Segunda meditação fichamento

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REVISÃO UEL DESCARTES, R. Meditações Metafísicas - Meditação Primeira e Meditação Segunda. Guinsburg, J. e Prado Jr., B. (trad.). Nova Cultural, São Paulo, 1987. (Coleção Os Pensadores). 2° aula – dia 06 Fichamento da Meditação Segunda, Da natureza do espírito humano; e de como ele é mais fácil de conhecer que o corpo, pp. 4-7, §§ 1-9. p. 4, §1 – Retomada da meditação, reafirmando o itinerário da dúvida metódica: “afastando-me de tudo em que poderia imaginar a menor dúvida, da mesma maneira como se eu soubesse que isto fosse absolutamente falso; e continuarei sempre nesse caminho até que tenha encontrado algo de certo, ou, pelo menos, se outra coisa não me for possível, até que tenha aprendido certamente que não há nada no mundo de certo”. Neste momento da meditação, após a dúvida bem-sucedida aos sentidos, à memória, à imaginação e, até mesmo, à razão matemática, é de se considerar que não há conhecimento certo algum. § 2 – Por isso, neste momento Descartes afirma que, para que a dúvida seja interrompida, basta que uma única verdade seja descoberta. Como Arquimedes, busca “um ponto que fosse fixo e seguro”. Como veremos, no entanto, há uma ideia adicional a esta “primeira verdade”, a saber, o princípio de que o conhecimento de todas as outras coisas deve ser deduzido exclusivamente a partir dela. § 3 – Descartes resume o resultado da aplicação da dúvida metódica: “Suponho, portanto, que todas as coisas que vejo são falsas; persuado-me de que jamais existiu de tudo quanto minha memória repleta de mentiras me representa; penso não possuir nenhum sentido; creio que o corpo, a figura, a extensão, o movimento e o lugar são apenas ficções de meu espírito”. §4 – A partir desta dúvida completa, o autor pergunta-se se, além das coisas postas em dúvidas, não existem outras, por exemplo, “algum Deus, ou alguma outra potência, que me ponha no espírito tais pensamentos?” É ainda a hipótese do deus enganador ou gênio maligno. Mas, mesmo essa possibilidade é questionada, pois todas as coisas de que dúvida – opiniões dos sentidos, imagens, elementos matemáticos não precisam necessariamente existir por força de algo externo, já que “talvez seja eu capaz de produzi-los por mim mesmo”. Aqui, é feita a hipótese do eu criador. Assim como na hipótese da criação do mundo ex nihilo por Deus, aqui é considerada a criação ex nihilo pelo eu. Mais importante, Descarte anuncia a ideia de um “eu”. Após negar “todas as coisas”, questiona-se sobre si mesmo, como possível criador de todas as ilusões. A existência do eu é, primeiramente, posta como questão: “Eu então, pelo menos, não serei alguma coisa?” E tal suposição é questionada pelo balanço da dúvida metódica: não há certeza, portanto é considerado falsa a Curso Saber Rua Montese, n° 76 Telefone: (43) 3326-1212 1 Curso Saber DATA: 30.10. 2013 PROFESSOR: GLAUBER KLEIN MATÉRIA:

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REVISÃO UEL

DESCARTES, R. Meditações Metafísicas - Meditação Primeira e Meditação Segunda. Guinsburg, J. e Prado Jr., B. (trad.). Nova Cultural, São Paulo, 1987. (Coleção Os Pensadores).2° aula – dia 06Fichamento da Meditação Segunda, Da natureza do espírito humano; e de como ele é mais fácil de conhecer que o corpo, pp. 4-7, §§ 1-9.

p. 4, §1 – Retomada da meditação, reafirmando o itinerário da dúvida metódica: “afastando-me de tudo em que poderia imaginar a menor dúvida, da mesma maneira como se eu soubesse que isto fosse absolutamente falso; e continuarei sempre nesse caminho até que tenha encontrado algo de certo, ou, pelo menos, se outra coisa não me for possível, até que tenha aprendido certamente que não há nada no mundo de certo”. Neste momento da meditação, após a dúvida bem-sucedida aos sentidos, à memória, à imaginação e, até mesmo, à razão matemática, é de se considerar que não há conhecimento certo algum.

§ 2 – Por isso, neste momento Descartes afirma que, para que a dúvida seja interrompida, basta que uma única verdade seja descoberta. Como Arquimedes, busca “um ponto que fosse fixo e seguro”. Como veremos, no entanto, há uma ideia adicional a esta “primeira verdade”, a saber, o princípio de que o conhecimento de todas as outras coisas deve ser deduzido exclusivamente a partir dela. § 3 – Descartes resume o resultado da aplicação da dúvida metódica: “Suponho, portanto, que todas as coisas que vejo são falsas; persuado-me de que jamais existiu de tudo quanto minha memória repleta de mentiras me representa; penso não possuir nenhum sentido; creio que o corpo, a figura, a extensão, o movimento e o lugar são apenas ficções de meu espírito”.

§4 – A partir desta dúvida completa, o autor pergunta-se se, além das coisas postas em dúvidas, não existem outras, por exemplo, “algum Deus, ou alguma outra potência, que me ponha no espírito tais pensamentos?” É ainda a hipótese do deus enganador ou gênio maligno. Mas, mesmo essa possibilidade é questionada, pois todas as coisas de que dúvida – opiniões dos sentidos, imagens, elementos matemáticos – não precisam necessariamente existir por força de algo externo, já que “talvez seja eu capaz de produzi-los por mim mesmo”. Aqui, é feita a hipótese do eu criador. Assim como na hipótese da criação do mundo ex nihilo por Deus, aqui é considerada a criação ex nihilo pelo eu.

Mais importante, Descarte anuncia a ideia de um “eu”. Após negar “todas as coisas”, questiona-se sobre si mesmo, como possível criador de todas as ilusões.

A existência do eu é, primeiramente, posta como questão: “Eu então, pelo menos, não serei alguma coisa?” E tal

suposição é questionada pelo balanço da dúvida metódica: não há certeza, portanto é considerado falsa a existência real dos corpos, das imagens, mesmo da extensão (figura, quantidade, tempo e espaço). Negando tais noções nega-se a existência do eu que faz as meditações, que duvida? “Serei de tal modo dependente do corpo e dos sentidos que não possa existir sem eles?” A resposta vem imediatamente: “Certamente não, eu existia sem dúvida, se é que eu me persuadi, ou, apenas, pensei alguma coisa”.

E o grau máximo da dúvida, a hipótese de um deus enganador ou gênio maligno, não é capaz de por em dúvida a existência do eu? – “Não há dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e, por mais que me engane, não poderá jamais fazer com que eu nada seja, enquanto eu pensar ser alguma coisa”.

Duas conclusões: por mais que se imagine enganando-se, por enganar-se, é algo. O meditante pode não ter conhecimento seguro algum, não possui nenhum critério que lhe garanta a verdade sobre as coisas, o que ele pensa está em dúvida, mas não que pensa. A dúvida metódica foi capaz de colocar tudo em dúvida, exceto que há a ação de duvidar, pois a própria proposta metódica só faz sentido com alguém duvidando. Talvez o ponto mais importante a se destacar aqui: tudo que a dúvida supôs como falso, mantém julgado falso, posto que incerto: corpos, imagens, quantidades, figuras, tempo e espaço estão em dúvida: duvidar não pressupõe nenhumas destas noções. A dúvida ou o ato de duvidar pressupõe apenas o pensamento. Por isso, o eu que duvida é o eu que pensa e é isto, e apenas isto, que a dúvida não pode por em dúvida:

Retomando: As graves dificuldades levantadas pelas dúvidas parecem dar inteira razão ao cético e destruir qualquer esperança de encontrarmos "alguma coisa que seja certa e indubitável". No entanto, é a própria reflexão sobre esta dúvida universal que produz uma reviravolta decisiva e nos conduz à descoberta da primeira certeza. Pois se todas as minhas ideias não passam de falsas ilusões, é certo que eu penso nessas falsas ilusões, e durante todo o tempo em que eu penso nelas, é certo que eu existo pensando. É esta primeira certeza que Descartes expressa.

"Penso, logo existo".De onde vem a força desta proposição? Para duvidar da verdade das minhas ideias é preciso que eu exerça um ato de pensamento, pois duvidar é um modo de pensar. Porém, não é possível que eu exerça qualquer ato de pensamento sem que eu saiba imediatamente que exerço este ato, pois este saber imediato que acompanha a realização dos meus atos mentais é o que define a natureza do

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DATA: 30.10. 2013 PROFESSOR: GLAUBER KLEIN MATÉRIA: FILOSOFIA

“De sorte que, após ter pensado bastante nisto e de ter examinado cuidadosamente todas as coisas, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito”.

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pensamento como consciência. Eis o que torna o Eu penso indubitável e o distingue de outros enunciados como, por exemplo, Eu ando. Não apenas eu posso andar sem saber que ando (basta que eu seja sonâmbulo), mas eu posso muito bem duvidar que eu esteja de fato andando (pode ser que eu esteja apenas sonhando que ando). Porém, eu não posso pensar que ando sem ser consciente deste pensamento. Tampouco é possível que eu não saiba imediatamente que eu existo como sujeito que exerce este pensamento. Afinal, como "o nada não tem propriedades", é impossível que os atos de consciência não sejam atos de um sujeito e que este não seja consciente de ser o sujeito que exerce estes atos. Eis a indubitabilidade de minha existência como sujeito pensante. Assim, se a dúvida põe em questão a verdade dos meus conteúdos de consciência, jamais ela atinge a certeza indubitável de que eu existo pensando nestes conteúdos.

§ 5 - Este é o cogito cartesiano, a primeira certeza do pensamento: a existência do pensamento. O que havia sido posto em dúvida: as coisas as nossas faculdades de conhecê-las: os sentidos, a imaginação e a razão. O pensamento, porém, não se identifica a nenhum deles. E a questão a partir de então é – o que, então, o pensamento? Este parágrafo enuncia a precaução de Descartes nos próximos passos de sua meditação: “doravante é preciso que eu atente com todo cuidado, para não tomar imprudentemente alguma outra coisa por mim, e assim para não equivocar-me neste conhecimento que afirmo ser mais certo e mais evidente do que todos os que tive até agora”. O que é mais certo e evidente? – a existência do pensamento. Só. Nada mais, o que é, quais as característica, o funcionamento, sabe-se ainda.

§ 6 – Descartes faz uma enumeração das crenças que ele tinha, anteriormente, sobre sua natureza: “O que, pois, acreditava eu ser até aqui? Sem dificuldade, pensei que era um homem. Mas que é um homem? Direi que é um animal racional?” Descartes nega que isso possa ser um conhecimento seguro a partir apenas do cogito. As noções mesmas de corpo – animal – e alma – razão – estão ainda suspensas pela dúvida metódica. A seguir, analisa e define, justamente, o conjunto de características ou noções que devem ser pressupostos na definição de homem como animal racional.Do corpo, Descartes afirma suas características ou funções: “máquina composta de ossos e carne, tal como ela aparece em um cadáver, a qual eu designava pelo nome de corpo”. E o distingue (o define) da alma: “por corpo entendo tudo o que pode ser limitado por alguma figura; que pode ser compreendido em qualquer lugar e preencher um espaço de tal sorte que todo outro corpo dele seja excluído; que pôde ser sentido ou pelo tato, ou pela visão, ou pela audição, ou pelo olfato; que pode ser movido de muitas maneiras, não por si mesmo, mas por algo de alheio pelo qual seja tocado e do qual receba a impressão”.

Podemos extrair daí que o corpo é definido pela exterioridade.

Da alma, afirma: “Considerava, além disso, que me alimentava, que caminhava, que sentia e que pensava e relacionava todas essas ações à alma”. Opõe a alma ao corpo: “Pois não acreditava de modo algum que se devesse atribuir à natureza corpórea vantagens como ter de si o poder de mover-se, de sentir e de pensar; ao contrário, espantava-me antes ao

ver que semelhantes faculdades se encontravam em certos corpos”.

Podemos extrair daí que a alma é definida pela atividade interna, auto-imposta.

§ 7 – Após a descoberta do cogito, isto é, da certeza evidente da existência do eu meditante, Descartes pergunta-se o que ele é. Pensa no que julgava ser, ante da dúvida metódica: um corpo e uma alma. Pergunta-se, a seguir, o que julgava ser o corpo e a alma. O corpo é uma máquina: uma coisa no espaço que funciona a partir da relação com demais coisas no espaço: suas ações são efeitos de causas externas. A alma é um conjunto de atividades, como andar, trabalhar, sentir, raciocinar. A questão, então, é saber quais entre estas características ou coisas podem ser ditas da natureza do cogito. O cogito é um corpo, é uma alma? O cogito é o homem?

Em relação às características do corpo, “detenho-me em pensar nisto com atenção, passo e repasso todas essas coisas em meu espírito, e não encontro nenhuma que possa dizer que exista em mim”. Isto quer dizer: sequer uma destas características são próprias do pensar nele mesmo.

Em relação às características da alma, Descartes considera que várias delas existem em união ou cooperação com o corpo: andar, alimentar-se, sentir. “Além do que, pensei sentir outrora muitas coisas, durante o sono, as quais reconheci, ao despertar, não ter sentido efetivamente.” Resta porém um atributo da alma:

Há, porém, uma importante consideração: O cogito não pode ser confundido com a existência temporal do meditante. Ao pensar, duvidando, sei que existo, pois nenhuma dúvida pode por em dúvida a própria ação de duvidar, Porém, uma vez que o pensamento não se exerça, se realize, seja uma ação atual, sua existência deixa de estar assegurada: “pois poderia, talvez, ocorrer que, se eu deixasse de pensar, deixaria ao mesmo tempo de ser ou de existir. Nada admito agora que não seja necessariamente verdadeiro: nada sou, pois, falando precisamente, senão uma coisa que pensa, isto é, um espírito, um entendimento ou uma razão, que são termos cuja significação me era anteriormente desconhecida.”

A passagem afirma, ainda, que a natureza mesma do espírito, alma, entendimento ou razão era desconhecida. Por quê? Por que não estava distinto, ainda, a alma do corpo. Por isso, não era claro e distinto, que o espírito é pensamento. Com a clareza e a distinção, Descartes pode rejeitar as definições tradicionais de espírito: “Ora, eu sou uma coisa verdadeira e verdadeiramente existente; mas que coisa? Já o disse: uma coisa que pensa. E que mais? Excitarei ainda minha imaginação para procurar saber se não sou algo mais. Eu não sou essa reunião de membros que se chama o corpo humano; não sou um ar tênue e penetrante, disseminado por todos esses

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O corpo é uma máquina. Unido à alma é um autômato.

“é pensar; e verifico aqui que o pensamento é um atributo que me pertence; só ele não pode ser separado de mim. Eu sou, eu existo: isto é certo.”

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membros; não sou um vento, um sopro, um vapor, nem algo que posso fingir e imaginar, posto que supus que tudo isso não era nada e que, sem mudar essa suposição, verifico que não deixo de estar seguro de que sou alguma coisa”.

§ 8 - Mas também pode ocorrer que essas mesmas coisas, que suponho não existirem, já que me são desconhecidas, não sejam efetivamente diferentes de mim, que eu conheço? Nada sei a respeito; não o discuto atualmente, não posso dar meu juízo senão a coisas que me são conhecidas: reconheci que eu era, e procuro o que sou, eu que reconheci ser. Ora, é muito certo que essa noção e conhecimento de mim mesmo, assim precisamente tomada, não depende em nada das coisas cuja existência não me é ainda conhecida; nem, por conseguinte, e com mais razão de nenhuma daquelas que são fingidas e inventadas pela imaginação. E mesmo esses termos fingir e Imaginar advertem-me de meu erro; pois eu fingiria efetivamente se imaginasse ser alguma coisa, posto que imaginar nada mais é do que contemplar a figura ou a imagem de uma coisa corporal. Ora, sei já certamente que eu sou, e que, ao mesmo tempo, pode ocorrer que todas essas imagens e, em geral, todas as coisas que se relacionam à natureza do corpo sejam apenas sonhos ou quimeras. Em seguimento disso, vejo claramente que teria tão pouca razão ao dizer: excitarei minha imaginação para conhecer mais distintamente o que sou, como se dissesse: estou atualmente acordado e percebo algo de real e de verdadeiro; mas, visto que não o percebo ainda assaz nitidamente, dormiria intencionalmente a fim de que meus sonhos mo representassem com maior verdade e evidência. E, assim, reconheço certamente que nada, de tudo o que posso compreender por meio da imaginação, pertence a este conhecimento que tenho de mim mesmo e que é necessário lembrar e desviar o espírito dessa maneira de conceber a fim de que ele próprio possa reconhecer muito distintamente sua natureza.______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

§ 9 – “Mas o que sou eu, portanto? Unia coisa que pensa. Que é uma coisa que pensa? É uma coisa que duvida, que concebe, que afirma, que nega, que quer, que não quer, que imagina também e que sente. Certamente não é pouco se todas essas coisas pertencem à minha natureza. Mas por que não lhe pertenceriam? Não sou eu próprio esse mesmo que duvida de quase tudo, que, no entanto, entende e concebe certas coisas, que assegura e afirma que somente tais coisas são verdadeiras, que nega todas as demais, que quer e deseja

conhecê-las mais, que não quer ser enganado, que imagina muitas coisas, mesmo mau grado seu, e que sente também muitas como que por intermédio dos órgãos do corpo? Haverá algo em tudo isso que não seja tão verdadeiro quanto é certo que sou e que existo, mesmo se dormisse sempre e ainda quando aquele que me deu a existência se servisse de todas as suas forças para enganar-me? Haverá, também, algum desses atributos que possa ser distinguido de meu pensamento, ou que se possa dizer que existe separado de mim mesmo? Pois é por si tão evidente que sou eu quem duvida, quem entende e quemdeseja que não é necessário nada acrescentar aqui para explicá-lo. E tenho também certamente o poder de imaginar; pois, ainda que possa ocorrer (como supus anteriormente) que as coisas que imagino não sejam verdadeiras, este poder de imaginar não deixa, no entanto, de existir realmente em mim e faz parte do meu pensamento. Enfim, sou o mesmo que sente, isto é, que recebe e conhece as coisas como que pelos órgãos dos sentidos, posto que, com efeito, vejo a luz, ouço o ruído, sinto o calor. Mas dir-me-ão que essas aparências são falsas e que eu durmo. Que assim seja; todavia, ao menos, é muito certo que me parece que vejo, que ouço e que me aqueço; e é propriamente aquilo que em mim se chama sentir e isto, tomado assim precisamente, nada é senão pensar. Donde, começo a conhecer o que sou, com um pouco mais de luz e de distinção do que anteriormente.______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Esquema geral§§1-9: da natureza do espírito humano.§§1-4: conquista da primeira certeza:(§§ 1-3): procura de uma primeira certeza;(§4): "Eu sou, eu existo"§§5-9: reflexão sobre esta primeira certeza e conquista da segunda:(§ § 5-8): quem sou eu, eu que estou certo que sou? Uma coisa pensante. Determinação da essência do Eu;(§9): descrição da "coisa pensante" e distinção entre o pensamento (atributo principal desta substância) e suas outras faculdades.

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Exercícios“Mas eu, o que sou eu, agora que suponho que há alguém que é extremamente poderoso e, se ouso dizê-lo, malicioso e ardiloso, que emprega todas as suas forças e toda a sua indústria em enganar-me? Posso estar certo de possuir a menor de todas as coisas que atribuí há pouco à natureza corpórea? Detenho-me em pensar nisto. Com atenção, passo e repasso todas essas coisas em meu espírito, e não encontro nenhuma que possa dizer que exista em mim. Não é necessário que me demore a enumerá-las. Passemos, pois, aos atributos da alma e vejamos se há alguns que existam em mim. Os primeiros são alimentar-me e caminhar; mas, se é verdade que não possuo corpo algum, é verdade também que não posso nem caminhar nem alimentar-me. Um outro é sentir; mas não se pode também sentir sem o corpo; além do que, pensei sentir outrora muitas coisas, durante o sono, as quais reconheci, ao despertar, não ter sentido efetivamente. Um outro é pensar; e verifico aqui que o pensamento é um atributo que me pertence; só ele não pode ser separado de mim. Eu sou, eu existo: isto é certo; mas por quanto tempo? A saber, por todo o tempo em que eu penso; pois poderia, talvez, ocorrer que, se eu deixasse de pensar, deixaria ao mesmo tempo de ser ou de existir. Nada admito agora que não seja necessariamente verdadeiro: nada sou, pois, falando precisamente, senão uma coisa que pensa, isto é, um espírito, um entendimento ou uma razão, que são termos cuja significação me era anteriormente desconhecida. Ora, eu sou uma coisa verdadeira e verdadeiramente existente; mas que coisa? (...) Eu não sou essa reunião de membros que se chama o corpo humano; não sou um ar tênue e penetrante, disseminado por todos esses membros; não sou um vento, um sopro, um vapor, nem algo que posso fingir e imaginar, posto que supus que tudo isso não era nada e que, sem mudar essa suposição, verifico que não deixo de estar seguro de que sou alguma coisa.” (Descartes, Meditações, Meditação Segunda, § 7) 01 - No texto acima, Descartes emprega um tradicional procedimento filosófico, que consiste em identificar as coisas por meio de seus atributos. Por meio desse procedimento, ele identifica duas espécies de coisas (substâncias). Quais são essas duas espécies de coisas (substâncias) assim identificadas e quais os principais atributos de cada uma delas? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ 02 - No texto acima, Descartes refere-se a “alguém que é extremamente poderoso (...) malicioso e ardiloso” e que emprega todas as suas forças para nos enganar. Mas Descartes jamais afirma que esse gênio maligno verdadeiramente exista. Para o argumento que ele está desenvolvendo, basta a mera possibilidade da sua existência. Qual o papel da mera

possibilidade da existência desse gênio maligno no argumento de Descartes? ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

03 - Para Descartes, o que é mais fácil conhecer: nosso espírito ou o que lhe é exterior? Por que um e não o outro?______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

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