FICHAMENTO Libras

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ PLANO NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA – PARFOR CURSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA NÁDIA OLIVEIRA BARROS LIBRAS? QUE LÍNGUA É ESSA?:A língua de sinais, O surdo e a Surdez

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Fichamento de Libras

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARPLANO NACIONAL DE FORMAO DE PROFESSORES DA EDUCAO BSICA PARFORCURSO DE EDUCAO FSICA

NDIA OLIVEIRA BARROS

LIBRAS? QUE LNGUA ESSA?:A lngua de sinais, O surdo e a Surdez

SANTARM PAR 2015

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARPLANO NACIONAL DE FORMAO DE PROFESSORES DA EDUCAO BSICA PARFORCURSO DE EDUCAO FSICA

NDIA OLIVEIRA BARROS

LIBRAS? QUE LNGUA ESSA ?:A lngua de sinais, O surdo e a Surdez

Fichamento de encerramento da disciplina Libras para obteno da nota da 2 avaliao, no Curso de Licenciatura em Educao Fsica, na Universidade do Estado do Par, sob orientao da Professora Fabiane Rabelo.

SANTARM PAR2015

GESSER, Audrei. Libras? Que lngua essa?: crenas e preconceitos em torno da lngua de sinais e da realidade surda. So Paulo: Parbola Editorial, 2009.

CAPTULO 1A lngua de sinais

A lngua de sinais universal?Uma vez que essa universalidade est ancorada na ideia de que toda lngua de sinais um cdigo simplificado apreendido e transmitido aos surdos de forma geral, muito comum pensar que todos os surdos falam a mesma lngua em qualquer parte do mundo. (p.11).Em qualquer lugar em que haja surdos interagindo, haver lnguas de sinais. (p. 12).Na pergunta sobre universalidade, est tambm implcita uma tendncia a simplificar a riqueza lingustica, sugerindo que talvez para os surdos fosse mais fcil se todos usassem uma lngua nica, uniforme. (p. 12).

A lngua de sinais artificial?Crena. A lngua de sinais dos surdos natural, pois evoluiu como parte de um grupo cultural do povo surdo. O esperanto1 (lngua oral) e o gestuno (lngua de sinais) so exemplos de lnguas artificiais, cujo objetivo maior estabelecer a comunicao internacional, foi mencionada pela primeira vez no Congresso Mundial na Federao Mundial dos Surdos (World Federation of the Deaf WFD) em 1951. A comunidade surda, de forma geral, no considera o gestuno uma lngua real, uma vez que foi inventada e adaptada. (pp. 12-13)

A lngua de sinais tem gramtica?O reconhecimento lingustico tem marca nos estudos descritivos do linguista americano William Stokoe em 1960. (...) As lnguas de sinais, como se v, vieram a ser contempladas cientificamente apenas nos ltimos quarenta anos. (pp. 13-14).Ao descrever os fonolgicos e morfolgicos da lngua americana de sinais (ASL aqui por diante), Stokoe apontou trs parmetros que constituem os sinais e nomeou-os... (p. 14).A orientao da palma da mo (o). Ficou demonstrado que dois sinais com os mesmos outros trs parmetros iguais (CM, L, M) poderiam mudar de significado de acordo com a orientao da mo. Nas lnguas orais, por exemplo, pata e rata se diferenciam significativamente pela alterao de um nico fonema (p. 15).Vrios verbos fazem a flexo verbal dependendo da palma da mo: respeitar, responder, telefonar, avisar etc. (p.16).Os sinais tambm podem ser realizados com as duas mos. (p. 16).A orientao a orientao da palma da mo indica que os sinais tm direo e que sua inverso, em alguns sinais, pode alterar o significado do sinal. A locao refere-se ao lugar podendo ser realizado em alguma parte do corpo, e no exemplo podemos verificar que ocorre em frente ao queixo (p. 17).As mos no so o nico veculo usado nas lnguas de sinais para produzir informao lingustica. Os surdos fazem uso extensivos de marcadores no manuais. Nas lnguas de sinais, as expresses no faciais (movimento de cabea, olhos, boca, sobrancelhas etc.) so elementos que compem a estrutura da lngua (p. 17-18).A partir da anlise desses parmetros, podemos perceber que as lnguas orais e as lnguas de sinais so similares em nvel estrutural, ou seja, so formadas a partir de unidades simples que combinadas, formam unidades mais complexas. (...) Sentenas e frases so construdas de palavras; palavras so construdas de a partir de morfemas; e morfemas, por sua vez, so construdos a partir de fonemas. (Pinker, 1995: 162) (p. 19).Enquanto a lngua de sinais, de uma maneira geral (mas no exclusiva!), incorporam as unidades simultaneamente; as lnguas orais tendem a organiz-la sequencialmente/literalmente (p. 19).A crena, ainda muito forte na sociedade ouvinte, de que a lngua de sinais dos surdos no tem gramtica est ancorada na crena de que (...) elas no passariam de mmicas e pantomimas (p. 19)

A lngua dos surdos mmica?Falso. (...) Quando me perguntam, entretanto, se a lngua de sinais mmica entendo que est implcito nessa pergunta um preconceito muito grande que vai alm da discusso sobre a legitimidade lingustica ou mesmo sobre quaisquer relaes com que ela possa ter (ou no) com a lngua de sinais. (...) uma viso embasada na anormalidade, segundo o qual o mximo que o surdo consegue expressar uma forma pantommica indecifrvel e somente compreensvel entre eles (p. 21).A lngua de sinais tem todas as caractersticas lingusticas de qualquer lngua humana natural. (p. 21).

possvel expressar conceitos abstratos na lngua de sinais?Claro que sim. (...) No dicionrio de lingustica e fontica, por exemplo, gestos so considerados traos paralingusticos ou extralingusticos das lnguas orais:(...) A expresso traos extralingusticos pode significar quaisquer propriedades de tais situaes, ou, em termos mais especficos, propriedades da comunicao que no so claramente analisveis em termos LINGUSTICOS. (pp. 22-23)Para nos desvincularmos da acepo exposta acima, devemos entender que sinais no so gestos. (...) Assim, correto afirmar que as pessoas que falam lnguas de sinais expressam sentimentos, emoo e quaisquer ideias ou conceitos abstratos. Tal como os falantes de lnguas orais, os falantes de lnguas de sinais podem discutir filosofia, poltica, literatura, assuntos cotidianos etc. (p.23)

uma lngua exclusivamente icnica?Crena. H uma tendncia em pensar assim, e essa viso relaciona-se com o fato de a lngua, quando sinalizada, fica mais palpvel, visvel. (...) Essa associao incorre, muitas vezes, em cairmos no risco de reforar a crena de que a lngua de sinais seria apenas uma representao pantommica (p. 23).Alm disso, mesmo sinais mais icnicos tendem a se diferenciar de uma lngua de sinais para outra, o que nos remete ao fato de a lngua ser um fenmeno convencional mantido por um acordo acordo coletivo tcito entre os falantes de uma determinada comunidade (Sausurre, 1995). (p.24)

A lngua de sinais um cdigo secreto dos surdos?Os surdos foram privados de se comunicarem em sua lngua natural durante sculos. (...) Escolas, profissionais da sade, e familiares de surdos tem seguido uma tradio de negao do uso dos sinais. (...) Padden & Humphries (1988) mostram que as escolas, em sua grande maioria, proibiam o uso de da ngua de sinais para a comunicao entre os surdos, forando-os a falar e a fazer leitura labial. (p. 25).No Brasil, a trajetria dos surdos no foi muito diferente (Reis, 1992; Rocha, 1997). Dentre algumas narrativas histricas, conta-se que a sinalizao era vista como um cdigo secreto, mesmo entre os surdos, pois eram usadas s escondidas, por causa de sua proibio. (p. 26).A lngua de sinais, como j vimos tem uma gramtica prpria e se apresenta estruturada em todos os nveis, como as lnguas orais: fonolgico, morfolgico, sinttico e semntico. (p. 27).

A lngua de sinais uma verso sinalizada da lngua oral?No. A lngua de sinais tem estrutura prpria, e autnoma, ou seja, independente de qualquer lngua oral em sua concepo lingustica. Educacionalmente, o uso do portugus sinalizado tem sido alvo de muitas crticas, porque se insere na filosofia do biomodalismo. Dentro dessa viso encara-se a lngua de sinais como meio para se distinguir um fim, ou seja, um recurso para ensinar a falar uma lngua oral (no Brasil, o portugus) funcionando como um amalgama dos sinais e da fala. (p. 33).(...) o portugus sinalizado pode ser o reflexo de uma ideologia e, ento, h que averiguar mais de perto para saber se esses usos, se esse fares so ou no uma ltima tentativa, um ltimo grito da maioria ouvinte para rejeitar e banir a lngua de sinais dos surdos. (p. 35).

A lngua de sinais tem suas origens histricas na lngua oral?H poucos documentos registrados por surdos, e sobre os surdos, que possam fornecer informaes sobre a origem e o desenvolvimento das lnguas de sinais entre os surdos. (p. 35).(...) importante dizer que a coabitao da maioria das lnguas de sinais com as lnguas orais faz com que emprstimos, alternncia e trocas lingusticas aconteam, inevitavelmente. Na histria da evoluo do homem, constata-se que o uso de sinais pelas mos como forma de comunicao pelo homem anterior ao da fala vocal. (p. 38)

A LIBRAS falada no Brasil apresenta uma unidade?Crena. Em toda lngua humana, h uma diversidade. (...) o mito da unidade lingustica o maior e mais srio de todos, pois est presente no discurso no somente da populao, mas de muitos intelectuais. (p. 39).Portanto, dizer que todos os brasileiros falam o mesmo portugus uma inverdade, na mesma proporo em que inverdade dizer que todos os surdos usam a mesma LIBRAS. Afirmar essa unidade negar a variedade das lnguas, quando de fato nenhuma lngua uniforme, homognea. (p. 39).

A lngua de sinais uma lngua grafa?A escrita de qualquer lngua um sistema de representao, uma conveno da realidade extremamente sofisticada, que se constitui num conjunto de smbolos de segunda ordem, sejam as lnguas verbais ou de sinais. (p. 42)Observou-se que os surdos expostos ao sistema Sign Writing tinham muita facilidade para escrever. Um dos grandes desafios dos pesquisadores no processo de sistematizao tornar a grafia a mais concisa e clara possvel. (p. 43).Nota-se uma diferena de surdo para surdo no uso dos grafemas uns so mais detalhistas, outros menos. (p. 44).

CAPTULO 2O surdoSurdo, surdo-mudo ou deficiente auditivo? facilmente observvel que, para muitos ouvintes alheios discusso sobre a surdez, o uso da palavra surdo, surdo-mudo, deficiente auditivo parece-lhes ser mais politicamente correto:Eu achava que deficiente auditivo era menos ofensivo ou pejorativo do que surdo ... mas, na convivncia com os prprios surdos, fui que eles preferem mesmo que os chamem de surdos e uns ficam irritados quando so chamados de deficientes... (aluno ouvinte, 2004) (p. 45)A deficincia uma marca que historicamente no tem pertencido aos surdos. Essa marca sugere autorrepresentaes, polticas e objetivos no familiares ao grupo. Quando os surdos discutem sua surdez, usam termos profundamente relaci0nados com sua lngua, seu passado, e sua comunidade (Padden & Humphries, 1988:44). (p. 46).Cabe ressaltar, por outro lado, que no apenas a escolha acertada de um termo que elimina os preconceitos sociais. (...) Mas o deslocamento conceitual preciso e urgente, e vem ocorrendo em primeira instncia na reflexo e problematizao dos conceitos de que fazemos uso ao nomear o outro. (p. 45).

O intrprete a voz do surdo?O intrprete tem sido uma importncia valiosa nas interaes entre surdos e ouvintes. (...) No brasil ainda no h uma tradio na profisso ou formao de intrpretes de lngua inglesa e francesa. (p. 47).No caso da LIBRAS, a interpretao ocorre geralmente de maneira informal, em momentos em que o surdo est interagindo com outros indivduos que no dominam/conhecem a lngua de sinais. Afirmar que o surdo precisa de intrprete em espaos institucionais em que as pessoas no falam a sua lngua j um direito reconhecido pela Lei n 10.436, aprovada em 24 de abril de 2002. Por outro lado, retomando a afirmao compartilhada pelo senso comum de que o intrprete a voz do surdo, pode-se encobrir uma crena que o surdo no tem lngua, e isto, sabemos, no verdade. (p. 47)O surdo vive no silncio absoluto?

Por definio, barulho a ausncia de silncio; um rudo ou som acstico perceptvel aos ouvidos. Para a cultura surda, todavia, o barulho e o silncio adquirem novas verses. O barulho, nesse ltimo caso, perceptvel viso do surdo atravs da dinmica dos objetos e das pessoas, manifestada, por exemplo, em forma de movimento, conversas paralelas, risos, expresso facial, corporal e manual. (...) Isto por que os sons extrapolam sua caracterstica fsico-acstica e adquirem significados culturalmente relacionados. Esse significado culturalmente construdo, e cada cultura organiza seus significados diferentemente. Essas convenes culturais so aprendidas e construdas dentro das nossas prticas cotidianas. (p. 48).Como se pode ver, no h desvantagem na surdez, quando se fala em comunicao e em linguagem, visto que no a modalidade da lngua que define se estamos em silncio ou no. (...) uma crena equivocada pensar que a lngua de sinais dos surdos uma lngua silente, ou que os surdos vivem no silncio total. (pp.49-50).O surdo precisa ser oralizado para se integrar a sociedade ouvinte?No. Pode-se dizer que a busca desenfreada pela recuperao da audio e promoo0 do desenvolvimento da fala vocalizada pelo surdo so objetos que trazem em vrios sentimentos: desejo: desejo, dor, privao, aprovao, opresso, discriminao e frustrao. (p. 50).Nesse cenrio, internatos de surdos, internatos de surdos, casamentos entre eles e qualquer tipo de contato eram proibidos, e tal proibio foi entendida como uma medida preventiva, capaz de salvar a raa humana. Por isso rechaado com veemncia pela comunidade surda em todo o mundo, do mesmo modo como so rechaados todos os que se inscrevem nessa filosofia. (pp. 50-51). recorrente ouvir, nos discursos mais extremistas, entretanto, que o surdo oralizado no surdo de verdade: Surdo que surdo defende e s usa a lngua de sinais. No entanto a rejeio da oralizao por a todo custo por surdos mais politizados e militantes mais uma discusso poltico-ideolgico e definitivamente pertinente e importante para a viabilizao da LIBRAS. Pois o perigo est quando certas decises so impostas, e as imposies e opresses, sabemos vm de todos os quadrantes... (p. 52).O surdo tem uma identidade e uma cultura prpria?Sim. Esse discurso muito disseminado pelos surdos e ouvintes em muitos ambientes sociais que discutem e articulam a questes prprias rea da surdez. (...) No singular, a afirmao sublinhada a ideia do purismo identitrio e cultural da pesquisadora surda Karin Strobel:Ao analisarmos sua histria, vemos que a cultura surda foi marcada por muitos esteretipos, seja atravs da imposio da cultura dominante, seja das representaes sociais que narram o povo surdo como seres deficientes. (...) No digo que seja errado, o que quero dizer que essas metodologias no seguem a cultura surda... (...) Mas no se trata somente de reconhecerem a diferena cultural do povo surdo, e sim, alm disso de perceberem a cultura surda atravs do reconhecimento de suas diferentes identidades, suas histrias. (pp. 52-53).

Toda via no se pode criar o mito de que o surdo no compartilharia de outras culturas como, por exemplo, das culturas ouvintes. Afinal, como aponta de Certeau (1995: 233), a Cultura , gostemos ou no, o flexvel; ela produtiva, dinmica, aberta plural e est em constante transformao, pois construda situacionalmente em tempos e lugares particulares. (p. 54).

O surdo no fala porque no ouve?

A sociedade, de modo ampliado, concebe fala com o sentido de produo vocal-sonora. A verdade que o surdo fala em sua lngua de sinais. necessrio, entretanto, expandir o conceito que temos de lnguas humanas, e tambm definir conceitos ultrapassados para enxergar outra dimenso na qual conceber a lngua o canal viso-gestual. (p. 55).Os surdos que perda auditiva profunda podem (se assim desejarem!) produzir fala inteligvel: basta estarem com seu aparato vocal intacto. Para tanto necessrio treinamento junto aos profissionais da fonoaudiologia. (pp. 55-56).

O surdo tem dificuldade de escrever porque no sabe falar a lngua oral?A escrita uma habilidade cognitiva que demanda esforo de todos (surdos, ouvintes, ricos, pobres, homens, mulheres...) e geralmente desenvolvia quando se recebe instruo formal. (p.56).Sabe-se que os alunos ouvintes tambm tem algumas memrias negativas das aulas de portugus e dos momentos de escrita, entretanto, a imposio do portugus a todo custo na escolarizao dos surdos tem vrios significados, sendo o mais grave deles a negao da lngua de sinais na alfabetizao. (p. 57).Ainda que o surdo no vocalizasse uma palavra da lngua oral, ele poderia escrever bem o portugus como fazem muitos outros falantes de outras lnguas estrangeiras. E na sala de aula, durante a escolarizao, que preciso rever essa relao entre a lngua falada e escrita. (p. 57).No se trata de dificuldade intelectual e sim de oportunidade de acesso a uma escola que reconhea as diferenas lingusticas; que promova acesso lngua padro; que, no caso dos surdos, tenha professores proficientes na lngua de sinais que permita a alfabetizao na lngua primeira e natural dos surdos. (pp. 57-58).

O uso da lngua de sinais atrapalha a aprendizagem da lngua oral?A falta de interesse dos surdos na aprendizagem da lngua majoritria oral tem estado intimamente relacionada aos castigos e punies que a histria da educao dos surdos se encarrega de narrar. O uso dos sinais sempre germina no encontro surdo-surdo e essa realidade faz com que os profissionais temam pelo progresso de seu trabalho, ou seja, acreditava-se que o treinamento de leitura labial e da vocalizao pudesse ficar completamente comprometido (Lane, 1984; Padden & Humphries, 1988; Sacks, 1990). Essas caractersticas ao contrrio do que se pensa so completamente naturais no repertrio dos indivduos bilngues, e muitos estudos que enfocam o fenmeno do bilinguismo descreve essa questo. (p. 58).Pesquisadores afirmam que o no uso da lngua de sinais que atrapalha o desenvolvimento e a aprendizagem de outras lnguas pelo surdo. O ensino da escrita para os surdos, entretanto, tem que ser, indiscutivelmente, promovido na lngua primeira de sinais. (p. 59).O respeito diferena lingustica do surdo lhe garantida s e se a educao for feita em sua lngua natural. (p. 59).

O surdo precisa da lngua portuguesa para sobreviver na sociedade majoritria ouvinte?No tocante educao educao dos surdos, a maioria dos profissionais tende a acreditar que a lngua oral seja o meio lingustico, relegando os sinais a um plano secundrio. Assim o mais coerente seria dizer que sem a lngua de sinais que o surdo no sobrevive na sociedade majoritria ouvinte, pois com e atravs dela que lhe garantida a construo de conhecimento de mundo e, sobretudo, a construo e o fortalecimento da identidade cultural surda. (p. 60).Para dar conta das questes educacionais na formao do surdo, inclusive a aprendizagem da lngua portuguesa em sua modalidade escrita, h a necessidade de inverter a lgica praticada at ento nos ambientes escolares e afirmar: Os professores ouvintes de crianas surdas que precisam saber a LIBRAS para poderem educ-las. (p. 60).Todos os surdos fazem leitura labial?A leitura labial e o desenvolvimento da fala vocalizada so habilidades que precisam de treinos rduo e intensos para ser desenvolvidas. H uma crena muito recorrente entre ouvintes, e vrios surdos relatam que uma das perguntas mais frequentes quando esto entre ouvintes que no sabem sinais, em um primeiro contato, se sabem ler lbios. (pp. 60).Curioso, entretanto, o jeito desengonado dos ouvintes quando dependem dessa forma comunicativa para travar uma conversa com o surdo: articulam exageradamente a palavras, falam muito alto, quase gritando. Por outro lado essa imagem tambm ilustrativa de como o ser humano busca forma para estabelecer a interao com o outro. (p. 61).

CAPTULO 3A surdez

A surdez um problema para o surdo? importante frisar que os surdos e ouvintes que usam e valorizam a lngua de sinais assumem uma postura positiva diante da surdez. No Brasil j possvel ver mudanas nos discursos de alguns familiares, educadores e mesmo profissionais da sade. (p. 63).Uma entrevistada surda discorre em uma de suas falas:A surdez um problema quando a sociedade passa a me ver como um problema. Quando tenho a oportunidade de interagir com pares que me identifico atravs da lngua de sinais, quando tenho a oportunidade de interagir com pares que me identifico atravs da lngua de sinais, quando tenho a oportunidade de estudar em uma escola que utilize sinais, quando tenho meus direitos assegurados, me sinto apta e capaz. (p.64).

A surdez muito mais um problema para o ouvinte do que para o surdo. (p. 64).

A surdez uma deficincia?A surdez no uma deficincia. Nas definies trazidas por Biderman, surdez e deficincia so sinnimos, e nos remete ao discurso clnico das patologias muito presente no imaginrio das pessoas, em grande medida, dado o valor que se medicina (e reas afins). A falha, insuficincia e imperfeio que significam a palavra deficincia so as que rotulam a surdez do surdo, ou seja, o prprio indivduo, que qualificado pelo predicativo deficiente auditivo (pp. 64-65).

Por que a surdez vista negativamente pela sociedade?A surdez construda na perspectiva do dficit, da falta, da anormalidade. O normal ouvir, o que diverge desse padro deve ser corrigido, normalizado. E, com um discurso to forte e to reforado pela grande maioria, fica difcil pensar a surdez sob outro prisma, ou seja, como diferena. (p. 67).Na nossa sociedade, ser normal ser homem, branco, ocidental, letrado, heterossexual, usurio de lngua oral padro, ouvinte, no cadeirante, vidente, sem desvios cognitivos, mentais e/ou sociais. A questo do preconceito social ciclo vicioso (e pernicioso) que est e sempre esteve presente na vida da humanidade. (p. 68).Em todas as esferas sociais, h nveis de demonstrao de preconceitos; da mesma forma que h formas veladas em algumas aes, dizeres e fazeres. (p. 69).

A surdez hereditria?No estudo de que estamos falando, Groe apontou que a elevada ocorrncia da surdez no se dava em funo de traumas ou doenas contagiosas capazes de provocar a surdez e tambm por acidentes, doenas contradas na gestao ou efeitos colaterais do uso de medicamentos, por exemplo. Mas quando h uma ocorrncia muito grande entre familiares, entre gestaes, as chances a ser genticas, ou mesmo hereditrias. (p. 69).Vrios outros fatos macabros so relatados, mas, atualmente, j se reconhece a tremenda atrocidade cometida contra os surdos no passado, que resultou no crime da privatizao lingustica e no estigma social e psicolgico que carregam, at hoje, todos os surdos na nossa sociedade. (p. 71).

H diferentes tipos e graus de surdez?O indivduo pode ficar surdo por vrias causas, e que h aproximadamente 70 tipos de surdez hereditria; mais ou menos 50 delas esto associadas com outras anormalidades. (pp. 71-72).O grau de surdez pode variar de leve a profundo. A surdez leve pode, entretanto, ir se agravando com o tempo e virar surdez profunda. (p. 72). nesse sentido que se pode dizer que nem todos os indivduos com algum tipo de perda auditiva so necessariamente deficientes aditivos ou surdos. (p. 72).

Aparelhos auditivos ajudam o surdo a ouvir melhor?O que os aparelhos auditivos fazem amplificar um som, que possivelmente funcionaria para pessoas mais idosas que, com o passar do tempo, perdem parte de sua audio, ou mesmo para aqueles que tm um resduo auditivo maior. O surdo pr-lingual, por outro lado, no tem experincia auditiva ou imagens para invocar. O nico tipo de funcionalidade seria a de sentir chiados na orelha, especialmente para garantir que perceber quando a campainha ou o telefone tocam, por meio de sons provocados por uma vibrao amplificada no tmpano. (p. 74).As prteses ou aparelhos auditivos, conforme argumentam os fonoaudilogos, ajudariam as crianas com surdez severa ou profunda a estimular a audio residual e, assim fazendo, perceber os componentes acsticos da fala. Os indcios daqueles que voltam a escutar, pode-se concluir, seriam casos excepcionais. (p. 75).

O implante coclear recupera a audio do surdo?A recuperao da audio, nesses casos, vai depender de inmeras variveis, mas h muito ceticismo em caso de surdos profundos, especialmente adultos. (p. 76).Corrente manifestao, a esse respeito, a viso de muitos ouvintes, geralmente inscritos em uma narrativa hegemnica, que v a surdez exclusivamente no vis patolgico. (p. 76).

A surdez compromete o desenvolvimento cognitivo-lingustico do indivduo?J est comprovado por estudos cientficos que ela est ligada, em grande medida, ao poder dos discursos mdicos. No a surdez que compromete o desenvolvimento do surdo, sim a falta de acesso a uma lngua. A ausncia dela torna o indivduo solitrio, alm de comprometer o desenvolvimento de suas capacidades mentais. (p. 76). comum ouvirmos as pessoas falarem que o surdo muito irritado, agressivo, nervoso e at dbil mental. Quando so abordados e educados atravs da lngua de sinais, nenhum desses problemas de ordem social se apresenta. Os surdos esto longe de serem estpidos ou deficientes mentais, pois viveram (e vivem?) uma situao que os pe em desvantagem em relao ao ouvinte em todos os aspectos, especialmente no tocante proibio e a falta de uso da lngua de sinais na vida escolar. (p. 77).No a surdez que priva o indivduo surdo de se desenvolver como indivduo em sua totalidade: reconhece-se o impedimento biolgico articulatrio-perceptual, mas, como bem pontua o linguista Noam Chomsky (1995), o termo articulatrio no processo de aquisio e funcionamento das lnguas no deve se restringir modalidade vocal apenas. Ento podemos afirmar que processo de aquisio de linguagem, possvel afirmar que o processo de crianas surdas adquirindo a lngua de sinais anlogo, em muitos aspectos, ao de crianas ouvintes. (p. 78).

Que momento ns vivemos?A oficializao da LIBRAS, o direito do surdo de ter um intrprete nas reas de licenciaturas no ensino superior para surdos, a incluso da LIBRAS em alguns currculos... Sem dvida, o momento do surdo e para o surdo. (p. 78).Tambm testemunhamos os descompassos entre os discursos tericos e a atuao de profissionais na prtica cotidiana. Alm disso, naquilo que diz respeito ao reconhecimento lingustico e cultural, outras aes so necessrias e cruciais para construir e legitimar socialmente o que a lei j assegura. (p. 79).Muitos pais rejeitam a lngua de sinais porque no sabem como lidar com seus filhos; so vtimas, da mesma forma que alguns educadores. Todavia, se algo h para ser mudado, a prtica do distanciamento entre pais/professores ouvintes e seus filhos/alunos surdos provocada pelo medo e pelo desconhecimento da surdez. (p.80).