Recursos Cinegéticos em Portugal: Oportunidades e ameaças ... · Raposa ( Vulpes vulpes) ......

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Recursos Cinegéticos em Portugal: Oportunidades e ameaças. Caso de estudo do perímetro florestal da Contenda 1 . Giselda Monteiro 2 Bruno Pereira 3 ; Carla Carrasco 4 ; Joana Carreto 5 Rua da Liberdade, 18 A-das-Lebres 2660-181 Sto. Antão do Tojal/ LRS Palavras-chave: Recursos Cinegéticos, sustentabilidade dos recursos autóctones, Perímetro Florestal da Contenda. Resumo A caça é hoje em dia encarada como uma actividade promotora de desenvolvimento de determinadas áreas onde o processo de despovoamento é uma realidade. No entanto, se a caça não for praticada de uma forma equilibrada e que respeite as regras básicas da conservação e preservação da natureza, pode pôr em causa a sustentabilidade dos recursos autóctones, e assim comprometer o potencial processo de desenvolvimento. A sobreexploração dos recursos cinegéticos constitui uma ameaça não negligenciada no quadro do ordenamento sustentável. Numa sociedade onde cada vez mais se dá importância às questões ambientais e, essencialmente, ao turismo de natureza, as áreas rurais podem aproveitar o potencial cinegético que possuem, de forma a criarem uma maior oferta de actividades de lazer. O exemplo do Perímetro Florestal da Contenda (Moura) ilustra as potencialidades e debilidades da exploração destes recursos. 1 Este trabalho foi realizado no âmbito da cadeira de Analise Biofísica do Território no ano lectivo de 2004-2005, orientado pela Prof. Ana Ramos Pereira 2 965 562 622 [email protected] ; 3 [email protected] 4 [email protected] ; 5 [email protected]

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Recursos Cinegéticos em Portugal: Oportunidades e ameaças. Caso de estudo do perímetro florestal da Contenda1.

Giselda Monteiro2 Bruno Pereira3; Carla Carrasco4; Joana Carreto5

Rua da Liberdade, 18 A-das-Lebres 2660-181 Sto. Antão do Tojal/ LRS Palavras-chave: Recursos Cinegéticos, sustentabilidade dos recursos autóctones, Perímetro Florestal da Contenda.

Resumo

A caça é hoje em dia encarada como uma actividade promotora de

desenvolvimento de determinadas áreas onde o processo de despovoamento é uma

realidade. No entanto, se a caça não for praticada de uma forma equilibrada e que

respeite as regras básicas da conservação e preservação da natureza, pode pôr em causa

a sustentabilidade dos recursos autóctones, e assim comprometer o potencial processo

de desenvolvimento. A sobreexploração dos recursos cinegéticos constitui uma ameaça

não negligenciada no quadro do ordenamento sustentável.

Numa sociedade onde cada vez mais se dá importância às questões ambientais e,

essencialmente, ao turismo de natureza, as áreas rurais podem aproveitar o potencial

cinegético que possuem, de forma a criarem uma maior oferta de actividades de lazer. O

exemplo do Perímetro Florestal da Contenda (Moura) ilustra as potencialidades e

debilidades da exploração destes recursos.

1 Este trabalho foi realizado no âmbito da cadeira de Analise Biofísica do Território no ano lectivo de 2004-2005, orientado pela Prof. Ana Ramos Pereira 2 965 562 622 [email protected]; 3 [email protected] 4 [email protected]; 5 [email protected]

OBJECTIVOS E METODOLOGIA

Pretendeu-se com a realização deste trabalho conhecer a diversidade das espécies

existentes, a sua distribuição no território, bem como o interesse cinegético de cada uma

delas, de forma a avaliar a importância da caça como um recurso e evidenciar os riscos

que a ela se podem associar.

Foi também nosso objectivo saber qual a influência da actividade cinegética no

ordenamento e gestão do território e simultaneamente as perspectivas futuras para esta

actividade. Para melhor percebermos toda a dinâmica deste tema, decidimos estudar o

caso específico do Perímetro Florestal da Contenda, nomeadamente, as características

do território, o tipo de gestão, a caça praticada e quais os impactes na região envolvente.

O estudo dividiu-se em quatro fases distintas.

Numa primeira fase, de âmbito mais descritivo, pretendeu-se analisar uma série de

conceitos relacionados com a caça, disponíveis no D.L. 173/99 de 21-09-1999.

Na segunda fase enunciamos as diversas espécies cinegéticas e respectivo interesse ,

recorrendo ao manual de exame para carta de caçador, publicado pela DGRF e a

publicações da especialidade.

A influência da actividade cinegética no ordenamento e gestão do território, a qual é

feita através de dois regimes distintos, constitui a terceira fase do trabalho. A partir do

perfil geral do caçador é ainda feita uma abordagem sobre os impactes económicos e

ambientais das actividades associadas à caça. Para tal, foram tidos em conta vários

estudos assim como dados estatísticos disponíveis no INE.

Na última fase do trabalho é apresentado o caso de estudo, tendo-se efectuado uma

caracterização dos recursos existentes evidenciando as suas potencialidades e as

debilidades. Para esta análise, o trabalho de campo mostrou-se bastante importante, uma

vez que nos permitiu um contacto directo com a realidade deste território. foram

consultadas outras fontes, nomeadamente artigos disponibilizados pelos Serviços

Florestais de Beja.

1. DISCUSSÃO DE CONCEITOS

Tendo em conta o tema do trabalho, foi necessário conhecer e precisar alguns

conceitos relacionados com os recursos cinegéticos. Para melhor compreensão do

mesmo, de seguida serão apresentadas algumas definições indispensáveis ao

desenvolvimento do trabalho:

ACTO VENATÓRIO: todos os actos que visam capturar, vivo ou morto, qualquer exemplar

de espécies cinegéticas que se encontre em estado de liberdade natural,

nomeadamente a procura, a espera e a perseguição. (Direcção Geral de Recursos

Florestais, 2003, Carta de caçador, manual para exame; Lisboa)

ORDENAMENTO CINEGÉTICO: conjunto de medidas e acções nos domínios da

conservação, fomento e exploração racional dos recursos cinegéticos, com vista a

obter a produção óptima e sustentável, compatível com as potencialidades do meio,

em harmonia com os limites impostos pelos condicionalismos ecológicos,

económicos, sociais e culturais e no respeito pelas convenções internacionais e as

directivas comunitárias transpostas para a legislação portuguesa. (Direcção Geral de

Recursos Florestais, 2003, Carta de caçador, manual para exame; Lisboa)

RECURSOS CINEGÉTICOS: aves e mamíferos terrestres que se encontrem em estado de

liberdade natural, quer os mesmos sejam sedentários no território nacional quer

migrem através deste, ainda que provenientes de processos de reprodução em meio

artificial ou de cativeiro e que figurem na lista de espécies publicada com vista à

regulamentação do Decreto-lei. 173/99 de 21-09-1999, considerando o seu valor

cinegético, e em conformidade com as convenções internacionais e as directivas

comunitárias transpostas para a legislação.(Direcção Geral de Recursos Florestais,

2003, Carta de caçador, manual para exame; Lisboa)

SUSTENTABILIDADE: Em sentido lato, pode ser entendida como o assegurar de bens e

serviços (recursos), físicos e biofísicos necessários ao desenvolvimento dos sistemas

humanos que pode ser mantido perpetuamente sem que se experimente uma

degradação irreversível da integridade e da capacidade de resiliência dos sistemas

biofísicos que os suportam. Aplicando-o ao caso concreto dos recursos cinegéticos,

a sustentabilidade implica uma utilização racional dos recursos para que esta

utilização não ponha em causa o equilíbrio biológico das espécies em concreto nem

a estabilidade dos ecossistemas ambientais na sua generalidade.

2. DIVERSIDADE DOS RECURSOS CINEGÉTICOS EM PORTUGAL

Em Portugal existe uma grande diversidade de recursos cinegéticos, classificados

em duas classes fundamentais: caça maior e caça menor.

A caça maior engloba mamíferos, tais como o veado, gamo, javali e o muflão,

enquanto a classe da caça menor é constituída pelo conjunto de aves sedentárias e

migradoras ou parcialmente migradoras, bem como mamíferos de pequeno porte

(coelho bravo, lebre, raposa, saca-rabos).

No quadro seguinte apresentam-se, com maior pormenor, o estatuto de

conservação e o respectivo interesse cinegético de cada espécie existente no nosso

território. Este mostra, de acordo com o boletim Informação Florestal, que as espécies

com maior interesse cinegético não são vulneráveis.

Quadro 1-

Classificação das espécies cinegéticas, segundo o estatuto de conservação e interesse cinegético.

Estatuto de conservação Interesse cinegético Espécie I.C 6 R 7 N.A 8 V 9 E 10 M 11 R 12

Caça Maior Corço (Capreolus capreolus) Gamo (Cervus dama) Javali (Sus scrofa) Muflão (Ovis ammon) Veado ( Cervus elaphus)

Caça Menor Mamíferos

Coelho ( Oryctolagus ciniculus) Lebre ( Lepus capensis) Raposa ( Vulpes vulpes) Saca- Rabos

Aves Sedentárias Faisão comum Gaio ( Garrulus Glandarius) Gralha preta ( Corvus corone) Melro preto ( Turdus merula) Pega rabuda (Pica pica) Perdiz vermelha ( Alectoris rufa) Pombo da rocha ( Columba livia)

Fonte: Informação Florestal, nº 12

Quadro 1 (cont.)- Classificação das espécies cinegéticas, segundo o estatuto de conservação e interesse cinegético.

Fonte: Informação Florestal, nº 12 6 Insuficientemente conhecido 7 Raro 8 Não Ameaçado 9Vulnerável 10Elevado 11Médio 12Reduzido

Estatuto de conservação Interesse cinegético Espécies I.C 6 R 7 N.A 8 V 9 E 10 M 11 R 12

Migradoras ou parcialmente migradoras Arrabio ( Anas acuta) Codorniz ( Cotumix Cotumix) Estorninho malhado ( Sturnus vulgaris) Frisada ( Anas strepera) Galeirão ( Fulica atra) Galinha d'água ( gallinula chloropus) Galinhola ( Scolopax rusticola) Marrequinha ( Anas crecca) Marreco ( Anas querquedula) Narceja comum ( Gallinago gallinago) Narceja galega ( Lymnocryptes minimus) Pato real ( Anas platyrhynchos) Pato trombeteiro (Anas clypeata) Piadeira ( Anas penelope) Pombo bravo ( Columba oenas) Pombo torcaz ( Columba palambus) Rola comum ( Streptopelia turtur) Rola turca ( Streptopelia decaocto) Tarambola dourada ( Pluvialis apricaria) Tordeia ( Turdus viscivorus) Tordo comum ( Turdus philomelos) Tordo ruivo ( Turdus iliacus) Tordo zornal ( Turdus pilaris) Zarro comum ( Aythya ferina) Zarro- negrinha ( Aythya fuligula)

3. TIPOS DE GESTÃO

O aproveitamento dos recursos cinegéticos é algo que está subjacente à presença

humana começou a merecer uma preocupação crescente sobretudo a partir de 1986,

quando se começou a pensar que a caça devia ser gerida de modo integrado e eficaz.

É a partir desta data que é publicada a Lei da Caça, Decreto-Lei nº 30/86 de 27 de

Agosto de 1986, que estabelece uma série de normas cinegéticas para que esta prática

seja sustentável.

Surge, em paralelo, o regime cinegético geral e o regime cinegético especial que

vão, de certa forma, organizar a prática desta actividade no território nacional.

Assim, o regime geral (ou terreno livre) obedece às leis gerais da caça, isto é,

qualquer caçador pode caçar desde que detenha carta de caçador, mas a gestão é

efectuada sem recorrer a qualquer tipo de plano específico.

O regime especial está abrangido por uma série de planos e normas legais de gestão

que tornam o acesso mais restrito e a exploração mais organizada e sustentável.

Subdivide-se em 4 tipos de Zonas de Caça:

Zonas de Caça Nacionais (ZCN): São constituídas em terrenos cujas características

físicas e biológicas justifiquem ser o Estado o único responsável pela sua administração,

em geral a entidade gestora é a Direcção Geral de Recursos Florestais (D.G.R.F.) e em

casos de áreas protegidas a gestão é partilhada com o Instituto de Conservação da

Natureza (ICN). Tem como objectivo permitir a formação de núcleos de potencialidades

cinegéticas a preservar.

Zonas de Caça Municipais (ZCM):Têm por objectivo proporcionar o exercício

organizado da caça a um maior número possível de caçadores em condições

particularmente acessíveis. O Estado é o principal gestor (DGRF) que pode, no entanto,

delegar nas associações e federações de caçadores, associações de agricultores,

produtores florestais, defesa do ambiente, autarquias locais ou para outras entidades

colectivas integradas.

Zonas de Caça Associativas (ZCA): São constituídas de preferência em terrenos

privados ou do sector cooperativo, desde que haja a concordância das respectivas

entidades titulares e gestoras. Têm como objectivo principal possibilitar que as

associações, clubes ou sociedades de caçadores assegurem o exercício venatório aos

seus sócios, realizando simultaneamente acções de fomento e conservação da fauna.

Zonas de Caça Turísticas (ZCT): Visam privilegiar o aproveitamento económico

dos recursos cinegéticos e a prestação de serviços adequados; a gestão está a cargo de

entidades públicas ou privadas, que tenham como objecto a exploração económica dos

recursos cinegéticos.

Zonas de Caça Militar (ZCM):Estas zonas de caça são criadas em áreas militares

cujas características de ordem física ou biológica permitam a existência de núcleos com

potencialidades cinegéticas e de acordo com as restrições militares e com uma

exploração racional e sustentada dos recursos existentes; apesar de ainda existirem, já

não se encontram consagradas no Decreto-Lei nº 173/99 de 21 de Setembro.

Para facilitar o processo de gestão cinegética no território nacional, a DGRF dividiu

o país em cinco regiões cinegéticas (fig. 1). Se tivermos em conta esta divisão, podemos

observar o diferente zonamento das diversas zonas de caça no território.

Observando as figuras 1 e 2 podemos denotar que na Região I existe o predomínio

das ZCA sobretudo no Nordeste Transmontano e no Noroeste de Portugal.

Na Região II são mais frequentes as ZCA apesar de surgirem as ZCT no interior do

país (áreas de fronteira com a região IV).

A Região III apresenta duas áreas distintas: o Noroeste é caracterizado pelo

predomínio das ZCA enquanto que o Sudeste apresenta uma maior frequência de ZCT.

A Região IV é a que apresenta a maior concentração de zonas de caça, sobretudo no

Alentejo Interior. Nesta região assiste-se a um predomínio das ZCT.

A Região V demarca-se das restantes devido à reduzida densidade de zonas de caça

não se verificando o predomínio de nenhuma delas.

3.1 Os Caçadores

Em Portugal continental estão registados 294.005 caçadores com aptidão legal,

distribuídos pelas 5 regiões cinegéticas (DGRF, 2003). É o distrito de Lisboa que regista

maior número de cartas de caçadores atribuídas (44.333)

Vários estudos efectuados sobre esta temática (Cipriano, 1999 in Palma, 2003)

indicam que, na sua maioria, os caçadores não caçam na sua área de residência (64%),

sendo por isso obrigados a fazer deslocações que podem atingir os 300km.

A classe etária predominante é a dos 41 a 50 anos, com 25%, seguindo-se a faixa

etária dos 51 a 60 anos, com 24%

0 20 40 Km

TIP O S D E ZO NA S DE C AÇ A

asso cia tiva s

tu ris tica s

outra s

m unic ipa is

Segundo dados de 2003 da DGRF, apenas 37% do número total de caçadores caça

numa zona de caça associativa. Desses 37%, a maioria integra apenas uma zona de caça

associativa (81%) e 19% integra mais do que uma zona de caça associativa.

Figura 1 – Regiões ciengética Fonte: www.dgrf.pt

Figura 2 – Distribuição das zonas de caça Fonte: www.dgrf.pt

3.2 Actividades complementares à caça

Associadas à caça existem várias actividades complementares que a ajudam a ser

cada vez mais considerada uma actividade económica.

A caça é geradora de riqueza através do aparecimento de dois tipos de indústria. O

primeiro prende-se com o fornecimento de todo o material necessário para a prática da

actividade cinegética. Seja através das armas e munições, a roupa e outro tipo de

acessórios, a criação de espécies em cativeiro para a “introdução” em zonas de caça

onde elas existam em número reduzido, entre outras.

O segundo tipo de indústria é o que, depois de adquirir a matéria-prima proveniente

da caça, a transforma em produtos economicamente mais rentáveis e os insere no

mercado ou comercializa-os no próprio local de transformação. Inserem-se neste tipo de

indústrias as fábricas de enchidos ou os restaurantes locais especializados em

“gastronomia cinegética”. A comercialização de chouriços de veado, de javali e de

mistura, com marca própria, permitiu já a algumas empresas a conquista de uma cota de

mercado no espaço nacional, fornecendo essencialmente hotéis e restaurantes.

Uma vez que consideramos a caça uma actividade geradora de novas actividades,

esta pode ser também promotora de emprego, quer nas explorações cinegéticas quer nas

pequenas unidades de prestação de serviço e de comércio local.

O turismo pode desempenhar um papel determinante para as regiões isoladas,

sujeitas ao despovoamento, na medida em que pode promover o desenvolvimento de

pequenas empresas vocacionadas com as artes e ofícios locais bem como para vários

serviços de apoio ao turismo.

As características específicas do turismo cinegético levam a que se registem

impactes positivos na economia da região, contribuindo para a dinamização do turismo

regional e local: histórico-cultural, paisagístico e ambiental.

3.3 Impactes da sobre-exploração A caça pode ser encarada como um complemento e até alternativa ao rendimento

das explorações agrícolas, sobretudo nas áreas mais deprimidas. Mas a exploração deste

recurso renovável não pode ser feita de forma desregrada, sob pena de podermos

extinguir as espécies, necessitando pois, que a sua exploração seja sustentável.

A sobre-exploração reflecte-se essencialmente no decréscimo do número de

indivíduos da espécie sobre a qual recai a maior pressão cinegética. Este efeito é tão

mais gravoso, quanto mais rara for a espécie em questão.

Se tivermos em conta a interdependência entre as várias espécies, seja a nível de

habitat ou de alimentação, a sobre-exploração e diminuição dos efectivos de uma

espécie pode pôr em causa a sobrevivência de outras espécies ou o equilíbrio biológico

dos ecossistemas.

O coelho bravo é uma espécie que, devido à caça em excesso, associada a várias

doenças, tem sofrido um declínio da sua população. Esta situação reflecte-se não só na

densidade da espécie no território como também no equilíbrio biológico de espécies

predadoras como é o caso do Lince ibérico e da raposa, uma vez que o coelho-bravo é a

base da cadeia alimentar deste animais.

!R

5

!R

PerímetroFlorestal

da Contenda

Barrancos

St. AleixoRestauração

Moura

0 10 km

ES

PA

NH

A

Figura 3 – Localização do Perímetro Florestal da Contenda

É, pois, fundamental que actividade cinegética seja praticada de forma ordenada,

respeitando o equilíbrio natural das espécies, de forma a perpetuar no tempo a

diversidade biológica.

4. CASO DE ESTUDO: PERIMETRO FLORESTAL DA CONTENDA

4.1 Enquadramento e caracterização geográfica

A Herdade da Contenda está localizada no

Baixo Alentejo (NUTIII), distrito de Beja,

concelho de Moura e, dentro deste, situa-se na

parte mais oriental da freguesia de Santo

Aleixo da Restauração (fig.3). Abrange uma

vasta área dos concelhos de Moura, Aroche e

Encinasola sendo limitada a norte e a poente

por pequenos ribeiros e cursos de água

(ribeiras de Arroio, Murtigão e Pai Joanes) e a

nascente e a sul pela fronteira espanhola, e é

classificada como Património Natural.

Esta herdade apresenta uma área

aproximada de 12.300 hectares, que se divide

entre Portugal (43%) e Espanha (57%). A nível morfológico destacam-se diferenças

acentuadas, apresentando um sector de peneplanície (contenda portuguesa a norte da

Ribeira de Murtigão) e outro sector mais montanhoso (contenda sul localizada a sul da

Ribeira de Murtigão).

Relativamente à forma como o solo é ocupado podemos distinguir duas contendas.

Assim, na Contenda Norte domina o montado de azinho, estando aqui presentes

explorações agro-pecuária, nomeadamente de criação de Bovino Mertolengo, Cabra

Serpentina e também alguns ovinos, constituindo estas explorações uma grande fonte de

rendimento. Na Contenda Sul predomina a floresta ou mato essencialmente dominada

pelo Pinheiro-Bravo, Sobreiros e Pinheiro-Manso, e nela predomina a caça maior.

No que concerne à flora, existe uma grande diversidade de espécies arbustivas e

matos diversificados, do qual se destaca a esteva.

A Contenda apresenta uma fauna riquíssima, encontrando-se 124 espécies de aves,

14 espécies de anfíbios e 17 espécies de répteis. É de salientar que a herdade possui a

maior reserva de veados em Portugal.

4.2 O Perfil do Caçador que vai à Contenda O caçador que se desloca à Contenda para caçar encontra-se inserido na faixa etária

compreendida entre os 35 e os 55 anos. Pertence a uma classe média-alta e tem como

origem a região Norte do país, o que também é elucidativo do facto de a maioria dos

caçadores não caçar junto à sua área de residência.

Pode-se afirmar que a caça praticada na Contenda é uma caça de elite, na medida em

que os preços praticados para se poder caçar são muito elevados.

Exemplo de alguns preços praticados:

Montaria: 500 euros 13

Inscrição para caçar um veado troféu: 500 euros

Por cada troféu (hastes/dentes): 2000 euros

Espera ao javali nocturna: 270 euros

Caça ao muflão: 500 euros 13 Preços tabulados, segundo a D.G.R.F. na época venatória 2006/2007

4.3 Espécies e Tipo de caça praticada na Contenda

As Espécies cinegéticas mais importantes na Contenda são o veado, estando aqui

estabelecida a maior população de veados existente no país. É caçado através da caça de

aproximação ou perseguição.

Na caça ao muflão é utilizado o processo de caça de espera que pode ser nocturna

ou diurna.

Também o javali possui um elevado valor cinegético, a sua caça é feita através das

montarias ou da caça de espera realizada principalmente entre os meses de Outubro e

Janeiro.

4.4 Impactes da Caça na área de Estudo Tal como todas as actividades também a caça têm impactes na área onde é praticada.

No caso do Perímetro Florestal da Contenda os impactes são sobretudo positivos uma

vez que a actividade cinegética aqui desenvolvida contribui para o equilíbrio

quantitativo das espécies existentes e permite também o desenvolvimento económico do

concelho onde está localizado, sendo uma fonte geradora de emprego.

Os recursos devem ser geridos de um modo sustentável para que se renovem ao

longo do tempo. Desde que a actividade cinegética seja acompanhada de uma gestão

minimamente cuidada, esta poderá traduzir-se no crescimento das populações caçadas,

comparativamente à situação quando não existe qualquer tipo de gestão (o chamado

“terreno livre”).

No entanto, assiste-se actualmente, ao risco de exaustão de alguns destas espécies

devido à sua sobre-exploração. A crescente pressão humana sobre o espaço,

proporciona um acelerar da degradação dos recursos, a perda da biodiversidade e à

crescente destruição dos habitats, é por isso necessário orientar e consciencializar

caçadores e proprietários de terrenos com aptidão à pratica da caça, para um conjunto de

medidas que visam a preservação das espécies, nomeadamente a criação de áreas de

refúgio, alimentação e procriação, dispersão e reintroduzições, para que deste modo

possam monitorizar o conjunto das espécies cinegéticas,

Apesar de os dados não serem ainda concludentes, alguns estudos efectuados pelas

entidades competentes apontam para a ocorrência de maiores densidades das espécies

cinegéticas em zonas de regime especial, onde beneficiam da aplicação cuidada de

medidas de ordenamento, numa lógica de conservação. Nesses casos, apesar de haver

captura de indivíduos, esta é controlada e limitada pelos efectivos existentes e pela sua

evolução demográfica, sendo a população beneficiada pelas medidas de melhoramento

que aumentam a sua capacidade de regeneração, permitindo atingir níveis populacionais

superiores ao de uma situação de não intervenção no habitat., como são disso exemplo o

os terrenos livres.

4.5 Potencialidades / Debilidades A Contenda é uma área dotada de grandes potencialidades. Assim, destacam-se a

produção florestal, a produção pecuária, a sua excelente propensão para a actividade

cinegética em particular para a caça maior, a aptidão para a introdução de espécies de

caça menor, a apicultura e a dinamização turística e económica do Concelho.

Assim, é possível afirmar que o Perímetro Florestal da Contenda é um dos locais

mais interessantes a nível cinegético do Sul do País.

Apesar de ser uma área com grandes potencialidades também algumas debilidades

se fazem sentir, nomeadamente relacionadas com a falta de programas turísticos em

complementariedade com a actividade cinegética, com a escassez de alojamento e

restauração na freguesia de Santo Aleixo da Restauração, onde a Contenda está inserida.

Os preços elevados, a falta de apoios financeiros e a falta de funcionários para

fiscalização, pois o facto de pertencer ao Estado condiciona o orçamento da Contenda, a

fluidez de suplementos alimentares e falta de pessoal especializado são outras das

limitações da área de estudo.

Também os caçadores furtivos constituem uma ameaça para a área, sobretudo se

considerarmos a proximidade com a fronteira espanhola.

4.6 Perspectivas Futuras

O município perspectiva o aproveitamento de toda essa área, integrando-a num

plano de ordenamento, desenvolvimento e valorização do concelho em geral, mas em

particular da freguesia de Santo Aleixo da Restauração. Há necessidade de que a

população conheça, sinta e assuma o Perímetro Florestal da Contenda, quer seja através

de acções educativas e pedagógicas, ou também pela prática do recreio e do lazer, que a

Contenda pode proporcionar.

Do ponto de vista venatório futuro, está previsto a recuperação da caça ao coelho

através de um parque de reprodução desta espécie e também da re-introdução de

perdizes e de pombos torcazes.

Pensa-se ainda construir um museu, numa antiga casa de refúgio dos caçadores. Esta

é uma ideia apenas lúdico/informativa, pois o Perímetro Florestal da Contenda é

visitado esporadicamente por estabelecimentos de ensino, investigação e grupos de

caçadores que poderão aproveitar o museu para conhecer um pouco mais da área que

visitam.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em conta a pesquisa efectuada anteriormente, e dada a diversidade de

recursos cinegéticos presentes no território português, pensamos que a caça é e será uma

actividade cada vez mais geradora de emprego, não só devido às várias actividades que

lhe estão directamente associadas mas, sobretudo, através do desenvolvimento de um

role de actividades que indirectamente desta dependem.

Numa sociedade onde cada vez mais se dá importância às questões ambientais e,

essencialmente, ao turismo de natureza, as áreas rurais podem aproveitar o potencial

cinegético que possuem de forma a criarem uma maior oferta de actividades de lazer.

O turismo cinegético tem sido apontado como uma alternativa viável para os

agricultores das regiões deprimidas do Interior e, não sendo uma actividade que possa

substituir na totalidade os rendimentos dos agricultores, pode, no entanto, servir de

actividade complementar.

Porém, é necessário que se criem novas actividades que promovam a actividade

cinegética e cativem cada vez mais pessoas para a sua prática para que esta não se torne

cada vez mais numa actividade envelhecida como acontece com muitas outras no nosso

país dando especial relevo à preservação e conservação das espécies.

Visto não haver uma indústria cinegética bem organizada no nosso país, a caça não

apresenta um peso significativo no sector primário, embora pensemos que deveria ser

encarada cada vez mais como uma fonte de rendimento e um recurso a explorar.

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