O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A...

91
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA MARIA SALETTE SOARES PRADO INOCENCIO CAMARGO DA SILVA ITAJAÍ (SC), maio de 2006.

Transcript of O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A...

Page 1: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

MARIA SALETTE SOARES PRADO INOCENCIO CAMARGO DA SILVA

ITAJAÍ (SC), maio de 2006.

Page 2: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

I

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

MARIA SALETTE SOARES PRADO INOCENCIO CAMARGO DA SILVA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Doutor Zenildo Bodnar

ITAJAÍ(SC),MAIO DE 2006.

Page 3: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

II

AGRADECIMENTOS

A todos que, direta e indiretamente, contribuíram com a minha formação acadêmica e, em particular, na elaboração deste Trabalho, em especial:

A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé se concretiza em atos e ideais de justiça e fraternidade;

A minha mãe que me educou com tanto amor e sacrifício, me ensinando o caminho da justiça e da exatidão. A ela que não mediu esforços, abrindo mão dos seus sonhos par que os meus se realizassem, lutando e sofrendo junto comigo, ou na maioria das vezes por mim. Ela que me amparou emocional e financeiramente, me mostrando a todo momento que eu não estava sozinha, com isso me ajudou e incentivou a ir atrás do meu sonho, pois ela agia a todos os instantes para que eles se viabilizassem. Obrigada mãe por tudo, eu te amo incondicionalmente!

Aos meus sobrinhos Pedro Frederico e Isabella Victória, que após o nascimento deles tive um novo sentido para a vida, em especial ao Pedro Frederico, pois é um ser tão frágil e dócil e já carrega consigo as injustiças cometidas pela sociedade. Aos dois quero agradecer apenas por existirem, vocês me trouxeram novas energias e metas.

A minha irmã Maria Goretti e meu cunhado Terje que contribuíram com a viabilização da disponibilidade da minha mãe em meu favor. A vocês eu agradeço de todo o coração, por esses anos de sacrifícios e renuncias.

A minha irmã Pôpô que da maneira dela me incentiva a continuar, me fazendo enxergar que depois das lutas vêm as vitórias.

Ao meu pai, que de um jeito ou de outro esteve presente na minha formação, contribuindo em sua parcela.

As pessoas especiais que passaram na minha vida, deixando uma grande contribuição na minha formação e desenvolvimento pessoal. Em especial a algumas pessoas queridas, que eu não poderia deixar de expressar a minha eterna gratidão: à Marilda Angioni, Clarice, Leonice, à Professora Henriete, à Professora Rosiléia Clara Werner, ao Mestre Jaime Hillesheim e ao Doutor Valmor Schiochet.

Aos meus amigos e colegas que me ajudaram muito, principalmente nessa etapa final, em especial: à Aninha, Jacson Cruz, Ernandes, Allan, Valério e Tiago.

Page 4: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

III

Aos ótimos Professores que tive durante a minha vida acadêmica, não tendo como citar todos aqui, mas muito obrigada a todos, em especial ao meu orientador Zenildo Bodnar, pelo profissionalismo, paciência e dedicação.

Page 5: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

IV

DEDICATÓRIA

A minha mãe pelo apoio, estímulo, compreensão e confiança;

Ao meu sobrinho e afilhado Pedro Frederico e a minha sobrinha Isabella Victória que me dão

forças para prosseguir.

Page 6: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

V

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

ITAJAÍ (SC), maio de 2006

Maria Salette Soares Prado Inocêncio Camargo da Silva Graduanda

Page 7: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

VI

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Ap. Civ. Apelação Cível

CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916

CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002

Constituição Federal Constituição da República Federativa do Brasil

DNA Ácido desoxirribonucléico

Estatuto da Criança e do Adolescente Lei n. 8.069/90

n. Número

Regula a Investigação de Paternidade dos filhos havidos fora do casamento

Lei n. 8.560/92

STJ Superior Tribunal de Justiça

TJ Tribunal de Justiça

Page 8: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

VII

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Ação negatória de paternidade:

Ação judicial proposta pelo pai, com a finalidade de obterá declaração de

inexistência do vinculo paterno-filial entre ele e o filho nascido de sua esposa na

constância do casamento.

Ação de anulação de registro civil de nascimento:

Ação judicial cujo pedido é o desfazimento, total ou parcial, do ato de registro de

nascimento com fundamento na falsidade ou no erro.

Adoção:

Ato jurídico que se caracteriza pela aceitação de uma criança ou adolescente

como filho por pessoas maiores de dezoito anos independentemente de estado

civil. A adoção estabelece uma relação paterna filial, através de sentença judicial.

Adolescente:

É o que está na adolescência, que compreende a idade entre doze e dezoito

anos1.

Criança:

Pessoas até dezoito anos de idade, que tem assegurados todos os direitos

fundamentais ao homem, que deverão ser respeitados prioritariamente pela

família, pela sociedade e pelo Estado, sob pena de responderem pelos danos

causados.2

Direito ao pai:

1 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. V. 1. São Paulo, 1998. p.115 2 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. V.1. São Paulo, 1998.p. 925

Page 9: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

VIII

È o direito de todo filho de ter um pai, pessoa responsável por sua criação, sua

educação, sua gurda e seu sustento, alguém com quem possa se identificar social

e culturalmente.

Dignidade da pessoa humana:

(...) É um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais

do homem (...).3

Exame de DNA:

Utilizado na identificação de indivíduos, possibilitando a aplicação de teste

conclusivo para o estabelecimento da paternidade biológica, através da

visualização e comparação do material genético doa indivíduos.

Filiação:

Vínculo existente entre pais e filhos. Relação de parentesco consangüíneo em

linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram a vida.4

Filiação Extramatrimonial:

Indica a prole gerada por pessoas não ligadas pelo casamento, isto é, advinda de

relação não matrimonial(...).5

Filiação Matrimonial:

A que se origina na constância do casamento dos pais, ainda que anulado ou

nulo.6

Investigação de paternidade:

Ação ordinária promovida pelo filho, ou seu representante legal, se incapaz,

contra o genitor os seus herdeiros ou legatários, podendo ser cumulada com a de

3 SILVA, José Afonso da. Curso de direito Constitucional positivo. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 1992, p.96. 4 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo, 1998. p.549. 5 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo, 1998. p.550. 6 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo, 1998. p.550

Page 10: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

IX

petição de herança, para obter a declaração judicial de seu respectivo status

familiae e de sua condição de filho.7

Melhor interesse da criança e do adolescente:

É o principio constitucional de proteção integral as crianças8, regulamentado pelo

Estatuto da Criança e do Adolescente, segundo o qual o Estado, a Sociedade, a

Família e, principalmente os pais, têm o dever de proteger e respeitar os

interesses e direitos da criança e do adolescente.

Paternidade afetiva ou socioafetiva:

É a paternidade que não se revela pelo vinculo biológico entre pai e filho, mas

pela atitude dessas pessoas ema em relação à outra, como amor, carinho e

cuidado com a saúde, a educação e o sustento. É algo que se constrói no dia-a-

dia, no convívio freqüente9.

Paternidade biológica:

Vinculo de parentesco consangüíneo entre uma pessoa e aquelas que a

geraram.

Paternidade registral ou jurídica:

Paternidade que consta do termo de registro de nascimento do filho. Por meio

espontâneo ou judicial.

7 DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. São Paulo, 1998. p.904. 8 Considera-se criança a criança e adolescente compreendida até os dezoito anos de idade. 9 FACHIN, Rosana. Da filiação. In: DIAS, Maria Berenice: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord.).

Direito de família e novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.p.59

Page 11: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

X

SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................XI

INTRODUÇÃO......................................................................................................... 1

Capítulo 1

INSTITUTO DE FILIAÇÃO E SEUS ASPECTOS DESTACADOS .........................3

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FILIAÇÃO ........................................................... 3

1.1FILIAÇÃO ...........................................................................................................6

1.2 FILIAÇÃO MATRIMONIAL..............................................................................10

1.2.1 Presunção de Paternidade ................................................................... ......11

1.2.2A Paternidade presumida e sua negação....................................................16

1.3 FILIAÇÃO DECORRENTE DA ADOÇÃO........................................................19

1.4 FILIAÇÃO NÃO MATRIMONIAL......................................................................25

1.4.1 Reconhecimento dos filhos não matrimoniais.........................................26

Capítulo 2

OS MEIOS DE RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMONIAIS E

SEUS EFEITOS JURÍDICOS.................................................................................31

2. OS MEIOS DE RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMONIAIS..... 31

2.1 O Reconhecimento voluntário ......................................................................31

2.1.2 Reconhecimento por escritura pública.....................................................35

2.1.3 Reconhecimento por testamento.............................................................. 36

2.1.4 Reconhecimento por manifestação direta de vontade.............................37

2.2 RECONHECIMENTO JUDICIAL......................................................................38

2.2.1 Ação de investigação de paternidade........................................................40

Page 12: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

11

2.2.2 A prova na ação de investigatória de

paternidade............................................................................................................43

2.2.3 Efeitos e conseqüências do reconhecimento...........................................47

Capítulo 3

A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E AS DIVERGÊNCIAS COM A

PATERNIDADE BIOLÓGICAS...............................................................................51

3. OS MEIOS DE RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMONIAIS ....51

3.1 Caracterização da paternidade socioafetiva ...............................................51

3.2 O DIREITO AO PAI: Paternidade socioafetiva como suprimento da

paternidade biológica .........................................................................................55

3.3. O MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NAS

SOLUÇÕES DOS CONFLITOS DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA ...............61

CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 68

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................................... 72

Page 13: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XII

1. RESUMO

A presente monografia trata dos aspectos da paternidade e

da filiação no Direito Civil Brasileiro, com enfoque na paternidade socioafetiva e os

conflitos com a paternidade biológica, tartando desde a sua evolução histórica,

social e legislativa, chegando ao objeto principal da pesquisa, qual seja, as

complexidades atuais relativas ao tema.

Page 14: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XIII

INTRODUÇÃO

O presente trabalho é parte dos requisitos exigidos pelo

Curso de Direito para obtenção do título de Bacharel em Direito, concedido pela

Universidade do Vale do Itajaí- UNIVALI /SC.

A temática que será abordada neste trabalho versa sobre a

paternidade socioafetiva. O interesse em abordar esse tema surgiu em razão de

vivenciar cotidianamente os problemas enfrentados por crianças que provieram de

relações não matrimoniais e em decorrência desse fato sofreram as

discriminações impostas pela sociedade. Não sabendo as suas mãe na maioria

das vezes adolescentes, como agir perante a constituição da nova família, tendo

consigo a figura de um novo pai, o pai socioafetivo.

O método10 a ser utilizado será o indutivo.

Serão acionadas as técnicas do referente11, da categoria12,

dos conceitos operacionais13, da pesquisa bibliográfica14 e do fichamento15.

10“Método é a forma lógico- comportamental na qual se baseia o pesquisador para investigar, tratar

dados colhidos e relatar os resultados.” PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.104.

11“explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa”.PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.241.

12“palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéias”. PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.229

13“definição estabelecida ou proposta para uma palavra ou expressão, com o propósito de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas”.PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.229.

14“ Técnica de investigação em livros, repertórios, jurisprudencias e coletâneas legais”.PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.229.

15“técnica que tem como principal utilidade otimizar a leitura na pesquisa Científica, mediante a reunião de elementos selecionados pelo pesquisador que registra e/ou resume e/ou analisa de maneira sucinta, uma Obra, um ensaio, uma Tese ou dissertação, um artigo ou uma aula, segundo Referente previamente estabelecido”.PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa

Page 15: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XIV

Esta pesquisa foi desenvolvida tendo como base as

seguintes hipóteses: a) Quais os meios de filiação hoje em vigor, a filiação ainda

diverge entre si, havendo discriminação entre filhos advindos ou não de relação

matrimonial. b)quais os meios de reconhecimento do filhos não matrimoniais, a

quem cabe a legitimidade da ação investigatória de paternidade. c) a paternidade

socioafetiva vem sendo reconhecida, como solucionar esse conflito entre

paternidade afetiva e paternidade biológica?

Para fins de apresentação, o presente estudo foi dividido em

3 capítulos. No primeiro capítulo intitulado “INSTITUTO DE FILIAÇÃO E SEUS

ASPECTOS DESTACADOS”, será apresentado uma reflexão da filiação desde os

tempos antigos, com a sua evolução histórica até os dias atuais com a vigência da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, englobando as suas

formas e subdivisões.

O segundo Capítulo, trata “OS MEIOS DE

RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMÔNIAIS E SEUS EFEITOS

JURÍDICOS”, nessa capítulo foi abordado os meios de reconhecimento voluntário

e o meio de reconhecimento judicial, bem como os seus efeitos e conseqüências.

O terceiro e último capítulo trata, “A PATERNIDADE

SOCIOAFETIVA E AS DIVERGÊNCIAS COM A PATERNIDADE BIOLÓGICA”,

neste capítulo buscou caracterizar a paternidade socioafetiva, assim como buscar

soluções para os conflitos que versam sobre essa forma de paternidade,

observando as correntes doutrinárias e os posicionamentos jurisprudenciais.

Nas considerações finais apresentam-se sínteses de cada

capítulo e demonstra também se as hipóteses da pesquisa foram ou não

confirmadas.

Jurídica- Idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC, 2202, p.229.

Page 16: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XV

Capítulo 1

INSTITUTO DE FILIAÇÃO E SEUS ASPECTOS DESTACADOS

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FILIAÇÃO

Nos primeiros períodos da civilização, os modelos de família

eram diferentes do que se vê atualmente, pois a descendência da espécie

humana é anterior a o Direito. Porém desde que a sociedade passou a ser

regulamentada pelo direito, este passou a demarcar e recriar as situações,

atribuindo-lhes relevância jurídica. Nesse contexto, a família passou a ocupar uma

posição central.

De acordo com Venosa16

Em Roma, o poder do pater exercido sobre a mulher, os filhos e os escravos é quase absoluto. A família como grupo é essencial para a perpetuação do culto familiar. No Direito Romano, assim como no grego, o afeto natural, embora pudesse existir, não era o elo de ligação entre os membros da família. Nem o nascimento nem a afeição foram fundamento da família romana.

No mesmo sentido, Silva Pereira17 aduz que, a filiação não

assentava na consangüinidade, uma vez que a generatio era insuficiente,

desacompanhada do cerimonial religioso, para fazer do recém nascido um

agnado.

16VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: atlas,2003, p.18. 17SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Reconhecimento de Paternidade e seus Efeitos. Rio de

Janeiro: Forense, 1998, p.8.

Page 17: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XVI

Assim sendo, a religião, com seus rituais, foi o primeiro

elemento agregador da família, tornando os laços da consangüinidade, em

principio, secundários, porém com a grande influência da religião a Igreja Católica

influenciou de tal maneira que a partir da idade média , a família passou a ser

reconhecida somente sendo fruto do matrimônio.

Com a grande influência da Igreja Católica, a família romana

era baseada no culto e na religião, desta maneira, o poder paterno era superior a

qualquer outro existente.

Nesse sentido Coulanges18 observa:

(...) Sem dúvida, não foi a religião que criou a família, mas,

seguramente foi a religião lhe deu as regras, daí resultando

receber a família antiga uma constituição muito diferente da que

teria tido se os sentimentos naturais dos homens tivessem sido os

seus únicos causadores.

Nesse período não existia a relação de afeto nas relações

familiares existentes em Roma Antiga, uma vez que a religião foi a norma

constitutiva da família. Com isso observa-se, que em Roma Antiga, a família foi

unida pela religião, a qual deveria ser respeitadas e mantida com o passar dos

anos pelos filhos gerados através dos casamentos religiosos, bem como,

respeitado o poder paterno ou marital.

No Brasil, mesmo sob forte influência da Igreja, nem sempre

o domicilio familiar foi composto por pessoas unidas pelo vínculo matrimonial.

Desde o período colonial, têm-se notícias tanto de relacionamentos sexuais

fortuitos, quanto de entidades familiares sem casamento, consubstanciadas em

18COULANGES, Fustel de. A cidade antiga- estudo sobre o culto, o direito as instituições da

Grécia e de Roma. Tradução de Jonas Camargo Leite e Eduardo Fonseca. São Paulo: Hemus, 2002, p. 34.apud. SILVA, Elza Desidério. Paternidade Biológica e Paternidade Socioafetiva: Complexidades atuais frente ao Direito Civil Brasileiro.Itajaí, 2004. (Grau de Especialista).

Page 18: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XVII

uniões estáveis e duradouras, entre portugueses e índias, constituindo-se destas

uniões vastíssimas proles.

O Cristianismo e o patriarcalismo privilegiavam o casamento,

muito embora a realidade vivenciada fosse em sentido contrário, ou seja as

grandes proles eram originárias de relações advindas de relacionamentos

constituídos sem as chamadas formalidades essenciais.

Nesse período, os filhos gerados na constância do

matrimônio eram considerados legalmente legítimos, e filhos frutos de

relacionamentos não oriundos da celebração do matrimônio, designados como

filhos ilegítimos.

O privilégio a família oriunda do matrimônio era acentuada,

até a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pois a concepção

do legislador era a de que a “ celebração do casamento é componente essencial

da família matrimonializada, concebida esta como comunidade de sangue calcada

no matrimônio, estatuindo a ' família legítima' e fazendo ponte para a legitimidade

dos filhos”.19

A Justificativa desta prevalência da família originária do

casamento decorria de um respeito arraigado a falsos pretensos caracteres morais

constantes no Código Civil de 1916, em que a estabilidade familiar seria

alcançada apenas através do vínculo matrimonial, responsável pelo

preenchimento de seu papel na Sociedade.

Sobre está matéria do Código Civil de 1916, Venosa20

entende:

19ALMEIDA, 2001,p.29. Apud. SILVEIRA, Adriana Bina. Conflitos de Interesses na Investigação da

paternidade biológica: Uma abordagem teórica à luz dos princípios Constitucionais. Itajaí. 2002 20VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: atlas,2003, p. 266.Dissertação.

Page 19: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XVIII

O Código Civil de 1916 centrava suas normas e dava

proeminência á família legítima, isto é, aquela derivada do

casamento, de justas núpcias. Elaborado em época histórica de

valores essencialmente patriarcais e individualistas, o legislador do

inicio do século passado marginalizou a família não provinda do

casamento e simplesmente ignorou direitos dos filhos que

proviessem de relações não matrimôniais, fechando os olhos a

uma situação social que sempre existiu.

Assim, o Código Civil de 1916, continuou seguindo os

modelos anteriores e se contrapôs a realidade existente no país, preferindo

ignorar o dado social, que orientava para a proteção de direitos de terceiros que

não deram causa a situação.

Parafraseando Bevilaqua21, com o evoluir da sociedade, as

barreiras para o reconhecimento de filhos provenientes de relações não

matrimoniais, torna-se moralmente inadmissível a proibição, sendo que não

deram causa à sua situação pessoal, pois a falta foi cometida pelos pais e a

desonra recai sobre os filhos, sem nada terem concorrido para este ato.

A situação dos filhos passou a ter outra forma de ser vista

com o evolução das legislações, sendo que as antigas foram editadas até chegar

à Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, seguida do Estatuto da

Criança e do Adolescente - Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 e da Lei de

Averiguação e Investigação de Paternidade Extramatrimonial – Lei nº 8.560, de 29

de dezembro de 1992. Segui-se, por fim, o Novo Código Civil, Lei nº 10.406,

publicada em 11/01/200, com vigência a partir de 11/01/2003.

1.1 FILIAÇÃO

A grande obra do homem e da mulher são os filhos, os quais

darão seguimento a sua espécie e crenças, para as gerações futuras.

21Bevilaqua, 1977, p. 805.

Page 20: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XIX

Juridicamente , Diniz22 conceitua filiação como sendo, (...) o

vínculo existente entre pais e filhos: vem a ser a relação de parentesco

consangüíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe

deram a vida.

No mesmo sentido Silva23 aduz que:

FILIAÇÃO. Derivado do latim filiatio ( filiação), na terminologia

jurídica é empregado para distinguir a relação de parentesco que

se estabelece entre as pessoas que deram vida a um ente humano

e este.A filiação pois é fundada no fato da procriação, pelo qual se

evidencia o estado de filho, indicativo do vinculo natural ou

consangüíneo, firmado entre gerado e seus progenitores.

Já em outro sentido, Rodrigues24 aduz que “Filiação é a

relação de parentesco consangüíneo, em primeiro grau e em linha reta, que liga

uma pessoa àquelas que a geraram, ou receberam como tivessem gerado”.

Seguindo esse ensinamento verifica-se que com a evolução

da legislação não se pode mais acreditar que a relação de filiação advém apenas

daqueles que conceberam determinado indivíduo, admitindo, também os filhos

adotivos e os filhos sócio-afetivos. A partir deste momento passamos analisar que

atualmente a única distinção que existe quanto a filiação é meramente didática.

Pois com a vigência da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a

discriminação entre filhos matrimoniais e filhos não - matrimoniais foi extinta das

relações jurídico - familiares.

Dispõe o artigo 227, § 6º da Constituição da República

Federativa do Brasil, “ Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por

22DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2002,p. 378. 23SILVA, De Plácido e. Vocabulário.11. ed. Rio de Janeiro: Forense,1991. p. 297. 24RODRIGUEZ, Silvio. Direito civil- Direito de família. V.6. 27. ed. Atul. São Paulo: Saraiva, p.

321.

Page 21: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XX

adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer

designações discriminatórias relativas à filiação.

A preocupação dos legisladores após a Constituição Federal

de 1988, era a de que as leis tratassem a mesma matéria de forma uniforme para

que as mesmas não se confrontassem, evitando assim o prejuízo para os filhos.

Desta maneira posicionou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente, lei nº 8.069,

de 13 de julho de 1990, que trouxe em seus artigos 25,26 e 27 considerável

contribuição. Destaca-se, assim, o conteúdo legal.

Art. 25 Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou por qualquer deles e seus descendentes.

Art. 26 Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais, conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento por testamento, mediante escritura pública ou outro documento público, qualquer que seja a origem da filiação.25

Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.

Art. 27 O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercido contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de justiça.

De nada adiantaria que se garantisse o direito a filiação se

não fossem disponibilizados meios para que fossem efetivados esses direitos,

seguindo esse pensamento o legislativo editou a lei nº 8.560 de dezembro de

1992. Lei esta que regulamenta o reconhecimento voluntário e compulsório da

paternidade extramatrimonial, conferindo ao representante do Ministério Público a

possibilidade de ajuizar a ação investigatória26

25Quando o Estatuto da Criança e do Adolescente entrou em vigor em 13 de julho de 1990,

revogou o disposto no artigo 357 do Código Civil de 1916. 26Artigo 2º, § 4º, da Lei nº 8.560/92.

Page 22: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXI

Dispõe o artigo 1º da Lei nº 8.560/92:

Art. 1º O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I- no registro de nascimento;

II- por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III- por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV- por manifestação expressa e direta perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Neste sentido, se mantiveram os legisladores na elaboração

do Novo Código Civil, ou seja o Civil Vigente, pois no que tange a relação de

filiação garantiu os princípio de igualdade27 e da proibição das designações

discriminatórias.

Assim dispõe o artigo 1.596 do Código Civil Brasileiro:

Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.

Como se observa, o casamento deixou de ser a fonte

exclusiva da família, e não mais existem desigualdades entre os filhos havidos do

casamento ou não, possuindo eles os mesmo direitos e qualificações.

Neste sentido entende Venosa28:

27“ O principio da igualdade fez cessar a distinção discriminatória entre filhos bem nascidos e mal

nascidos, e desapossou o casamento de um de seus efeitos tradicionais no que aos filhos dizia respeito:o estatuto privilegiado da legitimidade.” ( MUNIZ, Francisco José Ferreira. A família na evolução do direito brasileiro. IN: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. Direitos da família e do menor. Belo Horizonte: Del rey, 1993, p.78.

28VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3. ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: atlas,2003, p. 266.

Page 23: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXII

A partir de meados do século XX, porém, nossa legislação, em tendência universal, foi sendo alterada para, timidamente a princípio, serem introduzidos direitos familiares e sucessórios aos filhos provindos das relações extramatrimoniais. A Constituição de 1988 culminou por vedar qualquer qualificação relativa à filiação. Desse modo, a terminologia do Código, filiação legítima, ilegítima e adotiva, de vital importância para o conhecimento do fenômeno, passa a ter conotação e compreensão didática e textual e não mais essencialmente jurídica.

Em sentido meramente didático para estudarmos a questão

da filiação aponta Diniz29 que, sustentando a teoria de que temos que dividir a

filiação como matrimonial e extramatrimonial. Juridicamente, não há o que se fazer

tal distinção, ante o disposto na Constituição Federal de 1988, art. 227, §6º,e nas

leis 8.069/90 e 8.560/92, pois os filhos havidos ou não do matrimônio tem os

mesmos direitos e qualificações.

Assim sendo, sob a égide do preceito constitucional, para

Silva Pereira30, há uma equiparação perfeita de situação jurídica, onde não mais

se cogita a disparidade de tratamento, ao contrário todos são indiscutivelmente

iguais.

Mas ao falar em filiação, não se pode esquecer que muitos

direitos foram garantidos aos filhos, porém muitas deficiências ainda existem

quanto a essa matéria. Pois, mesmo tendo passado por uma série de reformas e

revisões, o Código Civil de 2002, deixou de abordar aspectos importantíssimo,

como o estabelecimento da maternidade e da paternidade face a possibilidade de

utilização da análise do DNA31, a paternidade sócio-afetiva32 e as técnicas de

reprodução medicamente assistidas33.

29DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 381. 30SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Reconhecimento de Paternidade e seus Efeitos. Rio de

Janeiro: Forense, 1998, p.27. 31DNA é a sigla utilizada para designar o ácido desoxirribonucléico, componente das genes,

presente em todas as células do corpo de uma pessoa. O DNA é responsável pela individualização da pessoa em relação das demais.

Page 24: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXIII

Tem-se, então, um raciocínio lógico de que com a vigência

da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a família pode ter

origem matrimonial ou não, sendo que os filhos havidos destas famílias terão

plena igualdade de tratamento.

1.2 FILIAÇÃO MATRIMONIAL

Sendo a filiação matrimônial, há advinda do matrimônio, o

Código Civil de 2002 manteve o sistema de presunção de paternidade do filho da

mulher casada, e reproduz com pequenas alterações os dispositivos referentes a

essa matéria no Código Civil de 1916.

Neste sentido posiciona-se Maria Helena Diniz34, “a filiação

matrimonial é aquela a que se origina na constância do casamento dos pais, ainda

que anulado ou nulo”.

Assim dispõe a legislação em seu artigo 1.561 do Código

Civil:

Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.

§1º Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.

32Paternidade afetiva ou socioafetiva é a paternidade que não se revela pelo vínculo biológico entre

pai e filho, mas pela atitude dessas pessoas uma em relação à outra, como amor, carinho e cuidado com a saúde, a educação e o sustento. É algo que se constrói no dia-a dia, no convívio freqüente (FACHIN, L.1996, p.59.

33Reprodução medicamente assistida, também conhecida como reprodução assistida ou artificial ou procriação artificial, é o “(...) conjunto de técnicas que favorecem a fecundação humana, a partir da manipulação de gametas e embriões, objetivando principalmente combater a infertilidade e propiciando o nascimento de uma nova vida humana.” (RIBEIRO, 2002. p.286).

34DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 381

Page 25: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXIV

§2º Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.

Ainda sobre este assunto, dispõe a legislação em seu artigo

1.617 do Código Civil, “ filiação materna ou paterna pode resultar do casamento

declarado nulo, ainda mesmo sem as condições do putativo.”

Parafraseando Diniz35, a filiação matrimônial, tem origem

com o casamento, válido, nulo ou anulável, ou em alguns casos e dá antes da

vigência do casamento, porém o nascimento ocorre durante a sua vigência e

sendo reconhecido pelos pais.

Contudo não se fala mais de presunção de legitimidade, uma

vez que o princípio constitucional da igualdade entre os filhos aboliu essa

classificação. Ao tratar desse assunto a legislação, trocou o termo legitimidade por

paternidade, ou seja, não se presumem mais legítimos os filhos nascidos de

mulher casada, mas presume-se que a paternidade desses caiba ao marido

daquela.

1.2.1 Presunção de Paternidade

A presunção de que o marido da mãe é o pai, para Fachin36 ,

“(...) liga-se a outra presunção: a de que o filho foi concebido na constância do

casamento. Por isso, a presunção pater is est está ligada à presunção de

concepção”.

Firma o Código Civil, que a presunção é de que, é o pai

aquele que o casamento demonstra, assim presume a lei que o filho da mulher

casada foi gerado por seu marido. Assim até a prova em contrário produzida pelo

mesmo, pai é o marido da mãe.

35DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 382. 36FACHIN, Rosana. FACHIN, Rosana. Da filiação. In: DIAS, Maria Berenice: PEREIRA, Rodrigo da

Cunha (Coord.). Direito de família e novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.p.3

Page 26: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXV

Em virtude desta situação anteriormente mencionada, o

Código Civil dispôs sobre este assunto, caracterizando em seu artigo 1.597 as

situações em que se presumem os filhos concebidos na constância do casamento.

Assim o artigo 1.597 do Código Civil Brasileiro, dispõe:

Artigo 1.597- Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:

I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;

II - nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;

III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;

IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;

V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.

Para presumir a paternidade o legislador estudou os prazos

previstos nos incisos I e II do artigo anteriormente citado, buscando a ciência

médica para estabelecer os períodos mínimo e máximo de gestação para que o

filho nascesse com vida, considerando a data do inicio da sociedade conjugal no

primeiro caso e a do último dia dessa convivência no segundo.

Neste sentido aponta Silvio Rodrigues37, “se a criança

nasceu 6 meses após o casamento, presume-se ser filha do casal, se veio à luz

antes desse prazo, não há qualquer presunção da sua filiação.

37DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p.383. Op. Cit. Silvio Rodrigues,p. 285

Page 27: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXVI

No tocante aos filhos nascidos nos 300 (trezentos) dias

subseqüentes à dissolução da sociedade conjugal, Rodrigues38 , assim leciona:

“ Por outro lado, se o filho nasceu nos dez meses posteriores à dissolução da sociedade conjugal, devia ser tido como legítimo, pois o legislador colheu na ciência a informação de que a gestação humana pode se prolongar por tão dilatado período. De modo que o infante, nascido trezentos dias após a dissolução da sociedade conjugal, poderia ter sido concebido no último dia de vigência do casamento.”

Quanto ao artigo 1.597 em seu inciso III, esse traz dois

problemas; um quanto a terminologia e o outro ético-jurídico. Ou seja, o primeiro

consiste no fato de ter o legislador usado o termo fecundação artificial, que não

deixa claro se o legislador quis referir-se a qualquer técnica de reprodução

medicamente assistida (gênero) ou a somente uma dessas técnicas, qual seja, a

fecundação artificial (espécie)39, pois o termo fecundação artificial é específico da

técnica em que ocorre a fecundação do material genético feminino pelo masculino

in vitro, artificialmente. Por isso teria sido melhor usar o termo genérico para

referir-se também às demais formas, principalmente à inseminação artificial que é

muito mais simples do que a fecundação in vitro.40

E a segunda problemática é a que se refere à possibilidade

da procriação artificial post mortem, pois além de haver o problema do filho ter

38RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: direito de família.27.ed. Atualizado por Francisco josé Cahali.

São Paulo; Saraiva, 2002.v.6.p.324. 39São várias as técnicas de reprodução medicamente assistida. As mais usuais são a inseminação

artificial,a fecundação in vitro e a transferência intratubária de gametas. Na inseminação artificial, introduz- se artificialmente o esperma no útero da mulher e a fecundação acontece naturalmente (RIBEIRO, 2002, p.287). A fecundação in vitro consiste na retirada do sêmem do corpo do homem e do óvulo do corpo da mulher, que será fecundado por aquele material em tubo de ensaio, que recria artificialmente o ambiente do útero, formando o zigoto que, em seguida, será introduzido no útero da mulher (RIBEIRO, 2002, p. 288). Na transferência intratubária de gametas, os materiais genéticos retirados do corpo do homem e da mulher são colocados diretamente nas trompas de de Falópio, onde deverá ocorrer naturalmente a fecundação (LEITE, 1995, p.48-9).

40 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família.v.5. São Paulo: Saraiva, 2002. p.384-386.

Page 28: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXVII

cerceado o direito de conhecer seu pai, há também o problema quanto a sucessão

no caso desse filho ser concebido muito tempo após a morte do seu pai, pois no

caso em que não houvesse a concessão dos direitos sucessórios, como herdeiros

legítimos necessários iria se ferir o principio constitucional da igualdade entre os

filhos.41

Nesse sentido o artigo 1.597 em seu inciso III, não deixou

clara a forma de resolução de determinados assuntos, deixando com que a

doutrina, expresse o posicionamento do legislador em determinadas situações.

No mesmo sentido trata o artigo supra citado, no seu inciso

IV, o qual estabelece a presunção da paternidade em favor dos filhos havidos “ a

qualquer tempo”, com embriões excedentários, decorrentes de concepção

homóloga. Esse dispositivo permite o aproveitamento dos embriões que não foram

utilizados em tentativas anteirores e que estejam congelados, porém não abrange

a matéria de discussão, no que diz respeito a se é licito ou não o descarte desses

embriões, ou se eles poderiam ser doados a casais que não possuem material

genético próprio. Assim como também não trata da possibilidade da mulher

implantar , material genético de seu ex-marido, após o divórcio.

No inciso V do artigo 1.597, estabelece-se a presunção da

paternidade dos filhos havidos por inseminação artificial heteróloga42, desde que

haja prévia autorização do marido. Esse inciso assim como o inciso III do mesmo

artigo apresentam alguns problemas. O primeiro deles, de ordem terminológica,

assim como o inciso mencionado acima, refere-se ao termo técnico utilizado, pois

a inseminação artificial é uma das técnicas de reprodução artificial, ou seja, é

41 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família.v.5. São Paulo: Saraiva, 2002. p.384-386. 42Técnicas de reprodução assistida na forma heteróloga são as técnicas de reprodução assistida em que é necessária a utilização de material genético (espermatozóide e/ou óvulo) de doador, em razão de uma das pessoas que buscaram a assistência médica para ter filhos não possuir material genético capaz de gerar vida, ou porque seu material genético não pode ser usado por razões médicas (estar em tratamento médico ou sofrer de doença que afeta sua fertilidade ou põe em risco a vida ou a saúde do descendente genético) ( LEITE, 1995, p.32).

Page 29: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXVIII

espécie, cujo gênero é a reprodução artificial. Dessa maneira fica o

questionamento se o legislador usou o termo para limitar a possibilidade de

utilização das técnicas sob a forma heteróloga, ou se usou como termo sinônimo

genérico, de reprodução assistida.43

Com base nesses no artigo 1.597 do Código Civil, não se

pode dizer que houve uma regulamentação de fato das técnicas de reprodução

assistida no novo diploma legal, mas que houve apenas a previsão legal de que,

nesses casos, a presunção da paternidade ao marido da mãe.

Ainda se tratando dessa problemática em relação a

presunção de paternidade, o artigo 1.598 aduz:

Art. 1.598. Salvo prova em contrário, se antes, de transcorrido o prazo previsto no inciso II, do artigo 1.523, a mulher contrair novas núpcias e lhe nascer algum filho, este se presume do primeiro marido, se nascido dentro dos trezentos dias, a contar da data de falecimento deste e, do segundo, se o nascimento ocorrer após esse período e já decorrido o prazo a que se refere o inciso I do art. 1.597.

Nesse caso a legislação não trata a problemaática do

conflito quando, os filhos nascem dentro do período dos trezentos dias após a

dissolução do primeiro casamento, caso este que ainda vigora a presunção de

paternidade em relação ao primeiro marido da mãe, mas que também já tenham

transcorrido cento e oitenta dias do inicio da convivência da mãe com o segundo

marido, fato que também já começou a vigorar a presunção de paternidade do

segundo marido.

Diante do exposto, e das problemáticas ao redor desta

temática, ficará mencionado que as formas de presunção de paternidade são as

previstas no artigo 1.597 do Código Civil, todavia essa presunção poderá ser

elidida em casos previstos em lei. Sendo que este será o tema do item que segue.

43 DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família.v.5. São Paulo: Saraiva, 2002. p.386-387.

Page 30: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXIX

1.2.2 A Paternidade presumida e sua negação

Assim como é garantida a presunção da paternidade pelo

marido da mãe, foi garantida também ao homem a oportunidade de poder negar a

paternidade presumida anteriormente.

Posiciona-se Diniz44 sobre está matéria, aludindo:

A presunção de paternidade não é juris et de jure ou absoluta, mas juris tantum ou relativa, no que concerne ao pai, que pode elidi-la provando o contrário. Essa ação de negatória de paternidade é de ordem pessoal, sendo privativa do marido, pois só ele tem legitimatio ad causam para propô-lá ( CC, art. 1.601, caput) a qualquer tempo; mas se, porventura, falecer na pendência da lide, a seus herdeiros será lícito continua-lá. Contudo, o marido não pode contestar a paternidade ao seu alvedrio; terá de mover ação judicial, provando uma das circunstâncias taxativamente enumeradas em lei (CC, arts. 1.599, 1.600, 1.602 e 1.597, V).

Desta forma, entende-se que para se provar a negativa de

paternidade é necessário provar que houve adultério, e que não houve

possibilidade de inseminação artificial, homóloga ou heteróloga, ou que o marido

se encontre acometido de doença grave, que impede as relações sexuais, por ter

ocasionado impotência coeundi absoluta ou que acarretou impotência generandi

absoluta. Neste entendimento analisar-se -à todas as formas elencadas acima,

uma vez que ações desta natureza45, causam alarde e tumultos no seio da família.

Quando se trata da possibilidade de adultério, argumenta

Clóvis Beviláqua46, “Nem mesmo a confissão materna de seu adultério constitui

prova contra a paternidade de seu filho, porque pode ser fruto de alguma

44DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 387/388. 45Entenda-se que ao referir-se o termo” ações desta natureza”, está se tratando da ação negatória

de paternidade. 46Clóvis Beviláqua, Código Civil Comentado, v.2, p.313.

Page 31: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXX

vingança, desespero ou ódio”. Porém complementa Venosa47, “(...) mas não

deixam de ser fortes indícios para permitir a prova científica que apontará com

quase absoluta certeza a paternidade”.

Tendo o marido duvidas, quanto a paternidade será

necessário, que se proponha ação de contestação de paternidade, sendo esta

ação imprescritível. Assim aduz o art 1.601 do Código Civil, “ Cabe ao marido o

direito de contestar a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal

ação imprescritível. Porém esse posicionamento do legislador vêm acarretando

desconforto ao filhos, pois muitos vínculos sócio-afetivos, vem sendo

interrompidos pelo direito imprescritível da ação negatória de paternidade.

Renan Lotufo48, ao comentar a previsão legal de

imprescritibilidade da ação negatória de paternidade prevista no artigo 1.601,

afirma, com razão, que:

(...) houve grande confusão e extensão indevida do que vem sendo posto pela doutrina quanto à imprescritibilidade do direito da personalidade na busca da plena identidade, com o direito à negatória de paternidade.

Pois segundo LOTUFO49, o direito imprescritível e

irrenunciável de buscar o estabelecimento de sua filiação pertencente ao filhos,

sendo que o direito do pai não pode ser igual, pois este, deveria estar sujeito a

decadência. Se o pai registral a qualquer momento puder negar a paternidade,

restará prejudicada a relação jurídica entre pai e filho, sendo que desta decorrem

importantes direitos e deveres pessoais e patrimoniais ambos.

Entende-se que diante da imprescritibilidade do direito do pai

negar a paternidade, o artigo 1.601 necessita ser revisto, já que não é correta a

47Venosa, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com o Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo; Atlas, 2003.p. 275. 48LOTUFO, Renan. Quetões pertinentes à investigação e à negação de paternidade. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Ibdfam:Síntese, v.3,n.11, p.46-58, out-dez.2001 49 Ibidem.

Page 32: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXI

possibilidade de o pai presumido, a qualquer tempo e sem qualquer restrição,

impugnar a paternidade de um filho seu atinge diretamente os direitos do filho, que

seriam privados acima de tudo de sua identidade pessoal. Sendo que tal fato seria

prejudicial, já que depois de anos passados, dificultaria a possibilidade do mesmo

encontrar seu pai biológico, desestabilizando à necessidade social e a proteção ao

direito à filiação.

Neste mesmo sentido entende Rocha50, em seu artigo prazo

para impugnar a paternidade, onde propõe que o prazo para a propositura da ação

de impugnação da paternidade pelo pai presumido deveria ser de quatro anos,

consolidando a relação jurídica paterno- filial, que não poderia ser mais

impugnada, e unificando os prazos relativos ao desfazimento desse vinculo, “(...)

no Brasil, o prazo para a anulação de atos jurídicos é de 4 anos. Este, a meu ver,

seria um prazo razoável, a ser fixado em lei, para a impugnação da paternidade

dos filhos matrimoniais, com a vantagem da uniformização.”

Conceituando a paternidade, é um vinculo que se constitui

uma relação entre pai e filho, não sendo apenas uma relação jurídica da qual

decorrem efeitos, mas é também uma relação vivida fundada na convivência, no

amor, no cuidado, na solidariedade.

Diante do exposto, entende-se que a ação negatória de

paternidade é direito personalíssimo do pai, sendo que diante de seu falecimento

seus herdeiros poderão continuá-la no pólo ativo da demanda judicial, porém para

que a mesma seja proposta é necessário a prova de uma das circunstâncias

taxativamente enumeradas em lei, CC, artigos. 1.599, 1.600, 1.602 e 1.597, V.

Assim a ação negatória de paternidade só reproduz efeitos

quando se trata da negativa de paternidade do pai presumido, ou seja do marido

da mãe. Não podendo ser confundida a revogação com anulação, pois a anulação

poderá ser invocada sempre que o pai presumido fizer prova das circunstâncias

50ROCHA, Marco Túlio Carvalho. Prazo para impugnar a paternidade. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto alegre: Ibdfam: Síntese,v.4,n.13, p.24-41.

Page 33: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXII

necessárias que presumem, ter ele sido induzido a erro no momento do registro. E

no reconhecimento, se a declaração for falsa ou contiver vício de vontade ou

defeito formal, em tese poderia ser anulada ou declarada nula, por ser o

reconhecimento um negócio jurídico, e como tal sujeito à nulidade relativa ou

absoluta, entretanto os tribunais de justiça, não estão julgando procedente, tais

ações se tratando do reconhecimento voluntário,caso que estudaremos

posteriormente.

1.3 FILIAÇÂO DECORRENTE DA ADOÇÂO

A adoção, vêm no ordenamento jurídico brasileiro, com o

intuito de suprir, a falta familiar das crianças e adolescentes que foram

abandonadas por suas famílias biológicas, ou tiveram suas guardas destituídas.

Conforme os ensinamentos de Diniz51, podemos conceituar

adoção como:

Um vinculo de parentesco civil, em linha reta, estabelecendo entre adotante, ou adotantes, e o adotado um liame legal de paternidade e filiação civil. Tal posição de filho será definitiva ou irrevogável, para todos os efeitos legais, uma vez que desliga o adotado de qualquer vinculo com os pais de sangue, salvo os impedimentos para o casamento(CF, art.227, § 5º e 6º), criando verdadeiros laços de parentesco entre adotado e a família adotante (CC, art.1626).

Por criar a adoção um laço parental entre adotado e a família

adotante, ela reger-se-á pela legislação em vigor, disposta na lei n° 8.069, de

13/07/1990, em seus artigos 39 a 52. Como a adoção é matéria estritamente

delicada por tratar da vida de menores, a mesma matéria está disposta no Código

Civil, porém em alguns pontos tem posicionamento diferente da lei supracitada, o

que não acarretou há revogação da lei especial. Neste sentido quando os 51DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, 2002, p. 423/424

Page 34: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXIII

posicionamentos divergirem, se dará enfoque para o ECA, por se tratar de Lei

Especial, que regula, está matéria estando de conformidade com todos os povos

da atualidade e com o Direito Internacional.

A adoção obedecerá sempre o processo judicial, observando

os requisitos legais previstos no Código Civil e na lei nº 8.069/90, sendo que a

adoção reger-se-á sempre pela lei supra citada, não podendo ser feita por

procuração.

O adotando deve contar com no máximo dezoito anos, na

data do pedido, salvo se já estiver sob guarda ou tutela dos adotantes

anteriormente, e nesse caso, mesmo quando o adotando for maior de 18 anos,

sua adoção será assistida pelo Poder Público e dependerá de sentença

constitutiva, uma vez que as ações relativas a adoção são de competência

exclusiva das Varas da Infância e da Juventude.

Sabendo que a adoção atribui a condição de filho ao

adotado, com os mesmo direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-se o

adotado de qualquer vinculo com pais e parentes sanguíneos, salvo os

impedimentos matrimoniais. Outra ressalva que pode-se apontar é, quanto a

quebra do vínculo do adotado com os parentes consangüíneos, pois se um dos

cônjuges adotar o filho do outro não se desligará o adotado da familia

consangüíneo daquele que continuou sendo seu pai ou mãe., ou seja é a

chamada adoção unilateral, pois se dá apenas na linha paterna ou materna.

Assim ensina Tavares,52

O adotado permanece com os vínculos da família do pai ou da mãe consangüíneos e demais parentes. Por outro lado, vincula-se ao pia ou mãe adotante e seus parentes, nessa outra linha, por força da adoção, constituindo-se assim o outro ramo de sua família, que desse modo se completa.

52TAVARES, José de Farias . Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Rio de

Janeiro: Forense, 1995, p.43.

Page 35: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXIV

Observa-se-à agora os requisitos necessários

imprescindíveis para a adoção, mencionados no Artigo 42, do Estatuto da Criança

e do Adolescente.

Dispõe o artigo 42 do ECA:

Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte um anos, independentemente do estado civil.

§ 1º Não podem a dotar os ascendentes, e os irmãos do adotando.

§ 2º A adoção por ambos os cônjuges ou concubinos, poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado vinte e um anos de idade, comprovada a estabilidade da família.

§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.

§ 4º Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar, conjuntamente, contando que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.

Estando os requisitos mencionados acima, decorrer-se-á a

cerca de cada um separadamente.

O Artigo 42, caput, estabelece a adoção por pessoas

maiores de 21 anos, entretanto o artigo 1.618 do Código Civil, estabelece a idade

de 18 anos, nesse caso será adotado a idade de 18 anos, pois segundo os

ensinamentos de Silva Pereira53, “Uma das alterações fundamentais no Novo

Código Civil é a redução da idade para o exercício dos atos da vida civil, fixando

no artigo 5º a idade de 18 anos para a capacidade absoluta(...)”.

Com esse posicionamento, fica claro que se o Estatuto da

criança e do Adolescente condicionou a capacidade civil para adotar, na época na

elaboração da lei citada, contava a maioridade civil prevista no Código Civil de

53SILVA PEREIRA, Tânia. Direito de Família e o Novo Código Civil. 3 ed. Belo Horizonte: Del

Rey, 2003, p.159.

Page 36: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXV

1916 a de 21 anos, com a redução no Código Civil vigente da idade para a

capacidade civil, tem se por entendido que a capacidade para adotar, é da pessoa

maior de 18 anos.

O parágrafo 1º do artigo 42 do ECA, menciona a proibição de

adoção entre irmãos e também entre ascendentes, com isso parece explicar o

óbvio, mas explica TAVARES54:

A primeira vista explicar o § 1º parece, explicar o óbvio: adotar o próprio filho é como chover no molhado(...), mas a proibição se refere a ascendentes, e não apenas aos pais, dá a entender que visa a evitar a chamada adoção à brasileira. Muitas vezes, avós registram como seus filhos, próprios, crianças que são realmente, ou seja, filhos dos seus filhos(..).

Nesse sentido a proibição legal dos adotantes serem

ascendentes ou irmãos dos adotandos, quer evitar que se burle a adoção,

evitando assim os constrangimento da criança no seu registro de nascimento ser

irmã dos pais biológicos.

O §2º do artigo supra citado, não deixa muitas duvidas,

restando claro no corpo da referida lei, que se um dos cônjuges, tiver completado

a maioridade civil, ambos poderão adotar, se comprovarem a estabilidade familiar.

Oportuno salientar que a lei não se referiu a adoção família monoparental, fato

este que está em uso, ou seja, atualmente a adoção unilateral está sendo

legitimada, pois o interesse é o melhor interesse da criança.

Assim ensina Tavares55:

Hoje tem-se de admitir que a família substituta pode ser a família nuclear (composta de pai/mãe/ filhos) como a entidade familiar (CF, art 226, § 4º), um agrupamento humano constituído por um

54TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. Rio

de Janeiro: Forense, 2002, p. 51/52. 55TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. 4 ed. Rio

de Janeiro: Forense, 2002, p. 52.

Page 37: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXVI

dos genitores e seus descendentes, sem a existência de cônjuge ou concubina ou companheiro, e sem que os descendentes tenham indicação do parentesco consangüíneo seus ancestrais de um dos lados de sua arvore genealógica. È a hipótese de família monoparental.

Em conformidade com o exposto, conclui-se que a família

substituta pode ser bilateral ou unilateral.

O parágrafo 3º do artigo 42, que trata da relação da diferença

de idade entre o adotante e o adotado, o Código Civil em seu artigo 1.619,

estabelece a diferença de idade de 16 anos entre eles, porém atualmente não se

recusa a concessão da medida, se não existir a diferença indicada em relação a

um dos requerentes. No caso de um dos adotantes, não possuir 16 anos de

diferença com o adotado, não é motivo de recusa do pedido de adoção.

Se tratando do previsto no § 4º e 5º o legislador, deixou clara

a sua intenção, não necessitando interpretação para está parte da lei.

Ainda sobre matéria de adoção, deve-se deixar claro que, os

atos da adoção produzem efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença que a

deferiu, no caso do adotante falecer no curso do procedimento de adoção, os

efeitos retroagirão à data do óbito.

Destacando os aspectos mais importantes da adoção, deve

enfocar o artigo 48 e 49 da Lei n.º 8.069/90, que trata, o fato da adoção ser

irrevogável, sendo que a morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos

pais naturais, tendo os filhos adotivos os mesmos direitos aos filhos naturais.

Desta maneira esclarece Pereira56:

A adoção é instituto por demais sublime e grandioso para amesquinhar com exegeses restritivas alicerçadas no fechamento egoístico da família consangüínea, em estranhas concepções

56PEREIRA, Sérgio Gischkow. A adoção e o direito intertemporal. Revista dos Tribunais, 1992.

p.169

Page 38: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXVII

sobre meias filiações e no aceitar de uma desigualdade que só provocará traumas psíquicos ao adotado, tudo em nome de interesses menores, porque puramente patrimoniais, ou seja, vinculado à herança.

Por ser a adoção ato tão sublime, como descreve Pereira,

sabe-se que a mesma produz efeitos de ordem pessoal e patrimonial, criando

direitos e obrigações recíprocas. Por este motivo tal ato é regulado pelo poder

judiciário, assim ensina Diniz.57

O Poder Judiciário é que analisará a conveniência ou não, para o adotando, e os motivos que se funda a pretensão dos adotantes, ouvindo sempre que possível, o adotando, levando em conta o parecer do Ministério Público.

Nesse contexto conclui que as competências para julgar as

ações de adoção são da Vara da Infância e da Juventude, sendo que à adoção

dos maiores de 18 anos não dispensam a efetiva assistência do poder público,

nem processo judicial. Já que segundo o artigo 1.625 do Código Civil, determina

que a medida deve constituir efetivo beneficio para o adotando.

Tratando-se de legitimidade, a adoção só se consuma com o

assento da sentença constitutiva, que se perfaz com a sua averbação à margem

do registro de nascimento do adotado, acompanhada da decisão judicial.

Porém ela pode ser inexistente, nula e anulável. Assim

ensina Diniz58,

Apontam-se três casos de inexistência de adoção: a) falta de consentimento do adotado e do adotante; b) falta de objeto, p ex. se o adotante estiver privado do exercício do poder familiar por incapacidade, ausência ou interdição civil; e c) falta de processo judicial com a intervenção do Ministério Público.Será nula a

57DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.427 58DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.435.

Page 39: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXVIII

doação: a)se o adotante não tiver mais d 18 anos, ou a diferença de idade não for de pelo menos 16 anos de idade entre adotado e adotante; b) duas pessoas sem serem marido e mulher, adotarem a mesma pessoa; c) o tutor ou curador não prestou contas; d) por vicio resultante de simulação, ou fraude a lei.São casos de anulabilidade; a) falta de assistência do pai, tutor ou curador, ao consentimento do adotado relativamente incapaz; b) ausência de anuência da pessoa cuja guarda se encontra o menor ou interdito; c) Consentimento manifestado somente pelo adotado relativamente incapaz; d) vicio resultante de erro, dolo, coação, lesão, estado de perigo ou fraude contra credores; e) falta de consentimento do cônjuge ou convivente do adotante e do consorte adotado.

Porém essas ações citadas acima são meramente

declaratórias, não podendo se desconstituir a filiação, já que a mesma é originada

em sentença constitutiva.

Para concluir a matéria sobre adoção, cabe mencionar, que

a adoção efetivada acarreta conseqüências jurídicas de ordem pessoal e

patrimonial, sendo eles dispostos por Diniz59 em, o rompimento automático do

vinculo de parentesco com a família de origem, salvo os impedimentos

matrimoniais, o estabelecimento de verdadeiros laços de parentesco civil entre

adotante e adotado, abrangendo a família do adotante, transferência definitiva e

de pleno direito do poder familiar para o adotante, liberdade razoável em relação à

formação do nome patronímico do adotado, possibilidade de promoção da

interdição e inabilitação do pai ou mãe adotiva pelo adotado e vice-versa, inclusão

do adotante e adotado entre os destinatários de serem testemunhas e entre

aqueles aos quais o juiz tem impedimentos.

1.4 FILIAÇÃO NÃO MATRIMONIAL

A filiação não - matrimonial é a decorrente de relações

extramatrimoniais, ou seja, não são provenientes do casamento não se podendo

59DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.430- 432.

Page 40: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XXXIX

pressupor a coabitação da mãe com algum homem específico. Dessa forma para

que se estabeleça a paternidade e a maternidade, é necessário que a pessoa seja

reconhecida por seu pai e por sua mãe conjunta ou separadamente, assim diz o

artigo 1.607 do Código Civil.

Neste sentido aduz Diniz60:

(...) que os filhos gerados de tal maneira, classificam-se apenas didaticamente:

Naturais, se descenderem de pais entre os quais não haviam nenhum impedimento matrimonial no momento em que foram concebidos;

Espúrios, se oriundos da união de homem e mulher entre os quais havia, por ocasião da concepção, impedimento matrimonial. Assim são espúrios: a) os adulterinos, que nascem de casal impedido de casar em virtude de casamento anterior, resultando de um adultério. O filho adulterino pode resultar de duplo adultério, ou seja, de adulterinidade bilateral, se descender de homem casado e mulher casada; ou ainda, de adulterinidade unilateral, se gerado por homem casado e mulher livre ou solteira, caso em que é adultério a patre, ou por homem livre ou solteiro e mulher casada, sendo então, adulterino a matre, os provenientes de genitor separado não são adulterinos, mas simples naturais(...)

b) os incestuosos, nascidos de homem e de mulher que, ante parentesco natural, civil ou afim, não podiam convolar núpcias à época de sua concepção.”

Após a Constituição Federal de 1988, não há mais o que se

falar em filhos naturais e espúrios mas, em filhos matrimoniais e não matrimoniais,

sendo vedada qualquer discriminação, conforme previsto na legislação em vigor.

1.4.1 Reconhecimento dos filhos não- matrimoniais

60DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.394

Page 41: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XL

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,

aboliu qualquer designação discriminatória ou qualquer diferença atribuída entre

os frutos de um relacionamento. Podendo os filhos concebidos fora da relação

matrimonial serem reconhecidos, por seus pais na forma da lei.

Assim é o posicionamento da legislação, pois o Estatuto da

Criança e do Adolescente ( Lei nº 8.069/90), que prevê o tratamento igualitário

entre os filhos, apresenta a seguinte redação:

Artigo 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas a filiação.

Em conformidade ao Estatuto da Criança e do Adolescente,

dispõe o artigo 1.609 do Código Civil:

Art. 1.609. O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I - no registro do nascimento;

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório;

III - por testamento, ainda que incidentalmente manifestado;

IV - por manifestação direta e expressa perante o juiz, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém.

Tratando dos filhos advindos de relações não matrimoniais o

ato de reconhecimento, é o que estabelece o parentesco entre o pai e a mãe não

casados, segundo entendimento de Venosa61.

Nesse sentido argumenta Venosa62 sobre o reconhecimento

de filiação extramatrimonial:

61Venosa, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com o Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo; Atlas, 2003.p. 292.

Page 42: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLI

que independente da forma em que for feito, deverá ser mencionado no registro civil os nomes do pai e da mãe e doa avós. Ainda no registro civil, não deverá constar qualquer “ detalhe da origem do nascimento”, para que não haja constrangimento para as partes, “salvo requerimento do próprio interessado ou em virtude de determinação judicial.

Ocorre que quando trata-se de reconhecimento podem surgir

alguns problemas, devido ao fato de que o ato do reconhecimento é declaratório,

ou seja ao estabelecer a relação de parentesco entre os progenitores e a prole,

origina-se efeitos jurídicos, fato esse que ocasionam várias demandas em torno da

investigação de paternidade. Quando o reconhecimento é voluntário, inexistem na

priori, conflitos jurídicos, bastando aplicar o princípio da igualdade estabelecido na

Constituição da República Federal do Brasil de 1988.

Oportuno registrar que o parentesco biológico com a mãe

não gera tantos problemas, uma vez que a gravidez e o parto, na maioria das

vezes, se revelam externamente de forma veemente. Por conseqüência, a máxima

latina mater semper certa est63. Porém, o problema geralmente é se estabelecer o

parentesco, quando a relação foi mantida fora do matrimônio, gerando duvidas,

quando não há o reconhecimento voluntário do genitor.

No entanto quando se fala de reconhecimento voluntário,

deve -se ficar claro que ele é irrevogável, ainda que feito em testamento.

Nesse sentido aponta a jurisprudência:

“NEGATÓRIA DE PATERNIDADE- FALSIDADE DE REGISTRO- ALEGAÇÃO DO PRÓPRIO REGISTRANTE- VÍCIO DE CONSENTIMENTO.Uma vez aperfeiçoada, torna-se irretratável a declaração de vontade tendente ao reconhecimento voluntário de filiação. A invalidação dar-se-á apenas em razão de dolo, erro, coação, simulação ou fraude. Se foi o próprio recorrido a pessoa que compareceu ao cartório e fez as declarações de registro, não

62Ibidem, p. 298. 63 Maternidade sempre certa.

Page 43: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLII

pode ela agora procurar anulá-la para beneficiar-se da anulação, principalmente em prejuízo de quem não participou do ato e nem podia participar, por ser menor de idade. ( MINAS GERAIS, TJ, Ap. Civ. n. 117.577/7,j.09.03.1999).”

De mesma forma, se posiciona Veloso64 , ao comentar o

acórdão, cuja ementa está acima reproduzida, constata que:

Extrema injustiça seria permitir o pai pudesse desfazer o estabelecimento da paternidade de um filho, a seu bel - prazer, a todo e qualquer tempo alegando que o fato não corresponde à verdade. Este gesto é reprovável, imoral, sobretudo se o objetivo é fugir do dever de alimentos, ou para o agravante de parentesco num crime, por exemplo.

Nesse mesmo entendimento leciona Silva Pereira65:

O reconhecimento no assento de nascimento pode ser efetuado por ambos os pais, conjuntamente, ou por qualquer deles isolado. Neste último caso, a menção do nome do outro genitor deve constar mediante declaração explicita.

Em razão do reconhecimento de filhos havidos fora do

casamento, ter que ser dar por ambos os pais conjuntamente, ou separadamente,

e necessária a declaração explicita do outro, seria plena injustiça que a

desconstituição se desse de maneira não prevista na lei.

E conclui o referido autor Veloso, “A verdade que a justiça

tem a proclamar não é a que decorre do sangue que corre nas veias, mas dos

sentimentos, dos brados da alma, dos apelos do coração.”

Sobre esse entendimento, pode-se afirmar que se o pai

reconheceu voluntariamente seu filho por uma das formas previstas no artigo

1.609 do Código Civil, não pode revogar o reconhecimento a qualquer momento

64VELOSO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. São Paulo: Malheiros, 1999, p.

73/75 65SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Reconhecimento de Paternidade e seus efeitos. Rio de

Janeiro: Forense, 1998, p. 64

Page 44: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLIII

pois trata-se da desconstituição do vinculo paterno-filial, podendo este acarretar

danos irreparáveis a pessoa do filho.

Sendo o reconhecimento de filhos não - matrimoniais,

matéria que merece superior atenção, por se tratar de relação sentimental, o

legislador manteve como requisito de eficácia do reconhecimento, a necessidade

de consentimento do filho maior. Assim prevê a lei.

Dispõe o artigo 1.614 do Código Civil, “O filho maior não

pode ser reconhecido sem o seu consentimento, e o menor pode impugnar o

reconhecimento, nos quatro anos que seguirem à maioridade, ou à emancipação”.

Embora o reconhecimento seja um negócio jurídico

unilateral, ou seja, para ser válido depende exclusivamente da vontade do agente,

para produzir efeitos é necessário que o reconhecido consinta. O artigo 1.614 do

Código Civil, foi de suma importância, pois com o vinculo paterno-filial

estabelecido os direitos e deveres são recíprocos entre pais e filhos, sendo que o

pai também se beneficiará do direito a alimentos, a herança necessária, depois de

estabelecida juridicamente a paternidade.

De uma certa maneira com o dispositivo acima citado, o

legislador tutelou e deu liberdade para aquele filho que cresceu sem a presença

paterna possa questionar o seu reconhecimento, em determinado momento de

sua vida ao qual ele não sofre mais da carência afetiva, nem financeira, o pai

requer o reconhecimento do filho para que possa usufruir dos direitos

estabelecidos pela lei.

Sabendo que a filiação pode ser matrimonial, não

matrimonial e por adoção, passa-se agora a estudar o instituto do reconhecimento

da filiação, assim como o reconhecimento da filiação e seus efeitos jurídicos.

Page 45: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLIV

CAPÍTULO 2

OS MEIOS DE RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMÔNIAIS E SEUS EFEITOS JURÍDICOS

2. OS MEIOS DE RECONHECIMENTO DOS FILHOS NÃO MATRIMONIAIS

2.1 O RECONHECIMENTO VOLUNTÁRIO

O reconhecimento voluntário é, segundo Antônio Chaves66, o

meio legal do pai, da mãe ou de ambos revelarem espontaneamente o vínculo que

os liga ao filho, outorgando- lhe por essa forma, o status correspondente.

O reconhecimento voluntário ou perfilhação pode ser definido

como o ato pelo qual o pai ou a mãe assumem, observadas as formalidades

legais, a paternidade ou a maternidade de filho havido fora do casamento,

passando a relação biológica a constituir também relação jurídica, gerando efeitos

no campo do direito.

Assim Silva Pereira67 , diferencia que o reconhecimento

66CHAVES, Antonio. Filiação Ilegítima. V 37, p. 290. In: DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito

Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo: Saraiva, p.400.

Page 46: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLV

voluntário da paternidade obedece a exigências especiais, com pertinência a três

elementos essenciais: subjetivo, formal e objetivo.

Sendo que o elemento subjetivo seria o de quem pode

reconhecer a paternidade, e quando pode fazê-lo, o formal seria somente quanto a

qual instrumento previsto, como assento de nascimento, escritura pública ou

testamento. E o requisito objetivo é atribuir o status ao filho.

Nesse sentido cabe estudar os três requisitos do

reconhecimento voluntário.

Sabendo que o requisito subjetivo, tem por fato quem pode

reconhecer a paternidade, ensina Diniz68 que o reconhecimento é ato pessoal dos

genitores, não podendo ser feito por avô ou tutor, sucessores do pai ou herdeiros

do filho.

Porém ensina Silva Pereira69 :

Todavia, será válido se efetuado por procurador, munido de poderes especiais e expressos, porque nesse caso a declaração de vontade já está contida na própria outorga de poderes, de maneira que o mandatário apenas se limita a formalizar o reconhecimento.

Entende-se então que a legislação brasileira permite o

reconhecimento do filho por meio de procuração desde que devidamente

outorgados poderes especiais para tal ato. Sendo que o reconhecimento poderá

se dar antes mesmo do nascimento, ou após a morte do filho, caso deixe

descendentes, uma vez que neste caso cabe a os descendentes do reconhecido

consentirem ou não do ato de reconhecimento.

67SILVA PEREIRA, Caio Mário. Reconhecimento de Paternidade e seus efeitos. Rio de Janeiro:

Forense, 1996, p.62. 68DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva, p.400. 69SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Instituições de direito civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979,

p. 233.

Page 47: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLVI

Incidindo sobre filho maior ou emancipado, o reconhecimento

dependerá de sua aceitação. Ao filho menor, fica reservado o direito de impugnar

o reconhecimento , por meio de ação específica, no prazo de quatro anos,

contados do dia em que atingir a maioridade ou se emancipar.70

Por ser a filiação direito indisponível da pessoa, não pode ser

objeto de transação ou renúncia. O ato de reconhecimento é também

imprescritível, podendo ser praticado a qualquer tempo. Assim ensina Diniz71:

Uma vez declarada a vontade de reconhecer, o ato passa a ser irretratável ou irrevogável, inclusive se feito em testamento, por implicar em confissão de paternidade ou maternidade, apesar de poder vir a ser anulado se inquinado de vício de vontade como erro, coação ou se não observar certas formalidades legais .A irrevogabilidade do reconhecimento não impede, portanto, sua anulação por vício de consentimento ou social. E, pelo artigo 1.604, a irrevogabilidade do reconhecimento não constituirá, ainda, obstáculo á declaração de sua invalidade diante do erro ou de falsidade do registro.

No entanto, o ato de reconhecimento pressupõe capacidade

do declarante, assim o incapaz por menoridade, não tem aptidão para

reconhecer filho. Porém o pai declara a paternidade no assento de nascimento,

mesmo que seja relativamente incapaz não é proibido de o faze-lo para que

cumpra o seu dever natural.

Por ser o reconhecimento um ato declaratório, ele retroage à

data do nascimento ou até mesmo da concepção do reconhecido. Há que se

destacar que é uma conseqüência lógica, haja vista que a filiação existia mesmo

antes do reconhecimento.

O reconhecimento voluntário, poderá se dar por quatro 70 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.400-401.

71DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.401.

Page 48: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLVII

formas diversas, sendo o reconhecimento no próprio termo de nascimento, por

escritura pública, por testamento ou por manifestação direta e expressa perante o

juiz, uma vez que as quatro formas previstas serão apreciadas em seguida.

2.1.1 Reconhecimento no próprio termo de nascimento

O reconhecimento no assento de nascimento pode ser

efetuado por ambos os pais, conjunta ou separadamente. Neste ultimo caso, a

menção do nome do outro genitor somente deve constar mediante declaração

explicita.

O ato do reconhecimento no próprio termo de nascimento, se

dá no caso em que o pai comparece perante oficial do Registro Público e presta

declarações sobre a descendência do registrado, assinando o termo, na presença

de testemunhas. Sendo o pai o declarante a mãe só poderá contestar provando a

falsidade do termo ou das declarações nele contidas.

Ensina Diniz72 no tocante ao registro:

Atualmente, em caso de reconhecimento por registro de nascimento de menor apenas pela mãe, o oficial remeterá ao juiz corregedor permanente do cartório certidão do registro de nascimento e o nome do indigitado pai, devida mente qualificado, para que oficiosamente se verifique a procedência da imputação da paternidade.

Assim está previsto na lei nº 8.069/92 que regula a

investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento, que aduz :

Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o nome e prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim de ser averiguada oficiosamente a procedência da alegação.

72DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.402.

Page 49: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLVIII

§ 1° O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada e mandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai, independente de seu estado civil, para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída.

§ 2° O juiz, quando entender necessário, determinará que a diligência seja realizada em segredo de justiça.

§ 3° No caso do suposto pai confirmar expressamente a paternidade, será lavrado termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do registro, para a devida averbação.

§ 4° Se o suposto pai não atender no prazo de trinta dias, a notificação judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que intente, havendo elementos suficientes, a ação de investigação de paternidade.

§ 5° A iniciativa conferida ao Ministério não impede a quem tenha legítimo interesse de intentar investigação, visando a obter o pretendido reconhecimento da paternidade.

A lei veio para amenizar os conflitos, pois muitas vezes a

mãe resiste, por motivo de foro íntimo, à indicação do pai. No entanto, o direito à

paternidade é da criança ou adolescente, não podendo a mãe decidir a seu

exclusivo critério do exercício dessa faculdade legal. Pois, para a criança, é

importante saber quem é o seu pia, já que poderá eventualmente fazer valer o

dever de assistência material pelo pai, especialmente se um dia sua mãe vier a

faltar.

No momento em que o suposto pai, após ser indicado pela

mãe não comparecer, ou negar a paternidade, o Ministério Público agirá como

substituo processual, defendendo em nome próprio direito alheio por expressa

disposição legal. Trata-se do reconhecimento oficioso, o qual irá se tornar, uma

futura investigação de paternidade, ao qual será estudada posteriormente.

2.1.2 Reconhecimento por escritura pública

Page 50: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XLIX

O reconhecimento por escritura pública ou por escrito

particular arquivado em cartório está previsto na lei 8.560/92, que dispõe:

Art. 1° O reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento é irrevogável e será feito:

I- (...)

II - por escritura pública ou escrito particular, a ser arquivado em cartório(...).

Em se tratando do reconhecimento por escritura pública, vale

ressaltar que segundo Venosa73:

O reconhecimento formalizado em escritura pública para esse fim é irretratável. Não se exige, no entanto, que a escritura tenha o fim precípuo da perfilhação. Esse reconhecimento pode ser incidente em qualquer ato notarial idôneo, como por exemplo, em uma escritura de doação. O que requer é que a declaração seja explícita e inequívoca.

Assim a escritura pública não precisa ser necessariamente

com fim especifico de reconhecimento, o que vale é a vontade declaratória de

paternidade, também assevera Diniz74:

Por escritura pública, que não precisará ter especificamente esse fim, pois o reconhecimento pode dar-se numa escritura pública de compra e venda, bastando que a paternidade seja declarada de modo incidente ou acessório em qualquer ato notarial, assinado pelo declarante pelas testemunhas; não se exigindo nenhum ato público especial. (RT, 301: 255; RF, 136:150; AJ, 97:145).

Ainda cabe ressaltar que o reconhecimento pode ser feito

também por escritura particular arquivada em cartório e autenticada, pois para que

o ato seja válido o único requisito é que a firma do signatário seja reconhecida.

73VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 297. 74DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.403.

Page 51: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

L

2.1.3 Reconhecimento por Testamento

No que tange ao reconhecimento por testamento não

importará se ele será feito por testamento cerrado, público ou particular, ele

obedece os requisitos de declaração e não propriamente os requisitos

testamentários.

Diniz75 assevera que:

Por testamento cerrado, público ou particular, ainda que incidentalmente manifestado e mesmo sendo nulo ou revogado, o reconhecimento nele exarado vale de per si, inclusive se tratar de simples alusão à filiação, a menos que decorra de fato que acarrete sua nulidade, como, p. ex., demência do testador.

Nesse sentido o reconhecimento por testamento é uma das

formas permitidas pela Lei 8.560/92 para o reconhecimento dos filhos havidos fora

do casamento.

Sendo o testamento ato revogável, mas não no que tange ao

reconhecimento de paternidade já que fica implícito a vontade do testador que

quis alterar a ordem vocacional hereditária dele.

Adotado o reconhecimento por quaisquer formas

testamentárias previstas na legislação vigente (o público, o particular, cerrado,

marítimo ou militar). Embora seja temerário o reconhecimento voluntário por

testamento nuncupativo76 que nem sempre reproduzirão com total fidelidade as

palavras do testador, em face do momento em que são colhidas. Porém mesmo a

nulidade parcial não prejudicará a parte válida, quando se tratar de paternidade. 75DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.396. 76Diz-se testamento nuncupativo aquele em que o testador, estando emprenhado em combate ou

ferido confiará sua última vontade a duas testemunhas.

Page 52: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LI

No entanto para o ser testador, se exige capacidade civil e

patrimonial, excluindo assim, o menor de 16 anos, o louco, o surdo de todo

gênero, dessa forma conclui -se que o relativamente incapaz, não poderá

reconhecer paternidade por testamento.

Ainda com o intuito de concluir o tocante ao reconhecimento

por testamento, defini-se que mesmo invalidado o testamento pelo próprio

testador, prevalecerá o reconhecimento , tendo ele sido capaz de fazer o

testamento. E se este não for explícito valerá ao menos como prova ou indício

para a propositura da ação de investigação de paternidade.

2.1.4 Reconhecimento por manifestação direta de vontade

Com a vigência da lei nº 8.560/92, e seus artigos 1º, inciso

IV, 8º, vieram as alterações referentes ao reconhecimento por manifestação direta

de vontade, ou seja anteriormente a essa lei o reconhecimento daqueles filhos

advindos de relação extra- matrimonial, não se dava de maneira tão fácil, ou seja

a referida lei possibilita que o pai que queira reconhecer a paternidade compareça

em qualquer juízo, em qualquer grau de jurisdição, e peça o reconhecimento,

bastando a sua declaração expressa perante o juízo.

Assim já está apontando a jurisprudência:

REGISTRO CIVIL. RETIFICAÇÃO DO ASSENTO DE NASCIMENTO PARA INCLUIR-SE O NOME DO GENITOR. MANISFESTAÇÃO EXPRESSA E DIRETA PERANTE O JUIZ EM PRECEDENTE AÇÃO DE ALIMENTOS. ART. 1º, IV, COMBINADO COM O ART. 8º DA LEI Nº 8.560, DE 29.12.1992. - Cabível a retificação do assento de nascimento para incluir-se o nome do pai, quando havida a manifestação expressa e direta deste, perante o juiz , reconhecendo a paternidade, ainda que o reconhecimento não haja sido o objeto único e principal do ato que o contém. Aplicação dos arts. 1º, IV, e 8º da Lei nº 8.560/92. Recurso especial conhecido e provido. STJ, RESP 119824.

Page 53: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LII

Relator Min. BARROS MONTEIRO. Data do julgamento: 28/05/2002 Orgão Julgador T4 - QUARTA TURMA. - [#1918]

Não havendo nenhuma das hipóteses previstas no artigo 1º

da lei nº 8.560/92, o único meio para que haja o reconhecimento de paternidade

será pelo reconhecimento judicial , que se denomina como reconhecimento

forçado ou involuntário, e se dá em virtude de sentença judicial proferida em ação

de investigação de paternidade, proposta pelo filho ou pelo Ministério Público, em

face do suposto pai, conforme previsão contida na Lei nº 8.560/92. Meio este que

será estudado na seqüência.

2. 2 RECONHECIMENTO JUDICIAL

Antigamente o reconhecimento dos filhos havidos fora do

casamento deveria ser feito por testamento cerrado aprovado antes ou depois do

nascimento do filho, e nessa parte, irrevogável. Com o Código Civil vigente, foi

revogado o disposto no antigo código civil de 1916, em seu artigo 363, que

dispunha pressupostos legais para a propositura da ação de paternidade.

Porém com o advento da Constituição Federal da República

de 1988, ampliou-se o conceito de família. Assim, apenas um dos genitores e os

seus descendentes constituem uma família, impossibilitando os atos

discriminatórios de classificar a prole em legítima, legitimada e ilegítima, a última

dividida em natural, incestuosa ou adulterina. Filhos agora são apenas filhos,

proibidos quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação, sendo que

com atual mudança o reconhecimento judicial da paternidade não delimita mais

limites para o reconhecimento dos filhos.

Nesse sentido foram necessários meios para que se

formalizar o reconhecimento judicial. Assim o Código Civil Brasileiro veio admitir o

reconhecimento judicial, ou seja, postular através de investigação de paternidade

Page 54: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LIII

que lhe seja declarado o “estado de filho”, segundo Neves77 essa previsão se

dará, “ No caso de o pai não reconhece-lo voluntariamente, o filho poderá

coercitivamente exigir essa providência por meio da ação de investigação de

paternidade”

Nesse sentido, Diniz78, assevera que:

O reconhecimento judicial de filho resulta de sentença proferida em ação intentada para esse fim, pelo filho, tendo, portanto, caráter pessoal, embora os herdeiros do filho possam continuá-la. A investigação pode ser ajuizada contra o pai ou a mãe ou contra os dois, desde que se observem os pressupostos legais de admissibilidade de ação, consideradas como presunções de fato.

Para Venosa79, a ação de investigação de paternidade é

aquela que cabe aos filhos contra os pais ou seus herdeiros, para requerer

judicialmente o reconhecimento da filiação.

A ação intentada para o reconhecimento judicial tem caráter

pessoal, porém pode ser intenta por manifestação do Ministério Público, quando a

mãe perante o oficial de registro aponta quem seria o suposto pai, e o mesmo não

comparece em 30 dias, ou comparecendo nega a paternidade.

2.2.1 Ação de investigação de paternidade

A ação de investigação de paternidade tem respaldo jurídico

no Código Civil Brasileiro, em seu artigo 1.606 que dispõe:

77NEVES, Márcia Cristina Ananias. Vademecum do Direito da Família. São Paulo: Jurídica

Brasileira, 1994, p. 827. 78DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.404. 79VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 304-305.

Page 55: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LIV

Artigo 1.606 - A ação de prova de filiação compete ao filho, enquanto viver, passando aos herdeiros, se ele morrer menor ou incapaz.

Parágrafo único. Se iniciada a ação pelo filho, os herdeiros poderão continuá- la, salvo se julgado extinto o processo.

Tendo previsão também no artigo 27 do Estatuto da Criança

e do Adolescente, onde está disposto: “O reconhecimento do estado de filiação é

direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra

os pais ou seus herdeiros, sem nenhuma restrição, observado o segredo de

justiça”.

Ainda em relação à legitimidade das partes na ação de

investigação de paternidade, Diniz80 aduz que:

A investigação de paternidade processa-se mediante ação ordinária promovida pelo filho ( legitimidade ad causam), ou seu representante legal ( legitimidade ad processam), se incapaz (RT,542:260;AASP, 1.927:381) contra o genitor ou seus herdeiros ( TJMG, Adcoas, 1983, n.88.224) ou legatários, podendo ser cumulada com a de petição de herança (RT, 330:281;154:127), e com a de alimentos (EJSTJ, 20:170, 23:151; RSTJ, 96:322 e 113:281) e com a de anulação de registro civil (EJSTJ, 20:169 e 170). Se por ventura, o investigante falecer na pendência da lide, seus herdeiros continuarão a ação, salvo se julgado extinto o processo; (...)mas com o novo Código Civil, desde que faleça, menor ou incapaz, seu representante terá legitimação para tanto (CC, art.1.606 e parágrafo único).

Há ainda, decorrente da Lei nº 8.560/92, à a legitimação

extraordinária ativa, atribuída ao Ministério Público, segundo nos ensina Venosa81:

(...) quando, no procedimento de averiguação inoficiosa, o pai indicado não responde à notificação em 30 dias ou nega a

80DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.405. 81VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 305.

Page 56: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LV

paternidade. Essa lei continua em vigor vigor no que não conflitar, até que sofra adaptação ao novo Código Civil. Se o Ministério Público tiver elementos suficientes, deverá propor ação. Trata-se de substituto processual, conforme o art. 6º do CPC. O Ministério Público propõe a ação de investigação em nome próprio, para defender interesse alheio, ou seja, o do investigante.

Essa atuação ministerial de oficio, independe da vontade da

parte, ela diz respeito a um interesse eminentemente publico, o de estabelecer a

paternidade responsável.

Par os que acreditam que quando se trata de paternidade, o

que se pondera não é o valor social e sim o biológico,a prova mais contundente a

ser produzida numa ação de investigação de paternidade é o exame de DNA82.

Aonde para saber se o individuo é ou não filho biológico de outro, se isola o DNA

de cada indivíduo e depois compará - los.

Neste sentido, Venosa83 assevera que:

Em síntese, a prova técnica coloca em segundo plano a prova das relações sexuais ou qualquer outra em matéria de paternidade. Não se diga, porem que a perícia genética é sistematicamente prova definitiva. Pode haver necessidade de recurso às demais provas permitidas.

No mesmo sentido Rodrigues84, conclui:

Com a descoberta do fator HLA ( Human Leucocytes Antigens), e hoje com o teste de DNA, esse quadro se alterou fundamentalmente, pois aquela prova incerta e duvidosa se tornou precisa e praticamente indiscutível. Ou seja, a prova testemunhal e

82DNA- ácido desoxirribonucléico, encontrado em as células do nosso corpo e responsável pela

individualização de cada pessoa em relação às demais. Cada pessoa possui um DNA único, diferente do das demais, exceto os gêmeos monozigóticos, que se formam a partir de um mesmo óvulo e de um mesmo espermatozóide, portanto têm material genético é idêntico( PENA, 1992, p.66).

83VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3. ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 307.

84RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Volume 6. 27. ed., com anotações sobre o novo Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2002.

Page 57: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LVI

circunstancial, que era ordinariamente aquela em se baseava o julgador, tornou-se totalmente secundária, pois a comparação do sangue dos genitores leva a um grau de probabilidade enorme, tanto para excluir como para incluir a paternidade.

Assim se o investigado alegar não ser o pai, e furtar-se à

realização do exame de DNA, cabe a ele, que é quem alega, o ônus da prova. É

ônus processual da parte a realização de exame genético. O investigado não tem

obrigação de realizar o exame, mas se recusar a fazer, “ opera presunção contra

ele”, segundo os ensinamentos de Venosa85

No mesmo sentido Silva Pereira86 aduz que:

De posse do material, das pessoas cujo relacionamento é pesquisado, o índice do pretenso pai é convertido em uma “ probabilidade de paternidade” fundada nas condições especificas de cada individuo. Realizados os testes em material colhido do filho, do pretenso pai e (quando possível) da mãe, o perito pode, num calculo de probabilidade, chegar a um resultado matemático com confiabilidade superior a 99,9999% ou seja, afirmação absoluta.

Após o exame de DNA que como aludida acima tem um grau

praticamente absoluto de certeza, será prolatada a sentença.

No que se refere a sentença nas ações desta natureza prevê

o artigo 1.616, do Código Civil Brasileiro que:

Artigo 1.616 – A sentença que julgar procedente a ação de investigação produzirá os mesmo efeitos do reconhecimento; mas poderá ordenar que o filho se crie e eduque fora da companhia dos pais ou daquele que lhe contestou essa qualidade.

Sabendo que as ações de investigação de paternidade são

cumuladas com pedido de alimentos, uma vez que a própria lei nº 8.560/92, em 85VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 308. 86SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Reconhecimento de Paternidade e seus efeitos. Rio de

Janeiro: Forense, 1998, p. 116.

Page 58: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LVII

seu artigo 7º, assim dispõe, “Sempre que na sentença de primeiro grau se

reconhecer a paternidade, nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos

do reconhecido que deles necessite”.

Ainda com relação à sentença, Venosa87 pondera que:

A sentença na ação de investigação de paternidade ( ou maternidade) é de carga de eficácia declaratória e tem efeitos erga omnes. Ao reconhecer a paternidade, a sentença declara fato preexistente, qual seja, o nascimento.

Com a descoberta do exame de DNA, os outros meios de

provas existentes em direito estão em plano inferior ao exame de DNA, que

atualmente tem tanto respaldo jurídico devido ao seu alto grau de confiabilidade.

No entanto não podemos deixar de mencionar os outros

meio de provas nas ações de investigação de paternidade.

2.2.2 A prova na ação de investigatória de paternidade

Abordar - se - à agora, os meios de prova utilizados na ação

de investigação de paternidade, porém o fim de abordá-la e analisá-la

especialmente quando o suposto pai se nega a realizar a prova científica, e o

investigante dela prescinde para a comprovação da paternidade, havendo, assim,

a colisão de interesses.

Sabendo que as provas de cunho científico, possuem o

condão de excluir a paternidade alegada e comprovar a probabilidade da filiação

com índices altamente consideráveis à margem de 99% de acerto, não podemos

deixar de considerar o conjunto probatório deverá fazer parte de um todo na ação

investigatória de paternidade, pois além da prova científica, que muitos supostos

pais se negam a produzir, deverão estar as provas indiretas, corroborando no

acerto da decisão a ser proferida pelo juízo competente.

87VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 309.

Page 59: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LVIII

Nesse sentido pode-se mencionar que entre as provas

indiretas, estão: a) a posse de estado de filho; b) a testemunhal; c) o exame

prosopográfico; d) o exame de sangue.

Passamos a discorrer então da posse de estado de filho, que

se caracteriza pelo nome, tratamento e fama.

Assim, aduz Diniz88:

A posse de estado de filho, que é a situação de fato estabelecida entre o pretenso pai e o investigante, capaz de revelar tal parentesco, desde que o filho use o nome do investigado (nomen), receba tratamento como filho (tractatus), e goze na sociedade do conceito de filho do suposto pai (fama).

Tratando-se da prova testemunhal, a mesma deverá ser

acolhida com reserva pelo magistrado, pois não há como se provar com efetiva

certeza as relações sexuais, principalmente por meio de terceiros. O que se pode

informar é a existência de relacionamento entre a mãe biológica e o suposto pai, e

se a data deste relacionamento coincidiu com a concepção.

Outra prova, sem cunho científico, e, portanto, servindo

apenas como meio subsidiária, é o exame prosopográfico, assim aduz Diniz89:

O exame prosopográfico, que consiste na ampliação de fotografias do investigante e do investigado, justapondo-se uma a outra, por cortes longitudinais e transversais, inserindo algumas partes de uma na outra(nariz, olhos, orelha, raiz do cabelo etc.), porém, ainda que prove entre os dois, não autoriza afirmar o vinculo jurídico, pois semelhança não induz relação de parentesco.

88DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.409-410. 89 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.410.

Page 60: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LIX

Porém lembrar que anteriormente às provas médico- legais

genéticas, a aparência fisionômica, a semelhança das funções fisiológicas e

psicológicas do suposto pai com o investigante serviam para designar o fenômeno

da hereditariedade, entendido este, àquela época, como sendo equivalente à

semelhança.

Ainda neste grupo de provas está o exame de sangue, que

serve para excluir a paternidade, caso em que o filho e o pretenso pai,

pertencerem a grupo sanguíneo diverso.

Assim entende Diniz90:

O exame de sangue, adequado para excluir a paternidade se o filho e o pretenso pai pertencerem a diverso grupo sanguíneo; porém, se do mesmo grupo, não se pode proclamar a filiação, mas tão somente a mera possibilidade da relação biológica de paternidade, devido à circunstância de que os tipos sanguíneos e o fator RH, embora transmissíveis hereditariamente, são encontrados idênticos em milhões de pessoas. Assim se o tipo de sangue for o mesmo no investigante e no investigado, isso não quer dizer que sejam parentes, pode ser mera coincidência. O exame hematológico é prova negativa, só serve para excluir a paternidade.

As provas acima citadas ajudam a buscar a verdadeira

filiação do investigando, porém a prova científica torna-se imprescindível para a

verificação da filiação biológica, a qual, juntamente com os demais indícios

produzidos, deverão levar o magistrado ao convencimento, entregando a devida

proteção jurisdicional.

Assim assevera Almeida91, que atualmente, o exame de DNA

é considerado, no meio jurídico, como “prova robusta do vinculo genético”,

constituindo elemento de convicção da hereditariedade biológica.

90DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.410.

Page 61: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LX

Neste sentido observa Almeida92:

A relevância atribuída à prova pericial em DNA é visualizada na jurisprudência em algumas decisões que concluem pela prevalência da autoridade desta prova, face á comprovação científica de seu resultado quanto á verdade da paternidade biológica.

O exame de DNA tem tomado grandes proporções, pois os

filhos advindos de relações não matrimoniais tem buscado a verdade biológica

sobre a sua descendência, uma vez que é o único meio de hábil de buscar essa

verdade real biológica.

Esse é o entendimento de Raskin93, que diz:

É possível através do teste em DNA, afirmar que um individuo é, com certeza, o progenitor de determinada pessoa, inclusive naqueles casos em que membros da família já faleceram, como por exemplo, quando o próprio suposto pai é falecido.

Nesse sentido com a descoberta e a realização do exame de

DNA, as outras formas pra se provar a paternidade ficaram menos consideráveis,

visto que conforme já mencionado, o exame traz um a certeza quase absoluta de

99%, tanto para excluir como para incluir a paternidade aos filhos

extramatrimoniais.

No entanto apesar do exame de DNA apontar com quase

absoluta certeza a paternidade biológica, não podemos esquecer que a posse de

estado de filho é um excelente meio de prova para convencer o juiz não da

paternidade biológica, mas da paternidade socioafetiva, que é caracterizada pela

91ALMEIDA, Maria Cristina. Investigação de paternidade e DNA- aspectos polêmicos. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2001, p.73. 92ALMEIDA, Maria Cristina. Investigação de paternidade e DNA- aspectos polêmicos. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2001, p.75. 93RASKIN, Salmo. Rio de Janeiro: forense, 2000, p.312. In: SILVEIRA, Adriana Bina. Conflitos de

Interesses na Investigação da Paternidade Biológica. Itajaí, 2002. Dissertação.

Page 62: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXI

existência de um relacionamento pessoal entre as partes que só se verifica entre

pessoas que se consideram reciprocamente pai e filho.

Assim será estudado posteriormente o direito dos filhos

socioafetivos, uma vez que eles tem o status de filho, porém no seu registro não

consta o nome patronimico do seu pai socioafetivo.

Dessa forma passamos aos efeitos e conseqüências do

reconhecimento, tanto do reconhecimento voluntário, quanto do judicial, deixando

para estudo posterior somente a filiação socioafetiva.

2.2.3 Efeitos e conseqüências do reconhecimento

Embora o interesse deste trabalho não seja especificamente

os efeitos do reconhecimento da filiação, porém cabe esboçar algumas linhas

sobre o mesmo, pois, na verdade, é em decorrência destes efeitos que

geralmente, se busca o reconhecimento do status filial.

O reconhecimento da filiação, sendo voluntário ou judicial,

estabelecerá uma relação de parentesco entre as partes envolvidas. Esta relação

gerará efeitos de ordem pessoal ligado ao estado da pessoa, ao poder familiar, à

guarda, bem como a efeitos de ordem material, como o dever recíproco alimentar

e direitos sucessórios.

Sabendo que os efeitos produzidos do reconhecimento

voluntário e judicial da filiação, são efeitos ex tunc, uma vez que retroagem “até o

dia do nascimento do filho ou mesmo de sua concepção se isto for de seu

interesse”, assim ensinou Diniz.94

94DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.416.

Page 63: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXII

No mesmo sentido ensina Venosa95, que diz:

O reconhecimento, como já afirmado, tem efeito, tem efeito ex tunc, daí por que seu efeito é declaratório. Sua eficácia é erga omnes, refletindo tanto para os que participaram do ato de reconhecimento, voluntário ou judicial, como em relação a terceiros.

Assim assevera Venosa96:

Ao lado do caráter moral, o reconhecimento de filiação gera efeitos patrimoniais. Os filhos reconhecidos equiparam-se em tudo aos demais, no atual estágio de nosso ordenamento, gozando de direito hereditário, podendo pedir alimentos, pleitear herança e propor ação de nulidade de partilha.

Sendo voluntário ou judicial, o reconhecimento estabelece “o

liame de parentesco entre estes e seus pais, gera importantes efeitos,

principalmente no que diz respeito aos alimentos, à sucessão, ao pátrio poder e à

guarda dos filhos enquanto menores, assim preceitua Rodrigues97

Dessa maneira os efeitos gerados pelo reconhecimento

judicial ou voluntário de paternidade, cedem alguns direitos não somente aos

filhos, mas também aos seus pais. Pode-se mencionar alguns deles, sendo o

primeiro de todos o direito ao nome patronímico e o status familiar, sendo que no

registro de nascimento não constará nada a respeito da sua filiação não ser

proveniente de união matrimonial.

Outro efeito decorrente do reconhecimento da filiação é a

prestação alimentícia. Sendo previsto que desde a sentença de primeiro grau que

reconhecer a paternidade será fixados os alimentos provisionais ou definitivos do

95VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 311. 96VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Familia. Estudo comparado com Código Civil de 1916. 3.

ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo: Atlas, 2003, p. 312. 97RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Volume6. 27 ed., como anotações sobre o novo Código Civil.

São Paulo: Saraiva, 2002, p. 350.

Page 64: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXIII

reconhecido que deles necessite, artigo 7º da Lei nº 8.560, de 29 de dezembro de

1992.

Juridicamente, a expressão alimentos possui um conceito

amplo, compreendendo os recursos necessários à sobrevivência, não só a

alimentação propriamente dita, mas também a habitação, o vestuário, tratamento

médico e dentário, e, em se tratando de menor, instrução e educação.

Porém esse conceito de alimentos garante o dever da

prestação alimentícia tanto de pais para filhos, como dos filhos para os pais.

Assim estabelece o artigo 229, da Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988, que: “ os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e

os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou

enfermidade”.

De forma idêntica os direitos sucessórios são recíprocos,

aonde todos irão herdar na mesma proporção, assim dispõe o artigo 1.596 do

Código Civil, que declara a igualdade de direitos entre filhos havidos ou não na

constância do matrimônio.

E o mais conflituoso dos efeitos do reconhecimento da

filiação, é o referente ao poder familiar, uma vez que as rivalidades pessoais em

muitas vezes acabam por interferir no melhor interesse da criança ou do

adolescente.

Diante disso explica Diniz98

Sujeitar o filho, enquanto menor, ao poder familiar do genitor que o reconheceu, e se ambos o reconheceram, e não houver acordo, sob o poder de quem melhor atender aos interesses do menor(CC, art.1612). Logo, aquele que não for o guardião, terá o direito de visitar o filho e de fiscalizar sua educação. Se o juiz perceber que não lhe será conveniente ficar com o pai, nem com a mãe,

98DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo:

Saraiva,2002, p.417.

Page 65: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXIV

deferirá sua guarda a pessoa idônea, de preferência da familia de qualquer dos genitores. E se houver motivos graves poderá decidir de outro modo, sempre atendendo aos interesses do menor (AJ, 116:9). A sentença que julgar procedente a ação de investigação de paternidade pode ordenar que o filho se crie e eduque fora da companhia dos pais ou daquele que negou esta qualidade (CC, art.1.616, 2ª parte).

Assim o Código Civil teve a preocupação de proteger e

amparar o menor, preocupando-se com o seu melhor interesse, resguardando

direitos e impondo deveres referentes a filiação.

Dessa forma encerra-se toda a parte referente a filiação

desde a sua evolução histórica, exemplificando os tipos de filiação, aos meios de

reconhecimento dela e suas conseqüências. Passando agora ao estudo da

situação dos filhos socioafetivos, já que os mesmos como dito anteriormente tem o

status de filho, no entanto não são reconhecidos em nenhum tipo de filiação até

agora estudada.

Diante de tal posicionamento, quais são os seus direitos?

Para a solução de tal questionamento no capitulo seguinte, investigar-se-á o

melhor interesse da criança e do adolescente na relação paternal.

Como fica a situação do filho que tem um “pai”, pessoa

responsável por sua criação, sua educação, seu sustento, porém não possui laços

biológicos com este referente?

Page 66: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXV

Capítulo 3

A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA E AS DIVERGÊNCIAS COM A PATERNIDADE BIOLÓGICA

3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

Tem-se conhecimento que atualmente o conceito de

paternidade, não está somente voltado para o liame biológico e jurídico. O

conceito de filiação e sua definição no mundo jurídico evoluiu da filiação biológica

até a atual filiação sócio- afetiva que prepondera, atualmente, em nosso

ordenamento.

Nesse sentido, a relação paterno-filial não se esgota na mera

constatação física-laboratorial da hereditariedade sanguínea, há também uma

relação afetiva e cultural. Afirma Lôbo99 que, (...) o afeto não é fruto da biologia.

Os laços de afeto e de solidariedade derivam da convivência e não do sangue”.

No mesmo sentido aduz Pereira100 quando diz:

(...) não basta esse ato101 para instituir a paternidade; é preciso que o pai deseje ser o pai, ou é necessário que ele adote seu filho

99LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi, Teresina, a.

4, n. 41, mai. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527>. Acesso em: 04 mai. 2006.

100PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Familia: uma abordagem psicanalistica. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 162.

101O autor refere-se ao ato de reconhecimento de filho

Page 67: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXVI

biológico. Caso contrário, ele será apenas o pai jurídico que se prestará às obrigações e deveres decorrentes da lei.

Com base nesse ensinamento pode-se perceber que não

basta o vinculo biológico para estabelecer a relação entre pai e filho, pois para que

se estabeleça essa relação é necessário o afeto, o cuidado, entre outros fatores

que somente o amor estabelece.

Assim também esclarece L. Fachin102, ao tratar que pai é

aquele que se comporta como tal e não aquele que simplesmente gerou a criança

ou o adolescente:

(...) a verdadeira paternidade pode também não se explicar apenas na autoria genética da descendência. Pai também é aquele que se revela no comportamento cotidiano, de forma sólida e duradoura, capaz de estreitar os laços da paternidade numa relação psico-afetiva, aquele, enfim que além de poder emprestar seu nome de família, o trata (sic) como sendo verdadeiramente seu filho perante o ambiente social.

Quando dispensado o tratamento ao qual L.Fachin comenta

acima, verifica-se a posse de estado de filho, pois verifica-se presente na relação

paterno-filial elementos importantes para a caracterização da paternidade

socioafetiva, uma vez que a posse do estado de filho na paternidade socioafetiva,

nada mais é do que o reconhecimento público da filiação, a forma ao qual o pai dá

ao seu filho afetivo o status de filho perante a sociedade.

Dessa maneira entende-se para Boeira103, como posse de

estado de filho:

(...) expressão forte e real do parentesco psicológico, a caracterizar a filiação afetiva. Aliás, não há modo mais expressivo de reconhecimento do que um pai tratar o seu filho como tal,

102FACHIN, Luiz Edson. Elementos críticos do direito de família. Rio de Janeiro: Renovar,

1999.p. 169. 103BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de paternidade: posse do estado de filho:

paternidade socioafetiva. Porto alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 54.

Page 68: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXVII

publicamente, dando-lhe proteção e afeto, e sendo assim reputado pelos que, com ele, convivem. E pode-se afirmar que a desbiologização da paternidade tem, na posse de estado de filho, sua aplicação mais evidente.

Ocorre que mesmo estando em uso o estado de filho, e os

direitos dos pais e filhos socioafetivos, esse fato não vêm sendo tratado como

deveria pela legislação civil brasileira. Uma vez a posse de estado de filho não é

apenas prova na falta de registro de nascimento, como presumem algumas

correntes, ela também indica a verdadeira filiação, devendo ser incluída entre as

formas de estabelecimento de paternidade.

A posse de estado de filho se caracteriza pela presença de

três elementos: o nome, o tratamento e a fama, assim se leciona L. Fachin104.

No entanto entendem os doutrinadores que o nome não é

elemento essencial para a caracterização da posse do estado de filho, pois os

elementos mais importantes para a verificação dessa são o tratamento e a

reputação. Pois, nem todos aqueles que tem uma relação afetiva de paternidade,

detém o nome patronímico da família do seu pai, muitos têm apenas a seu favor o

tratamento e a fama.

Nesse sentido se posicionam Oliveira e Muniz105

(...) o primeiro elemento ( a nominatio) é quase sempre de pouca ou nenhuma utilidade: tenha o filho apenas o nome de família da mãe dou também o nome de família do marido desta, não se está aí diante de elemento decisivo. Os outros dois elementos, porém, particularmente o segundo (tractacio) são da maior importância, por permitirem revelar a existência ( ou não) de um vinculo psicológico e social entre filho e suposto pai, isto é, de uma relação pai- filho existencialmente vivida.

104FACHIN, Luiz Edson. Elementos críticos do direito de família. Rio de Janeiro: Renovar,

1999.p. 202. 105OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de direito de

família. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2002. p.50

Page 69: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXVIII

Para que se caracterize a paternidade socioafetiva, além,

dos elementos destacados acima é necessário também que a relação fática, ou

seja o convívio de pais e filhos para a existência da posse referida anteriormente,

sabendo que à analise de cada caso concreto é que demonstrará se houve ou não

a relação socioafetiva.

Ao estudar o instituto da paternidade socioafetiva logo

percebe-se que é o único que realmente supri os deveres de um pai e os direitos

de um filho, pois essa relação é baseada em afeto, sendo que a obrigação é

composta por amor e não simplesmente, pelo fato que o seu descumprimento

acarreta medidas judiciais.

Nesse sentido Moreira Filho106 leciona, que o verdadeiro

vínculo que se trava com os pais é o afetivo e, portanto, pais podem perfeitamente

não ser biológicos.

Em concordância aos posicionamentos acima aduz Welter107:

A paternidade socioafetiva é a única que garante a estabilidade social, edificada no relacionamento diário e afetuoso, formando uma base emocional capaz de lhe assegurar um pleno e diferenciado desenvolvimento como ser humano.

A paternidade afetiva porém é aquela que se exterioriza

pelos fatos, ou seja, os pais educam, zelam , cuidam dos seus filhos, sem que

seja necessário o fator biológico ligando um ao outro.

Em suma a paternidade socioafetiva fundamenta-se,

juridicamente, no Princípio da Proteção Integral da Criança e do Adolescente,

preconizada no artigo 227 da Constituição Federal de 1988.

106MOREIRA FILHO, José Roberto. Direito à identidade genética . Jus Navigandi, Teresina, a. 6,

n. 55, mar. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2744>. Acesso em: 01 mai. 2006.

107WELTER, Belmiro Pedro. Igualdade entre as filiações biológica e socioafetiva. São Paulo: RT, 2003. p 165. apud

Page 70: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXIX

Com relação a este tema, posiciona-se Veloso108, determina:

Quem acolhe, protege, educa, orienta, repreende, veste, alimenta, quem ama e cria uma criança, é pai. Pai de fato,mas, sem dúvida, pai. O “pai de criação” tem posse de estado com relação ao seu “filho de criação”. Há nesta relação uma realidade sociológica e afetiva que o direito tem que enxergar e socorrer. O que cria, o que fica no lugar de pai, tem direitos e deveres para com a criança, observado o que for melhor para os interesses desta.

Para essa nova definição de paternidade, pai ou mãe não é

apenas a pessoa que gera e que tenha vínculo genético com a criança. Ser pai ou

mãe, antes de tudo é ser a pessoa que cria, instrui, ampara, dá amor, carinho,

proteção, educação, dignidade, enfim a pessoa que realmente exerce as funções

próprias de pai ou de mãe em atendimento ao melhor interesse da criança.

De acordo com o conceito de paternidade socioafetiva, o

vínculo biológico nunca poderá se sobrepor à relação existente entre um filho e

um pai. Com a paternidade socioafetiva, foi suprida a lacuna do ordenamento

jurídico, pois este não dava a reposta para todas as perguntas no campo do direito

de família.

3.2 O DIREITO AO PAI: PATERNIDADE SOCIOAFETIVA COMO SUPRIMENTO

DA PATERNIDADE BIOLÓGICA

A paternidade socioafetiva surge como sendo aquela

emergente da construção afetiva, através da convivência diária, do carinho e

cuidados dispensados a determinada pessoa. Nesse sentido buscou-se a família

sociológica, ou seja, aquela unida pelo amor.

Afirma R. Pereira109, que quando o ordenamento jurídico não

108VELOSO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. São Paulo: Malheiros, 1997.p.215. 109PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Família, direitos humanos, psicanálise e inclusão social. Revista

Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Ibdfam: Síntese, v. 4, n.16, jan-mar.2003.p.8.

Page 71: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXX

for suficiente para dar uma resposta, essa deve ser procurada em outros campos

do saber, entre eles,a psicanálise.

Ainda Pereira110 , a partir de seus estudos realizados na obra

Complexos familiares de Jaqcues Lacan, afirma que a familia é, “(...) uma

estruturação psíquica, onde cada um de seus membros ocupa um lugar, uma

função. Lugar do pai, lugar da mãe, lugar dos filhos, sem , entretanto estarem

ligados biologicamente.” E conclui o autor que a ligação biológica é prescindível,

sendo apenas necessário que alguém ocupe o lugar do pai ou da mãe ou do filho.

Não fosse assim, não haveria lugar no ordenamento jurídico para o instituto da

adoção.

É essa estruturação psíquica, a família, que é essencial para

a formação do filho, tornando- o sujeito e capacitando-o para relacionar-se com os

demais membros da sociedade. Assim posicona-se Pereira111. Diante desses

posicionamentos verifica-se que não importa quem exerceu a função de pai, se

foram os ascendentes biológicos ou não, o que importa é que a criança não pode

ter tolhido o direito da presença de um pai na sua formação.

Dessa maneira cabe aqui ressaltar que a para criança pouco

importa o fator biológico, o que é de interesse dela é o afeto que lhe é dado pelos

pais. Diante desse pensamento cabe fazer o relato de um caso aonde fica muito

explicito a questão da paternidade afetiva, onde o que mais é levado em conta é o

fator social.

Fernanda Otoni de Barros, psicóloga judicial em sua obra Do

Direito ao Pai, faz relato de alguns casos que envolvem a questão da paternidade.

Em um deles Barros112 relata o caso de uma menina que foi resgistrada pelo

companheiro da mãe, sem saber que não era o pai biológico, já que foi criada e

110PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de família: uma abordagem psicanalítica. 2 ed. Belo Hor:

Del rey, 1999. p.36. 111Ibidem, p.47. 112BARROS, Fernanda Otoboni de. Do direito ao pai. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p 74-77

Page 72: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXI

educada por ele, uma vez que a mãe trabalhava fora e, às vezes, tinha de passar

os fins de semana na sede da fazenda em que trabalhava como empregada

doméstica. Quando a menina tinha uns cindo anos de idade, o filho do dono da

fazenda decidiu-se casar. A mãe da menina, com medo de que sua filha perdesse

os direitos relativos ao pai biológico, pois ela havia se relacionado sexualmente

com ele à época da concepção da menina, propôs a ação de investigação de

paternidade.

O pai registral, ao tomar conhecimento da conduta da mãe

expulsou a mãe de casa e essa levou consigo a filha. O pai e a filha não se

conformavam com essa situação e manifestavam perante a psicóloga judicial, a

todo momento, a vontade de estarem juntos novamente. O pai pretendia a guarda

da filha, porém o exame de DNA foi feito e demonstrou que a menina era

realmente filha do fazendeiro e o registro de nascimento da criança foi alterado.

Afetando assim a relação já existente, sendo transcrita a fala do pai

Transcrição de Barros113

A justiça já decidiu e não posso fazer mais nada. Sabe, além de cega, a justiça é surda também. Deus sabe o que faz. Eu não quero ver, nem falar, para não sofrer mais. Tô ligando para justificar, se sendo pai era sempre a mãe que ficava com os filhos, eu não sendo o pai para a lei, não tenho nenhuma chance. Pode cancelar o processo, doutora.

A fala da menina também expressava seu sofrimento por

estar longe da família. Barros114 comenta:

Certo dia desenhou um cachorrinho que caiu do ônibus quando voltava com a mãe para casa e nunca mais achou o caminho de volta. Angustiada, dizia que o dono do cachorrinho estava procurando por ele em todos os lugares e que talvez um dia ele o encontrasse se alguém ajudasse, pois o cachorrinho não sabia

113Ibidem, p. 77. 114 BARROS, Fernanda Otoboni de. Do direito ao pai. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p 76.

Page 73: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXII

falar onde estava. A criança nada falava sobre o pai biológico, mas sabia que o juiz podia fazer com que retornasse para casa para encontrar seu pai.

Com a narração desta citada na obra da psicológa judicial,

fica clara a idéia de que quando o direito, não conseguir dirimir os conflitos

gerados em torno da paternidade, é de bom tom se peça o auxilio da psicanálise,

para que se de uma solução para determinadas situações.

Inúmeras vezes quando trata-se da paternidade o direito se

atem precisamente a lei, esquecendo que o direito a paternidade vai muito além

da certidão de nascimento, pois o pai biológico, nem sempre assume o papel de

ser pai, um pai efetivo, zeloso, então conceder o direito a ele, seria estar

preenchendo a lacuna jurídica do registro, porém abrindo a lacuna afetiva, agora

cabe o questionamento, qual dos dois direitos será de maior necessidade para

uma criança?

Em resposta a esse questionamento expõe Leite115

O que a evolução histórico- cultural comprovou, e de forma inquestionável, é que a função paterna está irremediavelmente ligada ao amor de um pai só insuficiente a criar qualquer vínculo de paternidade, incapaz de gerar um a relação paterno-filial.

Assim os laços afetivos são mais importantes do que os

laços biológicos, pois é o que dá base para a formação de uma criança, a

estrutura do seu lar a forma com que ela é criada, dará amparo para o que ela

venha ser no futuro.

O fato de uma criança ter o nome patronímico, ou o mesmo

fator biológico de uma determinada pessoa não significa que a mesma está tendo

a proteção integral prevista pela Constituição da República Federativa do Brasil de

1988, ou seja muitas vezes as crianças estão submetidas ao nome ou fator

biológico de um determinado individuo, porém quem zela, cuida e da o amparo

115LEITE, Eduardo de Oliveira. Grandes temas da atualidade. Rio de Janeiro: Forense, 2000.p.67.

Page 74: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXIII

necessário, é aquele que o reconhece como filho, dando seu nome, o tratamento

e o status ao filho na sociedade, assim, não cabe a justiça tolher esse direito da

criança.

Pode - se buscar esse respaldo jurídico da paternidade

socioafetiva, nos casos em que o pai reconhece como sendo seu filho os filhos da

esposa, porém com uma eventual separação o mesmo requer a desconstituição

do vínculo jurídico de paternidade, ou mesmo a mãe que ao separar-se do seu

marido como forma de punição, intenta com ação investigatória de paternidade,

alegando não ser o seu ex- marido o pai do seu filho, como esse fato fosse

desconhecido para eles.

Dessa maneira já se posicionou o Tribunal do Rio Grande do

Sul, decidindo sobre essa questão da paternidade socioafetiva:

TJRS- PEDIDO DE DESCONSTITUIÇÃO DO VÍNCULO DE PATERNIDADE. DECLARAÇÃO FALSA NO REGISTRO DE FILIAÇÃO. DESCONSTITUIÇÃO DO REGISTRO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. Se o autor reconheceu formalmente o filho da sua esposa, nascido antes do matrimônio, sendo sabedor da inexistência do liame biológico, mas deixando evidenciada a situação de paternidade socioafetiva, não pode pretender a desconsituição do vínculo, pretensão esta que se confunde com pedido de revogação. Vedação dos art. 104 do Código Civil e art. 1º da Lei nº 8.560/92. Recurso desprovido.

O Tribunal de Justiça do Paraná, também decidindo sobre a

questão, assim se manifestou:

1. A ação negatória de paternidade é imprescritível, na esteira do entendinento consagrado na Súmula 149/STF, já que a demanda versa sobre o estado da pessoa, que é emanação do direito da personalidade. 2. No confronto entre a verdade biológica, atestada em exame de DNA, e a verdade socioafetiva, dcorrente da denominada ' adoção à brasileira'(isto é, da situação de um casal ter registrado, com outro nome, menor, como se deles se) e que perdura por quase quarenta anos, há de prevalecer a solução que melhor tutele a dignidade da pessoa humana. 3. A paternidade

Page 75: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXIV

socioafetiva, estando baseada na tendência de personificação do direito civil, vê a família como instrumento de realização do ser humano; aniquilar a pessoa do apelante, apagando-lhe todo o histórico de vida e condição social, em razão de aspectos formais inerentes à irregular 'adoção à brasileira', não tutelaria a dignidade humana, nem faria justiça ao caso concreto, mas, ao contrário, por critérios meramente formais, proteger-se-iam artimanhas, os ilícitos e as negligências em beneficio do próprio apelado

Com a negativa dos Tribunais em concederem a destituição

da paternidade, cumpri-se a teoria do melhor interesse da criança, já que é certo

que a criança deva ser protegida em razão de sua dependência estrutural.

Focando os estudos para a teoria do melhor interesse da

criança, nota-se que as corrente doutrinárias defendem a investigação de

paternidade e de maternidade, quando o intuito for zelar pelos direitos da criança

ou adolescente.

Então com relação à investigação de paternidade ou

maternidade, leciona Welter116:

(...) ao filho e aos pais socioafetivos deve ser permitida investigação de paternidade e maternidade biológica, mas tão- só pra três efeitos jurídicos: a) por necessidade psicológica no conhecer (ser) a origem gen´tica; b) para preservar os impedimentos do matrimoniais; c) para manter a saúde e a vida do filho e dos pais biológicos, em caso de grave doença genética.

Desta maneira verifica-se, que a investigação de paternidade

ou maternidade em relação ao filho socioafetivo será aceita em casos de extrema

necessidade, quando o interesse do menor estiver sendo amparado.

A paternidade socioafetiva está diretamente ligada ao

princípio gênero da dignidade humana, desta forma não pode ser desconsiderada,

pois se estaria ferindo um principio constitucional.

116WELTER, Belmiro Pedro. Igualdade entre as filiações biológicas e socioafetiva. São Paulo: RT,

2003. p 197. apud mono

Page 76: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXV

Assim assevera Lôbo117:

(...) o principio da afetividade é espécie do princípio gênero da dignidade da pessoa humana e decorre de três principíos, a saber: o da igualdade entre os filhos, qualquer que seja a espécie de filiação(artigo 226, parágrafo 6º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988); a adoção como filiação fundada na opção e com direitos iguais relativamente às demais espécies de filiação( artigo 227, parágrafos 5º e 6º, da Constituição Federal de 1988); e a proteção constitucional à entidade familiar, qualquer que seja sua configuração (artigo 226, caput, da Constituição Federal de 1988).

Com os ensinamentos mencionados até o momento verifica-

se que a paternidade afetiva tem tomado grandes proporções pelo o fato de ter

seu respaldo no Princípio da proteção integral da criança e do adolescente, uma

vez que não se pode permitir que tal princípio seja violado.

Se um pai deixou o vinculo socioafetivo se consolidar entre

ele e aquele que ele tomou como filho, sendo seu descendente biológico ou não,

não é certo que algum tempo depois venha negar essa paternidade pela falta de

vínculo biológico.

3.3 O MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NAS

SOLUÇÕES DOS CONFLITOS DA PATERNIDADE SOCIO AFETIVA.

O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente,

vem tendo grandes proporções, como a solução dos conflitos existentes na

paternidade socioafetiva.

Os artigos 4º e 6º, do Estatuto da criança e do adolescente

117LÔBO, Paulo Luiz Netto. Principio jurídico da afetividade na filiação. In: Congresso Brasileiro de

Direito de Família, II, 1999, Belo Horizonte. Anais do II Congresso Brasileiro de Direito de Família- A família na travessia do milênio. Belo Horizonte: Del Rey: Ibdfam: OAB-MG, 2000. p.251.

Page 77: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXVI

(Lei nº 8.069/90) consagram o princípio do melhor interesse.

O artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe:

Artigo 4º - É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referntes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único – A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais e públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos as áreas relacionadas com aproteção à infância e à juventude.

Para maior efetividade ao disposto, teve o legislador, o

cuidado de determinar que sua aplicação levaria em consideração não só os

aspectos materiais, mas também os fins sociais a que se destinam.

Assim dispôs o artigo 6º da lei supra citada:

Artigo 6º- Na interpretação desta Lei levar-se- ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoa em desenvolvimento.

Assim, segundo a legislação é dever de todos dar absoluta

prioridade a criança aos direitos da criança, considerando a condição peculiar de

cada criança e adolescente. De essa forma respeitar a paternidade socioafetiva,

não tirando a base familiar de cada criança, não questionando a paternidade,

Page 78: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXVII

quando ela já está socialmente ou até mesmo juridicamente estabelecida, seria

cumprir a legislação,

Leciona a Professora Queiroz118

: "Assim, o novo

comportamento cultural, no tocante à paternidade, insere o mundo moderno em

outro contexto social, em que a função de pai deve ser exercida no maior

interesse da criança, sem que se atenha à própria pessoa em exercício da referida

função".

Esse também é o entendimento de Moreira Filho119 quando

diz:

Não apenas pelo vínculo biológico é que se estabelece a filiação, (...) mas principalmente em face do vínculo socioafetivo que atende mais ao principio do melhor interesse da criança, da dignidade da pessoa humana e também da paternidade.

De acordo com o amparo que a paternidade socioafetiva

deve ter também se posiciona Villela120, quando diz que, “ o elemento afetivo está

acima do biológico quanto se trata de filiação, o juiz deve ser muito cuidadoso ao

julgar uma ação relativa ao estado de filiação quando existe um relacionamento

fundado no amor, pois o melhor interesse da criança e do adolescente está no

lugar em que eles encontrem amor e afeto, completa Furtado121.

Porém Villela, ao posicionar-se pelo cuidado no julgamento

aonde tramitam ações envolvendo menores, principalmente no tocante a

paternidade, baseou-se na Convenção Internacional dos Direitos da criança e do

118 QUEIROZ, Juliane Fernandes. Paternidade : aspectos jurídicos e técnicas de inseminação artificial. Doutrina e Jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.p.52 119 MOREIRA FILHO, José Roberto. Direito à identidade genética . Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 55, mar. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2744>. Acesso em: 09 mai. 2006. 120VILLELA, João Baptista. O modelo constitucional da filiação: verdade & supertições. Revista

Brasileira de Direito de Famíla 121FURTADO, Alessandra Morais alves de Souza e. Paternidade biológica x paternidade declarada:

quando a verdade vem à tona. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre : Ibdfam: Síntese, v.4, n 13, abr- jun.2002. p. 22

Page 79: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXVIII

Adolescente, que foi ratificado no Brasil através do Decreto 99.710/90, que dispõe:

Artigo 31 – Todas as ações relativas ás crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem -estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o interesse maior da criança.

Nesse sentido falar em melhor interesse da criança e do

adolescente em termos de filiação não significa fazer coincidir a paternidade

jurídica com a paternidade biológica, pois nem sempre o melhor pai é aquele que

possui o mesmo fator genético.

A genética não garante a melhor paternidade ou

maternidade, pois há aqueles que não agem de acordo com a paternidade

biológica responsável, não se importando com os filhos, não os visitando,

inexistindo qualquer relação afetiva entre eles e o filho.

Nesse sentido estão se posicionando os Tribunais no intuito

de dirimir os conflitos relativos a paternidade. Assim posicionou-se o Tribunal de

Justiça de Santa Catarina:

Ação Declaratória Negativa de Paternidade - Reconhecimento da mesma através do Registro de Nascimento - Ato jurídico irrevogável - Inteligência da Lei nº 8.560/92 - Vindicação contrária ao que consta do Registro Civil - Inteligência do art. 348 do C.C. - Impossibilidade jurídica do pedido - Extinção do processo - Sentença confirmada - Apelo improvido. O registro civil prova o nascimento e estabelece presunção de verdade em favor de suas declarações. Ninguém será admitido a impugnar-lhe a veracidade; seu conteúdo impregna-se de fé pública, a menos que tenha ocorrido erro ou falsidade do registro (TJSC, apelação cível nº 96.005701-3, de Pinhalzinho, Rel. Des. Cláudio Barreto Dutra).

No mesmo sentido posicionou-se o Tribunal de Justiça de

São Paulo:

NEGATÓRIA DE PATERNIDADE - Reconhecimento voluntário - Anulação - Inadmissibilidade - Pai não biológico - Irrelevância -

Page 80: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXIX

Vício de consentimento não alegado - Irrevogabilidade do ato - Recurso não provido - Voto vencido. É irrevogável o reconhecimento voluntário de paternidade se não eivado do vício de vontade como erro, coação ou inobservância de certas formalidades legais (Ap. Cív. 274.482-1 - TJSP, j. 11.6.96, Rel. Des Alfredo Migliore - JTJ, v. 185, p. 157).

Nesse sentido tem se posicionado a maioria dos Tribunais,

uma vez que o interesse maior do judiciário é o dever a proteção da criança e do

adolescente, sabendo-se que os seus interesses devem preponderar ao demais.

Moreira Filho leciona ainda que:

Ser pai ou mãe atualmente, não é apenas ser a pessoa que gera ou que tem vínculo genético com a criança. É antes disso, a pessoa que cria, que ampara, que dá amor, carinho, educação, dignidade, ou seja, a pessoa que realmente exerce a função de pai ou de mãe em atendimento ao melhor interesse da criança.

Por isso quando se assume a paternidade espontaneamente,

principalmente a socioafetiva, reconhecendo como seu filho de companheiro, tem

que estar ciente que é ato irretratável, sendo que se eventualmente ocorrer uma

separação, não terá como abdicar essa paternidade.

Assim posicionou-se o Des. José Volpato de Souza122, no

corpo do texto da apelação cível n. 2002.018546-4, de Caçador.

(...) o autor assumiu espontaneamente a paternidade do réu

desde tenra idade. E depois de se separar da sua mãe resolveu livrar-se desse

filho como forma de aliviar suas despesas, já que passa por dificuldades

econômicas. Ora, em que mundo estamos? Que pouco caso com que existe de

mais sério! Veja-se que a paternidade não pode ser tratada como algo

descartável, que hoje se quer, porque se está a viver com a mãe da criança, e

amanhã não, se desiste porque o romance não deu certo. Ser pai é para sempre.

122 SOUZA, José Volpato. Disponível em:

http://tjsc6.tj.sc.gov.br/jurisprudencia/Pesquisa.do?query=2002.018546-4.

Page 81: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXX

O cuidar, no sentido dado por Boff123 é a responsabilidade

pelo sustento e pela educação e o afeto são as atitudes verificáveis no

relacionamento diário que qualificam o pai e a mãe, que apontam o verdadeiro pai.

É certo que, em tese, a paternidade socioafetiva pode

coincidir com a paternidade biológica, mas aquela prescinde dessa. Ou seja, o

ideal é que as três modalidades de paternidade: a jurídica, a socioafetiva e a

biológica coincidam, contudo quando isso não for possível, a paternidade jurídica

deve privilegiar o vínculo de afeto.

Segundo Leite124, a verdadeira paternidade é a baseada no

afeto, a verdadeira filiação- esta a mais moderna tendência do direito

internacional- só pode vingar no terreno da afetividade, da intensidade das

relações que unem pais e filhos, independentemente da origem biológica genética.

Assim pondera Barboza125:

Por força dos princípios constitucionais da prioridade e prevalência absoluta dos interesses da criança e do adolescente, deve prevalecer a paternidade afetiva, em detrimento da biológica, por se tratar de um dos direitos fundamentais: o direito à convivência familiar.

Em relação ao conflito entre pais biológicos e os pais

socioafetivos, não se resolve mais pela primazia de um ou de outro, e sim pelos

interesses do filho.

Lôbo126, neste sentido, aduz que:

123BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. 6. ed. Petropólis:

Vozes, 2000. p. 126. 124LEITE, Eduardo de Oliveira. Temas de direito de família. São Paulo: Revista dos Tribunais,

1994.p 121. 125BRABOZA, Heloísa Helena. Novas relações de filiação e patenidade. In: PEREIRA, Rodrigo da

Cunha (Coord.). Repensando o direito de família. I Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte. Anais: Ibdfam, OAB-MG, Del Rey, 1999. p. 141.

126LÔBO, Paulo Luiz Netto. Revista Brasileira de Direito de Família. v. 5. n 19- ago-set. Porto Alegre: Síntese, 2003.p.155/156.

Page 82: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXI

A solução do conflito mudou o foco dos interesses dos pais para os filhos. A convenção Internacional dos Direitos da Criança, de 1989, com força de lei ordinária no Brasil, desde 1990, estabelece que todas as ações relativas às crianças devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança, em face dos interesses dos pais. Essa norma, inteiramente conforme com a Constituição, foi absorvida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e pelo Código civil de 2002.

Assim ficou claro que os princípios da prioridade e da

prevalência absoluta dos interesses do filho, não devem ser interpretados , ou seja

o interesse da justiça deve ser única e exclusivamente o de preservar o bem -estar

dos filhos.

Dessa forma quando um filho for reconhecido jurídica e

voluntariamente por alguém, não há o que se falar em desconstituição da

paternidade, uma vez que a perda da identificação paterna e do vínculo de

parentesco com os parentes em linha paterna feriria sua dignidade, pois como não

teria como apagar toda a história de sua vida, pelo fato de ter sido alterado um

simples documento. Como se diria a um filho para esquecer a figura paterna que

foi tão marcante e importante durante a sua infância e a adolescência, como

também na sua fase adulta? Como lhe dizer, que após o pai tê-lo tratado como

filho durante toda a sua infância, e agora por um capricho, não quer ser mais o

seu pai?

Esses questionamentos não têm como serem respondidos,

dessa maneira os doutrinadores e também alguns Tribunais têm entendido que

aquele que exerceu as funções de pai, é o verdadeiro pai.

Villela127 defende a consolidação da relação pai filho e

comenta a importância da figura paterna para o filho nos seguintes termos:

Todos os argumentos que militam em favor da prescrição-

127VILLELA, João Baptista. O modelo constitucional da filiação: verdade & supertições. Revista

Brasileira de Direito de Família. p. 137.

Page 83: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXII

estabilidade das relações jurídicas, os limites da memória, a segurança, a certeza, etc.- ganham aqui um especial extremo releo. Se a uma situação patrimonial modesta e reles já convém beneficiar com os favores da indisputabilidade prescricional, tornando-a preclusa e, portanto, imune a questionamentos, o que não dizer da paternidade, ela própria a encarnação do sólido e do permanente no universo afetivo de cada um? Pai é o contraponto da fragilidade e da insegurança em que está irremediavelmente imersa a criança, com seus medos e desvalias. Pai é ainda o porto aonde acorrem os adultos nas crises que o destino lhes propõe e de que nenhuma alma está livre. Morto, a imagem do pai continua a ser evocada e a cumprir seu misterioso destino de pensar as feridas do tempo. As ciências e as artes ditas da alma- psicologia, psiquiatria, psicanálise, etc.- já insistiram ad nauseam na indispensabilidade de uma figura referencial permanente a partir de cuja intervenção a criança constitui suas estruturas e se afirma em relação ao mundo.

O direito civil brasileiro, juntamente com a Constituição da

República Federativa do Brasil de 1988, passou a valorizar a pessoa , as questões

relativas a paternidade e a preservação da identidade do filho, de sua história de

vida e de sua personalidade passaram a ter o foco no melhor interesse da criança

e do adolescente, tutelando os seus direitos, atentando para a paternidade

exercida com responsabilidade.

Verificou-se que nos casos em que houver uma relação

paterno filial saudável a paternidade socioafetiva deverá ser preservada,

principalmente juridicamente pra que não seja interrompida a vida social e

psicológica da criança.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao realizar as considerações finais sobre o presente

Trabalho de Conclusão de Curso, faz-se necessário analisar alguns elementos

Page 84: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXIII

anteriores à decisão da temática proposta, os quais de certa forma contribuíram

para aescolha do tema e de um olhar diferenciado sobre o contexto em que se

interviu.

O presente Trabalho teve como objetivo investigar, à luz da

legislação, da doutrina e jurisprudência brasileira, os aspectos da filiação a

paternidade socioafetiva, bem como as soluções dos conflitos que versam sobre a

paternidade socioafetiva, se valendo das formas de reconhecimento da

paternidade, às enquadrando na Teoria do Melhor Interesse da Criança.

O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de

vivenciar cotidianamente os problemas enfrentados por crianças que provieram de

relações não matrimoniais e em decorrência desse fato sofreram as

discriminações impostas pela sociedade. Não sabendo as suas mãe na maioria

das vezes adolescentes, como agir perante a constituição da nova família, tendo

consigo a figura de um novo pai, o pai socioafetivo.

Para seu desenvolvimento e raciocínio lógico o trabalho foi

dividido em três capítulos.

O primeiro, tratou sobre a Evolução Histórica da Filiação;

filiação, a presunção de paternidade dos filhos advindos do matrimônio e a sua

negação, as formas de filiação, ou seja a filiação nas suas sub divisões, como

filiação matrimonial, filiação decorrente de adoção e filiação extramatrimônial.

Neste capítulo, observou-se que historicamente a religião,

era a norma constitutiva da família, tornando os laços de consangüinidade em

principio, secundários. Mostrou-se que no Brasil desde a sua antiguidade, era

muito freqüente que as famílias não se formarem pelo vinculo do matrimônio, e

sim apenas pela agregação. Porém as famílias não advindas do matrimônio não

eram consideradas legitimas, e o mesmo acontecia com os seus filhos, ou seja os

filhos concebidos de famílias não matrimoniais eram tidos como filhos ilegítimos.

Page 85: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXIV

Abordou-se também, a filiação deixando explicito que

atualmente as suas divisões são particularidade somente do estudo do direito,

pois na prática é vetado qualquer tipo de distinção discriminatória entre filhos,

reconhecendo a todos os filhos, aqueles advindos ou não do matrimônio, todos os

direitos á filiação e os beneficio a ela inerentes.

O segundo capítulo foi destinado aos meios de

reconhecimento dos filhos não matrimoniais e seus efeitos jurídicos; o

reconhecimento voluntário e suas espécies; o reconhecimento judicial e ação de

investigação de paternidade, assim como a prova na ação investigatória e os

efeitos e conseqüências do reconhecimento paternal.

Pode-se constatar através desta pesquisa, que o

reconhecimento pode-se dar de várias formas, sendo que conforme estudo

realizado e seguindo a teoria do melhor interesse da criança, a melhor delas seria

o reconhecimento voluntário do filho, pois ao reconhecer voluntariamente um filho

advindo de uma relação não- matrimonial, a possibilidade da criação de um laço

afetivo entre pai e filho seria maior, devido a espontaneidade do reconhecimento.

Ainda sobre o reconhecimento voluntário dos filhos,

observou-se que quando se tratar do filho maior o reconhecimento dependerá de

sua aceitação, e quanto ao filho menor fica reservado o direito a sua impugnação

nos prazos estipulados por lei.

Quanto ao reconhecimento judicial, notou-se que embora a

ação de investigação de paternidade seja uma ação privativa do filho, a Lei nº

8.560/92 atribui legitimação extraordinária ativa, ao Ministério Público para

intenta-lá, com o objetivo de resguardar o direito das crianças. Assim como os

herdeiros do filho podem dar continuidade na mesma, de acordo com os

pressupostos legais de admissibilidade da ação, pois o reconhecimento judicial

gera efeitos pessoais e patrimoniais, embora o intuito dessa pesquisa não verse

sobre direitos patrimoniais. Porém teve-se que observa-lo pois como o intuito é o

Page 86: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXV

melhor interesse da criança, é necessário que se resguarde todos os direitos

cabíveis a ela.

No terceiro e último capítulo, observou-se os aspectos

relevantes da paternidade socioafetiva e as suas divergências com a paternidade

biológica, tratou-se da caracterização da paternidade socioafetiva, onde tentou-se

enumerar, quais os fatores que apontam para essa forma de paternidade,

vislumbrando o caráter afetivo acima do fator biológico.

Foi apontado também o papel do pai perante a formação

social da criança dando ênfase na questão psicológica, considerando a

problemática que pode-se ocasionar na criança que tem o vinculo paternal

interrompido por conflitos judiciais. Nesse ultimo e decisivo capítulo foi

considerado a importância do pai na formação de uma criança, considerando que

pai não é aquele que simplesmente possui um laço biológico com aquele ser tão

frágil, mas sim aquele que assumiu a paternidade criando verdadeiros laços

afetivos, entre ele e seu filho.

Para encerrar esse trabalho de pesquisa, foi apreciada a

questão do melhor interesse da criança na solução do conflito da paternidade

socioafetiva. Com esse estudo pode-se perceber que as correntes doutrinárias

estão apontando para o fato de que os laços afetivos não podem ser quebrados

em detrimento de problemas pessoais entre pais que se separam, ou outros

fatores desse gênero.

Posicionam-se os doutrinadores, é os Tribunais seguindo as

correntes doutrinárias, no sentido de que não é apenas o vínculo genético que

estabelece a filiação, concluindo que o reconhecimento da filiação é ato jurídico,

irretratável e irrevogável, não podendo estar os interesses dos filhos vulneráveis

aos sentimentos dos pais.

Passando as hipóteses da pesquisa, verificou-se que a

hipótese (a), restou esclarecida visto que, antes da Constituição da República

Page 87: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXVI

Federativa do Brasil de 1988 existiam distinções quanto as formas de filiação, e

aos direitos dos filhos. Já com a vigência da Constituição da República Federativa

do Brasil de 1988, os filhos advindos ou não de relações matrimoniais passam a

ter os mesmo direitos sendo a todos proibido, qualquer distinção discriminatória.

Em relação a hipótese (b) ficou explicito quais os meios de

reconhecimento do filhos não matrimoniais, sendo que no reconhecimento judicial

os filhos são os únicos que podem intentar ação de investigação de paternidade,

porém cabe aos seus herdeiros dar prosseguimento de acordo com os

pressupostos de admissibilidade da ação, sabendo também que a Lei nº 8.560/92

atribui legitimação extraordinária ativa, ao Ministério Público para intenta-lá, com

o objetivo de resguardar o direito das crianças.

E a ultima hipótese trabalhada na pesquisa, ou seja a

hipótese ( c), restou confirmada, já que absorveu-se do estudo que a paternidade

socioafetiva vem sendo reconhecida, amparando tanto aos filhos, como aos pais

que não querem ter interrompido o seu vínculo de afeto por problemas judiciais,

uma vez que a teoria do melhor interesse da criança, toma proporções maiores a

cada dia, sendo confirmada pelos Tribunais, garantindo o direito ao pai.

Contudo por ser esse um tema atual, e plausível ainda de

muita discussão, pode-se perceber que a uma certa tendência doutrinária na

aceitação da paternidade socioafetiva, porém não pode-se se falar ainda em

consenso doutrinário ou jurisprudencial.

Dessa forma , deve o julgador se valer das doutrinas e

decidir analisando cada caso concreto, ponderando os aspectos afetivos, sociais e

psicológicos, viabilizando a cada individuo a decisão que melhor caiba ao Melhor

Interesse da Criança.

Page 88: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXVII

REFERENCIAS DAS FONTES CITADAS:

ALMEIDA, Maria Christina. Investigação de paternidade e DNA- aspectos

polêmicos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001

BARBOZA, Heloísa Helena e Barreto, Vicente de Paulo [org]. Temas de biodireito

e bioética. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

BOEIRA, José Bernardo Ramos. Investigação de paternidade: posse do estado

de filho: paternidade socioafetiva. Porto alegre: Livraria do Advogado, 1999.

BOFF, Leonardo. Saber cuidar: ética do humano – compaixão pela terra. 6. ed.

Petropólis: Vozes, 2000.

CHAVES, Antonio. Filiação Ilegítima. V 37, p. 290. In: DINIZ, Maria Helena.

Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed. São Paulo: Saraiva.

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga- estudo sobre o culto, o direito as

instituições da Grécia e de Roma. Tradução de Jonas Camargo Leite e

Eduardo Fonseca. São Paulo: Hemus, 2002

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Brasileiro- Direito de Familia. V.5. 18 ed.

São Paulo: Saraiva, 2002

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. V. 1. São Paulo, 1998.

FACHIN, Luiz Edson. Elementos críticos do direito de família. Rio de Janeiro:

Renovar, 1999.

FACHIN, Rosana. Da filiação. In: DIAS, Maria Berenice: PEREIRA, Rodrigo da

Cunha (Coord.). Direito de família e novo Código Civil. Belo Horizonte: Del Rey,

2001.

Page 89: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXVIII

FURTADO, Alessandra Morais alves de Souza e. Paternidade biológica x

paternidade declarada: quando a verdade vem à tona. Revista Brasileira de Direito

de Família, Porto Alegre : Ibdfam: Síntese, v.4, n 13, abr- jun.2002.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Grandes temas da atualidade. Rio de Janeiro:

Forense, 2000.p.67.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus

Navigandi, Teresina, a. 4, n. 41, mai. 2000. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527>. Acesso em: 04 mai. 2006.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Revista Brasileira de Direito de Família. v. 5. n 19- ago-

set. Porto

LOTUFO, Renan. Quetões pertinentes à investigação e à negação de paternidade.

Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Ibdfam:Síntese, v.3,n.11,

p.46-58, out-dez.2001.

MOREIRA FILHO, José Roberto. Direito à identidade genética . Jus Navigandi,

Teresina, a. 6, n. 55, mar. 2002. Disponível em:

<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2744>.

NEVES, Márcia Cristina Ananias. Vademecum do Direito da Família. São Paulo:

Jurídica Brasileira, 1994, p. 827.

OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa de; MUNIZ, Francisco José Ferreira. Curso de

direito de família. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2002.

PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica- Idéias e ferramentas úteis

para o pesquisador do Direito. & ed. Rev. atual. amp. Florianópolis: OAB/SC,

2002.

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Familia: uma abordagem psicanalistica.

2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 162.

Page 90: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

LXXXIX

PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Família, direitos humanos, psicanálise e inclusão

social. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre: Ibdfam: Síntese, v. 4,

n.16, jan-mar.2003.

PEREIRA, Sérgio Gischkow. A adoção e o direito intertemporal. Revista dos

Tribunais, 1992. p.169

QUEIROZ, Juliane Fernandes. Paternidade : aspectos jurídicos e técnicas de

inseminação artificial. Doutrina e Jurisprudência. Belo Horizonte: Del Rey,

2001.p.52

ROCHA, Marco Túlio Carvalho. Prazo para impugnar a paternidade. Revista

Brasileira de Direito de Família, Porto alegre: Ibdfam: Síntese,v.4,n.13, p.24-41.

RODRIGUEZ, Silvio. Direito civil- Direito de família. V.6. 27. ed. Atul. São Paulo:

Saraiva, p. 321.

SILVA PEREIRA, Caio Mário da. Reconhecimento de Paternidade e seus

Efeitos. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p.27.

SILVA PEREIRA, Tânia. Direito de Família e o Novo Código Civil. 3 ed. Belo

Horizonte: Del Rey, 2003.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário.11. ed. Rio de Janeiro: Forense,1991.

SILVA, Elza Desidério. Paternidade Biológica e Paternidade Socioafetiva:

Complexidades atuais frente ao Direito Civil Brasileiro.Itajaí, 2004. (Grau de

Especialista).

SILVA, José Afonso da. Curso de direito Constitucional positivo. 9. ed. São Paulo:

Malheiros, 1992.

TAVARES, José de Farias . Comentários ao Estatuto da Criança e do

Adolescente. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.43.

Page 91: O RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE …siaibib01.univali.br/pdf/Maria Salette Camargo da Silva.pdf · A Deus, por amparar-me dando forças pra continuar, onde me mostrou que a fé ...

XC

VELOSO, Zeno. Direito brasileiro da filiação e paternidade. São Paulo:

Malheiros, 1999, p. 73/75

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. Estudo comparado com Código

Civil de 1916. 3. ed. Atualizada de acordo com o Novo Código Civil, São Paulo:

atlas,2003.

VILLELA, João Baptista. O modelo constitucional da filiação: verdade &

supertições. Revista Brasileira de Direito de Famíla

WELTER, Belmiro Pedro. Igualdade entre as filiações biológica e socioafetiva. São

Paulo: RT, 2003.