José Calvet de Magalhães - A Diplomacia Pura

download José Calvet de Magalhães - A Diplomacia Pura

of 94

Transcript of José Calvet de Magalhães - A Diplomacia Pura

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    1/94

    R D l ~ L O M R C IR P U R A .3 2 7 M ~ G1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 ( B M J S )12739

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    2/94

    J I)~(' La " t'I dt' 'Iill!alltii('~. diplomatut' t'~('I'it()r, Ii('t'l]('i()lI-~t, ('III Din'ito p e - l uFa('ldd,1tIt, dr ' n in - i ti l da L 11 i\ t'r~itladt' lit,I ,i~h()a ('III 1 q I O , ~ : 1lH11Ihr o da\ ( 'adt'll l inI'ort llgll t'~a ti t' Ili~I(lria to, dto~tlt' 10B:).pH~idt'l1tt, do COIl~tlllOet'ral do lusl il ulotIr' l:.;tlldo~ I:~tr

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    3/94

    A coleccao -Ensaios e Documentos- procurara const itu ir urn l iberrimo forumdestinado :\ discussao dos problemas que preocuparn o leitor dos nossos dins,Aber ta, pa r vocacao, a (ados aqueles autores e a todas aquelas obras que desejamacima de tudo explicar e compreender, esta coleccao nao escolhera t rincheiras nerntomara par tido: a sua unica e intrans igente defesa sed: a cia Iiberdade de informal'.

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    4/94

    J o s e Ca lv e t d e Mag alh ae s

    A D iplomacia Pura2. a EDI(,Ao

    BERTRAND EDITORAVENDA NOVA 1996

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    5/94

    B~.alIOIECA M \ J !> ! \C I .pA llost SARAMAGOLOURES

    Capa de Fernando FclgueiraTodos os drre itos para a l ingua por tugucsarcservados pOI" Ber trand Editora. Via.

    Fotocomposicao:Atelier de Imagem, Publicacoes e Arres Gdficas, Lda,

    Impressao e acabamento:G r af ic a M a n ue l Barbosa & Filhos, Lda.

    Deposito Legal n.? 104.761/96Acabou de imprimi r- se em Novernbro de 1996

    ISBN: 972-25-0943-8

    Indlce

    Prefacio 9Introducao 15

    1. Imprecisao no uso das expressoes politicaexterna e diplomacia 15

    2. Razoes desta imprecisao... .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. .. 213. Delimitacao do conceito de politica externa e estado doseu escudo teorico 22

    4. Nocoes gerais sobre os instrumentos da politica externae sua cJassifica

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    6/94

    jost: C A LV E']' D E M A GA LlIA ESCAPITULO III -M01:fologia dtplomdtica ".............................. 93

    93L Diplomacia antigu e moderna , " .11, Diplomacia secreta e aberta 9913. Diplomacia bilateral e multilateral 10514. Diplomacia e advocacia WH15. Diplornacia e neg6cio 111CAPiTULO IV - Patologia diplomdtica 11316. Diplomacia paralela 11317. Diplomacia de comhate I 1(i18. Espionagern e contra-espionagem 120CAPiTULO V - Critica da diplomacia e crise da diplomacia 12319.Critica cia diplomacia 12320. Crise cia diploma cia .. 135

    CAPITULO VI - Analise da actiuidade diplomauca "..... 14121. Elementos constirutivos cia activklade diplornatlca .. 14122. A) Representacao .. 14423. B) Infonnacao 14624. C) Negociacao 152

    1.0 Conceito de negoclacao diplonuitica 152 2. Principios e merodos da negociacao diplomatlca v; 155

    a) Preparacao da negociacao 1"56b) Conducao da negociacao 158

    3. 0negociador 16325. D) Promocao 16626 . E) Proteccao 16827. F) Extensao externa do service publico 170

    Bibliografia .. 171Indice analitico 175

    8

    Prefacio

    o presente estudo de ciencia politica foi publicado pela pri-meira vez em 1982, numa edicao restrita cia APRI, que teve umadifusao limitada, sobretudo aos meios acadernicos. Em 1988 foipublicada nos Estados Unidos uma versao em lingua inglesa, edi-tach pela Greenwood Press, de Westport, Connecticut, com atitulo Tile Pure Concept of Diplomacy.

    o autor ofereceu um exemplar desta versao inglesa aoembaixador George Kennan, director cia School of Historical Stu-dies do Institute For Advanced Study, da Universidade de Prin-ceton, de New Jersey. Para 0leitor portugues nao especializado,esclarece-se que George Kennan e talvez 0 mais nota vel diplo-mara e formulaclor de politica externa dos Estados Unidos, nopresente seculo.

    Walter Isaacson e Evan Thomas, na sua obra The \ViseMen- Six Friends and the World Tbey Made - Acheson, Bohlen,Harriman, Kennan, Lovett, jJlIacCloy (Simon and Schuster, NewYork, 1986) dizern, a respeito de George Kennan, que 0conside-ram uma clas seis mais irnportantes personalidades responsaveispela notavel transformacao cia politica americana no apes-guerra:-Primeiro, pelo famoso "longo telegrams", que chamou a atencaopara as ambicoes expansionistas do Kremlin, e depots pelo sabioartigo, escrito anonimamente como ''X'', em que Kennan formulou

    9

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    7/94

    Josf~ CALVET DE J\TAGAUIArs

    da contencao, que foi adoprada em Washington com talque em breve 0fez sobressaltar.

    que a politica de contencao constituisseurn expedicnte e uma medida temporaria, uma manobra diplo-matica preliminar de uma util discussao, e nunca um pretextopara manter urn estado permanente de preparacao militar. Desi-ludido pela forma como a politica que sugerira estava sendoexecutada, pecliu a desmissao do State Department em 1953, e,excepto pOl' uma curta missao diplornatica como ernbaixador emBelgrade, de 1961 a 1963, dedicou-se inteiramente ao ensino dehist6ria diplomatica no In stitu te for Ad va nce d Stu dy cla Universi-dade de Princeton.

    Agradecendo a oferta do livro que lhe enviamos, 0 ernbai-xaclor Kennan enviou-nos a seguinte carta:

    -Dezernbro, 1, 1988Caro Embaixaclor de Magalhaes:Acabo de receber, e rive ocasiao de examinar a edicao

    inglesa do sell livro sobre The Pure Concep t o f D ip lom acy;e escrevo-Ihe para the transrnitir a adrniracao e 0entusiasmoque sinto pelo livro depois desta prime ira leitura. Esperoque ele venha a ser leitura basica e obrigatorla em todas asinstituicoes americanas em que a natureza, os usos, e asmodalidades da diplomacia sao rnaterias de ensino. Ternsurgido, como bem sabe, muitos poucos bons livros sobreeste assunto, e os que existern sao hoje pouco conhecidos,E particularrnente importante que urn livro como seu,tenha surgido precisamente neste memento; porque umcerto numero de desenvolvimentos recentes, especialrnentea enorrne aceleracao das cornunicacoes electronicas e ()habito de viagens pessoais dos ministros de negocios estran-geiros e chefes de Estado, tern levado a obscurecer e, emcertos cases, a levar publico a duvidar dos valor das tra-

    10

    A DlPLOl\JACIA PURA.

    dicionais instituicoes da diplornacia - um valor que, narninha opiniao, nao esra diminuido (embora possa ter decerto modo mudado) por estas inovacoes.

    Entreranto, dcixe-rne Ielicita-Io pela elaboracao destauti! ohra e pedir-lhe que aceite os rneus respeitosos cum-prirnentos.

    Sinceramente vossoGeorge Kennan"

    NJ.o creio que esta carta, que serve de adequado prefacioao presente trabalho, necessite, cia nossa parte, de quaisquercomentarios,

    ]. C. M.

    11

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    8/94

    It is generally bet ter to deal by speech than by letter;and by the mediation of a third than by a man's self.

    Francis Bacon, 0/ Ne,!.;ilfialil1,Q. Essays .

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    9/94

    Introducao

    1. Imprecisao no uso das expressoes politic a externae diplomacia

    A teoria das relacoes internacionais e uma ciencia muitorecente e ainda pouco elaborada e que infelizrnente, quanta an65, tem muitas vezes enveredado por carninhos extremarnentearidos, com recurso a tecnicas alta mente sofisticadas, 0 que naopermite a sua facil divulgacao e assimilacao pelo grande publico.Por outro lade, como veremos melhor mais adiante, a teoria dapolitica externa propriarnente dita nao tern sido objecto degrande elaboracao teorica. Destes faetos resulta que, na lingua-gem corrente e ate nas obras dos especialistas de assuntos inter-nacionais, persista uma certa confusao de conceitos que lornadificil abordar com clareza qualquer materia teorica relativa a srelacoes internacionais, No que se refere, em particular, ao con-ceito de politico extern a, que agora mais de perto nos interessa,e frequente ve-lo confundiclo com 0conceito cle p olitic o in te r-n acion a l por urn lade e, rnais frequentemente, com 0 conceitode d iplomacia, por outro. Acresee ainda que a palavra d ip lo m a-ci a e empregada sem qualquer rigor teorico para designar dife-rentes coisas. Alern de sin6nimo de politics externa e empregadatambem frequentemente para designar 0 instrumento pacifico egene rico da politica externa ou seja qualquer forma de negocia-

    l'j

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    10/94

    JOS{~ CALVET DE !lIAGi\LTTAI~S

    GtC) em oposicao aos instrumentos violentos e em particular aguerra.

    No que se refere {l confusao entre 0 conceito de politicaexterna e () de diplomacia, ela e tao generalizada entre os pro-prios internacionalisras, pur vezes consciente e deliberadamente,que podernos referir urn autorizado professor de politica inter-nacional da Universidade de Wales, afirrnar, na introducao deLUll interessante trabalho, por de editado, sobre a diploma cia nahistoria moderna da Europa, 0seguinte:

    "A palavra diplomacia no titulo deste volume e usadu naono seu senti do mais resrrito do trabalho profissional de limdiplomata, mas na sua mais vasta referenda ao campo da poll-rica inrernacional como na corrente expressao "historia diploma-tica'v,

    A verda de e que de facto a maioria ou qU

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    11/94

    josi: CALVIn DE MAGALIIAES

    meios "'''\ Clausewitz n;10 so nunca ernpregou a palavra diplo-macia na sua definicao de guerra, tantas vezes citada, como aoexplicar 0 seu conceito afirma: "... a guerra nao e apenas umacto politico, mas um verdadeiro instrumento politico, umaconducao das relacoes politicas, uma realizacao destas poroutros meios-. 0 pensamento de Clausewitz e , pOl' conse-guinte, bem claro e a substituicao cia palavra polit ica por diplo-IU a c ia no seu texto s6 pode servir para provocar lamentavelconfusao.

    No mesrno estuclo cia Colgate University transcreve-se tam-bern um excerto de uma obra de Thomas Schelling, conside-rado como urn dos mais notaveis te6ricos americanos cia estra-tegia , com 0 titulo ja de si estranho de Diplo ma cia d aYiolencia . no qual se afirrna que a diplornacia e negociacao ouregateio (diplomacy is bargaining) 0 que, em principio, e acei-tavel pois se considera a diplomacia como um instrumento. Masao desenvolver 0seu conceito de guerra, Schelling distingue 0uso cia forca da arneaca do emprego da forca e poe em evi-dencia 0facto da possibilidade de fazer mal, de destruir, poderser usada como urn factor de negociacao para concluir que "0poder de fazer mal e poder de negociar. Explora-lo e diplo-macia - detestavel diplornacia, - mas diplomacia-". Sem pro-vavelmente se aperceber, no espaco de uma ou duas paginas,; Schelling pass a do conceito de diplomacia como um instru-mento da politica por rneio da negociacao, que e urn metodopurarnente pacifico, para um metodo que consiste na ameacado emprego da forca que nao pode ser considerado urn meiopacifico de tratar as relacoes entre os povos, Schelling fala-nos

    , Peace and !Far. p. 69. Esta dta~' iio foi extratda de Hans Morgenthau au bebidana mesrna Fonte em que ele a bebeu pols a reproduz na mesma forma errada arirnatrnnscrita tab cit., p. 36}). 0 rexto origi nal da famosa Frase de Clausewltz, que corres-ponde ao titulo do paragrafo 24 do primelro capitulo dn sua famosa obra, diz, com efctto:-Der Krieg ist cine blosse Portserzung der Poli tik mi t anderen Mineln- (Carl Von Clause-witz, Yom Kr iege, Ferd, Dummlers Verlag, Bonn. 1952. p, lOS).

    ( , D b . c i t . . p. 67 .7 D ip lo ma cy 0 / v io le nc e. in P eac e and IFill'. p, 75: -The power to hurt is bargai-

    ning power. To exploit it is diplomacy - vicious diplomacy, but diplomacy".

    18

    A DIPLOiv lACIA PURA

    r mesmo de d iplom aci a coercion compreendendo actos de vio-lencia para atemorizar 0 adversario com a eventualidade deaq~6es mais violentas. Se bern que a diplornacia como instru-menta cia politica externa possa ernpregar divers os rnetodos,incluindo as proprius arneacas para evitar 0 ernprego da 1'0" < , ;a ,quando se chega ao ponto cia concretizacao dessas arneacase11tramos j : : i no campo das pressoes militates deixando 0campo da diplornacia como rneio pacifico de resolver os coo-flitos entre nacoes. Seria pols rnais apropriado falarmos dep olittca c oercioa em vez de d ip lom a c ia c oe rciua 0 que sopodera levar inevitavelmente a confusao de conceitos. Mas aatraccao dos internacionalistas pela palavra d iplo m ac ia e taogrande que ate nao resistem a tentacao de ernprega-la quandose passa do terreno dos meios pacificos para 0dos meios vio-lentos.Essa tentacao para 0usa indiscriminado da palavra d i p lo -mac j a e tao forte e tao enraizado que ate os especialistas emmateria diplomatica, propriamente dita, nao escapam a ela, con-fundindo por vezes diploma cia com politica exrerna. E assim queo faleciclo professor de historia cia Universidade de Columbia,Garrett Mattingly, autor de urn dos mais notaveis estudos histo-ricos sobre a diplornacia , intitulado R en ais sa nc e D ip lo ma cy, noqual a actividade diplornatica e estudada com grande profun-didade e propriedade, acaba por ernpregar frequentemente 0termo d ip lomac ia no senticlo de politica externa sentindo anecessidade de adoptar a expressao -rnaquinaria diplomatica-( di pl om at ic m ac hin er y) para clesignar a diplomacia propria mentedita",o mais surpreendente, porern, e que Harold Nicolson, urndiplomata de carreira e um notavel escritor que dedicou variesestudos a teoria diplomatica, depois de se insurgir veernente-mente contra a abusiva confusao entre diplomacia e politicaexterna no seu conhecido ensaio intitulado Diplomacy, publi-cado pela primeira vez em 1939, quer nessa mesma obra, quernoutra publicacla em 1954 com 0 titulo The evolution of diplo-

    ~ Garrell Murtlngly. R e na is sa nc e D i pl Ol !l ac y, Penguin Boob. Baltimore. 19M.

    1 9

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    12/94

    propriodiversas passagens".

    esfera dos especialistas das relacoes interna-para 0campo dos nao-especialistas e nomeadarnenteambito do iornahsmo, a confusao conceptual na materia

    que estarnos examinando c generalizada, 0que decerto c maisdesculpavel do que a confusao, deliberada ou nao, ohservadaentre os internacionalistas. 0 conhecido diario frances L e ,110 II de !pOI' exernplo, possui uma seccao intitulada Dip loma t ie que e cla-ramente dedicada a certos acontecimentos de politica externapropriamente dita. Exemplos como estes poderiam SCI' repetidosa d n au se am .

    Mas nem tudo e negativo nesra materia da delimitacao dosconceitos de politica externa e diplornacia. Urn acontecimentoanirnador consiste na criacao, em 1978, na Georgetown Univer-sity do ln s titu to para 0 e stu d o da diplomacia cuja orientacaoconsiste precisarnente em charnar a atencao para 0 papel instru-mental cla diplomacia, distinguinclo-a da politica externa, e pro-curar desenvolver 0 estudo da diplomacia como instrumento deaplicacao cia polirica externa. No panfleto descritivo das activi-dades do Instituto afirrna-se que "a maioria dos esrudiosos,comentadores e instiruicoes que se ocupam das relacoes exte-riores nao distinguem devidamente entre -politica externa- e -pra-rica diplornatica, desprezando habitualmente esta ultima- e acres-

    !, H. Nicolson upcrceheu-se desve fac to quando na ul tima obra refer idu aflrmu .-You may be thinking that in devoting so much space to rhe new ideas of 1919. I amtransgrcssmg my own principle and confusing policy with negotiations, theory with prac-tice.. !1111!ouolution o] diplomatic method, London. Constable and Co. Ltd.. 1954. n." 88),

    George Kennan, urn clistinto diplomata de carrcira iruirulou 0 seu primeiro l ivrosobre pol it icu extema americana A me rtc a n D ip lo ma cy (Seckel' & Warburg. Londres,1952.LEm obras subscquentes sobre polltica externa Kennan parcce rcr cornprecndido 0erro e deixa de emprcgar a palavra diplomt/ci l l como sinonimo de polit lca externa.E ussun que essas obras Se Imirulam R ea li li f'$ o j A me ric an F or e/g il Policy, Sorie! Foruigl lPolicy e Tile C l o ud o j D I II IR ( 'I '>Cu r re n t Rcalitie, oj American Fo r e lg l l P o li c y

    Tal 0[10 aconteceu com Henri Kisinger . professor de Historia das Relaj ,'oesInter-nacionais e ant igo secrctarlo de Estado, que corneteu a impropnedade de dar 0 titulo deDip / omacy (Simon 8. : Schuster, Nova Iorque, 1994), ;1 um livro que sc ocupa Iundamen-talmente de politica externa.

    20

    A DlPLUVIACIA PURA

    ainda: -Existe portunto urna surprecndente - e preocu-ausencia de ensinamento e materia is de investigacao nade diplomacia .,. Nao existe urn livro de texto cornpre-ou series de monografias que expliquem e analisern COin 0

    n ci ol lt l ( ) p ro ce ss o diplolllcit ico e porque e que funciona bemem certas ocasioes-. Segundo 0 mesmo panf1eto 0 Insti-

    pretende concentrar-se no estudo do processo diplomaticocomo coisa distinta do processo de formulacao cia politicsexterna, concebendo a diplomacia como "LIm meio pelo qual ospdises procuram alcancar os objectives das suas politicas exter-nas atraves de acordos de preferencia a guerra". Como ja disse-mos, trata-se de urna tentativa esperancosa de eliminar a confu-5,10 tao frequentemente observada nos teoricos cla politicaintemacional entre politica externa e diplomacia com 0objectivede autonomizar 0 estudo te6rico desta ultima, 0 Institute ja pro-duziu alguns estudos valiosos e esperantos que no futuro eon-siga realizar plenarnente os seus objectives.

    POl' outro Iado, alguns manuals universitarios arnericanosrna i s recentes ocuparn-se cia diplomacia como urn instrumentoda polit ica externa 0que revela ji i uma tendencia para empre-gar a palavra diplomacia no seu exacto sentido!".

    2. Razoes desta Imprecisao

    Chegarnos ao momenta de perguntarrnos porque razao osintemacionalistas, os principals responsaveis nesta materia, comtodas as suas preocupacoes de rigor cientifico, persistem em uti-lizar a palavra d ip lo m a ci a para designar 0conceito de politicoexterna , dado que esra expressao e perfeitamente clara em sime srna e adaptada ao conceito que pretende exprimir, rnais clara,e adaptada certarnente, do que a palavra d ip lomac ia , que nao sohistoricamente nasceu para designar especificamente a actividade

    H Est::inesre caso 0 manual do professor da Universidade de British Colurnhia.K. J. Holsti intirukulo tnternutional Polittcs -A J m 1 1 1 I!U'OI' / . ! f or a n ai vs is Prentice-Hall Inc.,Englewood Cliffs, Ne'" Jersey, 1977.

    21

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    13/94

    JOSE CALVET DE MAGALI-rAES

    dos diplomatas OU agentes diplornaticos, como alern disso, naoexiste Dutra palavra ou expressao alternativa para designar essaactividade. Para. que confundir conceitos diferentes utilizandoscm necessidade uma mcsma palavra para designar ambos? Seno livro, j : : i referido, do professor Martin au no livro, tambern jiimencionado, do professor Aron, substituirmos nas respectivaspassagens, por nos referidas, a palavra d ip lo m a cia pelas palavraspolitico externa, 0sentido dessas passagens nao ficaria de todoalterado antes fica r ia mais daro.

    Ha certos maus habitos a que se nao furtarn sequel' as maisautorizados teorizantes e que sao difice is de combater uma vezgeneralizados, Neste caso particular a responsabilidade provern,em grande parte, daquilo que ja record amos antes, ou seja, 0recente e ainda fraco desenvolvimento da teo ria das relacoesinternacionais que nao permitiu aincla que surgisse uma perso-nalidade forte que, nurna obra fundamental, fixasse a terminolo-gia neste ramo cia ciencia politica. Por outro lado, os trabalhoste6ricos sobre a diplomacia propria mente dita sao Infelizmenteraros e pouco clesenvoIvidos de forma que se pode afirmar quenao surgiu ainda urn internacionalista que tenha analisado comprofundidade 0 conceito de diplornacia que assim se ve con-fundido e misturado com outros conceitos.

    3. Delimitacao do conceito de politic a externa e estadodo seu estudo teorrco.Torna-se, portanto, indispensavel precisar alguns conceitos

    directa ou indirectamente relacionados com 0 nosso tema,Em primeiro lugar devemos precisar a conceito de poli t tca

    externa . Esta contrapoe-se naturalmente a politico in terna e, nestesentido, refere-se a actividade exercida por urn Estado no dorninioexterno, ou seja, para alern elas suas fronteiras politicas. A expres-sao politico externa e pOI' nos utilizada , pOl' conseguinte, paradesignar 0 sector da actividade do Estado que se destina a obterum determinado resultado em relacao a outro Estado ou grupo de

    22

    A DlPLOMACrA PURA

    Eswdoso No ponto de vista te6rico a politica externa constitui 1 . 1 1 1 1aspect

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    14/94

    josi: CALVEI' DE ,VIAGAUrAES

    S~IO fragmentarios c superficials os estudos de conjuntosobre os referidos instrumentos e tecnicas, 0que l' deploravel,pois se trata de uma materia de cujo conhecimento dependern,em grande parte, as construpSes teoricas sobre a analise da poli-tica externa. A carencia deste estudo e , no fundo, a principal res-ponsavel pelas confus6es termino16gicas e eoneeptuais que seobservam no tratamento (las materias rc1acionadas com a politicaexterna de que antes demos alguns exernplos caracterfsticos,

    4. Nocoes gerais sobre os instrumentos dapoliticaexterna e Suaclassificas:ao.

    Se aludimos antes a instrumentos e tecnicas da politicaexterna e porque arnbas as nocoes se acharn intima mente liga-das, como orgao e funs;ao, por exemplo, Instrumento, significacorrentemente 0 objecto que serve para efectuar urna determi-nada operacao, e t ecnica ou metoda , 0 processo ou coniunto deprocesses utilizado par urna ciencia ou arte, ou seja, por umacerta actividade humana. 0instrumento e , pois, 0 objecto utili-zado para se praticar uma determinada operacao e a tecnica 0processo utilizado para a efectivacao dessa mesrna operacao, Sedo campo das coisas materiais passarrnos para 0campo das ins-titlli~0es humanas, uma dessas institl1i~0es sera chamada inst ru-men t e quando serve para a execl1~ao de uma determinadn acri-vidade hurnana.

    Instrumento e tecnica acham-se, pois, intimamente ligados,'como aspectos estatico e dinamico da mesma realidade,de formaque podemos sistematizar determinados campos de actlla~

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    15/94

    joss C A LV ET D E Iv Li\G A LH AE Sesrabelecer relacoes com outro Estado OU outra -unidade poli-tica-, 0 que constitui 0 primeiro passo positive da execucao deuma politicaexterna, a primeira ideia que nos ocorre e a de COII-t ac to . Para que um Estado aplique uma dada politica externa emrelacao a outro Estado, necessita primeiramente de estabelecercontacto com esse Estado. As funcoes do Estado sao exercidaspelos chamados orgaos da soberania que, de acordo com asregras constitucionais desse Estado, tern cornpetencias diversase, entre estas, a competencia para eonduzir activiclades externas,o 6rg,10 competente do Estado A designa a entidade que deverepresentar esse Esrado para estabelecer contacto com os res-pectivos representantes do Estaclo B. Este c on ta cto i nt er n a ci on alconsritui, por assim dizer, 0acto elementar da politica extema,do estabelecimento de relacoes internacionais, entendidas comorelacoes entre Estados. Esse contacto internacional visa, porern,um objective deterrninado que constitui 0 conteudo da politicaextern a do Estado A e que pode ser 0 estabelecimento, puro esimples, de relacoes de boa vizinhanca, au a estabelecimento deuma alianca politica e milirar, a estabelecimento de intercambiocomercial, etc., etc. Estes contactos entre Estados para concerta-rem entre S 1 a resolucao de problemas de interesse comum oureciproco, sao designados geralrnente por negociacoes , tornadaesta palavra no seu senticlo mais amplo e nao no senticlo rnais:estrito e preciso de concertacao para se chegar a um determi-nado aeordo, geralrnente escrito, sobre qualquer problema espc-cifico, Negociacao signiflca, naquele caso, 0 dialogo entabuladoentre Estados. Alguns autores de lingua francesa utilizam com 0mesmo sentido a palavra comercio , falando do comercio entreE s t a d os para significar sirnplesmente aquele dialogo, Ambos osvocabulos, negociacao e comercio . foram recolhidos no vocabu-lario proprio das transaccoes materials a que dernonsrra a imp or-tancia que sernpre tiveram essas transaccoes nas relacoes entreEstados,:E curiosa observar, em parentese, que os departamentos dos

    diversos Estados que se ocupam da conducao da politica externaadoptarn expressoes diferentes para clesignarem a materia da sua

    2 6

    A D II'LO MA CIA P UR A

    compctencia. Em Espanha, a respective rninisterio charna-se dos(fsslI!llos exteriores e no Brasil, das relacoes exteriores. expressoesarnbas de caracter bastante gene rico mas elucidativas. NaGra-Bretanha. 0 mesmo departamento chama-so Foreign Officeque se pode traduzir por departam ento do estrangeiro, o queainda c mais generico. Em Franca, porern, esse departamentocharna-se des affaires et r angeres a que corresponde a nossadesigna

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    16/94

    [ jE r vlA C ;A U r A E S

    varios tipos:

    negociacao levada a cabo directamente pelos detentoresdo poder politico dos Estados, tipo este de ncgociacao a que cha-maremos n e goc ra ~ r io d ir e ct .

    h) negociacao levada a cabo por representantes do Estadoespecial mente deslgnados pelos sells orgaos de soberania, masell'S proprios destituidos de poder politico, e que sao rigorosa-mente os gentes dip!omc1l icos . tipo este de negociacao a que cha-rnaremos diploniacia;

    c) negociacao levada a cabo pelos representantes ou pelosdetentores do poder politico de um terceiro Estado que serve deintermediario entre dois Estados, tipo de negoclacao a que cha-1 1 1 a r e 1 1 1 0 0 5 IIIed ia~' l o .Esta distincao entre os diversos tipos de contactos plurilate-

    rais ou negociacao entre Estados nao obedece apenas a umasimples necessidade pratica de sisternatizacao da materia.Encerra urna diferenca essencial entre d ip lo m a c ia , no sentidorigoroso pOl' nos empregado, de um lado, e as outras forrnas denegociacao, de outro, como melhor vercrnos mais adiantequando aprofundarmos 0 conceito de diplomacia.

    No que se refere aos contactos unilaterais de naturezapacifica ao service da politica externa poderemos distinguir osscguintes:

    a ) p ro p ag a nd a (a que alguns preferern chamar inforrnacao)ou infiltracao das ide ias favoraveis a politica externa de urn paisjunto da populacao de outro pais;

    b) espiollagem (a que os nnglo-saxoes chamam pudicarnenteintelligence) exercida par meio de agentes secretes de um Estadojunto de outro para a obtencao, par meios nao legitimos ou ocul-tos, de informacoes (1 Leis it sua politica;

    c) internencu o ec onom ic a de lim Estado junto de outro atra-ves dos varies meios oferecidos no dominic economico:

    d) interuencdc pol ii ica por forma mais ou menos oculta delim Estado junto dos meios politicos de outro Estado.

    28

    A DIPL01VlACIA PUlV' ..

    No que se refere aos instrumentos violentos da politicaexterna, cuja teoria se acha mais desenvolvida e divulgada, exis-tern rarnbem varias distincoes a Iazer. Por instrumenros viol en-tos entendern-se aqueles que exigem 0recurso

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    17/94

    Josf~6,IvET I)E l\IAGALl-JAESb) Diplomaciac) Medi

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    18/94

    Josj~CALVET DE JV IAGALIIAESmensageiros ou enviados. Segundo Numelin "a idcia internacio-nal, ou pelo menos inter-tribal, e t~10velha como a existencia decomunidades politicas indepcndenres, quer sejam trihos primiti-vas ou antigos Estados - cidade ou imperios-. E prossegueainda: Quer as causas das relacoes inter-tribais proven ham deconsideracoes utilitarias Oll de ideias de magia ou reiigi,lo,parece certo que ate 05 selvagens tern necessidade de manterrelacocs pacificas entre si, uma necessidade habitualmente maisforte do que aquelas tendencias retardadoras que levam ao 150-larnento e a uma atitude hostil em relacao a tribes ou povosestrangeiros. A razao para 0 tratamento -diplomatico- dos men-sageiros ou enviados deve, provavelmente, encontrar-se namesma ideia que deterrnina a atitude dos selvagens em relacaoa hospitalidade e ao tratamento de estrangeiros em ocasioesespeciais: pensa-se que os rnensageiros e arautos estao deposse, nao apenas de um tabu protectivo, mas talvez, igual-mente de um poder sobrenatural que seria fatal violar, A sacra-lidade dos privilegios do enviado primitivo deve tambern seratribuida as caracteristicas cia sua missao. Mas as Juncoes e pri-vilegios que the estao ligados derivam das necessidades ele-mentares das sociedades selvagens. Aqui, como em muitosOLJtrOS cases, religiao e magia influern com a sua forma e apoio,assim como as 5ll

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    19/94

    JOSE C A L V E T DE MAGALHAES

    da diplornacia: "A paz e 0 sell contrario (ou seja, a guerra)dependem dos embaixadores, pOis sao estes ultimos que criame separam os aliados. Eno sell poder que se encontrarn os nego-cios que provocarn entre os reis a paz ou a guerra-tv.

    As referencias mais significativas acerca do usa de interrne-diaries au negociac1ores em documentos da antiguicladc orientalsao talvez as que se encontram nos Iivros historicos do VelhoTestamento, especialmente nos Livros dos juizes, nos Livros deSamuel, nos Livros dos Reis enos Livros dos Macabeus, com-preendendo a epoca que vai do seculo XlII ao seculo III antes deCristo.

    Apesar destes livros serern rnuito mais ricos em referenciasao uso da violencia e estrategia militar ao relatarern as relacoesclo povo hebreu com os outros povos, nem par isso deixam dernencionar algumas instancias em que 0 povo hebreu recorreu apratica de negociacao, atraves de mensageiros ?u enviados.

    No Livre clos .Tulzes, por exernplo, refere-se que jeptaenviou mensageiros para negociar com os Amnomitas 2(J e noLivro Segundo de Samuel diz-se que Abner, que controlava acasa de Saul, enviou mensageiros a David para negociarern e ter-minarern com as diferencas existentes entre as casas de Saul ede David 21.

    Urna referenda deveras interessante e slgnificativa e aquelaque e feita no Livro Segundo dos Reis a um mensageiro do reiassirio Senacherib (705-681 a.C.) enviado ao rei da Judeia Hese-kiah (716-687 a, C.) para Ihe proper a submissao ao rei da Assi-ria. Nao se podera dizer que este mensageiro, um alto oflcial dacorte do rei assirio, fosse um negociador 01.1 um mensageiro depaz pois a sua missao era de intimidar ou constranger 0 rei dajudeia levando-o a submeter-se ao seu soberano invocando 0sell superior poderio militar. Tratava-se, neste caso, de verdadeirapressao rnilitar e nao de negociacao ou diplornacia. As palavras

    I') lo is d e M an oll. t ra d. d e E lrnannovi tc h, 1913 . cap, VII, Roi, 64; citado in Histoirde III D i pl om a l ie . dirigida pO l ' V, Pot iemk ine. vol , I. p. 26.

    20 [ iura dos [uizes, 11:12,2! Lil'I'OS d e S a mu e) , II. 3:12.

    3 4

    A DIPLO? v !ACIA PUHA

    nrribuiclas pelo Livro dos Reis ao enviado assirio sao, porern, domaior interesse pelo confronto que nebs se faz entre 0metodode negociacao, por urn lado, e 0 metodo militar, por outro,declarando naturalmente a suprernacia deste ultimo. 0 discursodo mensageiro assirio, clirigiclo aos representantes do rei dajudeia que foram ao sell encontro, inicia-se assirn: -Dizei a Hese-kiah: Assim tala 0 grande rei, 0 rei cla Assiria - 0 que te eleltanta confianca? Achas que palavras ocas sao tao boas como aestrategia e forca militar?,,22.

    Nestas palavras se denota 0 reconhecirnento da existenciade uma dualidade de instrumentos politicos: a negociacao, Oll as-palavras ocas-, no dizer do assirio, e 0ernprego cia forca mili-tar, 01.1 seja, aquela antinomia de paz e guerra de que falarn asLeis cle Manu.

    2. Grecia

    1 2 , porern, a partir cia antiguidade classica que possuimosdocumentacao mais abundante e esclarecedora sobre a utilizacaode enviados ou de intermediaries entre as diversas unidadespoliticas.

    A historia grega, em particular, da-nos exernplos hem clarosda utilizacao ampla e generalizada de intermediarios idos deuma cidade a outra para tratarern dos interesses das suas res-pectivas patrias.

    Estes interrnediarios, que nas traducoes modernas sao cha-mados embaixadores, eram pessoas de elevada posicao, nota-veis, e, pOI' conseguinte, pessoas geralmente de ielade rnadura .A palavra grega para designar um enviado, um ernbaixador,usada geralmente no plural (pois no sistema grego as embaixa-das eram colectivas), era p resbeis. N o singular ernpregava-se apalavra presbeutes , derivada do verbo presbeuo, por sua vez cle-rivado de presbus . Mas esta forma singular cia palavra e usada

    2 2 L i 'L ' /' O d os R ef s. II. 18;19.

    35

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    20/94

    antigos como Esquilo e Aristofa-desras palavras, presb eis au presbeutes, era 0

    -pessoa notavel- a que andava tam-bern ligacla :1 ideia de ancianidade com os privilegios a ela Iiga-dos. LIma ernbaixada, ou seja, uma rnissao clesempenhada porpresbeis , era urna presbeia ou uma -rnissao de pessoas notaveisOll veneraveis-s"

    Em Arenas os enviados eram designados pelo povo, emprincipio entre todos os atenienses, mas algumas vezes 0Senado,por delegacao especial, escolhia uma parte 01.1 todos os rnembrosda missao. Em Esparta a escolha dos enviados era feita peJoseforos ou magistrados que presidiam a assembleia. 0 nurnero deenviados por cada missao era, em Esparta, geralmente de tres.Em Arenas as missoes cram compostas, geralrnente, de tres,cinco ou dez enviados, Os enviados estrangeiros deviam apre-sentar-se em Arenas perante 0Senado. Erarn recebidos primei-ramente pel os pritanos Oll delegacao do Senado, Apresentavamentao as suas credenciais e expunharn a seu mandata. 0Senadoapresentava depois a missao perante a assernbleia do povo aqual a missao expunha novamente 0 seu mandate. Seguia-se uminterrogatorio e uma discussao ou debate, findo 0 qual os envla-dos se retiravarn a fim de se proceder a votacao, A resposta daassernbleia era-lhes depois cornurucada o.

    Dado 0 procedimento descrito, os enviados deviam, pOl'conseguinte, possuir qualidades oratorias e por i5S0 tais envia-dos eram escolhidos frequentemente entre os oradores rnaisreputados de uma cidade. Dai a designacao de orator que vemosaplicada a estes enviados na epoca rornana, juntamente com adesignacao de legatus e nuntius , como veremos mais adiante.

    25 Darernberg, Sagllo e Pot tier , D ic tiu nn ui re d es (II/tiqlliles G r ec qu e s e t N o ma /l ie s.vol . II! . p. 1025.

    " P. Chant rai re, D ic tio n n aire e tym olo giqn o d e la lan gu e g re cqu , Paris, 1974,romo Ill.

    Os escritores gregos da epoca rornana, como Pollbio (c. 208-c. 126 a.C.) rraduzemas pulavrus lut inas Lega t i e le galis - signiflcando enu iado s e e nu ia tu ra a u e m lr ai xa do -

    res e c m b a i x a d n - por p r e s b e i s e p r e s b e i a respectivarnenre.1;Darernberg, Saglio e Pot tier , ob . c i t . . col . III, pp. 1027-1029.

    36

    A DIPLOIVIACIA PT)RA

    Uma das principals fontes que possuimos para 0 estudo dode intermedbrios ou embaixadores na Grecia antiga e,

    Tucidides (c. 460-c. 399 a. C.). Na sua H is toric c iaG uerra do Peloponeso Tucidides refere-se frequentemente acnviaturas e a enviaclos que uma das cidades-Estado cia Greciaenviava a outra para tratar de assuntos de interesse comum oureciproco, geralmente para celebrar pactos de alianca pois ascidades gregas digladiavam-se frequentemente em lutas de hege-monia.Percorrendo a obra de Tucidides depararnos com repetidasalusC)es a enviados 01.1 ernbaixadores. Assim, durante a disputaentre a Corcira e Corinto, no seculo V antes de Cristo, a pro-posito de Epidamus, colonia cla prirneira, disputa que estevena origem cia guerra do Peloponeso, arnbas as cidades procu-rararn obter 0apoio de Atenas enviando-lhc embaixadores noano de 43 8 a. C. Os enviaclos de arnbas as cidades forarn ouvi-dos na assernbleia de Arenas onde pronunciaram longos dis-cursos defendendo as suas respectivas causas, apos 0 que aassembleia se reuniu a s6s para deliberar sobre qual 0cursoa tomar=.Pelos anos 445 a' C. Corinto e outros seus aliados enviararnembaixadores a Esparta a fim de se queixarem dos abuses come-tides par Arenas e convencerem os Laceclem6nios a entrar emguerra com os atenienses. Falaram os enviados na assernbleiasendo 0 ultimo a falar um representante de Corinto que pro-nunciou um eloquente discurso para estimular os espartanos aaccao-". Escreve Tucidides: "Mas aconteceu que estava presenteem Lacedem6nia uma embaixada de atenienses que tinham idopara outro assunto e quando ouvirarn os varios discursos consi-derararn aconselhavel aparecer perante os lacedernonios, naopara fazer uma defesa das acusacoes dirigidas pelas cidades, mastornar claro, em relacao a toda a questao a ser debatida, que oslacedem6nios nao deviarn decidir predpitadamente mas c1eviam--~(~ Tucidid~~ , H isto ry o f tile P elo ptn tn es ia n IV (/ I' . W. Heinemann, London - HarvardUniversity Press. Cambridge , vol , I. pp. 57-79.

    17 Oil. cit, pp, 109121.

    37

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    21/94

    JOSE CALVET DE MAGALHAES

    tomar mais tempo para decidir->. Tendo solicirado para serernouvidos na assembleia foi-lhes acordado essa faculdade e, apos 0sell discurso. a assembleia reuniu-se novarnenre para deliberarrevelando-se uma maioria contra as atenienses e favoravel iidecla-racao de guerra contra Arenas. 0 rei dos lacedem6nios, Arquida-mus, que segundo Tucidides era um -hornem reputado pOl' sagaze prudente- pronunciou entao um discurso para 0 qual HaroldNicolson j{l chamou anteriormente a atencao pela defesa que nelese faz da utilizacao previa da negociacao antes de se embarcarnuma empresa militar-v, Depois de fazer uma analise das possibi-lidades militares de Esparto e de Arenas e das consequencias deuma guerra longa e generalizada, Arquidamus conclui: -Nao vosaconselho, naturalmente, que suporteis cegarnente que ataquern osnossos aliados e que consentais que as suas (dos atenienses) con-juras m10 sejarn desmascaradas, mas que adopteis a seguinte ati-tude: Nao tomeis armas ainda, mas enviai-lhes mensageiros apre-sentando queixas, nao indicando claramente se entrarnos emguerra OLl aceitamos a sua conduta; entretanto principiernos, tam-bern, os nossos preparatives, em primeiro lugar procurando alia-dos para a nossa causa, barbaros ou hebreus, na esperanca deobtermos, de qualquer parte, recursos adicionais em barcos oudinheiro ... ; e, ao mesmo tempo, procuremos desenvolver tambemos nossos proprios recursos. E se des derern satisfacao aos nossosembaixadores, tanto melhor: mas se nao derem, num Iapso de doisou tres anos, deverernos estar finalmente melhor preparados paraos atacar, se assim 0decidirmos. Ou talvez aconteca que desquando virem os nossos preparatives e que as nossas palavras lhescorrespondem, inclinar-se-ao mais a ceder, porque a sua terra C011-tinuara a nao ser devastada e as sum; deliberacoes respeitarao ascoisas que continuam a pertencer-Ihes porque ainda nao forarndestruidas. Nao considereis, pois, a sua terra outra COiS~lque naoseja 0 penhor que nos dorninamos, e um penhor tanto melhor equanta e melhor cultivado, Deveis, portanto, poupa-Ia pelo maiortempo possivel, em vez de os fazer desesperados e passar a tel'

    2" /d" fl. 121.2'1 Harold Nicolson. Dip/oml lcy. Oxford Uni \' er~i ty P ress. 1969. pp. 17-Ul .

    3R

    A DIPLOi\lACIA PUHA

    um adversario mais dificil de tratar. Pois se, scm uma preparacaoadequada, compelidos pelas queixas dos n0550S aliados, devasta-1110S 0 seu terrltorio, atencao, nao varnos entrar num caminho queresultara antes em desgraca e dificuldades para 0Peloponeso. Por-qLle as queixas, na verdade, quando apresentadas por Estados ouindividuos poclem possivelmenre ser rernediadas, mas quando umainteira confederacao, para defesa de interesses singulares, iniciauma guerra de que nenhum homern podera vel' 0desfeeho, nao epossivel termina-la com honra. E que ninguem pense que seja porcobardia que muitos Estados hesitarn em atacar uma so cidade.Porque des tambem tern aliados, nao menos numerosos que osnOS80Stributaries; e a guerra e uma materia nao apenas de arrnasmas tarnbem cle dinheiro porgue e 0dinheiro somente que tornaas armas utilizavels, especialmente quando urna potencia conti-nental confronta uma potencia maritima. Procurernos, pois, obterprirneiramente 0dinheiro em vez de deixarrno-nos arrastar pre-maturamente pela eloquencia dos nOSS08 aliados; e assim comosomes nos a sofrer a rnaior parte das consequencias, boas ou mas,assim nos seja permitido sermos n6s a, calmamenre, procurar pre-veni-las, E, por conseguinte, nao vos envergonheis pela lentidaoe dilacao de que des (os aliados) nos censuram mais, porquepressa no corneco pode significar dernora no aCa1X11',porqueentrastes 11aguerra sern preparacao-w. E, terminando, Arquidam9sdiz ainda: -Enviai mensageiros aos atenienses para discutir aques-tao de Potideia e tambern os cases em que os nossos aliadosdizem terem sido prejudicados. A principal razao para assirn pro-cedermos e que des estao clispostos a submeterern-se ii arbitra-gem e nao e legitimo proceder coI1yal,Jmapessoaqueofercce.a.\arbitragemcomnse.fosse um culpado, Mas, entretanto, prepa-rai-vos para a guerra. Esta decisao sed. a melhor para nos e aquelaque inspirani maier receio

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    22/94

    Jost: CALVET DE MAGAUrAES

    Um dos eforos, ou alto magistrado que presidia ;1assernbleia ,insistiu porern na declaracao de guerra aos atenienses e tendo aquestao sido submerida nova mente a votos, a maioria pronun-ciou-se a favor cia guerra, nao fazendo atencao ;ls prudentes pala-vras do seu rei Arquidarnus. Desta decisao resultou a guerra doPeloponeso e 0consequente engrandecirnento de Arenas.o discurso de Arquidamus de que citarnos urn longo trecho,constitui de facto urn notavel exernplo de defesa cia negociacaoatraves de intermediaries ou ernbaixadores, para resolver umconflito entre Estados vizinhos. Nele se fala inclusivamente emarbitragern, um metodo de resolucao de conflitos internacionaisja bastante sofisticado e que so nos tempos modernos recebeu asua consagracao pelo direito internacional, Os greg os cia idadeclassica, tinham, portanto, uma concepcao bastante precisa ciautilidade do rnetodo diplomatico, ou seja, do uso de intermedi-arios para, atraves da negociacao, procurarem resolver os con-fli tos que surgiarn entre as diversas cidades gregas e promove-rem as relacoes pacificas entre elas. Tucidides,

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    23/94

    JOSE CALVET DE MAGAlJI;\ESpela ignorancia Ott a ma-fe. POl' cima de tuclo. quando a coisae resolvida e parece agora como util, torna-se necessariodar tempo para se cncontrarern os meios necessaries para se darexecucao ao que foi decidido, Aquele, pois, que priva daqueletempo um regime como 0 n0550, nao nos rouba apenas 0tempo, mas rouba-nos, pura e simplesrnente, a capacidade depoder agir- j5.

    Dernostenes fala -nos das ordens do dia especiais da assem-bleia ateniense para discutir os assuntos relatives a -arautos eembaixadores-. Os arautos cram os rnensageiros de guerra,enquanto os ernbaixadores eram os mensageiros cia paz. Na Gre-cia antiga os arautos exerciarn um cargo permanente enquantoque os embaixadores exerciarn cargos temporaries. Os ernbaixa-clores, por outro lado,eram negociadores que podiam discutiros assuntos de que eram incumbidos de tratar, enquanto que osarautos erarn simples mensageiros, transmit indo apenas mensa-gens sobre a conducao das operacoes militares.

    3. Roma

    Muitos autores pretendern que os rornanos se nao interes-savam particularrnente pel as artes da negociacao preferindo aestas as artes da guerra. Harold Nicolson afirma mesmo que osrornanos -nao eram dotados com qualquer aptidao especial paraa arte de negociacao e durante os muitos seculos da SUfi supre-macia os seus metodos foram os do Iegionario e do construtorde estradas de preferencia aos do diplomata. Visto a pior luz,foram impiecIosos nos seus objectives e brutais nos seus meto-dos. Vistos a luz mais favoravel, desenvolverarn 0 principio deaniquilarern os seus mais obstinados adversaries poupandoaqueles que se lhes submetiam, A contribuicao romana para adiplornacia deve procurar-se nao na area da negociacao mas simnaquela do direito intemaclonal-w.

    ,I, fer. p, 82,I > Harold Nicolson, 011, cit., p, 9,

    42

    A D1PLOivlAClA PURA

    nosso ver, de uma visao historica um tanto exa-pois os romanos, ernbora construtores do maior imperio

    antiguidade e ernbora com qualidades guerreiras notaveis,frequentemente a negociacao c nao andaram envol vi-

    em mais lutas de hegernonia com os povos vizinhos do queatenienses e os outros povos da antiguidade. A predorninan-cia da estrategia militar sobre a negociacao nao foi, pois, uma

    caractcristica ripica dos rornanos pois a encontramos na historiapovos da antiguidade oriental e na Grecia antiga, como os

    documcntos historicos dessas epocas abundanternente demons-tram. Simplesmente, Roma construiu 0 maior imperio da anti-guidade e a farna clas suas legioes obscureceu em parte muitasoutras das suas actividades.

    Em Rorna existia ate uma tribuna especial, junto do Capito-Iio, charnada G r ae co st a sis que, segundo refere 0 poligraforomano Marcus Terencius Varro (116-27 a. C.) era 0 local ondeos ernbaixadores dos paises estrangeiros e clas provincias aguar-davant as suas audiencias com 0Senado, Nos finais cia Republicafoi adoptado 0 sistema, formalmente autorizado pela Lex Cabi-n f a . de consagrar 0 mes de Fevereiro para os contactos entre os eernbaixadores e 0 Senaclo. Numa data que se nao conhece 0Graecostasis foi transferido para 0 Forum, junto do temple deSaturno, Durante () Imperio nao se ouve rnais falar do Graecos-t asis e a instituicao parece tel' caido em desuso v.

    Em Roma as embaixadas eram designadas pelo orgao politicoa que competia a suprema direccao da politica do Estado. Namonarquia rornana os ernbaixadores (legati) eram designados peIorei', na epoca republicana as ernbaixadas erarn designadas peloSenado sob proposta do magistrado que presidia a essa assern-bleb; na epoca imperial e 0imperador que designa as embaixa-das. Seguindo 0exernplo grego as ernbaixadas sao em regra colec-rivas, compostas de dois a dez ernbaixadores com urn presidente( pr in ce ps l eg at io ne s) : Os embaixadores cram sernpre escolhidosentre os cidadaos mais notaveis e tratados com todas as honras.

    ,7 David june Hill. A H is to r o j D tp lo m ac ill the ln te rn atio na l D err!op me ll/ o jEll rope, Londres, 1

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    24/94

    JOSE C AL VE T D E M A GA LlIA ES

    Os romanos recebiarn embaixadores dos paises a que reco-nheciarn 0jus legation is, 0que excluia os povos submetidos eas colonias, Os embaixadores dos povos arnigos eram recebidosem Roma com grande magnificencia e alojados em edificiosespedais na villa pliblica, situada no Campo de Marte. Recebiamalojamento gratuito (focus) e magnificos presentes (lautia) eeram tambern convidados aos espect{lculos publicos. No dia emque 0 assunto que os trazia a Roma devia ScI' tratado no Senadoeram conduzidos ao Graecostasis e depois recebidos em audien-cia pelo Senado. Depois de exporern 0seu mandate eram des-pedidos com todas as honras e acornpanhados a fronteira porum questor.A designacao corrente nos autores romanos aplicada aosenviados ou embaixadores e legatus, sendo uma ernbaixadaclesignacla por legCltione. Ha que ter cuidaclo, porem, em distin-guir estes legati, ou embaixadores de povos estrangeiros, doslegati municipals ou provincials que eram os representantes dascidades enviac.los ao Scnado romano ou os representantes de umconsilium provincial ou dieta constituida pelos representantes demunicipios de uma mesma provincia. Outro tipo de legatus eaquele constituido pelos sub-comandantes das legioes, cargopuramente militar".Os simples mensageiros ou portac.lores de uma mensagemeram charnados nuntii.

    As designacoes de legatus e nuntius encontram-se referidasabundantemente nos escritores classicos rornanos, como TitoLivio, Cicero e Cesar, atestando 0uso frequente de negociado-res nas relacoes de Roma com os outros povos-". Em Tiro Livio,

    :IH 0 Dicttonnaire des ali i/qu i/us GrcclJues et Romaines. de Daremberg, Saglio e Pottier, indica catorze significaclos difcrentes para a palavra legOl/is (Vol. TIl , P: 1064).

    3~Tiro Livio, Htstoir Romaine, Les Belles t.etrres, Par is , 1944: , li tr imque l egat i f er e. ,. " ( Li v. l,XXII, Tom, 1, p. 35 ; "l.eg~!tos quique ad s ollic ltan du m L atiu m passim dimlttunt, ,, " ( Liv u. XXII, Tom . II, p. 33); "Aquikiensiulll le ga tis .,," (Liv , X l.lII, I, Tom, XX")Gi ,p. 2); "Decernunt f requcntes, ut C. Sulpicius praetor t ris ed scnatu norninet legatos(Liv . XLI II , I , Tom. XXXII, p. 3); -Pe r i dem tempus quinque leguri ad regem mlssi , quires in Macedonia aspu.erent- (Liv. XU!' VI , Tom. X XX I, p . 5 3) ; ..L eg ate s item mittcndmin Afrieam censucrunt, eostlt:Jl1 Carti1aginclll, eosdem in Numidian ad Masinissam;

    44

    A DIPLONIACIA PURA

    Ovi,dio e Virgilio encontramos tarnbem a designacao de OI'(/tOI'apl!ca(.h~ .aos ernbaixadores, reminiscentes da tradicao gregatransnlltJda aos rornanos de designar como embaixadores pes-.5.oa:CO~l reconhecidos dotes oratorios, au mesmo oradores pro-flsslonms, pais teriam que se dirigir as assernbleias politicas paradefenderem a causa das suas respectivas patrias!".Sao pa~ti~ularmente importantes as passagens de Cesar quese referern a inviolabilidade dos embaixadores revelando 0con-ceit~ que os antigos tinham desse principio. Tendo os romanosel,wlado diversos emissaries junto dos Venetos, em busca detng~ para cornprarern para as suas tropas, este povo altivo, quehabitava a orb maritima da Bretanha aprisionoi I I, c I a guns c essesenviados, Cesar ao saber do acontecido resolveu imediatamenteatacar os Veneros acusando-os de terern cornetido um crimeinqualificavel. Com efeito pergunra Cesar: ,N~10prenderarn elese c:rregaram de ferros os ernbaixadores, funcao que todas asnacoes consideraram sempre como sagrada e inviolavel?-!'.

    Depois de os tel' vencido, Cesar decidiu punir severarnente osVenetos dizendo que 0fazia "para que no futuro os barbaros fossernmais respeitadores dos direitos dos embaixadores- ( ju s l e ga t or um r .(Jjv XXXI IX Tom X A'1 p I") C " c"......' . - icero, o II rrcspo 11 dun ce. Les Bdle s Lett re s, Par is .193): -Crassus tns legates decernrt nee excludit Pornpciurn , .. " (XC IV - A L' ITom) 127)" (/1/11 11,\., _, p. ,- Cesar, Bel lu m Gal ltcnm, Les Belles Letrres I"11'1's 17" Le aros I. 1; , ,., " _< " g..:l os [l(D um no rig cm H uc du um mitrunt c . " (Liv . I IX Tom I P 8)' H ' 'I' I'I .,.," .Jet til .. e {J~1 t {_) s ad Cae -sarern nutrunr .. (Liv. I, XI, Tom. l, p. 9); .... Legali Helvctii ,.," (!.iv. [,"'XIV. Tom. I,p. 11); ' .. ca d Ariovisrum legato;; mitteret ..." (Liv I XXXIV Tc [~7) .e tiarn ad eas iv ir , . I> " . >. .... ' 'l1l., p, -; -Mi t tuntur. c II.Hes egan, quae sunt citenons Hispanie f initimue Aqultanie- (Liv, Ill,XXlII, Tom. l~ p. 90): " , .. Lcgatos ad Caesarern miserunr ... " (Liv, VI, XXXIl , Tom, 11p, 198); -Legationes III omne s par te s c ir cu rnmi tu ruur " ." (Liv, VII, LXlll, Tom. II, . 2')6):' ,. , Legat i a b Arverni s "(I." V Ir ,)_s ') . . P . ," " . ,_ ' ..... , 1\. .' p. _I ; " ... Legat iontbus Remorum ... . (Liv, V!I l, VI.!m II, p. 28)); "... dJJl11SSIS nuntiis .. "(Liv V XXXIX 'fa III II P 1"8) D' .. It", . . " , .,..,;" ututtit ae ini-t unas CIv ita tes nun ti os Caesar . .. ' (Li v, V I, XXXIV Tom II )00'), ., p. - .

    ;0 Tiro Liv io, H i st oi r R om a tn e . Les Bel les Lcrtres Paris 1944 To 1 II L" IIXXXIX _ . . ' , , n. , 1\, ,, " p. )9: -. . . mlSSlCjUCde pa ce ad Marcium oratores atrox responsun r et tul erun t . .. . ;= : MI!/amorphosis, Liv. IV; -Ergo tarn placidas orator rnis sus ad aures-: Virgilio,At ueida, L1v.II , - Iamque orarores aderant-.

    11 Cesar, Bellum Gallicam, Les Belles Lettrcs, Paris, 1972, Tom. I , L iv. 1 lI , IX, p , 80," ,LCga~os,. quod n~men ad omnes nationes sanctum Inviolatumque semper fuisset,reren tos ab se e t In Vincula coniectos .....

    '12 Ob. cit., Tom, I Liv, HI XVI 8-' I . > " . ,. , ' "p.). "Ilques eo gr.tvlLls Caesar vlntllCandum sta-lUll, quo cllhgemllls in reliqulIm tempus a barbaris jus legatorom conservarctlll'".

    45

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    25/94

    JOSE C A LV E T D E r vIA G A LI IA E SEstas passagens mostram claramente que os rornanos considera-yam a inviolabilidade dos ernbaixadores urn principio funda-mental que fazia parte do direito das gentes. ou seia, do patri-m6nio dos povos civilizados. e 0 seu desrespeito tim crime forado conium mesmo entre os barbaros,

    Tal como na Grecia antiga as tentativas de negociacaodirecta, sern 0usa de intermediaries au legati, sao rams entre asrornanos. Referimos apenas como um exernplo ilustrativo umatentativa de negociacao directa Ieita pelo pr6prio julio Cesarquando comandava as operacoes net Galia. Os Germanos,comanclados pelo seu rei Ariovisto, ameacavarn frequentementeos povos da Galia atravessando 0Reno. Cesar pensou que pode-ria demover Ariovisto a abandonar a sua politica agressiva con-tra os povos gauleses e os proprios rornanos seus protectores setivesse uma entrevista pessoal com cle. Para 0efeito enviou-Iheemissarios e depois de dificultosas negociacoes os dois chefesencontrararn-se finalmente face a face, com algumas precaucoestornadas por ambos os lades com receio de uma emboscada.A conferencia resultou numa autentica conversa de surdos emque cada urn manteve os seus pontos de vista nao fazendo qual-quer caso das razoes da outra parte. A conferencia fracassounatural mente e Cesar enviou embaixadores a Ariovisto que esternandou prender; seguiu-se a guerra de que, Cesar, rnais umavez, saiu vitoriosoo.

    4. Idade MediaA queda do Imperio romano proVOCOLlna Europa ocidental

    uma nova situacao politica que nao se baseava verdadeiramente emEstados mas em senhorios feudais rnais ou menos dependentes doImperador ou do Papa. 0 uso cia diplomacia eleclinou bastantenum tal quadro politico durante largo tempo confuso e ca6tico.o Imperio bizantino uti!izou, porern, grandemente a diploma-cia de preferencia a guerra. Nos seculos VIII e IX os imperadores

    4. 1 /(L. Tom. I. Liv. I, XXXIII-XLVII, pp, 26-'10.

    4 6

    A DlI 'LOl'vL~CIA PURi\

    enviavam frequentemente representantes, geralmcntealtos dignatarios da corte, ao Papa e aos monarcas frances. espe-

    Pepino-o-breve e Carlos-o-Magno+' . Segundo HaroldNicolson "a diplomacia tornou-se um estimulante em vez de anti-doto da ambicao e loucura cia humanidade. Em vez de coope-racao, procurava-se a desintegracao, em vez ell' unidade, rup-tura: em vez de razao, tinha-se astucia, em lugar de principiosmarais usava-se habilidade. A concepcao bizantina de diploma-cia foi transmitida a Veneza, e, dessas fetidas lagunas atraves detoda a peninsula italiana, A diplomacia na Idade Media tinha urnsaber predominantemenre Italiano, e na verdade bizantino, E aesta hereditariedade que ela deve, na Europa moderna, muito ciasua rn a reputacao-:'>.

    Duas observacoes merecern estas palavras de Nicolson: emprimeiro lugar, apesar do seu vee mente e insistente cornbatecontra a confusao correntemente feita entre politica externa ediplornacia, nas palavras referidas e evidente que Nicolson nosfala cia diplomacia bizantina no duplo sentido da politica e doinstrumentow; em segundo lugar, Nicolson poderia ter acrescen-taclo que a diplomacia bizantina foi igualmente herdada pelaRussia, a grande herdeira cultural de Imperio do Bizancio,

    Existe um relato porrnenorizado de uma ernbaixada enviadapelo imperador Otao I (912-973) ao imperador de Constantino-pia, Nceforos, com 0 objective de obter a mao cia princesa Te6-fano, filha do anterior imperaclor, para' seu mho, 0 futuro OtaoII (955-983). 0 encarregado desta missao foi 0 bispo de Cre-mona Liutprando que, no relatorio que legou a posteridade, des-creve em porrnenor os habitos da corte de Constantinopla e a

    +1 Francois D

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    26/94

    JOSE CALVET DE MAGAUIAES

    forma arrogante e por vezes insultuosa como 0ernbaixador doimperador ocidental foi tratado, Trata-se de Ulll documentoextremamente interessante e que revel a 0 estilo oriental de tra-tar os emissaries de paises estrangeiros e que se conservou scm-pre atraves das epocas e que se resumia em ver em todo 0emis-sario estrangeiro urn espiao e de sentir a necessidade de 0humilhar acentuando a superioridade do pais onde se encon-trava ,p.William Thayer, que serviu como diplornata na Russia eem varies paises do Oriente nao deixa de evidenciar 0 parale-lismo da experi2ncia de Liutprando em Constantinopla noseculo x, com muitos aspectos hodiernos do tratamento dosdiplomatas em paises orientais+.

    Na medida em que 0 poder temporal do Papa se desenvol-via, a Igreja utilizava em grande parte 0 sistema de representa-cao utilizado anteriormente pelas autoridades seculares. As rela-~oes intricadas entre 0 Papado e 0 Imperio de Bizancio leva ramiriacao de uma representacao papal, quase permanente, emConstantinopla. Esta representacao era assegurada por enviadoscharnados apocrisidrios que, etimologicamente significa -respon-save is" e que erarn definidos como -enviados- ou ..encarregadosde uma mi8S8.0" . Segundo alguns autores existiam apocrisiariosde Roma junto da corte bizantina clesde 0 inicio do seculo IV cianossa era; outros autores afirmarn, porern, que tais representan-tes surgiram apenas nos meados do seculo V, no tempo do PapaS. Leao OLl Leao Magno (440-461), sendo imperador Marciano(450-457); outros autores, ainda, sustentam que a instituicao sur-giu apenas no tempo do imperador Justiniano (483-565) e preci-samente no ano 536, quando 0general bizantino Belisario con-quistou Roma. Parece nao haver duvidas, porern, que a instituicaoexistia ja a partir do seculo v 49. A epoca de rnaior esplendordo apocrisidrio romano em Constantinopla decorre dos meados

    ,17 De Legattone COllstalltinopoliionoe ed, Dummler Berlim, 1879; idem ed. Pertz inMUIIIII/wltia GenlulJIiwf Historica, t. H.

    iK Char le s W. Thayer . Dip lomat, Greenwood Press, Wes tpor t, Connec ti cu t, 1974,p. 43 e pp. 49 e segs.

    ,,9 Mario Oliveri, N atura e IUHZ /OI l ! d e i l eg at t pontiftci nella s to r ia e ne l contestoe cc le si ol og iC O d el V at ic an o 11.Marietti, Turim, 1979, pr. 7475.

    48

    A DIPLOMACIA PURA

    do seculo VI aos meados do seculo VII. A Igreja de Roma man-teve tambem apocrisiarios junto cia corte dos Frances a partir ciaconversao de Clodoveo ou Clovis em 496 e em seguida ~lspre-dicacoes de S. Rernigiov'. Concomitantemenre com a existenciadestes apocrisit trios a Igreja romana utilizava outros represen-tantes, enviados a corte imperial OLI aos concilios, a que cha-maya legati, segundo a designacao romana. E assim que 0 PapaLiberio 052-366) envia ao imperador Constancio do is lcgados noano 353 e no ana seguinte envia-lhe outros lcgados seus.Durante 0 pontificado do Papa Leao Magno partiram de R0111anurnerosas Iegacoes para Constantinopla. Na epoca do PapaNicolau I(858-867), os Iegados papais sao frequentes e gozarnde rnaiores poderes, Com Gregorio VII 0073-1085) surge urnanova epoca de actividade diplomatica cia Igreia de 1\0111

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    27/94

    .10SI~ CALVET DE IvlAGALlIAES

    Durandus, no sell Speculum iegatol'llJll, do seculo xm, defineiegatus como 0 representante de uma parte enviado a outra, eacrescenta que os n u n ti i s:10 tambem chamados lega t t . Se nostempos romanos a distincao entre legatus e n u n ti us parece clara(0 legatus e 0enviado e negociador eo nuntius 0simples men-sageiro), na Idacle Media e dificil distinguir entre um e 0outro,o mesmo acontecendo com outras designacoes como a de p r o-curator.Esta ultima designacao foi introduzida na linguagern oficial,para designar um enviado de urn rnonarca a outro, como con-sequencia do renascimento do direito romano operado noseculo XII. 0 pr o c 11ra tor Oll procurador era um instituto dodire ito civil romano que corresponclia ao representante legal deuma pessoa para tratar com outra e que pressupunha a existen-cia de urna procuracao ou pi e n a p ot es ta s, Existe evidencia douso de plena pot est as por enviados de Veneza na segundametade do seculo XIl5'i, Tal uso tornou-se corrente antes do finaldesse seculo . Encontramos, com efeito, no instrumento dematrimonio do rei D, Diniz com D. Isabel de Aragao, dataclo de1282, a designa

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    28/94

    josr CALVET DE ?vlAGALlIAESdatados de 1198 e 1199, mas a designacao comecou a dtfundir-seapenas no seculo seguinte. Nos arquivos de Veneza e GenovaS,,[O frequentes as referencias a ernbaixador em docurnentos doseculo XIII. Com 0 maior emprego das linguas vernaculas nosdocumentos medievais comecararr; a adoptar-se diversas formasvcrnaculas cia designacao latina a m b a xi a . t o r ou a m b a c t i a to r ,Existern clocumentos franceses ci a seculo XII que contem a formafrancesa ambasseu r (ill atnb axateur. Em Inglaterra o primeirouso conhecido da designacao e atribuido a Chaucer escrevendopOl' volta de 1374110.

    Em Portugal encontra-se a designacao de emb aixa dor numdocumento de D. Fernando clatado de 25 de julho de 1382. Emdocumenros posteriores, ja no reinado de D. Duarte, datados de1436 encontram-se tarnbem referencias a funcao de etn b a ix a-dor, Na Cr6nica de D. Fernando, escrita entre 1436 e 1443, Fer-nao Lopes emprega as designacoes de ernbaixador, mensageiroe procurador para designar as enviados dos monarcas e nalgunscases chama tambern ernbaixador aos proprios legados papaisw.o uso entre nos cia designacao embaixador deve tel' principiadopor influencia dos clocumentos papa is recebidos nas nossaschancelarias. E assim que a bula de Bento XX, Saudem u s e t Exu l-t amus . de 30 de Abril de 1341 se refere a Martinho, bispo deEvora, a Lopo Fernandes e a Lourenco Gomes de Abreu como-Ambaxiatores et nuntii tui . . (Afonso 1\1)65.

    Sabre a etimologia das palavras e m b a ix a d o r e e m b a ix a d aoriginou-se grande discussao entre as etimologistas do seculopassado sem que se tenha chegado a uma conclusao definitiva.Admite-se geralmente que estas designacoes provern cla palavrade origem celta 01..1 germanica am ba c tu s que significava vassalo,

    (,II Queller, ob cit, pp. 61-62. A referenda de Chaucer encontra-se em Troilus andC rts ev dc . I F. 14'): Tli aml rass i n l ours hom ansunird [ or [ ia l

    '> I Silva Marques, D e sc o hr im e u to s P o rt ng u es e s. Lisbon, 1944, Vol. I. pp. 418, e ~H9,572 . In formacuo r ecolhida por Edua rdo Bra zuo .

    ,,1 Fernao Lopes, CrrJl l i ca do Senhor R e f Dum Feru ando NUllO R ei des tes R eg IIOS,Civilizucao Editora, Porto. 1966, pp. 9, 10.25.83, 159, 141, 159. 177. 179, 187, 215. 26l,264e 5h

    (,.1 Silva Marques, ob . (II.. p . 66. In forr nacao recolhida pOI ' Eduar do Br azao ,

    A D lP LO [l.IA C TA I'U R A

    servidor, mernbro da cornitiva de urn senhor. 0 filologo romanoSexto Pompeo Festus afirma percmptoriamcnte que a III b a c t 11 Sem lingua celta significava servidorv' e Cesar, falando dos celtas,refere que os cavaleiros tinham ao seu servico a mb a c t o s e tctientes 0que se harmonize com a opiniao de Fesrusv>, Algunsautores sustentam que a forma a JI1 b a c lia do baixo latim naoderivava do a JI1 bu c t us celta mas 5i111do g6tico a n d ba II ti que sig-nificava igualmente servidor. Praticamente todas as linguas ger-rnanicas possuem uma palavra analoga. A conclusao que nosparece mais acertada (': a de Littre que afirma: (' : dificil decidirentre 0 celta e 0 alernao: mas sem duvida nesta circunstiincia,como em muitas outras, 0 celta e 0 alernao possuiam formasmuito vizinhas que vierarn a confundir-se no baixo latirn-w.

    Seja como for, 0 que e cerro e que no baixo latim dos pri-meiros tempos rnedievais se encontram referencias a a III h ax iaou ambactia. Na Lei salica. dos mcados do seculo v, pOl' exern-plo, encontram-se referencias a am baxi a , no sentido de missao=".Num documento carolingio do ano 783 fula-se de um persona-gem que desempenhou uma missao empreganclo-se a expressaoamboxiauit'. Noutro documento de Carlos-o-Calvo, de 877, umadoacao a um mosteiro a pedido cia imperatriz Richildis, 0 nomecia irnperatriz aparece a seguir ao nome do imperador naseguinte forma: Domina Rtchil dls imperuirix ambaxiauit'. Isto

    ' , i S('.'(II /'r)/II/1'1 P es t! D e F

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    29/94

    J OS 1: C AL V ET D E MAGALHAES

    significa que a imperatriz interveio nesta doacao sendo encarre-gada de uma missao a ela ]igada.As deslgnacoes de a III b axi a!missao, e amb axi are, desernpenhar uma missao, foram paisintroduzidas peIos povos gerrnanicos no baixo latim fazendomisteriosarnente carreira ate que nos finais do seculo XI I vemosos documentos dos arquivos de Milao referir ambaxiator comoum encarregado de uma missao junto de um pais estrangeiro,como ja arras referimos. Prova que no seculo XIII a designacaoemba ixador j{t era corrente c certamente preferida pelas autori-clades laicas, vista que legati e n u n t ii cram designacoes adopta-das pelas autoridades eclesiasricas, e 0 facto de se conhecer umacr6nica do seculo XlI (precisamente de 1160) que ao ser revistano seculo seguinte, nessa revisao a palavra legati do texto origi-nal e corrigida para a III b ax a to re s70.

    Nos seculos subsequentes, ou seja, nos seculos xrv e xv, adesignacao de ernbaixador passou a ser de uso corrente paradesignar qualquer enviado, se hem que usada predorninante-mente para designar um enviado de urn pocler laico, pois asdesignacoes de legado e nuncio passararn a reservar-se para asenviados papais, Com 0 renascimento, os humanistas, escre-vendo em Iatim, resuscitararn temporariarnente a designacao delegaius aplicac1a aos enviaclos de um poder laico e tambern adesignacao de orator, cle sabor mais literario, sob a influencia deVirgilio e Oviclio. Bernardo du Rosier escrevendo em 1436, urnpequeno tratado em latim sabre a f 1 . 1 n c ; . 1 0 de embaixador in-titula-o A mb ax ia to r b re uilo gu s, etc.71. Neste caso ainda nao sesentia a influencia do humanisrno que levava a adopcao dasdesignacoes ernpregadas pelos classicos latinos. Em pleno Renas-cimento, Machiavel, escrevendo em 1514 ao seu amigo Fran-cesco Vittori, designado embaixador de Plorenca junto do SumoPontifice, charna-lhe: i 'dClgl1( f 'i cO ora tor i f lorentino Francisco Vttorlo

    co ;l!1!1111t1H'lIla G e ri na n ic a e H t st nr ic u , S cr ip lo re s . FII, pp, 1H6. 20') t 212; l .ink-itunu.p, XXVIII Icitado illQucllcr, (Ii! (II p. (d),

    CI Bernard tit! Rosier. Amhax tan, l) r~ fl l[ )[ i/ IS { lr o" lI fc o / /l ora/ iI /I I! ' d ll ~I l/ (/ '" / "'" 1( '/ 1 'e t p r os jl u/ 'O d u ca to d/'Cil ambaxtntns w,/ . .e nc iu m e xc er pt us in \,\iladilllll' E, Hrub.u , / )"[(gatis et l e ,~ a fi IJ lJ lI ll lS t ra c ta t u s Nl'll I )"rp:!l. 1906, pp. ?,~2H.

    54

    A D lP LO rv lA CIA P UHA

    ap u d SU II/m um Pontifice? -, Mas 0 humanista Etienne Dolet(1509-1546), que morreu queimado em 1546, acusado de here-sia por ter impresso urna traducao de Platao, publicou em Lvon,no ano de 1541, um pequeno tratado intitulado slgnificauva-mente Libel' linus de offic io legati uu lg am bassiatorem uocant.ou seja, . .Livro (mica sobre a funcao dos legados charnados cor-rentemente ernbaixadores ...

    Ate meaclos do seculo XvII nalguns docurnentos oficiais eem quase todos os livros escritos em Latim os ernbaixadores saodesignados por legati is , Mas com a predorninancia (las linguasvulgares as diferentes formas cia designacao ernbaixador, con-soante as linguas, passou a predorninar.

    A partir sobretudo dos seculos x e ),.1 verifica-se uma inten-sificacao maior da actividade diplomatica, ou seja, do emprego, bde intermediaries nos contactos e negociacoes entre monarcas esenhores feudais. Nos ultimos anos da Iclacle Media 0 usa deembaixadores e uma pratica corrente e generalizada. Serb fasti-dioso citar documenracao comprovativa dada a sua enormeabundancia. Bastara percorrer os repositories de documentacaomedieval publicados para se verificar que assim e . '

    Na primeira parte da epoca medieval, dos seculos V ao IX,verificararn-se cases de negociacao directa entre monarcas, cer-tamente devido HO caracter essencialmente pessoal do poderimperial ou real. Mas tais encontros directos entre os detentoresdo poder politico nao excluiarn 0usa dos intermediarios, querpara a troca de correspondencia entre os chefes de Estado, querpara a preparacao e propria conducao clas negociacoes entre osmonarcas que sancionavarn os acordos concluidos corn a suapresenca. Nos seculos seguintes, ou seja nos seculos x a xu, taisencontros foram intensificaclos. Mas em ambos os periodos, amaioria das negociacoes foram conduzidas por enviados repre-sentando os respectivos monarcas?.

    -2 Machlave]. eEl/UN" Completes; Pleiadc, Paris, 1952. pp. 1438 e 5egs.c , Garrett M llt tingly. ob . cit: p . 26 ,7,. I'rancols L Ganshol. L e MOY l' 1 l AR e . in H ts to ir e d es R e la /i ol lS I nt er na ti ou nt es dirig.

    por Pierre Rcnouvin, Tom. I, Hachette, Paris. 1953, pp. 31-> 120.121.

    55

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    30/94

    .I0S[~ CALVET DE i\IAGAUrAES

    Urn experimentado diplomata do periodo de transicao ciaIdade Media para os tempos modcmos, Philippe de Comrnynes(c. 1447-1510, apercebendo-se dos riscos e inconvenientes dosencontros directos entre monarcas, pronunciou-se eloquente-mente contra des nas memorias que nos legou. Nessas memo-rias, que sao uma fonte imporrante da historia da Franca e daEuropa, Commynes declica um capitulo especial

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    31/94

    JOSE CALVET DE M A G A L H A E SNeste ultimo ano havia igualmente urn embaixador residente deMilao em Roma. A Santa Se cornecou a receber ernbaixadores resi-dentes antes de os enviar junto das diversas cortes italianas,Durante praticamente todo 0 seculo xv, os Papas receberamembaixadores mas nao enviaram nenhum. Alexandre VI 0492--1503) rnanteve urn nunt ius e orator na corte do imperador Maxi-milia no 0459-1519) durante quatroanos, depois de 1495. POl'volta de 1500 0mesmo Papa enviou representantes permanentcspara Espanha, Fran'.

    Da Italia, 0 sistema dos embaixadores residentes transmi-tiu-se ao resto da Europa ernbora nao de forma uniforrne esimultanea. De todos os Estados concorrentes na luta pelo poderna Europa nos finais do seculo xv, s6 a Espanha, durante a pri-rneira fase das guerras de Italia, instalou 1.1mservice diplomaticoregular que se aproximava daquele que as principals potenciasitalianas haviarn j{l estabelecido ap6s a paz de Lodi em 1454.Este facto deve-se sobretudo a accao pessoal do rei Fernando deAragao (1452-1516) que, ao contrario da sua consorte e co-rei-nante Isabel de Castela, mais preocupada com a expansao mari-tima. se interessava fundarnentalmente pelas lutas de hegernoniapolitica na Europa. 0 service diplomatico instalado pOI' Fernandode Aragao era. porern, bastante dcsorganlzado ficando os ernbai-xadores frequentemente scm instrucoes e sem respostas a s suascartas8'i.

    POI' altura cla invasao da It:llia pelas tropas francesas de Car-los VIII em 1494, Maximiliano de Austria procurou estabelecerum sistema de ernbaixadores residentes em Rorna , Venez

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    32/94

    josr CALVEI' DE MAGALlIAESum embaixador residente em Londres desde 1496, s6 em 1505 foidesignado urn embaixador residente Ingles em Espanha. Henri-que VIII 0491c1547), quando acedeu ao trono, incremenrou arepresentacao diplomatica de Inglaterra criundo ernbaixudas per-rnanentes nos Paises Baixos e junto do Imperador. Pelos anos de1520, quando 0 cardeal Thomas Wolsey (c. 1475-1530), 0 princi-pal conselheiro de Henrique VIII, passou a controlar a politicaexterna inglesa, 0 sistema de representacao diplornatica inglesa foialargado com ernbaixadores residentes em Franca e Veneza IF.

    Entre nos, 0 primeiro ernbaixador residente em Roma foidesignado em 1512, lugar desempenhaclo pelo Dr. Jo,10 de Fariaat~ 1514. No ana seguinre sucedeu-Ihe D. Miguel da Silva(c. 1480-1556) que exerceu as suas funcoes de ernbaixador ate1525 e foi mais tarde feito cardeal contra a vontade expressa deD. joao III, 0 que originou urn prolongado conflito com Roma.Em 1521 foi designado Ul11 ernbaixador espanhol residente emLisbon mas so em 1525 foi designado urn embaixador portuguesresidente em Madrid, lugar exercido por Antonio de AzevedoCoutinho. Em 1522, a Franca enviou para Lisbon 0seu primeiroernbaixador residente, Honore de Calx e nesse meS1110 ano foidesignado um embaixador portugues residente para Franca.Estas tres ernbaixadas permanentes, Roma, Paris e Madrid, man-tiverarn-se ate 1580. Com a Restauracao 0sistema de ernbaixa-das permanentes ja consagrado foi alargado consideravelrnentecomo verernos mais adianteH8.De todas as grandes potencias europeias do inicio cia IdadeMoclerna, a Franca foi aquela que levou mais tempo a estabele-cer um sistema de representacao diplorruitica permanente. Fran-cisco I (1494-1547), nas suas lutas de hegernonia contra a casade Austria, preferiu sempre a negociacao directa ao uso cla diplo-macia. E por algum tempo esse sistema de negociacao foi ten-tado sem, todavia, resultados de maior, Oucamos 0 testernunhoinsuspeito do grande historiador Garrett Mattingly, profundo

    xc Ob , e lL . pp. 137-139.~"1'. Jo~e de Castro, P( ) rW~as //0 C on cflio d e Trent, Lisbon, 1944, vol. Ill, p. 'ISO;

    G. Mattingly, oh. cit.. p. J 57 c notus 2 e ~~.60

    ; \ DI I'L01\ IACIA l 'URA

    conhecedor cia dlplomacia desta epoca: -No 1110111elltom que 0duelo entre os Valois e os Habsburgos, entre Francisco I e Car-los V, prendia a

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    33/94

    jost C AL V ET D E 1 1A GA LHA ESagiam como seus proprios ernbaixadores, e para esras ocasioesnao existiarn regras fixadas. Poderiam ser conduzidas com amaier pompa OU com a maior informalidade. As entrevistas pes-soais entre as chefes de Estado tiveram sempre 6bvias vanta-gens. Quando resultavam hem, como por exemplo, a entrevistade Lourenco de Medicis com Ferrante de Napoles em 1480,davarn ao resultado obtido uma especial solidez e ao bern suce-dido principe um aumento daquele prestigio t

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    34/94

    joss CALVET DE 1vlAGAUIAESfarna s6 foi destronada pelo aparecimento em 1716 de um tra-tado da autoria de um experimentado diplomats frances, Fran-cois de Callieres (1645-1717), intitulado De la nianiere de nego-cie r a ue c le s so uu era in sv. 0 livro de Calliercs paSSOll a ser 0manual obrigatorio dos diplomatas do seculo XV]]] e ainda hojee frequenternente citado. A razao do seu sucesso provem dofacto de se tratar de uma obra escrita com grande elegancia eclareza que, por outro lado, revela um profundo c2ifihecimentoda materia tratacla. Callieres em vez de se ocupar particularrnentedos aspectos mais superficiais da diplomacia ou dos ' rivilegiose imunidades dos diplomatas, trata essencialmente da propriaactividade diplornatica a que ell' chama negociacao. As suasobservacoes a este respeito sao bastante pertinentes e ate pro-fundas.e muitas delas possuern ainda hoje plena validade. Pocledizer-se que de todos os tratadistas anteriores ao seculo XIX quese ocupararn cia diplomacia foi, certarnente, Callieres aquele quemelhor soube apreender a essencia ou sentido proprio cia insti-tuicao.

    Voltando as negociacoes que culminararn com a assinaturaem 1648 do Tratado de Westfalia elas nao so constituem ummarco historico a partir do qual, como ja vimos, a diplomaciasofreu notavel expansao, mas inauguraram tambern um novometodo diplomatico, a chamada diploma cia multilateral. Contrari-amente ao que muitos autores afirmarn a diplornacia multilateralnao foi uma criacao do periodo que sucedeu a guerra mundial de1914-1918, mas havia j{t sido tentada em epocas anteriores. 0 quefoi uma inovacao do pes-guerra de 1914, foi 0sistema de diplo-macia multilateral de caracter perrnanente que veio a sofrer nota-vel incremento apos a nova guerra rnundial de 1939.

    As negociacoes que levaram a assinatura clo famoso Tratadode WestLt!ia (conjunto de acordos assinados entre 14 e 24 deOutubro de 1648) iniciararn-se em 1641 nas duas cidades deWestfalia, Munster e Osnabruck. Em Munster negociou-se a paz

    95 M. de Callieres , D e ia nu m iere de negocier aFec le s s ou ue ra tn s. d e i'lilili{(; de sNeuocta t ton s , d a c h ix d rs a mlu issa de urs ( . d es EI1l'lIyez. D d es qu a l it e z u ec ess air es p ou rr (' tl ss il ' d a ns e es vm p lo ts , Bruxcl, Pour la Compagnie, 1716.

    64

    A DIPLO[v!ACIA PURA

    entre a Franca e 0 Imperio e em Osnabruck a paz entre 0 Impe-rio e a Suecia e os seus aliados protestantes. Em Munster servlude medianeiro 0 legado papal e em Osnabruck 0 ernbaixador deVeneza, As negociacoes s6 comecararn verdadeiramente em 1644e tiveram ur n caracter verdadeiramente multilateral. Portugal, queacabara de reconquistar a sua independencjn, tentou fazer-serepresentar nestas negociacoes mas os nossos embaixadores rive-ram que actuar nos bastidores em virtude da forte oposicao daEspanha < t participacao de Portugal.

    Outra importante reuniao multilateral na Idade Moderna foio congresso de Utrecht que teve Ingar no inicio do seculo XVIII elevou a assinatura dos acordos, conhecidos por Tratado cleUtrecht, assinados entre Janeiro e Julho cle 1713. Neste Congresso,que pas terrno a guerra de sucessao de Espanha, participaram osrepresent antes da Franca, Inglaterra, Imperio, Estados Gerais ciaHolanda, Prussia, Sahoia, Palatinado, bispo de Munster, Treves,Hesse, \\7uftemberg, Polonia, Lorena e Portugal representadopel os embaixadores Conde de Tarouca e D. Luiz da Cunha.

    6. Epoca Contemporanea

    No inicio da epoca contemporanea, a instituicao cliplomaticaachava-se ja perfeitamente consagrada e regida por principiosuniversals baseados no costume internacional e na doutrina.

    A democratiz

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    35/94

    JOSE CALVET CE lvlAGALHAES

    mento das primeiras norrnas convencionais sobre a hierarquia dosagentes diplornaticos e as suas respectivas precedencias, proble-mas que na Idade Moderna originaram nao POllCOS conflitos. Taisnormas resultaram de um novo congresso multilateral, 0 Con-gresso de Viena, reunido em 1815, na capital austriaca para regu-lar a situacao politica da Europa ap6s a queda do imperio napo-le6nico. 0 problema da precedencia dos agentes diplomaticosandou sernpre ligado a precedencia dos varies Estados europeuso que tornava 0 problema mais intricado e de consequenciasmais graves. Sobre este problema escreveu Harold Nicolson: -NaIdade Media considerava -se que a ordem de precedencia entre osdiversos Estados seria fixada pelo Papa e, de facto, existe umaescala 01.1 Iista de categorias, datada de 1504, segundo a qual osdiversos soberanos sao alinhados na sua propria ordern. Segundoesta escala de precedencias 0 Imperador alemao figura em pri-meiro Ingar e 0 Duque de Ferrara, no ultimo: 0 rei de InglaterraFigura nos ultimos lugares cia Iista, imediatamente depois do reide Portugal e imediarnmente antes do rei de Sicilia. Nao era deesperar que esta fixacao arbitraria de valo res pudesse sobreviver,ls rnudancas de posicao do poder nacional. Desde 0 principio aEspanha recusou-se a aceitar a classificacao do Papa segundo aqual a Espanha recebia U1 1 1 lugar inferior ao cia Franca. Indeco-rosos arnuos e empurroes entre os embaixadores da Franca e daEspanha passararn a ser urn elernento ernbaracante no funciona-mente de eacla corte, e em 30 de Setembro de 1661, quando 0coche do embaixador espanhol renton ultrapassar 0 coche doembaixador de Franca num cortejo em Londres, resultou umabatalha de rua que levou a ruptura de relacoes diplomaticas entreParis e Madrid e ate ~l.ameaca de guerra. lima outra complicacaosurgiu quando a Russia deixou de ser uma potencia asiatica eprocurou impor-se como potencia europeia. Num baile cia corteem Londres em 1768 0embaixador russo sentou-se ao laclo doernbaixador do Irnperador, 0embaixador de Franca que chegoutarde, saltou por cima dos bancos de tras e esgueirou-se entre osdois colegas, do facto resultou urn duelo no qual 0embaixadorrusso ficou ferido. A coisa cornecava a tornar-se numa farsa-.

    66

    A DIPL01\lACIA PUnA

    -Um aspecto rnais serio desta constante c mal regularnentadalura pela precedencia e prcstigio - prossegue Nicolson - era acomplicacao que introduzia na conclusao dos tratados interna-cionais. Fortes animosidades resultavarn do problema da ordempela qual os diversos plenipotenclartos deviarn assinar. Urn com-plicado expedlente, chama do altern at, foi inventado segundo 0qual LIma c6pia separada de cada tratado ou documento era for-necida acacia plenipotenciario que assinava a sua copia emprimeiro Ingar; este metodo, ernbora originasse um trabalho des-necessario e major demora, clava a cada plenipotenei{lrio a satis-facao de sentir que, pelo menos numa das capias, 0seu nomefigurava no lugar de honra. 0 Congresso de Viena decidiu sabia-mente que tinha chegado 0 tempo de por tenno a urn sistematao ridiculo. Foi designada uma comissao que depois de doismeses de trabalho apresentou 0sell relat6rio.

    Este relatorio dividia os diversos paises em tres classes, masesra classificacao encontrou a oposicao de varias pequenaspotencias e especialmente dos representantes das republicas. Foi,portanto, adoptado 0 metodo sensate segundo 0 qual a prece-den cia dos representantes diplomaticos deveria ser regulada pelasua respectiva antiguidade, ou seja, segundo a data da sua noti-ficacao oficial cia chegada a sede da sua missao. 0 Reglemen t doCongrcsso dividiu, ao mesmo tempo, os representantes diplo-maticos em quatro classes distintas - embaixadores c lcgadospontificios, ministros plenipotenciarios, ministros residentes eencarregados de neg6cios. Foi tambern estabelecido que aordem pela qual os plcnipotenciarios deveriam assinar os trata-dos seria tirada a sorte; isto foi ulteriormente ernendado na Con-ferencia de Aix-la-Chapelle em 1818 quando foi adoptado 0metodo mais razoavel das assinaturas serern apostas segundo aordern alfabetica. 0 alfabeto escolhido foi, porern, 0 frances, cir-cunstancia que tornou por muitos anos incerto se os EstadosUnidos deveriam assinar sob a Ietra E ou A ou U. No entanto,exceptuada esta pequena imprecisao 0Reg l emen t cle Viena '"resolveu de facto 0 problema das precedenclas por mais de cemanos. E possivel que algum futuro congresso se sinta obrigado,

    67

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    36/94

    JOSE CALVET DE MAGAUIAES

    em face da rnultiplicidade de cmbaixadas que desde entao fOra!~lcriadas, a adoptar urn novo Reglement segundo 0qual ~s e~nlxl1:xadores serao classificados COIllO pertencendo-a pnrneira, asegunda e terce ira categoria. Isto provocaria, certarnente, urnaviva discussao-

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    37/94

    joss CALVET DE MAGALHAESAbril de 1963 e pela -Convencao de Viena sobre a representacaodos Estados nas suas relacoes com as Organizacoes Internacio-nais de caracrer universal- de 14 de Marco de 1975%.

    Outra irnportante transformacao da diplornacia ocorrida naepoca conternporanea foi a lnstitucionalizacao da diplomaciamultilateral com a criacao de organizacoes internacionais devaries tipo s iniciados no seculo XIX. Como resultante do Tratadode Paris de 1814 e do Congresso de Viena de 1815 fora criadaa Comissao Internacional do Reno e pelo Tratado de Paris de18)6, que pa s termo a guerra da Crimeia, fora criada a Comis-sao Internacional do Danubio, Em ambos os casos se tratava deorganismos de caracter perrnanente com representacao de diver-sos Estados. Em 1865 foi cnada a Uniao Telegrafica Universal,que rnais tarde se transformou na Uniao Internacional de Tele-comunicacoes, e em 1874 surgiu a Uniao Postal Universal.

    Muitas outras unioes chamadas admtnts tratiuas , foram cria-das no decurso do. seculo XIX enos principios do seculo pre-sente ate it eclosao do confIito mundial de 1914. Todas estasorganizacoes, de caracter permanente e multilateral, tinham urnambito limitado, ocupando-se de urn sector preciso e especiali-zado dos interesses inter-estaduais.

    Em 1919, como resultado da conferencia de paz que posterrno a guerra de 1914, foi criada a Sociedade das Nacoes, a pri-meira organizacao universal perrnanente de caracter politico.o objective central da S.D.N. era de garantir a paz entre os Esta-dos e constituia desta forma a maxima expressao cia diplornaciamultilateral.

    A Conferencia de Paz, reunida em Versailles em 1919, foifortemente influenciada pelo pensamento do Presidente Wilson,que em 8 de Janeiro de 1918 havia proclarnado os seus famosos-catorze pontes- entre os quais um que propunha a criacao daSociedade das Nacoes, Wilson presidiu pessoalmente a delega-< ; , : a o americana que participou nas negociacoes. 0 primeiro dos

    ' I i , G. E.do Nascimento e Silva. COIII'{'11r(IO d e V ie na s ob re R cla co cs D ip lo ma tic as .Minlstcrio

  • 5/12/2018 Jos Calvet de Magalhes - A Diplomacia Pura

    38/94

    JOSE CALVET DE MAGALHAES

    envenenar a literatura politica americana C outras que deb rece-bern influencia.

    Nao foram apenas estas as consequencias da malogradaintervencao do Presidente america no nas negociacoes de paz.A Sociedade das Nacoes, em que muitos homens no apes guerradepositararn tantas esperans;as como uma garantia da paz mun-dial, fracassou tambern. 0 Congresso americana nao ratificou 0pacto que a criara, desautorizando 0 Presidente que fora 0 seugrande inspirador, ficando a organizacao privada do seu maisimportante associado. A Russia a braces com uma revolucao deextensao gigantesca, tambern nao participou de inicio na orga-nizacao, s6 vindo a ser admitida em 1934. Nesta altura ja atinham abandonado, em 1933, a Alemanha e 0 japao. A Italiaabandona tarnbem a organizacao em 1937. Durante os seus vinteanos de exis tencia varias agressoes internacionais graves tiveramIugar sem que a Sociedade das Nacoes pudesse intervir de qual-quer forma eficaz. A ultima, a invasao da Pol6nia pela Alemanhaem 1939, deu 0 golpe de graca a organizacao, ja praticarnentemoribunda.

    Algumas agencias especializadas criadas sobre a egide daSociedade das Nacoes -sobreviveram ao desaparecimento dagrande organizacao muncliaL Esta neste caso a OrganizacaoInternacional do Trabalho, fundada em 1919, e uma das realiza-coes mais felizes da S.D.N.

    No decurso da ultima guerra mundial foram lancadas asbases de uma nova organizacao politica de caracter universal,as Nacoes Unidas, que com as suas nurnerosas agencias especia-lizadas, constitui um complexo sistema de instituicoes interna-cionais atraves do qual a diplomacia multilateral atingiu 0seuapogeu,

    Foi na Conferencia de Dumbarton Oaks, reunida de 21 deAgosto a 7 de Outubro de 1944, entre os representantes dosEstados Unidos, Gra-Bretanha, Uniao Sovietica e China, que foiIancado 0 projecto da criacao de uma organizacao politica mun-dial e elaborado urn documento que serviu de base a Conferen-cia de S. Francisco, convocada por aque1as potencias, e cujos tra-

    72

    A DIl'LOMACIA PUR,,\.

    balhos se iniciaram em 25 de Abril de 1945. Apos dois meses denegoclacoes 0 Estaruto das Nacoes Unidas foi assinado em 26 deJunho do mesmo ano.

    As Nacoes Unidas e as sua agencias especializadas e asorganizacoes regionais que surgiram no periodo que se seguinao ultimo conflito mundial, nomeadamente a NATO, a OECD, aOAS, a ALALC, a CENTO, a SEATO, a ANZUS, a OUA, a CEE, aEFTA, a UEO, 0 Conselho da Europa, 0 Comecon, etc., - paranao referir senao algumas dessas organiza