AcordaoTRC_Incumprimento

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Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra Processo: 321/2002.C1 Nº Convencional: JTRC Relator: HENRIQUE ANTUNES Descritores: CONTRATO-PROMESSA SINAL INCUMPRIMENTO DO CONTRATO INCUMPRIMENTO DEFINITIVO INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA RESOLUÇÃO DO CONTRATO Data do Acordão: 12/06/2011 Votação: UNANIMIDADE Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA SERTÃ Texto Integral: S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTºS 410º, Nº 1, 411º, 433º, 441º, 442º E 808º DO C. CIV. Sumário: I - Contrato promessa é o contrato pelo qual as partes, ou uma delas, se obrigado a celebrar novo contrato – o contrato definitivo (artº 410 nº 1 do Código Civil). II - Distinção relevante é a que separa o contrato promessa monovinculante e o contrato promessa bivinculante: no primeiro apenas uma das partes se encontra adstrita à obrigação de celebrar o contrato definitivo; no segundo essa obrigação vincula ambos os contraentes (artº 411 do Código Civil). III - Do contrato promessa emergem prestações de facto jurídico positivo: a obrigação de emitir, no futuro, as declarações de vontade integrantes do contrato definitivo prometido. IV - Toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente vendedor a título de antecipação do preço presume-se ter o carácter de sinal (artº 441 do Código Civil). V - Se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigação, por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente o direito de fazer sua a coisa entregue; se o incumprimento for assacável a quem recebeu o sinal, tem a contraparte a faculdade de exigir o dobro do que lhe prestou (artº 442, nº 2 do Código Civil). VI - Na ausência de convenção contrária, no caso de perda do sinal ou do seu pagamento em dobro, não há lugar, com fundamento no não cumprimento do contrato promessa, a qualquer outra indemnização (artº 442, nº 4 do Código Civil). VII - Nos termos gerais, o incumprimento definitivo de uma obrigação ocorre quando, objectivamente, o credor perca o interesse na prestação e quando o devedor não cumpra num prazo razoavelmente fixado pelo credor – a chamada interpelação admonitória (artº 808 do Código Civil). VIII - Porém, deve notar-se que o incumprimento definitivo

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  • Acrdos TRC Acrdo do Tribunal da Relao de CoimbraProcesso: 321/2002.C1N Convencional: JTRCRelator: HENRIQUE ANTUNESDescritores: CONTRATO-PROMESSA

    SINALINCUMPRIMENTO DO CONTRATOINCUMPRIMENTO DEFINITIVOINTERPELAO ADMONITRIARESOLUO DO CONTRATO

    Data do Acordo: 12/06/2011Votao: UNANIMIDADETribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA SERTTexto Integral: SMeio Processual: APELAODeciso: CONFIRMADALegislao Nacional: ARTS 410, N 1, 411, 433, 441, 442 E 808 DO C. CIV.Sumrio: I - Contrato promessa o contrato pelo qual as partes, ou uma

    delas, se obrigado a celebrar novo contrato o contrato definitivo(art 410 n 1 do Cdigo Civil).

    II - Distino relevante a que separa o contrato promessamonovinculante e o contrato promessa bivinculante: no primeiroapenas uma das partes se encontra adstrita obrigao decelebrar o contrato definitivo; no segundo essa obrigao vinculaambos os contraentes (art 411 do Cdigo Civil).

    III - Do contrato promessa emergem prestaes de facto jurdicopositivo: a obrigao de emitir, no futuro, as declaraes devontade integrantes do contrato definitivo prometido.

    IV - Toda a quantia entregue pelo promitente-comprador aopromitente vendedor a ttulo de antecipao do preo presume-seter o carcter de sinal (art 441 do Cdigo Civil).

    V - Se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigao, porcausa que lhe seja imputvel, tem o outro contraente o direito defazer sua a coisa entregue; se o incumprimento for assacvel aquem recebeu o sinal, tem a contraparte a faculdade de exigir odobro do que lhe prestou (art 442, n 2 do Cdigo Civil).

    VI - Na ausncia de conveno contrria, no caso de perda dosinal ou do seu pagamento em dobro, no h lugar, comfundamento no no cumprimento do contrato promessa, aqualquer outra indemnizao (art 442, n 4 do Cdigo Civil).

    VII - Nos termos gerais, o incumprimento definitivo de umaobrigao ocorre quando, objectivamente, o credor perca ointeresse na prestao e quando o devedor no cumpra numprazo razoavelmente fixado pelo credor a chamadainterpelao admonitria (art 808 do Cdigo Civil).

    VIII - Porm, deve notar-se que o incumprimento definitivo

  • surge no apenas quando por fora da no realizao ou doatraso na prestao o credor perca o interesse objectivo nela ouquando, havendo mora, o devedor no cumpra no prazo querazoavelmente lhe for fixado pelo credor mas igualmente noscasos em que o devedor declara expressamente no pretendercumprir a prestao a que est adstrito ou adopta uma qualqueroutra conduta manifestamente incompatvel com o cumprimento.

    IX - Quando tal ocorra, no se torna necessrio que o credor lheassine um prazo suplementar para haver incumprimentodefinitivo: a declarao do devedor suficiente, por exemplo, nocaso em que, sem fundamento, resolve o contrato, ou afirma deforma inequvoca que no realizar a sua prestao.

    X - O incumprimento definitivo traduz uma desistncia, porparte do direito, de manter vivo o dever de prestar principal, naexpectativa de que o devedor o cumpra.

    XI - A resoluo (contratual) uma forma condicionada,vinculada e retroactiva de extino dos contratos: condicionadapor s ser possvel quando fundada em lei ou conveno;vinculada por requerer que se alegue e demonstre determinadofundamento e retroactiva por operar desde o incio do contrato(art 433 do Cdigo Civil). Fala-se tambm por vezes em resciso:esta equivale resoluo, sendo utilizada, preferencialmente,para designar a resoluo fundada na lei.

    XII - A resoluo por incumprimento implica o chamadoincumprimento definitivo (art 801, n 1 do Cdigo Civil). O nocumprimento simples apenas levaria mora; s quando fosseultrapassado o prazo razoavelmente fixado pelo credor ou,quando objectivamente, desaparecesse o interesse deste naprestao, se poderiam transcender as consequncias da mora. Ocredor poderia, ento, resolver o contrato, entre outras medidas,com relevo para a indemnizao.

    XIII - A regra estabelecida na lei a de que a mora do devedorno faculta imediatamente ao credor a resoluo do contrato doqual emerge a obrigao que no foi pontualmente cumprida.Tendo a obrigao no cumprida por fonte um contratobivinculante para que o credor possa resolv-lo, libertando-se doseu dever de prestar, necessrio, em princpio, que a prestaoda contraparte se tenha tornado impossvel por causa imputvelao devedor (art 801, n 1 do Cdigo Civil).

    Deciso Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relao de Coimbra:1. Relatrio.

  • O ru, C, apelou da sentena da Sra. Juza de Crculo de CasteloBranco que, julgando parcialmente procedente a aco declarativa decondenao, com processo comum ordinrio pelo valor, contra eleproposta por A, na qual foi provocada a interveno principal docnjuge do primeiro, M, julgou o contrato promessa objecto destesautos incumprido por culpa exclusiva do ru e condenou o ru aentregar ao autor a quantia de 9 975,96, acrescidos de juros desde25.02.2002 at 30.04.03, ambos inclusive, taxa de 7% e desde01.05.2003, inclusive, at efectivo pagamento, taxa de 4%.O recorrente, que pede no recurso a revogao da deciso impugnadae a sua absolvio do pedido, condensou os fundamentos daimpugnao nas concluses seguintes: 2. Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso.3. Fundamentos.3.1. Delimitao objectiva do mbito do recurso.Alm de delimitado pelo objecto da aco e pelos eventuais casosjulgados formados na instncia recorrida e pela parte dispositiva dadeciso impugnada que for desfavorvel ao impugnante, o mbito,subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo prpriorecorrente. Essa restrio pode ser realizada no requerimento deinterposio ou nas concluses da alegao (art 684 ns 2, 1 parte, e3 do CPC). Nas concluses da sua alegao, lcito ao recorrenterestringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso (art684 n 2 do CPC). Porm, se tiver restringido o objecto do recurso norequerimento de interposio, no pode ampli-lo nas concluses[1]. Nestas condies, tendo em conta o contedo da decisorecorrida e das alegaes, as questes concretas controversas que oacrdo deve resolver so as de saber se aquela deciso se encontraferida com o valor negativo da nulidade e se o tribunal de queprovm o recurso incorreu, na deciso da questo de facto, porequvoco na valorao ou apreciao da prova, num error iniudicando.A resoluo destes problemas vincula, naturalmente, ao exame das

  • causas de nulidade da sentena representadas pela omisso depronncia e pela contradio intrnseca e dos parmetros dos poderesde controlo desta Relao relativamente deciso da matria de factoda 1 instncia, e reponderao do julgamento correspondente. justamente essa a finalidade das consideraes subsequentes.3.2. Nulidade da sentena impugnada.Como comum, o recorrente imputa sentena o vcio grave danulidade. De todas as causas possveis de nulidade, assaca-lhe estas: acontradio intrnseca e a omisso de pronncia (art 668 n 1 c) e d)do CPC).Este valor negativo da deciso recorrida resulta, no ver do recorrente,de no ter sido pedida, pelo autor, ou declarada, pelo tribunal, aresoluo do contrato promessa objecto da aco - ainda que talquesto tenha sido abordada na fundamentao - sendo certo, na suaperspectiva, que o pagamento do sinal em dobro pressupe que sejapedida e declarada a resoluo daquele contrato.O tribunal deve resolver todas as questes que as partes tenhamsubmetido sua apreciao, exceptuadas, claro, aquelas cuja decisoesteja prejudicada pela soluo dada a outras[2]. O tribunal deve, porisso, examinar toda a matria de facto alegada e todos os pedidosformulados pelas partes, com excepo apenas das matrias oupedidos que forem juridicamente irrelevantes ou cuja apreciao setenha tornado intil pelo enquadramento jurdico escolhido ou pelaresposta dada a outras questes. Por isso nula, a deciso que deixede se pronunciar sobre questes que devesse apreciar, ou seja, quandose verifique uma omisso de pronncia (art 668 n 1 d), 1 parte).A deciso tambm nula quando os seus fundamentos estiverem emoposio com a parte decisria, isto , quando os fundamentosinvocados pelo tribunal conduzirem, logicamente, a uma conclusooposta ou, pelo menos diferente daquela que consta da deciso (art669 n 1 c) do CPC)[3]. Esta nulidade substancial est para a decisodo tribunal como a contradio entre o pedido e causa de pedir estpara a ineptido da petio inicial.Na espcie do recurso, o autor pediu que o contrato promessaconcludo entre si e o ru fosse declarado incumprido por culpaexclusiva do ltimo e que este fosse condenado a pagar-lhe a quantiade 14 963,00, correspondente parte do sinal ainda em dvida.A sentena impugnada concluiu pelo incumprimento do contratopromessa por culpa exclusiva do ru e condenou-o a entregar ao autor

  • a quantia de 9 975,96, acrescida de juros.Se, como nota recorrente no foi pedida a resoluo do contrato e se asentena apelada no declarou essa resoluo, ento, em boa lgica,segue-se que um vcio de que decerto aquele acto decisrio nopadece , seguramente, o da omisso de pronncia, dado que um taldefeito supe, necessariamente, que o tribunal tenha deixado de sepronunciar ou de resolver qualquer questo que as partes tenhasubmetido sua apreciao. Ora, como, segundo o recorrente, elemesma, no foi pedida a resoluo do contrato claro que, ao nodeclarar essa resoluo, a sentena no incorreu em omisso depronncia. Na lgica da argumentao da recorrente, se tivessedeclarado essa resoluo, que a sentena seria realmente nula maspela causa inversa: o excesso de pronncia, dado que em tal casoteria conhecido de questo de que no podia tomar conhecimento econdenado mesmo num pedido no formulado (arts 661 n 1 e 668 n1 d), 2 parte, do CPC).A sentena impugnada foi terminante em concluir que o contratopromessa em torno do qual gravita o litgio, foi incumprido porexclusiva do recorrente e, em face disso, proferiu essa exactadeclarao e condenou aquele no pagamento de parte do sinal norestitudo.Nestas condies, no h qualquer coliso entre a deciso entre osfundamentos em que se apoia, dado que os fundamentos invocadospelo decisor da 1 instncia no conduzem, logicamente, a umadeciso de improcedncia daquele pedido, mas deciso deprocedncia nela expressa. No se verifica, portanto, na construo dasentena qualquer vcio lgico que comprometa, irremediavelmente,a sua coerncia interna. claro que a sentena impugnada pode ter-se equivocado,designadamente por erro na subsuno dos factos apurados na normaque julgou aplicvel ao caso concreto, mas esse equvoco resolve-senitidamente num error in iudicando e no num error in procedendo,como , caracteristicamente, aquele que est na base da causa denulidade substancial da sentena impugnada discutida.O recorrente sustenta que a restituio em dobro do sinal passado nocontexto de um contrato promessa de compra e venda supe adeclarao de resoluo desse mesmo contrato e que, emconsequncia dessa resoluo, seja ordenada aquela restituio. Deresto, tambm esse o pensamento da sentena impugnada dado que,na fundamentao de direito, se deteve no exame dos pressupostos daresoluo do contrato promessa tendo, perante o sinal inequvoco da

  • recusa do ru em contratar com o A., declarado operante a resoluocontratual.Nos termos gerais, o incumprimento definitivo de uma obrigaoocorre quando, objectivamente, o credor perca o interesse naprestao e quando o devedor no cumpra num prazo razoavelmentefixado pelo credor a chamada interpelao admonitria (art 808 doCdigo Civil). Porm, deve notar-se que o incumprimento definitivo surgeno apenas quando por fora da no realizao ou do atraso naprestao o credor perca o interesse objectivo nela ou quando,havendo mora, o devedor no cumpra no prazo que razoavelmentelhe for fixado pelo credor mas igualmente nos casos em que odevedor declara expressamente no pretender cumprir a prestao aque est adstrito[4] ou adopta uma qualquer outra condutamanifestamente incompatvel com o cumprimento. Quando talocorra, no se torna necessrio que o credor lhe assine um prazosuplementar para haver incumprimento definitivo: a declarao dodevedor suficiente, por exemplo, no caso em que, sem fundamento,resolve o contrato[5], ou afirma de forma inequvoca, que norealizar a sua prestao[6].O incumprimento definitivo traduz uma desistncia, por parte dodireito, de manter vivo o dever de prestar principal, na expectativa deque o devedor o cumpra. Em qualquer dos casos, a incumprimentodefinitivo provoca a extino do dever de prestar principal, comconsequncias vrias. Face situao patolgica da prestao causada pelodevedor com a violao da obrigao correspondente, a ordemjurdica comina-lhe sanes que podem ser reconstitutivas v.g. aresoluo do contrato ou a execuo especfica das obrigaes quedele emergem ou compensatrias, como por exemplo, aindemnizao por danos patrimoniais e, de harmonia com a doutrinaque se tem por exacta, no patrimoniais.Assim, a extino da prestao principal leva desde logo suasubstituio pelo dever de indemnizar (arts 798 e 801 n 1 do CdigoCivil).Tratando-se de obrigaes recprocas, o incumprimento definitivo deuma delas confere parte fiel a faculdade de resolver o contrato (art801 n 2 do Cdigo Civil). Faculta a essa parte a resoluo docontrato mas no lha impe.

  • Como melhor se procurar mostrar, do contrato promessa emergem,tipicamente, prestaes de facto jurdico positivo. Trata-se, caracteristicamente, de direitos de crdito. Podem,por isso, ser violados por quaisquer perturbaes provocadas pelodevedor, em especial, atravs do incumprimento.Verificado esse incumprindo, a ordem jurdica comina ao infractor,desde logo, uma sano compensatria a indemnizao do danodecorrente desse incumprimento, embora o objecto dessaindemnizao seja, no contexto do contrato promessa, sujeita a umadelimitao especfica. Toda a quantia entregue pelo promitente-comprador aopromitente vendedor a ttulo de antecipao do preo presume-se tero carcter de sinal (art 441 do Cdigo Civil). Se quem constituir o sinal deixar de cumprir a obrigao,por causa que lhe seja imputvel, tem o outro contraente o direito defazer sua a coisa entregue; se o incumprimento for assacvel a quemrecebeu o sinal, tem a contraparte a faculdade de exigir o dobro doque lhe prestou (art 442 n 2 do Cdigo Civil). Na ausncia deconveno contrria, no caso de perda do sinal ou do seu pagamentoem dobro, no h lugar, com fundamento no no cumprimento docontrato promessa, a qualquer outra indemnizao (art 442 n 4 doCdigo Civil).Nos termos gerais, a existncia de mecanismos especficos destinadosa actuar em caso de incumprimento de obrigaes com prestaesrecprocas, - v.g. a resoluo do contrato de que emergem - noparalisa as demais sanes cominadas para esse incumprimento.Assim, a parte fiel tem sempre direito s indemnizaes devidas pelaparte em falta. E essa parte pode actuar esse direitoindependentemente, por exemplo da resoluo do contrato, na qualpoder no ter qualquer interesse, como suceder, decerto, no caso dea actuao daquele direito indemnizao produzir um efeitohomtropo ao que decorre da resoluo ou no caso de essaindemnizao decorrer justamente da extino, ainda que indevida,do contrato operada pela contraparte. patentemente o que ocorre no caso do contrato promessa em quetenha sido traditado sinal. Verificado o no cumprimento, funciona,do contrato, o segmento vocacionado para intervir, substituindo aprestao principal o prprio sinal, no havendo lugar, pelo nocumprimento, a qualquer outra indemnizao. A nica coisa que deveexigir-se, para que o interveniente adquira o direito a essa prestao

  • indemnizatria substitutiva - de harmonia com a doutrina que setem por prefervel - que se trate de incumprimento definitivo e no demera mora.Note-se, em todo o caso, que, entendendo-se que a actuao do sinalenvolve necessariamente a resoluo do contrato promessa, estandoem causa a supresso radical do contrato, mesmo nessa hiptese, suficiente que o promitente fiel se limite a pedir a declarao do nocumprimento pelo faltoso da sua obrigao de contratar rectior, daobrigao de, no futuro, emitir a declarao de vontade integrante docontrato definitivo prometido e a devoluo em dobro do sinalpassado. Por duas razes, de resto. Desde logo, porque aquele ltimo pedido, na perspectivaconsiderada, tem implcito, lgica e necessariamente a declarao deresoluo do contrato. Depois, porque a aco em que se pede a restituio emdobro do sinal traditado , nitidamente, uma aco condenatria,dado que tem por finalidade a condenao do demandado narealizao de uma prestao de dare, pressupondo a violao de umdireito (art 4 ns 1 e 2 b) do CPC). Na verdade o contraente fiel pode exigir a restituio dosinal em dobro a partir do incumprimento definitivo da contraparte,no tendo que aguardar a sentena que, reconhecendo oinadimplemento desta, a condenasse a pagar a indemnizao j fixada forfait. Esta sentena meramente declarativa - e no constitutiva -na parte em que aprecia o incumprimento e julga-o verificado numdeterminado momento. Como claro, toda a aco de condenao pressupe umaapreciao prvia de natureza declarativa. Ora, para proferir acondenao do demandado na restituio em dobro do sinal querecebeu, tem necessariamente de apreciar se aquela parte nocumpriu definitivamente a sua obrigao de prestao de factojurdico positivo e, portanto, se o demandante goza da faculdade deresoluo do contrato. Neste contexto, o autor pode obter acondenao do demandado formulando um nico pedido: o derestituio em dobro do sinal passado. Repare-se, enfim, que no caso natural que o autor nosentisse a necessidade de formular appertis verbis o pedido deresoluo do contrato. que - de harmonia com a deciso da matriade facto do tribunal a quo, que neste particular no objecto de

  • impugnao - esse mesmo contrato foi inequivocamente resolvidopelo recorrente que alegadamente - vendeu a terceiros o bem queprometeu vender, ou melhor, o objecto mediato do contrato definitivoprometido, sendo que justamente daquela resoluo e destaalienao que o recorrido secundado pela sentena apelada - extraio no cumprimento definitivo pelo apelante da promessa. Como melhor se detalhar, da ilicitude da resoluodecorre, em regra, a subsistncia do contrato para cuja destruio sedirigia, desde que o cumprimento das prestaes ainda se mostrepossvel. Ora, no esse, seguramente - de harmonia com a causapetendi apresentada pelo recorrido - o caso do recurso dado que,ainda que se conclua pelo carcter ilcito da resoluo do contratopromessa operada pelo recorrente, o cumprimento da promessa nose mostra possvel, dado que o recorrente, segundo se alega, alienou aterceiros a coisa prometida vender. Nestas condies, o contratopromessa concludo entre o recorrente e o recorrido deve, na lgicado autor, ter-se por definitivamente extinto. Sendo isto exacto, e seno nos transvia um errnea lgica, deve ter-se por absolutamentedesprovido de sentido que uma parte pea a extino por resoluo deum contrato que julga j extinto. Neste contexto possvel e s possvel computador indemnizaes mas j no pedir a extino dafonte de que promanam as obrigaes de cuja violao decorre odever de indemnizar. Por outro lado, desde que o recorrente alegou a resoluodo contrato, por incumprimento imputvel ao recorrido, claro que asentena apelada teria de reflectir sobre o problema da resoluodesse contrato, para verificar se, realmente, essa resoluo era justaou antes indevida. Tendo isto presente, bem pode dizer-se que asentena no se debruou sobre qualquer objecto ou questo que aspartes, ou ao menos uma delas, no tenham submetido suaapreciao e, portanto, que tenha excedido os seus poderes deconhecimento. A sentena contestada no se encontra, pois, ferida com ovcio feio da nulidade que o recorrente lhe assaca.De resto, a arguio da nulidade da sentena no toma em devida eboa conta o sistema a que, no tribunal ad quem, obedece o seujulgamento.O julgamento, no tribunal hierarquicamente superior, da nulidadeobedece a um regime diferenciado conforme se trate de recurso deapelao ou de recurso de revista.

  • Na apelao, a regra da irrelevncia da nulidade, uma vez que aindaque julgue procedente a arguio e declare nula a sentena, a Relaodeve conhecer do objecto do recurso (arts 715 n 1 do CPC).No julgamento da arguio de nulidade da deciso impugnada deharmonia com o modelo de substituio, impe-se ao tribunal adquem o suprimento daquela nulidade e o conhecimento do objecto dorecurso (arts 715 n 1 e 731 n 1 do CPC).Contudo, nem sempre, no julgamento do recurso, se impe osuprimento da nulidade da deciso recorrida nem mesmo se exigesempre sequer o conhecimento da nulidade, como condio prvia doconhecimento do objecto do recurso.Exemplo desta ltima eventualidade disponibilizado pelo recursosubsidirio. O vencedor pode, na sua alegao, invocar, a ttulosubsidirio, a nulidade da deciso impugnada e requerer a apreciaodesse vcio no caso de o recurso do vencido ser julgado procedente(art 684-A n 2 do CPC). Neste caso, o tribunal ad quem sconhecer da nulidade caso no deva confirmar a deciso, regime deque decorre a possibilidade de conhecimento do objecto do recurso,sem o julgamento daquela arguio.Raro o caso em que o recurso tenha por nico objecto a nulidade dadeciso recorrida: o mais comum que a arguio deste vcio sejaapenas mais um dos fundamentos em que o recorrente baseia aimpugnao. Sempre que isso ocorra, admite-se que o tribunal adquem possa revogar ou confirmar a deciso impugnada, arguida denula, sem previamente conhecer do vcio da nulidade.Isso suceder, por exemplo, quando ao tribunal hierarquicamentesuperior, apesar de deciso impugnada se encontrar ferida com aquelevcio, seja possvel revogar ou confirmar, ainda que por outrofundamento, a deciso recorrida. Sempre que isso suceda, intil aapreciao e o suprimento da nulidade, e o tribunal ad quem develimitar-se a conhecer dos fundamentos relativos ao mrito do recursoe a revogar ou confirmar, conforme o caso, a deciso impugnada (art137 do CPC).A arguio da nulidade da deciso embora muitas vezes assentenuma lamentvel confuso entre aquele vcio e o erro de julgamento uma ocorrncia ordinria. A interiorizao pelo recorrente dairrelevncia, no tribunal ad quem, que julgue segundo o modelo desubstituio, da nulidade da deciso impugnada, obstaria, decerto, sistemtica arguio do vcio correspondente.Por este lado, o recurso no dispe de bom fundamento.

  • A sentena apelada observou que, em 15 de Abril de 2001, data emque o R. dava por terminado o contrato de compra e venda a obrano se encontrava concluda, no se encontrando, portanto, o A. emincumprimento e, por maioria de razo, a pontos de justificar aresoluo contratual protagonizada pelo ru, e que nesse momento elogo aps 15 de Abril de 2001, os apartamentos e as garagens foramvendidas a terceiros, deixando de estar na disponibilidade do mesmoR. Destas consideraes extraiu esta concluso: perante o sinalinequvoco de recusa do R. em contratar com o A., declara-seoperante a resoluo contratual, condenando-se o R. a entregar aoA, outro tanto do sinal prestado.Quer dizer: a sentena impugnada considerou, do mesmo passo,injustificada a resoluo do contrato declarada pelo recorrente, por orecorrido no haver incumprido a obrigao que para ele emergia dapromessa, e que quem incumpriu essa mesma promessa foi oapelante.Mas esta concluso, sustenta o recorrente, s se explica pelo error iniudicando em que lavrou, no tocante questo de facto relevante, odecisor de facto da 1 instncia.H, portanto, que proceder aferio dos poderes de controlo destaRelao relativamente deciso da matria de facto da 1 instncia e reponderao do julgamento correspondente.Todavia, como entre a matria de direito e a matria de facto existeuma interdependncia que se verifica na sua delimitao recproca,em especial na sua confluncia para a obteno da deciso de umcaso concreto - dado que a delimitao da matria de facto feita emfuno da matria de direito, porque os factos so recortados eescolhidos segundo a sua relevncia jurdica, i.e., segundo a suaimportncia para cada um das solues plausveis da questo dedireito - justifica-se, metodologicamente, a exposio subsequente seabra com a determinao da natureza jurdica do acordo de vontadesinvocado pelo autor como causa petendi, e sobre os pressupostos dasua supresso por resoluo.3.3. Pressupostos de resoluo do contrato, em geral, e do contratopromessa, em particular. Qualquer cessao do contrato, e salvo determinadasexcepes legais, acarreta a extino das obrigaes dele emergentes,o mais das vezes complexas. A figura que deve ser isolada, dado oproblema que o acrdo deve resolver, a da resoluo. A resoluo uma forma condicionada, vinculada e

  • retroactiva de extino dos contratos: condicionada por s serpossvel quando fundada em lei ou conveno; vinculada porrequerer que se alegue e demonstre determinado fundamento eretroactiva por operar desde o incio do contrato (art 433 do CdigoCivil). Fala-se tambm por vezes em resciso: esta equivale resoluo, sendo utilizada, preferencialmente, para designar aresoluo fundada na lei. Este esquema meramente tendencial: a prpria leiintroduz algumas variantes, sendo certo que as partes, dentro decertos limites, podem tambm incluir adaptaes. Assim, porexemplo, a resoluo pode ser no retroactiva (art 434 n 2 doCdigo Civil). o que sucede nos contratos de execuo continuadae com trato sucessivo v.g., os contratos de locao, de fornecimentoe de seguro em que a resoluo no afecta as prestaes jefectuadas, a no ser que a sua interligao com a causa resolutivalegitime uma resoluo plena. A resoluo pode operar em casos previstos pelo contratoou pela lei (art 432 n 1 do Cdigo Civil). O caso mais ntido de resoluo com base legal o queocorre perante o incumprimento definitivo do contrato: quando umadas partes no cumpra um contrato bivinculante - ou na expresso dalei, bilateral tem a outra direito resoluo. O Cdigo Civil fala na resoluo por incumprimento apropsito da impossibilidade culposa imputvel ao devedor (art 801n 1 do Cdigo Civil). A ideia a de que perante o incumprimentodefinitivo, o interesse do credor desvanece-se e o contrato ,juridicamente, impossvel. Em qualquer caso, dvida no resta que alei visa, com aquela disposio, permitir a um contraente livrar-se deum contrato que o outro incumpriu. A resoluo por incumprimento implica o chamadoincumprimento definitivo (art 801 n 1 do Cdigo Civil). O nocumprimento simples apenas levaria mora; s quando fosseultrapassado o prazo razoavelmente fixado pelo credor ou, quandoobjectivamente, desaparecesse o interesse deste na prestao, sepoderiam transcender as consequncias da mora. O credor poderia,ento, resolver o contrato, entre outras medidas, com relevo para aindemnizao. H mora do devedor quando, por acto ilcito e culposodeste, se verifique um cumprimento retardado (art 804 n 2 doCdigo Civil). A mora , portanto, o atraso ilcito e culposo no

  • cumprimento da obrigao: existe mora do devedor, quando,continuando a prestao a ser possvel, este no a realiza no tempodevido. Para se concluir que h mora do devedor, no basta, portanto,dizer que, no momento do cumprimento, aquele no efectuou aprestao devida; ainda necessrio que sobre ele recaia um juzo decensura ou de reprovao. Exige-se, portanto, a ilicitude e a culpa dodevedor, embora, tratando-se de responsabilidade obrigacional,qualquer retardamento na efectivao da prestao seja, porpresuno, atribudo a ilcito cometido com culpa pelo devedor (art799 n 1 do Cdigo Civil). Da mora do devedor emerge, comoprimeira consequncia, uma imputao dos danos, constituindo-seaquele no dever na obrigao de reparar todos os prejuzos que, como atraso, tenha causado ao credor (art 804 n 1 do Cdigo Civil). A regra estabelecida na lei , portanto, a de que a mora dodevedor no faculta imediatamente ao credor a resoluo do contratodo qual emerge a obrigao que no foi pontualmente cumprida.Tendo a obrigao no cumprida por fonte um contrato bivinculantepara que o credor possa resolv-lo, libertando-se do seu dever deprestar, necessrio, em princpio, que a prestao da contraparte setenha tornado impossvel por causa imputvel ao devedor (art 801 n1 do Cdigo Civil). S assim no ser, acrescenta o mesmo Cdigo, se, emconsequncia da mora, o credor perder o interesse que tinha naprestao, ou o devedor no a realizar dentro do prazo querazoavelmente lhe for fixado pelo credor. Em qualquer destes casos,considera-se, tambm, para todos os efeitos, a obrigao nocumprida (art 808 n 1 do Cdigo Civil)[7]. Quando isso ocorre, amora equiparada, para todos os efeitos, ao no cumprimentodefinitivo culposo, e, consequentemente, abre ao credor a porta daresoluo do contrato (arts 802 n 2 e 801 do Cdigo Civil). A lei, porm, no se contenta, para facultar ao credor oremdio da resoluo do contrato, com a simples perda subjectiva dointeresse do credor na prestao em mora. A lei muito maisexigente, reclamando, para que se produza esse efeito, que a perda dointeresse na prestao seja apreciada objectivamente. No basta, portanto, que, por exemplo, o contraente alegueter perdido o interesse que tinha na realizao do contrato prometidodefinitivo; indispensvel que a perda seja justificada luz decircunstncias objectivas, quer dizer, segundo um critrio derazoabilidade, prprio do comum das pessoas. Portanto, a perda do interesse na prestao no pode

  • assentar numa simples mudana de vontade do credor, sendo-lhe, porisso, vedado alegar, para fundamentar a resoluo, o facto de, porvirtude de o devedor se haver constitudo em mora, o contratodefinitivo no ser j do seu agrado; tambm no basta parafundamentar a resoluo, qualquer circunstncia que, segundo o juzodo credor, justifique a supresso da fonte da obrigao no cumpridana altura prpria: devendo aquela perda ser valorada objectivamente,no suficiente o critrio subjectivo do credor[8]. E porque se exige, no simplesmente a diminuio oureduo do interesse do credor na realizao da prestao, mas aperda absoluta, completa, desse interesse, esta s ocorrer no caso dedesaparecimento da necessidade do credor a que a prestao visavaresponder. Nestas condies, a perda do interesse do credor significa odesaparecimento objectivo da necessidade que a prestao visavasatisfazer. Se o credor j no tem interesse na prestao, o caso j no em rigor de simples retardamento do cumprimento mas de nocumprimento definitivo. Assim, no h que exigir ao credor que fixeao devedor um prazo para o cumprimento, pois dada a sua falta deinteresse, essa fixao no teria qualquer justificao: o credor poderecusar a prestao e exigir indemnizao pelo no cumprimento,como se de qualquer outro no cumprimento definitivo se tratasse. Por ltimo como se notou j - o incumprimento definitivosurge no apenas quando for fora da no realizao ou do atraso naprestao o credor perca o interesse objectivo nela ou quando,havendo mora, o devedor no cumpra no prazo que razoavelmentelhe for fixado pelo credor mas igualmente nos casos em que odevedor declara expressamente no pretender cumprir a prestao aque est adstrito ou adopta uma qualquer outra condutamanifestamente incompatvel com o cumprimento. Quando talocorra, no se torna necessrio que o credor lhe assine um prazosuplementar para haver incumprimento definitivo: a declarao dodevedor suficiente, por exemplo, no caso em que, sem fundamento,resolve o contrato, ou afirma de forma inequvoca, que no realizar asua prestao. Abstraindo dos casos em que a mora faz desaparecer ointeresse do credor na prestao, h que considerar toda umaconstelao de situaes em que no seria razovel forar o credor aesperar indefinidamente o cumprimento, i.e., a realizao daprestao devida. A lei, sensvel injustia da situao, concede aocredor a faculdade de, relativamente ao devedor constitudo em mora,

  • lhe fixar um prazo razovel, peremptrio e suplementar, dentro doqual dever cumprir sob pena de extino, por resoluo, do contrato(art 808 n 1, 2 parte, do Cdigo Civil). Trata-se da interpelao ouintimao cominatria que pode conduzir extino do contrato se aobrigao no for satisfeita dentro do prazo razovel nela fixado (art801 ns 1 e 2 do Cdigo Civil). Este remdio que a lei disponibiliza ao credor temdirectamente em vista os casos em que no tenha sido estipulada umaclusula resolutiva ou um termo essencial ou em que o credor nopossa alegar, de modo objectivamente fundado, a perda, por efeito damora, do interesse na prestao. A interpelao admonitria, com fixao de um prazoperemptrio para o cumprimento, resolve-se, portanto, numaintimao formal, dirigida ao devedor incurso em mora, para quecumpra, dentro do prazo assinado, sob esta pena grave: considerar-sedefinitivo o seu no cumprimento. Aquela interpelao desdobra-se, analiticamente, em trselementos: a intimao para o cumprimento; a fixao de umterminus ad quem peremptrio para esse cumprimento; a cominao declarao admonitria de que a obrigao se consideradefinitivamente no cumprida se a realizao da prestao devida seno verificar dentro do prazo assinado[9]. Na interpelao de prazo admonitrio, para alm daconsequncia de se considerar a prestao devidamente incumprida,por economia de meios, pode incluir-se a declarao condicional deresoluo do contrato; caso em que, transformando-se a mora emincumprimento definitivo pelo decurso do prazo suplementar,preenche-se a condio suspensiva e o contrato resolve-se[10]. A interpelao admonitria nitidamente uma declaraoreceptcia e, por isso, torna-se definitiva e irrevogvel logo que chegaao poder do devedor ou dele conhecida, e, como regra, a partirdesse momento, ao credor j no lcito exigir o cumprimento (art224 do Cdigo Civil). A lei terminante na declarao de que o prazo fixado pelocredor deve ser razovel. intuitivo que a razoabilidade do prazovariar em funo da natureza da prestao. Sem pretenso deformulao de uma regra de valor universal, dir-se- que o prazo razovel se, em face das circunstncias concretas, tendo em conta aregra de cooperao intersubjectiva representada pela boa f, permitirao devedor a realizao da sua prestao (art 762 n 2 do Cdigo

  • Civil)[11]. Deve, portanto, ser um prazo suficiente para que odevedor cumpra e, simultaneamente, que no prejudique ou importe odesaparecimento do interesse do credor na prestao. O devedorpode, naturalmente, de modo a evitar as consequncias que a leiassinala ao no cumprimento definitivo, discutir posteriormente emtribunal a razoabilidade do prazo. Caso se lhe d razo, nem por issose ressuscita uma relao extinta: a sentena limitar-se- a declarar asubsistncia da relao anterior em virtude da ineficcia a declaraoadmonitria anterior e da consequente declarao de resoluo. A questo de saber qual a consequncia jurdica de umaresoluo indevida, i.e., sem fundamento legal ou convencionado,no tem sido objecto de ateno detida da doutrina. A soluo que deve ter-se por exacta obriga a um distinguo,consoante o resolvente tem ou no o direito de por termo ao contratomediante uma denncia ad nutum, embora, eventualmente, o faasem pr- aviso. No primeiro caso, a resoluo sem fundamento, aomenos na maioria dos casos, deve ser equiparada a uma denncia sempr-aviso; no segundo caso, a resoluo ser ineficaz, por no ter,juridicamente, fundamento e o resolvente no dispor do direitopotestativo correspondente[12]. Se a relao contratual, cuja resoluo foi declarada ilcita,ainda pode ser executada, no obstante esta declarao de vontade terefeito extintivo, o vnculo obrigacional subsiste. A declarao deilicitude da resoluo e a consequente obrigao de reconstituir asituao que existiria implica a manuteno do contrato. Asubsistncia do vnculo ilicitamente resolvido depende, em todo ocaso, do preenchimento de trs pressupostos: que o cumprimento dasprestaes ainda se mostre possvel; que parte lesada tenha interessena execuo do contrato; que essa execuo no seja excessivamenteonerosa para quem o resolveu ilicitamente.Tudo isto deve, porm, ser lido luz desta considerao: ainterpelao admonitria pressupe que o credor ainda no tenhaperdido o interesse no cumprimento. Se o credor perdeu j,objectivamente, o interesse da prestao, se esse interesse jdesapareceu, no faz sentido assinalar ao devedor qualquer prazosuplementar para o cumprimento, uma vez que a realizao daprestao dentro desse prazo j no serve o interesse do credor emvista do qual se convencionou a prestao. A lei civil substantiva fundamental portuguesa adopta notocante resoluo do contrato um sistema declarativo: a resoluoopera por simples declarao outra parte, portanto, sem necessidade

  • de interveno constitutivo-condenatria do tribunal. Por outraspalavras, a resoluo opera ope voluntatis e no ope judicis (art 436n 1 do Cdigo Civil). A natureza potestativa da declarao deresoluo imprime-lhe as caractersticas da unilateralidaderecipienda, da irrevogabilidade, da incondicionalidade e daconcretizao dos respectivos fundamentos (arts 224 n 1, 1 parte, e230 n 1 do Cdigo Civil). Essa declarao no est sujeita a forma especial, ainda queo contrato a cuja resoluo se dirige o esteja[13] e, por isso, pode sermeramente tcita (art 217 ns 1 e 2 do Cdigo Civil). A declaraonegocial da qual resulta a resoluo do contrato pode ser expressa,afirmando a parte peremptoriamente que pretende a resoluo; maspode tambm ser meramente tcita, o que ocorrer com a declaraona qual a parte que a emite no afirma claramente que tem a intenode extinguir o contrato, mas de que se deduza que esse o seupropsito. Assim, por exemplo, a reclamao da entrega da coisavendida a prestaes por parte do vendedor consubstancia,tacitamente, numa declarao de resoluo do contrato[14]. Contrato promessa o contrato pelo qual as partes, ou umadelas, se obrigado a celebrar novo contrato o contrato definitivo(art 410 n 1 do Cdigo Civil)[15].Distino relevante a que separa o contrato promessamonovinculante e o contrato promessa bivinculante: no primeiroapenas uma das partes se encontra adstrita obrigao de celebrar ocontrato definitivo; no segundo essa obrigao vincula ambos oscontraentes (art 411 do Cdigo Civil). Do contrato promessa emergem prestaes de facto jurdicopositivo: a obrigao de emitir, no futuro, as declaraes de vontadeintegrantes do contrato definitivo prometido. A exigncia de um incumprimento definitivo, para que, nocontrato promessa, se facultasse ao promitente fiel a resoluo dele,era uma concluso para qual, at s modificaes a que foi sujeitopelo DL n 379/86, de 11 de Novembro, nenhuma dvida, por menosrazovel que se apresentasse, podia ser oferecida (art 442 ns 2 e 3do Cdigo Civil). Porm, em face da fisionomia que aquele diplomalegal lhe imprimiu, bem pode duvidar-se da exactido daquelasoluo. No falta, na verdade, quem admita a possibilidade de ocontraente fiel recorrer ao regime do sinal ou da valorizao da coisaobjecto mediato do contrato definitivo prometido que, em princpio,determina a resoluo do contrato[16] sem se verificarem os

  • pressupostos do incumprimento definitivo; neste caso, porm, aresoluo puramente condicional, dado que se faculta ao outrocontraente a invocao da excepo do cumprimento do contrato[17].Mas do mesmo passo, tambm no falta quem obtempere que aexigncia do sinal formalmente compatvel com o pressuposto doincumprimento definitivo a excepo do cumprimento s excluda, no caso de o promitente fiel ter, em consequncia da mora,perdido o interesse na prestao, ou na falta do cumprimento noprazo suplementar assinado pelo credor - e que, caso fosse suficientea simples mora, no se justificaria a concesso expressa aopromitente remisso da excepo do cumprimento, uma vez que ooferecimento da prestao pelo devedor sempre seria admissvelcomo meio de purgar a mora, e que, conclua, portanto, que s oincumprimento definitivo faculta a resoluo do contrato e aexigncia ao promitente faltoso do sinal em dobro[18]. neste ltimosentido nico que se julga exacto que se orienta maioritariamentea jurisprudncia[19].No contrato promessa comum convencionar-se um prazo para arealizao das prestaes de facto jurdico positivo, emergentes docontrato promessa, o que significa que o cumprimento temporalmente condicionado[20].O prazo da prestao no , em regra, um elemento essencial naeconomia do contrato, e, portanto, a simples mora no cumprimento,no faculta, por si s, a qualquer dos contraentes, a resoluo docontrato. H casos, porm, em que o desaparecimento, para o credor,do interesse da prestao fora do prazo, resulta da prpria natureza daprestao ou da finalidade particular prosseguida pelo credor com ocontrato. Diz-se, nesse caso, que se trata de um termo essencialobjectivo. A essencialidade desse termo pode tambm resultar deconveno, expressa ou tcita das partes, caso em que se tratar deum termo essencial subjectivo[21]: quando isso ocorre, ao termo dovencimento liga-se, por acordo das partes, a presuno absoluta, nocaso de no cumprimento pontual, de perda de interesse no credor narealizao da prestao. Mas claro que no basta a existncia de um prazo certopara se concluir pela sua essencialidade subjectiva. A estipulao deum prazo para execuo de um contrato no tem em todos os casos omesmo significado: h sempre que averiguar, atravs das regras deinterpretao do negcio jurdico, a precisa intencionalidade dafixao desse prazo, o exacto alcance da conveno dele (art 236 n

  • 1 do Cdigo Civil). Se atravs dessa actividade interpretativa se apura que setrata de um prazo fatal ou de um prazo absolutamente fixo, a norealizao da prestao no tempo devido, conduzir, conforme o casoa uma resoluo automtica ou a uma caducidade contratual;concluindo-se, porm, que se trata de um prazo relativamente fixo,poder fazer surgir para o credor o direito de resolver o contrato ou aexigncia de um cumprimento tardio[22]. Em regra, o prazo essencial, por no haver um interessetemporalmente delimitado no absolutamente fixo mas apenasrelativamente fixo[23]. Especiais dificuldades so as que resultam dos casos emque o prazo do cumprimento convencionado no contexto de umaclusula cum putuerit, como so, por exemplo, as clusulas em queconvencione que o contrato definitivo ser celebrado quando opromitente-comprador estiver em boa situao financeira ou quandoo promitente-vendedor puder arranjar a documentao necessria ou como no caso do recurso aps a concluso da obra. Todavia, mesmo em tal caso, sob pena de ficardefinitivamente comprometida a eficcia vinculativa da promessa ese dar cobertura discricionariedade do promitente, que impediria,ad infinitum, atravs da sua inrcia, o cumprimento - a convenodeve ser interpretada no sentido de uma simples clusula que lheoutorga a iniciativa da fixao do prazo, tendo, porm, a contraparte,a possibilidade de promover a fixao do prazo para ocumprimento[24]. A mesma soluo vale, de resto, pelas mesmasrazes materiais, para o caso de conveno ser atribuda a naturezade clusula cum voluerit - como sucede com a estipulao de que ocontrato definitivo ser celebrado quando um dos promitentes odeseje ou de clusula simultaneamente cum putuerit e cum voluerit.Uma coisa exacta: clusulas desta espcie resolvem-se na fixaode um prazo incerto, dado que no antecipadamente seguro, i.e., aotempo da celebrao da promessa, o momento em que o contratodefinitivo prometido dever ser concludo. Clusulas desta ndole tmainda a virtualidade de afastar a habitual discusso acerca da naturezaabsoluta ou relativa do prazo estipulado[25].

    Discutvel , porm, a questo de saber se um doscontraentes pode lanar mo de uma interpelao extrajudicial dooutro, fixando um prazo razovel para a celebrao do contrato ou seapenas lhe resta a proposio de uma aco especial de fixao

  • judicial do prazo. A doutrina que se tem por prefervel a de que, nestaconjuntura, ao contraente interessado assiste a faculdade de interpelaro outro judicial ou extrajudicialmente - para a celebrao docontrato definitivo prometido num prazo necessariamente razovel, no havendo razo material bastante para o recurso aoprocesso especial de fixao judicial do prazo[26]. O que relevante que o prazo assinado, mesmo extrajudicialmente, se mostrerazovel.

    O conceito de cumprimento enuncia-se com facilidade: ocumprimento da obrigao a realizao da prestao devida.O cumprimento deve decorrer sob o signo estrito, designadamentedos princpios da boa f e da integralidade.O cumprimento consiste, fundamentalmente, numa colaboraointersubjectiva entre credor e devedor e, por isso, a lei vincula-os aambos, a um dever de actuar de boa f (art 762 n 2 do CdigoCivil). luz da boa f que o cumprimento devido deve serdelimitado e partir da boa f que se determina a medida do esforoque, ao devedor, pode ser exigida na realizao da prestao.O princpio da integralidade diz-nos que a prestao no deve serefectuada por partes: o devedor deve realizar a prestao de uma svez, ainda que se trate de uma prestao divisvel, ou seja, que possaser fraccionada em partes sem prejuzo para o interesse do credor(art 763 n 1 do CPC). fcil de justificar esta soluo: o comando de realizar a prestaodirigido ao devedor unitrio e o credor tem interesse em efectuar arecepo da prestao de uma s vez.O princpio, porm, no injuntivo, mas meramente supletivo, dadoque se ressalva conveno contrria e, bem assim, a lei e os usos.Fora destes casos, porm, se o devedor oferecer apenas parte daprestao, o credor pode recusar o seu recebimento, sem sequerincorrer em mora. A lei admite, porm, que o credor possa exigirparte da prestao, o que bem se compreende j que, que pode o maispode o menos, havendo, por isso, nesse caso, por parte do credor,uma renncia temporria a parte do seu direito. O devedor pode,contudo, oferecer a sua prestao por inteiro (art 763 n 2 do CdigoCivil). Em qualquer caso, deve sempre entrar-se em linha de contacom o princpio estruturante da boa f: sempre que a no permissode um cumprimento parcial se mostre contrria boa f, deve

  • admitir-se um cumprimento no integral lcito, o que suceder, porexemplo, nos casos em que a parte em falta da prestao tenha, noseu conjunto, um valor desprezvel ou em que o credor no necessitede todo o conjunto da prestao devida. Nesta hiptese, e em casos dendole semelhante, deve ter-se por contrria boa f a recusa pelocredor de cumprimento meramente parcial[27]. axiomtico que estes princpios so aplicveis sprestaes que emergem do contrato promessa, apesar dapeculiaridade do seu objecto prestaes de facto jurdico positivo.Ainda que essa prestao possa ser realizada por partes, ao credor lcito recusar o cumprimento fraccionado. 3.4. Poderes de controlo da Relao relativamente aojulgamento da matria de facto do tribunal recorrido. indiscutvel a afirmao de que, a par da utilizao de um processojusto e da escolha e interpretao correctas da norma jurdicaaplicvel, um dos fundamentos de uma deciso justa o da verdadena reconstituio dos factos objecto do processo.De nada vale ao juiz uma compreenso exacta da norma aplicvel aocaso se, do mesmo passo, se deixa equivocar na apreciao damatria de facto. O error in judicando da questo de facto trazconsigo, inevitavelmente, um erro de direito; erro esse que, nem porter aquela causa, resultar menos sensvel para os destinatrioslesados.A reconstruo da espcie de facto, o saber na realidade como ascoisas so ou se passaram, quando este conhecimento dependa deelementos de prova cuja apreciao deixada ao prudente critrio dojuiz, uma actividade extraordinariamente delicada que ele ter delevar a cabo sem nenhuma ou quase nenhuma ajuda, pode dizer-se, dacincia do direito, que, nada ou quase nada, lhe pode dizer[28].As dificuldades do controlo da exactido do julgamento da questo defacto resultam, fundamentalmente, da falta de homogeneidade daassuno das provas pelo tribunal de 1 instncia e pela Relao e danatureza da actividade de julgamento da questo de facto.Durante largos anos prevaleceu entre ns uma errnea parificaoentre a oralidade e proibio do registo do acto levado a cabooralmente. O equvoco manifesto: mesmo quando os actos deproduo de prova pessoal so objecto de registo, o juiz a quo nodeixa de os receber oralmente e nessa base que os valora, sendo oseu registo mera formalidade complementar.

  • Oralidade no , portanto, sinnimo de excluso de registo, nosentido de proibio de todos os actos que tenham lugar oralmentefiquem registos, a servir, por exemplo, fins de controlo de assunoda prova, maxime em matria de recursos.Isto foi esquecido pelo legislador do nosso CPC de 1939, ao tomar oprincpio da oralidade como base justificativa da impossibilidade dese fazer registo da prova prestada em julgamento[29]. A combinaodesta circunstncia com o facto de, por um lado, o sistema derecursos ser o da escrita, com absoluta excluso da oralidade, e, poroutro, haver tribunais de recurso por exemplo, a Relao queconhecem tambm da questo de facto, tornava o sistema absurdo,por dar como uma mo possibilidade de recurso da deciso damatria de facto aquilo que tirava com a outra proibio deregisto da produo oral da prova.A Relao normalmente um tribunal de 2 instncia. Pela suaprpria ndole, a Relao tem competncia para apreciar e conhecertanto de questes de direito como de questes de facto. O recurso deapelao precisamente aquele que, segundo a sua natureza derecurso amplo, deveria ter eficcia e alcance para submeter considerao da Relao toda a matria da causa.Todavia a verdade que, at h relativamente pouco tempo, o recursoque se interpusesse da sentena final da causa, incidia, em regra,unicamente sobre questes de direito, funcionando, por isso, aRelao tambm como tribunal de revista (art 712 do CPC de 1939).Absurdo ou no o sistema foi com ele que viveu, durante dcadas, odireito processual portugus.A atribuio ao recurso de apelao da natureza de recursoverdadeiramente global e, correspondentemente, a possibilidade de aRelao conhecer da matria de facto, pressupe que a esse Tribunalso garantidas, pelo menos, as mesmas condies que soasseguradas ao tribunal recorrido.O sistema actual de recursos procurou conciliar as garantias daoralidade e da imediao que contribuem decisivamente para o bomjulgamento da causa, em especial, no que se refere apreciao damatria de facto com algumas exigncias prticas.Estas exigncias conduzem, por exemplo, a que o controlo sobre umdeciso relativa ao julgamento de um facto supostamente provadopelo depoimento de uma testemunha, no requeira a presena dessatestemunha perante o tribunal ad quem. suficiente, na lgica da lei,que seja disponibilizado a este tribunal o registo ou a gravao desse

  • depoimento (art 690-A ns 1 b) e 2 e 712 ns 1 a) e b) e 2 do CPC).O registo dos actos de produo da prova feito por gravao, emregra, por meios sonoros (arts 522-B e 522 C) ns 1 e 2 do CPC).Essa gravao efectuada, tambm em regra, por equipamentosexistentes no tribunal e por funcionrio de justia (arts 3 n 1 e 4 doDL n 39/95, de 15 de Fevereiro).O controlo efectuado pela Relao sobre o julgamento da matria defacto realizado pelo tribunal da 1 instncia, pode, entre outrasfinalidades, visar a reponderao da deciso proferida.A Relao pode reapreciar o julgamento da matria de facto e alterar e, portanto, substituir - a deciso da 1 instncia se do processoconstarem todos os elementos de prova que serviram de base deciso sobre os pontos de facto da matria em causa ou se, tendohavido registo da prova pessoal, essa deciso tiver sido impugnadapelo recorrente ou se os elementos fornecidos pelo processoimpuserem deciso diversa, insusceptvel de ser destruda porqualquer outra prova (art 712 ns 1 a) e b) e 2 do CPC).Note-se, porm, que no se trata de julgar ex-novo a matria de facto- mas de reponderar ou reapreciar o julgamento que dela foi feito na1 instncia e, portanto, de aferir se aquela instncia no cometeu,nessa deciso, um error in judicando[30]. O recurso ordinrio deapelao em caso algum perde a sua feio de recurso dereponderao para passar a ser um recurso de reexame.Mas para que a Relao altere e, portanto, substitua, a deciso damatria de facto da 1 instncia no suficiente um qualquer erro.Este erro h-de ser manifesto, ostensivamente contrrio s regras dacincia, da lgica e da experincia, que aponte, decisiva einequivocamente, para, o julgamento do facto, um sentido diversodaquele que lhe imprimiu o decisor da 1 instncia - e no,simplesmente, que se limite a sugerir ou a tornar provvel ou possvelesse outro sentido[31].Nem, alis, difcil explicar a exactido de um tal entendimento dospoderes de controlo sobre a deciso da matria de facto que a leiadjectiva actual reconhece Relao.De um aspecto, porque esse controlo e a reponderaocorrespondente da matria de facto efectuado, em regra, a partir dareproduo de registos sonoros, rectior, gravaes udio, dedepoimentos, ou da leitura fria e inexpressiva da sua transcrio. Ora, irrecusvel que depoimentos no so s palavras, nem o seu valor

  • pode alguma vez ser medido pelo tom em que foram proferidos; apalavra simultaneamente um meio de exprimir contedos depensamento e de os ocultar; todas as formas de comunicao noverbal do depoente influem, quase tanto como a sua expresso oral,na fora persuasiva do seu depoimento[32]. Realmente, a expressooral apenas uma parte bem diminuta da comunicao e, por isso,existem aspectos e reaces dos depoentes que apenas podem serapreendidos e apreciados por quem os constata presencialmente e quea gravao sonora, e muito menos a transcrio, no tem avirtualidade de registar e que, por isso, so irremissivelmentesubtrados apreciao do ltimo tribunal relativamente ao qualainda seja lcito conhecer da questo correspondente[33]. Tratando-sede prova pessoal, rectius, testemunhal, o registo sonoro ou escrito -comporta o risco de tornar formalmente equivalentes declaraessubstancialmente diferentes, de desvalorizar depoimentos saparentemente imprecisos e de atribuir fora persuasiva a outros ques na superfcie dela dispem.A deciso da matria de facto, respeita, por definio, averiguaode factos i.e., a ocorrncias da vida real, eventos materiais econcretos, a qualquer mudana do mundo exterior, ao estado,qualidade ou situao real das pessoas e coisas[34] e o resultadodessa actividade pode exprimir-se numa afirmao susceptvel de serconsiderada verdadeira ou falsa. Todavia, essa actividade no setraduz num juzo silogstico-formal de subsuno, no umaoperao pura e simplesmente lgico-dedutiva mas uma formaolgico-intuitiva. As dificuldades que daqui decorrem para o controlodessa actividade so meramente consequenciais.Por ltimo, convm ter presente que o controlo da matria de factotem por objecto uma deciso tomada sob o signo da livre apreciaoda prova, atingida de forma oral e por imediao, i.e., baseada numaaudincia de discusso oral da matria a considerar e numa percepoprpria do material que lhe serve de base (arts 652 n 3 e 655 n 1 doCPC)[35].Decerto que liberdade de apreciao da prova no sinnimo dearbitrariedade ou discricionariedade e, portanto, que essa apreciaoh-de ser reconduzvel a critrios objectivos: a livre convico dojuiz, embora seja uma convico pessoal, no deve ser umaconvico puramente voluntarista, subjectiva ou emocional masantes uma convico formada para alm de toda a dvida tida porrazovel e, portanto, capaz de se impor aos outros. Mas no devedesvalorizar-se a circunstncia de essa convico sobre a realidade ou

  • a no veracidade do facto provir do tribunal mais bem colocado paradecidir a questo correspondente.O procedimento desenvolvido para estabelecer os factos sobre osquais o tribunal deve construir a sua deciso no puramentecognitivo, o que explica a inevitvel relatividade da certeza histricade um facto que a prova disponibiliza.Contudo, esse procedimento, na medida em que assenta numesquema lgico, permite estabelecer uma regra de valorao da provaque se analisa nas proposies seguintes: a valorao da prova umaoperao mental que resolve num silogismo em que a premissa maior a fonte ou o meio de prova o depoimento, o documento, etc. - apremissa menor uma mxima de experincia e a concluso aafirmao da existncia ou a inexistncia do facto que se pretendiaprovar; as regras de experincia so juzos hipotticos, de contedogeral, desligados dos factos concretos objecto do processo,procedentes da experincia mas independentes dos casos particularesde cuja observao foram deduzidos e que, para alm desses casos,pretendem ter validade para casos novos. Deste ponto de vista, anica diferena entre um sistema de prova livre e um sistema deprova legal, consiste no facto de na ltima, a mxima de experincia,que constitui a premissa menor do silogismo, ser estabelecida ouobjectivada pelo legislador, ao passo que, no primeiro, se deixa aojuiz a determinao da mxima de experincia que deve aplicar nocaso. Em ambos os casos, o mtodo de valorao da prova no deveser contrrio lgica, devendo antes ser actuado de harmonia comum critrio de normalidade jurdica, derivado do id quod plerumqueaccidit - daquilo que normalmente sucede[36].Nestas condies, a apreciao da prova vincula a um conceito deprobabilidade lgica de evidence and inference. Os elementos deprova so assumidos como premissas a partir das quais possvelextrair inferncias; as inferncias seguem modelos lgicos; asdiversas situaes podem ser analisadas de acordo com padreslgicos que representam os aspectos tpicos de cada caso; a conclusoacerca de um facto logicamente provvel, como uma funo doselementos lgicos, baseada nos meios de prova disponveis[37].O juiz deve decidir segundo um critrio de minimizao do erro, i.e.,segundo a ponderao de qual das decises possveis a realidade oua inveracidade de um facto tem menor probabilidade de no ser acorrecta.3.4.1. Reponderao da deciso relativa matria de facto da 1instncia.

  • Algumas das provas que permitem o julgamento da matria de factocontrovertida e a generalidade daquelas que so produzidas naaudincia final esto sujeitas livre apreciao do tribunal, no sentidoj apontado. o caso, por exemplo, da prova testemunhal (art 396do Cdigo Civil). Essa apreciao baseia-se j se notou naprudente convico do tribunal sobre a prova produzida, quer dizer,em regras de cincia e de raciocnio e em mximas de experincia(art 655 n 1 do CPC). Neste contexto, nada impede, por exemplo,que a convico do juiz se funde no depoimento de uma nicatestemunha[38].Constitui patrimnio comum dos operadores judicirios aextraordinria cautela com que deve ser manejada a provatestemunhal, dado o perigo da sua infidelidade, seja ela involuntria v.g., por erro de percepo ou de reteno do facto ou voluntria por vcio de parcialidade. Dadas todas as possveis causas de erro que actuam sobre a provatestemunhal, natural um atitude de desconfiana e desnimo porparte de quem se v forado a decidir sobre a base de semelhanteprova e uma atitude de desconforto por banda de quem tem decontrolar uma deciso assente numa prova a que se associa uma tolarga falibilidade. O desencanto tanto mais lamentvel quanto certo que na prtica dos tribunais a prova por testemunhas vem cabea de todas as outras, a prova de uso mais frequente porque ,na maioria dos casos, a nica que se pode produzir. Considerada a enorme variedade de causas que podem dar lugar aque a testemunha no possa ou no queria dizer a verdade, deve usar-se de grande cautela em relao a esta prova e s a sua valorao sobo signo estrito da oralidade e da imediao permite estabelecer,adequadamente, o efeito persuasivo que, em cada caso, lhe deve serassinalado. De resto, aquele princpio e este seu corolrio socomprovadamente adequados a extirpar um dos maiores males daprova testemunhal: a mentira.Como j se reparou, o resultado da actividade de julgamento damatria de facto pode exprimir-se numa afirmao susceptvel de serconsiderada verdadeira ou falsa. Contudo, essa verdade no umaverdade absoluta ou ontolgica, sendo antes uma verdade judicial,jurdico-prtica. No julgamento da matria de facto no se visa o conhecimento ouapreenso absoluta de um acontecimento, tanto mais que intervm,irremediavelmente, inmeras fontes possveis de erro, quer porque setrata de conhecimento de factos situados no passado, quer porqueassenta, as mais das vezes, em meios de prova que, pela sua natureza,se revelam particularmente falveis. Est nestas condies,notoriamente, a prova testemunhal. A prova de um facto no visa, pois, obter a certeza absoluta,

  • irremovvel, da verificao desse facto. A prova tem, por isso mesmo,atenta a inelutvel precariedade dos meios de conhecimento darealidade de contentar-se com certo grau de probabilidade do facto: aprobabilidade bastante, em face das circunstncias concretas, paraconvencer o decisor, conhecer das realidades do mundo e das regrasde experincia que nele se colhem, da verificao da realidade dofacto[39].

    As provas no tm forosamente que criar no esprito do juiz umacerteza absoluta acerca do facto a provar, certeza essa que seriaimpossvel ou geralmente impossvel: o que elas devem determinarum grau de probabilidade to elevado que baste para as necessidadesda vida. Nestas condies, uma prova, considerada de per se oucriticamente conjugada com outras, suficiente para demonstrar arealidade no ontolgica mas jurdico-prtica de um factoquando, em face dela seja de considerar altamente provvel a suaveracidade ou, ao menos, quando essa realidade seja mais provvelque a ausncia dela. O primeiro fundamento da impugnao que o recorrentedirige contra a deciso da matria de facto no radica num erro dejulgamento mas num vcio de procedimento error in procedendo.A deciso da matria de facto, diz o recorrente, nula, por violaodo art 653 n 2 do CPC. No seu ver, o tribunal a quo no analisoucriticamente as provas, maxime, no tocante aos factos declarados noprovados, no especificou os fundamentos que foram decisivos para ano comprovao desses factos e para a formao da sua conviconem patenteia o fio crtico da anlise da prova que fosse determinantedo sentido da sua deciso.

    Uma das funes essenciais de toda e qualquer decisojudicial, maxime da deciso da matria de facto, convencer osinteressados do bom fundamento da deciso. A exigncia demotivao da deciso destina-se a permitir que o juiz convena osterceiros da correco da sua deciso. Atravs da fundamentao, ojuiz deve passar de convencido a convincente[40]. A motivao constitui, portanto, a um tempo, uminstrumento de ponderao e legitimao da deciso judicial e, noscasos em que seja admissvel, de garantia do direito ao recurso. Por isso que as decises sobre qualquer pedidocontrovertido ou sobre qualquer, dvida suscitada no processo serosempre fundamentadas (arts 208 n 1 da CR Portuguesa e 158 n 1do CPC). Correspondentemente, a lei adjectiva portuguesa actual

  • terminante na exigncia da especificao, na deciso na matria defacto, dos fundamentos que foram decisivos para a convico dojulgador sobre a prova, ou a ausncia dela, dos factos (art 653 n 2do CPC). Como, em regra, as provas produzidas na audincia finalesto sujeitas livre apreciao, o decisor da matria de facto deveindicar os fundamentos suficientes para, que atravs das regras decincia, da lgica e da experincia, se possa controlar a razoabilidadedaquela convico sobre o julgamento do facto como provado ou noprovado (arts 655 n 1 e 652 n 3, b) e d) do CPC). Note-se que coma exigncia de motivao no se visa a exteriorizao das razespsicolgicas da convico do juiz; a finalidade limitadamente a depersuadir os destinatrios da correco da sua deciso. A apreciao de cada meio de prova pressupe oconhecimento do seu contedo, a determinao da sua relevncia e asua valorao. A exigncia de motivao no exclui a possibilidade defundamentao conjunta de mais que um facto, sempre que, porexemplo, os factos se encontrem ligados entre si e tenham sidoobjecto, no seu ncleo essencial, dos mesmos meios de prova[41]. Oque decerto no admissvel uma motivao em bloco, reportada atodos os factos objecto da prova, mediante mera indicao das provasrelevantes para a formao da convico do juiz. Como, evidentemente, no possvel submeter aapreciao da prova a critrios objectivos a lei apela e contenta-se com a convico ntima ou subjectiva, mas prudente, do tribunal (art655 n 1 do CPC). A convico exigida para a demonstrao darealidade ou da inveracidade de um facto uma convico que, paraalm de dever respeitar as leis da cincia e do raciocnio, podeassentar numa regra mxima da experincia. A convico sobre aprova do facto fundamenta-se em regras de experincia que tantopodem corresponder ao senso comum como a um conhecimentotcnico ou cientfico especializado - baseadas na normalidade dascoisas o id quod plerumque accidit - e aptas a servirem deargumento justificativo dessa convico. A convico do tribunalextrada dessas regras da experincia uma convico argumentativa,isto , uma convico demonstrvel atravs de um argumento[42].No caso, uma leitura ainda que meramente oblqua da motivaoadiantada pelo decisor da 1 instncia para justificar o julgamento damatria de facto permite, com inteira suficincia, apreender as provasque o convenceram da veracidade dos factos que julgou provados e

  • da falta de realidade dos que declarou no provados, a relevncia quedeu s vrias provas produzidas e aquelas que teve por decisivas paraa demonstrao dos factos que julgou provados, e as razes queimpediram uma convico sobre a veracidade daqueles que declarouno provados.Mas vamos que, realmente, o decisor de facto do tribunal de queprovm o recurso omitiu como sustenta o recorrente aespecificao dos fundamentos suficientes para controlar arazoabilidade da sua convico sobre o julgamento dos factos comoprovados ou no provados. Ainda que fosse o caso, de uma talomisso, no resulta, para a procedncia do recurso, qualquerconsequncia relevante.O nico efeito que a lei associa a falta de fundamentao o reenviodo processo para a instncia recorrida para que supra a omisso contanto que o impugnante tenha formulado o indispensvelrequerimento (art 712 n 5 do CPC). O impugnante no deduziu umtal requerimento, tendo-se limitado a notar a omisso. Aquela falta, ainda que devesse ter-se por verificada, ,portanto, na espcie do recurso, falha de consequncias. Todavia, segundo o impugnante, o vcio da nulidade dadeciso da matria de facto decorreria ainda de uma outracircunstncia: de, na resposta ao quesito n 18 da base instrutria, odecisor de facto ter valorado a certido emitida pela CM da Sert mas no o documento representativo da licena de utilizao doimvel. Por esse motivo, alega o impugnante, aquela resposta , domesmo passo, excessiva, por ter ido para alm do que estavaquesitado, no respondendo directamente matria objecto da prova,e deficiente, dado que em finais de 2000, os apartamentos estavamprontos.

    No quesito inserto na base instrutria com o n 18,perguntava-se isto: Em finais de 2000, os apartamentos estavamprontos, tinham gua, electricidade e garantia para a realizao dearruamentos? O tribunal da audincia deu-lhe esta resposta: Porcertido de 12 de Fevereiro de 2001, da ento Chefe da Repartioda Secretaria da Cmara Municipal da Sert, conforme despacho doSr. Presidente da dita Cmara, de 18 de Abril de 2000, foi atestadoque a cauo efectuada pelo aqui R. a favor da mesma CmaraMunicipal, destinada a assegurar a execuo das infra-estruturas doalvar de loteamento nmero 3, do ano de 2000, para o prdio sitoda Rua dos Pinheiros, freguesia de Cernache do Bonjardim, concelhoda Sert, suficiente para garantir a boa execuo das obras deurbanizao do mesmo loteamento.

  • s partes que cumpre alegar os factos essenciais queintegram a causa de pedir ou que fundamentam a excepo (art 264n 1 do CPC). No tocante aos factos essenciais vale, por inteiro, oprincpio da disponibilidade objectiva: o tribunal no os podeconsiderar se no foram alegados pelas partes.A esse poder de disposio quanto aos factos da causa, correspondeum limite do julgamento: o juiz no pode utilizar factos que as partesno tragam ao processo (art 664 do CPC). Correspondentemente, odecisor da matria de facto no pode pronunciar-se sobre facto que aspartes no tenham alegado. Caso o faa, essa resposta deveconsiderar-se no escrita, portanto, inexistente (art 646 n 4, porinterpretao extensiva)[43].Seja qual for, em definitivo, a soluo exacta para o problema dasrespostas restritivas i.e., que declaram provado menos de que oalegado e explicativas i.e., que julgam provada a causa do factodeclarado assente no tocante s respostas excessivas ouexorbitantes, a nica doutrina admissvel a de as ter por noescritas, e, logo, por inexistentes[44]. O tribunal da audincia s podeconhecer da matria de facto abrangida pelos pontos insertos na baseinstrutria e no pode responder ao que lhe no foi perguntado. Emboa lgica, impe-se que no se tomem em considerao, pelomenos, as respostas exorbitantes, isto , as respostas que excedam ouultrapassem os factos compreendidos nos quesitos.No caso, no parece que a resposta considerada seja,simultaneamente, excessiva e deficiente. Trata-se antes de umaresposta restritiva, ou seja, de uma resposta que apenas julga provadoparte do facto controvertido.Nitidamente, a reproduo o teor da certido autrquica teve porfinalidade responder afirmativamente parte final do quesito, no qualse perguntava se a realizao dos arruamentos estava garantida, enegativamente parte inicial desse mesmo quesito, na qual sequestionava se os apartamentos estavam prontos.Tendo em conta o contedo do instrumento representativo da licenade utilizao possvel determinar que, por deciso municipal, tinhasido autorizada, no dia 13 de Novembro de 2000, a utilizao doprdio para habitao. Todavia, desse documento no decorre que,naquela data, os apartamentos estivessem prontos, com o sentido dese mostrarem absoluta e funcionalmente aptos para a sua finalidade: ahabitao.Realmente, a licena administrativa em que resolve a autorizao de

  • utilizao que titulada por alvar apenas garante a concluso, notodo ou em parte, da operao urbanstica, e a conformidade da obracom o projecto de arquitectura e com as condies de licenciamento(arts 4 n 1 e 62 n 1 do RGEU, aprovado pelo DL n 555/99, de 16de Dezembro).Assim, por exemplo, est assente ponto que o recorrente nocontroverte no recurso que em 15 de Abril de 2001, osapartamentos ainda no tinham electricidade e os arruamentos noestavam feitos (resposta ao enunciado de facto inserto na baseinstrutria sob o n 8).Por outro lado, perguntando-se se os apartamentos estavam prontos, eclaro que o tribunal da audincia no podia responder-lhe que tinhamlicena de utilizao, dado que um facto e outro no so exactamenteequivalentes.De resto, como a licena de utilizao s documentalmente podeprovar-se, qualquer resposta do decisor de facto sobre tal factosempre se teria por no escrita e, logo, por inexistente (art 646 n 4,2 parte do CPC). No h, portanto, a mnima razo para, comopretende o recorrente, aditar resposta ao quesito 18 o facto daexistncia daquela licena o que no impede o uso do factocorrespondente pela sentena, j que esta deve utilizar, comofundamentos de facto, todos os factos adquiridos durante a tramitaoda causa, designadamente os provados por documentos juntos aoprocesso, por iniciativa das partes ou tribunal (arts 523, 524, 535 e659 n 3 do CPC).Seja como for, a desconsiderao pelo decisor de facto de umaqualquer prova, que, a ser atendida, conduziria a uma diferentedeciso de qualquer ponto da matria de facto, constitui um error iniudicando um erro de julgamento - e no erro de procedimento,uma nulidade processual.De resto, entendendo-se que se trata de uma nulidade processual,ento segue-se, a um tempo, que tal nulidade se considera sanada eno constitui objecto admissvel do recurso. Realmente, sendoclaramente uma nulidade inominada ou secundria, ela s apreciadamediante reclamao da parte interessada na eliminao ou repetiodo acto, e o prazo da sua alegao de dez dias, a contar de qualquerinterveno da parte na aco ou da sua notificao para qualquertermo do processo sempre que no esteja presente no momento emque a nulidade foi cometida (arts 153 n 1, 201 n 1, 202, 2 parte,203 n 1 e 205 n 1 do CPC).

  • No caso, o recorrente teve ou deveria ter tido - necessariamenteconhecimento da comisso da nulidade no dia 2 de Dezembro de2010, data em que se realizou a audincia no terminus da qual foipublicada a deciso da matria de facto, publicao a que o recorrentes no assistiu por entretanto se ter ausentado, mas s reclamoucontra ela na sua alegao do recurso, i.e., depois a extino, porcaducidade, do direito de arguir (arts 144 n 1 e 2, 145 ns 1 e 3 e685 n 2, por analogia, do CPC).O recorrente impugna tambm o sentido da deciso dos pontos defacto insertos na base instrutria sob os ns 14, 15, 16, 17, 19 e20 - que foram julgados no provados - e d, para inculcar o error iniudicando, uma nica prova: a prova testemunhal, maisespecificamente, os depoimentos das testemunhas irmo doautor - adquirentes de fraces do prdio e ...Perguntava se na sequncia do referido na alnea F) dos factosassentes o Autor pediu ao Ru, que aguardasse at Maro de 2001,uma vez que estava em vias de se divorciar e s ento outorgaria aescritura, e se em Maro de 2001, o Ru contactou de novo o Autorpara o mesmo efeito, por intermdio do irmo deste, recusando-seaquele a outorgar a escritura dos apartamentos, com o mesmomotivo, respectivamente. De harmonia com a alegao do recorrente deve dar-secomo provado ao menos que, em Abril de 2001, o autor seencontrava em processo de divrcio e que o ru se ofereceu paracumprir, parcialmente que fosse, dada a questo da independnciadas garagens, o contrato promessa de compra e venda e outorgar aescritura dos apartamentos. No segmento relativo oferta do cumprimento parcial, areponderao do julgamento de todo intil, dado que resulta deoutros pontos de facto cuja exactido o apelante no discute, a ofertadesse cumprimento: o que patentemente ocorre com o ponto defacto que, no momento da seleco da matria de facto, foi logo tidopor assente, sob a alnea E), de harmonia com a qual, o ru comeoua pressionar o autor desde finais de 2000, para a outorga da escriturapblica, depreendendo-se inequivocamente, por exemplo, do facto,tambm logo considerado assente no mesmo momento, sob alnea Q),que a escritura pblica que o apelante se propunha celebrar tinha porobjecto apenas a relativa aos apartamentos e no tambm sgaragens, dado que estas em 15 Abril de 2001, ainda no estavamconcludas. De outro aspecto, patente que o ponto vivo daqueles

  • quesitos o facto relativo ao motivo da recusa do autor em celebrar ocontrato definitivo prometido. E que esse motivo consistiu nodivrcio do recorrido realidade que no foi asseverado por nenhumadas testemunhas apontadas pelo apelante.A audio do registo sonoro dos depoimentos prestados na audinciae a leitura da transcrio que deles fez o recorrente mostra que anica testemunha que se referiu ao divrcio do recorrido foi que,todavia, foi terminante em garantir que a escritura no foi feitaporque a garagem no estava feita e as infra-estruturas no estavamem condies, o meu irmo no quis.De resto, o motivo da recusa do recorrido em outorgar a escritura decompra e venda a no construo das garagens - foi julgado assente alnea P) logo no momento da seleco da matria de facto econtra esse facto no dirigida pelo recorrente qualquer impugnao.Quesitava-se nos pontos de facto inserto na base instrutria sob o ns15 e 16 se Autor e Ru acordaram que o preo das garagens aconstruir, independentes do edifcio, seria de 1.000.000$00 (ummilho de escudos) cada e descontados no valor do apartamento, noacto da escritura, uma vez que os apartamentos seriam construdos eestariam concludos antes das garagens.Quanto este enunciado de facto a reponderao da exactido do seujulgamento deve ter-se por inteiramente excluda.O contrato promessa de compra e venda de uma fraco de edifcio um contrato formal, dado que exigindo-se para o contrato definitivoescritura pblica ou documento particular autenticado, s vale seconstar de documento assinado pelos promitentes (arts 410 n 2 e875 do Cdigo Civil, e 80 do Cdigo do Notariado).No caso, no instrumento que documenta as declaraes de vontadeintegrantes do contrato promessa, diz-se simplesmente que o objectodo contrato era dois apartamentos com respectivas garagens e que oseu preo unitrio era de 26 000 000$00. Portanto, o ponto de factoconsiderado constitui nitidamente uma conveno seno contrria aomenos adicional ao contedo daquele documento.Ora, a prova testemunhal no admitida contra ou praeterscripturam, mas apenas, juxta scripturam, quer dizer, para efeitosinterpretativos (art 393 n 3 e 394 do Cdigo Civil).Desde que para a demonstrao daquele facto inadmissvel a provatestemunhal, e que esta a nica prova que o recorrente oferece parao julgar provado, segue-se, como corolrio que no pode ser

  • recusado, que est irremediavelmente prejudicada a reponderao dojulgamento correspondente.Como se observou j, a compra e venda de bens imveis sdocumentalmente pode provar-se (arts 364 n 1 875 do Cdigo Civil,e 80 do Cdigo do Notariado). Como tambm j se notou, o tribunalda audincia deve restringir a sua apreciao prova validamenteproduzida na audincia, por isso que considerada inexistentequalquer resposta desse tribunal sobre factos que s possam serprovados por documento (art 646 n 4, 2 parte, do CPC).Como a venda de bens imveis s documentalmente pode provar-se,qualquer resposta dada pelo tribunal da audincia ao quesito 17 - noqual se perguntava se o recorrente vendeu os demais apartamentos,com as garagens independentes do edifcio habitacional deve ter-sepor inexistente.A isto responde o recorrente que, nesse caso fica por explicar, quesem qualquer documento autntico que o comprove, se tenha, logo nomomento da seleco da matria de facto, dado como assente que, emdata posterior a 15 de Abril de 2001, o ru vendeu os apartamentos aterceiros.A seleco da matria de facto, ainda mesmo quando contra ela notenha sido deduzida qualquer reclamao no transita em julgado e,por isso, no se torna vinculativa no processo (art 511 n 2 do CPC).Ela nunca torna indiscutvel, que no existam factos relevantes queno foram sequer seleccionados, nem que os factos includos na baseinstrutria seja efectivamente controvertidos nem que osconsiderados assentes no sejam, afinal, controvertidos. Assim, aconsiderao pelo tribunal de que o facto est admitido por acordo ouprovado no significa que ele no seja realmente controvertido[45]. o que ocorre na espcie vertente. Por claro erro da deciso daseleco da matria de facto, julgou-se logo assente que o recorrentevendeu os apartamentos e as garagens a terceiros, no obstante no semostrar adquirido ao processo o indispensvel documento.Simplesmente esse erro no autoriza outro. A nica soluo exacta ,do mesmo passo, julgar aquele facto controvertido e recusar aresposta ao quesito 17 e, evidentemente, a reponderao dojulgamento correspondente.O facto includo na base instrutria sob o n 14 no deve ter-se porrelevante, segundo o nico enquadramento jurdico possvel doobjecto da causa, sendo, portanto intil a reponderao da exactidodo seu julgamento (art 137 do CPC).

  • Relevante, de algum modo, segundo a soluo plausvel da questode direito, exterioridade das garagens relativamente ao edifcio emque se localizam os apartamentos. Mas esse facto e o seuconhecimento pelo apelado mesmo desde data anterior daconcluso do contrato promessa mostra-se provado e no sofreuqualquer impugnao.Nestas condies, a impugnao deduzida pelo recorrente contra adeciso da matria de facto deve improceder sem prejuzo, todavia,de, pelas razes apontadas, o facto inserto na factualidade assente soba alnea R) identificado na sentena recorrida pela letra T - se deverter por no provado.Apesar disso, no h razo para modificar a deciso de procedncia parcial da aco, contida na sentena impugnada.3.5. Concretizao.Na espcie sujeita, o recorrente e o recorrido vincularam-se, no dia13 de Setembro de 2000, a comprar e a vender, respectivamente, porum preo unitrio, dois apartamentos com as respectivas garagens. ,por isso, incontroverso que concluram entre si um contrato promessade compra e venda, no qual aquela e esta ocupam as posiesjurdicas de promitente alienante e de promitente adquirente,respectivamente (arts 410 n 1, 874, 879 a) e b) do Cdigo Civil). Os promitentes convencionaram que o contrato definitivoprometido o contrato de compra e venda - seria concludo logo queo recorrente assim o desejar, desde que a obra se encontre concluda.Uma conveno desta espcie configura, prima facie, do mesmopasso uma clusula cum voluerit e cum puerit. Todavia, pelas j razes apontadas, nenhuma razo obstavaa que o recorrente interpelasse extrajudicialmente o recorrido para ocumprimento.E foi o que o recorrente fez, dado que, desde os finais de Dezembrode 2000, como se diz na matria de facto, comeou a pressionar orecorrido para a outorga da escritura de compra e venda.Simplesmente, tendo-se convencionado que o objecto mediato docontrato definitivo prometido era constitudo pelos apartamentos epelas garagens, o recorrente propunha-se celebrar aquele contrato dealienao - mas apenas no tocante aos apartamentos. Nessemomento, e mesmo em 15 de Abril de 2001, as garagens no estavamconcludas e mesmo os arruamentos no estavam feitos e osapartamentos no tinham electricidade.

  • Ora, tendo-se convencionado que o contrato definitivo prometidoseria celebrado quando a obra se encontrasse concluda, porconcluso da obra deve entender-se no apenas a concluso dosapartamentos mas tambm das garagens. Obra, no contexto dapromessa, realmente o conjunto dos apartamentos e das garagens,concluso que indelevelmente inculcada pelo carcter unitrio dopreo, pela utilizao, sempre no singular, do substantivo escriturapblica, e pela ligao funcional entre os apartamentos e as garagens.De resto, mesmo no momento em que o recorrente deu por terminadoo contrato promessa, a obra relativa aos apartamentos no semostrava concluda, dado que os apartamentos no dispunham deelectricidade e os arruamentos no estavam feitos. certo que as garagens eram fisicamente independentes do edifciodos apartamentos, sendo-lhe exteriores. Porm, essa autonomia fsicano autoriza na falta de conveno contrria a ciso temporal documprimento, celebrando-se primeiro a escritura relativa aosapartamentos e, em momento ulterior, a relativa s garagens.Nestas condies, claro que o recorrente ofereceu um cumprimentomeramente parcial, propondo-se realizar a sua prestao de factojurdico-positivo a emisso da declarao de vontade integrante docontrato definitivo prometido apenas no tocante a um das coisasprometidas vender.E, face ausncia do oferecimento pelo recorrente da sua prestaopor inteiro, ao recorrido era licito recusar o seu recebimento, semsequer incorrer em mora. E foi justamente essa a atitude do apelado.E sendo isto exacto, claro que o recorrente no dispunha do direitopotestativo extintivo de resoluo do contrato promessa, conclusoque permanece exacta ainda que se devesse entender que, com aquelarecusa, o recorrido se constituiu na situao de mora. que, como senotou, a resoluo do contrato reclama, no apenas a mora mas umincumprimento definitivo.Portanto, a declarao de resoluo do contrato dirigida pelorecorrente ao recorrido no deve ter-se por lcita. Todavia, essadeclarao resolutiva sem fundamento tem uma inegvelvirtualidade: torna patente a constituio do recorrente numa situaode incumprimento definitivo, tornando dispensvel ao recorrente opercurso da via crucis da fixao do prazo admonitrio, para que oapelante se constitua naquela situao: quem resolve infundadamenteum contrato revela uma vontade sria, definitiva e consciente de noo querer cumprir e de se sujeitar s consequncias desseincumprimento

  • E esse incumprimento definitivo garante ao recorrido o direito aopercebimento em dobro da quantia que depositou nas mos doapelado embora s daquela, como justamente notou a sentenaapelada, a que deva assinalar-se o carcter se sinal.Todas as contas feitas, bem pode retirar-se esta proposioconclusiva: a sentena impugnada juridicamente exacta e, por isso,o recurso deve improceder.As custas do recurso sero satisfeitas pelo sucumbente: o apelante(art 446 ns 1 e 2 do CPC).4. Deciso.Pelos fundamentos expostos, nega-se provimento ao recurso.Custas pelo recorrente.Henrique Antunes (Relator)Regina RosaArtur Dias

    [1] Acs. do STJ de 16.10.86, BMJ n 360, pg. 534 e da RC de23.03.96, CJ, 96, II, pg.24.[2] Acs. do STJ de 26.09.95, CJ, STJ, III, pg. 22 e de 16.01.96, CJ,STJ, III, pg. 43.[3] Acs. da RC de 11.01.94, BMJ n 433, pg. 633, do STJ de21.10.88, BMJ n 380, pg. 444 e de 30.05.89, BMJ n 387, pg. 456e da RC de 21.01.92, CJ, I, pg. 86.[4] Antnio Menezes Cordeiro, Direito das Obrigaes, 2 vol.AAFDL, 1980, pg. 457, Baptista Machado, RLJ Ano 118, pg. 275,Brando Proena, Do Incumprimento do Contrato PromessaBilateral, cit., pg. 87 e A Hiptese da Declarao (Lato Sensu)Antecipada de Incumprimento por parte do Devedor, Estudos emHomenagem ao Professor Doutor Jorge Ribeiro de Faria, CoimbraEditora, 2003, pg. 364, e Antunes Varela, Das Obrigaes em Geral,vol. II, pg. e Pessoa Jorge, Direito das Obrigaes, AAFDL, pg.296; Acs., v.g. da RC de 24.03.92 e 28.05.92, CJ, XVII, II, pg. 50 eXVIII, III, pg. 115 e do STJ de 07.03.91, BMJ n 405, pg. 458.[5] Calvo da Silva, A Declarao da Inteno de no Cumprir,Estudos de Direito Civil e Processo Civil (Pareceres), Coimbra, 1996,pg. 137.[6] Acs. do STJ de 05.12.06 e 29.06.06 www.dgsi.pt.[7] Ac. do STJ de 07.03.06, www.dgsi.pt.

  • [8] Joo Batista Machado, Pressupostos da Resoluo porIncumprimento, Obra Dispersa, vol I, Scientia Iuridica, Braga, 1991,pgs. 135 a 137 e Pessoa Jorge, Ensaio sobre os Pressupostos daResponsabilidade Civil, Lisboa, 1968, pg. 20, nota 3, e Ac. do STJde 05.07.07, www.dgsi.pt.[9] Joo Baptista Machado, Pressupostos da Resoluo porIncumprimento, Obra Dispersa, vol I, Scientia Iuridica, Braga, 1991,pg. 164 e Ac. do STJ de 10.07.08, www.dgsi.pt.[10] Pedro Romano Martinez, Da Cessao do Contrato, Almedina,Coimbra, 2005, pg. 139 e Ac. da RP de 27.04.95, BMJ n 446, pg.352.[11] Ac. do STJ de 29.06.96, www.dgsi.pt.[12] Cfr., sobre o problema, Antnio Pinto Monteiro, Denncia deum contrato de concesso comercial, RLJ, Separata, 1998, pgs. 71 a73 e Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e InteresseContratual Positivo, vol. II, Coimbra, 2009, pg. 1674, nota 4861.[13] Como sucede, por exemplo, no tocante ao contrato promessa.Cfr. Ac. do STJ de 09.05.95, CJ (STJ), II, pg. 66[14] Ac. do STJ de 28.11.75, BMJ n 251, pg. 272 e Pedro RomanoMartinez, Da Cessao do Contrato, Almedina, Coimbra, 2005, pgs.71 e 72 e 175.[15] Vaz Serra, Contrato-Promessa, BMJ n 74, 1958, pg. 6.[16] O ponto duvidoso. Antnio Menezes Cordeiro O NovssimoRegime do Contrato Promessa, Estudos de Direito Civil, vol. I,Coimbra, 1987, pg. 85 - sustenta que no se trata de verdadeiraresoluo; contra, Brando Proena, Do Incumprimento do ContratoPromessa Bilateral. A Dualidade Execuo Especfica Resoluo,Coimbra, 1987, pg. 153.[17] Almeida Costa, Direito das Obrigaes, 7 edio, Almedina,Coimbra, 1998, pgs. 375 e 376 e Pedro Romano Martinez, DaCessao do Contrato, Almedina, Coimbra, 2005, pg. 127 e SousaRibeiro, O Campo de Aplicao do Regime Indemnizatrio do Artigo442 do Cdigo Civil: Incumprimento ou Mora? BFDUC, VolumeComemorativo, Coimbra, 2003, pgs. 211 e ss. Este ltimo autorentende que o contraente fiel que pede o valor do sinal ou da coisasem haver incumprimento definitivo fica sujeito excepo documprimento, mas que se houver incumprimento, ainda que fora daextino do prazo admonitrio, fica excluda a oferta documprimento.[18] Assim, v.g, os Acs do STJ de 01.07.08, www.dgsi.pt., e de27.11.97, BMJ n 471, pg. 388. Este ltimo indica, todavia,jurisprudncia de sentido contrrio, reafirmada, por exemplo, peloAc. do STJ de 10.02.98, CJ, STJ, VI, I, pg. 63.

  • [19] Assim, v.g. os Acs. do STJ de 12.01.10 e de 06.10.11,www.dgsi.pt. Uma recenso da jurisprudncia sobre o ponto pode ler-se Antnio Menezes Cordeiro Tratado de Direito Civil Portugus,II, Direito das Obrigaes, Tomo II, 2010, Almedina, Coimbra, 2010,pgs. 388 e 389 que, de resto, sustenta que, para o efeitoconsiderado, suficiente a simples mora.[20] Mas claro que, quando isso no suceda i.e., quando apromessa se mostre destituda de prazo de cumprimento no hmotivo para por em causa a sua validade e eficcia. Assim, para odireito anterior - o Assento do STJ de 4 de Maro de 1966, quedeclarou que para a validade formal da promessa de venda deimveis no era necessria a fixao de prazo a doutrina citada porVaz Serra, RLJ Ano 109, pg. 237. Em todo o caso, a natureza puradas obrigaes instrumentais dos promitentes no poder deixar deter em conta que a interpelao judicial ou extrajudicial no poderser feita arbitrariamente ou com violao das regras da boa f,impedindo o cumprimento da outra parte ou encobrindo mesmo umno cumprimento.[21] Joo Batista Machado, Pressupostos da Resoluo porIncumprimento, Obra Dispersa, vol I, Scientia Iuridica, Braga, 1991,pg. 188.[22] Antunes Varela, Das Obrigaes em Geral, vol. II, 5 edio,Almedina Coimbra, 1992, pgs. 45 e 45, Vaz Serra, RLJ, Anos 104,pg. 302 e 110, pg. 326, e Jos Carlos Brando Pro