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Revista Brasileira de Ensino de F´ ısica, v. 29, n. 4, p. 575-583, (2007) www.sbfisica.org.br Produtos e Materiais Did´ aticos Teoria da relatividade restrita e geral no programa de mecˆ anica do ensino m´ edio: uma poss´ ıvel abordagem (Special and general theory of relativity in the high school: a possible approach) Andreia Guerra 11 , Marco Braga 1 e Jos´ e Cl´audio Reis 2 1 Grupo Teknˆ e, Laborat´ orio de Difus˜ ao de Ciˆ encia e Tecnologia, Centro Federal de Educa¸ c˜aoTecnol´ ogica, Rio de Janeiro, RJ, Brasil 2 Grupo Teknˆ e, Col´ egio Pedro II, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Recebido em 7/3/2007; Revisado em 10/9/2007; Aceito em 20/0/2007 Esse artigo pretende contribuir para o debate em torno ao ensino de f´ ısica, trazendo uma proposta curricular deinser¸c˜ ao do estudo das teorias da relatividade restrita e geral na primeira s´ erie do ensino m´ edio. Tal proposta foi constru´ ıda a partir de uma abordagem hist´orico-filos´ofica da ciˆ encia, onde a rela¸c˜ ao entre a f´ ısica com outras produ¸ oes culturais constituiu-se no vi´ es privilegiado para se trabalhar com os adolescentes as quest˜oes cient´ ıficas respondidas pelos trabalhos de Albert Einstein. Palavras-chave: ensino de f´ ısica, teoria da relatividade, hist´oria e filosofia da ciˆ encia, cultura. The present article aims to contribute for the debate about the teaching of physics in the first year of high school, as far as the study of the theory of relativity (restrict and general) is concerned. Based on a historical and philosophical approach, it discusses the relationship between science and other cultural productions, in an effort to make students reach a more meaningful understanding of how knowledge is built and therefore, better apprehend the questions and solutions presented by Albert Einstein in his works. Keywords: physics teaching, theory of relativity, history and philosophical of science, culture. 1. Introdu¸ ao A quest˜ao do curr´ ıculo de f´ ısica para o ensino m´ edio ´ e um tema muito pensado e discutido entre os pesquisa- dores da ´ area. A publica¸ c˜ao dos Parˆ ametros Curricu- lares Nacionais (PCNs) trouxe contribui¸ c˜oesaodebate, apresentando de forma sistematizada as propostas cons- tru´ ıdas pela comunidade ao longo dos ´ ultimos 20 anos, expostas em eventos como o Simp´osio Nacional de En- sino de F´ ısica. Com o estabelecimento dos parˆametros ao se pretendeu a formula¸ c˜ao de um curr´ ıculo pronto e fechado a ser executado por todas as escolas. A id´ eia era que a partir das orienta¸ c˜oes de temas e das ha- bilidades espec´ ıficas a serem desenvolvidas, diferentes propostas curriculares pudessem ser criadas de acordo com a especificidade de cada escola [1]. Nas orienta¸ c˜oes dos Parˆ ametros Curriculares est´a clara a necessidade da abordagem de temas relacio- nados ` a f´ ısica do s´ eculo XX. Na ´ epoca da publica¸ c˜ao daquele documento, essas quest˜oes estavam alijadas do curr´ ıculo praticado na maioria das escolas brasileiras. A mesma ausˆ encia era registrada nos livros did´ aticos. Fazendo uma retrospectiva, percebemos que no que tange ao ensino da f´ ısica moderna, o cen´ario nacional ao sofreu mudan¸ cas significativas ap´os a publica¸ c˜ao dos PCNs. O tema continua exclu´ ıdo da maioria dos exames de vestibulares nacionais. Apesar desse n˜ao ser o elemento norteador do ensino m´ edio, o privil´ egio atribu´ ıdo ` a f´ ısica cl´assica e ao formalismo matem´atico a ela inerente por parte desses exames refor¸ca a re- sistˆ encia de muitos educadores em ampliar a aborda- gem da f´ ısica para al´ em do s´ eculo XIX. Em rela¸ c˜ao aos livros did´ aticos houve mudan¸ cas. As novas edi¸ c˜oes de algumas cole¸c˜oes [2-5] muito usadas pelos professores de f´ ısica inseriram no ´ ultimo volume temas de f´ ısica moderna, como: a f´ ısica relativ´ ıstica, a ısica do mundo microsc´opico e a cosmologia. Na ver- dade, a mudan¸ ca n˜ao partiu de uma demanda dos pro- fessores, mas da exigˆ encia do Minist´ erio da Educa¸ c˜ao da adequa¸ c˜ao dos livros did´ aticos `as metas anunciadas nos PCNs. Parte dessa tendˆ encia se deve ao plano do governo federal de amplia¸ c˜ao do programa de aquisi¸ c˜ao de livros did´ aticos para as disciplinas cient´ ıficas. Apesar da resistˆ encia das escolas brasileiras em rela¸ c˜ao ao ensino da f´ ısica moderna, estudos foram rea- lizados no intuito de criar bases para uma mudan¸ ca cur- 1 E-mail: [email protected]. Copyright by the Sociedade Brasileira de F´ ısica. Printed in Brazil.

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Revista Brasileira de Ensino de Fısica, v. 29, n. 4, p. 575-583, (2007)www.sbfisica.org.br

Produtos e Materiais Didaticos

Teoria da relatividade restrita e geral

no programa de mecanica do ensino medio: uma possıvel abordagem(Special and general theory of relativity in the high school: a possible approach)

Andreia Guerra11, Marco Braga1 e Jose Claudio Reis2

1Grupo Tekne, Laboratorio de Difusao de Ciencia e Tecnologia, Centro Federal de Educacao Tecnologica,Rio de Janeiro, RJ, Brasil

2Grupo Tekne, Colegio Pedro II, Rio de Janeiro, RJ, BrasilRecebido em 7/3/2007; Revisado em 10/9/2007; Aceito em 20/0/2007

Esse artigo pretende contribuir para o debate em torno ao ensino de fısica, trazendo uma proposta curricularde insercao do estudo das teorias da relatividade restrita e geral na primeira serie do ensino medio. Tal propostafoi construıda a partir de uma abordagem historico-filosofica da ciencia, onde a relacao entre a fısica com outrasproducoes culturais constituiu-se no vies privilegiado para se trabalhar com os adolescentes as questoes cientıficasrespondidas pelos trabalhos de Albert Einstein.Palavras-chave: ensino de fısica, teoria da relatividade, historia e filosofia da ciencia, cultura.

The present article aims to contribute for the debate about the teaching of physics in the first year of highschool, as far as the study of the theory of relativity (restrict and general) is concerned. Based on a historicaland philosophical approach, it discusses the relationship between science and other cultural productions, in aneffort to make students reach a more meaningful understanding of how knowledge is built and therefore, betterapprehend the questions and solutions presented by Albert Einstein in his works.Keywords: physics teaching, theory of relativity, history and philosophical of science, culture.

1. Introducao

A questao do currıculo de fısica para o ensino medio eum tema muito pensado e discutido entre os pesquisa-dores da area. A publicacao dos Parametros Curricu-lares Nacionais (PCNs) trouxe contribuicoes ao debate,apresentando de forma sistematizada as propostas cons-truıdas pela comunidade ao longo dos ultimos 20 anos,expostas em eventos como o Simposio Nacional de En-sino de Fısica. Com o estabelecimento dos parametrosnao se pretendeu a formulacao de um currıculo prontoe fechado a ser executado por todas as escolas. A ideiaera que a partir das orientacoes de temas e das ha-bilidades especıficas a serem desenvolvidas, diferentespropostas curriculares pudessem ser criadas de acordocom a especificidade de cada escola [1].

Nas orientacoes dos Parametros Curriculares estaclara a necessidade da abordagem de temas relacio-nados a fısica do seculo XX. Na epoca da publicacaodaquele documento, essas questoes estavam alijadas docurrıculo praticado na maioria das escolas brasileiras.A mesma ausencia era registrada nos livros didaticos.

Fazendo uma retrospectiva, percebemos que no que

tange ao ensino da fısica moderna, o cenario nacionalnao sofreu mudancas significativas apos a publicacaodos PCNs. O tema continua excluıdo da maioria dosexames de vestibulares nacionais. Apesar desse naoser o elemento norteador do ensino medio, o privilegioatribuıdo a fısica classica e ao formalismo matematicoa ela inerente por parte desses exames reforca a re-sistencia de muitos educadores em ampliar a aborda-gem da fısica para alem do seculo XIX.

Em relacao aos livros didaticos houve mudancas. Asnovas edicoes de algumas colecoes [2-5] muito usadaspelos professores de fısica inseriram no ultimo volumetemas de fısica moderna, como: a fısica relativıstica, afısica do mundo microscopico e a cosmologia. Na ver-dade, a mudanca nao partiu de uma demanda dos pro-fessores, mas da exigencia do Ministerio da Educacaoda adequacao dos livros didaticos as metas anunciadasnos PCNs. Parte dessa tendencia se deve ao plano dogoverno federal de ampliacao do programa de aquisicaode livros didaticos para as disciplinas cientıficas.

Apesar da resistencia das escolas brasileiras emrelacao ao ensino da fısica moderna, estudos foram rea-lizados no intuito de criar bases para uma mudanca cur-

1E-mail: [email protected].

Copyright by the Sociedade Brasileira de Fısica. Printed in Brazil.

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ricular [6]. Alem disso, nas ultimas decadas varios pes-quisadores da area de ensino de fısica tem desenvolvidotrabalhos envolvendo construcao de materiais didaticos,pesquisas educacionais e projetos de formacao de pro-fessores que se propoe fornecer a estrutura para queprofessores possam reconstruir seus currıculos, trazendoaos alunos a fısica do seculo XX [7-11]. No ano de2005, comemoramos o centenario do ano miraculoso deEinstein. No mundo inteiro, ocorreram eventos paracomemorar a data. Motivados pela comemoracao, mui-tos professores brasileiros realizaram atividades de di-vulgacao em suas escolas da obra de Einstein, mas pou-cos incluıram essa tematica como parte do currıculo re-gular.

Os resultados de varias pesquisas educacionais, otrabalho pontual de alguns professores, a pequena mu-danca nos livros didaticos e a validade dos PCNs mos-tram que a introducao de temas de fısica moderna deveser objeto de discussao entre aqueles que se dedicamao ensino medio. Procurando contribuir para o debateo presente artigo centrara atencao numa proposta deinsercao da teoria da relatividade, restrita e geral, noensino medio formal.

2. Por que tratar de um tema desenvol-vido ha cem anos como a teoria darelatividade restrita?

Nas reflexoes voltadas para a busca da identidade doensino de fısica, fica claro que esse ensino precisapreocupar-se em construir caminhos que facilitem aformacao da cidadania dos envolvidos no processo edu-cacional. Nesse sentido, e importante que ao longo detoda a sua formacao, o aluno seja instigado a refletirsobre a ciencia, pensando sobre os limites e as possibi-lidades desse conhecimento [13].

Mas em que a fısica moderna, e, mais particular-mente, o estudo da relatividade restrita e da geral po-dem contribuir a reflexao dos limites e possibilidadesda ciencia?

A resposta a essa questao sera construıda a par-tir da reflexao sobre uma proposta de introducao dotema na primeira serie do ensino medio. Essa insercaonao e algo inedito. Alguns pesquisadores/educadoresja propuseram ser este um caminho para que a fısicarelativıstica esteja presente nos cursos de fısica [14,15].

3. Relatividade restrita - uma brevepassagem

Einstein no artigo de 1905 “A eletrodinamica dos cor-pos em movimento” solucionou, a partir de dois pos-tulados, problemas que alguns fısicos de fins do seculoXIX estavam se defrontando. Dentre essas questoes,podemos destacar: a nao validade do princıpio da rela-tividade galileana para o eletromagnetismo. Nesse con-

texto, deve-se acrescentar o carater absoluto atribuıdoao eter, meio que sustentava a propagacao das ondaseletromagneticas.

Algumas dessas questoes ja haviam perturbado amente de outros cientistas, como Lorentz e Poincare,mas os caminhos construıdos para responde-las forammenos revolucionarios e ao mesmo tempo mais tortuo-sos do que os de Einstein [16,17].

Einstein, como um homem de seu tempo,confrontou-se com a ciencia de sua epoca. Nesse pro-cesso, defendeu que o princıpio da relatividade esta-belecido por Galileu deveria ser mais abrangente, oumelhor, valido para todas as leis da fısica, e nao apenaspara as da mecanica. Paralelamente a isso, rejeitou oeter, a complexidade e a estranheza fısica desse meioimpulsionou-o a considerar superfluo assumir um meiomaterial que sustentasse a propagacao das ondas ele-tromagneticas. Estabeleceu, ainda, que o conceito derepouso absoluto nao correspondia a nenhuma proprie-dade dos fenomenos mecanicos ou eletrodinamicos, eque as leis de Maxwell eram aquelas que deveriam servistas como verdadeiras [18].

Ao assumir essas consideracoes dentro de suaciencia, Einstein precisou alterar conceitos estabeleci-dos e vivenciados no senso comum como os de tempoe espaco. Esse breve levantamento das ideias defen-didas pelo fısico alemao nao pretende explicar o seutrabalho, mas fazer uma rapida descricao dos proble-mas que a relatividade restrita resolveu e alguns dosque ela apresentou. Isto porque foi tomando esse eixode centralidade que a proposta curricular a ser apresen-tada possibilitou a discussao da ciencia, de seu papel ede seus limites na sociedade contemporanea, de modo atornar esse estudo algo integrado ao currıculo do ensinomedio.

4. Construindo uma proposta curricu-lar

Nessa sessao, sera descrito um estudo de caso, uma pro-posta curricular preliminar aplicada em uma escola darede federal. Esse trabalho partiu do pressuposto queo ensino de fısica deve ter por objetivo apresentar asteorias da fısica dentro de seu contexto de producao,de forma a possibilitar em sala de aula um debate emtorno a ciencia, seus limites e possibilidades [19].

O tema central do trabalho foi a mecanica, sendo acinematica dos movimentos o primeiro assunto abor-dado. Nao se pretendeu com esse estudo analisarexaustivamente as funcoes matematicas capazes dedescrever os movimentos retilıneos uniforme e uni-formemente variados. Rompendo com o formalismomatematico, abordou-se o tema numa perspectivahistorico-filosofica, enfatizando a obra de Galileu Gali-lei no que se refere as suas contribuicoes para o estudoda cinematica, e o contexto cultural em que a mesmafoi produzida [20]. Dessa forma, o conceito de referen-

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cial e as grandezas posicao, deslocamento, velocidadee aceleracao foram definidas, enfatizando-se as trans-formacoes de Galileu.

Para desenvolver a discussao historica fez-se usodo filme O Nome da Rosa dirigido por Jean-JacquesAnnaud no ano de 1986, baseado na obra homonimade Umberto Eco. A projecao e o debate do filme foio caminho encontrado para envolver os alunos com otema nascimento da ciencia moderna, e, assim, situara obra e vida de Galileu Galilei. Cabe aqui destacarque o professor que aplicou a proposta esteve direta-mente envolvido na construcao e avaliacao da mesma.Assim, ele, enquanto professor/pesquisador preocupou-se a cada aula em registrar suas impressoes a respeitode como os alunos envolviam-se com o curso. Nessaprimeira parte, os registros foram anotacoes escritas arespeito das falas dos alunos durante as aulas e, maisparticularmente, ao longo do debate em torno ao filme.

A projecao e discussao do filme O Nome da Rosaja havia sido realizada em outros cursos de mecanica,em que a teoria da relatividade restrita nao fora dis-cutida. Nessas outras experiencias educacionais, o tra-balho com o filme foi realizado em conjunto com profes-sores de historia. Observou-se que nessas oportunida-des os alunos utilizaram ao longo do debate um numeromaior de exemplos e associacoes historicas. E que taisassociacoes tambem se fizeram presente em outros mo-mentos do curso. Assim, acreditamos que a atividadeteria sido mais rica se desenvolvida com outros profes-sores de forma a explorar melhor seu potencial interdis-ciplinar. Porem a organizacao dos tempos regulares dasdisciplinas, na escola em que esse trabalho foi aplicado,impediu esta integracao.

O estudo dos movimentos constituiu-se na porta deentrada para a relatividade restrita, pois os alunos pu-deram ser defrontados com os seguintes problemas: oprincıpio da equivalencia e as transformacoes de Galileupossuem limites, ou sao validas para quaisquer casos?

Nesse momento, os alunos foram divididos em gru-pos, que tinham por funcao responder a pergunta,atraves de exemplos concretos. Ao final, cada grupoapresentava suas conclusoes para o restante da turma.O professor durante esse processo ficou atento para en-caminhar a discussao em torno aos limites e possibilida-des de uma teoria cientıfica. Dentro dessa abordagem,os conceitos de espaco e tempo foram priorizados. Paratrabalhar esses conceitos muitos caminhos poderiam sertrilhados, um dos encontrados foi trazer a sala de aulaum dialogo entre fısica e arte.

O objetivo dessa parte do curso era fazer os alu-nos refletirem sobre as diferentes concepcoes de tempoe espaco construıdas pelos homens ao longo da historia.[21] Para que o proposito se cumprisse nao foram sufi-cientes exposicoes orais do professor. Isto porque du-rante as exposicoes a dispersao foi grande e o envol-vimento com o assunto limitado. Por isso, o profes-sor propos as turmas um trabalho que se iniciou com a

apresentacao de uma selecao de imagens contendo afres-cos e pinturas produzidas por artistas da Idade Mediaate o seculo XX. Cinco obras de arte foram escolhidaspara a construcao desse painel: Entrada em Jerusalem,1308/11 de Duccio de Sienna, A Madona do ChancelerRolin, 1435 de JanVan Eyck, Piquenique sobre a relva”,1863, de Edouard Manet, A Catedral de Rouen, 1892-94, de Claude Monet, As mocas de Avignon, 1907, dePablo Picasso.

A catedral de Rouen, de Claude Monet.

As mocas de Avignon, de Pablo Picasso.

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Entrada em Jerusalem, de Duccio de Sienna.

Piquenique sobre a relva, de Edouard Manet.

A Madona do Chanceler Rolin, de JanVan Eyck.

Essa primeira apresentacao foi bastante simples erapida. O proposito era que os alunos selecionassemuma das imagens para trabalhar. Eles deveriam, entao,realizar uma pesquisa com o proposito de responder asseguintes questoes:

• Como as pessoas e os objetos eram retratados naimagem?

• Outras obras do pintor escolhido seguiam omesmo padrao de representacao?

• Outros pintores da epoca seguiam o mesmo ca-minho de representacao?

• Quais eram as teorias cientıficas mais importan-tes da epoca para explicar os movimentos celestese os terrestres?

Exigiu-se dos alunos que as respostas fossem apre-sentadas por meio de um painel, a ser exposto a turma,contendo imagens e pequenos textos, de forma que asprimeiras prevalecessem em relacao ao texto. O pro-fessor recebeu o projeto dos paineis com antecedencia,o que possibilitou criar estrategias de trabalho em salapara que ao final da apresentacao de cada grupo, osaspectos, a seguir relatados, de espaco e tempo de cadapintura pudessem ser enfatizados.

A primeira pintura, por ter sido construıda den-tro do perıodo medieval, destaca um espaco hierar-quizado. O tamanho das pessoas retratadas corres-ponde a posicao social que elas ocupam naquele con-texto cultural. Existe uma clara distincao entre ceue Terra. O primeiro sendo representado como uma

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imagem uniforme, monotona e de cor dourada e o se-gundo compondo as suas diversidades. Essa, como mui-tas outras obras pictoricas do medievo, ilustra a con-cepcao espacial do homem europeu daquela epoca. Oespaco era percebido como algo heterogeneo. Cadaelemento daquele universo possuıa seu lugar natural,estando ao ceu reservado o movimento perpetuo e aimutabilidade.

A segunda por ser uma representacao pictorica doseculo XV, nao mais apresenta o espaco hierarquizadodo medievo. Ceu e Terra formam um todo. O ceu nao eo local da permanencia. Assim como a Terra, ele apre-senta fenomenos efemeros. O tamanho atribuıdo as pes-soas, as arvores, as montanhas e calculado pela tecnicada pintura em perspectiva. E o ponto de fuga que de-termina como a imagem e representada. O espaco naotem mais um limite claro, o infinito pode ali ser con-templado. Essa e uma percepcao espacial presente nomundo de Isaac Newton, onde os fenomenos celestes, as-sim como os terrestres apresentam um inıcio, um meioe um fim. Nao ha lugares privilegiados. O espaco ehomogeneo e isotropico, a presenca de objetos nao oaltera.

A terceira pintura nao mais coloca a homogenei-dade espacial da anterior. As regras da perspectivaclassica nao estao plenamente respeitadas. Ha umamulher na pintura retratada com um tamanho que naocorresponde a sua posicao espacial. A pintura de Manetdo seculo XIX mostra de certa forma uma integracaoentre objeto e espaco. A retirada de objetos daquelaimagem altera a representacao ali disposta [22].

O quadro de Monet faz parte de uma serie de pin-turas sobre a mesma catedral. Apesar dessa particula-ridade, em cada quadro Monet representou-a com im-pressoes bem distintas, ao retrata-la em diferentes tem-pos. O momento registrado alterava aquele espaco.

Por ultimo a pintura de Picasso e com ela um espacodistorcido, em que as regras da perspectiva nao mais sefazem presentes. Varios angulos de uma mesma figurasao representados num mesmo plano. Nao ha o espacofechado e hierarquizado do medievo, mas tambem naoencontramos o espaco homogeneo e isotropico da epocade Galileu [23].

O que esse trabalho com as imagens proporcionaramas aulas de fısica?

Na aplicacao e avaliacao dessa proposta nao houveuma preocupacao em realizar uma pesquisa quantita-tiva capaz de tabular a mudanca de concepcao dos alu-nos. Acreditou-se naquele momento, que o caminhomais eficaz para avaliar o processo seria, atraves daimersao direta na realidade, registrar por escrito dia-riamente as impressoes do trabalho. Dessa forma, oprofessor construiu um escrito antropologico daquelarealidade [24]. Esse trabalho mostrou que o trabalhorealizado pelos alunos e as discussoes de espaco e tempodesenvolvidas a partir das pinturas permitiram a com-preensao de que toda concepcao espacial e historica e

faz parte da cultura dos homens. A seguir destacamosrecortes dos textos apresentados pelos alunos, durantea apresentacao do painel, que ilustram o resultado deseus trabalhos:

Grupo A – turma 1 “O ceu amarelo e superior, bemdestacado, pois ja que o ceu era a morada de Deus, ea morada de Deus e feita de ouro e pedras preciosas, oceu deveria ser tambem dourado.

“O mesmo pintor e outros pintores da epoca se-guiam o mesmo caminho, pois a influencia religiosa eramuito grande e os pintores queriam retratar a sua rea-lidade.”

Grupo A – turma 2 “O ceu e retratado douradopor ser considerado como perfeito, a morada de Deus.As figuras do quadro estao extremamente separadas doceu retratado. E as pessoas sao retratadas por sua im-portancia, quanto maior sua importancia, maior seu ta-manho (no quadro).

O ceu era imutavel e perfeito, seguindo a teoria deAristoteles. A Terra ficava imovel no centro do Uni-verso, e os planetas, a Lua e o Sol giravam em volta daTerra.”

Grupo B – turma 2 “A pintura medieval, sem pers-pectiva, corresponde a uma visao de mundo aristotelica,geocentrica, explicada pela Bıblia; a perspectiva surgecom o Renascimento, rompendo com as explicacoes re-ligiosas para os fenomenos e buscando explicacoes ra-cionais, que correspondessem a realidade da natureza...

“Quando se comeca a mudar a mentalidade emrelacao a natureza, descobrem-se varias concepcoesreais da verdade que quebram a hierarquia da Igreja.Essas mudancas refletem sobre a pintura fazendo surgiruma maior nocao de profundidade, proporcao perspec-tiva e tridimensionalidade.”

Grupo C – turma 1 “No quadro tem dois homens eduas mulheres, sendo que uma mulher que se encontrabem atras tem o mesmo tamanho que as outras tres pes-soas. No quadro, o espaco e representado nao na formacomo nos vemos, onde a mulher que esta atras seria de-senhada menor do que as outras para dar a impressaode proporcao, mas sim da forma como nos sentimos,como nos sabemos que e; que a mulher de tras e domesmo tamanho das pessoas da frente. Como na epocaa fotografia ja tinha sido inventada, os pintores nao que-riam mais retratar a realidade, mas sim impressionar,impactar as pessoas que veem o quadro, para dar umanocao de espaco.

Com a invencao da fotografia, os pintores nao sepreocupavam mais em transmitir a realidade, dimi-nuindo a perspectiva e a perfeicao. Esta imagem per-tence a era do impressionismo fazendo uso a sensuali-dade.”

Grupo D – turma 1 “Nesse quadro ainda pode-senotar a presenca da perspectiva. Entretanto ja mostra-se bem menos preso a realidade do que as do Renas-cimento. Isto ocorria porque nessa epoca a fotografiafoi inventada e os pintores nao importavam tanto com

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a perspectiva.”Grupo E – turma 1 “A arte do inıcio do seculo

XX era extremamente revolucionaria, ja que quebravaa percepcao espacial imediata dos corpos, dando-lhesnovos contornos e nuances, numa visao “alem” quemenosprezava a perspectiva (as tres dimensoes). Osfenomenos nao sao apenas aqueles que o olho humanopode presenciar e identificar no dia a dia.”

Interessante que esse grupo, referiu-se a teoria darelatividade. Apesar deles, ainda nao terem estudado oassunto, sabiam que esse era o tema do curso.

-“A relatividade modificou as velhas concepcoes daepoca em que exerceu “grande influencia”: sobre os ra-mos do conhecimento das ciencias as artes. O inıcio doseculo XX foi marcado pela “procura” de se criar no-vas concepcoes atraves do questionamento das velhasconcepcoes”.

Cabe ainda destacar que se percebeu a formacao dedois grupos em sala de aula. Um que, muito preocu-pado com os resultados das avaliacoes, empenhava-separa realizar o painel solicitado, porem se dispersavamuito facilmente durante as discussoes. Era como setivessem a certeza de que aquilo nao seria assunto deprova e, portanto, poderia ser desconsiderado. O ou-tro grupo envolveu-se muito com o debate ocorrido du-rante a apresentacao dos paineis. Nem sempre os tra-balhos construıdos por eles eram os melhores, mas aolongo das aulas estavam atentos, trazendo aspectos no-vos para o debate. Muitos alunos se remeteram as dis-cussoes realizadas em torno ao nascimento da cienciamoderna. Concretizada essa etapa, partiu-se para umaviagem historica aos fins do seculo XIX, ressaltando asituacao da fısica naquele contexto. Devido ao objetivodo trabalho, apresentaram-se experimentos simples deinducao eletromagnetica para discutir do que trata oeletromagnetismo. Esse foi o inıcio da discussao emtorno as novidades trazidas por essa area de conheci-mento e aos problemas cientıficos derivados daquele de-senvolvimento. Nesse ponto foi explorado o significadodas ondas eletromagneticas e, mais, particularmente, ofato da luz ser uma onda eletromagnetica. A profundi-dade desse debate variou com a maturidade do grupo dealunos que se estava trabalhando e tambem do tempodisponıvel para o tema. Porem experimentos simplescom molas e cordas foram uteis para se discutir o quevem a ser uma onda e a questao da necessidade ou naode um meio como suporte a sua propagacao.

Apos o breve panorama da fısica dos fins do seculoXIX, Albert Einstein e sua teoria da relatividade res-trita e geral foram os assuntos tratados. Os registrosda pesquisa sobre a concepcao espacial indicaram queum bom recurso para explorar essa parte do curso seriapropor aos alunos um trabalho em grupo, cada um es-colheria um tema para trabalhar. Em todos os casos ogrupo precisava abordar no mınimo os itens a respeitodo assunto destacado pelo professor.

Tema 1: Albert Einstein antes de 1905.

• A vida de Einstein antes de 1905, enfatizando suaformacao academica.

• O ambiente socio-cultural em que Einstein vivia.

• As incoerencias entre o eletromagnetismo e amecanica.

• As solucoes propostas pelos fısicos Poincare e Lo-rentz.

Tema 2: Reflexoes sobre o tempo e espaco em finsdo seculo XIX e inıcio do XX.

• A maquina do tempo de H.G. Wells.

• O impressionismo.

• O cubismo.

• Um problema tecnico: a sincronia dos relogios.

Tema 3: A relatividade restrita.

• A proposta de Einstein para resolver o pro-blema da incoerencia entre o eletromagnetismo ea mecanica.

• As inspiracoes para resolver o problema.

• As implicacoes do fato de se considerar a veloci-dade da luz constante.

• E = m.c2.

• O impacto no meio academico e na sociedade dateoria da relatividade.

Tema 4: O efeito fotoeletrico.

• O quanta de Planck.

• O efeito fotoeletrico

• Implicacoes da explicacao do efeito fotoeletricopara explicar fenomenos como a fotossıntese.

Tema 5: A relatividade geral.

• A proposta de Einstein para explicar os efeitosgravitacionais.

• A curvatura espaco-tempo.

• Buraco negro.

• O eclipse de Sobral.

Tema 6: Albert Einstein apos 1905.

• A vida de Einstein apos 1905, o que mudou ime-diatamente com a publicacao dos artigos de 1905.

• O ambiente socio-cultural em que Einstein vivia.

• Os motivos que o levaram a morar nos EstadosUnidos.

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Tema 7: Einstein e a bomba atomica.

• Princıpios basicos do funcionamento da bombaatomica.

• Relacoes entre teoria da relatividade e a bombaatomica.

Como o registro do professor apontou alguma dis-persao dos alunos durante a apresentacao dos trabalhossobre as pinturas do medievo ao seculo XX, buscou-se desenvolver atividades capazes de solucionar o pro-blema. Por isso propos-se que cada grupo escolhes-se uma forma diferente para expor seus resultados.Ninguem poderia optar apenas por apresentacoes orais,era preciso encontrar caminhos alternativos, como: es-quetes de teatro, filmagens, poesia etc.

As apresentacoes foram divididas ao longo do cursode modo que apos cada uma delas o professor, atravesde aulas expositivas, pudesse aprofundar o assuntoabordado. Cabe destacar que a criatividade dos alunospara construir seus modos de exposicao foi surpreen-dente.

Um grupo montou um esquete de teatro para apre-sentar o tema 2. Eles construıram cenario com suca-tas, figurino e ate trilha sonora. A estoria girava emtorno a um grupo de alunos que precisava desenvolveruma pesquisa para a aula de fısica sobre “Einstein eseu tempo”. O grupo necessitava tirar uma nota altano trabalho, devido aos resultados das provas anterio-res. Eles dividiram as tarefas, mas o tempo passava enenhum deles conseguia realizar sua parte. Depois demuitas brigas e confusoes, um aluno sonhou com Al-bert Einstein. O cientista lhe guiou a uma viagem aofim seculo XIX e inıcio do seculo XX, que permitiu aoaluno no dia seguinte apresentar a seu grupo todo otrabalho pronto. Para narrar o sonho, um dos alunosse vestiu de Einstein e atraves de projecao de fotos, tex-tos e pinturas apresentou as conclusoes da pesquisa quehaviam realizado. Esse grupo em particular era com-posto por alunos muito integrados. Como o trabalhofoi proposto antes do perıodo das ferias de inverno ea entrega apenas ocorreu em final de agosto, eles sereuniram varias vezes nas ferias para trabalhar.

Outro grupo que apresentou o tema 3 envolveu fa-miliares na execucao da atividade. Eles montaram efilmaram um documentario fictıcio sobre Albert Ein-stein para tratar do terceiro tema, e tomaram o avo deum dos componentes do grupo, para representar o cien-tista. O avo estudou um texto construıdo pelo grupo,proporcionando um resultado muito interessante.

As falas do Einstein entrevistado e do apresentadoreram grandes e didaticas. Para tornar o vıdeo “maislegal”, como declarou uma das alunas, o grupo bolou ainsercao de intervalos comerciais. Elas criaram, entao,varios produtos fictıcios para brincar com a turma.

Concluıda a relatividade restrita, o curso voltou-separa o estudo da dinamica e mais particularmente das

leis de Newton. Nesse momento, apenas os grupos quese dedicaram aos temas 1, 2 e 3 haviam concluıdo suasapresentacoes. Aqui foram analisados aspectos expe-rimentais e teoricos do tema, que visavam ultrapassara analise estritamente matematica comum no ensinomedio, capaz de restringir o estudo das leis de Newton aresolucao de problemas numericos envolvendo bloquin-hos. Com a perspectiva de que esse estudo enriquecessea discussao em torno a ciencia, aulas expositivas fo-ram utilizadas para apresentar o legado de Newton, deforma a destacar o contexto cultural da Europa, e maisespecificamente da Inglaterra de fins do seculo XVII einıcio do seculo XVIII. Em termos teoricos as tres leisde Newton e a lei da gravitacao universal foram enfoca-das simultaneamente. Dessa forma, foram exploradasas questoes da ciencia do seculo XVII respondidas porNewton, as controversias em torno ao seu trabalho, osdebates com seus contemporaneos, as questoes deixa-das em aberto, os problemas suscitados e por fim comoessa obra foi absorvida pelos cientistas e tambem poroutros homens ao longo do seculo XVIII [25].

O termino desse estudo foi o aporte para a ultimafase do curso, ou seja, o estudo da relatividade geral. Otrabalho com a relatividade geral requisitou um poucomais de cuidado, devido a complexidade matematica dotema. Escolheu-se discutir questoes importantes dessateoria sem avancar nos aspectos mais distantes dos alu-nos, como a geometria do espaco curvo. Os gruposresponsaveis pelos temas 4 e 5 apresentaram suas pes-quisas. O tema 4 por estar mais desconectado do cursonao foi muito aproveitado nas aulas seguintes. Poremna apresentacao do tema 5 os alunos utilizaram muitasimagens que foram, ao longo do estudo da relatividadegeral, exploradas pelo professor.

Trabalhar o legado de Newton ultrapassando o for-malismo matematico comum aos livros didaticos propi-cia discutir a visao mecanicista de natureza fortementepresente no seculo XVIII. Fora isso podem ser explora-das as controversias em torno a obra de Newton e aomodo de propagacao da acao gravitacional, a possibili-dade de se pensar num meio especial e o eter, como umcaminho para responder a acao a distancia entre cor-pos de massas diferentes de zero. Alem dessas, outraquestao que se destaca e o limite das leis de Newton,ou melhor, o caso dos referenciais nao-inerciais. Es-ses aspectos da obra de Newton alem de possibilitaremuma reflexao sobre a ciencia e seu modo de producaopermitiram problematizar com os alunos a obviedade dasentenca: a pedra cai, pois a Terra a atrai. O enfrenta-mento aos problemas em torno a essa questao permitiudiscutir que o modo de propagacao gravitacional foi umproblema em aberto por muitos anos. Assim, por maisnova que fosse a ideia de um espaco curvo, ela respon-dia de alguma forma a uma questao filosofica e cientıficaque ficou adormecida por muito tempo.

Mas o que enfocar da teoria da relatividade geral,se os alunos nao tem o suporte matematico necessario

582 Guerra et al.

a exploracao do tema?O princıpio da equivalencia e a nova concepcao

espaco-temporal foram os temas estudados nessa etapafinal do curso. Com o primeiro assunto, pode-se discutiro que a teoria da relatividade geral ampliou tanto emrelacao ao princıpio da equivalencia galileano, quanto ateoria da relatividade restrita. Essas abordagens foramdesenvolvidas sem as ferramentas matematicas indis-ponıveis aos alunos do ensino medio. Durante as au-las, foi retomada a mudanca de representacao espacialdos pintores renascentistas para a dos que viveram noinıcio do seculo XX, como a dos representantes do cu-bismo. Esse paralelismo foi importantıssimo, uma vezque permitiu ao aluno mergulhar no ambiente cultu-ral em que a teoria analisada se construiu. Assim, ospossıveis obscurantismos ligados ao olhar do senso co-mum puderam ser confrontados com a cultura da epoca,de forma a ressaltar que tanto as questoes quanto asrespostas estavam ligadas ao ambiente cientıfico e cul-tural em que o cientista ou grupo de cientistas que aenfrentou encontrava-se inserido.

Algumas das falas dos alunos resgatadas pelo pro-fessor durante as aulas reforcam essa analise.

Aluno 1 -“Analisando atenciosamente aobra artıstica contemporanea a formulacaoda teoria relativıstica pode-se notar seuesforco na tentativa de romper com as an-tigas relacoes de espaco e tempo do seculoXIX, baseada na tese newtoniana com su-porte na geometria euclidiana. A deformi-dade espaco-temporal proposta por Eins-tein, bem representada na pintura cubista,caracterizada pela multipla percepcao dosobjetos, enxergados de variadas angulacoese posicoes, eliminando a perspectiva renas-centista que encerrava emancipadamente osconceitos de massa, tempo e espaco”.

Aluno 2 -“Havia um conflito naquelaepoca: o de se “quebrar” com as concepcoesantigas. Com isso, Einstein ao tentar solu-cionar as inconsistencias da fısica classica,recorreu a concepcoes de realidade que “pa-recem” absurdas para as nossas nocoes coti-dianas. Assim como os artistas desta epoca,ele substituiu conceitos ate entao inques-tionaveis”.

Aluno 3 -“... o conhecimento da arte de-lineia o contexto em que as mudancas acon-teceram, o ambiente e o momento que aspossibilitaram. ... o conhecimento da arteem si permite que nos livremos dos concei-tos ja estabelecidos de espaco e tempo; daforma mecanicista de enxergar o mundo”.

5. Conclusao

A proposta curricular que aqui apresentamos foi efe-tivada, como ja salientamos, em uma escola da redefederal de ensino. Nao se pretende que ela seja umexemplo a seguir, a especificidade dos professores, daescola e ate mesmo das turmas, faz com que sejam ne-cessarias diferentes metodologias de trabalho. Porem oregistro de trabalhos, mesmo que pontuais, e fundamen-tal para que os autores do processo educacional tenhamsubsıdios para reinventar suas praticas.

Nao realizamos ao longo de nosso trabalho uma pes-quisa quantitativa para medir o quanto o grupo de alu-nos apreendeu dos conteudos abordados. Privilegiamosuma pesquisa qualitativa, onde o professor a partir deuma proposta curricular entrou em sala de aula comoum ator-espectador, registrando diariamente suas im-pressoes do trabalho desenvolvido. O professor, nessaposicao, tinha sempre atencao ao comportamento dosalunos, ao tipo de questoes que eles lhe colocavam e aodesempenho das atividades. Os registros do professormostraram que a integracao da teoria da relatividaderestrita e geral ao currıculo, de forma que esses assuntosnao fossem percebidos pelos alunos como um apendiceaos conteudos importantes da serie, e um caminho paratrazer esses temas ao ensino medio. Para superar ossupostos problemas dos pre-requisitos, sugere-se umtrabalho interdisciplinar, em que as producoes cultu-rais, diferentes da cientıfica, sejam discutidas. Foraisso uma proposta curricular centrada numa aborda-gem historico-filosofica, em que as questoes enfrentadaspelos cientistas, as controversias que se envolveram, oambiente cientıfico cultural de seu trabalho sejam as-suntos privilegiados, e um caminho viavel para o estudodas teorias da relatividade restrita e geral no ensinomedio.

As conclusoes da implementacao da proposta indica-ram, tambem, caminhos a serem seguidos num trabalhode pesquisa futuro. De um modo geral, os alunos esta-vam predispostos a estudar o tema. Eles manifestavaminteresse em conhecer algo que lhes parecia magico epoderoso. Essa percepcao inicial encaminhou uma pes-quisa, que esta sendo desenvolvida ao longo de 2007,sobre fatores que levam os alunos a terem um interes-se especial em estudar relatividade. A importancia deuma pesquisa como essa se deve a necessidade de cons-truir materiais capazes de trazer aos educadores ferra-mentas para conhecerem melhor sua realidade e a partirdisso melhor interferirem nela.

Referencias

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Teoria da relatividade restrita e geral no programa de mecanica do ensino medio 583

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