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Aula de Análise Textual Deonísio da Silva
28/10/2014
Você não chegou até aqui sozinho. Você tem mãe, pai,
irmãos, outros parentes, amigos. Quem sabe disso não é só
você. Muitos outros também o sabem. E você sabe que com
todos os outros deu-se a mesma coisa.
Mas você prova que é filho de Fulano com Fulana com os
seus documentos. Com a língua também dá-se algo
semelhante.
Fulano e Fulana, seus pais, são filhos de outros casais, seus
avós, que por sua vez também são filhos de outros casais,
chamados bisavós, que por sua vez são filhos dos seus
trisavós, que por sua vez são filhos de seus tetravós.
bicampeão (duas vezes)
tricampeão (três vezes)
tetracampeões (quatro vezes)
Os étimos latinos estão aí: bi, de bis, do
Latim “bis”, variante de “duos” (dois),
quando pedimos repetição de uma coisa;
tri, de três, do Latim “tres”; e tetra, do
Grego “téttares”, quatro
Para os parentescos situados antes dos
tetravós, ditos e escritos também pela
variante “tataravós”, não damos nomes
específicos. Dizemos apenas
“antepassados”, de novo o prefixo antes,
reduzido a ante, do Latim “ante”, presente
em antes, diante etc.
Vejam, como curiosidade, que o
personagem de Dias Gomes, Odorico
Paraguaçu, diz apenas “patrasmente”
Outros prefixos gregos:
“pentacampeão”: “pénte”, mudado para
“penta”, em Grego, é cinco
“Héks”, mudado para “hexa”, em Grego, é
seis.
“Heptá”, mudado para “hepta”, é sete, em
Grego.
Em octacampeonato, voltamos ao Latim
“octo”, oito, presente em outubro, o oitavo
mês.
De onde vêm as palavras?
Em sua maioria do Latim, mas também do
Grego, e depois receberam outras afluências,
como o Italiano, do Alemão, do Inglês.
Outras vieram de línguas indígenas, como os nomes de lugares, rios, lagoas, montanhas etc. Outras vieram de línguas faladas pelos escravos africanos, trazidos para o Brasil no período colonial. Temos também palavras do Árabe, afinal eles ficam sete séculos em Portugal!
A língua portuguesa falada ganhou sua
independência do Latim vulgar há quase um
milênio, no século XII, quando o então
condado portucalense transformou-se em
reino.
O primeiro soberano foi Dom Afonso
Henriques, filho de um cavaleiro francês
chamado Henrique de Borgonha, e de Dona
Teresa, escrita também Tareja e Tereja, filha
ilegítima do rei de Leão e Castela, Dom
Afonso VI.
"A Canção da Ribeirinha". Foi escrita em 1198 por Paio Soares de Taveirós. Os versos foram dedicados a Maria Pais Ribeira, a "Ribeirinha", que era casada. O rapaz estava apaixonado por uma mulher casada e escreveu assim:
“No mundo ninguém se assemelha a mimenquanto a vida continuar como vai,porque morro por vós, e ai!minha senhora alva de pele rosadas,
quereis que vos retratequando eu vos vi sem manto.Maldito dia que me levanteiE não vos vi feia
E minha senhora, desde aquele dia, ai!tudo me foi muito male vós, filha de Don PaioMoniz, e bem vos parecede ter eu por vós guarvaiapois eu, minha senhora, como presenteNunca de vós recebera algoMesmo que de ínfimo valor.
A ESCRITURA DE TERRAS
In Ch(rist)i n(omi)ne, am(en).
Hec e(st) notitia de p(ar)tiçon (e) de deuison que fazem(os) antre nós dos h(er)dam(en)tus e dus cou[tos e] das onrras [2] e dou<s> padruadig(os) das eygreygas que fórum de nossu padre e de nossa madre, en esta maneira q(ue) Rodrigo [3] Sanchiz ficar por sa p(ar)ticon na q(u)inta do couto de Vííturio e na q(u)inta do padroadigo dessa eygreyga en todol(os) [4] us h(er)dam(en)tus do couto e de fora do couto.
Vu<a>sco Sanchiz ficar por sa p(ar)ticon na onrra d'Ulueira e no padroa- [5] digo dessa eygreyga en todol(os) h(er)dam(en)tos d'Olveira e en nu casal de Carapezus q(ue) chamam da Vluar e en outro [6] casal en Agiar que chamam Q(u)intáá.
Meen Sanchiz ficar por sa p(ar)ticon na onrra de Carapezus e nus outr(os) [7]h(er)dam(en)tus e nas duas p(ar)tes do padroadigo dessa eygreyga e no padroadigo da eygreyga de Creysemil e [8] na onrra e no h(er)dam(en)to d'Arguiffi e no h(er)dam(en)to de Lauoradas e no padroadigo dessa eygreyga.
Eluira [9] Sanchiz ficar por sa p(ar)ticon nos h(er)dam(en)tos de Centegaus e nas três q(u)artas do padroadigo dessa eygreyga [10] e no h(er)dam(en)to de Creyximil assi us das Sestas come noutro h(er)dam(en)to. Estas p(ar)ticoens e diuisoes fazem(os) an- [11] trenós q(ue) uallam por ens(e)c(u)la s(e)c(u)lor(um), am(en). Facta karta m(en)sse M<a>rcii E(r)a M.ª CC.ª XXX.ª. Vaa<s>co Suariz [12] ts., V(er)múú Ordoniz ts., Meen Farripas ts., Gonsaluu U(er)muiz ts., Gil Diaz ts., Dom M(a)rfío [13] ts., M(a)r(ti)m P(eri)z ts., Don St(e)ph(a)m Suariz ts. Ego J(o)h(an)n(e)s M(e)n(en)di p(res)b(ite)r notauit.
O TESTAMENTO DO REI AFONSO
Em nome de Deus. Eu, rei D. Afonso, pela graça de Deus, rei de Portugal estando são e salvo, temendo o dia da minha morte, para a salvação da minha alma e para proveito de minha mulher D. Orraca e de meus filhos e de meus vassalos e de todo o meu reino, fiz meu testamento para que depois de minha morte, minha mulher e meus filhos e meu reino e meus vassalos e todas aquelas coisas que Deus me deu para governar estejam em paz e em tranqüilidade. Primeiramente mando que o um filho, infante D. Sancho, que tenho da Rainha D. Orraca assuma o meu reino inteiramente e em paz. E se este morrer sem deixar descendentes, o filho mais velho que houver da rainha D. Orraca tenha o meu reino inteiramente e em paz.
E se não tivermos filho homem, a filha mais velha que tivermos, assuma o reino. E se no tempo da minha morte, meu filho ou minha filha que deve reinar não tiver idade, esteja o reino em poder da rainha, sua mãe. E meu reino siga em poder da rainha e de meus vassalos até quando cheguem à idade. E se eu morrer, rogo ao Papa, como padre e senhor e beijo a terra ante seus pés para que ele receba sob sua guarda e sob sua proteção a rainha e meus filhos e meu reino. E se eu e a rainha morrermos, rogo e peço que meus filhos e o reino sigam sob sua proteção.
Ano de 1214
A norma culta, mais próxima daquela hoje utilizamos, tem
pouco mais de quinhentos anos, coincidindo com o
Descobrimento do Brasil.
Seu prestígio consolida-se no século século XVI, quando
Luís Vaz de Camões, em Os Lusíadas, grande poema
narrado em versos, conta como o Estado português e as
empresas se uniram para aquelas viagens que
demandavam grande investimento: de recursos, navios,
marinheiros experientes, astrônomos, linguistas etc.
Afinal, iriam encontrar povos que falavam línguas
desconhecidas. Foram viagens cheias de perigos,
naufrágios e tragédias, mas tiveram um final feliz, assim
expresso: "Na quarta parte nova os campos ara/ E, se mais
mundo houvera, lá chegara".
Escrevemos de um modo, mas falamos de outro. Ninguém escreve como
fala ou fala como escreve. Essa duplicidade requer de todos os alunos de
Análise Textual uma atenção especial para esta disciplina porque todas as
outras serão ensinadas por meio dela. As habilidades a serem atingidas são
orientadas no sentido de ouvir, falar, ler e escrever melhor do que já sabiam
ao chegarem à universidade. E como esses objetivos são alcançados? Ah,
coordenadores, professores, tutores e demais pessoas envolvidas no processo
ensino/aprendizagem têm segredos que só eles podem revelar aos alunos.
Esses profissionais têm chaves que abrem muitas portas.
E como a língua portuguesa escrita começou com uma canção de amor, vamos concluir esta aula com dois belos poemas. Um de Luís de Camões, o soneto (do Italiano “sonetto”, pelo Provençal “sonet”, sonzinho, pequenaCanção). Sete Anos de Pastor: “Sete anos de pastor Jacó servia/Labão, pai de Raquel, serrana bela;Mas não servia ao pai, servia a ela, E a ela só por prêmio pretendia. Os dias, na esperança de um só dia,Passava, contentando-se com vê-la;Porém o pai, usando de cautela,Em lugar de Raquel lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que com enganosLhe fora assim negada a sua pastora,Como se a não tivera merecida,
Começa de servir outros sete anos,Dizendo: — Mais servira, se não forPera tão longo amor tão curta a vida! Outro, de Olavo Bilac, intitulado Língua portuguesa:
Última flor do Lácio, inculta e bela,És, a um tempo, esplendor e sepultura:Ouro nativo, que na ganga impuraA bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura.Tuba de alto clangor, lira singela,Que tens o trom e o silvo da procela,E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aromaDe virgens selvas e de oceano largo!Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
em que da voz materna ouvi: "meu filho!",E em que Camões chorou, no exílio amargo,O gênio sem ventura e o amor sem brilho! (fim)