Thelma Renata Parada Simao Marsola Original

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tese de mestrado sobre história da anatomia

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  • THELMA RENATA PARADA SIMO MARSOLA

    Doao voluntria de corpos para estudo anatmico

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres da Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Doutora em Cincias

    Departamento: Cirurgia rea de Concentrao: Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres

    Orientador: Prof. Dr. Edson Aparecido Liberti

    So Paulo

    2013

  • Autorizo a reproduo parcial ou total desta obra, para fins acadmicos, desde que citada a fonte.

    DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAO-NA-PUBLICAO

    (Biblioteca Virginie Buff Dpice da Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia da

    Universidade de So Paulo)

    T.2752 Marsola, Thelma Renata Parada Simo FMVZ Doao voluntria de corpos para estudo anatmico / Thelma Renata Parada Simo

    Marsola. -- 2013. 121 f. : il.

    Tese (Doutorado) - Universidade de So Paulo. Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia. Departamento de Cirurgia, So Paulo, 2013.

    Programa de Ps-Graduao: Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres. rea de concentrao: Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres. Orientador: Prof. Dr. Edson Aparecido Liberti.

    1. Doao. Cadver. Disseco. Anatomia. I. Ttulo.

  • FOLHA DE AVALIAO

    Nome: MARSOLA, Thelma Renata Parada Simo Ttulo: Doao voluntria de corpos para estudo anatmico

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Anatomia dos Animais Domsticos e Silvestres da Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Doutora em Cincias

    Data: ______ /______/______

    Banca Examinadora

    Prof. Dr. _________________________________________ ___________________

    Instituio: _____________________________Julgamento: ___________________

    Prof. Dr. _________________________________________ ___________________

    Instituio: _____________________________Julgamento: ___________________

    Prof. Dr. _________________________________________ ___________________

    Instituio: _____________________________Julgamento: ___________________

    Prof. Dr. _________________________________________ ___________________

    Instituio: _____________________________Julgamento: ___________________

    Prof. Dr. _________________________________________ ___________________

    Instituio: _____________________________Julgamento: ___________________

  • quele que com seu precoce falecimento, me fez entender e compreender, apesar de

    minha tenra idade, a morte: Meu pai, Jos Andirs de Abreu Simo.

    quela que apenas aps a sua morte, fomos aproximadas e mais que isso, cedeu, atravs de sua atitude arrojada e inusitada, o tema para este trabalho, agora, causa: Minha av paterna,

    Eunice Nogueira de Abreu Simo.

    A este, eterno mestre, intenso nos propsitos, e eternamente, por mim, admirado, sem o qual este trabalho jamais seria aceito, executado, instalado e oficializado. E o foi de maneira magnnima e segura: Professor, Orientador, Amigo, Exemplo e Referncia: Edson Aparecido

    Liberti

    A todos os Doadores Voluntrios de Corpos para Estudo Anatmico.

  • AGRADECIMENTOS

    minha filha, Guilhermina, por permear a minha vida de sentidos e de amor. Apresentar-me

    o verdadeiro sentido de um lar, na nsia do breve retorno para o seu encontro o que nutre

    minhas energias para um concentrado e eficiente trabalho.

    minha me, Sueli, exemplo de fora, determinao, compreenso, dedicao, vitria,

    alicerce e amor incondicional. Serei realizada se eu for para a minha Guilhermina, a me que

    para mim! Obrigada!

    Ao meu marido, verton, por ensinar diariamente, o valor do silncio adequado, da recluso,

    do retiro, das palavras doces e incentivadoras.

    s minhas afilhadas: Juliane e Gabriela, com vocs, aprendo e revivo as fases que a vida j me

    proporcionou, mas que no passado estabeleceram-se e me permitem corrigir e elaborar. A

    presena e convivncia com vocs tornam a minha vida mais leve, alegre e divertida.

    Aos afilhados: Kaque e Matheus, com os quais, por este tempo, ficamos distantes, espero

    poder retomar nosso convvio com a intensidade que o mesmo merece e deve ser realizado.

    Aos Paradas: Henrique, Valentina, Tim, Guilherme, Gustavo, Tia Marli, Kiko, Gugu, minha

    famlia estendida e essencial. Vocs so o exemplo de famlia, perseverana e perdo!

    Aos queridos: Ftima, Marsolas, Vilson, Tati, Slvio, Kau, Nilton, Melissa, Pedro, Lvia, Ana,

    Andr, Isabela, agradeo o alento, entusiasmo, compreenso e benevolncia por este

    perodo.

    s minhas amigas, assistentes, companheiras: Luzia e Lidiane, as quais cuidam de mim, de

    minha filha e meu lar, com todo o carinho e respeito. Sem a colaborao delas, minha

    ausncia para a elaborao deste trabalho seria impossvel.

  • Frente a inmeras conversas e conselhos, certamente este: Para os amigos, no precisa se

    justificar; para os inimigos, no vai adiantar o que realmente norteia minhas atitudes

    dirias. Obrigada, eterna: Slvia de Campos Boldrini.

    Aos mestres: Luiz Ronaldo Picosse e Bertha Rosemberg pela apresentao a esta fascinante

    disciplina ainda na graduao. A ele pela bondade, piedade e carinho que trata seus alunos e

    ela a forma enftica, disciplinadora e normativa. Os quais norteiam minhas atividades

    docentes.

    A professora Maria Anglica Miglino, pelo aceite da realizao deste trabalho no programa de

    Ps-Graduao que coordena.

    Ao Servio Funerrio da Cidade de So Paulo, em especial a Sra. Claudete Rodrigues de Souza,

    pelas preciosas informaes oferecidas, disposies em ajudar, orientar na elaborao do

    fluxograma do Programa de Doao, bem como, na sua desburocratizao, apresentando-nos

    as trilhas a serem desvendadas.

    Ao casal Regina e Paulo Henrique, companheiros, exemplo de esforo, humildade, carinho e

    docilidade. A presena de vocs torna o laboratrio um lar.

    Aos amigos do LAFACC: Flvia de Oliveira, Thiago Habacuque, Bruna Caixeta, Eduardo Beber,

    Ricardo Eustquio, Ricardo Bandeira, Jodonai Barbosa, Joice Naiara, Aline Rosa, Aline

    Gonalves, Ricardo Fontes, Marcelo Cavalli, Josemberg Baptista, Valquria Mariotti, Karina do

    Valle, Catarina Tivane, Josy Cal, Cristina Bolina, Naianne Clebis, Any Kely e Ivone Benigno. A

    presena de vocs refora que o trabalho srio flui e se propaga (metstases), frente a

    harmonia, paz, tranquilidade, respeito, colaborao e compreenso.

    A Rosana Duarte Prisco, quem realizou a quantificao deste trabalho de modo, srio

    tranquilo, com disposio e envolvimento pela causa.

  • Aos funcionrios do ICB: Maria do Carmo, Patrcia Rodrigues de Campos Rocha, Cristiane

    Pinheiro Maciel, Luciana Monteiro Silva, Martha Righetti, Snia Yokomizo, Sebastio Boleta

    pelo harmonioso convvio e gentilezas diversas.

    Ao Maicon , funcionrio do Departamento de Anatomia da Faculdade de Medicina Veterinria

    e Zootecnia da USP, pela amizade iniciada e estabelecida, ateno e disposio em ajudar.

    A Elza Faquim, bibliotecria da FMVZ, quem orientou a formatao desta tese.

  • impossvel conhecer o homem sem lhe estudar a morte, porque, talvez mais do que na vida, na morte que o homem se revela. nas suas atitudes e crenas perante a morte que o homem exprime o que a vida tem de mais fundamental.

    Edgar Morin

  • RESUMO

    MARSOLA, T. R. P. S. Doao voluntria de corpos para estudo anatmico. [Voluntary Donation of bodies for anatomical study]. 2013. 121 f. Tese (Doutorado em Cincias) Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2013. Cadveres no reclamados constituram por muito tempo o suprimento de material para o

    estudo da Anatomia Humana. No entanto, devido melhoria da qualidade de vida decorrente

    das tecnologias atuais, bem como, o carter tico, vem ocorrendo um rareamento

    progressivo da sua utilizao. Frente a estas circunstncias, e a impossibilidade da

    substituio total deste material por outro de qualquer natureza para o estudo da Anatomia e

    a prtica da disseco na formao de profissionais da rea da sade, a criao de Programas

    de Doao Voluntria de Corpos para Estudo Anatmico apresentada como alternativa de

    captao de cadveres. Essa ao altrusta encontra respaldo legal no artigo 14 da lei

    10.406/02 do Cdigo Civil Brasileiro que esclarece a quem desejar doar o seu corpo ou parte

    dele s instituies de pesquisa e estudo cientficos, sem obter qualquer ganho pecunirio,

    dever faz-lo em vida, atravs de inequvoca e expressa declarao de vontade. Deste modo,

    com o objetivo de desenvolver o Programa de Doao Voluntria de Corpos para Estudo

    Anatmico (pdvcea) para o Departamento de Anatomia do Instituto de Cincias Biomdicas

    da Universidade de So Paulo (DA-ICB/USP) realizou-se no presente trabalho questionrios

    relativos obteno de informaes sobre: o conhecimento e a opinio da populao de

    profissionais anatomistas e de alunos primeiranistas acerca do tema; a importncia da

    disciplina de Anatomia e da disseco para a prtica profissional, bem como da populao

    geral como fator de confiabilidade no profissional cirurgio mdico. Os dados demonstraram

    que: a possibilidade de Doao de Corpos no desconhecida pela maioria da populao

    pesquisada, o que, no implica em potenciais doadores, e a necessidade de investimento em

    divulgao de mdia de massa. O pdvcea do DA-ICB/USP embora institucionalizado, ainda

    depende do parecer da Corregedoria do Estado de So Paulo, para diminuio do tempo de

    lavratura do assento do bito, sem prejuzos financeiros aos familiares dos doadores, e da

    aquisio de jazigo pela instituio para homenagens aos doadores.

    Palavras-chave: Doao. Cadver. Disseco. Anatomia.

  • ABSTRACT

    MARSOLA, T. R. P. S. Voluntary donation of bodies for anatomical study. [Doao voluntria de corpos para estudo anatmico]. 2013. 121 f. Tese (Doutorado em Cincias) Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2013.

    Unclaimed corpses were for many years the supply of human material for the study of human

    anatomy. However, due to improved quality of life and technology as well as the ethical

    character of the use, there has been the surround these. Faced with these circumstances, and

    the impossibility of total replacement of this material by others in training future

    professionals and the endless dissection technique, the Donation Voluntary Bodies for

    Anatomical Study is presented as an alternative to capture corpses and no legal impediment

    to such action, since the Civil Code provides for the donation of bodies for teaching and

    research through article 14 of Law 10.406/02, or who wish to donate your body or part of it

    to research institutions and scientific study, without obtaining any pecuniary gain, you should

    do it in life through clear and express statement of intent. Thus, the present study aimed to

    gather information about the knowledge and belief of the population of anatomists and

    freshmen, on the subject; obtain information on the importance of discipline and dissection

    for professional practice and reliability of the general population, and develop Donation

    Program Voluntary Bodies for Anatomical Study (pdvcea) for the Department of Anatomy at

    the Institute of Biomedical Sciences, University of So Paulo (DA-ICB/USP). Regarding the

    importance of dissection for vocational training is considered, for the general population,

    such as reliability factor in professional medical surgeon, the possibility of donation Bodies is

    not unknown for the majority of the population studied, which do not necessarily set in

    potential donors. The Voluntary Donation Program is created, institutionalized, but still in the

    process of acquiring gravesite tributes to the institution; dependent for its dissemination,

    clarification and placement in mass media, as well as the opinion of the Magistrate of the

    State of So Paulo, to decrease the time of drafting the seat of death, without financial loss to

    the relatives of the donors.

    Keywords: Donation. Corpse. Dissection. Anatomy.

  • LISTA DE FIGURAS Figura 1- Processo de mumificao ...................................................................................... 26 Figura 2- Mondino de Luizzi ..................................................................................................... 27 Figura 3- Teatro Anatmico da Universidade de Pdua, construdo em 1594 pelo

    anatomista Fabrizio DAcquapendente .................................................................. 28 Figura 4- Teatro anatmico de Leiden, Holanda, (1609/1610) ............................................. 29 Figura 5- A lio de Anatomia de Andreas Vesalius ................................................................ 30 Figura 6- Os Mdicos da noite ............................................................................................. 31 Figura 7- Disseco em laboratrio de anatomia da Universidade de Boston, no final

    do sculo XIX ............................................................................................................ 33 Figura 8- Disseco no laboratrio de anatomia da Faculdade de Medicina e Cirurgia

    de So Paulo (atual FMUSP) .................................................................................. 34

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1 Idade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ..................................... 52

    Tabela 2 Sexo dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ..................................... 52

    Tabela 3 Estado Civil dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante

    pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ..................................... 52 Tabela 4 Escolaridade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante

    pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011. ................................... 53 Tabela 5 Idade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante

    pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011. ................................... 53

    Tabela 6 Conhecimento sobre doao de corpo entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ................................................................................... 54

    Tabela 7 Opinio sobre doao do prprio corpo entre os Anatomistas e

    Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ................................................................................... 54

    Tabela 8 Conhecimento dos procedimentos necessrios para a doao de

    corpo entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011 ....................... 54

    Tabela 9 Realizao dos procedimentos necessrios para a doao de corpo

    entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011. ................................... 55

    Tabela 10 Dados da pesquisa sobre os motivos doao/no tenho opinio

    formada entre os Anatomistas e Primeiranistas - obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011. ................................... 56

    Tabela 11 Dados da pesquisa sobre os motivos no doao/no tenho opinio

    formada entre os Anatomistas e Primeiranistas - obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011. ................................... 57

    Tabela 12 Conhecimento Anatmico e Disseco de Cadveres entre os

    Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012. .................................................................................................... 58

  • Tabela 13 Disseco durante Graduao e Ps Graduao entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012. .............. 58

    Tabela 14 Nmeros de cadveres e a disseco entre os Mdicos - dados

    obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012. ......................... 58 Tabela 15 Treino de tcnicas manuais em cadveres, materiais sintticos e

    animais entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012 ................................................................................ 59

    Tabela 16 Substituio de material cadavrico por animais e sintticos entre os

    Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012. .................................................................................................... 59

    Tabela 17 Confiana da populao frente a formao do mdico - dados obtidos

    durante pesquisa entre dezembro 2012 a janeiro 2013. ................................ 60

  • SUMRIO

    1 INTRODUO ......................................................................................................... 18

    2 REVISO DE LITERATURA ........................................................................................ 24

    2.1 HISTRICO .................................................................................................................. 25

    2.2 A DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS ....................................................................... 35

    3 OBJETIVOS .............................................................................................................. 41

    3.1 OBJETIVOS GERAIS ..................................................................................................... 42

    3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS ............................................................................................ 42

    4 CASUSTICA ............................................................................................................ 43

    4.1 ELABORAO DE QUESTIONRIO PARA A AVALIAO DO CONHECIMENTO E

    A OPINIO SOBRE DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS ........................................... 44

    4.1.1 Amostra ...................................................................................................................... 44

    4.1.1.1 Anatomistas ............................................................................................................... 44

    4.1.1.2 Alunos Primeiranistas ................................................................................................ 45

    4.1.2 Procedimento ............................................................................................................. 45

    4.2 ELABORAO DE QUESTIONRIO PARA A AVALIAO DO CONHECIMENTO E

    A OPINIO SOBRE A IMPORTNCIA DA DISSECO PARA A PRTICA

    PROFISSIONAL ............................................................................................................ 45

    4.2.1 Profissionais Mdicos ................................................................................................. 46

    4.2.1.1 Amostra ...................................................................................................................... 46

    4.2.1.2 Procedimento ............................................................................................................ 46

    4.2.2 Populao em Geral ................................................................................................... 47

    4.2.2.1 Procedimento ............................................................................................................ 47

    4.3 ANLISE DOS RESULTADOS ....................................................................................... 47

    4.4 ELABORAO DO PROGRAMA DE DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS PARA

    ESTUDO ANATMICO: O PDVCEA DO DA-ICB/USP .................................................. 48

    4.4.1 Leis que regem a destinao de corpos para estudo em Anatomia Humana .......... 48

    4.4.2 Programas em execuo de doao voluntria de corpos ....................................... 48

    4.4.3 Consulta s agncias funerrias do municpio de So Paulo sobre a Doao

    Voluntria de Corpos para Estudo Anatmico .......................................................... 49

    4.5 IMPLEMENTAO DO PDVCEA DO DA-ICB/USP ....................................................... 49

  • 5 RESULTADOS .......................................................................................................... 51

    5.1 AVALIAO DO CONHECIMENTO E A OPINIO SOBRE A DOAO

    VOLUNTRIA DE CORPOS PARA ESTUDO ANATMICO .......................................... 52

    5.2 AVALIAO DO CONHECIMENTO E A OPINIO SOBRE A IMPORTNCIA DA

    DISSECO PARA A PRTICA PROFISSIONAL ............................................................ 57

    5.3 ELABORAO DO PROGRAMA DE DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS PARA

    ESTUDO ANATMICO (pdvcea) ................................................................................. 60

    6 DISCUSSO ............................................................................................................. 64

    6.1 A DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS ....................................................................... 69

    6.2 O PDVCEA DO DA-ICB/USP ......................................................................................... 72

    7 CONCLUSES.......................................................................................................... 75

    REFERNCIAS .......................................................................................................... 78

    APNDICES ............................................................................................................. 85

    ANEXOS ................................................................................................................ 110

  • INTRODUO

  • Introduo 19

    1 INTRODUO

    A disciplina de Anatomia Humana constitui-se, h sculos, como a base para aqueles

    que decidem atuar nas diferentes reas da sade, uma vez que o seu conhecimento apurado

    e domnio so imprescindveis para o exerccio profissional eficaz e competente,

    possibilitando diagnsticos e prognsticos corretos.

    Essa importante matria oferecida aos alunos a partir do primeiro semestre dos

    diversos cursos de graduao, poca em que, ao se fundamentar no contato com as

    estruturas do corpo humano no cadver, o aprendizado sobre a forma, sintopia, holotopia e

    estratigrafia dos diferentes rgos, sedimenta-se tambm a sua Nomenclatura, conferindo-

    lhe assim, a condio de Cincia Anatmica (WIECKING, 1974).

    Como caracterstica prpria dessa Cincia, a utilizao de cadveres, que remonta aos

    primrdios da histria da humanidade (DE CARO; MACCHI; PORZIONATO, 2009), constitui-se

    motivo de ampla discusso ainda nos tempos atuais, pois apesar de ser considerado

    insubstituvel para o aprendizado, a diminuio da oferta de corpos de indigentes, e os

    trmites burocrticos com alto custo de regularizao desses corpos no reclamados fazem

    rarear, de maneira preocupante, um material de valor didtico inestimvel (PASQUALUCCI,

    2012).

    A dificuldade da obteno do material natural determinou o surgimento de correntes

    que defendem mtodos alternativos, com o intuito de se tentar solucionar, pelo menos em

    parte, esse problema, fazendo proliferar a utilizao de modelos elaborados com os mais

    diferentes tipos de materiais sintticos. Estes, por mais que possuam semelhanas com o

    correspondente natural, so incapazes de permitir a sua total substituio, demonstrada

    atravs da difcil tarefa de se representar de maneira fidedigna, as estruturas internas de

    alguns sistemas (CARVALHO et al., 2010).

    A introduo de imagens computadorizadas e de modelos Anatmicos pode

    representar um complemento valioso, mas no um substituto para a educao (onde 2/3 da

    utilizao do cadver serve a esse propsito, e o 1/3 restante para fins investigativos) e onde

    somente o cadver pode fornecer uma gama ampla de percepo, tanto de consistncia,

  • Introduo 20

    tamanho e forma dos rgos, como visual, ou seja, relativa profundidade e relaes dos

    mesmos (STIMEC; DRASKIC; FASEL, 2010).

    Pelo at aqui exposto, pode-se compreender que, ao se avaliar as conseqncias

    advindas dos entraves administrativos relacionados obteno de corpos no reclamados,

    bem como da impossibilidade da substituio por completo do material natural por outro de

    qualquer natureza (GUNDERMAN, 2008; CORNWALL; STINGER, 2009; PASQUALUCCI, 2012), a

    sada encontrada pelas Universidades de diversos Pases, foi a de se estabelecer um

    programa de doao voluntria de corpos, cada um deles desenvolvido respeitando-se as

    leis especficas de seus respectivos territrios de origem.

    De fato, as doaes voluntrias vm se constitudo como a soluo para a escassez de

    material biolgico para estudo da Anatomia. Nos EUA, por exemplo, desde 1968, todos os

    estados criaram o direito do cidado de doar o seu prprio corpo para a educao em cincia

    mdica. A Lei norte-americana prev que qualquer pessoa em idade legal e livre de doenas

    mentais pode disponibilizar seu corpo, ou qualquer rgo ou parte dele, para ser usado com o

    propsito da cincia mdica ou para a reabilitao de doentes ou pessoas que estejam com

    seus rgos fatigados. Tal prtica passou a surtir efeito, e os seus resultados puderam ser

    comprovados em Universidades Estaduais como a de Virgnia onde, de 1969 a 1973, a

    Universidade Estadual recebeu 129 corpos (WIECKING, 1974) e a de Massachussets que, em

    2007, exibia uma lista de 4.500 pessoas dispostas a doarem seus corpos para Estudo

    Anatmico (PRAKASH et al., 2007).

    A prtica da doao voluntria de corpo dissemina-se pelos diferentes Continentes, e

    tem sido apresentada como alternativa em pases como a Tailndia (WINKELMANN;

    GLDNER, 2004), a Turquia (SEHIRLI; SAKA; SAIKAYA, 2004), a China (ZHANG et al., 2008), a

    Nova Zelndia (BOLT et al., 2010), dentre outros.

    Na Itlia onde, segundo De Caro, Macchi e Porzionato (2009), foi criada em 2004 no

    departamento de Anatomia Humana e Fisiologia da Universidade de Padova, a Associao

    para a doao de corpo para tcnicas morfolgicas em poucos anos pode ser retomada

    plenamente a prtica da disseco nos cursos de Anatomia.

    Embora possa parecer que os programas de doao voluntria de corpos para estudo

    em Anatomia seja um assunto recente, o da Escola Mdica da Universidade de Otago na Nova

    Zelndia foi estabelecido em 1943, permitindo que a instituio receba, em mdia, 40 corpos

    anualmente (CORNWALL; STRINGER, 2009).

  • Introduo 21

    No Brasil, aps extensa busca, do total de 2.377 instituies de Ensino Superior

    verificou-se que algumas delas, na tentativa de driblar e minimizar o problema da falta de

    cadveres executam um programa oficioso de doao voluntria de corpos com resultados

    bons, parcos, ou no informados: Universidade Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de

    Medicina do ABC, Universidade Estadual do Rio Grande do Norte, Universidade Federal do Rio

    Grande do Norte, Universidade Federal do Acre, Universidade Federal do Paran,

    Universidade do Vale do Itaja, Universidade Federal de So Paulo, mas que apenas duas

    universidades possuem um programa oficial de doao.

    Assim, o Departamento de Cincias Bsicas da Sade da Universidade Federal de

    Cincias da Sade de Porto Alegre (RS) possui, desde 2008, um programa de doao de

    corpos que tem por objetivo conscientizar a populao sobre a ao, o qual elevou de 26

    doaes no perodo de 2003-2007 para 147 registros, aps a implantao (ROCHA et al.,

    2012).

    Desde 1999, a Universidade Federal de Minas Gerais, possui o programa Vida aps a

    vida, que visa doao voluntria de corpos. Em 10 anos, 300 pessoas se inscreveram como

    Doadoras, sendo que 30 cadveres frutos desse projeto encontram-se disposio no

    laboratrio de Anatomia e vm sendo utilizados para fins de ensino e pesquisa (UFMG, 2010).

    Ao se abordar a problemtica no Estado de So Paulo, onde especificamente o

    nmero de Escolas Mdicas (36 cursos) superior queles dos Estados em que o programa

    de doao voluntria de corpos foi implantado (Minas Gerais com 28 cursos, e Rio Grande do

    Sul com 11 cursos) e, ainda, quase cinco vezes o dos Estados do Nordeste com o maior

    nmero de cursos (Bahia, Cear e Paraba, com 7 cursos cada), executou-se a presente

    pesquisa, com o objetivo primordial de se desenvolver, legalizar e estabelecer um Programa

    de Doao Voluntria de Corpos para Estudo Anatmico (pdvcea) do Departamento de

    Anatomia do Instituto de Cincias Biomdicas da Universidade de So Paulo (DA-ICB/USP),

    cujas regras e normas, aps implementadas, devero ser extensivas a todo o Estado de So

    Paulo.

    Mesmo tendo-se na USP, desde o final dos anos 1980, a conscincia de que esse seria,

    num futuro prximo, o nico procedimento capaz de suprir a deficincia no ensino da

    Anatomia Humana decorrente da falta de cadveres, foi a histria pessoal da autora o ponto

    de partida para que esse programa se desenvolvesse.

  • Introduo 22

    Formada em Odontologia, Mestre em Anatomia Humana, e exercendo as atividades

    de professora de Anatomia em Universidades particulares da Capital de So Paulo, onde se

    depara no dia a dia de suas aulas com os problemas oriundos da extrema escassez de

    material humano natural a autora, convicta da atitude altrusta do ato de doao voluntria

    de corpo para o estudo da Anatomia, engendrou esforos para a concretizao do desejo de

    sua av paterna que, aps seu bito, queria que o seu corpo servisse aos devidos e justos

    ensino das cincias anatmicas. Essa aspirao foi consumada no dia 05 de setembro de

    2008, quando devidamente regularizado quanto s leis em vigncia, o cadver da Sra. Eunice

    Nogueira de Abreu Simo adentrou ao laboratrio de Anatomia Humana do Instituto de

    Cincias Biomdicas da Universidade de So Paulo para a sua derradeira e nobre misso.

    Considerando que todo e qualquer tipo de material humano possa ser utilizado no ensino da

    Anatomia, no obstante, em novembro do ano de 2010, exumou e tambm doou ao mesmo

    departamento, os ossos do esqueleto de seu pai, o Sr. Jos Andirs de Abreu Simo, falecido

    em 16 de fevereiro de 1983.

    Essas aes, pioneiras no seio da USP, trouxeram tona um assunto importante e

    complexo, tratado algumas poucas vezes e de maneira velada em nosso meio, devido em

    grande parte ao tabu que a morte representa para a nossa sociedade, e abordagem quase

    sempre extraordinria sobre esse tema dispensada pelas diversas mdias, o que tambm

    contribui para que se desencorajem os indivduos, quando em vida, a meditar sobre a doao.

    Mesmo observando-se que ao longo do tempo as diferentes crenas e religies,

    cincias, artes, filosofias, tentam confortar os anseios humanos sobre o fato de a morte ser

    apenas uma passagem, um caminho, ou para onde se vai aps ela acontecer, existe uma

    proibio oculta quando o assunto a morte; as pessoas no podem falar, no podem desej-

    la a si nem ao outro, a ponto de que aqueles sobre ela comentem, sejam tidos como seres

    portadores de patologias necessitando, portanto, de tratamento.

    Porm, considerando-se que o corpo humano sem vida de utilidade mpar nos

    estudos necessrios formao dos profissionais das reas da sade, e que a escassez cada

    vez maior de cadveres para a prtica anatmica preocupante no sentido de comprometer

    seriamente a qualidade desses profissionais, alm de questionamentos prticos sobre os

    procedimentos necessrios nos dias atuais, para que seja possvel a obteno de um nmero

    adequado de cadveres humanos (compatvel com a boa qualidade do ensino oferecido, de

    modo desburocratizado e com baixo custo), contriburam tambm para motivar a realizao

  • Introduo 23

    da presente pesquisa, alguns de base filosfica, como por exemplo, se, alm de colaborar

    com a formao dos futuros profissionais da rea da sade, as pessoas estariam dispostas a

    introduzir no dia-a-dia, a reflexo e as discusses constantes sobre a doao voluntria

    decidida e oficializada.

    Assim, ao mesmo tempo em que a proposta do presente trabalho, foi a de se

    estabelecer uma alternativa visando minimizar, ou at erradicar a falta de cadveres em

    nossos laboratrios de Anatomia Humana, procurou-se tambm, esclarecer as pessoas do

    elevado grau de altrusmo dessa atitude.

  • REVISO DA LITERATURA

  • Reviso da Literatura 25

    2 REVISO DA LITERATURA

    Sero apresentadas uma breve cronologia sobre a utilizao de cadveres no ensino

    da Anatomia, e os diferentes aspectos relativos doao voluntria de material humano para

    estudo.

    2.1 HISTRICO

    Nas diferentes civilizaes, o conhecimento do corpo nasceu da necessidade e desejo

    de mant-lo ntegro, na tentativa do ser humano em superar a morte. Com esta fixao em

    mente, fazia-se necessrio no somente ousar, mas tambm criar mtodos de estudos e ir

    busca do desconhecido que se encontrava no prprio cadver (QUEIROZ, 2005).

    De todos os povos da antiguidade eram, sem dvida, os egpcios os que mais

    veneravam os seus mortos. Por acreditarem que a alma saa do cadver e ia ao encontro de

    Osris, a alma da pessoa necessitava ento de um corpo para a vida aps a morte. Portanto,

    devia-se preservar este corpo para que ele recebesse de forma adequada a alma,

    desenvolvendo-se ento, a arte de embalsamar, transformando o corpo em mmia (Figura 1).

  • Reviso da Literatura 26

    Figura 1 - Processo de mumificao

    Fonte: library.thinkquest.org/28209/mummification.htm. Acesso em: 20 de dezembro de 2012.

    Tratando-se o cadver como sagrado e sendo, portanto, um assunto religioso, a

    disseco era vista como um desrespeito ao morto ou sua alma, sendo praticada em

    segredo por muitos dos anatomistas da antiguidade.

    Atribui-se a Mondino de Luizzi (1275-1326) cirurgio italiano da cidade de Bolonha,

    cognominado o restaurador da Anatomia, a primeira demonstrao pblica de disseco

    em cadver humano, realizada em 1315 (Figura 2).

  • Reviso da Literatura 27

    Figura 2 - Mondino de Luizzi

    A B

    Fonte: 2.A- Revista de Medicina Francesa, L. Jacolliot, Paris, Frana, 1882; 2.B- Acervo particular do Prof. Dr. Edson Aparecido Liberti. Legenda: 2.A- Xilografia original de Mondino de Luizzi, o restaurador da Anatomia; 2.B- Clssica cena de uma disseco por volta do sculo XV, onde se observa o demonstrator e o sector, na concepo da escola de Mondino de Luizzi.

    Considerado como o primeiro a incorporar o estudo sistemtico da Anatomia e

    disseco em um currculo mdico, Mondino foi o instaurador da Ctedra, uma cadeira

    colocada num plano elevado, de onde lia (lector) e comentava sobre um texto anatmico,

    para um professor (demonstrator) que tinha a incumbncia de indicar a regio para o

    encarregado de realizar a disseco (sector), em geral, um simples barbeiro ignorante do

    latim, idioma em que se efetuava a rcita do lector (CHIARELLO, 2011).

    Nessa fase, a Anatomia era essencialmente italiana, sobretudo porque o Papa Sixto IV,

    que havia estudado em Bolonha e Pdua, autorizou no sculo XV, a disseco de cadveres

    humanos, condicionada permisso das autoridades eclesiticas, posteriormente confirmado

    por Clemente VII no sculo XVII. Na Universidade de Bolonha, as disseces foram

    reconhecidas oficialmente em 1405 e, em 1429, em Pdua (REVISTAMEDICA, 2012).

    Regulamentada por lei, essas demonstraes realizadas em corpos de executados,

    eram pblicas, fazendo disseminar por toda a Europa, os teatros anatmicos (ABRAHO,

    2012), como o da Universidade de Pdua (Figura 3).

  • Reviso da Literatura 28

    Figura 3 - Teatro Anatmico da Universidade de Pdua, construdo em 1594 pelo anatomista Fabrizio DAcquapendente

    Fonte: http://educacao.uol.com.br/biografias/girolamo-fabrizio-acquapendente.jhtm. Acesso em: 20 de dezembro de 2012.

    Esses Teatros, que paulatinamente vo incorporando os avanos das tcnicas de

    preparao e conservao e apresentando modificaes em sua arquitetura (KLESTINEC,

    2007; SCHUMACHER, 2007; TAVANO, 2009), passam a ser considerados espaos no apenas

    para a aprendizagem da Anatomia, mas tambm para que os anatomistas pudessem

    disciplinar os espritos do pblico, induzindo a diferentes emoes (CHERVEL, 1990;

    TAVANO, 2009; GUERRINI, 2004) (Figura 4).

  • Reviso da Literatura 29

    Figura 4 - Teatro Anatmico de Leiden, Holanda (1609/1610)

    Fonte: http://laiguanailustrada.blogspot.com.br/2009/05/illus-el-teatro-de-operaciones.html. Acesso em: 20 de dezembro de 2012.

    Como no pertence ao escopo do presente trabalho, um detalhamento ao longo da

    histria sobre a evoluo e os percalos inerentes prtica da disseco em corpos humanos,

    pode-se considerar que com Andreas Vesalius (1510-1564) essas demonstraes atingiram o

    seu mais alto grau e, a partir de ento, como enfatizado por Chagas (2001) o cadver passou

    a compartilhar com o professor, a primazia de ser a figura mais importante no ensino da

    Anatomia (Figura 5).

  • Reviso da Literatura 30

    Figura 5 - A lio de Anatomia de Andreas Vesalius

    Fonte: Reproduo de ilustrao original do acervo particular do Prof. Dr. Edson Ap. Liberti.

    Rompendo com a tradio, Vesalius desce da ctedra e dispensa o demonstrator e, em

    atitude inusitada, realizava ele prprio a disseco e demonstrao das estruturas. Com aulas

    dadas a grandes pblicos, utilizava, tambm de forma inovadora, desenhos e esquemas de

    estruturas anatmicas (SINGER, 1996). Assim, at o sculo XIX, a prtica da disseco tornou-

    se um evento pblico normal e tambm uma atividade de ensino praticada preferencialmente

    no inverno, a fim de retardar a decomposio do corpo. Na Itlia, as disseces eram algumas

    vezes praticadas poca do carnaval para servirem, no somente aos interesses mdicos,

    mas tambm como uma lio de moral e religiosa (SCIENCEMUSEUM, 2012).

    Mesmo tendo sido o cadver revestido de to elevado valor na formao daqueles

    que se dedicavam prtica da Medicina, restringir o estudo da Anatomia somente em corpos

    de executados, muito embora tenha significado um avano enorme sobre os dogmas que

    dominavam o cenrio anatmico da poca, como as teorias de Galeno, a Anatomia passa a

    defrontar-se com um problema crnico, o da quantidade insuficiente de cadveres para

    estudo.

    Na Inglaterra, em 1751, o Parlamento Britnico instituiu o Murder Act, estipulando

    que para prevenir o horrvel crime de assassinato, deve ser adicionado como marca peculiar

  • Reviso da Literatura 31

    da infmia, pendurar o cadver em correntes, ou envia-lo disseco. Como, quase 200 anos

    depois de Vesalius, ainda determinava-se que em disseces era permitido apenas o uso de

    cadveres de criminosos, o problema crnico do nmero insuficiente de cadveres persistia

    (para se ter uma ideia, de 200 escolas mdicas em 1793, esse nmero passou a mais de mil

    em 1823 e, como fator complicador, o nmero de condenaes forca caiu de 500\ano no

    sculo 18, para o 50\ano no sculo 19). Essa questo era resolvida parcialmente pela ao

    dos chamados ressuscitadores, ressurreicionistas, ensacadores ou mdicos da noite,

    invasores de cemitrios que exumavam cadveres e os encaminhavam para mdicos e

    escolas anatmicas (MELO, 1989; CHAGAS, 2001; MAGEE, 2001; QUEIROZ, 2005; ABRAHO,

    2012) (Figura 6).

    Figura 6 - Os Mdicos da noite

    Fonte: http://www.artfund.org/what-to-see/exhibitions/2012/10/19/doctors-dissection-and-resurrection-men. Acesso em: 20 de dezembro de 2012.

    Como previamente citado, no incio do sculo XIX o problema agrava-se, pois com a

    ascenso da cincia mdica concomitantemente com o declnio das execues, a demanda de

  • Reviso da Literatura 32

    cadveres tornou-se muito maior do que a sua oferta. Na tentativa de solucion-lo e,

    tambm, com o intuito de se extinguir na Gr Bretanha o mercado negro de cadveres e a

    prtica de roubo de corpos nos cemitrios pelos mdicos da noite, o Parlamento Britnico

    promulgou, em 1832, o Anatomy Act, que permitia aos mdicos, cirurgies e estudantes, o

    acesso legal aos corpos no reclamados, em particular aqueles mortos em prises e hospcios,

    bem como aos corpos doados por parentes, que assim evitavam o pagamento das despesas

    relativas ao sepultamento.

    O Ato discorria que:

    o conhecimento das causas e a natureza das diversas doenas que afetam o corpo e o tratamento e cura dessas doenas, bem como o reparo e a cura de leses e ferimentos a que o ser humano esteja sujeito, no pode ser adquirido sem um exame anatmico.

    Ainda segundo o Ato, todo aquele que pretendia praticar a Anatomia deveria obter

    licena oficial, que era concedida a apenas um ou dois professores de cada Instituio de

    Ensino, que assumiam a responsabilidade quanto ao tratamento adequado aos corpos

    existentes nas dependncias da Instituio onde lecionavam.

    Nos Estados Unidos em 1831, portanto um ano antes do Anatomic Act, membros da

    Sociedade Mdica de Massachussets trabalharam para que o estudo da Anatomia Humana

    fosse legalizado.

    Assim, institui-se o Massachussets Anatomic Act, uma lei tambm conhecida como

    instrumento beneficente de humanizao na manuteno da sade, que permitia s escolas

    mdicas receberem e destinarem aos laboratrios de Anatomia, corpos no reclamados

    (DYER; THORNDIKE, 2000). Seguida pela lei de Connecticut em 1833, e subsequentemente

    pelas leis de outros Estados americanos, as mesmas no resolveram os problemas da escassez

    de material anatmico, nem tampouco os conflitos sociais decorrentes da prtica disseces.

    Todavia, se por um lado, a questo da falta de material para estudo no foi solucionada, essas

    leis representaram o incio de uma mudana nas atitudes sociais de ento, o que permitiu aos

    alunos estudarem abertamente a Anatomia em cadveres humanos, mesmo que muito

    tempo depois, ou seja, cerca de 60 anos (Figura7).

  • Reviso da Literatura 33

    Figura 7 - Disseco em laboratrio de Anatomia da Universidade de Boston, no final do sculo XIX

    Fonte: https://www.countway.harvard.edu/chm/archives/iotm/iotm_2003-05.html. Acesso em 20 de dezembro de 2012.

    No Brasil, apesar do desenvolvimento considervel da Anatomia na Europa desde o

    sculo XVI (onde em Portugal, com a reforma administrativa da Universidade de Coimbra em

    1772 visando atualizao da Faculdade de Medicina, a Anatomia era praticada por

    intermdio da disseco de cadveres), o estudo dessa cincia quase que no existiu at o

    final do sculo XIX. Isso porque o uso de cadveres humanos, contrariamente ao que

    acontecia na Europa moderna (FOUCAULT, 1972), era proibido entre ns pelo Santo Ofcio

    (PIRES, 1989).

    Criada em 18 de fevereiro de 1808, a Escola Mdica da Bahia foi a primeira escola de

    medicina do Brasil, e teve como professor de Anatomia, o Doutor Jos Soares de Castro.

    Durante os seus primeiros anos (de 1808 a 1815), o ensino da Anatomia limitava-se a lies

    tericas.

    Na Escola Anatmica, Cirrgica e Mdica do Rio de Janeiro, criada em 02 de abril de

    1808, foi nomeado para essa funo, o cirurgio Joaquim da Rocha Mazarm (SANTOS FILHO,

    1991). Como na Bahia, o ensino da Anatomia era essencialmente terico; porm, algumas

    vezes eram praticadas disseces em carneiros. A partir de 1813, ao ensino da Anatomia

  • Reviso da Literatura 34

    embasado em textos franceses, incorpora-se a disseco de cadveres, sob a orientao do

    professor Joaquim Jos Marques (TAVANO, 2009).

    Em So Paulo, convidado pelo Doutor Arnaldo Augusto Vieira de Carvalho (1867-

    1920), fundador em 1912 da ento Faculdade de Medicina e Cirurgia de So Paulo, o

    Professor italiano Alfonso Bovero (1871-1937) foi contratado em 1914 para assumir a Ctedra

    de Anatomia (LIBERTI, 2010). Discpulo de Carlo Giacomini (1840-1898) na Universidade de

    Turim, Bovero teve uma formao acadmica que aliou a docncia e a pesquisa, uma sntese

    da proposta descritiva italiana com o experimentalismo, o comparativismo e o incentivo

    pesquisa, sugeridos pelos alemes. Com essa formao, rejeita o modo de ensino de

    Anatomia at ento praticado no pas e, ao promover o acesso direto ao cadver, incentiva

    tambm a pesquisa, necessrios para a formao e a prtica mdica (TALAMONI, 2012).

    Com o seu discpulo Renato Locchi (1876-1982) assumindo a ctedra de Anatomia

    aps a sua morte em 1937, manteve-se a tradio da prtica da disseco como parte crucial

    do processo de ensino e aprendizagem (TALAMONI, 2012). Nessa fase, Departamento de

    Anatomia da FMUSP recebia de 200 a 250 cadveres por ano, tornando o ensino prtico

    muito eficiente (LOCCHI, 1942) (Figura 8).

    Figura 8 - Disseco no laboratrio de Anatomia da Faculdade de Medicina e

    Cirurgia de So Paulo (atual FMUSP)

    Fonte: Guimares, A. P. Arnaldo Vieira de Carvalho, Biografia e Crtica, 1967. Legenda: Destacam-se o jovem professor Benedito Montenegro (segundo, da esquerda para a direita) que, embora tendo se firmado como eminente cirurgio, atuou durante muitos anos como assistente do professor Bovero.

  • Reviso da Literatura 35

    2.2 A DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS

    A abordagem do tema pelos diversos autores citados a seguir, visa no somente a

    descrio das caractersticas, desenvolvimento e procedimentos dos programas de Doao

    Voluntria do Corpos para Estudo Anatmico, mas tambm exp-los avaliao em vrios

    aspectos, quer sejam eles legais, ticos, morais, religiosos, ou propriamente de ensino e

    pesquisa.

    Nos primrdios da dcada de 1970, Wiecking (1974) comenta sobre o interesse da

    populao do Estado da Virgnia (EUA) em doar o corpo ou partes dele, e que com o

    esclarecimento sobre os procedimentos necessrios para essa atitude contidos no Uniform

    Anatomical Gift Act, vem ocorrendo um aumento da relao nmero de corpos

    doados/corpos no reclamados, passando de 10/209 em 1969-1970, para 33/124 em 1972-

    1973. Salienta que os jornais e outras mdias tm sido uma poderosa fonte capaz de moldar e

    influenciar favoravelmente a atitude da populao a respeito do uso cientfico do corpo e

    suas partes.

    Na Escola Mdica da Universidade de Otago, Fennel e Jones (1992) formularam um

    questionrio enviado para pessoas que tinham manifestado a inteno de doar seus corpos

    para a faculdade. O questionrio solicitava, entre outras, informaes sobre o sexo, estado

    civil, idade, ocupao, fonte de informao sobre o programa de doao, razes que levaram

    a doar e a expectativa sobre o uso do cadver. Verificaram que as razes mais comuns para

    esse ato eram a de ajudar a cincia e gratido profisso mdica, e que os indivduos no

    souberam distinguir entre a utilizao do cadver para o ensino mdico, ou para a pesquisa.

    Lagwinski et al. (1998) analisaram os aspectos como idade, sexo, raa, estado civil,

    grau de educao, ocupao, em 1.267 potenciais doadores inscritos no programa da Escola e

    Medicina de Ohio, no perodo de 1978 a 1993. Observaram que o perfil do doador so

    mulheres brancas com mais de 70 anos que exercem atividades domsticas e com terceiro

    grau completo, e que homens com essas caractersticas (exceto a ocupao) tambm so

    doadores, mas em menor quantidade. Casais manifestaram-se como doadores conjuntos, em

    32,1% dos casos.

  • Reviso da Literatura 36

    Para Watkins et al. (1998), quando da doao, geralmente o histrico mdico do

    doador aceito como suficiente para se confirmar a presena ou no de uma doena

    infecciosa. Sabendo que os programas de doao voluntria de corpo so atualmente

    conduzidos por regras bem estabelecidas, e como o programa do Medical College of

    Wisconsin onde atuam, fornece cadveres para outras instituies, e desconhecendo algum

    protocolo oficial que obrigue a realizao de testes para doenas infecciosas nos corpos

    doados para uso em ensino e pesquisa, os autores apresentaram um estudo em 785

    cadveres recebidos de 1992 a 1997 por aquela instituio, onde analisaram em amostras

    sanguneas, a presena de vrus para a Imunodeficincia adquirida (HIV), hepatite B (HBV) e

    hepatite C (HCV). Detectaram que 2,3% da amostra (18 indivduos) estava infectada (2

    positivos para HIV, 6 para HBV e 10 para HBC), e concluram que, para que se evite a

    contaminao, a realizao desses testes deve ser condio prvia ao uso de cadveres dos

    doadores.

    Boulware et al. (2004) realizaram uma pesquisa no Estado de Maryland (EUA) sobre

    doao de corpos, onde incluram questes como idade, raa/etnia, nvel educacional e

    financeiro, estado civil, religio/espiritualidade, confiana em hospitais. De 285 participantes,

    49% consideraram a doao, sendo os itens raa/etnia e nvel educacional, os que mais

    influenciaram a voluntariedade dos participantes.

    Na Tailndia, Winkelmann e Gldner (2004) relatam que os cadveres para estudo so

    obtidos atravs de doao voluntria no remunerada, e que ultimamente tem ocorrido um

    declnio no nmero de doaes, uma vez que a maioria dos tailandeses budista e relutam

    em doar, por acreditarem no seu renascimento. Todavia, os autores identificaram dois fatores

    que podem auxiliar o povo tailands a superar essa limitao, com o consequente aumento

    no nmero de doaes: a aprovao da doao oficializada pelo Rei Bhumibol (o que

    consideram um poderoso incentivo), e que os doadores adquirem o status elevado de

    notvel professor (ajarn yai).

    Considerando que, na Turquia, existe um nmero insuficiente de cadveres para o

    estudo da Anatomia devido ao declnio do nmero de corpos no reclamados, e de poucos

    obtidos por doao, Sehirli, Saka e Saikaya (2004) avaliaram a atitude dos anatomistas (83

    profissionais) frente ao assunto sobre a doao de corpos. Dentre as respostas, ressalta-se

    que 51% consideram a doao a soluo a longo prazo; 83,1 % acreditam que uma

    campanha sobre o assunto pode ajudar no aumento da captao de corpos; 47% estariam

  • Reviso da Literatura 37

    dispostos a participar da campanha e 15,7% estariam dispostos a doar os seus corpos. Dentre

    as razes pelas quais 63,3% no doariam, esto ser dissecado por colegas (15,7%); a no

    aceitao da famlia em doar (26,5%); razes psicolgicas (43,4%); desrespeito ao cadver

    (26,5%) e crenas religiosas (3,6%).

    Na Irlanda do Norte, Taylor e Wilson (2007) fazem uma extensa avaliao das normas

    do Human Tissue Act de 2004, e a importncia da doao de corpos para estudos. Relatam

    uma ampla flutuao no recebimento de cadveres legados em testamento (55 entre 1957 e

    1962, e 196 no perodo de 1977 a 1985), com um declnio evidente a partir de 2005/2006.

    Concluem sobre a necessidade de se conscientizar a opinio pblica, informando que o

    sucesso do treinamento de mdicos e dentistas depende da doao de corpos.

    Sato (2007) descreve que no Japo, com o aumento das escolas mdicas a partir da

    dcada de 1970 e a necessidade de se incrementar o material para estudo anatmico no

    somente com cadveres no reclamados, mas tambm oriundos de doaes; professores de

    Anatomia e lderes de organizaes de doadores voluntrios compreenderam a necessidade

    de se formular um procedimento para beneficiar o desenvolvimento de uma lei de doao de

    corpos, que foi proposto para o Ministrio da Educao. Como resultado foi institudo, em

    1982, o Certificado Oficial de Reconhecimento do Ministrio da Educao (com o nome do

    doador e fornecido aos familares), e criada em 1983, a Lei de Doao de Corpos, o que para

    sociedade assegurou a aceitao cultural do conceito da doao de corpos (uma vez que foi

    certificado pelo Governo), e auxilia a reforar o desejo verdadeiro do falecido, e no dos

    membros da famlia. Com isso, o nmero de cadveres tem sido suficiente para suprir as

    necessidades dos trabalhos de disseco nas escolas mdicas do Japo.

    Dado o papel importante que a disseco desempenha no carter das atitudes dos

    estudantes de medicina frente vida e morte, e que as mesmas no foram avaliadas no

    contexto da doao de corpos para estudo, Cahill e Ettarh (2008) realizaram, atravs de

    questionrios, uma pesquisa sobre o assunto com os estudantes do primeiro ano de uma

    escola de medicina da Irlanda, antes e depois de iniciados os trabalhos de disseco, e

    novamente depois de 9 semanas. A idia de doar o corpo diminuiu significativamente entre

    os estudantes aps a exposio disseco, passando de 31,5% antes dos procedimentos,

    para 19,6% aps 9 semanas. Concluram que, como uma populao de doadores em

    potencial, os estudantes so relutantes em se tornar emocionalmente envolvidos no processo

    de doao.

  • Reviso da Literatura 38

    Em uma abordagem tica sobre a doao, Gunderman (2008) interagiu com os

    aspectos egosta e liberal, o porqu de as pessoas escolherem doar seus corpos para a

    educao e a cincia, e que tipo de apelo devem ter em mente os anatomistas e mdicos

    para que os pacientes e familiares procedam doao? A anlise sob o ponto de vista do

    egosmo demonstrou que, entre outras constataes, as pessoas querem desfrutar dos

    benefcios da doao, sem doar o prprio corpo, ou podem simplesmente mentir sobre as

    suas intenes, e assim aproveitar dos benefcios da doao durante a vida. Sob o aspecto

    liberal, associou a generosidade que harmoniza as pessoas com a necessidade de outras,

    sendo que o ato generoso completa um indivduo que naturalmente quer compartilhar com

    outros e, por isso, quando se oferecem atravs da doao do corpo, se entregam por inteiro.

    Zhang et al. (2008) avaliaram os principais obstculos da cultura chinesa para a

    doao de corpos para o estudo da Anatomia, uma vez que as escolas mdicas vm se

    deparando com a diminuio de cadveres para ensino e pesquisa, e propuseram uma

    soluo tica com o intuito de mudar naquela cultura, o estudo da Anatomia com disseco.

    Descreveram que aspectos supersticiosos tradicionais sobre o corpo, a falta de legislao que

    regula as doaes e a deficincia de canais efetivos que promovam a doao so os principais

    obstculos. Concluram ser necessrio a remoo das barreiras culturais e a mudana da viso

    dos chineses sobre o ato de doao, e estabeleceram no Departamento de Anatomia da

    Universidade de Nanjing, um Centro Educacional para tica Mdica, a fim de promoverem

    o respeito aos cadveres, cuidar para que as pessoas nutram carinho especial pelo que o

    cadver representa, e ganhar a confiana dos potenciais doadores.

    A Faculdade de Medicina e Cirurgia da Universidade de Pdua criou, no ano de 2004, a

    Associao para a doao de corpos para estudo morfolgico para ser utilizado em ensino e

    pesquisa. Para analisar os princpios e procedimentos a serem seguidos nos processos de

    doao, tambm foi instituda uma Comisso sobre Doao para a Educao Mdica,

    formada por professores de Anatomia, Medicina, Medicina Legal, membros do Comit de

    tica em experimentao do hospital de Pdua, bem como representantes do Colgio de

    Cirurgies daquela cidade. Com isso, o departamento de Anatomia da Faculdade recebeu

    diversas declaraes de pessoas desejando doar o corpo para estudo, bem como cadveres

    que vm sendo utilizados em prticas de disseco. O programa amplamente divulgado

    atravs da mdia de massas, bem como em reunies e congressos cientficos (DE CARO;

    MACCHI; PORZIONATO, 2009).

  • Reviso da Literatura 39

    A fim de saber se a idade influencia no ato de doao pelos estudantes de medicina,

    Perry e Ettarh (2009) elaboraram um questionrio aplicado aos alunos do primeiro ano do

    curso mdico, iniciantes na prtica da disseco no curso de Anatomia. Os resultados

    demonstraram que o processo aceito para corpos de desconhecido (83,8%), membros da

    famlia (43,2%) ou responsvel (40,5%), e que a idade modula as influncias sobre as atitudes

    prvias relativas doao de corpo que a exposio disseco causa nos estudantes de

    medicina mais jovens.

    Numa retrospectiva realizada de 1876 a 2009 no Departamento de Anatomia e

    Biologia Estrutural da Escola de Cincias Mdicas da Universidade de Otago (Nova Zelndia),

    sobre a doao de corpos e uso de cadveres para o ensino e a pesquisa naquela instituio,

    Cornwall e Stringer (2009) relataram que o programa oficial de doao estabelecido em 1943,

    permite o recebimento de mais de 40 cadveres por ano. Alm do curso mdico, esses corpos

    vm sendo utilizados em outros nove cursos oferecidos pela universidade, muitos deles em

    especialidades da medicina, promovendo uma melhor abordagem sobre a Anatomia clnica,

    baseada em evidncias. Concluram que essa avaliao de mais de um sculo na educao

    anatmica daquela Universidade, reala utilidade de um programa de doao vigoroso, e a

    abrangncia alcanada de estudantes e profissionais de sade que interagem com essa fonte

    preciosa de material humano para seus estudos.

    Admitindo que a Anatomia constitui-se em um dos alicerces do currculo mdico, e

    que no pode ser praticada sem a obteno adequada de cadveres, o que se constitui em

    um desafio para as escolas mdicas com um nmero elevado de estudantes, Stimec, Draskic e

    Fasel (2010) descrevem a situao dos programas de doao na Srvia, um pas que fornece

    pouca informao aos indivduos sobre o assunto, e que no possui uma legislao adequada.

    Em vista dessa situao, os autores elaboraram procedimento na lei de sade, cujos principais

    objetivos foram: a identificao das opes para a obteno de cadveres (programas de

    doao, corpos no reclamados, e corpos com a permisso de parentes); definio da

    responsabilidade das instituies em informarem as escolas mdicas sobre a possvel

    candidatura aquisio; procedimentos de armazenamento dos corpos; confidncia sobre a

    identificao, e sepultamento do falecido aps a utilizao nos estudos anatmicos.

    Concluram estarem convencidos que o programa de doao de corpos com o

    estabelecimento de legislao prpria a soluo definitiva, e que a utilizao de corpos no

  • Reviso da Literatura 40

    reclamados deve ser mantida como uma soluo provisria, at que seja atingido um nvel

    satisfatrio de conscientizao pblica sobre o problema.

    Ao analisar os 2.357 doadores potenciais e as 1.363 pessoas falecidas registradas na

    Universidade de Groningen (Holanda), Wijbenga et al. (2010) verificaram que 29% das

    pessoas cadastradas entre 2003 e 2008 (sendo 155 homens e 85 mulheres) faleceram em at

    1 ano aps oficializarem a doao, como que tomando uma deciso de ltima hora.

    Consideraram, com a metodologia empregada, ser possvel de se estabelecer um prognstico

    estatstico que permita monitorar e antever a chegada dos corpos para estudo.

    Na mesma Universidade de Groningen, Bolt et al. (2010) enviaram questionrios a 996

    pessoas envolvidas no programa de doao, com perguntas focando os motivos da doao, e

    as caractersticas sociais dos doadores. Responderam ao questionrio 76% dos entrevistados,

    sendo 98% holandeses (com 79% no afiliados a igrejas), 25% profissionais da rea de sade e

    11% envolvidos em educao. Descreveram 3 fatores que motivaram a doao: o desejo de

    ser til aps a morte; a atitude negativa frente aos funerais, e a expresso de gratido. Apesar

    da recesso econmica naquele Pas, somente 8% alegaram motivos financeiros para

    realizarem a doao.

    Com o objetivo de determinar se ocorreram mudanas no perfil dos indivduos que

    legaram seus corpos para a Otago Medical School (OTM), McClea e Stringer (2010)

    selecionaram, de forma aleatria, 200 doadores que registraram sua inteno de doao,

    entre os anos de 2000 e 2009 e enviaram um questionrio solicitando, entre outras,

    informaes sobre idade, sexo, estado civil, profisso, motivo para a doao e deciso para a

    escolha do doar o corpo inteiro. Responderam 140 indivduos (70% da amostra), com a

    maioria apresentando idade acima de 50 anos, poucos profissionais da rea de sade

    (nenhum mdico), aproximadamente 40% oriundos de famlias de doadores, e 90%

    afirmando que a principal razo para a doao do corpo era a de auxiliar ao ensino e

    pesquisa. Concluram que a OTM ainda depende da doao altrusta de corpos para ensino e

    pesquisa, e que os doadores esto mais bem informados sobre a utilizao de seus corpos

    pela Faculdade.

  • OBJETIVOS

  • Objetivos 42

    3 OBJETIVOS

    3.1 OBJETIVO GERAL

    Estabelecer procedimentos que permitam desenvolver, oficializar e

    institucionalizar o programa de doao voluntria de corpos para

    Estudo Anatmico (pdvcea), do Departamento de Anatomia do Instituto de Cincias

    Biomdicas da Universidade de So Paulo (DA-ICB/USP).

    3.2 OBJETIVOS ESPECFICOS

    a) Colher asinformaes sobre o conhecimento e a opinio de anatomistas e leigos,

    quanto doao voluntria de corpos para Estudo Anatmico;

    b) Obter dados de leigos e de profissionais mdicos que atestem a importncia da

    disciplina e da disseco de cadveres em suas respectivas especialidades;

    c) Legalizar, em mbito Estadual, os trmites para a emisso da Certido de bito

    relativos aos corpos destinados pdvcea;

    d) Elaborar o fluxograma do pdvcea;

    e) Divulgar, no mbito da universidade e da sociedade em geral, atravs de diferentes

    canais de veiculao, o pdvcea do DA-ICB/USP;

    f) Adquirir jazigo prprio do DA-ICB/USP para servir de local prtica de reverncias por

    familiares e amigos em memria dos doadores.

  • CASUSTICA

  • Casustica 44

    4 CASUSTICA

    4.1 ELABORAO DE QUESTIONRIO PARA A AVALIAO DO CONHECIMENTO E A OPINIO

    SOBRE A DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS

    O presente questionrio foi formulado com o objetivo de levantar e identificar,

    atravs de um plano exploratrio, o conhecimento do tema doao voluntria de corpos,

    bem como as razes que levariam os participantes a serem Doadores ou no Doadores. A

    inteno foi a de estabelecer um primeiro contato, restringindo interpretaes com a

    problemtica da doao de corpos. O questionrio foi criado a partir da coleta de dvidas e

    explanaes comuns quando se aborda o assunto em questo, em conversas informais da

    autora com pblicos diferentes. Formado por doze itens interrogativos, o mesmo contemplou

    informaes scio-demogrficas (idade, sexo, profisso, religio e grau de escolaridade); o

    conhecimento e a atitude frente ao tema, e os motivos que podem levar o indivduo a doar

    ou no o prprio corpo para Estudo Anatmico (Apndice A).

    4.1.1 Amostra

    Foram constitudos dois grupos, sendo um de profissionais Anatomistas e outro, de

    alunos Primeiranistas.

    4.1.1.1. Anatomistas

    Esse grupo foi formado por 424 indivduos participantes do XXIV Congresso Brasileiro

    de Anatomia (CBA), realizado no perodo de 09 a 13 de outubro de 2010, na Cidade de

    Ribeiro Preto, SP.

  • Casustica 45

    4.1.1.2 Alunos Primeiranistas

    O grupo de alunos foi formado por 630 calouros dos cursos de Medicina, Terapia

    Ocupacional, Educao Fsica, Fisioterapia, Odontologia, Nutrio, Farmcia e Bioqumica,

    Fonoaudiologia da USP, e do curso de Educao Fsica da Universidade Paulista (UNIP).

    4.1.2 Procedimento

    O questionrio foi respondido individualmente com tempo mdio de 5 minutos, sem

    identificao pessoal. No XXIV-CBA, com a autorizao cedida pelo presidente do congresso.

    Assim que o congressista adentrava ao anfiteatro de convenes, foi entregue uma folha

    impressa, sem qualquer explicao oral, que era recolhida ao final do expediente do

    Congresso.

    Para os calouros, mediante autorizao do professor responsvel pelo curso, o

    questionrio foi entregue na primeira aula de Anatomia do primeiro ano do curso, antes

    mesmo que houvesse apresentao do docente e da disciplina. O tempo mdio para resposta

    foi de 5 minutos, sendo o questionrio recolhido aps esse perodo sem qualquer explicao

    sobre o assunto, justamente para no haver induo na resposta.

    Para os dois grupos, considerou-se vlido o questionrio respondido por completo.

    4.2 ELABORAO DE QUESTIONRIOS PARA A AVALIAO DO CONHECIMENTO E A

    OPINIO SOBRE A IMPORTNCIA DA DISSECO PARA A PRTICA PROFISSIONAL

    Com o intuito de coletar e analisar, atravs de um plano exploratrio, a

    importncia da disciplina Anatomia, bem como da prtica da disseco na atuao

    profissional mdica, elaborou-se dois questionrios, sendo o primeiro especfico para

    profissionais mdicos, e o segundo, aberto populao em geral.

  • Casustica 46

    4.2.1 Profissionais Mdicos

    O questionrio foi criado a partir de informaes colhidas junto ao laboratrio do DA-

    ICB/USP, sobre a falta de cadveres para o ensino da Anatomia Humana, e a importncia da

    disseco para a formao mdica. Com catorze itens interrogativos, o mesmo contemplou,

    alm dos itens anteriormente descritos, informaes scio-demogrficas (idade, sexo,

    profisso, religio e grau de escolaridade), e a crescente substituio do material cadavrico

    por animais e materiais sintticos e tecnolgicos nas diferentes Universidades (Apndice B).

    4.2.1.1 Amostra

    O questionrio foi enviado, via correios, para mil profissionais Mdicos

    cirurgies com dados pessoais includos no site do Conselho Regional de Medicina

    (www.cremesp.org.br).

    4.2.1.2 Procedimento

    Atravs dos dados pessoais e de endereo dos mdicos cirurgies, agrupados por

    especialidades mdicas, os mesmos foram contatados por telefonemas em seus respectivos

    consultrios, com prvia apresentao, para a confirmao do endereo completo e

    consequente envio da correspondncia em envelope padronizado, com o timbre oficial do

    ICB/USP.

    O contedo da mesma era composto pelo questionrio; pelo Termo De

    Consentimento Livre e Esclarecido elaborado a partir das regras do Comit de tica em

    Humanos do ICB (Apndice C), e um envelope pr-pago, com o endereo do destinatrio

  • Casustica 47

    colado em etiqueta, para a devoluo sem identificao - do questionrio respondido, sem

    custos ao voluntrio.

    Considerou-se vlido o questionrio respondido por completo.

    4.2.2 Populao em Geral

    Neste questionrio, foram elaboradas trs perguntas a fim de se obter a opinio

    quanto confiana da populao frente formao acadmica do profissional mdico

    cirurgio (Apndice D).

    4.2.2.1 Procedimento

    Utilizou-se o site www.surveymonkey.com , especfico para a criao de pesquisas, as

    perguntas foram enviadas aos destinatrios da lista de contato da autora, solicitou-se,

    tambm, aos entrevistados que o encaminhasse para seus contatos. As questes ficaram

    disponveis para respostas por um perodo de trinta dias.

    4.3 ANLISE DOS RESULTADOS

    Os resultados obtidos nos itens 3.1 e 3.2 foram tabulados e, quando necessrio,

    cruzados com a aplicao do teste Qui-quadrado (ZAR, 1984).

  • Casustica 48

    4.4 ELABORAO DO PROGRAMA DE DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS PARA ESTUDO

    ANATMICO: O PDVCEA DO DA-ICB/USP

    Com o objetivo de desenvolver, instaurar e divulgar Programa de Doao

    Voluntria de Corpos para Estudo Anatmico que pudesse atender s necessidades do DA-

    ICB/USP, foram coletados e avaliados diferentes aspectos, descritos nos itens a seguir.

    4.4.1 Leis que regem a destinao de corpos para estudo em anatomia humana

    No caso especfico dos corpos utilizados para o estudo da Anatomia Humana no

    ICB/USP, at os dias atuais, os mesmos so de indivduos no reclamados (indigentes), e

    provenientes do Servio de Verificao de bitos da Capital (SVOC). A fim de receber esse

    material, o DA-ICB/USP cumpre as determinaes descritas na Lei Federal n. 8501/92 e no

    Provimento n. 16/97, da Corregedoria Geral da Justia do Estado de So Paulo (Anexos A e B).

    As 10 etapas correspondentes a esse processo, aprovada pelo Conselho de

    Departamento em 23/02/2012, e que envolvem desde a obteno de Boletim de Ocorrncia

    at a Lavratura do Atestado de bito, esto expressas no anexo C.

    4.4.2 Programas em execuo de doao voluntria de corpos.

    Durante o I e o II Encontro Internacional de Ensino em Anatomia realizados pelo DA-

    ICB/USP, respectivamente entre os dias 08 a 13/03/2010 e 25 a 27/07/2011 na Cidade

    Universitria Armando de Salles Oliveira da USP, e durante o XXIV Congresso Brasileiro de

    Anatomia, realizado pela Sociedade Brasileira de Anatomia (SBA), no perodo de 09 a

    13/10/2010, no centro de convenes de Ribeiro Preto, foram discutidos os programas e/ou

    procedimentos para a Doao Voluntria de Corpos para Estudo Anatmico. Dentre eles, os

    existentes nos Departamentos de Anatomia das Universidades Federais de Minas Gerais,

  • Casustica 49

    Pernambuco, So Paulo e de Cincias e Sade de Porto Alegre; Vanderbilt University Medical

    Center (Tennessee- EUA); Mont Sinai School of Medicine (Nova Iorque- EUA); Mayo Clinic

    (Minnesota- EUA) e University of Toledo (Toledo- Ohio- EUA).

    4.4.3 Consulta s agncias funerrias do Municpio de So Paulo, sobre a Doao Voluntria de

    Corpos para Estudo Anatmico.

    Durante todo o ms de fevereiro de 2010, a fim de obter informaes relativas ao

    tema, foram contatadas via telefone, todas as agncias funerrias da cidade de So Paulo,

    sendo que das treze existentes, apenas nove atenderam. Na oportunidade, informava-se

    inicialmente ao atendente o falecimento de um familiar que, em vida, havia disponibilizado o

    seu corpo para estudo em universidade, e questionava-se qual(is) procedimento(s)

    deveria(m) ser tomado(s), uma vez que a seguinte documentao pertinente j se encontrava

    em seu poder: atestado de bito, documento da inteno de doao (devidamente escrito,

    assinado e com firma reconhecida em cartrio perante trs testemunhas), e o termo da

    universidade assinado por representante legal, afirmando estar a mesma habilitada a receber

    o corpo. Em seguida, procedia-se aos seguintes questionamentos: onde deveria ser registrado

    o bito; se o velrio poderia ser suprimido; como o corpo seria transportado e, finalmente,

    quais os custos envolvidos.

    4.5 IMPLEMENTAO DO PDVCEA DO DA-ICB/USP

    O pdvcea do DA-ICB/USP foi ento elaborado a partir das informaes obtidas nos

    itens 3.4.1; 3.4.2 e 3.4.3, acrescidas pela colaborao inestimvel da Sra. Claudete Rodrigues

    de Souza, representante da Associao Registral das Pessoas Naturais (ARPREN) no Servio

    Funerrio do Municpio de So Paulo, com experincia de 20 anos na elaborao de

    documentao relacionada aos trmites legais que regem a destinao de corpos de

    indivduos indigentes, para o estudo da Anatomia.

  • Casustica 50

    Desta forma, foram preparados os seguintes documentos:

    a) Cartilha de esclarecimentos sobre o pdvcea do ICB/USP (Apndice E);

    b) Termo de Declarao de Vontade e Testemunho de Doao Voluntria de Corpos para

    Estudo Anatmico (Apndice F);

    c) Formulrio de Registro do Doador Voluntrio de Corpos para Estudo Anatmico

    (Apndice G);

    d) Termo de Aptido (Apndice H);

    e) Termo de Recebimento (Apndice I);

    f) Fluxograma do pdvcea (Apndice J);

    g) Procedimentos do DA-ICB/USP, para a Doao Voluntria de Corpos para Estudo

    Anatmico (Apndice L).

  • RESULTADOS

  • Resultados 52

    5 RESULTADOS

    5.1 AVALIAO DO CONHECIMENTO E A OPINIO SOBRE A DOAO VOLUNTRIA DE

    CORPOS PARA ESTUDO ANATMICO

    Os dados scio-demogrficos referentes s avaliaes realizadas com os Anatomistas

    e Primeiranistas esto expressos, em porcentagens, nas tabelas de 1 a 5 a seguir.

    Tabela 1 Idade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Idade Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    17-21 anos: 20,8 80

    22-30 anos: 42 17

    Acima 31 anos 37,2 3

    Total 100 100

    Tabela 2 Sexo dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a

    fevereiro de 2011

    Sexo Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Feminino 49,3 57

    Masculino 50,7 43

    Total 100 100

    Tabela 3 Estado Civil dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de

    2010 a fevereiro de 2011

    Estado Civil Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Casado 26,7 2

    Solteiro 67,1 97

    Outros 6,2 1

    Total 100 100

  • Resultados 53

    Tabela 4 Escolaridade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de

    2010 a fevereiro de 2011

    Escolaridade Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Ensino Mdio 17,7 85,5

    Superior 35,1 13,8

    Ps-graduao 47,2 0,7

    Total 100 100

    Tabela 5 Idade dos Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a

    fevereiro de 2011

    Religio Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Catlico 68,4 66,2

    Esprita 14,6 8,1

    Evanglico/Protestante 10,1 11,5

    Agnstico/Ateu 3,7 9,8

    Outros 3,2 4,5

    Total 100 100

    De maneira geral, em ambos os grupos, houve um predomnio de indivduos jovens

    com menos de 30 anos (62,8% Anatomistas; 97% Primeiranistas). Relativamente ao estado

    civil, a predominncia foi de indivduos solteiros (67,1% Anatomistas; 97% Primeiranistas),

    enquanto que o grau de escolaridade dos entrevistados demonstrou uma predominncia de

    formao em curso superior e de psgraduao para os Anatomistas (82,3%), enquanto que

    nos Primeiranistas, o predominou o curso mdio (85,5). A maioria dos entrevistados era de

    religio catlica, sendo 68,4% dos Anatomistas, e 66,2% dos Primeiranistas. Quanto ao sexo

    no foram detectadas diferenas nos grupos avaliados.

    Nas tabelas 6 a 9 esto inseridos, em porcentagem, os dados relativos doao de

    corpos para o estudo da Anatomia.

  • Resultados 54

    Tabela 6 Conhecimento sobre doao de corpo entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Voc j ouviu falar sobre doao de corpo para o estudo da Anatomia?

    Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Sim 95,7 77

    No 4,3 23

    Total 100 100

    Tabela 7 Opinio sobre doao do prprio corpo entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos

    durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Voc doaria seu corpo para o estudo da Anatomia?

    Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Sim 34,2 24,9

    No 30,7 28,4

    No tenho opinio formada 35,1 46,7

    Total 100 100

    Tabela 8 Conhecimento dos procedimentos necessrios para a doao de corpo entre os Anatomistas e

    Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Voc conhece quais os procedimentos e documentos necessrios para a doao voluntria de corpo para o Estudo Anatmico?

    Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Sim 31,4 1,3

    No 68,6 98,7

    Total 100 100

  • Resultados 55

    Tabela 9 Realizao dos procedimentos necessrios para a doao de corpo entre os Anatomistas e Primeiranistas - dados obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Voc j realizou os procedimentos (documentos preenchidos, com testemunha, assinados em cartrio e entregues universidade), para que o seu corpo, aps seu falecimento, seja conduzido aos estudos?

    Anatomistas (%) Primeiranistas (%)

    Sim 2,4 0,3

    No 97,6 99,7

    Total 100 100

    Pela anlise da tabela 6, verificou-se que a quase totalidade dos Anatomistas e 3/4 dos

    Primeiranistas j ouviram falar sobre doao de corpos. Quando questionados se doariam

    seus corpos para estudo, o que se observou em ambos os grupos foi um equilbrio entre as

    possveis alternativas, ou seja, cerca de 1/3 para cada uma delas. A grande maioria dos

    participantes, de ambos os grupos, demonstrou no conhecer os procedimentos, nem

    tampouco realizou os procedimentos necessrios para a efetivao da doao.

    Sobre a questo Voc doaria seu corpo para o estudo da Anatomia?, nas tabelas 10 e

    11 encontram-se expressos em porcentagem, os resultados relativos aos motivos pelos quais,

    respectivamente, doariam/ no tenho opinio formada ou no doariam/ no tenho opinio

    formada.

  • Resultados 56

    Tabela 10 Dados da pesquisa sobre os motivos doao/no tenho opinio formada entre os Anatomistas e Primeiranistas - obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Anatomistas Primeiranistas

    Para contribuir para o avano da educao na rea da sade

    47,2 55,9

    Para ajudar o prximo a ser um profissional melhor qualificado

    31,8 28,1

    Conheo a necessidade deste material nos laboratrios de Anatomia

    46,9 24,1

    Sou contra enterro/cremao ou outros

    1,4 1,4

    Serei til mesmo aps o meu falecimento

    22,9 23,5

    Sou sozinho (a)/ no tenho parentes

    0,7 0

    Em agradecimento cincia

    13 11

    Outros 2 2,2

    Entre os Anatomistas, avaliando-se os resultados do primeiro quesito (47,2%),

    possvel inferir que o altrusmo ocupa posio de destaque, reiterado pelo segundo (31,8%) e

    terceiro (46,9%) quesitos, reforado, ainda, pelo resultado do quarto quesito (1,4%), uma vez

    que ser contra enterro/ cremao, no configura motivo para a doao.

    Mesmo tendo sido verificada uma menor porcentagem relativa aos quesitos 2 (28,1%)

    e 3 (24,1%), nota-se que entre os Primeiranistas uma tendncia ao altrusmo, apontada pelo

    quesito 1 (55,9%).

  • Resultados 57

    Tabela 11 Dados da pesquisa sobre os motivos no doao/no tenho opinio formada entre os Anatomistas e Primeiranistas - obtidos durante pesquisa entre outubro de 2010 a fevereiro de 2011

    Anatomistas Primeiranistas

    Familiares no aceitariam

    22,4 23,8

    Despreparo da academia em receber o cadver

    13,7 3,2

    Vergonha em ser reconhecido

    5,9 7,5

    Quero ser enterrado/cremado ou outros

    21,9 33,5

    Motivos religiosos

    5,7 5,9

    Desconhecimento das tcnicas anatmicas de estudo

    1,4 11,3

    Outros 10,4 7,6

    Ao se avaliar os dados da tabela 11, verifica-se que, tanto para os Anatomistas, como

    para os Primeiranistas, os quesitos 1 (22,4%; 23,8%) e 4 (21,9%; 33,5%) so os principais

    fatores que justificam a no doao. Cumpre ressaltar, a baixa porcentagem por motivos

    religiosos.

    5.2 AVALIAO DO CONHECIMENTO E A OPINIO SOBRE A IMPORTNCIA DA DISSECO

    PARA A PRTICA PROFISSIONAL

    Das 1000 correspondncias enviadas, somente 163 retornaram, ou seja, 16,3%.

    Relativamente idade, os mdicos exibiram uma mdia de 51,1 10,7 (variando de 30 a 85

    anos). Destas, 81,6% eram de profissionais do sexo masculino, e 18,4%, do sexo feminino,

    com diferentes especialidades cirrgicas (65,6%) e clnicas (34,4% ).

    Nas tabelas 12 a 14, so considerados aspectos pertinentes Anatomia e disseco.

  • Resultados 58

    Tabela 12 Conhecimento Anatmico e Disseco de Cadveres entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012

    Voc considera o conhecimento

    Anatmico o alicerce para a sua atuao

    profissional?

    Voc considera importante a disseco em cadveres e/ou peas cadavricas para a

    aquisio do conhecimento Anatmico/Cirrgico?

    Sim 97,5 100

    No 2,5 0

    Total 100 100

    Tabela 13 Disseco durante Graduao e Ps Graduao entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa

    entre julho 2012 a outubro 2012

    A disseco de cadveres e/ou peas

    cadavricas constou do currculo da

    disciplina de Anatomia Humana durante

    o seu curso de graduao?

    A prtica da disseco fez parte da sua Ps-graduao (Especializao, Residncia,

    Mestrado, Doutorado...)?

    Sim 96,9 58

    No 3,1 42

    Total 100 100

    Tabela 14 Nmeros de cadveres e a disseco entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho

    2012 a outubro 2012

    O nmero de cadveres e/ou peas cadavricas que voc dissecou, foi

    suficiente para a sua formao profissional?

    A disseco anatmica em cursos preparatrios foi fundamental para a sua formao enquanto

    cirurgio?

    Sim 82,8 87,3

    No 17,8 12,7

    Total 100 100

    Na tabela 12, nota-se que a grande maioria considera o conhecimento Anatmico

    como alicerce para a atuao profissional, bem como a importncia da disseco para a

    aquisio do conhecimento Anatmico.

    Em quase 100% da populao analisada, a disseco caracterizou-se como prtica

    comum nos laboratrios de Anatomia durante a graduao, fato no observado durante os

    cursos de Ps-Graduao (Tabela 13). Quando argidos se o nmero de cadveres dissecados

    foi suficiente, e se a disseco foi fundamental para a formao enquanto cirurgies, a grande

    maioria confirmou positivamente a questo (Tabela 14).

  • Resultados 59

    As respostas sobre a utilizao de material sinttico e de animais para treinamento e

    substituio do material humano, so observadas nas tabelas 15 e 16.

    Tabela 15 Treino de tcnicas manuais em cadveres, materiais sintticos e animais entre os Mdicos - dados obtidos durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012

    Voc treinou suas habilidades manuais de tcnicas cirrgicas

    (novas ou consagradas) previamente em cadveres,

    antes de execut-las em seus pacientes?

    Voc faz uso de materiais sintticos e de tecnologias de

    imagem para obter conhecimento Anatmico e cirrgico, bem como treinar suas habilidades manuais?

    Voc faz uso de animais para obter conhecimento

    Anatmico e cirrgico, bem como treinar suas habilidades

    manuais?

    Sim 60,4 56,2 64,8

    No 39,6 43,8 35,2

    Total 100 100 100

    Tabela 16 Substituio de material cadavrico por animais e sintticos entre os Mdicos - dados obtidos

    durante pesquisa entre julho 2012 a outubro 2012

    Voc acredita que a prtica em animais (como ces, porcos, etc.), retrata bem os aspectos relativos Anatomia/|Cirurgia, podendo

    estes substituir os cadveres humanos?

    Voc acredita que o corpo humano ou partes dele reproduzidos em materiais sintticos

    (bonecos, membros, vsceras, etc.) e tecnologias de imagem (ultrassom, ressonncia magntica, tomografia computadorizada, etc.), retratam bem a Anatomia Humana, podendo

    substituir os cadveres humanos?

    Sim 12,4 8,6

    No 82,1 78,5

    No tenho opinio formada

    5,6 12,9

    Total 100 100

    Em linhas gerais, quando se analisa os dados da tabela 15, cerca de 2/3 da populao

    analisada treinaram as habilidades manuais em cadveres humanos e animais, enquanto

    56,2% se utilizaram de materiais sintticos.

    Como demonstrado na tabela 16, a maior parte dos entrevistados afirmou que no

    possvel a substituio do material humano por animais, tampouco por materiais sintticos.

    Os dados referentes ao questionrio disponibilizado via online por um perodo de 30

    dias e respondido por 845 indivduos, contendo trs perguntas sobre a opinio da populao

  • Resultados 60

    geral frente confiana no profissional cirurgio, esto expressos em porcentagem na tabela

    17.

    Tabela 17 Confiana da populao frente a formao do mdico - dados obtidos durante pesquisa entre dezembro 2012 a janeiro 2013

    Supondo que voc ou um ente querido necessite realizar uma

    cirurgia, voc confiaria no mdico cirurgio se o mesmo

    afirmasse que no estudou atravs de cadveres, mas

    apenas em bonecos plsticos?

    Supondo que voc ou um ente querido necessite realizar uma

    cirurgia, voc confiaria no mdico cirurgio se o mesmo

    afirmasse que no estudou atravs de cadveres, mas

    apenas em animais?

    Supondo que voc ou um ente querido necessite realizar uma

    cirurgia, voc confiaria no mdico cirurgio se o mesmo

    afirmasse que no estudou atravs de cadveres

    humanos?

    Sim 8,5 8,9 96,1

    No 91,5 91,1 3,9

    Total 100 100 100

    Os resultados no deixam dvidas que, para a grande maioria da sociedade (96,1%), a

    confiana no mdico cirurgio est intimamente associada ao estudo do profissional em

    cadveres humanos.

    5.3 ELABORAO DO PROGRAMA DE DOAO VOLUNTRIA DE CORPOS PARA ESTUDO

    ANATMICO (pdvcea)

    Sobre as leis que regem a destinao de corpos para estudo em Anatomia Humana,

    encontra-se em vigor desde 1992 a lei 8501/92, que prev a destinao de cadveres de

    indigentes. Em 2002 foi aprovado o artigo 14 da lei 10406/2002 (Anexo D) do Cdigo Civil

    Brasileiro, que afirma ser vlida, com objetivo cientfico ou altrustico, a disposio gratuita

    do prprio corpo, no todo ou em parte para depois da morte. O ato de disposio pode ser

    livremente revogado a qualquer tempo. Com a criao da mesma, tornou-se vivel a doao

    voluntria de corpo para estudos no Brasil, ato sacramentado desde 1968 em diversos

    centros de ensino dos Estados Unidos.

    Como consequncia da melhoria da qualidade de vida de nossa populao e,

    principalmente, da evoluo dos meios de comunicao atravs de telefones mveis,

    internet, sites de relacionamento, o fluxo de cadveres advindos do SVOC/SP tem diminudo

  • Resultados 61

    substancialmente a cada ano, o que compromete diretamente a qualidade do ensino da

    Anatomia Humana. Tal fato, detectado h tempos, j havia sido observada anteriormente nos

    EUA, que procuraram sanar o problema poca, com a criao de campanhas de doao

    voluntria.

    Atreladas lei 10406/2002, as Universidades Federais de Minas Gerais (UFMG) e de

    Cincias e Sade de Porto Alegre (UFCSPA), criaram oficialmente um Programa Voluntria de

    Doao de Corpos para Estudo Anatmico, adaptando-o s normas vigentes em seus

    respectivos municpios.

    A criao do pdvcea- do DA- ICB/US