Gilberto Hockman- A Era Do Saneamento

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ilberto Hochman articula poder e política(s) Gde saúde de modo a fazer ressaltar a trama incerta de interdependências, alianças e conflitos entre Estado Nacional, oligarquias e grupos pro- fissionais, na formação das políticas de saúde no Brasil. Sua análise é ambiciosa e hábil. Por sua re- levância e superior qualidade, A era do saneamento compara-se aos melhores trabalhos internacionais no campo da sociologia histórica da saúde. — L UIZ A. DE C ASTRO S ANTOS Instituto de Medicina Social, Uerj GILBERTO HOCMAN A ERA DO SANEAMENTO GILBERTO HOCMAN A ERA DO SANEAMENTO HUCITEC EDITORA HUCITEC EDITORA PARA VOCÊ LER E RELER 4 0 1971 2011 ISBN: 978-85-7970-116-0 3.ª edição Gilberto Hochman nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 1960. Bacharel em Administração Pú- blica pela Ebap/FGV, é mestre e doutor em Ciência Política pelo Iuperj. Ganhou o Prêmio José Al- bertino Rodrigues na categoria de melhor tese de doutorado em ciências sociais (1997), concedido pela Associação Nacional de Pós- Graduação e Pesquisa em Ciên- cias Sociais-Anpocs. Desde 1987 é pesquisador e professor da Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Os- waldo Cruz, tendo sido também Coordenador de Pesquisa e Coor- denador do Programa de Pós-Gra- duação. É autor de inúmeros capí- tulos e artigos sobre instituições, atores e políticas públicas, e sobre ciência e saúde no pensamento social e político brasileiro. É co- -organizador das coletâneas Cui- dar, Controlar, Curar (2004) e de Políticas Públicas no Brasil (2007). O livro de Gilberto Hochman nos oferece um belo exemplo da pos- sibilidade de combinar pesquisa histórica e raciocínio teórico socio- lógico. Enquanto alguns autores voltaram nos anos recentes a dis- putar se a miséria é da história ou da teoria, ele aposta antes na ri- queza de explorar ambas perspec- tivas. Assim, ao mesmo tempo que nos esclarece sobre um pro- cesso singular que é a implantação de uma política nacional de saúde no Brasil da Primeira República, Hochman sugere uma interpreta- ção teórica original e estimulante. Partindo do modelo proposto por De Swaan para explicar a cole- tivização de saúde, educação e pre- vidência social na Europa Ociden- tal, A era do saneamento avança na discussão sobre a interação entre ideias e interesses na vida da so- ciedade em geral e da brasileira em particular. O leitor descobrirá logo que para o autor estudar o sa- nitarismo é não apenas compreen- der a dimensão mais expressiva de uma ideologia profissional, mas uma maneira rica de trazer novas luzes sobre o processo de constitui- ção do Estado-nação no Brasil. — ELISA PEREIRA REIS PPGSA/UFRJ Projeto de capa: Yvonne Sarué 0 5 25 75 95 100 0 5 25 75 95 100 0 5 25 75 95 100 0 5 25 75 95 100 Capa Hochman 3 ed_for web quinta-feira, 8 de mar o de 2012 14:54:49

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ilberto Hochman articula poder e política(s) Gde saúde de modo a fazer ressaltar a trama incerta de interdependências, alianças e conflitos entre Estado Nacional, oligarquias e grupos pro-fissionais, na formação das políticas de saúde no Brasil. Sua análise é ambiciosa e hábil. Por sua re-levância e superior qualidade, A era do saneamento compara-se aos melhores trabalhos internacionais no campo da sociologia histórica da saúde.

— LUIZ A. DE CASTRO SANTOSInstituto de Medicina Social, Uerj

GILBERTO HOCMAN

A ERA DO

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HUCITEC EDITORA

HUCITEC EDITORAPARA VOCÊ LER E RELER

401971 2011

ISBN: 978-85-7970-116-0

3.ª ediçãoGilberto Hochman nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 1960. Bacharel em Administração Pú-blica pela Ebap/FGV, é mestre e doutor em Ciência Política pelo Iuperj. Ganhou o Prêmio José Al-bertino Rodrigues na categoria de melhor tese de doutorado em ciências sociais (1997), concedido pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciên-cias Sociais-Anpocs. Desde 1987 é pesquisador e professor da Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Os-waldo Cruz, tendo sido também Coordenador de Pesquisa e Coor-denador do Programa de Pós-Gra-duação. É autor de inúmeros capí-tulos e artigos sobre instituições, atores e políticas públicas, e sobre ciência e saúde no pensamento social e político brasileiro. É co- -organizador das coletâneas Cui-

dar, Controlar, Curar (2004) e de Políticas Públicas no Brasil (2007).

O livro de Gilberto Hochman nos oferece um belo exemplo da pos-sibilidade de combinar pesquisa histórica e raciocínio teórico socio-lógico. Enquanto alguns autores voltaram nos anos recentes a dis-putar se a miséria é da história ou da teoria, ele aposta antes na ri-queza de explorar ambas perspec-tivas. Assim, ao mesmo tempo que nos esclarece sobre um pro-cesso singular que é a implantação de uma política nacional de saúde no Brasil da Primeira República, Hochman sugere uma interpreta-ção teórica original e estimulante.

Partindo do modelo proposto por De Swaan para explicar a cole-tivização de saúde, educação e pre-vidência social na Europa Ociden-tal, A era do saneamento avança na discussão sobre a interação entre ideias e interesses na vida da so-ciedade em geral e da brasileira em particular. O leitor descobrirá logo que para o autor estudar o sa-nitarismo é não apenas compreen-der a dimensão mais expressiva de uma ideologia profissional, mas uma maneira rica de trazer novas luzes sobre o processo de constitui-ção do Estado-nação no Brasil.

— ELISA PEREIRA REIS PPGSA/UFRJ

Projeto de capa: Yvonne Sarué

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A ERA DOSANEAMENTOAs bases da políticade Saúde Pública

no Brasil

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TERCEIRA EDIÇÃO

GILBERTO HOCHMAN

HUCITEC EDITORASão Paulo, 2012

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© Direitos autorais, 2011, deGilberto Hochman.

Direitos de publicação reservados porHucitec Editora Ltda.,

Rua Gulnar, 23 – 05796-050 São Paulo, BrasilTelefone (55 11 5093-0856)www.huciteceditora.com.br

[email protected]

Depósito Legal efetuado.

Coordenação editorialMARIANA NADA

Assessoria editorialMARIANGEL A G IANNELLA

CirculaçãoSOLANGE ELSTER

Foto da primeira capa:Inauguração do trecho aberto do rio Sarapuhy, entre Mesquita e Engenheiro Neiva(Nova Iguaçu), Estado do Rio de Janeiro. Departamento de Saneamento e ProfilaxiaRural, 8-1-1922. Acervo Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Oswaldo Cruz.

Foto da última capa:Serviço do Profilaxia Rural, Subposto de Itacuruçá, Estado do Rio de Janeiro,

1919? Acervo Casa de Oswaldo Cruz/Fundação Oswaldo Cruz

A primeira edição deste livro (1998) foi feita em co-edição com aAssociação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs)

CIP-Brasil. Catalogação-na-FonteSindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

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Por todas e quaisquer razõeseste livro é dedicado aos meus pais

Samuel e Clara.

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SUMÁRIO

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Apresentação

Introdução

Capítulo 1Quando a saúde se torna pública: formação do Estado e polí-ticas de saúde no Brasil1. Introdução2. Aspectos teóricos e metodológicos3. Argumento geral, estratégia de análise e estrutura do livro.3.1. Argumento3.2. Análise3.3. Estrutura do livro

Capítulo 2O micróbio da doença e o poder público: o movimento sanita-rista brasileiro e o surgimento de uma consciência da inter-dependência1. Introdução2. A sociabilidade da doença: externalidades, consciência e co-munidade3. Brasil = Sertões + Hospital: A equação do movimento pelareforma sanitária na Primeira República3.1. Apresentação

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3.2. Doença e abandono: um diagnóstico dos males do Brasil3.3. Federação, doença e ausência: uma interpretação sobre o Brasil4. A doença que pega questiona os limites do Poder Público5. Considerações finais

Capítulo 3A reforma da saúde pública ou quem deve ser o responsável pela

“doença que pega”?

1. Introdução2. A responsabilidade governamental em saúde pública e sanea-mento nas primeiras décadas da República3. A reforma dos serviços de saúde pública na agenda nacional:propostas, crises sanitárias e decisões3.1. Repercussão pública da campanha pelo saneamento3.2. Propostas, debates e decisões I — Os círculos profissionais3.3. Propostas, debates e decisões II — O Legislativo federal3.4. Um interregno trágico e uma ameaça permanente: a auto-ridade pública sob o impacto das epidemias3.5. Propostas, debates e decisões III — Depois da epidemia4. Considerações finais

Capítulo 4Sobre o encontro da consciência com o interesse: uma política pú-blica e nacional de saúde1. Introdução2. O poder central como solução dos problemas sanitários2.1. Sobre ineptos e incautos ou o perigo mora ao lado2.2. Sobre os benefícios e os custos da coletivização: uma inter-pretação3. Dos custos, das oportunidades e das regras: o saneamentorural como política nacional de saúde pública3.1. Os benefícios do poder central, a regra de adesão e os cus-tos tangíveis da estatização3.2. A reforma sanitária: benefícios do Estado, custos externose custos do Estado

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4. A reforma da saúde pública em marcha: indicadores e im-pactos4.1. A adesão dos estados e a adição de atribuições4.2. Preenchendo o mapa do Brasil: a dilatação do Poder Público4.3. Os benefícios do custeio e custo dos benefícios5. Nos estados ou dos estados? Constituição de autoridade e aredistribuição de responsabilidades6. Considerações finais

Capítulo 5À exceção de São Paulo: autonomia política, interdependênciasanitária1. Introdução2. Políticas de saúde pública em São Paulo uma breve exposição3. A excepcionalidade paulista: da constatação ao problema4. A excepcionalidade paulista como interpretação4.1. Cada um que cuide de si: uma proposta paulista para a saúdedo Brasil4.2. São Paulo cuida de si e dos outros: a internalização dos custosda interdependência4.3. São Paulo cuida de si e o Governo Federal dos outros: uma po-lítica viável de saúde pública5. Considerações finais

Capítulo 6Considerações gerais

Bibliografia e fontes1. Arquivos Privados e Institucionais2. Periódicos3. Legislação e Anais4. Documentos, textos e relatórios Brasileiros do período1890-19405. Referências bibliográficas

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APRESENTAÇÃO

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S ob que condições os pobres, os destituídos, os doentes, os iletrados e asvítimas em geral da adversidade e do infortúnio passam a ser objeto deproteção pública? Como se dá, em termos históricos e analíticos, o processo

de “coletivização da proteção a destituição humana”? Perguntas graves, comcerteza. Mais do que isso, talvez: perguntas que sugerem um certo desencontrocom os tempos que correm, marcados pelo predomínio de políticas e de concepçõesque parecem decorrer de perguntas simetricamente opostas. Para falarmos nostermos de Karl Polanyi, a “religião do mercado”, assumida como imperativocategórico da modernidade, está a indicar o trajeto oposto e as perguntas quedele decorrem: sob que condições a adversidade e o infortúnio podem/devemdeixar de ser percebidos como efeitos de processos de geração de males públicos?Como se dá – deve dar – o processo de “comodificação” (com o perdão de Esping--Andersen. . .) da proteção social? Mas, seria um equívoco supor que A era dosaneamento permanece nos limites de um belo e competente exercício de história,devotado a exibir um contraste: o da combinação entre consciência da necessidadepública de um sistema nacional e coletivizado de saúde e um conjunto de interes-ses específicos com os valores e as políticas vinculados ã naturalização do mercado.Se esse fosse o limite do trabalho de Gilberto Hochman, já estaríamos, comcerteza, saciados. Alas não é esse o caso. O que está em jogo é mais do que isso.

A era do saneamento pretende demonstrar a centralidade assumida pe-las políticas de saúde e saneamento, no Brasil da Primeira República, no proces-so de construção do Estado Nacional. Em termos mais diretos, aquelas políticassão apresentadas como cruciais para o alargamento da presença do Estado na so-ciedade e no território brasileiros. Trata-se de, portanto, indicar a complexidade

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da esfera pública e estatal no Brasil oligárquico. Por esse caminho, o livro de Gil-berto Hochman pode ser lido, ainda, como um corajoso e brilhante experimentoanalítico que indica o tema da complexidade do Brasil anterior a 1930. A ex-periência política e institucional da Primeira República brasileira é percebida,não raro até hoje, como uma espécie de hiato na formação do Estado Nacional.Tanto o universo da política imperial, como o da vida política posterior a 1930são tidos como legíveis a partir da perspectiva estratégica da construção doEstado. O domínio parentético da República Velha segue desinteressante: elenão passaria de abrigo de uma ordem política tida como simples – já que tra-duz no plano político as hierarquias do predomínio social e regional – e comohospedeira preferencial do folclore coronelista e da truculência oligárquica.

Através de um ângulo específico, porém decisivo, Gilberto Hochman nospersuade que a transformação da saúde em um bem público interage de maneiraintensa com a constituição de uma comunidade nacional e com o próprio forta-lecimento da esfera pública e estatal. A escolha desse ponto de observação é umdos pontos brilhantes da análise: dados os padrões de complexidade e interde-pendência social crescentes, o fenômeno da doença transmissível e da insalubri-dade é um objeto privilegiado para tratar das relações entre público e privadoe entre poder local e poder central. O que se está indicando é, em termos maisdiretos, a presença de uma tradição republicana, anterior mesmo a 1930, queassocia consciência, valores e interesses no processo de geração de bens públicos ede políticas de combate à destituição. Mesmo em um oceano de oligarcas cíni-cos, foi possível, graças ao esforço de persuasão do movimento sanitarista bra-sileiro, perceber o país como um “imenso hospital”, cuja letalidade é funçãodireta da ausência de poder público.

Mas, a meu juízo, aqui fica registrado o mérito principal desse livro: ode nos sugerir o quanto que nossa experiência civilizatória recente, e desde asduas décadas que antecedem a Revolução de 1930, está marcada pela capaci-dade de integração promovida por políticas sociais públicas e nacionais. Comtodos os problemas contidos nessa tradição, trata-se de um legado que parecenão estar à altura da perspectiva contábil e da mercadofilia dos reformadorescontemporâneos.

— RENATO LESSA

Professor titular da UFF.

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INTRODUÇÃODESTA TERCEIRA EDIÇÃO

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A primeira edição deste livro (1998) foi resultado do Prêmio JoséAlbertino Rodrigues concedido pela Anpocs à melhor tesede doutorado em ciências sociais no ano de 1996. Ganhou uma

nova edição em 2006 que rapidamente se esgotou. Ao longo de umadécada A era do saneamento ingressou e circulou em diferentes circuitosacadêmicos tais como as ciências sociais, a história, a saúde coletiva, aeducação e a engenharia ambiental. Tenho consciência de que este livro,associado a outros trabalhos publicados no mesmo período, consolidouuma interpretação original sobre as relações entre políticas de saúde eformação do Estado no Brasil e forneceu pistas e atalhos para uma produ-ção crescente na área de ciências sociais e da saúde coletiva. Inúmerasleituras têm sido feitas dos argumentos centrais do livro, algumas surpre-endentes e diversas do que originalmente pensei. Como filhos em umdado momento da vida, livros seguem caminhos independentes do autor.Ao apresentar uma nova edição a novos leitores alerto que poucas modi-ficações foram feitas no texto. Sua ampla e positiva recepção e inúmerascitações indicam que sua base teórica e empírica resistiu, e sua interpre-tação continua ajudando a reflexão sobre políticas públicas, história dasaúde e pensamento social no Brasil. O livro reeditado, como todo traba-lho acadêmico, precisa ser continuamente desafiado. Meus próprios arti-gos e capítulos de livros posteriores têm reelaborado visões e perspectivasnele contidos. Reeditar esse livro em 2011 é renovar meus compromissosintelectuais de cientista social com a saúde da população brasileira e con-tinuar refletindo e debatendo sobre seu passado e futuro

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Se o livro continua essencialmente o mesmo, a vida do autor mu-dou muito. Não só intelectualmente. John Lennon cantou que “a vida éaquilo que acontece enquanto fazíamos outras coisas”. E a vida foi acon-tecendo enquanto pessoas liam esse trabalho. Novos e outros amigos (al-guns por meio do contato com esta obra), novos desafios pessoais e inte-lectuais, alegrias renovadas, algumas tristezas e uma nova e intensa vidaamorosa e familiar. Minha mãe, Clara Cohen Hochman, educadora sa-nitária e a quem dediquei o livro nos deixou em 2010. Saudades eu tereisempre e esse livro continua sendo em homenagem a ela e ao meu paiSamuel. E por fim, e o mais importante, essa primeira década do séculoXXI foi atravessada de mãos dadas com minha adorável Simone Kropf ecom nossa filha Ana Clara. Nada seria possível sem o afeto e amor deSimone e Aninha.

Como o passado enferruja porém não se apaga retomo aqui parteda introdução escrita em junho de 1998, ainda no final do século XX.Este livro é uma versão revista de minha tese de doutorado em CiênciaPolítica apresentada ao Iuperj em dezembro de 1996. É um estudo sobrea formação de políticas públicas e nacionais de saúde e o seu foco princi-pal são as políticas de saneamento rural no Brasil das duas últimas déca-das da Primeira República. Nesse período, que denomino de a era dosaneamento, a saúde pública, envolvida numa ideologia de cunho marca-damente nacionalista, foi alçada ao topo da agenda política nacional. Desselugar privilegiado foram lançadas as bases de uma política estatal de saúdee saneamento de amplitude nacional. Os anos 20 ofereceram oportunida-des políticas únicas para uma reforma sanitária ampla. Elas não se repe-tiriam na história brasileira. Este é um trabalho sobre essas oportuni-dades, sobre essa reforma, sobre alguns de seus sucessos e fracassos. Apergunta que o orienta é quando, por que e como a saúde se torna pública?

O objetivo é mostrar que as políticas de saúde e de saneamentotiveram um papel importante no incremento substancial da penetraçãodo Estado na sociedade e no território do país. Enquanto um estudosobre a coletivização da proteção à destituição humana, ou sobre a gênesede políticas sociais, o livro indica que esse processo depende da formapela qual as elites enfrentaram os dilemas e impasses gerados pelainterdependência social. A interpretação apresentada é que, primeiro, as

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políticas de proteção social emergem a partir de uma articulação entreconsciência social das elites e seus interesses materiais a partir de oportu-nidades por elas vislumbradas com a coletivização do bem-estar. Segun-do, o formato organizacional e os conteúdos substantivos dessas políticassão objetos de cálculo e barganha em torno dos custos e benefícios daestatização vis-à-vis os custos impostos pela interdependência social. Umdos principais atores na conformação das políticas nacionais de saúde esaneamento foi, justamente, aquele que desenvolveu uma política sanitá-ria autônoma porém interdependente em relação aos resultados das açõesdos demais estados e do Governo Federal: o estado de São Paulo.

Uma política nacional de saúde pública no Brasil foi possível e viá-vel a partir do encontro da consciência das elites com seus interesses, esuas bases foram estabelecidas a partir de uma negociação entre os estadose o poder central, tendo o federalismo como moldura político-institucional.Esse encontro foi promovido pelo movimento sanitarista brasileiro quebuscou redefinir, entre 1910 e 1920, as fronteiras entre os sertões e o litoral,entre o interior e as cidades, entre o Brasil rural e o urbano em função doque consideravam o principal problema nacional: a saúde pública. Essemovimento divulgou exaustivamente uma definição essencialmente polí-tica desses limites: os sertões dos médicos-higienistas caracterizavam-se pelaconcomitante ausência de poder público e onipresença das doenças que pegam,em especial das chamadas grandes endemias rurais. Por meio de umaintensa campanha de opinião pública, o movimento pelo saneamentorural buscou convencer as elites políticas de que esses sertões, ausência edoença, estavam mais próximos e eram mais ameaçadores do que elasimaginavam. Afinal, como advertiu Afrânio Peixoto, os sertões do Brasilcomeçavam no final da avenida Central. Tão perto, ainda que tão longe.

Gostaria de agradecer às instituições e pessoas que deram apoio aomeu trabalho de tese e a publicação deste livro.

Em primeiro lugar, agradeço à Casa de Oswaldo Cruz, unidade daFundação Oswaldo Cruz na qual trabalho desde 1987 e onde a pesqui-sa de minha tese foi realizada. Liberdade intelectual, condições de traba-lho e suporte ao meu projeto de pesquisa nunca me faltaram. Agradeçoaos pesquisadores, bibliotecárias, staff administrativo e à diretoria peloambiente criativo e desafiador que tem caracterizado a COC.

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Muito mais do que colegas de trabalho, Nísia V. Trindade Lima,Cristina M. Oliveira Fonseca, Marcos Chor Maio e Maria Rachel F.da Fonseca foram os amigos queridos, generosos e incondicionais queme incentivaram e apoiaram afetiva e intelectualmente. Nísia, em es-pecial, foi a parceira intelectual mais constante nestes últimos anos. Par-te deste trabalho resultou de nossas conversas e esforços de produçãoacadêmica. Com Cristina participei de projetos e discussões que gera-ram muitas das questões deste livro. Marcos foi um interlocutor perma-nente e fraterno. A Nísia, Cris, Marcos e Rachel os meus agradecimen-tos. De coração.

Credito ao Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro aminha formação intelectual e identidade profissional. Em poucas pala-vras, se sou um cientista social devo isso ao Iuperj. Agradeço aos profes-sores, bibliotecárias, funcionários e alunos pelo intenso convívio intelec-tual e pessoal de mais de uma década.

No desenvolvimento de minha tese de doutorado tive o privilégiode contar com a orientação da professora Elisa Pereira Reis. Parte im-portante de meu curso de doutorado foi realizado por meio de conversase discussões que tive com minha orientadora em torno dos meus papers,projetos e capítulos de tese. A professora Elisa ajudou a transformar meuinteresse geral por políticas de saúde pública em uma questão analíticacom estratégias de pesquisa e de argumentação mais definidas. Com rigorteórico, objetividade, espírito crítico, respeito intelectual e sem imposi-ções, Elisa apontou-me caminhos, balizou escolhas e apoiou minhas deci-sões. Por tudo isso, registro aqui o meu reconhecimento e o meu especialagradecimento.

Em 1992, os professores Maria Regina Soares de Lima e RenatoR. Boschi ministraram um excelente curso sobre política social no Iuperj,no qual tive a oportunidade de ler trabalhos e discutir questões aquipresentes. O trabalho de final de curso foi o primeiro esforço de sis-tematização das ideias desenvolvidas na tese e acabou sendo publicadona revista Estudos Históricos, n.o 11, 1993. A minha tese e este livro fo-ram imensamente beneficiados pelos comentários, pelas sugestões e peloapoio de Maria Regina e de Renato. A Regina e a Renato o meu muitís-simo obrigado.

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Sou grato aos demais membros da banca examinadora da tese, pro-fessores Luiz Antônio de Castro Santos, Argelina Cheibub Figueiredo eFabiano Guilherme Mendes Santos, pelas críticas e pelos comentáriosque foram incorporados neste livro. Luiz Antônio, sempre aberto ao diá-logo, fez sugestões fundamentais ao meu trabalho ainda em sua fase pre-liminar e me incentivou a realizá-lo. Seus artigos e sua tese formam oconjunto obrigatório de leituras para aqueles que, como eu, se aventuramno estudo da gênese e do desenvolvimento das políticas de saúde noBrasil. Fabiano, além de um interlocutor frequente nestes últimos anos,reapresentou-me, em um momento decisivo, autores indispensáveis quejá tinham sido por mim sepultados em anotações amareladas de um cursode teoria política. De Argelina tive todo apoio e o entusiasmo pelo meutrabalho. Por tudo isso agradeço, muito, a Luiz Antônio, Argelina e Fabito.

Gostaria de registrar o meu reconhecimento àquele que, desde omeu ingresso no Iuperj como aluno do mestrado, influenciou e marcou aminha formação intelectual e a minha trajetória profissional: WanderleyGuilherme dos Santos, professor.

O Departamento de Sociologia do Boston College recebeu-mecomo pesquisador visitante durante o ano de 1994 e forneceu-me todosos recursos e facilidades para que eu tivesse tranquilidade para ler, pesquisare escrever. Nada me faltou. Diante de tamanho desafio profissional aca-bei me sentindo como se estivesse em casa. Foi um dos anos mais felizese produtivos de minha vida. Devo isso ao profissionalismo e à generosi-dade do professor John B. Williamson, que tão bem me recebeu e comquem tive o privilégio de trabalhar. Contei, também, com o auxílio ines-timável de Brodwyn M. Fischer tanto na minha chegada e instalação emmeio a um terrível inverno bostoniano, como no acesso a bibliotecas e ainformações importantes. Sou grato a John, Brodie e aos membros doDepartamento de Sociologia do BC.

Agradeço à CAPES e ao CNPq pelos auxílios financeiros que re-cebi no Brasil e nos Estados Unidos e à Anpocas pelo reconhecimentoao meu trabalho e pela oportunidade de divulgá-lo por meio de sua pu-blicação. Tema Pechman (in memoriam) tornou a tese inteligível. Igual-mente eficiente foi a revisão dos originais do livro realizada por LuizAntônio Aguiar e Marisa Sobral. Obrigado.

Agradeço o apoio incondicional, a ajuda inestimável e o afeto ili-mitado de duas amigas muitíssimo queridas, Wilma Mangabeira e HelenaBomeny. A Paulo Wrobel e a Christopher J. Ballantyne, amigos próxi-mos. Rogério Hochman, meu irmão, tem sido uma intensa e afetiva pre-sença em minha vida, enquanto Marcia Sobral me apoiou e me acompa-nhou durante a realização da tese que se transformou neste livro.