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GESTÃO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS E AS REPERCUSSÕES PARA O
TRABALHO DOCENTE
Alda Maria Duarte Araújo Castro1
A discussão acerca da gestão das políticas educacionais na atualidade e a
forma como as elas têm influenciado e modificado o trabalho docente não pode ser
realizada de forma descontextualizada. Os estudos mostram que a política educacional
brasileira, na sua evolução, tem-se articulado com o modelo econômico vigente em cada
época fato esse que tem repercutido nos sistemas educacionais e, consequentemente, nas
formas de organização escolar. Neste capítulo, parte-se do pressuposto de que as
organizações educacionais são conduzidas e orientadas por um processo que se
consubstancia em um determinado momento histórico e contemplam vários elementos,
por vezes, contraditórios, mas que, de modo geral, respondem ao ritmo e à direção
impostos pelo processo produtivo. Na atualidade, esse cenário tem sido influenciado por
diferentes fatores, entre eles, os processos de globalização, da reestruturação produtiva e
do desenvolvimento das tecnologias da comunicação e da informação.
O texto discute, em primeiro plano, o redimensionamento do papel do estado,
enquanto instituição responsável pela organização da sociedade em todas as suas
dimensões, evidenciando o modelo de gestão gerencial adotado na atualidade para a
condução das políticas sociais; em segundo plano, o texto aborda a incorporação das
diretrizes gerenciais na política educacional brasileira, ressaltando os principais
programas implementados a partir da década de 1990, com características do modelo
gerencial. Por fim, analisa as repercussões que o modelo gerencial traz para o o trabalho
docente, acentuando características da intensificação, da precarização e da flexibilização
do trabalho.
1 Professora Doutora do Departamento de Fundamentos e Política Educacional do Centro de Educação eCoordenadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande doNorte.
Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade
EdUECE - Livro 401005
1. O papel do Estado na condução das atuais políticas públicas: A gestão
gerencial em foco
No atual debate sobre o processo de globalização na sociedade contemporânea,
emerge uma discussão que busca caracterizar a complexa relação existente entre as
transformações econômicas, sociais, culturais e políticas ocorridas em âmbito mundial e
seus desdobramentos no plano da educação em todos os seus níveis. A ideia de
globalização, eventualmente também denominada de mundialização, vem tornando-se
uma evidência axiomática, já que é considerada, via de regra, um processo político
hegemônico e que não pode ser revertido. Para essa defesa, têm contribuído,
substancialmente, o desenvolvimento das tecnologias e da informação em nível global,
modificando as relações de afiliação, de identidade e interação dentro e através dos
cenários culturais locais.
A readequação das sociedades contemporâneas às novas exigências do mundo
globalizado e a opção política pelo ideário neoliberal de reorganização do estado
impuseram a adoção de reformas que implicaram a reestruturação do Estado e a
redefinição de seu papel em relação ao mercado, às políticas sociais, bem como
alteraram a lógica até então prevalecente na administração pública, no sentido de
articular um novo padrão das relações público-privado tomando como referência os
critérios de mercado.
No que se refere ao papel do estado é válido demarcar que, ao longo da sua
evolução histórica, o estado Liberal tem sofrido transformações e assumido diferentes
funções, isso porque o Estado não é um ente monolítico, mas, uma organização que
existe em função de prioridades e interesses de grupos sociais que compõem a
sociedade. O Estado capitalista exerce um papel organizativo, na medida em que
representa e materializa os interesses de classe e da acumulação do capital, sem,
contudo, aparentar compromissos com interesses particulares, tampouco com grupos
específicos, deixando transparecer uma noção de neutralidade. Sua função, portanto,
vem se modificando articulada às necessidades do capital, ora desempenhando um papel
de interventor, ora se retraindo para uma função mais controladora e avaliadora do que
executora. Em quaisquer circunstâncias, é importante entender que o estado permanece
como categoria analítica para uma melhor compreensão das políticas educacionais.
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EdUECE - Livro 401006
Na atualidade, o papel do estado baseado em uma ideologia neoliberal, de corte
nos gastos sociais e na redução do seu papel adota uma posição mais privatista e uma
concepção gerencial na organização do aparelho administrativo do estado, que passa a
desempenhar a função de coordenar, controlar e avaliar as políticas públicas, em
detrimento de seu papel de executor. Nesse sentido, o Estado – enquanto instituição
responsável pelo controle e pela regulamentação das políticas públicas – deverá assumir
um novo perfil: tornar-se uma instituição mais ágil, mais enxuta e flexível no
gerenciamento das políticas públicas, voltada, essencialmente, para promover o
desenvolvimento econômico. Para isso, se faz necessário utilizar mais o controle do
mercado do que os administrativos reforçando assim, a ideia de que era preciso reformar
o contexto institucional, melhorar a qualidade da administração, o sistema judicial e
político. Essas reformas visavam reformar a legislação, a administração pública e a
estrutura do governo central para imprimir maior governabilidade ao Estado.
O modelo gerencial para o serviço público foi importado da iniciativa privada e
a Grã-Bretanha pode ser considerada o laboratório das técnicas gerenciais aplicadas ao
setor público. Esse novo modelo de administração caracterizado pela busca da
eficiência, da qualidade, da produtividade, da avaliação de desempenho, pela
flexibilidade gerencial e pelo planejamento estratégico, vem configurar a nova gestão
pública. Exigem-se dos gerentes habilidades e criatividade para encontrar novas
soluções, sobretudo para aumentar a eficiência, utilizando, (entre outras estratégias), a
avaliação do desempenho. Há preocupação, portanto, com o produto em detrimento dos
processos.
Na visão de Gete (2001), a Nova Gestão Pública não é um conjunto sistemático
e ordenado de propostas que deve ser utilizado de acordo com problemas específicos ou
com os objetivos a serem alcançados; ela atuaria sobretudo como um depósito de
orientações, métodos e técnicas. Algumas características permitem uma melhor
compreensão da reforma gerencial, tais como: a) a descentralização/desconcentração
das atividades centrais para as unidades subnacionais; b) a separação dos órgãos
formuladores e executores de políticas públicas; c) o controle gerencial das agências
autônomas, que passa a ser realizado levando em consideração quatro tipos de controle:
controle dos resultados, a partir de indicadores de desempenhos estabelecidos nos
contratos de gestão, controle contábil de custos, controle por quase-mercados ou
competição administrada, e controle social; d) a distinção de dois tipos de unidades
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descentralizadas ou desconcentradas: as agências que realizam atividades exclusivas do
estado, e os serviços sociais e científicos de caráter competitivo; e) a terceirização dos
serviços; f) e o fortalecimento da alta burocracia.
Segundo Gete (2001), a gestão gerencial trouxe uma nova visão dos usuários
do serviço público, o que significa uma mudança radical nas orientações desses
serviços, ou a ideia de que o cliente não é alguém sobre quem se exerce um determinado
poder; pelo contrário, é alguém a quem se serve. Assim, a mudança do conceito de
usuário para o conceito de cliente significa converter o serviço público em serviço ao
público. Dessa forma, cada cidadão pode transmitir sua própria visão da prestação dos
serviços que recebe, de sua utilidade e sua preferência. A autora questiona essa visão
pelas suas conotações instrumentais e mercantis.
Analisando as características da Nova Gestão Pública, Lima (2002) entende
que ela se apresenta, de modo geral, como politicamente neutra, privilegia a lógica de
ações do tipo empresarial, as quais promovem o privado como política pública e
subordinam a educação a objetivos econômicos, de empregabilidade, produtividade e
competitividade, por meio dos discursos de qualidade e da excelência. Esse também é o
entendimento de Gete (2001) para quem essa neutralidade é baseada no pressuposto de
que a sua hegemonia, sua ampla difusão deve-se à sua capacidade de responder aos
dilemas do mundo atual. Essa é uma visão asséptica e técnica; na verdade, a adoção do
novo modelo de gestão pública está associada a uma inspiração do pensamento
neoliberal com vistas à redimensão do papel do estado nos serviços públicos.
No entanto, o Documento do Centro Latino-Americano para o
Desenvolvimento - CLAD (1998), ao discutir sobre a necessidade de uma mudança na
gestão dos serviços públicos na América Latina, apresenta o modelo gerencial como
altamente positivo, ressaltando as inúmeras possibilidade de formas de
responsabilização que ele permite, destacando: a) a responsabilização pelos controles
clássicos; b) a responsabilização pelo controle parlamentar; c) a responsabilização pelo
controle social; d) a responsabilização pela introdução da lógica dos resultados; e e) a
responsabilização pela competição administrada. As três últimas se inserem no
contexto mais atual, e, combinada com as anteriores, complementam-se em busca das
transformações necessárias ao capital.
O uso do modelo de gestão gerencial, segundo Lima ( 2002) estaria induzindo
a uma hiperburocratização das instituições e a um excessivo controle do processo de
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trabalho. Concordando com Lima (2002) é fundamental ressaltar neste capítulo duas
formas de responsabilização, por entender que elas demonstram de forma mais
consistente as idéias do autor e favorecem o processo de hiperburocratização das
instituições: a responsabilização pela introdução da lógica dos resultados e a
responsabilização pela competição administrada,
Concernente à responsabilização pela introdução da lógica dos resultados,
orienta-se pelo constante monitoramento e controle desses resultados, sendo necessário,
torná-los quantificáveis para assim auferir os ganhos de eficiência e efetividade das
políticas. Isso permite que essas normas sejam elevadas e controladas ao extremo o que,
na prática, torna-se excessivo o controle, as normas e as regras. Como parte da
estratégia para promover a modernização do Estado, pressupõe a comparação entre
“metas” e “resultados” o que implica uma organização hierárquica que cria uma cadeia
de responsabilização desde o Governo Central até os diretores, gerentes e funcionários
públicos nos diferentes níveis subnacionais e locais conduzidos pela busca da
adequação entre as metas e os resultados. A profissionalização desses gerentes se
constitui numa das principais medidas para as capacidades institucionais do Estado não
mais executor, mas regulador das políticas. A função da alta e profissionalizada
burocracia reside em elaborar as grandes linhas da política nacional; supervisionar o
processo de descentralização e fiscalizar os vários provedores dos serviços públicos,
ajudando a montar as redes de cooperação entre os diversos agentes sociais envolvidos
nas políticas.
Os gerentes ou gestores atuam dentro de um sistema descentralizado, flexível,
com liberdade para tomar decisões e administrar recursos, em contrapartida, com maior
responsabilidade pessoal em relação aos resultados, podendo inclusive ter sua
remuneração (por meio de gratificações e premiações) e a remuneração dos demais
funcionários, condicionado aos resultados. Essa forma de autocontrole por parte dos
gestores públicos, faz com que eles assumam para si o ônus do sucesso da sua missão.
Outra forma de verificar o excessivo controle do atual modelo de gestão é a
incorporação da avaliação como forma de promover a consciência tanto por parte dos
avaliadores quanto dos avaliados, em relação aos critérios e às metas que servem de
referência para medir o desempenho em cada instituição. A avaliação implica em
mecanismo de formação constante de todos os envolvidos na gestão, de tal forma que,
em um processo de prestação de contas, os gerentes responsáveis pela execução dos
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programas devem ser capazes não, apenas, de reconhecer os acertos e desacertos da sua
gestão, mas também de prestar explicações conscientes e racionais sobre os fatores que
determinaram o sucesso ou o fracasso .
De igual modo, desempenham papel preponderante os mecanismos de
acompanhamento da execução como indutor do ajuste entre metas e resultados, em
oposição ao modelo anterior cuja preocupação central voltava-se para a fiscalização da
legalidade e cumprimento de horários, rotinas, sem a preocupação com a satisfação dos
usuários. Por meio do acompanhamento, os gerentes responsáveis procuram manter o
controle dos programas e dos recursos, incorporando a autoavaliação como prática
interna de cada órgão executor, e estabelecendo controles seletivos e estratégicos para
garantir o uso racional dos recursos.
No que se refere à responsabilização pela competição administrada, essa
provocou as transformações mais significativas, quanto à redefinição do Estado e à
relação deste com a sociedade. Essa forma de responsabilização parte do princípio de
que a falta de concorrência no interior do serviço público é um fator impeditivo da
eficácia, eficiência e qualidade deste, apontando, como solução, formas de diversificar
os provedores dos serviços e ações públicas, para que em meio à pluralidade de atores,
se instaurem diferentes formas de competição. Se a competição acontece entre órgãos
governamentais, o Estado deve se fortalecer para acompanhar e avaliar a execução das
ações descentralizadas. Se ocorrer entre empresas privadas que prestem serviço público
por meio de concessões, é necessária a criação de agências reguladoras independentes
do Executivo e Legislativo, cuja tarefa é fiscalizar os setores privados. E ainda, no caso
da prestação de serviços pelo terceiro-setor (entidades públicas não-estatais), deve haver
uma constante fiscalização por meio do acompanhamento dos contratos obedecendo à
lógica dos resultados.
A implementação e o sucesso dos métodos gerenciais de controle, a posteriori,
propiciaram os parâmetros para que se estabelecessem as primeiras formas de
competição administrada; dentre as principais, destacam-se: adoção de índices e
avaliações de resultados como parâmetros básicos para a ação administrativa; a
flexibilização na gestão de pessoal, inclusive em termos de pagamento; o repasse de
poderes de órgãos centrais às unidades descentralizadas e do topo da organização às
gerências intermediárias; a introdução de uma cultura mais voltada à satisfação de metas
públicas que à observância de regras ensimesmadas; e, especialmente, a
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contratualização da administração pública, definida pela autonomia e pelo aumento da
responsabilidade de cada agência segundo objetivos claramente definidos (ABRÚCIO,
2003, p. 231).
No discurso, a obtenção desses objetivos, estaria condicionada à
desburocratização e flexibilização das regras; e à fiscalização e acompanhamentos dos
contratos, incluindo-se, no segundo condicionante, a transparência e publicização das
informações para possibilitar o controle social. Na prática, o que se verifica é um
controle exarcebado, permitido pelas tecnologias da comunicação e da informação que
possibilitam acompanhar a vida de todos e em todos os momentos. Dessa forma, se está
de acordo com o que Weber (1994) concebia como burocracia: um sistema racional em
que a divisão de trabalho ocorre, racionalmente, visando a um determinado fim. Isso
implica o predomínio do formalismo da existência de normas escritas, estrutura
hierárquica, divisão horizontal e vertical do trabalho e impessoalidade no recrutamento
dos quadros. A ação é orientada para um forte planejamento e controle. É o que Licínio
Lima defende como uma hiperburocratização dos processos com sérias repercussões
para a gestão dos sistemas educacionais e para o trabalho dos docentes.
2. A política educacional brasileira e a operacionalização da gestão gerencial
Com as mudanças advindas da reestruturação produtiva e da adoção do ideário
neoliberal, o modelo burocrático de gestão sinaliza esgotamento a partir da década de
1970. Dessa forma, o campo das organizações é impelido a adotar uma nova concepção de
gestão mais flexível próprio das empresas privadas. Nesse sentido, a nova Gestão pública
foi adotada enquanto modelo administrativo para todas as vertentes sociais, contemplando
também o sistema educacional. Com as reformas educacionais, a gestão descentralizada
passa a ser o eixo da política educacional brasileira, redesenhada pela influência das
estratégias neoliberais que imprimem o reordenamento das relações entre o Estado e
sociedade. Nesse cenário, ganha destaque a descentralização das responsabilidades
materiais, com incentivo a parcerias com as empresas, organizações não-governamentais.
Dois conceitos sobressaem nesse modelo de gestão, ainda que de forma ressignificada: a
descentralização e autonomia.
Ainda no que se refere ao conceito de descentralização, essa passou a ser a
estratégia de gestão utilizada, segundo o discurso oficial para propiciar a democratização
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do Estado e a busca de maior justiça social. Apesar de as propostas de descentralização
não serem novidades na administração pública, no contexto atual ela é indicada como uma
das alternativas de solução para o impasse em que se encontra o sistema educacional
verificada pela incapacidade do Estado em responder às mais urgentes demandas da
população, principalmente no que diz respeito ao atendimento de necessidades sociais
básicas.
Quanto à autonomia da escola, essa é bastante questionada por Lima (2011), para
quem o conceito de autonomia, nessa forma de gestão, assume um significado
instrumental e técnico, apenas devolvendo alguns encargos e responsabilidades de
execução das políticas educativas, definidas em nível central e regional. Assim, o autor
infere que essa forma de entender a autonomia se articula com políticas mais amplas de
redefinição do aparelho de Estado. A autonomia é decidida por meio de conjunto de
normas definidas por órgãos da administração pública que reconhece a autonomia das
escolas de forma restrita, dentro dos limites estabelecidos, de decidir sobre o planejamento
pedagógico, disciplinar, estatutário e financeiro, o que a caracteriza como “autonomia
decretada”. Dessa forma, a autonomia não passa de retórica oficial e é insuficiente para
instituir formas de autogoverno das escolas, uma vez que a autonomia não se dá por
outorga, mas por processo de construção na relação entre os atores.
No campo educacional brasileiro, uma das primeiras iniciativas de implantação da
gestão gerencial nas escolas foi a implantação do Plano de Desenvolvimento da Escola
– (PDE-Escola), que visava à modernização da gestão e ao fortalecimento da autonomia
da escola, mediante a adoção do modelo de planejamento estratégico, apoiado na
racionalização e na eficiência administrativa. Ao aderir ao PDE, as escolas firmam um
contrato com a União responsabilizando-se a cumprir as metas que foram estabelecidas.
A gestão gerencial é fortemente induzida pela lógica do controle dos resultados, em
detrimento do controle dos processos organizacionais. Para a sua operacionalização, foi
instituída uma nova lógica na cultura organizativa das escolas brasileiras, entre elas: a
reformulação no sistema de avaliação nacional e o uso da tecnologia a favor da
informatização/centralização das informações referente ao desempenho de todas as
redes e escolas.
Concernente ao uso das tecnologias da comunicação e da informação, que
permitem à gestão armazenar grandes quantidades de informações, de naturezas
diversas, pode-se dizer que elas propiciaram uma mudança profunda nas formas de
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gestão e controle dos órgãos centrais com repercussão na cultura organizacional das
unidades escolares. A esse respeito, Lima (2011, p. 16) destaca que,
As próprias relações estabelecidas entre a administração central e adesconcentrada do Ministério da Educação e as escolas, em termos deinformação, de processos de gestão diversos e de disseminação de circularese diretivas são atualmente mediadas por complexos processos de informaçãoe comunicação e por plataformas informáticas de diversos tipo, amplificando,sem precedentes a capacidade de controlo do centro sobre as periferias esobre o trabalho, pedagógico e administrativo dos professores. Este tende aser subordinado a uma vigilância sistemática, sob categorias tipificadas apriori e que modelam a representação das realidades escolares, controlam ostempos e os espaços, generalizam metodologias e processos de trabalho,favorecem a padronização e permitem a mensuração detalhada e acomparação automática.
No campo da avaliação educacional, foram criados sistemas de avaliação
educacional em todos os níveis da educação nacional. Quanto à educação básica,
merece destaque o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb)
implementado, em 1990 e aperfeiçoado a partir de 2005, com a aplicação da Prova
Brasil. O Governo Federal utiliza os dados do Ideb para estimular a competição entre as
redes e escolas; para distribuir os recursos dos vários programas da União,
principalmente os que têm um caráter (re) distributivo e complementar, evidenciando
assim, o controle dos resultados pela competição administrada, própria da gestão
gerencial. Para a educação superior como política de sistematização de avaliação desse
nível de ensino, merece destaque o Sistema Nacional de Avaliação da Educação
Superior (Sinaes), visando assegurar o processo nacional de avaliação das instituições
de educação superior, dos cursos de graduação e do desempenho acadêmico de seus
estudantes, nos termos do art. 9º, da Lei nº. 9.394, de 20 de dezembro de 1996
(BRASIL, 2004). Esse Sistema defende o uso dos recursos metodológicos de forma
combinada, ou seja, as ações da avaliação interna e externa combinadas e
complementares.
No entanto, é com o lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação –
PDE (2007) que o governo brasileiro sedimenta o modelo de gestão gerencial
fundamenta na eficiência e na aferição de resultados baseados em cumprimento de
metas estabelecidas em contratos de desempenho. Segundo Castro e Pereira (2014, p
290), o contrato de gestão é o instrumento de planejamento que permite o
acompanhamento das metas acordadas entre as instituições. Para os autores,
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O contrato de gestão constitui um instrumento que permite tanto umaaferição mais rigorosa da eficiência, da eficácia e da efetividade, bem comoum aumento considerável, bem como um aumento da transparência daadministração pública [...]. É um instrumento normativo, uma ferramenta queauxilia o planejamento e pode ser utilizado na administração pública comomeio para formalizar o compromisso das partes contratantes com a obtençãodos resultados.
No processo de implementação das estratégias gerenciais merece destaque a
institucionalização do Plano de Desenvolvimento de Educação (2007) que tinha como
objetivo integrar um conjunto de Programas e Ações, que já vinham sendo
desenvolvidos pelo Ministério da Educação de forma fragmentada, objetivando a uma
melhor organicidade ao sistema educacional. Como estratégia para implementar o PDE
(2007) nos sistemas municipais o governo criou o Plano de Ações Articuladas (PAR)
pelo qual os municípios aderiram voluntariamente ao Programa por meio do Contrato
de Gestão no qual estabeleciam as metas a serem atingidas no seu Planejamento Anual
sempre atreladas ao financiamento a ser recebido. O PAR, no entendimento de Ferreira
e Fonseca (2013, p. 289), é,
uma ferramento de planejamento, de operacionalização e avaliação daspolíticas educacionais criada dentro dos moldes de um Estado Federativo.Opelanejamento é centralizado pelo Ministério de Educação, que, oferecendoapoio técnico e financeiro, induz os entes federados a assumiremresponsabilidades na gestão da educação.
No campo da educação superior e integrando as ações do PDE, merece destaque
a instituição do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais –
Reuni ( Decreto nº 6.096/2007). Com esse programa, o governo brasileiro reestruturou
as universidades públicas e instituiu a gestão gerencial. O programa procurou estimular
a eficácia e a eficiência das instituições de ensino superior públicas federais como forma
de expandir o acesso às universidades federais brasileiras.
Verifica-se, dessa forma, que a gestão gerencial predomina na atualidade na
condução da gestão das políticas educacionais, no discurso, objetivando a modernização
da gestão das instituições, no entanto, é possível evidenciar que, nesse processo, o que
se estabelece é a busca pela racionalização dos serviços públicos, impregnando uma
lógica que subordina a educação a conceitos econômicos, realçando as noções de
empregabilidade, produtividade e competitividade transvestidos pelo discurso da
qualidade e da excelência. É uma lógica que introduz o sentido da mercadorização dos
direitos no interior da sociedade de forma sutil e gradativa, mudando o foco das
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políticas sociais universalistas fundamentadas no princípio da igualdade, para políticas
focalizadas baseadas na competitividade, na meritocracia, na diferença.
3. Gestão Gerencial e repercussões no trabalho docente
As mudanças ocorridas, principalmente, a partir dos anos de 1990 nas políticas
públicas educacionais brasileiras privilegiam a transformação produtiva com equidade e
trouxeram uma nova organização para as instituições, referenciadas em critérios de
flexibilidade, eficiência e eficácia, próprias de uma gestão empresarial. No campo
educacional as orientações do modelo gerencial com novas características – como
responsabilização, transparência e critérios mais rígidos de acompanhamento, avaliação
e controle – intensificaram a atividade do trabalhador docente, passando, pois, a exigir
um trabalhador com características multifacetadas e polivalentes, capaz de se adaptar a
diferentes tipos de ocupação.
Ao discutir as especificidades do trabalho docente, é necessário compreender
que a docência é uma profissão com características próprias e faz parte de um processo
histórico, cultural que se organiza dentro da lógica do sistema capitalista. No entender
de Flores e Tirado (2010), toda profissão é um trabalho que implica modalidades,
particularidades e especificidades e, nessa perspectiva, a natureza do trabalho docente
encontra-se vinculada à divisão social do trabalho, sem contudo, deixar de se organizar
de modo fragmentado, própria da divisão do trabalho, no sistema capitalista, devendo
portanto, ser analisado como qualquer outro tipo de trabalho.
Para Kuenzer (2009, p. 240), há uma estreita articulação entre a divisão social
do trabalho e a divisão do trabalho. Para a autora, “essas duas concepções não se
opõem, e sim guardam uma relação dialética entre si, em que ao mesmo tempo, se
negam, se afirmam, configurando a dupla face do trabalho: qualificador, prazeroso e,
simultaneamente, desqualificador, explorador, causador de sofrimento”. Segundo a
autora, para se discutir as questões do trabalho no sistema capitalista, deve-se considerar
a sua dupla face, enquanto produtor de valores de uso e de valores de troca; essa é uma
relação dialética que compõe uma totalidade. No caso do trabalho docente, essa
característica é acentuada, devido à natureza não-material2 do seu trabalho.
2A definição de trabalho imaterial não é algo simples. Trabalho imaterial pode ser entendido, segundo, Camargo (2013) como aquelas atividades que
possuem como conteúdo principal a comunicação, a cooperação, o conhecimento e o saber. São as qualificações subjetivas que passam a ter um papel
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Corroborando o pensamento de Kuenzer (2009), Flores e Tirado (2010)
assinalam que a força do trabalho dos mestres é considerada uma mercadoria e que
facilita a continuidade do processo de acumulação. Essa constatação tem permitido
afirmar que, por um lado, o trabalho do docente incide sobre o processo de valorização
do capital; por outro lado, cria as condições para a capacitação de mão-de-obra que é
consumida pelo capital e pelo Estado. Nessa mesma linha de raciocínio, o trabalho
efetivado pelos docentes, forma e instrui tanto ideologicamente como em
conhecimentos a mão de obra para que ela adquira habilidades e destrezas necessárias
ao capital, convertendo-a em uma mão de obra, qualificada com possibilidades de
aumentar a sua capacidade produtiva o que contribui para perpetuar a sociedade
burguesa.
Isso significa dizer que a análise do trabalho docente ultrapassa a análise de
técnicas e procedimentos pedagógicos, do conhecimento como fonte do trabalho e da
relação professor-aluno. Na sua configuração, deve levar em consideração as relações
sociais capitalistas e sua lógica organizativa que se estendem a todas as atividades
sociais existentes, inclusive à escola, embora essa instituição não produza mercadorias,
e, por isso, não seja possível falar em paridade entre escola e produção. Por isso, para se
compreender o trabalho docente, é, necessário ter a clareza de que ele se institucionaliza
com base em várias dimensões, ou seja, a organização, os sujeitos, os objetos, os
processos os conhecimentos, as tecnologias e os seus resultados.
Nesse sentido, o trabalho docente apresenta-se, apenas como mais uma
especificidade no contexto do trabalho no sistema capitalista. Isso porque, para ambos,
são exigidos determinados padrões de comportamento compatíveis com a
racionalização crescente do processo produtivo e da vida social (KUENZER, 2009). Em
consonância a esse pensamento (TARDIF; LESSARD, p. 24, 2008), destacam ainda que
“o conjunto de tarefas cumpridas pelos agentes escolares, inclusive os alunos é, ele
próprio, padronizado, dividido, planificado e controlado”, assim a ligação da
organização do trabalho no sistema produtivo acaba se estendendo até a forma de
organização das escolas e do trabalho docente. Para Kuenzer (2009), o trabalho docente
é complexo e não consiste, apenas, em cumprir ou executar uma ação, mas também
central no processo de valorização das mercadorias. Uma mercadoria, cuja produção resulta de trabalho imaterial, pode ser quanto a sua forma física, materialou imaterial; mas a questão principal está no tipo de trabalho, ou de ação, empregado para sua produção. A noção de “saber” é provavelmente o que melhordefine, em um sentido quase didático, o trabalho imaterial, pois diz respeito ao fato de que o valor de uma mercadoria não resulta necessariamente dodispêndio de tempo de trabalho empregado na sua produção (trabalho abstrato), mas sim dos saberes mobilizados por aqueles que a produzem.
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numa atividade que envolve pessoas o que vai exigir que esse trabalhador atribua
sentido a sua ação o que determina uma especificidade própria.
Assim, pode-se considerar que o trabalho docente é parte da totalidade
constituída pelo trabalho no capitalismo sendo, portanto, inerente a esse e estando
submetido, à sua lógica e às suas contradições. Nessa perspectiva, a docência pode ser
analisada como qualquer outro tipo de trabalho humano.
No contexto das atuais reformas educacionais e da implementação de um
modelo de gestão no seio das instituições escolares, as reformas passaram a atribuir à
escola múltiplos e diferenciados papéis além das suas funções normais, contribuindo,
assim, para ampliar o raio de atuação docente, consequentemente, provocando
modificando na realização do trabalho. Como bem destaca Oliveira (2004, p. 19), “[...]
el modelo de gestión escolar adoptado combina formas de planejamento y controle
central em la formulación de políticas com la descentralización administrativa en la
ejecución de lãs mismas (p. 19). Tais consequências ocorrem pela flexibilidade
administrativa presente no modelo de gestão vigente que se deriva da descentralização
administrativa, modificando a organização do trabalho, que passa a ser realizado
pautado em um modelo mais flexível.
Segundo Brito e Castro (2013), com as reformas implementadas nos sistemas de
ensino a partir de 1990, o trabalho docente foi reconfigurado. Nos últimos anos, têm
sido observadas novas formas de organização do trabalho docente, associadas também
a uma nova forma de reorganização do sistema escolar, que passou a incorporar um
modelo de regulação educativa, com base nas demandas contextuais do mundo
globalizado. A regulação das políticas educacionais repercute diretamente no trabalho
docente, haja vista que modifica a estrutura e composição da organização escolar
influenciando no seu funcionamento, que segundo Oliveira (2004), se dá em função,
[...] da centralidade atribuída à administração escolar nos programas dereforma, elegendo a escola como núcleo do planejamento e da gestão;financiamento per capita, com a criação do Fundo de Manutenção eDesenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério(FUNDEF), por meio da Lei n. 9.424/96; a regularidade e a ampliação dosexames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM, ENC), bem como a avaliaçãoinstitucional e os mecanismos de gestão escolares que insistem naparticipação da comunidade (OLIVEIRA, 2004, P.1130).
Tais mudanças modificam o trabalho escolar já que passam a implementar
medidas que alteram a configuração das redes públicas de ensino. Com isso, é possível
observar que as orientações norteadoras das políticas educacionais ocasionam uma
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maior autonomia para as escolas, principalmente no que se refere à gestão e realização
do trabalho docente; em contrapartida, estes acabam intensificando seu trabalho para
atender às exigências e obrigações postas.
Segundo Oliveira (2004), o professor, em face das variadas funções que a
escola pública assume na atualidade deve responder às exigências que ultrapassam a sua
formação. Para a autora, o trabalho docente não é definido mais apenas como atividade
em sala de aula; ele compreende a gestão da escola no que se refere à dedicação ao
planejamento e à elaboração de projetos específicos, bem como à discussão coletiva
sobre o currículo e da avaliação em geral e específica do ensino. Semelhante às novas
exigências do processo produtivo, o professor passa agora a ser responsável por
múltiplas funções que deve desempenhar de forma mais efetiva, participativa e flexível.
Pesquisas realizadas pelo Gestrado (2007), intitulada Trabalho docente na
educação básica no Brasil3 e posteriormente comprovada no Rio Grande do Norte por
Brito e Castro (2013), indicam que a nova forma de organização escolar tem repercutido
no trabalho docente, principalmente na intensificação, na precarização e flexibilização
do trabalho docente.
No Dicionário do Trabalho Docente, Duarte (2010) utiliza-se da ideia de Apple(1995) para explicitar o que seja o conceito de intensificação do trabalho. Para esseautor,
[...] a intensificação do trabalho docente representa uma das formas pelasquais os privilégios de trabalho dos(as) trabalhadores(as) da educação sãodeteriorados. Isso ocorre de forma trivial e mais complexa, pois inclui desdea falta de tempo de tomar um cafezinho e relaxar, ou seja, a falta de tempopara o descanso, que cada vez mais se comprime, até uma ausência total detempo para se manter em dia com o próprio campo profissional, comoatualizar-se (Apple, 1995, p. 48).
A intensificação do trabalho docente pode ser comprovada por diversos fatores;
dentre eles, merecem destaque: o aumento da jornada de trabalho em mais de uma
escola, em geral para complementar o salário; a extensão da jornada de trabalho no
próprio estabelecimento de ensino, sem remuneração extra e pela incorporação de novas
funções no interior do próprio trabalho. Para Brito e Castro (2013), o fato de o docente
ter que distribuir o seu tempo de trabalho em mais de uma unidade, compromete o
trabalho escolar e traz consequência para o trabalhador que tem de se deslocar para mais
de uma unidade, com perda de tempo e horas que deveriam ser dedicadas ao lazer ou ao
3 Pesquisa desenvolvida pelo GESTRADO/UFMG. A pesquisa do tipo survey foi realizada em seteestados brasileiros: Minas Gerais, Pará, Rio Grande do Norte, Paraná, Santa Catarina, Espírito Santo eGoiás.
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descanso para a recomposição da sua força de trabalho. Discutindo essa tendência,
também comprovada por Tardif e Lessard, (2008, p. 25), os autores apontam que uma
das consequências da intensificação do trabalho escolar reside no fato de que,
[...] os governos, pressionados por contextos econômicos, consideram mais emais a educação escolar como um investimento que deve ser rentável, o quese traduz por uma racionalização das organizações escolares e enxugamentossubstanciais nos orçamentos. Eles visam simultaneamente a aumentar suaeficácia e sua “imputabilidade” através de práticas e normas de gestão e deorganização do trabalho provenientes diretamente do ambiente industrial eadministrativo.
Assim, as exigências e as responsabilidades direcionadas aos sistemas de ensino
público principalmente a partir da década de 1990, acabam por repercutir diretamente
no trabalho efetivado pelos gestores, professores, supervisores entre outros que
integram o processo de ensino de aprendizagem. Esse novo contexto leva a um modelo
de organização pautado na descentralização administrativa, acarretando
consequentemente, responsabilização por parte dos docentes e uma participação mais
efetiva da comunidade nas instituições por meio de Conselhos e incentivos ao
voluntariado, reconfigurando, dessa forma, o trabalho docente.
Quanto à precarização do trabalho docente, esta ocorre nas relações de
emprego como decorrência de sua flexibilização e do contrato provisório, da ausência
de um piso salarial e de um plano de cargos e salários e as perdas de garantias de
trabalho. Para autores, como Antunes (2006), Pochamann (2011), as mutações no
mundo do trabalho, provenientes da reestruturação na base de produção, em vez de
proporcionar a melhoria qualitativa do trabalho, complexificou as relações trabalhistas,
reduzindo os direitos conquistados pelos trabalhadores no período do estado de bem
estar e estabelecendo relações mais fragilizadas que têm levado à precarização do
trabalho em todas as profissões. Para Ricardo Antunes (2006), a precarização do
trabalho significa o desmonte dos direitos trabalhistas, ou seja, é o conjunto de
mudanças econômicas e sociais no mundo do trabalho, geralmente caracterizado pela
desqualificação nas relações de contrato trabalhista. Nesse entendimento, a precarização
do trabalho docente, e também do trabalhar escolar, não se constituem em algo recente,
mas se apresentam de forma histórica e constante, pois, acompanham as profundas
mudanças políticas, econômicas e sociais ocorridas no âmbito internacional e nacional.
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Outros motivos também podem causar precarização a exemplo das condições de
formação e de trabalho dos professores, a organização do ensino e as condições
materiais do atendimento escolar.
No que se refere à flexibilidade do trabalho docente, esse fator está associado à
exigência de um novo perfil do trabalhador para atender à transversalidade dos
currículos, às avaliações formativas, as exigências pedagógicas e administrativas em um
ambiente sem condições de trabalho adequadas (OLIVEIRA, 2004). Isto implica que a
profissão docente mal estruturada e, em condições de formação precária, contribuirá
para o desenvolvimento intelectual e consciente deficitário das pessoas na sociedade.
Vale ressaltar, também, que a ação docente formal tem, como característica, o trabalho
flexível e codificado, autônomo e controlado, composto de uma combinação variada de
elementos contraditórios e diversificados .
Na atualidade, o contexto sócio-histórico e cultural acaba por suscitar muitas
incertezas aos educadores e educandos: aos professores, que cumprem ordens advindas
de instâncias superiores, cumprindo tarefas, muitas vezes, sem muita segurança.
Chegam a se sentir desvalorizados profissionalmente, sendo encarados como pessoas
que estão em salas de aulas para testar o que foi simplesmente mudado. Os alunos,
também são submetidos a incertezas, pois, o processo de formação educacional não está
sintonizado com as demandas da vida social, tampouco com a formação de espírito
crítico, necessário a uma vida cidadã autônoma e ativa.
Em um movimento dialético, autores, como (Libânio 1984), (Melo, 2010),
(Freire 1996), definem a prática docente para além da formação e da reprodução da
força de trabalho e apresentam conceitos que comprovam a complexidade do trabalho
docente, mas apontam para uma possibilidade de transformação e de mudança. Entre
essas concepções, destacamos a de Libânio (1984, p.137) que define e ressalta que o
trabalho docente “é um processo simultâneo de transmissão/assimilação ativa, onde o
professor intervém trazendo um conhecimento sistematizado onde o aluno é capaz de
reelaborá-lo criticamente com os recursos que traz para a situação de aprendizagem”.
Esse fazer deve pautar-se na realidade do aluno e na contextualização histórica e social
a que estão inseridos.
Melo (2010, p.2) descreve a atividade docente como “uma prática social
concreta, dinâmica, multidimensional, interativa, invariavelmente inédita e imprevisível.
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Um processo atravessado por influências de múltiplos aspectos – políticos, econômicos,
sociais, entre outros”.
Freire (1996, p.98) destaca, ainda, que “[...] a educação é uma forma de
intervenção no mundo. Intervenção que, além do conhecimento dos conteúdos bem ou
mal ensinados e/ou aprendidos, implica tanto o esforço de reprodução da ideologia
dominante quanto o seu desmascaramento”. Isso implica que a profissão docente mal
estruturada e formada poderá contribuir para um desenvolvimento deficitário da
sociedade.
O trabalho docente se enaltece quando deixa de ser, apenas, cumpridor e ou
executor de ações, e passa a ser uma atividade de interação com outras pessoas,
imprimindo, assim, sentido ao que fazem. No atual contexto das reformas educacionais,
essa dimensão tem sido secundarizada; a ação docente formal tem adquirido
características do trabalho flexível e codificado, autônomos e controlados, composto de
uma combinação variada de elementos contraditórios e diversificados entre si. Essas
características do trabalho, em geral, estão presentes no trabalho docente, quer seja no
cenário educacional em âmbito nacional, quer seja no âmbito internacional.
Considerações finais
As reformas que se processaram no final do século XX, no campo da educação
em âmbito mundial, vinculam-se às mudanças impostas pelo processo de globalização
econômica que caracterizam o mundo contemporâneo. Essas transformações
provocaram uma ampla reestruturação e reorganização da economia e das relações
políticas mundiais. É nesse contexto, que adquire centralidade a redefinição do papel do
estado, induzido por uma nova agenda econômica global veiculada e ampliada pelas
tecnologias da comunicação e da informação. O antigo modelo de organização social, o
Estado do Bem-Estar-Social, passou a ser visto como um impedimento ao
desenvolvimento das nações por ser considerado como ineficiente e ineficaz, ganhando
destaque as teses do Estado-mínimo, e do mercado como instituição eficiente, ágil e
capaz de oferecer produtos e serviços de qualidade. Em função desses fatores, há uma
nova reorganização da vida social, com base na revalorização da racionalidade
econômica e empresarial, na procura de vantagens competitivas, no protagonismo das
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organizações produtivas e dos seus respectivos critérios de gestão tais como a eficácia e
a eficiência, tornando-se prioridade a substituição do modelo de gestão burocrático por
uma gestão gerencial.
Os sistemas educacionais, para se ajustarem às novas diretrizes da reforma do
estado, necessitaram ser reformulados e regulamentados; e contou para isso, com a
orientação de organismos internacionais, que, nas suas diretrizes, apontavam para a
necessidade de tornar os sistemas de ensino mais flexíveis e modernos, com uma gestão
mais eficiente e baseadas em resultados. Dessa forma, a gestão da educação sofreu
profundas modificações, de um modelo patrimonialista e burocrático para uma gestão
democrática definida em Lei ou para uma gestão gerencial imposta pela necessidade de
reformar o estado, tornando-o mais ágil e flexível. Assim, se evidencia uma grande
distância entre a gestão democrática que é definida na Constituição Federal de 1988,
referendada na Lei de Diretrizes e Bases nº 9.394/96 e os programas que são gestados
no Ministério da Educação que apostam no modelo gerencial, como forma de
modernizar a gestão da educação e da escola, permitindo o estabelecimento de um
modelo híbrido de gestão que não tem contribuído para a sistematização de uma prática
democrática nas instituições escolares.
Ademais, o trabalho docente vem sendo reconfigurado no interior das
unidades escolares. As mudanças ocorridas com a gestão, as novas formas de
acompanhar e avaliar o trabalho docente, bem como novas exigências para os
trabalhadores da educação, têm alterado a formação dos trabalhadores da educação,
flexibilizando a sua forma de contratação, aumentando a carga horária de trabalho e
suas atribuições, contribuindo, sobremaneira, para a precarização e a intensificação do
trabalho.
Esse novo modelo de organização educacional tem evidenciado, cada vez
mais, o docente como um trabalhador que presta um serviço técnico e instrumental,
muito associado a questões burocráticas o que tem impedido as chances de realização
do real objetivo da escola: a produção e sistematização do conhecimento e a formação
de indivíduos mais conscientes, atuantes e críticos.
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