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I Coloquio/Encontro Nordestino

de Musicologia Historica Brasileira

(I CENoMHBra)  ATAS 

Salvador, 8 e 9 de Julho de 2010

Universidade Federal da Bahia

PPGMUS-UFBA 

Salvador, 2012 

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Realizaçao 

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Reitora 

Dra. Dora Leal Rosa 

ESCOLA DE MÚSICA Diretor 

Dr. Heinz Karl Schwebel 

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA 

CoordenadoraDra. Diana Santiago da Fonseca

NÚCLEO DE ESTUDOS MUSICAIS 

(NEMUS)Líder

Dr. Manoel Veiga

Editor das Atas do I CENoMHBraPablo Sotuyo Blanco

Apoio 

UFMA UFPI UFS UFPE 

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Sumário 

 APRESENTAÇÃO ................................................................................................................. ii  

MUSICOLOGIA BRASILEIRA:REVISITA A GUILHERME DE MELOManoel Veiga ............................................................................................................ 1 

 A UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA E A COMPOSIÇÃO MUSICAL NO SÉCULO XX:MARCOS HISTÓRICOSIlza Nogueira ............................................................................................................ 25 

 ACERVO MUSICAL JOÃO MOHANA:POSIÇÃO REGIONAL, SITUAÇÃO DOCUMENTAL Alberto Dantas ......................................................................................................... 49 

 ACERVO PADRE JAIME DINIZ:PATRIMÔNIO ARQUIVÍSTICO COMO REFERÊNCIA HISTÓRICA À MUSICOLOGIADO NORDESTE BRASILEIRO João Berchmans ....................................................................................................... 63 

FILARMÔNICA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO:FUNÇÕES DE UMA BANDA DE MÚSICA NO AGRESTE SERGIPANO ENTRE 1898 E 1915 João Liberato ........................................................................................................... 73 

MAPEAMENTO DE ARQUIVOS MUSICAIS PÚBLICOS E PARTICULARESDO BAIXO SÃO FRANCISCO:NOVAS PERSPECTIVAS À LUZ DE NOVOS DOCUMENTOSNilton Souza ............................................................................................................ 97  

O TEATRO SÃO JOÃO DESTA CIDADE DA BAHIA:O FUNDO DOCUMENTAL DO ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIALucas Robatto ......................................................................................................... 107  

MEMORIAL DA ESCOLA DE MÚSICA:DOCUMENTOS E PESQUISA

Maria da Conceição Costa Perrone .......................................................................... 123 

O PATRIMÔNIO MUSICAL NA BAHIA:BREVE RELATO DE NOVAS ACHEGAS DOCUMENTAISPablo Sotuyo Blanco ............................................................................................... 129

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Apresentáçáo 

 A partir do trabalho desenvolvido nos Grupos de Trabalho em Musicologia realizados

nos Congressos da ANPPOM entre 2003 e 2008, coordenados em colaboração com o Prof.

Dr. André Guerra Cotta, sentimos a necessidade de buscar novos espaços institucionais

abertos à proposta que vinha se desenvolvendo em nível nacional e regional.

 Assim, em 2010 realizamos o I Colóquio/Encontro Nordestino de Musicologia

Histórica Brasileira (I CENoMHBra)  visando dar continuidade àquele trabalho em nível

regional, procurando promover o encontro dos musicólogos que lidam com patrimônio

musical documental, ativos no nordeste brasileiro, a fim de atender as necessidades dos

profissionais nele envolvidos.

Não há ação musicológica histórica sem patrimônio documental musical ou relativo à

música. Dito patrimônio existe, sim. Temos provas disso. Mas precisamos garantir o seutratamento adequado. O nordeste brasileiro é uma região ainda a ter organizado o seu

patrimônio musical. Praticamente tudo está ainda para ser feito. As ações iniciadas na região

são claros indicadores da riqueza documental que ainda nossa região guarda.

Por outro lado, tal situação nos coloca em posição privilegiada com relação a como

organizar e realizar ditas ações musicológicas, constituindo assim uma classe profissional.

No intuito de tratarmos desses tópicos no I CENoMHBra, foram propostos os

seguintes temas:

1)  O patrimônio musical documental brasileiro no Nordeste - ações vinculadas à arquivologia

e biblioteconomia musicais2)   A ação musicológica como manifesto individual e de classe  –   (ré)definição e

(ré)organização da classe musicológica.

Nesse mesmo sentido, resultado desse evento marcante, apresentamos aqui as Atas que

reúnem os trabalhos científicos de nove musicólogos residentes e ativos no nordeste brasileiro,

região cuja riqueza cultural hoje é indiscutível e cujo patrimônio documental musical começa a

ser sistemáticamente pesquisado.

 Trabalhemos juntos por uma musicologia que atenda as necessidades locais e regionais,

enquanto se confronte e dialogue nacionalmente e se projete internacionalmente.

Sejam bem-vindos aos resultados centíficos do I CENoMHBra! Tenham uma ótima

leitura!

Dr. Pablo Sotuyo Blanco

Presidente do I CENoMHBra

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MUSICOLOGIA BRASILEIRA:

REVISITA A GUILHERME DE MELO 

 Manoel Veiga *  

 A)  CONVERGÊNCIAS:  

 Três vetores convergem para uma proposta de reedição da obraclássica de Guilherme de Melo:

1.  Revisão conceitual da Etnomusicologia brasileira cujaimplantação universitária teve o proponente entre seus operáriosmais antigos, no Brasil (UFBA, 1981) (Sandroni 2008);

2.  Continuidade do levantamento dos músicos e expressões musicaisna Bahia (DEMEM);

3.  Reedição crítica, fartamente comentada, minimamente corrigida,do marco histórico da musicologia ou historiografia musicalbrasileira (  A Música no Brasil , 1908).1 

Os dois primeiros são estratégias: constituem complexos deforças sob as quais uma revisita a Guilherme de Melo torna-se mais doque a reedição de uma obra esgotada e rara, para recompor-se,justificar-se e iluminar problemas do passado e que ainda continuemconosco.

* Prof. Emérito da Universidade Federal da Bahia e Pesquisador 1A do CNPq, líderdo Núcleo de Estudos Musicais (NEMUS).1  Há interesse da Editora da Universidade Federal da Bahia [EDUFBA] para

 publicação na Coleção Bahia de Todos ou na Pesquisas em Arte.

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1. A REVISÃO:

 A Etnomusicologia, como disciplina, vem passando por

profundas alterações sob o impacto do virtual, entre outras razões. Opróprio conceito de etnia, que compartilha com a antropologia damúsica − nunca muito claro − ora se dilui nos videoclipes amadores vistos e manipulados em comunidades virtuais por pessoas que nuncase viram, ou se verão, aos milhões (cf. Caroso 2010).

Questões de territorialidade e de renegociação de significados já vinham também preocupando nossos pesquisadores; o caso doOlodum, entre outros, era assunto já tratado aqui há mais de duasdécadas.

Não menos que nove tendências atuais  são apontadas narecente antologia de Jennifer C. Post. As contribuições são aliagrupadas sob os rótulos de “Commodification” (produção de benscomerciais) e Consumo; Turismo Cultural e Viagem; Gênero eSexualidade; Globalização e “Glocalização”(redefinição do conceito dolocal); Mídia, Tecnologia e Tecnocultura; Nacionalismo e Transnacionalismo; Lugar e Incorporação; Identidades Racial e Étnica, Ação Social e Política (Post 2006).

 As questões de poli-, inter- e transdisciplinaridade vêm sendoagudizadas nas universidades brasileiras por uma série de expansões emudança de modelos, duplicações, ofertas de cursos, na sequência dereformas pelas quais passam, que provocam não tanto as preocupaçõesque deveriam provocar, mas uma apatia, talvez mesmo uma anomiaentre docentes. É de se temer que o desejado consórcio de disciplinasnão sacrifique uma indispensável disciplinaridade básica, interna; quecontatos de superfície não simulem fusões que devem ser buscadas eocorrer na base teórica das disciplinas associadas.

Opções pelo populismo, oportunismo, até irresponsabilidadepodem comprometer níveis de excelência, assim como anseios deprestação ilimitada de serviços que propiciem recursos e afastem apecha de elitismo das universidades, poderão fazê-las esquecer de

educar.

No caso específico das artes, na UFBA, há uma projeção dascomunicações sociais sobre as artísticas, uma tendência de separaçãoentre o seu fazer característico e a reflexão que lhes é tambémnecessária. Os discursos artísticos (entre os quais as musicologias) estãosendo separados dos discursos diretos das próprias artes (que falam porsi mesmas): reflexão sem o fazer, de um lado; fazer sem reflexão, de

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outro. Escolas superiores de artes estão a caminho de serem apenasescolas técnicas. Uma tendência generalizada à teatralizaçãocomplementa a administração das personalidades que se vê em todaparte, das ruas à presidência da República.

O resultado da aceleração desenfreada da mudança tecnológica,não mais mediação entre homem e meio ambiente mas fim em simesma, não pode ser previsto. É provável que o cimento social que uneos grupos se dissolva e as identidades se enfraqueçam. Não se trata deum inevitável catastrofismo cultural e físico. Temores dedegenerescência podem ser apenas um estado de consciência damudança. Se apenas isto, podem também ser úteis para a periodizaçãonas histórias estilísticas das artes. Em Salvador, em torno de 1818,resultaram na criação da primeira cátedra de música por interferênciareal; em 1908 foi Guilherme de Melo, em sua  A Música no Brasil , comum capítulo inteiro (o quarto) que denominou “Período dedegradação”; hoje, com os sinceros votos de estar errado há, no

mínimo, necessidade de uma reflexão mais aprofundada.

Em várias ocasiões apresentei um trabalho abrangente sobre oestudo de música, distinguindo-o do ensino. Resultou de umahipertrofia de vinte anos de seminários de Estudos Bibliográficos eMetodológicos em Música (MUS 502, na UFBA) que, ao passo em quese tornavam antipedagógicos, pelo seu porte, rumavam mais e maispara um roteiro de vida (o ROBIM). Pode ser acessado em suaapresentação original, elaborada em PowerPoint, necessariamenteinacabado e ajustável às condições mutáveis de tempo e lugar2. Seja oque música seja, algo nos dado pronto por deuses e heróis, ou meras

sintaxes de sons construídas por nós mesmos, lidaremos sempre comcomplexos em que não faltarão conhecimentos (do mundo e delaprópria), impulsos internos e externos, e técnicas adequadas paraexpressar tais vínculos. A complexidade da obra artística é um reflexoda complexidade da vida que de algum modo espelha.

 A revisão pretendida não é dos cursos, nem da produtividade,mas das ideias  atuais na Etnomusicologia Brasileira. Evidentemente,para uma avaliação de área, as agências têm muito mais capacidade emeios para fazê-lo e o , , mas não de modo explícito e direto. Empequeno grupo, como ponto de partida, uma reflexão continuada sobre

as ideias atuais num contexto brasileiro poderá de modo ordenadoalcançar esferas mais amplas. O que se propõe, com o endosso daCoordenação dos Cursos de Pós-Graduação em Música da UFBA, é arealização de três seminários de Etnomusicologia Geral, em sequência,

2 Cf. O estudo e o ensino de música: a busca (de um roteiro de vida)  (Salvador:

Pós-graduação em Música da UFBA, 2008 ). Acesso aos slides em 

<http://www.manuka.com.br/robim.ppt>. 

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com o mesmo grupo de pós-graduandos da área tanto quanto possível,sem exclusão de outros que deles queiram participar, inclusivedocentes. Uma bibliografia inicial de dez obras importadas já estádisponível, como ponto de partida. Relatos semanais dos participantes,semestrais (Coordenação), fóruns e eventos maiores propiciarão adivulgação eletrônica corrente de trabalhos. Ao final do ciclo, umevento de amplitude nacional que organizássemos, já anteriormentesugerido à ANPPOM, mas ainda indefinido, seria a conclusão indicada,inclusive com definição de metas e distribuição de tarefas na disciplina.

2. CONTINUIDADE DE LEVANTAMENTOS:

Os trabalhos do DEMEM [Dicionário de Músicos e ExpressõesMusicais na Bahia] continuam como segundo vetor. A cargo doNEMUS [Núcleo de Estudos Musicais da Bahia], vinculado à Escola deMúsica da UFBA, alcançaram um patamar irreversível com apublicação em CD de sua base de dados (Veiga 2010)3, mas estátambém longe de terminado. Não é ainda o que gostaríamos que fosse.Novas partituras continuam sendo localizadas até em Portugal, ouconfiadas a nós pela liberalidade de um Vicente Salles, vindas do Pará.Muitas estão ainda por serem localizadas em bibliotecas em que játrabalhamos (a Biblioteca Alberto Nepomuceno, da UFRJ, entre elas)ou em que nunca estivemos. O limite superior de tempo adotado(1950), por força da legislação de direitos autorais e editoriais, já pode edeve ser elevado.

Há necessidade de incorporação dos manuscritos. Asdigitalizações laboriosas dos impressos de tamanho variado, não raromaiores que A4, exigiam serem feitas muitas vezes em partes a seremrejuntadas. Este trabalho era realizado com scanners   que normalmentelimitavam a varredura ao referido tamanho de página. Talprocedimento pode ser facilitado com o uso de equipamentos maisadequados do que naquela altura dispúnhamos.

 A publicação do DEMEM, como ora o vemos, deve favorecer os

meios eletrônicos, em vez de impressão em papel. A versatilidade deuma Wikipedia “nossa” permitirá que verbetes sejam lançados sem aobra esteja inteiramente completa. A pesquisa histórica sobre os

3  O maior banco de partituras relacionadas aos impressos da Bahia ora contém

mais de 420 obras de 226 compositores, 140 autores de texto e poetas, impressas por não menos de 40 núcleos de litografias e t ipografias ativas entre 1850 e 1950.Uma versão on-line pode ser acessada em http://www.nemus.ufba.br. 

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músicos é lenta e terá de ser continuada por muito tempo. Figuras maisnotáveis terão maior sucesso como Damião Barbosa de Araújo (1778-1856), entre os compositores. Graças a Pablo Sotuyo Blanco, muitomais se sabe hoje sobre ele e suas obras, com a publicação de váriostrabalhos. Guilherme de Melo, entre os musicólogos ou historiadoresde música, já me ocupa desde 2010, como se verá mais adiante.

 Apresentações sobre a imprensa musical na Bahia continuamsendo feitas, a última ocorrida no encerramento do ciclo de debates“200 Anos da Mídia na Bahia”, organizado pelo Instituto Geográfico eHistórico da Bahia44. Há também consultas, como a recente sobre ohino oficial da Bahia, já que o Senhor do Bonfim continua fazendopolítica5.

 Temos também a informar um convênio estabelecido com oGrupo Caravelas, da Universidade Nova de Lisboa que alarga nossoshorizontes. Por outro lado, temos pago um preço alto pelo sucesso,

diante de membros importantes do NEMUS que, embora semantenham como nossos colaboradores, se concursaram ou setransferiram de Universidade para vários outros centros do Brasil. Teremos de estabelecer uma rotina de comunicação eletrônica que nosmanterá em contato.

4 “Impressão Musical na Bahia”, IGHB, 13 de julho de 2011.

5 O Hino do Estado da Bahia foi novamente alterado, realmente definido em lei pela primeira vez (Lei Estadual nº 11.901, publicada no Diário Oficial do Estadode 21 de abril de 2010). O atual Governador do Estado, Jacques Wagner,sancionou a Lei no dia anterior. O belo “Hino ao 2 de Julho” de José dos SantosBarreto (1764-1848), letra de Ladislau dos Santos Titara, foi favorecido. Deslocouo popular “Hino ao Senhor do Bonfim” (outra história complicada: são doiscompositores e dois poetas para três hinos), no caso música de João Antônio

Wanderley (1879-1927), com letra de Arthur de Salles (1879-1952) que havia sido“preferido” por Antônio Calos Magalhães. Pablo, com sua habitual maestria, tevede responder a uma consulta recente do IGHB sobre o “porquê do Hino ao Senhordo Bonfim ser tão popular na Bahia”. Cf. o manuscrito “Medida da recepção doHino ao Nosso Senhor do Bomfim” elaborado por ele e enviado ao Instituto em14/08/2011, com 10 pp. e várias tabelas, não faltando a reprodução da capa da

 publicação do Hymno ao Senhor do Bonfim, tirada do banco de dados de partituras, este também música de Wanderley, para o poema de Dr. Egas Moniz,com os 100 dias de indulgência concedidas pelo arcebispo D. Jerônimo Thomé deSouza, “aos christãos que cantassem a peça”. 

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3. A REEDIÇÃO CRÍTICA 

Este é o cerne desta proposta. Vamos diretamente ao mérito:Guilherme Theodoro Pereira de Mello (na grafia de seu tempo) foi um

afrodescendente e músico, órfão de pai aos nove anos, criado eeducado no Colégio dos Órfãos de São Joaquim, em Salvador. Superoudificuldades enormes para tornar-se o primeiro historiador da músicabrasileira. Modesto e honrado precisa ser lembrado mais do que nunca,num país que não se pode dar ao luxo de perder sua memória. Estudá-lo é um dever dos brasileiros, particularmente dos baianos que lhe sãoingratos e teimam em não tomar conhecimento de sua figura, nem desua obra.

Não sendo musicólogo histórico mas etnomusicólogo, asbiografias não me interessam muito, mas as teias que costurem as obras

aos seus autores, ao seu lugar e ao seu tempo são importantes. Não se veja nisso qualquer tipo de determinismo. Essa urdidura complexa emsi é, em adição, uma função do tempo, isto é, varia conforme o pontode observação que se adote. Como todo conhecimento, musicólogostêm-se dedicado a uma ou outra de duas vias: a da estrutura (tempo“zerado”) e a do processo (tempo variável). Há também um simplismoem separar as duas: o tempo zerado, sem dimensão, não existe, éapenas uma abstração com a qual temos de lidar pela via do bom senso.

Salvador em 1908, ano de publicação de  A Música no Brasil , erauma capital de apenas 292.181 habitantes6. Cidades do interior doEstado, tais como Feira de Santana e Vitória da Conquista, têm hojepopulações bem maiores e são centros universitários emdesenvolvimento. O Estado da Bahia inteiro, em 1910,  tinhapopulação inferior à da Cidade do Salvador sozinha, em 2010, cem anosdepois (2.631.989 e 2.675.656 de habitantes, respectivamente).Portanto, a capital baiana, em que se publicou a primeira história damúsica brasileira, é hoje mais que nove vezes a de Melo. Emboratransformar quantidade em qualidade seja temerário, haja vista oinferno urbano em que Salvador se transformou, talvez esses númerossugiram a magnitude de diferenças, entre as quais as de possibilidade deacesso ao conhecimento, em 1908.

Na ideologia desse tempo, desde Nina Rodrigues (1862-1906),por exemplo, a etnologia brasileira saia da antropologia física de

6 As informações demográficas estão sendo retiradas da publicação bilíngüe (Brasil

1916) e do website Cidades@, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE), disponível no endereço eletrônico <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1> em 15/08/2011. Esta e boa parte das fontes eletrônicas oudisponíveis por meio eletrônico mencionadas neste texto me chegaram pelainestimável ajuda de Luciano Caroso, a quem agradeço.  

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médicos, para uma antropologia criminal, no caso visando os africanos,aliás atendidos caridosamente pelo último. Foi êmulo de CesareLombroso (1835-1909), assim como o foi Tobias Barreto (1839-1889),em Sergipe, também associado ao evolucionismo, ele próprio mestiço. Tobias Barreto foi professor de Sílvio Romero (1851-1914) que odefendia tenazmente, outra figura indispensável à apreciação deGuilherme de Melo. Evolucionismo, determinismo, racismo,positivismo foram doutrinas no contexto histórico-social que temos deconsiderar.

 A Exposição de Anthropologia Brazileira de 1882, do MuseuNacional do Rio de Janeiro, cuja Revista  sobreviveu, é um retrato do quese pensav a sobre o índio, neste tempo, uma das “raças”, em confrontocom a exaltação romântica do indianismo. Revela-nos um E. Deleau(quem era de fato? Médico?) (Deleau 1882)7  entre muitos outros quepassavam sentença sobre o futuro do Brasil. A figura mais absurda é ado pretenso Conde de Gobineau (1816-1882), Joseph Arthur de

Gobineau (não era conde) que chegou a ser representante diplomáticono Rio de Janeiro em 1869-1870, sem esconder seu desprezo pelo país.

 Ainda na Bahia, ódio, religiosidade e misticismo no sertão, entre1896 e 1898, tiveram reflexos trágicos na República inteira: a Guerra deCanudos, uma segunda descoberta do Brasil, mas de outros brasileiros,massacrados. Isto acontecia às vésperas do Motu Próprio de Pio X 8, de1903, que reordenava a música religiosa do catolicismo oficial. Paracompletar o quadro de instabilidade, a política dos primeiros anos dadécada levaria ao lamentável bombardeio da Cidade do Salvador, em

7 E. Deleau, que escreve bem, revelando conhecimentos anatômicos e fisiológicossubstanciais do aparelho auditivo, passa do físico para o domínio da percepçãodeclarando que “a civilização, que não é, em suma, mais que uma forma denevrose, comunica ao ouvido não somente a faculdade de perceber os sons maisvariados, mas ainda de neles apreciar as moda lidades mais diversas”. Parte daorganologia para concluir, de instrumentos destinados fundamentalmente ao usoem combates, um estado ainda rudimentar da sensibilidade indígena: percepçãodos sons limitada mais à intensidade (acuidade auditiva que reconhece) do que àtonalidade. Em resumo, o positivismo, evolucionismo e racismo da épocasublinhando a “inferioridade” do índio, somada à reação contra o indianismo. 8 O Motu Proprio Tra le sollecitudine (1903) de Pio X (1835-1914), franciscanoafeito aos trabalhos pastorais, posteriormente santificado, era uma das faces do

catolicismo oficial. Versa sobre a música sacra, com 29 instruções rigorosasagrupadas sob princípios gerais, gêneros, textos litúrgicos, forma externa dascomposições sacras, cantores, órgão e instrumentos (o piano proibido, bandasexcluídas das igrejas), extensão, meios principais. Uma das recomendações é a derestabelecimento das Scholae cantorum que Melo seguiu, no Colégio São Joaquim.É previsível um reflexo na música secular pelas restrições, ainda mais a dosrecursos de execução. Acesso em 09/08/2011, no endereço<http://www.vatican.va/holy_father/pius_x/motu_proprio/index_po.htm>. Curiosoobservar que, vinte anos mais tarde, em 1923, o próprio Arcebispo de Salvador nãoacatava as recomendações de Pio X, no episódio dos hinos ao Senhor do Bonfim.

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1912, com perdas de vidas, de bens, monumentos históricos e aBiblioteca Pública que abrigara o acervo dos jesuítas e muito mais.

 A baianidade tem raízes culturais e históricas profundas. Estásujeita a exageros, mas é uma questão de identidade que écompartilhada e que precisa ser considerada no trato de Guilherme deMelo, já que não viveu na estratosfera, como nenhum de nós.

B)  UM RELATO PRELIMINAR  

Desde 2010, trabalho numa “revisita” a Guilherme de Melo.Começou com uma promessa de dizer alguma coisa sobre o autor daprimeira história da música no Brasil no I Colóquio/Encontro

Nordestino de Musicologia Histórica Brasileira. Pablo Sotuyoorganizou o evento, na UFBA. Preparei uma estrutura de tópicos efalei, sem redigir a exposição. Sentia-me familiar com a obra depois dosanos de que dela me servia para informações difíceis de obter noutroslugares. Por ser “provinciana” (uma das críticas recorrentes), o que semdúvida é, ela é importante para os estudos baianos. Primeiro, foram osestudos da modinha. Em seguida, partindo das canções que iam sendorecolhidas com a ajuda de muitos e acesso direto ao acervo do próprioMelo, no Rio de Janeiro, tornou-se indispensável o levantamento dosimpressos musicais da Bahia. Quase nada se sabia além de doisparágrafos densos de Mercedes Reis Pequeno9. Do levantamento dosimpressos a um projeto de dicionário regional, o DEMEM (“Dicionáriode Músicos e Expressões Musicais na Bahia”), a tarefa que se impunhaera ainda um germinar de sementes que Melo plantara.

Retornei à “revisita” não apenas porque Pablo me cobrava umtexto para inclusão nos Anais do evento, mas porque passei a perceberum simplismo de foco nas análises da obra de Guilherme de Melo, acomeçar das minhas próprias. Ela tem sido vista de cima para baixo, apartir de nossas ideias e de nosso tempo, nunca ao reverso. A estruturade tópicos que sobrevivera era basicamente uma divisão entre um“ontem” e um “hoje” em que anotara itens que me pareceramsignificativos nos dois tempos, principalmente nos de hoje. Com a

Internet ao alcance do dedo, o processo de redação de trabalhosmudou. Ainda assim pude apenas acrescentar alguns dados positivossobre o autor. Já sei o nome da esposa e que teve ao menos um filho,

9  Cf. “Impressão musical no Brasil”, in Marcos Antônio Marcondes, ed.

 Enciclopédia de música brasileira: erudita, folclórica e popular  (São Paulo: Art.Editora, 1977): 352-363. O verbete já teve várias edições, uma delas em Inglês, porsua excepcional importância. 

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mas deste não sei o nome, nem se sobreviveu. As poucas informaçõesse repetem de fonte secundária a fonte secundária. A cada item quedesenvolvia, entretanto, a estrutura de tópicos se tornava maisproblemática: patinava e espichava; tinha de revê-la. Nada de novonisso, mas não em tal grau. Defini melhor os tempos, calibrando orecuo necessário, mas ainda assim esse ontem e esse hoje teimam em sesuperpor. Minha intimidade, portanto, é infundada.

 A questão principal então é se vale a pena dar ânimo, tentarexplicar uma obra histórica que já passou dos cem anos. Parece-me quesim, se dela ainda pudermos extrair benefícios, levantar questões,iluminar períodos, até apontar para o que não se deve fazer. A obra éum clássico, por sua feição pioneira como marco inicial de umamusicologia brasileira. Mas tem erros, é de fato provinciana e poucoinformada, mas transuda informações. Que se poderia saber demúsica brasileira em 1908? No Brasil? Vista da Bahia? Teremos de ver tudo isso10.

 Ao contrário de seu contemporâneo Manoel Raymundo Querino(Santo Amaro, 1851 - Salvador, 1923), também um afrodescendentecomo tantos baianos ilustres, entre os quais Theodoro FernandesSampaio (Santo Amaro, 1855 - Rio de Janeiro, 1937), Guilherme deMelo não sabia se promover. Enquanto Querino, por exemplo,dedicava duas folhas inteiras de seu  Artistas Bahianos   (1909) a doisnomes coruscantes, Melo se contentou com um total de 37 linhas, deseu “Ao Leitor,” assim distribuídas: 14 linhas de desculpas pelosreduzidos “cabedais” a seu dispor e a reveladora informação de seu“desejo ardente de mostrar-vos com provas exuberantes, de que não

10  Estarão aqui considerados escritos sobre música que Paulo Castagna (2008)

corretamente enumera. São os de Manuel de Araujo Porto Alegre (não vi), deAfonso de Escragnolle Taunay (Visconde de Taunay) (1930), João BarbosaRodrigues e Sílvio Romero. São obras de interesse quase tão-somente literário, aosquais acrescento textos de Joaquim Norberto de Sousa e Silva e de Alexandre deMelo Moraes Filho voltados à introdução e divulgação de coletâneas predominanteou exclusivamente de textos de cantigas: as de A Cantora Brazileira [sic] (Norberto1878); Cantares Brasileiros (Moraes Filho 1900), com uma parte de música eSerenatas e Saraus (Moraes Filho 1901). Houve publicação desse último tipotambém na Bahia, o de Serões Bahianos (1881), sem comentário algum nemmenção do compilador, no que resta de um exemplar único, talvez, e muito

maltratado, que obtive. Quanto à inegável influência de Sílvio Romero, não énecessário indicar bibliografia sobre o muito que escreveu acerca de poesia popular, história da literatura brasileira, contos populares, cantos populares (semmúsica, exceto na edição repudiada de Theophilo Braga) e de crítica combativaque inclusive não poupou Joaquim Norberto (Cf. “Joaquim Norberto de Souza eSilva  –    por Sílvio Romero”, acesso em 07/07/2011 no endereço<http://www.consciencia.org/joaquim-norberto-de-souza-e-silva-por-silvio-romero>. Agradeço a colaboração que tenho recebido do Arquivo EdgardLeuenroth (AEL), Centro de Pesquisa e Documentação Social, IFCH/UNICAMP,

 pelas cópias em PDF dos microfilmes que me forneceram.

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somos um povo sem arte e sem literatura, como geralmente

dizem, e que pelo menos a Música no Brasil tem feiçãocaracterística e inteiramente nacional” (meu grifo). Agradece apenasa três figuras ora esquecidas, em tom reservado e formal, “a cujo auxílio[financeiro?] muito devo os incentivos [?] que me animaram  a estapublicação” (8 linhas, meu grifo). Conclui com os testemunhos de“sincera gratidão” ao Colégio dos Órfãos de S. Joaquim, até pelosclichês “caprichosamente feitos por um órfão da casa, que desde járevela um grande talento e que supriu a falta de tipos apropriados a estapublicação (7 linhas).

No corpo do livro, Melo dá crédito a um operoso músicoportuguês que se deixou transportar a Salvador, iludido por promessasde contratação que não se materializaram11, para a Academia de Belas Artes, atual Escola de Belas Artes da UFBA, fundada em 1877. Veiopara aqui falecer em 1896, dois anos após sua chegada. Este JoséBarreto de Avis (1852-1896), clarinetista e compositor, editor do Amphion , é nome esquecido das enciclopédias e dicionários portuguesesde música. Recebe de Melo o seguinte comentário:

Se não fosse Barreto de Avis, talvez que o Brasil deixasse de possuir estainsignificante obra [  A Música no Brasil ...] e um grosso compêndio complementarde música já pronto e em via de publicação, no qual ensino pelo métodointuitivo a filosofia de todas as regras musicais.” (1908, 291-292; 1947, 276,minha ênfase). 

Luiz Heitor é indulgente quando diz que “o livro foi recebidofestivamente, máxime pelos cultores da história pátria” (Mello 1947, ix-x) incluindo o Secretário Perpétuo do Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro, o jornalista e historiador Max Fleuiss (1868-1943), o cronistae historiador José Vieira Fazenda (1874-1917)12, e até mesmo umamenção no verbete, “Brésil”, da edição  francesa do  Musiklexikon de

11 Os anos de 1896/1898, como dissemos, foram terríveis para o Brasil inteiro e,

mais de perto, para os baianos: Canudos foi um Brasil distante, mais seco, trazidoaos olhos de todos de noite para o dia. Luiz Henrique Dias Tavares , mestre dahistória política e econômica, diz que “o Brasil era então [1897] um paísimobilizado por grave crise econômica e financeira, inflação ascendente,dissidências políticas, militares e sociais e ainda ameaçado em sua integridadeterritorial por confusos movimentos federalistas que se estendiam do Rio Grandedo Sul a Santa Catarina.” Dificilmente a administração de Luiz Vianna (1896-

1990), com metade do mandato consumido pelas dimensões nacionais políticas emilitares da guerra de Canudos, teria espaço para se ocupar de ensino oficial demúsica e Barreto de Avis. Melo percebe isto quando diz ter sido o músico português “acometido de um acesso de loucura artística” (1947: 273) ao acreditarna carta de Braz do Amaral, quando Diretor da Academia de Belas Artes,consultando-o sobre sua aceitação da direção do Conservatório de Música queesperava criar anexo à Academia.12 Fornece as fontes, datadas respectivamente de 1917 e 1927, para uma publicaçãode 1908.

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Riemann (1931)13. Sempre elegante e bondoso, Luiz Heitor parece terexagerado, neste caso. A acolhida à obra de Melo, no Rio de Janeiro, foirestrita a comentários de passagem de pessoas de indiscutível mérito,um deles bacharel em Direito, o outro médico, ambos historiadores, oque era próprio do tempo em que bacharéis, médicos e engenheiroscom tendências literárias se inclinavam para a história.

De fato, nem um deles tem o porte dos comentários econtribuições bem documentadas de 1910, de Francisco Marques deSousa Viterbo (1845-1910), e estas não foram absorvidas de pronto porhistoriadores brasileiros. Historiador, arqueólogo, jornalista, poeta,Sousa Viterbo foi homem de extraordinária dedicação aos arquivos e àhistória de Portugal. Para seu maior crédito, não pode ter lido, masouvido a leitura do livro de Melo, já que perdera inteiramente a visãopelos seus últimos cinco anos de vida. Ouviu-a com rigor e bondade, às vezes com uma ponta de ironia. Dele são os comentários de maiorimpacto. Faz correções e agrega um vasto estudo da música em igrejas

sujeitas à supervisão da Ordem de Cristo nos domínios ultramarinos dePortugal, já que Melo ignora a contribuição portuguesa outra que a de Jesuítas, nesse período14.

13 A obra de Melo aparece apenas como referência num verbete que não vai alémdo título.14

 A ortografia será atualizada e abrasileirada, exceto nos títulos, no que se perde osabor do texto de Sousa Viterbo. Trata-se de um longo estudo dividido emsegmentos no periódico O Instituto, Revista scientífica e litteraria, publicado naImprensa da Universidade de Coimbra, propriedade e edição da Scociedadescientífica  –   O Instituto de Coimbra, dirigida pelo Conde de Felgueiras, seuPresidente. A capa do 57º Volume (1910), reproduz um brasão ao centro, do qualconstam uma caravela no miolo e a divisa “Dos mares experimenta a furia insana”ao derredor. Os segmentos de “A ordem de Christo e a música religiosa nos nossosdomínios ultramarinos” vêm em sequências de páginas 10-19, 75-84, 146-153,274-281, 344-353, 412-420, 473-480, 536-543, 599-610, 693-698 e 737-747 deonze números do volume. Está dividido em seis partes correspondentes aosdomínios, com informações sustentadas pela transcrição de um total de 150documentos, dos quais apenas 29 dizem respeito ao “Brasil” (Primeira Parte),aproximadamente um quinto do total, infelizmente sem correspondência aotamanho do território e abrangência do bispado. Em adição ao “Brasil”, vêm o“Archipelago Açoreano” (Segunda Parte), o “Archipelago Madeirense” (TerceiraParte), “Praças da Africa” (Quarta Parte), “Archipelago de Cabo Verde” (QuintaParte) e “Ilhas de S. Tomé, e S. Paulo da Loanda” (Sexta Parte). Há uma promessade continuação “(Continúa)” na p. 747. De fato, estudos de Viterbo continuaram

 pelo volume seguinte, póstumo, mas não com a inclusão de domínios de Portugalna Ásia (Macau, Goa, entre eles), como seria de esperar, t ivesse vivido (faleceu em1910). Foi publicada uma separata de 50 volumes que não foram postos à venda. Oacesso foi feito em 10/07/2011 a <https://bdigital.sib.uc.pt/institutocoimbra/UCBG-A-24-37a41_v057/UCBG-A-24-37a41_v057_item1/P143.html>. Emrelação ao Brasil, 17 dos documentos anexados da Chancelaria da Ordem de Cristosão para “A Bahia de Todos os Santos” (A); 2 dizem respeito a S. Luiz doMaranhão” (B); 2 a “Pernambuco” (C), valendo-se de Melo para chegar a Pereirada Costa e, deste, a inclusão da irmandade de Santa Cecília, fundada no Recife, em1788; 6 documentos são de “S. Sebastião do Rio de Janeiro” (D); 1 documento

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Creio que a morte o alcançou subitamente, como ao provincianobaiano, uma vez que a publicação da série de documentos não chegouaos domínios ultramarinos da Ásia. Excede, entretanto, de muito oslimites da antiga Colônia, o Brasil. É um quinau, talvez mesmo umpretexto para oferecer informações valiosas que de muito acumulava. Tratar dessa contribuição paralela à de Melo, cotejando-as, é revelador.Há informações que poderiam ter constado das primeiras páginas dePereira de Melo, sem precisar acesso aos arquivos da Chancelaria daOrdem de Cristo. É o caso de Bartolomeu Pires, mestre de capelamencionado por Gabriel Soares de Sousa, no Roteiro do Brasil   [sic], jáque Melo compulsou a obra apenas para sublinhar a musicalidade dos Tupinambá (1908, 9; 1947, 9)15.

Se tiver tido a seu alcance a edição de 1851 de Sousa, a que Varnhagen reuniu, não restaria dúvida de que o autor de  A Música noBrasil  não reconhecesse outras contribuições musicais europeias, nesseperíodo, que não fossem as dos Jesuítas; ou, por outra, que teria tido

dificuldade em dar crédito à musicalidade do índio sem o missionárioao lado. Optou por dois fragmentos de Léry, se bem que os de maiorinteresse melódico e grafados em notação quadrada. Isso não contrariaa tese que Melo sustenta da existência de uma música brasileira (nãouma música no Brasil, como o título expressa), algo original e valiosoque resultou de influências sobre uma calha central em que os aportesse superpõem (as “influências”), inclusive de etnias não privilegiadas,que não são negadas. Já é um nacionalismo, embora não militante. O

 para “S. Paulo” (E); e 1 para “Marianna”. (F). Quanto à continuidade das publicações, já então póstumas, encontra-se disponível pelo endereço

<https://bdigital.sib.uc.pt/institutocoimbra/ UCBG-A-24-37a41_v058/UCBG-A-24-37a41_v058_item1/index.html>.15

 Melo menciona  Roteiro do Brasil  de Gabriel Soares. A obra de Gabriel Soaresde Sousa tornou-se justamente conhecida tanto como  Notícia do Brasil , quantocomo Tratado Descriptivo do Brazil em 1587 , conforme a edição de FranciscoAdolpho de Varnhagen, baseada no exame de muitos códices e manuscritosexistentes no Brasil, Portugal, Espanha e França, aos quais acrescentoucomentários, segundo declara na folha de rosto (Rio de Janeiro: TypographiaUniversal de Laemmert, 1851). O Tratado já poderia estar accessível a Guilhermede Melo numa das bibliotecas baianas de que se valeu. Melo pode também estarcitando a referência aos Tupinambá indiretamente. O trecho ignorado se acha à p.130 em que se refere a uma das ilhas  paradisíacas da Baía de Todos os Santos: “A

ilha de Maré é muito boa terra para canaviais, e algodões, e todos os mantimentos,onde está um engenho de açúcar que lavra com bois, que é de Bartholomeu Pires,mestre de capela da Sé, aonde estão assentados de sua mão passante de vintemoradores, os quais têm aqui uma igreja de Nossa Senhora das Neves, muito bemconcertada [consertada?], com seu cura que administra os Sacramentos a estesmoradores.” A igrejinha ainda existe com seus 424 anos (pelo menos), bemconcertada ou consertada. O que parece claro é que Bartolomeu Pires não era padre(não tinha de ser) e que já estava na tradição dos proprietários ausentes tendo deconciliar as obrigações de mestre de capela com as de senhor de engenho. Foihomem rico.

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livro é uma demonstração dessa tese. Cabe aqui apenas a percepçãoafetiva de Viterbo do homem que não conheceu, mas que de algumamaneira entendeu em suas intenções de comprovar a existência de umamúsica brasileira, na contramão de teorias evolucionistas e racistas daépoca. Diz logo ao início:

É inquestionável que o Brasil possui uma extraordinária aptidão e natural tendênciapara a música. Este sentimento bem fundo e arreigado, herdou-o não só das raçasaborígenes, como também das raças colonizadoras, europeia e africana”, disse ele(1910, 10).

E continua:

Estas influências étnicas, conjugadas com a influência da natureza e do clima,fundindo-se e depurando-se no mesmo cadinho, deram lugar ao gênio musical dopovo brasileiro, que o sr. Guilherme Theodoro Pereira de Mello considera de umaoriginalidade característica, acentuada sobretudo na modinha, cuja apoteose fazcom o maior entusiasmo no seu livro... (Viterbo 1910, 10). 

Raça. Natureza. Clima. Em vez de cultura. O retrato literáriomais perfeito dessa ideologia seria publicado em 1919, num sonetofamoso de Olavo Bilac, “Música brasileira”, parte de Tarde . Osindicadores do pensar da época convergem sobre a obra de Melo.

Na Bahia, a acolhida foi pior, se houve alguma. Melo diz ter-se valido dos recursos do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia e doGabinete Português de Leitura de Salvador. Ninguém parece tertomado conhecimento dele. O IGHB nada sabe, embora bibliotecáriase arquivista tentem ajudar. Quanto aos historiadores baianos,Guilherme de Melo nunca existiu. Isto precisa e pode ser corrigido.

Quanto à recepção mais recente, bons historiadores damusicologia histórica brasileira, entre os quais Antonio Alexandre Bispo(1999a; 1999b) e Paulo Castagna (2008)16, ambos altamente produtivos,se ocuparam de Guilherme de Melo. Dissertações de mestrado emdepartamentos de música e de história abordam a influência dessasideias (evolucionismo, positivismo, determinismo, racismo,nacionalismo) na incipiente produção musicológica dos primeiros anos

16 Paulo Castagna apresentou a palestra “Avanços e Perspectivas Na Musicologia

Histórica Brasileira” num ciclo organizado por Pablo Sotuyo Blanco, “Musicologia

e Patrimônio Musical”, realizado na Biblioteca Central da UFBA em 2004, para aPós-Graduação em Música da UFBA. A palestra tornou-se um importante artigo na Revista do Conservatório de Música da UFPel . A tese que Paulo adota é de que“apesar   da existência de trabalhos interessados no conhecimento da música

 brasileira já no século XIX, a musicologia iniciou o seu desenvolvimento no Brasilenquanto uma atividade intermediária entre literatura e ciência a partir da décadade 1900, mas começando a ser praticada segundo concepções propriamentecientíficas somente a partir da década de 1960.” Tem ainda inédito “A organizaçãomusical na Sé de Salvador, do cantochão à polifonia”, de 1994, em que incorpora

 plenamente a contribuição de Souza Viterbo, dentre outros.

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do século passado, inclusive de Melo. Nessa linha, vale também realçara dissertação e artigo de Dalton Martins Soares (2007a; 2007b) e a tesede Rogério Soares de Moura (2009), esta em história social da cultura,ambas com adições críticas relevantes ao cenário que Melo por sua vezfixou.

Em sua tese, Moura se interessa pela projeção das matrizesdelineados por Guilherme de Melo, Renato Almeida e Mário de Andrade, considerando o que pensavam sobre questões denacionalismo musical, música popular, música erudita, influênciasétnicas e modelos estético-estilísticas, num trabalho voltado para aconstrução da imagem de Alberto Nepomuceno. Nessa trilha Melonem sempre se mostrou um crítico perspicaz, entronizando CarlosGomes numa moldura que não tinha mais lugar para ele.

Clássica a obra, dissemos, mas não no sentido literal do termo,isto é, do que sirva de modelo, do que seja para ser imitado sem ser

revisto, de ser obra exemplar, a de Guilherme de Melo, contudo, foiimitada, sem dúvida, pelo menos até a publicação de 150 Anos de Músicano Brasil de Luiz Heitor (1956)17. A de Cernicchiaro (1926), que algunsprivilegiam, não é tão flagrante quanto a de Renato Almeida,teoricamente mais sofisticado mas carente de formação musicalmínima. Cernicchiaro chega ao ponto de fazer erros de tradução naleitura de Melo e daí criar gente que nunca existiu e multiplicar canções,no que é prontamente imitado na segunda edição de Renato Almeida(1942), e daí exportado para os dicionários e enciclopédias de ondedificilmente sairão (cf. Veiga 2006, 21-22).

Caberia a Luiz Heitor, melhor que ninguém, a elaboração de umasegunda edição (na realidade a terceira) de  A Música no Brasil   (Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1947), tendo desistido de corrigi-la eatualizá-la, como pretendia, pela pressão do tempo e vulto dasexigências que lhe fariam a edição princeps18.

17 Luiz Heitor Corrêa de Azevedo, ou simplesmente Luiz Heitor (Rio de Janeiro,

1905  –   Paris, 1992), bibliotecário do INM desde 1932 (sucedeu a Melo),historiador, folclorista, musicólogo, professor visitante em várias universidades

estrangeiras, editor de periódicos, foi representante do Brasil em setoresimportantes de música na OEA e na UNESCO.18 A edição de (1922) é de acesso difícil. Consegui-o apenas em 14/08/2011, noendereço <http://memoria.nemesis.org.br/index.php?p=1> onde o item 59.1

 permite baixar o texto inteiro do vol. 1. “A Música no Brasil” aparece com o títuloencurtado. É o item B (sem um A anterior) do Capítulo Trigèsimo-sexto, que nosdá a “História Artística”, esta redigida por Argeu Guimarães (pp. 1585-1621). Ocapítulo sobre música é o último do volume, precedendo apenas a biografias eretratos de figurões reunidos por Ramiz Galvão. 

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 A Bibliografia Musical Brasileira (1820-1950)  (1952) contou com aassistência impecável de Mercedes Moura Reis e de Cleofe Person deMatos e o conhecimento particular que Luiz Heitor teve da obra queeditara. Juntos, dão uma referência bibliográfica completa à obra deMelo no item B-157, seção dedicada a Etnografia e Folclore, assimcomo na seção C, de História. Melo foi o iniciador da prática de se darenorme espaço a folclore musical em obras de história.

No item não numerado da seção C, se faz apenas remissão. Areferência completa, no item B-157, inclui a edição baiana (1908), hojerara, e a carioca tampouco disponível e há muito esgotada,supervisionada pelo próprio Luiz Heitor (1947), como segunda edição. Assinalam-se 306 pp. à primeira (aí contada até a folha de rosto);362.pp. à segunda (sem inclusão das numeradas em algarismosromanos). Quanto à edição incluída no Diccionario,  que veremos emseguida, apenas apõem ao livro de 1908 a expressão: “Foi republicado

no   Dicionário Histórico, Geográfico  e Etnográfico do Brasil,

1922, p.1621-1679 ” (minhas aspas e realce). 

 A edição de 1922, embora ainda necessite um cotejo maiscuidadoso com a de 1908, é de fato a segunda edição, não umareimpressão. Temos aqui, portanto, um pequeno problemabibliográfico. Projeto de grande porte, como se depreende do textointrodutório de B. F. Ramiz Galvão, teve dois tomos publicados, oprimeiro como Introdução Geral , com 1702 páginas, tratando do Brasilcomo um todo. Um segundo, também disponível, destinou-se aosEstados, começando dos do Norte, mas não inclui todos. Outrostomos viriam se as informações solicitadas aos Estados chegassem?

Não foi organizado por Theodoro Sampaio, como consta de seu verbete na Wikipedia. 

 À primeira vista, não parecia possível uma edição completa dotexto de Melo no Diccionario. Embora o texto tenha sido publicado emduas colunas por página, o número bem menor de páginas pareciaindicar o contrário. A inclusão dos exemplos musicais, por sua vez,exigindo uma clientela de leitores familiarizados com notaçãotradicional, pareceria também implicar em cortes. Com provávelanuência do autor,  pequenas alterações foram feitas nos títulos doscapítulos, mas não houve corte dos exemplos musicais. Pelo contrário,

a evidência é de que as mesmas placas das gravuras de música usadaspara a edição de 1908 foram aproveitadas para a de 1922.

 Além da redução do título, apenas a “A Música no Brasil”,contudo, há também pequenas modificações nos capítulos cujanumeração é supressa e dá lugar a designações de períodos, estessubdivididos em “influências”: Período de formação, incluindo ainfluência indígena e a jesuítica; Período de caracterização, com ainfluência portuguesa, africana e espanhola. Aqui aparece a maioria dos

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exemplos folclóricos: ranchos, ternos, cheganças, congos e taieiras,quicumbres e quilombos, reinados, reisados, cantares de roda,cantilenas de berço, canções báquicas, aboios, arrazoar (cantar tiranasao desafio), romances, xácaras, cânticos de viático e benditos. É de sesupor um terceiro período, pelo menos, que abarcasse outras“influências” deixadas soltas: Bragantina, de D. João VI, de Pedro I, dePedro II e, finalmente a Republicana.

Numa primeira e difícil leitura dessa publicação de 1922, oanterior Capítulo IV da edição de 1908, mantido na de 1947

(“Período de degradação”), não aparece. Teria sido “limado”, ousimplesmente julgado desatualizado e supérfluo. Malgrado o corte doCapítulo, persistem as baianadas (com o perdão de meus conterrâneos):exagero nas hipérboles, excesso de adjetivos e de advérbios, gênio portoda parte. Como não há uma convenção gráfica na hierarquia dostítulos, subtítulos e itens, nem números, a tarefa de destrinchá-los não éfácil. Para todos os efeitos, ora nos parece que esta edição, ainda em

 vida de Guilherme de Melo, deverá ser tomada como base paraconsolidação do texto, levando-se em conta, também, o esboço dereedição em que o autor já vinha trabalhando em 1932, quando faleceu.Estes papéis foram confiados, pela família, à guarda de Luiz Heitor eestarão, espera-se, entre os documentos do acervo do mesmo naBiblioteca do Congresso, em Washington. Há também de se buscaro manuscrito da obra teórica que Guilherme de Melo teve pronto

 para publicação, conforme dito pelo autor.

 A insatisfação social e política das camadas sociais médias deSalvador, no período da elaboração de  Música no Brasil , como Luiz

Henrique assinala (2008: 315), também se reflete na história cultural daqual este respeitado historiador não se ocupa, no que diz respeito amúsica. Detalhes da obra podem refletir os abalos. Entre os reisados,por exemplo, Melo dá destaque ao “Zé do Vale”, um matador, quecompara com Lucas de Feira19. Segundo o saudoso Nelson Araújo,estudioso do teatro popular, a versão de Melo seria a primeiraconhecida. A presença de Sylvio Romero nas concepções de Guilhermede Melo, até mesmo em relação à contribuição do índio é tambémprojetada na obra em apreço. Guilherme de Melo nada apresenta demúsica indígena que tivesse ouvido. Opta apenas por dois dosfragmentos de música Tupinambá que pôde ter em mãos graças à

publicação de Eduardo da Silva Prado (1889) pela qual entraram na

19  Há um texto de Guimarães Covas, delegado em Feira de Santana no final do

século XIX e início do século XX, escrito em 1907, em que transcreve o julgamento de Lucas Evangelista no primeiro volume publicado de Municípios daBahia. que ele dedica ao Instituto Geográfico e Histórico da Bahia Disponível em<http://www.feiradesantanna.com.br/livro_municipios.htm>, acesso em05/08/2011 

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historiografia brasileira. Selecionou dois dos cinco fragmentos: os quelhe pareceram de maior interesse melódico20.

Nas repercussões artísticas de longo alcance, cumpre assinalarMelo como uma das fontes para a elaboração do Guia Prático de Villa-Lobos (2009), conforme comunicação pessoal de seu principal editor,que também nos põe às mãos o exemplar de  A Música no Brasil , daedição de 1908, com anotações do punho de Luiz Heitor. Verifique-seabaixo a correspondência recebida do musicólogo e membro da Academia Brasileira de Música, Manoel Corrêa do Lago, amigo pessoalde Luiz Heitor21.

Conclusões aqui são ainda provisórias, mas serão hipóteses sobreas quais esta proposta se apoia: de que Guilherme de Melo pretendeude fato escrever uma história da música brasileira, não da música no

Brasil, como o título indica; que é uma expressão precoce de umnacionalismo que, no gênero, se atribui a Mário de Andrade e a Renato

 Almeida duas décadas mais tarde; que o autor lutou e demonstrou apossibilidade de uma civilização à revelia das doutrinas deterministas(sobretudo geográfico, clima) e evolucionistas da época (“raças”inferiores, com o agravante da “mestiçagem”) contra as quais serebelou; que as avaliações relativamente recentes de competentesmusicólogos não chegam a iluminar a obra porquanto a veem de cimapara baixo, no tempo, e de fora para dentro, no espaço, isto é,descontextualizada, concluindo pelo óbvio: carência de informação,provincialismo, incoerência; que não se tem urdido a trama que existiuentre a obra, seu autor, seu lugar e seu tempo.

 As realizações originais do caldeamento foram, segundo Mello,na música popular a modinha, o lundu e a tirana; no caso da música

20 Prado, um bibliófilo, valeu-se da edição da Histoire d'un voyage faict en la terre

du Brésil , de Jean de Léry, como aparece em  America Tertia Pars Memorabilis

 provinciae Brasiliae, de 1592, impressa por Théodore De Bry. Nesta, os cantosforam corrigidos, sendo-lhes dada uma feição mais próxima de cantochãogregoriano. Um tratamento exaustivo dos cinco fragmentos de música Tupinambá(coletados, ou não?) por Jean de Léry pode ser encontrado na edição fac-similar deminha dissertação de doutorado, “Toward a Brazilian Etnomusicology:Amerindian Phases” UCLA, 1961, in (Sotuyo Blanco 2004, 267-296). 21

 Caro Manuel [Veiga],

Que ótimo! [a revisita e reedição de Melo]Sou fã do Guilherme de Melo, ao qual muito recorrí por ocasião da reedição doGuia Prático,- pois além do “Dona Sancha”, a “Condessa” e o “Xô Passarinho” noGP também se originaram nele (sem falar, para ficar com o Villa-Lobos, noscantos do Lery...) –  e a Violeta me presenteou os exemplares do Luiz Heitor da 1ª(com anotações) e 2ª edições, que evidentemente estão às suas ordens, caso possamser úteis.Acho da maior importância ele finalmente merecer um verdadeiro estudo!Será um enorme prazer encontrá-lo. Até lá, e um grande abraço doManoel [Corrêa do Lago] 

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acadêmica, Carlos Gomes, com o comprovante do reconhecimento noexterior. Em relação a este, que fez cinco visitas a Salvador, entre 1881e 1895. O entusiasmo com que foi recebido deixou marca, até em nomede rua importante da cidade. Isto ocorre quando, a partir daproclamação da República (1889), ou até antes, o público brasileiromais sofisticado já começava se afastar do italianismo que Gomesrepresentava: Leopoldo Miguez, Francisco Braga, AlbertoNepomuceno, Henrique Oswald, o próprio Froes, na Bahia, surgiamsob outras influências norte-europeias interessados em obrascamerísticas e sinfônicas, deixando o eventual verismo operático paraum público de imigrantes italianos de São Paulo, alvo de algumastiradas da música-de-pancadaria de Mário de Andrade. Músicaitalianada, nessa época, seria vista como uma negação da músicanacional, que Melo desejou, mas que em seu distanciamento e poucaacuidade crítica não pôde perceber.

 Trata-se de uma arqueologia que, na hipótese de uma carência de

dados factuais, poderá ser complementada com uma teoria da culturatendente à antropologia psicológica, mas anterior a ela: “Cultura ePersonalidade” à Ruth Benedict e Margareth Mead, pode ser o caso. 

 A metodologia a ser seguida, inclui a pesquisa em arquivos ejornais, assim como as discussões em seminários das tendênciasprincipais da musicologia atual. Criar-se-á o necessário confronto entreas idéias correntes em 1908 e as de hoje. No que se refere ao preparoda edição da obra, tratar-se-á da fixação do texto, privilegiando a ediçãode 1922, por ter sido realizada ainda em vida do autor, masconfrontando-a com a de 1908 e o projeto do próprio Melo anterior a

1932, tendo de localizá-lo. Os textos terão de ser digitalizados comotexto, não como imagem. Uma leitura fina já deverá ser a preparação deum índice, levantando minuciosamente nomes, obras, fontes, citações,peças musicais, instituições, idéias. Correções de erros grosseiros serãofeitas no corpo do texto, com uma correspondente alusão em nota derodapé. Notas copiosas de fim de capítulo tratarão dos comentáriosfeitos na perspectiva do tempo e do estado atual de conhecimento. Umensaio introdutório dará uma visão abrangente da obra e de suaimportância. A manutenção do título original encurtado poderá secomplementado por um subtítulo expressivo já sob a supervisão daeditora universitária, assim como a atualização ortográfica e

normatização consistentes.

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 A  UNIVERSIDADE FEDERAL DA B AHIA

E A COMPOSIÇÃO MUSICAL NO SÉCULO XX:  

M ARCOS HISTÓRICOS 

Ilza Nogueira (UFPB)

Há 20 anos venho desenvolvendo uma pesquisa, cujo objeto deestudo é a produção composicional desenvolvida na UniversidadeFederal da Bahia, no período entre 1965 e 1999. Nesta apresentação,quero inicialmente apresentar o objeto de estudo em seu contextohistórico, e em seguida, a pesquisa propriamente dita, com relação aosseus objetivos, realizações e perspectivas.

UM BREVE HISTÓRICO  

O fomento às atividades composicionais na Universidade Federalda Bahia, estimulante do desenvolvimento do ensino de composiçãoque conduziu à formação do Grupo de Compositores da Bahia em abrilde 1966, teve seu “marco inicial” no Concurso Nacional deComposição realizado em 30.11.1965, com patrocínio do Ministério daEducação e Cultura, da então denominada Universidade da Bahia1 e doInstituto de Cultura Hispânica. Nesse evento, foram premiadosNikolau Kokron (  A Grande Cidade , 1.º prêmio) e Milton Gomes(  Nordeste , Prêmio do Público). Nessa época, Ernst Widmer era oprofessor de composição dos “Seminários de Música”2 em substituição

a Koellreutter, que deixara a Bahia em 1963. Ele também era o Diretorda escola, devendo-se considerar que a confluência do cargo

1 Data de 20.8.1965 a Lei n.º 4.759, que dispõe sobre a denominação e qualificaçãodas Universidades e Escolas Técnicas Federais, por meio da qual a “Universidadeda Bahia” passa a denominar -se “Universidade Federal da Bahia”. 2  Denominação da unidade de ensino musical da UFBA no período de 1965 a1968.

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administrativo e da responsabilidade total pela disciplina davam àcomposição relevância e prestígio político no âmbito da universidade.

 A maioria dos membros do Grupo de Compositores foramalunos der Widmer. A respeito do ensino de composição, ele assim seexpressou, já no final de sua vida: “A meu ver o professor decomposição deve interferir o menos possível e propiciar o maispossível. Nada de regras, apenas abrir horizontes, fazer conhecer obrascontemporâneas de todas as correntes e aplicar exercícios técnicosindividualizados a fim de aguçar o metier .” (WIDMER 1988) 

Essa postura, de certa forma, reflete as ideias divulgadas porKoellreutter em 1954, quando, a convite do então Reitor EdgardSantos, implantou no seio da então “Universidade da Bahia” os “Seminários Internacionais de Música”, um evento de periodicidadeanual, cujas duas primeiras edições tiveram a colaboração da “EscolaLivre de Música Pro- Arte” de São Paulo.3  Na abertura do primeiro

desses seminários, realizado entre junho e julho de 1954, Koellreutterassegurava: 

Os Seminários oferecerão [...] um autêntico ensino artístico baseado nosfundamentos de uma cultura geral, num programa moderno e eficiente que respeiteno aluno os seus dons naturais, desenvolva sua personalidade e o conduza àprocura de estilo e expressão próprios, em substituição do ensino acadêmico,baseado em fórmulas e regras que matam a força criadora e reduzem a arte a umprocesso.Os Seminários constituirão um verdadeiro laboratório artístico de alunos e mestres,em cujo recinto serão livres, inteiramente livres, a opinião, as ideias e, o que édecisivo, a crítica. (Apud BASTIANELLI 2003, p. 5, grifos nossos) 

 Após apenas três meses da realização do “I SeminárioInternacional de Música”, Edgard Santos fundava, no âmbito doprocesso de criação do “Setor de Música” da Universidade, a nova“unidade permanente” de ensino musical, a qual absorvia a ideologiadidática do evento inspirador da sua origem. Isso parece ter-se refletidono nome escolhido para a escola: “Seminários Livres de Música”. Essadenominação foi reduzida para “Seminários de Música” em 1963 ou1964.4 

Essa digressão ao passado dos Seminários de Música vem

demonstrar a nascente da ideologia pedagógica desenvolvida por3 O evento teve seis edições, entre 1954 e 1959. Sobre o histórico da implantaçãodos Seminários Internacionais de Música, remeto o leitor ao Capítulo III da tese deDoutoramento da Prof.ª Maria da Conceição Costa Perrone “Música, Contexto e

Tradição: Estudo sobre a Criação de uma Instituição de Ensino” (UFBA, 2008). 4 Segundo PERRONE (2008, 109), em 1963 a nova denominação já era vigente.

 No entanto, em programas de concertos do ano de 1964, ainda consta adenominação antiga.

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 Widmer a partir de 1963, quando assumiu tanto a Direção da Escolaquanto a liderança do ensino de composição na UBa. Num ensaioautobiográfico escrito em 1980 (“Esboço de um auto-retrato sobdiferentes pontos de vista”), Widmer se refere ao que mais o atraiu nosSeminários Livres de Música, quando da sua chegada à Bahia em 1956:“Os programas de ensino não congelados deixaram-me respirar, criaruma nova atmosfera, e desenvolver, em pouco tempo, um trabalhomuito mais intensivo e abrangente do que me teria sido possível realizarna Suíça.” (WIDMER 1980) 

 Além do mencionado Concurso Nacional de Composiçãorealizado em 30.11.1965, outra motivação que se situa nas bases dafundação do Grupo de Compositores da Bahia em abril de 1966 foi aturnê do Madrigal da UFBA aos Estados Unidos,5 conseqüente da suaparticipação no I Festival Internacional de Corais Universitários,realizado no Lincoln Center for the Performing Arts   de New York, emsetembro de 1965. Sobre esse estímulo, Fernando Cerqueira depôs

recentemente: 

Eu e Lindembergue começamos a compor os arranjos para o Madrigal no verão de1965, quando já recebíamos orientações de Widmer. Numa certa manhã dedezembro de 1964 ou janeiro de 1965, deitados ao sol do Porto da Barra,escolhemos os temas de nossas primeiras peças: Reisado do Piau   (dele) e  Quando oVento Dava   (minha). Foram nossas primeiras peças na Escola. (CERQUEIRA,2009)

Nessa ocasião, os arranjos de Cardoso e Cerqueira foramgravados nos Estados Unidos pelo Madrigal, no LP “Brazilian StudentsSing”.6  Considerando que o sucesso do grupo nos Estados Unidoslevou o Madrigal a uma turnê nacional em 1966,7  que Widmer foi oregente do grupo até 1967, e que Lindembergue Cardoso e FernandoCerqueira integravam o naipe dos tenores, pode-se justificar a grandequantidade de arranjos do folclore nordestino e da música popularbrasileira para coro a cappella  compostos por eles entre 1965 e 1967.8 

5  Entre 20.9 3 7.10.1965, o Madrigal da UFBA se apresentou nas seguintescidades: New York, Boston, Waltham, Reading e Amherst.6 Request Records, SRLP 8091.7  A turnê brasileira do Madrigal, realizada entre Agosto e Setembro de 1966,

incluiu as cidades de São Paulo, Piracicaba, Santos, Salto, Curitiba, Santa Maria,Porto Alegre, Belo Horizonte e Salvador.8  No período, Widmer arranjou  Iemanjá (arranjo de um arranjo de Kilza Setti,1965),  Farinhada (1966), O carreteiro (1966), O lê lê ô Bahia  (1966/67),  Xôarara  (1966),  Europa, França e Bahia (1967),  É doce morrer no mar (1967), ecompôs seus 5 Quodlibets sobre canções do folclore brasileiro  op. 42 (1966). DeCardoso, constam no período, além do mencionado  Reizado do Piau  (1965), Reizado dos Compadres (1966), Reizado do Bicho Turuna (1966), Aboio (1966), O Mar   (1966, D. Caymmi), Canção da Partida  (1966, D.Caymmi) e  Disparada (1967, G. Vandré). Cerqueira, além do citado arranjo de Quando o vento dava 

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 Apesar dos mencionados estímulos à composição no ano de1965, contrapesou o fato de Widmer ter-se ausentado, em grande partedo ano, para cumprir uma bolsa de estudos na Suíça. Isso levou JamaryOliveira a acompanhar um grupo de estudantes dos Seminários deMúsica que, em março de 1965, mudou-se para Brasília. A meta era aUnB, a nova e moderna instituição universitária,9  cujo planoeducacional foi concebido pelo jurista e pedagogo baiano Anísio Teixeira (1900 - 1971) e pelo antropólogo e educador mineiro DarcyRibeiro (1922-1997) para ser, na concepção do arquiteto Lúcio Costa,um "foco de cultura dos mais lúcidos e sensíveis do país" (MORHY2001). A motivação dos estudantes baianos não era tanto a linhapolítico-ideológica esquerdista palpitante naquela instituição. Antes,tinha a ver com a expressividade intelectual dos docentes queintegravam o novo Departamento de Música, implantado e coordenadopor Cláudio Santoro, e do qual, no que diz respeito à área deComposição, além de Santoro, também faziam parte Damiano Cozzelae Rogério Duprat. Vale lembrar que Santoro foi um dos signatários do

“Manifesto Música Viva” (Nov.1946), e que Cozzela e os irmãosDuprat foram signatários do “Manifesto Música Nova” (Março de1963). Segundo Régis Duprat e Maria Alice Volpe em “Vanguardas eposturas de esquerda na música brasileira (1920-1970)” (2010),

Brasília foi cenário do re-encontro de representantes do movimento Música Viva edo grupo Música Nova. Santoro convidou integrantes do Grupo Música Novapara o magistério e a atuação musical nos concertos semanais entusiasticamenteconcorridos na nova Universidade. Logo o cenário tornou-se representativo doconfronto entre as ditaduras e os movimentos musicais na América Latina, na crisede 1966-68 que culminou com a decretação do Ato Institucional n.º 5, quando atruculência e o arbítrio da ditadura militar esvaziaram o corpo docente da

Universidade de Brasília. O promissor encontro institucional entre membrosextremamente representativos dos movimentos Música Viva e Música Nova foiabortado prematuramente pela ditadura militar, deixando no ar a indagação sobretudo o que tal encontro poderia ter realizado no bojo da universidade.(p. 598)

Se Jamary Oliveira chegou em Brasília no final de março de 1965, vejamos o que ele vivenciou no novo ambiente universitário, desde diasapós a sua chegada. No dia 09 de abril, o campus da UnB foi invadidopela Polícia Militar de Minas Gerais, e 14 professores foram presos. Nodia 13 de abril, um decreto extinguiu os mandatos dos membros doConselho Diretor da Fundação Universidade de Brasília, inclusive doseu Presidente e Reitor Anísio Teixeira. O ministro da Educação (Luiz Antônio da Gama e Silva) determinou a intervenção na UnB adreferendum  do Conselho Federal de Educação, indicando o Dr. Zeferino

(1965), compôs em 1966 Sambas de Roda na Capoeira  e arranjou  Imbalança (Luiz Gonzaga).9 A UnB iniciou as atividades acadêmicas em 21 de abril de 1962.

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 Vaz, professor da USP, como Reitor  pro-tempore , confirmado no cargopelo novo Conselho Diretor. A UnB entra em um período dedemissões arbitrárias de docentes, por “incompatibilidade política coma Revolução". O clima de perseguição espalhou insegurança e agitou osestudantes, que, mobilizados através da Federação dos EstudantesUniversitários de Brasília (FEUB), exigiam a readmissão dosprofessores. Desgastado, o Reitor renunciou ao cargo. Seu substituto(Laerte Ramos de Carvalho), diante da crise, suspendeu as atividadesacadêmicas e solicitou ao Departamento Federal de Segurança Públicao envio de tropas policiais para garantir a integridade patrimonial daUniversidade. A ocupação policial durou uma semana. A crise chegouao desgaste máximo quando, no dia 18 de outubro, 15 professoresconsiderados subversivos foram arbitrariamente demitidos.Considerando que a instituição não mais oferecia as condições mínimasde tranquilidade para o ensino, pesquisa ou qualquer outro trabalhointelectual, 209 docentes enviaram seu pedido de demissão coletivo àReitoria, e 79% da UnB parou. Dentre os demissionários do

Departamento de Música do Instituto Central de Artes, encontravam-seCláudio Santoro, Damiano e Maria Amélia Cozzella, Régis e RogérioDuprat. Consequentemente, em novembro, Jamary regressou aSalvador. Em depoimento concedido à nossa pesquisa em maio de2010, ele diz sobre sua experiência no curto tempo em que estudou naUnB: 

fui aluno de Cozzella. Foi um ano conturbado, de pouco aproveitamento, e queculminou com o fechamento da UnB. Ponto positivos: tive contato com otrabalho então realizado por Rogério Duprat e Damiano Cozzella, que utilizava ocomputador para análise de obras de Mozart, [10]  e aproveitei a biblioteca quecontinha muitas partituras e gravações de música do século XX. Conheci, entre

outros, Claudio Santoro e Régis Duprat com os quais mantive uma amizadeduradoura. De lá, quase fui para São Paulo. Se tivesse ido, teria, provavelmente,participado do trabalho da Tropicália junto com Cozzella e Rogério. Retornei paraSalvador, ao que me lembro, em novembro, e fiquei vagando atrás de emprego.No início de 1967 fui contratado como Auxiliar de Ensino [...] da escola.(OLIVEIRA 2010)

Provavelmente pelo seu afastamento de Salvador em 1965, Jamary Oliveira não escreveu para a turnê do Madrigal aos EstadosUnidos, como o fizeram Widmer, Cardoso e Cerqueira. No entanto, emabril de 1966 ele participou do evento intitulado “Semana Santa naBahia”, com um programa de concerto realizado em três récitas, para oqual sete compositores da UFBA escreveram pequenos oratórios para

10 Segundo Régis Duprat e Maria Alice Volpe (2010 p. 592), “entre 1962 e 1963,Rogério Duprat e Damiano Cozzella, [...], inspirados no envolvimento com amáquina e no processamento analítico e criativo, absorvem-se em programaçõescom o computador na cadeira de Cálculo Matemático da Universidade de SãoPaulo, no sentido de proceder à análise musical estatística da música tradicional e àcriação de música nova.” (Nota da autora). 

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coro, sopros e percussão.11 Com o sucesso inesperado da apresentação,esses compositores começaram a se reunir semanalmente para discutirsobre música, educação e seus trabalhos de composição. Como disse Widmer em 1968, “aí estava o Grupo [de Compositores da Bahia] , semestatutos nem ata de fundação, mas com um acervo considerável deobras” (  WIDMER 1968, p. 6). Segundo Paula Oliveira,  em suadissertação intitulada “Grupo de Compositores da Bahia (1966-1974):Desenvolvimento e Identidade”, o Grupo de Compositores da Bahia sederivou do “Grupo Experimental de Percussão da UFBA” (cf.OLIVEIRA 2010, p. 45, 86). Com efeito, a integração do GrupoExperimental de Percussão que consta do programa do concerto daSemana Santa de 66 inclui membros fundadores do Grupo deCompositores (Tom Zé e Jamary Oliveira) e outros que aderiram aoGrupo posteriormente (Lucemar Alcântara e Alda Ribeiro de Jesus).Segundo depõe Jamary Oliveira,

Podemos considerar o Grupo Experimental de Percussão, primeiro conjunto de

percussão do país, criado em 1964, como o principal precursor do Grupo deCompositores da Bahia. Dele fizeram parte quase todos os membros fundadoresdo Grupo. (apud OLIVEIRA, op. cit., p. 87)12 

Originalmente, o Grupo de Compositores da Bahia se constituiude 10 membros: Antônio José Santana Martins (Tom Zé), CarlosRodrigues de Carvalho, Carmem Mettig Rocha, Ernst Widmer,Fernando Cerqueira, Jamary Oliveira, Lindembergue Cardoso, MiltonGomes, Nikolau Kokron Yoo, e Rinaldo Rossi. Nesse ano,apresentaram em mais 16 concertos, estreando mais 17 obras de seusintegrantes e de outros compositores que escreviam incentivados peloGrupo. Falando das atividades do ano de 1966 em comparação ao que

sucedeu no ano anterior, Jamary Oliveira comenta: 

O ano de 1966, ano de fundação do Grupo, foi também atípico, mas na direçãocontrária ao do ano anterior: muitas atividades, muita novidade, o incentivo aoexperimental, o início da divulgação nos dois sentidos, do exterior para o Grupo edo Grupo para onde pudéssemos estar presentes. A partir do concerto da Semana Santa de 1966, iniciamos uma série de projetos visando à execução e divulgação de nossa música, alguns com evidente sucesso eque sobreviveram à existência do Grupo, tais como as Apresentações deCompositores da Bahia e os Festivais de Música Nova. Outros mais diretamente

11  Elegia de F. Cerqueira, Exortação Agônica de M. Gomes, Pilatus de N. Kokron, Nu  de J. Oliveira,  Impropérios  de A. J. Santana Martins , Do Diálogo e Morte do Agoniad o de R. Rossi e Diálogo do Anjo com as três Mulheres de E. Widmer.12  Vale salientar que os registros, na dissertação de Paula Oliveira, sobre o

 pioneirismo brasileiro do Grupo Experimental de Percussão da UBa, bem como dasua íntima vinculação ao Grupo de Compositores da Bahia, é significativo, porque:1) não se havia resgatado essa informação na literatura sobre a música brasileira; e2) a informação é esclarecedora da importância que a percussão assume, desdeentão, na música do Grupo.

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associados à atuação do Grupo cessaram com o final das suas atividades, tal comoos Boletins. (Idem)

Em novembro de 1966, na ocasião de um concerto do Gruporealizado no Instituo Cultural Brasil Alemanha  –   “Compositores daBahia & Música Popular Experimental”  –   tem origem a sua famosa

“Declaração de Princípios” (v. Anexo I), um documento elaborado por Jamary Oliveira e Milton Gomes para ser inserido no programa doconcerto. Em seu famoso Parágrafo único  –  “Estamos contra todo equalquer princípio declarado” – , a atitude rebelde, iconoclasta, tanto sejustifica na ideologia de ensino plantada por Koellreutter e Widmer nosSeminários Livres de Música, quanto no palco dos acontecimentospolíticos e sociais da época. Um documento de época, esse texto revelaa postura rebelde da juventude brasileira dos anos 60 diante darepressão às formas de expressão artística. É um depoimento implícitosobre o patrulhamento dos espetáculos e, principalmente, sobre otemor ao poder de significação, comunicação e mobilização social das

artes. Em forma de documento institucional (uma resolução), aDeclaração de Princípios consta de dois breves capítulos: o primeirocontém um “Artigo único”, que, fora da Escola de Música daUniversidade Federal Bahia, é o que geralmente se conhece como “omanifesto de 66”. Esta epígrafe do documento chama a atenção peloteor paradoxal: “Estamos contra todo e qualquer princípio declarado”.Com esta frase, qualquer expectativa criada pelo título do documento  –  “Declaração de princípios” –  está frustrada. E o “Artigo único” podeser entendido dessa forma: “É isto o que não vamos querer/fazer/ter:princípios.” Mas, princípios de que ordem? “Estamos contra” que tipode princípios, a priori ? Estéticos? Ideológicos? Políticos? A não-

permissão da divulgação do documento na ocasião para a qual ele foiredigido (o concerto de 30.11.66) deixa clara que foi percebida aterceira hipótese: os princípios políticos vigentes.

O Capítulo II consta de seis curtas “deliberações” de uma“Assembléia ordinária” fictícia13  sobre os tipos de manifestaçãopermitidos ao público do evento e sobre a responsabilidade do queocorresse (“princípios éticos”). Há palavras omitidas, como se tivessemsido “censuradas”, no que o documento é caricato (e crítico) do que erarotineiro na época: a censura às formas de expressão verbal (oral eescrita). Humor e ironia são a tônica de um discurso essencialmentelúdico, que conclui com uma paródia sobre a frase que serve comoartigo conclusivo aos documentos legislativos: “não  se revoguein disposições em contrário” (nosso grifo). Em lugar do que se esperanormalmente de notas para um programa de concerto (dados sobre oscompositores e as respectivas obras), o Grupo de Compositores da

13 O que se depreende do texto de Jamary Oliveira, O Grupo de Compositores daBahia e a sua Declaração de Princípios   [Cf.  Marcos Teóricos da ComposiçãoContemporânea na UFBA, vol. 3, p. 2-3, 2006. Disponível em:<http://www.mhccufba.ufba.br/publicacoesProjetos.php?serie=2>.].

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Bahia se apresenta com um discurso tipicamente “anárquico” e“galhofeiro”. Seria o texto uma reação vanguardista ao convencional?Uma provocação? Um ato de rebeldia? Teriam os compositoresdiretamente responsáveis pelo documento  –   Jamary Oliveira e MiltonGomes  –   o desejo único de ironizar (assim censurando) a censuraimposta aos espetáculos da época?

Na época, a “Declaração de princípios” foi certamente percebidacomo insinuação de um manifesto político, pois foi boicotada  –  apreendida e destruída  –   pela direção do Instituto Cultural Brasil- Alemanha em Salvador, instituição que abrigava o concerto do Grupo,antes que o público e a censura do governo militar dela pudessemtomar conhecimento.

 Vinte anos mais tarde, Widmer se referiu ao Artigo Único daDeclaração de Princípios, considerando-o antes sob o aspecto estético-ideológico do que sociopolítico:

Embora aparentemente sem rumo, esta premissa ainda hoje é válida [...]. Além

disso, permitiu deixar de lado rixas naturais entre facções [...]. Ela representa umesforço consciente de uma postura não-dogmática valorizando a diversidadeidiossincrática, e de evitar tolhimento oriundo de técnicas e estilos jásistematizados. Nesse sentido, o movimento do Grupo é anti-escola,descondicionador e paradoxal.” (WIDMER 1985, 69). 

O que se percebe aqui, portanto, é a interpretação do documentosob um ponto de vista subjacente à sua aparência de manifesto críticoda realidade sociopolítica. Essa interpretação revela aquilo que, aindapertinente em 1985, corresponde a princípios ideológicos estimuladoresde uma estética musical pluralista e inovadora, enquanto livre deprincípios engessados em sistemas, doutrinas ou tendências estilísticas

(“escolas”); e que valoriza a noção de um todo, de um conjunto comobjetivos, interesses e características comuns (“grupo”). 

Hoje, observando comparativamente o movimento do “Grupode Compositores da Bahia” e aquele que se pode considerar paralelo nocampo da música popular brasileira, a “Tropicália”, pode-se notar aconvergência do manifesto de 1966 para o texto da canção “É proibidoproibir” (1968) de Caetano Veloso ( cf. Anexo II), que, nitidamente,insinua-se também como manifesto político.14 Não esquecendo de que Tom Zé foi um dos membros fundadores do Grupo de Compositoresda Bahia, e que Smeták (integrado ao movimento do Grupo desde1967) foi uma das fontes de inspiração de Caetano Veloso e Gilberto

Gil, não podemos deixar de notar que, assim como as bases estéticas doGrupo foram definidas pela interação de tradição e inovação, a

14  A canção de Caetano, certamente, faz referência ao movimento estudantilfrancês de maio de 1968, quando os estudantes da Sorbonne e da Naterre, munidosde slogans como: “É PR OIBID O PR OIBIR  ”, “GOZA R SEM FR EIOS ” e “N E M

DE U S ,   N EM M ESTR ES”, iniciaram uma revolução que se propagou por outros

 países, criticando os padrões políticos, sociais e culturais da época e  pregando ummodus vivendi baseado no liberalismo e contestando todo tipo de autoridade. 

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 Tropicália também se pautou na mistura de manifestações tradicionaisda cultura brasileira a inovações estéticas radicais.

 Ainda em Dezembro de 1966, Smeták apresenta suas primeiras“plásticas sonoras” na I Bienal de Artes Plásticas da Bahia, pelas quaisrecebe o “Prêmio de pesquisa”  Norberto Odebrecht.15  Premiado,Smeták foi integrado ao Grupo como “membro honorífico”. 

 A intensidade crescente do movimento motivou a Secretaria deEducação e Cultura do Governo da Bahia a instituir em 1967, junto àUniversidade, as  Apresentações de Jovens Compositores ,16  realizadasanualmente com regularidade até 1980, incluindo um concurso ao vivode obras inéditas, tendo o público como um dos jurados.17  Asingularidade da I Apresentação (Nov. de 1967) foi a união de doisconcursos, um de música “erudita” e outro de música “popular”, tendocomo consequência imediata um público único, o qual, vale salientar,desde então participou como um dos jurados. O fato exemplifica o queapontou Widmer em sua interpretação do Artigo Único da “Declaraçãode Princípios” de 66: a abolição de facções, o descondicionamento e a

 valorização da diversidade idiossincrática. Foi também em 1967 que oGrupo instituiu seu “Boletim”, que se constituía, basicamente, de umrelatório anual da produção do Grupo e das suas apresentações eatividades em função da música contemporânea.

Em 1968, a II Apresentação de Jovens Compositores já realizouum concurso de âmbito nacional. A formação inicial do grupo sofreualterações importantes a partir desse ano: Tom Zé foi para São Paulo; eRinaldo Rossi e Nikolau Kokron foram absorvidos pela Universidadede Brasília. Surge o primeiro LP do selo UFBA dedicado ao registro dasobras dos compositores da Bahia,18  com o Trio da Universidade(Moysés Mandel, Piero Bastianelli e Pierre Klose) tocando as obras de

Lindembergue Cardoso e Jamary Oliveira premiadas na I Apresentaçãode Jovens Compositores (1967). Em 1969 ocorrem as primeiras graduações em composição na

UFBA (Fernando Cerqueira e Jamary Oliveira), já no âmbito da nova“Escola de Música e Artes Cênicas”, resultante da departamentalizaçãodas três escolas de arte: Seminários de Música, Escola de Dança e

15 Foi na I Bienal da Bahia que surgiu a denominação “plásticas sonoras” para osinstrumentos de Smeták, atribuída pelo artista plástico Juarez Paraíso. A premiaçãoabriu as portas para a circulação da obra de Smeták no campo das artes plásticas.Em 1967, ele participou da exposição coletiva  Nova Objetividade Brasileira,

realizada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.16  A partir de 1969, o evento passou a denominar-se “Apresentação de

Com positores da Bahia”. 17  Até o ano 2000, houve 23 apresentações de Compositores da Bahia. A XVapresentação (1982) foi atípica, no sentido de que não se realizou a execução

 pública das obras inscritas, tendo os prêmios do concurso sido distribuídosigualmente entre os participantes.18 Rosenblitz, CLP 80.031.

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Escola de Teatro.19  A partir desse ano, o perfil da apresentação decompositores passou corresponder à sua nova designação:“Apresentação de Compositores da Bahia”. Também em 1969 teveinício a série de Festivais e Cursos de Música Nova, realizados desdeentão anualmente, no mês de julho, reunindo professores e estudantesde vários estados para um convívio intenso com a linguagem musicalcontemporânea. As cinco edições desses eventos (1969-1973), dirigidaspor Ernst Widmer, promoviam o debate sobre obras contemporâneasrecentemente estreadas nos festivais de Darmstadt e Donaueschingen,por meio de gravações e projeção de filmes. Os concertos, por sua vez,apresentavam obras de membros do Grupo e de compositoreseuropeus e norte-americanos consagrados (Antheil, Berio, Cage,Feldman, Ives, Kagel, Riley, Stockhausen, etc.). Também em 1969, aparticipação do Grupo no I Festival de Música da Guanabara (deâmbito nacional) foi vitoriosa em termos de prêmio e crítica; as cincoobras inscritas foram às semifinais e três ficaram dentre as 5 primeirascolocadas: Procissão das Carpideiras de L. Cardoso (3.º Prêmio), Heterofonia

do Tempo de F. Cerqueira (4.º Prêmio) e Primevos e Postrídio de M. Gomes(5.º Prêmio).

Em 1970 o feito se repetiu no II Festival de Música da Guanabara,dessa vez com repercussão internacional, em concurso aberto acompositores das três Américas. E. Widmer obteve o 1.º Prêmio comSinopse ; L. Cardoso, o 3.º Prêmio com  Espectros ; e F. Cerqueira, oPrêmio do Público com Decantação. Nesse mesmo ano,  A MontanhaSagrada   de M. Gomes e Contração  de F. Cerqueira foram selecionadaspara representar o Brasil na Tribuna Internacional de Compositores daUNESCO em Paris. O ano de 1970 também marcou o início doinvestimento na divulgação da produção do Grupo em publicações de

partituras (Série Compositores da Bahia) e gravações de discos (LPs dasobras premiadas nas Apresentações de Jovens Compositores). Étambém em 1970 que Fernando Cerqueira deixa Salvador por Brasília,contratado como professor do Departamento de Música do Institutode Artes e Arquitetura, onde permaneceu 5 anos e meio. Emdepoimento recente concedido à nossa pesquisa, ele diz:

O que mais me atraiu [...] foi a efervescência e a modernidade das ideias na UnB,que levavam a um pensamento mais experimental, com pesquisas metodológicas ereflexão antropológica sobre o papel da arte e do artista, considerando a Música demodo integrado na sua percepção estética e na relação epistemológica com asdemais expressões artísticas. O ambiente de centro de artes que o IAA

proporcionava facilitou essa integração de pessoas e ideias em torno de umpensamento mais próximo da vanguarda, apesar de politicamente nacionalistaporque não podia deixar de envolver a luta contra a repressão e pela volta dademocracia. [...] A modernidade arquitetônica de Brasília certamente favorecia estemodo de ver a arte, intelectualmente e sensorialmente engajada no puro novo.

19 A fusão das escolas foi decorrente do sistema departamental implantado pelaReforma Universitária de 1968.

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Brasília, no entanto, perdia para a Bahia naquilo que musicalmente termina sendo oessencial: a criatividade espontânea e a vivência musical com uma diversidade queacolhe toda a riqueza cultural e humana que aqui sobrevive e que predetermina oque entendemos como a musicalidade baiana. [...] Voltei para a Bahia quandoaquele espírito de equipe multidisciplinar e vanguardista do IAA que se reproduziano Departamento de Música já havia se deteriorado, por dispersão dos

componentes e por divergências com as novas orientações provocadas pelasmudanças no corpo docente, com novos músicos contratados, em geralinstrumentistas. Apesar de excelentes profissionais e apoiarem os projetos doscompositores, executando e estreando obras, não compartilhavam das ideiassociais e políticas do grupo anterior e foram aos poucos re-estabelecendo e re-fortalecendo o modo convencional de pensar a Música e o ensino e a sua relaçãocom a política institucional da Universidade e com todo o resto. (CERQUEIRA2010)

No ano de 1971, o Boletim do Grupo, registrou 161 execuções, 55das quais foram estréias. A atividade de palestras realizadas pormembros do Grupo em várias unidades da Universidade e órgãos de

intercâmbio cultural já era significativa. E os compositores jácomeçavam a ter suas obras divulgadas no exterior (Espanha, Suíça eInglaterra).

Em 1972, a proposta de inclusão do público em eventos do Grupo,introduzida desde a I Apresentação de Jovens Compositores (1967)com o “Prêmio do Público”, ganhou terreno com o projetoENTROncamentos SONoros. Concebido "com o objetivo deevidenciar a ligação inerente entre o tronco da arte musical e asramificações do mundo sonoro do público, ou vice-versa, visando aoseu reatamento" (WIDMER 1972, 17), esse projeto consistia numasérie de apresentações didáticas experimentais com obras dos

compositores do Grupo. Concebidas para orientação e co-participaçãodos ouvintes, essas apresentações eram roteirizadas, narradas eentremeadas com exemplificações de recursos audiovisuais: sonsambientais pré-gravados e executados pela platéia, acompanhados deimagens projetadas. Assim, as características estéticas eramdevidamente “destrinchadas” antes da execução integral da obra emfoco (uma por apresentação), que poderia ser ambientada com dançae/ou projeção de fotografias e animação.20  O que se pretendia eracativar o público, aguçar a percepção e informar acerca dospressupostos estéticos da nova linguagem musical. Buscava-sepropiciar, portanto, condições que favorecessem a percepção, aassimilação e a intelecção, no sentido de vencer o estranhamento do

público em relação à música contemporânea. Com patrocínio doInstituto Goethe em Salvador, o apoio da Seção Regional da SociedadeBrasileira de Música Contemporânea e a colaboração da Escola deMúsica e Artes Cênicas, o projeto ENTROncamentos SONoros se

20  A coreógrafa Lia Robatto, o fotógrafo e arquiteto Sylvio Robatto, o artista plástico Chico Liberato e o ator e diretor teatral Arildo Deda participaram do projeto, no que tange aos aspectos de ambientação e ilustração visual.

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articulou em cinco eventos, entre 28 abril e 28 julho de 1972. As obrasapresentadas foram: Iteraçõe s (1970) de Jamary Oliveira,  Extreme  (1970)de Lindembergue Cardoso e  Antístrofe   (1970) de Rufo Herrera.21  Foitambém em 1972 que teve início a publicação de partituras pela da“Série Compositores da Bahia”, com a  A-ve Ma-ri-a  de Ernst Widmereditada como separata junto ao Boletim N.º 4.

Em 1973, a criação do Conjunto Música Nova, sob a direção dePiero Bastianelli e Ernst Widmer, foi um dos principais artífices dapolítica de projeção nacional e internacional do Grupo. Nesse mesmoano, o Conjunto realizou a turnê de concertos Brasil-Paraguai-Uruguai(24.10  –   19.11),22  levando obras de Alda e Jamary Oliveira, Ernst Widmer, Lindembergue Cardoso e Rufo Herrera.

Em 1974 teve início o “Festival de Arte*Bahia”, eventocoordenado por Ernst Widmer e realizado até 1982, priorizando aapresentação de propostas inéditas. A ênfase na execução e estudos damúsica contemporânea em vez do repertório de valores já consagradosinternacionalmente deu ao festival o cognome de “festival mutirão”, em

oposição ao “festival consagração”. Nesse ano intensificou-se adivulgação internacional de compositores do Grupo. Ernst Widmer, Jamary Oliveira, Lindembergue Cardoso e Fernando Cerqueira tiveramobras editadas na Alemanha;23  obras de Widmer e Cardoso foramestreadas respectivamente na Suíça e na Áustria, e membros do Grupocomeçaram a ser citados em obras de referência sobre música do séculoXX publicadas no exterior.24 

 As Bienais da Música Brasileira Contemporânea, organizadas peloInstituto de Música da FUNARTE e realizadas no Rio de Janeiro,tiveram início em 1975. Na I Bienal, Fernando Cerqueira se apresentoucom  Quanta , para conjunto instrumental com 4 grupos independentes,

Lindembergue Cardoso com Pleorama  op. 19, para orquestra sinfônica, eErnst Widmer com La belle se siet  op. 25, para flauta solo. Nesse ano, oConjunto Música Nova inicia a organização de uma série de concursosde composição no âmbito dos Festivais de Arte*Bahia. No 1.ºConcurso, revelaram-se premiados dois novos compositores baianos:

21 A peça de Ernst Widmer ENTROncamentos SONoros op. 75, composta em 1972 para teatro instrumental (5 trombones, fita magnética, piano e cordas), emboraintitulada segundo o projeto e concebida no espírito do mesmo, foi estreadadurante a VI Apresentação de Compositores da Bahia (novembro de 1972). 22 Iniciando com um concerto em Salvador, a turnê incluiu as cidades do Rio deJaneiro, Brasília, Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba, Assunção, Montevidéu eBlumenau.23  Rondomobile  para piano de Ernst Widmer. Oito peças para piano  de JamaryOliveira, e Reflexões II  de Lindembergue Cardoso foram editadas por Hans Gerig(Colônia). Fernando Cerqueira teve seu Quarteto de cordas Síndrome  e a obraQuanta editados pela Tonos ( Darmstadt).24  VINTON, John. Dictionary of Twentieth-Century Music. Londres: Thames andHudson, 1974.

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 Alda Oliveira (  Agre-Som ,) e Agnaldo Ribeiro ( Korpus-et-Antikorpus  ). Também em 1975 Fernando Cerqueira retorna à Bahia, após cinco anose meio em Brasília. Em sua percepção, o movimento do Grupo já nãose comparava àquele, do qual havia participado de 1966 a 1969. Emrecente depoimento à nossa pesquisa, ele registra esse fato da seguintemaneira:

Quanto ao sentido de Grupo, comparando com o movimento a partir de 1966,não conseguimos, na prática, retomar debates e trabalhos como antes. Tentei, várias vezes, sem sucesso e acho até que um pouco ingenuamente, reunir novos e velhos companheiros no salão de orquestra para criarmos um grupo experimentalde composição coletiva, mas nunca conseguíamos acertar os horários e acabeidesistindo. Todos nós estávamos atarefados com sérios compromissos pessoais eprofissionais, que não deixavam mais espaço para brincadeiras musicais. As novasregras do jogo eram as conhecidas do velho e cordial bom senso: cada um comseus próprios botões... (CERQUEIRA 2010).

 A consolidação do trabalho composicional iniciado pelo Grupo

se fez, no entanto, com novos compositores já formados pelos ex-alunos de Widmer (a segunda geração de compositores da UFBA),desenvolvendo a mesma filosofia de trabalho. A partir de 1984,despontam no cenário brasileiro os compositores Paulo Lima e Wellington Gomes,25  premiados no “Concurso Nordestino deComposição Camerística”, já coordenado por Agnaldo Ribeiro.

 A partir de 1986, Paulo Lima inicia as “Semanas de MúsicaContemporânea”, dando continuidade às idéias que sustentaram osFestivais de Arte * Bahia até 1982. Na II Semana (1987), revelou-sepremiado o compositor baiano Pedro Augusto Dias, com Ritual , paraorquestra.

Na década de 1990 revelam-se através de premiações nosconcursos da UFBA: Ângelo Castro (1.º Prêmio na  Apresentação deCompositores da Bahia de 1992 com a peça Silêncio para conjunto decâmera), Pedro Kröger (1.º Prêmio no Concurso Nacional deComposição da UFBA de 1993-94 para a peça orquestral Liberdade Assinótica  ) e Hélio Bacelar Viana (2.º Prêmio no mesmo concurso para apeça orquestral Rupturas  ).

É principalmente com base no arbítrio de todos esses eventoscitados, bem como de outros realizados no âmbito internacional (comoa Tribuna Internacional de Música da UNESCO, dentre outros) que oprojeto “Marcos Históricos da  Composição Contemporânea na

UFBA”, iniciado no ano 2000 e com previsão de conclusão em 2015,seleciona as obras a serem estudadas e publicadas.

25  Categoria “Quarteto de Cordas”: Wellington Gomes,  Moldura Sertaneja, 1.ºPrêmio; Paulo C. Lima, Quarteto, 2.º Prêmio, e  Brasiléia, 3.º Prêmio. Categoria“Piano a 4 mãos”: Paulo C. Lima, 1,2,3 Fantasia.

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M ARCOS HISTÓRICOS DA COMPOSIÇÃOCONTEMPORÂNEA NA UFBA

I  – NATUREZA DO PROJETO 

“Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA” euma pesquisa na qual se aplicam: 1) conhecimentos existentes da teoriacomposicional, em suas várias categorias (tonal, modal, pós-tonal,

serial, minimalista, etc.); 2) conhecimentos de metodologias de análisecomposicional, em suas múltiplas perspectivas (estrutural, motívica,harmônica, rítmica, tímbrica, etc.); 3)  conhecimentos de educaçãomusical; 4) conhecimentos da semiologia da música; 5) conhecimentosde musicologia histórica; e 6)  conhecimentos metodológicos decatalogação, indexação e classificação de documentos são direcionadospara:  A)  a observação estética do repertório musical, no contextocultural e ideológico do qual ela se deriva, e o processamento dessaobservação para a geração de conhecimentos de ordem estilística; B) aobservação crítica da produção teórica dos compositores da pesquisa,gerada pari passu o repertório em foco, para a produção de uma reflexãocrítica, que subsidie o conhecimento dos suportes filosóficos, estéticos

e ideológicos do repertório em estudo; C ) a geração de produtossubsidiais à pesquisa sobre o Grupo de Compositores da Bahia(catálogos de obras e biografias de compositores); e D ) a organizaçãode uma biblioteca de referência sobre os compositores da UFBA. Osresultados produzidos se referem a:  A  ) edições críticas de partituras; B) estudos analíticos das partituras editadas; C ) estudos críticos de textosque podem ser considerados como “discurso alternativo” doscompositores relativos ao repertório pesquisado;26  D ) organização decatálogos da produção musical desses compositores.

II  –

 EVOLUÇÃO: 1989-2010

26  Referimo-nos aos textos de natureza teórica, crítica ou filosófica doscompositors da pesquisa que abordem questões composicionais, educacionais eideológicas, podendo subsidiar a compreensão de pressupostos estéticos eestilísticos.

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“Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA” éum projeto de pesquisa que pretende concluir a evolução de uma sériede estudos centrados na criação musical desenvolvida na UFBA, desdea fundação do Grupo de Compositores da Bahia. O projeto teve doisprecursores. O primeiro deles, “O Discurso Musical de Ernst Widmer”teve início em 1989 e desenvolveu-se com exclusividade até o ano de1996,27  visando ao estabelecimento do perfil estilístico do mentorintelectual do Grupo de Compositores da Bahia. A produçãobibliográfica desse projeto consta de livros, capítulos, artigos, notaspara encarte de CD e coletânea de ensaios, publicados em meiosimpressos e eletrônicos (v. Anexo III).

O segundo estudo, desenvolvido entre 1996 e 1999, focalizou aprimeira geração de compositores da UFBA, selecionando aqueles quese iniciaram na composição com Ernst Widmer (Fernando Cerqueira, Jamary Oliveira e Lindembergue Cardoso). Esse estudo objetivou oestabelecimento de um corpus   de características estéticas comuns eindividuais, que sustentassem ou não a hipótese de uma “Escola de

Composição da UFBA”, que se antevia pelas caracterizações, a nível docoletivo, encontradas nos textos musicológicos de época:principalmente,  Music in Latin America   de Gerard Béhague e  MúsicaContemporânea Brasileira  de José Maria Neves. Por “Escola”, entendemosum consenso ideológico-estético que confere identidade  à produçãode uma coletividade; no caso, os compositores atuantes na unidade deensino musical da UFBA. A produção bibliográfica desse projetoconsta de um livro eletrônico, alguns capítulos e artigos, publicados emmeios impressos e eletrônicos (v. Anexo IV).28 

Finalmente, em 2000 iniciamos o projeto “Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA”, com a finalidade específica da

identificação, conhecimento e divulgação de obras de valor histórico natrajetória da “Escola de Composição da UFBA” durante o século XX.Pela descrição do objetivo, deduz-se que a pesquisa anterior tenhaassentado as premissas do conceito “Escola de Composição da UFBA”.O critério seletivo do objeto de estudo  –   “valor histórico” –   foidefinido, em princípio, em relação à arbitragem de concursos decomposição e de mostras significativas a nível nacional e internacional,ou de algum evento historicamente significativo, para o qual obrastenham sido encomendadas ou do qual tenham participado. O projetodiz respeito, portanto, a obras dos compositores da UFBA que sedestacaram a nível regional, nacional e internacional, seja através depremiações ou da participação em importantes mostras e eventosnacionais e internacionais. Através do critério seletivo, este projeto

27  Concluído em 1996 no que diz respeito aos objetivos propostos, o projetocontinua gerando produção bibliográfica.28 Apesar de “oficialmente” concluído em 1999 no que diz respeito aos objetivos

 propostos, o projeto continua ativo e gerando produção bibliográfica.

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ampliou, consequentemente, o âmbito dos compositores estudados naspesquisas anteriores.

Em relação aos estudos antecessores, o principal diferencial desteprojeto é o fato de a sua produção não ser de um único pesquisador,mas de um grupo de pesquisadores colaboradores de diferentes einstituições e perfis profissionais. Até agora, vimos contando com aparticipação de pesquisadores colaboradores da UFBA (Alda Oliveira,Pablo Sotuyo Blanco, Pedro Kröger, Regina Cajazeira, Ricardo Bordinie Wellington Gomes), da UFPB (Didier Guigue) e da UFRGS (CristinaGerling e Jusamara Souza).

III  – HIPÓTESE NORTEADORA

Com esse projeto, portanto, pretendíamos aprofundar a reflexãoa respeito da questão “Escola” (conjunto de pessoas que segue umsistema de pensamento, uma doutrina, um princípio estético) ou“Grupo” ( conjunto de pessoas com objetivos, interesses ecaracterísticas comuns). Nos 10 anos de desenvolvimento da pesquisa,quando trabalhamos por fases cronológicas seqüentes, o conceito“escola”, sem implicação em noções de sistema ou doutrina, foiresistente. A decisão de limitarmos o corpus da pesquisa até a produçãodo ano 2000 explica-se pelo seguinte argumento. Se a hipótesecondutora da pesquisa é a identificação de pressupostos estilísticos quejustifiquem a consideração de uma “Escola de Composição da UFBA”,podemos observar, no século atual, uma diversidade estética que já nãosustenta essa hipótese. Supomos que os seguintes fatos tenham sido

determinantes das alterações no perfil estético que a Escola deComposição da Bahia apresenta entre as décadas de 1960 e 1980,havendo contribuído para a diversidade estilística notável na produçãomusical da UFBA a partir dos anos 90: 1) a criação do Programa dePós-Graduação em Música da UFBA no ano de 1990, absorvendojovens compositores de outras regiões do país e até mesmo de outrospaíses da América Latina;29 2) a introdução de estudos de informáticaaplicada à Música a partir de então; e 3) o fato de que, a partir de 1990,o ensino de composição na UFBA evoluiu sem duas das liderançasfundadoras e vertentes construtivas do pensamento composicionaldessa Escola: Lindembergue Cardoso e Ernst Widmer, falecidos,

respectivamente, em 1989 e 1990. A finalização da pesquisa, previstapara 2015, e abordando a partir de 2010 a produção da década de 1990, visa à demonstração da desconstrução do conceito “escola  decomposição da UFBA”  no final do século XX. Nessa fase, iremos

29 Alexandre Reche (SP), Ângelo Tavares Castro (MG), Amaro Borges MoreiraFilho (RS), Demétrio Bogea (DF), Dimitri Cervo, Pedro Kröger (PA), RicardoBordini (RS), Luis Edmundo Ochoa Revoredo (Peru) e Pablo Sotuyo Blanco(Uruguai).

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observar a introdução de novos pressupostos estilísticos, ainda nãodefinidos, os quais, gradativamente, vão compondo um novo painelestético, que já não remete à idéia de coletividade: “Grupo” ou“Escola”. 

IV  – PRODUÇÃO

 Atualmente, a pesquisa abriga três séries de publicaçõeseletrônicas em  site   próprio (<http://www.mhccufba.ufba.br>),implantadas gradualmente, em cada fase da sua evolução. A série inicialtem o mesmo título do projeto  –   “Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA ” e se destina à edição críticade partituras de valor histórico com comentários analíticos de autoriasdiversas. Esta série se encontra atualmente com 16 volumes editadosem formato de livros eletrônicos (arquivos .PDF), disponíveis paradownload  a usuários cadastrados no site  da pesquisa. Desta série, os seisprimeiros volumes, referentes às obras sobreviventes da “Semana Santade 1966”, foram impressos: Elegia  de F. Cerqueira, Exortação Agônica  deM. Gomes,  Nu  de J. Oliveira, Impropérios  de A. J. Santana Martins , DoDiálogo e Morte do Agoniad o de R. Rossi e Diálogo do Anjo com as três Mulheres  de E. Widmer.

Na segunda fase do projeto (2003-2006), demos início à segundasérie, intitulada “Marcos Teóricos da Composição Contemporâneana UFBA ”. Esta série objetiva edições críticas de textos inéditos decaráter teórico, didático ou cultural produzidos pelos compositores da

pesquisa, acompanhados de comentários críticos de autorias diversas.Essa segunda linha editorial se encontra atualmente com 03 volumeseditados em formato de livros eletrônicos (arquivos .PDF), disponíveispara download .

Na terceira fase (3.2007-2.2010), foi introduzida a série de “Web -catálogos” dos compositores pesquisados. Em 2007 lançamos oprimeiro volume, que diz respeito à documentação musical da obra deErnst Widmer. Publicado em formato impresso pela AcademiaBrasileira de Música em 2007 (ISBN 978-85-88272-13-2), o Web -catálogo de Widmer representa uma segunda versão revista e ampliadada versão impressa. E em 2009, realizamos a catalogação da obra

completa de Lindembergue Cardoso. Até o ano de 2014, está prevista a seguinte seqüência decatálogos: Vol. 3  –  Catálogo de Fernando Cerqueira (2011); Vol. 4  –  Catálogo de Agnaldo Ribeiro (2013); e Vol. 5  –   Catálogo de JamaryOliveira (2014).

Os compositores integrantes do projeto, até a sua conclusão, são: Agnaldo Ribeiro, Alda Oliveira, Alfredo Barros, Ângelo de Castro,Ernst Widmer, Fernando Cerqueira, Hélio Bacelar Viana, Jamary

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Oliveira, Lindembergue Cardoso, Milton Gomes, Paulo Lima, Pedro Augusto Dias, Pedro Kröger, Rinaldo Rossi, Ruy Brasileiro, Tom Zé e Wellington Gomes.30 

30  Não foram encontradas obras de Nikolau Kokron, que seria um doscompositores integrantes do projeto. 

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BIBLIOGRAFIA 

BASTIANELLI, Piero. A Universidade e a Música: uma memória 1954 -2003. 2 vols., Salvador: Editora Contexto, 2003.

CERQUEIRA, Fernando. Depoimento escrito concedido à autora,22.11.2009.

 ______. Depoimento escrito concedido à autora em 15.5.2010.

DUPRAT, Régis. & V OLPE, Maria Alice. “Vanguardas e posturas deesquerda na música brasileira (1920-1970)”, in: ILLIANORoberto & SALA, Massimiliano. Music and Dictatorship in Europeand Latin America. (Speculum Musicae vol. XIV). Turnhout,Bélgica: Brepols, 2009, p.573-611.

MORHY , Lauro. “UnB e Brasília: 40 anos de parceria”.  Jornal de Brasília ,

20/12/2001. Disponibilizado em:<http://www.unb.br/administracao/reitoria/artigos/20011221.php>. Acesso em 12.05.2010.

OLIVEIRA, Jamary. Depoimento escrito concedido à autora em18.5.2010.

OLIVEIRA, Paula. Grupo de Compositores da Bahia (1966-1974:Desenvolvimento e Identidade . 2010. 202 p. (inclusive anexos).Dissertação (Mestrado em Comunicação ) − Faculdade deComunicação, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2010.

PERRONE, Maria da Conceição Costa. Música, Contexto e Tradição:

 Estudo sobre a Criação de uma Instituição de Ensino.  Tese(Doutorado em Música) − Escola de Música, UniversidadeFederal da Bahia, Salvador, 2008.

 WIDMER, Ernst. “O Grupo de Compositores da Bahia e as Apresentações de Jovens Compositores”. In: Boletim [do Grupode Compositores da Bahia], N.º 3, Salvador: Seminários deMúsica da UFBA, 1968, 22p.

 ______. “Ensaio a uma didática da música contemporânea”. Originaldatilografado, 1972.

 ______ . “Skizze eines Selbstporträts unter verschiedenen Gesichtspunkten ”.

Chardonne: documento datilografado não publicado, 1980. 7 p. ______ . “Travos e Favos”.  ArT - Revista da Escola de Música da UFBA,

Salvador: Gráfica Universitária [UFBA], N.º 13, p. 63-71, abrilde 1985.

 ___  ___. “ A Formação dos Compositores Contemporâneos... ... e seuPapel na Educação Musical”. Documento datilografado, nãopublicado, 1988. 5 p.

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 ANEXO  I:   A  “DECLARAÇÃO DE PRINCÍPIOS”  DO GRUPO DE

COMPOSITORES DA B AH IA 

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 ANEXO  II:  “É  PROIBIDO PROIBIR”  (C AETAN O VELOSO)

 A mãe da virgem diz que nãoE o anúncio da televisãoE estava escrito no portão

E o maestro ergueu o dedoE além da porta há o porteiro, sim...

E eu digo nãoE eu digo não ao nãoEu digo é proibido proibirÉ proibido proibir, é proibido proibir...

Me dê um beijo meu amorEles estão nos esperandoOs automóveis ardem em chamas

Derrubar as prateleiras, As estantes, as estátuas, As vidraças, louças, livros, sim...

E eu digo sim,E eu digo não ao nãoE eu digo é proibido proibirÉ proibido proibir, é proibido proibir...

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 ANEXO  III:  PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE  “O  DISCURSO  MUSICAL  DE  ERNST  WIDMER” 

Livros:NOGUEIRA, Ilza. ERNST WIDMER: perfil estilístico. Salvador: Escola de Música da

UFBA, 1997, 198 p.

 _______. ERNST WIDMER: catálogo de obras . Rio de Janeiro: Academia Brasileira deMúsica, 2007, 231 p.

Capítulos:

NOGUEIRA, Ilza. “Offricium Sepulchri de Ernst Widmer: Comentários Analíticos”.Série Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 1. Salvador:Editora da UFBA, 2000, 11-19. Também disponível em:<http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______ . “ ENTROncamentos SONoros  de Ernst Widmer: Comentários Analíticos”.Série Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 12, 2003, 11-19. Disponível em: < http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______. “Rumos  opus 72 de ERNST WIDMER: Comentários Analíticos”. Série Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 16, 2003, p. 40-58.Disponível em: < http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______ . “Sertania: Sinfonia do Sertão opus 138 de Ernst Widmer: Aspectos deSimbologia Sonora e Paisagismo Musical”. Série Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA, vol. 17, 2010, p. 58-89. No prelo (a serdisponibilizado em: < http://www.mhccufba.ufba.br>.

 Artigos:

NOGUEIRA, Ilza. “ Ambiguidade e Contextualidade: Princípios Fundamentais daLinguagem Pós-tonal de Ernst Widmer”. Cadernos de Estudo - Análise Musical ,N.º 5, Fev.-Ago./1992, São Paulo: Atravez, p. 1-20;

 _______. “Ernst Widmer, Opus 97: A Complexidade da Postura Eclética”. ANPPOM: Anais do VII Encontro Anual, São Paulo, 29/8 - 2/10/1994, p.74-88;

 _______. “ As Quatro Estações de Ernst Widmer: O Sonho e a ‘Fantasia de Realizaçãodo Desejo’”. Claves, Periódico do Programa de Pós-Graduação em Música da UFPB,N.º 6 (Nov. 2008), Fortaleza: Realce Editora & Indústria Gráfica Ltda., p. 15

 –  27. Disponível em: <http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/claves>.

Resenha de CD:

NOGUEIRA, Ilza. “ERNST WIDMER: um Alquimista das Fusões Culturais”. In: Ernst Widmer: Remeiros do Rio São Francisco, Eduardo Torres, regente. Paulus,004512, DDD, 1999.

Organização de Publicação:

NOGUEIRA, Ilza (org.). “ A Linguagem Contemporânea no Ensino do Piano: uma Apresentação do Ludus Brasiliensis  de Ernst Widmer” (coletânea de 5 artigos).

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 Vários autores, Apontamento, N.º 71, fev. 2.ª quinzena/1998, e n.º 72, mar., 1.ªquinzena/1998, Maringá: UEM.

 ANEXO  IV:  PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE “ESCOLA  DE  COMPOSIÇÃO  DA  UFBA:  PRIMEIRA

GERAÇÃO (LINDEMBERGUE C ARDOS O ,  FERNANDO CERQUEIRA

E J AMRY OLIVEIRA)”  

Capítulos:

NOGUEIRA, Ilza. “Simetrias I : uma estrutura cromático-diatônica”. In Perrone,Conceição et alii. A Música de Jamary Oliveira: Estudos Analíticos . Porto Alegre:Setor Gráfico do Curso de Pós-Graduação em Música da UFRGS, 1994, p.49-58;

 _______. “ Elegia  de Fernando Cerqueira: Comentários Analíticos”. Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA, vol. 2. Salvador: Editora da UFBA, 2000,p. 21-28. Também em publicação eletrônica disponível em:<http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______. “ Nu  de Jamary Oliveira: Comentários Analíticos”.  Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA, vol. 3. Salvador: Editora da UFBA, 2000,p. 7-15. Também em publicação eletrônica disponível em:<http://www.mhccufba.ufba.br>;.

 _______. “Triode Jamary Oliveira: Comentários Analíticos”. Série Marcos Históricos daComposição Contemporânea na UFBA, vol. 9, 2001, p. 29 –  38. Disponível em:<http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______. “Trio Metamorfose de Fernando Cerqueira: Comentários Analíticos”. Série Marcos Históricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 8, 2001, p. 19 –  27. Disponível em: <http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______. “Trio1 de Lindembergue Cardoso: Comentários Analíticos”. Série Marcos

Históricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 7, 2001, p. 41-55.Disponível em: <http://www.mhccufba.ufba.br>;

 _______. “O Grupo de Compositores da Bahia  e seu Manifesto de 1966: ComentárioCrítico.” Série Marcos Teóricos da Composição Contemporânea na UFBA, vol. 3,2007, p. 14 - 21. Disponível em: <http://www.mhccufba.ufba.br>.

 Artigos:

NOGUEIRA, Ilza. “Escola de Composição da Bahia: considerações estilísticas.“ICTUS :  PERIÓDICO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

MÚSICA DA UFBA  ,  N. º 4   (Dez. 2002), Salvador: EdUFBA, p.17-43;

 _______. “Escola de Composição da UFBA: Esboço de uma Fundamentação Teórica”. Ictus, Periódico do Programa de Pós-Graduação em Música da UFBA, N.º

2 (Dez. 2000), Salvador: UFBA, p. 37-43; _______. “Grupode Compositores da Bahia: Implicações culturais e educacionais”.

BRASILIANA, Revista da ABM , N.º 1, ano 1 (Jan. 1999), Rio de Janeiro: ABM, p. 28-35;

 _______. “O Grupo de Compositores da Bahia (1966 - 1975): uma proposta deeducação musical formal e informal crivada de novos paradigmas culturais”. Anais do 6.º Simpósio Paranaense de Educação Musical, Londrina, 30/6 a4/7/97, p. 41-54;

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 _______. “Die Compositores da Bahia : Aspekte einer Zeitgenössischen Musikkultur.”Publicação eletrônica disponível em: <http://www.beckmesser.de>.

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 ACERVO MUSICAL JOÃO MOHANA:POSIÇÃO REGIONAL ,   SITUAÇÃO DOCUMENTAL  

 Alberto Dantas Filho 

 

Durante alguns anos, mais precisamente na década de noventa,em minhas participações em congressos, colóquios, encontrosmusicológicos percebia que esses eventos começavam e terminavam,invariavelmente, com uma espécie de lamúria em que se reconhecia oisolamento cruel que caracterizava o ofício da musicologia na regiãonordeste do Brasil.

Porém, não falo apenas de minha geração, mas observo que estefenômeno tinha origens bem mais distantes, pois, tive a oportunidade eo privilégio de acompanhar, por exemplo, as queixas do grande Padre Jaime Diniz que, mesmo com toda a força e o reconhecimento de seutrabalho, angustiava-se com a situação insular de seu empenho para adivulgação e o intercâmbio necessários para o aprofundamento de seusestudos.

Grandes foram os esforços dos congressos realizados de lá paracá, mas antevíamos, com muita propriedade, que só a profissionalizaçãodo musicólogo, a formação acadêmica específica e o aparelhamento ouinstrumentalização da pesquisa e de toda a rede que compõe o nossotrabalho, é que poderia conferir um estatuto condizente com umcorpus representativo e reinvindicante de uma verdadeira rede dearticulações.

 Venho experimentando, há aproximadamente quinze anos, umaevolução constante dessas condições e o simples fato - se é quepodemos chamar assim - de hoje estarmos reunidos para debatermos a

Professor Assistente do Departamento de Artes do Centro de Ciências Humanasda Universidade Federal do Maranhão. Doutor em Ciências Musicais pelaUniversidade Nova de Lisboa.

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dimensão da musicologia nordestina e seu verdadeiro perfil, é um fatoimportante que não podemos menosprezar.

Para ilustrar o que estou referindo, menciono o esforçocrescente, naquela década de 1990 para a inserção de regiõescompletamente esquecidas e anteriormente desprovidas de estudos

sobre seu passado musical. Neste contexto, inclusive, é que aparecemestados como Piauí e Maranhão da Região Nordeste e Pará e Amazonasda Região Norte.

O passo seguinte foi a integração a partir de interesses quemesclavam assuntos regionais e temas gerais.

Dentro desse contexto víamos referencias a acervos, coleções,arquivos musicais públicos ou privados em um contexto da mais puracuriosidade e, muitas vezes, revestidos de certa mística, como no casomaranhense de uma suposta missa do século XVIII desaparecida, ouainda, o papel do primeiro bispo do Maranhão nos inícios da atividademusical em Minas Gerais.

Muita dessa curiosidade em torno de um repertório, à época,ainda desconhecido, foi também fruto de certa euforia encabeçada pelopróprio Padre João Mohana que descrevia a São Luís oitocentista comouma “Viena dos Trópicos” em seu livro “A Grande Música do

Maranhão” somando-se uma atitude inicial sua de resguardo exageradodo material colhido no espaço de trinta anos, o que hojecompreendemos e que, devemos reconhecer, assim que sentiu-seseguro, passou o acervo para o estado.

PADRE JOÃO MOHANA 

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O Acervo Musical João Mohana do Arquivo Público do Estadodo Maranhão tem importância fundamental para a compreensão dodesenvolvimento musical do estado e de toda sub-região do Meio-Norte e é peça fundamental para a compreensão desse imenso Brasilmusical.

ALUNOS DO PROJETO “TRATAMENTO DO ACERVO MUSICAL JOÃO MOHANA: REORGANIZAÇÃO / 

ACONDICIONAMENTO / PRESERVAÇÃO / DESCRIÇÃO /  DIVULGAÇÃO”  –  3º. MÓDULO DE

INICIAÇÃO À NORMATIVA RISM  -  2009

Situado na rua de Nazaré número 218 , no centro da cidade, o Arquivo Público guarda em seu segundo andar na ala direita do antigo

casarão o Acervo Musical.

PRÉDIO DO ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO 

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Desde o ano de 1992 que o Arquivo conta com climatização e asala onde encontra-se o Acervo divide ainda o espaço com umapequena coleção de discos fonográficos em vinil, um armário comcopias da coleção portuguesa “Papéis do Maranhão dos ArquivosNacionais da Torre do Tombo”, dois computadores de mesa, uma

mapoteca, uma mesa grande de cerca de cinco metros. Todo o manancial foi doado pelo Padre Mohana no ano de 1987à Secretaria de Estado da Cultura e a primeira tentativa desistematização do material foi um desastre em termos arquivísticos,falta de pessoal qualificado, condições físicas e de preservaçãoinadequadas resultando em uma grande desarrumação sendo possível,ainda hoje, depararmo-nos com maços em cujo interior há uma verdadeira confusão de partes cavadas e partituras de obras diversasmuitas vezes referenciadas como uma só obra.

 Atualmente temos duas teses de doutoramento cujo objeto deestudo é o Acervo, cada uma tratando o assunto de forma diferenciada

e com olhares diferentes: a primeira, defendida em 2004 naUniversidade Federal do Rio Grande do Sul com o título “A MúsicaReligiosa de Leocádio Rayol (1849-1909) e sua relação com o Maranhão do Século XIX: um estudo musicológico, com transcrição, análise e perspectiva histórica” 1 traça o seu foco a partir da obra e da vida de Leocádio Rayol (1849-1909), o integrante mais velho da tríade ilustre de irmãos músicos, Antonio e Alexandre Rayol baseado em, “[...] episódios que direta ouindiretamente contribuíram para a consolidação do personagem enquanto criadorinserido em um cenário de um conturbado período histórico [...]”   (2003, p.102).Berchmans defini a atividade do compositor como uma “possibilidadeestética de província”  (Id.Ibidem, p.103) em oposição ao modelo laico da

 vida musical do Rio de Janeiro para onde parte em 1883.2

 O segundo trabalho doutoral defendido em 2006 na Universidade

Nova de Lisboa intitulado “O Acervo Musical João Mohana e a Vida Musical Litúrgica no Maranhão Imperial  –   O ‘Romantismo de Província’ comoOrnamentalismo Hegemônico na Ilha de São Luís  –   1836- 1892” 3  trata,essencialmente, da constituição do Acervo e de sua contextualizaçãoutilizando-se, como suporte, o construto proposto por Ricardo Sales“Ornamentalismo Hegemônico”4  que tenta explicar a expansão dopoder imperial ou “ordem imperante” nas províncias mais distantes damonarquia, através do que seria uma espécie de ornamento do poder

1 BERCHMANS, João. Tese de Doutoramento:  A Música Religiosa de Leocádio

 Rayol (1849-1909) e sua relação com o Maranhão do Século XIX: um estudomusicológico, com transcrição, análise e perspectiva histórica, p.102.2 Id. Ibdem p.47.3  DANTAS FILHO, Alberto. Tese de Doutoramento: O Acervo Musical João

 Mohana e a Vida Musical Litúrgica no Maranhão Imperial –  O ‘Romantismo de Província’ como Ornamentalismo Hegemônico na Ilha de São Luís –  1836-1892.4 SALLES, Ricardo.  Nostalgia imperial: a formação da identidade nacional no

 Brasil do Segundo Reinado. Rio de Janeiro: Topbooks. 1996.

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central expresso, sobretudo, na originalidade da monarquia americana,supostamente herdeira única de uma cultura aristocrática enobiliárquica.

 A música seria, dessa forma, um instrumento de disseminação da“ordem imperante”, tal como o direito, a arquitetura, a literatura etc.

Será nesse contexto que a música sacra (e para o compositormaranhense restou a igreja como espaço de atuação) exercerápreponderante papel na vida artística de São Luís

Em linhas gerais, o Acervo Mohana não se diferencia daquilo quepodemos encontrar na maioria dos acervos brasileiros, o que o fazinteressante é, de fato, a sua importância histórica regional e acontribuição para o estabelecimento de um quadro mais geral ecompleto da atividade musical no Brasil.

 Vale de início ressaltar que o que chamamos de acervo é, narealidade uma coleção: “ o conceito de coleção refere-se a uma reunião intencional,consciente, de documentos de origens diversas, com o fim explícito de reuni-los, sem a

observância do princípio de respeito aos fundos, sem a preservação, portanto, de suaorganicidade.” 5  Sua primeira inventariação foi realizada em 1974 pelo próprio

 João Mohana contabilizando 1416 obras de 158 compositores, 11compositoras com o total de 169 autores, resultando na publicação dolivro  A Grande música do Maranhão, obra que, apesar de sofrer críticaspela pobreza musicológica ou científica da abordagem, constitui-se emimportante material de referência para os estudiosos do Acervo.

 Adquirido e tombado em 1987 pelo Arquivo Público do Estado,só em 1995 é que foi feita uma abordagem prospectiva contabilizando2.125 obras, não havendo estimativas conclusivas quanto a real situaçãoquantitativa e qualitativa (elementos de ordem técnica) de todo o

manancial.De maneira geral, os primeiros estudos empreendidos sobre o

 Acervo tentam responder a perguntas essenciais para a compreensão daregião, onde destacamos:

1.   A presença na historiografia musical brasileira da músicado Maranhão constitui um corpus   considerável de referênciasmusicológicas?

2.  O primeiro levantamento descritivo de parte das fontesmusicais constantes no Acervo Musical João Mohana, através dacriação de um esboço de catálogo de descrição RISM 6  traz

5  GUERRA-COTTA, André. Dissertação de Mestrado: O Tratamento da

 Informação em Acervos de Manuscritos Musicais Brasileiros. Belo Horizonte:PPGCI / EB-UFMG. 2000, p.56.6  Parte integrante da Tese Doutoral (terceiro volume ) intitulada ““O Acervo

 Musical João Mohana e a Vida Musical Litúrgica no Maranhão Imperial  –   O

‘Romantismo de Província’ como Ornamentalismo Hegemônico na Ilha de São Luís –  1836-1892”, tem o titulo Catálogo de Obras Sacras do Período I mper ialdo Acervo Pe. João Mohana  com 75 entradas.

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informações diferenciadas ou semelhantes às já existentes em outrosarquivos e acervos?

3.  É possível o enquadramento do Acervo, em umcontexto mais amplo, no quadro geral das práticas musicais noBrasil, estabelecendo novos modelos de interpretação frente aossítios musicológicos mais tradicionais?

4.  Qual o papel da arte musical nas regiões periféricas emrelação à ideologia hegemônica do Império?

5.  Quais as consequências para os desenvolvimentosulteriores da atividade musical no Maranhão em particular e naregião como um todo?

Estas respostas e muitas outras começam a servir de mote paraestudos cada vez mais especializados a respeito do Acervo Mohana e deseu potencial.

Sabemos que no esteio das práticas descritas pelos testemunhoscoletados por Mohana está uma sociedade com elementos fortes dediferenciações pelas práticas político-administrativas empreendidas pelaMetrópole que foi engendrando formas diferenciadas de relação com omeio e que tem, na base de sua fragilidade, a colonização tardia e oisolamento.

O surto cultural descrito pelo Acervo, de cariz meteórico deu-se,sobretudo, pela rápida expansão comercial na vertente setentrional daProvíncia do Maranhão, liderada pela produção de algodão e do arrozque supriam a falta no mercado internacional pela eclosão da GuerraCivil estadunidense.

Em relação às questões colocadas é possível inferir que:

1- A presença maranhense na historiografia musical brasileira, adespeito dos estudos mais recentes, ainda é muito tímida, tanto naliteratura tradicional, onde invariavelmente aparece deslocada entre aspráticas da região norte, como em Vicente Sales, para citar umexemplo, no esteio dos estudos musicológicos paraenses ou inseridosna região nordeste, porém pelas razões históricas já referidas, com umenquadramento que não nos remete às peculiaridades de sua históriamusical, como em Bruno Kiefer.

Os estudos acadêmicos em literatura especializada trazem, sim,

alguma novidade, a partir de congressos e seminários e, também, pelointeresse aqui já comentado levado por uma vaga que observa a regiãocomo uma espécie de “último bastião histórico e arqueológico de nossamúsica”; 

2- O Catálogo de Obras Sacras do Período Imperial do Acervo Pe. João Mohana , em linhas gerais, traz o mesmo perfil queencontramos nos acervos e coleções do período, tanto na configuraçãogeral das práticas utilizadas: formais, relação entre gêneros,

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funcionalidade em relação a ortopraxia litúrgica etc., quanto a relaçãode importância e protagonismo do repertório litúrgico no século XIX,isto para falar do repertório sacro;

O repertório profano também traz, como em outros mananciaismusicológicos, uma quantidade imensa de obras semi-eruditas, vestígiosda prática operística marcante durante a segunda metade dosoitocentos, modinhas, lundus, obras violonísticas, pianísticas, operetasetc.;

3- No que tange a possibilidade do Acervo revelar práticasmusicais diferenciadas, no contexto geral brasileiro, faz-se necessáriouma interpretação hermenêutica calcada em uma leitura transversal dasfontes documentais e suportada por uma historiografia que só agoracomeça a entender as especificidades da região. O papel da colonizaçãojesuítica amplamente sobrevalorizada, a partir de um projeto de podertemporal em toda a região norte7, as diretrizes especiais conferidas àregião, durante o governo de José I e seu primeiro ministro o Marquêsde Pombal; as mudanças empreendidas no processo de colonização doMaranhão; a política eclesiástica de não contratar músicos laicos para oserviço litúrgico que faz do Maranhão um paradigma às aversas do queaconteceu, por exemplo, nas Minas Gerais que, desde sempre,fomentou um mercado de música e músicos baseado em leilões eoutras formas contratuais;

4- Este repertório se caracteriza, principalmente, por umdesenvolvimento exógeno, ou seja, as modificações e mudançasobservadas eram engendradas a partir de modelos importados e não,como no Rio de Janeiro, em que estas eram geradas por uma política

governamental preocupada em produzir modelos passíveis de seremirradiados às restantes províncias.Curioso notar, ao defrontarmo-nos com esta história peculiar, é o

desafio da necessidade de enquadrarmos a “música periférica” dessasprovíncias construindo possibilidades de interpretação cada vez maisafastadas daquela visão tradicional em que devia prevalecer apenascomo algo importante, a música de caráter nacional.

O esforço de produção de óperas, que encontramos em meadosdos oitocentos em São Luís, é uma prova incontestável de que estegênero era um dos principais elementos de difusão da ideologiamonárquica. Segundo o jornal Diário do Maranhão8 - em apenas doismeses realizaram-se cerca de quarenta récitas de três óperas

estrangeiras.

7  “Os poderes de caráter temporal, outorgados aos jesuítas, para administrarem,

 politicamente, suas aldeias, não lhes permitiram conservarem-se, exclusivamente,missionários, e os transformaram, também, em colonizadores.  (CAVALCANTIFILHO,1990, p.76):8 Diário do Maranhão. São Luís, 1856 [junho a dezembro]

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São Luís, Recife e Belém formaram importantes parceriasempresariais na produção de muita ópera e peças teatrais;

5- Quais serão as consequências desse desenvolvimento tãoheterogêneo e suis generis ? Temos a impressão que o referido surtometeórico de vida musical expressiva no século XIX não irá sustentar-

se pela insuficiente infra-estrutura (teatros, uma média burguesiaincipiente, isolamento cultural etc., tanto foi assim que, o último suspirodessa fase foi o projeto de fundação da Escola de Música da Capital por Antônio Rayol, aluno do Conservatório de Milão, baseada nosconservatórios sucumbindo seu projeto logo apos o seu precocefalecimento em 1904.

 A única instituição estável de ensino da música em todo o estadosó foi criada em 1974, marcando um interregno de exatos setenta anos.

 A titulo de ilustração colocaremos abaixo alguns quadrosdemonstrativos da situação do Acervo Mohana.

Q UADRO 1 -   PRIMEIRA INVENTARIAÇÃO FEITA POR JOÃO MOHANA 

Obras eruditas Quant.

a)  Obras sinfónicas religiosas 3 b)  Oratórias 3c)  Obras religiosas orquestradas menores 3d)  Obras religiosas instrumentais 4e)  Tantum Ergo 20f)  Salutaris e Jaculatórias 14g)  Motetos 11h)  Veni Creator Spiritus 10i)  Ave Maria 27

 j) 

Ladainhas completas 50l)  Entre-actos 13m)  Missas 20n)  Marchas graves, orquestradas para

 procissões39

o)  Marchas Fúnebres orquestradas 22 p)  Obras sinfónicas não religiosas 14q)  Orquestradas e corais não religiosas 14r)  Instrumentais e vocais não religiosas 26s)  Ópera 1t)  Operetas 5u)  Grandes valsas orquestradas 41v)  Grandes marchas orquestradas 19x)  Gavotas 4z)

 

Berceuses 9za) Minuetos 2zb) Mazurcas 6zc)  Pas de quatre 14zd)  Habaneras 7ze) Lundus 2

(MOHANA,1974, p.24)

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Q UADRO 2  –  SITUAÇÃO F ÍSICA DE ACONDICIONAMENTO DAS OBRAS 

As gavetas G04 e G05 estão reservadas às obras anónimas e a gaveta G06 às partes

incompletas de difícíl identificação.(DANTAS FILHO, p.115-116)

Q UADRO 3 -  ANALOGIA ENTRE AS DUAS INVENTARIAÇÕES MENCIONADAS  

Obras:

Música Sacra

Livro “A Grande Música 

do Maranhão”  

Inventário do Acervo

Padre João Mohana  Tantum Ergo 20 26

Salutaris e Jaculatórias 14 16

Motetos 11 [?] 2

Veni Creator e Veni Sancte Spiritus 10 8Ave Maria 27 31

Ladainhas 50 46

Entre-actos 13 12Missas 20 24

Marchas graves, orquestradas para procissões 39 79

Marchas fúnebres orquestradas 22 12

Pastorais 14Total 226 270

(DANTAS FILHO, pp.152-153)

Móvel 1M1

GavetasG01G02G03G04G05

Registos0001 - 00630064 - 01860187 - 02000221 - 03250326 –  0527

M2 G01G02G03G04G05

0528 - 07390740 - 08290830 - 09530954 - 10561057 - 1185

M3 G01G02G03G04

G05G06

1186 - 13551356 - 14581459 - 16931694 - 2060

2061 - 2125Partes avulsas, sem numeração.

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Q UADRO 4  –  OUTRAS OBRAS TAMBÉM MENCIONADAS POR MOHANA 

As restantes obras são profanas, perfazendo um

total de 157 ao todo (referidas pelo Pe. Mohana): 

 No Inventário do Acervo encontramos

um número bem maior  

Obras sinfônicas 14

Obras corais com orquestra 26

Obras vocais com acompanhamento instrumental

(abaixo em destaque os principais gêneros) 28 328

Opera 1 2

Opereta 5 6

Valsas orquestradas 19 18

Gavotas 4 2

Berceuses 9 3

Minuetos 2 2

Mazurcas 6 12

Pás de quatre 14 16

Habaneras 7 4Lundus 2 3

(DANTAS FILHO, p.153)

 Algumas tabelas analíticas da situação documental das 75entradas constantes do Catálogo de Obras sacras do Período Imperial .9 

1-  TONALIDADES ENCONTRADAS 

Gênero

Ton.    A  n   t   í   f  o  n  a  s

   H   i  n  o  s

   L  a   d  a   i  n   h  a  s

   S  a   l  m  o  s

   E  n   t  r  e  -  a  c   t  o  s

   M  a  g  n   i   f   i  c  a   t

   M  a  r  c   h  a  s

   M   i  s  s  a  s

   M  o   t  e   t  o  s

   M   ú  s   i  c  a   d  e

   R  e   i  s

   N  o  v  e  n  a  s

   O  s  a   l  u   t  a  r   i  s

   h  o  s   t   i  a

   O   f   i  c   i  o

   T  a  n   t  u  m  e  r  g  o

   T  e   D  e  u  m

   J  a  c  u   l  a   t   ó  r   i  a  s

   T  o   t  a   l

   P  e  r  c  e  n   t  a  g  e  m

C 2 1 1 4 1 1 1 12 10.56

Cm 2 1 3 2.64

D 2 1 1 3 1 2 10 8.8

Dm 1 1 0.88

Eb 3 1 2 2 8 7.04

E

Em 1 1 0.88

F 1 8 4 1 6 1 3 24 21.12

Fm 4 4 3.52

G 2 3 1 2 4 2 1 1 1 1+[1?] 19 16.72

Gm 2 1 1 1 5 4.4

A

Am

Bb 1 1 2 1.76

Bbm

Total 2 3 15 1 9 2 15 14 3 1 6 1 2 10 1 ou 2 2 88 100

(DANTAS FILHO, p.169)

9 cf. p.7.

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2-  ANDAMENTOS ENCONTRADOS  

Allegro Maestoso/ non troppo/ brillante/ come prima

Andante Grazioso/ grave/ sostenuto/ maestoso/ assai

sostenuto/ non tanto/ molto sentimental /

molto/ spirituoso/ mosso/ Pouco Andante

Adagio non tanto

Allegretto Moderato/ risoluto

Animato Sem variações

Largo Sem variações

Moderato Assai/ allegreto

Andantino Sem variações

Larghetto Flebile

(Maestoso) Sem variações

Vivace Sem variações

(DANTAS FILHO, p.170)

3-  S ITUAÇÃO DOCUMENTAL DAS FONTES M USICAIS 

Obras Autógrafas 32

Obras Autógrafas em cópias 4

Cópias 41

(DANTAS FILHO, p.170)

4-  S ITUAÇÃO QUANTO À INTEGRALIDADE DAS FONTES MUSICAIS  

Obras Musicais Completas Incompletas Fragmentadas Defeituosas

 Novena 1 Missas 1 Tantum ergo 1 Novena 1

Missa 1 Motetos 2 Entre-actos 6

Salmo 1 Te Deum 2 Marchas 6

Magnificat 1 O Salutaris hóstia 2 Dobrado 1

 Novenas 7

Tantum ergo 2

Hinos 12

Ladainhas 1

Salmo 1

Magnificat 1Música de Reis 1

Jaculatória 6

Entre-actos 6

Marchas 2

Ofícios 2

TOTAL 4 TOTAL 58 TOTAL 14 TOTAL 1

(DANTAS FILHO, p.170)

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5-  FÓRMULAS DE COMPASSOS CONSTANTES

Entre-acto 3/4 2/4

Hino 4/4 3/4

Jacultória 4/4 3/4 12/8

Ladainha 4/4 3/4 2/4 3/8 12/8Magnificat 4/4 3/4 2/2

Marcha 4/4 2/2

Missa 4/4 3/4 2/4 2/2 3/8 6/8 9/8

Moteto 4/4Música de Reis 4/4 6/8

 Novena 4/4 3/4 2/4 6/8 12/8

O Salutaris hostia 4/4

Ofício 4/4 3/4 2/4 2/2 3/8Salmo 4/4 3/4 9/8

Tantum ergo 4/4 –  3/4

Te Deum 4/4 –  3/4Antífona 4/4

(DANTAS FILHO, p.171)

Concluímos o presente artigo chamando a atenção para aimportância desse repertório, mais pelos aspectos funcionais que ofazem um protagonista de grande relevância na compreensão de nossahistória, embalados que somos sempre, pelo entusiasmo do grandepolígrafo desta Ilha do Maranhão, a Upaon Açu , o Padre João Mohana,cuja obra maior foi construir um corpus tão significativo detestemunhos históricos que a cada dia nos desafia pela sua grandeza e

fragilidade.

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BIBLIOGRAFIA 

BERCHMANS, João. Tese de Doutoramento: A Música Religiosa de

Leocádio Rayol (1849-1909) e sua relação com o Maranhãodo Século XIX: um estudo musicológico, com transcrição,análise e perspectiva histórica . 2004

DANTAS FILHO, Alberto. Tese de Doutoramento: O AcervoMusical João Mohana e a Vida Musical Litúrgica noMaranhão Imperial –  O ‘Romantismo de Província’ como

Ornamentalismo Hegemônico na Ilha de São Luís –  1836- 1892 . 2006

CAVALCANTI FILHO, Sebastião.  A Questão Jesuítica no  

Maranhão . São Luís: SIOGE. 1990

Diário do Maranhão. São Luís, 1856 [junho a dezembro]

GUERRA-COTTA, André. Dissertação de Mestrado: O Tratamentoda Informação em Acervos de Manuscritos MusicaisBrasileiros . Belo Horizonte: PPGCI / EB-UFMG. 2000

MOHANA, João.  A Grande Música do Maranhão . Rio de Janeiro: Agir Editora. 1974

SALLES, Ricardo. Nostalgia imperial: a formação da identidadenacional no Brasil do Segundo Reinado .  Rio de Janeiro: Topbooks. 1996

SOTUYO BLANCO, Pablo e GUERRA COTTA, André. PatrimônioMusical da Bahia - Arquivologia e Património Musical .Salvador: EDUFBA. 2006 

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 ACERVO P ADRE J AIME DINIZ:  

PATRIMÔNIO ARQUIVÍSTICO COMO REFERÊNCIA

HISTÓRICA À MUSICOLOGIA DO NORDESTEBRASILEIRO 

 João Berchmans de Carvalho Sobrinho (UFPI) 

HISTÓRICO DO ACERVO  O acervo de música do Instituto Ricardo Brennand, composto

por cerca de 2.800 partituras, é parte integrante dos 60 mil documentosexistentes na Biblioteca, constituído na sua maioria de coleçõesparticulares, compradas pelo olhar de colecionador do seu Presidente,Ricardo Coimbra de Almeida Brennand. Este valioso acervo reúnedocumentos musicológicos, bibliográficos e arquivísticos pertencentes

ao compositor, pianista e professor pernambucano Euclides Fonseca(1854-1929 ), uma representativa coleção de 1177 partituras impressasdo artista plástico e colecionador italiano Giuseppe Baccaro (1930-) etambém o Acervo Padre Jaime Diniz, objetivo desta comunicação.

F IGURA 1.  PADRE JAIME DINIZ  

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Padre Jaime Cavalcanti Diniz  (1924-1989)  foi compositor,regente, organista, professor e pesquisador pernambucano comdestaque no campo da pesquisa musicológica. Estudou com FurioFranceschini, Ernest Krének, Higino Anglés, dentre outros renomadosprofessores da Itália e França. Realizou edições musicológicas epublicações sobre a história da música no Brasil, dirigiu corais e fundouo Coro Guararapes do Recife, onde apresentou obras oriundas de suapesquisa musical, sendo também membro efetivo da AcademiaBrasileira de Música, ocupando a cadeira de nº27, cujo patrono foi Vicenzo Cernicchiaro. Seu acervo, adquirido em 2002 pelo InstitutoRicardo Brennand, contabiliza em torno de 1466 partituras, 1000correspondências passivas e ativas, mais de 800 discos de vinil e 532programas de eventos musicais, inúmeros recortes de jornais; textosdatilografados e manuscritos, registros de pesquisa em fichas, diários,cadernos, bem como, documentos institucionais referentes às igrejas doRecife. Conta ainda com um acervo bibliográfico catalogado e indexadona base de dados da Biblioteca, com 1162 livros/folhetos e 587

exemplares de periódicos.Este conjunto histórico-musicológico compreende manuscritos

autógrafos e cópias constituindo-se em uma gigantesca fonte primária esecundária de informação, não só para os estudiosos e pesquisadores,como também para músicos, estudantes e professores. Estemonumento é representativo de exemplos da tradição musical ocidentalem seu feitio instrumental e vocal, abrangendo tanto a produçãonacional como a de outros países em suas manifestações de músicateatral ou religiosa, ou em sua multiplicidade de formas  –   sinfonias,missas, aberturas sinfônicas, peças para solista e de câmara  –  de gêneros –  religioso, popular, operístico, camerístico  –  e de funções  –  concertoscomemorativos, festividades religiosas, temporadas líricas e deconcertos, cerimônias de caráter militar, e divertimentos e saraus -podendo-se ter uma idéia do perfil musical da sociedade pernambucanado século XIX e primeira metade do século XX.

Da coleção destaco importantes partituras originais decompositores como Luís Álvares Pinto, Francisco Libânio Colás, Tomás da Cunha Lima Cantuária, Gabriel Arcanjo de Azevedo, e BentoMussurunga, e tantos outros que atuaram com destaque na músicabrasileira. Ressalte-se, ainda, os ensaios musicológicos publicados peloPe. Jaime Diniz em jornais, revistas e livros que o torna o mais

destacado estudioso da música do nordeste brasileiro.Portanto, este acervo constitui um importante patrimônio cultural

adquirido e gerenciado pelo Instituto Ricardo Brennand, e tem comoobjetivo fornecer um suporte histórico e documental à pesquisa emfontes históricas pernambucanas e nacionais.

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LOCALIZAÇÃO E IMPORTÂNCIA DO ACERVO Fundado em 13 de setembro de 2002, o Instituto Ricardo

Brennand está localizado a 14 quilômetros do centro da cidade do

Recife, e seguramente, é um dos mais movimentados centros culturaisbrasileiros, com uma média anual superior a 160.000 pessoas. Assim,esta Instituição possui uma visitação pública que se aproxima a algunsdos mais importantes museus brasileiros, como o MASP - São Paulo(230.000), o Museu de Arte Moderna de São Paulo (210.000) e o Museuda Inconfidência de Ouro Preto (100.000). Em julho de 2008, estainstituição sem fins lucrativos, atingiu a marca de 1 milhão de visitantespor possuir um relevante acervo, dentre eles a maior coleção do mundode Frans Post, primeiro paisagista das Américas, uma rica coleção sobrea arte brasileira do século XIX, uma significante coleção de armasbrancas e um interessante museu de cera. Sua grandiosa bibliotecapossui mais de sessenta mil documentos e é parte integrante doconjunto arquitetônico

 –   Museu, Pinacoteca e Biblioteca - ocupando

uma área de 274 m2. Projetada para reunir mais de cem mil volumes,detém atualmente livros, opúsculos, periódicos, partituras, discos,fotografias, álbuns iconográficos e obras raras. A sua coleção de ObrasRaras abriga desde obras do século XVI ao XX, dificilmenteencontradas em outras bibliotecas ou arquivos.

F IGURA 2.  INSTITUTO R ICARDO BRENNAND 

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É, portanto, nas terras da Várzea, sede de uma pequena povoaçãodesde o século XVII que a Biblioteca do Instituto Ricardo Brennandajuda a produzir o conhecimento na região do grande Recife, do séculoXXI.

ESTRUTURAÇÃO DO ACERVO PADRE JAIME DINIZ  

Portanto, a tarefa que nos cabe agora é a de organizar, catalogar,inventariar e digitalizar em sua totalidade o Acervo Musical daBiblioteca do Instituto Ricardo Brennand, incluindo sua higienização,acondicionamento e organização em séries documentais, promovendopublicações musicológicas, preservando-o e tornando-o acessível a

todo e qualquer público.

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F IGURA 3 EQUIPE NA ETAPA DE CATALOGAÇÃO 

Para tanto, a equipe do Instituto Ricardo Brennand elaborou umprojeto em que constam as seguintes etapas para a reorganização eestruturação adequada do acervo:

 Organização do acervo em séries documentais;

 Classificação dos documentos segundo o caráter de divulgação;

 Embalagem e arquivamento adequados;

 Qualificação e treinamento de pessoal técnico de apoio emdigitalização, catalogação e edição musical;

 Digitalização do conjunto documental do Acervo Musical daBiblioteca do Instituto Ricardo Brennand;

 Catalogação para pesquisa pública da Biblioteca do InstitutoRicardo Brennand e sua indexação em bases de consulta internacionais;

 Inserção de um link  no website do Instituto Ricardo Brennandreferente ao Acervo Musical da Biblioteca do Instituto RicardoBrennand para a socialização da consulta, que incluirá uma notíciabiográfica, fotografias, o acesso ao catálogo e a disponibilização dasséries documentais publicadas;

 Estabelecimento de uma política de edição musical de obras

significativas para a musicologia brasileira a partir da análise técnica daequipe coordenadora do projeto;

 Disponibilização de todo o trabalho publicado para instituiçõesde ensino e pesquisa, músicos profissionais e amadores, pesquisadores,historiadores, críticos, professores e amantes da música.

METODOLOGIA E ALGUMAS SINGULARIDADES DO

ACERVO O convite da Coordenadora da Biblioteca de Obras Raras do

Instituto Ricardo Brennand para uma consultoria musicológica ao Acervo Padre Jaime Diniz, além de me tocar de maneira afetiva, poisme fez reviver velhas lembranças do mestre amigo, colocou-me aoportunidade de discutir com a equipe do Instituto Ricardo Brennandaquilo que eu considero de mais fundamental em um arquivo destanatureza: a possibilidade de colocar à disposição de estudiosos demúsica um conjunto de informações sobre a prática musical de um

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período e de uma região como testemunho de um momento cultural ehistórico.

Portanto, foi deste modo que se deu o meu primeiro contatocom o Acervo Jaime Diniz e a possibilidade de desenvolver umtrabalho que ao iniciar já se prenuncia proveitoso. É mais um acervo

que pode possibilitar a recuperação de uma parte de nossa memóriamusical e mais um legado para a musicologia histórica de Pernambucoe do Brasil.

No momento atual o Acervo Padre Jaime Diniz encontra-sedepositado junto à Biblioteca de Obras raras do Instituto Brennand.Entretanto, em face do impacto cultural que este conjuntomusicológico representa para as diferentes áreas da pesquisa musical, epor constituir um conjunto que compreende mais dois acervos, o deGiuseppe Baccaro, constituído de obras impressas, e o de EuclidesFonseca, que compreende manuscritos e obras impressas, a equiperesponsável resolveu transferi-los para o andar de cima que passa agoraa ser um setor exclusivo para a área da música.

Outro ponto fundamental e que já está em fase dedesenvolvimento, diz respeito à catalogação dentro de padrõesmusicológicos que possa facilitar a consulta aos pesquisadoresinteressados. Ao iniciar o exame do catálogo de manuscritos, constateique a preocupação inicial deveria seguir este caminho: o de subsidiarinformações complementares e mais detalhadas, do ponto de vistamusicológico, à catalogação geral já existente na plataforma usada pelaequipe do Instituto Ricardo Brennand, objetivando com isso, umainserção mais específica em seu banco de dados. Estas informações são

pertinentes às exigências da pesquisa musicológica, tais como, época,gênero, contexto cultural, instrumentação, caracterização das partesinstrumentais, dentre outras. Evidentemente que se trata de umtrabalho que extrapolou a minha rápida passagem pelo velho Recife.Entretanto, aceitei o desafio de iniciar um exame preliminar do materialpara, posteriormente, elaborar um projeto que viabilizasseinstitucionalmente este objetivo. Como já coordeno um grupo depesquisa em música na Universidade Federal do Piauí, o NUPEMUS,poderia utilizá-lo como base de apoio a este projeto através de umaparceria interinstitucional.

Como diretriz metodológica resolvi trabalhar, neste primeiro

momento, as composições exclusivamente de autores brasileiros. Estatomada de decisão justifica-se pelo interesse mais emergente de obrasde maior porte voltadas para a produção musical nordestina.Entretanto, constatei um repertório significativo dos chamados grandesmestres do passado musical. Compositores dos períodos barroco,clássico e romântico estão presentes no arquivo, acredito que, peloimportante papel de educador musical que o Padre Jaime exercia e com

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certeza estes documentos foram guardados com o mesmo zelo eapreço que dedicava ao material autóctone.

Os resultados começam a aparecer. Nos primeiros dias trabalheio catálogo organizando algumas missas, partes de missas, Te Deum, Tantum Ergo, peças soltas de diversos compositores brasileiros.

 Algumas destas obras possuíam partes incompletas em que os fóliosforam armazenados em pastas de outras obras. Com muita calma epaciência remontamos o quebra-cabeça musical conseguindo darunidade musicológica às obras. Cada pasta possui agora uma novacatalogação anexa: uma ficha de informações musicológicas, com dadossobre a instrumentação das peças, datas, autor, copista, que venha afacilitar e enriquecer a consulta.

 Alguns manuscritos, pela situação de risco em que se encontram(fragilidade do papel, a queima da tinta pelo armazenamentosobreposto dos fólios, ataque de insetos, acidez, dentre outrosproblemas), serão digitalizados para possibilitar um manuseio semmanipulação do original.

 Aliás, ressalte-se o profissionalismo e correção da equipe daBiblioteca do Instituto Ricardo Brennand, que além das condiçõesadequadas de armazenamento, nos conforta com a beleza do lugar, queparece nos transportar através do tempo, nos fazendo sentir em um verdadeiro scriptorium: a sala de cópia dos mosteiros medievais.

Na verdade, neste primeiro dediquei-me mais detalhadamente aoexame das obras do velho compositor tão querido do Padre Jaime,Francisco Libânio Colás. Trata-se de um conjunto de obras religiosasem boas condições de preservação e que a um primeiro exame, localizei

o que parece ser um manuscrito autógrafo. Se pudermos comprovarisso em um futuro próximo, teremos neste acervo a única obraautógrafa de Francisco Libânio Colás até então encontrada: o Te Deumdo Espírito Santo. O curioso é que desconheço qualquer citação do Padre Jaime a esta obra, sobretudo quando ele sempre deixou transpareceruma franca admiração por este compositor, que pode ser dimensionadapor sua infatigável busca pela Missa Pernambuco e pela sua edição daMarcha Fúnebre pelo Coro Guararapes, acompanhada de um esboçobiográfico do compositor.

O Te Deum do Espírito Santo é escrito para três vozes masculinas(1º. e 2º. Tenores e baixo) e orquestra (ottavino, flauta, clarinetas,pistons, trompas, 1º. 2º. e 3º. Trombones, oficleide, 1os. e 2os. violinos, violas, violoncelos e contrabaixos). Esta obra encontra-se em fase deestudos como projeto de Iniciação Científica da UFPI, sob minhacoordenação.

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F IGURA 4.  FOLHA DE ROSTO DO TE DEUM DO ESPÍRITO SANTO 

Outra obra que me despertou interesse foi a Missa No.1 deFrancisco Libânio Colás, um projeto editorial do Padre Jaime Diniz,que não chegou a concluí-lo. Encarei esta tarefa tomando como base aedição original do Padre e realizando as lições inconclusas ou passagensque ele deixou com lacunas.

No dia 25 de novembro próximo passado executamos Gloria daMissa No.1 com a Orquestra de Câmara da UFPI e o Coral Letitia etSpes  do Instituto Camillo Filho, no Cine Teatro da UFPI, por ocasiãodo lançamento de dois livros deste autor: Músicas e Músicos em SãoLuís: subsídios para uma história da música no Maranhão e Texto eContexto: a comédia musical Uma Véspera de Reis de Francisco

Libânio Colás. Como se vê, o Acervo Jaime Diniz já dando osprimeiros frutos.

Portanto, o Acervo Padre Jaime Diniz, através do InstitutoRicardo Brennand encontra-se em fase de organização para possibilitara consulta aos pesquisadores interessados de mais um conjuntomusicológico importante para a memória musical brasileira.

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BIBLIOGRAFIA  

COTTA, André H. Guerra. Subsídios para uma Arquivologia Musical.XI ENCONTRO NACIONAL DA ANPPOM, Campinas, 24 a

28 de agosto de 1998.  Anais .  Campinas: Instituto de Artes daUNICAMP, 1998. p. 238-243.

 __________. O Tratamento da Informação em Acervos deManuscritos Musicais Brasileiros. 2000. Dissertação (Mestrado emCiência da Informação) - Escola de Biblioteconomia, UFMG,Belo Horizonte, MG, 2002.

COTTA, André Guerra; SOTUYO BLANCO, Pablo.  Arquivologia e

Patrimônio Musical . Salvador: EDUFBA, 2006.

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FILARMÔNICA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO:  

FUNÇÕES DE UMA BANDA DE MÚSICA NO

 AGRESTE SERGIPANO ENTRE 1898  E 1915

 João Liberato (UFS)

RESUMO 

Este artigo estuda a atuação da Filarmônica Nossa Senhora da Conceição nacidade de Itabaiana, região agreste sergipana. Nos dias atuais, esta instituiçãodestaca-se como importante baluarte da tradição musical em Sergipe, tendocomo principais funções a difusão de conhecimentos musicais e a inserçãosocial através da música. No entanto, o seu vasto acervo histórico explicita ofato de que esta instituição musical exercia funções diferentes das atuais nasociedade itabaianense de antanho. O presente trabalho se propõe ademonstrar, fundamentado principalmente na análise de documentaçãohistórica, algumas das mais importantes funções desempenhadas por estabanda filarmônica no final do séc. XIX e início do séc. XX.

 A Filarmônica Nossa Senhora da Conceição, doravante tratadacomo FNSC, tem sede no município de Itabaiana, região agreste

sergipana. Há mais de um século desenvolve atividades, realizandoapresentações musicais periódicas não só em Itabaiana, mas tambémem diversas cidades da região. Na sede da instituição são ministradasaulas de música, englobando todos os instrumentos da formaçãotradicional de banda filarmônica e, mais recentemente de orquestra. Oseu atual projeto musical contempla diversas linhas de atuação, dentreelas uma banda jovem, uma banda sinfônica, uma orquestra sinfônica,um coro sinfônico, um coro infantil e aulas de iniciação musical.

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Na sede da FNSC foi instalado um museu, contendo muitosinstrumentos musicais antigos, além de partituras, fotografias e algunsdocumentos pertencentes à administração.

Essa instituição musical faz parte da cultura local, não só comobanda de música, mas também como um ícone popular em torno do

qual surgem histórias e mitos. De acordo com os habitantes da cidade etambém os seus membros, a FNSC é uma instituição musical delongevidade surpreendente, sendo o seu slogan  “a mais antiga instituiçãomusical do Brasil”. Não existem estudos comprobatórios destaafirmação, tendo ela sido publicada pela primeira vez pelo historiadorsergipano José Sebrão de Carvalho,1 na obra intitulada Filarmônica NossaSenhora da Conceição, a mais antiga instituição musical do Brasil. 2 

Os documentos mais antigos da FNSC  –   localizados até opresente momento  –   encontram-se no Arquivo Público Estadual deSergipe (APES), estão identificados como “Livro de Atas da SociedadePhilarmônica Nossa Senhora da Conceição 1896-1915.” O conteúdo domaço vai além do citado no frontispício, não é apenas o livro de atas,mas também o livro da secretaria e diversas folhas avulsas.3  Osdocumentos vão de 1898 a 1915, não existem documentos de 1896,como é indicado no frontispício. 

1  Mais conhecido como Sebrão, sobrinho. Adotou o sobre nome sobrinho paradiferenciar-se do seu tio, o Cel. José Sebrão de Carvalho. Inicialmente adotou onome José Sebrão de Carvalho Sobrinho, tendo depois passado a assinar seustrabalhos com o nome de Sebrão, sobrinho (em minúsculo) para não ser

confundido com alguém da família Sobrinho. Informações retiradas de Vladimir deSouza Carvalho.  A República Velha em Itabaiana  (Aracaju: Fundação OviedoTeixeira, 2000), 616-617.2 Nesta obra o historiador afirma que a FNSC originou-se no ano de 1745, quandoera uma orquestra sacra, tendo como regente o vigário colado coimbrenseFrancisco da Silva Lobo. Segundo o autor, Francisco da Silva Lobo permanece atéo ano de 1768, deixando a orquestra sacra sob a tutoria de seu sobrinho VitoManuel de Jesus e Vasconcelos, que foi em seguida substituído pelo seu netoFrancisco Manuel Teixeira. No ano de 1879, já sob a regência de Samuel Pereirade Almeida a orquestra sacra é incrementada com uma “pancadaria” (instrumentosde percussão), adquirida pelo mesmo maestro numa estadia em Salvador, passandoentão a ter características marciais e a se chamar Philarmônica Euphrosina. Estafilarmônica funciona até o ano de 1897, quando tem o nome novamente mudado

 para Philarmônica Nossa Senhora da Conceição, pelo maestro Francisco Alves deCarvalho Júnior. Segundo Sebrão, sobrinho a orquestra sacra, a PhilarmônicaEuphrosina e a FNSC seriam, portanto, a mesma instituição.3 O livro de atas contém ao todo 52 folhas. Constitui-se de atas que vão do dia 14de junho de 1898 ao dia 18 de julho de 1915. O livro da secretaria contém ao todo83 folhas mais o frontispício. São registros diversos da administração da FNSC. Asfolhas avulsas constituem-se em recibos emitidos e recebidos pela tesouraria daFNSC.

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No início do séc. XX, artigos publicados nos jornais O Estado deSergipe, Jornal de Sergipe, Correio de Aracaju, Jornal de Sergipe, Folhade Sergipe e Jornal do Povo faziam referências constantes à FNSC.

Nos dias atuais, a FNSC tem dentre as suas principais funções adifusão de conhecimentos musicais e inserção social através da música.

Entretanto, as diversas fontes documentais antigas e atuais indicam queesta instituição tinha funções diferentes na sociedade itabaianense noperíodo entre 1898 e 1915  –   intervalo de tempo abarcado pelo seuconjunto de documentos históricos mais antigos. Dentre elas chama aatenção o fato dessa filarmônica ter forte ligação com a política naqueleperíodo, pertencendo ao grupo liderado pelo Cel. José Sebrão deCarvalho. 

 Além da política, a FNSC desempenhava outras funçõesimportantes na sociedade itabaianense de antanho. Podemos destacar,dentre elas, a função simbólica e a função social.

FUNÇÃO SIMBÓLICA 

No âmbito cultural, as bandas filarmônicas tinham ao menos doispapéis importantes, enquanto símbolo de poder e status de uma classedominante e enquanto difusoras de conhecimentos musicais.4 A cidadede Itabaiana possuía duas bandas filarmônicas no período abarcadopelo presente estudo: a FNSC e a Filarmônica Santo Antônio.

O símbolo de poder e status desempenhado por estas bandas nãofoi um caso à parte no contexto brasileiro de bandas filarmônicas. Emdiversas localidades do país essas corporações musicais tiveram umpapel semelhante nas comunidades à que pertenciam. Esse símboloemanava a partir da utilização das bandas militares na corte luso-brasileira e se espraiava por diversos âmbitos da sociedade, atérecônditas cidades, como Itabaiana naquele período:

Bandas militares muitas vezes tomavam parte das festas oficiais da monarquialuso-brasileira, tanto em honra à família real e imperial  –  aniversários, noivados,casamentos, batizados etc.  –  quanto por razões de Estado –  aclamações, vitórias

militares e celebrações cívico-políticas em geral. Esta exposição freqüente teria

4 As fontes localizadas não oferecem subsídios suficientes para a perscrutação dosaspectos de difusão de conhecimentos musicais desempenhados pela FNSC. É

 possível citar apenas que os músicos e compositores eram formados no ambienteda banda a que pertenciam, sem maiores detalhes sobre o modo como aconteciaeste processo.

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favorecido a divulgação deste tipo característico de conjunto instrumental - abanda de música - como um importante elemento simbólico na representaçãomonárquica.5 

 As bandas filarmônicas eram uma forma de adaptação oureapropriação desse símbolo sonoro desempenhado pelas bandas

militares,6

 que tinham participação em grande parte das cerimônias damonarquia. Esses rituais simbólicos foram se sedimentando nasociedade brasileira ao longo do séc. XIX, principalmente a partir de1808, com a vinda de Dom João VI  –   acompanhado da corteportuguesa –  para o Brasil:

 A transferência da corte para o Rio de Janeiro intensificou as comemorações dasfestas reais e religiosas, que também se tornaram mais suntuosas, afinal o reicompareceria pessoalmente à algumas ocasiões, exigindo pompa à sua altura.Nem todas as festas tinham o mesmo objetivo, embora conjugassem uma sériede elementos, discursos e regras ditadas pelo Estado  –   arcos, trajetos,participantes etc. –  em diferentes vozes, gestos, monumentos e danças.7 

 As comemorações realizadas em Itabaiana  –   principalmente aspolíticas –  seguiam um padrão bastante próximo do utilizado pela cortebrasileira ao longo do séc. XIX. É possível verificar isso através dorelato da coroação e aclamação de dom João VI, realizado pelo PadrePerereca:

[Após os juramentos, o alferes-mor desfraldou o estandarte real dizendo em voz alta:] Real, Real, Real, pelo muito alto, e muito poderoso senhor rei D. João VI, nosso senhor, o que repetiram os reis de armas e as pessoas presentes nagaleria, e constitui sinal para as bandas reunidas nos largos executarem os hinos.Depois dessa primeira proclamação interna, o porta-estandarte desceu doestrado, após saudar o rei, e foi conduzido ao balcão central da galeria [...]

repetiram eles ao povo a mesma proclamação, a que todos os presentesresponderam com demonstrações de alegria e vivas que se confundiram com amúsica das bandas, os sinos, os estrondos das girândolas e as salvas de artilhariados fortes da marinha. Depois dessa proclamação, o rei de armas, novamenteno interior do palácio, notificou a partida do rei; o cortejo se formou e a marchase iniciou ao som da música das bandas reunidas na praça.8 

5  Fernando Pereira Binder.  Bandas Militares no Brasil: difusão e organização

entre 1808-1889 (São Paulo: Dissertação de Mestrado UNESP, 2006), 10.6  Idem, Ibidem. Até hoje muitas dessas bandas utilizam repertório, uniforme eformação instrumental característicos de corporações militares.7  Iara Lis Carvalho Souza.  Pátria Coroada: o Brasil como um corpo político

autônomo 1780-1831 (São Paulo: Unesp, 1999). Apud Binder, 37.8 Luis Gonçalves dos Santos (Padre Perereca).  Memórias para Servir de História

do Brasil (Belo Horizonte; São Paulo: Itatiaia, Ed. da Universidade de São Paulo,1981. 2 vols.). Apud Binder, 56.

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Comparado ao relato das comemorações em Itabaiana pelaeleição do Dr. Manoel Batista Itajahy para vice-presidente do Estado:

 Aos seos primeiros arreboés a sympathica philarmonica “S. Antonio” tocoualvorada em frente a residência do circunspecto Ex. sr. dr. Manoel BaptistaItajahy, digníssimo Vice-Presidente do Estado e Chefe deste município, sahindo

depois em passeiata9

...Em casa do sr. coronel Dultra Almeida foram erguidas enthusiasticassaudações;10  foi servido fino vermouth e após a philarmonica executar lindaspeças de seu vastíssimo repertorio, a multidão desfilou. . . .

Muitas foram as casas vizitadas e em todas a mesma festa, o mesmodelírio...

O orador foi estrepitosamente saudado.Eram doze horas voltaram todos à sede da philarmonica e ao toque do

Hymno Nacional11  a multidão despersou na melhor ordem, todos jubilosos.[ sic. ] 12 

Como se pode perceber, através da comparação entre os relatos

anteriores, os rituais comemorativos no Rio de Janeiro e em Itabaianatinham aspectos em comum. A banda filarmônica em Itabaiana tinhafunção análoga às bandas militares na corte luso- brasileira. Tocava emfrente à residência do seu patrono político; recepcionava os convidadose a população; acompanhava as passeatas, desfiles e procissões;executava o repertório condizente com a ocasião; era um elementoessencial no estabelecimento da pompa e ordem nos rituais.

O símbolo representado pela banda nos rituais brasileiros,principalmente os públicos, atravessou gerações, sedimentando-se nasociedade brasileira a partir do início do séc. XIX e perdurando demaneira bastante intensa até o início do séc. XX. Em 1913, um relatoda inauguração da primeira iluminação pública de Itabaiana nos fornecemais um testemunho:

Pelas 7 horas da noite, ao som da filarmônica Santo Antonio e presentes orepresentante do presidente do Estado, Dr. Nobre de Lacerda. Do daImprensa, jornalista Costa Filho, autoridades locais e muito povo, foiinaugurada a iluminação pública, acendendo o intendente a primeira lâmpada,como é do estilo.13 

9  Assim como no relato anterior, geralmente havia passeata acompanhada pela

 banda.10 As saudações também eram seguidas pela execução musical da banda.11 Na descrição feita pelo Padre Perereca ele também se refere à hinos executados

 pela banda, sem definir quais eram exatamente.12 Folha de Sergipe, 01.11.1908, 03.13 Diário da Manhã, 31.10.1913.  Apud Vladimir de Souza Carvalho.  A RepúblicaVelha em Itabaiana, 449.

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No relato acima há somente referência à presença da FilarmônicaSanto Antônio, sem descrição de todo o ritual de inauguração. Noentanto é possível remontar diversos aspectos desses rituais. Issoporque a banda filarmônica se inseria dentro da estrutura cultural deuma época. Havia uma organização coerente e relações quase fixas entrerealidades e massas sociais. A banda filarmônica tinha um significadoinspirado na utilização das bandas militares pela aristocracia brasileira nacorte. Apesar de haver inúmeras diferenças de modelo e significadoentre as diversas bandas brasileiras, essa estrutura cultural herdadapermitiu que as bandas filarmônicas tivessem mais um significado nasociedade itabaianense, atravessando gerações como ícones, sofrendotransformações, porém mantendo a essência simbólica. As bandas demúsica eram um elemento essencial nos rituais políticos e religiosos emItabaiana.

F ILARMÔNICA NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO14

 

14 Fotografia de Miguel Teixeira da Cunha. Apud  Carvalho.

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F ILARMÔNICA SANTO ANTÔNIO15

 

FUNÇÃO SOCIAL 

 A FNSC desempenhava função social como um dos poucoslocais de encontro e entretenimento daquele período em Itabaiana.Parte da população, não encontrando outras formas de lazer, reunia-se

nas fileiras da banda, papel que posteriormente foi desempenhado pelofutebol:

Essa atração por música na época se explica pela falta do que fazer à noite.Itabaiana não tinha energia elétrica e a música era uma forma do homem sair desua casa para ir fazer alguma coisa lá fora, daí o número expressivo  –   paraaquela época –  de músicos.16 

 A FNSC possuía um número grande de sócios, que se reuniamperiodicamente para ensaios e sessões deliberativas da administração.Dentre estas classes havia pessoas dos mais diversos estratos sociais,étnicos e etários, um grupo bastante heterogêneo. Somente as mulheres

15  Idem. Ibidem.

16  Vladimir Souza Carvalho. Em entrevista feita por mim, gravação em formatomp3, Aracaju, 27 de junho de 2007. Carvalho é historiador e Juiz Federal, publicoudiversos trabalhos sobre a cidade de Itabaiana.

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estavam excluídas desta sociedade.17 Outro aspecto notável é que fazerparte da FNSC ou de outra filarmônica era uma coisa importante nocontexto social daquela época. Os nomes dos sócios em débito eexcluídos algumas vezes eram publicados nos jornais aracajuanos:

 A filarmônica cobrava dos sócios em débito através de editais publicados

nos jornais da capital e quando cortava uma pessoa também publicava um editalpara avisar que ela estava excluída.18 

 A FNSC pertencia a um grupo social e político liderado pelo Cel. José Sebrão de Carvalho. Durante a maior parte do tempo o Cel.Sebrão esteve no topo da hierarquia da FNSC, tendo sido eleitopresidente nos anos de 1900, 1903, 1904, 1905 e 1906. Este fatoevidencia a influência que este personagem tinha nesta bandafilarmônica.19 Os outros cargos de maior importância geralmente eramexercidos por pessoas ligadas ao Cel. Sebrão. A estrutura da FNSCpode ser encarada como um simulacro da estrutura social mais amplade Itabaiana. Os sócios se encaixavam de acordo com a faixa etária,

nível de instrução, poder econômico e prestígio social. Dentro dafilarmônica havia representantes de quase todos os estratos sociais efaixas etárias. Crianças, jovens e adultos, pobres ou de melhorescondições, procuravam a FNSC como forma de entretenimento,socialização, aprendizado musical e também prestigio social:

 As filarmônicas eram solenes. Elas tinham atas, diretoria, presidência e umcorpo social e diretivo grande... Fazer parte da diretoria e do corpo dafilarmônica era uma coisa importante, na época era a única coisa que tinha paraa pessoa participar além da igreja.20 

Enquanto organismo social, a FNSC, ao mesmo tempo que

congregava grupos sociais diversos, também definia um determinadogrupo, apesar de heterogêneo, que era o grupo social liderado pelo Cel.Sebrão. Eram sócios da FNSC alguns dos mais importantes líderespolíticos itabaianenses, tais como: Antônio Agostinho de Oliveira,intendente municipal por duas vezes e delegado de polícia; Josias Lapa Trancoso, negociante, membro do Conselho de Intendência Municipalem 1916; Antônio Lourenço Telles, vereador e intendente municipal; Tranquilino Lobão, subdelegado de polícia do distrito em 1890,membro do Conselho de Intendência Municipal em 1892 e Alferes; Antônio de Oliveira Bezerra, vereador em 1889, duas vezes presidente

17  Não há registro da presença de mulheres como sócias, tanto nos documentosescritos quanto nos documentos fotográficos.18  Vladimir Souza Carvalho. Em entrevista feita por mim, gravação em formatomp3, Aracaju, 27 de junho de 2007.19 De acordo com as atas das reuniões administrativas da FNSC daquele período.20  Vladimir Souza Carvalho. Em entrevista feita por mim, gravação em formatomp3, Aracaju, 27 de junho de 2007.

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do Conselho de Intendência Municipal, três vezes deputado estadual,suplente de delegado literário, 1º secretário da Assembléia Legislativa edelegado de higiene em 1909; Manoel das Neves de A., tenente emembro do Conselho de Intendência Municipal; Domingos Pereirad’Andrade, suplente do juiz municipal; Francisco da Silva Porto,conselheiro da Intendência Municipal; João Pereira de Oliveira, generaldo exército; José Cornélio da Fonseca Filho, 3° suplente do juizmunicipal e capitão; José Guilherme da Fonseca Menezes, capitão emembro do Conselho Municipal; Manoel da Lapa Trancoso, membrodo Conselho da Intendência Municipal;  Antônio d’Araújo Lobão,membro do Conselho de Intendência Municipal em 1891 e escrivão daexatoria; José de Calazans, presidente do Conselho de IntendênciaMunicipal.21 

Importantes comerciantes também faziam parte da FNSC. Valeressaltar que o Cel. Sebrão também era um importante líder comercialem Itabaiana.22  Podemos citar, como alguns deles: Josias Lapa

 Trancoso, negociante; Antônio Lourenço Telles, negociante; Cel.Hermelino Contreiras, muito bem sucedido na exploração de seringaisno Pará, um dos quais com o nome de Itabaiana; Antônio de OliveiraBezerra, ourives.

Muitos membros da família Carvalho faziam parte da FNSC, nosdocumentos há registro de nove deles, número bastante alto, levando-se em consideração a sua proporção ao número total de sócios.23 Podemos citar: Álvaro Carvalho, Argenor Manoel de Carvalho,Francisco A. Carvalho Júnior, José Antônio de Carvalho Heitor, José Antônio de Carvalho Heitor Filho, Juvenal Araújo de Carvalho, Cícero Alves de Carvalho, Francisco Antônio Carvalho e Francisco Alves de

Carvalho.24 Os documentos antigos e o material bibliográfico atual nos

oferecem um número maior de informações sobre o que poderíamoschamar de elite da FNSC. Este é um fato natural, tendo em vista omaior prestígio destas personalidades naquele ambiente, e a tendência

21 Vladimir de Souza Carvalho. A República Velha em Itabaiana. 22 O Cel. Sebrão defendia os interesses do grupo comercial que tinha suas casas naPraça da Matriz, em oposição ao grupo liderado pelo Dr. Itajahy, que tinha suas

casa comerciais na Praça Santo Antônio.23 Possuía uma média de 43 sócios, divididos em classes diferentes, que se reuniam periodicamente para ensaios e sessões deliberativas da administração. Os sóciosdividiam-se em 4 classes: músicos, contribuintes, beneméritos e honorários.24 Os nomes foram arrolados através de diversas fontes. A comprovação da filiaçãode cada um dos membros foi retirada do Livro da Secretaria (Deve Caixa e Termosde Adesão) e do Livro de Atas. As informações biográficas foram retiradas deCarvalho.

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de permanência dos vestígios históricos das classes mais abastadas. Noentanto, muito outros grupos faziam parte do quadro social da FNSC.Profissionais de diversas áreas, como carpinteiros, sapateiros, alfaiates,pequenos comerciantes e agricultores. Também participavam pessoasde faixas etárias bastante diversas, dentre elas crianças que, não tendomuitas opções de lazer e ocupação, procuravam a FNSC parapreencher o tempo e aprender a arte musical:

O primeiro grupo escolar de Itabaiana vem em 1937. Até então os meninosestudavam em escolas isoladas, boa parte não freqüentava a escola. Há umafoto de Itabaiana na década de 1940 que mostra uma sapataria com 50 oficiais eaprendizes de sapateiro. Ali estão pessoas da melhor sociedade de Itabaiana,pessoas que aprendiam a fazer o nome, não viam futuro nenhum no estudo eentão ficavam procurando uma profissão e uma arte musical. Esses meninosdeviam fazer parte disso [com relação às crianças que tocavam na FNSC e queestão presente na fotografia anterior].25 

O que caracterizava a FNSC, era a sua inserção e adaptação a um

meio social bastante heterogêneo, quase todos encontravam lugarnaquela sociedade musical. Mesmo as pessoas de origem simples epouca instrução podiam chegar a lugares importantes, como o cargo demaestro: “O maestro Antonio Silva tinha formação primáriaincompleta. Desde cedo ele estava costurando e cortando pano para terum meio de vida.”26 

 Apesar de não haver registro da participação das mulheres comosócias, há indícios de que elas estavam presentes no ambiente da FNSC,principalmente em eventos como as procissões, missas religiosas e osleilões de chifrineiras.27 

FUNÇÃO POLÍTICA 

25

 Carvalho. Em entrevista feita por mim, gravação em formato mp3, Aracaju, 27de junho de 2007.26 Carvalho. Em entrevista feita por mim, gravação em formato mp3, Aracaju, 27de junho de 2007.27  Espécie de bazar realizado com objetos de pouco valor (coisa chinfrim) queeram angariados dentre os membros da FNSC. Esses leilões de chifrineiras eramuma importante fonte de arrecadação de recursos da FNSC, além das mensalidades

 pagas pelos sócios, das doações e das cobranças por apresentações.

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Diversos estudos apontam a política como uma das maisimportantes funções desempenhadas pelas bandas filarmônicasbrasileiras no final do séc. XIX e começo do séc. XX, havendo casosdeste tipo nas mais variadas partes do Brasil, onde as bandasfilarmônicas se mesclavam com os partidos, onde a bipolaridadepolítica pós-monarquia se materializava também em duas filarmônicas,a “de cima” e a “de baixo”, a de São Sebastião e a de Santa Cecília.  28 

O Estado de Sergipe vivia um momento de reformulação de seusistema político, os diferentes grupos disputavam acirradamente opoder, contaminando toda a sociedade com a verve partidária, inclusiveas bandas filarmônicas.

Em Itabaiana havia dois grupos políticos principais, lideradospelos dois principais coronéis que, conseqüentemente, tambémdominavam as duas filarmônicas. De um lado o Coronel José Sebrão deCarvalho, comandando a FNSC e o grupo denominado Peba, do outroo Dr. Manoel Baptista Itajahy, comandando a Filarmônica Santo Antônio e o grupo denominado Cabaú .

DR. ITAJAHY CEL . SEBRÃO 

O período de 1899 ao início da segunda década do séc. XX émarcado pela dominação quase completa do Dr. Manoel Baptista

Itajahy. A Filarmônica Santo Antônio passa, conseqüentemente, afigurar nos principais eventos da sociedade Itabaianense. O seumaestro, Esperidião Noronha, tem também o seu melhor momento

28 Cf.: Mônica Vitorino. A Banda de Cima; Idem. Banda São Sebastião; Schwebel,Horst Karl. Bandas Filarmônicas e Mestres da Bahia. 

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político, integrando por diversas vezes o Conselho de IntendênciaMunicipal.

Nas festividades e comemorações políticas, a Filarmônica Santo Antônio é a principal atração. Como é o caso da visita do então senadorOlimpio Campos:

 A cidade apresentava um aspecto encantador e feérico.Em todas as ruas por onde passaram o digno Senador e a sua guapa comitiva,arcos e galhardetes se ostentavam, dispostos simetricamente e produzindo omais belo efeito. Em frente à residência do nobre Dr. Itajahy, na praça S. Antonio, erguia-se um chique pavilhão, onde a filarmônica local [Santo Antônio] executava as mais belas e simpáticas peças de seu apuradorepertório.29 

 As comemorações da eleição do Dr. Itajahy para vice-presidentedo Estado também representaram um importante momento para aFilarmônica Santo Antônio. Durante o seu domínio político, a sua

chegada na cidade era motivo de mobilização de boa parte dasociedade, estando a sua fiel filarmônica sempre presente:

Ontem à noite aqui chegou Dr. Baptista Itajahy e família, acompanhados demuitos companheiros que foram ao seu encontro. Ao primeiro sinal da entradade S. Ex. nesta cidade subiram muitas girândolas ornamentadas de foguetes; asruas estavam vistosamente ornamentadas e a sua residência repleta de senhoras,senhoritas e distintos cavalheiros da melhor sociedade itabaianense; em ricopalanque artisticamente preparado tocou a excelente filarmônica S. Antonio asmelhores peças do seu vastíssimo repertório.30 

Contraditoriamente, o período áureo da FNSC, é justamente operíodo em que seus membros mais influentes foram duramenteperseguidos. Foram longos anos em que a Filarmônica Santo Antôniomanteve-se completamente atrelada ao poder do Dr. Itajahy,usufruindo de todas as regalias e facilidades outorgadas pelo poderpolítico. Não obstante, a FNSC desenvolveu-se de forma vertiginosa, oterritório hostil não foi empecilho para o completo arraigamento destainstituição na sociedade itabaianense. Como prova disto, temos o fatode que, mesmo durante o domínio político do Dr. Itajahy, os quadrosda FNSC não só permanecerem constantes como também ampliarem-se.31 Além disso, a FNSC permanece viva até os dias atuais ao passo

29 O Estado de Sergipe, 19.02.1905. Apud Carvalho, 311.30 Folha de Sergipe, 14.06.1909 ( Apud  Carvalho, 329).31 No ano de 1899, período a partir do qual o Cel. Sebrão começa a perder poder aFNSC tinha 44 sócios. Em 1900 são registrados 15 novos membros, em 1900apenas 1, em 1902 são 20, em 1903 são 5, em 1904 são 2 e em 1906 são 6 novosmembros.

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que a Filarmônica Santo Antônio sucumbiu completamente, nãofuncionando mais nos dias atuais.32 

 Aparentemente, a hostilidade do ambiente a fortaleceu, pois aFNSC era um dos pontos de encontro da oposição ao domínio do Dr.Itajahy, representando uma bandeira partidária da oposição. Isto pode

ser comprovado pelo fato do Cel. Sebrão, na sua constante lutaoposicionista, lançar mão dos quadros da FNSC para sua militânciapartidária, a exemplo da querela política envolvendo ele e o padre Vicente Francisco de Jesus –  um dos principais aliados políticos do Dr.Itajahy – , episódio que será relatado mais adiante no tópico que trata dasua função política.

O ambiente interno da FNSC era um produto direto do ambienteexterno. A estrutura política itabaianense era reproduzida dentro dabanda filarmônica, num simulacro das relações hierárquicas,comportamentais e de poder. Um exemplo evidente é o modo comoaconteciam as eleições dentro da banda. A maior parte das atasdescreve as eleições como sendo realizadas por escrutínio secreto,contendo o nome dos candidatos, o número de votos recebidos e aassinatura dos presentes.

No entanto era muito comum à época, o forjamento deste tipode documento. Na ata do dia 24 de novembro de 1907, fica evidenciadaa possibilidade de que as eleições para o diretório e assembléia geral nãoacontecessem de forma diferente das eleições municipais de Itabaiana,obedecendo àquela cultura dominante de eleições fantasiosas eregistrando como o Cel. Sebrão exercia o seu poder nos momentos deeleição para os cargos. Inicialmente o presidente anuncia a realização de

uma eleição: Acta da eleição para Assemblea Geral e do Directorio da SociedadePhilarmonica N. S. da Conceição da Cidade de Itabaiana... o Sr, PrizidenteCoronel José Sebrão de Carvalho, commigo Secretario abaixo firmado e socio.Pelo Prizidente foi anunciado que hoje nesta reunião hia proceder a eleição paraPrizidente e mais membros da Assemblea Geral e do Directorio que tera defuncionar no exercicio do anno proximo futuro de 1908 [ sic. ]...

No entanto, a eleição  –  que deveria ser por escrutínio secreto  –  não é realizada. O Cel. Sebrão se encarrega de propor os nomes, quesão imediatamente aceitos por unanimidade, um sinal evidente dopoder do coronel:

32 Não foram encontradas informações sobre a data exata do fim da FilarmônicaSanto Antônio. Dentre a comunidade itabaianense os relatos indicam que elasobreviveu somente durante o domínio do Dr. Itajahy. Fato é que esta instituiçãonão se encontra mais em funcionamento.

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Pelo mesmo Prizidente foi proposto e acceito por unanimidade o Sr. Vicente Tavares de Jesus, para Secretario João Monteiro d’Oliveira, para 2 secretarioManoel Bispo dos Santos, para V [vice] Prizidente Antonio Ferreira Lima,Passando-se procedeu-se a eleição do Directorio pela mesma forma. ParaPrizidente digo Regente Paulino Menezes, V. Regente: Antonio Joaquim daSilva, para Thezoureiro Paulo Cordeiro d’Oliveira, para Zellador Balthazar

 Aventano Cajazeira, para Procurador o mesmo [ sic  ].

 Também fica explícito na mesma ata que o Cel. Sebrão nem aomenos consultava as pessoas que indicava para os cargos:

Em seguida pediu a palavra o socio Antonio Joaquim da Silva e disse querenunciava o cargo que fora eleito, pelo motivo de sua novidade, e que haviaoutros de maioridade que poderia exercer tal cargo. Pelo que ficou extinto esselugar. E nada havendo findou-se a Eleição as quatro horas da tarde, do quelavrou-se esta acta que vai por todos assignada. [ sic. ]

 Aparentemente, nem sempre os estatutos eram obedecidos noquesito que institui escrutínio secreto para a realização das eleições, ochefe político assumindo assim o encargo de escolher os membros dodiretório e assembléia geral.

Fato é que o Cel. Sebrão tinha plenos poderes sobre a FNSCnaquele período, servindo a banda como ambiente de aglutinação demuitos dos seus partidários, assim como palanque político dos seusideais.

Há evidências de que alguns músicos tinham envolvimento

político, porém não há evidências nos documentos que levem àgeneralização. Não é possível atribuir tal postura às crianças, porexemplo. Fato é que havia uma cultura de rivalidade política entre osmúsicos e pelo menos alguns deles se envolviam nela. Textos popularesfaziam constantes referências à este aspecto:

 Antônio Macaco [Antônio J. de Oliveira Silva, então regente da FNSC]por ser regente da banda Vai saindo em demandaNo seu passo de cegonha:Chama os colegas [músicos da FNSC] e no bilhar de Deolindo

Forma o seu plano infindoContra os músicos de Noronha [Esperidião Noronha, então regente daFilarmônica Santo Antônio]

O macaco larga pêta Temos música de careta

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .Cabo Mamona, comandante da milícia,Não quis mais ouvir a missa

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Do Cura do Patrimônio. –  Prende-se o padre, Sacristão, com alegriaPrendo as filhas de MariaE os músicos de Santo Antonio [músicos da Filarmônica Santo Antônio].

Mamona não é chalaça Vá tomar sua cachaça33 

 Além de uma cultura de rivalidade política entre os habitantes deItabaiana, outros fatores contribuíam para o envolvimento dos músicosna política. A participação de um músico da FNSC em evento daFilarmônica Santo Antônio era considerada falta grave pela direção damesma. Os músicos tinham, portanto, fatores externos  –   a cultura derivalidade política – , e internos –  a repressão da direção – , que tambémos levava a envolver-se politicamente:

 Tendo o mesmo regente prohibido que muzicos ou instrumentos pertencentesa sociedade toca-se em leilões de chifrineiras nas ruas d’esta cidade, a fim denão desmoralizar a mesma sociedade, no domingo 5 do corrente após otermino do ensaio, saem os referidos socios em questão juntamente o socioUrsulino Barretto, para tocar em um leilão, o regente tendo conhicimento, fez ver aos ditos socios que era mais como ja tinha os esposto, elles João Gomes eOctavio, entregando os instrumentos, e retirando-se afrontozamente, edirigindo-se ao regente da Philarmonica adversária34, e foram pedirinstrumentos, os quais foram ou serviram para tocar no dito leilão. Passandoestes dois socios por insubordinados e faltos de confiança perante a estasociedade inteira; o regente uzando das attribuições conferidas pelos estatutosrequer a excluzão dos ditos socios nas condições do art. 19 § 4° e 2° dosmesmos Estatutos. Em vista d’estas narrativas do mesmo regente Directoriouzando do que lhe faculta o Art. 18 § 2° rezolveu attender por maioria asrezuluções do alloido [aludido] regente, para assim evitar o mal maior;

defendendo o progresso da corporação muzical, pois que sendo os mesmossocios insubordinados e dizatenciozos não cumprindo as disposições do § 5°art. 23° dos Estatutos, e para que continue moralizada a sociedade, ficandoexcloidos de socios por falta de confiança os Srs. João Gomes de Vasconcellose Otavio Paranhos. [ sic. ] 35 

No caso acima, os músicos são tratados como insubordinadospor não terem acatado as ordens da direção e faltos de confiança por

33 Versos atribuídos a um grupo de itabaianenses, inspirados na música Caxangá,de Catulo da Paixão Cearense, divulgada em Itabaiana via de cartas anônimas.Focalizam os fatos ocorridos no dia 14 de junho de 1916 e atacam o Cel. Sebrão etodos os seus aliados. Apud Carvalho 477, 478.34  O tratamento de “adversária” denota o sentimento de rivalidade por parte da

direção.35 Ata do dia 6 de setembro de 1902.

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terem recorrido à filarmônica adversária. Não havia liberdade para queos músicos pudessem transitar entre as duas filarmônicas.

Para o entendimento e, principalmente, ilustração da funçãopolítica da FNSC, é importante citar o histórico conflito que houveentre o padre Vicente Francisco de Jesus, partidário do Dr. Itajahy e da

Filarmônica Santo Antônio, e o Cel. Sebrão, acompanhado de todo oséquito da FNSC. O acontecimento teve seu estopim no ano de 1916,numa trezena de Santo Antônio. De acordo com o padre, haviainteresse por parte do Cel. Sebrão em sabotar as comemorações dopadroeiro da Filarmônica Santo Antônio e do partido Cabaú , utilizando-se para isso de alguns membros da FNSC. O padre descreve osacontecimentos durante os dias de trezenas:

É costume solemnizaren-se as tradicionaes trezenas de S. Antonio  –  oragoda freguesia em Itabaiana. Começaram a 5 para terminar em 18 com a missafestiva.

 A’ primeira noite, correu tudo na melhor ordem, sendo notada a ausenciada gente da nata [em itálico no original, referindo-se aos membros do partidoPeba  ].

Para principio de hostilidades, foram destruidas algumas lanternas dailuminação da Matriz pelos sobrinhos do Cel. Sebrão e outros [membros dopartido Peba  ] . . .

Correram animadamente e em ordem relativa ate domingo, onze.Uma circumstancia importante quero salientar para que fique registrado.O Snr, Tenente Geminiano, nomeado regional para Itabaiana, chegara na

sexta feira, nove; motivo por que correram em ordem as trezenas ate a noite deonze. Este official foi abordado pelo Cel. Sebrão e insuflado para commetterdesatinos contra os musicos da philarmonica S. Antonio, que tocava as trezenas

no intuito de pertubal-as. [ sic. ] 36 

De acordo com o padre, as atitudes dos músicos da FNSC nãoprenunciavam bons acontecimentos:

Qual não foi a minha estupefação e indignação publica quando, ao passar decasa para a Matriz, no domingo immediato ao meu regresso, na praça publicarecebi cumprimento de zombaria e ridiculo por um musico do Cel. Sebrão!

Era o prenuncio de uma nova tempestade que se ia desencadear,arrancando na sua voragem a vida a um pae de familia. [ sic. ] 37 

 A eminência de um conflito entre os membros das filarmônicas eo prenúncio de um boicote às trezenas levam o padre a enviar umtelegrama às autoridades em Aracaju:

36 Vicente Francisco de Jesus. Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana, 05.37  Idem. Ibidem, 04.

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Itabaiana  –   13  –   Junho de 1916  –   Exmo Snr. General Valladão  –   Aracajú -Protesto energicamente perante vossa Excia. [o governador do Estado, Oliveira Valadão e o chefe de polícia do Estado, Deodato Maia] contra insolenciasagentes do Snr. Sebrão que, furioso meu triunpho moral, manda sicariosprovocar-me toda parte, toda forma. Repetidos insultos, até na Matriz, funcçõesmeu cargo, tenho recebido musicos [músicos da FNSC] embriagados,

transformados capangas. Prudencia tenho evitado conflicto . . . Persuada-me Vossa Excia. não aprovará desvarios cometidos á sombra sua administração,nem consentira seu patriótico governo se assignale em Itabaiana por tropelias,ou por ventura derramamento sangue parte escumalha incontida, patrocinadachefe se diz altamente prestigiado Vossa Excia. [telegrama]. [ sic  ]38 

 Vale ressaltar que a palavra músico era usada naquele contextocom acepções diversas. No artigo seguinte há um pequeno exemplo das variantes semânticas da palavra músico naquele período:

Notem porem os que me lêem que não usei em meu artigo, nem usarei jamais, a

linguagem soez do Snr. Coronel José Sebrão, o que se mostrou mau musico39

 não tomando o tom que desferi. [ sic  ]40 

Não é possível excluir-se completamente a possibilidade de que oCel. Sebrão fosse um mau músico, no sentido literal da palavra. Opadre Vicente estaria assim utilizando a dubiedade da palavra para fazerchacota das habilidades musicais do seu rival. No entanto em algunstrechos da obra o padre reforça esta associação entre músico epartidário, não tratando os envolvidos como “músicos da FNSC”, ou“partidários do Cel. Sebrão” e sim como “músicos do Cel. Sebrão .”41 

 As duas bandas filarmônicas estavam no centro desta querela,num exemplo claro de como elas podiam ser confundidas com ospróprios partidos políticos. Assim descreve o padre:

 A’ noite, os satellites do Cel. Sebrão, que até então não frequentavam astrezenas, invadiram a Matriz, aos grupos, e alguns passeiavam em attitudeprovocadora pela frente do altar-mór.

 Terminada a trezena, fui, conforme costume, à porta da Matriz verificar ailluminação; ahi os agentes, na sua maioria musicos do Cel. Sebrão, que já meesperavam, proromperam em provocações e assuada. Em minha residencia, àporta, reproduziram-se as mesmas scenas. . .

38  Idem. Ibidem, 07.39  Neste contexto, a expressão “mau músico” tem o sentido mais próximo de

aquele “que não age ou não toca de acordo com alguém ou alguma coisa.”  40  Vicente Francisco de Jesus.  Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana,XIV.41 Aqueles que tocavam de acordo com o Cel. Sebrão.

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 A noite de doze, foram reproduzidos os mesmos actos degradantes da vespera com uns tons de mais gravidade. Como porem nessa noite algunsmusicos da philarmonica S. Antonio permanecessem à porta da Matriz, no diaseguinte declarava o mesmo Snr. Cel Sebrão que não fui esbofeteado por que aquellesmusicos me serviram de capangas.42 

Sentindo que se aggravava a situação, maxime quando era publico que havia

proposito de perturbar as trezenas, desacatar ao vigario e fazer correr aosmusicos para tomar-lhes armas, não querendo suspender eu as trezenas, porqueestamos em um paiz onde se diz que ha liberdade de culto. [ sic. ] 43 

 As advertências do padre Vicente Francisco de Jesus não eramgratuitas. O conflito entre ele e os partidários do Cel. Sebrão chegou atal ponto de acirramento que uma pessoa foi assassinada:

O plano era desacatar a philarmonica S. Antonio e aggredir-me. Mas GenolinoPrecipicio e João de Deus, que se devia chamar  João do Diabo, assignalaram apresença de Luiz Pereira e seus companheiros [músicos da Filarmônica Santo Antonio]44  na porta da Matriz assistindo ao acto religioso. Levam isto ao

conhecimento do Cel. Sebrão45, que no conselho do triumvirato46 resolveu mudaro plano do desacato á philarmonica para espancamento e morte de Luis Pereira.

Effectivamente Luiz e seus companheiros, de braços cruzados e postadosna hombreira de uma das portas de frente da Matriz, assistiam a formatura do Apostolado. Inopinadamente apresentaram-se trez soldados de policia,commandados por um cabo e arremettem furiosos contra Luiz, desembainhamos sabres e começam o officio de magarefes da carne humana.

Luiz, vendo-se perdido, saca de uma faca e grita aos companheiros que oacudam e começa a defender-se. Esses esforçam-se por impedir que Luiz fosselynchado por uma onda de canalhas armados, que acompanhavam e auxiliavama policia.

Por infelicidade, na lucta Luiz perde a sua arma de defesa e foge, enquanto

seus companheiros continham á distancia os outros soldados, que debandarama pretexto de buscar as carabinas.O soldado escuro que desarmara Luiz sahiu em sua perseguição. Ao chegar

na porta do cinema, Luiz, que deslocara um pé semana antes, cahiu; ahi foiapunhalado e dahi arrastado debaixo de uma chuva de pranchadas de facão atéo meio da rua da Victoria pelo mesmo soldado. Momentos depois era cadaver!Mais uma vez armou-se a mashorca em plena civilisação! [ sic. ] 47 

42 Itálico no original.43 Vicente Francisco de Jesus. Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana, 6-7.

44 Afirmo isso por que em outro trecho do mesmo documento o padre afirma que“nessa noite alguns musicos da philarmonica S. Antonio permanecessem à porta daMatriz”. 45  De acordo com Carvalho o Cel. Sebrão ocupava neste período o cargo dedelegado de polícia.46 Itálico no original.47 Vicente Francisco de Jesus. Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana, 14.

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Existe também uma outra versão deste mesmo fato. O climapolítico era de guerra, e numa guerra, assim afirma uma velha máxima,a primeira vítima é a verdade. Um telegrama do Cel. Sebrão dá a sua versão:

Dr. Chefe de Policia  –  Aracajú  –   Itabaiana, 15-06-916.  –  Hontem celebração

novenas casa padre, individuos chefiados Othoniel Doria armados mauser,punhaes, dirigiram-se porta Igreja, atacaram violencia força publica achava-seproximidade porta Matriz manutenção ordem consoante desejo Governoexpresso vosso telegramma trese. Policia defendeu heroismo sendo feridos doissoldados, morto sicario Luis Pereira, declarando mulher deste seu marido victima padre Vicente o convidou varias vezes para, em companhia outros,levar effeito plano meu assassinato vários amigos [telegrama]. [ sic. ] 48 

Havendo duas versões tão contraditórias do mesmo evento,torna-se difícil saber quem foi o culpado pelo assassinato. Não éintenção nossa a busca da verdade sobre os fatos ocorridos, mas sim a

análise do conteúdo das diferentes versões. O mais significativo para onosso estudo, é que as duas filarmônicas aparecerem como as maisimportantes coadjuvantes, ou representantes simbólicos deste conflitoentre dois políticos em Itabaiana, demonstrado pela documentaçãocitada anteriormente e pela documentação que vem a seguir. Com ointuito de provar a veracidade das suas afirmações e a falsidade do Cel.Sebrão, o padre Vicente Francisco de Jesus envia a seguinte carta aalgumas pessoas que julga influentes naquela sociedade:

Illmo. Exmo. Snr.  –  A bem da verdade e da justiça, preciso que V. S. sedigne attestar, ao pé desta, tudo quanto sabe por ter visto ou ouvido acerca dasprovocações, insulto e ameaças de que tenho sido alvo, de certo tempo a esta

parte, nesta cidade de Itabaiana, principalmente durante as trezenas de S. Antonio, que se estavam celebrando e que foram interrompidas à falta dasgarantias legaes. Assim, para desfazer qualquer duvida sobre a minha reputaçãoultrajada por vil calumnia, peço responder-me os seguintes quesitos,concedendo-me a faculdade de utilizar-me da resposta como meio de defesa:E’ ou não verdade que a philarmonica, a que com verdadeira profanação dão onome de Conceição,  –   ao passar pela minha residencia, por diversas vezes,interrompeu a peça que tocava, preenchendo os compassos com escarros,assovios e assuada?!E’ ou não verdade que em certa occasião, ao sahir de casa para celebrar a missaconventual, fui insultado por um musico da mesma banda, que me fezcumprimentos zombeteiros e de escarneo?! . . .

E’ ou não verdade que dentro da Matriz musicos da mes ma banda passeiavampela frente do altar-mór, em attitude aggressiva e provocadora?!E’ ou não verdade que ao terminar as trezenas, na porta da Matriz, fuiinsultado, provocado e assoviado por typos da mesma banda, por mais de uma vez?! . . .

48 Vicente Francisco de Jesus. Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana, 15.

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Note que nas perguntas o padre se refere diretamente aosmúsicos da FNSC. Essas descrições poderiam ser consideradas falsas,atribuindo-se assim o intuito de prejudicar a FNSC por parte do padre,motivado por interesse político ou vingança pessoal. No entanto o alvo

direto do padre é o Cel. Sebrão, os membros da FNSC sendo citadosapenas como participantes à serviço deste mandante. A possibilidadedos membros da FNSC estarem realmente envolvidos nesta querela,como correligionários do Cel. Sebrão, é aumentada pelo depoimento deoutras quatro pessoas que, em resposta à carta do padre, citamnovamente a presença dos músicos da FNSC naquele conflito. Seguemalgumas destas respostas:49 

E’ publico e notorio nesta cidade e fóra della que V. Revma. tem sidoperseguido, calumniado e desacatado pela philarmonica Conceição e por outraspessoas mais pertencentes ao grupo politico do Snr. José Sebrão de Carvalho,que como chefe alimentava tão triste e selvagem procedimento.

Itabaiana, 12 de Julho de 1916.De V. Revma. Cro. e atto. –   Antonio Philadelpho de Mesquita................................................................ Aracajú 13 de Julho de 1916.  –  Exmo. e Revmo. Snr. Conego Vicente F. de Jesus. –  Itabaiana . . .Infelizmente apreciei por diversas vezes a philarmonica Conceição parar a peçaque tocava quando passava por vossa porta, e quando estava mais adeante,continuava a mesma peça. Digo “infelizmente porque achava indigno para umpovo dos nossos tempos”. . . Assisti por diversas vezes os nojentos insultos que vos dirigiam na porta daigreja, após a terminação das trezenas de Santo Antonio.

De V. Revma. Amigo muito attento e obro.  –  Osvaldo Andrade.

O padre Vicente Francisco de Jesus afirma ainda que umaautoridade foi até a sede da FNSC com o intuito de apaziguar osânimos dos músicos:

Neste sentido, o promotor publico fez discurseira na séde da philarmonicaConceição, recommendando em nome do Cel. que fossem suspensas ashostilidades ridiculas. [ sic. ] 50 

 As duas filarmônicas viviam em meio ao fogo cruzado dasquerelas políticas. Pertencer a uma destas corporações podia

representar estar na infantaria, em meio a um combate atroz entre oCel. Sebrão e o Dr. Itajahy, dois dos mais importantes líderes políticos

49 Devido a extensão dos documentos apresentarei somente as respostas em relaçãoaos quesitos diretamente relacionados com a FNSC.50 Vicente Francisco de Jesus. Manifesto Sobre as Occurrencias de Itabaiana, 24. 

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sergipanos. Quem tinha poder arbitrava como queria, quem estava naoposição esperava o momento de revidar as perseguições.

O Dr. Itajahy imperou durante longos anos, impondo durasrepresálias ao grupo do qual fazia parte a FNSC. Porém o Cel. Sebrãojamais esteve longe das lides políticas, aguardava e articulava o seu

retorno ao poder. A FNSC, como instituição propagadora e promotorados ideais do Cel. Sebrão teve, certamente, participação na manutençãodo seu prestígio e poder político em Itabaiana. Uma banda filarmônicacomo a FNSC fazia “barulho”, além de música. Incomodava seusadversários e fortalecia os ânimos de seus partidários. Mesmo nãoestando seu principal líder com o poder nas mãos, era capaz dearrebanhar dezenas de sócios. Suas apresentações eram um dosmomentos onde o Cel. Sebrão  –  e a oposição ao Dr. Manoel BaptistaItajahy –  podia mostrar sua vida e poder.

 A vinculação política da FNSC acontecia de forma quase queobrigatória, pois inseria-se num contexto onde não somente asfilarmônicas estavam atreladas a esta política bipartidária, mas tambéma religião, a economia e até a geografia. Nesta constante necessidade desobrevivência, esta banda de música adaptou-se e continua seadaptando ao contexto de sua época, fazendo parte não só da vidamusical itabaianense, mas tendo também uma função simbólica, social epolítica. Se antigamente a estrutura dominante indicava a FNSC ocaminho da política, da socialização e da representação de poder de umgrupo fechado, hoje em dia ela indica o caminho da inserção social e dodesenvolvimento cultural através do conhecimento musical. A FNSCrevela-se como um simulacro, uma micro-estrutura em forma de bandafilarmônica bastante semelhante à ampla estrutura social de Itabaiana,

metamorfoseando-se para se adaptar e viver cada período da história.Uma instituição musical como a FNSC encontra paralelo nas

mais diversas partes e períodos do Brasil. Uma instituição ligadaeminentemente à execução musical, mas inserida num amplo contextosocial, cultural e político. A manifestação musical exibindo a suainexorável faceta humana, um símbolo sonoro atrelado aos conceitos e valores da nossa sociedade.

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REFERÊNCIAS

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Le Goff, Jacques. A História Nova. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

Rocha, Gentil.  A Banda do Rosário.  Ouro Preto: Instituto de Artes eCultura da Universidade Federal de Ouro Preto (IAC/UFOP),1985. 

Schwebel, Horst Karl. Bandas Filarmônicas e Mestres da Bahia.  Salvador:Centro de Estudos Baianos da Universidade Federal a Bahia,1987.

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 Vitorino, Mônica.  A Banda de Cima. Ouro Preto: Instituto de Artes eCultura/UFOP. Sem data. 

 _______. Banda São Sebastião. Ouro Preto: Instituto de Artes eCultura/UFOP. Sem data.

JORNAIS ANTIGOS CONSULTADOS  

 A Opinião: 17.03.1918

Correio de Aracaju: 11.02.1909; 08.05.1907

Correio de Sergipe: 03.04.1891

Diário da Manhã: 31.10.1913; 12.04.1913

Folha de Sergipe: 15.09.1910; 14.06.1909; 01.11.1908; 11.06.1908; 27 e30.05.1909; 11.06.1908; 16-06-1916; 20.07.1905; 9.08.1909

O Estado de Sergipe: 09.04.1907; 03.04.1906

FONTES PRIMÁRIASNÃO PUBLICADAS CONSULTADAS  

Maço de documentos localizado no Arquivo Público Estadual deSergipe e identificado como “Livro de Atas da Sociedade Philarmônica

Nossa Senhora da Conceição 1896-1915.” 

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M APEAMENTO DE ARQUIVOS MUSICAIS

PÚBLICOS E PARTICULARES DO B AIXO S ÃO

FRANCISCO :  NOVAS PERSPECTIVAS À LUZ DE NOVOS

DOCUMENTOS

 Nilton da Silva Souza (UFAL)1 

 A proposta de sistematização setorial de documentos musicais edo mapeamento musicológico dos arquivos musicais públicos eprivados no estado de Alagoas atende a uma orientação de pesquisa quealmeja a identificação, catalogação, digitalização e publicação do acervomusical alagoano da música sacra, da música erudita, da música semi-erudita, das composições instrumentais para banda de música e dascomposições instrumentais para piano.

Essa proposta estrutura-se em dois pilares: a relevância histórica

de fatos, compositores e obras musicais identificadas, catalogadas edispostas em arquivos públicos ou privados; e as nossas pesquisas emandamento que, embora tenham identificado novos arquivos, ainda nãoestão completas e/ou estruturalmente embasadas do valormusicológico dessas obras.

 A proposta de mapeamento norteia-se segundo as novastendências da musicologia brasileira (Cf. OLIVEIRA, 2008) voltadapara os espaços ainda não explorados e longe dos grandes centroshistórico-musicais.

1 Prof. Ass. do ICHCA/ UFAL, do Curso de Graduação em Música e dos CursosTécnicos de Música da Escola Técnica de Artes da UFAL na área de TeoriaMusical, Percepção Musical e Regência. É vice-líder do Grupo de PesquisaHmDm-AL (História, Memória e Documentação da Música em Alagoas) junto aoCNPq, além de desenvolver trabalho com regente da Orquestra da UFAL, emúsico-coordenador do MCZBrass (Quinteto de Metais ligado a Pró-Reitoria deExtensão-PROEX/UFAL)

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Embasados dessa prerrogativa concordamos com Fubini no quetange a importância do conhecimento histórico e documental para aidentificação e reconhecimento das raízes culturais de um povo. Dessaforma, Fubini (2001) ao tratar da música e seu sentido de historicidaderessalta a importância da história para a compreensão do passadomusical e que nesse contexto, a elaboração de uma consciênciahistórica, caracterizadamente ocidental passa a ter um valor acentuado.

Uma de las características de nuestra cultura occidental es [...] la cuidadaconservación de todos los documentos de esa secular y milenaria historia. Lahistoria nace, precisamente, del recuerdo y reflexión sobre el passado y de laconsciência de que el presente se retrotrae a um bagaje en el que se reconocey en el que hunde sus próprias raíces.2 (FUBINI, 2001, p. 37)

 Assim como coloca Blanco (Cf. SOTUYO BLANCO, 2007; VOLPE, 2009) sobre a arquivologia musical como bagagem essencialao “musicólogo brasileiro que queira ou deva lidar com o patrimôniobrasileiro” entendemos que as fontes documentais devem ter um

tratamento adequado e pormenorizado para atender as expectativasadvindas da chamada “Nova Musicologia”, a musicologia de“fragmentos” ( SOTUYO BLANCO, 2007, p.4) salientada por Castagnacomo necessária a “sistematização de fontes e catalogação de acervos” de zonas de pesquisa distintas daquelas focadas em outras épocas comoos grandes centros histórico-musicais do Brasil.

Para Volpe (Cf. VOLPE, 2009) a mudança de paradigmas emtermos internacionais salientada por Kerman (apud VOLPE, 2009) nãotem sido acompanhada com a mesma velocidade pelo pensamentomusicológico brasileiro e propõe uma maior interação da musicologiacom outras disciplinas.

 A transdisciplinaridade emerge da constante preocupação por alternativas quepermitam a elaboração de um discurso musicológico que transcenda asfronteiras da própria disciplina, sem abandonar, no entanto, as especificidadestécnicas da linguagem musical. Para tanto, é necessário ter sempre em vista aintra-disciplinaridade evocada por Duprat (2005), ou seja, intensificar ainteração entre as sub-áreas da própria música: a musicologia (no sentido toutcourt  ), a prática interpretativa, a composição e a educação musical. (VOLPE,2009, p.116)

Castagna (2008) enfatiza ainda acentuada preocupação com opapel da musicologia no Brasil, com a importância do surgimento danova musicologia a partir dos anos 1990 e do acesso aos arquivosmusicológicos públicos e privados nas mais diversas regiões brasileiras.

2 “Uma das características da nossa cultura ocidental é a delicada conservação detodos os documentos dessa secular e milenar história. A história nasce,

 precisamente, da recordação e da reflexão sobre o passado e da consciência de queo presente se retrai a uma bagagem que se reconhece e que funde suas própriasraízes.” 

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Coloca também o trabalho do pesquisador em foco, assim como assuas metodologias de pesquisa em torno do respaldo social quecertamente pode-se buscar de tais pesquisas.

 A proposta de mapeamento dos acervos musicológicos em Alagoas e em particular no Baixo São Francisco é o primeiro passo para

uma pesquisa calcada em novos parâmetros para a ação musicológicano Brasil.

A PESQUISA MUSICOLÓGICA EM ALAGOAS 

 Toda essa temática atenta para a importância que omapeamento musicológico em Alagoas e excepcionalmente no BaixoSão Francisco tenha relevância no contexto musicológico nordestino ebrasileiro.

 As pesquisas em Alagoas encampadas por Antônio AlexandreBispo a partir dos anos 1970 apontam para o estudo dos acervosmusicais sacros e de bandas de música em Penedo e outros centros.Entretanto, o contexto de abrangência dessa música não entra comofoco de pesquisa, muito menos alguns aspectos relevantes da vida localcomo o papel que o transporte fluvial viria a ter após 7 de dezembro de1866 com a abertura do Porto de Penedo à navegação internacional elogo após em 21 de maio de 1867 com a assinatura do contrato para otráfego semanal de vapores no Rio São Francisco.

Esse aspecto tem relevância, pois, a partir do desenvolvimento

do transporte fluvial no Baixo São Francisco, que compreende a regiãoentre os limites dos estados de Alagoas e Sergipe, foi alavancada atradição musical fortalecida pela ação principal da música religiosa e dasbandas de música.

Os trabalhos musicológicos de Bispo assim como de historiadoscomo Ernani Mero; Guiomar Castro, Moacir Medeiros de Santana eLuiz de Medeiros Neto3, entre outros, ainda são consultadosdemasiadamente como referências pela falta de novos trabalhos maisaprofundados e de uma atividade musicológica mais detalhada em todoo Estado.

De modo geral, assim como acontece em todo o Brasil, osproblemas relacionados ao acesso a arquivos musicais são similares.Encontramos no trabalho de mapeamento musicológico das várias

3  Historiadores alagoanos que escreveram bibliografias de músicos e/ou quefalaram sobre músicos e a vida musical alagoana em seus trabalhos.

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micro-regiões do Estado de Alagoas obstáculos dos mais diversos. Emespecial há sempre a temática de alguém (geralmente um parente) quese apropria de partituras, fotos, e muitos outros documentos.

Um estudo mais detalhado aponta para manifestações musicais voltadas quase exclusivamente para fins religiosos, seja durante o culto

católico, a missas ou a novena, ou mesmo durante as procissões e festasreligiosas.

Fora da igreja a música no Baixo São Francisco acontece, aindahoje, nas rodas de choro, durante o carnaval e nas comemoraçõesprofanas das festas religiosas.

Em termos musicais, o Estado de Alagoas4, a partir das nossasprimeiras tentativas de mapeamento, pôde ser dividido em sete pólosde ação de grupos musicais: Baixo São Francisco; Maceió e OrlaLagunar; Zona da Mata; Litoral Norte; Litoral Sul; Agreste; e Sertão.

 A primeira e mais antiga área mapeada é o Baixo São Franciscodevido à importância que o Rio São Francisco representava, no períodode colonização, como uma das portas de entrada para o conhecimentodo interior do Brasil pelos exploradores europeus (Cf. MEDEIROSNETO). Dessa forma, o Baixo São Francisco foi o primeiro pólo dedesenvolvimento musical considerável haja vista a criação das primeirasSociedades Musicais e bandas de música em Alagoas.

F IGURA 1:  MAPA DESCRITIVO DO BAIXO SÃO FRANCISCO 

4 Deve-se levar em consideração que a divisão territorial não tem como parâmetroapenas a geografia do Estado e sim a organização dos grupos musicais por áreatemática, onde se leva em consideração a interação entre os grupos musicais e oseu fazer musical.

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 As cidades mais representativas e com maior desenvolvimentomusical ao longo de sua história são Penedo, Traipu e Pão de Açúcar. Além de Delmiro Gouveia, Olho D’água do Casado, Piranhas, BeloMonte, São Brás, Porto Real do Colégio, Igreja Nova e Piaçabuçu quesão banhadas pelo rio.

 A margem alagoana do Baixo São Francisco desde o séculoXIX desenvolveu um gosto particular pela música. Essas manifestaçõessurgiram como musica sacra, voltada à Igreja e também como imitaçãoa música das Bandas Militares, ainda no Império, através das SociedadesFilarmônicas Civis.

Muito do que caracterizava a necessidade de tais gruposresumia-se no provimento de música voltada para o entretenimentourbano nas vilas e pequenas cidades que povoam a região.

O Baixo São Francisco situa-se como uma região precursora deatividades musicais no Estado. O mais importante documento acerca

da criação de Sociedade Filarmônica remonta-se a 1865, da ImperialSociedade Phyl’harmonica Sete de Setembro de Penedo (Figura 2).

F IGURA 2 -  ESTATUTO DA SOCIEDADE FILARMÔNICA SETE DE SETEMBRO DE PENEDO-AL

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O documento encontrado em Penedo5  trata do regimento daSociedade Filarmônica, dos deveres e direitos dos sócios e também dapostura que os mesmos deveriam ter em sociedade. De modo geral nãotrata de música, mas, da regulamentação social dos que freqüentam asatividades onde são proporcionados saraus e bailes.

 Assim como em Penedo, a cidade de Traipu, segunda freguesiado Baixo São Francisco, fundou no ano de 1886 a Sociedade ClubeDoméstico Musical Guarany , com os objetivos similares aos da Sete deSetembro. (MEDEIROS NETO, 1941)

Dentro deste contexto surgem os músicos que passam atrabalhar diretamente com a formação dos instrumentistas e com aregência dos grupos musicais sacros, como coros e pequenas formaçõesinstrumentais para acompanhamento das vozes e também em relação àmúsica para o entretenimento urbano.

Lauro Augusto do Carmo ou simplesmente, Lauro Carmo, foi o

grande mestre das gerações de maestros que povoaram o Baixo SãoFrancisco e certamente o primeiro grande nome que surge comoprofessor de música, compositor e regente na região do Baixo SãoFrancisco.

Em Pão de Açúcar foi encontrada uma das composições deLauro Carmo, trata-se do Dobrado nº 155, dedicado ao 12 Tênis Clubde Própria-SE. Na composição copiada por Davidson Pereira datada de17 de setembro de 1928 o nome do copista aparece Nosdivad Arierep,estranhamente ao contrário. As cópias encontradas são em númerosuficiente para a sua reprodução: baixo Bb; 1º e 2º sax-alto Eb; 1º, 2º e3º trombone; 1º e 2º clarinete em Bb; requinta Eb; baixo Eb; caixa,

bombo e pratos.

Outra composição bastante conservada é a Marcha ManoelSérgio com cópias datadas de 1917 e copiadas por Manoel VictorinoFilho. Em uma partitura de 1º trombone encontra-se a inscrição “Pãode Assucar, 7/02/917” o que nos leva a compreender que o maestroLauro Carmo poderia ter tido alguma passagem pela cidade de Pão de Açúcar ou que o copista teria transcrito a obra do maestro de Penedo.

Foram encontradas as cópias de 2º baixo Bb; 2º baixo C; 1º, 2ºe 3º sax Eb; 1º e 2º trombone; baixo Eb, com cópia de Américo Bastos,em 1921; 1º piston Bb com cópia de Manoel Victorino Filho e 2º

piston Bb, com cópia de Boanerges Bezerra Lima; 2º clarino Bb;Barítono Bb; e 1º clarinete Bb.

5 Cabe salientar que o documento original encontra-se no Museu da Imagem e doSom de Maceió.

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Dentre as composições de Lauro Carmo encontramos duas valsas: Genros e Sogras, com cópia datada de 1927; e Amélia Pinheiro. Ambas as partituras, usando a frente e o verso da folha se resumem ao1º e 2º clarinete em Bb. Não foram encontradas as partituras referentesao acompanhamento, contracanto e percussão.

Os originais das composições de Lauro Carmo e Ranufo Carmoforam encontradas no acervo particular de Antônio Melo Barbosa6, o“Tonho do Mestre” em Pão de Açúcar7. A pasta com as partituras demaior valor possuía a inscrição da Escola de Música José Leopoldinode Barros, que fora criada em Traipu em 14 de julho de 1946 (SOUZA,2002) e fazia parte do Arquivo da Banda Lira Traipuense. Existiampartituras de Lauro Carmo juntas com as de “Nô Carmo”.

O acervo de “ Tonho do Mestre” ainda não foi catalogado. Acreditamos ser um dos importantes arquivos musicais do Estado de Alagoas com composições de vários maestros do Baixo São Francisco.

Em Alagoas, em sua cidade natal, Penedo, Lauro Carmo deixoumarcada a vida musical pela atuação principalmente em relação àscomposições musicais sacras e para banda. Sua relação possivelmenteestendeu-se a Traipu onde vivia, Ranufo Carmo8, conhecido como NôCarmo ou ainda, Nô Morcego. Desse compositor encontramos em Traipu uma partitura de bombardino (em C) bastante avariada doDobrado Onofre Tavares, partitura encontrada com José Basílio dosSantos, trombonista da Banda Lira Traipuense e contramestre dessabanda quando era regida por Nelson Palmeira, na década de 1970; e emPão de Açúcar, 13 partes individuais da valsa Celina Medeiros, escritaspelo mesmo compositor. Sendo as partes correspondentes a: Requinta

Eb; 1º Clarino Bb; 2º Clarino Bb; Sax-alto Eb; 1º Trombone; 1ª Trompa Eb; 2ª e 3ª Trompa Eb; Piston Bb; Baritono Bb; BombardinoC; Contrabaixo Eb; Contrabaixo Bb; Bateria (percussão).

Em virtude da dispersão dos arquivos documentais sobre oscompositores do baixo São Francisco, principalmente pelo típicocostume do empréstimo de repertório entre as bandas, os acervos maisimportantes encontram-se sempre fora do seu local de composiçãoexigindo mais cautela por parte do pesquisador.

6

  “Tonho do Mestre” é filho de Manoel Vitorino Filho   (1895-1960), conhecidocomo “ Mestre Nozinho” .7 O Acervo que se encontra em posse de “Tonho do Mestre” é uma coletânea de

 partituras pertencentes a várias bandas. O mesmo recebeu o arquivo como herançade seu pai.8  Em entrevista, Antônio Basílio dos Santos (1939-2010), maestro da Banda deMúsica Lira Traipuense de Traipu - AL, confirmou que o maestro Lauro Carmoera parente de Ranufo Carmo, certamente sobrinho.

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TABELA 1:  RELAÇÃO 0DE ACERVOS DAS BANDAS DE MÚSICA DO BAIXO SÃO FRANCISCO 

Banda de Música Local Data de

Fundação

Estado Maestros e

Compositores relacionados

Arquivos

Lyra Operária Penedo Sec. XIX Desativada Francisco Paixão Não existe catalogação.Sem informações precisas.

União Caxeiral Penedo Sec. XIX Desativada Lauro Augusto do Carmo Não existe catalogação.Poucos documentos encontrados.

Euterpe Ceciliense Penedo 1883 Desativada Lauro Augusto do CarmoHenrique Tomaz Ribeiro

Julio Caratina

 Não existe catalogação.Poucos documentos encontrados.

Carlos Gomes Penedo 1888 Desativada Manoel Tertuliano dos Santos Não existe catalogação.Sociedade Musical Penedense Penedo 16.07.1944 Ativa Edson Porto O Arquivo não detém partituras antigas.

Euterpe de Pão de Açúcar Pãode Açúcar

15.04.1911 Desativada Abílio Mendonça Arquivo não encontrado.

União e Perseverança Pãode Açúcar

Iníciosec. XX

Desativada Sem identificação Arquivo não encontrado.

Sociedade Musical Guarany Pãode Açúcar

15.03.1918 Ativa Manoel Vitorino FilhoPetrucio Ramos de Souza

Arquivo não catalogado.O principal arquivo foi herdado por “ Tonho do Mestre”,

filho de Manoel Vitorino.Sociedade Club Domestico Musical Guarany Traipu 1886 Desativada Manoel Firmino Meneses Matos

José Leopoldino de BarrosArquivo não encontrado.

Lira Traipuense Traipu Sem data cconfirmada.

Sec. XIX

Ativa Mestre VieiraMestre HermínioRanufo Carmo

João Albuquerque Nelson PalmeiraAntonio Basílio Nelson Souza

Arquivo do maestro Ranufo Carmo: poucas partituras encontradas.

Arquivo do maestro Antonio Basílio.Arquivo do maestro Nelson Souza:

catalogado e em fase de edição.

Filarmônica de São José Traipu Sem data.Início Sec. XX

Desativada Sem identificação Não encontrado

Sociedade Musical Jorge Trompete Traipu 2008 Ativa Jorge da Hora Arquivo recente.

Sociedade Musical Euterpe São Benedito Piaçabuçu 1910? Ativa Euclides da FrançaManoel FrancelinoGilvan Gonçalves

Arquivo não catalogado.

Associação Musical Filarmônica Maestro JoséMendonça de Oliveira

São Brás 25.08.1979 José Mendonça de OliveiraAntonio Basílio

Arquivo recente.

Banda de Música de Piranhas Piranhas 1906 Ativa Avelino de OliveiraElísio José de Souza

Afrânio MenezesCícero Francisco de Brito

Arquivo não catalogado.

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RUMOS DA PESQUISA MUSICOLÓGICA NO BAIXO SÃO FRANCISCO 

O trabalho de pesquisa em arquivos públicos e privados aindase encontra em estágio inicial. Somente o aprofundamento da pesquisa

mostrará a validade musicológica dos documentos já encontrados e dosarquivos pessoais ao qual essa preliminar abordagem ainda não foicapaz de esgotar.

Em outras frentes como a catalogação do Arquivo da Banda deMúsica da Policia Militar de Alagoas, em Maceió, que se encontra empleno andamento e aos arquivos pessoais de Nelson Souza, e da Bandade Música Lira Traipuense, em Traipu, assim como o arquivo pessoalde “ Tonho do Mestre", em Pão de Açúcar, também em andamento, anossa pesquisa tem encontrado relevantes documentos que apontampara uma uniformidade no fazer musical em Alagoas no século XIX einício do sec. XX.

Os documentos a que tivemos acesso nos encorajam amantermos o foco na região do Baixo São Francisco tendo em vista asprimeiras etapas terminadas a qual essa pesquisa se dispôs.

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REFERÊNCIAS

BISPO, Antonio Alexandre. Penedo: comércio português e a história dasbandas de música . Excerto. Disponível em:http://www.revista.akademie-brasil-europa.org. Acesso em: 25 demaio de 2008.

CASTAGNA, Paulo. Avanços e perspectivas na musicologia históricabrasileira. Revista do Conservatório de Música da UFPel , Pelotas, nº 1,p. 32-57, 2008. Disponível em:http://conservatorio.ufpel.edu.br/revista_pdf/artigos02.pdf . Acesso em 28 de Nov. 2010.

KERMAN, Joseph. Musicologia . São Paulo: Martins Fontes, 1987.

MEDEIROS NETO, Luiz. História do São Francisco. Maceió: s/Ed.,1941.

OLIVEIRA, Heitor Martins. Teoria, análise e nova musicologia:debates e perspectivas. Opus , Goiânia, v. 14, nº 2, p. 100-114, dez.2008. Disponível em: http://www.anppom.com.br/opus/opus14/sumario-14.2.pdf. Acesso em 02 de out. 2010.

SANT’ANA, Moacir Medeiros de. Apontamentos sobre o piano em Alagoas, Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas  XXXVIII, 1982-83. Maceió, 1983.

SOTUYO BLANCO, Pablo. Diagnóstico, estratégias e caminhos para amusicologia histórica brasileira II: da musicologia da totalidade àmusicologia de periferia e de fragmentos. Anais do VII SEMPEM ,Goiânia-GO, Vol. 1, nº 1, p. 3-13, 2007. Disponível em:http://www.musica.ufg.br/mestrado/anais/anais%20doVII%20Sempem/anais%20VII%20SEMPEM.pdf. Acesso em 15 deNov. de 2010.

SOUZA, Nilton da Silva. Estudo Histórico da tradição Musical Traipuense, de suas personalidades musicais e dos métodos deensino. Maceió, 2002. TCC do Curso de música da UFAL.

 TONI, Flávia Camargo. A musicologia e a exploração das arquivospessoais. In Revista USP , nº 157, São Paulo, dez de 2007.Disponível em: http://www.revistasuso.sibi.usp.br/scielo.php?

pid=S0034-. Acesso em: 15 de Nov. de 2010.

 VOLPE, M.. Por uma Nova Musicologia. Música em Contexto, 1, ago.2009. Disponível em: http://www.red.unb.br/index.php/Musica/article/view/11/10. Acesso em: 28 Nov. 2010.

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O  TEATRO S ÃO JOÃO DESTA CIDADE DA B AHIA:  

O FUNDO DOCUMENTAL DO  ARQUIVO PÚBLICO

DO ESTADO DA B AHIA  

Lucas Robatto (UFBA)

INTRÓITO 

O Teatro São João desta Cidade da Bahia (TSJB)  –   comodenominado por seus criadores –  funcionou entre 1812 e 1923, e talvezseja o teatro mais bem documentado do período do impérioultramarino português, pelo menos no que se refere aos dados sobre operíodo de sua criação entre os anos de 1806 e 1812. Esta situaçãoprivilegiada e rara de preservação da memória em nossa cultura deve-seà abundância e qualidade do fundo documental referente a esta

instituição disponível no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB).Contudo, infelizmente este fundo documental foi e ainda édesconhecido entre a grande maioria dos pesquisadores que podem tero teatro enquanto objeto de suas pesquisas, como, por exemplo, osinteressados na história do teatro, da música, da dança, da arquitetura,da cultura, da administração pública, etc.

 Tanto não foi a minha surpresa quando, ao final do meudoutorado e retorno á Bahia em 2001, me deparei com esta vasta e ricadocumentação, sem antes ter encontrado quaisquer referências a suaexistência ou localização. O presente trabalho trata da descrição decomo se deu este encontro, da descrição da documentação atualmente

disponível no APEB sobre o TSJB, e da exemplificação do tipo deinformações e dados que esta documentação pode fornecer parapesquisadores das mais diferentes áreas e que tenham a instituiçãocultural ou física do teatro enquanto objeto de seus estudos.

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1. EM BUSCA POR REPERTÓRIO NÃO-RELIGIOSO: “OS CAÇADORES DO ARQUIVO PERDIDO” 

 Ao completar o meu doutoramento na University of Washigton(Seattle, EUA) e retornar à Bahia em 2001, imediatamente iniciei

pesquisas que pudessem se relacionar com um dos objetos gerais daminha dissertação: a música não-religiosa no Brasil ao final do séculoXVIII e início do XIX (Robatto, 2001). Um dos resultados das minhaspesquisas no doutorado foi a constatação da existência de uma intensaatividade teatral e operística na América Portuguesa daquele período, eque o ambiente mais provável para encontrar um repertorio musicalnão-religioso no Brasil de então era o teatro de ópera. Tanto oimaginário cultural coletivo dos baianos quanto algumas referênciasencontradas em minhas pesquisas anteriores apontavam para o TSJBcomo uma das instituições culturais mais importantes na Bahia daqueleperíodo. Portanto, dirigi meus primeiros esforços para a literatura que

pudesse discorrer sobre esta instituição.Inicialmente minha pesquisa se concentrou na localização e

análise dos escritos de autores que diretamente trataram de assuntosrelativos à história do teatro na Bahia anterior ao século XX, maisnotadamente Affonso Ruy (1959 e 1967), Manuel Querino (1911 e1913) e Sílio Boccanera (1915 e 1924). Este último autor foi umengenheiro e amante do teatro, que dirigiu o TSJB entre 1912 e 1923.Em seu livro O Teatro na Bahia da Colônia à República (1800-1923)  de1924 (publicado em 2ª edição em 2008)1  Boccanera faz a seguintemenção sobre o arquivo de partituras do TSJB:

Era riquíssimo, de valor inestimável, esse Arquivo, dos tempos emque nesta nossa terra se rendia fervoroso culto à excelsa arte. Continhapartituras completas de óperas italianas, composições de Bellini, Rossini,Donizetti, Verdi, algumas antiqüíssimas, com todas as partes deinstrumentação cavadas para grande orquestra, além de muitas composiçõesoutras, avulsas, sacras e profanas, hinos religiosos e cívicos, de autoresnacionais e estrangeiros, entre os quais D. Pedro I.

[...]Por iniciativa nossa, o governo do Estado, por ato de 18 de maio de

1912, nomeou uma comissão para dizer dos arquivos e bens do Teatro São João que fossem aproveitáveis.

 A comissão logo iniciou seu trabalho, pelo exame, do arquivomusical, mandando, primeiramente, desinfetá-lo por precaução higiênica, tal

era o estado de absoluto abandono, em que fora encontrado, não mais no Teatro São João, mas nos baixos de uma repartição pública do Estado,atirado lá para um canto, coberto de grossa camada de poeira, cheio de

1 Todas as referências subseqüentes a esta obra serão feitas em relação à edição de

2008 desta obra, por esta edição ser mais facilmente acessível do que a anterior.

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traças, baratas, e, até, de cupim (!), que inutilizou muita música, grudando detal maneira as páginas, que era impossível separá-las, sem rasgá-las.

Os despojos desse opulento Arquivo foram, afinal, recolhidas ao Arquivo Público do Estado, por determinação do governo em novembro de1915, sem que a Comissão chegasse a ultimar o trabalho! [...] (Boccanera,2008, 111-112).

De posse desta informação, prontamente me dirigi ao APEBbuscando localizar este arquivo.

2. LOCALIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS NO APEB SOBRE O TSJB

 Atualmente, o APEB organiza os seus fundos arquivais em duas

grandes coleções:1)   Arquivos Permanentes, divididos nas seções Colonial /

Provincial, Arquivos Judiciários, Arquivos Republicanos, SeçãoFazendária / Alfandegária e Arquivos Privados; 

2)   Arquivos Intermediários, “Constituído por um conjunto dedocumentos semi-ativos, originários de Arquivos Correntes dasinstituições e/ou órgãos do Estado da Bahia, que aguardamdestinação final- eliminação ou guarda permanente- organizado paraatender às solicitações de caráter público e/ou particular.” 2 

No momento inicial da pesquisa (2001) o APEB somentedisponibilizava ao público catálogos3 em estado bastante incompleto deseu acervo, e não encontrei nenhuma referência ao TSJB nos catálogosdisponíveis. Porém, durante minha primeira visita a aquela instituição,uma funcionária responsável pela conservação dos documentos meassegurou que não havia nenhum arquivo musical no APEB, mas queexistiam documentos sobre o TSJB na Seção Colonial/Provincial,constantes do catálogo de consulta, e já disponíveis à consulta pública.

2

 http://diarq.fpc.ba.gov.br/node/63 acessado em 24.11.2010.3  Os catálogos de consulta do APEB são folhas com a listagem de fundos

documentais, encadernadas no formato de livro de capa dura, e estão disponíveis àconsulta pública na sala de consultas. Além destes catálogos  –   que são

continuamente atualizados - o APEB disponibiliza um banco de dadosinformatizado para alguns fundo documentais, os quais permitem consultas

 bastante pormenorizadas ao conteúdo de alguns documentos (fundos detestamentos, processos cíveis, etc.). 

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 Ao solicitar acesso aos documentos fui surpreendido por estes seremoito maços volumosos.

Estes primeiros documentos encontrados foram classificadospelo APEB sob o título genérico de “   Dossiês sobre finanças do

teatro São João”   e tratam do período entre 1806 e 1826. Estes

documentos versam principalmente sobre a vida administrativo-financeira do referido teatro. Os maços recebem os seguintes títulos emsuas capas:

Maço 617 Livro de assentamento das apólices, suas passagens e vencimento

1806Maço 618 Folhas de pagamento, listas de compras de materiais

para as obras do novo teatro1806-1820

Maço 619 Folhas de pagamento1813-1821

Maço 620 1o livro de receitas e despesa do novo teatro às portas deSão Bento

1807-1815Maço 621 (continuação do 1o livro )

1815-1826Maço 622 Livro Caixa

1812 - 1818Maço 623 Loteria - Ajuste de Arrendamento - Apólices - Recibos -

Certidão1807 - 1814

Maço 624 Registros de Portarias, Requerimentos, Representações,

Ofícios, Editais, Informações1806 - 1830

Estes oito maços de documentos têm sido o ponto de partidaparas as minhas pesquisas atuais sobre o TSJB.

Contudo, já durante os primeiros anos das minhas pesquisas no APEB, constou em um website desta instituição (descontinuado a partirde 2007) a seguinte descrição dos seus fundos arquivais quemencionava a existência de documentos sobre o TSJB:

Guia da Província Seção: Colonial e Provincial Área Jurisdição: Província da BahiaFundo: Governo da ProvínciaSérie: Dossiê

Dossiê sobre o Teatro São João (apólices, balanços, folhasde pagamento, apresentações, inventário, correspondência, etc.)Datas-Limite: 1822/18898 unidades.

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 Tal qual a documentação com que vinha trabalhando, estefundo seria constituido por oito maços de documentos administrativos,porém o período ao qual se referia a documentação (1822 á 1889) eradiferente do período e data dos documentos a que tinha acesso (1806-1826). Estes documentos relacionados no website não constavam doscatálogos de consulta do APEB naquele momento.

 Apesar da divisão “oficial” dos Arquivos Permanentes do APEBapresentar a seção Colonial/Provincial enquanto seção única, osfrequentadores mais assíduos daquela instituição sabem que este fundoé dividido pelos funcionários e pesquisadores que lá trabalham  –   emesmo nos catálogos de consulta que a instituição disponibilizaatualmente - em seções distintas: “colonial” e “provincial”. A referênciaao fundo “governo da província” a as datas me levaram a crer que estesdocumentos referidos no website descontinuado poderiam ser outrosque os que eu estava trabalhando. Estranhamente neste website nãoconstavam referencias a documentos sobre o TSJB cobrindo o período

dos documentos com que eu trabalhava então (1806-1826). Todavia, os documentos referidos no website não estavam

disponíveis á consulta pública (por motivos de restauração econservação, como me foi dito mais tarde por funcionários do APEB)e o website que continha estas informações foi descontinuado antes de2007. Restava a dúvida se tratava-se de um engano, ou de uma outracoleção de documentos, diferente da então disponível à consultapública.

No ano de 2008 o APEB disponibilizou em sua sala deconsultas catálogos atualizados sobre os seus fundos, e nestes

constavam as seguintes informações:- Seção de Arquivos Coloniais e Provinciais, Inventário dosDocumentos do Governo da Província, 2ª Parte.

Na página 54 deste catálogo inicia-se a seção“Correspondência Recebida de Instituições Culturais”, e na páginaseguinte temos a seguinte listagem:

4072 Teatro (Dossiê sobre o Teatro São João) 1826-18464073 Teatro (Dossiê sobre o Teatro São João) 1843-18564074 Teatro (Dossiê sobre o Teatro São João) 1866-18714075 Teatro (Dossiê sobre o Teatro São João) 1840-1885

4076 Teatro (Dossiê sobre o Teatro São João) 1885-18894077 Inventário do Teatro São João 1878

(Dossiê sobre o Teatro São João)

Esta documentação corresponde ao período mencionado nainformação do antigo website, porém tratam-se somente de seis maços –  ao invés de oito, como era informado no website.

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Em outubro de 2008, em visita ao APEB com os pesquisadoresRosana e Marco Brescia da Universidade Nova de Lisboa, soube que osreferidos documentos estavam finalmente disponíveis à consultapública, e ao solicitá-los deparei-me com um volume de documentos nomínimo equivalente aos documentos sobre o TSJB da seção Colonial.

 Até o presente momento, não é de meu conhecimento nenhumaoutra coleção de documentos referentes ao TSJB no APEB.

3. BREVE DESCRIÇÃO DO ESTADO FÍSICO E DA ORGANIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS NO APEB 

SOBRE O TSJB

 Atualmente tenho subsidios que me permitem descrever em

maiores detalhes a documentação sobre o TSJB referente ao períodocolonial (maços 617-624), porém somente conheço superficialmente oconteúdo dos maços 4072-4077. No intuito de fornecer um panoramageral e suscinto desta documentação, o presente trabalho se absterá dedescrições muito pormenorizadas dos documentos já trabalhados, asquais demandariam um grande tempo.

O APEB agrupou a documentação referente ao TSJB emquatorze maços de documentos, e este agrupamento seguiu doiscritérios distintos porém concomitantes: data dos documentos e tipo desuporte.

Os maços são numerados tentando seguir a ordem cronológicade datação dos documentos, nem sempre sendo isto possível, poiscertos maços contem documentos cujas datas abarcam períodos muitoextensos, como por exemplo o maço 4072, que abarca um período de20 anos. As datas que subdividem as pastas (e que estão nelasassinaladas) nem sempre correspondem ao conteúdo real de cada pasta,e nem sempre fica perceptível uma ordem coerente de agrupamentopara os documentos.

 Já os suportes são de dois tipos: livros encadernados (maços617, 620, 621, 622, 623, 624 e 4077) e maços de folhas soltas. Estasúltimas são organizadas dentro de cada maço por pastas de papel, asquais dividem os documentos por data. Como atestam os tipos de papele os timbres contidos nas pastas, as folhas soltas foram organizadas eacondicionadas em pastas em diversos momentos, a partir do início doséculo XX.

Os documentos têm diversos tipos de papel como suporte, e oestado de conservação destes, em ambas as coleções, varia bastante.

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Em geral, o suporte papel dos livros encadernados encontra-se maisbem conservado, enquanto que nos documentos avulsos –  folhas soltas –   os danos são mais frequentes. Em ambos os casos, muitos dosdocumentos sofrem pelo fato da tinta ter penetrado o papel,alcançando ambos lados de uma folha, tornando - em certos casos -impossível a sua leitura. Alguns documentos estão em tal estado dedeterioração que medidas urgentes para salvaguardar o seu conteúdosão necessárias. Cada manuseio significa perda de material, e por estemotivo evito ao máximo manusear documentos neste estado.

4. BREVE DESCRIÇÃO DO CONTEÚDO DOS DOCUMENTOS NO APEB SOBRE O TSJB

 A documentação encontrada no APEB é constituida por

documentos que tratam da vida administrativa, gerencial, contábil efinanceira do TSJB, e é constituida por portarias, regulamentos e atas dagerência do TSJB e do governo da Bahia; por recibos e contratos decompras e serviços prestados ao TSJB; por comunicações institucionaisentre o TSJB, orgãos do governo e particulares envolvidos em questõescom o TSJB; por relatórios, balancetes e inventários; por processosadministrativos sobre questões funcionais de profissionais atuantes no TSJB (artistas, administradores e prestadores de serviço); por projetos epropostas relativas à vida cultural em torno de um teatro; e por outrosdocumentos relativos ao funcionamento de uma tal instituição.

 A documentação é bastante completa para certos períodos(1806-1815 ou 1838-1856, por exemplo), mais rarefeita para algunsperíodos (1815-1817 ou para a década de 1830, por exemplo), existindoporém lacunas quase que completas de outros períodos (início dadecada de 1820 ou anos de 1857 a 1865, por exemplo).

O imenso volume da documentação, o fato de que osdocumentos  –   especialmente as folhas soltas  –   nem sempre estãoagrupados em algum tipo de ordem coerente (seja por tipo dedocumentação, seja por data), e a frequente dificuldade de leitura dosdocumentos  –   seja devido ao estado físico do suporte, seja devido adificuldades de leitura da caligrafia e da ortografia da época  –   fazem

com que o processo de classificação dos documentos seja uma tarefaárdua e que demanda bastante tempo.

Quanto os maços constituidos por folhas soltas (maços 618,619, 4072, 4073, 4074, 4075 e 4076) as maiores dificuldades são o volume de documentos e o caráter fragmentários e diverso dadocumentação. Estas dificuldades podem ser exeplificadas através domaço 618, que é constituido de 21 pastas contendo uma total de 415

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folhas, com documentos de natureza tão diversa como listas de comprade materiais para a construção do prédio até processos de carátertrabalhista/funcional, passando por folhas de pagamento tanto deartistas como de operários de construção, e tudo isto em um períodoque abrange os anos de 1806 até 1820.

Os maços constituidos por livros encadernados (maços 617,620, 621, 622, 623, 624 e 4077) apresentam naturalmente uma melhororganização cronológica, porém mais constantemente apresentamdanos no suporte papel, que dificultam e mesmo impedem a sua leitura.Por exemplo, o maço 622, “ A Caixa pelo dinro  recebido pelosCamarotes, Plateia e Varandas, do Theatro de S. João destaCidade” é um livro de receitas (borderô) e despesas, constituido de 67páginas manuscritas, das quais as 32 últimas são parcial ouabsolutamente ilegíveis, devido ao fato da tinta ter atravessado as folhaspapel.

5. Q UALIFICAÇÃO, METODOLOGIA DE TRABALHO E ANÁLISE DO CONTEÚDO DOS

DOCUMENTOS NO APEB SOBRE O TSJB

 A natureza desta documentação aponta para que esta coleçãoseja o “Arquivo Administrativo” original do TSJB, depositado em 1890no então recém-criado Arquivo Público do Estado (da Bahia) e jámencionado em citação acima. A seguinte delaração de Sílio Boccanera

corrobora esta hipótese, porém desperta uma questão importante sobrea coleção mais antiga de documentos:

 Arquivo AdministrativoNo arquivo Público do Estado é onde se acha guardado, desde sua

criação em 1890 o arquivo das antigas administrações do Teatro São João.Está, porém, incompleto, pois começa do ano de 1839, tendo sido o

teatro inaugurado em 1812, e iniciada a sua construção em 1806, e acaba noano de 1888.

Nem um só documento existe que se refira a esse teatro durante os33 anos (1806-39) ou 27 (1812-39) da sua vida primitiva, e nem um,

tampouco, dos 34 (1889-1923) decorridos no regime republicano, desde oseu advento!

Dos existentes, os relativos aos anos de (1839-41) não passam deméia dúzia, sem nenhuma importância.

[...]Encontram-se nesse arquivo, além da correspondencia oficial entre

as antigas administrações e o governo da província, empresários e artistas decompanhias, originais de vários contratos, inventários de objetos

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pertencentes ao teatro, e alguns Regulamentos do mesmo (Boccanera, 2008,113-114).

 A declaração acima e as informações que Boccanera fornece emseus outros escritos (Boccanera 1915 e 1924) revelam que ele tinhaacesso a informações hoje contidas nos maços 4072 a 4077 do APEB,

contudo evidenciam seu desconhecimento da documentação e demuitas das informações contidas nos maços 617 a 624.

Outros autores que trataram em maior detalhe e profundidadedo TSJB em tempos mais recentes, tais como Manuel Querino (1911 e1913), Affonso Ruy (1959 e 1967) e Maria Helena Franca Neves (2000)também aparentemente ignoravam estes documentos mais antigos do APEB, pois uma série de informações constantes desta documentação –  especialmente no que se refere aos anos de criação e construção do TSJB  –  não são por eles citadas. Portanto, muitas destas informaçõesainda são, em grande, parte inéditas para os pesquisadores, e para opúblico em geral.

 A análise do conteúdo das informações contidas nadocumentação tratada no presente trabalho é de grande dificuldade,pois envolve duas ordens distintas de ações, que, contudo, interagementre sí:a)  Levantamento e organização dos documentos e informações;b)  Contextualização das informações advindas da documentação.

Devido ao caráter fragmentário da documentação, para umentendimento mais amplo das informações tratadas pela documentação,faz-se necessária a complementação de informações através doconhecimento de outros documentos da mesma coleção, ou através deinformações de outras fontes.

Ou seja, o delineamento de um quadro mais abrangente dasinformações potenciais contidas na documentação em questão somenteé possível ao se conhecer uma grande quantidade de documentos,traçando possiveis relações entre eles, e relações com informações deoutras origens. Para tanto, faz-se necessário, primeiramente, tanto atranscrição maciça desta documentação, como também odesenvolvimento de métodos e mecanismos de organização quepossibilitem o armazenamento e o resgate fácil das informaçõescontidas nos documentos.

Entre 2002 e 2004 contei com a inestimável e competente ajudade dois bolsistas de iniciação científica (PIBIC UFBA/CNPQ), Marcosda Silva Sampaio e Clara Rodrigues, que muito contribuiram para asminhas pesquisas. Ambos trabalharam intensamente na transcrição demuitos documentos, além de desenvolverem seus próprios projetosindividuais de pesquisa a cerca desta documentação (Sampaio, 2003,2004a e 2004b; Rodrigues, 2004). Em artigo publicado em 2004,

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Marcos da Silva Sampaio apresenta um sistema de localização deinformações que constitui uma decisiva ferramenta auxiliar para apesquisa desta documentação.

Este sistema e os problemas os quais ele busca atender sãocomentados por Sampaio:

Este sistema de códigos considera o sistema de localização de documentosutilizado pela APEB e o complementa, localizando precisamente asinformações neles contidos. A necessidade de localização das informações sedeu pela ineficiência da simples localização dos itens documentais referentesao teatro. Um exemplo prático desta insuficiência é o trabalho com o maço622. Este é um livro caixa com sessenta páginas e centenas de informações arespeito dos artistas. Em cada página há dezenas de informações que podemser consideradas independentes caso o objeto de estudo seja um artista emespecial ou um dia de apresentação, por exemplo. A localização dodocumento (o próprio livro) é pouco operacional, já que um pesquisador queprecise encontrar uma informação contida nele gastará dias ou semanas paraachá-la, pois a cada consulta ele precisará ler todo o livro. Terá, ainda assim,

dificuldades para encontrar o nome, a soma, a data ou qualquer outrainformação que desejar, pois este livro-caixa tem sérios problemas deconservação, e leitura bastante difícil.

O sistema de códigos foi criado de forma aberta o suficiente para poderse aplicado aoutras fontes que contenham informações referentes ao TeatroSão João, e ainda, para abranger formatos e suportes de documentosdiferentes dos encontrados até então (Sampaio, 2004a p.3)

 Através deste sistema de códigos torna-se possivel a imediatalocalização de informações de dentro do “emaranhado documental”que a coleção apresenta, facilitando deste modo o cotejamento deinformações, tais como nomes próprios, datas, valores, tipos dedocumentos, etc.

O grande desafio foi criar um método de “isolar” melhor as várias informações que um mesmo suporte ou documento traz em sí. O APEB somente apresenta um catálogo com documentos “grandes”,cuja unidade mínima são os maços, e cuja eventual divisão interna sãoas pastas de folhas soltas. Na verdade ambos são “coleções dedocumentos”. O sistema desenvolvido parte da identificação e“destaque” de “unidades menores de documentos”. 

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F IGURA 1.  CÓDIGO DE LOCALIZAÇÃO PARA O MAÇO 619  DO APE:  FOLHAS AVULSAS E

ENCADERNADAS GUARDADAS EM PASTAS (SAMPAIO 2004A).

Obs. FA = Folhas Avulsas

F IGURA 2.  CÓDIGO DE LOCALIZAÇÃO PARA O MAÇO 624:  LIVRO DE REGISTRO DE PORTARIAS,  

OFICIOS E EDITAIS (S AMPAIO 2004A).

Obs. LD = Livro de Documentos

Segundo este sistema, cada uma das atas e portarias do maço624, por exemplo, passa a ser considerada um documento individual.Desta forma, uma mesma página deste livro pode conter váriosdocumentos diferentes. O critério adotado para a delimitação de umdocumento foi a datação e informação de quem gerou o documento,informações sempre presentes em documentação de naturezaburocrática, como são os documentos em questão. Além deste critério,a referencia de catalogação do APEB e o tipo de suporte do documentoconstam das informações do código para cada “unidade dedocumento”. 

 As transcrições e o sistema de localização de informaçõespossibilitam a elaboração de vários quadros e tabelas relacionando

Página

Lado da Página(Frente ou Verso)

 Número do Registro

Formato dos Documentos

 Nome do Arquivo

 Número do Maço

APE 624 _ LD _ 37 _ 42 V

 

Formato dos Documentos

 Nome do Arquivo

 Número do Maço

APE 619 _ FA _ A 0 . 01

Pasta

Caderno

Folha

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informações antes restritas a cada documento individual, fornecendotanto informações complementares às questões levantadas peladocumentação, como também servindo de ponto de partida para outrasquestões.

Um exemplo desta dinâmica é a elaboração de uma tabela de

informações sobre as apresentações realizadas na temporada 1812-1813do TSJB. O livro caixa (maço 622) apresenta um série de entradasrelativas ao borderô  –  arrecadamento de ingressos a cada récita. Estasentradas estão “misturadas” com entradas de outras receitas, tais comoo aluguel de camarotes ou assinaturas de espetáculos. Estas entradas deborderô, quando “isoladas”, nos mostarm os dias em que aconteceramapresentações no TSJB, e quanto cada apresentação destas rendeu.

O cotejamento destas informações com as contidas no livro deatas e portarias (maço 624) e com as do “Diario Ecclesiastico”, as do“Dias de Grande Cortejo” e as da “Epochas da História Portugueza”(que fornece datas cívicas, tais como aniversários de nascimento efalecimento de membros da casa real, ou outras efemérides) do Almanach 1812  (Almanach, 1812), permitem a elaboração de um gráficoque revela padrões de frequencia do público baiano de então, queprevilegiava as apresentações em dias de “benefícios” (apresentaçõescuja renda era destinada aos artistas) ou em datas cívicas (dias deanivesários da familia real, por exemplo).

F IGURA 3.  TABELA COM O FATURAMENTO DA BILHETERIA (EM RÉI S) D O TSJB  PARA A

TEMPORADA 1812-1813

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6. RESULTADOS, ESTADO ATUAL E PERSPECTIVAS FUTURAS PARA A PESQUISA DOS

DOCUMENTOS NO APEB SOBRE O TSJB

 Além do trabalho sistemático de organização e transcrição de

uma parcela da documentação contida nos maços 617-624 do APEB, jáfoi realizado um levantamento prévio sobre a documentação dos maços4072-4077. Como fruto direto destas ações, já é possível realizarestudos que revelam aspectos importantes sobre as relações entre asociedade de então com a produção artística presente em umainstituição como um teatro público.

 A documentação sobre o TSJB do APEB traz á luz uma sériede dados que muito contribuem para a pesquisa em musicologia:-listas de artistas-listas de repertório executado-listas de repertório e equipamentos presentes na instituição-informações sobre a situação financeira e trabalhista dos artistasatuantes no teatro-informações sobre os freqüentadores e mantenedores das atividadesdo teatro-informações sobre o cotidiano funcional, financeiro e comportamentaldas atividades do teatro

Certamente outras informações estão á disposição depesquisadores que se interessem em estudar esta documentação tão ricae detalhada.

 As informações que esta documentação revela servem de pontode partida para uma série de pesquisas de interesse para o entendimentodo papel simbólico das artes na sociedade baiana durante todo o séculoXIX. As minhas próprias pesquisas abordaram aspectos tão diversosquanto: as motivações e contexto político-cultural que resultaram nacriação do TSJB; as diferenças de concepção por parte dosfinanciadores, dos governantes e dos artistas do que seria esta empresateatral; aspectos financeiros e da vida funcional dos artistas; ascaracterísticas do repertório executado no TSJB; a circulação de artistasentre a Europa e o Brasil; entre outros. Estas pesquisas resultaram emuma série de comunicações em eventos científicos e publicações noBrasil e exterior, das quais destaco algumas (a produção bibliográfica

gerada até o momento encontra-se na bibliografia abaixo):

  2003 - Porto Alegre , RS - XIV ANPPOM

  2003 - Havana, Cuba –  III Coloquio Internacional de Musicologia

  2004 - Juiz de Fora, MG –  VI Encontro de Musicologia Histórica

  2006 - Juiz de Fora, MG  –   VII Encontro de MusicologiaHistórica

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  2008 - Lisboa, Portugal –  Colóquio Luso-Brasileiro (Gulbenkian)

  2010 - Salvador, BA –  CENOMHBRA

Esperamos que futuros trabalhos possam explorar amplamenteo potencial de informações que a documentação do APEB sobre o TSJB traz para o estudo do papel simbólico que um teatro público

pode ter para uma sociedade, e encerro o presente trabalho com umtrecho de uma publicação passada, que realça a importância destadocumentação tão rica, esperando que muitos pesquisadores venham ase dedicar ao seu estudo:

O “Teatro São João desta Cidade da Bahia” (como conhecido naépoca de sua criação) foi uma instituição que sobreviveu por mais de umséculo. Foi o palco principal da representação dos valores culturais, estéticose políticos da elite baiana, e também foi testemunha das mudanças queocorreram nesta sociedade, em um período decisivo para a consolidação doBrasil enquanto nação independente, até mesmo em termos culturais(Robatto, 2003).

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EDUFBA. CD ROM, 2003.

 ——— . "Os Documentos do Teatro São João no Arquivo Público doEstado da Bahia: Catalogando e Gerenciando Informações." In Anais do VI Encontro de Musicologia Histórica , Edit. PauloCastagna, 432-41. Juiz de Fora, MG: Promúsica, 2004a.

 ———. “Relações Trabalhistas entre o Teatro São João e os seus Artistas, no Período de 1812 a 1821.” In  Anais do II Encontro Nacional da ABET . Salvador: CNPq/Contexto. CD ROM,2004b.

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MEMORIAL DA ESCOLA DE MÚSICA:  

DOCUMENTOS E PESQUISA  

 Maria da Conceição Costa Perrone (UFBA)

O estudo de instituições ligadas à música na Bahia vem traçandocaminhos que são de interesse da história da educação, tornandoemergencial a criação de um arquivo referencial de dados, que é oelemento inicial de qualquer ato de conhecimento. Assim, a pesquisadocumental necessita ter um suporte teórico que a sustente. É sempreindispensável incentivar, através dos meios oficiais, o cuidado com osdocumentos, principalmente aqueles que podem prover a estabilidadehistórica em todas as áreas as quais ela (a História) atua. A existência dediversos arquivos de referência solucionaria parte das dúvidas que aindapersistem sobre fatos, dados e identificação de conceitos sobre opassado. Como sugestão necessita-se, definitivamente, erradicar essetipo de determinação selvagem de destruir, indiscriminadamente, papéis(documentos, partituras), hábito que, infelizmente, ainda persistente nacultura brasileira.

Semelhante situação de descaso com documentos de extremaimportância aconteceu na Universidade Federal da Bahia. Fundado em1954, oito anos após a criação da Universidade da Bahia (1946) osSeminários Livres de Música hoje reconhecidamente a Escola deMúsica da UFBA, vinha com seus documentos cuidadosamentearquivados, desde sua criação, por Hildebranda Kateb, com posteriorfichamento de alunos e professores realizado por Lucy Cardoso foram,

no início do ano 2003, encontrados em um porão inóspito e úmidomuitos em estado de decomposição reflexo de quase nenhumapreocupação1  com a história que esses documentos podem elucidarsobre o ensino da música na Bahia, sobre as personalidades eadministrações.

1  O termo “quase nenhuma preocupação” é justificado porque esses documentos

 poderiam ter sido incinerados.

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Como o local onde estavam os documentos continuaabsolutamente insalubre para realizar qualquer pesquisa foi buscadaoutra solução juntamente com o Departamento de Apoio daEMUFBA, responsável pela manutenção e distribuição do espaço físicoda Escola de Música. Assim os documentos passaram a ser abrigadosna casa de força da Escola. Após higienizar, arquivar em caixasapropriadas tornou-se possível realizar uma primeira consulta em umapequena parte desse vasto acervo documental em um CD anexo sendotambém possível, através de fotografia, apreciar o processo dearrumação do que agora chamamos de Memorial da Escola de Músicada Universidade Federal da Bahia.

ARQUIVO TRANSPORTADO PARA A CAS A DE FORÇA DA ESCOLA DE MÚSICA.  

ESTADO DO MATERIAL A SER REVISTO 

Enfim, com a ajuda de algumas pessoas e muita perseverança,

conseguiu-se chegar, com o que foi possível resgatar, a um panoramade conclusões para estabelecer o percurso histórico desta Instituiçãoatuante na área do ensino de música no Brasil. Passaremos a descreversistematicamente o trabalho realizado.

 Após pintar e colocar algumas estantes, com a ajuda de algunsfuncionários, os documentos foram transferidos para lá. Muitosdocumentos já se encontravam em processo de desintegração pela açãoda umidade, com muita praga de traça e cupim nas caixas de papelão.

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INÍCIO DO PROCESSO DE LIMPEZA COM PRAGAS DIVERSAS .

Para a história da Escola de Música foi absolutamente necessáriodescobrir onde se encontrava o arquivo da Instituição. Somente assimfoi possível conhecer o que foi produzido em termos de estrutura deensino, eventos, estrutura administrativa e também conhecer ospersonagens que fizeram, de fato, a história da Instituição. Depois de

estar consciente da diferença entre conhecimento e informação, foiiniciado o trabalho de organização do Memorial da EMUFBA.

PARTITURAS MANUSCRITAS E PROGRAMAS DE C ONCERTOS DIVERSOS 

 A maior parte do material foi resgatada do porão, lá restando oque ainda não foi possível retirar por questões de espaço para alocação.Como é possível avaliar pelas fotografias selecionadas2, o estado deconservação era o pior possível. Como método de estruturação de uma

quantidade imensa de papéis, é possível dividir as atividades em trêsfases

 A primeira fase, a limpeza, caracterizada pela desinfecção dosdocumentos, em princípio investindo sem o auxílio institucional e, logoem seguida, com a benevolência da Pró-Reitoria de Pós-Graduação daUFBA. Durante essa fase, foi possível realizar a primeira parte da

2 Vide Fotos do Memorial, (Fase I, Fase II e Fase III)

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pesquisa, uma tomada de consciência do material disponível parasedimentar abordagens posteriores, sendo então elaborada a primeiradescrição do conteúdo das caixas. Pelo tempo exíguo para a realizaçãoda organização do arquivo e pela agilidade posterior da consulta, foramsolicitadas caixas de arquivo morto coloridas para identificaçãoimediata: vermelhas, destinadas para documentos da administração;amarelas, para histórico escolar de alunos; azul, programas deconcertos, eventos e partituras. Depois chegaram caixas verdes,brancas, cinzas e de papelão, sendo distribuído o material do Madrigal,da Orquestra Sinfônica, livros de empenho, de contabilidade, caixas defichas, cadernetas de professores e outras.

FASE I:  INÍCIO DA LIMPEZA DOS DOCUMENTOS ENCONTRADOS  

 A segunda fase, a organização, foi destinada ao dimensionamentodo espaço para a colocação das estantes, de acordo com a quantidade edistribuição das caixas. Nessa fase, foi possível vislumbrarpossibilidades posteriores para pesquisa, envolvendo educação musical,

composição, identificação de históricos diversos pela qualidade dosdocumentos lá existentes, embora todos necessitassem e aindanecessitem de catalogação específica. Ainda nessa fase, emergiu aconsciência de adesão de profissionais qualificados para a realização dealguns trabalhos: um bibliotecário, um arquivista, um restaurador depapéis e um técnico em informática.3 

3  O que não foi possível porque isso demandava abertura de concurso paraocupação dos efetivos cargos.

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FASE II : A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO  

 A terceira fase, a sistematização do material, foi destinada àelaboração de um banco de dados no programa  Access . Depois dedeterminado quais seriam os itens, foi solicitado a um aluno deinformática a alimentação desse banco de dados. Cada caixa foi aberta eos documentos ali existentes sofreram o primeiro registrado, sendo,posteriormente, através de uma numeração, determinada umalocalização na estante. Os trabalhos ainda não foram concluídosporque, em momento posterior, chegaram várias pastas e caixas comdocumentos da década de 80 em diante (da administração, das oficinas,da graduação e da pós-graduação), no que resultou, por falta de espaçoe estantes, na impossibilidade de chegar a termo essa primeira

catalogação.

FASE III:  A  SISTEMATIZAÇÃO DO MATERIAL . 

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ESTÁGIO ATUAL DO MEMORIAL DA ESCOLA DE MÚSICA DA UFBA

 A guisa de conclusão e continuidade dessa etapa de organização esistematização dos documentos fica como sugestão a proposta para a

Universidade Federal da Bahia, conjuntamente com a Escola de Música(resgatando e acreditando que ambas têm respeito pela sua história) queeste arquivo de referência ou fonte histórica seja preservado de formaconveniente, obedecendo aos padrões de conservação e de preservação.Neste Memorial pode ser antevistos, através de documentação denatureza primária, o estabelecimento de futuras e múltiplas abordagensem história da Bahia, como: da Educação Musical; do Grupo deCompositores; do Ensino do Piano; do Ensino dos Instrumentos deSopro; do Ensino dos Instrumentos de Cordas; da Vida Musical naCidade do Salvador; do Relacionamento Música e Universidade; da Arte e da Universidade dentre outras possíveis linhas de pesquisa.

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O  P ATRIMÔNIO MUSICAL NA B AHIA:  

BREVE RELATO DE NOVAS ACHEGAS

DOCUMENTAIS 

Pablo Sotuyo Blanco (UFBA)

APRESENTAÇÃO DO FEITO NO PASSADO 

Em 2004 apresentamos um modelo operacional para realizardiagnósticos da expectativa documental arquivística relativa à músicaem territórios geográficos específicos. Dito modelo foi inicialmente

testado na Bahia entre 2003 e 2004, o referido modelo foiposteriormente aplicado em estados como Goiás (UFG, 2005), Piauí(UFPI, 2006), Paraíba (UFPB, 2008) e em Sergipe (UFS, 2009).

Dentre os resultados obtidos, isto é, qual o número estimado dearquivos relativos à música que se pode esperar encontrar nos Estadosacima referidos, pode-se afirmar que na Bahia diagnosticamos mais de2000 fundos documentais relativos à música, enquanto no Piauíestimamos mais de 500 fundos documentais, na Paraíba calculamosmais de 680 fundos documentais e, finalmente em Sergipe, pode-seesperar mais de 330 fundos documentais no território estadual.

O modelo operacional de diagnóstico arquivístico documentalrelativo à música desenvolvido em 2003 e aperfeiçoado até finais de2004 pode ser descrito como a somatoria resultante da combinação einterpretação de dados e parâmetros relativos à organização política,religiosa e socio-cultural de um território dado (no caso, uma UnidadeFederal ou Estado da União).

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Dentre as fontes dos dados e parâmetros se incluem:a) IBGE e CONARQ (legislação vigente);b) CNBB (Código de Direito Canônico);c) MEC, FUNARTE, Secretarias de Cultura estaduais

(mapeamentos e legislação estadual);d) outras informações sócio-econômicas do território em

questäo.

 Ainda, o diagnóstico prevê a eventual parametrizaçäo doterritório no processo histórico, pela justaposição das diversasdefiniçöes geo-políticas que dito território experimentou na sua históriaaté o presente, cujas informações surgem de levantamento bibliográficoe outras fontes de informações históricas relativas ao território.

Durante o VI Encontro de Musicologia Histórica (Juiz de Fora,2004) propusemos o Guia para a Localização de Arquivos NãoInstitucionais de Música (GLANIM) que foi ampliado em 2005 comoGuia Geral para a Localização de Acervos de Música (GLAM) eapresentado durante o III Seminário do PPGMUS-UnB (Brasília,2005). Aplicado ao Estado da Bahia, o GLAM permitiu identificar maisde 150 fundos musicais específicos em Salvador e mais de 350 fundosmusicais específicos no interior da Bahia.

 Tanto o GLANIM quanto o GLAM visam a localização efetivados fundos documentais diagnosticados. Assim, esquemáticamente, oGLANIM inclui quatro etapas que as figuras 1 a 4 expöem.1 

FIGURA 1 -  ETAPA 1  DO GLANIM

1  Para maiores informações e detalhes, o leitor interessado pode ler o artigo

completo nos  Anais do VI Encontro de Musicologia Histórica  (Juiz de Fora:ProMusica, 2006).

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F IGURA 2 -  ETAPA 2  DO GLANIM

F IGURA 3 -  ETAPA 3  DO GLANIM

F IGURA 4 -  ETAPA 4  DO GLANIM

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Dentre as ações musicológicas desenvolvidas até 2009,podemos incluir o desenvolvimento de ferramentas e conceitos emmusicologia; a catalogação e inventário de fundos documentais taiscomo os listados abaixo.

•  Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

•  Luiz Gonzaga Mariz•  Hildebranda Fonseca Kateb•  Damião Barbosa de Araújo•  Fundação Gregório de Mattos (ms e impressos)•  Mestre Eduardo Vieira de Mello (ms e impresos)

 Ainda, participamos da realização dos seguintes inventários ecatálogos:

•  Inventário do acervo da Fundação Instituto Feminino da Bahia•  Catálogo web de Ernst Widmer (MHCC-UFBA)•  Catálogo web de Lindembergue Cardoso (MHCC-UFBA)

AÇÕES NO PRESENTE 

O nosso maior empenho no presente está centrado nainstalação definitiva do Acervo de Documentação Histórica Musical daUFBA (ADoHM-UFBA) estabelecido em 4 de abril de 2009,

integrando o Sistema de Bibliotecas da UFBA e coordenadomusicologicamente por mim com auxilio de uma equipemultidisciplinar que inclui bibliotecários, arquivistas, e a colaboração dediversos técnicos em atividades específicas.

Desde o inicio, o Laboratório de Musicologia do PPGMUS-UFBA assiste tecnicamente o ADoHM-UFBA, integrando assim umespaço propedéutico que garante aos mestrandos e doutorando emmusicologia pelo PPGMUS-UFBA o tão necessário contato com adocumentação musical e a relativa à música, podendo assimefetivamente aplicar na prática os conceitos teóricos transmiticos nasrestantes disciplinas disponiveis na área de concentração em

Musicologia. Em breve, através de projeto integrado da UFBA efinanciado pela FINEP o acervo será instalado definitivamente naBiblioteca Universitária Reitor Macedo Costa, no âmbito do Sistema deBibliotecas.

Embora o ADoHM-UFBA procura se estabelecer como umcentro de referência no que diz respeito à gestão e tratamento deacervos de música, a sua ação não se limita ao âmbito da UFBA, tendo

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entre as suas prioridades o Estado da Bahia, o nordeste e o Brasil. Atualmente, dentre os Fundos disponíveis, cabe destacar dois gruposprincipais:

 –   Oriundos da UFBA (em suportes papel, microfilme e digital)

•  OSUFBA Pedagógico-musical (exercícios de alunos docurso de Composição e Regência da EMUS e

executados pela orquestra)•  Seminários Livres de Música•  Grupo de Compositores da Bahia•  Antonio Fernando Burgos•  Luiz Gonzaga Mariz•  Hildebranda Fonseca Kateb

 –   Oriundos de fora da UFBA (em suporte digital)

•  Maragogipe (Mestre Eduardo Vieira de Mello,

Filarmônica 2 de Julho, Elan Kilder)•  Lençois (Phylarmônica Lyra Popular)•  Paratinga (Filarmônica 13 de Junho)

 A esses grupos, ainda se agregou um terceiro grupo dedocumentos avulsos (em suportes papel e digital) oriundos de cidadescomo Salvador, Feira de Santana e Cachoeira, dentre outras cidades doestado da Bahia.

 Assim, os fundos guardados no ADoHM-UFBA inclui osseguintes tipos documentais:

 –   Musicais (impressos e manuscritos) –   Iconográficos (fotos, diapositivos, e imagens diversas) –   Sonoros (discos vinil, fitas de rolo e K7) –   Audiovisuais (VHS, DVD)

 Ainda, o conjunto total dos documentos constantes no ADoHM-UFBA cobre um periodo que inclui o século XIX e XX naBahia, no Brasil e outros paises. Dentre as raridades nele contidas,pode-se destacar os seguintes:

 –   Obras de Damião Barbosa de Araújo –   Fotografias dos Seminários Livres de Música –   Slides e gravações de obras do GCB –   Microfichas dos catálogos de Widmer e Cardoso

 –   Fotografias digitais de numerosos documentoslusitanos, hispânicos e latino-americanos

Finalmente, uma importante hemeroteca musical em suportedigital, resultado das pesquisas do Núcleo de Estudos Musicais(NEMUS), junto a uma biblioteca de referência e acesso à internet,

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fornecerão aos usuários a complementação necessárias à otimização daspesquisas.

PROJEÇÃO NECESSÁRIA DO FUTURO 

O futuro do nosso patrimônio musical documental, suapesquisa e, consequentemente, a nossa memória cultural musicaldepende, notadamente, da convergência ativa de quatro fatoresconcomitantes.

Em primeiro lugar, a musicologia brasileira precisa desenvolverde forma multi-disciplinar uma tão necessária quanto devidaconceituação ontológica, técnica e normativa em torno dadocumentação musical e relativa à música. Nesse sentido, a recente

criação da Câmara Técnica de Documentação Audiovisual,Iconografica e Sonora (CTDAIS) no âmbito do Conselho Nacional de Arquivos (CONARQ) e da qual fazemos parte, se apresenta como aoportunidade que esperávamos para que a tal conceituação aconteça,permitindo uma maior integração das ações musicológicas comeventuais ações arquivísticas, com os necessários marcos legaisdevidamente vinculados.

Em segundo lugar, parece-nos evidente a necessária capacitaçãoprofissional de bibliotecários e arquivistas nos diversos aspectosrelativos ao tratamento e gestão da documentação musical. Assim, um1º curso de “Gestao e Tratamento de Acervos de Música” em parceria

da EMUS com o Instituto de Ciencia da Informação (ICI) da UFBA,como inicio previsto para o semestre 2013.1 em nível deEspecialização, expondo assim o pioneirismo necessario à nossa regiãonordestina.

 Além do anterior, ações estruturantes complementares enecessárias em diversos níveis (acadêmicos, institucionais, profissionaise normativos) estão previstas com o apoio das seguintes instituições eprojetos institucionalizados:

• Associação Internacional de Bibliotecas, Arquivos e Centrosde Documentação de Música (IAML);

• Associação Internacional de Arquivos Sonoros (IASA);• Federação Internacional de Arquivos Fílmicos (FIAF);• Repertório Internacional de Fontes Musicais (RISM) e RISM-

Brasil;• Repertório Internacional de Literatura Musical (RILM) e

 Academia Brasileira de Musica;• Repertório Internacional de Iconografia Musical (RIdIM) e

RIdIM-Brasil

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Finalmente, mas não por isso menos importante, precisamosiniciar ações que promovam a conscientização social e política dapopulação com relação ao nosso patrimônio musical documental, tantoem âmbito privado quanto público, visando o resgate, guarda epreservação do nosso valioso e nunca justamente consideradopatrimônio cultural e documental musical, no maior grau possível.