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A abolição do Comércio Atlãntico de Escravos e os Africanos Livres no Brasil Titulo Pires, Ana Flavio Cicchelli - Autor/a; Autor(es) Los estudios afroamericanos y africanos en América Latina : herencia, presencia y visiones del otro En: Córdoba ; Buenos Aires Lugar CLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales CEA-UNC, Centro de Estudios Avanzados-Universidad Nacional de Córdoba Editorial/Editor 2008 Fecha Colección Historiografía; Africanos libres; Libertad; Esclavitud; Aspectos judídicos; Africanos; Trata de personas; Brasil; Temas Capítulo de Libro Tipo de documento http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/Argentina/cea-unc/20121212053442/07pire.pdf URL Reconocimiento-No comercial-Sin obras derivadas 2.0 Genérica http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.0/deed.es Licencia Segui buscando en la Red de Bibliotecas Virtuales de CLACSO http://biblioteca.clacso.edu.ar Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO) Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (CLACSO) Latin American Council of Social Sciences (CLACSO) www.clacso.edu.ar

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  • A abolio do Comrcio Atlntico de Escravos e os Africanos Livres no Brasil Titulo Pires, Ana Flavio Cicchelli - Autor/a; Autor(es)Los estudios afroamericanos y africanos en Amrica Latina : herencia, presencia yvisiones del otro

    En:

    Crdoba ; Buenos Aires LugarCLACSO, Consejo Latinoamericano de Ciencias SocialesCEA-UNC, Centro de Estudios Avanzados-Universidad Nacional de Crdoba

    Editorial/Editor

    2008 FechaColeccin

    Historiografa; Africanos libres; Libertad; Esclavitud; Aspectos juddicos; Africanos;Trata de personas; Brasil;

    Temas

    Captulo de Libro Tipo de documentohttp://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/Argentina/cea-unc/20121212053442/07pire.pdf URLReconocimiento-No comercial-Sin obras derivadas 2.0 Genricahttp://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.0/deed.es

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    ANA FLVIA CICCHELLI PIRES*

    A ABOLIO DO COMRCIO ATLNTICO DEESCRAVOS E OS AFRICANOS LIVRES NO BRASIL

    Os esforos do governo portugus e, aps a independncia, do governobrasileiro com a finalidade de abolir o comrcio atlntico de escravos para oBrasil culminaram na criao de um novo status jurdico: os africanos livres.Estavam inseridos nesta categoria tanto os africanos emancipados por estarem abordo de embarcaes condenadas por trfico ilegal pela Comisso Mista BrasilGr-Bretanha, localizada no Rio de Janeiro, quanto os africanos recm-importadosapreendidos em terra por autoridades brasileiras.

    O artigo que ora se apresenta tem por objetivo elucidar algumas questesreferentes aos africanos livres no Brasil. Para atingir o objetivo proposto, noprimeiro momento resgato os acordos internacionais e a legislao nacionalestabelecida visando abolio do comrcio atlntico de escravos para o Brasil.Posteriormente, trao um panorama sobre o contexto especfico em que se deu acriao deste grupo, assim como os seus desdobramentos. Por fim, realizo umbalano historiogrfico, trazendo tona os estudiosos que tm se dedicado aotema, assim como os enfoques dados e os desenvolvimentos deste campo de estudosno Brasil.

    * Doutoranda no Programa de Ps-graduao em Histria Social da Universidade FederalFluminense desenvolvendo o projeto Cabinda em perspectiva histrica: relaes comerciais emudanas sociais e polticas no Reino do Ngoyo, sculos XVIII-XIX. O projeto tem contadocom o apoio do CNPq, Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico.

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    A ABOLIO DO COMRCIO ATLNTICO DE ESCRAVOS PARA O BRASIL

    A campanha para abolio do comrcio de escravos atravs do Atlnticoassumiu grandes propores na Inglaterra, alegando para a causa defendidaelementos de ordem moral, poltica, econmica, religiosa, filosfica etc. No finalda dcada de 1770 so apresentados ao Parlamento ingls diversos projetos comesta finalidade, porm, inicialmente, apenas algumas restries parciais vo sendoimpostas a este circuito comercial1. O comrcio escravista s ser abolido naInglaterra em 18072. Embora no tenha sido o primeiro pas a proibir essaatividade, ser o que mais se empenhar nesta campanha, tentando fazer com quetodas as outras naes adotassem a mesma poltica, especialmente Portugal,Espanha e suas colnias Brasil, no primeiro caso, Cuba e Porto Rico, no segun-do.

    A ao britnica para pr fim ao trfico de escravos se deu de duas maneirasprincipais: 1) atravs da assinatura de diversos tratados, tanto com as naesresponsveis pela importao, quanto com as chefias africanas; 2) atravs da aonaval realizada pelos cruzadores britnicos, responsveis pela patrulha dos marese pelas apreenses das embarcaes envolvidas no trfico.

    Os tratados assinados entre o governo britnico e as autoridades cujasbandeiras ou portos eram usados no comrcio de africanos so de quatro tipos. Asaber: 1) direito mtuo de busca e apreenso s embarcaes das partes contratantese a formao de Comisses Mistas para adjudicao da propriedade; 2) direitomtuo de busca e apreenses, mas sem a complementar superestrutura dostribunais de Comisses Mistas; no lugar, os cruzadores responsveis pelasapreenses passavam as embarcaes suspeitas para os respectivos tribunaisdomsticos das partes envolvidas no acordo; 3) obrigao mtua de manteresquadres na costa da frica para seu patrulhamento, assinado com Frana eEstados Unidos: os dois pases recusaram-se a conceder o direito mtuo de buscapara os britnicos, exceto por limitado perodo de tempo; 4) tratados realizadosentre Gr-Bretanha e as autoridades africanas, que estavam sendo foradas a umacrescentemente condio de subservincia em relao s naes europias (Eltis,1987)3.

    1 Sobre o abolicionismo anglo-saxo ver: Davis, David Brion 2001 O problema da escravido nacultura ocidental (Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira). Eltis, David 1987 Economic growth andthe endind of the transatlantic slave trade (New York: Oxford university Press). Eltis, David &Walvin, James (comp.) 1981 The abolition on the atlantic slave trade (Madison: The University ofWisconsin Press). Klein, Herbert 2002 O fim do comrcio de escravos en O comrcio atlntico deescravos: quatro sculos de comrcio esclavagista (Lisboa: Editora Replicao).2 Tal medida passa a vigorar a partir de 1 de janeiro de 1808.3 A rede de tratados foi reforada por dois itens na legislao domstica britnica: o Bill de Palmerston,

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    No que diz respeito a Portugal e sua colnia, o Brasil, a presso inglesapara a abolio do comrcio negreiro remonta vinda da famlia real para o Riode Janeiro, em 1808. Portugal encontrava-se envolvido numa srie de problemasem funo das Guerras Napolenicas, sendo a transferncia da Corte para o Brasilauxiliada pela Inglaterra. Em funo desta proteo, Portugal v-se impelido aassinar o Tratado de Amizade e Aliana entre o Prncipe Regente de Portugal e oRei do Reino Unido da Gr-Bretanha e Irlanda, em 19 de fevereiro de 1810.Entre outras determinaes ficou decidido que o Prncipe Regente estandoconvencido da injustia do comrcio de escravos e resolvendo cooperar com SuaMajestade Britnica adotaria os meios mais eficazes para conseguir uma aboliogradual do trfico atlntico em seus domnios, sendo que, a partir de ento, sseria permitido comerciar com os territrios africanos que lhe pertencessem4.Esse apenas o primeiro ato formal a partir do qual uma srie de tratadosinternacionais entre Inglaterra e Portugal e aps a independncia, com o Brasil assinada com o objetivo de pr fim ao trfico de escravos5.

    Alguns problemas advieram a partir da assinatura do tratado de 1810,uma vez que este gerou dvidas com relao aos locais na costa africana onde era

    em 1939, contra Portugal, e o Bill Aberdeen, em 1845, contra o Brasil. A superestrutura internacionalcontra o comrcio escravista veio a estar completa em 1862, com a assinatura dos ltimos tratadoscom os chefes africanos e da assinatura da conveno anglo-americana que concedeu o direito debusca s embarcaes norte-americanas e a formao de Comisses Mistas em funo do trficopara Cuba. (Eltis, 1987: 89-90). Alm disso, a poltica britnica para supresso do trfico deescravos se deu tambm atravs do bloqueio de vrios rios, na tentativa de impedir a passagem deembarcaes negreiras, assim como atravs da destruio e queima de barraces e feitorias, todaslevadas a cabo na costa africana. (Eltis, 1987: 82-3; Klein, 2002: 182-3).4 Tratado de Amizade e Aliana entre o Prncipe Regente de Portugal e El-Rey do Reino Unido daGr-Bretanha e Irlanda, assinado em 19 de fevereiro de 1810, Colleco das Leis do Imprio doBrasil, 1810, Biblioteca Nacional. Segundo Maurcio Goulart, o compromisso portugus nestaocasio foi mais alm, uma vez que [...] comprometeu-se o prncipe regente, depois de reafirmaro intento de cooperar eficazmente na causa de humanidade to gloriosa sustentada pela Inglaterra, aabolir de pronto todo o comrcio e trfico de escravos nos estabelecimentos de Bissau e Cacheu.(Goulart, 1975: 220-1).5 Sobre o processo de abolio do trfico de escravos para o Brasil, entre outros, ver: Goulart,Maurcio 1975 A escravido africana no Brasil: das origens extino do trfico (So Paulo: EditoraAlfa-mega). Bethell, Leslie 1976 A abolio do trfico de escravos no Brasil: a Gr-Bretanha, oBrasil e a questo do trfico de escravos 1807-1869 (Rio de Janeiro: Expresso e Cultura; So Paulo:Editora da Universidade de So Paulo). Conrad, Robert 1985 Tumbeiros: o trfico de escravos parao Brasil (So Paulo: Ed. Brasiliense). Rodrigues, Jaime 2000 O infame comrcio: propostas e experinciasno final do trfico de africanos para o Brasil (1800-1850) (Campinas, SP: Ed. da Unicamp/Cecult).Pires, Ana Flvia Cicchelli 2006 Trfico ilegal de escravos: os caminhos que levam a Cabinda,Dissertao de Mestrado, Universidade Federal Fluminense, Niteri. Algumas questes referentesa esse processo so contempladas ainda em: Malheiro, Perdigo 1976 A escravido no Brasil: ensaiohistrico, jurdico, social (Petrpolis: Vozes; Braslia: INL, 2v.). Bastos, A. C. Tavares 1975 Cartasdo Solitrio (So Paulo: Ed. Nacional; Braslia: INL).

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    permitido realizar o comrcio de escravos. Diversas embarcaes pertencentes asditos portugueses foram apreendidas, alegando a Inglaterra para tal ato o fatode que elas estavam sendo empregadas no trfico ilegal. Estes acontecimentoscausaram certa agitao, especialmente entre os negociantes da praa da Bahia,que tiveram a maior parte das embarcaes apresadas.

    Portugal e Gr-Bretanha tentaram solucionar tais problemas atravs deoutro acordo, assinado em janeiro de 1815, durante o Congresso de Viena, quandoa questo do trfico foi novamente levantada, discutida e temporariamenteresolvida. Segundo o novo tratado, ficou proibido a todo vassalo da Coroa dePortugal comprar ou traficar escravos em qualquer lugar da Costa da frica aonorte do Equador6. Alm disso, o Prncipe Regente de Portugal comprometia-seem: no empreender o trfico debaixo da bandeira portuguesa para outro fim queno fosse suprir de escravos suas possesses transatlnticas; adotar as medidasnecessrias para que o ajuste fosse cumprido; fixar, atravs de um tratado separado,o perodo em que o trfico de escravos seria proibido em todos os seus domnios.J Sua Majestade Britnica comprometia-se em adotar medidas que impedissemqualquer embarao s embarcaes portuguesas enquanto o comrcio escravistaagora limitado ao sul da linha do Equador ainda fosse permitido segundo asleis de Portugal e aos tratados existentes entre as duas naes. Alm disso,indenizaria Portugal pelas embarcaes indevidamente apresadas at 1 de junhode 18147.

    Para a regulamentao dos pontos fixados em 1815 foi assinada a ConvenoAdicional de 28 de julho de 1817, que estipulou clusulas para impedir qualquercomrcio ilcito de escravos, tendo como itens principais: o direito mtuo debusca e visita aos navios mercantes das partes contratantes Portugal e Inglaterrasempre que houvesse suspeita de trfico ilcito; o apresamento de embarcaes,caso a seu bordo fossem encontrados escravos irregularmente embarcados na frica.Tais casos seriam encaminhados aos tribunais estabelecidos para este efeito, asComisses Mistas, encarregadas de julgar com agilidade os apresamentos edeterminar a indenizao por perdas sofridas em caso de deteno injusta earbitrria. Portugal ainda assumiu o compromisso de promulgar uma leideterminando as penas que deveriam ser aplicadas aos vassalos de sua Coroa queviessem a fazer o trfico ilcito de escravos. A Gr-Bretanha concederia indenizaesaos donos de navios portugueses que foram apresados pelos cruzadores britnicos

    6 O comrcio de escravos entre o Brasil e a Costa da Mina encontrava-se, dessa maneira, proibido.7 Tratado de 22 de Janeiro de 1815, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1815, BibliotecaNacional. Durantes este congresso as principais naes concordaram em abolir o comrcio escravista,exceto Portugal, Espanha e Frana. Porm, logo depois, em novembro de 1815, a Frana adota amesma resoluo. Dessa maneira, Portugal e Espanha foram as nicas naes que permaneceramativas no comrcio escravista. (Klein, 2002: 186).

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    no perodo compreendido entre 1 de junho de 1814 e o estabelecimento dasComisses Mistas8.

    As Comisses Mistas teriam sedes na Costa da frica (Serra Leoa), noBrasil (Rio de Janeiro) e na Inglaterra (Londres), e eram destinadas a julgar, semapelao, sobre a legalidade da deteno dos navios empregados no trfico deescravos. Alm disso, eram responsveis pelo estabelecimento de indenizaes,caso fosse concedida liberdade ao navio apresado. Cada uma das comisses eracomposta por um comissrio juiz, um comissrio rbitro e um secretrio ou oficialde registro, nomeados pelo soberano do pas onde residia a comisso. No caso donavio ser condenado por viagem ilcita, o casco e a carga exceo dos escravosseriam considerados boa presa, sendo vendidos em leilo pblico em benefciodos dois governos. Quanto aos escravos encontrados nas embarcaes apreendidasficou determinado que receberiam uma carta de alforria e seriam consignados aogoverno do pas onde estivesse instalada a comisso que dera a sentena paraprestarem servio como trabalhadores livres9. A comisso estabelecida em SerraLeoa foi responsvel pelo julgamento de diversos navios que traficavam para oBrasil. Mesmo navios apresados prximos costa brasileira foram conduzidospara l pelos cruzadores britnicos10.

    As Comisses Mistas existiram tambm em lugares como Havana, Caboda Boa Esperana, Luanda, Ilha de Santa Helena, entre outros. Contudo, deacordo com David Eltis, mais de 80% dos escravos e navios capturados sob essetipo de tratado eram adjudicados em Serra Leoa. (Eltis, 1987: 86). Isto fazia parteda poltica britnica de recrutamento de trabalhadores para suas colnias(Mamigonian, 2005).

    Em 26 de janeiro de 1818 foi promulgado outro alvar, com fora de lei,para a execuo e punio dos transgressores que continuassem a traficar escravosnos portos proibidos da costa africana, dando as convenientes providncias arespeito do destino da carga humana. Os navios empregados no trfico seriamconfiscados com todos os aparelhos e pertences, juntamente com a carga. Aosoficiais dos navios seria imputada uma pena de degredo por cinco anos emMoambique, alm do pagamento de multa. Ficou determinado que os africanos

    8 Conveno Adicional de 28 de julho de 1817, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1817,Biblioteca Nacional. Anexo a esta Conveno encontramos os seguintes atos ou instrumentos: 1)Formulrio de passaporte para os navios mercantes portugueses que se destinarem ao trfico lcitoda escravatura; 2) Instrues para os navios de guerra das duas naes que forem destinados aimpedir o trfico ilcito de escravos; 3) Regulamento para as Comisses Mistas que residiro naCosta dfrica, no Brasil, e em Londres.9 Anexo n 3: Regulamento para as Comisses Mistas que devem residir na Costa da frica, noBrasil, e em Londres, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1817, Biblioteca Nacional.10 Alguns navios, embora poucos, foram conduzidos para a Ilha de Santa Helena e a julgados.

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    encontrados a bordo seriam entregues ao Juzo da Ouvidoria da comarca paraservirem como libertos por tempo de quatorze anos, em algum servio pblicoou alugados em praa a particulares de estabelecimento e probidade conhecida.Os responsveis deveriam aliment-los, vesti-los, doutrin-los e ensinar-lhes oofcio ou trabalho que se convencionasse, pelo tempo que fosse estipulado. Almdisso, seria nomeado um curador, tambm pessoa de conhecida probidade, queteria por ofcio requerer tudo o que for a bem dos libertos e fiscalizar os possveisabusos11.

    Para Manolo Florentino, a presso inglesa e a proibio do trfico ao nortedo Equador configuraram como mais um fator de risco para os traficantes(Florentino, 1997: 149). Tal qual j havia ocorrido aps a assinatura do Tratadode Amizade e Aliana, em 1810, estes tratados internacionais provocaram acirradosatritos entre os traficantes de diversas provncias e os ingleses nela residentes, umavez que assistimos a apreenso de diversas embarcaes. Mais uma vez, osnegociantes da praa de Salvador foram os mais afetados, acumulando maioresprejuzos, em funo dos laos estreitos que mantinham com a frica Ocidental,mais especificamente com os portos localizados na Costa da Mina12.

    Passado algum tempo, em 1821, por temor de perder o trono portugusem decorrncia das revolues liberal-nacionalistas do ano anterior, assistimos aoretorno de D. Joo VI a Portugal, deixando em aberto a questo da fixao doprazo para o trmino do trfico de escravos (Goulart, 1975: 240; Bethell, 1976:34). Com a posterior independncia do Brasil, em 1822, os ingleses tentaramnovo entendimento, agora com o nascente Imprio. As negociaes prosseguiramat 1825 envolvendo, por um lado, o reconhecimento da independncia por parteda Coroa Britnica e, por outro, garantias seguras da abolio do trfico porparte do Brasil. Embora as primeiras negociaes tenham sido rejeitadas, a 23 denovembro de 1826 foi ajustada uma nova conveno entre o Brasil e a Gr-Bretanha, com a finalidade de por termo ao comrcio de escravatura da Costa dafrica, quando os tratados anglo-portugueses de 1815 e 1817 foram adotados erenovados pelo Brasil13. Segundo o novo acordo, num prazo de trs anos aps sua

    11 Alvar com fora de lei de 26 de janeiro de 1818, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1818,Biblioteca Nacional.12 Consultando os processos referentes s embarcaes apresadas e julgadas perante a ComissoMista Brasil Gr-Bretanha, consegui localizar dezesseis que foram apreendidas no perodocompreendido entre 1817 e 1825. Desse total, onze haviam sado da Bahia, uma retornaria paraeste mesmo porto, duas saram de Pernambuco e uma havia sado de Lisboa. Havia ainda umaescuna inglesa, que sara de Gibraltar. Arquivo Histrico do Itamaraty (AHI); III - Colees Especiais;33 - Comisses Mistas Brasil Gr-Bretanha (trfico de negros).13 Vale destacar que o reconhecimento da independncia por parte da Coroa Britnica estavavinculado abolio do comrcio de escravos pelo Brasil. Sem o reconhecimento ingls ficavadifcil fazer o comrcio martimo.

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    ratificao o que ocorreu em 13 de maro de 1827 no seria mais lcito aoImprio do Brasil comerciar escravos na Costa da frica, equiparando sua prtica pirataria. Alm disso, as duas partes contratantes se comprometiam em nomear,desde j, Comisses Mistas, semelhana daquelas estipuladas com Portugal14.

    Esse acordo soou altamente impopular, refletindo mal em diversas partesdo Imprio. Segundo Leslie Bethell, a grande maioria dos deputados brasileirosestava convencida de que a abolio do trfico negreiro, naquele momento, seriaum desastre j que o Brasil era economicamente dependente de braos escravos.Alm disso, argumentavam como boa parte do pas que o governo imperialtinha abolido o trfico em conseqncia da presso estrangeira, e no para atenderaos interesses nacionais (Bethell, 1976: 73-4). Mais uma vez as repercusses foramenormes, marcando negativa e profundamente as relaes entre os dois governosbrasileiro e ingls que, durante algumas dcadas, continuariam envolvidos emquestes diplomticas.

    O governo brasileiro tentou adiar a data marcada para a abolio, ou seja,13 de maro de 1830, mas o governo britnico no estava disposto a ceder. Quandoa data chegou, em funo das crises polticas que culminaram com a abdicao deD. Pedro I (07.04.1831), o debate sobre a extino do trfico negreiro ficourelegado a segundo plano15.

    O assunto voltou cena durante a Regncia Trina, quando foi promulgadaa lei de 7 de novembro de 1831, que sancionada pela Assemblia Geral, tornarailcito o trfico de escravos. Ficou determinado que todos os africanos recolhidosem embarcaes ilegais ou desembarcados em territrio do Brasil seriamconsiderados livres. A nova lei reafirma a condio de livres dos africanosintroduzidos no Brasil por comrcio ilcito, mas estende sua abrangncia a todocontinente africano e no apenas aos embarques feitos ao norte do Equador. Almdisso, estipularam as penas a serem aplicadas aos importadores de escravos. Estes,entre outras responsabilidades, deveriam arcar com as despesas de reexportaodos africanos. Com relao definio de quem seria considerado importador,pode-se dizer que a estavam enquadrados o comandante, mestre ou contramestre

    14 Conveno de 23 de novembro de 1826, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1826, BibliotecaNacional. O Tratado de 1826 estipulou que entre 1827 e 1830 os cruzadores britnicos continuariama operar de acordo com a Conveno de Direito de Busca firmada em 1817 entre Inglaterra ePortugal (Bethell, 1976: 95).15 Segundo Tho L. Pieiro, assistimos ao crescimento da oposio ao longo do primeiro reinadoem funo de fatores como a poltica autoritria do governo, a luta interna entre os diversos grupospelo controle do Estado e a questo do fim do comrcio de escravos. Isto levou ao esvaziamentopoltico do imperador que, em 1831, renunciou ao trono, em meio a manifestaes de rua, quetambm contaram com a participao de parte do Exrcito. A abdicao, para o autor, significou achegada ao poder dos proprietrios de terras e escravos (Pieiro, 2002).

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    da embarcao, assim como todos os interessados na negociao. Aresponsabilidade pela ilegalidade era, pela primeira vez, estendida queles quecientemente comprassem os referidos africanos, embora para esses as penas fossemmenores16.

    Apesar das medidas que foram sendo estipuladas desde 1810, o trficoatlntico continuou. Em 1826, quando foi anunciada a proibio da entrada deescravos no Brasil, criou-se grande inquietao no s neste lado do Atlntico,mas tambm na costa da frica17. Temendo o cumprimento desta conveno osinteressados no prolongamento do comrcio negreiro fizeram um esforo grandepara importar o mximo possvel de africanos, o que resultou num aumentobrutal do volume dos escravos traficados para o Brasil, atingindo uma cifra superioraos perodos anteriores. Muitos fazendeiros contraram dvidas com os traficantes,ficando depois sem condies de sald-las18 (Florentino, 1997: 47). Por seu turno,foi grande tambm o nmero de apreenses realizadas pelos cruzadores britnicosno perodo.

    Os traficantes continuaram em ao atravs de um sistema de contrabando,com a conivncia do governo e das autoridades brasileiras, cabendo Inglaterravigiar, reprimir e exigir o cumprimento dos tratados e convenes firmados. Osesforos para conter o trfico de africanos foram poucos e insuficientes,encontrando apoio nas populaes locais e fcil mercado. Adiciona-se a isso aconivncia das autoridades locais, freqentemente constitudas pelos prpriosfazendeiros interessados na continuidade do trfico19. Embora o comrcio escravistatenha sofrido um forte abalo nos primeiros anos da dcada de 1830, a partir de

    16 Lei de 7 de novembro de 1831 (Malheiro, vol. 2, 1976: 181-2).17 Com relao aos conflitos gerados na costa da frica quando do anncio do fim do comrcio deescravos para o Brasil, especialmente na costa centro-ocidental, ver: Ferreira, Roquinaldo Amaral1996 Dos sertes ao Atlntico: trfico ilegal de escravos e comrcio lcito em Angola, 1830-1860,Dissertao de Mestrado, UFRJ, Rio de Janeiro. Ferreira, Roquinaldo Amaral 1998-1999Escravido e revoltas de escravos em Angola (1830-1860), en Afro-sia (Bahia), N 21-22.18 Lus Henrique Dias Tavares ressalta em seu trabalho que os proprietrios endividados, inclusiveministros imperiais, acabaram ficando nas mos dos traficantes e agentes do comrcio de escravos(Tavares: 130-1).19 De acordo com Mary Karasch, grandes somas de dinheiros foram gastas com subornos, queeram distribudos no Brasil para capites do porto, agentes alfandegrios, juzes municipais e atmesmo para o Chanceler da legao portuguesa. Ressalta ainda a autora que ao lado da cooperaodos oficiais do governo e dos polticos, muitos brasileiros ajudavam as embarcaes negreiras adesembarcar na costa, dando informaes a respeito dos lugares de desembarque, localizao doscruzeiros ingleses e condies do mercado. (Karasch, 1967: 43). Sobre as propinas recebidas pelasautoridades brasileiras e, sobretudo, pelo Chanceler portugus, ver: Alcoforado, Joaquim de PaulaGuedes. Histria sobre o infame negcio de africanos da frica Oriental e Ocidental, com todasas ocorrncias desde 1831 a 1853 en Ferreira, Roquinaldo Amaral 1995 O Relatrio Alcoforado,Estudos Afro-Asiticos, N 28.

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    1835-36 assistimos sua recuperao, muito em funo do contexto poltico daRegncia. Do total de africanos trazidos para o Brasil em trezentos anos de trficoatlntico, aproximadamente 20% chegou entre 1831 e 1855, demonstrando aimportncia do trfico ilegal de escravos20 (Eltis, 1987: 243-4).

    A REPRESSO AO TRFICO DE ESCRAVOS E OS AFRICANOS LIVRES NO BRASIL

    Em 20 de dezembro de 1830, o Jornal do Commrcio anunciava a entradada fragata inglesa Druid no porto do Rio de Janeiro, com quarenta e oito doscinqenta africanos encontrados a bordo da escuna Destemida, tambm conduzidapara o Rio de Janeiro aps ter sido apresada cinco milhas ao sul da Bahia21. Ocaso estava sendo encaminhado Comisso Mista Brasileira e Inglesa.

    A escuna Destemida havia sido apresada pelo navio de guerra de S.M.B.Druid, sob o comando de G. William Hamilton. Segundo o relato destecomandante:

    Na manh de 2 de dezembro de 1830, estando 10 milhas ao S.O. da Bahia,observamos uma escuna a barlavento, a qual supusemos ser a mesma que me tinhasido denunciada naquela manh muito cedo estando ento ancorado na Bahiacomo dirigindo-se para o Porto e depois fugindo dele, portanto em razo dasaparncias suspeitosas, demos-lhes caa e tendo chegado a distncia prpria,fizemos-lhes fogo e a obrigamos a vir para ns: iou bandeira portuguesa22.

    Os envolvidos no caso apresentaram uma srie de documentos, que foramanexados ao processo. Os apresadores queriam provar que a embarcao estavaenvolvida no contrabando de africanos; os apresados que a embarcao no estavaenvolvida no trfico de escravos e que os cinqenta africanos encontradosembarcaram no porto de Ajud e estavam sendo encaminhados para a Bahia naqualidade aprendizes, com o consentimento do Governo a partir do compromissode pagamento de uma fiana e de lev-los de volta assim que tivessem concludoo aprendizado do ofcio23.

    20 No podemos esquecer que aps 1831 ainda ser promulgada uma outra lei com o objetivo depr fim ao trfico atlntico de escravos: Lei de 4 de setembro de 1850.21 Jornal do Commrcio, 20.12.1830, Biblioteca Nacional.22 AHI, III Colees Especiais; 33 Comisses Mistas Brasil Gr-Bretanha (trfico de negros).Lata 10, Mao 2, Embarcao Destemida, 1830-1831.23 AHI, III Colees Especiais; 33 Comisses Mistas Brasil Gr-Bretanha (trfico de negros).Ibid. A idia de qualificao profissional fazia parte do projeto de assentamento de africanos livresnas Amricas e o comandante da escuna Destemida, Raimundo Arribas, parecia estar a par disso efazer uso do argumento para justificar a presena dos cinqenta homens em sua embarcao. Sobre

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    O processo longo e foge ao escopo do trabalho estar levantando todos osseus meandros. O que vale ressaltar no momento que a Comisso Mista Brasileirae Inglesa concluiu seus trabalhos e chegou a um veredicto no dia 22 de janeiro de1831. Segundo os autos, na conformidade do Artigo 3 da Conveno de 28 dejulho de 1817 e do Tratado de 23 de novembro de 1826, a comisso julgou legala deteno da escuna Destemida. Segundo o Artigo 7 do Regulamento dasComisses Mistas, os escravos encontrados a bordo estavam sujeitos disposiodo 2 do Alvar de 26 de Janeiro de 1818, devendo ser libertos e passadas ascartas de liberdade. Declara ainda a comisso que, embora os apelide de domsticose alegue que os trouxera para aprenderem ofcios, desembarcando-os com faculdadedo Governo da Bahia, a inteno de Raimundo Arribas foi conduzi-los comoescravos cidade de Salvador. Sendo assim, declarou os escravos, em nmero decinqenta, todos do sexo masculino, livres e emancipados, e postos disposiodo Governo de S.M.B. Imperador como criados e trabalhadores livres24.

    A cada um dos cinqenta africanos da escuna Destemida foi concedidacarta de liberdade nos termos abaixo, tendo sido Fortunato o primeiro a receb-la:

    Dom Pedro Primeiro por graa de Deus, e unnime aclamao dos povos,Imperador constitucional e perptuo defensor do Imprio do Brasil. Fao saber,que tendo-se em conformidade da Conveno de 28 de julho de 1817, adicionalao Tratado de 22 de janeiro de 1815, julgado por sentena, da Comisso Mistaestabelecida nesta cidade sobre o trfico da escravatura de 22 de janeiro do corrente,boa presa os escravos da Escuna Destemida, de que era mestre Raimundo de Arribas,e proprietrio Manoel Afonso Vicente da Conceio da Ilha do Prncipe por serapreendida no trfico ilcito da escravatura; e havidos por emancipados e livres docativeiro os escravos vindos a bordo da dita Escuna Destemida. Sou [servido]determinar que de ora em diante e por esta carta fique considerado o preto Fortunatode nao nag sem marca livre e emancipado da escravido para ser empregado naconformidade do artigo stimo do Regulamento anexo dita Conveno, e doAlvar de 26 de janeiro de 1818, como criado, ou trabalhador livre. E esta secumprir como se contem, e declara, sem dvida nem embarao algum registrando-se no livro da Comisso. O Imperador constitucional o mandou. Os comissriosda Comisso Mista abaixo assinaram. Theophilo de Mello Secretrio interino eintrprete da Comisso Mista o escrevi. Rio de Janeiro 22 de janeiro de 1831.

    o caso da escuna Destemida ver: Pires, Ana Flvia Cicchelli A represso ao comrcio atlntico deescravos na rota da Costa da Mina: o caso da Escuna Destemida, 1830-1831 en Soares, Mariza deCarvalho Rotas atlnticas da dispora africana: os pretos minas no Rio de Janeiro (Niteri: EDUFF)no prelo.24 AHI, III Colees Especiais; 33 Comisses Mistas Brasil Gr-Bretanha (trfico de negros).Ibid.

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    Alexandre Cunningham = Joo Carneiro de Campos = nmero hum = Lugar dosello Imperial da comisso25.

    Os africanos que receberam a carta de liberdade passaram a fazer parte dogrupo conhecido como africanos livres. Alm dos africanos apreendidos nos naviosnegreiros estavam tambm inseridos nesta categoria os africanos recm-importadosapreendidos em terra por autoridades brasileiras.

    Constando-me que existem alguns africanos novos dos desembarcados no dia 26do prximo passado ms na Praia do Per, e do Brigue incendiado pela tripulaoem casas de um indivduo de nome Jos Luiz Lopes Trindade, morador naquelapraia, e conhecido tambm por Jos Per [...] ordeno-lhe terminantemente, e sobsua responsabilidade, que sem perda de tempo [...] requisite a fora policial quenecessitar, e com ela faa apreenso dos africanos novos que encontrar naquelascasas e prenda minha ordem o dito Trindade26.

    J tendo em mente quem eram os africanos livres no Brasil, passemos agoraa entender um pouco mais sobre a vida deste grupo, que compunham um totalde 11.000 pessoas. (Conrad, 1985; Mamigonian, 2002).

    Em 12 de abril de 1832 a Regncia Trina promulga um decreto cujafinalidade seria regular a execuo da carta de lei de 7 de novembro de 1831.Foram introduzidas novas instrues prevendo a inspeo pela polcia e pelosjuzes de paz locais de todos os navios que entrassem ou deixassem um portobrasileiro. Se fossem encontrados ou apreendidos africanos nas circunstncias dalei, eles seriam postos em depsito e os importadores obrigados a arcar com aquantia necessria para sua reexportao. Alm disso, constando ao intendentegeral da polcia ou a qualquer juiz de paz que algum comprou ou vendeu escravoboal, o fato seria averiguado. Se fosse concludo que o africano veio aps a cessaodo trfico, ele seria depositado para que se procedesse nos termos da lei. Emtodos os casos consta que as partes interessadas seriam ouvidas27.

    Apesar do compromisso assumido pelo governo brasileiro em vrias leis etratados com relao reexportao dos africanos ilicitamente introduzidos noImprio, isso no se verificou. Os principais motivos alegados para o seu nocumprimento eram a dificuldade em encontrar na frica um lugar onde estabelec-los, a enorme despesa e a dificuldade de transporte. Com isso, tornaram-se

    25 Arquivo Nacional (AN), Cdice 184, Volume 3.26 Cidade de Cabo Frio, 11 de setembro de 1850. Arquivo Pblico do Estado do Rio de Janeiro(APERJ), Fundo Presidncia da Provncia (PP), Coleo 192.27 Decreto de 12 de Abril de 1832, Colleco das Leis e Decretos do Imprio do Brasil, 1832,Biblioteca Nacional.

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    necessrias algumas medidas para que os africanos no continuassemindefinidamente retidos em depsitos.

    Como conseqncia foram providenciadas algumas instrues, como adatada de 29 de outubro de 1834, onde a Regncia ordena a arrematao aparticulares dos servios dos africanos depositados na Casa de Correo do Riode Janeiro que no estivessem sendo utilizados em suas obras. No ato daarrematao o juiz faria conhecer aos africanos que eles eram livres, porm serviriampor sustento, vesturio, tratamento e mediante arrecadao anual de mdicosalrio pelo curador com a finalidade de ajudar na reexportao. Alm disso, seriaentregue ao africano uma pequena lata e uma carta declaratria de que era livre.No que diz respeito nomeao do curador, esta seria realizada por um juiz edeveria ser aprovada pelo governo, tendo por obrigaes fiscalizar tudo quantofor a bem de tais africanos tanto os arrematados a particulares quanto aos queficassem trabalhando nas obras pblicas e arrecadar anualmente o salrio quefosse estipulado28.

    Entre as condies fixadas para a arrematao dos servios dos africanoslivres temos: ela s poderia ser realizada por pessoas de dentro do municpio dereconhecida probidade e inteireza, preferindo-se a quem oferecesse mais por anopelos seus servios; obrigao dos arrematantes em vestir e tratar os africanos comtoda humanidade, permitindo a visita do curador para verificar se o contratoestava sendo cumprido; arrematando os servios das mulheres teriam por obrigaolevar tambm algumas crianas e, por isso, o pagamento seria mais suave; entregaros africanos logo que a Assemblia Geral decidisse sobre sua sorte ou o governodecidisse por sua reexportao. Caso ocorresse a morte de algum dos africanos, oarrematante seria obrigado a dar parte imediatamente ao Juiz de Paz para inspeodo cadver e baixa no livro respectivo. Em caso de fuga, o arrematante deveria darigualmente parte ao Juiz de Paz ou Chefe de Polcia, para que se expedissem asordens necessrias para a captura do fugitivo.

    Em 19 de novembro de 1835 um novo decreto foi aprovado, ondeprocurou-se no s executar as instrues expedidas em 29 de outubro do anoanterior pela Secretaria de Estado dos Negcios da Justia, como tambm ampli-las e fazer algumas alteraes. Afirmava-se que os servios dos africanos seriamarrematados perante o juiz, para serem prestados dentro dos municpios das capitaise, caso pretendessem servir fora desses municpios, s o poderiam fazer medianteautorizao do Governo da Corte, dos Presidentes das Provncias e da nomeaode um curador. A distribuio seria realizada atravs de anncio oito dias antes dadata da arrematao em folhas pblicas ou editais. Determinava ainda este aviso

    28 Aviso de 29 de outubro de 1834, com Instrues relativas arrematao dos Africanos ilicitamenteintroduzidos no Imprio. APERJ, Fundo PP, Coleo 193.

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    que no mximo oito africanos seriam concedidos a cada arrematante, excetoquando para servio em algum estabelecimento nacional29.

    Em funo da clusula que dizia que os africanos livres deveriam serconcedidos a senhores de reconhecida inteireza e probidade, na maioria das vezeseles naturalmente foram confiados a senhores proeminentes ricos e influentesda cidade do Rio de Janeiro. A elite poltica da nao tambm estava pessoalmenteinteressada na posse de trabalhadores to baratos.

    Os emancipados mantidos sob controle direto do governo eram utilizadosprincipalmente em ocupaes urbanas, trabalhando em abertura de estradas,limpeza e conservao das ruas, nos cemitrios e servios afins. Podiam serencontrados servindo em fbricas de plvora, em fbricas de ferro, nas obras daestrada da Serra da Estrela, nas obras da Casa de Correo da Corte, na CmaraMunicipal de Niteri, na Biblioteca Nacional, no Corpo Policial da Provncia,entre outros estabelecimentos. J os africanos livres arrematados a particulareseram, em sua maioria, empregados no servio agrcola ou domstico, como amaioria dos escravos no Brasil. Nas cidades tambm eram empregados pelosparticulares ao ganho ou em outros fins lucrativos, e no ao servio pessoal dessesconcessionrios como deveria ser conforme as instrues30.

    Alm dos servios a que eram empregados, outros aspectos importantespodem ser destacados com relao vida africanos livres, como o caso dorecolhimento dos salrios. De acordo com o aviso do Ministro da Justia aoChefe da Polcia, datado de 7 de maro de 1836, estipulou-se que o dinheiroarrecadado com os salrios dos africanos livres seriam recolhidos e guardadosnum cofre, juntamente com o dinheiro proveniente da arrematao de seusservios. Haveria um livro de receita e despesa e outros livros que fossem necessriospara a respectiva escriturao. Ficou determinado tambm que haveria umtesoureiro nomeado pelo Juiz de rfos, ou pelo juiz a quem o governo tivesseencarregado da disposio dos africanos. O tesoureiro deveria prestar contas aojuiz de trs em trs meses, ou antes de findar este prazo se assim fosse necessrio31.

    Em 2 de julho de 1840 encontramos novas instrues referentes arrecadao dos salrios dos africanos livres: tal procedimento deveria ser realizadopela Recebedoria da Corte e remetidos regularmente ao Tesouro Nacional, a fimde terem a aplicao determinada nas Instrues de 29 de outubro de 1834 e

    29 Decreto de 19 de novembro de 1835, Colleco das Leis do Imprio do Brasil, 1835, BibliotecaNacional.30 Empregando os africanos livres em servios ao ganho os arrematantes ganhavam muito mais porms do que eram obrigados a pagar por ano. (Malheiro, 1976). O produto da arrematao destinava-se a ajudar nas despesas da reexportao ou em benefcio dos africanos.31 Aviso de 7 de Maro de 1836, Colleco das Leis e Decretos do Imprio do Brasil, 1836, BibliotecaNacional.

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    alteraes de 19 de novembro de 1835. Para isso haveria o livro de inscrio dosarrematantes, o livro de receita dos salrios e o livro onde se abriria uma contacorrente para o curador em funo das quantias que recebia para as despesasnecessrias com os africanos. Passado o tempo em que deveria ser feito o pagamentodos salrios, ficou determinado que o administrador extrairia a relao dosdevedores e remeteria ao juiz, fazendo-se a cobrana executiva pelos agentes daRecebedoria32.

    Em 22 de janeiro de 1841 enviado um comunicado ao Ministro eSecretrio de Estado dos Negcios da Fazenda com o seguinte teor:

    Comunicando o senhor Ministro e Secretrio dEstado dos Negcios da Fazenda,que constando, que em algumas provncias se tem apreendido africanos, cujosservios tm sido arrematados, sem que nos balanos remetidos pelas respectivasTesourarias se encontre quantia alguma proveniente dos salrios dos mesmos [...]ordens para que a Tesouraria dessas Provncias se recolhido desde j qualquer soma,que possa [ilegvel] arrecadada, e informe com a possvel brevidade do que ocorrersobre este objeto33.

    Como podemos perceber, da mesma forma que no houve um controlergido sobre o nmero dos africanos ilicitamente introduzidos no Imprio, tambmno foi feito um controle rgido sobre a arrecadao dos salrios. De acordo comTavares Bastos, a formalidade para controle da arrecadao era to grande que apartir da lei de oramento de 21 de outubro de 1843 os salrios comearam a serclassificados entre as verbas da receita ordinria do Estado (Bastos, 1975). Sendoassim, os africanos livres normalmente nada recebiam por seu trabalho, excetocomida, vesturio e alojamento. Algumas vezes no lhes era fornecido sequer omnimo a que tinham direito seja pelos particulares ou pelas agncias oficiaisdo Imprio.

    Em 15 de setembro de 1836 temos mais instrues com relao aos africanoslivres. Desta vez o aviso determinava, em aditamento s instrues de 1834 e1835, que no caso de falecer a pessoa que tivesse arrendado os servios dos africanoslivres, os herdeiros seriam obrigados a comunicar o bito dentro de trinta dias,para que fossem tomadas as providncias acerca do destino dos africanos. Erarecomendada a maior vigilncia aos Juzes de Paz e curadores a este respeito34.

    32 Instruo de 2 de Julho de 1840, para arrecadao dos salrios dos africanos ilicitamenteintroduzidos no Imprio, Colleco das Leis e Decretos do Brasil, 1840, Biblioteca Nacional.33 APERJ, Fundo PP, Coleo 2.34 Aviso de 15 de setembro de 1836, Colleco das Leis e Decretos do Imprio do Brasil, 1836,Biblioteca Nacional.

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    Estas no so as nicas instrues dadas a respeito dos africanos livres. Osexto artigo da lei 4 de setembro de 1850 determinava que enquanto no severificasse a reexportao dos africanos livres, eles seriam empregados debaixo datutela do governo, no sendo em caso algum concedidos os seus servios aparticulares35. Segundo Tavares Bastos, isso seria prova dos vexames que ocorriam.Para ele, proibindo a arrematao dos servios dos africanos livres a particulares,o poder legislativo os livravam da barbaridade dos senhores e da escravido futura(Bastos, 1975).

    No que diz respeito reexportao dos africanos livres para a frica,compromisso assumido pelo governo brasileiro em diversas ocasies e uma dasjustificativas para o aluguel de homens e mulheres livres a particulares, pode-sedizer que tambm no se verificou. Segundo Robert Conrad, os pagamentos erambaixos, o que favorecia mais aos interesses dos particulares do que o alegado objetivode repatriao. Sendo assim, em 1868 apenas 459 haviam sido registrados comotendo voltado ao seu continente nativo. (Conrad, 1985).

    Em 28 de dezembro de 1853, a partir do anncio do Decreto n 1303,ficou determinado que os africanos livres que tivessem prestado servios aparticulares por espao de catorze anos seriam emancipados, caso o requeressem.Porm, teriam a obrigao de residir no lugar que fosse designado pelo governo edeveriam ter uma ocupao ou servio onde recebessem salrio36. Comoconseqncia do decreto, uma srie de peties foram dirigidas ao ImperadorDom Pedro II e processadas pelos funcionrios do Ministrio da Justia, nasdcadas de 1850 e 1860.

    Vrios foram os impedimentos colocados no caminho dos africanos livrespara conseguirem a emancipao. Entre eles podemos citar as dificuldadesoferecidas pelas formalidades da petio requerida pelo decreto e as complicaescolocadas no caminho dos africanos pelos arrematantes. Alm disso, o decreto de28 de dezembro de 1853 continha uma medida complementar destinada arestringir a liberdade dos africanos. Os emancipados que conseguissem obter sualibertao atravs das peties feitas ao governo seriam obrigados a aceitar empregoassalariado onde quer que fosse ordenado pelo governo, provavelmente at mesmonas propriedades de seus antigos tutores se tal soluo parecesse apropriada. Nestemesmo sentido, vale ressaltar que os milhares de africanos empregados no serviogovernamental estavam excludos dos benefcios do decreto. Contudo, de acordocom Jaime Rodrigues, embora a demanda judicial ocorresse em condies deenorme desigualdade e apesar da discrepncia notria entre as partes, a arenajudicial tinha rituais que precisavam ser cumpridos e em meio aos quais os escravos

    35 Lei n. 581 de 4 de setembro de 1850 (Malheiro, vol. 2, 1976: 183-4).36 Decreto n 1303 de 28 de dezembro de 1853 (Malheiro, vol. 2, 1976: 223).

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    e africanos livres conseguiram, por vezes, alcanar seus objetivos (Rodrigues,2000: 199).

    A emancipao final dos africanos livres ocorreu a partir da promulgaodo Decreto n 3.310 de 24 de setembro de 1864. Este determinava que todos osafricanos livres existentes no Imprio, a servio do Estado ou de particulares,seriam emancipados. Expedidas pelo Juzo de rfos da Corte e pelas Capitaisdas Provncias, as cartas de emancipao seriam remetidas aos Chefes de Polcia eentregues aos emancipados depois de registradas em livro destinado para isso. Osafricanos livres a servio de particulares seriam sem demoras recolhidos Casa deCorreo da Corte. Nas provncias seriam recolhidos a estabelecimentos pblicosdesignados pelos Presidentes. A partir da, seriam levados presena dos Chefesde Polcia para receberem suas cartas de emancipao. Os emancipados poderiamfixar seu domiclio em qualquer parte do Imprio, porm antes disso deveriamdeclar-lo a Polcia, assim como a ocupao de que pretenderiam viver. At aplena execuo do decreto os africanos livres ficariam sobre a proteo dosPromotores das Comarcas, que teriam por funo, como os curadores, requerer afavor dos direitos do africano37.

    Os empecilhos colocados no caminho dos africanos livres que desejavamfinalmente conseguir a liberdade no foram poucos. Mais uma vez o compromissoassumido pelo governo brasileiro no foi cumprido com o rigor que deveria.Mesmo aps a emancipao final em 1864, ainda encontramos os africanos livrestrabalhando em estabelecimentos governamentais, sem contar os que haviam sidoabsorvidos pela populao escrava. Certamente, muitos africanos livres e seusdescendentes no conseguiram suas cartas de emancipao, tendo que esperarmais de vinte anos pela lei de 13 de maio de 1888 que aboliu a escravatura noBrasil para que lhes fosse concedida a liberdade. Aos emancipados queconseguiram suas cartas de liberdade, as perspectivas tambm no erampromissoras, pois no deixariam de ser africanos e pobres. No entanto, fao minhaas palavras de Martha Abreu quando esta se refere aos africanos livres que estavama bordo do navio que desembarcou em Bracu: com seu exemplo e experinciade vida, ampliaram os caminhos possveis para a liberdade dos homens de cor ecomplicaram a eficincia do sistema de dominao escravista (Abreu, 1995: 194-5).

    37 Decreto n 3.310 de 24 de setembro de 1864 (Malheiro, vol. 2, 1976: 224-5). A emancipaodos africanos livres seria ainda causa de desentendimento entre Brasil e Gr-Bretanha, sendo umdos motivos alegados para rompimento das relaes diplomticas entre as duas partes, episdioque ficou conhecido como Questo Christie. Sobre isso ver: Bethell, Leslie, op. cit., captulo 13.Pena, Eduardo S. 2001 Pajens da Casa Imperial, jurisconsultos, escravido e a lei de 1871 (Campinas,SP: Ed. Unicamp).

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    BALANO HISTORIOGRFICO SOBRE OS AFRICANOS LIVRES NO BRASIL

    Os africanos livres so uma categoria amplamente mencionada nahistoriografia e a documentao sobre este grupo farta. No entanto, grandeparte das informaes aparece dispersa na literatura sobre a abolio do comrciode escravos e sobre a escravido. No encontramos muitos trabalhos que versamsobre os africanos livres, embora esta rea de estudos tenha avanado nos ltimosanos. Vejamos38.

    Dois abolicionistas, contemporneos poca, deixaram importantestestemunhos sobre os africanos livres: Perdigo Malheiro e Tavares Bastos39. Ambosos autores apontam para as ms condies de vida a que eram submetidos osafricanos livres no Brasil, sendo nivelados com os de mais baixa condio, ouseja, os escravos. Apontam tambm para a crueldade das pessoas que arrematavamseus servios, ressaltando que eram submetidos a trabalhos excessivos e lhes eranegado o necessrio. Para Perdigo Malheiro, testemunha ocular do processo porter exercido na Corte o cargo de curador dos africanos livres, estes eram igualadosao escravo e sua sorte foi pior, seno igual, a de outros africanos que aqui chegaramantes da lei de 7 de novembro de 1831.

    De raa negra como os outros, eram igualados em razo de cor; porm, no sendoescravos, eram menos bem tratados do que estes, ou quando muito do mesmomodo. Servio e trabalho dia e noite; castigos; falta at do necessrio, ou escassezde alimentao e vesturio; dormiam pelo cho, em lugares imprprios, expostoss enfermidades; a educao era letra morta (Malheiro, 1976: 61).

    Ainda de acordo com Perdigo Malheiro, muitos fazendeiros procuravamconfundir as autoridades para se beneficiar do trabalho dos africanos. TavaresBastos tambm registra os mesmos desvios, denunciando o uso indevido dosafricanos livres, especialmente quando concedidos a particulares (Bastos, 1975;Malheiro, 1976).

    38 De acordo com Beatriz G. Mamigonian, embora faa parte do tema dispora africana, a atenodispensada aos africanos livres est em defasagem aos trabalhos que se dedicam aos escravos epessoas livres de descendncia africana. (Mamigonian, 2000). Para um outro balano historiogrficosobre o tema ver: Mamigonian [Bessa], Beatriz G 1997 Out of diverse experiences, a fragmentaryhistory: a study of the historiography on liberated africans in Africa and the Americas, Paperpresented at the SSHRC/UNESCO Summer Institute Identifying enslaved africans: the Nigerianhinterland and the african diaspora, York University, Canad.39 Gostaria de ressaltar que, segundo Eduardo S. Pena, tanto Perdigo Malheiro quanto TavaresBastos, obedecendo s razes de segurana e ordem do Estado Imperial, procuraram no comentarsobre a polmica com relao liberdade dos africanos e descendentes importados aps a lei de1831, que do ponto de vista jurdico e poltico, poderia colocar em perigo a manuteno daescravido no pas. (Pena, 2001).

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    Embora no trate especificamente dos africanos livres em seu importanteestudo sobre a abolio do trfico da escravatura no Brasil, Leslie Bethell nos dimportantes informaes sobre o tema. O foco de sua anlise recai sobre as relaesdiplomticas desencadeadas entre Brasil e Gr-Bretanha e os africanos livresaparecem no bojo desta discusso. Leslie Bethell foi responsvel por uma certacaracterizao do grupo, que serviu de base para outros estudos. Segundo ele,estes africanos poderiam ser divididos em dois grupos: os liberados pelo trabalhodas comisses mistas (1817 a 1845) e os capturados por autoridades brasileirasque compunham um grupo menor (Bethell, 1976).

    Robert E. Conrad foi pioneiro ao dedicar sua ateno aos africanos livresno Brasil. Em 1973, publicou Neither slave nor free: the emancipados of Brazil,1818-1868, depois traduzido para portugus e publicado sob o ttulo Osemancipados: nem escravos nem libertos. Neste trabalho, Robert Conrad juntadiversas informaes sobre os africanos livres, sobretudo as que dizem respeito asua vida e experincia, aos trabalhos a que eram submetidos e ao processo deemancipao. Alm disso, faz um alerta sobre violncia com que os africanos,livres ou escravos, eram tratados. Segundo o autor, mais de 11 mil africanosilegalmente importados foram mantidos em estado de servido, muitos pelo restode suas vidas, outros por talvez meio sculo. Legalmente eram diferentes da maioriados africanos, mas sofriam destino semelhante nas mos de uma sociedade cruele desigual. (Conrad, 1973; Conrad, 1985). Nas palavras do autor:

    [...] os emancipados, pode-se concluir, foram um grupo estranho na sociedadebrasileira, vivendo em uma espcie de purgatrio legal (e ilegal) entre a escravidoe a liberdade [...] Mesmo como no-escravos, por muitos anos foi negada a liberdadeaos emancipados, por governos comprometidos por lei a defender sua liberdade(Conrad, 1985: 186).

    Luciano Raposo abordou o tema no texto analtico que acompanhou apublicao de um documento pertencente ao acervo do Arquivo Nacional. Odocumento trata-se de uma listagem com os escravos emancipados vindos a bordode embarcaes negreiras apresadas no perodo de 1839 a 1841. Alm do nomedos africanos e as respectivas embarcaes, encontramos tambm informaes arespeito do grupo de procedncia40 e das marcas corporais, tanto as relativas sorigens tnicas quanto as feitas pelos proprietrios. O autor abordou tambm

    40 Sobre o conceito de grupo de procedncia ver: Soares, Mariza de Carvalho 2000 Devotos da cor.Identidade tnica, religiosidade e escravido no Rio de Janeiro, sculo XVIII (Rio de Janeiro: CivilizaoBrasileira). Ver tambm: Soares, Mariza de Carvalho 1998 Mina, Angola e Guin, nomes dfrica no Brasil setecentista, en Revista Tempo (Rio de Janeiro), Vol. 3, N 6.

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    assuntos como as leis de regulamentavam os africanos livres no Brasil, alm deaspectos de sua vida (Raposo: 1990)

    Na dcada de 1990, Mrcia Graf dedicou parte de sua produohistoriogrfica aos africanos livres. A autora concentrou seus estudos em aspectoscomo a legislao reguladora da vida deste grupo, realizando um contraponto aoque ocorreu na prtica. Outro aspecto que despertou sua ateno foi o processode emancipao dos africanos livres no Paran e as respectivas cartas deemancipao (Graf, 1994a; Graf, 1994b).

    No podemos deixar de fora deste debate o historiador Jaime Rodrigues.Os africanos livres aparecem em um dos tpicos do livro que publicou comoresultado da pesquisa realizada para composio de sua dissertao de mestrado.Embora o foco do livro seja a questo do trfico de escravos para o Brasil e suaabolio, o tema africanos livres aparece no bojo destas discusses e se constituicomo objeto de anlise. Alm de assuntos como as ms condies a bordo dosnavios negreiros, Jaime Rodrigues aborda tambm os desembarques e apreensesde africanos, principalmente no perodo posterior a lei de 1850. Contudo, omais interessante em ressaltar de seu trabalho diz respeito a sua perspectiva deanlise, uma vez que para ele a lei de 1831 abriu brechas nas relaes escravistas e,conseqentemente, possibilidades para a liberdade de pelo menos alguns africanosatravs do desenvolvimento de diversas estratgias para se livrarem do cativeirocomo o caso de escravos se passaram por africanos livres para requerer aliberdade. Em sua viso, a populao livre e pobre, os escravos e os africanoslivres estiveram presentes no processo de extino do trfico para o Brasil(Rodrigues, 2000).

    Anteriormente, Jaime Rodrigues j havia publicado artigo sobre os africanoslivres que trabalharam numa fbrica de ferro, a fbrica So Joo de Ipanema. Ohistoriador analisa os africanos livres a partir de seu local de trabalho, revelandosua experincia cotidiana e dando relevo luta pela emancipao atravs deestratgias diversas, como fugas e rebelies (Rodrigues, 1998).

    Em 1999, Jorge Luiz Prata de Sousa defendeu tese de doutorado sobre osafricanos livres no Brasil, discutindo aspectos como trabalho, cotidiano e luta. Oautor faz um bom balano das leis que regulavam esses africanos, assim como seocupa de vrias instituies que os empregaram, como o caso da Fbrica dePlvora da Estrela. Seu objetivo foi estudar os africanos livres na sociedadeescravista brasileira do oitocentos como uma categoria social especfica, distintados escravos. Trabalhando com bibliografia substanciosa, com informaes dosexpedientes policiais, dos relatrios ministeriais, dos mapas de freqncia deoperrios e africanos livres em vrias fbricas, do testemunho dos viajantes e dacartografia existente, o autor acredita que chegou a um panorama distinto aoconhecido. Para ele, os africanos livres estiveram presentes no s nas atividades

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    profissionais junto com os escravos, como estiveram tambm presentes a todos osmovimentos de contestao do sculo XIX (Sousa, 1999)41.

    Afonso Bandeira Florence tambm produziu alguns trabalhos versandosobre a temtica dos africanos livres. Primeiramente, encontramos um artigo seusobre os africanos livres na Bahia, dando destaque a singularidade deste grupo efazendo distino entre africanos livres e emancipados (Florence, 1989). Emseguida, encontramos um outro artigo de sua autoria abordando a questo daresistncia escrava em So Paulo e a luta dos escravos e africanos livres na Fbricade Ferro So Joo de Ipanema (Florence, 1996). Por fim, gostaria de dar destaqueao trabalho mais completo do autor sobre o tema, que trata-se de sua dissertaode mestrado. Afonso B. Florence aborda no s a histria, mas tambm as diferentesvises de cativeiro e liberdade dos africanos livres, usando fontes como as peasde Martins Pena, as memrias, a legislao, os debates parlamentares e as petiesde liberdade. Para o autor, as idias e representaes construdas sobre a liberdadedos africanos livres sempre foi um terreno de disputa, ganhando diferentessignificados (Florence, 2002).

    A historiadora Beatriz G. Mamigonian dedica grande parte de sua produohistoriogrfica abordando diversos aspectos a respeito dos africanos livres no Brasil,sendo sua tese de doutorado um dos trabalhos mais significativos sobre o tema42.Neste estudo, Mamigonian revisita e examina detalhadamente a vida na fronteiraentre a escravido e a liberdade, tendo como perspectiva a nova historiografia

    41 Vale ressaltar que a temtica africanos livres aparece tambm numa coletnea organizada peloautor. A saber: Sousa, Jorge Luiz Prata de (org.) 1998 Escravido: ofcios e liberdade (Rio de Janeiro:Arquivo Pblico do Estado do Rio de Janeiro).42 No temos como recuperar todos os trabalhos produzidos pela autora para fins desta discusso,contudo podemos citar alguns deles: Mamigonian [Bessa], Beatriz G. 1997 Out of diverseexperiences, a fragmentary history: a study of the historiography on liberated africans in Africaand the Americas, Paper presented at the SSHRC/UNESCO Summer Institute Identifyingenslaved africans: the Nigerian hinterland and the African Diaspora, York University, Canad.Mamigonian, Beatriz G. 1997 Recovering the pieces of a puzzle: the history of liberated africansin Brazil and the historiography on Brazilian slavery and abolition, Trabalho no publicado,University of Waterloo. Mamigonian, Beatriz G. 2005 A abolio do trfico atlntico de escravose os africanos livres no Paran atravs das fontes disponveis no Arquivo Pblico do Paran,Artigo apresentado para o lanamento do Catlogo seletivo de documentos referentes aos africanose afrodescendentes livres e escravos, Arquivo Pblico do Paran, Curitiba, mimeo. Mamigonian,Beatriz G. 2005 O litoral de Santa Catarina na rota do abolicionismo britnico, dcadas de 1840e 1850, en Anais do II Encontro Escravido e Liberdade no Brasil Meridional (Porto Alegre: UFRGS).Mamigonian, Beatriz G. 2005 Revisitando a transio para o trabalho livre: a experincia dosafricanos livres en Florentino, Manolo (comp.) Trfico, cativeiro e liberdade, sculos XVII-XIX (Riode Janeiro: Civilizao Brasileira). Mamigonian, Beatriz G. 2006 O direito de ser africano livre:os escravos e as interpretaes da lei de 1831 en Lara, Silvia & Mendona, Joseli (comp.) Direitose Justias no Brasil: ensaios de histria social (Campinas: Editora da Unicamp/Cecult).

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    sobre escravido e abolio, Brasil imperial e poltica britnica. Temas como aemancipao formal, a tutela e concesso dos servios, as experincias de trabalho,a liberdade alternativa oferecida pelo governo britnico e as lutas pela emancipaofinal nas dcadas de 1850 e 1860 so contemplados na tese, tendo como metaavaliar em que medida esses africanos puderam gozar da liberdade. O estudoapresenta uma nova interpretao do impacto da poltica abolicionista britnicasobre a escravido brasileira e aborda os limites da liberdade durante o sculoXIX e os conflitos gerados em torno dos significados atribudos a ela. Para aautora, a experincia de trabalho dos africanos livres se insere no amplo espectrodas relaes de trabalho compulsrio que coexistiram com a escravido no Brasildo oitocentos (Mamigonian, 2002).

    Beatriz G. Mamigonian ainda autora de um interessante artigo, ondesegue a trajetria de um grupo de africanos livres nags da Bahia que vieram parao Rio de Janeiro e So Paulo, detalhando sua resistncia e luta pela emancipao.Neste caso, os africanos livres usaram a identidade tnica para pressionar oreconhecimento do seu status jurdico distinto (Mamigonian, 2000).

    Entre as pesquisas mais recentes encontramos a dissertao de mestrado deAlinnie S. Moreira, voltada para a experincia dos africanos livres que trabalharamna Fbrica de Plvora da Estrela, localizada na Serra da Estrela, no Rio de Janeiro.Abarcando o perodo entre 1830 e 1864, a dissertao dedica-se a anlise dasrelaes de trabalho desencadeadas na fbrica, onde os africanos livres puderamter um estreito contato com outros grupos sociais, como escravos da nao,trabalhadores livres e soldados artfices. Atravs da documentao consultada,Alinnie S. Moreira percebeu determinadas brechas de significado no complexomundo do trabalho, sendo as transformaes no mundo do trabalho oitocentistauma de suas grandes preocupaes. Como os demais estudiosos que se dedicaramao tema, a autora chega a concluso que o Estado Imperial no cumpriu a obrigaoassumida em acordos com a Coroa inglesa. Embora Alinnie S. Moreira tenhautilizado as teses de Beatriz G. Mamigonian e Jorge Luiz Prata de Sousa comoreferncia em seu trabalho, as perspectivas de anlise e de escala se diferenciam, jque a autora tem por objetivo observar, na menor escala, a insero dos africanoslivres no Brasil e sua relao com os demais grupos scio-jurdicos (Moreira,2003, 2005).

    Em 2004, os africanos livres foram objeto de anlise em dois trabalhos deconcluso de curso (monografia). O primeiro foi realizado por mim sob o ttuloOs africanos livres na Imperial Provncia do Rio de Janeiro. Os principais objetivosque nortearam a pesquisa partiram da necessidade que tive em compreender quemeram os africanos livres, como era a vida deste grupo na provncia do Rio deJaneiro, como se deu seu processo de emancipao e, sobretudo, em que medidaeram realmente tratados como livres. Ao revelar as perspectivas de vida deste

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    grupo de africanos no Rio de Janeiro, o estudo pretendeu contribuir para acompreenso da experincia dos africanos livres no mundo atlntico (Pires, 2004).A segunda monografia foi realizada por Ivone A. Viera e tem por objetivo principalelucidar questes relativas aos africanos livres na provncia do Paran e seu processode emancipao (Vieira, 2004).

    Atualmente, alguns estudos tm sido produzidos sobre o tema. EnidelceBertin estar defendendo tese de doutorado no final deste ano, pelo Programa dePs-Graduao em Histria da Universidade de So Paulo, sob o ttulo Os meia-cara: africanos livres em So Paulo no sculo XIX. Anteriormente, a autora j haviaapresentado uma comunicao que versava sobre a chegada dos africanos livres Justia atravs dos autos de emancipao apresentados ao Juzo de rfos de SoPaulo, abordando o processo que deveria ser seguido para obteno da carta deliberdade e os obstculos colocados em seus caminhos (Bertin, 2006). J AdrianaS. Santana est desenvolvendo atualmente no Programa Multidisciplinar de Ps-Graduao em Estudos tnicos e Africanos (Ps-Afro), da Universidade Federalda Bahia, o projeto de mestrado intitulado Negros, sim, escravos, no. Africanoslivres na Bahia, 1831-1850. A pesquisadora tem como interesse principal trabalharcom o discurso dos africanos livres e com as fontes onde so percebidas as idiasacerca da escravido e liberdade (Santana, 2005).

    Por fim, gostaria ainda de mencionar dois trabalhos que abordam o temados africanos livres. O primeiro foi produzido por Luiz Geraldo Silva e tratou-sede um texto para divulgao do Catlogo seletivo de documentos referentes aosafricanos e afrodescendentes livres e escravos, produzido pelo Arquivo Pblico doParan. Neste texto, Luiz Geraldo Silva aborda no s a questo dos africanoslivres, mas tambm dos escravos no Paran, sobretudo os que foram destacadospara aldeamentos (Silva, 2005). O segundo trabalho que menciono trata-se deuma comunicao apresentada em Ouro Preto, em junho de 2006, de autoria deMiriam Lott, cujo cerne principal so os emancipados em Ouro Preto e aexperincia deste grupo em Minas Gerais. As pesquisas a nvel local soextremamente interessantes e importantes para a composio de trabalhos emperspectiva comparada (Lott, 2006).

    CONCLUSO

    Embora o nmero de africanos livres seja reduzido em comparao aonmero de escravos de origem africana no Brasil, a anlise deste grupo, quelegalmente era diferente da maioria dos africanos, mas que sofria destinosemelhante nas mos de uma sociedade desigual, nos proporciona umentendimento mais profundo das atitudes do governo brasileiro, das autoridades

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    subordinadas e dos brasileiros livres em geral com o trfico de escravos atravs doatlntico e os africanos que foram trazidos para o Brasil durante a primeira metadedo sculo XIX.

    A categoria africanos livres existiu no s no Brasil, mas tambm em diversospases e colnias como Serra Leoa, Cuba, Jamaica, Colnia do Cabo da BoaEsperana, entre outros, demonstrando a dimenso atlntica assumida por estacategoria. Isso se deu em funo de serem estes locais regies-sede dos tribunais ecomisses mistas encarregados de julgar os navios negreiros capturados a partirda poltica de represso ao trfico43. Aproveito a oportunidade e destaco anecessidade de estudos comparativos sobre o tema, sobretudo em dimensoatlntica.

    Para finalizar, ressalto que ainda h muito que saber tanto sobre ocontrabando de africanos quanto sobre os africanos livres. Enquanto isso, finalizoeste artigo com um trecho de Tavares Bastos para reflexo:

    Que a sorte dos africanos ilicitamente importados, e como tais reputados livres, pssima, sem garantias reais, ningum contesta. E, entretanto, os poderes pblicosestabeleceram regras de que alguma forma podiam amortecer os golpes de suadesventura. J que no existe corao neste pas; j que o instinto da benevolnciaest embotado; j que se despreza assim o direito do miservel, vs consentireis,meu amigo, que eu advogue a sua causa perante o governo de Sua Majestade, coma letra das leis, o esprito e as clusulas de tratados solenes. Avivando a lembranadas providncias escritas e das garantias prometidas, talvez eu possa conseguir queas garantias se cumpram e que a lei se execute (Bastos, 1975:68).

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    43 O surgimento da categoria africanos livres ou emancipados est associada proibio do trficoatlntico pelos ingleses em 1807, o que afeta todas as reas escravistas das Amricas, especialmenteo Brasil e o Caribe. Analisando o caso das Bahamas, Gail Saunders mostra que entre 1811 e 1860,aproximadamente 6.000 africanos livres foram enviados s Bahamas. A primeira razo para essaconcentrao parece ter sido a posio das Bahamas na rota das embarcaes negreiras entre africa e Cuba. Assim como no Brasil, ao serem liberados esses africanos ficavam sob aresponsabilidade do Chief Customs Officer, para terem algum tipo de aprendizado junto a senhoresque pudessem ensin-los alguma forma de comrcio ou atividade manual (in order for them tolearn a trade or handicraf ), pelo perodo de quatorze anos. Saunders, Gail. The liberated africans

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