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XI ECOMIG Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação Social de Minas Gerais Faculdade de Comunicação - Universidade Federal de Juiz de Fora | 18 e 19 de outubro de 2018 A NARRATIVA HERÓICA E A MEMÓRIA AUTORREFERENCIAL NO WEBDOC: “ABERTURA POLÍTICA - 1974-1985” DO SITE MEMÓRIA GLOBO 1 THE HEROIC NARRATIVE AND THE SELF-REFERENTIAL MEMORY IN THE WEBDOC POLITICAL OPENING - 1974 -1985” OF THE SITE MEMÓRIA GLOBO. Raíza Ribeiro Halfeld 2 Cláudia Thomé 3 Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) Resumo Este trabalho tem por objetivo analisar como a Rede Globo constrói uma narrativa heroica e uma memória autorreferencial por meio dos conteúdos que ela mesma disponibiliza no site Memória Globo. Tendo como objeto de estudo o webdoc intitulado “Abertura Política-1974- 1985”, a pesquisa analisa a estratégia narrativa da emissora ao mesclar depoimentos fornecidos pelos próprios jornalistas da empresa com imagens de reportagens selecionadas sobre determinado período histórico. O trabalho se propõe a observar ainda como tais iniciativas são empregadas para legitimar mensagens e construir memórias. Serão utilizados aportes teóricos relacionados à memória, à história, ao webdocumentário e ao jornalismo. Para análise do material, será utilizada a metodologia de telejornalismo da autora Itânia Gomes (2011). Abstract his work aims to analyze how Globo Network constructs a heroic narrative and a self- referential memory through the contents that it makes available on the Globo Memory site. Having as a study object the webdoc entitled "Political Opening-1974-1985", the research analyzes the narrative strategy of the broadcaster by merging testimonies provided by the company's own journalists with images of selected reports about a certain historical period. The paper proposes to observe how such initiatives are used to legitimize messages and build memories. It will be used theoretical contributions related to memory, history, web document and journalism. For the analysis of the material, it will be used the methodology of telejornalismo of the author Itânia Gomes (2011). Palavras-chave: webdocumentário; memória; jornalismo; história; Rede Globo. 1 Trabalho apresentado no GT1 - Linguagens e Narrativas, do XI Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação Social de Minas Gerais, 18 e 19 de outubro de 2018. 2 Mestranda do PPGCOM da UFJF na linha de Competência Midiática, Estética e Temporalidade. Integrante do grupo de pesquisa CNPq, “Narrativas Midiáticas e Dialogias”, sob a orientação da professora Cláudia Thomé. E-mail: [email protected]. 3 Professora da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (Facom-UFJF) e do Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFJF. E-mail:[email protected] .

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XI ECOMIG – Encontro dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação Social de Minas Gerais Faculdade de Comunicação - Universidade Federal de Juiz de Fora | 18 e 19 de outubro de 2018

A NARRATIVA HERÓICA E A MEMÓRIA AUTORREFERENCIAL NO WEBDOC:

“ABERTURA POLÍTICA - 1974-1985” DO SITE MEMÓRIA GLOBO1

THE HEROIC NARRATIVE AND THE SELF-REFERENTIAL MEMORY IN THE

WEBDOC “ POLITICAL OPENING - 1974 -1985” OF THE SITE MEMÓRIA GLOBO.

Raíza Ribeiro Halfeld2

Cláudia Thomé3

Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF)

Resumo

Este trabalho tem por objetivo analisar como a Rede Globo constrói uma narrativa heroica e

uma memória autorreferencial por meio dos conteúdos que ela mesma disponibiliza no site

Memória Globo. Tendo como objeto de estudo o webdoc intitulado “Abertura Política-1974-

1985”, a pesquisa analisa a estratégia narrativa da emissora ao mesclar depoimentos

fornecidos pelos próprios jornalistas da empresa com imagens de reportagens selecionadas

sobre determinado período histórico. O trabalho se propõe a observar ainda como tais

iniciativas são empregadas para legitimar mensagens e construir memórias. Serão utilizados

aportes teóricos relacionados à memória, à história, ao webdocumentário e ao jornalismo.

Para análise do material, será utilizada a metodologia de telejornalismo da autora Itânia

Gomes (2011).

Abstract

his work aims to analyze how Globo Network constructs a heroic narrative and a self-

referential memory through the contents that it makes available on the Globo Memory site.

Having as a study object the webdoc entitled "Political Opening-1974-1985", the research

analyzes the narrative strategy of the broadcaster by merging testimonies provided by the

company's own journalists with images of selected reports about a certain historical period.

The paper proposes to observe how such initiatives are used to legitimize messages and build

memories. It will be used theoretical contributions related to memory, history, web document

and journalism. For the analysis of the material, it will be used the methodology of

telejornalismo of the author Itânia Gomes (2011).

Palavras-chave: webdocumentário; memória; jornalismo; história; Rede Globo.

1 Trabalho apresentado no GT1 - Linguagens e Narrativas, do XI Encontro dos Programas de Pós-Graduação em

Comunicação Social de Minas Gerais, 18 e 19 de outubro de 2018. 2Mestranda do PPGCOM da UFJF na linha de Competência Midiática, Estética e Temporalidade. Integrante do

grupo de pesquisa CNPq, “Narrativas Midiáticas e Dialogias”, sob a orientação da professora Cláudia Thomé.

E-mail: [email protected]. 3 Professora da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora (Facom-UFJF) e do

Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFJF. E-mail:[email protected] .

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Keywords: webdocumentary; memory; journalism; history; Rede Globo.

1. Introdução

A mídia sempre exerceu forte influência na nossa percepção de mundo, configurando-

se como uma das principais responsáveis pela construção da memória social. Muitos dos fatos

históricos que lembramos hoje só se tornaram conhecidos por terem sido mediados pelos

meios de comunicação. Sendo assim, pode-se dizer que é através das narrativas do presente

que é possível observar as práticas de armazenar, preservar e reconstruir versões do passado.

O desenvolvimento das tecnologias digitais, bem como da internet nas últimas

décadas, modificou as relações na sociedade. O excesso de informação e a aceleração do

tempo contribuíram para tornar o mundo mais fragmentado. Nesse contexto, a memória

passou a exercer um papel fundamental no que diz respeito à formação de identidades. A

necessidade de ter um referencial e de se ancorar em algo contribuiu para a fomentação de

iniciativas memorialísticas nos mais diversos setores.

No âmbito comunicacional, percebe-se que as instituições estão investindo em

projetos autorreferenciais de rememoração para legitimar suas mensagens, reforçar suas

identidades e criar laços de pertencimento com público. Muitos têm se apropriado da história

oral e do testemunho para conferir sentido aquilo que é transmitido. É o caso do site

“Memória Globo”4 que apresenta seções e conteúdos relacionados a programas e coberturas

feitas pela emissora ao longo dos anos. Nesse artigo, iremos analisar, em especial, o webdoc

intitulado “Abertura Política 1974-1985” que utiliza depoimentos de jornalistas sobre aquele

período, com imagens de matérias antigas, para reconstruir uma narrativa do passado.

Durante a pesquisa iremos verificar como os fatos históricos são rememorados pela

emissora e de que maneira são apresentados para o público na atualidade. Além disso, iremos

investigar quais narrativas são empregadas e quais aspectos são evidenciados pela emissora.

2. A Memória nos Discursos Jornalísticos

Pierre Nora (1999) já dizia que se nas sociedades tradicionais, baseadas na memória, o

ideal era ressuscitar o passado; na sociedade contemporânea o novo ideal é representá-lo.

Nesse sentido, pode-se dizer que a memória exerce papel fundamental na construção de

identidades. De acordo com o autor, existem lugares – espaços físicos ou não - onde as

pessoas, os grupos sociais ou até mesmo uma sociedade inteira podem ancorar suas memórias

4 Acessado em 08/08/2018. Disponível em http://memoriaglobo.globo.com/ .

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diante da aceleração do tempo. Nesse processo, os meios de comunicação exercem grande

influência na medida em que produzem acontecimentos históricos.

O jornalismo, em especial, produz ,diariamente, registros de fatos e com isso faz a

marcação do sentido histórico. Segundo Letícia Matheus (2010):

As marcas do tempo são especialmente sensíveis nos jornais, localizando o leitor

num “lugar” na duração. O consumo diário das narrativas jornalísticas fornece um

forte parâmetro espaço-temporal [...] (MATHEUS 2010, p.2-3).

Sendo assim, pode-se dizer que o jornalismo mantém relações claras com a história e

se caracteriza como uma importante ferramenta de compreensão e recuperação de lembranças,

bem como, de formação de identidades. De acordo com Berkowitiz (2011), a partir daquilo

que nos é mostrado, a memória consegue fazer associações que auxiliam na compreensão dos

acontecimentos presentes no seu contexto. Sendo assim, é por meio das narrativas

encontradas no jornalismo que, muitas vezes, é possível analisar, preservar e reconstruir

várias versões de passados. Para Santa Cruz (2016), as notícias são uma forma não-ficcional

de contar histórias e dependem intensamente de estratégias temporais.

Jornalistas sempre se apoiaram em temas relacionados com o tempo e em recursos

narrativos para manter a continuidade da história, o engajamento dos leitores e a

visibilidade da notícia. (...) Acontecimentos de longa duração se encaixam também

nesta perspectiva, com o tempo se deslocando para ser a questão mais relevante ou

sendo alçado à categoria de valor-notícia. Da celebração de aniversários a

retrospectivas de final de ano, passando por simples analogias verbais e visuais

conectando o passado e o presente, o jornalismo incorporou um endereçamento para

tempos anteriores, perceptível por meio de uma ampla mostra de suas convenções e

práticas (SANTA CRUZ, 2016 p. 37-38).

Marialva Barbosa (2004) endossa essa ideia ao afirmar que o jornalismo, ao selecionar

assuntos que devem ser lembrados em detrimento de outros, produz uma espécie de

classificação do mundo para o leitor a partir de critérios altamente subjetivos.

O jornal retém em sua estrutura assuntos que, em princípio, guardariam alguma

identificação com o leitor. Entretanto, como não se pode informar a totalidade, o

jornalismo seleciona e hierarquiza as informações tomando por base critérios

subjetivos. A própria distribuição das notícias em eixos centrais de análise, onde

informações em rubricas específicas produzem uma classificação permanente do

mundo social para o leitor, mostra esta tendência. (BARBOSA, 2004, p.2)

Nunca se produziu tanta informação quanto nos dias de hoje. Diante de novas

possibilidades de produção, distribuição e consumo de conteúdos, as instituições jornalísticas

estão buscando produzir materiais que sirvam de referência para a sociedade. Importante

destacar que o jornalismo constrói socialmente o presente, selecionando os fatos que serão

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noticiados e dando a eles determinadas angulações. Segundo Palácios (2010), grande parte da

sociedade se vê representada no jornalismo, uma vez que ele possui a função de transformar

o presente vivido em notícia, um presente que é, constantemente, atualizado e recuperado.

A partir dessa perspectiva, pode-se dizer que o jornalismo se configura como um

importante “lugar de memória”, como bem coloca Nora (1993). É por meio do jornalismo

que são registrados fatos, testemunhos e versões do mundo. Para Eliza Casadei (2012), sem

testemunho não há jornalismo. Isso se dá pelo fato de ser, justamente, o testemunho uma das

etapas que buscam garantir alguns preceitos da profissão, como a objetividade e a

credibilidade. Para Ricouer (2007) o ato de testemunhar tem valor, simplesmente, porque

acreditamos que uma pessoa é capaz de dizer a verdade. Assim, ele assume um caráter moral,

de comprometimento, se afirmando como um laço de sociabilidade. A partir dessa

“promessa” de dizer sempre a verdade é que é assegurado o vínculo social.

A partir dos rituais jornalísticos, dos critérios de noticiabilidade5, o jornalismo tenta

garantir que essa aproximação com o real se cumpra. Segundo Motta (2008), o narrador

jornalístico, narra como se o real estivesse sempre lá fora, apenas esperando para ser contado,

independente da posição de um observador ou de alguém para contar. Assim, o jornalística

atua como um narrador discreto.

O jornalista utiliza recursos de linguagens que buscam camuflar seu papel enquanto

narrador. Apagar sua mediação. É um narrador que nega até o limite a narração.

Finge não narrar, apaga a sua presença. Faz os fatos surgirem no horizonte como se

estivessem falando por si próprios. (MOTTA, 2008, p.38).

Pode-se dizer que mecanismos simples, que são utilizados nas narrativas, são

responsáveis por construir grandes campos de referencialidades, demarcando tempo e lugar,

construindo, então uma memória social.

Segundo Pollak (1992), um indivíduo para lembrar seu passado precisa se remeter às

lembranças dos outros, que se constituem como pontos de referência, onde estão fixados pela

sociedade. Para ele, as memórias são sempre enquadradas, a partir de perspectivas dos grupos,

e são o fruto de lutas hegemônicas dentro da sociedade. Sendo assim, ela possui um caráter

negocial e é feita de camadas de recordação e de esquecimento, com ambos os movimentos

contribuindo para a cristalização do que deve ser relembrado.

5 Podemos definir o conceito de noticiabilidade, como um conjunto de critérios e operações que fornecem a

aptidão de merecer um tratamento jornalístico, isto é, possuir valor como notícia. Assim, os critérios de

noticiabilidade, são o conjunto de valores- notícia que determinam se um acontecimento ou assunto é suscetível

de se tornar notícia, isto é, de ser julgado como merecedor, de ser transformado em matéria noticiada.

(TRAQUINA,, 2005, p.63)

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Segundo Halbwachs (2006), mesmo que pareça particular, a memória sempre remete a

um grupo, uma vez que o indivíduo carrega em si a lembrança, mas está sempre interagindo

na sociedade. “Nossas lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por outros,

ainda que se trate de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que

somente nós vimos” (HALBWACHS, 2006, p. 30).

Há uma relação direta entre a memória individual e coletiva.

para que a nossa memória se aproveite da memória dos outros, não basta que estes

nos apresentem seus testemunhos: também é preciso que ela não tenha deixado de

concordar com as memórias deles e que existam muitos pontos de contato entre uma

e outras para que a lembrança que nos fazem recordar venha a ser constituída sobre

uma base comum. (HALBWACHS, 2006, p. 39)

Para que uma lembrança seja reconhecida e reconstruída, os atores sociais precisam

buscar marcas de proximidade que os permitam continuar fazendo parte de um mesmo grupo,

dividindo as mesmas recordações. Segundo Bosi, o passado e o presente articulam-se através

das lembranças que podem ser condicionadas através das ações do cotidiano. Para a autora, o

instrumento socializador da lembrança é a linguagem.

Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar,

com imagens e ideias de hoje, as experiências do passado, a memória não é sonho, é

trabalho (...) A lembrança é uma imagem construída pelos materiais que estão,

agora, à nossa disposição, no conjunto de representações que povoam nossa

consciência atual (Bosi,1995,p. 55)

3. Webdocumentário : uma estratégia de rememoração no jornalismo

Em tempos de convergência midiática, o webdocumentário configura-se como uma

nova proposta narrativa. O gênero, ainda pouco utilizado no jornalismo, tem origem no

documentário tradicional, e tem sido utilizado por instituições jornalísticas para guardar e

veicular a memória de diferentes temporalidades.

Esse novo formato propõe uma construção mais interativa e busca oferecer novas

experiências para o leitor. São muitas as ferramentas utilizadas na construção de um webdoc,

dentre elas, pode-se citar: depoimentos, imagens paradas, imagens em movimento, sons,

mapas, câmeras subjetivas, textos, animações e hipertexto. Uma das características principais

que diferenciam o webdocumentário do documentário tradicional é a ausência de uma

sequência narrativa linear. Segundo Loureiro (2000), no webdocumentário a linearidade só é

rompida pela criação de uma bifurcação ou encruzilhada.

Ao pesquisar sobre a produção de webdocumentários, observa-se uma variedade de

nomes e especificações utilizadas por diferentes autores. Para Bauer (2011), o

webdocumentário é feito a partir de um único tema, em que os demais elementos narrativos se

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transformam em um complemento ao tema proposto. Assim, o vídeo seria o elemento

principal, sendo complementado por links de textos, áudios, gráficos e tabelas. Tudo isso

criaria uma espécie de narrativa com a característica principal da não linearidade e permitiria

a interação do internauta por meio de opções de navegação.

Ribas (2003) endossa essa ideia, ao dizer que a hipertextualidade, a interatividade e a

memória seriam características desse modelo de produção. Para ele, por meio do hipertexto, é

possível construir narrativas, fazendo associações entre dados e permitindo que o internauta

trace o caminho que for mais conveniente. Sendo assim, a estrutura narrativa apenas indica

trajetos, mas não determina uma ordem a ser seguida.

A construção das páginas através das micronarrativas organiza a informação de

maneira fragmentada, mas articulada dentro da totalidade do documentário,

oferecendo níveis de aprofundamento e integrando formatos distintos. Tanto

entrevistas em texto, como em áudio e vídeo, podem ser divididas por

assunto e reorganizadas, tendo em vista a fácil movimentação do usuário na

busca por informações. (RIBAS, 2003, p.7).

As múltiplas possibilidades que o ambiente online proporciona, permite que o

conteúdo seja trabalhado de várias maneiras. Assim, sem os limites de armazenamento de

informação, a memória aliada a instantaneidade e a interatividade é ainda mais potencializada.

Grecolin, Sacrini e Tomba (2002), destacam que o webdocumentário tende a ser um

produto totalmente diferenciado do documentário tradicional já que são necessárias

tecnologias multimídias para a sua confecção. Para Spinelli (2013) o termo webdocumentário

retrata o tratamento criativo de experiências documentárias na web, representadas por projetos

multimídias, interativos e não lineares que utilizam os recursos digitais e priorizam a

produção audiovisual documentária na sua constituição.

Para essa pesquisa, no entanto, vamos nos basear nas definições apresentada por Nash

(2012). A autora chama a atenção para o fato do webdocumentário apresentar algumas

semelhanças com o documentário tradicional, tais como: civismo democrático (fornece

informações para fomentar a participação dos cidadãos), investigação jornalística e

interrogação radical (questiona o status quo e apresenta alternativas). Segundo a autora o que

diferencia o webdocumentário são os padrões de organização textual. Sendo assim, três

estruturas são empregadas: a narrativa, a categórica e a colaborativa.

No webdocumentário do tipo narrativo, um ponto central de narração é determinado e

a história se desenvolve a partir dele. Não existe uma ordem cronológica a ser seguida. A

forma como os eventos estão estruturados e os enquadramentos utilizados deixarão em

evidência a ordem temporal. Já o modo categórico utiliza vários elementos como objetos,

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personagens, lugares e tópicos para organizar a estrutura da obra e dar sentido às

micronarrativas. No entanto, embora esses elementos tenham pontos em comum, não existe

uma relação narrativa direta entre eles. Ao contrário do formato anterior, não existe uma

hierarquia que organize a narrativa. Por último, o tipo colaborativo é estruturado a partir das

contribuições dos usuários. Embora Nash (2012) não apresente, de maneira ampla, os detalhes

sobre os tipos de participações existentes, ela identifica que é possível encontrar contribuições

de usuários fornecendo material para a obra, editando conteúdo ou integrando uma

comunidade em torno da obra.

Com relação a interatividade, esse artigo irá se basear nos conceitos desenvolvidos por

Alex Primo (2000). Para ele existe um sistema interativo e um reativo. O interativo é aquele

que dá total autonomia para o espectador. Por meio da interação mútua, cada agente, ativo e

criativo, influencia o comportamento do outro. Já o reativo oferece uma gama pré-

determinada de escolhas, sendo mais fechado, baseado apenas na ação e reação.

Pode-se dizer que sistemas interativos mútuos operam em modo virtual, pois

interfaceiam dois ou mais agentes inteligentes e criativos. Mesmo que hajam roteiros

rígidos pré-definidos, [...] nada pode garantir que sempre os mesmos estímulos

garantirão as mesmas respostas. [...] Já em um sistema informático reativo, baseado

na relação estímulo-resposta, e sendo um sistema fechado, cada estímulo é pensado

e programado por antecedência para que certas respostas sejam apresentadas..

(PRIMO, 2000, p. 88- 89).

Os conceitos desenvolvidos por Primo (2000) são fundamentais para compreendermos

o processo de construção de um webdocumentário.

4. Sobre o site Memória Globo

Idealizado pela historiadora Sílvia Fiuza, o site Memória Globo6 foi lançado em junho

de 2008 e apresenta tanto conteúdos audiovisuais, quanto textuais sobre programas,

coberturas e profissionais da emissora. Com uma equipe constituída por jornalistas,

historiadores e antropólogos, que utilizam a técnica da história oral para realizar entrevistas

com jornalistas, autores, atores, diretores, cinegrafistas, produtores, figurinistas, editores,

iluminadores, entre outros; conseguem traçar um panorama da história da Rede Globo e da

televisão no Brasil. A partir do material que é coletado, a emissora gera novos produtos, que

vão desde perfis dos entrevistados até livros e publicações. Inclusive, há livros que são

anteriores ao site e que estão ali citados.

6 Acessado em 4 de outubro de 2018. Disponível em: http://memoriaglobo.globo.com/

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Figura 1

Fonte: http://memoriaglobo.globo.com/

O site apresenta abas que permitem a navegação do internauta pela história da

empresa. A aba “Programas” , por exemplo, contém as linhas do tempo relacionadas ao

entretenimento, ao jornalismo e ao esporte. Já a aba “Perfil” apresenta os profissionais da

emissora. A aba “Mostras” contém os programas especiais produzidos pela Globo, como

“Você Decide 25 anos” e “Mais Você, 15 anos!”.

Há ainda a aba “Erros” que traz os equívocos que ocorreram em coberturas feitas pela

Rede Globo e assumidos pela emissora, com as respectivas explicações dos erros, em um

processo de mea culpa da emissora, diante de críticas que recebeu por tais coberturas. Além

disso, o site apresenta uma aba denominada “Acusações Falsas”, onde a emissora emite a sua

versão dos fatos, esclarecendo sobre cada uma das denúncias divulgadas.

A história da instituição pode ser encontrada nas abas: “Grupo Globo”, “Memória

Grupo Globo”, “Princípios Editoriais”, “Publicações”, “Quem somos” e “Fale Conosco”.

Em 2013, a plataforma passou por um processo de transformação a fim de melhorar a

exibição dos materiais disponibilizados e aumentar a interação com público. Nesse ano,

foram incluídos na aba“Vídeos” o que a emissora chama de webdocumentários ou

“Webdocs”.

Figura 2

Fonte: memoriaglobo.globo.com/videos

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5. Narrativas heroicas e a memória autorreferencial no webdoc “Abertura

Política – 1974-1985”.

Como já foi mencionado, o site Memória Globo possui uma seção denominada

“Vídeos”, na qual ele disponibiliza os webdocs divididos nas seguintes categorias: esporte,

entretenimento e jornalismo. Os conteúdos apresentados são relacionados a programas e

coberturas jornalísticas feitas pela emissora ao longo dos anos. Todos trazem depoimentos dos

profissionais que estiveram envolvidos com a produção desses materiais nas respectivas

épocas. O público pode acessar qualquer um deles, sem perder a lógica narrativa. Não existe

uma sequência a ser seguida, cada webdoc é independente do outro. Além disso, o tempo de

duração de cada um varia entre 2 minutos e 22 minutos.

Falando especificamente do webdoc escolhido para esse artigo, intitulado “Abertura

Política – 1974-1985”, observa-se que ele possui 11 minutos e 49 segundos. As reportagens

que foram produzidas durante esse período são mescladas aos comentários dos 12

profissionais convidados para relembrar os fatos históricos. São eles: Ricardo Pereira

(jornalista), Sérgio Motta Melo (jornalista), Toninho Drumond (jornalista), Álvaro Pereiro

(jornalista), Wilson Ibiapina (cinegrafista) , Ronan Soares (jornalista), Luiz Fernando Silva

Pinto (jornalista), Marilena Chiarelli (jornalista), Carlos Henrique de Almeida Santos

(jornalista), Pedro Rogério (jornalista), Armando Nogueira (jornalista) e Luiz Edgar de

Andrade (jornalista). Chama a atenção o fato de haver apenas uma mulher e um cinegrafista.

5.1 Análise do webdoc “Abertura Política – 1974- 1985”.

Para essa pesquisa utilizaremos a metodologia de análise do telejornalismo da autora

Itania Gomes (2011). Levando em consideração que o teor dos conteúdos disponibilizados na

plataforma do site Memória Globo advém da televisão iremos nos ancorar na proposta de

modos de endereçamento a partir dos operadores de análise. A autora propõe uma abordagem

a partir de quatro critérios: mediador, contexto comunicativo, pacto sobre o papel do

jornalismo e organização temática.

De acordo com Gomes (2011), todo programa jornalístico precisa contar com um

mediador como figura central, para construir a ligação entre o telespectador, os outros

jornalis­tas, que fazem o programa, e as fontes. Assim, para compreender os modos de

endereçamento, é fundamental analisar quem são os apresentadores, como eles se posicionam

diante das câmeras e, portanto, como se posicio­nam frente ao público.

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No webdoc “Abertura Política 1974-1985” não há um único mediador. Os próprios

profissionais atuam como testemunhas da história e como mediadores, dando um tom de

conversa ao vídeo. Apesar de não falarem diretamente com o público e de haver muitos cortes

nas falas, eles vão construindo uma narrativa baseada nas memórias autorreferenciais. Nota-

se também que a temporalidade muda o tempo todo, uma vez que eles vão mesclando várias

imagens de coberturas jornalísticas antigas, daquele período específico, com os depoimentos

dos profissionais de hoje.

Outro fator apontado por Gomes (2011) está relacionado ao contexto comunicativo.

Segundo a autora, um programa jornalístico sempre apresenta definições dos seus

participantes, dos objetivos e dos modos de se comunicar explicitamente e implicitamente

através das escolhas técnicas, do cenário e da postura do apresentador. No webdoc analisado,

a cobertura que a Globo fez é o grande destaque. Apesar de haver muitos cortes, as vozes dos

profissionais surgem para dar legitimidade às mensagens apresentadas. O cenário, por sua

vez, é bem simples, sendo composto apenas por um logotipo do site “Memória Globo” atrás

do jornalista entrevistado.

FIGURA 3

Fonte: memoriaglobo.globo.com/videos

Levando em consideração a classificação desenvolvida por Nash (2012), pode-se

dizer que o webdoc analisado está na categoria narrativa, uma vez que possui um ponto

central de narração, no caso, a “Abertura Política”, e vai se desenvolvendo a partir dele. Além

disso, a forma como os eventos são estruturados e os enquadramentos utilizados acabam

ditando a ordem temporal a ser seguida. A cada momento é mostrada uma fase da história e os

depoimentos correspondentes a cada episódio. Contudo é preciso dizer que, por se tratar de

um webdocumentário, ele possui poucas características relativas à interação. Não há outras

opções de percursos para o usuário seguir na narrativa, faltam hiperlinks, ícones e espaços

para comentários.

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A questão do pacto sobre o papel do jornalismo é outro aspecto apontado por Gomes

(2011). A relação entre programa e teles­pectador é regulada por uma série de acordos. Por

isso, para compreensão desse pacto é fundamental analisar como o programa atualiza as

premis­sas que constituem o jornalismo como instituição social. No webdoc analisado

percebe-se que a todo instante a emissora tenta reforçar a ideia de imparcialidade, de

responsabilidade social, de pioneirismo e de objetividade ao longo dos anos. Por meio desses

critérios, ela tenta se autoafirmar e reforçar seu papel enquanto empresa de comunicação.

Por último, Gomes (2011) coloca a organização temática como o operador de maior

importância para a análise dos modos de endereçamento. De acordo com ela, é essencial

verificar como a temática é abordada e como se articula aos outros operadores de aná­lise. No

webdoc pesquisado, nota-se que as reportagens da época, selecionadas pela emissora, são

utilizadas como pano de fundo para enaltecer a cobertura feita pela Rede Globo durante o

período. Há um destaque muito maior para o jornalismo feito pela emissora, do que para os

fatos em si. Logo nos primeiros minutos a questão da censura é abordada nos discursos dos

jornalistas. Eles chamam a atenção para o fato de que na época haviam poucas coberturas

políticas e que tudo tinha que ser dito e feito de forma cuidadosa. “Quando começou a cobrir

Brasília basicamente não existia matéria política. Era o máximo da ditadura fechada!”, relata

o jornalista, Ricardo Pereira7.

O poder que a Rede Globo exercia é apontado como um agravante a mais para a

repressão. “Quanto mais poder, quanto mais popular era a Globo maior era a pressão”,

comenta o jornalista, Ronan Soares8. Essa censura também é relatada nas coberturas

internacionais.

Nós começamos a cobrir o exterior com objetivo interno. Então as belas reportagens

que fazíamos, como „Eleições dos Estados Unidos‟, era o processo democrático;

„Revolução dos cravos‟, era rebelião contra a ditadura. Nós sabíamos que tudo isso,

o alvo principal era a adesão, a conscientização da população brasileira sobre a

abertura política.9

7 Acessado em 12/07/2018. Disponível em:

http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm

8 Acessado em 12/07/2018. Disponível em:

http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm

9 Trecho de depoimento de Ronan Soares no webdoc “Abertura Política - 1964 - 1975”, disponível em

http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm

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O processo de anistia também é relatado nos depoimentos. “A Globo entrou nessa

cobertura e era tolerada pelo regime militar, pois seria um contrassenso o regime anistiar e

ficar tolhendo a opinião”, comenta o jornalista Álvaro Pereira, no mesmo webdoc.

Apesar dos profissionais relatarem essa questão da censura contra a emissora e

também sobre essas estratégias de combate à repressão, é importante lembrar que a Globo

apoiou o golpe militar. Isso foi reconhecido e publicado no próprio site do jornal “O Globo”10

em 31/08/2013 por meio de um editorial, intitulado “Apoio editorial ao golpe de 64 foi um

erro”, na qual as Organizações Globo fazem uma meia culpa. Nesta seção intitulada “Erros”

há uma meia culpa sobre outras coberturas, como das “Diretas Já” e posteriormente, já no

período inicial da redemocratização, sobre o “Debate Lula x Collor”.

O pioneirismo é outro ponto evidenciado nos testemunhos. A reportagem da morte do

ex-presidente Jucelino Kubitschek, por exemplo, é apontada como uma das maiores

coberturas já feitas pela emissora. Além disso, a entrevista do General Ernesto Geisel a um

repórter da TV Globo no exterior é mostrada como um furo de reportagem para a época.

De repente aparece um repórter da Rede Globo entrevistando um presidente da

República, num regime militar e com direito de fazer perguntas. Olha que coisa

inovadora! Era a primeira vez que ele falava da intenção dele em conduzir a

abertura.11

Essa ideia da emissora, enquanto precursora das coberturas políticas, também é

evidenciada na fala do jornalista Carlos Henrique de Almeida Santos12

, no mesmo webdoc.

“Isso foi quase um marco. Uma mudança de atitude, uma relação mais fluente que até então

não havia entre o presidente e a mídia”.

As rotinas de produção e o trabalho diário no Congresso Nacional também são pontos

ressaltados pelo jornalista, que aponta novamente um pioneirismo da emissora. , “começamos

a nos capacitar para fazer isso. Para levar essa perspectiva a um conjunto da opinião pública

da sociedade brasileira. Porque sem o engajamento, sem o mínimo de crença e adesão da

sociedade, esse processo tendia a naufragar”.

10

Acessado em 17/07/2018. Disponível em

https://oglobo.globo.com/brasil/apoio-editorial-ao-golpe-de-64-foi-um-erro-9771604

11

Trecho de depoimento do jornalista Álvaro Pereira no webdoc “Abertura Política - 1964 - 1975”, disponível

em http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm 12

Acessado em 12/07/2018. Disponível em

http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm .

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A ideia de compromisso social aparece o tempo todo, mesmo que de forma implícita,

nos discursos dos profissionais que tentam transmitir essa ideia sobre a importância da Rede

Globo nesse processo de redemocratização do país. Isso fica bem claro no depoimento do

jornalista, Pedro Rogério13

: “ a rede Globo realizou nesse período um trabalho fundamental

para a preservação daquilo que havíamos avançados em termos democráticos”. Percebe-se

que o tempo todo a emissora tenta salientar esses valores jornalísticos.

6. Considerações Finais

A partir da análise do webdoc “Abertura Política – 1974- 1985” é possível perceber

que, a todo instante, a Globo tenta construir uma memória que privilegia muito mais a

atuação dela, durante as coberturas jornalísticas, do que dos fatos jornalísticos em si.

A partir de critérios próprios, a emissora elencou as matérias e os assuntos que

deveriam ser lembrados. Porém, tudo foi mostrado de forma muito superficial e rápida. O

processo de abertura política que durou 11 anos é compactado em um vídeo de 11 minutos e

49 segundos, repleto de cortes secos. As falas dos profissionais envolvidos nas produções

daquele período ganharam muito mais destaque.

O testemunho e a memória autorreferencial parecem ser a grande aposta da emissora,

que buscou, através dos depoimentos, expor as dificuldades, as fragilidades e as estratégias

utilizadas durante aquele período de cobertura política da história do Brasil. A abordagem

utilizada nas narrativas se ateve mais em elencar e enfatizar a excelência dos profissionais

que ali trabalharam, do que mostrar a situação do país naquela época. O pioneirismo, o

heroísmo, o compromisso com o social e a imparcialidade foram os aspectos mais ressaltados

nos depoimentos.

Outra questão observada está relacionada ao formato do material que eles

apresentaram como webdocumentário. O conteúdo produzido não apresenta características de

interação para que ele seja, de fato, considerado um webdocumentário. Trata-se, portanto, de

um conteúdo documental na web, mas sem a interatividade prevista pelos teóricos.

Por fim, pode-se dizer que o site “Memória Globo” funciona muito mais do que um

simples repositório de lembranças, uma vez que busca produzir conteúdos novos a partir de

materiais antigos, conferindo assim, novos significados aquilo que é contado. Nesse jogo de

temporalidades, ela determina o que deve ser memorável e redefine o novo. Assim, entre

13

Acessado em 12/07/2018. Disponível em

http://memoriaglobo.globo.com/videos/idvideo/2122642/title/webdoc-jornalismo-abertura-politica-1974-

1985.htm .

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lembranças e esquecimentos, a emissora busca criar um espaço de memória, construindo não

apenas sua própria identidade , mas também, uma memória coletiva.

Referências

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TRAQUINA, Nelson. Teorias do Jornalismo. Florianópolis. Insular. Ed.2. 2008: A tribo jornalística

– uma comunidade interpretativa transnacional.