UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE ARTES
CLAUDIA ROBERTA BORTOLETTO
JOHANN JOACHIM QUANTZ E A ARTE DE ORNAMENTAR: O ARIOSO E MESTO
DO CONCERTO PARA FLAUTA E ORQUESTRA EM SOL MAIOR (QV 5: 174),
ORNAMENTADO COM BASE NO VERSUCH EINER ANWEISUNG DIE FLÖTE
TRAVERSIERE ZU SPIELEN.
CAMPINAS
2015
CLAUDIA ROBERTA BORTOLETTO
JOHANN JOACHIM QUANTZ E A ARTE DE ORNAMENTAR: O ARIOSO E MESTO
DO CONCERTO PARA FLAUTA E ORQUESTRA EM SOL MAIOR (QV 5: 174),
ORNAMENTADO COM BASE NO VERSUCH EINER ANWEISUNG DIE FLÖTE
TRAVERSIERE ZU SPIELEN.
Dissertação apresentada ao Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Mestra em Música, na Área de Concentração Música: Teoria, Criação e Prática.
ORIENTADORA: PROFA. DRA. HELENA JANK
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO DEFENDIDA PELA ALUNA CLAUDIA ROBERTA BORTOLETTO, E ORIENTADA PELO PROFA. DRA. HELENA JANK.
CAMPINAS
2015
FICHA CATALOGRÁFICA
Aos meus pais e irmãos, cujo
apoio incondicional foi
essencial para a minha carreira
como musicista.
AGRADECIMENTOS
A Deus, em primeiro lugar, por ter me proporcionado alegria, força e
disciplina para a conclusão desta dissertação.
À querida Profa. Dra. Helena Jank, minha orientadora e uma das grandes
incentivadoras da minha carreira acadêmica, por todos os ensinamentos, carinho,
apoio, confiança e oportunidade de trabalhar ao seu lado.
À Livia Lanfranchi, por me ajudar a descobrir o prazer na interpretação do
repertório barroco.
Aos Profs. Drs. Esdras Rodrigues, Hermes Coelho e Áurea Ambiel, pelo
incentivo, disponibilidade e conselhos valiosos durante o exame de qualificação.
Aos Profs. Drs. Esdras Rodrigues, Hermes Coelho, Emerson De Biaggi e
Lucia Carpena, pela disposição em participar da banca de defesa.
À Aci Taveira Meyer, por ter me acolhido em sua casa durante quase todo
o período de graduação e mestrado. Pelo exemplo de força, amizade e altruísmo.
Aos meus pais João Carlos Bortoletto e Nilva Aparecida da Silva
Bortoletto, pelo carinho e apoio incondicional aos meus estudos.
Aos meus irmãos João Carlos Bortoletto Júnior e Antonio Carlos
Bortoletto, grandes amigos e modelos de excelência nos estudos e profissão.
Ao meu amado esposo Rodrigo da Silva Rodrigues Lermes, pela revisão
das traduções, confiança, presença constante e pelo apoio durante toda a
elaboração da pesquisa.
À querida amiga Guilhermina Maria Lopes de Carvalho, pela revisão das
traduções, sendo grande companheira de pesquisa e da vida.
Aos amigos Pedro Estevão Quental e Wesley Moraes, pelo
comprometimento e participação no recital de mestrado.
À Daniela Becker Carpena, pela revisão das traduções.
A todos os funcionários da secretaria de pós-graduação em Música da
Unicamp, em especial à Letícia Machado, pela prontidão e auxílio nos momentos de
avaliações e processos burocráticos.
CAMBIO DE ACTITUD
MIGUEL ÁNGEL VILLANUEVA
RESUMO
Objetivamos com este trabalho o estudo da prática da ornamentação para
movimentos lentos em obras do período barroco. Tal estudo foi norteado pelas
propostas de ornamentação (italiana e francesa) especificadas no Tratado Versuch
einer Anweisung die Flöte traversiere zu spielen, escrito pelo compositor e flautista
Johann Joachim Quantz (1697-1773) e publicado no ano de 1752. A peça escolhida
para a elaboração dos ornamentos foi o segundo movimento (Arioso e Mesto) do
concerto em Sol maior para flauta, dois violinos, viola e baixo contínuo (QV 5:174) do
próprio Quantz. Além dos ornamentos, outros elementos foram constantemente
observados durante a pesquisa de edições e no processo de interpretação do Arioso
e Mesto. São eles: tessitura, dinâmica e articulação. Por meio da revisão destes
elementos, conseguimos obter ferramentas para o aprofundamento teórico,
necessário a uma boa interpretação do repertório barroco. Adicionalmente,
almejamos oferecer uma discussão dinâmica aos intérpretes da música barroca que
tocam instrumentos antigos e/ou modernos, em ambos os casos, visando uma
interpretação historicamente informada.
Palavras-chave: Ornamentação. Quantz. Flauta. Concerto.
ABSTRACT
It is the aim of this work the study of the practice of ornamentation in the slow
movements of baroque compositions. This study was based on proposals of Italian
and French ornamentation, as specified in the Versuch einer Anweisung die Flöte
traversiere zu spielen treatise, written by the German composer and flautist Johann
Joachim Quantz (1697-1773), published in 1752. As example we present an
ornamentation proposal for the second movement Arioso e Mesto of the G major
concerto for flute, two violins and continuo (QV 5: 174) by the aforementioned
author. Besides ornaments, other pertinent elements are also observed during the
research and interpretation process of the Arioso e Mesto, namely: range, dynamics
and articulation. We believe that revision of these elements can provide the
necessary theoretical knowledge for a historically informed performance by
interpreters of baroque music, whether they use early or modern instruments.
Keywords: Ornamentation. Quantz. Flute. Concerto.
ÍNDICE DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Símbolos para o Trinado ..................................................................................... 15
Figura 2: Consort de Flautas ............................................................................................ 26
Figura 3: Consort de Flautas ............................................................................................ 26
Figura 4: Flautas com a chave de Ré# ................................................................................ 27
Figura 5: Corps de Réchange ........................................................................................... 29
Figura 6: Corps de Réchange .......................................................................................... 30
Figura 7: Semitons ......................................................................................................... 31
Figura 8: Tuning Slide e Sistema de Rolha .......................................................................... 32
Figura 9: Capa do tratado de Quantz .................................................................................. 36
Figura 10: Erros descritos por Quantz ................................................................................. 37
Figura 11: Principium Musicum ......................................................................................... 38
Figura 12: Executio anima compositionis ............................................................................. 38
Figura 13: Proporção dos 6 temas gerais do Versuch de Quantz .............................................. 54
Figura 14: Ritmos trocaicos .............................................................................................. 72
Figura 15: Tabela XVII .................................................................................................... 73
Figura 16: Tabela XVII .................................................................................................... 74
Figura 17: Uníssono ....................................................................................................... 88
Figura 18: Intervalo de Segunda ........................................................................................ 89
Figura 19: Intervalo de Terça ............................................................................................ 90
Figura 20: Intervalo de Quarta .......................................................................................... 91
Figura 21: Intervalo de Quinta ........................................................................................... 92
Figura 22: Intervalo de Sexta ............................................................................................ 93
Figura 23: Intervalo de Sétima .......................................................................................... 94
Figura 24: Mais alguns intervalos....................................................................................... 95
Figura 25: Arioso e Mesto ornamentado pela autora .............................................................. 99
Figura 26: Cadência ..................................................................................................... 101
Figura 27: Edição de Horst Augsbach ............................................................................... 120
Figura 28: Edição Wilhelm Barge ..................................................................................... 126
Figura 29: Manuscrito de Dresden ................................................................................... 128
Figura 30: Fonte A ........................................................................................................ 130
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1: Título, Dedicatória, Prefácio, Introdução ................................................................ 48
Tabela 2: Capítulos ........................................................................................................ 49
Tabela 3: Referências sobre os estilos italiano e francês no tratado de Quantz ........................... 58
Tabela 4: Os ornamentos segundo Quantz .......................................................................... 59
Tabela 5: Catálogo dos Concertos de Quantz por Augsbach ................................................... 78
Tabela 6: Movimento harmônico resumido ......................................................................... 105
Tabela 7: Ornamentos ................................................................................................... 112
Tabela 8: Fonte A e Manuscrito ....................................................................................... 131
Tabela 9: Fonte A e Augsbach ........................................................................................ 131
Tabela 10: Fonte A e Barge ............................................................................................ 133
Tabela 11: Manuscrito e Augsbach .................................................................................. 134
Tabela 12: Manuscrito e Barge........................................................................................ 135
Tabela 13: Augsbach e Barge ......................................................................................... 136
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ........................................................................................................ 9
1. Os estilos nacionais e a ornamentação no barroco tardio ........................................ 9
1.1. Os ornamentos de acordo com: Tartini, Carl Philipp Emanuel Bach e Leopold Mozart.
............................................................................................................... 18
CAPÍTULO 2 ...................................................................................................... 23
2. Johann Joachim Quantz: Biografia ................................................................... 23
2.1. A flauta de Quantz ...................................................................................... 25
CAPÍTULO 3 ...................................................................................................... 34
3. O tratado Versuch einer Anweisung die Flöte traversiere zu spielen: repercussão e
influência ................................................................................................... 34
3.1. Características Gerais do tratado de Quantz .................................................... 43
3.2. A arte de ornamentar segundo Quantz ........................................................... 55
3.2.1. A arte de ornamentar o Adagio ................................................................... 66
CAPÍTULO 4 ...................................................................................................... 77
4. Concerto em Sol maior para flauta transversal, violinos 1 e 2, viola e baixo contínuo QV
5:174 ........................................................................................................ 77
4.1 O Arioso e Mesto: edições ............................................................................ 84
4.2 O Arioso e Mesto: ornamentação ................................................................... 87
CONCLUSÃO .................................................................................................. 102
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 107
ANEXOS ......................................................................................................... 111
Anexo I: Ornamentos ...................................................................................... 112
Anexo II: Partituras ......................................................................................... 120
Anexo III: Edições comparadas ......................................................................... 131
Anexo IV: Originais dos textos de Quantz ............................................................ 137
Anexo V: Link para a audição do Arioso e Mesto: Recital de Mestrado ...................... 141
1
INTRODUÇÃO
O período barroco é caracterizado por grandes transformações em
relação à prática musical. Podemos destacar: a consolidação do sistema tonal; o
florescimento de gêneros musicais tais como a ópera, o oratório, a cantata, a fuga, a
suíte, a sonata e o concerto; o crescimento e desenvolvimento da orquestra
(BENNETT, 1986, p. 35). Além disso, foi importante a influência da classe burguesa
para a propagação musical na Europa, como ressaltam Jean e Brigitte Massin:
O crescimento do público burguês amante da música no século XVIII teve uma consequência importante para a vida musical: multiplicaram-se as apresentações públicas de música, asseguradas pelos diversos concerts (sociedades de concerto ou academias). Na França, academias organizadas como sociedades de concerto, sobretudo de amadores, mas com a participação cada vez maior de profissionais, existiram desde a primeira metade do século, em Paris, Marselha, Bordeaux, Nîmes, Lyon, Lille e noutros pontos. [...]. (MASSIN, J; MASSIN, B, 1997, p. 417).
Neste período, a ornamentação e a improvisação eram recursos
interpretativos amplamente conhecidos pelos músicos. De acordo com Harnoncourt
(1993, p 36), os instrumentos eram divididos em dois grupos: instrumentos
fundamentais (cravo, virginal, órgão, harpa, alaúde, dentre outros) e instrumentos
ornamentais (de arco, sopros, harpa e alaúde quando usados melodicamente). Aos
primeiros, cabia a execução do baixo contínuo, sendo que todo desenvolvimento
harmônico era improvisado. Sobre os segundos, Harnoncourt afirma:
O papel dos instrumentos ornamentais é atualmente motivo de controvérsia. Alguns testemunhos do século XVII indicam que o nível de instrução dos músicos profissionais era tão elevado que se lhes podia confiar completamente a improvisação de movimentos polifônicos (sem dúvida com imitações simples e uma harmonia sem complicações, com pequenos erros sendo tolerados). Em todo caso, os esboços e partituras, juntamente com eventuais gestos do maestro al cembalo eram suficientes para que as pequenas orquestras de ópera tocassem de maneira ordenada. (HARNONCOURT, 1993, p. 37).
Somado a isso, alguns autores como Laura Rónai, Thurston Dart e Hans
Martin Linde apontam em seus escritos a recorrente prática da ornamentação e
improvisação na interpretação da música barroca: Dart (2000, p. 104) destaca que
no adagio típico italiano, esperava-se que o intérprete improvisasse com bastante
2
liberdade; Linde (1979, p. 5) ressalta que a maioria dos compositores do período
barroco esperava que o intérprete ornamentasse sua obra; Rónai (2008, p. 238)
afirma que no século XVIII, improvisar fazia parte da rotina de qualquer músico e a
ornamentação dava vida às composições. Johann Joachim Quantz, Leopold Mozart,
C.P.E. Bach e Giuseppe Tartini dedicam grande atenção à ornamentação,
apontando em seus tratados publicados no decorrer do século XVIII, as principais
características que envolvem a ornamentação e improvisação de uma obra musical.
Como interpretamos hoje a música barroca? Os bons músicos dos
séculos XVII e XVIII dominavam as regras de composição e improvisação, o que
fazia com que a forma final de uma obra se definisse sempre durante a sua
execução (HARNONCOURT, 1993, p. 13). Porém, com a consolidação da classe
burguesa e a formação dos conservatórios de música por influência desta classe, a
improvisação foi saindo de cena e o foco voltava-se cada vez mais para o ensino
nos conservatórios, ou seja, excelência na leitura e técnica do instrumento. De
acordo com Rónai (2008, p. 235) “[...]. A ornamentação improvisada, que depende
da orientação direta de um mestre, deixa de ser assunto prioritário”. Ainda segundo
esta autora:
[...] o músico do século XIX só parece um improvisador razoável se comparado ao do século seguinte, e suas habilidades empalidecem ao serem confrontadas com as do músico barroco. Enquanto no século XVIII todos os compositores eram intérpretes e virtualmente todos os intérpretes sabiam compor (até mesmo sua Majestade, Frederico II, o Grande, da Prússia!), os intérpretes de música clássica do século seguinte se tornaram altamente especializados. Eram instrumentistas que estudavam horas por dia, num esforço hercúleo para dominar textos compostos por outros músicos. A técnica era cultuada acima de outras qualidades, e apesar de serem altamente capazes de reproduzir peças com perfeição, não tinham mais qualquer treinamento ou estudo que capacitasse a inventar seu próprio repertório! Felizmente o nosso século está presenciando um resgate da arte de ornamentar e improvisar, não apenas nos campos da música popular e folclórica como também no âmbito da chamada música de concerto. (RÓNAI, 2008, p. 239 - 240).
O estudo de tratados, livros, gravações, notações, manuscritos, dentre
outros, torna-se de extrema importância para o resgate da prática musical barroca.
Laura Rónai ressalta:
3
[...] os métodos e compêndios do Barroco que sobreviveram até os nossos dias são mais do que curiosidades históricas, empoeirados volumes de reduzido valor acadêmico. Devem ser vistos, isso sim, como ferramentas de primordial utilidade para o intérprete consciencioso, que gostaria de aproximar ao máximo de uma interpretação viva e autêntica, tão fiel quanto possível às intenções do compositor. (RÓNAI, 2008, p. 209).
Consideramos adequado tomar como principal base teórica para a nossa
pesquisa o tratado Versuch einer Anweisung die Flöte traversiere zu spielen (1752),
uma das mais importantes obras do século XVIII. No prefácio, o autor Johann
Joachim Quantz (1697-1773) deixa claro que as regras ali descritas por ele não se
destinam somente aos flautistas, mas também a cantores e instrumentistas em
geral, ou simplesmente a todos aqueles que desejam cultivar uma boa interpretação
musical.
É relevante destacar que, em relação à interpretação da música barroca,
devemos expressar nossas conclusões em termos da nossa própria era, pois não
vivemos no século XVIII ou XV (DART, 1990, p. 7). Por isso, o uso de instrumentos
modernos, não excluindo a importância e relevância dos antigos em nossa época,
pode oferecer uma nova visão quanto à performance musical barroca, refletindo
assim a interação da prática e teoria do passado com o que temos na atualidade.
Isso inclui os instrumentos que tiveram um desenvolvimento ou adaptação posterior
ao século XVIII e que estão ainda sujeitos a mudanças em sua constituição no
tempo presente. Dart ainda acrescenta:
A interpretação deve ser idiomática e ter estilo, não importa que sonoridades empregue. Cada instrumento e cada versão da obra vai exibir uma faceta diferente da música para o ouvinte, e o executante deve ter o cuidado de iluminar essas facetas de modo brilhante e seguro. As execuções devem ser idiomáticas: cada instrumento deve ser verdadeiro em si mesmo e não deve tentar arremedar os outros. (DART, 1990, p. 212).
Neste trabalho, visamos auxiliar intérpretes da música barroca que tocam
instrumentos modernos, porém, se preocupam com a interpretação historicamente
informada. Apresentamos uma possibilidade de ornamentação no Arioso e Mesto do
concerto1 em Sol maior para flauta, violinos 1 e 2, viola e baixo contínuo (QV 5:174)
1 Dentre os concertos para flauta de Quantz, este é o mais conhecido. BONNEMA, Feike. Listen to
Quantz music. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/youtube-test>. Acesso em: 5 jun. 2015.
4
de Quantz. De acordo com este autor em seu tratado, Capítulo XIV, tópico 1, um
músico pode distinguir-se de outros, demostrando disciplina e domínio técnico,
através da execução de um movimento lento. Quantz afirma também que as regras
para a ornamentação descritas por ele servirão principalmente para o Adagio, já que,
por se tratar de um movimento lento, há mais tempo para a aplicação dos
ornamentos e variações.
Sobre a organização desta dissertação, dividimos o trabalho em 4
capítulos:
Capítulo 1
Neste capítulo discorremos sobre três estilos nacionais de composição e
interpretação da música (Século XVIII) que tiveram importância para o
desenvolvimento da ornamentação e improvisação. São eles: italiano, francês e o
galante. Vale ressaltar que delineamos o século XVIII para o estudo destes estilos,
por se tratar de um período representativo em relação à bibliografia sobre
ornamentação, por exemplo, o tratado para flauta de Quantz. Segundo Laura Rónai
(2008, p. 210) os compositores barrocos franceses tinham por hábito escrever todos
os ornamentos que julgavam necessários à interpretação de suas obras, já, os
italianos, deixavam ao intérprete a função de acrescentar os ornamentos a suas
composições. O estilo galante foi muito cultivado na Alemanha e alguns autores são
considerados representantes, tais como: Johann Joachim Quantz, C. P. E. Bach,
Leopold Mozart e Marpurg (DART, 2000, p. 116).
A ornamentação não era um recurso interpretativo unicamente utilizado
nos países França e Itália. Linde (1979, p. 5) destaca que na Inglaterra, havia forte
influência do estilo francês e na Alemanha, a influência era de ambos estilos (italiano
e francês). Compositores franceses também compunham música italiana e vice-
versa, ou seja, havia contatos e influências mútuas entre os compositores
pertencentes a tais estilos: ornamentos poderiam ser introduzidos em uma
composição francesa (improvisados) e nem toda peça em estilo italiano deveria ser
necessariamente ornamentada.
5
Recomendamos também para a compreensão do processo de
ornamentação as seguintes obras: Leopold Mozart, Versuch einer gründlichen
Violinschule (1756); Carl Philipp Emanuel Bach, Versuch über die wahre Art das
Clavier zu spielen (Parte I - 1753/ Parte II - 1762); Giuseppe Tartini, Traité des
Agrémens de la Musique (1771), publicados no mesmo período que o Versuch de
Quantz. Susan Murphree Wallace afirma,
A maioria dos professores de instrumentos da época ensinava a ornamentação à maneira francesa, que seguia as instruções específicas do compositor. O Traité des Agrémens (Tratado da Ornamentação), contribuição de Tartini, era um manual de instruções para o estilo italiano. Esta obra foi altamente ofuscada pelo trabalho mais compreensível de Johann Joachim Quantz, e recebeu, comparativamente, pouca atenção tanto na história do violino como na história da ornamentação. Leopold Mozart (1756), Francesco Geminiani (1749) e Carl Philip Emanuel Bach (1753, 1762) também deixaram tratados que dedicaram muita atenção aos ornamentos e que realçaram a sua expressiva significância. (WALLACE, 2003, p. 33, tradução nossa)
2.
Para a apresentação e organização de alguns dos ornamentos discutidos
por estes autores em seus tratados, decidimos pela produção de tabelas. Desta
maneira, o conteúdo estaria mais claro para consulta e aplicação dos ornamentos:
apojatura, trinado, mordente, grupeto, tremolo, vibrato, battements, cadência.
Vale ressaltar que a produção de todas as tabelas ao longo desta
dissertação tem como objetivo: a praticidade e facilidade para consulta e aplicação
do material.
2 Most of the instrumental tutors of the period taught ornamentation in the French manner, which
followed the composer’s specific instructions. Tartini’s contribution, the Traité des Agrémens (Treatise on Ornamentation) was an instruction manual for the Italian style. This work has been largely overshadowed by the more comprehensive work of Johann Joachim Quantz, and has received comparatively little attention, either in the histories of the violin or in histories of ornamentation. Leopold Mozart (1756), Francesco Geminiani (1749) and Carl Philip Emanuel Bach (1753, 1762) also left behind treatises that devoted a great deal of attention to ornaments and stressed their expressive significance.
6
Capítulo 2
Discorremos sobre a biografia de Quantz e sua importância e contribuição
para a história da flauta (desenvolvimento e luteria). Quantz inicia seu aprendizado
musical ainda quando criança, através do tio Justus Quantz e de seu tutor (logo
após a morte do tio) Adolf Fleischhack. Apesar de ter aprendido vários instrumentos,
como violino, trompete, violoncelo, dentre outros, a dedicação maior de Quantz foi
para a flauta transversal. De 1741 até o fim de sua vida (1773), trabalhou na Corte
de Frederico II, rei da Prússia, sendo que suas atribuições nesta Corte incluíam o
dever de dar aulas de flauta para o rei, reger orquestras, participar de concertos e
também de compor novas peças.
Apresentamos as transformações e inovações realizadas na flauta
transversal por Quantz. Por exemplo: acréscimo da segunda chave no instrumento;
utilização do tuning slide e do sistema de rolha no bocal da flauta. Além disso, em
1739, Quantz passa a fabricar flautas e nos indica no Capítulo 1 de seu tratado as
madeiras utilizadas para a fabricação e meios de manutenção do instrumento.
Capítulo 3
Ressaltamos a importância do tratado de Quantz para a interpretação de
obras do período barroco, além de sua repercussão e influência na Europa do
século XVIII. Seu tratado foi traduzido e publicado em diversos idiomas, por
exemplo: o francês, o italiano, o inglês e o holandês. Autores como Friedrich Wilhelm
Marpurg (1718-1795), Johann Samuel Petri (1738-1808), Johann Friedrich Agricola
(1720-1774), lançaram mão do Versuch de Quantz para a elaboração de seus
trabalhos teóricos.
Construímos as Tabelas 1 e 2 com as principais características do
Versuch, percebendo assim a relevância do tratado não só no aspecto interpretativo,
mas também no aspecto técnico em ralação à flauta transversal (embocadura,
articulação, postura, som, respiração). O tratado está dividido da seguinte maneira:
Título, Dedicatória, Prefácio, Introdução (onde a numeração começa), 18 Capítulos,
7
Índice Remissivo. Na tradução em espanhol de Rodolfo Murillo e na tradução em
inglês de Edward Reilly, os exemplos musicais são mantidos juntos aos capítulos.
Na versão em alemão, tais exemplos são colocados no final do tratado.
Na Tabela 4, elencamos alguns dos ornamentos descritos por Quantz no
Versuch e indicamos os capítulos em que explica tais ornamentos. Por exemplo:
apojatura (Capítulos VI, VIII, XI, XIII), trinado (Capítulos, VIII, IX, XI), battement
(Capítulos VIII, XI e XII), grupeto (Capítulos VIII e XI), mordente (Capítulos VIII e XI),
cadência (Capítulo XV), flattement (Capítulo XIV).
Introduzimos como Quantz nos orienta a ornamentar um Adagio. No
Capítulo XIV, tópico 2 de seu tratado, o autor afirma que existem duas maneiras de
ornamentar este movimento: francesa e italiana. Para a ornamentação francesa,
precisamos reconhecer e interpretar corretamente os ornamentos essenciais
(apojaturas, trinados, mordente, grupeto, dentre outros). Para a ornamentação
italiana, devemos ir além dos ornamentos essenciais, e para isso, o conhecimento
de harmonia torna-se indispensável. Vimos também a importância dos ornamentos,
da dinâmica e do ritmo para uma boa interpretação de um movimento lento.
Capítulo 4
Apresentamos o concerto em Sol maior para flauta, violinos 1 e 2, viola e
baixo contínuo (QV 5:174) de Quantz. Foi composto por volta de 1745 e contém três
movimentos: Allegro assai; Arioso e Mesto; Presto. Horst Augsbach catalogou as
obras de Quantz em 7 grupos e decidimos por utilizar sua catalogação para
especificar o concerto em Sol maior como QV 5:174. Os grupos estão divididos
desta maneira: (1) sonatas solo para flauta e baixo contínuo; (2) trio sonatas; (3)
solos, duos e trios para flauta sem o baixo contínuo; (4) concertos para flauta, dois
violinos e baixo contínuo; (5) concertos para flauta, dois violinos, viola e baixo
contínuo; (6) concertos com vários solistas; (7) obras vocais.
Pensando na importância do estudo de tratados, livros, gravações, dentre
outros, para a construção da prática musical barroca (como anteriormente
8
mencionado), decidimos por pesquisar edições do concerto em Sol maior de Quantz.
Encontramos muitas edições, no entanto, lançamos mão de apenas 4.
A primeira, do autor Horst Augsbach, é da editora Breitkopf & Härtel,
editora renomada. O fato de ser Urtext nos trouxe segurança quanto à reprodução
do texto de Quantz. A segunda, do autor Wilhelm Barge, também é da editora
Breitkopf & Härtel, sendo que nesta partitura, encontramos muitas ligaduras e notas
escritas uma oitava acima, se comparadas com as dos manuscritos estudados. Com
esta edição, percebemos diferenças e semelhanças com a escrita do século XVIII. A
terceira e a quarta versão são manuscritos da obra, e podem ser encontradas na
Biblioteca de Berlim (Staatsbibliothek zu Berlin - Preußischer Kulturbesitz) e na da
Universidade de Dresden (Saxon State and University Library Dresden - SLUB).
Nestas 4 edições, observamos alguns elementos: tessitura, dinâmica,
ornamentos e articulação, constantemente revisados no processo de interpretação
do Arioso e Mesto. Através deste estudo, conseguimos obter ferramentas para o
aprofundamento teórico, necessário a uma boa interpretação do repertório barroco.
Colocamos em prática as especificações de Quantz para a ornamentação
do Arioso e Mesto, através de exemplos descritos no Versuch: Capítulos XIII, XIV,
XV e XVIII. Além disso, a orientação com a Professora Doutora Helena Jank e as
aulas de flauta com a Professora Livia Lanfranchi foram imprescindíveis para um
melhor entendimento dos exemplos de Quantz e aplicação dos ornamentos.
Para a interpretação dos três movimentos do concerto, os elementos já
citados foram bem debatidos nas orientações e aulas. Na elaboração dos
ornamentos, todo cuidado foi necessário para não obscurecer a escrita de Quantz.
No Capítulo XIV, tópico 14, o compositor ressalta que não devemos acrescentar
ornamentos em excesso, de modo que as notas principais não sejam escurecidas e
nem a melodia principal resulte irreconhecível.
9
CAPÍTULO 1
1. Os estilos nacionais e a ornamentação no barroco tardio
O período da história da música denominado barroco3 compreende o
século XVII e grande parte do século XVIII. Neste último, a partir de 1750
aproximadamente, vemos o surgimento do estilo clássico de composição e
interpretação da música. No entanto, tal surgimento não significa que certos
procedimentos na interpretação da música barroca, como a improvisação e a
ornamentação, saíssem de cena completamente4. Segundo Laura Rónai,
No século XVIII, improvisar era parte da rotina de qualquer intérprete, e parte do aprendizado de qualquer estudante de música. Instrumentos barrocos tinham possibilidades de articulação e de dinâmica menores do que seus descendentes, e o intérprete dependia mais da ornamentação para criar a variedade imprescindível para dar vida a uma composição. (RÓNAI, 2008, p. 238).
Seguindo o mesmo pensamento, Thurston Dart afirma:
Esta tendência para a improvisação habilidosa (e até mesmo inabilidosa) parece crescer em vez de diminuir, à medida que retrocedemos na história da música. Ao longo dos séculos XVII e XVIII, presumia-se que qualquer suposto regente, organista ou tecladista fosse capaz de tocar com fluência a partir de um baixo cifrado num conjunto musical. [...]. A improvisação era tão apreciada no século XVI quanto no século XVII, e os tratados sobre o assunto que foram conservados sugerem que essa arte era altamente desenvolvida. [...]. (DART, 2000, p. 69 - 71).
Sobre o contexto social em que a música do século XVIII estava inserida
(elencamos resumidamente), os autores Jean & Brigitte Massin (1997, p. 411)
destacam: “[...] O impulso tomado pela evolução social e cultural na Europa do
século XVIII fez-se sentir mais cedo nas regiões ocidentais do continente e no meio
urbano, onde a mobilidade social e as atividades culturais se desenvolveram mais
3 A palavra “barroco” é provavelmente de origem portuguesa, significando pérola ou joia de formato
irregular. De início, era usada para designar o estilo da arquitetura e da arte do século XVII, caracterizado pelo emprego excessivo de ornamentos. Mais tarde, o termo passou a ser empregado pelos músicos para indicar o período da história da música que vai do aparecimento da ópera e do oratório até a morte de J. S. Bach. (BENNETT, 1986, p. 35). 4 [...]. A passagem do barroco ao clássico não se faz abruptamente. Bem antes da década de 1730,
já havia sinais de mudanças, de modo que, de fato, o estilo clássico começou a desabrochar nos últimos anos do período barroco. (BENNETT, 1986, p. 45).
10
amplamente”. Dentre as regiões ocidentais apontadas, ressaltamos os países
França, Itália, Inglaterra e Alemanha, especialmente as cidades de comércio,
universitárias, portos marítimos e centros administrativos. A “Arte Monárquica5”,
herdada do século XVII, continuou a exercer influência na prática musical do século
XVIII:
[...] a música de corte rodeava e glorificava os soberanos. As festas e as cerimônias também cumpriam função de relevo na vida da sociedade, sobretudo nos círculos em que se moviam os príncipes e a nobreza, tendo sempre a acompanhá-la a música apropriada às ocasiões mais diversas, como noivados, casamentos, funerais e recepções solenes. (MASSIN, J; MASSIN, B, 1997, p. 411).
Paralelamente à vida musical da corte e dos salões aristocráticos,
desenvolveu-se pouco a pouco uma vida musical nova, a da burguesia que, além de
retomar as práticas musicais supracitadas, criou em meados do século XVIII uma
cultura musical autônoma:
A música, aos poucos, foi se tornando parte da vida social, no círculo familiar e de amizades da casa burguesa, como outrora do salão aristocrático, nos espetáculos e nas festas. Sob a forma de frequentação dos concertos, saraus musicais a domicílio ou atividade musical de amadores, a música passou a ser, pouco a pouco, uma exigência social e um marco distintivo da família burguesa. (MASSIN, J; MASSIN, B, 1997, p. 413).
Dentro deste contexto social, que abarcava tanto as práticas musicais da
corte quanto as da burguesia, floresciam estilos nacionais de composição e
interpretação da música que tiveram importância no desenvolvimento da
ornamentação6 e improvisação, sendo os três principais: o italiano, o francês e o
galante.
O termo estilo no século XVIII, “[...] se refere aos modos de escrita
utilizados nos discursos verbais ou musicais. Essas escritas são variáveis e seguem
um critério de adequação segundo a matéria e a finalidade do discurso [...]”
(PAOLIELLO, 2011, p. 39). Adicionalmente, “[...] se trata de uma transposição por
5 Expressão utilizada pelos autores Jean & Brigitte Massin no livro “História da Música Ocidental”, p.
411. 6 A ornamentação melódica tem uma longa história, que remonta à Idade Média. É provável que a
origem dos ornamentos tenha sido sempre a improvisação, e, embora numa etapa posterior tenham por vezes passado a ser total ou parcialmente escritos, ou então indicados por sinais próprios, [...], não deixaram de conservar um certo tom de espontaneidade. (GROUT; PALISCA, 2001, p. 410).
11
metáfora do termo stylus para modos de escrita, ou modos de compor, e se insere
dentro do contexto retórico” (PAOLIELLO, 2011, p. 46). Assim sendo, os estilos
italiano e francês seguem alguns critérios importantes. Tratamos de alguns
resumidamente e nos atentamos à ornamentação desenvolvida dentro destes dois
estilos. Dart problematiza:
Como podem então os dois estilos ser mais facilmente reconhecidos? Quais são os indícios mais evidentes, em cada peça? A resposta é: o título e certos traços da textura e da instrumentação. As suítes são francesas; as sonatas e concertos, italianos. As danças cujos títulos são pronunciados à francesa (allemande, courante, gigue, bourrée, sarabande, etc.) e as indicações francesas de andamento (vivement, lentement) pedem um estilo francês de interpretação; as danças com títulos italianos (allemanda, corrente, siciliana, giga, sarabanda) ou com indicações italianas de andamento (allegro, grave, presto, adagio) pedem um estilo italiano. As aberturas (overtures) são francesas; as sinfonias, italianas – e esses dois tipos de aberturas não são apenas formalmente distintos, mas também precisam ser tocados de maneira diferente. Ritmos ondulantes e uma orquestração usando instrumentos de sopro obbligato geralmente indicam um estilo francês; ritmos regulares “de maquina de costura”, ritmo lombardo e orquestração predominantemente de cordas são características do estilo italiano. (DART, 2000, p. 114).
O estilo galante foi muito cultivado na Alemanha e alguns autores são
considerados representantes, tais como: Johann Joachim Quantz, C. P. E. Bach,
Leopold Mozart e Marpurg. Segundo Paoliello,
Escritos musicais setecentistas, ao descreverem o estilo galante, fazem-no através da contraposição com outro modo de escrita: o estilo estrito, também chamado de estilo ligado ou fugal, que, como vimos anteriormente, se relaciona à ocasião sacra. O estilo galante é também chamado pelos autores setecentistas como estilo livre, e se destina à ocasião de câmara ou teatral. (PAOLIELLO, 2011, p. 63, grifo no original).
Existem algumas características importantes quanto à interpretação das
obras compostas no estilo galante, dentre as quais podemos destacar: sensibilidade
no tratamento dos ornamentos, andamentos e dinâmica; expressão (influência da
ópera italiana). Somado a isso, de acordo com o autor Heinrich Christoph Koch7, o
estilo galante tem por qualidade: ser um estilo livre; com muitas ornamentações;
7 (Rudolstadt, 10 out 1749; idem, 19 mar 1816) Teórico alemão. Após servir como violinista (e mais
tarde como Konzertmeister) na corte de Rudolstadt, dedicou-se a escrever. Sua obra principal, Versuch einer Anleitung zur Composition (1782-93), o mais completo tratado de composição da era clássica, exerceu influência especialmente pelo seu tratamento detalhado da forma musical. Também escreveu um dicionário de termos musicais, Musikalisches Lexikon (1802). (GROVE, 1994, p. 499).
12
alternância nos elementos rítmicos; harmonia menos complexa8 (KOCH apud
PAOLIELLO, 2011, p. 65). Dart ressalta:
[...] A música galante deve tender, frase por frase, àquelas cadências suspirantes, que são um traço tão importante de estilo: não são meros clichês mas clímax emocionais da linha melódica. A melodia, sua direção e pontuação, é o que importa. Os allegros e allegrettos mais suaves devem flutuar, sem pressa; os graves e os adagios devem ser delicada mas francamente emocionais; e os finales devem fluir e não se atropelar numa corrida sufocante para o fim. (DART, 2000, p. 116-117).
Muitos países lançaram mão da música italiana e francesa para a
composição de suas obras. Na Alemanha, por exemplo, tais músicas constituiram o
principal modelo responsável pela formação do gosto e maneira de compor dos
músicos. O compositor alemão Georg Philipp Telemann (1681-1767) foi um grande
representante dos chamados “gostos reunidos” presentes na prática musical
setecentista. Resumidamente, caracteriza-se pela: “imitação e a mistura dos
modelos francês e italiano com o intuito de aprender, fazer igual e superar”
(PAOLIELLO, 2011, p. 13). Os gostos reunidos9 começaram a se consolidar na
música alemã nas primeiras décadas do século XVIII e, a partir deles, formou-se o
gosto alemão.
Quantz em seu tratado, Versuch einer Anweisung die Flöte traversiere zu
spielen, Capítulo XVIII, tópico 53, destaca:
[...] Há dois povos em particular que têm alcançado estima considerável por sua melhoria do gosto musical, e que, conduzidos por suas inclinações naturais, têm percorrido caminhos diferentes para alcançar este fim. Estes dois povos são os italianos e os franceses. Outras nações têm aprovado o gosto desses dois povos, e procuram adotar e imitar o que lhe agradam mais em um ou em outro. Consequentemente, os dois povos têm se colocado como juízes soberanos do bom gosto na música; e como nenhum dos outros países tem sido capaz de contrapô-los, eles têm sido, em certo grau, os legisladores neste assunto por alguns séculos. A partir deles, o bom gosto tem sido transferido para outros povos. (QUANTZ apud PAOLIELLO, 2011, p. 72-73).
8 Ao contrário da escrita estrita, temos uma escrita de harmonia simples, não contrapontística, que
permite ornamentação abundante e desvios da melodia (que se assemelhavam à variedade e aos desvios da direção das conversas de salão). (PAOLIELLO, 2011, p. 65). 9 [...] apesar de Couperin utilizar o termo Les Goûts Réunis em 1724, encontramos, no decorrer da
pesquisa, o termo gemischten Goût na autobiografia de Telemann escrita em 1718 – seis anos antes do termo de Couperin. (PAOLIELLO, 2011, p. 103).
13
A ornamentação era um recurso interpretativo amplamente utilizado em
todos os estilos nacionais. Segundo Linde (1979, p. 5, grifo no original), “[...] a
maioria dos compositores antigos esperava que o intérprete ornamentasse sua
obra”. Este intérprete poderia ser tanto o cantor, quanto o instrumentista: “[...]. Em
muitos métodos de ensino encontramos alusões ao fato de que cantores e
instrumentistas deveriam poder aprender uns com os outros e aplicar, no essencial,
os mesmos tipos de adornos” (LINDE, 1979, p. 15). Com isso, os músicos do
período barroco tinham a liberdade de introduzir ornamentos na partitura escrita pelo
compositor, além de suprimi-los e realizar outras modificações quando necessário
(GROUT; PALISCA, 2001, p. 411).
De acordo com Laura Rónai (2008, p. 210) os compositores barrocos
franceses tinham por hábito escrever todos os ornamentos que julgavam
necessários à interpretação de suas obras, já, os italianos, deixavam ao intérprete a
função de acrescentar os ornamentos a suas composições. A execução dos
ornamentos padronizados (mordentes, trinados, apojaturas, grupeto, dentre outros)
representa o estilo francês de interpretação e a ornamentação de floreios (expansão
do texto escrito pelo compositor) o estilo italiano. No entanto, isso não significa uma
limitação rígida (quanto ao uso dos ornamentos) aos países França e Itália, pelo
contrário, com a imigração de músicos estrangeiros,
[...] se aprendeu a conhecer e apreciar também sua música com todas as peculiaridades. Os franceses colocavam em suas obras, nos locais correspondentes determinados símbolos para a ornamentação essencial e, frequentemente, também anotavam ornamentos livres. […]. Na Inglaterra era acentuada a influência da música francesa. […]. A Alemanha foi fortemente influenciada de igual maneira pelo estilo italiano e francês [...]. (LINDE, 1979, p. 5, grifos no original).
Apesar da rivalidade existente entre os estilos italiano e francês de
composição e interpretação da música, havia também contatos e influências mútuas
entre os compositores pertencentes a tais estilos: ornamentos poderiam ser
introduzidos em uma composição francesa (improvisados) e nem toda peça em
estilo italiano deveria ser necessariamente ornamentada. É importante ressaltar que
os compositores franceses compunham música italiana e vice-versa. Laura Rónai
acrescenta:
14
Ainda assim, as diferenças entre ambos [italianos e franceses] são notáveis e sem dúvida refletem as diferenças de temperamento entre os dois povos que dominaram estilisticamente a música do Barroco. Diz-se que os italianos, sentimentais, tocavam como quem canta. E que os franceses, racionais, tocavam como quem fala. A ornamentação italiana é derivada diretamente das divisões renascentistas, com uma ênfase maior nos ornamentos que têm função harmônica (aqueles capazes de criar dissonâncias) e em ornamentos conectivos (que preenchem escalarmente um intervalo). [...]. A música francesa era mais contida, menos “derramada”, mais sofisticada harmonicamente e mais fragmentada melodicamente. Ao invés de amplas frases apaixonadas, a escrita francesa é cheia de interjeições, exclamações, hesitações – como a própria língua falada. [...]. (RÓNAI, 2008, p. 211-212).
François Raguenet em sua obra Paralele des Italiens et des François en
ce qui regarde la musique et les opéra (1702) discorre sobre as diferenças entre a
música italiana e francesa. O autor destaca a rigidez da música francesa em relação
à liberdade da música italiana:
Os franceses se consideram arruinados se eles violam minimamente as regras; eles encantam, agradam, cortejam o ouvido e ainda assim são receosos do sucesso, apesar de tudo ser feito com uma ordem exata. O italiano, mais ousado, altera o tom e o modo sem nenhum temor ou hesitação; ele faz cadências duplas ou triplas de sete ou oito compassos juntos, em tonalidades que nós acharíamos incapazes de uma mínima divisão. [...]. Os italianos se aventuram em tudo o que é ousado e fora da regra, mas eles o fazem como quem tem o direito de ousar e está certo do sucesso. (RAGUENET apud STRUNK, 1998, p. 675, tradução Noara de Oliveira Paoliello)
10.
Os autores franceses eram exigentes quanto à execução dos ornamentos
e utilização de sinais para a exemplificação dos mesmos. Segundo Laura Rónai
(2008, p. 212), nos volumes de peças publicados em Paris, havia uma espécie de
glossário que explicava a interpretação adequada para cada símbolo apresentado.
Porém, não existe uma homogeneidade francesa quanto à utilização destes
símbolos, “[...] muitos compositores se utilizavam de sinais peculiares, próprios.
Outros faziam uso de sinais gráficos iguais, mas com significados totalmente
10
The French would think themselves undone, if they offended in the least against the rules; they flatter, tickle, and court the ear, and are still doubtfull of success, tho’ ev’ry thing be done with an exact regularity. The more daring Italian changes the tone and the mode without any awe or hesitation; he makes double or treble cadences of seven or eight bars together, upon tones we should think incapable of the least division. […]. The Italians venture at ev’ry thing that is hasrh, and out of the way, but then they do it like people that have a right to venture, and are sure of success.
15
diversos. [...]” (RÓNAI, 2008, p. 212). A imagem11 abaixo (Figura 1) apresenta os
símbolos para o trinado utilizados por alguns autores:
Figura 1: Símbolos para o Trinado
Fonte: RÓNAI, 2008, p. 213
Thurston Dart nos aponta mais algumas informações sobre a
ornamentação desenvolvida dentro dos estilos italiano e francês. De maneira geral, o
estilo francês de composição e interpretação “[...] estava baseado nos traços
característicos da música francesa escrita entre 1650 e 1700 por Lully, seus
contemporâneos e sucessores” (DART, 2000, p. 93). Até meados do século XVIII tal
estilo permaneceu em evidência por toda França. Os ornamentos em música para
conjunto eram geralmente indicados pelo símbolo (+), sendo que este sinal deveria
ser interpretado como: uma apojatura, um trinado, um mordente ou qualquer outro
11
Laura Rónai afirma que esta tabela foi retirada do livro de Betty Bang Mather: Interpretation of French Music From 1675 to 1775, p. 88.
16
ornamento apropriado para a obra em questão. Seguindo as sugestões de Georg
Muffat12, Dart exemplfica a interpretação dos ornamentos conforme o estilo francês:
a) mordentes invertidos para demonstrar tensão; b) trinados apenas quando puderem ser tocados como semitons diatônicos e nunca em notas iniciais nem (geralmente) em notas próximas de um salto; eles podem ser usados com maior liberdade em passagens de escalas descendentes, especialmente em notas pontuadas; c) apojaturas em notas próximas de um salto e (com ou sem mordente) nos tempos fortes em passagens de escalas ascendentes; d) coulements em notas precedidas de um salto de uma nota mais baixa; e) escalas rápidas para demonstrar veemência; os franceses as chamam de tirades e, como as tiradas, devem ser raras; f) coulés em intervalos decrescentes e em saltos descendentes, com um trinado na última nota. Os ornamentos devem ser suaves, bem escolhidos, não muito frequentes nem muito velozes, mais animados. (DART, 2000, p. 102-103).
Ainda segundo Dart, a notação utilizada pelos compositores italianos em
suas obras, quase sempre significa o que diz, porém, existem duas exceções: a
ornamentação de um Adagio e o tratamento dos ritmos pontuados. No adagio do
século XVIII, desenvolvido dentro do estilo italiano, esperava-se que o intérprete
improvisasse com bastante liberdade, ou seja, as notas escritas eram apenas um
esqueleto a ser vestido com ornamentos. Resumidamente,
No estilo italiano, portanto, os desvios em relação ao texto escrito caem nas seguintes categorias: ornamentação improvisada nos adágios; variações opcionais do material repetido; ornamentação adicional nas cadências, indo de um trinado a uma cadenza inteira, ligeiras alterações dos valores das notas, sempre associadas à ocorrência de ritmos trocaicos, anapésticos ou de tercinas, em qualquer outro ponto do mesmo movimento [...]. (DART, 2000, p. 108).
Percebemos, portanto, que a ornamentação é essencial para a
interpretação da música barroca. No entanto, Julie Anne Sadie problematiza o fato
de que, muitas vezes, não sabemos a dosagem correta de ornamentos a serem
utilizados durante a execução desta música, assim “os ornamentos interferem tanto
pela sua ausência, quanto pela sua abundância” (TOSI apud SADIE, 1995, p. 587).
Como perceber então estes excessos e/ou faltas? De acordo com Sadie,
12
(Mégève, bat. 1 jun 1653; Passau, 23 fev 1704) Compositor alemão de origem francesa (Savoy), pai de Gottlieb. Estudou com Lully e outros em Paris, 1663-9. Após um período como organista em Molsheim, fez muitas viagens e, em 1678, tornou-se organista e músico de câmara do arcebispo de Salzburgo. [...]. Eminente compositor de música instrumental, Muffat foi um pioneiro na introdução dos estilos francês e italiano na Alemanha, e nos prefácios de suas obras deu também detalhes sobre as práticas de execução de Lully e Corelli. [...]. (GROVE, 1994, p. 629).
17
Um músico, ao se ocupar desta música estará necessariamente confrontado com esses problemas e não podemos censurar o leitor por tentar encontrar aqui algumas soluções. Mas não faltam bons motivos para tentar outra coisa. Existe uma legião de manuais práticos de ornamentação barroca, mas mesmo os melhores deles oferecem apenas uma visão parcial de um assunto tão diverso como: gêneros e estilos musicais aos quais se aplica a ornamentação. O estudante se convence facilmente que a autenticidade consiste em identificar o trilo certo nos menores detalhes, mas a realidade é diferente. Em grande parte do repertório - como na ópera de meados do século XVII - não existe nenhuma informação direta, ao passo que, apesar dos muitos anos de pesquisa musicológica bem documentada, algumas questões ainda são controversas, tais como a maneira correta de interpretar o trilo [no repertório] francês. E mesmo dispondo do conhecimento necessário, como querer rivalizar com a maneira de cantar de alguém que já vinha desde a infância praticando os diversos ornamentos e para quem a correta impostação da voz havia se tornado uma segunda natureza, a ponto de poder utilizá-la espontaneamente como recurso expressivo? E como, com nossos ouvidos sobrecarregados com dois séculos de músicas inimagináveis à época barroca, podemos aprender a improvisar as cadências sem que as notas pareçam erradas, do ponto de vista estilístico? Assim também uma partitura esquelética não deve se revestir dos hábitos da moda. Para chegar lá, é necessária uma consciência clara, não só do abismo que nos separa dos músicos antigos e das condições de execução nos tempos passados, mas também das forças e fraquezas dos nossos conhecimentos históricos. (SADIE, 1995, p. 587-588, tradução nossa )
13.
Sadie ressalta também que existem muitos modelos de improvisação que
chegam até nós, mas, precisamos avaliar com cuidado em qual momento estes
improvisos foram escritos, pois eles podem afetar o efeito desejado da
ornamentação (devemos ter em conta que tais modelos eram circunstanciais e não
13
[...]. À ces problèmes, un musicien s’occupant de cette musique se trouvera nécessairement confronté, et on ne saurait reprocher au lecteur de s’attendre à trouver iciquelques solutions. Mais les bonnes raisons ne manquent pas pour tenter autre chose. Les manuels pratiques d’ornementation baroque sont légion, mais les meilleurs ne donnent qu’une vue trés partielle d’un sujet aussi divers que les genres et styles musicaux auxquels s’applique l’ornementation elle-même. L’étudiant se persuade aisément que l’authenticité consiste à trouver pour le moindre signe le trille qui convient, mais la réalité est différente. Pour de vastes pans du répertoire, comme l’opéra du milieu du XVII siècle, on ne possède aucune information directe, alors que malgré des années de recherche musicologique, certaines questions bien documentées comme le mode d’interprétation du trille à la française restent matière à controverse. Et même en disposant des connaissances nécessaires, comment rivaliser avec la maniére de chanter de quelqu’un ayant pratiqué depuis l’enfance les différents ornements et pour qui le placement de la voix était devenu une seconde nature, au point de pouvoir l’utiliser spontanément comme ressource expressive? Comment, avex nos oreilles surchargées de deux siècles de musiques inimaginables à l’époque baroque, apprendre à improviser des cadences dont sur le plan stylistique les notes ne sonneront pas faux? Une partition squelettique n’en doit pas moins revêtir parfois des habits à la mode. Pour en arriver là, il faut une conscience claire, non seulement de l’abîme qui nous sépare des musiciens anciens et des conditions d’éxecution des temps passés, mais aussi des forces et desfaiblesses de nos connaissances historiques.
18
fixos compostos de acordo com a capacidade técnica dos músicos a quem se
destinavam as obras) (SADIE, 1995, p. 618).
A autora Laura Rónai destaca a importância da improvisação dentro da
música barroca:
Para o intérprete, a improvisação é assunto fascinante. Não apenas porque lhe dá a oportunidade de exibir sua própria personalidade, mas também porque o eleva ao status de co-autor, ao lhe possibilitar interferir na obra de outrem. Essa liberdade torna a música do Barroco particularmente simpática para um grande segmento de intérpretes, e explica em parte a atração que a música deste período musical tem exercido nos últimos anos sobre instrumentistas e cantores, cansados da interpretação literal prescrita para a maior parte da música dos últimos dois séculos. Para a pesquisa musicológica, este é igualmente um campo de suma importância. Desvendar os mistérios da improvisação é uma ótima via para se penetrar nos hábitos de interpretação musical do passado. (RÓNAI, 2008, p. 214).
1.1. Os ornamentos de acordo com: Tartini, Carl Philipp Emanuel Bach e
Leopold Mozart.
Giuseppe Tartini (1692-1770) escreveu o seu “Tratado sobre os
Ornamentos na Música” entre os anos de 1735-1750 (há indícios de que pode ter
sido escrito entre 1752-1756). A primeira edição, em francês, Traité des Agrémens
de la Musique, foi publicada em 1771 na cidade de Paris: a tradução foi atribuída a
P. Denis, mas acredita-se que Pierre La Houssaye (aluno de Tartini) tenha sido um
possível tradutor (WALLACE, 2003, p. 36-37). Apenas 4 cópias do manuscrito
original foram encontradas, sendo que em 1957, Pierluigi Petrobelli encontrou a mais
completa versão do tratado na biblioteca do conservatório de música Benedetto
Marcello. Esta versão vem assinada por Giovanni Francesco Nicolai (aluno de
Tartini) e foi disponibilizada ao público em 1960 (WALLACE, 2003, p. 37).
19
De maneira geral, de acordo com Sol Babitz14, o tratado de Tartini,
É o primeiro livro a lidar integralmente com ornamentação; o primeiro livro a discutir em detalhes a raison d’être e a aplicação de ornamentos, oferecendo informações não disponíveis em qualquer outro livro da época; o único livro escrito na Itália acerca do assunto, em um tempo no qual toda a Europa copiava o modelo italiano de performance. Estranhamente, nunca chegou a ser publicado em italiano, embora circulasse amplamente em manuscrito; enquanto assim circulava, tinha, segundo seu tradutor francês, larga influência; foi provavelmente visto por C. P. E. Bach e mais certamente estudado por Leopold Mozart, que se apropriou de seções inteiras dele para o seu Violinschule, com a então habitual ausência de menções ao autor. (BABITZ, ed., Treatise on the Ornaments of Music, 1956, p. 75, tradução nossa)
15.
Tartini não acreditava no uso mecânico da ornamentação, pelo contrário,
estimulava a improvisação na hora da performance musical. Em seu outro tratado,
Trattato di Musica, publicado em 1754, ele afirma:
Posso aprovar o uso apropriado de ornamentos musicais em muitas melodias, mas nunca fui capaz de entender o uso de exatamente os mesmos ornamentos em todas as melodias. Convenço-me firmemente que, cada melodia que realmente corresponde a um efeito de palavras, deve possuir a sua própria maneira individual e original de expressão e, consequentemente, os seus próprios ornamentos individuais e originais. (TARTINI apud WALLACE, 2003, p. 40, tradução nossa)
16.
Carl Philipp Emanuel Bach (1714-1788) publicou a primeira parte de seu
tratado, Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen, no ano de 1753. A Parte
II foi publicada em 1762. De acordo com Fernando Cazarini, tradutor do tratado para
o português (edição de 2009, p. 9), o Versuch de C. P. E. Bach é considerado o
tratado sobre teclado mais importante do século XVIII, além de “[...] um guia para
dedilhado, ornamentação, fundamentos estéticos, baixo-contínuo e improvisação”.
14
Tradutora para o inglês do tratado de Tartini. 15
It is the first book dealing entirely with ornamentation; the first book to discuss in detail the raison d'etre and application of ornaments, providing information found in no other books of the period; the only book written on that subject in Italy at a time when all Europe was copying the Italian model in performance. Oddly enough, it was never published in Italian but circulated widely in manuscript; while thus circulating it had, according to its French translator, wide influence; it was probably seen by C. P. E. Bach and most certainly studied by Leopold Mozart, who appropriated entire sections from it for his Violinschule with the then customary lack of acknowledgement. 16
I can approve of the proper use of musical ornaments in many tunes, but I have never been able to understand the use of exactly the same ornaments in all tunes. I am firmly convinced that every tune that truly corresponds to an affect of words must possess its own individual and original manner of expression and consequently its own individual and original ornaments.
20
No século XVIII houve outras edições do tratado: Parte I em Berlim
(1759); Partes I e II (1780) e Parte I (1787) em Leipzig. No século XX muitas outras
edições foram publicadas: em Leipzig (edição completa, 1906, 1917, 1920 e 1925);
Londres (edição completa sem as sonatas, 1949); Milão (Parte I, 1973); Paris (Parte
I com as sonatas, 1979). Sobre a ornamentação, C. P. E. Bach exemplifica no
Capítulo 2 as características gerais dos ornamentos e demonstra conhecimento
sobre os estilos italiano e francês de composição e interpretação da música.
Destacaremos alguns exemplos:
As cadências ornamentadas são também composições de improviso. De acordo com o caráter da peça, são tocadas livremente, sem levar em conta o compasso. Por isso, nas Lições, o valor das notas dessas cadências é aproximado
17. Capítulo 3, tópico 30.
Por isso sempre agiram com mais segurança os compositores que indicaram claramente em suas peças os ornamentos que deveriam ocorrer, em vez de deixarem suas peças sujeitas ao discernimento de executantes desajeitados. Capítulo 2, Parte I, tópico 3. A lição em fá maior é um esboço da maneira como se costuma hoje em dia variar a segunda das duas reprises dos Allegros. Por louvável que seja essa invenção, ela é muito mal utilizada. Minha opinião sobre isso é esta: não se deve variar tudo, pois se não surge uma outra peça. Muitas passagens de uma peça, principalmente as afetuosas e eloquentes, não se prestam a variação. [...]. Toda variação deve ser conforme o afeto da peça. [...]. Às vezes é bom variar as passagens mais simples acrescentando-lhes ornamentos, e vice-versa. [...]. Capítulo 3, tópico 31. Também neste ponto deve-se fazer justiça aos franceses, por serem particularmente meticulosos na notação de suas peças. Os maiores mestres de nosso instrumento na Alemanha agiram da mesma forma, contudo, sem excesso de ornamentos, como os franceses. [...]. Capítulo 2, Parte I, tópico 4. Os ornamentos podem dividir-se em duas classes. Na primeira coloco os que se costumam indicar por certos sinais convencionais, ou por algumas pequenas notas; à outra classe pertencem os restantes, para os quais não há sinais e que consistem de muitas notas curtas. Os ornamentos deste último tipo dependem particularmente do bom gosto na música, e são, consequentemente, suscetíveis de mudanças. Nas peças para teclado geralmente são indicados. Devido ao grande número de ornamentos do outro tipo, pode-se passar sem eles. Assim sendo, trarei pouco deles, no final, quando estiver tratando das fermatas. Antes, tratarei dos ornamentos da primeira classe, uma vez que estes já há muito tempo estão relacionados à própria essência de tocar teclado e, sem dúvida, continuarão sempre na moda. [...]. Capítulo 2, Parte I, tópicos 6 e 7.
17
Tradução do tratado para o português por Fernando Cazarini, edição de 2009.
21
Os franceses são minuciosos na indicação dos sinais de seus ornamentos; infelizmente, à medida que nos afastamos de suas peças e de sua maneira excelente de tocar teclado, também vai desaparecendo a compreensão exata dos ornamentos [...]. Capítulo 2, Parte I, tópico 16. Vemos, portanto, que os ornamentos são mais usados em andamentos lentos e moderados do que em andamentos rápidos, e mais com notas longas do que com curtas. [...]. Capítulo 2, Parte I, tópico 21. O gosto atual, influenciado sensivelmente pelo bel canto italiano, não pode se exprimir apenas com os ornamentos franceses: assim, tive que reunir ornamentos de mais de um país. Acrescentei-lhes ainda alguns novos. Creio que, tanto para o teclado como para outros instrumentos, a melhor maneira de tocar é a que reúne de forma correta a precisão e o brilho do gosto francês com a sedução do canto italiano. [...]. Capítulo 2, Parte I, tópico 25.
Leopold Mozart (1719-1787) publicou o seu Versuch einer gründlichen
Violinschule no ano de 1756. Alec Hyatt King, nas notas acrescentadas à tradução
para o inglês deste tratado (edição de 1985, p. vii), afirma que o Versuch de Leopold
é considerado o maior trabalho para violino do século XVIII, comparável ao tratado
para flauta de Quantz e ao tratado para teclado de C. P. E. Bach. Quanto às
edições, podemos elencar algumas de acordo com David D. Boyden (1949, p. 148):
em alemão, 1769, 1970, 1787, 1800; em holandês, 1766; em francês, 1770; em
inglês, 1948, por Editha Knocker. Vale destacar que Leopold lançou mão do Traité
des Agreméns de la Musique de Tartini para a elaboração de seu Versuch. Sol
Babitz acrescenta:
O manuscrito [Tartini] aparentemente não tem data, mas deve ter sido escrito antes de 1750, possibilitando sua circulação por vários anos e alcançando Leopold Mozart a tempo de ser incorporado a seu livro antes de sua escrita em 1754. (BABITZ, ed., Treatise on the Ornaments of Music, 1956, p. 75, tradução nossa)
18.
O tratado de Leopold traz grande atenção aos ornamentos desenvolvidos
na França e Itália, ressaltando sua expressiva significância para a interpretação
musical do século XVIII. Vejamos alguns exemplos:
18
The manuscript [Tartini] apparently bore no date, but it must have been written prior to 1750 in order to allow several years for it to circulate and reach Leopold Mozart in time to be incorporated into his book before its writing in 1754.
22
Leopold era considerado o melhor professor de Salzburgo, muito procurado mesmo quando mais velho. Ele não se permitia ser influenciado por Quantz e, menos ainda, por Carl Philip Emmanuel Bach, como provado por seu capítulo sobre ornamentação, no qual segue a prática da escola italiana de Tartini, em vez da dos músicos saxões ou do norte da Alemanha. (KNOCKER, ed., A Treatise on the Fundamental Principles of Violin Playing, 1985, p. xxx-xxxi, tradução nossa)
19.
O Zurückschlag (em italiano, Ribattuta) é usado quando se sustenta uma nota muito longa e geralmente antes de um trilo. [...] O Zurückschlag também pode ser usado agradavelmente, por exemplo, em um adagio
20.
[...]. Capítulo XI, tópico 17, tradução nossa. Há ainda alguns outros ornamentos que são majoritariamente nomeados do italiano. Apenas o Battement é de origem francesa. Ribattuta, Groppo, Tirata, Mezzo Circolo e outros são de origem italiana. E, mesmo que raramente sejam mencionados, vou, apesar disso, exemplifica-los aqui, uma vez que eles não estão em desuso e ainda podem ser aplicados
21. [...].
Capítulo XI, tópico 15, tradução nossa.
No Anexo I apresentamos resumidamente as características gerais de
alguns dos ornamentos destacados por C. P. E. Bach, Leopold Mozart e Tartini em
seus respectivos tratados, já mencionados neste trabalho. Espera-se que estes
apontamentos sejam um guia para aqueles que desejam aprofundar-se no estudo da
ornamentação desenvolvida no século XVIII, além de um estímulo para a elaboração
de nossos próprios ornamentos. Donington afirma:
Assim como Geminiani ou Tartini ou Leopoldo Mozart, quando tocavam Corelli, não procuravam soar exatamente como Corelli, ou como J. S. Bach que colocava muito de sua refinada e livre ornamentação nas suas performances de Vivaldi... esperamos recorrer as nossas afinidades de temperamento e intuição a fim de produzir uma ornamentação livre que seja, ao mesmo tempo, vívida e compatível. (DONINGTON apud BORÉM, 2004, p. 49).
19
Leopold was considered to be the best teacher in Salzburg, and his teaching was sought after even in his old age. He did not permit himself to be influenced by Quantz, and still less by Ph. Em. Bach, as is proved by his chapter on Ornamentation, in which he follows the practice of the Italian School of tartini rather than of the Saxon or North German musicians. 20
The Zurückschlag (Italian Ribattuta) is used in the sustaining of a very long note and generally before a trill. […]. The Zurückschlag can also be used pleasingly, for example, in an adagio. […]. 21
There are still a few other embellishments which are mostly named from the Italian. The Battement only is of French origen. The Ribattuta, Groppo, Tirata, Mezzo Circulo, and other such, are of Italian birth. And even though one now rarely hears them mentioned, I will, in spite of this, set them down here, for they are not without use and may well be used still. […].
23
CAPÍTULO 2
2. Johann Joachim Quantz: Biografia
Johann Joachim Quantz nasce no dia 30 de janeiro de 1697 na cidade de
Oberscheden, Alemanha. Seus pais, Anna Beuermann e Andreas Quantz, morrem
respectivamente nos anos de 1702 e 1707, por isso, o autor passa a morar com o
tio, Justus Quantz, músico de Merseburg. Quantz inicia seu estudo de música com
este tio que falece poucos meses após a chegada de seu sobrinho. O novo tutor,
Johann Adolf Fleischhack (genro de Justus), proporciona ao compositor uma grande
e extraordinária educação musical durante aproximadamente cinco anos.
Neste período, Quantz aprende a tocar vários instrumentos, tais como:
violino, oboé, trompete, violoncelo, viola da gamba, dentre outros. Edward R. Reilly,
nas notas introdutórias de sua tradução do tratado de Quantz para o inglês (1966, p.
xii), destaca que o violino era o instrumento principal de Quantz, sendo que ele
possuía técnica instrumental suficiente para tocar obras dos compositores Heinrich
Biber (1644-1704), Johann Jakob Walther (1650-1717), Henrico Albicastro (1670-
1738), Arcangelo Corelli (1653-1713) e Georg Philipp Telemann (1681-1767).
Somado a isso, fez aulas de cravo e composição com o professor Friedrich
Kiesewetter, organista.
Em 1714 vai para a cidade de Desdren, que na época, era um dos
centros musicais mais importantes da Alemanha, e no ano de 1716 passa a ser
integrante da banda desta cidade22. Em 1718 torna-se oboísta e violinista da
Polnische Kapelle, contando com um grupo de 20 músicos. No ano seguinte, inicia
suas aulas de flauta transversal com o professor Pierre-Gabriel Buffardin (1690-
1768), primeiro flautista da orquestra de Dresden. No ano de 1720, Quantz começa
a compor para a flauta, recebendo grande influência de Pisendel, Vivaldi e
Montenari, grandes compositores e violinistas. Em sua autobiografia23, Quantz
22
BONNEMA, Feike. Biography. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/biography>. Acesso em: 20 mar. 2015. 23
Publicada em 1755 por Friedrich Wilhelm Marpurg e a continuação manuscrita em 1762 pelo Padre Martini.
24
ressalta sua admiração por Vivaldi quando descreve que os ritornellos escritos por
este compositor proporcionaram bons modelos para os seus escritos24.
Rodolfo Murillo25 também destaca:
Durante esse período ele conheceu pessoalmente o violinista Johann Georg Pisendel, o Primeiro Violinista da Orquestra Real, com quem Quantz aprendeu como executar o Adagio, como interpretar e ornamentar movimentos lentos, e como tocar diferentes tipos de movimentos, e música em geral. Ele também aprendeu muito sobre estilo ao escutar a bons cantores. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 6, tradução nossa)
26.
Num período de três anos (1724 a 1727), Quantz viaja para os países
Itália, França e Inglaterra (SCHAEFLE, 1989, p. 8), com o intuito de aperfeiçoar seu
conhecimento em música. Na Itália, estudou contraponto com o compositor
Francesco Gasparini (1668-1727), além de conhecer os grandes músicos Johann
Adolph Hasse (1699-1783) em Nápoles e Alessandro Scarlatti (1660-1725) em
Roma. Na França, teve contato com os flautistas Jacques Christophe Naudot (1690-
1762) e Michel Blavet (1700-1768). Na Inglaterra “[...] visitou a ópera e, certamente,
encontrou Händel, que estava em Londres naquele momento27”. Retorna para
Dresden em 1727 e, em uma visita a Berlim no ano de 1728, tem a oportunidade de
tocar para o príncipe da Prússia, Frederico II. De acordo com Feike Bonnema,
Frederico ficou tão encantado que, imediatamente, providenciou para que Quantz o ensinasse flauta, apesar da objeção de seu pai. Durante os 13 anos seguintes, Quantz iria duas vezes por ano a Berlin e, mais tarde, para Ruppin e Rheinsberg para dar aulas ao futuro rei
28.
Frederico II, o Grande, torna-se rei em 1740. Com isso, Quantz assume
integralmente o seu trabalho como músico da Corte. De 1741 até o fim de sua vida
24
BONNEMA, Feike. Biography. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/biography>. Acesso em: 20 mar. 2015. 25
Tradutor do tratado de Quantz para o espanhol. 26
During this time he became acquainted with the violinist Johann Georg Pisendel, the Royal Concertmaster, from whom Quantz learned how to perform the Adagio, how to interpret and ornament slow movements, and how to play different kinds of movements and music in general. He also learned much about style by listening to good singers. 27
[…] visited the opera and surely met Händel who was in London at that time. BONNEMA, Feike. Biography. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/biography>. Acesso em: 20 mar. 2015. Tradução nossa. 28
Frederick was so enchanted that he immediately arranged Quantz to teach him the flute in spite of the objections of his father. During the 13 following years, Quantz will go twice a year to Berlin and later to Ruppin and Rheinsberg to give lessons to the future king. BONNEMA, Feike. Biography. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/biography>. Acesso em: 20 mar. 2015. Tradução nossa.
25
(1773), suas atribuições nesta Corte incluíam o dever de dar aulas de flauta
regularmente ao rei, reger orquestras, participar de concertos e também compor
novas peças. Além disso, nas palavras de Reilly,
Em outras fontes, notavelmente Frederico, o Grande (1712-1786) e sua irmã Wilhelmine (1709-1758), a Margravine de Bayreuth, confirmam outras atividades de Quantz como a de fabricante e vendedor de flautas, e sua responsabilidade pela qualidade de seus instrumentos. (REILLY, 1997, p. 431, tradução nossa)
29.
2.1. A flauta de Quantz
São muitas as inovações e transformações realizadas por Quantz na
flauta transversal. Podemos ressaltar, por exemplo, a preocupação com a afinação e
sonoridade do instrumento. Porém, antes de aprofundarmos mais sobre tais
inovações e transformações, discorreremos brevemente sobre algumas
características da flauta dos séculos XVI, XVII e XVIII.
De acordo com Laura Rónai (2008, p. 60), a típica flauta transversal do
século XVI consistia de um tubo inteiro com seis orifícios cilíndricos, sendo que os
mesmos eram mais ou menos alinhados com a embocadura. Com a tessitura que
apresentava aproximadamente duas oitavas, esta flauta era caracterizada também
por possuir três tamanhos diferentes afinados em quintas. Por exemplo: contralto em
Lá, tenor em Ré e baixo em Sol (Figuras 2 e 3). Rónai afirma:
[...] Geralmente eram usadas em consorts30
e tinham um som razoavelmente forte, porém pouca flexibilidade tímbrica. Até o século XVII, este instrumento não tinha função precípua de solista, e era de muito suplantado pela flauta doce, que possuía som mais penetrante, permitia maior agilidade digital e afinação mais precisa. No século seguinte esta situação acabou por se inverter, e a flauta doce foi relegada a uma aposentadoria precoce. (RÓNAI, 2008, p. 60).
29
Other sources, notably Frederick the Great (1712-86) and his sister Wilhelmine (1709-58), the Margravine of Bayreuth, confirm Quantz's continuing activity as a manufacturer and seller of flutes, and his responsibility for the quality of his instruments. 30
Grupos instrumentais que incluíam famílias de um mesmo instrumento, sendo o mais comum o Consort of Viols, grupos de viola-da-gamba. (RÓNAI, 2008, p. 60).
26
Figura 2: Consort de Flautas
Fonte: RÓNAI, 2008, p. 60
Figura 3: Consort de Flautas
Fonte: ARAÚJO, 1999, p. 3
27
Em 1707, o grande flautista e compositor Jacques Martin Hotteterre
(1680-1760) publica o seu tratado Principes de la flûte traversière, de la flûte a bec et
du hautbois31. Tal método foi o primeiro a abordar (de maneira sistemática) a flauta
transversal desenvolvida pela família Hotteterre32. Esta flauta era dividida em três
partes: cabeça cilíndrica (embocadura em forma de círculo); corpo cônico; pé com a
chave de Ré#. Além disso, a tessitura compreendia duas oitavas (D1 ao D3) (ver
Figura 4). Vale ressaltar que os primeiros grandes fabricantes de flautas do Barroco
foram membros da família supracitada e as modificações introduzidas no
instrumento aumentaram a popularidade da flauta na França (qualidade nas
composições).
Figura 4: Flautas com a chave de Ré#
Fonte: ARAÚJO, 1999, p. 5
31
[...]. Seu livro oferecia tabelas de dedilhado, e conselhos sobre embocadura, articulação e ornamentação. (RÓNAI, 2008, p. 61). 32
Sávio Araújo (1999, p. 4) afirma que Jean Hotteterre (1648-1732) provavelmente foi o responsável pela adição da primeira chave na flauta (Ré#) por volta de 1660. Adicionalmente, Quantz no seu tratado, Capítulo I, tópico 4, admite o acréscimo da primeira chave na flauta pelos franceses.
28
A flauta com a chave de Ré# era frequentemente referida como flauta
alemã (SCHAEFLE, 1989, p. 13). Johann Joachim Quantz nos apresenta esta flauta
em seu Versuch einer Anweisung die Flöte traversiere zu spielen, Capítulo I, tópico
2:
Não há dúvida de que, no norte, foram os alemães que estabeleceram, ou pelo menos renovaram completamente, os primeiros princípios da flauta assim como de vários outros instrumentos de vento. Os ingleses chamam este instrumento “the German Flute”, os franceses igualmente o chamam “la Flüte allemande” (ver Principes de la Flúte traversiére, ou de la Flüte allemande par Monsieur Hotteterre, Le Romain). (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 25, tradução nossa)
33.
Adicionalmente, no tópico 6, Quantz afirma que o primeiro músico a se
destacar com a flauta de uma chave na França foi o flautista Philibert Rebeille.
Depois seguiram outros como Michel de la Barre, Jacques Hotteterre, Pierre Gabriel
Buffardin e Michel Blavet. Rónai (2008, p. 62) problematiza o fato de que, apesar da
flauta transversal ser denominada muitas vezes flauta alemã, foi a França quem
liderou o cenário musical europeu entre os anos 1680-1730: a maioria dos
fabricantes de instrumentos de sopro no período eram franceses e as inúmeras
composições para flauta comprovam o sucesso que faziam os instrumentos
fabricados na França.
No decorrer do século XVIII, a flauta transversal foi ganhando destaque
entre os instrumentos de sopro e a sua utilização em concertos se popularizou por
outros países da Europa, além da França e Alemanha. Podemos destacar algumas
transformações técnicas ocorridas no período: “O instrumento passou a ser dividido
em quatro partes, a embocadura se ovalou gradualmente, o som se tornou menos
escuro e mais penetrante” (RÓNAI, 2008, p. 62). No ano de 1720, foi desenvolvida
uma técnica de construção do instrumento denominada Corps de Réchange (Figuras
5 e 6). De acordo com Sávio Araújo:
33
Pero no hay duda que, en el norte, fueron los alemanes los que establecieron, o por lo menos renovaron completamente, los primeros principios de la flauta así como los de varios instrumentos de viento. Los ingleses le llaman a este instrumento "the Germán Flute", los franceses igualmente le llaman "la Flüte allemande" (ver Principes de la Flúte traversiére, ou de la Flüte allemande par Monsieur Hotteterre, Le Romain). Original em alemão no Anexo IV.
29
Este sistema envolvia a divisão da flauta em quatro partes, onde a parte central, ou o corpo, era dividido em dois. A parte intercambiável era a porção superior do corpo - mão esquerda - e, dependendo do instrumento, havia três ou até seis tamanhos diferentes. O mais comum eram três partes intercambiáveis, sendo a mais curta um semitom mais agudo do que a normal e, consequentemente, a mais longa um semitom mais grave. (ARAÚJO, 1999, p. 6).
Quantz aponta em seu tratado esta flauta com corpos de troca. Conforme
o compositor no Capítulo 1, tópico 9, as flautas foram divididas em 4 partes para
facilitar o seu transporte e permitir a adaptação das afinações que eram diferentes
em cada país ou cidade34.
Figura 5: Corps de Réchange
Fonte: BONNEMA, 2015
34
Em aulas com a professora especialista em flauta barroca Livia Lanfranchi, conversamos sobre estas afinações. De acordo com ela, elas variavam entre 390 e 460.
30
Figura 6: Corps de Réchange
Fonte: BONNEMA, 2015
Em 1726, Quantz acrescenta a segunda chave na flauta transversal.
Segundo o compositor em seu tratado, Capítulo I, tópico 8, a introdução de outra
chave no instrumento melhoraria a afinação de certas notas. Complementa no
Capítulo III, tópico 8, o motivo pelo qual opta por este acréscimo: as diferenças
existentes entre semitons maiores e menores.
Para o autor, quando uma nota, que está no mesmo espaço ou linha que
outra, é alterada por um sustenido ou bemol, a diferença entre ela e a nota principal
é de um semitom menor. Por exemplo: Ré - Ré#; Mi - Mib. Por outro lado, o semitom
maior ocorre entre notas que estão em posições diferentes no pentagrama (a um
grau de distância), sendo que uma delas é alterada meio tom por um sustenido ou
bemol. Por exemplo: Ré – Mib; Ré# - Mi. Seguindo esta lógica, Quantz destaca no
Capítulo III, tópico 8, que existem diferenças de afinação entre as notas Ré# e Mib:
O semitom maior tem cinco comas; o semitom menor só tem quatro.
Consequentemente, o Mi bemol é um coma mais alto que o Ré sustenido.
31
Figura 7: Semitons
Fonte: MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode
pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 48
A ideia da segunda chave não resolvia totalmente os problemas de
afinação no instrumento, portanto, seu uso não foi concretizado, além disso, muitos
músicos não concordaram com a proposta de Quantz. Rodríguez ressalta:
[...]. Por esse motivo recebeu numerosas críticas de seus contemporâneos, especialmente do organista Andreas Sorge, com base em que por estes anos a grande maioria dos músicos haviam adotado um temperamento igual, enquanto que para Quantz, ainda existiam diferenças entre Re# e Mib
35. [...]. (RODRÍGUEZ, 1997, p. 6, tradução nossa).
De acordo com Mary Oleskiewicz (2000, p. 214), mais ou menos próximo
ao período de escrita do Versuch, Quantz realiza sua grande e última transformação
na flauta: a utilização do tuning slide (Figura 8). Este dispositivo é acrescentado na
cabeça da flauta (bocal), permitindo que ela seja alongada ou encurtada do corpo do
instrumento. Reilly, na tradução do tratado de Quantz para o inglês (1966, p. 34),
aponta que este compositor, em sua autobiografia, atribui a si mesmo a invenção do
tuning slide, no entanto, no Versuch, Capítulo 1, tópico 15, apenas indica que
experimentou este dispositivo e o achou muito válido para seu instrumento36.
Destaca também a praticidade do alongamento e encurtamento do bocal da flauta
em detrimento do pé37, por não prejudicar a afinação.
Além disso, Quantz ressalta a importância do sistema de rolha na parte
superior do bocal da flauta para a melhoria da afinação das oitavas (Figura 8). Tal
sistema “[...] possibilitava ao instrumentista puxar ou empurrar a rolha para afinar o
instrumento e, para tal fim, contava com um parafuso anexado a ela” (ARAÚJO,
35
Por este motivo recibió numerosas críticas de sus contemporáneos, especialmente del organista Andreas Sorge, fundadas en que por estos años la gran mayoría de los músicos habían adoptado el temperamento igual mientras que para Quantz, aun existían diferencias entre Re# y Mib. 36
Nas aulas com a professora Livia Lanfranchi, conversamos sobre as flautas utilizadas por Quantz. Estas flautas, com corpos de troca, tinham a afinação por volta de 392 Hz (afinação francesa em voga na corte de Dresden e Berlim). 37
No capítulo 1, tópico 14, Quantz fala da divisão do pé da flauta em duas partes (poderia ficar mais longo ou mais curto para ajustar a afinação das notas). No entanto, Quantz faz objeção a este invento (não fala quem inventou), alegando que o mesmo prejudica a afinação geral do instrumento.
32
1999, p. 5-6). Segundo Quantz, Capítulo 1, tópico 11, o emprego dos corps de
réchange precisam estar de acordo com o movimento da rolha, isto é, se utilizarmos
um corpo de troca maior, empurramos a rolha mais para perto do orifício do bocal,
se um corpo menor, empurramos mais para longe.
Adicionalmente, no Capítulo I, tópico 10, Quantz afirma que o sistema de
rolha é indispensável para a flauta: conforme o manuseamos, estabelecemos um
som agradável ou não. Se empurrarmos a rolha muito para dentro ou muito para
fora, prejudicamos a beleza deste som e consequentemente a afinação. Ainda sobre
o sistema de rolha, Mary Oleskiewicz (2000, p. 217, tradução nossa) destaca que:
“Mahaut38 atribuiu esta invenção, assim como o registro no pé, ao professor de
Quantz, Buffardin, e isso provavelmente formou uma parte do projeto de Quantz39”.
.
Figura 8: Tuning Slide e Sistema de Rolha
Fonte: OLESKIEWICZ, 2014, p. 215
Em 1739, Quantz passa a fabricar flautas. Em seu tratado, Capítulo 1,
tópico 18, traz algumas recomendações quanto ao material apropriado para a
fabricação. Recomenda madeiras duras, tais como: buxu, ébano, jacarandá, dentre
outros. A madeira Buxu é a mais duradoura e a mais comum na fabricação de
38
Antonie Mahaut (1720-1785) atribui a invenção do sistema de rolha ao flautista Buffardin. Descreve este fato em seu método publicado em 1759: Nouvelle Méthode pour Apprendre en peu de tems a Joüer de la Flute Traversiere. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/flute-builder>. Acesso em: 20 mar. 2015. 39
Mahaut credited this invention, as well as that of the foot register, to Quantz's mentor Buffardin, and it probably formed a part of Quantz's design from the first.
33
flautas, no entanto, a ébano produz um som mais belo e claro. No tópico 19
recomenda a manutenção da flauta com óleo de amêndoas.
Laura Rónai (2008, p. 63) ressalta outros fabricantes de flauta do período:
Pierre Jaillard Bressan (1663-1730), Karl August Grenser (1720-1807), Jacob
Denner (1681-1735), Carlo Palanca (1690-1783), dentre outros, “[...] cujas flautas
ainda servem de modelo para os atuais fabricantes de réplicas de instrumentos
barrocos”.
Nancy Toff destaca pontos importantes sobre a história da flauta dentro
do período barroco. De acordo com esta autora (2012, p. 183), Manfred Bukofzer
divide a época barroca em três grandes períodos: início (1580-1630); meio (1630-
1680); tardio (1680-1730). Quando nos referimos à flauta transversal, segundo
Bukofzer, os dois primeiros períodos são irrelevantes, uma vez que a chave de Ré#
não havia sido inventada até a metade do segundo período. A fim de discutir a
literatura sobre flauta, Nancy Toff afirma:
[...] Definirei a era barroca como sendo o período que corresponde à exclusiva proeminência da flauta de uma chave, de aproximadamente 1660 a 1760, embora essa não seja uma definição sem ressalvas: a música para flauta, pré-1700, é quase inexistente. O final da era é particularmente difícil de quantificar, muito porque as transformações de estilo que ocorreram em meados do século dezoito eram, de região para região, inconsistentes. Estudiosos propuseram um número de explicações para a hibernação da flauta transversa durante o século dezessete, período que corresponde ao médio-barroco de Bukofzer. Talvez, alguns historiadores argumentem que isso se deva ao crescente papel da flauta transversa (pífano) na música militar, fato que continuou até que a família das charamelas substituísse o pífano durante o reinado de Luís XIV. (TOFF, 2012, p. 183, tradução nossa)
40.
40
[…] I shall define the baroque era as that period corresponding with the exclusive prominence of the one-keyed flute, from approximately 1660 to 1760, though this definition is not without caveats: pre-1700 flute music is nearly nonexistent. The end of era is particularly difficult to quantify, more so since the transformations of style occurring in the mid-eighteenth century were not consistent from nation to nation. Scholars have proposed a number of explanations for the hibernation of the transverse flute during the seventeenth century, the period corresponding to Bukofzer's middle baroque. Perhaps, some historians argue, it was due to the growing role of the transverse flute (life) in military music, which was to continue until the shawm family superseded the fife during the reign of Louis XIV.
34
CAPÍTULO 3
3. O tratado Versuch einer Anweisung die Flöte traversiere zu spielen:
repercussão e influência
Acredita-se que o trabalho intitulado Solfeggi Pour la Flûte traversière
avec l’enseignement, par Monsr. Quantz41 foi escrito por Johann Joachim Quantz
antes do seu tratado para flauta. Segundo Winfried Michel e Hermien Tesky (editores
do trabalho supracitado), o Solfeggi foi desenvolvido entre os anos de 1728 e 1742.
Rodolfo Murillo destaca:
Solfeggi Pour la Flûte traversière avec l’enseignement, par Monsr. Quantz é um documento muito importante que contém exemplos de músicas de vários compositores, destacados com muitos comentários didáticos do próprio Quantz. Sua publicação é baseada no manuscrito que se acredita ser o “registro didático” das aulas de flauta que Quantz deu a Frederico, o Grande. Michel e Tesky, os editores, datam o Solfeggi em algum momento entre 1728 e 1742. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 15, tradução nossa)
42.
Adicionalmente, Laura Rónai afirma:
[...]. E não pode propriamente ser chamado de método, pois se destina a um aluno em particular, merece, contudo, ser estudado ao lado dos outros métodos e tratados do Barroco, pela enorme quantidade de informações que traz, e por jogar luz sobre uma fascinante faceta da pedagogia, ainda mergulhada em sombras. [...]. (RÓNAI, 2008, p. 109-110).
Johann Joachim Quantz publicou o seu tratado para flauta, Versuch einer
Anweisung die Flöte traversiere zu spielen, no ano de 1752. Originalmente realizado
na língua alemã foi traduzido para diversos idiomas, o que demonstra sua
importância e repercussão no meio musical. Rodolfo Murillo em sua tese de
doutorado destaca no Capítulo II, Literature Review, páginas 20 e 21, algumas
41
Johann Joachim Quantz, Solfeggi Pour La Flûte Traversière avec l’enseignement, par Monsr. Quantz. Primeira edição baseada no manuscrito de Winfried Michel e Hermien Teske (Winterthur, Switzerland: Amadeus Verlag, Bernhard Päuler, 1978). (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 15). 42
The Solfeggi Pour la Flûte traversière avec l’enseignement, par Monsr. Quantz is a very important document that contains music examples by various composers marked with many of Quantz’s own teaching commentaries. Its publication is based on the autograph of what is believed to be the “teaching record” of the flute lessons that Quantz gave Frederick the Great. Michel and Tesky, the editors, date the Solfeggi somewhere between 1728 and 1742.
35
destas traduções43 cujas edições abarcam principalmente o século XX: duas
italianas (1992, 1993), uma inglesa (1966, 1976, 1985, 2001), duas japonesas
(1976), uma holandesa (ano desconhecido44) e uma parcial edição em polonês
(1994), além da tradução em espanhol feita por Murillo (tese de doutorado) a partir
das edições em francês (1752 e 1975).
De acordo com o autor Edward R. Reilly45 em seu livro Quantz and his
Versuch: three studies: ”As várias edições, traduções e citações do Versuch dão
ideia de sua popularidade e aceitação em diferentes países46” (REILLY, 1971, p. 40,
tradução nossa). Além disso, o autor destaca que não há como saber o número
exato de cópias e edições do tratado nos diversos países em que foi traduzido
durante o século XVIII, porém, por meio de alguns trabalhos da época, podemos
inferir a reação favorável ou não de professores e intérpretes em relação ao Versuch
neste mesmo período.
No capítulo II do livro supracitado, Reilly exemplifica com detalhes a
repercussão e influência do Versuch na Europa do século XVIII, especificamente nos
países Alemanha, França, Holanda, Inglaterra e Itália. Ao longo deste capítulo,
citaremos alguns exemplos das traduções do tratado de Quantz para os idiomas:
francês, holandês, inglês e italiano no decorrer do século já descrito.
Num período de 37 anos, 4 completas edições do Versuch surgiram na
Alemanha: 3 alemãs (1752 [original], 1780, 1789) e uma francesa (1752). Em
relação à primeira edição em alemão, Reilly nos aponta o título completo de
apresentação do tratado:
43
Murillo consultou a página Index Translationum - Bibliographie mondiale de la traduction para sua pesquisa relacionada às traduções do tratado de Quantz. Trata-se de uma base de dados que contém informações sobre várias obras traduzidas e comentadas. Para maiores informações acessar: <http://portal.unesco.org/culture/fr/ev.php-URL_ID=7810&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>. 44
De acordo com Edward Reilly, há uma edição em holandês datada de 1965. (REILLY, 1971, p. 68). 45
Edward Reilly fez a tradução do Versuch para o inglês. Contribuiu muito para a compreensão do tratado e outros aspectos relativos à vida e obra de Quantz. Exemplos: Further Musical Examples for Quantz’s “Versuch”, escrito em 1964; Quantz and the Transverse Flute: Some Aspects of His Practice and Thought regarding the Instrument, escrito em 1997. 46
The various editions, translations, and borrowings from the Versuch provide some indication of its popularity and acceptance in different countries.
36
Johann Joachim Quantzens./ Königl. Preussischen Kammer – musikus, / Versuch einer Anweisung/die/ Flöte traversiere/ zu spielen:/ mit verschiedenen, / zur Beförderung des guten Geschmackes/ in der praktischen Musik/ dienlichen Anmerkungen/ begleitet, / und mit Exempeln erläutert. / Nebst XXIV. Kupfertafeln. / Berlin, / bey Johann Friedrich Voss. / 1752. (REILLY, 1971, p. 41).
Exemplo da capa do Versuch:
Figura 9: Capa do tratado de Quantz
Fonte: Primeira edição do Versuch (1752)
37
Nas 14 primeiras páginas do escrito temos o Título, a Dedicatória e o
Prefácio, sendo que este último é datado de Setembro de 1752. A numeração
começa na Introdução e ao todo o tratado contém 334 páginas numeradas. Ao final
do Versuch, depois do último capítulo e antes das 24 tabelas de exemplos musicais,
19 páginas são dedicadas ao índice remissivo dos termos principais destacados por
Quantz ao longo do tratado. Tais termos vêm acompanhados por uma numeração
específica: os números romanos indicam o capítulo; os não romanos o tópico (cada
capítulo contém vários tópicos); se há dois números romanos (um ao lado do outro)
o primeiro indica o capítulo e o segundo a seção. Ao final destas 19 páginas, Quantz
separa uma em isolado para indicar três erros contidos ao longo do texto,
especificamente nas páginas 94, 292, 315.
Figura 10: Erros descritos por Quantz
Fonte: Primeira edição do Versuch (1752)
Tanto na primeira página da Introdução quanto na conclusão do último
capítulo da primeira edição, aparecem duas imagens do artista Georg Friedrich
Schmidt (1712-1775), que durante o século XVIII, trabalhou para Frederico II, rei da
Prússia47. A Figura 11, com a inscrição Principium Musicum representa Pitágoras
descobrindo a relação numérica entre os intervalos musicais. A Figura 12, com a
inscrição Executio anima compositionis apresenta: uma pessoa tocando um
instrumento de teclado, um flautista, um cantor e vários outros instrumentistas de
cordas.
47
Disponível em: <http://www.pastellists.com/Articles/SCHMIDTgf.pdf>. Acesso em: 24 Fev. 2014.
38
Figura 11: Principium Musicum
Fonte: Primeira edição do Versuch (1752)
Figura 12: Executio anima compositionis
Fonte: Primeira edição do Versuch (1752)
Quantz explica em uma das cartas48 enviadas ao grande músico e
historiador Padre Martini49 (1706-1784) a razão pelo qual acrescentou a imagem de
48
Para maiores informações sobre estas cartas, recomenda-se a leitura do capítulo II (Italy) do livro Quantz and his Versuch: three studies do autor Edward Reilly. 49
Padre Giovanni Battista Martini, Bolonha, 1706; Bolonha, 1784. “Ensaísta de música, professor e compositor. Monge e mais tarde sacerdote, serviu em S. Francesco, Bolonha, como organista (1722-5), depois como maestro di cappella. [...] manteve correspondência com muitas figuras proeminentes,
39
Pitágoras na Introdução do seu tratado: ele não quer equiparar-se a Pitágoras,
tampouco fazer demonstrações geométricas ou discorrer sobre a história da
matemática. Quer tornar evidente o trabalho daqueles que, de alguma maneira,
contribuíram em algo para a história da música. Segue uma pequena parte de uma
das cartas enviadas ao Padre Martini:
[...]. A verdadeira razão, em resumo, que me levou a escolher este assunto e mandar fazer dele uma referência para o meu livro, foi a memória de meu pai e de meus avôs, todos os quais foram da mesma profissão que aqueles ferreiros que, inocentemente, deram a Pitágoras a oportunidade da descoberta da altura de qualquer som. Não me comparo, de modo algum, com Pitágoras, mas um tanto por esta alusão, diligenciei fazer evidente que a profissão daqueles a quem devo a minha vida, já contribuiu com algo para o crescimento da música: tanto como o erro aparente e intencional do filho de um ferreiro também pode ajudar estimular um segundo Pitágoras a trazer uma luz mais clara à história do primeiro. Que verificação mais bonita poderia eu alguma vez esperar de minha alusão? (REILLY, 1971, p. 85, tradução nossa)
50.
Simultaneamente com a primeira edição em alemão, surgiu a francesa,
publicada em Berlim. O nome do tradutor não aparece no tratado e o título está
descrito desta maneira:
Essai d’ une methode/ pour apprendre à jouer/ de la/ flute traversiere, / avec plusieurs remarques/ pour servir au bon gout/ dans la musique/le tout eclairci par des exemples/ et par/ XXIV. tailles douces/ par/ Jean Joachim Quantz/ musicien de la chambre de sa majesté de roi/ de prusse. / Berlin, / chez Chretien Frederic Voss1752. (REILLY, 1971, p. 42).
Já no prefácio em alemão, Quantz afirma a importância da tradução do
Versuch para o francês, uma vez que desta maneira o seu tratado poderia ser
conhecido em outros países. De acordo com Reilly (1971, p. 42), outro motivo pelo
qual Quantz apoiava a tradução do Versuch para o francês era agradar Frederico, o
Grande, e quaisquer outros alemães que tinham maior facilidade com a língua
francesa. Outra edição em francês teria surgido 13 anos após a primeira:
tendo formado uma biblioteca magnífica, incluindo retratos de músicos (preservada em Bolonha). [...]. (GROVE, 1994, p. 579) 50
[…]. To real reason, in short, which led me to choose this subject and to have a shield made of it for my book, was the memory of my father and my grandfathers, all of whom were of the same profession as those blacksmiths who innocently gave Phitagoras the opportunity to discovery the pitch of any sound. I do not compare myself in any way with pitagoras, but rather by this allusion I have endeavored to make evident that the profession of those to whom I owe my life has already contributed something to the growth of music: just as the apparent and willful error of a black-smith's son can also help the stimulate a second Phitagoras to bring a clearer light to the history of the first. What nicer verification could I ever expect from my allusion?.
40
[...]. Albert Quantz menciona uma edição, datada de 1765, do XXIV tailles douces para a tradução francesa. Ele foi incapaz de determinar se representava uma nova impressão da tradução francesa como um todo, ou se era uma publicação separada. Desde então, nenhum sinal de cópia foi encontrado, tanto dessas tabelas como do tratado que apresenta essa data. (REILLY, 1971, p. 43, tradução nossa)
51.
Na Holanda tivemos duas edições do Versuch: uma consiste na tradução
quase que completa para o holandês e a outra contendo apenas uma parte desta
mesma tradução. O responsável pelo texto (tradução datada de 1754) foi Jacob
Wilhelm Lustig, organista de Groningen e autor de vários livros de música (REILLY,
1971, p. 68). O título está assim descrito:
GRONDIG ONDERWYS/ Van den AARDT en de regte BEHANDELING/ DER/ DWARSFLUIT; / Verzeld met eenen/ TREFFELYKEN REGELENSCHAT/ VAN DE/COMPOSITIE/ En van de/ UITVOERING/ der voornaamste Musyk-stukken, op de/ Gebruikelykste Instrumenten; / Door lange ondervinding en schrandere opmerking, / in de Groote Muzykaale Wereld, verzameld/ door/ JOHANN JOACHIM QUANTZ/ Kamer-Musicus van Zyne Koninglyke Majesteit/ van Pruissen. / Uit he Hoogduitsche vertaald/ door/ JACOB WILHELM LUSTIG, / Organist van Martini Kerk te Groningen. / TE AMSTELDAM/ by A. OLOFSEN, Boek – en Muziekverkooper, / in de Grave Straat, by de Voorburgwal [modern reprint, Utrecht, 1965]. (REILLY, 1971, p. 68).
Na Inglaterra, o Versuch não foi completamente traduzido. Neste caso, a
tradução é de um breve trecho da obra original. Trata-se dos capítulos XIII e XV.
Conforme o título desta edição, o tratado seria de grande valia a cantores e
instrumentistas em geral e não menciona o Versuch como um método para flauta. O
nome do tradutor não é dado, tampouco a data de publicação. Estima-se que tenha
sido entre 1762 e 1798 (REILLY, 1971, p. 74). Título:
Easy and/ Fundamental/ Instructions/ Whereby either vocal or instrumental Performers/ unacquainted with Composition, may from the mere/ Knowledge of the most common intervals in Music, / learn how to introduce/ Extempore Embellishments or Variations; / as also/ Ornamental Cadences, / with Propriety, Taste, and regularity. / Translated from a famous Treatise on Musis, written/ by / John Joachim Quantz, / Composer to his Majesty the King of Prussia. / Price 7s – 6d/ London Printed by Welcker in Gerrard Street St. Ann’s Soho/ Where may be had, Practical Rules for learning Composition by John Joseph Feux [sic] 10-6. The Art/ of learning the Harpsichord by Heck 10-6. A Treatise on Singing by Dr. Nares 3-6. &&&. (REILLY, 1971, p. 73).
51
[...]. Albert Quantz mentions an edition, dated 1765, of the XXIV tailles douces for the French translation. He was unable to determine whether this represented a new printing of the French translation as a whole or whether it was a separate publication. No trace has since been found of a copy either of these tables or of the treatise bearing this date.
41
O tratado de Quantz, em sua versão em italiano, fez parte da biblioteca do
músico Padre Martini e atualmente pertence ao Museo Civico e Bibliografico
Musicale, na Bolonha (REILLY, 1971, p. 81). Segue a descrição do título:
Trattato di un Metodo per imparare a suonare il Flauto traversiere con/ molte osservazioni che servono per il buon gusto dela Musica ed il tut-/ to viene reso chiaro da esempli e da ventiquattro Stampe di Rame/ Dato in Luce da Gio: Gioachino Quantz Musico della Camera di sua Maestà/ il Re de Prussia. (REILLY, 1971, p. 81).
O texto em italiano não traz a data de publicação e nem o nome do
tradutor. Acredita-se que o conhecimento do Versuch de Quantz na Itália tenha sido
por intermédio do Padre Martini, especialmente através das cartas trocadas entre
este e Quantz no decorrer dos anos de 1761-1765. De acordo com Reilly:
[…] ainda não foi possível determinar quem foi o responsável pela tradução italiana do Versuch, quando ela foi realizada ou se foi amplamente divulgada. Pelas cartas e pelo trecho citado acima, está claro que Quantz enviou a Martini uma cópia do tratado em 1763. (REILLY, 1971, p. 86, tradução nossa)
52.
Segundo indica Rodolfo Murillo, em sua tradução do Versuch para o
espanhol (1997, p. 12), o tratado de Quantz é uma das fontes mais citadas na
literatura sobre performance musical do século XVIII. Podemos elencar alguns
exemplos: nos anos de 1762 e 1763 Friedrich Wilhelm Marpurg (1718-1795)
publicou uma antologia em três volumes denominada: Clavierstücke mit einem
practischen Unterricht für Anfänger und Geübte. De acordo com Reilly (1971, p. 44),
no terceiro volume Marpurg lança mão do capítulo XVII do Versuch.
Johann Samuel Petri (1738-1808) utiliza o Versuch em algumas seções
do seu tratado Anleitung zur praktischen Musik (1782): (i) na última parte em que
trata dos instrumentos de cordas; (ii) ao longo do tratado quando aborda a técnica
na flauta (postura, dedos, embocadura, etc) (REILLY, 1971, p. 45); entre outros.
Um ano antes da terceira edição em alemão do tratado de Quantz, o
músico Franz Anton Schlegel publica o seu trabalho: Gründliche Anleitung/ die Flöte
zu spielen, / nach/ Quanzens Anweisung. / Herausgegeben/ von/ Franz Anton
52
[...] it is not yet possible to establish who was responsible for the Italian translation of the Versuch, exactly when it was done, or whether it was widely circulated. From the letters and the insertion quoted above, it is clear that Quantz sent Martini a copy of treatise in 1763.
42
Schlegel. / Graz/ bei F. G. Weingand und Fr. Ferstl. /1788 (REILLY, 1971, p. 46). De
acordo com Reilly,
O trabalho é, de fato, uma versão resumida e modificada não do Versuch inteiro, mas da primeira das três divisões que compõem o trabalho original de Quantz, isto é, a porção destinada principalmente para o flautista. (REILLY, 1971, p. 46, tradução nossa)
53.
Johann Friedrich Agricola (1720-1774) nas notas acrescentadas ao
tratado Anleitung zur Singekunst54 (esta tradução para o alemão publicada em
1757), recomenda que os cantores estudem as seções do tratado de Quantz no que
concerne às: dinâmicas, cadências e variações (REILLY, 1971, p. 63).
Percebemos, portanto, que o tratado de Quantz foi bem referenciado,
tanto pelos autores citados, quanto por outros, tais como: Mattheson, G. M
Telemann, Adlung, Reichardt, Forkel, Sulzer e C. G. Schröter (REILLY, ed., On
Playing de Flute, 1966, p. xxxii). No entanto, podemos destacar algumas críticas
negativas feitas ao Versuch. É o caso do trabalho intitulado: Sei sonate da flauto
traverso e basso continuo, com um discorso sopra la maniera di sonar il flauto
traverso, publicado em 1753 por Joachim Von Moldenit. Reilly nos afirma:
Nas sonatas, ele exigiu uma extensão que excedesse àquela costumeira nas flautas da época, e em seu discorso acusou o método de Quantz de articular com a língua, explicando que tinha uma nova abordagem baseada no uso do lábio inferior. Os relatórios cáusticos acerca do trabalho de Moldenit apareceram em Historisch-Kritische Beyträge de Mapurg, o qual precipitou um outro trabalho de Moldenit, diretamente atacando Quantz a quem ele responsabilizou pela crítica de Mapurg. (REILLY, ed., On Playing the Flute, 1966, p. xxxii, tradução nossa)
55.
Somado a isso, temos o tratado Ausführlicher und gründlicher Unterricht
die Flöte zu spielen, escrito por Johann George Tromlitz (1725-1805) e publicado no
ano de 1791. Segundo Siqueira (2012, p. 49), “[...] assim como o tratado de Quantz,
é uma obra extensa, tratando praticamente dos mesmos assuntos abordados e da
mesma maneira detalhada. [...]”. Adicionalmente, Reilly destaca:
53
The work is actually an abridged and modified version not of the entire Versuch, but of the first of the three divisions that make up Quantz’s original work, that is, the portion intended primarily for the player of the flute. 54
Opinioni de' cantori antichi e moderni, do autor Pier Francesco Tosi, publicado em 1723. 55
In the sonatas he demanded a range exceeding that customary on the flutes of the day, and in his discorso attacked Quantz's method of articulating with the tongue, explaining that he had a new approach based on the use of the lower lip. Caustic reports of Moldenit’s work appeared in Mapurg’s Historisch-Kritische Beyträge with precipitated another work by Moldenit directly attacking Quantz, whom he felt responsible for Mapurg’s review.
43
Enquanto algumas seções do volume de Tromlitz são um pouco mais do que paráfrases livres do Versuch, e sua abordagem geral derive diretamente daquela de Quantz, em seu prefácio ele tem alguma dificuldade em explicar e defender a necessidade de um novo trabalho que suplante Versuch e, intencionalmente, questiona Quantz em uma série de fatores. O seu argumento inicial, que explica o objetivo de um novo trabalho para a flauta, é baseado na necessidade de instruções que poderiam seguir-se, independentemente de um professor. (REILLY, 1971, p. 50, tradução nossa)
56.
A bibliografia sobre Quantz e sua obra continua vastíssima e desenvolvida
por pesquisadores consagrados nas mais diversas áreas da música. Segundo Laura
Rónai:
O conselho de Quantz continua tão atual hoje quanto era há três séculos, quando o Versuch foi escrito. Absortos como estamos numa era que valoriza as aparências, a velocidade, destreza e superficialidade, na qual a capacidade de impactar, chocar ou simplesmente impressionar pelo virtuosismo é exaltado pela mídia, temos de levar em conta que a música era encarada de forma bem diversa no período Barroco. Se quisermos buscar uma empatia maior com o repertório desta época, devemos nos lembrar que os intérpretes de três séculos atrás sabiam ser o propósito de uma composição, muito mais do que apenas entreter o público. Este devia ficar profundamente emocionado ou levado a perceber os vários “afetos” da música, como alegria, tristeza, entusiasmo. (RÓNAI, 2008, p. 234).
3.1. Características Gerais do tratado de Quantz
Até a segunda metade do século XIX, os estudos repetitivos de mecânica
não faziam parte da rotina diária de um estudante de música. Laura Rónai (2008, p.
111) nos afirma que “[...] a ideia de estudos diários de repetição não é congenial ao
século XVIII. Estudos mecânicos aparecem pela primeira vez no século XIX, junto
com toda uma mudança na maneira de conceber o mundo”. Podemos inferir que, de
alguma maneira, tal mudança apontada por Rónai influenciou o meio artístico. De
acordo com esta autora,
56
While a few sections of Tromlitz's volume are little more than free paraphrases of the Versuch and his general approach derives directly from that of Quantz, in his preface he is at some pains to explain and defended to need for a new work to supplant the Versuch and pointedly takes issue with Quantz in a number of matters. His opening argument explaining the purpose of a new work on the flute is based on the need for instructions that could be followed independently of a teacher [...].
44
[...] Num século que descobre a industrialização, se encanta com as máquinas, e prepara o surgimento das linhas de montagem, parece natural imaginar que no estudo do mecanismo pode-se encontrar a fórmula mágica da fabricação de um músico. Assim como o exercício físico regular aprimora o atleta, é a repetição de passagens padrão que irá aprimorar o músico. [...]. De fato, as atividades artísticas em geral passam a depender não mais de um “dom”, de uma imersão num mundo de paixão, mas sim de uma disciplina voluntária, ao alcance de qualquer um. (RÓNAI, 2008, p. 111-112).
Com isso, a principal diferença entre os métodos de música do século
XVIII57 e XIX é o aprimoramento do corpo e a disciplina para um real
aperfeiçoamento do instrumentista: escalas, estudos de sequências intervalares,
arpejos, articulação, o uso do metrônomo em maior escala devem fazer parte da
rotina diária de um músico. Ainda segundo Laura Rónai,
Quando o assunto é metodologia de ensino, uma dessas lacunas é exatamente a organização do estudo diário. Isso porque caímos aqui numa armadilha previsível. A maior parte dos tratados, especialmente aqueles anteriores a 1800, não se pretende autossuficiente. Pressupõe a presença de um mestre, que será o responsável por orientar os estudos de seu aluno. E a maneira de estudar, propriamente dita, pretende exatamente à seara do mestre. (RÓNAI, 2008, p. 108).
De que maneira os flautistas do século XVIII aprimoravam sua técnica
instrumental? Constata-se que nos métodos anteriores a 1800 não havia qualquer
tipo de exercício padrão recomendado, nem mesmo em relação ao estudo de
dedilhados complicados (RÓNAI, 2008, p. 116). Em algumas passagens do Versuch
de Quantz, percebemos que ele concilia o estudo da técnica instrumental com obras
que fazem parte do repertório flautístico. Vale ressaltar que tais obras não foram
escritas especificamente para aprimorar a técnica, mas Quantz as utiliza para tal fim.
No Capítulo X, tópico 5, nosso compositor destaca58:
O iniciante deve escolher peças curtas e fáceis para treinar a embocadura, a língua e os dedos, de modo que não esforce mais a memória do que a língua e os dedos. Estas peças podem ser compostas em tonalidades fáceis, tais como Sol maior, Do maior, Lá menor, Fá maior, Si menor, Ré maior e Mi menor. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 135, tradução nossa)
59.
57
Em 1791, quatro décadas depois de Quantz, Tromlitz em seu tratado Ausführlicher und gründlicher Unterricht die Flöte zu spielen discute a ideia de exercícios de mecanismo inseridos na rotina do estudo diário. (RÓNAI, 2008, p. 118). 58
Ver também Introdução, tópico 13 e Capítulo X, tópicos 8 e 10. 59
El principiante debe escoger piezas cortas y fáciles para adiestrar la embocadura, la lengua y los dedos, de manera que no se esfuerce más la memoria que la lengua y los dedos. Estas piezas
45
Somado a isso, Quantz nos demonstra a importância da repetição para o
aprendizado de uma passagem complicada. Tal repetição é realizada no próprio
estudo da obra. O autor indica no Capítulo X, tópico 3: não devemos tocar uma peça
a uma velocidade superior àquela em que somos capazes de realizar. Pelo contrário,
precisamos nos esforçar para expressar claramente as notas e repetir
frequentemente o que os dedos, a princípio, não pode executar.
Laura Rónai (2008, p. 116) afirma que: “A repetição de trechos sempre foi
uma ferramenta útil ao aprendizado. O que não existia, isso sim, eram os exercícios
de mecânica, aos moldes de Taffanel & Gaubert60 [...]”. Portanto, através dos
exemplos descritos, percebemos que em seu tratado, Quantz destacou algumas
ferramentas necessárias à prática instrumental, apesar da não utilização de
exercícios mecânicos. Rónai aponta:
Apesar de mencionar exercícios de caráter eminentemente técnico, Quantz está se referindo a peças já existentes no repertório de qualquer flautista, e não a exercícios mecânicos. Todo o estudo diário é feito a partir da seleção de trechos dentro de um repertório geral que não foi concebido especificamente para aprimorar a técnica. O que mais se aproxima ao estudo de mecânica dos séculos posteriores é seu conselho em relação a trilos: o principiante “deve praticar trilos diariamente em todas as tonalidades, de modo a fazer seus dedos adquirirem fluência”. [...]. (RÓNAI, 2008, p. 116).
Para Quantz, um instrumentista virtuoso é aquele que, além de dominar a
técnica de seu instrumento, possui um conhecimento significativo de harmonia,
estilo, análise, ornamentação, dentre outros aspectos considerados importantes para
uma boa interpretação musical (RODRÍGUEZ, 1997, p. 4). Quantz destaca no
Capítulo X, tópico 18, o caminho necessário para que um flautista seja um
verdadeiro músico: aprender composição, baixo contínuo e canto. O conhecimento
da arte de cantar, por exemplo, nos auxilia na ornamentação de um Adagio.
Além disso, o compositor afirma no Prefácio de seu tratado que não
pretende formar o flautista unicamente nos aspectos técnicos. Pelo contrário, deseja
que o estudante de flauta tenha uma formação integral em seu aprendizado de
música. Por exemplo: um gosto musical refinado; que saiba acompanhar outros
pueden ser compuestas en tonalidades fáciles tales como Sol mayor, Do mayor, La menor, Fa mayor, Si menor, Re mayor, y Mi menor. [...]. 60
Checar o “Méthode Complète de Flûte” dos autores Taffanel & Gaubert.
46
instrumentistas; que conheça por completo o repertório que irá tocar, inclusive as
partes acompanhantes.
O Versuch de Quantz é uma das principais fontes de informação sobre a
interpretação musical do século XVIII (LINDE, 1979, p.14), tornando-se assim um
dos mais importantes tratados deste período (LOZANO, 2009, p. 20). Siqueira em
sua tese de mestrado define de maneira bem clara e resumida as principais
características deste escrito:
Trata-se de uma obra de grande fôlego, a qual trata de um sem-número de assuntos concernentes não apenas à flauta (sua história, sua construção e a maneira de tocá-la), mas também ao fazer musical corrente em seu tempo, como um todo. Quantz discorre sobre as qualidades que alguém que almeja seguir a profissão de músico deve possuir caso queira obter algum sucesso com ela, fala sobre estilos nacionais, esclarece questões de andamento, versa sobre as várias maneiras de se ornamentar um adagio, dá conselhos sobre a disposição dos músicos no palco para as mais diversas formações camerísticas, opina sobre o que deve ser levado em conta ao julgarmos uma composição musical... Essa riqueza de conteúdo é o que afere ao seu tratado a grande importância que ele tem para o movimento da música historicamente informada: é uma das principais fontes de conhecimento acerca do fazer musical do período barroco. (SIQUEIRA, 2012, p. 47).
Por esta razão, merece ser conhecido e estudado por todos os músicos,
não só flautistas, que desejam aperfeiçoar-se na interpretação do repertório do
século XVIII. Quantz afirma no Prefácio de seu tratado:
Por isso que me prolongo um pouco explicando as regras do bom gosto na prática musical. Ainda que as tenha aplicado principalmente em relação à flauta transversal, estas mesmas regras poderão ser de utilidade a todos aqueles que se dedicam a arte de cantar ou de tocar outros instrumentos e desejam cultivar uma boa interpretação musical. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. i, tradução nossa)
61.
Percebemos, portanto, a completude do Versuch em relação ao fazer
musical de seu tempo. Quantz oferece várias ferramentas para o estudo da técnica
instrumental e performance, nos auxiliando assim na conquista de uma interpretação
musical consciente, prazerosa e inteligente.
Visando auxiliar àqueles que desejam estudar o tratado de Quantz como
um todo, desenvolvemos duas tabelas que apresentam uma visão geral do Versuch,
61
Es por eso que también me he extendido un poco explicando las reglas del buen gusto en la práctica de la música. Y aunque las he aplicado principalmente en relación a la flauta travesera, estas mismas reglas podrán ser de utilidad a todos aquellos que se dedican al arte de cantar o de tocar otros instrumentos y que deseen cultivar una buena expresión musical.
47
elencando resumidamente as características de cada capítulo. Vale ressaltar, que
Frederick Neumann em seu artigo The use of baroque treatises on musical
performance, faz apontamentos muito interessantes sobre o estudo aprofundado de
um tratado de música. Dentre estes apontamentos, podemos destacar:
personalidade do autor, relação do tratado com outras fontes, a quem o tratado é
dirigido (estudantes iniciantes, avançados ou artistas), dentre outros (NEUMANN,
1967, p. 316).
Na Tabela 1 apresentamos: Título, Dedicatória, Prefácio, Introdução. Na
Tabela 2, os Capítulos.
48
Tabela 1: Título, Dedicatória, Prefácio, Introdução
Título
Método para aprender a tocar la Flauta Travesera, con diversas observaciones para promover el buen gusto en la musica. Todo esto ilustrado con ejemplos en XXIV tablas gabradas en cobre por Johann Joachim Quantz, musico de camara de su majestad el Rey de Prussia. Berlin, Frederick Voss 1752, / Essay of a method for playing the Transverse Flute, accompanied by several Remarks of service for the Improvement of Good Taste in Practical Music, and illustrated with examples. With XXIV copperplate tables. By Johann Joachim Quantz, Royal Prussian Chamber Musician. Berlin, Johann Friedrich Voss 1752.
Dedicatória Dedica o tratado ao rei da Prussia, Frederico II.
Prefácio
Quantz nos apresenta o seu tratado afirmando que o entrega a todos os amantes da música; Ressalta que o Versuch é um método que indicará passo a passo todo o necessário para que se toque bem a flauta transversal, porém incentiva a pesquisa em outras fontes; As regras e exemplos musicais que destaca servirão a todos os músicos que querem desenvolver uma boa interpretação musical; Uma interpretação musical com êxito depende não só dos solistas, mas também dos músicos acompanhantes; Formação integral do flautista que vai além da técnica; Justifica o emprego dos dois últimos capítulos (músicos solistas e acompanhantes); Não quer impor regras aos músicos que tanto na interpretação, quanto na composição, estão em destaque. Ao discutir no livro o que os distingue de tantos outros, coloca em evidência seus méritos e obras; Quantz mostrará aos jovens dedicados à música o que devem fazer para seguir os passos destes homens bem sucedidos em suas carreiras musicais; Ressalta mais algumas observações que são para promover o bom gosto musical; Destaca a importância da tradução do tratado para o francês, para que seja conhecido em outros países; O prefácio termina datado de setembro de 1752.
Introdução: As aptidões
necessárias para aqueles que
desejam se dedicar à música.
21 tópicos; Conselhos e opiniões sobre a profissão de músico. Temos talento para seguir a profissão? Ou estudamos porque alguém nos disse que seria importante? Os que se dedicarão profissionalmente à música devem contar que com o tempo obterão destaque; os que não querem seguir a profissão podem encontrar reconhecimento e prazer na leitura do tratado; Requisitos necessários para ser um bom músico: talento, amor e um bom professor; Ao estudante de música aconselha a dedicação plena aos estudos (reflexão e atenção); Importância do conhecimento musical como um todo: composição, harmonia, etc; Cuidado com o orgulho, o excesso de autoconfiança pode ser um dos maiores impedimentos para o desenvolvimento de um músico; Tocar flauta não danifica o corpo, no entanto, devemos tomar alguns cuidados: não tocar imediatamente após as refeições e nem tomar bebida fria quando se acaba de tocar.
49
Tabela 2: Capítulos
Capítulos Características
I - Breve história e descrição da flauta transversal.
19 tópicos; Informações históricas sobre o desenvolvimento do instrumento, os tipos de flautas existentes e sua manutenção.
II - Sobre a maneira de sustentar a flauta transversal e como colocar os dedos.
9 tópicos; Instruções sobre a montagem do instrumento, postura, designação das mãos e dedos na flauta, cabeça, posição dos lábios.
III - Sobre a digitação ou disposição dos dedos e a escala na flauta.
12 tópicos; Informações detalhadas sobre a digitação na flauta, afinação, escalas, questão do temperamento neste instrumento, tabelas de digitação e digitações alternativas.
IV - Sobre a embocadura.
26 tópicos; Comparação da estrutura da flauta com a da traqueia (existe uma grande relação entre a produção do som na flauta e a produção do som na traqueia): explicação detalhada; Formação do som através da disposição dos lábios (embocadura); Qualidade sonora, mudanças de registro, respiração e timbre.
V - Sobre as notas, seus valores, o compasso, os silêncios e outros símbolos utilizados na Música.
27 tópicos; Explicação das claves de sol, fá e dó, valores das notas musicais, tonalidades, escalas, os tipos de compassos, solfejo, regras quanto à execução, alguns termos em italiano (da capo, bis) e outros símbolos musicais.
VI - Sobre o uso da língua ao tocar a flauta.
Antes das seções, dois tópicos; Função da língua na articulação, ela é indispensável para a expressão musical e assume o mesmo papel que o arco para o violino; Para que tenhamos uma boa articulação na flauta, é necessário que se pronuncie certas sílabas enquanto assopramos, por exemplo: ti, di, tirí e did’ll. Exemplos de aplicação em diversas situações; 3 seções, a primeira com 13 tópicos, a segunda com 9 e a terceira com 16; Logo após as três seções, Quantz coloca um acréscimo ao Capítulo 6, em que faz várias observações sobre o uso do fagote e oboé (6 tópicos); Seção I (Sobre o uso da língua com as sílabas ti ou di): o ti deve ser empregado para atacar notas iguais, rápidas e vivas; o di em melodias lentas, com ataques mais delicados. Exemplos musicais com o emprego destas duas sílabas; Seção 2 (Sobre o uso da língua com as sílabas tirí). Este tipo de articulação é usado em passagens de movimentos lentos. Faz-se necessário para tocar notas pontuadas (por exemplo, a figura rítmica “colcheia pontuada/semicolcheia”), pois as expressam com mais força e vivacidade. Exemplos musicais com o emprego desta articulação; Seção 3 (Sobre o uso da língua com o vocábulo did’ll, ou ataque com duplo golpe de língua). A articulação com duplo golpe de língua é utilizada para as notas que são executadas com grande rapidez. Exemplos musicais com o emprego desta articulação e das outras já mencionadas; Acréscimo ao Capítulo 6 (Algumas observações para o uso do oboé e do fagote): O fagote e oboé possuem várias características comuns à flauta transversal, com exceção da digitação e embocadura. Os músicos que se dedicam a estes instrumentos podem se beneficiar com as instruções dadas em relação a duas articulações: ti e tirí. Várias outras observações.
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VII – Como respirar ao tocar a flauta.
10 tópicos; Regras aplicadas durante a divisão das frases (respirar nos momentos adequados); Exemplos musicais com demarcações das respirações.
VIII - Sobre as apojaturas e outros pequenos ornamentos essenciais.
19 tópicos; As apojaturas (do italiano appogiature) são ornamentos necessários; Sem elas a melodia seria mais simples e seca. São indicadas por notas menores acrescentadas à nota principal; Exemplos musicais com diversos tipos de apojaturas e explicação detalhada de como executá-las; Pequenos ornamentos: trinados de meio tom, pincé (mordente) e doublé ou grupeto (exemplos e explicação de cada um deles). De acordo com Quantz, os franceses utilizam estes ornamentos para dar lucidez a uma peça. Explicação sobre os battements.
IX - Sobre os trinados.
13 tópicos; Como as apojaturas, os trinados são indispensáveis. Exemplos de como executá-los (varia de acordo com a peça e velocidade da mesma); Tabela de digitação para cada trinado. Devemos praticar os trinados diariamente em todas as tonalidades de modo a fazer nossos dedos ganharem agilidade e fluência.
X - Sobre o que um principiante deve observar em sua prática individual.
23 tópicos; Quantz aconselha que os estudantes de flauta busquem outras fontes de estudo além de seu tratado, como, por exemplo, um bom professor; Resumo das recomendações anteriores para que o estudo do instrumento seja efetivo (peças que o estudante pode praticar diariamente, postura, mãos, boca, respiração, solfejo, golpes de língua, dentre outros); Ressalta a importância de ter todos os princípios que ele desenvolveu nos capítulos anteriores de maneira clara e resumida; Em uma melodia escrita no estilo italiano não se indicam todos os ornamentos, diferente do estilo francês.
XI - Sobre uma boa expressão musical em geral ao cantar ou tocar um instrumento.
21 tópicos; Relação entre a interpretação musical e a oratória (o orador e o músico têm os mesmos objetivos quanto à composição e rendimento de suas produções); Características da voz de um orador; Importância de uma boa interpretação musical (os sentimentos que uma música pode despertar nos ouvintes dependem do compositor e do intérprete): muitas vezes, a composição pode ser arruinada por uma má interpretação e uma composição medíocre pode ser melhorada por uma boa interpretação; Uma boa interpretação depende de todo o conjunto, não só dos solistas, sejam eles instrumentistas ou cantores; Características e regras de uma boa interpretação musical, por exemplo, a execução deve ser clara e todas as notas bem afinadas e tocadas no valor correto (exemplos musicais); A execução deve ser fácil e fluida (a dificuldade não deve ser aparente), dentre muitas outras características; Interpretação de sentimentos que dominam uma peça. Como reconhecê-los?
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XII - Sobre a maneira de tocar o Allegro.
27 tópicos; Os vários tipos de Allegro (Allegro, Allegro Assai, Allegro non presto, Allegro ma non tanto, Allegro moderato, dentre outros); O Allegro se caracteriza por sentimentos de alegria e de vitalidade. Já o Adagio expressa ternura e tristeza; Tomar muito cuidado com a execução do Allegro, as notas devem ser bem claras e tocadas no valor correto; Colocar bastante atenção na articulação e nos golpes de língua; respirar nos lugares corretos, administrar bem o ar; Em uma melodia simples devemos ornamentá-la de acordo com o sentimento existente na peça. Características gerais de execução de um Allegro (passo a passo).
XIII - Sobre as mudanças ou variações arbitrárias em intervalos simples.
44 tópicos; Ornamentos essenciais e improvisação (análise e instruções). Para as variações, Quantz orienta passo a passo como devemos ornamentar uma nota simples e intervalos, sem prejudicar a harmonia da peça; Tabelas com diversos exemplos e explicações detalhadas de cada figura (em cada uma Quantz exemplifica ornamentações): tomar cuidado com a harmonia, notas principais, interpretação, observar bem o caráter da obra, não cometer exageros em relação ao acréscimo de ornamentos, dentre muitos outros; Todas as regras descritas por Quantz servirão principalmente para o Adagio, já que, por se tratar de um movimento lento, temos mais tempo para a introdução dos ornamentos e variações.
XIV - Sobre a maneira que se deve tocar o Adagio.
43 tópicos; Reconhecimento de um bom intérprete a partir de como ele executa um Adagio. Existem duas maneiras diferentes de tocar este movimento: a primeira é a francesa e a segunda italiana. A francesa requer uma expressão nítida e a melodia vem acompanhada de ornamentos essenciais como apojaturas, trinados, mordentes, grupetos, flattements e battements, dentre outros. No estilo italiano, além dos ornamentos essenciais, o intérprete tem a liberdade de improvisar, desde que não afete a harmonia da obra; Quantz exemplifica os ornamentos em tabelas. Os compositores franceses geralmente escrevem os ornamentos essenciais em suas obras, já os italianos não; Os vários tipos de Adagio existentes: Cantabile, Arioso, Andante, Andantino, Affetuoso, etc. Ao tocar um Adagio, devemos ter em mente o sentimento que ele evoca e todas as outras características que o envolve, por exemplo, tonalidade, compasso, melodia, harmonia, respiração, ornamentos, dinâmicas (piano e forte), etc; Tabelas com exemplos de ornamentação num Adagio e explicação detalhada (tabelas XVII, XVIII e XIX): como executar, quais as dinâmicas, duração das notas, dentre outros.
XV - Sobre as cadências.
36 tópicos; Como Quantz define cadência; pequeno contexto histórico sobre o seu uso; Propósito e função das cadências melódicas improvisadas em concertos e obras solo; necessidade de adequá-las de acordo com o sentimento evocado pela peça; Cuidado com o abuso, quando e como devemos usar uma cadência; estrutura harmônica e cadências a duas vozes; Exemplos de cadências em tabelas.
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XVI - Sobre o que um flautista deve observar ao tocar em público.
33 tópicos; Cuidados necessários para uma apresentação: afinação do instrumento com os demais músicos, condições físicas da sala (temperatura, acústica, etc), sustentação da flauta, estar atento ao andamento da obra, atenção direcionada a obra em si e não ao público (principalmente se o intérprete for tímido), praticar bastante, no entanto, sem abusos, eleição do programa, dentre muitos outros.
XVII - Sobre as responsabilidades dos acompanhantes ou daqueles que executam as partes de ripieno que acompanham a uma parte concertante.
6 tópicos antes das seções. Seção 1, 18 tópicos. Seção 2, 35 tópicos. Seção 3, 17 tópicos. Seção 4, 12 tópicos. Seção 5, 8 tópicos. Seção 6, 33 tópicos. Seção 7, 60 tópicos; Música em distintas épocas e lugares; Seção 1 (Sobre as características do líder de uma orquesta). Uma boa execução depende muito do regente; Características gerais de um líder: instrumentos que deve tocar, experiência em orquestras, ser capaz de tocar todo tipo de obra de acordo com o estilo, observar os compassos com precisão, afinação, saber dispor os músicos no ambiente em que forem tocar, saber a quantidade de músicos para uma determinada composição, trato com os demais instrumentistas, dentre outras; Seção 2 (Sobre os violinos acompanhantes em particular). Cordas proporcionais ao tamanho do instrumento; Golpes de arco e suas características (intensidade, efeitos, articulações, etc); Tabelas com exemplos musicais e explicação de cada figura; Apojaturas, trinados, mordentes, afinação; Maneiras distintas de levar o arco. Exemplo: nos movimentos Allegro, Allegro Assai, Vivace, Presto, Allegro di molto, exige-se uma arcada mais vivaz, curta e bem separada; uso da surdina e pizzicato; Seção 3 (Sobre o violista em particular). A viola é considerada um instrumento de pouca importância na música, no entanto este instrumento é muito importante para a música e a orquestra. Características de um bom violista: saber expressar-se bem musicalmente, conhecer harmonia, saber adequar uma arcada, reconhecer as notas que devem ser ressaltadas em uma melodia, conhecimento de estilos e gêneros musicais, dentre outras; Seção 4 (Sobre o violoncelista em particular). É necessário que um violoncelista que toca em conjunto e faz solos tenha dois instrumentos, com o propósito de adequar-se a cada situação; características gerais das arcadas e som que deve produzir; tomar cuidado com o acréscimo de ornamentos no baixo sem o devido conhecimento de harmonia; características de uma boa execução no baixo contínuo (harmonia, dinâmica, etc); exemplos musicais; Seção 5 (Sobre o contrabaixista em particular). Como no caso da viola, há muitas pessoas que não reconhecem o valor que o contrabaixo possui dentro da música e a sua necessidade dentro de uma orquestra; tamanho e dimensão do instrumento (contribui para a claridade e nitidez da execução); golpes de arco; características que um contrabaixista deve possuir: ter uma boa digitação (deve tocar as notas superiores tão bem quanto um violoncelista), grande conhecimento na execução do baixo contínuo (cuidado com o acréscimo de ornamentos, dinâmicas com precisão), etc; tabelas com exemplos musicais; Seção 6 (Sobre o cravista em particular). Importância do conhecimento profundo do baixo contínuo: nem todos que sabem baixo contínuo são bons acompanhantes; regras gerais para que se toque bem um baixo contínuo: saber as características dos instrumentos que o acompanham (se o som que os instrumentos projetam é forte, fraco, se vão estar perto, longe, etc), harmonia, ritmo, dissonâncias, consonâncias, dinâmicas em função da harmonia, maneira de mover as mãos e dedos no teclado, temperamento, diferentes situações e tipos de acompanhamento (bastante ênfase no Adagio). Tabelas com exemplos; Seção 7 (Sobre os deveres de todos os que tocam instrumentos acompanhantes em geral). Para que uma orquestra produza um bom resultado sonoro é necessário que os músicos tenham bons instrumentos e saibam afiná-los corretamente; Para todos os instrumentistas: reconhecimento das proporções entre os intervalos musicais; diferenças entre bemol e sustenido. Cada peça é interpretada de acordo com seu gênero e suas características particulares; homogeneidade entre os músicos de uma orquestra (tocar uniformemente), saber as diferenças entre as dinâmicas, regularidade do ritmo, dentre muitas outras características necessárias a uma boa interpretação em conjunto, seja na orquestra ou música de câmara.
53
XVIII - Como se deve julgar a um músico e uma obra musical.
89 tópicos; Todos que trabalham com arte estão expostos a julgamentos, principalmente os músicos. Somos criticados em uma apresentação, caso não alcancemos um nível considerado excelente. Não se leva em consideração o todo; Podemos ter mérito em distintos gêneros. Às vezes um músico não toca bem em uma apresentação porque não está nas melhores condições de demonstrar suas habilidades. Este fato não tira a sua capacidade de interpretar uma obra (a maioria dos ouvintes se precipita em seus julgamentos e se deixa influenciar pelo que escuta inicialmente); A crítica musical envolve conhecimento: não é suficiente saber cantar ou tocar um instrumento. Como podemos reconhecer excelentes intérpretes e composições musicais? Dificuldades próprias de cada instrumento; Características gerais de um bom músico (cantor e instrumentista) e como criticar de maneira justa uma obra musical? Características de uma boa composição (diferentes tipos de música e maneiras de interpretação: músicas compostas para a igreja, para o teatro, música de câmara, etc); Música instrumental sem o uso da voz: Concerto, Abertura, Sinfonia, Quarteto, Trio e Solo. Concertos, Trios e Solos: concerto grosso e concerto de câmara; trios e solos são elaborados de acordo como se denominam. Explicação detalhada de cada um destes gêneros; Diversidade de estilos (italianos, franceses) e a música alemã (vocal e instrumental). Tabelas com exemplos musicais.
54
Figura 13: Proporção dos 6 temas gerais do Versuch de Quantz
Fonte: CIRILLO. Un "mapa" del tratado de Quantz62
.
62
Disponível em: <http://www.csmmurcia.com/musica_antigua/Quantz_mapa.htm>. Acesso em: 09 abr. 2015.
55
3.2. A arte de ornamentar segundo Quantz
A respeito da ornamentação desenvolvida no século XVIII, Linde (1979, p.
5) destaca que Quantz compreendia muito bem a clara divisão dos ornamentos em
essenciais (franceses) e livres (italianos). Em seu tratado, o compositor nos
apresenta no capítulo XIV, tópico 2, essas duas possibilidades de ornamentação
focadas para o Adagio:
O modo de tocar e ornamentar o Adagio pode ser concebido de duas maneiras diferentes. A primeira é a francesa e a segunda é a italiana. A primeira maneira requer uma expressão nítida e sustentada da melodia, é um estilo acompanhado de ornamentos essenciais, como apojaturas, trilos de tom inteiro e de meio tom, mordentes, grupetos, battements, flattements, etc. Por outro lado, não existem passagens extensas e nem muita ornamentação arbitrária. Na segunda maneira, ou seja, a do estilo italiano, além dos pequenos ornamentos franceses, há uma busca por ornamentos elaborados e refinados que devem sempre combinar com a harmonia. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 212, tradução nossa)
63.
Laura Rónai também afirma:
É exatamente o escopo de seu tratado, que descreve com igual zelo tanto os “ornamentos essenciais” característicos da música francesa, quanto as passagens ornamentais italianadas, que faz com que este seja até hoje nossa fonte de referência para desvendar os hábitos interpretativos flautísticos do século XVIII. (RÓNAI, 2008, p. 232).
Em alguns capítulos do Versuch, percebemos que o conhecimento
integral de música (ornamentação, composição, harmonia, dentre outros) é essencial
para uma boa interpretação do repertório do século XVIII. Especificamente sobre a
ornamentação, Quantz nos orienta: é necessário reconhecimento e precisão na
execução dos ornamentos escritos na partitura (ornamentação francesa), porém,
precisamos saber improvisar estes ornamentos, seguros de como e onde tocá-los na
obra em questão (ornamentação italiana). O autor ressalta que, sem os
conhecimentos musicais necessários, com destaque para os fundamentos da
63
El modo de tocar y ornamentar el Adagio puede considerarse de dos maneras diferentes. La primera es la francesa y la segunda es la italiana. La primera manera requiere una expresión nítida y sostenida de la melodía, y un estilo acompañado siempre de adornos esenciales, como apoyaturas, trinos enteros y medios trinos, mordentes, grupetos, battements, flattements, etcétera; pero por otra parte, no hay Pasajes extensos ni muchos adornos arbitrários. [...]. En la segunda manera, es decir, en la del estilo italiano, uno no se cuenta con los pequeños adornos franceses, sino que busca grandes adornos elaborados y refinados, que deben siempre acoplarse con la armonía. .
56
composição musical, é preferível que não nos arrisquemos nas variações, conforme
o Capítulo XIII, tópico 9.
Portanto, Quantz postula como estilo musical ideal “[...] aquele que inclua
os melhores aspectos da música de todas as nações” [...] (GROUT & PALISCA,
2001, p. 477). Somado a isso, Dart (2000, p. 116) afirma que Quantz é um grande
representante do estilo galante, ou seja, do estilo livre que permite a improvisação e
a ornamentação, além de trazer também características do estilo italiano e francês.
No capítulo XVIII do Versuch, tópico 89, Quantz destaca:
Num estilo que, como na Alemanha actual, consiste numa mistura dos estilos dos diferentes povos, cada nação encontra alguma coisa com que tem afinidades e que, deste modo não pode desagradar-lhe. Ao reflectir sobre todas as ideias e experiências acima citadas a propósito das diferenças entre estilos, deverá dar-se a preferência ao puro estilo italiano sobre o puro estilo francês. Porém, uma vez que o primeiro já não assenta sobre fundamentos tão sólidos como outrora, tendo-se tornado arrevesado e bizarro, e uma vez que o segundo permaneceu excessivamente simples, todos concordarão que um estilo onde se conjuguem e misturem os bons elementos de ambos será, sem dúvida, mais universal e mais agradável. Por um estilo musical que é acolhido e aprovado por muitos povos, e não por uma única terra, uma única província, ou uma única nação, um estilo musical que, pelos motivos acima apontados, não pode merecer senão aprovação, terá, por força, de se basear também no bom senso e num sentir escorreito, o melhor de todos. (QUANTZ, apud Grout & Palisca, 2001, p.477).
São muitos os exemplos no tratado de Quantz que demonstram o seu
conhecimento sobre a ornamentação e interpretação desenvolvidas na Itália e
França. Podemos destacar: Capítulo XIII, tópico 2; Capítulo XIV, tópico 3; Capítulo
XVIII, tópico 76. De maneira geral, num pequeno trecho do tópico 76, Quantz afirma:
Em uma só palavra, a música italiana é arbitrária e a francesa é restringida, de modo que se é para produzir um bom efeito, a francesa depende mais da composição que da execução, e a italiana, quase na mesma medida e em algumas peças, depende mais da execução que da composição. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 462, tradução nossa)
64.
Nas Tabelas 3 e 4 apresentamos as características gerais de alguns dos
ornamentos apontados por Quantz em seu Versuch. Espera-se que estes
64
En una sola palabra, la música italiana es arbitraria y la francesa es restringida, de manera que si há de producir un buen efecto, la francesa depende más de la composición que de la ejecución, y la italiana casi en la misma medida, y en algunas piezas depende todavia más de la ejecución que de la composición. [...].
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apontamentos sejam um guia para aqueles que desejam aprofundar-se no estudo da
ornamentação do século XVIII, em especial de acordo com Quantz.
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Tabela 3: Referências sobre os estilos italiano e francês no tratado de Quantz
Johann Joachim Quantz (1697-1773)
Tratado Versuch einer Anweisung die Flöte travesiere
Ano de publicação 1752
Estilo italiano e francês (ornamentos, composição e interpretação)
Alguns exemplos no tratado de Quantz: Capítulo VIII (Sobre as apojaturas e outros pequenos ornamentos essenciais), tópicos 14, 19; Capítulo XII (Sobre a maneira de tocar o Allegro), tópicos 26, 27; Capítulo XIII inteiro (Sobre as mudanças ou variações arbitrárias em intervalos simples); figura 25 do capítulo XIII; Capítulo X (Sobre o que um principiante deve observar em sua prática individual), tópicos 13, 17, 19; Capítulo XIV (Sobre a maneira que se deve tocar o Adagio), tópicos 2, 3, 4; Capítulo XVIII (Como se deve julgar a um músico e uma obra musical), tópico 76.
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Tabela 4: Os ornamentos segundo Quantz
Ornamento Alguns Exemplos
Ap
oja
tura
Apresentação
Capítulo VIII, tópico 1: As apojaturas (em italiano appogiature, em francês ports de voix) além de ornamentos, são também muito necessárias. Sem elas a melodia seria, frequentemente, seca e simples. Tópico 14: Outros tipos de pequenos ornamentos provêm da apojatura como o trinado de meio tom, o pincé (mordente) e o doublé ou grupeto. Tópico 18: Podemos mesclar estes ornamentos pequenos com a apojatura simples, no entanto, devem ser empregados com muita cautela. Capítulo XI, tópico 15: As apojaturas possibilitam unidade entre as partes do canto e enriquecem a harmonia. Checar a tabela VI, figura 26 do capítulo VIII: nesta, Quantz exemplifica a maioria dos tipos de apojaturas.
Movimento
Capítulo VIII, tópico 3: As apojaturas são um retardamento da nota precedente
65. Podem ser
descritas abaixo ou acima, de acordo com a posição da nota anterior (ver as figuras 1, 2, 3 e 4). Capítulo VI, Seção 1, tópico 8: Como regra geral, temos que fazer uma breve separação entre a apojatura e a nota anterior para que possamos escutar claramente a apojatura.
Apojatura Simples
Capítulo VIII, tópico 16: As apojaturas simples são usadas para despertar a ternura e a tristeza.
65
Na tradução para o inglês do Versuch, Reilly (1966, p. 92) afirma que Quantz fez uma pequena confusão neste trecho em que ressalta a apojatura como um retardamento da nota precedente. Este retardamento recai sobre a nota que sucede a apojatura e não sobre a que precede. Original em alemão: Die Vorschläge sind eine Aufhaltung der vorigen Note.
60
Ap
oja
tura
Apojatura longa
Capítulo VIII, tópico 7: Característica da apojatura longa: são aquelas que caem no tempo forte, ou no primeiro tempo do compasso, e que precedem uma nota longa que começa no tempo forte seguida por uma nota curta no tempo fraco (ver figura 11). Devemos sustentar a apojatura até a metade do valor da nota principal, de acordo com a figura 12. Tópico 9: Quando no compasso de seis por quatro ou de seis por oito há duas notas ligadas, das quais a primeira tem um ponto, como acontece nas gigas, devemos sustentar a apojatura igual o valor da nota com ponto (ver figuaras 15 e 16). Tópico 11: Quando uma apojatura precede uma nota seguida de pausa, damos à apojatura a mesma duração da nota, sendo que esta última recebe a mesma duração da pausa, a não ser que seja absolutamente indispensável tomar uma respiração (ver as figuras 23 e 24).
Apojatura curta
Capítulo VIII, tópico 2: Para não confundir as apojaturas com as notas da melodia, aquelas são indicadas com notas pequenas que tomam o valor da nota seguinte. Não importa muito que tenham mais de um colchete ou que não tenham nenhum. No entanto, normalmente, se usa um só colchete ou dois (nas apojaturas) antes das notas que não queremos tirar nada do seu valor; por exemplo, antes de duas ou mais notas longas, semínimas ou mínimas (ver a figura 25). Estas pequenas semicolcheias são tocadas bem brevemente e, vindas de cima ou de baixo, são executadas no tempo, no lugar das notas principais.
61
Ap
oja
tura
Dupla apojatura
Capítulo XIII, tópico 41: As notas pequenas dos exemplos a, b, c, d, e, f, g são chamadas de Anschalg ou dupla apojatura. São utilizadas pelos cantores para encontrar segurança em saltos distantes. A dupla apojatura resulta mais agradável nos intervalos de segunda, quarta e sétima, do que em outros (ver as figuras a, c e f). Portanto, para obter um melhor efeito, a primeira nota pequena deve estar numa distância de meio tom da nota principal, em vez de um tom inteiro (ver as figuras c e f). Devemos tomar cuidado ao empregar o Anschlag, não utilizá-lo de maneira exagerada.
Apojatura de
passagem
Capítulo VIII, tópico 5: Existem dois tipos de apojaturas. Em um, as notas devem ser atacadas como notas boas, isto é, no tempo forte; em outro, as notas devem ser atacadas como notas más, isto é, no tempo fraco. As primeiras, chamamos de apojaturas no tempo e as segundas, de apojaturas de passagem. Tópico 6: Encontramos as apojaturas de passagem quando temos várias notas do mesmo valor que descendem de intervalos de terça (ver a figuras 5). Devemos sustentar o ponto e articular as notas em que começam as ligaduras, ou seja, a segunda, quarta e sexta nota (ver a figura 6).
62
Tri
nad
o o
u T
rilo
(tr
)
Apresentação
Capítulo IX, tópico 1: Os trinados ressaltam infinitamente a execução musical, dando a esta um grande resplendor e, como as apojaturas, são indispensáveis. Tópico 7: [...] cada trinado começa com uma apojatura que é colocada antes da nota e pode ser tocado desde cima ou desde baixo. [...]. Tópico 8: Com frequência, a apojatura do trinado é tão rápida como as outras notas que constituem o trinado [...]. Capítulo XI, tópico 15: [...]. Os trinados dão vivacidade à expressão [...].
Trinados de meio tom
Capítulo VIII, tópico 14: Os trinados de meio tom são de dois tipos (ver as figuras 27 e 28) e podem ser agregados às apojaturas que vem de cima em lugar dos abzug simples. [...].Tópico 4: A língua deve articular levemente as apojaturas, mantendo de acordo com a duração, e ligando um pouco mais fraco a nota que se segue. Este tipo de ornamento se chama Abzug e provém dos italianos.
Terminação dos Trinados
Capítulo IX, tópico 7: [...] O final de cada trinado consiste de duas notas pequenas que vêm depois da nota com trinado e se executam na mesma velocidade (ver a figura 2). Em alemão chamamos Nachslag que significa "depois do tempo". Frequentemente, as notas pequenas são indicadas na partitura (ver figura 3); mas quando a nota aparece sozinha (ver a figura 4), devemos inferir a terminação do trinado, sem a apojatura e esta terminação, o trinado seria imperfeito, não teria suficiente resplendor.
63
Tri
nad
o o
u T
rilo
(tr
)
Maneira de executá-lo
Capítulo IX, tópico 2: Não é necessário executar todos os trinados numa mesma velocidade. Além de adaptar sua velocidade à peça, temos que ter em mente o espaço físico em que vamos executá-los. Se o lugar em que estamos tocando é grande e há muita ressonância, um trinado lento produzirá um melhor efeito do que um rápido, já que a alteração rápida das notas o torna confuso e perde sua claridade. Se, ao contrário, se está tocando em um lugar pequeno ou fechado, onde os executantes estão situados muito perto do intérprete, o trinado rápido é preferível ao lento. Além disso, temos que saber distinguir o tipo de peça que estamos tocando, para não confundir o trinado com nenhum outro, como acontece com tanta gente. Os trinados se executam lentamente em peças tristes, mas devem ser mais rápidos em peças alegres.
Apojaturas antes dos trinados
Capítulo IX, tópico 9: As notas que vêm antes do trinado, as apojaturas, são de dois tipos: podem estar a uma distância de um ou meio tom da nota principal. [...].
64
Batt
em
en
t
Apresentação
Capítulo VIII, tópico 15: O Battement é usado para dar vivacidade e lucidez às notas que vêm depois de um salto, nas quais não se podem usar apojaturas (ver as figuras 32 e 33). O primeiro tipo de battement acontece quando o ataque da língua e o movimento dos dedos acontecem ao mesmo tempo. Podemos utilizá-lo para as notas rápidas assim como para as lentas. O outro tipo é mais adequado para notas um pouco lentas. Portanto, é necessário que toquemos as fusas o mais rápido possível e que os dedos não se levantem demasiado ao executar este ornamento. Capítulo XI, tópico 15: [...] dão vivacidade à expressão [...].
Quando usá-lo?
Capítulo XII, tópico 14: Nas ideias musicais alegres, os trinados devem ser executados de uma maneira alegre e rápida. [...]. O battement pode ser usado quando existirem notas ascendentes. Ambos dão mais vitalidade e esplendor às passagens. No entanto, não se deve abusar para não causar desgosto.
Gru
peto
Apresentação
Capítulo VIII, tópico 14: Também chamado de doublé. Os franceses utilizam este ornamento para dar lucidez a uma peça. Pode ser acrescentado à apojatura que bem de baixo. Capítulo XI, tópico 15: [...] dão vivacidade à expresão [...].
Mo
rden
te
Apresentação
Capítulo VIII, tópico 14: Também pode ser chamado de Pincé. Usado pelos franceses para dar lucidez a uma peça. Assim como o grupeto, podem ser agregados às apojaturas que vem de baixo. Capítulo XI, tópico 15: [...] dão vivacidade à expressão.
65
Cad
ên
cia
Apresentação
Capítulo XV, tópico 1: Com a palavra cadência não me refiro aos fins das frases melódicas, muito menos aos trinados, que alguns franceses chamam cadences. Aqui me ocupo deste ornamento arbitrário que, de acordo com a vontade e fantasia do executante, interpreta a parte principal ao final da peça e sobre a penúltima nota do baixo, ou seja, a quinta da tonalidade em que está composta a obra. Tópico 6: Não se pode negar que as cadências são um grande ornamento quando introduzidas no lugar apropriado e quando estão bem feitas. [...].
Finalidade
Capítulo XV, tópico 5: A finalidade das cadências é de surpreender uma vez mais o ouvinte de maneira inesperada ao final da peça e de deixar uma impressão particular em seu espírito. Por esta razão, em uma peça, uma cadência basta; e se um cantor introduz duas cadências na primeira parte de uma área e outra mais na segunda, deve ser considerado um abuso, [...].
Fla
ttem
en
t
Apresentação
Capítulo XIV, tópico 10: Se temos que sustentar uma semibreve ou uma mínima, o que os italianos chamam messa di voce, primeiramente devemos de articulá-las delicadamente ou quase com uma mera exalação. Em seguida, começamos a assoprar, mas piano, aumentando a força da nota até a metade. Na continuação, vamos diminuindo até o fim da duração da nota, efetuando ao mesmo tempo um flattement com o dedo no orifício mais perto. [...].
66
3.2.1. A arte de ornamentar o Adagio
Como anteriormente mencionado no tópico 3.1, o Versuch de Quantz é
reconhecido como uma das principais fontes de informação sobre a interpretação
musical do século XVIII. De acordo com Stephen Hefling (1987, p. 205), o tratado
examina com detalhes e com profundidade muitos aspectos de estilo e performance
musical, tornando-se assim inigualável a qualquer outro tratado do período
apontado. Ainda segundo este autor, Quantz trata com um rigor único a execução do
solista na ornamentação de um Adagio. Adicionalmente, David Ledbetter afirma:
Para Johann Joachim Quantz, a quem devemos a mais completa interpretação do Adagio no pico do seu desenvolvimento, foi o gênero do conhecedor por excelência, no qual o flautista tem o alcance infinito não só para a ornamentação, mas também para as sutilezas mais expressivas de dinâmica e ritmo. (LEDBETTER, 2001, p. 15, tradução nossa)
66.
O termo Adagio no barroco tardio não significa apenas uma indicação de
andamento ou um termo genérico para movimentos lentos. É o termo técnico para
um gênero musical que traz inúmeras características. A exemplo: geralmente escrito
em compasso quaternário, um baixo com a predominância de colcheias,
improvisação rítmica e melódica, dentre outras (LEDBETTER, 2001, p. 15). De
acordo com este autor,
[...]. Quantz trata 'o Adágio' como um termo de gênero para um tipo de movimento lento, dentro do qual há duas amplas categorias: o 'patético' (traurig, pathetisch), que pode ser intitulado de Adágio pesante, Lento, Lento assai, Mesto, Grave etc.; e o 'canto' (cantabel), que pode ser intitulados de Cantabile, Arioso, Affettuoso, Andante, Andantino, Largo, Larghetto, Soave, Dolce etc. Estas duas categorias devem distinguir-se claramente no tempo, o 'patético' não demasiadamente rápido, e o 'canto' não demasiadamente lento, mas, todavia, relacionando-se ao mesmo gênero. (LEDBETTER, 2001, p. 15-16, tradução nossa)
67.
66
For Johann Joachim Quantz, to whom we owe the fullest account of the Adagio at the peak of its development, it was the connoisseur's genre par excellence, in which the player has infinite scope not only for ornamentation but also for the most expressive subtleties of dynamics and rhythm. 67
[…]. Quantz treats 'the Adagio' as a genre term for a type of slow movement within which there are two broad categories: the 'pathetic' (traurig, pathetisch), which may be headed Adagio pesante, Lento, Lento assai, Mesto, Grave etc.; and the 'singing' (cantabel), which may be headed Cantabile, Arioso, Affettuoso, Andante, Andantino, Largo, Larghetto, Soave, Dolce etc. These two categories are to be clearly distinguished in tempo, the 'pathetic' not too quick and the 'singing' not too slow, but they nonetheless relate to the same genre.
67
Nos tópicos 1, 5, 6, 7 e 8 do Capítulo XIV de seu tratado, Quantz nos
apresenta o Adagio e algumas de suas características interpretativas.
Resumidamente, no tópico 1, ressalta o fato do Adagio produzir menos prazer aos
simples amantes da música, no entanto, um bom músico pode se distinguir dos
demais e demonstrar o seu domínio técnico e disciplina através da execução deste
movimento lento; no tópico 5, destaca a importância do afeto para não
descaracterizar a interpretação de um Adagio; no tópico 6, Quantz descreve que
existem vários tipos de peças lentas, sendo que algumas são lentas e tristes, outras
são mais vivas. Em ambas, o estilo de execução depende muito do modo como a
peça está composta (tonalidade maior ou menor); nos tópicos 7 e 8, distingue os
tipos de movimentos lentos existentes (Patético, Cantabile, Arioso, Affetuoso,
Andante, Andatino, Largo, Larghetto, Adagio di Molto, Lento Assai, dentre outros) e
frisa a importância de interpretá-los de acordo com o afeto.
A prática da ornamentação no Adagio pode ser de duas maneiras: italiana
ou francesa, conforme as especificações de Quantz em seu Versuch, Capítulo XIV,
tópico 2. No tópico 4 deste mesmo capítulo, nosso compositor reforça esta afirmação
e conhecimento:
Já disse que a maioria dos compositores franceses tem por costume escrever os ornamentos na melodia e consequentemente, o executante tem unicamente que interpretá-los bem. No estilo italiano do passado não se escrevia nenhum ornamento. Tudo se deixava ao gosto do executante [...]. Mas, já há algum tempo, os que seguem a maneira italiana, têm começado a escrever os ornamentos mais necessários na melodia principal, já que, aparentemente, o Adagio estava sendo estragado por muitos músicos ignorantes e isto diminuía e até comprometia a honra e reputação dos compositores. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 213, tradução nossa)
68.
Vale ressaltar que a improvisação dos ornamentos no Adagio provém do
estilo italiano, conforme aponta Thurston Dart:
68
Ya hemos dicho que la mayoría de los compositores franceses tienen la costumbre de escribir los adornos en la melodía y consecuentemente el ejecutante tiene únicamente que interpretarlos bien. En el estilo italiano del pasado no se escribía ningún adorno. Todo se dejaba a la voluntad del ejecutante [...]. Pero desde hace tiempo, los que siguen la manera italiana, han comenzado también a escribir los adornos más necesarios en la melodía principal, ya que aparentemente, el Adagio estaba siendo estropeado por muchos músicos ignorantes y esto disminuía y hasta marchitaba algunas veces el honor y la reputación de los compositores. [...].
68
No adagio italiano típico do século XVIII esperava-se que o intérprete improvisasse com bastante liberdade sobre a melodia que tinha à sua frente – as notas escritas pelo compositor eram apenas um esqueleto a ser vestido com volatas, roulades e floreios de todo tipo. (DART, 2000, p. 104).
É importante ter em mente que, no estilo italiano, entre cerca da metade
do século XVII e o fim do século XVIII, ornamentos eram obrigatórios em certas
situações, principalmente no retorno à primeira seção em uma aria da capo e nos
adagios de sonatas ou concertos. Até que ponto devia se dar esta ornamentação,
entretanto, é uma questão que não tem uma resposta simples. Ajudaria pensarmos
em uma grande variedade de níveis de ornamentação legitimamente possíveis, indo
de um mínimo necessário ao ponto de saturação. Quando os compositores
exemplificam algumas figurações em suas obras, questiona-se: o que escreveram
satisfaz as demandas estilísticas ou tais obras ainda precisam ser ornamentadas?
(NEUMANN, 1993, p. 528).
Em alguns casos, quando o flautista encontra dificuldades para improvisar
ornamentos ou linhas melódicas em um movimento lento, Quantz aconselha ao
intérprete: criar contrastes de articulação69 ou dinâmica; usar apojaturas antes de
notas longas e notas de passagem entre intervalos de terça (RÓNAI, 2008, p. 233).
Porém, o autor nos orienta a tomar muito cuidado para não acelerar no andamento,
devido ao acréscimo de notas nas frases, e de não ornamentar em excesso.
Devemos utilizar os ornamentos somente quando necessário. Os ouvintes pouco se
comoverão se apagarmos as boas ideias do compositor.
Outra questão muito importante trabalhada por Quantz no Capítulo XIV,
adicional aos ornamentos, é a dinâmica. Existem correlações importantes entre
dinâmica e ornamentação em relação à execução de um Adagio (HEFLING, 1987, p.
206). No tópico 9 deste mesmo capítulo, o compositor afirma que a alternância entre
piano e forte, juntamente com o acréscimo de ornamentos, nos ajudam a perceber
as nuances presentes na música:
69
No século XVIII, a articulação mais importante era o staccato. Nos métodos da época, isso fica claro ao percebermos a imensa variedade de sílabas sugeridas para os ataques, e o papel subalterno desempenhado pelo legato. (RÓNAI, 2008, p. 174).
69
As trocas de dinâmicas (piano, forte) podem contribuir muito para a execução de um Adagio, aos quais, junto com uma mescla balanceada de ornamentos pequenos e grandes formam, por assim dizer, a luz e as sombras, cuja percepção é essencial na música. Contudo, devemos saber muito bem como realizar isso, para não passarmos abruptamente de um para outro; é necessário reforçar ou enfraquecer o tom de maneira imperceptível. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 217, tradução nossa)
70.
De acordo com Hefling (1987, p. 207), Quantz utilizava as palavras stark,
stärker, wachsend, abnehmend e schwach para indicar as dinâmicas em seus
exemplos musicais ornamentados. No Capítulo XIV, percebemos dois pontos
bastante frisados pelo compositor em relação ao uso das dinâmicas na interpretação
de um Adagio: alternância entre piano e forte; graduações de intensidade
(crescendos e diminuendos). No tópico 25, Quantz reforça que a variedade de
dinâmica é necessária para uma boa interpretação musical.
Quantz observa que, para a ornamentação de um movimento lento (no
estilo italiano), o conhecimento de harmonia torna-se indispensável. Demostra
grande conhecimento no tratamento das dissonâncias e consonâncias, sendo que a
dinâmica é uma importante ferramenta para destacá-las. Exemplos:
[...]. [...] dividi as dissonâncias em três classes, de acordo com o efeito que produzem e a maneira que devemos executá-las. Chamei a primeira classe de mezzo forte, a segunda forte e a terceira fortissimo. [...]. [...] no Adagio de um Solo, os acordes consonantes devem ser tocados mezzo piano e não tão fortes, assim, deixamos para tocar forte ou fraco nos lugares que seja necessário. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 344, tradução nossa)
71.
É possível aprender a maneira francesa de ornamentar o Adagio por meio de boas instruções e sem conhecer as regras de harmonia; mas para a maneira italiana de tocar, este conhecimento é indispensável. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 213, tradução nossa)
72.
70
A ello [Adagio] pueden contribuir mucho los câmbios de piano a forte, los cuales, junto con una mezcla balanceada de adornos pequeños y grandes, forman, por así decirlo, la luz y las sombras cuya percepción es esencial en la Música. No obstante, hay que ejercer muy buen juicio al efectuar ésto para no pasar muy abruptamente de uno a outro; es necesario reforzar o debilitar el tono imperceptiblemente. 71
[...]. [...] he dividido en tres clases las disonancias de acuerdo al efecto que producen y a la manera en que hay de ejecutarlas. He llamado la primera clase mezzo forte, a la segunda forte y a la tercera fortissimo. [...]. [...] en el Adagio de un Solo, los acordes consonantes se tocan mezzo piano y no con la mayor fuerza posible, para poder tocar de una manera más fuerte o más débil en los lugares en que sea necesario. 72
Es posible aprender la manera francesa de ornamentar el Adagio por medio de buenas
70
Assim como não sentimos dor sempre com a mesma intensidade, certas dissonâncias produzem um menor efeito que outras e, portanto, é necessário que umas se toquem e expressem com mais força do que outras. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 343, tradução nossa)
73.
Além dos ornamentos e dinâmica, a questão do ritmo também é muito
importante para a interpretação de um Adagio. Encontramos no Versuch alguns
apontamentos sobre a execução rítmica de um movimento lento, por exemplo: a
distinção entre notas principais (notas boas) e de passagem (notas más). Tais notas
possuem uma hierarquia dentro dos tempos do compasso. Hefling (1987, p. 206)
destaca que esta noção foi comum no século XVIII e continua fazendo parte da
interpretação do repertório deste período.
As notas que estão no tempo forte (notas boas), ou seja, a primeira,
terceira, quinta e sétima, devem ter a duração um pouco maior que as notas de
passagem (notas más), isto é, a segunda, a quarta, a sexta e a oitava (QUANTZ,
Capítulo XVII, seção VII, tópico 40). Quantz ressalta também que podemos destacar
as notas principais através da alternância de articulação. No Capítulo XI, tópico 12, o
autor afirma:
Devo fazer aqui uma observação muito necessária em relação à duração que cada nota deve ter. Ao tocar, devemos conseguir diferenciar as notas principais ou as que caem no tempo forte, o que os italianos chamam de notas boas, e as notas de passagem que alguns estrangeiros chamam de notas más. As notas principais devem se destacar mais do que as notas de passagem sempre quando possível. De acordo com esta regra, em um movimento moderato, e incluso no Adagio, as notas mais rápidas são executadas com certa desigualdade, mesmo que visualmente pareçam ter o mesmo valor. [...]. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 152, tradução nossa)
74.
instrucciones y sin conocer las reglas de la armonía; pero la manera italiana de tocar, este conocimiento es indispensable. [...]. 73
Así como el dolor no siempre se siente con la misma intensidad, ciertas disonancias producen un menor efecto que otras y por lo tanto es necesario que unas se toquen y expresen con más fuerza que otras.[...]. 74
Debo hacer aquí una observación muy necesária en relación a la duración que se le debe ortogar a cada nota. Al tocar, hay que saber lograr una diferenciación entre las notas principales o que caen en el tempo fuerte, que los italianos llaman notas buenas, y las notas pasajeras que algunos extranjeros llaman notas malas. Las notas principales deben destacarse más que las pasajeras siempre que sea posible. De acuerdo con esta regla, en un movimiento moderado, e incluso en el Adagio, las notas más rápidas son ejecutadas con cierta desigualdad, aunque visualmente parezcan tener el mismo valor. [...].
71
Quantz aponta características distintas entre a interpretação dos vários
movimentos lentos, conforme os exemplos: no Capítulo XIV, tópico 17 destaca o
movimento Grave; no tópico 18, o Adagio Spiritoso; no tópico 20, o Cantabile ou
Arioso; no tópico 21, o Andante ou Larghetto; no tópico 22, uma alla Siciliana.
Portanto, as indicações de Quantz para a interpretação de um Adagio
podem ser resumidas em três pontos principais que dialogam entre si:
Ornamentos (essenciais e/ou livres); Para a improvisação dos
ornamentos, o que caracteriza o estilo italiano, é necessário que
saibamos harmonia; para a execução dos ornamentos essenciais
(escritos na partitura), tal conhecimento não é imprescindível; Existem os
lugares e momentos certos para o acréscimo de ornamentos, por
exemplo: na repetição de uma frase ou do tema, nos saltos entre os
intervalos, nas notas longas; não devemos exagerar neste acréscimo e
nem apagar a melodia principal.
Dinâmica (alternância entre piano e forte); Não alternar essas dinâmicas
de maneira brusca; graduações de intensidade (crescendo, diminuendo);
As dissonâncias e consonâncias devem ser executadas com dinâmicas
diferenciadas para que fiquem em evidência para os nossos ouvidos.
Ritmo (destaque nas notas principais da harmonia e melodia); As notas
principais devem sempre estar em destaque, seja pela dinâmica
(tocadas forte), pela duração (um pouco mais longas que as outras) ou
pela articulação.
Thurston Dart também afirma que no estilo italiano de interpretação
existem certas idiossincrasias na notação dos ritmos pontuados que podem
confundir o intérprete. De acordo com Dart, o ritmo trocaico (__ U) ou o anapéstico
(UU__) que ocorre numa marcha, numa siciliana ou num grave deve ser executado
um pouco mais pontuado do que vêm escrito. O ritmo trocaico em um compasso
ternário composto vem escrito, frequentemente, como se fosse pontuado. No
entanto, deve ser interpretado em conformidade com o ritmo de tercinas dominante
do movimento (DART, 2000, p. 107). Exemplo:
72
Figura 14: Ritmos trocaicos
Fonte: DART, 2000, p. 107
O modo como interpretar esses ritmos deve ser resumido em uma única
frase: “[...] iguale todos os ritmos pontuados ao ritmo dominante do movimento. [...]”
(DART, 2000, p. 107).
Na tabela XVII, tópico 41 do Capítulo XIV, Quantz indica passo a passo a
interpretação de um Adagio. Como veremos a seguir, ele frisa bastante a questão da
ornamentação e as dinâmicas.
73
Figura 15: Tabela XVII
Fonte: MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode
pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 223.
74
Figura 16: Tabela XVII
Fonte: MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode
pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 224.
75
Considerações de Quantz sobre a tabela XVII (Figuras 15 e 16):
Na primeira nota, Sol, fazemos um crescendo. No exemplo c 26, as pequenas
notas são realizadas piano; o Dó deve ser tocado mezzo forte para crescermos
na dinâmica a partir dele.
No exemplo II 9, o Mi com o trinado deve ser realizado forte e vamos
diminuindo pouco a pouco a dinâmica até chegarmos nas notas Ré-Dó (piano).
Em d 28 as notas devem ser executadas da seguinte maneira: Ré forte, Dó
(apojatura) piano, Si forte, Lá (apojatura) e o Sol com o trinado piano.
Em i 8 o Sol é piano, o Si-Ré mezzo forte.
Em f 26 as notas pequenas devem ser realizadas piano, nas notas Fá-Fá
crescemos na dinâmica.
Em aa 8 o Lá-Sol é piano, Fá-Mi-Ré mezzo forte.
Em e 26 as notas pequenas são realizadas piano.
Em b 28 o Mi realizamos forte, Ré (apojatura) piano, Dó forte (diminuendo), Mi
(crescendo).
Em a 3 crescemos na nota Ré, realizamos as notas Fá (apojatura) e Mi piano,
crescemos novamente no Ré (apojatura) e na nota Dó (com o trinado) fazemos
a terminação piano. A apojatura Dó deve ser forte e a nota Si piano.
Em f 7 o Mi é forte, Dó piano, Sol forte e Mi piano.
Em k 3 o Ré é forte e crescemos no Sol, nas notas Ré-Dó realizamos piano,
crescemos no Lá, diminuímos no Dó, na apojatura Dó fazemos um crescendo e
no Si com o trinado diminuendo.
Em v 8 fazemos um Ré crescendo, as notas Dó-Si-Dó-Ré realizamos piano.
Em c 6 crescemos no Mi, realizamos o Fa#-Sol piano.
Em g 6 o Fá# é forte, Ré-Mi piano, Fá# forte, Sol-La piano.
Em b 23 o Sol com o trinado é forte, Fa#-Mi piano, Ré forte.
Em t 8 o Ré é forte, Mi piano e o Fá forte.
Em v 6 o Fá (apojatura) é forte, Mi piano, Dó-Lá-Mi realizamos um diminuendo,
Mi (apojatura) forte, Fá# piano, Ré-Lá-Fá# diminuendo, Fá # (apojatura) forte,
Sol piano.
76
Em d 20 crescemos nas notas Sol-Si-Lá, diminuímos nas notas Sol-Lá-Si e
crescemos no Dó.
Em II 25 as 4 notas pequenas são realizadas piano.
Em m 25 as notas Lá-Si são fortes e articuladas fortemente, as quatro notas
pequenas são executadas piano, o Dó é forte e articulado fortemente, Si piano,
crescemos sobre o Lá com trinado, Sol piano.
Em a 20 realizamos um crescendo no Sol, e diminuímos nas quatro notas
pequenas.
Em g 20 nas notas Lá-Sib-Si-Dó-Dó# realizamos um crescendo.
Em b 2 o Ré começa piano e realizamos um crescendo, Mi-Fá piano.
Em K 2 o Mi é forte, Sol-Fá piano, Mi forte, Fá-Sol piano, Fá com o trinado
realizamos forte, Mi piano, realizamos um crescendo no Fá e chegamos forte
no Sol.
Em b 23 o trinado na nota Lá começa forte e diminuímos até chegarmos nas
notas Sol-Fá (piano).
Em l 14 o Mi é forte, Sib-Sol-Mi piano, crescemos no Ré (apojatura) e
diminuímos no trinado sobre o Dó#.
Em x 8 crescemos no Mi, diminuímos nas notas Ré-Dó#-Si-Dó#-Lá, crescemos
novamente nas notas Fá-Lá.
Em c 13 o Lá é forte, Sol-Fá-Mi piano, Ré forte, Dó piano, crescemos sobre a
apojatura Dó e diminuímos no Si com o trinado.
Em p 18, o Ré realizamos bem curto e forte, Ré-Mi-Fá piano, o trinado sobre o
Mi forte, Ré-Mi piano.
Em c 5 o Fá é forte, crescemos no Ré, Fá piano, Mi forte, crescemos no Dó, Mi
piano.
Em e 22 o Mi com o trinado é forte, Sol-Mi piano, Ré forte.
Em z 8 crescemos no Ré, diminuímos nas notas Dó-Ré-Si.
77
CAPÍTULO 4
4. Concerto em Sol maior para flauta transversal, violinos 1 e 2, viola e baixo
contínuo QV 5:174
Johann Joachim Quantz trabalhou grande parte de sua vida na Corte de
Frederico II, rei da Prússia. Em 1728 passa a dar aulas de flauta para Frederico, até
então príncipe da região. Precisamente no ano de 1741, Quantz assume o
compromisso de trabalho integral na Corte, atuando como compositor, professor de
flauta e conselheiro pessoal do rei.
Como compositor Quantz escreveu inúmeras obras, na maioria para
flauta. Em relação à quantidade de concertos para este instrumento, John Burrows e
Charles Wiffen destacam no Guia Ilustrado Zahar – Música Clássica (2006, p. 134),
300 concertos compostos; Horst Augsbach indica 289 concertos no Prefácio de sua
edição (1991, p. IV) do Concerto em Sol maior para flauta, violinos 1 e 2, viola e
baixo contínuo de Quantz; Douglas E. Worthen em sua tese de doutorado75 (2007, p.
35), aponta 162 concertos escritos antes de 1741 e 130 após este mesmo ano, além
de 7 concertos para duas flautas e cordas (não menciona o período de escrita).
Nesta dissertação, apresentamos o catálogo das obras de Quantz
realizado por Horst Augsbach: Thematisch-systematisches Verzeichnis der Werke
von Johann Joachim Quantz (QV = Quantz-Verzeichnis), publicado em 1997.
Segundo Mary Oleskiewicz (2010, p. 1), tal catálogo divide as composições de
Quantz em 7 grandes grupos: (1) sonatas solo para flauta e baixo contínuo; (2) trio
sonatas; (3) solos, duos e trios para flauta sem o baixo contínuo; (4) concertos para
flauta, dois violinos e baixo contínuo; (5) concertos para flauta, dois violinos, viola e
baixo contínuo; (6) concertos com vários solistas; (7) obras vocais. Dentro de cada
categoria, as peças são listadas de acordo com a tonalidade e não
cronologicamente, começando no Dó maior e terminando no Si menor, sendo que
Augsbach colocou um apêndice no final de cada grupo (Anhang) indicando as obras
cuja atribuição a Quantz é questionada. Ainda sobre o catálogo, Mary Oleskiewicz
afirma:
75
A Semiotic view of the flute concerto genre from Vivaldi to Mozart.
78
Em sua organização baseada na tonalidade, QV segue um índice manuscrito de trabalhos reunidos por Frederico o Grande; o volume inclui uma reprodução de uma das duas versões sobreviventes. Esta organização tinha um raison d'etre prática: Frederick executou trabalhos de Quantz nos seus concertos privados na corte, em uma sequência regular rotativa baseada em chaves. O arranjo permanece útil, desde que cada chave apresente possibilidades técnicas e expressivas específicas para os instrumentos do século dezoito para os quais Quantz escrevia. Além disso, apesar de avanços recentes na datação de trabalhos de Quantz, listar exatamente a cronologia de suas composições permanece além de capacidades presentes. (OLESKIEWICZ, 2010, p. 1, tradução nossa)
76.
Na Tabela 5, segue a catalogação resumida dos concertos de Quantz
para flauta sem e com a parte da viola, respectivamente QV 4 e QV 5. Destacamos
também os concertos que talvez tenham sido escritos por este compositor (Anh):
Tabela 5: Catálogo dos Concertos de Quantz por Augsbach
Quantz Verzeichnis Concertos para flauta
QV 4 (1 - 7) Ré maior, Mi b maior, Mi menor, Sol maior, Sol maior, Lá Maior, Si menor.
QV 4 (Anhang 1 - 2) Ré maior; Dó maior, Ré maior e Sol maior.
QV 5 (1 - 100) 1 ao 22 Dó maior; 23 ao 39 Dó menor; 40 ao 78 Ré maior; 79 ao 87 Ré menor; 88 ao 100 Mi b maior.
QV 5 (101 - 200) 101 ao 106 Mi b maior; 107 e 108 Mi maior; 109 ao 137 Mi menor; 138 ao 163 Fá maior;164 ao 192 Sol maior; 193 ao 200 Sol menor.
QV 5 (201 - 281)77
201 ao 208 Sol menor; 209 ao 232 Lá maior; 233 ao 242 Lá menor; 243 ao 260 Si b maior; 261ao 281 Si menor.
QV 5 (Anhang 1-26) 1 ao 3 Dó maior; 4 Dó menor; 5 ao 10 Ré maior; 11 Ré menor; 12 ao 14 Mi b maior; 15 Mi menor; 16 Fá maior; 17 ao 22 Sol maior; 23 e 24 Lá maior; 25 Si b maior; 26 Si menor.
Fonte: BONNEMA, 2015.
Worthen (2007, p. 9) aponta a importância do conhecimento do termo
“concerto para flauta” antes do estudo do gênero em si. De acordo com este autor,
76
In its organization based on tonality, QV follows a manuscript index of works collected by Frederick the Great; the volume includes a facsimile of one of the two surviving versions. This organization had a practical raison d'etre: Frederick performed Quantz's works at his private court concerts in a regular rotating sequence based on key. The arrangement remains useful, since each key presents specific technical and expressive possibilities on the eighteenth-century instruments for which Quantz was writing. Moreover, despite recent advances in the dating of Quantz's works, an accurate chronological listing of his compositions remains beyond present capabilities. 77
No site do autor Bonnema (link Quantz Verzeichnis), encontramos um outro arquivo do cátalogo das obras de Quantz, organizado por Augsbach. Neste arquivo (pdf), o QV 5 vai até o 283, sendo que o 282 corresponde a tonalidade de Sol menor e o 283, Si menor. No site, Bonnema descreve o QV 5 até o 281. Para maiores informações checar: http://jjquantz.org/files/Concordance_Quantz_no-QV_eng.pdf e http://jjquantz.org/index.php/quantz-verzeichnis.
79
mesmo no início de 1730, a palavra concerto designava um gênero musical que
abarcava as seguintes formações: instrumento de teclado solo; um pequeno
conjunto de câmara; uma formação mais ampla em que um grupo menor de
instrumentistas (concertino) dialogava em seções contrastantes com um grupo maior
(ripieno). Quantz no Versuch Capítulo XVIII, tópico 30, exemplifica a sua definição de
concerto. Segundo ele, este gênero musical nasceu dos italianos e provavelmente
Torelli foi o primeiro a compor. Um concerto grosso consiste na combinação de
vários instrumentos concertantes, de maneira que sempre há dois ou mais músicos
tocando em conjunto e alternadamente. Em um concerto de câmara, há apenas um
instrumento concertante.
Quando falamos em “concerto para flauta”, a noção do solista está
implícita na própria instrumentação, criando assim uma imagem clara deste gênero.
Somado a isso, as partes entre orquestra e solista ficam bem evidentes no decorrer
da performance musical. Worthen ressalta:
Antes de 1778, o concerto de flauta como um gênero tinha menos do que cinquenta anos. Durante este breve período, o concerto de flauta solo passou por algumas modificações, mas certas características de seu formato seguiriam presentes. Entre essas características, encontramos certas sequências-chave, figurações técnicas apropriadas para o instrumento, tonalidades favorecidas que destacavam emoções, e a estrutura ritomello assim chamada. O próprio instrumento modificou-se pouco neste período, apenas modificações menores de calibre que favoreceram os altos registros. (WORTHEN, 2007, p. 10, tradução nossa)
78.
Os concertos de Quantz reúnem os elementos estilísticos e
composicionais dos franceses, italianos e alemães. Geralmente escritos em três
movimentos, tais concertos eram modelados na forma de ritornello79, que teve sua
era de ouro no início do século 18, sobretudo nos concertos para violino de Vivaldi.
De acordo com Augsbach, em relação aos concertos de Quantz,
78
By 1778, the flute concerto as a genre was less than fifty years old. During this brief period, the solo flute concerto went through some changes, but certain features of its design were enduring. Among those features, we find certain key sequences, technical figurations appropriate to the instrument, favored tonalities that highlighted emotional affects, and so called ritomello structure. The instrument itself changed little in this period, with only minor changes to the bore that favored the high register. 79
Ritornello. Originalmente, estribilho, como nos madrigais dos séculos XIV e XV. No início do século XVII, o termo era aplicado a uma peça instrumental que se repetia regularmente no decurso de uma obra teatral musicada e, mais tarde, às passagens instrumentais que separavam as partes vocais de um hino ou ária. Nos concertos barrocos e clássicos, o ritornello tornou-se uma opção orquestral do tutti que alternava com a parte concertino. O termo forma de ritornello passou a ser usado para movimentos baseados nessa alternância. (Dicionário de Música Zahar, 1985, p. 320).
80
O primeiro movimento rápido compõe-se de cinco ritornellos (tutti) no qual quatro seções de solo se entretecem. Os movimentos lentos médios formam-se, às vezes, muito livremente e, às vezes, em forma de da capo. Os movimentos finais rápidos concebem-se geralmente em forma concertante ritornello e, muito frequentemente, derivavam de danças (minueto, gigue; também rondeau, etc.). (AUGSBACH, 1991, p. IV, tradução nossa)
80.
De maneira muito clara e precisa, Quantz no tópico 33 do capítulo XVIII
de seu tratado, apresenta 17 características que envolvem a interpretação e
composição do primeiro movimento de um concerto de câmara (ou de um só
instrumentista). Segundo ele, o primeiro movimento deve conter:
1. Um ritornello majestoso e bem elaborado em todas as partes;
2. Uma melodia agradável e inteligível;
3. Imitações corretas;
4. As melhores ideias do ritornello podem ser extraídas e usadas durante
ou entre os solos;
5. A parte do baixo deve ter uma melodia característica de sua função;
6. É necessário que não haja mais partes intermediárias do que a parte
principal permite, frequentemente conseguimos um melhor efeito
duplicando as partes principais do que forçando as intermediárias;
7. O movimento do baixo e das partes intermediárias não deve diminuir a
vivacidade da parte principal, nem escondê-la ou suprimi-la;
8. O ritornello precisa ter uma duração adequada. É necessário que tenha
pelo menos duas seções principais. A última deve ser provida de ideias
belas e majestosas, uma vez que se repetirá ao final da peça;
9. Se a primeira ideia do ritornello não for suficientemente musical e nem
apropriada para o solo, devemos encontrar uma ideia nova,
completamente oposta a primeira e incorporá-la de modo que não seja
aparente sua introdução por necessidade ou deliberadamente;
80
The rapid first movement consists of five ritornellos (tutti) into which four solo sections are interwoven. The slow middle movements are fashioned sometimes very freely and sometimes in a da capo form. The rapid closing movements are generally conceived in a concertante ritornello form and very often derived from dances (minuet, gigue; also rondeau, etc).
81
10. Muitas vezes os solos devem ser cantáveis e outras, intercalados com
passagens brilhantes, melodiosas e harmoniosas, mantendo-se sempre
apropriados ao instrumento executante; precisamos alterná-los com
pequenas porções do tutti, para manter a fogosidade do começo ao fim;
11. Os solos (parte concertante) não devem ser muito curtos, nem os tutti
que ocorrem entre os solos devem ser muito longos;
12. O acompanhamento durante as seções de solo não deve ter
progressões que obscureçam a parte concertante. Este
acompanhamento deve constituir ora de muitas partes, ora de poucas,
de modo que a parte principal tenha liberdade para destacar-se. De
maneira geral, precisamos manter as nuances claro e escuro em todos
os momentos;
13. A progressão harmônica precisa ser correta e natural; não modular para
tonalidades muito distantes;
14. A métrica deve ser cuidadosamente observada na obra como um todo. É
necessário que continuemos a métrica da maneira que começamos. Em
um Arioso composto em compasso ternário é permitido cesuras
sucessivas depois de três e dois compassos;
15. Não devemos prolongar as transposições por muito tempo e da mesma
maneira;
16. Não devemos apressar o final da peça e nem fazê-lo muito curto, é
preciso conclui-lo de uma maneira definitiva. O último solo deve repetir
as ideias mais agradáveis das escutadas previamente.
17. Precisamos concluir o último tutti do Allegro tão brevemente quanto
possível, usando a segunda parte do primeiro ritornello.
Para o terceiro movimento, tópico 39 do mesmo capítulo, Quantz orienta:
1. É necessário que o ritornello seja curto, alegre e fogoso, mas também
jocoso;
2. A parte principal precisa ter uma melodia agradável e viva;
82
3. As passagens devem ser fáceis, para que não diminuamos a velocidade
do movimento. De modo nenhum o andamento do terceiro movimento
deve ser igual ao primeiro;
4. Precisamos observar a métrica com muito cuidado, uma vez que os
erros em compassos curtos e rápidos se tornam mais evidentes. Em
compassos 2/4, 3/4, 3/8 e 6/8 as cesuras devem sempre cair no princípio
do segundo compasso e as divisões principais devem cair no quarto e
oitavo compassos.
5. O acompanhamento não deve ser muito cheio ou carregado de partes.
Os acompanhantes precisam executar as notas sem dificuldade, já que
o terceiro movimento se toca normalmente muito rápido.
Com estas indicações, percebemos o quanto Quantz era cauteloso em
relação à composição e interpretação dos concertos escritos em sua época. No
tópico 40, ainda do capítulo XVIII, este autor nos aponta o tempo de duração de
cada movimento de um concerto:
Para conseguir uma boa proporção em relação à duração de um Concerto, podemos consultar o relógio. Se a duração do primeiro movimento é de cinco minutos, do Adagio de cinco a seis e do último movimento de três a quatro minutos, o Concerto terá a duração desejada. Em geral, é melhor que os ouvintes pensem que uma peça musical é muito curta em vez de muito longa. (MURILLO, ed., Spanish Translation of Johann Joachim Quantz’s Essai D’une Méthode pour apprendre a jouer de la Flüte Traversière, 1997, p. 434, tradução nossa)
81.
Quanto à escrita de seus concertos, Quantz se distanciava da
composição virtuosística dos italianos, no entanto, seria incorreto afirmar que tais
obras são destituídas de virtuosismo e brilho (AUGSBACH, 1991, p. IV). Sobre o seu
concerto em Sol maior para flauta, violinos 1 e 2, viola e baixo contínuo QV 5:174,
Worthen nos afirma:
81
Para lograr una buena proporción en cuanto a la duración de un Concierto se puede consultar el reloj. Si la duración del primer movimiento es de cinco minutos, la del Adagio de cinco a seis y la del último movimiento de tres a cuatro minutos, el Concierto tendrá la duración requerida. En general es mejor que los oyentes piensen que una pieza musical es demasiado corta en vez de demasiado larga.
83
[…] O concerto parece menos formalista do que se esperaria dos seus “17 Pontos”. Trabalhando para o francófilo declarado Frederico II, Quantz era um grande admirador dos instrumentistas franceses com padrões de execução estabelecidos por Buffardin e Blavel. Além do “brilho” da execução virtuosa, as obras desse período frequentemente apresentavam outras “tópicas” e “estilos” estabelecidos, que se tornaram uma parte importante da retórica musical do período. O segundo movimento do concerto em “estilo sensível”, permitindo a completa expressão do gosto francês, Galante. O último movimento é em “estilo brilhante”, com figuração virtuosística no solo final. (Worthen, 2007, p. 36, tradução nossa)
82.
Composto por volta de 1745, para Frederico II, este concerto é
considerado o mais conhecido dentre os concertos para flauta de Quantz83. Moritz
Fürstenau (1824-1889), flautista virtuoso da Dresdner Hofkapelle, descobriu esta
obra na coleção particular da Royal House da Saxônia e a interpretou em 14 de
março de 1877 na cidade de Dresden. O concerto foi publicado no ano de 1884, em
Leipzig, pela editora Breitkopf & Härtel e desde então, este escrito passou a fazer
parte do repertório de muitos flautistas e ganhou um lugar permanente nas salas de
concertos, devido sua musicalidade e bela sonoridade (AUGSBACH, 1991, p. IV).
Adicionalmente, Collin afirma que o concerto QV 5:174 é reconhecido até
mesmo por estudantes de flauta, aos quais é solicitado tocá-lo por ocasião de
exames práticos (Colin apud McILWAINE, 2009, p. 1). Entre flautistas profissionais
renomados, encontramos em nossa pesquisa aproximadamente 18 gravações84 da
obra. Dentre estes músicos, podemos destacar: James Galway, Partick Gallois,
Michael Martin Kofler, Alexandre Magnin, Abbie de Quant, Claudio Ferrarini, Peter-
Lukas Graf, Rachel Brown, Wolfgang Schulz, Benedek Csalog, dentre outros.
Em relação ao andamento dos movimentos de um concerto, Quantz no
Capítulo XVII, Seção VII, tópico 55, estabelece um pulso de 80 batidas por minuto85
82
[…]. The Concerto seems less formulaic that one would expect from his “ 17 Points.” Working for the avowed Francophile Friedrich II, Quantz was a great admirer of French instrumentalists with standards of flute playing set by Buffardin and Blavet. In addition to the “brilliance” of virtuoso playing, works of this period often presented other established “topics” and “styles” which had become an important part of the musical rhetoric of the period. The concerto’s second movement is in “sensitive” style, allowing full expression of Galant, French taste. The last movement is in “brilliant” style, with virtuosic figuration in the final solo. 83
BONNEMA, Feike. Listen to Quantz’s Music. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/youtube-test>. Acesso em: 9 abr. 2015. 84
BONNEMA, Feike. Listen to Quantz’s Music. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/youtube-test>. Acesso em: 9 abr. 2015. 85
Quantz escolhe a frequência cardíaca como um meio padrão de determinação de certos tempos, afirmando que o pulso normal de uma "pessoa saudável" é de cerca de oitenta batimentos por minuto. Quantz chooses the heart rate as a standard means of determining certain tempos, stating that the normal pulse of a “healthy person” is about eighty beats per minute. (BROWNE, 2013, p. 35,
84
como o ponto de partida para a interpretação. Tal andamento pode oscilar tanto para
mais, quanto para menos, de acordo com as características do movimento: Allegro
Assai (Allegro di Molto, Presto, etc), Allegretto (Allegro ma non tanto, non troppo,
moderato, etc), Adagio Cantabile (Arioso, Affettuoso, Poco Andante, etc), Adagio
Assai (Lento, Largo Assai, Grave, etc).
Considerando então este pulso de 80 batidas por minuto, teríamos as
seguintes proporções segundo Reilly, em sua tradução do tratado de Quantz para o
inglês (1966, p. 286): num compasso 4/4 o Allegro Assai tem a mínima igual a 80;
Allegretto tem a semínima igual a 80; Adagio Cantabile tem a colcheia igual a 80;
Adagio Assai tem a semicolcheia igual a 80. Num compasso 2/2, o Allegro Assai tem
a semibreve igual a 80; Allegretto tem a mínima igual a 80; Adagio Cantabile tem a
semínima igual a 80; Adagio Assai tem a colcheia igual a 80.
Portanto, de acordo com Augsbach, os andamentos para o Allegro assai,
Arioso e Mesto e Presto do concerto QV 5:174 poderiam ser:
[...] primeiro movimento, Allegro: semínima = 120. […]. Segundo movimento, Arioso e Mesto: segundo Quantz, um mesto no tempo 3/4 deveria ser tocado: semínima = 40; o movimento é, contudo, “mais arioso do que triste”, para que a semínima = c.80 seja apropriada. Terceiro movimento, Presto: a julgar pela estrutura total da peça, um tempo adequado poderia ser semínima = 160. (AUGSBACH, 1991, p. IV, tradução nossa)
86.
4.1 O Arioso e Mesto: edições
Neste tópico, apresentamos duas edições do concerto QV 5:174 de
Quantz: dos autores Wilhelm Barge e Horst Augsbach, sendo que ambas foram
publicadas pela editora Breitkopf & Härtel87. Adicionalmente, discorremos sobre duas
versões da obra, uma encontrada na Biblioteca de Berlim (Staatsbibliothek zu Berlin
tradução nossa). 86
[...] first movement, Allegro: quarter note = 120. […]. Second movement, Arioso e Mesto: according to Quantz, a mesto in 3/4 time should be played: quarter note = 40; the movement is, however, “more arioso than sorrowful”, so that quarter note = c.80 is appropriate. Third movement, Presto: judging from the overall make-up of the piece, an adequate tempo might be quarter note = 160. 87
Firma alemã de editores e impressores de música. Foi fundada em Leipzig, em 1719, pelo impressor Bernhard Christoph Breitkopf (1695-1777). A partir de 1745, sob o comando de seu filho Johann Gottlob Immanuel (1719-94), alcançou fama por sua produção eficiente e por sua tipografia musical aprimorada (em 1754-5 foram introduzidos tipos divisíveis e móveis), bem como por sua notável lista de compositores, de Telemann a Haydn e C.P.E.Bach; seus catálogos temáticos permanecem inestimáveis. Gottfried Christoph Härtel (1763-1827) comprou a firma em 1796; [...]. (GROVE, 1994, p.133).
85
- Preußischer Kulturbesitz) e a outra, na da Universidade de Dresden (Saxon State
and University Library Dresden - SLUB). No processo de interpretação do Arioso e
Mesto (e estudo destas edições), os elementos tessitura, ornamentos, dinâmica e
articulação foram constantemente revisados.
Horst Augsbach, no Prefácio de sua versão (Breitkopf Urtext, N. 5219,
1991), menciona quatro sets completos do concerto os quais identifica como: fonte
A, fonte B, fonte C e fonte D. De acordo com este autor:
[…] A fonte A é o material composto a partir da partitura para a primeira apresentação no Palácio Charlottenburg. As muitas inserções autográficas e correções nesse material ressaltam a autenticidade e confiabilidade dessa fonte. As partes para Charlottenbourg serviram de fonte para um segundo material para Potsdam (fonte B), que foi usada no Palácio da Cidade de Potsdam. Depois dessas duas fontes principais, os seguintes conjuntos de partes são de importância secundária, uma vez que ambos derivam de B: o material de performance C (originalmente destinado a Sans Souci, mas dado por Quantz a seu amigo Pisendel para a Orquestra da Corte de Dresden; foi usado posteriormente como a fonte para ambas as performances de Furstenau em 1877 assim como para a primeira edição de 1884) e D (uma cópia particular pertencente a Herr von Schbning). Curiosamente, Quantz continuou a trabalhar em A após a fonte B ter sido transcrita, como podemos ver por numerosas correções subsequentes, que não estão contidas em B e também faltam, portanto, em C e D. (AUGSBACH, 1991, p. IV, tradução nossa)
88.
Para a elaboração de sua edição (Figura 27), Augsbach lança mão,
principalmente, da fonte A. Além disso, indica algumas padronizações que utiliza ao
longo da partitura:
Dinâmicas: forte = f, piano = p;
Instrumentos: Flauto traversiero = Flauto Traverso; Violetta = Viola;
Acidentes, Dinâmicas, Ornamentação, Fraseado, etc: quando utiliza estes
elementos das fontes B, C ou D, coloca um parêntese como indicação.
88
[…]. Source A is the material which was made from the lost score for the first performance in Charlottenburg Palace. The many autographic entries and corrections in this material underscore the authenticity and reliability of this source. The parts pour Charlottenbourg served as the source for a second material pour Potsdam (Source B), which was used in the Potsdam City Palace. After these two main sources, the following sets of parts are of secondary importance, as both of them derive from B: the performance material C (originally intended pour Sans Souci, but given by Ouantz to his friend Pisendel for the Dresden Court Orchestra; it was used later as the source for both Furstenau's performance in 1877 as well as for the first edition of 1884) and D (a private copy belonging to a Herr von Schbning), Interestingly, Ouantz continued to work on A after Source B had been transcribed, as we can see from numerous subsequent corrections which are not contained in Band are thus missing in C and D.
86
O outro editor do concerto de Quantz, Johann Heinrich Wilhelm Barge
(1836-1925), teve uma carreira muito promissora como flautista. Em 1862 começou
a trabalhar como professor de flauta do conservatório de Leipzig e desenvolveu
diversos trabalhos como intérprete neste instrumento: em 1860 foi flautista principal
da orquestra da corte de Detmolder; de 1867 a 1895, flautista principal da orquestra
de Leipzig.
Publicou no ano de 1880 um método de flauta Praktische Flötenschule e
como editor, trabalhou em várias composições para este instrumento89. Por
exemplo: as 6 sonatas de Johann Sebastian Bach para flauta e cravo; concerto para
flauta em Ré menor, op. 69, de Bernhard Molique; arranjo para flauta e piano da
obra Songs Without Words de Felix Mendelssohn; dentre outros.
Na edição do concerto de Quantz à qual tivemos acesso (numeração
3097), a obra vem descrita como: Konzert für Flöte, zwei Violinen, Violetta und
bezzifferten Baß (Figura 28). Ao final da primeira página do primeiro movimento,
Barge ressalta que em algumas partes, modificou o escrito de Quantz para uma
oitava acima (não sabemos em qual fonte se baseou para tal modificação).
Quanto à edição original do concerto, Augsbach (1991, p. IV) afirma que
esta versão não existe mais. Porém, tivemos acesso ao manuscrito da obra (com a
inscrição Mus. 2470-0-1) que foi gentilmente enviado pela biblioteca da Universidade
de Dresden (Saxon State and University Library Dresden, SLUB). Inferimos que tal
manuscrito (Figura 29) seja a fonte C ressaltada por Augsbach pelo seguinte motivo:
de acordo com Feike Bonnema, o flautista Moritz Fürstenau realizou várias
alterações nesta partitura90, portanto, poderia ser a mesma que foi utilizada em seu
recital no ano de 1877. Além disso, Augsbach afirma que a fonte C serviu como base
para a interpretação deste flautista neste mesmo ano.
Na pesquisa de Augsbach, a fonte A foi encontrada na biblioteca de
Berlim (Staatsbibliothek zu Berlin - Preußischer Kulturbesitz). Não tivemos acesso à
89
HAIDER, Claudia. Biography of Johann Heinrich Wilhelm Barge (1836-1925). Disponível em: <http://www.flutepage.de/deutsch/composer/person.php?id=1296&englisch=true>. Acesso em: 20 mar. 2015. Em pesquisa bibliográfica encontramos também o trabalho completo e digitalizado, The flutist's orchestra studies: a collection of the most difficult movements, solos, etc., for the flute, taken from standard operas, symphonies and orchestral arrangements. Escrito por Barge, foi publicado em 1900 pela Editora Carl Fischer. O trabalho original está na biblioteca da Universidade da Califórnia. 90
BONNEMA, Feike. Listen to Quantz’s Music. Disponível em: <http://jjquantz.org/index.php/youtube-test>. Acesso em: 9 abr. 2015.
87
partitura, pois não está digitalizada, no entanto, na edição do concerto QV 5:174,
este autor disponibiliza a primeira parte do Arioso e Mesto até o compasso 32
(Figura 30).
Para uma melhor compreensão do concerto em Sol maior, os elementos
tessitura, dinâmica, ornamentos e articulação foram constantemente revisados e
observados no processo de interpretação. Decidimos pela produção de tabelas para
exemplificar estes elementos no Arisos e Mesto e como são utilizados nas edições
mencionadas. No Anexo III disponibilizamos tais tabelas e no Anexo II as partituras
do segundo movimento. As edições comparadas com a fonte A foram vistas até o
compasso 30, já as outras, consideramos o movimento todo. Sendo assim,
respectivamente, apresentamos: fonte A e manuscrito de Dresden; fonte A e edição
de Augsbach; fonte A e edição de Barge; manuscrito de Dresden e edição de
Augsbach; manuscrito de Dresden e edição de Barge; edição de Augsbach e edição
de Barge
4.2 O Arioso e Mesto: ornamentação
A edição utilizada para a interpretação91 do concerto QV 5:174 e
ornamentação do Arioso e Mesto foi a do autor Horst Augsbach. Adicionalmente,
realizamos encontros e ensaios com a Professora Doutora Helena Jank (orientadora
da pesquisa) e aulas de flauta com a Professora Livia Lanfranchi. Tanto nos
encontros e ensaios, quanto nas aulas, discutíamos as orientações de Quantz para
a ornamentação (contidas em seu tratado) e também a improvisação que seria
realizada pela própria pesquisadora, focalizando para aspectos interpretativos
importantes do século XVIII: acento, afeto, articulação, tessitura, dinâmica,
ornamentos, dentre outros.
Quanto às orientações de Quantz, lançamos mão dos seguintes capítulos
de seu tratado: XIII, XIV, XV e XVIII. No XIII (Sobre as mudanças ou variações
arbitrárias em intervalos simples), o compositor nos apresenta tabelas com exemplos
de improvisação em intervalos diversos. Vale ressaltar que Quantz explica
detalhadamente todas as variações contidas nas tabelas e figuras. Apresentamos
91
Interpretação do Concerto no dia 04/12/2014, recital de Mestrado da autora da dissertação.
88
nesta dissertação apenas aquelas que foram utilizadas para a ornamentação do
Arioso e Mesto. Estes exemplos, retirados da edição de Rodolfo Murillo, foram a
base para a improvisação da autora:
Figura 17: Uníssono
89
Figura 18: Intervalo de Segunda
90
Figura 19: Intervalo de Terça
91
Figura 20: Intervalo de Quarta
92
Figura 21: Intervalo de Quinta
93
Figura 22: Intervalo de Sexta
94
Figura 23: Intervalo de Sétima
95
Figura 24: Mais alguns intervalos
96
No Capítulo XIV (Sobre a maneira que se deve tocar o Adagio), Quantz
ressalta que, através da interpretação de um movimento lento, podemos distinguir:
um simples amante da música; um músico com disciplina e domínio técnico no
instrumento. Além disso, apresenta os vários tipos de Adagios existentes
exemplificando em tabelas alguns meios de ornamentá-los. Do capítulo XIV,
conforme o item 3.2.1 (A Arte de ornamentar o Adagio) desta dissertação, seguimos
as orientações de Quantz para a interpretação do Arioso e Mesto nos seguintes
pontos: ornamentação (essencial e livre), dinâmica (mantivemos as da edição;
acrescentamos um p no compasso 56; no compasso 12 colocamos um p no
segundo tempo) e ritmo (destaque para as apojaturas e dissonâncias), tomando
bastante cuidado para não obscurecer a melodia principal e nem a harmonia com a
improvisação.
Para a elaboração da cadência, utilizamos o Capítulo XV do Versuch
(Sobre as Cadências). Vejamos algumas considerações de Quantz:
Finalidade da cadência: surpreender o ouvinte e deixar uma impressão
particular em seu espírito. Por esta razão, uma cadência apenas basta;
São utilizadas principalmente em peças patéticas e lentas ou em peças
rápidas que sejam sérias;
Não existem regras para a elaboração de uma cadência. Uma cadência
alegre não cabe em uma peça triste e vice-versa. Deve fluir do sentimento
principal que domina a obra. Construa sua cadência com base na parte
principal;
Tente mesclar figuras variadas;
Não divagar para tonalidades muito distantes que não têm conexão com a
tonalidade principal da peça; se a cadência for muito longa, podemos
passar para a subdominante ou dominante.
Devem ser realizadas numa só respiração; No caso da cadência realizada
pela autora, tentamos, ainda que com mais respirações, manter a fluidez,
como se uma parte se costurasse na outra.
97
Por fim, do Capítulo XVIII (Como se deve julgar a um músico e uma obra
musical), seguimos mais algumas orientações de Quantz em relação à interpretação
de um Adagio. De acordo com o autor, tópico 35, o Adagio deve distinguir-se do
primeiro movimento de um concerto, tanto na métrica, quanto na tonalidade.
Somado a isso, tópico 36, no movimento lento temos a oportunidade de transparecer
e instigar os sentimentos. Antes, os Adagios eram compostos com base na
harmonia, sendo que o intérprete deveria improvisar a melodia e os ornamentos. No
entanto, segundo o autor, não era qualquer músico que conseguia realizar essas
improvisações de maneira satisfatória, por este motivo, os compositores passaram a
escrever os Adagios mais cantabiles.
No tópico 36, Quantz ainda afirma que o Adagio não possui tantos
simpatizantes, por isso, o compositor precisa observar algumas regras para que o
movimento se torne o mais agradável possível. São elas:
Tanto os ritornellos quanto as seções em que a parte concertante toca
sozinha, precisam ser breves;
Os ritornellos devem ser melodiosos, harmoniosos e expressivos;
A parte principal deve ter uma melodia que permita acrescentar alguns
ornamentos, no entanto, ela também deve agradar sem a presença dos
mesmos;
A melodia da parte principal deve sempre alternar com as passagens do
tutti;
A melodia da parte principal deve ser composta de maneira bem afetuosa
e expressiva como se existissem palavras que caminhassem com ela;
Precisamos utilizar em algumas partes passagens provenientes do
ritornello;
Não se deve modular muito para outras tonalidades, isso tiraria a
brevidade do movimento;
O acompanhamento do solo deve ser simples, a parte principal não deve
ser impedida de ter ornamentos agregados (muitos ou poucos, de acordo
com a percepção do intérprete);
98
Caracterizar o adagio de acordo com o sentimento que ele evoca, de
modo que possamos adivinhar o movimento requerido.
O Arioso e Mesto do concerto QV 5:174 contém 70 compassos e está na
tonalidade de Sol menor. A instrumentação proposta por Quantz para este
movimento é a seguinte: Violino I, Violino II, Viola e um Baixo. Augsbach (1991, p.
IV) afirma que tal instrumentação era utilizada nos concertos de câmara diários da
corte de Frederico II. Ainda segundo este autor:
Para os seus concertos de câmara diários, Frederico II reunia a sua volta um círculo seleto de músicos, geralmente dois violinos, viola, violoncelo, contrabaixo e cravo. De seu Conselheiro Privado von Schbning, sabemos que por volta de 1770 "a flauta era acompanhada por dois violinos, uma viola, um violoncelo, um fagote e o piano". Contudo, para uma interpretação ideal do concerto deve-se empregar a formação usada nos concertos de fim de tarde do rei Frederico. Neste caso, deve-se preferir o histórico traverso à flauta moderna como o instrumento de solo. Porém, não há razão para não se usar uma orquestra de câmara para o acompanhamento. Não se deveria exceder, entretanto, o corpo máximo de instrumentistas que a orquestra de Dresden teria reunido: quatro instrumentistas para cada um dos violinos I e II, duas violas e violoncelos, um contrabaixo e a cravo. O acompanhamento reduz-se a um instrumento por parte nas seções de solo. (AUGSBACH, 1991, p. IV, tradução nossa)
92.
Abaixo, na Figura 25, segue a nossa versão ornamentada e na 26 a
Cadência:
92
[…]. For his daily chamber concerts, Frederick II gathered around him a choice circle of musicians, generally two violins, viola, violoncello, double bass and harpsichord. From Privy Councilor von Schbning, we know that around 1770 "the flute was accompanied by two violins, a viola, a violoncello, a bassoon and the pianoforte." However, for an ideal rendering of the concerto one should employ the ensemble used at King Frederick's evening concerts. In this case, the historical flauto traverso should be given preference over the modern flute as the solo instrument. However, there is no reason not to use a chamber orchestra for the accompaniment. It should perhaps not exceed the maximum body of performers the Dresden orchestra would have mustered: four players each of violins I and II, two violas and violoncellos, one double bass and the harpsichord. The accompaniment is reduced to one instrument per part at the solo sections.
99
Figura 25: Arioso e Mesto ornamentado pela autora
100
101
Figura 26: Cadência
102
CONCLUSÃO
Dividida em 4 capítulos, esta pesquisa teve como objetivo o estudo da
prática da ornamentação para movimentos lentos em obras do período barroco. Ao
final, apresentamos o Arioso e Mesto do concerto em Sol maior para flauta, violinos
1 e 2, viola e baixo contínuo (QV 5:174) de Johann Joachim Quantz, ornamentado
conforme indicações deste autor em seu tratado Versuch einer Anweisung die Flöte
traversiere zu spielen.
Estudamos a ornamentação italiana e francesa no decorrer do século
XVIII e percebemos que ambas são muito importantes para o processo de
interpretação de um Adagio. Com a ornamentação francesa ou essencial,
aprendemos os principais ornamentos escritos pelos compositores em suas obras.
Podemos elencar: apojatura, trinado, grupeto, mordente, battement, flattement. Com
a ornamentação italiana ou livre, aprendemos a expandir o texto escrito pelo
compositor, colocando bastante atenção na harmonia, fraseado, respiração, notas
principais da melodia, para não descaracterizar a obra em questão.
Ornamentos essenciais, como a apojatura e o trinado, foram bem
utilizados na ornamentação do Arioso e Mesto, assim como a ornamentação livre.
Isto foi possível em decorrência de:
Interpretação dos exemplos descritos por Quantz em relação às variações
em intervalos. Empregando ritmos diversos, dinâmica e articulação
diferenciadas e nos atentando à harmonia, conquistamos, ainda que
moderadamente, a prática para improvisar em melodias;
Durante os 6 meses de aula com a professora Livia Lanfranchi,
conversamos muito sobre os afetos em música e o que seria de fato
importante transparecer aos ouvintes na execução do concerto QV 5:174.
Com isto em mente, o foco foi direcionado à obra e à interpretação, sendo
que alguns problemas técnicos no decorrer do estudo foram solucionados
principalmente a partir da compreensão sobre os afetos da peça.
Audição do concerto QV 5: 174 por flautistas diversos. A escuta da obra
nos auxiliou na compreensão das frases, na demarcação das respirações,
103
no ajuste do som. Com a Professora Doutora Helena Jank, entendemos a
base harmônica efetuada pelo baixo contínuo, facilitando assim o
desenvolvimento da improvisação nas frases do Arioso e Mesto.
Estudo harmônico para a elaboração dos ornamentos. O Arioso e Mesto
do concerto QV 5:174 está na tonalidade de Sol menor. Do compasso 9
ao 12 (compassos não ornamentados), percebemos claramente a
harmonia de tônica (Sol menor) e de dominante (Ré maior).
Descreveremos, resumidamente, o caminho harmônico dos compassos
ornamentados:
o No compasso 13 iniciamos a elaboração dos ornamentos. Deste
compasso até o 16, a harmonia ainda está na região de Sol menor
e Ré maior. Vale ressaltar que o cromatismo realizado por Quantz
no final do compasso 12 e no 13, pode ser uma possível
ornamentação (um caminho) do próprio autor para chegar na
dominante (compasso 14), sendo que começamos uma
ornamentação mais rica neste trecho para ressaltar este
cromatismo e chegada no Ré maior também no final do período,
compasso 16;
o Do compasso 17 ao 21, a harmonia está na região de Si bemol
maior, ou seja, a relativa maior da tônica (Sol menor). No final do
compasso 16 e início do 17, percebemos uma cadência de engano
(Ré maior – Si b maior). No compasso 21, realizamos nossa
ornamentação em torno dos acordes de Fá maior e Si b maior,
ressaltando assim o final deste período na região de Sib maior;
o Do compasso 22 ao 39, Quantz escreve o seu Arioso e Mesto em
torno de Dó menor, ou seja, a subdominante de Sol menor. Nos
compassos 25 e 26, percebemos o mesmo movimento melódico
dos compassos 12 e 13, isto é, o cromatismo como um possível
caminho para chegar não mais na dominante de Sol menor, mas
na dominante de Dó menor, ou seja, Sol maior (compasso 27). No
compasso 26 nossa ornamentação reforça esta chegada em Sol
104
maior e nos compassos 28, 29 e 30 os ornamentos destacam o
caminho harmônico para a resolução em dó menor (compasso 31);
o Do compasso 40 ao 70, estamos em torno da tônica novamente,
apesar de, momentaneamente, Quantz passar por outras regiões,
como no caso dos compassos: 40 (Fá maior); 41, 42 e 43 (Si b
maior); 44 (Fá maior); 60 (Si b maior e Mi b maior);
o Nos compassos 45 (Sol menor) e 46 (Dó menor), os ornamentos
destacam o caminho para a chegada na dominante (Ré maior) no
compasso 47;
o Nos compassos 49 e 50 (ver a edição de Augsbach) temos uma
sequência rítmica de colcheias, como nos compassos 13 e 25. No
entanto, o movimento melódico destas colcheias mescla-se entre
ascendente e descendente, enquanto que no 13 e 25 predomina o
ascendente. Os ornamentos realizados nos compassos 13, 26 e 50
ressaltam tal movimento melódico e destacam o cromatismo escrito
por Quantz;
o As várias colcheias no compasso 49 caminham para o Dó menor
(compasso 50), sendo que o acorde de Sol maior com sétima no
final do 49 reforça esta passagem. No compasso 51, voltamos para
a dominante de Sol menor (Ré maior), sendo que no final do
compasso 50 o acorde de Dó sustenido diminuto também confirma
esta passagem;
o Do compasso 52 ao 62, nossa ornamentação destaca o caminho
harmônico i (a partir do 52) - iv (a partir do 56) - i (compasso 62);
o Vale destacar que Quantz inicia os compassos 13, 25 e 49 sempre
depois de uma mesma sequência rítmica (ver os compassos 11,12;
23, 24; 47, 48);
o A Cadência foi realizada a partir do acorde de dominante
(compasso 64).
Com isso, percebemos que Quantz mantém a tonalidade de Sol menor no
segundo movimento de seu concerto, apesar de percorrer outras regiões,
105
enfatizando ora a tônica e a dominante (Sol menor e Ré maior), ora a subdominante
(Dó menor) e também a relativa maior (Si b maior). Nossa ornamentação, além de
intuitiva, buscou reforçar estas passagens (muitas vezes presentes em finais de
frases ou períodos). A exemplo:
Compassos 13, 14, 15: para a chegada em Ré maior;
Compasso 21: ênfase em Sib maior;
Compassos 26, 28, 29, 30: ênfase em Dó menor;
Compassos 45 e 46: para a chegada em Ré maior;
Compassos: 50, 52, 53, 54, 55: ênfase i – iv – i.
Compasso 61: para a chegada em Sol menor no 62.
De maneira geral, nosso caminho harmônico percorrido foi:
Tabela 6: Movimento harmônico resumido
Compassos Região
9 ao 16 Sol menor
17 ao 21 Si b maior
22 ao 39 Dó menor
40 ao 70 Sol menor
Através do estudo sobre ornamentação, conhecemos obras importantes
como os tratados de Quantz, C. P E. Bach, Tartini e Leopold Mozart. A partir da
leitura de algumas partes destas obras, refletimos sobre a completude do
conhecimento musical dos músicos do período barroco: além de tocarem com
grande excelência vários instrumentos, sabiam improvisar, compor, escrever textos
muito bem embasados teoricamente, dentre outras habilidades.
Recomenda-se a leitura do tratado de Quantz por todos os flautistas e
músicos em geral. Este autor oferece conselhos valiosos sobre a performance
musical no decorrer do século XVIII, aos quais podemos lançar mão em
interpretação de obras de outros períodos também.
106
Esperamos que o nosso olhar para as obras musicais e teóricas do
período barroco não seja apenas bibliográfico, mas possa trazer um sólido
embasamento teórico. Tais obras podem despertar sensibilidade, criação e
expressão no processo de interpretação, muitas vezes ofuscado pelo estudo da
técnica, não tirando a importância do estudo técnico para o aperfeiçoamento
instrumental.
No caso da autora deste trabalho, o estudo técnico foi prioridade em
muitos anos de prática musical. A partir do momento que começamos a
compreender a interpretação como o diálogo entre a técnica, criação, sensibilidade e
expressão (despertados pelo processo de improvisação e ornamentação),
conquistamos o prazer na execução de um repertório variado, principalmente o
barroco. Encerramos este trabalho com as palavras de Tom Moore:
Eu gostaria de poder gravar música barroca com a qualidade de ornamentação que ela merece. Sinto que estou fazendo progressos nesta direção, mas acho que deveríamos aspirar ao tipo de liberdade e criatividade que se encontram no Jazz. Isso faria enorme diferença em executar música barroca. (Tom Moore, apud RÓNAI, 2008, p. 209).
107
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111
ANEXOS
112
Anexo I: Ornamentos
Tabela 7: Ornamentos
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen
Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule Giuseppe Tartini - Traité des
Agrémes de la Musique
Orn
am
en
to (
ap
resen
taçã
o)
Capítulo 2, Parte 1, tópico 1: Ninguém coloca em dúvida a necessidade dos ornamentos. Basta notar que eles se encontram em grande quantidade por toda parte. Considerando-se o seu uso, são mesmo indispensáveis. Eles fazem a conexão entre as notas; dão-lhes vida; dão-lhes, quando necessário, um acento e um peso especiais; tornam as notas agradáveis; despertando, assim, uma atenção especial; ajudam na expressão, seja em uma peça triste, alegre ou de qualquer outro tipo; em grande parte, é neles que se concentra a oportunidade para uma boa execução; podem melhorar uma composição medíocre, enquanto, sem eles, a melhor melodia parecerá vazia e simples, e o conteúdo mais claro parecerá confuso
93.
Capítulo 1, Parte 3, tópico 23: As pequenas notas que são sempre vistas (particularmente na música moderna) antes das notas reais são as chamadas Appoggiature ou Apojaturas, que não são consideradas na somatória dos tempos do compasso. Elas são, se tocadas no momento certo, indisputavelmente um dos ornamentos mais charmosos, e, portanto, nunca podem ser negligenciadas. Lidaremos com elas separadamente
94. [...]. Capítulo XI, tópico 22: Todas essas decorações são
usadas, entretanto, apenas quando se está tocando um solo, e bem espaçadamente, no tempo certo, e apenas para dar mais variedade a passagens muito repetidas ou similares entre si. E olhe bem para as direções dadas pelo compositor, uma vez que a ignorância na aplicação desses ornamentos é facilmente percebida. Particularmente, evite ornamentos totalmente improvisados quando vários [instrumentistas] tocarem a mesma parte. [...] Sei como é assustador ouvir as peças mais melodiosas pateticamente distorcidas por ornamentações desnecessárias
95. [...]. Capítulo IX, tópico 22: Há ainda
alguns ornamentos neste capítulo; a um chamarei Ueberwurf, a outro Rückfall ou Abfall, o terceiro Doppelschlag, o quarto Meio-trilo, e o quinto Nachschlag. O Ueberwurf é uma nota que é ligada discretamente à nota que precede a appoggiatura
96. [...].
Página 77: Tratado sobre ornamentos musicais, incluindo a origem da appoggiatura, seu valor e onde a colocar, todos os vários tipos de trilos, como utilizá-los; o vibrato e o mordente, o uso que deles se pode fazer, os modos ou ornamentos naturais, os modos floridos que são infinitos; como construir uma cadenza
97.
93
Tradução do tratado para o português por Fernando Cazarini. 94
The little notes which are always seen (particularly in modern music) in front of ordinary notes, are the so-called Appoggiature or Grace-notes, which are not reckoned in the value of the bar. They are, if played at the right moment, indisputably one of the most charming of ornamentations, and therefore never to be neglected. We will deal with them separately. [...]. Tradução para o inglês por Editha Knocker, edição de 1985. 95
All these decorations are used, however, only when playing a solo, and then very sparingly, at the right time, and only for variety in often-repeated and similar passages. And look well at the directions of the composer; for in the application of such ornaments is one's ignorance soonest betrayed. But in particular, guard against all improvised embellishments when several play from one part. [...]. I know how it frightens one, when one hears the most melodious pieces distorted so pitifully by means of unnecessary ornamentations. [...]. 96
There are still some embellishments belonging to this chapter, of which I will call one the Ueberwurf, another the Rückfall or Abfall, the third the Doppelschlag, the fourth the Half-triller, and the fifth the Nachschlag. The Ueberwurf is a note which is slurred quite quietly on to the note preceding the appogiatura. [...].
113
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen
Violinschule Giuseppe Tartini - Traité des
Agrémes de la Musique
Ap
oja
tura
Capítulo 2, Parte II, Tópico 1: As apojaturas estão entre os ornamentos mais indispensáveis. No primeiro caso são agradáveis, pois ligam bem as notas; no caso das notas, que por serem longas, frequentemente podem ser desagradáveis, as apojaturas encurtam-nas, preenchendo com som nossos ouvidos; enfim, às vezes repetem a nota precedente, e sabe-se, pela experiência, que, principalmente na música, é agradável a repetição bem-feita. No outro caso elas modificam a harmonia, que seria muito simples sem essas apojaturas. Elas estão na origem de todos os retardos e dissonâncias: e o que seria uma harmonia sem esses elementos?. Tópico 2: As apojaturas às vezes são escritas como as outras notas, com seu valor próprio no compasso, e às vezes são indicadas especialmente por pequenas notas. As notas maiores que as sucedem parecem, à primeira vista, conservar o seu valor, mas sempre perdem um pouco dele na execução. Tópico 8: Os sinais das apojaturas, bem como os sinais dos trinados, são conhecidos por todos e é por isso que são geralmente indicados. Mas como nem sempre se pode contar com essa indicação, deve-se tentar, na medida do possível, determinar os contextos dessas apojaturas variáveis. Parte VI, Tópico 1: Denomina-se apojatura dupla quando, em vez de simplesmente tocar uma nota, repete-se uma vez a nota anterior, para em seguida tocar a nota, fazendo com que esta seja precedida por uma segunda superior, ou quando, em vez de repetir a nota anterior, toca-se a segunda inferior da nota para depois tocar, como no caso anterior, a segunda superior da nota e então, finalmente, tocar a nota.
Capítulo IX, tópico I: As Appoggiature são pequenas notas que ficam entre as notas reais, mas não são consideradas como parte dos tempos do compasso. Elas são exigidas pela própria Natureza para encadear as notas, tornando a melodia mais cantável. Digo pela própria Natureza, uma vez que é inegável que até mesmo um camponês encerra suas canções com apojaturas, as quais, afinal, têm importância
98. [...]. Tópico 2:
Há tanto appoggiature descendentes como ascendentes, as quais, entretanto, dividem-se entre appoggiature acentuadas e appoggiature de passagem. As appoggiature descendentes são mais naturais, uma vez que, segundo as mais corretas regras da composição, elas possuem a verdadeira natureza de uma apojatura
99. [...].
Tópico 3: As appoggiature descendentes são de dois tipos, a saber: a Longa e a Curta
100. [...].
Tópico 28: Nachschlag (dupla apojatura): […]. É um par de pequenas notas rápidas que se pode ligar à nota principal, em peças lentas, para avivar a performance
101. [...].
Pagina 77: As apojaturas são notas menores acrescentadas ao lado das principais; Na França são chamadas de pequenas notas; São consideradas ornamentos; Existem dois tipos de apojaturas: as que vêm abaixo ou acima das notas principais. Além de sua posição entre as notas, as apojaturas podem ter valores diferenciados, mais curtos ou mais longos; Várias outras características e regras quanto ao uso das apojaturas; Alguns exemplos, páginas 77 (posição da apojatura; apojatura longa), página 80 (apojatura curta), página 81 (combinações entre apojaturas).
97
Treatise on the ornaments of music, including the origen of appoggiatura, its value and where to put it; all the various kinds of trills, how to use them; the vibrato and the mordent, the use to which they can be put; the modes or natural ornaments, the florid modes which are endless; how to construct a cadenza. Tradução para o inglês por Sol Babitz, edição de 1956. 98
The Appoggiature are little notes which stand between the ordinary notes but are not reckoned as part of the bar-time. They are demanded by Nature herself to bind the notes together, thereby making a melody more song-like. I say by Nature herself, for it is undeniable that even a peasant closes his peasant-song with grace-notes for, after all, it only means fundamentally. [...]. 99
There are both descending and ascending appoggiature, which, however, are divided into accentuated appoggiature and passing appoggiature. The descending appoggiature are most natural, for according to the most correct rules of composition they possess the true nature of an appoggiature. [...]. 100
The descending appoggiature are of two kinds: namely, the Long and Short. [...]. 101
[…]. These are a couple of rapid little notes which one can hang on to the principal note; in order, in slow pieces, to enliven the performance. [...].
114
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen
Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule
Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Tri
nad
o
Capítulo II, Parte III, tópico I: Os trinados dão vida à melodia e são, portanto, indispensáveis. Antigamente só eram utilizados após uma apojatura (Figura 90, a), ou quando da repetição da nota precedente (b); no primeiro caso são chamados trinados ligados; hoje em dia, ocorrem tanto em passagens contínuas como descontínuas, logo no começo de uma peça, frequentemente um após o outro, em cadências e também em notas presas (c), fermatas (d), em cesuras sem (e) ou com apojatura. Portanto, esse ornamento atualmente é de uso muito mais arbitrário do que outrora. Tópico 2: Ainda que seja indispensável, esse ornamento deve ser empregado com muita moderação em trechos afetuosos. Tópico 3: Na maneira correta de tocar teclado tem-se quatro tipos de trinados: simples, ascendente, descendente e curto.
Capítulo X, tópico I: O trilo é uma comum e agradável alternância de duas notas vizinhas, em intervalo de tom ou semitom. O trilo, portanto, pode ser de dois tipos: de segunda menor ou segunda maior
102. [...].
Tópico 5: O começo e o fim de um trinado podem ser feitos de várias maneiras
103. […].
Tópico 7: O trinado pode ser dividido em quarto tipos, segundo sua velocidade, a saber: lento, médio, rápido e acelerando. O lento é usado em peças tristes e lentas; o médio em peças que têm um caráter vivo, mas um tempo ainda moderado e suave, o rápido em peças muito vivas e cheias de espírito e movimento e, finalmente, o trinado acelerando é usado principalmente em cadenzas
104. […].
Tartini descreve o trinado como um ornamento ideal na música, porém, não se deve utilizá-lo em demasiado. Define basicamente dois tipos de trinados: os de tom e os de meio tom. Além disso, existem maneiras diferentes quanto à sua execução: lento, moderato ou rápido, dependendo do ritmo e caráter do movimento. Segundo Tartini: “O trilo lento cabe às peças sérias, patéticas e tristes; o moderado às moderadamente alegres; o rápido em peças que são alegres, vivas e ligeiras. Um bom intérprete deve praticar e dominar os trilos em todas essas velocidades; é claro que um trilo em um allegro jocoso e exuberante não deve ser o mesmo que em um grave ou andante malinconico, nem um na corda Mi o mesmo que um na corda Sol. Isso é o mais necessário porque o comando desses diferentes graus de velocidade também é necessário para outras formas de trilo. Por exemplo, em uma nota cadencial que não está presa ao tempo, o melhor trilo é o que começa devagar e gradualmente vai se acelerando até ficar bem rápido
105”.
102
The trill is a common and pleasing alternation of two neighbouring notes which are either a whole-tone or a half-tone apart. The trill therefore is mainly of two kinds: namely the major second and the minor second. […]. 103
The beginning and the end of a trill can be made in various ways. [...]. 104
The trill can be divided into four species according to its speed: namely into slow, medium, rapid, and accelerating. The slow is used in sad and slow pieces; the medium in pieces which have a lively but yet a moderate and gentle tempo, the rapid in pieces which are very lively and full of spirit and movement, and finally the accelerating trill is used mostly in cadenzas. […]. 105
The slow trill is suitable in serious, pathetic and sad pieces; the moderate trill in moderately gay ones; the fast, in pieces which are gay, lively and swift.! A good player must practice and master trills at all these speeds; it is clear that a trill in a cheeky, swaggering allegro must not be the same as in a grave or andante malinconico, nor one on the E string the same as one on the G string. This is all the more necessary because the command of these different degrees of speed is also necessary for other kinds of trills.! For instance, on a cadential note, which is not tied to the beat, the best trill is one which begins slowly and gradually speeds up to become very fast. (TARTINI apud WALLACE, 2003, p. 44-45).
115
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen
Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule
Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Mo
rden
te
Capítulo II, Parte V, tópico 1: O mordente é um ornamento indispensável, que liga as notas, preenche-as e lhes dá brilho. Ele pode ser longo ou curto. Seu sinal e sua execução no primeiro caso estão ilustrados na Figura 140. Quando necessário, esse pode ser alongado (a). O mordente curto nunca é alongado; em (b) vemos o seu sinal e sua execução. Tópico 7: O mordente é utilizado para preencher as notas que devem ser sustentadas; portanto, pode-se encontrá-lo, como vemos na Figura 142, sobre notas ligadas (a), pontuadas (b) e sincopadas; essas síncopes podem ser na mesma nota (c) ou em notas diferentes (d). [...]. Tópico 9: O mordente dá brilho às notas em staccato nos saltos. Neste caso usa-se, na maioria das vezes, o mordente curto. [...]. Parte VIII, tópico I: Sempre indiquei, sem modificação, como vemos na Figura 162, o mordente curto em movimento contrário, cuja nota superior deve ser resvalada, enquanto as duas outras notas devem ser tocadas com dedos firmes. Por causa desse resvalo, esse ornamento, que ainda ninguém tinha analisado, pode chamar-se mordente superior.
Capítulo XI, tópico 8: […] Por mordente, definem-se as duas, três ou mais pequenas notas que rápida e discretamente, por assim dizer, agarra-se à nota principal e desaparece de uma vez, de forma que apenas a nota principal é ouvida com força
106. [...]. Tópico 9: O mordente é feito
de três diferentes formas. Primeiramente, ele vem da própria nota principal. Em segundo lugar, das duas notas vizinhas mais agudas ou graves. Em terceiro lugar, ele é feito com três notas, sendo que a nota principal está entre as duas notas vizinhas. [...]. Alguns, de fato, recusam-se a reconhecer o segundo tipo entre os mordentes, mas diferenciam essas duas pequenas notas do mordente pela palavra Anschlag. Mas na verdade elas têm todas as características de um mordente
107. […].
Página 86: O mordente igualmente é um ornamento derivado da natureza e arte na música vocal e instrumental. Seu caráter é expresso em uma nota por meio de apenas três pequenas notas acrescentadas à nota escrita, e que são executados de duas formas
108, [...]. Página 87: Em suma, se se
deseja realizar um mordente, as notas do ornamento não devem ser ressaltadas, mas seu efeito meramente sentido, tornando a nota principal mais viva, nítida e impetuosa. É por isso que o mordente, por sua natureza, é mais apropriado para músicas vivas e leves que para a aria simples e fluente, e se alguém deseja utilizá-lo nessa ária, ele não é apropriado para todo tipo de ária, mas apenas Andantes e Allegros, quando se deseja dar calor à expressão. Jamais deve ser utilizado em árias sérias, sustentadas e melancólicas
109. [...].
106
By mordent is meant the two, three, or more little notes which quite quickly and quietly, so to speak, grasp at the principal note and vanish at once, so that the principal note only is heard strongly. [...]. 107
The mordent is made in three different ways. Firstly, it comes from the principal note itself. Secondly, from the two next higher and lower notes. Thirdly, it is made with three notes when the principal note falls between the two neighbouring notes. [...].Some, indeed, refuse to reckon the second kind among the mordents, but differentiate these two little notes from the mordent by the word Anschlag. But in truth they have all the characteristics of a mordent. [...]. 108
The mordent is likewise an ornament derived from nature and art in vocal and instrumental music. Its character is expressed on a note by means of three small notes only, joined to the written note, and which are done in two ways, [...]. 109
In short, if a mordent is desired the three joined notes should not be brought out, but their effect merely felt, rendering the main note livelier, bolder, and more fiery. This is why the mordent by its nature is more suitable for lively and light music than for the simple flowing air, and if one wishes to use it in this air it is not suitable for every type of air but only in Andantes and Allegros, when one wishes to lend fire to the expression. It should never be used in serious, sustained, and melancholy airs. […].
116
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu spielen
Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule
Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Gru
peto
Capítulo II, Parte IV, tópico 1: O grupeto é um ornamento fácil, que torna a melodia ao mesmo tempo agradável e brilhante. [...]. Tópico 2: Como, na maioria das vezes. Ele deve ser executado rapidamente, tive que ilustrar o valor de suas pequenas notas tanto em andamentos lentos como rápidos.[...]. Tópico 3: Este ornamento é utilizado tanto em peças lentas como em peças rápidas, tanto em legato como em staccato. Contudo, uma nota muito curta não o admite, pois a melodia poderia ficar confusa, devido às várias notas que, portanto, exigem um certo tempo para ser tocadas. Tópico 4: O grupeto pode ser encontrado ora sozinho sobre uma nota, ora junto com um trinado curto, indicado abaixo dele, ora, ainda, depois de uma ou duas fusas, colocadas antes da nota principal, e que são diferentes de uma apojatura, como veremos mais adiante. Tópico 5: Quando ocorre sozinho, o grupeto é indicado ou exatamente sobre a nota ou depois dela, um pouco mais à direita. Parte VII, tópico 2: As escorregadelas sem ponto consistem em duas notinhas e o grupeto invertido, de três notinhas. Ambos são tocados antes da nota principal. Tópico 4: As escorregadelas distinguem-se ainda dos grupetos invertidos por dois detalhes: (1) aquelas sempre ocorrem antes de um salto, em que preenchem os intervalos (Figura 156); estes, ao contrário, como logo veremos, ocorrem também em outros contextos; (2) aquelas são sempre tocadas rapidamente (b), porém estes não.
Capítulo IX, tópico 26: O Doppelschlag é um ornamento de quatro rápidas pequenas notas que ocorrem entre a appoggiatura ascendente e a nota que a segue, e que estão ligadas à appoggiatura. O acento cai na appoggiatura; na volta o acento diminui e o mais fraco ocorre na nota principal
110.
[...]. Tópico 27: O Doppelschlag é exatamente o mesmo na aparência, exceto por ser invertido. É usado entre a appoggiatura e a nota principal, mas é tocado tão rapidamente que soa exatamente como o início de um trilo, razão de seu nome
111. […]. Capítulo XI,
tópico 18: O ornamento que é chamado Groppo é uma combinação de notas a uma pequena distância umas das outras, tocadas rapidamente
112. [...]. Tópico 19:
O círculo e o meio-círculo são um pouco diferentes do Groppo. Se forem apenas quatro notas, eles são chamados Meio-Círculo, mas se forem oito notas é um Círculo
113. […].
Página 75: O estilo de Tartini é claro e algumas de suas afirmações extremamente inequívocas, o que ajuda a esclarecer aspectos da performance que ainda não estão completamente compreendidos. A evidência de Tartini ajuda a explicar, por exemplo, por que os principais livros que não tratavam de instrumentos de teclado (Tosi, Quantz, Geminiani, L. Mozart) omitem símbolos para o mordente e o grupeto, e por que esses termos são tratados diferentemente nesses livros
114; A última
parte desta seção trata de dois tipos de mordentes. O primeiro trata-se de um ornamento do tipo gruppetto; três pequenas notas acrescidas àquela escrita. Tartini preferiu um gruppetto descendente e defende o seu uso principalmente em andamentos rápidos! Ele acredita que este ornamento “é dado pela Natureza” e deve ser tocado muito rápida e levemente, de forma que as três notas unidas deixem a nota principal mais viva, mais nítida e arrebatadora
115. [...].
110
The Doppelschlag is an embellishment of four rapid little notes, which occur between the ascending appoggiatura and the note following it, and which are attached to the appoggiatura. The accent falls on the appoggiatura; on the turn the tone diminishes, and the softer tone occurs on the principal note. [...]. 111
The Doppelschlag is exactly the same in appearance, except that it is inverted. It is used between the appoggiatura and the principal note, but is played so rapidly that is sounds exactly like the beginning of a trill; whence its name. [...]. 112
The ornament which is called Groppo is a combination of notes lying at a slight distance from each other, which combination is made by means of a few rapid notes. [...]. 113
The circle and half-circle are little different from the groppo. If they be only four notes, they are called the Half-Circle; but if there be eight notes, then is it a Whole Circle. [...]. 114
Tartini's style is clear and some of his statements unequivocal in the extreme, all of which helps shed light on aspects of performance which are still not completely understood. Tartini's evidence helps explain, for example, why the leading nonkeyboard books (Tosi, Quantz, Geminiani, L. Mozart) omit symbols for the mordent and turn, and
117
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art
das Clavier zu spielen
Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule
Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Tre
mo
lo,
Vib
rato
Capítulo 3, tópico 3: São elementos de uma boa execução: a força ou suavidade das notas, sua pressão, o resvalo, o legato, o staccato, o vibrato, o arpejar, o sustentar, o ritardando e o accelerando. [...]. Tópico 20: Uma nota longa e afetuosa exige um vibrato, que se obtém balançando o dedo sem retirá-lo. [...].
Capítulo XI, tópico 1: O Tremolo é uma ornamentação que resulta da própria Natureza e que pode ser usada encantadoramente em uma nota longa, não só por bons instrumentistas, mas também por cantores inteligentes. A Natureza é a própria instrutora disso
116. […]. Tópico 4: Mas há
também uma oscilação lenta, crescente e rápida
117. [...].
Página 85: Esta espécie do ornamento é, por sua natureza, melhor ajustada a instrumentos do que à voz. Às vezes, quando ocorre em uma voz humana, é devido à natureza daquela voz. O som de cordas do cravo, de sinos, e de cordas abertas de determinados bons instrumentos de fricção, deixa em seu despertar natural uma ondulação no ar a qual foi provocado por ele. Esta ondulação é causada pelas vibrações das partes muito pequenas que compõem o metal, ou pela vibração contínua do conjunto de cordas movido pelo arco, em caso de um instrumento de fricção, e pelo saltador (saltarello) no caso de uma corda de cravo. Na imitação deste efeito, pode-se produzir esta vibração artificialmente no violino, viola, e violoncelo com um dedo pressionando a corda enquanto o vibrador é impresso no dedo com a força do pulso, sem que o dedo solte a corda, apesar de levantar-se ligeiramente. Se o vibrato do dedo for lento, a ondulação, que é o vibrato do som, será lenta; se for rápido, a ondulação será rápida. Cada um pode, apropriadamente, aumentar a velocidade da ondulação pouco a pouco, começando lentamente e tornando-a gradualmente mais rápida. Um exemplo mostrará este aumento indicado com pequenos semicírculos, cujos tamanhos relativos marcam a lentidão e a rapidez e, consequentemente, a velocidade aumentada
118.
why these very terms are treated differently in these books. 115
The last part of this section deals with two types of mordents. The first is a turn-like embellishment; three small notes joined to the written one. Tartini preferred a descending turn and advocates its use mainly in quick tempi.! He believes this ornament is “given by Nature” and should be played very fast and lightly so the three joined notes render the main note livelier, bolder and more fiery. […]. (WALLACE, 2003, p. 52 - 53). 116
The Tremolo is an ornamentation which arises from Nature herself and which can be used charmingly on a long note, not only by good instrumentalists but also by clever singers. Nature herself is the instructress thereof. [...]. 117
But there is also a slow, an increasing, and a rapid oscillation. [...]. 118
This kind of ornament is by its nature better suited to instruments than to the voice. Sometimes, when it occurs in a human voice, it is due to the nature of that voice. The sound of harpsichord strings, of bells, and of open strings of certain good bowed instruments leaves in its natural wake an undulation in the air which has been animated by it. This undulation is caused by the vibrations of the tiny parts composing the metal, or by the continued vibration of the string set in motion by the bow in the case of a bowed instrument, and by the jack in the case of a harpsichord string. In imitation of this effect one can produce this vibration artificially on the violin, viola, and cello with a finger held on the string while the vibrato is impressed on the finger with the force of the wrist, without the finger leaving the string, despite its being lifted slightly. If the vibrato of the finger is slow, the undulation which is the vibrato of the sound will be slow; if it is fast, the undulation will be fast. One can accordingly increase the speed of the undulation little by little, by starting slowly and rendering it faster by degrees. An example will show this augmentation indicated with small semicircles, the relative sizes of which mark the slowness and the
118
Carl Philipp Emanuel Bach - Versuch über die wahre Art das Clavier zu
spielen Leopold Mozart - Versuch einer gründlichen Violinschule
Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Batt
em
en
t
(Não consta na bibliografia consultada)
Capítulo XI, tópico 15: Há ainda alguns outros ornamentos que recebem, em maioria, nomes italianos. Apenas o Battement é de origem francesa. Ribattuta, Groppo, Tirata, Mezzo Circolo e outros são de origem italiana. E, mesmo que raramente sejam mencionados, vou, apesar disso, exemplifica-los aqui, uma vez que eles não estão em desuso e ainda podem ser aplicados
119.
[...]. Tópico 16: O Battement é um prolongado mordente de dois semitons vizinhos, em que o mordente prolongado da nota mais grave para a mais aguda é repetida diversas vezes, uma após outra com mais rapidez. O battement ou este mordente prolongado não devem ser confundidos com o tremolo ou o trilo, nem com o mordente oriundo da nota principal
120. […].
(Não consta na bibliografia consultada)
quickness and consequently the increased speed. 119
There are still a few other embellishments which are mostly named from the Italian. The Battement only is of French origen. The Ribattuta, Groppo, Tirata, Mezzo Circulo, and other such, are of Italian birth. And even though one now rarely hears them mentioned, I will, in spite of this, set them down here, for they are not without use and may well be used still. […]. 120
The battement is a prolonged mordent of two neighbouring half-tones, which prolonged mordent from the lower half-tone to the upper is repeated a number of times, one after the other with the greatest rapidity. The battement or this prolonged mordent must not be mistaken for the tremolo or the trill, nor yet with the mordent flowing from the principal note. [...].
119
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Giuseppe Tartini - Traité des Agrémes de la Musique
Cad
ên
cia
Capítulo 3, tópico 30: As cadências ornamentadas são também composições de improviso. De acordo com o caráter da peça, são tocadas livremente, sem levar em conta o compasso. Por isso, nas Lições, o valor das notas dessas cadências é aproximado. Ele só apresenta de certa forma a velocidade e a variedade dessas notas. Em cadências a duas ou três vozes, há sempre uma pausa entre cada proposição antes que comece a outra voz. [...]; Parte II, Capítulo 30, tópico 1: Meus leitores devem ter visto na primeira parte deste Ensaio que as cadências finais ocorrem com e sem ornamento. Portanto, queremos aqui ensinar ao acompanhador como ele deve agir em ambos os casos; Tópico 2: Na entrada de uma cadência ornamentada, haja ou não a indicação de uma fermata no baixo, o acompanhador deve sustentar o acorde de quarta e sexta por um momento. Então, faz pausa até que, no fim da cadência, a voz principal ou outras vozes façam a resolução necessária do acorde mencionado através de um trinado final. [...].
Capítulo XI, tópico 7: Antes de começar uma cadenza, que ao final de um solo é improvisada, é costume sustentar uma longa nota na tônica ou na dominante. Em tal nota, um tremolo crescente pode sempre ser usado. Por exemplo: encerrando um adagio
121 [...].
Páginas 99 e 100: Cadências floridas é o termo geral em referência a todos os tipos de peças musicais, em andamentos sérios ou alegres – em suma, o termo descreve cadências finais, nas quais o cantor ou instrumentista pode parar à vontade e, sem se ater ao tempo, as faz durar o quanto deseja, ou consegue. É por isso que, na primeira das duas notas que formam a cadência há um sinal que indica a liberdade de parar o quanto tempo se desejar na parte principal, vocal ou instrumental. Todas as partes do acompanhamento, consequentemente, devem ter o mesmo sinal, uma vez que todos devem parar pelo mesmo tempo que a parte principal. Esse tipo de cadência é atualmente mais um capricho que uma cadência, porque hoje, todo cantor ou instrumentista se permite alongar tanto e com expressões tão diferentes que não é razoável chamá-lo de cadência; deve-se por força chamá-lo capricho. Um capricho pode ser estendido tanto quanto se deseja, e pode constituir trechos com diferentes caráteres e fórmulas de compasso. Mas já que os ouvintes atualmente se deleitam com esse tipo de coisa, mesmo sendo anormal e doentia, deve-se saber como o executar – e como o realizar com algum juízo é o que vamos descrever
122; Ele [Tartini]
segue discutindo cadenzas “artificiais”, “Cadências conhecidas como ‘artificiais’ são aquelas que encerram qualquer peça de música, lenta ou rápida. Esse termo indica cadências finais nas quais o cantor ou instrumentista para à vontade sem se ater ao tempo, e as fazem durar o quanto desejarem ou o quanto as podem prolongar
123”. [...].
121 Before beginning a cadenza which at the end of a solo is improvised thereto, it is costumary to sustain a long note either on the key-note or on the dominant. On such a long sustained note an increasing tremolo can always be used. For example: At the close of an adagio [...]. 122 Florid cadences is the general term referring to all kinds of pieces of music, in serious or gay tempos—in short, this term describes final cadences over which the singer or instrumentalist stops at will and, without regard for tempo, makes them last as long as he wishes, or is able. That is why, on the first of the two notes forming the final cadence there is a formula sign, which denotes the freedom to stop as long as one wishes in the principal part, vocal or instrumental. All the parts which serve to accompany the principal part should consequently have a similar formula sign, because they must all stop as long as the principal part. This type of cadence is at present more a caprice than a cadence, because today, every singer or instrumentalist permits himself to draw it out to such a degree, and with such different expressions that it is not reasonable to call it cadence; one must perforce call it caprice. A caprice can be extended as far as one wishes, and can consist of pieces and different sentiments with different time signatures. But since listeners are pleased at present to hear this sort of thing, however anomalous and ill suited, one must know how to do it—and how to do it with some sort of judgment is that of which we shall speak. 123 He goes on to discuss “artificial” cadenzas, “Cadences known as ‘artificial’ are those by which any piece of music, either slow or fast, is brought to a close.! This term indicates final cadences on which the singer or instrumentalist stops at will without regard to the beat, and makes them last as long as he wishes or as long as he can prolong them. [...]”. (TARTINI, apud WALLACE, 2003, p. 57).
120
Anexo II: Partituras
Figura 27: Edição de Horst Augsbach
121
122
123
124
125
126
Figura 28: Edição Wilhelm Barge
127
128
Figura 29: Manuscrito de Dresden
129
130
Figura 30: Fonte A
131
Anexo III: Edições comparadas
Tabela 8: Fonte A e Manuscrito
Fonte A (até o compasso 30) Manuscrito de Dresden (até o compasso 30)
Tessitura Igual (inclusive a disposição dos compassos, o 32 é o último da primeira página)
Igual
Dinâmica
Utilização das siglas p, f, pia. e for.; Algumas modificações: Anacruse do Comp. 9: piano; Comp. 10: piano no último tempo; Comp. 11: forte nas semínimas; Comp. 12: forte nas colcheias; Comp. 14: piano nas colcheias (segundo e terceiro tempos); Comp. 15: forte; Comp. 22: piano e forte; Comp. 25: forte; Compassos 26, 27, 28, 29 e 30: não há sinal de dinâmica.
Utilização das siglas p, f, pia., for., mf, sinais de crescendo e diminuendo; Algumas modificações: Anacruse do Comp. 9: mf; Comp. 10: crescendo (último tempo); Comp. 11: forte na figura rítmica do primeiro tempo, um diminuendo (cor clara) nas semínimas; Comp. 12: forte (riscado) nas colcheias; Comp, 14: sinal de crescendo em cima da dinâmica apagada; Comp. 15: não há sinal de dinâmica; Comp. 22: não há sinal de dinâmica; Comp. 25: forte apagado e sinal de crescendo; Comp. 26: forte e um decrescendo (cor clara) na figura rítmica do último tempo; Comp. 27: forte (cor mais clara) e sinais de crescendo e diminuendo; Comp. 28: crescendo; Comp. 29: diminuendo e forte; Comp. 30: crescendo.
Ornamentação
Igual (trinados e apojaturas): Comp. 9: apojatura; Comp. 10: trinado; Comp. 11: trinado; Comp. 14: apojatura; Comp. 15: trinado; Comp. 16: trinado; Comp. 18: trinado; Comp. 19: trinado; Comp. 20: trinado; Comp. 22: trinado; Comp. 23: trinado; Comp. 24: trinado; Comp. 27: apojatura; Comp. 28: apojatura; Comp. 29: apojatura; Comp. 30: trinado.
Igual (trinados e apojaturas)
Articulação
Algumas Modificações: Comp. 9, primeiro tempo: duas ligaduras (apojatura e colcheia; duas semicolcheias); Comp. 21, segundo tempo: não há ligadura nas 3 semicolcheias; Comp. 22, primeiro tempo: ligadura nas três semicolcheias; Comp. 23, primeiro tempo: não há ligadura; Comp. 30, primeiro tempo: não há ligadura; demais compassos a articulação é igual.
Algumas modificações: Comp. 9, primeiro tempo: uma ligadura na figura rítmica (apojatura, colcheia e duas semicolcheias); Comp. 21, segundo tempo (ligadura nas três semicolcheias); Comp. 22, primeiro tempo: ligadura nas quatro semicolcheias (está por cima de outra ligadura, igual da Fonte A); Comp. 23, primeiro tempo: ligadura na figura rítmica; Comp. 30, primeiro tempo: ligadura nas 4 semicolcheias; demais compassos a articulação é igual.
Considerações
As duas versões possuem a mesma tessitura e os mesmos ornamentos; A dinâmica muda bastante (no manuscrito de Dresden, algumas modificações são indicadas por riscos, acréscimos e cor mais clara); A fonte A não possui sinais de crescendo e diminuendo, diferente do manuscrito. Exemplos: compassos 10, 11, 12, 13, 14, 21, 25, 26, 27, 28, 29 e 30; Encontramos dinâmicas semelhantes nas duas versões. Alguns exemplos: compassos 12, 20, 21, 24. A articulação é bem parecida em ambas edições (poucas modificações).
Tabela 9: Fonte A e Augsbach
132
Fonte A ( até o compasso 30) Edição de Augsbach (até o compasso 30)
Tessitura Igual Igual
Dinâmica
Utilização das siglas p, f, pia. e for.; Modificações: Comp. 23: não há sinal de dinâmica; Comp. 27, não há sinal de dinâmica; Comp. 30: não há sinal de dinâmica; demais compassos a dinâmica é igual.
Utilização das siglas f e p; Modificações: Comp. 23: forte; Comp. 27, segundo tempo: piano entre parênteses; Comp. 30, primeiro tempo: forte entre parênteses; demais compassos a dinâmica é igual.
Ornamentação
Igual (trinados e apojaturas): Comp. 9: apojatura; Comp. 10: trinado; Comp. 11: trinado; Comp. 14: apojatura; Comp. 15: trinado; Comp. 16: trinado; Comp. 18: trinado; Comp. 19: trinado; Comp. 20: trinado; Comp. 22: trinado; Comp. 23: trinado; Comp. 24: trinado; Comp. 27: apojatura; Comp. 28: apojatura; Comp. 29: apojatura; Comp. 30: trinado.
Igual (trinados e apojaturas)
Articulação Igual Igual
Considerações As duas versões possuem a mesma tessitura, os mesmos ornamentos e a mesma articulação. Augsbach acrescenta apenas algumas dinâmicas.
133
Tabela 10: Fonte A e Barge
Fonte A (até o compasso 30) Versão de Wilhelm Barge (até o compasso 30)
Tessitura Diferente em alguns compassos: 9, 10, 11, 12, 14, 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30.
Modificações para uma oitava acima: Compassos 9, 10, 11, 12 (até o segundo tempo), 14 (segundo tempo), 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30 (Mi).
Dinâmica
Utilização das siglas p, f, pia. e for.; Algumas modificações: Comp. 10: piano; Comp. 15: forte; Comp. 17: não há sinal de dinâmica; Comp. 19: não há sinal de dinâmica; Comp. 21: forte; Comp. 22: piano e forte; Comp. 23: não há sinal de dinâmica; comp. 25: forte; Comp. 27: não há sinal de dinâmica; Comp. 30: não há sinal de dinâmica.
Utilização das siglas mf, mp, f, p. Algumas modificações: Comp. 10: não há sinal de dinâmica; Comp. 15: não há sinal de dinâmica; Comp. 17: mf; Comp. 19: forte e um diminuendo; Comp. 21: piano e crescendo; Comp. 22: mf e crescendo; Comp. 23: forte e diminuendo; Comp. 25: mf e crescendo; Comp. 27: piano, diminuendo e crescendo; Comp. 30: forte e diminuendo. Nesta versão existem muitos sinais de crescendo e diminuendo.
Ornamentação Algumas modificações: Comp. 9: apojatura; Comp. 16: trinado; Comp. 18: trinado; Comp. 19: trinado; Comp. 20: trinado; Comp. 22: trinado.
Algumas modificações: Comp. 9: sem apojatura; Comp. 16: Mordente; Comp. 18: floreio com três notas; Compassos 19, 20, 23 e 24: Barge escreve a terminação do trinado; Comp. 22: não tem o trinado no dó colcheia.
Articulação
Algumas modificações: Comp. 9: ligadura em duas figuras rítmicas; Comp 10: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura; comp. 11: as duas semínimas estão ligadas; comp. 21: as três semicolcheias do segundo tempo não estão ligadas; Comp. 23: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura; Comp. 30: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura.
Algumas modificações: Comp. 9: ligadura em três figuras rítmicas; Comp. 10: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 11: não há ligadura entre as semínimas; Comp. 21: ligadura entre a última colcheia do primeiro tempo e as 4 semicolcheias do segundo; Comp. 23: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 30: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo.
Considerações Percebemos muitas modificações na versão de Barge. A escrita uma oitava acima (flauta com mais recursos técnicos) e acréscimo das ligaduras revelam algumas das características do estilo romântico, além da partitura conter mais indicações para a interpretação do flautista: graduações de dinâmica, terminação dos trinados, detalhamento da maneira de execução (dolce, compasso 17).
134
Tabela 11: Manuscrito e Augsbach
Manuscrito de Dresden Versão de Augsbach
Tessitura Modificação: Comp. 64: indicação para fazer oitava acima as duas semínimas (cor mais clara)
Não há nenhuma indicação para realizar uma oitava acima.
Dinâmica
Utilização das siglas p, f, pia., for., mf, sinais de crescendo e diminuendo. Algumas modificações: Anacruse do 9: mf; Comp. 9: não há sinal de dinâmica no último tempo; Comp. 10: crescendo nas três semicolcheias; Comp. 11: forte no primeiro tempo; Comp. 12: dinâmica riscada nas colcheias; Comp. 14: dinâmica apagada e um sinal de crescendo nas três últimas colcheias; Comp. 15: não há sinal de dinâmica; Comp. 22: não há sinal de dinâmica; Comp. 23: não há sinal de dinâmica; Comp. 25: forte riscado e sinal de crescendo; Comp. 26: forte; Comp. 27: forte (cor mais clara); Comp. 29: forte; Comp. 30: sinal de crescendo; Comp. 45: forte (cor mais clara); Comp. 49: forte riscado; Comp. 51: crescendo e diminuendo; Comp. 53: forte; Comp. 54: crescendo; Comp. 56: forte e indicação de crescendo; Comp. 58: forte; Comp. 62: forte na colcheia do primeiro tempo.
Utilização das siglas p, f. Algumas modificações: Anacruse do 9: piano; Comp. 9: forte na última colcheia do terceiro tempo; Comp. 10: piano no último tempo; Comp. 11: forte no segundo tempo; Comp. 12: piano no primeiro tempo e forte nas colcheias; Comp. 14: piano nas três últimas colcheias; Comp. 15: forte; Comp. 22: piano; Comp. 23: forte; Comp. 25: forte; Comp. 26: não há sinal de dinâmica; Comp. 27: piano entre parênteses; Comp. 29: não há sinal de dinâmica; Comp. 30: forte entre parênteses; Comp. 45: não há sinal de dinâmica; Comp. 49: forte; Comp. 51: piano; Comp. 53: não há sinal de dinâmica; Comp. 54: forte entre parênteses; Comp. 56: não há sinal de dinâmica; Comp. 58: piano entre parênteses; Comp. 62: forte entre parênteses na última colcheia.
Ornamentação Modificações: Comp. 44: trinado na colcheia do primeiro tempo;
Modificações: trinado na colcheia do primeiro tempo e na semicolcheia do segundo tempo;
Articulação
Algumas modificações: Comp. 9: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 21: ligadura nas três semicolcheias do segundo tempo; Comp. 22: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo (acrescentada); Comp. 23: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 30: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 47: ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 53: ligadura em todas as notas do último tempo; Comp. 54: não há ligadura entre as notas do primeiro e segundo tempo;
Algumas modificações: Comp. 9: 2 ligaduras na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 21: não há ligadura nas três semicolcheias do segundo tempo; Comp. 22: ligadura nas três semicolcheias do primeiro tempo; Comp. 23: não há ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 30: não há ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 47: não há ligadura na figura rítmica do primeiro tempo; Comp. 53: ligadura nas três primeiras notas do último tempo; Comp. 54: ligaduras nas colcheias (primeiro e segundo tempos).
Considerações
A tessitura e a ornamentação são bem parecidas nas duas versões. No manuscrito de Dresden constatamos: bastante graduações de intensidade; alterações de cor e riscos para indicar dinâmica e articulação. O manuscrito de Dresden pode não ter sido uma das fontes para as dinâmicas entre parênteses de Augsbach. Exemplo em Augsbach: 27 (p), 30 (f), 54 (f), 58 (p), 62 (f) na colcheia do ultimo tempo; No manuscrito: 27 (f cor clara); 30 (crescendo); 54 (não há sinal de dinâmica); 58 (f); 62 (f cor clara na colcheia do primeiro tempo).
135
Tabela 12: Manuscrito e Barge
Manuscrito de Dresden Edição de Wilhelm Barge
Tessitura Diferente em alguns compassos: 9, 10, 11, 12, 14, 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 58, 59, 60, 61.
Algumas modificações para uma oitava acima: Compassos 9, 10, 11, 12 (até o segundo tempo), 14 (segundo tempo), 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30 (Mi), 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50 (até o Dó), 58, 59, 60, 61 (até o Fá #).
Dinâmica
Utilização das siglas p, f, for., pia., mf; Algumas modificações: Anacruse do Comp. 9: mf; Comp. 14: sinal de dinâmica apagado e um crescendo; Comp. 17: não há sinal de dinâmica; Comp. 19: não há sinal de dinâmica; Comp. 21: sinal de dinâmica riscado e um crescendo; Comp. 22: não há sinal de dinâmica; Comp. 25: sinal de dinâmica riscado e um crescendo; Comp. 26: forte; Comp. 27: forte (cor mais clara) e graduações de intensidade (crescendo e diminuendo); Comp. 36: não há sinal de dinâmica; Comp. 54: apenas um crescendo no final do compasso; Comp. 56: forte; Comp. 61: diminuendo.
Utilização das siglas p, f, mf, mp. Algumas modificações: Anacruse do Comp. 9: piano; Comp. 14: piano; Comp. 17: mf; Comp. 19: forte e um diminuendo; Comp. 21: piano e um crescendo; Comp. 22: mf e um crescendo; Comp. 25: mf e um crescendo; Comp. 26: não há sinal de dinâmica; Comp. 27: piano e graduações de intensidade (crescendo e diminuendo); Comp. 36: mp; Comp. 54: forte; Comp. 56: crescendo; Comp. 61: não há sinal de dinâmica.
Ornamentação Utilização de apojaturas e trinados. Algumas modificações: Comp. 9: apojatura; Comp. 16: trinado; Comp. 18: trinado; Comp. 38: trinado; Comp. 44: trinado.
Utilização de apojaturas e trinados. Nas passagens com trinados, Barge escreve as terminações; Algumas modificações: Comp. 9: não há apojatura; Comp. 16: mordente; Comp. 18: florido com três notas; Comp. 38: mordente; Comp. 44: mordente e sem trinado.
Articulação
Algumas modificações: Comp. 9: colcheias não ligadas; Comp. 10: figura ritmica do primeiro tempo sem ligadura; Comp. 11: semínimas ligadas; Comp. 13: 4 colcheias ligadas; Comp. 21: figura rítmica do último tempo (3 semicolcheias ligadas); Comp. 40: sem ligaduras; Compassos 41 e 42: ligadura nas semínimas; Comp. 44: ligadura nas três primeiras notas do último tempo; Comp. 47: ligadura nas semínimas; Comp. 50: colcheias ligadas de 3 em 3.
Algumas modificações: Comp. 9: colcheias ligadas; Comp. 10: figura ritmica do primeiro tempo com ligadura; Comp. 11: semínimas sem ligadura; Comp. 13: todas as colcheias ligadas; Comp. 21: figura rítmica do último tempo (todas as semicolcheias ligadas); Comp. 40: colcheias ligadas; Compassos 41 e 42: semínimas sem ligadura; Comp. 44: ligadura na figura rítmica do último tempo; Comp. 47: semínimas sem ligadura; Comp. 50: colcheias ligadas.
Considerações Tessitura uma oitava acima em alguns compassos da edição de Barge; as duas versões possuem graduações de intensidade; utilização de apojaturas e trinados; Barge utiliza em alguns compassos uma articulação bem parecida com a do manuscrito. Alguns exemplos: compassos 26, 27, 28, 51, 52, 56 ao 65.
136
Tabela 13: Augsbach e Barge
Edição de Augsbach Edição de Wilhelm Barge
Tessitura Diferente em alguns compassos: 9, 10, 11, 12, 14, 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 58, 59, 60, 61.
Algumas modificações para uma oitava acima: Compassos 9, 10, 11, 12 (até o segundo tempo), 14 (segundo tempo), 15, 16, 25, 26, 27, 28, 29, 30 (Mi), 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50 (até o Dó), 58, 59, 60, 61 (até o Fá #).
Dinâmica
Utilização das siglas p, f. Algumas modificações: Comp. 9: forte; Comp. 10: piano; Comp. 15: forte; Comp. 17: não há sinal de dinâmica; Comp. 19: não há sinal de dinâmica; Comp. 21: forte; Comp. 22: piano; Comp. 25: forte; Comp. 36: não há sinal de dinâmica; Comp. 41: não há sinal de dinâmica; Comp. 47: não há sinal de dinâmica; Comp. 49: forte; Comp. 51: piano; Comp. 58: piano entre parênteses; Comp. 61: não há sinal de dinâmica; Comp. 62: forte entre parênteses.
Utilização das siglas p, f, mf, mp. Algumas modificações: Comp. 9: crescendo e diminuendo; Comp. 10: não há sinal de dinâmica; Comp. 15: não há sinal de dinâmica; Comp. 17: mf; Comp. 19: forte e diminuendo; Comp. 21: piano e um crescendo; Comp. 22: mf e um crescendo; Comp. 25: mf com um crescendo; Comp. 36: mp; Comp. 41: forte e um diminuendo; Comp. 47: forte e um diminuendo; Comp. 49: crescendo; Comp. 51: crescendo e diminuendo; Comp. 58: mf; Comp. 61: piano; Comp. 62: crescendo.
Ornamentação
Utilização de apojaturas e trinados. Algumas modificações: Comp. 9: apojatura; Comp. 16: trinado; Comp. 18: trinado; Comp. 38: trinado; Comp. 44: dois trinados.
Utilização de apojaturas e trinados. Nas passagens com trinados, Barge escreve as terminações. Algumas modificações: Comp. 9: não há apojatura; Comp. 16: mordente; Comp. 18: florido com três notas; Comp. 38: mordente; Comp. 44: mordente e sem trinado.
Articulação
Algumas modificações: Comp. 9: ligadura em duas figuras rítmicas; Comp. 10: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura; Comp. 21: semicolcheias do segundo tempo não tem ligadura; Comp. 23: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura; Comp. 29: figura rítmica no último tempo (ligadura nas três primeiras notas); Comp. 30: figura rítmica do primeiro tempo não tem ligadura; Comp. 54: ligadura nas colcheias.
Algumas modificações: Comp. 9: ligadura em três figuras rítmicas; Comp. 10: figura rítmica do primeiro tempo com ligadura; Comp. 21: semicolcheias do segundo tempo com ligadura; Comp. 23: figura rítmica do primeiro tempo com ligadura; Comp. 29: figura rítmica do último tempo (ligadura em todas as notas); Comp. 30: figura rítmica do primeiro tempo com ligadura; Comp. 54: Colcheias do primeiro e segundo tempo sem ligadura.
Considerações Percebemos diferenças entre as edições destes dois autores. Em relação à edição de Barge: muitos trechos escritos uma oitava acima; graduações de intensidade bem presentes; articulação com predominância de ligaduras. A ornamentação em ambas versões lançam mão das apojaturas e trinados. A versão de Augsbach se mantém bem fiel à Fonte A.
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Anexo IV: Originais dos textos de Quantz
Página 51: Prefácio (2º parágrafo)
Ich habe mich deswegen auch in die Lehren vom guten Geschmacke in der
praktischen Musik etwas weitläufitig eingelassen. Und ob ich zwar dieselben
hauptsächlich nur auf die Flöte traversiere angewendet habe: so können sie doch
auch allen denen nützlich seyn, welche so wohl vom Singen, als von Ausübung
anderer Instrumente Werk machen, und sich eines guten musikalischen Vortrages
befleissigen wollen. Es darf nu rein jeder, dem daran gelegen ist, was sich für seine
Stimme, oder sein Instrument schicket, heraus nehmen, und sich zu Nutzen Machen.
Página 31: Capítulo I, tópico 2
Dass aber in den Abendlaendern die Deutschen die ersten gewesen, welche den
Grund zur Flöte traversiere nebst vielen andern Blasinstrumenten, wo nicht von
neuem geleget, doch zum wenigsten wieder hervorgesuchet haben ; ist ausser allem
Zweifel. Die Engländer nennen dieses Instrument deswegen : the German Flute, (die
deutsche Flöte.) Die Franzosen benennen es ebenfalls la Flûte alemande.
Página 49 : Capítulo X, tópico 5
Für einen Anfänger ist nöthig, das ser zu Uebung des Ansatzes, der Zunge, und der
Finger, erstlich ganz kleine und leichte Stücke erwähle; damit das Gedächtnis nicht
mehr beschweret werde, als die Zunge, und die Finger. Solche Stücke können aus
leichten Tönen, als: G dur, C dur, A moll, F dur, Hmoll, D dur und E moll gesetzet
seyn.
Página 77 : Capítulo XI, tópico 12
Ich muss hierbey eine nothwendige Anmerkung machen, welche die Zeit, wie lange
jede Note gehalten werden muss, betrifft. Man muss unter den Hauptnoten, welche
man auch: anschlagende, oder, nach der Art der Italiäner, gute Noten zu nennen
pfleget, und unter den durchgehenden, welche bey einigen Ausländern schlimme
heissen, einen Unterschied im Vortrage zu machen wissen. Die Hauptnoten müssen
allezeit, wo es sich thun lässt, mehr erhoben werden, als die durchgehenden. Dieser
138
Regel zu Folge müssen die geschwindesten Noten, in einem jeden Stücke von
mässigen Tempo, oder auch im Adagio, ungeachtet sie dem Gesichte nach
einerley Geltung haben, dennoch ein wenig ungleich gespielet warden. […].
Página 61: Capítulo XIV, tópico 2
Man kann das Adagio, in Ansehung der Art dasselbe zu spielen, und wie es nöthig
ist, mit Manieren auszuzieren, auf zweyerley Art betrachten; entweder im
französischen, oder im italiänischen Geschmacke. Die erste Art erfordert einen
netten und an einander hängenden Vortrag des Gesanges, und eine Auszierung
desselben mit den wesentlichen Manieren, als Vorschlägen, ganzen und halben
Trillern, Mordanten, Doppelschlägen, battemens, flattemens, u.d.gl.; sonst aber keine
weitläufigen Passagien, oder grossen Zusatz willkürlicher Verzierungen. […] Die
zweite, nämlich die italiänische Art besteht darinne, dass man in einem Adagio, so
wohl diese kleine französischen Auszierungen, als auch weitläuftige, doch mit der
Harmonie übereinkommende gekünstelte Manieren anzubringen suchet.
Página 76: Capítulo XIV, tópico 3
Die französishce Art das Adagio auszuzieren, kann man durch gute Amweisung,
ohne die Harmonie zu verstehen, erlernen. Zur italiänischen hingegen wird die
Wissenschaft der Harmonie unumgänglich erfordert […].
Página 73: Capítulo XIV, tópico 4
Dass die französischen Componisten die Auszierungen mehrentheils mit hin
schreiben; und der Ausführer also auf nichts weiter zu denken habe, als sie gut
vorzutragen, ist schon gesagt worden. Im italiänischen Geschmacke wurden, in
vorigen Zeiten, gar keine Auszierungen darzu gesetzet; sondern alles der Willkühr
des Ausführers überlassen […]. Seit einigen Zeiten aber, haben die, welche sich
nach der italiänischen Art richten, auch angefangen, die nothwendigsten Manieren
anzudeuten. Vermuthlich deswegen, weil man gefunden hat, dass das Adagio von
manchem unerfahrnen Ausführer sehr verstümmelt worden; und die Componisten
dadurch wenig Ehre erlanget haben.
139
Página 75: Capítulo XIV, tópico 9
Hierzu kann auch das abwechselnde Piano und Forte sehr vieles beytragen, als
welches nebst dem, von kleinen und grossen Manieren vermischten, geschickt
abwechselnden Zusatze, hier, das durch den Spieler auszudrückende musikalische
Licht und Schatten, und von der äussersten Nothwendigkeit ist. Jedoch muss
solches mit vieler Beuhrteilung gebrauchet werden, damit man nicht mit allzugrosser
Heftigkeit von dem einen zum andern gehe, sondern unvermerkt zu=und abnehme.
Página 76: Sessão VI, Capítulo XVII, tópico 13
Wie aber der Verdruss nicht immer von einerley Heftigkeit seyn kann; also haben
auch von den Dissonanzen, einige mehr, einige weniger Wirkung; und muss also
davon immer eine stärker, als die andere angeschlagen werden.[…].
Página 76: Sessão VI, Capítulo XVII, tópico 14 (uma parte)
[...] Ich theile dem oben gesagten zu Folge, die Dissonanzen , in Ansehung ihrer
Wirkungen, und des darnach einzurichtenden Anschlags, um mehrerer Deutlichkeit
willen, in drey Classen ein. Die erste bezeichne ich mit mezzo forte; die zweite mit
forte; und die dritte mit fortissimo. […]. […] Ich setze dabey voraus, dass man die
consonirenden Accorde des Adagio zu einem Solo nicht in der äussersten Stärke,
sondern überhaupt mezzo piano accompagniren müsse, damit man den Vortheil
behalte, wo es nöthig ist, schwächer und starker spielen zu können.
Página 91: Capítulo XVIII, tópico 40:
Um auch bey einem Concert eine proportionirliche Länge zu beobachten; kann
man die Uhr dabei zu Rathe ziehen. Wenn der erste Satz die Zeit von fünf Minuten,
das Adagio fünf bis sechs Minuten, und der letzte Satz die Zeit von fünf einnimmt: so
hat das ganze Concert seine gehörige Länge. Es ist überhaupt, ein grösserer
Vortheil, wenn die Zuhörer ein Stück eher zu kurz, als zu lang finden.
Página 62: Capítulo XVIII, tópico 76 (uma pequena parte)
Mit einemssimoe: die italiänische Musik isst willkürlich, und die französiche ein
geschränket: daher es bey dieser mehr auf die Composition, als auf die Ausführung,
140
bey jener aber fast so viel, ja bey einigen Stücken fast mehr, auf die Ausführung, als
auf die Composition ankömmt […].
141
Anexo V: Link para a audição do Arioso e Mesto: Recital de Mestrado
https://youtu.be/9csXX16d4zs
https://youtu.be/5v_4_4FINAw
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