TEXTOS COMPLETOS COMUNICAO
EIXO 1
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Sumrio
1. A INDISSOCIABILIDADE ENTRE ENSINO E PESQUISA E A FORMAO INICIAL DE PROFESSORES: TENSES DA DOCNCIA UNIVERSITRIA.
2. A PRTICA EDUCATIVA NO ENSINO SUPERIOR: ESPAO INTERSUBJETIVO E TELEOLGICO DE DELIBERAO
3. A RELAO ENSINO/PESQUISA NA FORMAO DE PROFESSORES: A EXPERINCA DO BANCO DE AULAS PARA A CONSTRUO DA PRXIS DOCENTE
4. A RELAO TEORIA-PRTICA NA FORMAO DOCENTE VIVENCIADA NUM PROJETO EXTENSIONISTA DENOMINADO: PROJETO EJA-APAE: UMA EXPERINCIA ALFABETIZADORA
5. A URGNCIA DA PESQUISA NO ENSINO SUPERIOR
6. CONCEPES DE ENSINO E APRENDIZAGEM NA GRADUAO: UM ESTUDO COM PROFESSORES UNIVERSITRIOS
7. CONTRIBUIES DA DIDTICA NOS CURSOS DE PS-GRADUAO LATO SENSU EM SADE: FORMAO PARA A DOCNCIA NO ENSINO SUPERIOR?
8. DOCNCIA UNIVERSITRIA EM EDUCAO FSICA E O PARADIGMA DA COMPLEXIDADE: ALGUMAS APROXIMAES
9. EM BUSCA DE UMA POSIO DE PROFESSOR LEGTIMA: UMA TRAVESSIA NA EXPERINCIA DE ESTGIO DOCNCIA A PARTIR DO CONCEITO DE SELF DIALGICO DE HERMANS
10. ENSAIO SOBRE UM ESTUDO ETNOFRFICO: CONFIGURAES TERICAS E METODOLGICAS
11. INDICADORES DE QUALIDADE DO ENSINO SUPERIOR: O PROCESSO DA AVALIAO NA CONSTRUO DO SABER PROFISSIONAL
12. MESTRANDOS E ORIENTADORES JUNTOS NA DOCNCIA: FORMAO DE PROFESSORES A PARTIR DO ESTGIO EM DOCNCIA
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13. O CAMPO DA LUDICIDADE NO CURRCULO DE FORMAO DO
PEDAGOGO
14. O ENSINO E A APRENDIZAGEM NA EDUCAO SUPERIOR: DESAFIOS E NOVAS POSSIBILIDADES
15. O PROFESSOR UNIVERSITRIO E O PLANEJAMENTO DE ENSINO
16. O TRABALHO DE CONCLUSO DE CURSO: CONSTRUCTO EPISTEMOLGICO NO CURRCULO FORMAO, VALOR E IMPORTNCIA
17. O TRABALHO PEDAGGICO E AS PRTICAS DE ESTGIO NA FORMAO DO PROFESSOR PEDAGOGO.
18. PROFESSORES FORMADORES DE PROFESSORES: FORMAO, SABERES E PRTICAS
19. REFLEXES SOBRE OS SABERES E PRTICAS DA DOCNCIA UNIVERSITRIA
20. RELAO ENSINO SUPERIOR/EDUCAO BSICA: CONTRIBUIES DA UNIVERSIDADE PARA A CONSTRUO DE UM CURRCULO HIPERTEXTUAL PARA JUVENTUDES
21. FORMAO DE PROFESSORES (AS): DESAFIOS DE UMA REINVENO EPISTEMOLGICA.
22. DESENVOLVIMENTO DA DOCNCIA EM NVEL SUPERIOR: de situaes vivenciadas na prtica formao de rede de saberes
23. DOCNCIA EM PEDAGOGIA: A RELEVNCIA DA DIMENSO LDICA E DA HISTRIA DE VIDA NO PROCESSO DE FORMAO DE PROFESSORES
24. QUALIDADE DO ENSINO NA EDUCAO SUPERIOR: DESAFIOS PARA A UNIVERSIDADE CONTEMPORNEA (MONICA TORRES)
25. SABERES DA DOCENCIA NO ENSINO SUPERIOR (ARQUIVO EM PDF). MARINGELA SANTANA GUIMARES SANTOS
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A INDISSOCIABILIDADE ENTRE ENSINO E PESQUISA E A
FORMAO INICIAL DE PROFESSORES: TENSES DA DOCNCIA UNIVERSITRIA.
Carla Carolina Costa da Nova*
Resumo
Esta comunicao um recorte de uma pesquisa concluda que buscou conhecer como docentes de uma universidade pblica entendem a relao entre ensino e pesquisa na formao inicial de professores, no contexto da universitrio identificado pela indissociabilidade entre ensino e pesquisa, por diversas concepes de formao de professores que circulam no meio acadmico e pela crescente importncia atribuda prtica da pesquisa. Por ser um princpio contraditrio, gerou vrias formas para nortear essa relao. Mas existem algumas que reafirmam a viso de ensino e pesquisa hegemnicos, muito marcado pela concepo de conhecimento ainda dominante, e outras que buscam ressignificar os lugares e as formas de desenvolver a docncia, a investigao em sala de aula o papel da formao profissional. Os participantes da investigao foram professores de um mesmo curso de licenciatura em pedagogia e foram abordados por meio da entrevista semiestruturada. Os dados colhidos foram tratados conforme a anlise de contedo do tipo temtica. A discusso dos resultados trouxe indcios de que o pensamento dos participantes sobre a relao entre ensino e pesquisa est vinculado de forma conflituosa s seguintes dimenses: concepo de pesquisa, concepo de ensino, concepo de professor, ou seja, que tipo de profissional esses docentes buscam formar.
Palavras-chave: Ensino Pesquisa Indissociabilidade - Formao inicial do professor - Universidade.
O ensino e a pesquisa na universidade esto envoltos pelo princpio formal da
indissociabilidade que se instituiu depois de um processo histrico de conflitos e
contradies, sob disputas polticas, e sobretudo, de concepes de universidade e de
sociedade. Como afirma Tobias (1986), essas tenses esto presentes desde a
implantao tardia da educao superior brasileira, e giraram em torno de conflitos para
a implantao de instituies voltadas apenas para a formao profissionalizante e com
a responsabilidade exclusiva de oferecimento de ensino, outras instituies que se
voltariam para a realizao de pesquisas e formao de pesquisadores e outras que mais
*
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Mestre em Educao e Contemporaneidade pelo Programa de Ps-Graduao em Educao e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia PPGEduC/UNEB e integrante do Grupo de Pesquisa Docncia Universitria e Formao de Professores DUFOP. ([email protected])
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tardiamente teriam a responsabilidade de desenvolver as duas atividades de forma
indissocivel.
A prtica pedaggica predominante nas instituies voltadas apenas para o
ensino profissionalizante eram baseadas na transmisso dos clssicos, na memorizao
dos contedos, na avaliao como instrumento seletivo e na passividade dos estudantes.
Segundo Pimenta & Anastasiou (2002) prevalecia uma metodologia tradicional, com
uma pedagogia de manuteno, no havendo a inteno de construo do
conhecimento (p.150). As pesquisas eram realizadas em institutos independentes das
escolas superiores e eram na sua maioria realizadas para atender demandas
emergenciais e alguns se responsabilizavam pela formao de pesquisadores.
Segundo Paoli (1988), o princpio da indissociabilidade passou a orientar a
estrutura e a organizao das instituies de ensino superior a partir dos anos 30, e
apesar da lei da poca continuar a admitir a existncia de instituies isoladas voltadas
exclusivamente para o ensino. A idia de que a universidade lcus privilegiado da
pesquisa, ganhou fora com a fundao de algumas importantes instituies
universitrias que na dcada de 60 buscaram articular o ensino e a pesquisa.
O regime militar impe a reforma universitria de 68, segundo Paoli (1988), o
projeto educacional, e mais especificamente o sistema universitrio, orientou as suas
aes a partir de mecanismos heternomos, impositivos, de controle. A teoria do capital
humano, a tecnificao e a instrumentalizao orientaram toda a reestruturao do
ensino universitrio e localizaram a pesquisa apenas na ps-graduao. Desta forma, a
formao para a pesquisa deveria ser passada, com exclusividade, para os cursos
regulares de ps-graduao. Assim cada vez menos haveria razo para manter essa
perspectiva na graduao (PAOLI, 1988, p.33). Nesse perodo institucionaliza-se um
comportamento e que com o passar do tempo e sem que as pessoas se dessem conta,
aconteceu a cristalizao (idem, 1988, p. 45) que observamos at os dias de hoje, ou
seja, o estabelecimento de uma hierarquia e de um distanciamento entre as principais
atividades desenvolvidas na universidade, ou seja, o ensino e a pesquisa, consolidando a
ciso entre graduao e ps-graduao. Este quadro influenciou a imagem que temos de
que a ps-graduao o lugar mais qualificado para a formao da docncia
universitria. Isso confirmado pelo fato da maioria dos 08 participantes quando se
referiram sua formao, citaram apenas a ps-graduao, em que obtiveram os ttulos
de mestres e doutores e pouco se referem ao perodo da graduao.
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O projeto de universidade baseado no modelo norte-americano dominante nos
dias de hoje, segundo Castanho (2000), um padro baseado na flexibilidade de
modelos de instituies que oferecem a formao universitria e repercute e,
evidenciado, em vrios dispositivos legais que orientam a formao de professores,
entre eles, a LDB 9394/96, as Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formao de
Professores da Educao Bsica de 2002, as Diretrizes Curriculares do Curso de
Pedagogia de 2006, o Plano Nacional de Formao de Professores de 2008. Nestes
documentos, o ensino fica localizado na graduao com o intuito de formao
profissional baseada no consumo de contedos cientficos. A pesquisa, que concebida
como a produtora dos conhecimentos para o ensino, de responsabilidade da ps-
graduao, bem como a formao dos pesquisadores.
No interior desse processo esto as prticas docentes de formao de professores
que, sempre estiveram sob o paradigma hegemnico de cincia, o positivismo. Como
este concebe o conhecimento como algo a ser absorvido, pelo acmulo do mximo de
informaes possveis, o ensino aprendido por ns e por nossos professores formadores
o ensino transmissivo, centrado na boa e segura exposio do professor e buscando o
comportamento ideal e passivo do estudante. Esse processo observado quando a
maioria dos participantes diz que se sentem mais seguros quando estudam os textos
antes e quando lamentam o fato dos estudantes lerem pouco esses textos. A
aprendizagem concebida por eles como automtica, a partir do contato com os
contedos essenciais a sua boa formao profissional. A pesquisa circunscrita ps-
graduao ou a poucos e restritos momentos na graduao como a iniciao cientfica, a
construo dos TCCs ou disciplinas que expem as metodologias e os instrumentos
para a realizao de pesquisas.
Na essncia desse quadro de separao dos espaos no interior da universidade e
as atividades que a compem, o princpio da indissociabilidade est distorcido pela
dicotomia estrutural e ideolgica que a racionalidade tcnica instrumental naturaliza por
meio das prticas, das legislaes, das instituies e dos discursos, entre teoria e prtica.
Essa dualidade nos auxilia a relacionar sempre o ensino como a atividade subjugada
pesquisa e voltada para a transmisso dos instrumentos das prticas profissionais e a
pesquisa como a atividade balisadora das avaliaes universitrias, superior na
hierarquia da diviso social do trabalho e que no se confunde com a formao
profissional. Por isso que os docentes participantes sempre fazem referncia
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pesquisa como meio de alimentar as suas prticas com novos contedos, ou
aprofundamento daqueles essenciais a um bom professor.
Muitas formulaes de intelectuais conceberam a pesquisa como eixo central
para a mudana de atitude do profissional professor, na perspectiva da construo do
conhecimento e de sua autonomia diante dos eventos da prtica, atravs da reflexo,
anlise e problematizao e superao da falta de intencionalidade. Algumas muito
difundidas repercutiram positivamente na formao de professores como o professor-
pesquisador, o professor investigador, o professor como intelectual e a polmica figura
do professor reflexivo. A despeito dos debates suscitados a partir de todas essas
propostas, a formao inicial do professor parece estar ainda baseada na viso
positivista de cincia, na dicotomia entre teoria e prtica e na dissociao entre ensino e
pesquisa. Segundo Mark Hughes (2008), a integrao dessas duas atividades, tem se
constitudo muito mais como um discurso bem aceito no meio acadmico, do que uma
realidade concreta, mistificando a relao entre ensino e pesquisa, entre investigao e
docncia, o que no contribui para a sua efetiva mudana.
A recorrente idia de que a docncia e a investigao so atividades dispares faz
com que continue a crena em uma diferena qualitativa entre o conhecimento fruto de
uma construo e participao ativa dos sujeitos em formao e o conhecimento
transmitido a partir de uma posio passiva dos sujeitos. Esses pontos de vista so
diferentes porque tem como base concepes de aprendizagem diferentes e concepes
distintas sobre o papel do sujeito na construo da relao entre docncia e investigao.
Segundo Hugues (2008) el aprendizaje es el nexo fundamental entre docncia e
investigacin. (BREW y BROUD 1995 apud HUGHES, 2008, p.33).
Os participantes justificaram a adoo da metodologia expositiva, pois acreditam
que assim, oportunizam aos estudantes o contato com uma gama maior de
conhecimentos imprescindveis para o exerccio competente da sua futura prtica
profissional. Reconheceram tambm de que o predomnio do ensino transmissivo uma
repetio das prticas de seus antigos professores, como afirma um dos participantes
no tem nada de inovador...agente continua...continuo trabalhando da mesma forma
que os meus professores trabalharam. o mesmo modelo de aula(P5).
Ainda compartilham a compreenso de que o ensino transmissivo a
modalidade que garante a estabilidade da sala de aula, a demonstrao de competncia e
responsabilidade do professor. Esses atributos devem ser perseguidos para dar conta
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do contedo (P3), para demonstrar para o estudante e para a instituio de que a
partir do momento que agente estuda, prepara, tem domnio, a gente consegue
desempenhar bem o trabalho na sala de aula (P4). Essa construo fruto do processo
de consolidao da idia tradicional de que aula sinnimo de exposio desses
contedos, e orientada pelo padro de uma metodologia descritiva. Essa compreenso
tem sido apontada por outros estudos como o de Cunha (1998, p.10) de que [...] a idia
de ensinar resume-se a dar aulas [...] dando bem a matria [...]. Est permeada pela
idia do controle do processo, porque numa aula expositiva, no corre o risco de ser
surpreendido (P8).
Essa necessidade presente nos participantes de no perder o controle da sala de
aula explcito quando um dos participantes diz o aluno que l, que estuda, que
questiona, esse me incomoda, esse desafiador, a gente tem que estar sempre pronta
para ele.(P4) Essa uma situao contraditria, visto que, eles buscam o ideal de
estudante caracterizado pela receptividade a acumular conhecimento ao mesmo tempo
que perseguem um modelo discente com autonomia e motivao.
A relao do ensino transmissivo marcada pela hierarquizao de papis, o que
favorece a permanncia da atitude de heteronomia. O seu principal objetivo transmitir
contedos, e secundariamente a formao de atitudes e valores. Essa modalidade
consolida a passividade, a falta autonomia presente em toda a nossa trajetria escolar.
Porm, esquecendo que os estudantes so oriundos desse processo escolarizao, os
participantes tm uma expectativa de que aqueles que ingressam no ensino universitrio
j possuam as atitudes que consideram adequadas ao contexto do ensino-aprendizagem
para formao profissional.
Os docentes formadores no assumem como responsabilidade sua e da formao
na universidade, a aprendizagem de atitudes, a provocao da reflexo, o desafio de
construo da autonomia diante do conhecimento por meio da critica e da busca de
sentido da formao profissional. A viso da maioria representado pela fala de (P6)
frustrante porque a gente comea o semestre....vai procurando construir o trabalho...ter
o retorno... frustrante, por mais que a gente tenha o processo de, eu corrijo, devolvo,
corrijo, a gente avana muito pouco.
Preocupado tambm com a construo de atitudes pesquisadoras, Demo (1999)
defendeu a cotidianizao da pesquisa na universidade para suscitar a reflexo,
problematizao, construo de sentidos, a criao de atitudes criativas, e portanto,
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autnomas diante do conhecimento, o que exige disposio e
desacomodao(CUNHA, 1998,p.85). Tanto a criatividade quanto a construo de
sentidos est diretamente ligada valorizao dos conhecimentos prvios dos
estudantes, j que so jovens e adultos. No entanto, os participantes revelaram uma
perplexidade diante destes saberes. As falas recorrem constantemente posio de
valorizarem apenas do que advm da leitura dos textos acadmicos. Alguns revelaram
reagir com intolerncia diante desses conhecimentos prvios como na fala no pode
ser uma resposta simplista, uma resposta do achismo. Tem que ser uma resposta
fundamentada (P7). Para Cunha (1998), nesse tipo de prtica, guiada pela forma
tradicional e autoritria de docncia, o conhecimento tido como acabado e sem
razes, isto , descontextualizado historicamente [...] a disciplina intelectual tomada
como reproduo das palavras, textos e experincias do professor. (p.10).
Ainda segundo Cunha (1998) preciso compreender que o conhecimento
acadmico precisa estar ancorado num significado (p.66). Esse significado construdo
a partir do que o estudante j traz como bagagem cultural, emotiva, profissional etc. Por
isso que em muitos eventos em que se interpreta o chamado descompromisso do
estudante, o fato de ser muito difcil manter a postura de ateno diante de algo que
nos diz pouco sobre a realidade cotidiana, que se mostra distante. Muito mais
interessante do que trabalhar com conhecimentos prontos, com certezas legitimadas,
apegar-se ao planejamento, a capacidade de trabalhar a dvida como princpio
pedaggico, o que parece dar sentido possibilidade do aluno percorrer os caminhos
de sua prpria construo do conhecimento. (CUNHA, 1998, p.65).
A pesquisa para os participantes aparece como principal fonte para um docente
dar uma boa aula como afirma o (P5) o fazer pesquisa me ensinou a preparar melhor
as aulas, principalmente as aulas da graduao, porque eu tenho que ler mais, eu tenho
que estudar mais. Entretanto, vrios autores como Demo (1999), Cunha(1998),
Perrenoud (1993) afirmam que, alm de subsidiar a ao do professor, a pesquisa,
precisa ser assumida como um princpio educativo que traz a possibilidade dos
estudantes e do prprio docente formador vivenciar e, portanto, construir atitudes
investigativas, pois oportuniza-se na sala de aula momentos de indagao,
problematizao sobre o prprio ato de ensinar e, assim como afirma Soares (2008)
contemplar aspectos que so relegados pelo ensino tradicional como as atitudes, os
afetos, a comunicao, o pensamento crtico e reflexivo. Porem, a idia compartilhada
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por todos que a pesquisa deve me instrumentalizar e me possibilitar a desenvolver
minha atividade de ensino(P7).
Contraditoriamente, o potencial formativo da pesquisa foi declarado pelos
participantes quando um deles traduz o pensamento que eles compartilham de que
pesquisa modifica a nossa pessoa e modifica a ns mesmos, principalmente em funo
da profisso, a relao que a gente estabelece com os alunos, a gente aprende mais
para trabalhar melhor com os alunos (P6). Identificam o potencial de isomorfismo
(GARCIA, 1999) quando um deles declara e eles aprendem e eu aprendo junto com
eles, medida que vo apresentando novas dificuldades, vou percebendo que minha
tambm (P1). Porm, a pesquisa a que os participantes mais se referiram foi aquela
desenvolvida na ps-graduao e muito centrada no professor formador, como declara
um dos participantes para ensinar voc precisa pesquisar. Eu venho fazendo pesquisas
que do continuidade ao meu trabalho de mestrado, doutorado, ento isso de certa
forma interfere no meu trabalho (P3)
No existe um consenso sobre a concepo da relao entre ensino e pesquisa na
universidade. Nesse sentido, conforme registra Healey (2008), os estudantes podem ser
levados a estudar mtodos e tcnicas de fazer pesquisa, podem ser orientados a
desenvolver projetos prprios, individualmente ou em grupo, podem ser convidados a
participar das pesquisas desenvolvidas pelos docentes, portanto fora do contexto da
disciplina. Os professores podem incorporar, como contedo de suas aulas, resultados
de pesquisas suas ou de outros pesquisadores, ou ainda podem adotar prticas
pedaggicas baseadas na problematizao e indagao.
As diferentes abordagens de estabelecer essa relao no contexto da sala de aula
da graduao podem ser categorizadas tendo em conta trs elementos-chave: o contedo
da investigao versus o processo da investigao; o lugar reservado aos estudantes
espectadores ou participantes da pesquisa; e a natureza da docncia centrada no
professor ou no estudante.
As abordagens centradas no professor, em geral se manifestam na forma de aulas
expositivas. No caso de uma docncia impulsionada pela investigao, o professor
desenvolve a relao entre ensino e pesquisa via a apresentao aos estudantes,
preferencialmente, de resultados de estudos realizados mediante processos de pesquisa.
J a docncia orientada para a investigao, os estudantes aprendem os processos
utilizados na pesquisa e o plano de estudos d importncia tanto ao processo de
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aprendizagem como a aprendizagem em si. Nesta situao os professores pretendem
suscitar um ethos investigador atravs de sua docncia. (HEALEY, 2008, p.97). Nas
duas situaes os estudantes so colocados frente pesquisa na condio de
espectadores.
Nas abordagens centradas nos estudantes estes so sujeitos ativos no processo de
pesquisa. A investigao tutorizada, aquela em que os estudantes em pequenos grupos
desenvolvem pesquisas sob a orientao do tutor e so desafiados a elaborar trs artigos
com os resultados de seus estudos. Na docncia baseada na investigao, os estudantes
so tambm investigadores e o plano consta principalmente de atividades baseadas na
indagao. A fronteira entre o papel do professor e do aluno mnima, ambos ensinam e
aprendem, sob a coordenao do professor.
Segundo Healey (2008), as abordagens centradas nos estudantes e baseadas em
problemas fomentam a aprendizagem profunda, suscitam uma implicao ativa dos
estudantes em atividades de investigao. Embora estes assimilem menos conhecimento
sobre a matria, desenvolvem mais competncias e so mais eficientes no campo
profissional para o qual esto sendo formados, enquanto o inverso se d com estudantes
que vivenciam o ensino tradicional baseado em aulas magistrais.
A realizao de pesquisa por parte do professor amplia as possibilidades de
domnio do conhecimento disciplinar. Porm, no processo de formao inicial, como
defende Demo (1999), importante ter como objetivo a construo de atitudes
investigativas para que o estudante se predisponha a desenvolver a pesquisa
propriamente dita. transformador do processo profissionalizao, a significao dos
processos que impulsionam a pesquisa, como a dvida, a curiosidade, a predisposio
para a pergunta e para a participao.
A perspectiva declarada pela maioria dos participantes a de ensinar a pesquisar
como afirma um dos participantes o professor deve envolver estudantes como
bolsistas, no sentido de estar orientando para que eles tambm j comecem a se
envolver desde a graduao com as atividades de pesquisa, para o mestrado(P7).
Hegemonicamente essa a postura assumida pelos docentes formadores, em geral
mestres e doutores. Trabalham com uma transposio para a graduao, por meio da
iniciao cientfica ou pelas disciplinas de metodologia, da lgica dos cursos de ps-
graduao stricto sensu. Paoli (1988) enftico, ao afirmar que no processo de
institucionalizao dos cursos de ps-graduao configurou-se uma tendncia de que a
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articulao entre ensino e pesquisa se daria especificamente nestes cursos, e a graduao
se restringiria a uma escola de consumo de conhecimento (idem, p.33).
Essa viso unnime entre os participantes de ensino transmissivo e pesquisa
apenas como a acadmica tem como pano de fundo a concepo de aprendizagem como
reteno de contedos. Aprender para eles est muito associada acumulao da maior
quantidade possvel de conhecimentos. Esta acumulao que viabilizar o eu chamo
de amadurecimento intelectual, ou seja, a garantia mnima de acesso a alguns
contedos fundamentais para a formao profissional (P1) e conseqentemente
autonomia para lidar e buscar informaes. Revelam desta forma, o entendimento de
aprendizagem como mero reflexo do contexto externo ao sujeito. Como sugere Zabalza
(2004), no se pode confundir entender uma explicao fornecida pelo professor ou
pelo texto com aprender porque o entendimento dos contedos isso no supe que o
tenham aprendido, isto , que tenham integrado conceitos, informaes ou prticas
novas ao seu repertrio de conhecimentos. (p.203).
A autonomia no algo dado ou surgido de fora para dentro do sujeito. Ela
construda e est intimamente relacionada gerao de significado e de vontade e
inteno criadora Contreras (2002, p.194). necessrio oportunizar aos estudantes um
processo de identificao de sentidos entre o que se faz e o que se estuda. Assim,
priorizar a apresentao de contedos alheios, refora a dependncia do estudante em
relao ao professor, legitimando e intensificando a falta de autonomia do estudante e,
consequentemente, dele como futuro professor. Contreras (2002) nos diz que a
autonomia, no contexto da prtica do ensino, deve ser entendida como um processo de
construo permanente no qual devem se conjugar, se equilibrar e fazer sentido muitos
elementos (p.193).
Alimentar a sua curiosidade, provocar o conflito cognitivo, dar espao para a
dvida mais do que respostas so posturas que o professor formador deve buscar sempre
proporcionando mecanismos de participao que viabilizem o desequilbrio cognitivo
no estudante mais do que a ateno pura e simples, pois,
A curiosidade como inquietao indagadora, como inclinao ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou no, como procura de esclarecimento, como sinal de ateno que sugere alerta, faz parte integrante do fenmeno vital. No haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e nos pe pacientemente impacientes diante do mundo que no fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos. (FREIRE, 1998, p.35).
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O distanciamento da relao entre ensino e pesquisa advm da dissociao de
teoria e da prtica na formao de professores, os participantes, em sua totalidade
acreditam que primeiro se constri o arcabouo terico e depois vivencia a prtica. ns
vamos apreender alguns elementos da escola, tentar fazer uma relao com o que a
gente est vendo aqui(P2). No quadro dominante dos cursos de formao universitria
a tendncia
[...] tratar todas as disciplinas como tericas [...] os momentos dedicados s prticas servem para a aplicao de teorias anteriormente estudadas, no sentido de comprovao da teoria na prtica. Em lugar da prtica alimentar a teoria e fornecer-lhe os elementos para a reflexo, pressupe-se que a competncia prtica comea onde termina o conhecimento terico. (CUNHA, 1998, p.82)
A maioria s relacionou a articulao teoria e prtica aos estgios como ilustra a
fala de (P1) s estudar, teorizar, teorizar, no d conta da realidade no ... a disciplina
de estgio para mim foi fantstico, que foi um momento de voc realmente sair da
universidade e ir para as instituies, ento, deu outro gs.
Segundo Porto (2010) a prtica do estudante na graduao acontece no estgio
com a suposta aplicao da teoria recebida, estudada, lida e adquirida ao longo do
curso [...] o aluno tem contato com a prtica apenas no estgio curricular e com a
pesquisa, quando bolsista de iniciao cientfica. (p.98). Os cursos de formao de
professores, por terem o vis cartesiano, so estruturados e implementados baseados em
momentos estanques.
Porm, nem sempre a simples observao se caracteriza como processo, um
processo reflexivo de articulao entre teoria e prtica que um discurso muito
difundido, mas pouco compreendido (P4). necessrio que ocorram aes por parte
dos estudantes no sentido de buscar questes significativas nas atividades de estgio,
para que a atividade tenha uma coerncia entre o objetivo e a finalidade. Caso contrrio,
segundo VZQUEZ (2007, p.221) ocorre uma inadequao entre inteno e resultado
que se evidencia tanto na atividade dos indivduos como na propriamente social.
A construo envolve um processo de envolvimento dos sujeitos para que estes
encontrem sentido naquelas atividades que esto desenvolvendo. Os processos no quais
o professor no se sente participante, no se identifica, no tem domnio das suas
atividades, dificilmente resultaro em originalidades ou em iniciativas de criao.
Segundo VSQUEZ (2007) [...] relaes que os homens contraem independentemente
de sua vontade e de sua conscincia [...] so produzidas pelos homens como produtos
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seus no intencionais (p.221). Ou seja, se os estudantes participarem do processo de
visitao s escolas a partir de prescries e sem um desenvolvimento de atividades
anteriores nas quais eles encontrem algum sentido, eles at faro as visitas necessrias,
mas se limitaro a observar e a reproduzir concluses j feitas por outros em ocasies
diferentes. PIMENTA (2002, p.15) afirma que o estgio no prxis. atividade
terica, preparadora de uma prxis.
A relao teoria e prtica no deve ser restrita ao estgio, nem s disciplinas de
final de curso, chamadas de prticas de ensino. O processo ensino-aprendizagem na
universidade precisa ser objeto de reflexo coletiva como sinaliza Porto (2010, apud
PENTEADO; GARRIDO, 2010, p. 100)
[...] a relao teoria e prtica no est restrita aos estgios; a produo de conhecimentos deve acontecer na interao com a realidade [...]; a pesquisa deve articular-se ao ensino; e professores e alunos (da universidade) qualificam seu trabalho, o que conduz ambos vivncia de situaes que lhes permitem conhecimento da realidade, [...] discusses e reflexes nas diferentes disciplinas do curso.
As situaes vivenciadas na sala de aula da universidade tambm so
formativas, tambm concretizam a relao teoria e prtica, portanto, merecem ser
avaliadas e refletidas, oportunizando, simultaneamente, aprendizagens ao futuro
professor e ao docente formador. Na prtica cotidiana da formao deve estar explcito a
idia de que aprendizagem ao [...]. O aluno age fsica e intelectualmente na procura
de interpretao (CUNHA, 1998, p.111), concretizando a articulao teoria/prtica. A
sala de aula na universidade, no s um espao de teorias. um espao de
aprendizagem centrada na ao prtica dos seus alunos, nas suas prticas sociais,
passando, ento, a definir outra lgica. Dessa forma epistemologicamente teoria vai ser
a expresso de uma ao prtica. (MARTINS, 1998, p.94).
Concluses
A anlise dos dados me permitiu concluir que a totalidade dos participantes
concebe a relao entre ensino e pesquisa na graduao, a partir do ensino impulsionado
pela investigao (HEALEY, 2008), ou seja, a pesquisa dos docentes, ou de outrem,
essencialmente subsdio para o ensino transmissivo. Nessa perspectiva o ensino
centrado no professor e os estudantes atuam como espectadores.
A representao acerca da relao entre ensino e pesquisa na graduao envolve,
ainda, no que tange ao engajamento dos estudantes, de um lado, uma perspectiva
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circunscrita participao em grupos de pesquisa, no desenvolvimento da pesquisa do
professor, na condio de bolsistas de iniciao cientfica. Essa compreenso revela
uma concepo restritiva e cientificista de pesquisa.
De outro lado, o desenvolvimento de alguma forma de pesquisa pelo conjunto
dos estudantes da sala de aula da graduao, percebido como forma de estabelecer a
relao teoria e prtica e principalmente no interior das disciplinas de estgio ou
trabalho monogrfico de concluso do curso, mas essencialmente numa perspectiva de
aplicao da teoria prtica, ou de reconhecimento do contexto escolar.
A racionalidade instrumental distorce a relao teoria e prtica e lhe d um
sentido utilitarista, o que leva aos participantes declararem que sala de aula da
universidade apenas teoriza e que a prtica s concebida mediante participao nos
estgios. Esta viso se estende relao entre ensino e pesquisa, onde o ensino est
relacionado s atividades prticas e, portanto, apenas para reproduzir e a pesquisa,
relacionada teoria e o momento de teorizar, tornando as duas atividades inconciliveis
e dificultando a concretizao na graduao da indissociabilidade entre ensino e
pesquisa
A aula expositiva reconhecida como indicativo de competncia, compromisso
e responsabilidade do professor e ainda como elemento essencial da identidade do
docente universitrio. Essa concepo se articula e se assenta na concepo de ensino
centrado na transmisso, incluindo as diferentes nuances apontadas, e na concepo de
aprendizagem como aquisio de conhecimentos e essencialmente intelectualista, que
confunde entendimento do assunto explicado com aprendizagem e no considera a
construo de atitudes, valores e habilidades metacognoscitivas passveis de serem
aprendidos no contexto da universidade. A expectativa de que os estudantes sejam
maduros, competentes para aprender de forma autnoma.
Existem muitos obstculos a serem questionados e superados na formao de
professores, entre eles, a hierarquia entre docente e estudante, entre professor e
pesquisador, entre ensino e pesquisa, entre graduao e ps-graduao. Essa hierarquia
refora uma desigualdade, um distanciamento baseado na dicotomia estrutural das
relaes de produo capitalista. Essa dicotomia impede o desnudamento da
complexidade da docncia e deixa incompleta a qualificao dos agentes sociais
docentes, to importantes na sociedade contempornea. A dualidade entre ensino e
16
pesquisa amputa a possibilidade de autonomia e senso crtico na ao dos professores
como profissionais.
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18
A PRTICA EDUCATIVA NO ENSINO SUPERIOR: ESPAO
INTERSUBJETIVO E TELEOLGICO DE DELIBERAO
Antnia Dalva Frana Carvalho
Introduo
Este trabalho, utilizando-se da pesquisa bibliogrfica traz um ensaio terico
sobre a prtica educativa no ensino superior com o objetivo de compreender como este
espao se configura, evidenciando que os saberes de natureza social e humana, bem
como os da prpria pedagogia, so elementos determinates para que a mesma se
consctretize para alm da racionalidade tcnica. As reflexes aqui apresentadas
gravitam em torno das compencias do professor universitrio frente ao papel das
instituies de ensino superior no sculo XXI, evidenciando que a prtica pedaggica,
no contexto universitrio, integre outros saberes capazes de fortalecer sua funo de
formar futuros profissionais para a autonomia intelectual e a emancipao humana.
Geralmente a docncia universitria tem sido discutida sobre as perspectivas da
profissionalidade, da autonomia e da identidade docente, bem como da prpria
formao, no sendo muito comum tocar no fenmeno atravs do qual so constitudas
todas estas categorias que o processo de ensino e de aprendizagem, isto , a prtica
educativa no ensino superior. Provavelmente, pelo fato de a docncia no ensino superior
ser, geralmente, marcada pela liberdade acadmica docente, ou laisse-faire.na acepo
de Morosini (2001).
Porm, a contemporaneidade exige do professor universitrio competncia
cientfica, com maior nvel de escolarizao, bem como conhecimentos relativos ao
prprio fazer da docncia. Neste aspecto, Cunha (1993) ressalta que o exerccio da
docncia universitria requer, alm do domnio da matria, a capacidade de conect-la
com o contexto sciohistrico que, por sua vez requer competncia comunicacional e o
uso adequado de metodologias de ensino diversas. Requer, portanto, competncia
Antonia Dalva Frana Carvalho. Doutora em Educao, Currculo e Ensino. Professora Adjunta da Universidade Federal do Piau. [email protected]
19
tcnica, humana, esttica, poltica, tica e cientfica, para desenvolver processos
significativos de ensino e de aprendizagem em um espao deliberativo, intersubjetivo e
teleolgico: a prtica educativa. Convm ento perguntarmos, como se configura esta
prtica educativa no ensino superior? Que caractersticas ela tem? Quais suas
dimenses? Que formao necessria para o docente do ensino superior? E em que
base epistemolgica? So estas questes que pretendemos desenvolver ao longo deste
texto.
Sendo eminentemente social e intersubjetiva, a prtica educativa tem sua marca
registrada na intencionalidade, uma vez que a educao um processo de interveno
social necessrio para a formao das geraes. No caso do ensino superior sua funo a
inteno qualificar o profissional para um mercado de trabalho, dotando-lhes de
habilidades necessrias ao oficio. De tal modo que sua gesto do Estado, pois muito
embora as instituies educativas mesclem-se em pblicas e privadas, as coordenadas
so estabelecidas pelo Estado, atravs de um rgo de Educao, cujas funes so
deliberativas. No caso, o MEC (Ministrio de Educao e Cultura), aqui no Brasil.
Este, atravs de processos, nem sempre democrticos, estabelece os princpios
sob os quais a educao deve fundamentar-se. Encontra-se a a primeira razo para
conceituar a prtica educativa deliberativa e tambm teleolgica, tendo em vista que no
nascedouro de seus fins e princpios ela j vem normatizada. Sua legitimidade est
descrita nas diretrizes gerais especficas para cada nvel de ensino, conforme a Lei
9.394/96 (BRZEZINSK, 2000). A ttulo de ilustrao, em seu Artigo 43, inciso II,
estabelece as finalidades da educao superior ipsis litteris, formar diplomados nas
diferentes reas de conhecimento, aptos para a insero em setores profissionais, para a
participao no desenvolvimento da sociedade brasileira e para a colaborao com sua
formao contnua. A Lei complementada por outros documentos legais que
orientam o conjunto de prticas educativas, como as Diretrizes Curriculares Nacionais,
para cada nvel de ensino e para cada curso superior especificamente, que, por sua vez,
so mediadas pela gesto e pelo Projeto Poltico-Pedaggico de cada instituio, pelo
currculo, e igualmente pelo Projeto Poltico-Pedaggico de cada curso.
No que tange a formao dos professores do ensino superior a LDB apenas exige
que ele tenha cursado uma ps-graduao, reforando que as universidades tenham seu
quadro docente 1/3 de seus professores com formao em nvel de doutorado e
mestrado. Observe-se que nas instituies de ensino superior o quadro de professores,
20
em funo da multiplicidade de cursos que oferta hibrido. At mesmo no interior de
um curso de licenciatura, por exemplo, h professores que tem formao em licenciatura
e h professores que tm apenas em bacharelado. Estes ltimos no tm formao
especfica que lhe possa fornecer os instrumentos para compreenso de funo de
educador e todos estes professores, bacharis ou no, agiro, no caso, com o objetivo de
formar futuros professores. Curiosamente, esta mesma universidade que defende uma
formao de professores baseada em saberes esotricos menospreza o saber de seu
professor, pouco se preocupando com sua capacidade de gerenciar um espao movedio
que a sala de aula.
Com efeito, na sala de aula, ante o conflito entre a liberdade profissional
(autonomia) e obedincia a um projeto poltico-pedaggico preestabelecido, que estas
mediaes confrontam com as intencionalidades do professor. Por exemplo, quando ele
organiza o contedo, planeja as atividades, as metodologias de ensino e as formas como
sero avaliadas as aprendizagens. Isso implica que o ensino no se reduz apenas ao que
foi estabelecido pelas leis e diretrizes e que os objetivos e princpios terico-
metodolgicos nelas explicitados so traduzidos pela subjetivao dos sujeitos. Em
outras palavras, a realidade da sala de aula que define os contornos da prtica
educativa que, muitas vezes, se realiza sob condies impossveis. Sacristn e Gmez
(1998), teorizando sobre o currculo, chamam a ateno para o fato de que a prtica
educativa no tem como dependncia o aparato legal de ensino; citam, por exemplo, o
contexto espanhol. Neste, mesmo depois de modificados leis e programas de ensino
com vistas melhoria da qualidade da educao, a prtica educativa permaneceu
inalterada, uma vez que sua melhoria no foi significativa. Para corroborar este
pensamento, os autores lembram que dois professores com as mesmas diretrizes
curriculares, ou com o mesmo material didtico, no ensinam a mesma coisa em sua
classe (p. 139). Isso implica que as deliberaes sobre o percurso do processo e a
postura do professor so os definidores do que o aluno aprende e como aprende. Como
gestor e nos limites de sua autonomia, ele organiza suas aes profissionais no interior
da realidade de classe, sempre em funo de finalidades entremeadas de valores. De
modo que a prtica docente sempre teleolgica, consciente que s pode fazer-se
inteligvel em relao com os esquemas de pensamento, muitas vezes tcitos e, no
melhor dos casos, parcialmente articulados (CARR 1999, p. 64):
21
Tardif (2002) pensa da mesma forma quando recorda que a educao no
ocidente tradicionalmente conceituada como atividade consciente de si mesma; ao
que se exerce voluntria e conscientemente sobre os outros e sobre si. E, portanto, uma
atividade racionalizada. Por que racionalizada? Porque baseada em um conjunto de
saberes, que, mesmo sendo muitas vezes tcito, como est indicado no conceito de Carr
(1999), fundamenta ou d razo para o agir na sala de aula, guiando-se por propsitos.
Isso significa que a prtica educativa consiste em uma ao social que apresenta
uma teleologia dimensionada por seu carter formativo e instrutivo. Neste sentido, ao
professor deliberada a tarefa de instruir e, ao mesmo tempo, de formar. Quando o
professor proporciona ao aluno o aprendizado dos contedos socioculturais, de tcnicas
e de habilidades especficas, est instruindo novas formas de referncias culturais.
Quando ele agrega a esta aprendizagem valores distintos, est formando modos de agir e
de julgar. Esta a razo pela qual estamos denominando-a tambm de teleolgica, logo,
eminentemente pedaggica; e o porque se realiza mediante o uso de princpios,
tcnicas e mtodos sempre voltados para a consecuo de um objetivo prtico que a
educao.
O professor forma quando transmite valores, gera comportamentos, condutas
ticas e autonomia moral; instrui quando fomenta o desenvolvimento de capacidades,
habilidades, competncias, conhecimentos e autonomia intelectual. Neste aspecto,
segundo Gramsci (1989),
instruo e formao, pois, mesclam-se no trabalho vivo do professor na proporo que ele [...] seja consciente dos contrastes entre os tipos de sociedade e de cultura que ele representa e o tipo de sociedade e de cultura representado pelos seus alunos, sendo tambm consciente de sua tarefa [...] (p. 131).
A presena da conscincia poltica no trabalho do professor esvazia a concepo
de prticas sociais neutras. O prprio Gramsci (1989) reporta-se ao carter dinmico,
poltico e intencional e transformador da prtica educativa. O autor pontua tambm
sobre a caracterstica deliberativa da prtica definida pelas opes do professor no
circuito de sua ao. Como ao deliberativa e no neutra, envolve no somente a
conscincia de o seu fazer, mas tambm requer responsabilidade e competncias, sem as
quais no pode ser capaz de decidir, como bem nos diz Paulo Freire (2006):
Na medida em que nos tornamos capazes de transformar o mundo, de dar nome as coisas, de perceber, de inteligir, de decidir, de escolher, de valorizar
22
de, finalmente, eticizar o mundo, o nosso mover-nos nele e na histria vem envolvendo sonhos por cuja realizao nos batemos (p. 32-33).
Porm, a prtica educativa no fala por si, porque se constitui mediante o que as
pessoas fazem; so elas que lhe conferem sentido e significao. Em razo de estar
submersa em um processo de construo de sentidos e significados que ocorrem nos
planos sociocultural, poltico e histrico, s podemos entend-la de forma interpretativa
ou crtica. Por ser dotada de significaes como algo que se realiza por razes que
tendem a um fim. Com isso afirmamos que a prtica educativa no improvisao
aleatria, mas sim repleta de contedos e preposies tericas. Teoria e prtica, pois,
so duas dimenses complementares da prtica educativa, na medida em que esta, sendo
entendida como prxis, um movimento operacionalizado simultaneamente pela ao e
reflexo. Dito de outro modo, a prxis uma ao final que traz, em seu interior, a
inseparabilidade entre teoria e prtica.
Pensamento e ao, desta forma, se misturam, expressando o saber pedaggico
que, segundo Pimenta (2002), o fundamento e, ao mesmo tempo, produto da ao
docente, o que implica dizer que esta prtica fonte de teoria pedaggica. Isso significa
que a relao mantida entre o professor e o aluno, com a teoria e a prtica, decorrente
de sua concepo de educao, de sujeito que pretende formar, do tipo de sociedade que
idealiza e de sua prpria concepo de professor. So estas concepes quem vo ajud-
lo a definir, por exemplo, se o aluno vai ser includo, fazendo-o co-sujeito do processo
educativo. Este exemplo, por um lado, caracteriza uma postura em favor de algo e com
algum, isto , uma opo poltica. Por outro lado, fortalece a ideia de que uma prtica
educativa tem uma epistemologia, ou seja, tem como base conhecimentos ou saberes
que o professor pe em movimento durante sua realizao. Da no se pode prescindir
que o professor do ensino superior no detenha saberes acerca das cincias humanas e
sociais, bem como dos elementos constitutivos da prtica educativa como
aprendizagem, avaliao, currculo ou da prpria pedagogia. Ressalte-se que o termo
Pedagogia aqui entendido na concepo de Gauthier (1998, p. 136), ou seja, como
conjunto de aes desenvolvidas pelo professor no mbito de sua funo de instruir e
educar com um grupo de alunos em um determinado contexto escolar.
Como mediador pedaggico, o professor define um conjunto de aes
determinantes para os rumos que o processo educativo. Escolhendo o que, como e com
qual recurso levar adiante a prtica educativa, est definindo tambm os rumos que ela
pode tomar. Poder estar, por exemplo, formando em uma perspectiva crtica, para o
23
exerccio da deciso ou em uma perspectiva passiva ou da acomodao, atrelada ao
modelo da racionalidade tcnica que tem amparo no positivismo. Queremos dizer, aqui,
que, qualquer que seja a deciso tomada pelo professor, esta certamente assentar-se-
em uma racionalidade pedaggica e, conseqentemente, em uma pedagogia. Tais
decises concentrar-se-o em torno de dois eixos que configuram a prtica educativa: a
gesto da matria e a gesto de sala de aula que no constituem unidades autnomas,
uma vez que se mesclam na prtica educativa e sobre o qual trataremos a seguir.
Gesto da matria e gesto de classe: eixos da prtica educativa
Os termos gesto da matria e gesto de sala de aula so apenas construes
mentais para caracterizar um conjunto de aes solicitadas pelo professor e efetivam a
prtica educativa. Sendo esta dimensionada pela matria e pelas as inter-relaes dos
sujeitos na ecologia da sala de aula para signific-la, estes dois eixos caracterizam as
funes pedaggicas do trabalho docente.
No primeiro eixo, est localizado o ensino e a aprendizagem do contedo, o que
implica organizao do planejamento da matria, das seqncias das atividades, das
estratgias, das metodolgicas, do espao e do tempo da aprendizagem at a avaliao
do processo educativo. A matria (contedo) consiste, pois, no mundo objetivo que o
professor compartilha com o aluno, sendo a razo das interaes, de produo e
transformao de saberes. Assim, do professor de Direito Penal, por exemplo, exige-se
formao nesta rea. Os contedos, entretanto, no se submetem ao que,
tradicionalmente, chamamos de contedos disciplinares, como se o ensino tivesse
apenas a dimenso terico-cognitiva ou conceitual. Eles tambm comportam valores,
atitudes, habilidades. Coll (1998) e Zabalza (1998), ao estudarem o processo de ensino e
de aprendizagem e questionarem sobre o que se deve saber, o que se deve saber fazer e
como se deve fazer, agruparam os contedos em trs categorias: conceituais,
procedimentais e atitudinais tendo. Portanto eles tm uma grande relevncia para servir
de apoio terico quando se analisa a prtica pedaggica.
A forma como o professor manipula os contedos e encaminha as atividades de
ensino so determinadas por suas intenes sobre a prtica e o seu entendimento acerca
das finalidades da educao, de modo geral. Isto s possvel ser afirmado porque o
professor, como mediador pedaggico entre o mundo objetivo (conhecimentos) e o
aluno, ou como gestor do ensino, nas palavras de Therrien, et al. (2005) [...] faz
adaptaes na organizao e na estrutura dos conhecimentos, para adequ-los ao
24
contexto onde o ensino ocorre, s limitaes espao-temporais e s normas
institucionais e curriculares, e at mesmo nos contedos de ensino (p.8).
Este postulado foi pontuado a partir estudos desenvolvido pelos autores sobre a
gesto da matria, onde destacaram elementos determinantes para a compreenso da
ao docente para alm dos desafios didticos demarcados pelo processo pedaggico
escolar. Por exemplo, encontraram que a deciso sobre os contedos (prioridade,
excluso e a forma de abordagem) feita conforme as necessidades da turma. Pudemos
comprovar tambm este fenmeno quando os professores formadores baseiam-se no
aluno e na turma para decidir sobre o tipo de atividade, o planejamento e at mesmo a
forma de avaliao. Isto indica que o professor faz uma leitura do contexto, refletindo
sobre este, para tomar decises acerca do processo de seu prprio trabalho. Os autores
entendem que estas decises so realizadas a partir de elementos que o professor julga
pertinentes, compilados ao longo de sua prpria histria pessoal e profissional, e podem
tomar direes epistemolgicas, didticas e metodolgicas distintas. Em sntese,
conforme Therrien e Loiola, (2003) o eixo da gesto da matria faz da prtica educativa
um processo eminentemente criativo, de aprendizagem mtua e relativamente autnoma
proporo que os contedos de ensino so prescritos.
Entretanto, ainda que estes sejam prescritos, de alguma forma, o professor
precisa decidir o que fazer com eles e esta deciso quando tomada sem a base
epistemolgica da educao, traz implicaes. Chaves (2001) ao pesquisar sobre
professores universitrios que no tiveram acesso formao pedaggica encontrou
que a forma improvisada e com que lidam com a avaliao tem se constitudo uma dos
pontos da crise do ensino na universidade. Isso significa que no basta ter o domnio do
conhecimento especfico do que se vai ensinar, mas ter o domnio de transform-los
didaticamente em contedos acessveis para os seus alunos.
Ressalte-se que o planejamento da gesto da matria requer reflexes acerca da
organizao da classe, assim como requisita reflexes sobre a forma como o professor
espera que a aprendizagem se concretize, posto que se imbrica como o outro eixo do
trabalho docente, que a gesto da interao.
Este segundo eixo caracterizado pela natureza humana do trabalho docente e
abarca sua dimenso axiolgica. Requer a busca de formas de colaborao entre alunos
e professor, de motivao, de disciplina e de tica, sem as quais fica impossvel realizar
o ensino. Gauthier et al. (2003) definem a gesto de classe como um conjunto de
25
operaes que o professor aciona para manter um certo tipo de ordem e agir de maneira
a fazer a aprendizagem ser absorvida pelo grupo (p.23).
Sob este aspecto, a gesto de classe o momento em que a matria vai ser
colocada em prtica e requer decises conjuntas. Os autores tambm afirmam que a
gesto de classe a varivel que determina mais fortemente a aprendizagem dos alunos.
O professor necessariamente vai compartilhar com o aluno suas intenes, ao tempo em
que pode deliberar, com ele, os rumos da ao educativa. Provavelmente seja o aspecto
mais conflituoso do trabalho docente, devido heterogeneidade de uma sala de aula e a
simultaneidade com que os fatos ocorrem neste mbito. Tais fatos exigem do professor
demandas imediatas, em razo de os antagonismos existentes entre o que proposto
pelo professor e as respostas do grupo de alunos. Admitindo-se sua essncia interativa e
a eminncia cooperativa, o ideal mesmo que ocorra nos moldes da ao comunicativa,
como prope Boufleuer (2001). Caso contrrio, se o professor no tiver a inteno de
buscar um entendimento entre os alunos no surte o efeito desejado. Nos limites de uma
educao crtica, a postura reflexiva do professor e sua capacidade de negociao e
dilogo so elementos determinantes. Neste caso, agir democrtica e dialogicamente
como fazem os sujeitos dessa investigao o caminho encontrado para implantar
regras, estabelecer rotinas, realizar atividades e at mesmo tomar medidas disciplinares,
como requer a gesto de classe.
Tanto na gesto da matria como na gesto de sala de aula, o professor como
mediador pedaggico detm autonomia, sendo esta determinada por exigncias de
responsabilidade, competncia e controle na satisfao dos objetivos perseguidos. Ainda
que esta autonomia seja relativa proporo que as tarefas do ensino so prescritas
como asseveram categoricamente Therrien e Loiola (2003), a competncia constitui o
elemento central da dimenso da autonomia do professor.
Neste sentido, Gauthier et al. (2003) afirmam que este mediador, quando
conhece a matria e o grupo com o qual vai atuar, o momento e a forma de tomar o
controle da turma, a gesto de classe torna-se mais fcil. Porm, acreditamos que a
conversa, o dilogo, a interao, a empatia so, tambm, fatores preponderantes para
facilit-la sobremodo quando esta ocorre docncia superior. Assim sendo, a gesto de
interao de classe implica, de fato, competncias (manipulao de saberes) para
deliberar, improvisar, que vo alm do saber tcnico ou disciplinar. Sob este aspecto, a
26
competncia comunicativa condio sine qua non para o desenvolvimento da gesto
de classe.
Com efeito, a gesto de classe requer deliberaes constantes que solicitam ao
professor competncias que auxiliam e desenvolvem sua capacidade de decidir bem
sobre determinada situao na ecologia de sala de aula. As deliberaes tm como
fundamento o juzo prtico do professor, sua epistemologia da prtica. Baseiam-se em
um pensamento reflexivo, que aqui chamamos de racionalidade pedaggica, e so
tomadas em funo do alcance de finalidades. Esta racionalidade desempenha uma
funo bsica, porque, ao escolher os meios que far uso, o professor tambm dever
decidir sobre os fins ticos. Esta escolha permeada pela prudncia, sendo esta
entendida como uma relao epistemolgica e tica do professor, o que faz do ensino o
exerccio de uma habilidade moral como atesta Tom (1984 apud SACRISTN, 1999).
Provavelmente seja por isso que Wortham (1998 apud THERRIEN, et. al, 2003)
acredita que mais do que a matria ensinada, os dilogos sociomorais entremeados na
sociedade constituem o cerne da interao entre aluno e professor na prxis situada. Em
outras palavras, a aula, como bem adverte Vasconcelos (2002) seria fundamentada em
uma ao moral; afinal, se professor de alunos, e no de contedos.
Da o porqu de a gesto de classe requisitar aes docentes regidas pela
prudncia, porque, como idealiza Sacristn (1998, p. 255), envolve a tica e deve-se
responder diante algum pelas decises que se toma. Ora, se a prtica educativa
caracteristicamente interventora, tambm, em essncia, reflexiva, de tal modo que
Schn (2002) a classifica como investigativa. Ao faz-lo, o autor nega a concepo de
professor como um tcnico, aplicador de rotinas preestabelecidas e rgidas a problemas
padronizados do ensino como a melhor forma de orientar racionalmente a sua prtica.
Elliot (2005) tem esta mesma concepo, quando descreve que a prtica
educativa tem a funo de diagnosticar os diferentes estados e movimentos da vida
complexa de sala de aula, da perspectiva de quem intervm nela, elaborar. O autor
inclusive prope a deliberao como um mtodo mais racional de interveno, segundo
o qual possibilita o professor a desenvolver conhecimentos sobre sua prtica e,
conseqentemente, ampliar sua autonomia. Sua ideia encontra em Habermas (2002) um
forte apoio, quando ele teoriza que o objetivo da ao comunicativa , antes que
qualquer outro, a busca de entendimento entre os sujeitos. Neste caso, a ao educativa
27
consiste na busca de um consenso quanto s direes necessrias para que se possa
atingir o mundo vivido.
Afirmar ela um lcus intersubjetivo uma afirmao de que ela concebida
como interativa e comunicativa. Isso significa que os sujeitos, ao efetuar seus planos de
ao, agem intencionalmente sob condies legitimas, reconhecidas por um acordo.
Porm, reiteramos que a ao comunicativa no se reduz a atos da fala nem ao
entendimento lingstico. Efetivamente, se somente o professor entende sobre o que vai
ser objetivado, a ao educativa deixa de ser uma ao comunicativa para ser uma ao
exclusivamente estratgica cujo fim no seria a emancipao do aluno.
Por exemplo, quando o professor e os alunos estabelecem uma comunicao
sobre o mundo objetivo (os saberes tericos e prticos do processo de ensino e
aprendizagem), para discutir metas e aes, que, assentidas pelos alunos, desencadeiam
aes sucessivas de cada um (professor e aluno) geradas pelo consenso. Neste caso, o
docente no pode ser visto como um tcnico que desenvolve estratgias de
comunicao. Mas sim como algum que compartilha, significativamente, trocas e
propostas de outros atores coadjuvantes de sua ao, que, por sua vez, tambm no so
passivos. Esta forma de encaminhar a prtica pedaggica requer competncias
interpessoais do professor. Elas, conexas com os princpios valorativos de sua ao,
alm de sua responsabilidade e sua tica, so elementos necessrios para o controle da
gesto de classe. Atravs deles possvel a coordenao da gesto da matria. Esta, por
sua vez, requer competncias de carter disciplinar e pedaggico. E ambas
conjuntamente envolvem a subjetividade, a intersubjetividade e a racionalidade prtica
(os saberes de experincia). Tais elementos so provenientes de uma epistemologia da
prtica que conduz a racionalidade pedaggica da prtica educativa, cujo objetivo s
encontra sentido na emancipao humana ou nos preceitos da ao moral.
Esta racionalidade posta em ao, ou seja, na prtica pedaggica do ensino
universitrio responde pela constituio do ethos profissional dos docentes
universitrios, cuja identidade no se assenta em ser professor, mas em ser
pesquisador constituda entre dois antagonismos: a formao para pesquisa e a
formao para o ensino. Antagonismos tambm verificados por Cunha (1991) lembrar
que as prpria universidades ao tempo que defende que o exerccio da docncia exige
conhecimentos especficos da cincia da educao, no os considera para atuao no
ensino superior, quando se trata de seus prprios professores.
28
Nesta mesma direo Chaves (1991) alerta que pelas lacunas formativas os
docentes universitrios no do conta de submeter a disciplina que lecionam a lgica da
pedagogia e da didtica, permanecendo em uma prtica pedaggica extremamente
tradicionalista.
Sob esta composio, no momento em que poltica de educao concebe para a
educao superior o papel de formar profissionais com perfil generalista, humanista,
crtico e reflexivo, devendo ser fundada em competncias distintas, inclusive a de
compreender e traduzir as necessidades de indivduos, grupos sociais e comunidades,
com relao s atividades inerentes ao exerccio profissional relevante que se
questione os fundamentos terico-metodolgicos da prtica educativa no ensino
superior.
Toda esta poltica tem um como fim para legitimar as bases de um novo mundo,
um mundo onde se exige trabalhadores de qualquer campo epistemolgico
competncias mais elaboradas. Um mundo, reiteramos, onde o ser humano necessita
aprender a ser humano, no aceitvel uma prtica educativa no ensino superior ainda
calcada em uma racionalidade puramente tecnicista, tradicional e autoritria incapaz de
estimular a curiosidade epistemolgica de seus alunos e possibilitar a aprendizagem do
oficio de forma significativa e prazerosa, atravs do ensino, da pesquisa e da extenso.
Consideraes finais
Considerando a racionalidade efetuada ao longo do texto sobre a prtica
educativa no ensino superior conclui-se que a complexidade e impreciso com a qual
ela constituda, sua realizao requer muitas competncias do professor. Elas, aliadas
aos princpios valorativos de sua ao, alm de sua responsabilidade e sua tica, so
elementos necessrios para o controle da gesto de classe e pela coordenao da gesto
da matria. Esta, por sua vez, requer competncias de carter disciplinar e pedaggico.
E ambas conjuntamente envolvem a subjetividade, a intersubjetividade e a racionalidade
prtica (os saberes de experincia). Tais elementos so provenientes de uma
epistemologia da prtica que conduz a racionalidade pedaggica da prtica educativa,
cujo objetivo s encontra sentido na emancipao humana.
No momento em que a sociedade (re) define novas problemticas a respeito do
docente universitrio, sobremodo no que tange a sua formao, lhe requisitando a
conscincia que no basta conhecer a matria, mas que preciso saber transform-la.
29
Isso implica na necessidade do aprendizado de competncias pedaggicas e uso de
estratgias de ensino distintas que desemboquem em formao profissional no ensino
superior fundada na emancipao e autonomia do indivduo. Dito de outra forma,
implica em abandonar o paradigma cientificista e tradicional de se abordar a prtica
educativa no ensino superior e caminhar em rumo de um novo modelo formativo,
calcado na autonomia intelectual e na emancipao humana.
Sob esta composio, acreditamos ser imprescindvel para as Instituies de
Ensino Superior (IES) investirem sobre a formao de seus professores que no foram
formados para o oficio como mdicos, engenheiros, advogados que vivenciam o cho da
sala de aula, sendo, portanto, profissionais da educao, para lhes proporcionarem uma
epistemologia da prtica docente direcionada para a subjetividade de seu trabalho. Para
ns, esta forma de investimento encontra respaldo no estudo da racionalidade
pedaggica da ao destes docentes, a priori. Deste modo importante observar antes,
atravs de instrumentos prprios no mbito de cada curso para questionar: qual a
racionalidade pedaggica da prtica pedaggica de seus docentes? Qual o perfil
profissional formado? Que aes devero ser implementadas para promover uma
formao continuada dos docentes? Como avanar para alm de um ensino meramente
tcnico? Este um papel que, no mbito de cada IES, em nosso entendimento cabe as
Pr-Reitorias de Ensino de Graduao, atravs de seus rgos como as Comisses
Prprias de Avaliao (CPAs), institudas obrigatoriamente pelo MEC, cuja
responsabilidade realizar, de fato, a avaliao do ensino de cunho emancipatrio; isto
, avaliar para interferir; para modificar o curso das aes; para otimizar a qualidade da
formao de futuros profissionais no interior de cada instituio, assim como
proporcionar, de modo geral, a formao continuada de seus professores que, de fato,
possa orientar racionalmente a sua prtica de ser professor.
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32
A RELAO ENSINO/PESQUISA NA FORMAO DE PROFESSORES: A
EXPERINCA DO BANCO DE AULAS PARA A CONSTRUO DA PRXIS DOCENTE
Maria do Socorro da Costa e Almeida
Ana Cristina Castro do Lago
Resumo
Promove a anlise do potencial do banco de aulas como dispositivo inteligente de construo e partilha do conhecimento sobre a prtica pedaggica na mediao entre educadores, licenciandos e egressos do curso de Pedagogia e a realidade escolar. Aborda o percurso formativo e cientfico da construo de prticas inovadoras a partir da integrao de atividades das reas de Didtica, TCC e Estgio Curricular, no Curso de Licenciatura em Pedagogia. Historia e relaciona dimenses, caractersticas, impasses e componentes de uma iniciativa acadmica que promove a integrao curricular desses componentes de uma comisso interdisciplinar que congrega as atividades de Estgio Supervisionado e Trabalho de Concluso de Curso. Aborda o papel das atividades de ensino, pesquisa e extenso como elos entre Universidade e Escola. Discute o carter dialtico e transformador das experincias terico/prticas concebidas como indagao de pesquisa. Problematiza a construo da prxis. Discute o referencial terico, as aproximaes realizadas e os primeiros resultados da pesquisa. Relaciona a natureza do trabalho docente com a qualidade das aprendizagens sociais e escolares. Valida a integrao orgnica ensino/pesquisa, teoria/prtica e contedo/forma com a construo do 'banco de aulas'.
Palavras-Chave: Ensino e Pesquisa - Formao de Professores - Banco de Aulas.
Introduo
O presente estudo denominado A relao ensino/pesquisa na formao de
professores: a experincia do Banco de Aulas para a construo da prxis docente
parte da compreenso da aprendizagem como resultado do processo de ensino
relacionado a pesquisa (DEMO, 1999), reconhecendo a vivncia da investigao como
Professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Formao em Pedagogia Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Mestrado em Educao pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Integra o DUFOP - Grupo de Pesquisa Docncia Universitria e Formao de Professor que est inscrito no CNPQ e integra o Programa de Ps-Graduao em Educao e Contemporaneidade do Departamento de Educao da UNEB - Campus I. [email protected]
Professora da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Formao em Pedagogia pela Universidade Catlica do Salvador (UCSAL) e Mestrado em Educao pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). No momento, est concluindo o Doutorado no Programa Educaci i Democrcia do Departamento de Teoria i Histria De Leducaci da Universidad De Barcelona. [email protected]
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prtica social de aprendizagem. Sua realizao parte da anlise dos pressupostos
terico-metodolgicos de uma experincia realizada no curso de Pedagogia.
Essa experincia est afinada com a noo de Demo (1999) sobre o sujeito
autnomo que se emancipa atravs de sua conscincia crtica e da capacidade de
questionar a realidade. E, em se tratando do Curso de Licenciatura em Pedagogia
considera a necessidade da participao ativa dos licenciando em sua prpria formao,
tomando a mediao para elaborar e concretizar estratgias e dispositivos para a
construo de aulas mais eficazes e significativas. Nesse estudo, portanto, busca-se
fortalecer a trade ensino, pesquisa e extenso, na medida em que seu foco se d na
docncia universitria com atitude investigativa, a favor da aprendizagem significativa
dos educandos, futuros professores da educao bsica.
Nesse sentido, Pedro Demo (1999) defende a relevncia da opo do ensino
com pesquisa. Seus estudos sugerem que a apropriao cientfica dos percursos de
apreender a realidade possibilita mudanas nas relaes com o mundo e com a
sociedade. Faz-se necessrio, lembra, no entanto, que a preocupao com os saberes
necessrios pesquisa sempre inquietou estudiosos como Freire (1998), Stenhouse
(2000) e Tardif (2002), dentre outros.
Vale lembrar, tambm, que os estudos de Fazenda (2000), enfatizam que o ensino um
fenmeno de muita complexidade. No sentido de vislumbrar com maior nitidez esse
complexo contexto, partimos do princpio de que deve existir o cultivo de uma relao
mais proximal entre as vrias vertentes que compe o cenrio da Formao de
Professores. Entre elas podemos citar:
A identidade profissional a qualidade desse sujeito ao vivenciar a construo
de sua identidade como trabalhador no exerccio de sua profissionalidade como
educador;
O entendimento da unidade teoria/prtica como prxis no apenas o
conhecimento linear da realidade para a reproduo de um saber, valorizando a
pesquisa e o dilogo como tnicas de uma nova e necessria postura educadora;
A compreenso e a transformao das relaes entre o ensinar e o aprender: o
trabalho docente.
Para a presente pesquisa, esses aspectos se entrelaam no momento em que o
licenciando se encaminha para as disciplinas de natureza terico/prticas e praticas, tais
como a Didtica e o Estgio Supervisionado Curricular. Da a necessidade da pesquisa
34
nesse contexto. De acordo com as discusses de Fazenda (2000) e de Freire (1998),
pois, defendem a pesquisa como forma de aquisio do conhecimento e reflexo crtica
sobre a prtica. Dessa forma, emerge o papel da pesquisa como articuladora entre a
Universidade e a Escola, como consta na figura 1, na qual aparece a concepo da
relao Universidade Escola, nesta experincia.
Desse modo, ao se colocar entre a Universidade e a Escola, o licenciando,
respaldado pela pesquisa, consegue construir uma atitude mais alargada de compreenso
sobre profissionalidade/trabalho docente/prxis e desenvolver uma postura mais
propositiva de estratgias, dispositivos e procedimentos para aulas eficazes para
aprendizagem discente.
Nesse contexto se insere a experincia que se constitui objeto do estudo aqui
tratado e traz na sua abordagem a reflexo sobre a unidade ensino, pesquisa e
extenso. imperativo contextualizar essa investigao, pois, se constitui em uma
atividade derivante das pesquisas de suporte de dois eixos do trabalho acadmico de
uma comisso interdisciplinar que congrega atividades de Estgio Supervisionado
Curricular e Trabalho de Concluso de Curso. Vale ressaltar que a constituio dessa
comisso visa atender aos pressupostos de um ensino vinculado atitude investigativa.
Assim, essa proposta parte da necessidade de articulao entre os estudos realizados nas
disciplinas: Didtica, Pesquisa e Prtica Pedaggica, Estgio Supervisionado e Trabalho
de Concluso de Curso, vislumbrando a possibilidade de gerao de um processo de
integrao orgnica entre eles.
Em funcionamento desde 2009, a referida comisso, se organiza em cinco (05)
eixos de trabalhos, com especial ateno para a articulao entre ensino e pesquisa no
Departamento em que funciona. Assim, a comisso articula a investigao sobre a prxis
pedaggica com intuito de construir referenciais terico-metodolgicos e atividades
didticas vinculadas aos componentes curriculares que agrega. Portanto, a experincia
tratada neste estudo, constitui-se em uma atividade derivante, atrelada s pesquisas de
suporte de dois eixos - (02) e (05) - do desenho da integrao. Como mostra o quadro 1,
referente aos Eixos de Trabalho
Pesquisa de Suporte
Atividade Derivante.
Faz-se necessrio destacar, especialmente, o carter cientfico dessa experincia,
assentado no princpio de que a formao do profissional de Pedagogia precisa estar
fundamentada na ao interdisciplinar, focada na iniciao cientfica e nas atividades
de investigao continuada, vinculadas s atividades de extenso. Dessa forma, o
35
estudante aprende a desenvolver aes fundamentadas em valores comprometidos com
a reflexo sobre a sua prtica pedaggica, favorecendo a formao de novas
mentalidades em defesa da associao do ensino pesquisa e do engajamento dos
futuros docentes como atores da realidade.
Desenvolvimento
Faz-se necessrio registrar que a comisso aqui relacionada nasce no projeto de
reformulao do Curso de Pedagogia, do Departamento em que a mesma est inserida,
assim como os seus cinco (05) eixos de trabalhos que articulam a investigao sobre a
prxis pedaggica, com intuito de construir referenciais terico-metodolgicos com
objetivo de:
Eixos 1 Referenciais Tericos e Metodolgicos para o ensino em classes de
Educao Infantil e do Ensino Fundamental Produzir e sistematizar
referenciais Tericos e Metodolgicos para utilizao no processo de
ensino/aprendizagem na Educao Infantil e no Ensino Fundamental, a partir das
investigaes realizadas por docentes e discentes.
Eixo 2 Norteadores Metodolgicos para dinamizao das Prticas
Pedaggicas de Estgio Supervisionado - Documentar experincias e propostas
inovadoras sobre as abordagens metodolgicas das prticas pedaggicas para a
Educao Infantil, para o Ensino Fundamental.
Eixo 3 Processos Gestores do Pedagogo - Desenvolver e aprimorar a prtica de
processos gestores do Pedagogo em escolas pblicas de Educao Infantil e de
Ensino Fundamental, inserindo este profissional no trabalho de coordenao
pedaggica e de gesto da escola e dos sistemas de ensino.
Eixo 4 Integrao Estgio Supervisionado e Trabalho de Concluso de
Curso - Acompanhar a sistemtica do processo de ensino/pesquisa com vistas ao
fortalecimento da integrao ES/TCC, no Departamento de Educao,
articulando a atividade de Estgio com o TCC, a partir do 5 semestre, definindo
temas, problemas de pesquisa e encaminhando os estudantes aos orientadores
dos projetos iniciais de monografia.
Eixo 5 A utilizao tecnologias inteligentes no processo de estgio
supervisionado. Desenvolver experincia de criao e utilizao de ambientes e
36
dispositivos pedaggicos virtuais auxiliares do percurso formativo dos
estudantes de Pedagogia.
Desse modo, a experincia aqui trazida se tornou possvel na medida em que o
eixo dois (02) e o eixo cinco (05) foram estruturados. Ela tem a inteno de articular a
prxis pedaggica e criar a cultura de mediao como acompanhamento da
aprendizagem dos licenciandos em Pedagogia, estudando os processos didticos na
Educao Bsica, a partir da construo de um banco de aulas que funciona em um
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA).
O contexto atual do Estudo
O estudo A relao ensino/pesquisa na formao de professores: a experincia
do banco de aulas para a construo da prxis docente considera o uso do Ambiente
Virtual de Aprendizagem (AVA) como articulador entre ensino/pesquisa/extenso,
aproximando Universidade e Educao Bsica, representados pela relao entre o
Departamento de Educao e escolas parceiras que se constituem campo de estgio e de
prticas de ensino.
Assim, imprescindvel reconhecer que a presente experincia se inscreve na
compreenso dos referenciais tericos de Alves (2000), Ramal (2002), dentre outros
autores, pois, investiga o potencial e eficcia do uso das TIC para a construo do
conhecimento e o desenvolvimento de um processo educacional interativo que propicie
a produo de conhecimento, via processos colaborativos. Nesse sentido, Silva (2000),
sustenta a idia que o processo de ensino/aprendizagem, baseado na interatividade pode
ser bastante participativo e permitir experincias muito enriquecedoras. Enquanto,
Alves (2000) prope que a prtica pedaggica seja redimensionada pelos recursos das
Tecnologias da Inteligncia e da Comunicao (TIC), gerando valores de sociabilidade,
dilogo, entendimento e co-participao.
O funcionamento do banco de aulas envolve a postagem no Ambiente Virtual
de Aprendizagem (AVA) de planos e propostas de atividades integradas de ensino
produzidas com orientao da professora de Didtica. Depois da postagem ocorre a
interao com os outros universitrios e com a professora de Estgio I, gerando
reescrita, discusses, textualizaes e criao de propostas inovadoras sobre as
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abordagens metodolgicas das prticas pedaggicas para a Educao Infantil e para o
Ensino Fundamental, como representa a figura 2, referente concepo do banco de
aulas.
Com o desenvolvimento de aulas nas reas de linguagens, cincias da natureza e
cincias sociais h a partilha no AVA e vivncia de pesquisas acerca das reas e sobre
metodologias inovadoras de ensino, compondo projetos didticos e propostas de
atividades integradas de ensino, considerando a mediao e a interatividade dos
participantes;
Essa iniciativa se apia, sobretudo, no pensamento de Freire (1998), Becker
(2010), dentre outros pensadores crticos que defendem a unidade entre os saberes
necessrios pesquisa e docncia, considerando-os intrinsecamente interligados. Essa
unidade possibilita a gerao de novos modelos de organizao e sistemtica de
gerenciamento da relao entre a comunidade escolar, professores e estudante da
licenciatura em Pedagogia, participantes do conjunto de interfaces que as TIC
favorecem.
A experincia ganha intensidade na medida em que prope articulaes que
fomentam o fortalecimento da Licenciatura em Pedagogia e, conseqentemente, revela-
se como um singular investimento na formao de novos docentes. A idia que
fundamenta este estudo consiste em construir uma trade entre:
O eixo dois (02), composto por professores e estudantes de Didtica,
O eixo cinco (05), composto por professores e estudantes de Estgio
Supervisionado, e
A escola parceira,
Vale destacar que, nesta proposta, o 'banco de aulas' representa a sntese de
relaes entre o campo terico estudado, a experincia de observao de aulas na Escola
de Educao Bsica e as problematizaes realizadas nos semestres de estudos na
Licenciatura. Dessa forma, a concretude do 'banco de aulas' em sua virtualidade supera
o modelo de um mero depsito de idias, testadas ou no, sobre possibilidades de aula.
Trata-se de um espao vibrante, dinmico e inconcluso de trocas e interaes. L,
licenciandos, estagirios ou no, partilham, com a mediao docente, estratgias,
dispositivos e procedimentos para a construo e implementao de propostas de aulas
mais desafiadoras, partindo das necessidades dos educandos da escola bsica e das
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orientaes didtico/pedaggicas pertinentes.
Logo, o potencial do 'banco de aulas' se revela como dispositivo de superao do
cnone, tendo em vista que ao acessar o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) e
postar um plano ou projeto didtico, mergulha-se na horizontalidade mediada de
produo do conhecimento. Silva (1999) em sua obra "A Sala de Aula Interativa" j
preconizava o fim da verticalidade depositria do docente na produo do
conhecimento. Nela, ele sinaliza a tendncia que se anuncia: o poder rizomtico do
AVA para educadores e educandos, sujeitos que se estruturam dialogicidade como
tnica de uma nova e necessria postura mediadora para a vivncia da aprendizagem.
Alm desses aspectos, faz-se necessrio salientar que, antes da postagem no
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), cada proposta