UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA -...
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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANA
"CASA TOMADA" - JULIO CORTAzAR
A LlNGUAGEM REALISTA FANTAsTICA
NA LlTERATURA HISPANO-AMERICANA
AURELIA MARCIA DE SOUZA FRAN<;:A
Trabalho apresentadoUniversidade Tuiuti do Parana comorequisito parcial para a obteny30 dotftulo de P6s- GradUay30 em linguaEspanhola, sob orientay30 daProfessora Isabel Jasinski.
CURITIBA2004
re:. -~L..J' I·~·_t ~§rl·r---.,\~~. v ~
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TERMO DE APROVA<;.li.OAurelia Marcia de Souza Fran~a
"CASA TOMADA"- JULIO CORTAzARA LlNGUAGEM REALISTA FANTAsTICANA LlTERATURA HISPANO-AMERICANA
Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenyao do titulo de
Especialista em Lingua e Literatura Espanhola e Hispano-Americanano curso de P6s-graduayao em Lingua e Literatura Espanhola e
Hispano-Americana da Universidade Tuiuti do Parana.
Curitiba, 16 de maryo de 2004.
Leonilda Ambrozio
P6s-gradua~ao em Lingua e Literatura Espanhola e Hispano-
Americana. Universidade Tuiuti do Parana.
Orientadora: Prof" Mestre Isabel Jasinski
UFPR-Departamento de Letras
SUMARIO
RESUMO ..
1 INTRODUC;Ao ..
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Objetivo Geral..
2.2 Objetivo Espeeifieo ..
2.3 Metodologia ..
2.4 0 Autor .
2.5 A Obra
2.6 0 Conto ..
2.6.1 Breve Resumo do Conto ..
2.7 Casa Tomada, Cas a de Usher e 0 Ineesto
3 CONCLUsAo.. . .
REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS
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RESUMO
A moderna narrativa fantastica remonta, em ultima instancia, ao romance g6tice(Gothic Nove~ que surgiu no seculo XVIII. Ao eontrario de seu ancestral queexplorava diretamente as ambientes macahros, as lances dramaticos e 0 ritmoacelerado de aventura 0 fantastico fai paulatinamente sendo depurado ao longo dosecula XIX ate chegar no XX com urn arsenal narrativQ mais sutil, enredos maiscondensados, escritura mais requintada. Seu campo tematico, porem, taiabandonando a rapida sucessao de acontecimentos surpreendentes, assustadores eemocionantes para adentrar esferas mais complexas que a aproximam do mito e dosimbolo. A narrativa fantastica ternou-se receptiva a inquieta~o perante as avan<;oscientificos e tecnol6gicos; as angustias existenciais e psicol6gicas em obras taiscomo: A metamorfose, de Kafka; A queda da casa de Usher, de E. A. Poe; iIsensavao de impotencia, a repressao sexual partindo do inconsciente e deixando-seaflorar em urna relavao incestuosa na obra Casa lomada de Julio Cortazar. 0 efeitocriado por esses textos pode, por conseguinte, cobrir urn grande leque de ernoc;6es:incornodo, surpresa, duvida, estranhamento, aversao, encanto. Qualquer que sejaseu pretexto ou contexto, a narrativa fantastica efetua uma reavaliayao dospressupostos da realidade, questionando sua natureza precipua e colocando emduvida nossa eapacidade de efetivamente eapta-Ia atraves da percep980 dossentidos. Em conseqOemcia disso, 0 fantastico faz emergir a incerteza e 0
desconforto diante daquilo que era tido como familiar. 0 fantastico nao cria mundosfabulosos, distintos do nosso e povoados por criaturas imaginarias, mas revela eproblematiza a vida e 0 ambiente que conhecemos no dia-a-dia. Esse "realismo" dofantastico nao implica, porem, em uma limitay80 ou pauperizay80 de seu alcance naabordagemde problemashumanos.Antes, e a fonte de sua complexidadeestetica ede representac;ao social, estando ai justamente sua distinyao da simples "hist6ria dehorror", composta de personagens e situayoes macabros visando tao somente 0
efeito de terror. 0 fantastieo, portanto, ultrapassa as fronteiras da literatura trivial,contando-se em suas fileiras escritores de primeira grandeza. Onde se encontramtextos de esmerada escritura, enredos complexos, temas e abordagens criticas,alem de urn continuo processo de evoluyao mostrando que 0 genera nao eestanque. A literatura fantastica nunca deixa de procurar novas formas de expressaoe novos conteudos, estando sua definic;ao sempre adiante do estipulado porhistoriadores e te6ricos. A constante transformayao pela qual ela passa deve-se aofato de sempre constituir uma resposta ao complexo de preeeitos, habitos econvenyoes dominantes no meio social em que foi criada: pode-se entender essacategoria literaria como urn instrumento a serviyo da rebeldia espiritual, social eartistica. 0 alcance critlco e estetico do fantastico realiza-se de varias formas, entreelas esta Casa Tomada de Julio Cortazar, na qual uma dupla de irmaos se veemexpulsos de sua casa por uns ruidos que sao, a principia, uma metafora semidentifica980.No entanto, ao longo da analise do conto, se ve que pode ser umemerglr violento de urn desejo incestuoso. Dai a importancia de conhece-Io eestuda-Io.
1 INTRODUQAO
o objetivo deste trabalho sera 0 de demonstrar que na obra
de Julio Cortazar percebe-se, claramente, a existencia de urn plano
"dupla", uma realidade cotidiana, visivel e razaavel, e outra, de pura
imaginac;ao, que nao se explica senaa par aquilo que reside na
inconsciencia humana, configurando, indubitavelmente, a linguagem
realista fantastica na literatura hispano-americana.
Portanto, a busea sera de evidenciar que em Cortazar as
temas se entrelac;am com as aspectos construtivQs, reproduzindo
uma linguagem fantastica e ultrapassando as fronteiras da literatura
trivial.
A abordagem cortazariana do universe do fantastico nao
deve ser buscada somente nos relatos que mostram 0 cheque e a
fusao das ordens incompativeis (Ia pesadilla y la vigilia, el yo y el no
yo, el pasado y el presente), mas tambern naqueles que
desmascaram a carga de catastrofe da realidade cotidiana.
Enfim, se trata do que 0 proprio Cortazar tern denominado
como urn fantastico "sin mayusculas", pais a misterio nao se escreve
com maiuscula, exageradamente, como imaginam tantos narradores,
mas estara sempre presente em suas obras.
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2 DESENVOLVIMENTO
2.1 ObjetiYo Geral
Com a renOV8c;8.0 da lingua gem pro posta pelo realismo
fantastica, demonstrar que surge Julio Cortitzar como digna
representante dessa mesma linguagem fantastica na literatura
hispano-americana, e que tambem, diferentemente dos autores
classicos, apresenta 0 elemento fantastico submerso na
cotidianidade, sem tentar gerar no leitor a reatyao que antes S8
buscava, ou seja, 0 horror.
2.2 ObjetiYo Especifico
Especificamente, neste trabalho, ao analisar a obra "Casa
Tomada", busea-s8 demonstrar 0 fantastico cortazariano como urn
emergir do inconsciente sexual liberado numa relaC;80 incestuosa
entre a dupla de irmaos, sendo a casa elemento fomentador do
incesta.
2.3 Metodologia
Trabalho realizado atrayss de pesquisa bibliografica. com a
concernente consulta a livros relevantes e fundamentais a execu~ao
do trabalho, analise e reflexao do conto proposto, informayoes
coletadas atraves da Internet e aula expositiva ministrada peia
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Professora Susan Blum Pess6a de Moura, realizada na Universidade
Federal do Parana, no dia 29 de outubro de 2003, onde ela expos
sobre 0 Realismo Fantastico (Neofantastico) de Cortazar, sua
linguagem, seu questionamento sabre a realidade (ficcional e nao
ficcional) e especificamente a respeito da angustia ou do suposto
incesta no conto Casa Tomada de Cortazar.
2.40 Autor
De pais argentinas, Julio Cortazar nasceu em Bruxelas,
Belgica, em 26 de agosto de 1.914.
Eram tempos de terror no Velho Continente que sofria as
embates da Primeira Guerra Mundial.
o pai de Julio havia side enviado a Europa em uma missao
comercial juntamente com uma delega980 da Republica Argentina em
Bruxelas. Na verdade, seria uma viagem que deveria durar apenas
alguns meses. Mas em decorrencia da guerra e suas consequencias
a familia viu-se obrigada a permanecer na Europa por mais de quatro
anos, alternando sua estadia tambem na Espanha e na Sui<;a.
Em 1.918 a familia Cortazar pode retornar a Argentina e
se instalou em uma velha e grande casa na cidade de Banfield, a
poucos quil6metros de Buenos Aires.
Nao foi facil a infancia do menino Julio. Seu pai
abandonou a familia e 0 mundo do menino reduziu-se ao contato com
sua mae, sua irma e algumas tias.
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Era urn garolo solitario, timido e sumamente introvertido
que passava haras e haras lendo livros que encontrava na biblioteca
da casa.
Logo ap6s esse primeiro contato com a literatura,
seguiram-se Qutros interesses que se desenvolveriam atraves dos
anos: a boxe e a musica, particularmente 0 jazz, que se
transformaram em verdadeiras paix6es que ele nunca mais
abandonaria.
Nos principios da decada de 30, a familia Cortazar mudou-
se para Buenos Aires onde Julio curSQU 0 secundario no Colegio
Maria Acosta obtendo a titulo de mestre escola.
No inicio de sua carreira de professor leeionou em tres
pequenos municipios perdidos em meio aos pampas: Saladillo,
Bolivar e Chivilcoy.
Nessa epoca, ja havia escrito alguns poemas que publicou
com 0 titulo "Presencia", sob a pseud6nimo de "Julio Denis".
Tambem estava comec;ando a escrever seus primeiros contos e uma
obra dramaiica, "Los Reyes", que vieram il luz em 1.949.
Cansado de viver nesses pequenos povoados e com uma
intensa necessidade de ter urn maior contacto com os ambitos
intelectuais argentinos, requereu uma catedra na Universidade de
CUYOt na provincia de Mendoza.
Durante urn ana lecianou literatura mas acabou por
renunciar a essa cadeira em decorrencia de prafundas desavenc;as
com 0 governo do General Juan Domingo Peron e sua palitica
populista.
o peronismo representou uma molestia para 0 intelectual.
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Em 1.950, realizou sua primeira viagem a Europa de onde
voltou com a intent;;ao de realizar uma profunda mudan<;a ern sua
vida.
Finalmenle, em 1.951 afaslou-se definilivamenle da
Argentina para morar em Paris. Nesse ana publicou "Bestiario", obra
na qual encontram-se alguns de seus melhores contos, tais como:
Carta a una senorita en Paris, Lejana, Cefalea e Casa Tomada,
objelo do presenle Irabalho.
Na Fran9a Irabalhou como Iradulor independenle da
UNESCO. Seu Irabalho perm ilia ler liberdade para seguir escrevendo
e viajar constantemente. Aurora Bernardez, sua primeira mulher, 0
acompanhava em suas viagens pel a Europa e Asia.
o afastamento de seu pais, levou-a paradoxalmente a
descobrir uma nova identidade em si mesmo.
Cortazar muda profundamente de posic;ao a respeito dos
movimentos socia is que 0 haviam afastado da Argentina. Apesar de
viver em Paris, sente-se atraido pela America Latina e apoia
ativamente as revolu~6es cubana e nicaraguense.
Visita varias vezes ambos paises, transformando-se ern
urn continuo colaborador de seus projetos culturais e urn divulgador
de seus sucessos politicos e culturais.
A publica9ao de "Rayuela" (1.963) 0 ralificou como urn dos
narradores latino-americanos mais originais, ao construir uma novel a
que significava uma quebra com rela~ao it narrativa tradicional.
Aclamado pelos leitores e reconhecido pela critica,
chegou a converter-se em uma referencia da novela latino-
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americana, juntamente com Carlos Fuentes, Mario Vargas Llosa e
Gabriel Garcia Marquez.
o exito de Cortazar deriva de urna conjun98o entre urna
literatura agressiva, ou melhor, como se diz em espanhol, "fresca",
que, bem traduzido vern a significar "falar na lata" au "mandar vern,
com urna literatura ludica, aliado a seu compromisso politico,
enfatizada par certos impetas que despertam a curiosidade de seus
leitores, parecia ser eternamente jovem, tinha multiplas aventuras
amorosas e era profundamente admirado e Querida par todos as que
a conheciam.
Com 0 implemento das ditaduras na America Latina,
fortaleceu seu compromisso com as povos que as sofriam, abordando
a tematica da luta armada, momento no qual representou
definitivamente a entrada da politica em sua abra.
o premia que ganhou com esse livro, doou-o ao povo
chilena que lutava ferozmente contra a ditadura de Augusto Pinochet.
Do mesmo modo, as direitos autorais de muitas de suas obras foram
cedidos a diferentes causas sociais.
Nessa altura de sua vida, separou-se de Aurora Bernardez
e manteve uma rela'Yclo estavel com a lituana Ugne Karvelis. Esta
rela'Y8o durou algum tempo ate que conheceu a escritora franc6fona
Carol Dunlop, de 31 anos, durante uma viagem a Montreal, Canada.
Mesmo tendo Cortazar mais de sessenta e cinco anos de
idade quando conheceu Carol, a relayclo que se estabeleceu entre
ambos foi intensa e passional.
Juntos realizaram uma viagem pela estrada Paris -
Marselha que resultou na publica9ao de "Los autonautas de la
cosmopista", obra esc rita pelos dais.
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o edilico romance terminou abruptamente com a marte de
Carol, vitima de uma rara enfermidade.
Abatido par tao grande perda e sofrendo de leucemia,
Julio realizou sua ultima viagem a Argentina, ja vivendo uma
democracia. Pela primeira vez sentiu-se velho, deprimido e cansado.
Ao regressar a Paris foi internado varias vezes ate que
laleceu em 12 de levereiro de 1.984.
2.5 A Obra
Divertimiento - 1950
Bestiario - 1951
Final del juego - 1956
Las armas secretas - 1959
Ultimo Round - 1960
Historias de cronopios y de lamas - 1962
Ocupaciones raras - 1962
Material Plastico - 1962
Historias de cronopios y de famas - 1962
Rayuela - 1963
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Todos los fuegos el fuego - 1966
La vuelta al dia en ochenta mundos - 1967
Un tal de Lucas - 1979
Queremos tanto a Glenda - 1980
Deshoras - 1982
Los autonautas de la cosmopista - 1983
Salvo el crepusculo - 1984
2.6 0 Conto
Nos gustaba la casa porque aparte de espaciosa y
antigua (hoy que las casas antiguas sucumben a la mas ventajosa
liquidacion de sus materiales) guardaba los secretos de nuestros
bisabuelos, el abuelo paterno, nuestros padres y toda la infancia.
Nos habituamos Irene y yo a persistir solos en ella, 10 que
era una locura pues en esa casa pod ian vivir echo personas sin
estorbarse. Haciamos la limpieza par la mariana, levantandonos a las
siete. y a eso de las once yo Ie dejaba a Irene las ultimas
habitaciones par repasar y me iba a la cocina. Almorzabamos a
mediodia, siempre puntuales; ya no quedaba nada por hacer fuera de
unos platos sucios. Nos resultaba grato almorzar pensando en la
casa profunda y silenciosa y c6mo nos bastahamos para mantenerla
limpia. A veces lIegamos a creer que era ella la que no nos dej6
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casarnos. Irene rechaz6 dos pretendientes sin m a mi se
me muri6 Maria Esther antes que lIegaramas a comprometernos.
Entramos en los cuarenta anos con la inexpresada idea de que el
nuestro, simple y silencioso matrimonio de hermanos, era necesaria
clausura de la genealogia asentada par los bisabuelos en nuestra
casa. Nos moririamos alii algun dia, vag os y esquivos primos se
quedarian con la casa y la echarian a[ suelc para enriquecerse con el
terreno y los ladrillos; 0 mejor, nosotros mismos la volteariamos
justicieramente antes de que fuese demasiado tarde.
Irene era una chica nacida para no molestar a nadie. Aparte
de su actividad matinal se pasaba el resto del dia tejiendo en el sofa
de su dormitorio. No se porque tejia tanto, yo creD que las mujeres
tejen cuando han en contra do en esa labor el gran pretexto para no
hacer nada. Irene no era asi, tejia cosas siempre necesarias, tricotas
para el invierno, medias para mi, mananitas y chalecos para ella. A
veces tejia un chaleco y despues 10 destejia en un momento porque
algo no Ie agradaba; era gracioso ver en la canastilla el monton de
lana encrespada resistiendose a perder su forma de algunas horas.
Los sabados iba yo al centro a comprarle lana; Irene tenia fe en mi
gusto, se complacia can los colo res y nunca tuve que devolver
madejas. Yo aprovechaba esas sa lid as para dar una vue Ita por las
librerias y preguntar vanamente si habia novedades en literatura
francesa. Desde 1939 no Ilegaba nada valioso a la Argentina.
Pero es de la casa que me interesa hablar, de la casa y de
Irene, porque yo no tengo importancia. Me pregunto que hubiera
hecho Irene sin el tejido. Uno puede releer un libra, pero cuando un
pull-over esta terminado no se puede repetirlo sin escandalo. Un dia
encontre el cajon de abajo de la comoda de alcanfor lIeno de
panoletas blancas, verdes, lila. Estaban con naftalina, apiladas como
en una merceria; no tuve valor de preguntarle a Irene que pensaba a
hacer can elias. No necesitabamos ganarnos la vida, todos los meses
lIegaba la plata de los campos y el dinero aumentaba. Pero a Irene
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solamente la entretenia el tejido, mostraba una destreza maravillosa
y a mi se me iban las heras viendole las manos como erizos
plateados, agujas yendo y viniendo y una 0 dos canastillas en el
suelo donde se agitaban constantemente los ovillos. Era hermoso.
Como no acordarme de la distribucion de la casa. EI
comedor, una sala con gobelinos, la biblioteca y tres dormitorios
grandes quedaban en la parte mas retirada, la que mira hacia
Rodriguez Pena. Solamente un pasillo con su maciza puerta de roble
aislaba esta parte del ala delantera donde habia un bafio, la cocina,
nuestros dormitorios y el living central, al cual comunicaban los
dormitorios y el pasillo. Se entraba a la casa por un zaguan con
may61ica , y la puerta central daba al living. De manera que uno
entraba por el zaguan, abria la cancel y pasaba al living; tenia a los
lados las puertas de nuestros dormitorios, y al frente del pasillo que
conducia a la parte mas retirada; avanzando por Ie pasillo se
franqueaba la puerta de roble y mas alia empezaba el otro lado de la
casa, 0 bien se podia girar a la izquierda justamente antes de la
puerta y seguir por un pasillo mas estrecho que lIevaba a la cocina y
al bario. Cuando la puerta estaba abierta advertia uno que la casa
era muy grande; si no, daba la impresi6n de un departamento de los
que se edifican ahora, apenas para moverse; Irene y yo viviamos
siempre en esta parte de la casa, casi nunca ibamos mas alia de la
puerta de roble, salvo para hacer la Iimpieza. pues es increible c6mo
se junta tierra en los muebles. Buenos Aires sera una ciudad Iimpia,
pero eso se 10 debe a sus habitantes y no a otra cosa. Hay
demasiada tierra en el aire, apenas sapia una rafaga se palpa el
polvo en los marmoles de las consolas y entre los rombos de las
carpetas de macrame; da trabajo sacarlo bien con plumero, vuela y
se suspende en el aire, un momenta despues se deposita de nuevo
en los muebles y en los pianos.
Lo recordar;, siempre con claridad porque fue simple y sin
circunstancias inutiles. Irene estaba tejiendo en su dormitorio, eran
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las ocho de la noche y de repente se me ocurri6 poner al fuego la
pavita del mate. Fui hasta el pasillo hasta enfrentar la entornada
puerta de roble, y daba la vuelta al codo que lIevaba a la cocina
cuando escuche algo en el comedor 0 la biblioteca. EI son ida venia
impreciso y sordo, como un volcarse de silla sobre la alfombra 0 unahogado susurro de conversaci6n. Tambiem 10 ai, al mismo tiempo 0
un segundo despues, en el fonda del pasillo que traia desde aquellas
piezas hasta la puerta. Me tire contra la puerta antes de que fuera
demasiado tarde, la cerre de golpe apoyando el cuerpo; felizmente la
lIave estaba puesta de nuestro lade y ademas corri el gran cerrojo
para mas seguridad.
Fui a la cocina, calente la pavita, y cuando estuve de vue Ita
con la bandeja del mate Ie dije a Irene:
- Tuve que cerrar la puerta del pasillo. Han tomado la parte
del fondo.
Dej6 caer el tejido y me mir6 con sus graves ojos cansados.
-l,Estas seguro?
Asenti.
-Entonces -dijo recogiendo las agujas- tendremos que
vivir en este lado.
Yo cebaba el mate con mucho cuidado, pera ella tard6 un
rata en reanudar su labor. Me acuerdo que tejia un chaleco gris; a mi
me gustaba ese chaleco.
Los primeros dias nos parecio penoso porque ambos
habiamos dejado en la parte tomada muchas cosas que queriamos.
Mis libros de literatura francesa, por ejemplo, estaban todos en la
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biblioteca. Irene extranaba unas carpetas, un par de pantuflas que
tanto la abrigaban en invierno. Yo sentia mi pipa de enebro y cree
que Irene pens~ en una botella de Hesperidina de muchos anos. Con
frecuencia (perc esto solamente sucedi6 los primeros dias)
cerrahamos algun cajon de las c6modas y nos mirabamos con
tristeza.
-No esta aqui.
Y era una cosa mas de lodo 10 que habiamos perdido al olro
lado de la casa.
Pera tambien tuvimos ventajas. La limpieza se simplifie6
tanto que aun levantandose tardisimo, a las nueve y media par
ejemplo, no daban las once y ya eslabamos de brazos cruzados.
Irene se acostumbr6 a ir conmigo a la cocina y ayudarme a preparar
el almuerzo. La pensamos bien y se decidi6 esto: mientras yo
preparaba el almuerzo, Irene cocinaria platDs para comer frios de
nache. Nos alegramos porque siempre resulta molesto tener que
abandonar los dormitorios al atardecer y ponerse a cocinar. Ahora
nos bastaba con la mesa en el dormitorio de Irene y las fuentes de
com ida fiambre.
Irene estaba contenta porque Ie quedaba mas tiempo para
tejer. Yo andaba un poco perdido a causa de los libros, pero par no
afligir a mi hermana me puse a revisar la colecci6n de estampillas de
papa, y eso me sirvi6 para matar el tiempo. Nos divertiamos mucho,
cad a uno en sus cosas, casi siempre reunidos en el dormitorio de
Irene que era mas c6modo. A veces Irene decia:
-Fijale esle punlo que se me ha ocurrido. ~No da un dibujo
de Irebol?
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Un rata despues era yo el que Ie ponia ante los ojos un
cuadrito de papel para que viese el merito de algun sello de Eupen y
Malmedy. Estabamos bien, y poco a poco empezabamos a no pensar.
Se puede vivir sin pensar.
(Cuando Irene sonaba en alta voz yo me desvelaba
enseguida. Nunca pude habituarme a esa voz de estatua 0 papagayo,voz que viene se los sueflos y no de la garganta. Irene decia que missueflos consistian en grandes sacudones que a veces hacian caer elcobertor. Nuestros dormitorios ten ian el living de par media, pera de
nache se escuchaba cualquier cosa en la casa. Nos alamos respirar,
toser, presentiamos el ademan que conduce a la lIave del velador,
los mutuDs y frecuentes insomnios.
Aparte de eso todD estaba callado en la casa. De dia eran
los rumores domesticos, el roce metalieo de las agujas de tejer I un
crujido al pasar las hojas del album filatelico. La puerta de roble,
creo haberlo dicho, era maciza. En la cocina y el ban~, que quedaban
tocando la parte tamada, nos poniamos a hablar en voz mas alta 0
Irene cantaba canciones de cuna. En una cocina hay demasiado ruido
de loza y vidrios para que otros sonidos irrumpan en ella. Muy pocas
veces permitiamos ahi el silencio, pero cuando tornabamos a los
dormitorios y al living, entonces la casa se ponia callada y a media
luz, hasta pisabamos mas despacio para no molestarnos. Yo creo que
era por eso que de noche, cuando Irene empezaba a sonar en alto
voz, me desvelaba en seguida).
Es casi repetir \0 mismo salvo las consecuencias. De noche
siento sed, y antes de acostarnos Ie dije a Irene que iba hasta la
cocina a servirme un vasa de agua. Desde la puerta del dormitorio
(ella tejia) oi el ruido en la cocina; tal vez en la cocina 0 tal vez en el
bane porque el codo del pasHlo apagaba el sonido. A Irene Ie llama
la atenci6n mi brusca manera de detenerme, y vino a mi lade sin
decir palabra. Nos quedamos escuchando los ruidos, notando
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clara mente que eran de este lado de la puerta de roble, en la cocina
y en el bario, 0 en el pasilla mismo donde empezaba el coda casi al
lado nuestro.
No nos miramos siquiera. Aprete el brazo de I rene y la hiee
correr conmigo hasta la puerta cancel, sin volvernos hacia atras. Los
ruidos se cian mas fuerte, pera siempre sordos a espaldas nuestras.
Gerre de un golpe la cancel y nos quedamos en el zaguan. Ahora no
se cia nada.
-Han tornado esta parte -dijo Irene. EI tejido Ie colgaba de
las manos y las hebras iban hasta el cancel y se perd ian debajo.
Guando vio que los ovillos habian quedado del otro lado, solt6 el
tejido sin mira rio.
-i Tuviste tiempo de traer alguna cosa? -Ie pregunte
inutilmente.
-No, nada.
Estabamos con 10 puesto. Me aeards de los quince mil pesos
en el armaria de mi dormitorio. Va era tarde ahara.
Como me quedaba el reloj pulsera, vi que eran las once de
la noche. Rode'; con mi brazo la cintura de Irene (yo creo que ella
estaba lIorando) y salimos a la calle. Antes de alejarnos tuve lastima,
cerre bien la puerta de entrada y tire la lIave a la alcantarilla. No
fuese que a alglln pobre diablo se Ie ocurriera robar y se metiera en
la casa, a esa hora y con la casa tomada.1
lCORTAZAR, Julio F. Bestiario. Madrid, Grupo Santillana de Ediciones, 2"
edici6n p.11-20.
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2.6.1 Breve Resumo do Conto
Urn irmao e uma irma dividiam uma casa durante anos. Esta
mesma casa era de posse da familia desde sempre, sendo inclusive
urn marco na historia familiar. De grandes dimensoes, a residencia
sempre despertou a cobic;;a dos demais rnembros do cia familiar.
Porem, a insistencia dos dais irmaos a preservou de qualquer espalio
ou disputa. Ali dentro, 0 casal vivia uma vida de absoluta pasmaceira
e ratina, dividida entre a ratina de limpeza e as habitos individuais e
as manias de cada urn.
Eis que urn certo dia, a casa foi invadida. As partes dos
fundos foi tamada por invasores an6nimos. Os irma os, apavorados.
S8 trancaram na parte frontal da residencia e logo S8 ajustaram ao
novo ritmo de vida, agora adaptado a um espa90 menor. Quando tudo
parecia se normalizar novamente, a casa sofreu uma nova invasao.
Desta vez, 0 casal preferiu fugir de vez da moradia, deixando-a aos
desejos desses invasores. Assim, expulsos de seu lar, os dois foram
obrigados a encarar 0 mundo.
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2.7 CASA TOMADA, CASA DE USHER E 0 INCESTO
Para se falar de Cortazar se deve prirneiramente buscar 0
que mais influenciou seu modo particular de escrever, e nesse
trabalho indagativo encontrou-se a Edgard Allan Poe. Eis que 0
proprio Corti:lzar aceita que sua inclinal;tc30 para a fantastico provem
desse autor que ele mesma, Cortazar, traduziu para a castelhano.
Segundo ALAZRAKI(1983), Cortazar dizia que "Las huellas
de escritores como Poe estan innegablemente en los niveles mas
profundos de mis cuentos y cree que sin Ligeia y sin La caida de la
casa Usher, no hubiera ten ida esa disposicion hacia 10 fantastico ..
Porem, se POE(1970), como aceita Cortazar, esta
implicitamente em seus contos, aparece de forma explicita no conto
escolhido para esta analise, "Casa Tomada", que se mostra em boa
medida como resposta ao conto de Poe, "La caida de la casa Usher",
no qual se encontram varios elementos que se repetem em Cortazar,
ainda que um tanto quanto distante da concep98o do tantastico e da
propria literatura de Poe.
o tertii dialogo entre am bas as obras nos permite iluminar
zonas obscuras da enigmatica narrat;:ao cortazariana e abordar uma
interpretat;:ao da mesma.
"La caida de la casa Usher" de POE (1970), nos apresenta
uma casa habitada desde seculos por uma familia, perpetuada
sempre em linhagem direta, e na qual no momento vi vern dois irmaos
solteiros, homem e mulher.
A casa oferece urn aspecto sinistro ao narrador-testemunha
que visita seu antigo amigo, Roderick Usher, torturado por um mal
de familia que se reflete em ataques catalepticos, alem do problema
de sua irma que apresenta uma grande
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que tern
permitido it familia Usher dar mostras de "numerosas e elevadas
concep~oes artisticas".
Sua irma esta a ponto de morrer, 0 que agrava 0 mal de
Roderick que tern, por outra parte, a sensa~ao de que a casa exerce
uma influencia malefica sobre ela.
Lady Madeline morre e, dado a sua particular enfermidade e
para evitar a curiosidade medica, seu irmao prefere guardar 0
cadaver alguns dias em uma velha cripta no mais profundo dos
por6es da mansao.
Em uma noite de tempestade em que 0 pr6prio narrador
sente uma grande agita~ao, recebe em seu quarto 0 amigo que havia
piorado muito seu estado de animo nos ultimos dias. Tenta acalma-Io
lendo-Ihe umas paginas de urn livro no qual 0 personagem for~a a
porta de uma casa e se defronta com urn dragao.
A agita~ao do narrador vai crescendo porque cada um dos
sons que descrevem as paginas do livro parecem produzir eco na
propria casa Usher. Roderick confessa finalmente que na realidade
se trata de sua irma enterrada viva que tinha conseguido sair do
sepulcro e, saindo da cripta, subia as escadas para vingar a
precipita~ao de seu irmao.
E assim se da, a porta se abre e a ensangiientada lady
Madeline cai finalmente em um abra~o mortal sobre seu irmao. 0
narrador foge apavorado e observa, ja a salvo, como a casa se
desmorona e e trag ada pelo lago situ ado aos seus pes.
E evidente a importancia que tem a dimensao espacial em
ambos os relatos desde 0 proprio titulo, pOis a casa imp6e urn valor
22
predominante e converte-se em personagem principal na narraC;8o,
adicionando-se assim mais urn personagem a trama.
No relato de Poe, a casa aparece personificada desde 0
principio atraves da descriy80 que nos apresenta 0 narrador,insistindo especial mente na estranha atmosfera que a rodeia e que
se assimila a respirac;ao de urn ser vivo, e as janelas que aD longo da
narraC;8o sao comparadas a olhos vazios.
Seria interessante analisar em profundidade 0 elemento
espacial em ambos as relatos e observar as coincidemcias existentes,par exemplo a insistencia no relato de Poe de que as janelas saoparecidas a olhos vazios pareee ter uma correspondencia com aausencia de janelas na descric;ao da casa que faz 0 narrador doconto cortazariano. Esta ausencia de janelas nos faz notarANDREU(1968), "Inexplicablement les ouvertures ou les fenetres,
semblent totalement absentes de ceUe maison don la seule issue est
la «puerta cancel» qui donne sur la rue".
Evidentemente, a ausencia de janelas e seu carater tetricoajuda a conseguir a atmosfera de angustia em ambos relatos e acaracterizar um espa~o opressivo.
Roderick Usher considera que a casa exerce sobre ele uminfluencia negativa. Tambem no relato de Cortazar a condi9ao de
personagem da casa vem determinada pelas proprias palavras donarrador, porem e da casa que sobressai 0 interesse maior. A casacomo personagem adquire as caracteristicas de personagem sinistraque enumera FREUD (1943) em sua obra Das Unheimliche e a
mesma aparece como possuidora de males, convertendo-se emreflexo de toda a genealogia que nela viveu.
Tal identifica9ao se manifesta, por exemplo, na coincidencia
entre as janelas de olhos vazios e a gradativa perda de brilho dos
23
olhos de Roderick ao longo do relato. Igualmente aparece, com
clareza, quando declara a narrador a tragico final da casa: "extrafio y
equivoco nombre de Casa Usher, nombre que parecia incluir entre
los campesinos que 10 usaban, la familia y la mansion familiar".
FREUD(1978), elaborou urn breve catalogo de temas
sinistros entre as quais se encontram a presenc;a do duplo. das
amputar;oes e da presenr;a de partes do corpo que tern regemcia
propria, a presenya de urn personagem geralmente com
caracteristicas de duple, que possui uma rna influencia, repetic;ao de
uma mesma situar;clO, a encarnar;80 do fantastico e a cumprimento de
desejos e de fantasias que consideramos impossiveis ou irreais.
Porem todos esses assuntos nao conseguem a sinistra par 5i
50S, po is muitos deles aparecem em contos maravilhosos, onde nao
se da 0 sinistro. Necessariamente porque nao se da a duvida sobre 0
inexplicavel que nao se reflete numa realidade possive!.
o sinistro e aquilo que, sendo familiar, e nesse sentido
Freud mostra como a familiar, intimo e na verdade 0 inconsciente
reprimido do sinistro, resultou das imagens das amputay6es que nao
sao senao a recordayao do temor infantil pela castrayao por parte do
pai-rival (e Freud nos recorda que precisamente a castigo que se
auto-imp6e Edipo ao conhecer seu pecado e arrancar os proprios
olhos).
Cortazar incide nessa mesma ideia ao dizer no comeyo do
relato que a casa guardava as recorday6es de "nuestros bisabuelos,
el abuelo paterno, nuestros padres y toda la infancia". E por outro
lado a identifica9ao dos personagens com a casa que habitam esta
muito clara na dedica9ao de que ela e objeto por parte dos dois
irmaos, mesmo porque, sabedor de um destin~ sinistro, 0 narrador
24
tenta destrui-Ia antes de sua desapariyEio. "Nosotros mismos la
volteariamos justicieramente antes de que fuese demasiado tarde".2
Dutra coincidencia entre ambas as obras esta em que a cas a
e justamente habitada par dais irmaos, de sexo distinto. Dois irmaos
que sao as ultimos de uma longa estirpe.
No relato de Cortazar, tambem ha referencias que indicam
que a casa foi habitada par varios antepassados dos dais irmaos,
alias, como a proprio narrador comentou acima: "guardaba los
recuerdos de nuestros bisabuelos, el abuelo paterno, nuestros
padres y tada la infancia".
Inclusive relata que esta linhagem esta prestes a
desaparecer porque nenhum deles se casou.
As duas obras se constroem em torno de urn triangulo de
personagens: a casa e os dois irmaos que a habitam, e 0 nucleo do
relato e precisamente 0 conjunto de inter-rela96es entre eles que, no
caso da obra de Poe, sao observadas par urn narrador-testemunha.
Em Cortazar, de forma oculta, sugere-se a possibilidade de
uma rela9aO incestuosa entre as irmaos. No relato de Poe se discute
que a antigo tronco dos Usher nunca havia brotado de urn ramo
duradouro porque toda a familia se Iimitava a uma unica linha de
descende!ncia direta e em alguns casos com insignificantes e
passageiras varia90es.
Na obra "Casa Tomada", 0 narrador nos fala de urn "simple y
silencioso matrimonio de hermanos", e alem de outras referencias
que sugerem essa pessibilidade a pesar de que varies critices negam
o inceste ne relate de Cortazar. Por exemple Maria Cecilia Quintero
2 CORTAZAR, Julio F. Bestiario. Madrid, Grupo Santillana de Edicianes, 2001Todas as cita.;:Oes do texto Casa Tamada remetem a esta edi.;:ao.
25
Marin quando diz: "No aceptamos la relaci6n incestuosa pues el
mecanismo significativ~ del texto no sugiere en su totalidad dicho
enfoque".3
No que diz respeito ao relate de Poe, varias sao as
sugestoes de urna relac;:c3o incestuosa. Porem alguns criticos, como
Louis Vax, acreditam que todas essas sugestoes respondem, na
realidade, a fatores estruturantes do relato que nao pretendem
sugerir 0 incesta entre as irmaos:
[ ... J EI efeeta que profesa a su hermana moribunda pone derelieve, de forma tan natural como trivial, el desamparo deUsher. La simpatia que liga a los dos personajes S8 explica,desde el punto de vista de 10 verosimil, per su calidad degemelos, y, desde el punto de vista artistico, per la necesidad depresentarlos, no como personalidades bien perfiladasenfrentandose en situaciones diversas, sino comoindividualidades distintas, ligadas p~r afinidades de naturalezaextraordinaria, y que se confunden con la mansion de su raza.En lugar de suponerle tendencias incestuosas, imaginemos porun momento que Usher ha tomado esposa: "no sentimos que laobra perderia calidad? Aunque su union fuera esteril, dosesposos no podrian estar ligados p~r la misma simpatiamisteriosa que dos gemelos [ ... ]. EI parentesco de sangre dacuenta de la solemnidad maca bra del relato mejor que el amorculpable.(Vax, 1980, p. 110).
Em ambos casos os dois casais de irmaos vivem em um grande
grau de isolamento. Roderick confessa a seu amigo que "durante
muchos alios, nunca me habia aventurado a salir" da casa. A dupla
de irmaos de Cortazar raramente deixa a de ambos. Em Cortazar, 56
o irmao e que, aos sabados, sai com uma clara finalidade que e a de
procurar livros franceses, mesmo que tal busca, ele sabe, sempre
seja in "til.
Ja a irma nunca a abandona, contenta-se em tricotar e tricotar,
o que a permite assim passar a tempo.
3 QUINTERO MARIN, Marla Cecilia. La cuentfstica de Julio Corttlzar. Madrid:Editorial Complutense, 1981, p.41.
26
Tal isola menta esta ligado a sugerida relayao incestuQsa. Na
verdade, assemelha-se ao velho conflito familia versus sociedade,
que nao e senaa a conflito endogamia versus exogamia das
sociedades primitivas cnde 0 incesto era a norma.
Pequenos grupos humanos encerrados em si mesmas se
perpetuam sempre em relayDes que nao podiam senaa ser
incestuosas porque precisamente era proibido as relay6es com
membros de outros grupos.
Portanto, parece que hi! uma explica9ao antropologica na
leitura desse relato que nos permite compreender esse isola menta
como resultado de uma relayao incestuQsa, por subentendido que
pareya a principia.
Prova disso e a aceita<;ao de que tal relayao vern estabelecida
pela propria casa, idenlificada com a linhagem, como pode-se ver: "A
veces lIegamos a creer que era ella [Ia casal la que no nos deja
casarnos"; tambem Roderick supunha sobre uma influencia da
mansao a esse respeito.
Tal isola mento, tanto quanto a concentra9ao da familia sobre si
mesma, conduz finalmente it sua propria destrui9ao. Tal e a ideia de
"La caida de la casa Usher", que se converte no esgotamento da
linhagem familiar, bern como 0 proprio fim da casa, trag ada pelo lago
que a cercava.
Assim, casa e linhagem sao devorados por si mesmos. Se trata
portanto de um caso de autofagia. Nao porque 0 incesto em si mesmo
leve a morte, ainda que evidentemente 0 relato de Poe sugira que 0
mal da familia tern muito a ver com a miscigenacao sangUinea, ao
longo do tempo. Mas pelo contri!rio porque, precisamente, 0
isolamento a que essa situac;ao conduz,
propria destruiC;ao.
Na verdade, 0 incesto nao produz monstros nem doenc;as. A
nao ser, logicamente, a perpetuac;ao das caracteristicas de urn
determinado ramo familiar, sejam boas ou ruins.
Por esse motiv~, os criadores de cavalos sempre procuram
cruzar irmaos, quando estes sao de rac;:a pura, para evidentemente
perpetuar a qualidade da especie. Ou ao contra rio, assim nao
proceder quando percebem alguma anormalidade doentia nesses
cruzamentos. Em uma relac;:ao incestuosa a possibilidade de que se
juntem do is genes frageis sao muito maiores do que em uma relac;ao
nao incestuosa.
Os grupos endogamicos acabam por sobrepor-se espacialmente
com outros, 0 que produz uma mutua adversidade porque 0 homem
acaba enfrenlando-se, como diz LEVI-STRAUSS (1985), recordando
a Tylor, a discordancia entre "casar-se" fora do grupo acaba por
"aniquilar" esse rebelde dentro do grupo original.
Na verdade a proibic;:ao do incesto nao tem uma origem moral
como pode considerar-se na atualidade, senao "politica", foi uma
forma de evitar os conflitos entre grupos fechados entre si mesmos e
que por outr~ lade dependiam-se mutuamente.
A proibic;:ao do incesto supoe 0 desenvoivimento da familia e da
sociedade pOis como disse LEVI-STRAUSS (1987), "si la
organizacion social tuvo un principio, este solo pudo haber consistido
en la prohibicion del incesto".
A ideia da destruic;:ao da casa, que acontece no relato de Poe,
como resultado dessa autofagia, bem como do incesto, tam bern
aparece em Cortazar, ainda que apenas como urn plano anunciado
28
pelo narrador no principia, porem que indica em definitiv~ a mesma
ideia de "necesaria clausura de la genealogia asentada par los
bisabuelos en nuestra casa", e de destrui<;ao de urna linhagem
decadente.
Os personagens parecem ter bem definido, em ambos os
relatos, a influencia da casa e par sua vez, da longa descendencia
que a habitou em sua situac;:ao de isola mento, e provavetmente
tambem desse estado de "matrimonio de irmaos" em que vivem as
duas duplas.
o narrador de "Casa Tamada" manifesta ter tido, as vezes, a
ideda de que a casa nao as deixou se casarem, 0 que vern a ser urna
manifestac;:ao desse isolamento endogamico que as impedia de sair
de seu interior, freqOentar a sociedade. Assim, em boa medida, as
dais irmaos estao presos dentro da propria casa, da mesma forma
que estava Roderick, que tambem explicava essa situal(80 em
relal(80 com sua propria casa.
Alem disso, ao reconhecer 0 narrador de Cas a Tomada a
possivel influencia malefica da casa, ele esta apresentando-a como
uma personagem sinistra ao dizer que ela e 0 duplo da familia como
no caso do relato de Poe com os caracteres do duplo, duple da
familia e dos proprios personagens e portadora de influencias
maleficas, conforme en contra va Freud nessa classe de personagens.
Essa situal(80 de isolamento e de identifica980 dos irm80S com
a casa, os identifica com a longa linhagem em ambos os relatos,
resultando em uma relal(80 incestuosa que aparece so de forma
latente no conto de Cortazar e possivelmente consumada no de Poe.
Tal relal(80 incestuosa proporciona uma chave antropologica
que explica 0 isolamento dos irm80s, porem tambem apresenta uma
chave psicologica, po is 0 incesto aparece como desejo normal e
29
habitual nos primeiros estagios da vida do ser humano, que
evidentemente tern pelos membros de sua pr6pria familia, objeto de
seus primeiros desejos sexuais, assim como na infancia da
humanidade os membros do grupo se relacionavam sexualmente
entre si.
o progresso desse estado primitiv~ a Dutro mais avanc;ado,
como sucede com a crescimento do menino, leva a proibic;ao do
incesta em urn casa e a repressao psiquica do mesma, em Qutro,
produzindo, segundo FREUD (1973). elementos fundamentais do
psiquismo humano. Em ambos as casas, a incesta e substituido par
outro tipo de manifestac;ao. Pon3m no presente relata, a relac;ao
incestuQsa aparece apenas sugerida em varias ocasioes, como diz
JEAN L. ANDREAU (1968). nada aparece permitindo afirmar essa
relac;ao com certeza absoluta.
Oentro desta visao da situac;ao do relata pode-se propor a
hipotese de que os invasores que com tanta naturalidade vao
expulsando os dois irmaos da casa, nao sao na realidade, mais do
que 0 desejo incestuoso que emerge do profundo do inconsciente,
identificado com a parte mais subterranea desta casa-familia-
psiquismo, que vai emergindo ate a superficie da consciencia
identificada finalmente com 0 exterior da propria casa.
Tal ideia fica tambem confirmada porque a situac;ao e similar ao
relato de Poe, onde Roderick tenta reprimir seu desejo incestuoso
ocultando 0 objeto, sua propria irma, na parte mais profunda de sua
casa, numa tumba.
No entanto 0 desejo consegue emergir finalmente e lady
Madeline consegue abrir seu ataude, assim como a porta de ferro, e
subir as escadas ate a habitac;ao onde encontra-se Roderick, e
consumar 0 incesto em urn macabro abrac;o final, que vern a ter seu
30
paralelo no ge5to do narrador do conto de Cortazar de abra9ar Irene
pela cintura.
A personific8yao da casa e a autentica protagonista. 0 relato S8
inicia diretamente falando dela: "nos gustaba la casa porque aparte
de espaciosa y antigua .. "t com 0 que apresenta, alem disso, uma
primeira descriyao que continua no paragrafo seguinte, ao referir-se
novamente ao prazer que Ihes produz: "Nos fesultaba grato almorzar
pensando en la casa profunda y silenciosa .. ". A casa, que pareee
evidentemente proporcionar satisfayBo aos dais irmaos, eapresentada atraves de quatro caracterlsticas basicas, repartidas em
duas partes: espayosa e antiga primeiro, e mais adiante: profunda e
silenciosa.
Estes quatro adjetivos mostram uma relayao basica com a
mente humana. Em primeiro lugar sua antigOidade que, rna is
diretamente relacionada com a leitura antropol6gica, caracteriza a
relayao hist6rica com 0 ambito familiar, 0 qual emerge no psiquismo,
po is 0 proprio narrador dira que a casa "guardaba los recuerdos de
nuestros bisabuelos, el abuelo paterno, nuestros padres y toda la
infancia". Precisamente as lembranyas da infancia sao fundamentais
no feitio do carater, porquanto este se origina, sempre segundo
Freud, durante esses primeiros anos e em sua origem tomam parte
muito ativa nos desejos incestuosos.
Em seguida 0 narrador apresenta suas dimens6es, ou seja,
espayosa e profunda, que sao aplicaveis tambem a mente humana
caracterizada par uma amplitude que em grande medida ainda e
desconhecida.
E a ultimo adjetivo fundamental, como se pode ver, e quando
refere-se ao silencio, que tambem e uma manifestayao da
identifica9ao da casa com 0 psiquismo, pois segundo FREUD, 0
silencio frente ao ruido e precisamente a simbolizayao que se realiza
31
no relata para referir-se a repressao e it emergencia da repressao,
respectivamente.
o narrador continua com a ideia do incesta e da endogamia: "A
veces Ilegamos a creer que era ella la que no nos deja casarnos.
Irene rechaz6 dos pretendientes sin mayor motivD y a mi se me muri6
Maria Esther antes de que J1egaramos a comprometernos".
Posteriormente apresenta mais clara mente a situa~ao:
"Entramos en los cuarenta anos con la inexpresada idea de que el
nuestro, simple y silencioso matrimonio de hermanos era necesaria
clausura de 18 genealogia asentada par los bisabuelos en nuestra
casa",
o narrador ja nos da. algumas chaves. Ao falar de inexpresada
idea, situa urn circulo de pre-consciencia, e evidente a menc;ao aD
matrimonio de irmaos, que 0 narrador qualifica como silenc;oso.
E uma prova maior da identificayao dos personagens com a
casa, 0 sih~ncio foi destacado como atributo desta e, como se pode
ver, tambem se relaciona com a situa<;ao de repressao, em que os
impulsos permanecem amortecidos ou latentes, por otro lado, a ruido
sera a indicayao da emergencia do reprimido.
Tudo se estabelece todavia numa situa<;ao incestuosa
reprimida, au seja, matrimonio silencioso, e em um horizonte no qual
tal desejo e sua repressao e todavia inconsciente, veja-se:
inexpresada idea.
A influencia da casa sobre as irmaos vem, alem disso,
determinada pela dedica<;ao de que e objeto especial mente atraves
da limpeza que aparece quase como uma obsessao e que se pode
interpretar simbolicamente como referencia a repressao, isto e, da
necessidade de eliminar certos impulsos, como se elimina a
32
obscenidade, aqui identificada precisamente como uma poeira que,
par mais que se limpe, "despues se deposita de nuevo en los
muebles y los pianos".
Os dais irmaos nunca atravessam a porta de carvalho que
divide em duas a casa, exceto para realizar e5sa tarefa que pareee
ser a mais importante para eles: "nos resultaba grato almorzar
pensando en la casa profunda y silenciosa y como nos bastflbamos
para mantenerla limpia".
A repressao do desejo incestuoso se ve com claridade no fate
de que ambos irmaos, especialmente Irene, sublimam esse desejo
realizando Dutra atividade.
No relata de Poe, tambem Roderick manifestava uma sarie de
sublima<;oes artisticas que, segundo 0 narrador, eram caracteristicas
da linhagem, pois este "se habia destacado desde tiempos
inmemoriales par una peculiar sensibilidad de temperamento,
desplegada, a 10 largo de much os anos, en numerosas y elevadas
concepciones artisticas". Roderick toca violao, improvisa versos e
pinta, e nao e por uma casualidade que a poema mencionado par ele
se intitule tiEl palacio hechizado" nem tambem que pinte uma
profunda gruta, que e tam bern uma representayao de seu psiquismo e
vern a coincidir simbolicamente com a cripta na qual guardava a
suposto cadaver de sua irma.
No relata de Cortilzar a sublimayao e evidente no casa de
Irene, que se dedica a tecer 0 dia inteiro, e ele, que se entretem com
uma gaveta cheia de quinquilharias, chega a dizer: "no se par que
tejia tanto" (CORTAZAR,2001).
Na verdade, e evidente que Irene sublima assim a situayao
latente de incesto, pais Cortazar se refere a atividade de tecer como
forma de escape. Em sua familia as mulheres teciam muito, via isto
como uma maneira de escapar de sua propria inquietude. Escreveu
um poema chamado "Las tejedoras" em homenagem as mulheres de
33
sua familia. Parece claro que e urna Penelope que evita casar-se:
"Irene rechaz6 dos pretendlentes sin mayor motivo", sugerindo que
esperava a chegada do autentico, 0 qual no entanto resultou ser seu
proprio irmao.
Essa relaC;;3o com Penelope fica mais clara quando a narrador
comenta que "a veces tejia un chaleco y despues 10 destejia en un
momenta porque algo no Ie agradaba".
Certamente tambem esta presente a mito de Ariadne e Teseo,
po is em certa medida tambem a casa e um labirinto. E 0 labirinto e 0
melhor simbolo espacial para 0 proprio psiquismo. Alias, 0 tema
Ariadne e Teseo foi tratado por CORTAzAR (1985), em Los Reyes,
onde precisamente Ariadne e a Minotauro desenvolvem urn desejo
incestuoso.
[ ... ) S610 yo se. jEspanto, aleja esas alas pertinaces! jeedelugar a mi secreto amor, no calcines sus plumas con tantahorrible duda !iCede lugar a mi secreto amort iVen, hermano,Yen, amante al fin !i$urge de la profundidad que nunca osesalvar, asoma desde la hondura que mi amor ha derribado!iBrota asido al hila que te lleva el insensato! jDesnuda yrajo, vestido de sangre, emerge y Yen ami, oh hija dePasifae, yen a la hija de la reina, sedienta de tus belfosrumorosas (Cort.har, 1985,p.52).
o narrador de uCasa Tomada" parece $ublimar seus desejos
atraves da leitura de livros franceses. Parem a prova de que sua
sublimaC;ao e menor do que ele proprio pensa e que sabe que a cada
saida em busca de livros franceses nao vai encontrar nenhum, pais:
"desde 1939 no Ilegaba nada valioso a la Argentina".
Entretanto, nessas saidas comprava 121 para Irene que confiava
em seu bom gosto para escolhe-Ia, mostrando de sua parte falta de
vantade ou sua submissao it vontade do irmao. Portanto essas saidas
estao motivadas unicamente pela necessidade de obter a materia que
Ihes permitia sublimar seus desejos incestuosos.
34
Os quatro primeiros paragrafos constituern a primeira parte do
relato que se pode qualificar de introdut6ria e finaliza conforme a
maiaria das partes com uma especie de uma exclama9clo sentenciosa
it maneira de conclusao e resumindo, sobretudo, uma forma de
introduzir a subjetividade do narrador e dar ao relato normalidade e
habitualidade.
Esta primeira parte finaliza-se com um "era hermoso",
referindo-se a ver sua irma tricotar, que incide numa nostalgia de um
tempo perdido.
Porem, apes a primeira invasao da casa, 0 narrador concluira
com a maior naturalidade que 0 fa to de tricotar era a (mica
recorda,):8o que tinha it hora de recather-se, "A mi me gustaba ese
chaleco". Em outros fragmentos do relato conclui com um epifonema
(Conclus8o com uma exclamay80 de valor de sentenya significativa):
lise puede vivir sin pensar".
Apos a primeira parte introdutoria produz-se uma das pausas
descritivas das que antecedem as invas6es sucessivas da casa.
A primeira pausa e fundamental porque descreve a casa e eprecisamente aqui que se encontra a espacializayao do psiquismo,
que se produz entre a distribuiy80 da casa e 0 que se tem imaginado
do proprio psiquismo humano.
Cortazar descreve a casa com duas partes bem diferenciadas,
uma das quais e a do fundo, que e precisamente aquela que seus
habitantes nao utilizam, separada da parte frontal por uma espessa
porta de carvalho.
o espayo que Cortazar dedica a descreve-Ia e a prova maior da
importancia da casa num conto tao curto:
35
1... 1 Como no acordarme de la distribuci6n de la casa. EIcomedor. una sala con gobelinos, la biblioteca y tresdormitorios grandes quedaban en la parte mas retirada, la quemira hacia Rodriguez Peria. Sola mente un pas ilia con sumaciza puerta de rable aislaba esta parte del ala delanteradonde habia un baria, la coeina, nuestros dormitorios y elliving central, al cual comunicaban los dormitorios y el pasillo.Se entraba a la casa par un zaguan con mayolica , Y la puertacentral daba al living. De rnanera que uno entraba par elzaguan, abria la cancel y pasaba al living; tenia a los lad os laspuertas de nuestros dormitorios, y al frente del pasHia queconducia a la parte mas retirada; avanzando par el pas ilia sefranqueaba la puerta de roble y mas alia empezaba el otrolado de la casa, a bien se podia girar a la izquierda justamenteantes de la puerta y seguir par un pasillo mas estrecho queque lIevaba a la cocina y al bano. Cuando la puerta estabaabierta advertia uno que la casa era muy grande; 51 no, dabala impresion de un departamento de los que se edifican ahara,apenas para moverse; Irene y yo viv[amos siempre en estaparte de la casa, casi nunca ibamas mas alia de la puerta deroble, salvo para hacer la limpieza,.(Cortazar,2001, p.14).
o narrador, ah3m disso, afirma: "cuando la puerta estaba
abierta advertia uno que la casa era muy grande; si no, dab a la
impresi6n de un departamento de los que se edifican ahora"; ou seja,
diz que a espac;o em que eles realmente ocupam e muito pequeno,
este espat;io simboliza a mente, representando 0 processo de
estreitamento pSiquico dos personagens.
Na segunda parte do relato acontecera a primeira invasao da
casa. Nao e por acaso que a invasao se da a noite, porque epeculiarmente nesse periodo que 0 ruldo tern maior importancia,
pais, como 0 narrador dira mais adiante, "de noche se escuchaba
cualquier cosa en la casa". Sabido e que na leoria de FREUD (1973),
a censura torna-se mais fragil durante 0 sono que geralmente tern
lugar de noite, permitindo a comunicac;ao entre 0 inconsciente e 0
pre-consciente.
Tambem nao e por acaso que h<i por parle dele um repenlino
desejo de beber, islo e, "sede", pois como se bem sabe, a "sede" e
36
urn dos simbolos mais claros do desejo sexual no mundo do
psiquismo e especialmente nas representac;oes oniricas.
Assim S8 produz uma estranha relac;ao entre a repentino desejo
de beber por parte dele: "de repente se me ocurrio poner al fuego la
pavita de mate"; e a invasao da casa, relac;ao que voltara a repetir-se
na segunda vez.
Frente ao sih3ncio caracteristico da casa e de seus habitantes,
o unice sintoma de que a casa esta sendo "tamada" e 0 fuida: "Desde
la puerta del dormitorio (ella tejia) oi ruido en la cocina ( .. ). Nos
quedamos escuchando los ruidos ..
A primeira parte que invadem e a parte do fundo e ele chega a
tempo de impedir um maior avan90, fechando a porta de carvalho.E
espantoso a total naturalidade com que as personagens vivem este
acontecimento, po is apos fechar a porta ele retoma sua intenc;ao
inieial: "fui a la cocina, calente la pavita.. e conclui com uma
exclamac;ao a descriC;ao desse momento: "A mi me gustaba ese
chaleco" .
Na verdade, trata-se de uma naturalidade que ate pode chocar
o leitor espectador exterior, porque aparece como norma dos
personagens algo assim como a naturalidade com que em um sonho
se vive as coisas mais estranhas.
De fato, 0 acontecido foi tao somente 0 emergir dos sonhos de
um desejo incestuoso e, fechando a porta de carvalho, poder apenas
pensar tranqOilamente em continuar com sua vida, "calentar la pavita
de mate y vivir sin pensar".
De fato, 0 proprio Cortazar explica este conto como nascido de
um pesadelo que teve:
37
[ ... ] Es uno de mis cuentos mas oniricos. Yo sone noexactamente el cuento sino la situacion del cuento. Alii no habianada incestuoso. Yo estaba solo en una cas a muy extrana conpasillas y codas y todo era muy normal, ya no me acuerdo de 10que estaba hacienda en mi suelio. En un momento dado desde elfondo de uno de los codas 5e cia un fuida muy claramente y esoera ya la sensaci6n de pesadilla. Habia algo alii que me producfaun terror como s610 en las pesadillas. Entonces yo me precipitabaa cerrar la puerta y a poner todos los cerrojos para dejar laamenaza de otro lado. Y entenees durante un minuto me sentitranquillo y parecia que la pesadilla volvia a convertirse en unsuerio pacifico. Pero entenees de este lado de la puerta empez6de nuevo la sensaci6n de miedo. Me desperte con la sensaci6n deangustia de la pesadilla. Ahora, despertarme equivalia a serdefinitivamente expulsado del suerio mismo. Entonces me acuerdomuy bien que tal como estaba en pijama y sin lavarme los dientesni peinarme, me fui a la maquina y en una hora -es muy corto elcuento-, una hora y media estuvo escrito. Por razones tecnicasnacieron los dos hermanos y se organiz6 todo el contenido delcuento [ ... 1 para mi no tiene absolutamente ningun contexto deninguna naturaleza salvo la pesadilla. Eso no impide que mipesadilla es la que hay que analizar. (Garfield, 1978, p. 89)
De acordo com TODOROV (1972), esla alilude dos personagens
e fundamental para comprovar a forma com que Cortazar entende 0
fantastico de forma diferente de Poe, e se assimila com uma corrente
rna is moderna que se inicia com La Mefamorfosis de Kafka e que tern
mais a ver com a logica dos sonhos que com a realidade.
A angustia do leitor cresce justamente pelo contraste entre a
forma que 0 personagem entende a que acontece como sinistro e a
forma natural com que eles vivem. Em certa medida tam bern tudo
teria a ver com a condic;;:ao exposta por Freud de que a sinistro e urn
alga lao familiar que jil nao assusla pelo simples falo de sa-Io. S6
que nas obras neofant8sticas isso tern acontecido apenas para a
leitor, posta que as personagens vivem com total normalidade.
Em qualquer caso do sinistro, tal como em Poe, tem-se dado
par espac;;:o a casa que, segundo as riscos que Freud enumera,
aparece tam bern como 0 morto que pareee vivo, a inanimado Que
atua como animado.
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No referente ao plural usado pelo narrador de "Casa Tomada'"
"han tornado la parte del fonda", deve-s8 entender como urn plural
impessoal que refere-s8 algo indefinido que evidentemente
aumenta ainda mais a expectativa do relato.
Uma leitura rnais superficial mostraria que quem havia invadido
a casa seriam seres sobrenaturais, como: os ancestrais dos dais
irmaos, cujos espiritos VaG assenhorando-se da casa para talvez
evitar a designio anunciado pelos dais irmaos no inicio do relato de
destrui-Ia antes que morram. Neste senti do cabe recordar a
referenda inicial de que a casa continha "/os recuerdos de nuestros
bisabuelos, el abuelo paterno,.
Evidentemente tal interpreta9aO, como muitas Qutras, e valida e
tern relaC;;ao com 0 relato, porem igualmente parece que e possivel
uma leitura em que esses invasores inominados e inominaveis nao
sejam tao somente 0 reprimido, ou seja, 0 desejo incestuoso que vai
pouco a pouco escapando do inconsciente e tentando fluir aconsciencia.
Multiplas sao as interpretac;;6es possiveis como e pr6prio da
obra cortazariana. Alias, como em Kafka, ha urn principio fundado na
incerteza que funciona como principio estruturador do relato. Alem
disso se consegue tambern dotar a obra da mesma ambigOidade das
manifestac;;6es do psiquismo.
Entretanto, seguindo a comparaC;;ao entre "Casa Tomada" e a
obra de Poe, vemos que neste se produz uma situa9B:o similar,
representada pela irma emergindo da tumba prisional descerrando 0
proprio feretro e abrindo a porta de ferro maci90 ate as habitac;;6es
altas da casa, onde morre abrac;;ada a seu irmao. No relato de
Cortazar, a porta de carvalho, uma vez traspassada, significa 0
passo ao pre-consciente, enquanto atravessar a segunda porta ja
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significa 0 passo a consciencia exterior, simbolizada pela saida a rua
par parte dos dais irmaos, abrac;ados.
Ap6s a primeira invasao, 0 relato descreve como era a vida dos
dais irmaos, e mesmo com a perda de alguns objetos mais au menes
queridos, a situac;ao nao parece preocupa-los demasiadamente, nem
alterar sua forma de vida, inclusive conseguem encontrar vantagens,
pois "Ia limpieza S8 simplifie6" consideravelmente.
Os dais irmaos parecem seguir vivendo em urn certo estado de
inconsciencia, como diz 0 proprio narrador no esclarecimento final
desta parte: "estabamos bien, Y poco a poco empezabamos a no
pensar. Se puede vi vir sin pensar". Talvez esse desejo de nao pensar
S8 deva a proximidade, urn tanto quanta perigosa, do reprimida
af/aranda do pre-consciente ao consciente com uma velocidade
alarmante.
Iniciando a segunda pausa que divide navamente a relata e da
lugar a terceira e ultima parte em que se praduz a segunda e ultima
acupa9aa da casa, nata-se que essas divisoes tipograficamente
marcadas par espayas em branca articulam par sua vez a relata em
tres partes separadas par pausas descritivas: a descriC;8:a da casa
em primeira lugar depois a descric;ao da vida cotidiana apesar da
primeira acupac;aa e agora a descric;ao das noites dos dois irmaos.
Estas tres partes padem ser associadas igualmente ao
inconsciente, pre-consciente e consciente. Dessa forma, mente, cas a
e a proprio relato se constraem de forma para lela.
Nessa interrupc;ao descritiva, encantra-se tam bern 0 mundo
inconsciente no casa dos sonhos, pais Irene "sofiaba en alta voz".
Refere-se igualmente a "los mutuos y frecuentes insamnias" e a que
"de noche se escuchaba cualquier casa en la casa".
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Portanto, a naite a reprimido aflora atraves dos sonhos que S8
manifestam em ruidos que, como jil vista, representam a emergencia
do reprimido. No casa de Irene manifesta-se at raves de sua fala
durante 0 dormir e isso precisamente provoca mutuas e freqOentes
insonias. A naite e 0 ambito do reprimido que aflui, 0 narrador insiste
na presenc;:a dos ruidos: "de nache S8 escuchaba cualquier cosa en la
casa".
Pode-s8 perceber aqui uma insinua980 de que a relac;:ao entre
os irmaos podia nac ser simplesmente fraterna e a encontramos em
urn comentario do proprio narrador a respeito dos son has: "Irene
decia que mis suenos consistian en grandes sacudones que a veces
hac;a caer el cobertor." Ora, dado que os dais irmaos dormiam em
quartos diferentes, a (lnica forma de que Irene soubesse das quedas
do cobertor era vendo- o.
A terceira parte e a definitiva invasao da casa. E nova mente se
da a noite, menciona-se a sede e a re/agao entre ambas: "De noche
siento sed", relembrando a referencia aos mutuos e frequentes
ataques de ins6nia.
A sede e a noite voltam a marcar a inicio da invasao da casa
que se manifesta atraves de ruidoso Mas desta vez a porta de
carvalho ja foi atravessada, portanto, 0 reprimido ja esta em urn nivel
p re-consciente.
No entanto, ao contrario do relata de Poe, onde se da a
destruigao da casa e da /inhagem, Cortazar produz uma diferenga, ou
seja, a aceitagao da situagao ou ao menos uma resignagao a ela.
A casa acaba por expulsar as dais irmaos ou, par outro lado, a
reprimido emerge ao exterior. Quer dizer, a consciencia representada
pela rua os arrebata, send a portanto a representaC;8o do emergir do
mais profundo do psiquismo.
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3 CONCLUsAo
Lendo "A Casa Tomada" de Julio Cortazar S8 conclui que
invasao em nenhum momenta nos e exp/icada de forma
convincente. Pois e somente at raves de ruidos que 0 narrador
identifica a presenrya de "invasores"
o silencio permite uma reflexao, no caso deles "perigosa",
pois poderiam descobrir uma realidade indeseji'IVel, como par
exemplo viver urn incesto, procuram fugir da realidade, desta forma
optam par naa pensar.
A repressao do desejo incestuoso se ve claramente no fa to
de que ambos as irmaos, especialmente Irene, sub/1mam esse desejo
realizando Dutra atividade e deixam transparecer uma falsa alegria e
felicidade.
Ve-se que a sensac;:ao de emergir dos son has incestuosos
se de. quando fecha a primeira porta de carvalho, que uma vez
traspassada, significa a passo ao pre-consciente, enquanto
atravessar a segunda porta ja significa 0 passo a consciencia
exterior. 0 reprimido emerge ao exterior quando a casa as expulsa
para a rua representando a emergir do psiquismo.
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