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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI CLARISSA SOUZA PALOMEQUÉ URBANO DIÁLOGOS ENTRE ECOLOGIA, ARTE E DESIGN DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU São Paulo, Março/ 2011

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI

CLARISSA SOUZA PALOMEQUÉ URBANO

DIÁLOGOS ENTRE ECOLOGIA, ARTE E DESIGN

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

MESTRADO EM DESIGN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

São Paulo, Março/ 2011

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CLARISSA SOUZA PALOMEQUÉ URBANO

DIÁLOGOS ENTRE ECOLOGIA, ARTE E DESIGN

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design.

Orientadora: Profª. Dra. Ana Mae Barbosa

São Paulo, Março/2011

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CLARISSA SOUZA PALOMEQUÉ URBANO

DIÁLOGOS ENTRE ECOLOGIA, ARTE E DESIGN

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design. Aprovada pela seguinte Banca Examinadora: Profª. Dra. Ana Mae Barbosa

Orientadora Universidade Anhembi Morumbi Profª. Dra. Gisela Belluzzo

Avaliador Interno Universidade Anhembi Morumbi Profª. Dra. Lilian Amaral

Avaliador Externo Universidade do Estado de São Paulo - UNESP

São Paulo, Março/2011

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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização da Universidade, do autor e do orientador.

CLARISSA SOUZA PALOMEQUÉ URBANO Graduada em Educação artística (2008). Atualmente, é professora do Ensino Fundamental no município de Canas.

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À toda a minha família, pelo carinho,

incentivo e compreensão.

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AGRADECIMENTOS

À minha querida orientadora, Prof. Dra. Ana Mae Barbosa, que ao longo dessa trajetória sempre teve uma palavra de incentivo. Obrigada pela paciência e dedicação, e acima de tudo, por partilhar seu conhecimento e sabedoria.

Aos professores do programa de Mestrado pelos diálogos tão produtivos e cruciais para minha formação.

À assistente de coordenação do Mestrado em Design Antonia Costa, por seu carinho com todos.

Aos colegas do Mestrado que foram responsáveis por muitos momentos de alegria e também muitas risadas.

A direção e coordenação da Escola Municipal João Nery Marton, por possibilitar a minha pesquisa se tornar realidade.

Aos meus alunos, que todo o dia me ensinam sobre a vida e o ser humano.

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RESUMO

Esta pesquisa visa promover a educação ambiental e a conscientização acerca da necessidade de melhorar a interação entre o homem e o meio ambiente, através da investigação de estratégias educativas, por meio de leitura de imagens do cotidiano, de campo dos sentidos e de objetos de Design e de Arte, e através da leitura destas imagens, levantar questões, discutir, e orientar sobre problemas ambientais que fazem parte do cotidiano, contextualizando as mesmas e buscando valorizar a cultura e os hábitos locais, e principalmente possibilitar ao educando pensar e refletir sobre o ambiente ao seu redor, formando cidadãos aptos a interagir com o mundo de forma crítica e consciente.

Palavras-chave: design, arte, ecologia, leitura da imagens

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ABSTRACT

This research aims to promote environmental education and awareness about the need to improve the interaction between man and environment through research strategies for education, through reading the daily pictures, the field of the senses and objects of design and Art, and by reading these files, ask questions, discuss, and advise on environmental issues that are part of everyday life, contextualizing them with their daily lives and attempt to value the culture and local customs, and especially to enable the student to think and reflect on the environment around them, forming citizens who are able to interact with the world in a critical and conscious.

Key words: design, art, ecology, image reading.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 . Vista aérea da cidade de Canas. ............................................................... 26

Figura 02. Imagem de satélite da cidade de Canas. .................................................... 27

Figura 03 . P. (6 anos) com seu desenho ..................................................................... .....................................................................................................................................

29

Figura 04. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. .............. 32

Figura 05. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. .............. 32

Figura 06. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008 ............... 33

Figura 07 . Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008 ............... .....................................................................................................................................

33

Figura 08 . Manet, Edouard. Le déjeuner sur l'herbe, 1863 óleo sobre tela. Dimensões A: 2.08. .........................................................................................................................

34

Figura 09. Ringgold, Faith. Tar Beach,1988. Acrílico sobre tela, tecido tingido e bordado. .......................................................................................................................

35

Figura 10. Cadeira Favela, Irmãos Campana. .............................................................. 36

Figura 11 . Turma do terceiro ano durante a aula de frotagem. ..................................... 40

Figura 12. Aula de frotagem com a turma do quarto ano. ............................................ 40

Figura 13. Alunos do quarto ano durante a aula de frotagem. ...................................... 41

Figura 14. Alunos do quinto ano durante a aula de frotagem. ..................................... 41

Figura 15. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. .............. 42

Figura 16. Modelo das mochilas criadas por Jum Nakao. ............................................ 43

Figura 17: Modelo das mochilas criadas por Jum Nakao. ............................................ 43

Figuras 18, 19 e 20. Momento do “fazer artístico”. ....................................................... 45

Figura 21. Aluno do segundo ano mostrando sua interpretação da obra de Srur. ........ 50

Figuras 22 e 23. Interpretações de alunos do segundo ano da instalação PETS. ........ 50

Figura 24. Desenho de aluno do segundo ano. ............................................................ 51

Figura 25. Alunos do segundo ano trabalhando na confecção dos brinquedos. ........... 52

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Figura 26. Alunos do segundo ano. .............................................................................. 53

Figuras 27 e 28. Alunos do segundo ano. .................................................................... 53

Figura 29. Alunos do terceiro ano. ............................................................................... 54

Figuras 30 e 31. Alunos do terceiro ano............ .............................................. 54

Figura 32. Alunos do quarto ano. ................................................................................. 55

Figuras 33, 34, 35, 36 e 37 . Alunos do quinto ano. ...................................................... 56

Figura 38. Manet, Edouard. Le déjeuner sur l'herbe, 1863 óleo sobre tela Dimensões A: 2.08 ; L. 2.645 ; Musée d'Orsay, Paris, França. ...............................................................

57

Figura 39. Pessoas fugindo de um dinossauro, desenho de aluno do segundo ano. ... 58

Figura 40. Floresta com um vulcão, desenho de aluno do terceiro ano. ....................... 59

Figura 41. Fazenda, desenho de aluno do quarto ano. ................................................ 59

Figura 42. Fazenda, desenho de aluno do quarto ano ................................................ 60

Figura 43. Plantação de cana, desenho de aluno do quinto ano. ................................. 60

Figura 44. Uma casinha sem nada em volta, só a natureza. Aluno do quinto ano. ....... 61

Figura 45. “Uma cidade com prédios e quem sabe até com elevador”. ........................ 61

Figura 46. Desenho de como será a cidade no futuro. ................................................. 62

Figura 47. Desenho de como será a cidade no futuro. ................................................. 62

Figura 48. desenho de como será a cidade no futuro. .................................................. 63

Figura 49. Biblioteca Pública Municipal de Canas. ....................................................... 64

Figura 50. Alunos do quinto ano a caminho da visitação na fábrica de cerâmica. ........ 66

Figura 51. Chegada na fábrica de tijolos. ..................................................................... 66

Figura 52. Alunos durante a visita na fábrica de tijolos. ................................................ 67

Figura 53. Tocando os tijolos recém moldados. ........................................................... 67

Figura 54. Tocando os tijolos recém moldados. ........................................................... 68

Figura 55 . recolhendo argila para a escola. ................................................................. 68

Figura 56. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. ................... 70

Figura 57. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. ................... 70

Figura 58. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. ................... 71

Figura 59. “A moça hoje ia poder sentar sozinha, só que na cidade”. .......................... 72

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Figura 60. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quinto ano. ................... 73

Figura 61. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quinto ano. ................... 73

Figura 62. “Se fosse hoje, um deles ia ter um laptop na mão”. ..................................... 74

Figura 63. (Le déjeuner sur l'herbe), de Édouard Manet, interpretado pelo grupo Wifipicnic project em Provence, France, data desconhecida. ........................................

76

Figura 64. Le déjeuner sur l’herbe Interpretação de Pablo Picasso, 1960. ................... 76

Figura 65. Capa do disco da banda inglesa Bow Wow Wow (1981). ............................ 77

Figura 66. Interpretação do artista Americano Bob Kessel, data desconhecida. .......... 77

Figura 67. Personagens da saga Star Wars, de Philip Bond, 2009. ............................. 78

Figura 68. Interpretação do artista turco Bedry Baykam. .............................................. 78

Figura 69. Interpretação do artista chinês Yue Minjun, 1995. ....................................... 79

Figura 70. Alunos do quinto ano como uma “banda de rock”. ...................................... 79

Figura 71. Alunas do quinto ano como “pop stars”. ...................................................... 80

Figura 72. Alunos do quinto ano “como a gente é”. ...................................................... 80

Figura 73. Alunos do quinto ano como “a gente mesmo”. ............................................ 81

Figura 74. Alunos trabalhando com argila. ................................................................... 81

Figura 75. Aluno trabalhando com argila. ..................................................................... 82

Figura 76. Aluna trabalhando com argila. ..................................................................... 82

Figura 77. Alunos trabalhando com argila. ................................................................... 83

Figura 78. Alunos trabalhando com argila. ................................................................... 83

Figura 79. Alunos trabalhando com argila. ................................................................... 84

Figura 80. Alunos trabalhando com argila. ................................................................... 84

Figura 81. Interpretação em argila dos alunos do quinto ano. ...................................... 85

Figura 82. Interpretação em argila dos alunos do quinto ano. ...................................... 85

Figura 83. Interpretação em argila de Le déjeuner sur l'herbede de alunos do quarto ano. ..............................................................................................................................

86

Figura 84. Interpretação em argila de Le déjeuner sur l'herbede de alunos do quarto ano. ..............................................................................................................................

86

Figura 85. Interpretação dos alunos do quarto ano de Le Dejeuner sur l’herb. ................. 87

Figura 86 . Ringgold, Faith. Tar Beach,1988. Acrílico sobre tela, tecido tingido e bordado. .......................................................................................................................

88

Figura 87. Alunos do quarto ano no momento do “fazer”. ............................................ 90

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Figura 88. Alunos do quarto ano no momento do “fazer”. ............................................ 90

Figura 89. Alunos do quinto ano trabalhando com a obra de Faith Rinngold. ............... 91

Figura 90. Alunos do quinto ano trabalhando com a obra de Faith Rinngold ................ 91

Figura 91. Alunos do quinto ano................................................................................... 92

Figura 92. Alunos do quinto ano................................................................................... 92

Figura 93. Vista aérea da cidade em tecido (trabalho de aluno do quinto ano). ........... 93

Figura 94. Interpretação da obra de Faith Ringgold. .................................................... 93

Figura 95. Interpretações de alunos do quarto ano da obra de Faith Ringgold............. 94

Figura 96. Interpretações de alunos do quarto ano da obra de Faith Ringgold............. 94

Figura 97. Trabalhos de alunos do quinto ano. ............................................................ 95

Figura 98. Trabalhos de alunos do quinto ano. ............................................................ 95

Figura 99. Trabalhos de alunos do quinto ano ............................................................. 96

Figura 100. Trabalhos de alunos do quinto ano. .......................................................... 96

Figura 101. Trabalhos de alunos do quarto ano. .......................................................... 97

Figura 102. Trabalhos de alunos do quarto ano. .......................................................... 97

Figura 103. Cadeira Favela, Irmãos Campana. ............................................................ 98

Figura 104. Projeto de cadeira em palha e madeira. “Precisa de bastante palha seca e madeira. Não pode estar molhado”. ...........................................................................

101

Figura 105. Projeto de cadeira confeccionada em corda, bambu e arame. .................. 101

Figura 106. Projeto de cadeira confeceionada em bambu. .......................................... 102

Figura 107. Projeto em cadeira confeccionada em metal. ............................................ 102

Figuras 108, 109 e 110. Alunos do quinto ano projetando suas cadeiras. .................... 103

Figura 111. Esboço de uma cadeira confeccionada com garrafas pet. ........................ 103

Figuras 112, 113, 114 e 115. Alunos mostrando seus trabalhos. ................................. 105

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SUMÁRIO

RESUMO.......................................................................................................................... 6

ABSTRACT ...................................................................................................................... 7

LISTA DE ILUSTRAÇÕES .............................. ................................................................ 8

INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 13

1 LEITURA DE IMAGENS E OBJETOS DO DESIGN E DA ARTE .............................. 23

2 A CIDADE E O MUNDO DE MEUS ALUNOS ............... ............................................. 26

3 ESTÉTICA RELACIONAL E A/R/TOGRAFIA .............. .............................................. 37

4 LEITURA DAS IMAGENS ............................. .............................................................. 42

4.1 PETS, Eduardo Srur ................................................................................................. 42

4.2 LE DÉJEUNER SUR L'HERBE, EDOUARD MANET ............................................... 58

4.3 TAR BEACH, FAITH RINGGOLD ............................................................................ 89

4.4 CADEIRA FAVELA, IRMÃOS CAMPANA ................................................................ 99

RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS ................. ........................................... 105

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................ .................................................... 107

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INTRODUÇÃO

Sou professora de Arte nas Escolas de Canas, cidade em que existem três

escolas públicas municipais, uma de educação Infantil, e duas de ensino fundamental.

Dou as aulas de Artes de todas as três escolas.

O objetivo maior quando iniciei esta pesquisa era introduzir a Educação

Ambiental e o Design na sala de aula, especificamente durante as aulas de Arte. Tanto

os problemas ambientais quanto o design fazem parte do cotidiano das pessoas,

independente da situação econômica, cultural ou social em que vivem

A pesquisa foi feita apenas com as crianças do ciclo I do Ensino Fundamental

(alunos do 2º ao 5º ano), Cheguei à conclusão de que estimularia melhor a consciência

de meus alunos para a importância do respeito ao meio em que vivem se explorasse a

construção do conhecimento de maneira mais lúdica levando em conta a imaginação e

a produção de imagens. A leitura de imagens e objetos, a contextualização e a

produção de imagens foram realizadas de forma dialogal e lúdica. Embora a palavra

lúdico faça referência a jogos e brincadeiras, o seu uso no processo pedagógico deu-

lhe novos significados. O lúdico na aprendizagem faz referência a cognição, a

construção de conhecimento através da contextualização entre o brincar, o imaginário e

o real. A ludicidade é uma característica inerente ao ser humano e caracteriza-se por

sua espontaneidade, embora na grande maioria das vezes seja ligada a infância, é algo

presente durante toda a vida do ser humano. Segundo o professor e pesquisador

Cipriano Luckesi, coordenador do Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e

Ludicidade (GEPEL), ligado ao Programa de Pós-Graduação em Educação dos cursos

de Mestrado e Doutorado da Faculdade de Educação da Universidade Federal da

Bahia em seu texto “Ludicidade e atividades lúdicas: uma abordagem a partir da

experiência interna” publicado em 2005, ludicidade é um fenômeno interno do sujeito,

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que possui manifestações no exterior, e há ludicidade nas atividades da criança, do

adolescente e do adulto. São experiências lúdicas, mas tendo por base atos diferentes.

O que permanece é o estado interno de alegria, de realização, de experiência plena. O

ser humano se desenvolve e, com o desenvolvimento, os objetos de ludicidade vão se

modificando, o que não quer dizer que um adulto não possa nem deva, um dia,

experimentar novamente brinquedos de sua infância. Pensei também na ludicidade

presente no Design contemporâneo, que tem como uma de suas características o

Design voltado ao lúdico, com produtos destinados ao público adulto, como por

exemplo, os trabalhos presentes na 9ª Bienal Brasileira de Design Gráfico de São Paulo

de 2009, War in Rio (um jogo de tabuleiro que faz alusão a um conhecido jogo de

estratégia, e que faz severas críticas sociais a respeito da violência na cidade do Rio de

Janeiro), do designer Fábio Lopes ou os flyer Mapa Digital, da agência Designlândia,

que depois de dobrados se transformam em toyart. Pode-se citar também o Colar

Gude, de Mana Bernardes, que são colar e brincos feitos com bolas de gude, e o

vestido Maria, criado por Ronaldo Fraga, estampado com bolachas Maria, ambos

presentes na exposição Design brasileiro hoje: fronteiras, exposta no Museu de Arte

Moderna também em São Paulo no mesmo ano.

Conclui que este poderia ser um meio facilitador de aproximação com os

educandos, independente da idade.

Quando comecei a trabalhar com a primeira imagem, (PETS, de Eduardo Srur)

tomei conhecimento de que alguns pais trabalhavam como catadores, foi então que

percebi que o trabalho tomaria um novo rumo, que embora eu soubesse que ao longo

de minha pesquisa teria que “visitar”, não imaginava que faria uma parte tão grande da

jornada: a valorização dos alunos como cidadãos, como seres humanos, e também a

descoberta da sua cidade.

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Educação Ambiental

A crescente preocupação com os danos causados ao meio ambiente pela ação

humana faz com que o homem comece a procurar iniciativas criativas e inovadoras

para solucionar as questões do presente e também inevitáveis problemas que virão em

um futuro próximo. Cabe a nós encontrarmos novos caminhos e soluções destes

problemas, rumo à sustentabilidade. Existem diferentes definições para

sustentabilidade. Uma delas é que sustentabilidade é um conceito sistêmico,

relacionado com a continuidade dos aspectos econômicos, sociais, culturais e

ambientais da sociedade humana. De acordo com Vera Rodrigues,

uma sociedade sustentável pode ser definida como a que vive e se desenvolve integrada à natureza, considerando-a um bem comum. Respeita a diversidade biológica e sociocultural da vida. Está centrada no pleno exercício responsável e consequentemente da cidadania, com a distribuição equitativa da riqueza que gera. Não utiliza mais do que pode ser renovado e favorece condições dignas de vida para as gerações atuais e futuras (RODRIGUES, 1997, p. 159).

Assim como a sustentabilidade, a conscientização ambiental é uma questão da

qual depende a sobrevivência e o bem estar da espécie humana. É importante ressaltar

que Educação Ambiental ou Conscientização Ambiental como prefiro chamar, não quer

dizer formação de ativistas ecológicos ou “eco xiitas”, mas, sim de cidadãos conscientes

da importância das suas ações e do impacto que essas podem causar ao meio

ambiente que os cercam, e principalmente que consequências suas atitudes

desencadearão. Para Mauro Guimarães, a questão ambiental incorpora, na concepção

de educação, a preocupação com a qualidade ambiental, entendendo ambiente como

meio biótico e abiótico com relações de interdependência que propiciam o

desenvolvimento e a qualidade de vida dos seres humanos. De acordo com Isabel

Cristina de Moura Carvalho, os problemas ambientais não são apenas questões ligadas

à natureza é de âmbito social.

A visão sócio ambiental orienta-se por uma racionalidade complexa e interdisciplinar e pensa o meio ambiente não como

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sinônimo de natureza intocada, mas como um campo de interações entre a cultura, a sociedade e a base física e biológica dos processos vitais, no qual todos os termos dessa relação se modificam dinâmica e mutuamente (CARVALHO, 2004, p.37).

Ainda segundo Isabel Carvalho, um dos objetivos de uma educação ambiental

crítica é construir processos de aprendizagem significativa, que conecte experiências e

repertórios já existentes com questões e outras experiências, gerando assim novos

conceitos e significados de compreensão de mundo. Esse também é um dos objetivos

do ensino de Arte. De acordo com Ana Mae Barbosa,

por meio da Arte é possível desenvolver a percepção e a imaginação para apreender a realidade do meio ambiente, desenvolver a capacidade crítica, permitindo analisar a realidade percebida e desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi analisada (BARBOSA, 2008, p.16).

A Arte a partir da década de 70 começou a chamar atenção para os problemas

do mundo, entre eles a questão ambiental. Em Tópicos Utópicos, Ana Mae Barbosa

relata a sua experiência no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São

Paulo (MAC) entre os anos de 1987 a 1993, período em que o museu esteve voltado

para os estudos e questões ambientais, através de programas educativos para

professores e alunos, que incluíam debates, simpósios e exposições. A Secretaria

Municipal de Educação de São Paulo desenvolveu um projeto em que os alunos

escolhiam qual programa gostariam de fazer durante as férias escolares. Os alunos

escolheram visitar o museu. Durante estas visitas, os alunos observaram árvores,

visitaram exposições e tiveram a oportunidade de participar de uma instalação coletiva

com o artista Octavio Roth, na qual os alunos pintavam as folhas da imagem de uma

árvore, dando a eles a oportunidade não só de observar, mas também de produzir arte.

Segundo Ana Mae Barbosa “em um único dia, as crianças experimentaram o processo

de representação em sua globalidade, desde a observação do mundo fenomênico até a

apreciação de arte abstrata, passando pela produção de imagens figurativas”

(BARBOSA, 1998, p.119). No mesmo livro, a autora também fala de importância dos

arte educadores na promoção do despertar a consciência de seus alunos para as

questões do meio ambiente.

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O trabalho dos arte educadores no sentido de despertar a consciência para o meio ambiente não é menos importante. Temos que nos aliar a outros especialistas – sociólogos, ecologistas, cientistas, geógrafos, bem como arquitetos, urbanistas, comunicadores, psicólogos sociais e antropólogos – na luta em busca do equilíbrio entre preservação e desenvolvimento, que conduz a uma melhor qualidade de vida e do meio ambiente natural (BARBOSA, 1998, p. 116).

Quando falamos em meio ambiente, é preciso salientar que os problemas

ambientais não estão presentes apenas nas florestas, mas também nas cidades onde

vivemos; O meio ambiente de cada um difere de um lugar para outro, de uma pessoa

para outra, é preciso esclarecer que cuidar do meio ambiente ou do planeta não se

resume apenas a evitar a derrubada de árvores, mas sim ter consciência dos atos do

nosso cotidiano, tomar atitudes como não descartar o óleo de cozinha no ralo,

economizar energia ou separar o lixo são pequenas atitudes que fazem diferença.

Existem várias perguntas relacionadas ao meio ambiente que podem ser feitas,

como por exemplo, a respeito da qualidade do ar, se existe tratamento de esgoto, ou se

o lixo é recolhido sempre ou reaproveitado. De acordo com Rodrigues, a educação

ambiental deve possibilitar que sejam estabelecidas ligações entre economia, política,

ecologia e vida social, e assim estimular a construção de novos conhecimentos. ”Não

basta que se cultive a vontade de preservar os elementos naturais. É preciso querer

também melhorar os elementos sócio ambientais” (RODRIGUES, 1997, p.162).

Embora a preocupação com o meio ambiente e os problemas originários do

descarte da população das cidades pareça ser um assunto atual, essas questões são

antigas, pode-se citar como exemplo os primeiros depósitos de lixo fora das cidades na

Grécia antiga ou os “trous punais” (ou buracos fétidos) criados na França do século XIII.

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Arte, Design e Imagens

A importância das áreas de Arte e Design e sua interdisciplinaridade como

participantes da consciência ecológica já foram estudadas por Eileen Adams no projeto

“Aprendendo a ver”, que pesquisou a experiência ambiental em escolas, e através

dessas experiências trabalhava o conhecimento estético e de design, a capacidade de

julgamento estático e as “habilidades de design” (dar forma ao ambiente e lidar com

mudanças), e buscava relacionar aspectos da estética e do design com a questão do

meio ambiente.

Segundo Meira, não é mais possível pensar-se em uma educação para a

cidadania, ou em uma educação que assuma a função de construir cidadãos, sem a

garantia de uma educação estético visual.

A presença de um mundo imaginal se constituindo na sociedade, o fato de o estético representar o universo das imagens que adjetivam qualitativamente tudo o que se apresenta ao olhar criam a demanda de uma educação visual e sua configuração dentro dos currículos escolares como uma área específica e fundamental do conhecimento. (MEIRA, 2004, p. 136)

Em seu trabalho, Rossi (2003) parte do princípio de que a leitura de imagens

deve levar em consideração o desenvolvimento de cada indivíduo e a familiaridade do

leitor com as imagens a serem lidas. Para comprovar a importância da familiaridade

entre leitor e imagem, em suas pesquisas, a autora não utiliza apenas obras de arte, ela

utiliza também imagens de campanhas publicitárias, rótulos, embalagens, enfim

imagens do cotidiano. De acordo com a autora, a leitura de imagens feita hoje não dá

aos alunos a oportunidade de contextualizar as mesmas com a sua vida, impedindo

assim que os leitores construam relações das imagens com o seu cotidiano. Ainda

segundo Rossi, as abordagens formalistas que reduzem a leitura estética à percepção

dos elementos e princípios da composição, que se interessam apenas por itens como a

organização ou o estilo da obra, têm-se mostrado ineficientes para proporcionar a

alfabetização visual. Em seus estudos Rossi busca comprovar que as experiências

adquiridas pelos alunos em sua vida cotidiana é que forneceriam embasamento e

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ajudariam os mesmos a formar uma ligação entre a imagem e o mundo real, por isso

seria impossível alfabetizar visualmente se não houvesse uma contextualização, uma

ligação entre observador e imagem. Em seu livro Estética Relacional, Bourriaud

também fala da importância da relação entre observador e objeto com o surgimento das

novas mídias e meios de comunicação.

O surgimento da internet e das novas mídias inaugura novos tipos de contato com o objeto cultural, assim cada um encontraria a sua própria relação com o objeto/obra, seria possível escrever uma história da arte como a história dessa produção de relações com o mundo (BOURRIAUD, 2009, p.99).

Assim como a preocupação com o descarte do lixo nas cidades, as questões

envolvendo a visualidade do cotidiano remonta ao século XIX ou até mesmo antes.

Segundo Cardoso, o crescimento urbano que ocorreu em decorrência da

industrialização no século XIX, a difusão da alfabetização, juntamente com a busca por

lazer nas horas livres culminaram em vários dilemas comunicacionais, desde a

preocupação com diagramação de um editorial, até a sinalização nas grandes cidades.

É importante ressaltar que mesmo havendo esse tipo de preocupação com a

visualidade, apenas na última metade do século XIX, quando a fotografia se tornou

mais popular, é que houve realmente uma popularização da imagem.

Nunca dantes existira ou circulara tamanha quantidade de imagens: qualquer pessoa merecia ser retratada; qualquer paisagem precisava ser vista; qualquer incidente acabava sendo registrado. A fotografia completou o processo de transformar imagem em mercadoria abundante e barata, mas ironicamente essa abundância toda acabou por esvaziar as imagens de uma parte do seu poder simbólico tradicional (CARDOSO, 2005, p. 61).

O interesse pelos estudos da imagem resultou na construção de uma nova área

de pesquisa chamada Cultura Visual, que pode ser definida como um conjunto de

identidades e valores construídos ou relacionados com o mundo visual, como o design,

a arte e a moda, e que chegam à sociedade através da mediação visual. Autores como

Paul Duncun e Nicholas Mirzoeff defendem que a Cultura Visual é vinculada aos

estudos culturais nas questões relacionadas as experiências vividas pelas pessoas e da

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dinâmica estrutural da sociedade em que vivem. Para os autores cultura são as

relações sociais, valores, crenças, ideias políticas e religiosas, e não algo relacionado

ao conhecimento ou valores intelectuais de cada indivíduo. Para Paul Knass seria

inconsistente falar de alfabetização visual ou cultura visual levando em consideração

apenas a história da arte, seria necessário haver o estudo da história da imagem. Essa

aproximação entre história da arte e história da imagem foi proposto por Malcom

Barnard, que de acordo com Knass “considera que a cultura visual representa uma

forma mais inclusiva de estudos da imagem, que torna possível abarcar todas as

formas de arte e design”.

Alguns países como os Estados Unidos, Austrália e Inglaterra já incluíram o

Design ou a cultura visual no currículo como disciplina no ensino escolar, e outros

mantém, programas relacionados ao ensino de design (FONTOURA, 2002). No Brasil,

existe a proposta pedagógica da Educação através do Design (EdaDe), de Antônio

Fontoura, que utiliza o design como ferramenta interdisciplinar para integrar diversas

disciplinas e conteúdos, porém nos PCNs (parâmetros curriculares nacionais) e na LDB

(lei de diretrizes e bases) que norteiam a educação brasileira, a palavra Design e as

atividades relacionadas ao Design não são citadas. Tão pouco cogita-se a possibilidade

de se aprender e ensinar através do Design.

Um relato de Ana Mae Barbosa sobre o Congresso Anual da National Art

Education Association dos Estados Unidos em Seattle /USA 17 a 21 de março de 2011

publicado no blog Arteeducaçãoonline (2011) afirma que há uma tendência a voltar a

ensinar conjuntamente Arte e Design, como na Inglaterra depois da Revolução

Industrial até os anos 80.

Há cinco anos, por compromisso profissional, voltei a pesquisar e ensinar na intersecção da Arte e do Design, o que fizera na década de oitenta, coincidentemente na época do divórcio desta relação na Inglaterra promovido pelo governo de Margaret Thatcher. Portanto, trabalhei na educação para a Arte e o Design na USP, com a ajuda de Joyce Leal, na época que já estava fora de moda, por convicção e antes deste tópico voltar a ser foco de interesse da Arte/Educação.

Este ano na NAEA as mesas sobre Art and Design Education foram as mais concorridas. Cultura Visual já não é algo discutível, já está assimilada na Arte/Educação americana, pois seus estudos foram integrativos com respeito à história e àqueles

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que faziam Cultura Visual antes da Cultura Visual ter este nome. Desde os primórdios do modernismo houve arte/educadores americanos como Belle Boas (anos vinte na Columbia University) que integraram diferentes meios produtores de imagens ao ensino da Arte e estenderam o campo de sentido da Arte para a Antropologia e os meios de comunicação.

A grande preocupação agora é com Arte e Design na Educação. Deste tema falaram Kerry Freedman, Mary Ann Stankiewicz e Robin Vande Zander. Foi uma mesa excelente. Começou com a História do ensino da Arte e do Design na Escola Normal de Massachusetts hoje Massachusetts College of Art onde eu fiz uma disciplina durante meu doutorado. Falaram de Walter Smith que influenciou o mundo todo no início do século XX, da Nova Zelândia ao Brasil. Foi analisada também a Revista School Arts por Robin Zander demonstrando que esta preocupação com o Design sempre esteve subjacente ao ensino da Arte nos Estados Unidos. A frase com a qual Kerry Freedman, a grande dama da Cultura Visual, terminou sua fala ecoou por todo o Congresso, todos os outros dias: “Art and Design Education is Visual Culture”.

Para quem tudo “já era”, isto é aqueles que só ensinam novidades a seus alunos, sem considerações de valores, sem contextualização e sem história é bom avisar que Cultura Visual não é mais novidade.

Arte e Design Education vem sendo defendida com grande ênfase na África do Sul. Há dois anos em um Congresso sobre Design um professor Sul Africano disse que em sua universidade o número de professores de Design Education era quase o triplo do número de professores de outras áreas do Design. Quando perguntei “por que”, ele respondeu que era política do governo. Portanto a nova onda em direção ao ensino da Arte e do Design não recomeçou nos países ricos, mas em um país em desenvolvimento.

A crise está obrigando os países ricos a reverem suas posições. Uma das linhas fortes nos Estados Unidos em Art and Design Education, é o Design Thinking que tem Martin Rayala, como adepto. Ele presidiu uma mesa também muito boa e acredita que pesquisa, experimentação e prototipagem são processos criadores aplicáveis a toda produção humana. Mas, isto é assunto para outro artigo no qual se possa discutir mais largamente sobre as pressões do capitalismo sobre a educação fazendo os arte/educadores norte americanos “to follow the money” e o resto do mundo os seguirem. Na história recente o dinheiro da Getty (ESSO) produziu uma revolução no ensino da Arte dando ênfase ao DBAE (Disciplined Based Art Education} ao entendimento da Arte, a imagem na sala de aula. Um rico colecionador, Paul Getty legando sua coleção ao público precisava ser valorizado, era necessário que todos entendessem seu legado daí a ênfase na História da Arte, na Estética e na Crítica de Arte. Não foi de todo mal, pois ficou a importância de se ler imagens nas aulas de Arte. No fim dos anos noventa um Encontro nos headquarters da IBM reuniu cem arte/educadores top no mundo para ouvir os

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executivos das grandes corporações de entretenimento dizerem de que tipo de criadores precisavam na indústria cultural. Havia mercado, mas não havia produtos suficientes para vender. Surgiu a ênfase na Cultura Visual. Talvez não tenha surtido o efeito que os executivos do entretenimento queriam, mas resultou positiva pela ampliação do campo de sentido da Arte. E agora: a que veio o Design Thinking neste momento de crise econômica e crise do capitalismo?

O PCN que mais se aproxima do Design, é o de Arte, que tem por objetivo

“propiciar o desenvolvimento do pensamento artístico, que caracteriza um modo

particular de dar sentido às experiências das pessoas: por meio dele, o aluno amplia a

sensibilidade, a percepção, a reflexão e a imaginação” (BRASIL, 2000b p.15).

Esta preocupação também está presente nos documentos oficiais que regulam o

ensino de Arte no país. Na discussão sobre o que caracteriza o conhecimento artístico,

os PCN para o ensino fundamental enfatizam claramente o papel da percepção

estética.

De 1ª a 4ª série: A percepção estética é a chave da comunicação artística. No

processo de conhecimento artístico, do qual faz parte a apreciação estética, o canal

privilegiado de compreensão é a qualidade da experiência sensível da percepção. (...)

O processo de conhecimento advém de relações significativas, a partir da percepção

das qualidades de linhas, texturas, cores, sons, movimentos, etc. (1997:39).

De 5ª a 8ª série: A criação e a exposição às múltiplas manifestações visuais

geram a necessidade de uma educação para saber ver e perceber, distinguindo

sentimentos, sensações, ideias e qualidades contidas nas formas e nos ambientes. Por

isso é importante que essas reflexões sejam incorporadas na escola, nas aulas de Arte

e, principalmente, nas de Artes Visuais (1998:63).

O PCN diz: “investigar as articulações dos elementos e componentes básicos

das linguagens visuais e áudio presentes nas produções artísticas em geral e nas do

campo da comunicação visual, das novas mídias e Artes audiovisuais” (2000:53).

Portanto, mesmo do ponto de vista legal e institucional pode-se trabalhar com

design na área de arte integrando no componente referido acima a comunicação visual.

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1 LEITURA DE IMAGENS E OBJETOS DO DESIGN E DA ARTE Por que arte e design?

A leitura de objetos prepara para decodificar o mundo, para fazer pensar e

refletir. Quando lemos uma imagem ou um objeto, nos questionamos sobre algo, e essa

é a maneira pela qual atribuímos significação ao mundo e as coisas ao nosso redor,

questionando, analisando e interpretando. Parece-me apropriado contextualizar com

algo que não é desconhecido e ir aos poucos aprofundando em um mundo que parece

distante da grande maioria das pessoas, como a Arte e o Design.

Temos que alfabetizar para a leitura da imagem. Através da leitura das obras de Artes plásticas estaremos preparando a criança para a decodificação da gramática visual, da imagem fixa e, através da leitura do cinema e da televisão, e dos cd-rom, os prepararemos para aprender a gramática da imagem em movimento” (Barbosa, 2009, p.36).

Embora Arte e Design nem sempre venham a servir aos mesmos propósitos, ao

longo da História tem caminhado juntos. O Design por natureza estabelece relações

com a Arte. Existe um trânsito, uma troca entre as duas áreas que é inegável, não se

consegue definir muito bem onde termina um e começa outro, e é assim também

quando tenta-se “rotular” um artista ou um designer, muitas vezes as duas profissões, e

consequentemente o produto do trabalho destes profissionais não pode ser classificado

como Arte ou como Design. Essa é uma das consequências do pós-modernismo, que

tornou o saber interterritorial.

Como citado anteriormente, os PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais)

brasileiros não fazem nenhuma referência ao termo Design. No entanto, alguns dos

conteúdos relacionados com a Arte se aproximam dos interesses do Design, tais como:

− Consideração dos elementos básicos da linguagem visual em suas

articulações nas imagens produzidas (relações entre ponto, linha, plano, cor, textura,

forma, volume, luz, ritmo, movimento, equilíbrio);

− Reconhecimento e utilização dos elementos da linguagem visual

representando, expressando e comunicando por imagens: desenho, pintura, gravura,

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modelagem, escultura, colagem, construção, fotografia, cinema, vídeo, televisão,

informática, eletrografia1;

− Contato e reconhecimento das propriedades expressivas e construtivas dos

materiais, suportes, instrumentos, procedimentos e técnicas na produção de formas

visuais;

− Experimentação, utilização e pesquisa de materiais e técnicas artísticas

(pincel, lápis, giz de cera, papéis, tintas, argila, goivas) e outros meios (máquinas

fotográficas, vídeos, aparelhos de computação e de reprografia);

− Seleção e tomada de decisões com relação a materiais, técnicas,

instrumentos na construção das formas visuais;

Pode-se utilizar esses interesses em comum entre Design e Arte, para inserir o

ensino/leitura de objetos de design nas aulas de arte.

O Design desperta o interesse por ser parte da cultura material de todos os seres

humanos. É uma área de conhecimento que se relaciona não só com questões

projetuais, mas também sociais e culturais, além de ser presente no cotidiano de todos.

Assim sendo tornou-se aberto a diversas áreas e aos mais diferentes tipos de

pensamentos e discursos. Segundo Bonfim, o Design não teria ou pertenceria a um

campo fixo de conhecimentos, ele teria uma constituição transdisciplinar, precisaria

combinar conhecimentos pertencentes a diversas áreas científicas. Pelo fato do Design

ser transdisciplinar, se utilizássemos objetos de Design em sala de aula, poderíamos

abordar os mais variados temas, como sociologia, história e ecologia por exemplo.

No Brasil em 2002 a tese de doutorado de Antônio Martiniano Fontoura, na

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), defendeu uma proposta pedagógica e

educacional através do Design, a qual ele chamou de Educação Através do Design

(EdaDe). De acordo com Fontoura, o ensino de Design propiciaria aos alunos a

experiência transdisciplinar de integração dos conteúdos que hoje são separados ainda

de maneira cartesiana.

A Educação através do Design, ou EdaDe como aqui será chamada, pode ser caracterizada como uma proposta pedagógica e como capaz de interferir ativa e positivamente na formação básica – geral – do sujeito. Num sistema formal de ensino,

1 Eletrografia, também chamada de foto Kirlian consiste no uso de máquinas fotocopiadoras na produção de trabalhos artísticos.

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juntamente com outras disciplinas curriculares, tenha ela a “formatação” de uma disciplina ou de um programa complementar, a Educação através do Design possibilita a integração de conteúdos e a viabilização de vivências projetuais adequadas que confirmam certas atitudes, habilidades e comportamentos desejáveis nos educandos (FONTOURA, 2002, p.07).

Ainda segundo Fontoura, o Design é um amplo campo que envolve e para o qual

convergem diferentes disciplinas. Ele pode ser visto como uma atividade, como um

processo ou entendido em termos dos seus resultados tangíveis. Ele pode ser visto

como uma função de gestão de projetos, como atividade projetual, como atividade

conceitual, ou ainda como zum fenômeno cultural. É tido como um meio para adicionar

valor às coisas produzidas pelo homem e também como um veículo para as mudanças

sociais e políticas.

É pelo viés da Arte e do Design e das suas conexões com a cultura e a

sociedade que este estudo pretende promover a educação ambiental e a

conscientização acerca da necessidade de melhorar a interação entre o homem e o

meio ambiente. Esta pesquisa tem por objetivo estudar e investigar estratégias

educativas, para auxiliar na educação ambiental por meio de leitura de imagens, de

objetos de Design e de Arte, possibilitando assim que o educando reflita, interagindo

com o mundo ao seu redor.

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2 A CIDADE E O MUNDO DE MEUS ALUNOS

Para começar a descrever o meu trabalho como pesquisadora e docente, creio

que seja fundamental contextualizar o mundo de meus alunos.

Os alunos que participam de minha pesquisa são estudantes da Escola

Municipal de Ensino Fundamental Professor João Nery Marton, todos estão nas séries

iniciais do ensino fundamental (2º ao 5º ano) no município de Canas. Situada na região

do Vale do Paraíba, interior do estado de São Paulo, a 199 quilômetros da capital, é

considerada uma das mais pobres do estado de São Paulo. Segundo o Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população local é de 4.387 habitantes, e

de acordo com a prefeitura deste total 49,3% da população vive abaixo da linha de

pobreza. A economia local vem da agricultura (plantio de arroz e horticultura) e da

pecuária (gado leiteiro).

Figura 01 . Vista aérea da cidade de Canas. Fonte: Site da prefeitura de Canas (www.canas.sp.gov.br).

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Figura 02. Imagem de satélite da cidade de Canas. Fonte: Google Earth.

Embora a cidade de Canas fique a apenas 199 quilômetros de distância da

capital São Paulo, as diferenças culturais e sociais são muito grandes. Quando comecei

a trabalhar, eu não fazia ideia do mundo que me esperava. Aqui em meu relato, citarei

algumas situações pelas quais passei, acho que assim ficarão mais claras as diferenças

as quais me refiro.

Em minha primeira semana de aula, percebi que muitas crianças iam à escola

para se alimentar, na segunda semana, um de meus alunos (L. F. 9 anos), um menino

muito quieto, retraído e pouco participativo nas aulas, chegou feliz, falante e veio me

dizer: “Tia, estou muito feliz! Minha mãe saiu da cadeia! Ela não vai mais vender

drogas, agora vai ser só prostituta!” A partir daquele momento tive consciência de que

eu estava vivenciando situações que não eram algo comum à minha experiência, e sim

algo revelador, que eu não estava ali para ajudar os meus alunos apenas a ver e refletir

sobre o mundo, mas que o meu modo de ver as coisas também iria mudar. Tratava-se

de um problema de relativização de valores em relação ao contexto.

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Em poucos meses tive experiências que jamais pensei viver, como ver uma

criança pulando, queimando os pés no chão quente e ouvir a seguinte explicação da

mãe: “Agora é a vez de o irmão usar o sapato, não posso mandar ele de pé no chão

para a escola. Não liga não dona, o pé dele fica grosso e depois passa”. Ou de ver as

crianças pedindo sobras da merenda para levar para os irmãos que ficaram em casa e

que ainda não tem idade para estudar.

“A gente tem mais conhecidade disso que os grandes”

Foi assim com essa frase honesta que F. (6 anos), concluiu que seus pais e avós

não se preocupam com o meio ambiente como ele e as outras crianças da sua idade.

Comecei a trabalhar com os alunos sobre meio ambiente. Conversamos sobre a

importância das árvores, de como é importante não poluir, e de reaproveitar tudo o que

for possível. Os alunos do segundo ano ficaram empolgados, gostaram do assunto e

deram diversas ideias de como ajudar a preservar o planeta. A resposta que tive desta

turma me surpreendeu. Achei que por serem mais novos, seria mais difícil trabalhar

com eles sobre meio ambiente, eu estava enganada.

Fiquei surpresa quando na primeira aula em que comecei a falar sobre meio

ambiente, P. (6 anos), autista, veio mostrar seu desenho: um homem com uma

motosserra em que estava escrito “não corte as árvores”. Ou quando J. (6 anos), da

mesma sala me falou: “Fico preocupado com a vida marinha. Eles estão ameaçados

também”. A participação da turma do segundo ano foi integral, superou todas as minhas

expectativas. Eles falaram em preservar as árvores, os animais, e se mostraram

preocupados com a poluição do mar e com a ameaça à vida marinha.

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Figura 03 . P. (6 anos) com seu desenho. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, set/2010.

Foi baseado nas diferenças e no multiculturalismo que escolhemos as obras que

seriam apresentadas às crianças. Optamos por obras de artistas de diferentes épocas,

lugares, etnias e sexo. Edouard Manet, um dos mais importantes artistas do início do

Modernismo europeu, de um continente que dominou não só o mundo, mas também a

arte; Faith Ringgold, mulher, negra, americana, de um país rico mas colonizado como o

Brasil; Eduardo Srur, artista contemporâneo, brasileiro, que trabalha com a temática

ambiental com instalações e intervenções urbanas, fugindo do tradicional óleo sobre

tela; e os designers brasileiros Fernando e Humberto Campana, que trabalham em

conjunto e não individualmente. A diferença dos materiais utilizados pelos artistas

também foi importante na hora da escolha das imagens. Enquanto as obras de Edouard

Manet e de Faith Ringgold são bidimensionais e utilizam como suporte respectivamente

tela, tecidos e costuras, os trabalhos de Eduardo Srur com materiais

descartáveis/recicláveis e dos irmãos Campana com objetos que produzem outros

objetos resultam em trabalhos tridimensionais.

A instalação de Eduardo Srur foi uma das imagens escolhidas por tratar de um

problema que existe em todas as cidades, sejam grandes ou pequenas: o descarte do

lixo, e a poluição que este problema pode gerar. Também é importante ressaltar que

esta obra destaca-se por estabelecer uma ponte entre a Arte e o Design: no intuito de

aproveitar o material utilizado durante a instalação, o artista fez uma parceria com o

designer brasileiro Jum Nakao, estilista e diretor de criação, e projetou mochilas com o

plástico que antes eram as garrafas infláveis que ficaram expostas as margens do Rio

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Tietê. Embora Jum Nakao seja um designer, ele transita entre os mundos do design e

da arte, tendo participado da Bienal de Artes da Nova Zelândia, e integrado a exposição

“Quando vidas se tornam forma: diálogo com o futuro - Brasil-Japão”, no Museu de Arte

Contemporânea de Tokyo, Yuko Hasegawa, em 2008.

A imagem da obra de Edouard Manet foi escolhida por diferentes razões, por

mostrar os hábitos da época e do lugar, por ter uma paisagem natural (que está se

tornando cada vez mais difícil de se encontrar nos dias de hoje), e por destacar em sua

obra uma mulher nua, aborda a questão do gênero, que é de fundamental importância

para o desenvolvimento de práticas educacionais que buscam promover a diversidade

e a pluralidade, educando para a diversidade étnica, cultural e de gênero. Para Belidson

Dias, houve a partir dos anos 70 um deslocamento nas representações artísticas das

questões de classe, que antes valorizavam o estilo do artista, para novas discussões,

entre elas, a do gênero e da sexualidade.

Houve, a partir dessa época, um deslocamento nas representações artísticas das questões de classe, que valorizavam o estilo expressivo e pessoal do artista, para novas categorias; dentre elas, a de gênero e sexualidade. Isso fez com que boa parte da arte contemporânea passasse a privilegiar em seu discurso, aqueles que se encontravam, até então, sem representatividade na história da arte (DIAS, 2010, p.277).

A educação intercultural tem por objetivo o conhecimento da cultura local e o

reconhecimento de outras culturas, possibilitando assim reconhecer similaridades e

diferenças, e promover o respeito às diferenças.

A artista americana Faith Ringgold, autora da obra Tar Beach, que também foi

escolhida para ser uma das imagens participantes desta pesquisa, busca trabalhar com

suas origens africanas, e se autodenomina “artista mulher africana”. Faith Ringgold em

seus trabalhos com colchas de retalhos retoma uma tradição da época da escravidão,

em que as mulheres negras confeccionavam colchas de retalhos onde contavam suas

histórias. Esta obra foi escolhida por utilizar materiais diferentes dos que estamos

acostumados a ver em obras de arte expostas nos museus, a artista utiliza tecidos

costuras e bordados, materiais que são utilizados também por muitas mães de alunos

que ajudam financeiramente a família através da venda de artesanato e de trabalhos

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manuais. A pesquisadora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Ivone

Richter fala da importância de trabalhar com as raízes, e comenta o relato de Faith

Ringgold:

Ela relata que tem um sentimento de orgulho ao utilizar formas africanas em seu trabalho, e que foram os obstáculos colocados pelas camadas dominantes da sociedade à sua arte que a inspiraram. Da mesma forma, podemos imaginar o sentimento de orgulho de alunos da mesma etnia, ao estudar, na escola, a obra dessa grande artista (RICHTER, 2008, p. 107).

A autora vai além e fala da importância de utilizar a arte na conscientização

contra a discriminação como ferramenta para a educação intercultural.

Utilizar o sentimento estético como forma de lutar contra esse tipo discriminação presente no cotidiano é um caminho a ser seguido, como um canal para a compreensão da estética e de outras culturas, no sentido de despertar valores estéticos que permitam a valorização de todas as manifestações culturais (RICHTER, 2008, p. 108).

Buscando explorar a utilização de materiais alternativos e incorporando o Design

nas aulas, escolhemos a cadeira Favela, dos irmãos Campana, para abordar as

diferentes possibilidades de materiais e formas que podem ser utilizadas. Entre os

vários trabalhos dos irmãos Campana, a cadeira Favela foi escolhida por ser uma peça

do mobiliário que faz parte do cotidiano de todos, e que independente da situação

financeira está presente na maioria dos lares.

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PETS, de Eduardo Srur

Figura 04. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4624794469/in/set-72157623978422765/>>. Acesso em: Setembro, 2010.

Figura 05 . Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4625319164/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Setembro, 2010.

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Figura 06. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4624765253/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Setembro, 2010.

Figura 07 . Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4625373056/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Setembro, 2010.

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Le déjeuner sur l'herbe , Edouard Manet

Figura 08 . Manet, Edouard. Le déjeuner sur l'herbe, 1863 óleo sobre tela. Dimensões A: 2.08 ; L. 2.645 ; Musée d'Orsay, Paris, França Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4625373056/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Outubro, 2010.

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Tar Beach , de Faith Ringgold

Figura 09. Ringgold, Faith. Tar Beach,1988. Acrílico sobre tela, tecido tingido e bordado. Dimensões 74 x 69" , Guggenheim Museum, New York.

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Cadeira Favela, Irmãos Campana.

Figura 10. Cadeira Favela, Irmãos Campana. Fonte: Disponível em: <<http://www.campanas.com.br>>. Acesso em: Outubro, 2010.

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3 ESTÉTICA RELACIONAL E A/R/TOGRAFIA

A leitura das imagens se dará a partir da Estética Relacional e da Abordagem

Triangular. Estas abordagens consistem em analisar as imagens em função das

relações inter-humanas que elas figuram, produzem ou criam, e se baseia na relação

entre as pessoas e o mundo por intermédio dos objetos estéticos. Para Bourriaud, Arte

Relacional é “Uma arte que toma como horizonte teórico a esfera das interações

humanas e seu contexto social mais do que a afirmação de um espaço simbólico

autônomo e privado”.

A Estética Relacional lembra ainda que a arte participa das negociações para

construção da realidade social, oferecendo ferramentas para se ver o mundo de forma

diferente, podendo mudar não só a percepção da realidade, mas a realidade em si,

permitindo criar novas formas de sociabilidade, além de privilegiar a participação e a

interatividade. De acordo com Dutra,

a atribuição de significados vai ser feita por um sujeito que tem uma determinada história de vida, em que objetividade e subjetividade organizam, de modo singular, sua forma de apreensão e de apropriação do mundo (DUTRA, 2006, p.15).

Minha pesquisa é inspirada na A/r/tografia (artist-researcher- teacher-grafia), teoria e

método que defende estarem arte, pesquisa, ensino e escrita interligados numa prática

viva imbricada com o mundo. Além disto, salienta o poder da imagem, e sobretudo que

Arte e escrita se complementam. Por isso esta pesquisa não será apenas descrita com

palavras, mas apresentada em imagens, fazendo parte da narrativa uma exposição de

trabalhos entremeada de textos das crianças. De acordo com Irwin,

arte e escrita unificam o visual e o textual por se complementarem, se refutarem e se salientarem uma à outra. Imagem e texto não duplicam um ao outro e, sim, ensinam algo de diferente e ainda similar, permitindo que nos questionemos mais profundamente a respeito de nossas práticas (IRWIN, 2008, p.93).

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A A/r/tografia assim como a estética relacional e a Abordagem Triangular

também afirmam que pensamento e prática estão diretamente ligados através da

interpretação, compreensão e do fazer.

A A/r/tografia baseia-se nas habilidades do artista/pesquisador/professor, escritor

operarem conjuntamente na investigação e seu relato. A educadora, pesquisadora e

artista canadense Rita Irwin, sistematizadora da metodologia e criadora do termo

A/r/tografia explica a mesma como o ato do artista / pesquisador / professor de arte não

só pesquisar, mas também de fazer arte. Segundo a autora, o poder da A/r/tografia é

revelado no ato de criar, integrando o poder da pesquisa, com a escrita e com o fazer

arte. Ainda de acordo com Rita Irwin, o uso da A/r/tografia permite ao

artista/pesquisador/professor uma experiência estética complexa integrando o saber, o

descobrir e o fazer de maneira não dicotômica.

Fazer relações entre essas formas de pensamento é fundamental para o nosso trabalho. No passado, o pensamento dicotômico separava as categorias de pensamento e frequentemente posicionava uma forma acima da outra, levando a considerações hierarquizadas (IRWIN, 2008, p.89).

A autora explica sua teoria apresentando a ideia de que Arte, pesquisa e ensino

juntos situam atos de similaridade e diferenças, e que a A/r/tografia reorganiza

visualmente a experiência simplificando o que parece complexo e vice-versa.

Artistas-pesquisadores-professores devem saber que a imagem visual é um complexo local de informação que talvez fale mil palavras; aqueles que estudarem intensamente questões visuais devem se engajar profundamente com os sujeitos e objetos desse mundo visual. No entanto, os que não sofreram imersão em análise textual da imagem ou quem se tornou anestesiado para a linguagem das imagens, devem ser capazes de entrar no mundo visual através de um meio superficial, a não ser que guiados por um texto narrativo (IRWIN, 2008, p. 95 e 96).

Irwin também fala da importância que a A/r/tografia como ferramenta pedagógica

e defende que a seu uso pode ser uma poderosa fonte pedagógica quando o

professor/autor/artista expõe seu trabalho, compartilhando assim o lugar de aprendiz

com seus aprendizes. E que os artistas/pesquisadores/professores que compartilham

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suas práticas procuram nada mais do que a compreensão das mesmas como artistas,

pesquisadores e professores.

São a/r/tografistas que representam suas questões práticas, sua emergente compreensão e textos analíticos criativos. Estão vivendo seu trabalho, estão representando sua compreensão e estão executando suas posições pedagógicas, e enquanto integram teoria, prática e criação através de suas experiências estéticas passam significado no lugar de fatos. Seu trabalho é ao mesmo tempo ciência e arte, mas está mais perto da arte, e como tal eles procuram realçar o significado no lugar da certeza (IRWIN, 2008, p. 98).

Mas e os meus alunos? Será que eles conseguiriam ver uma imagem e refletir

sobre ela? Antes de começar a trabalhar leitura de imagens com meus alunos, resolvi

investigar qual era o seu poder de observação, se conseguiam diferenciar formas,

tamanhos e cores, se eles conseguiriam realmente ler uma imagem. Para isso planejei

uma atividade bem simples, escolhi trabalhar com frotagem, técnica que consiste em

colocar uma folha de papel sobre uma superfície que apresente um relevo ou textura e

esfregar com o lápis ou giz de cera, até que o relevo ou a textura apareça na folha de

papel.

Propus que os alunos desenhassem uma folha de árvore. O resultado não me

surpreendeu nem um pouco, todos desenharam o mesmo tipo de folha. Pedi então que

cada aluno levasse uma folha de árvore para a próxima aula.

Na aula seguinte, os alunos levaram as suas folhas, e eu também fiz a minha

parte, levei várias, de formatos, tamanhos e cores diferentes. Sem falar nada fui para a

lousa, coloquei o papel sobre a folha e comecei a passar o giz de cera. Quando a folha

começou a aparecer ouvi um “Ohhhh! Que legal tia!”. Assim que olhei para eles, todos

estavam frotando, trocando folhas com os colegas, comparando tamanhos e cores, e

escolhendo que formato ainda não haviam frotado. A aula virou uma loucura, e eu

deixei. Eles adoraram.

Após a experiência da frotagem, novamente propus que os alunos desenhassem

folhas de árvores. Eles desenharam folhas de todos os tipos, e quase nenhum

desenhou aquela folhinha que havia desenhado da primeira vez.

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Conversamos sobre o poder da observação, de como as coisas podem ser

diferentes dependendo de quem olha. Falamos que o céu nem sempre é azul, que em

dias de chuva fica acinzentado, e que no fim da tarde ele é alaranjado, que as folhas

das árvores possuem vários tons de verde e que sua coloração muda com a chegada

do outono, ou que as folhas caem no inverno. As crianças não só entenderam o que eu

estava falando como deram outros exemplos, como as noites que nem sempre tem

estrelas, que existem noites claras por causa da lua e noites muito escuras.

Figura 11 . Turma do terceiro ano durante a aula de frotagem. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

Figura 12. Aula de frotagem com a turma do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

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Figura 13. Alunos do quarto ano durante a aula de frotagem. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

Figura 14. Alunos do quinto ano durante a aula de frotagem. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

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4 LEITURA DAS IMAGENS

4.1 PETS, EDUARDO SRUR

Figura 15. Registro fotográfico da instalação PETS, de Eduardo Srur, 2008. Fonte: Disponível em: <<http://www.jumnakao.com.br/pts.html>> Acesso em: setembro, 2010.

Foram apresentados os registros fotográficos da intervenção urbana PETS, do

artista plástico brasileiro Eduardo Srur, que consistia em 20 esculturas gigantes na

forma de garrafas de refrigerante, e ficaram expostas as margens do rio Tietê por um

período de 60 dias, entre os dias 27 de março e 25 de maio de 2008.

Quando a exposição deste trabalho acabou, o artista em parceria com o designer

Jum Nakao transformou o material plástico que foi utilizado em seu trabalho em

mochilas, e distribuiu a alunos da rede pública municipal de São Paulo que haviam

navegado no rio Tietê para visitar a instalação. Juntamente com o registro fotográfico

da instalação, mostrei também as mochilas, ou seja, o produto da reutilização do

material empregado na obra do artista.

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Figura 16. Modelo das mochilas criadas por Jum Nakao. Fonte: Disponível em: <<http://www.jumnakao.com.br/pts.html>>. Acesso em: setembro, 2010.

Figura 17: Modelo das mochilas criadas por Jum Nakao. Fonte: Disponível em: <<http://www.jumnakao.com.br/pts.html>>. Acesso em: setembro, 2010.

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De acordo com o site do artista, o trabalho buscou despertar a reflexão do

público sobre os problemas urbanísticos causados pelo lixo. “A obra, vista por mais de 1

milhão de pessoas diariamente, propôs a reativação visual do principal rio metropolitano

e a reflexão do público sobre os problemas urbanísticos causados pelo lixo”.

(http://eduardosrur.tumblr.com/ em 28/05/2010).

Assuntos abordados:

− Poluição das águas;

− Descarte consciente do lixo;

− Possibilidades de reaproveitar e reutilizar materiais antes do descarte.

Os alunos foram convidados a ler as imagens e a discutir entre si o que viam. Em

seguida, conversamos sobre o que eles haviam visto, o que achavam que era aquilo, o

que mais lhes chamou a atenção na obra, e o quê o artista propôs discutir com seu

trabalho.

Durante as aulas muitos comentários chamaram atenção, a primeira reação das

turmas foi de espanto, muitos perguntaram se aquilo existia, depois do que era feito, se

era de verdade, e por fim se eu tinha visto pessoalmente, mas o comentário mais

inesperado de todos foi a pergunta de um aluno que me perguntou como aquilo era

considerado arte “se a pessoa que fez ainda está viva”.

Também é importante registrar a aula com a turma do quinto ano, que observou

as imagens, conversou, discutiu, debateu sobre a instalação, sobre a poluição das

águas e do planeta durante toda a aula, foi realmente proveitoso, mas quando a aula

acabou e eu me despedi, ao sair da sala, ouvi uma aluna perguntar: “mas a gente não

vai fazer nada hoje?”, Esse comentário me deu oportunidade de prometer que o fazer

viria na próxima aula, e de certa maneira me deixou segura de que estava no rumo

certo, pois a Abordagem Triangular e a Pedagogia moderna e contemporânea de John

Dewey enfatizam o “aprender fazendo”. Segundo Barbosa,

um currículo que interligasse o fazer artístico, a análise de obra de arte e a contextualização estaria se organizando de maneira que a criança, suas necessidades, seus interesses e seu desenvolvimento estariam sendo respeitados e, ao mesmo tempo, estaria sendo respeitada a matéria a ser apreendida, seus valores, sua estrutura e sua contribuição específica para a cultura. (BARBOSA, 2009, p. 36)

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De acordo com Ostrower, é inerente ao ser humano a necessidade de se

apropriar do que está vendo, de fazer para ordenar seus pensamentos, para

compreender.

Ao indivíduo criativo torna-se possível dar forma aos fenômenos porque ele parte de uma coerência interior que absorve os múltiplos aspectos da realidade externa e interna, os contém e os compreende coerentemente, ordenando-os em novas realidades significativas para o indivíduo (OSTROWER, 2008, p.132).

Figuras 18, 19 e 20. Momento do “fazer artístico”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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“Quanto dinheiro!”

Um dos alunos comentou com o colega: “Quanto dinheiro! Já pensou se isso

existisse?” “A gente ia ficar rico!” completou o outro aluno. Curiosa com aquele

comentário perguntei sobre o que eles estavam falando, e eles me contaram que os

pais trabalhavam como catadores e vendiam garrafas para a reciclagem. Começamos

então a conversar sobre os hábitos familiares, e percebi que muitas famílias mesmo

sem querer tinham uma iniciativa de sustentabilidade ou reutilização de materiais que

na maioria das vezes são considerados lixo. Os alunos filhos de catadores que até

poucos minutos antes da aula tinham vergonha das atividades exercidas por seus pais

começaram a falar com um certo orgulho que os pais também “cuidavam do planeta”.

Durante as nossas conversas os alunos contaram que algumas mães produziam sabão

em barra a partir do óleo de cozinha, outras faziam artesanato com garrafas pet, ou as

recolhiam das ruas e as vendiam. Os alunos já viam a garrafa com uma outra função,

para eles não era simplesmente lixo, mas sim também uma fonte de renda.

Sobre a transcrição das aulas, é necessário esclarecer que os alunos são

bastante participativos e agitados, o que dificultou a gravação e impediu a transcrição

da fala dos mesmos em alguns trechos das gravações.

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Segundo ano

J: “Quanto dinheiro! Já pensou se isso existisse?”

F: “A gente ia ficar rico!”

J: - O que é isso tia? É garrafa de verdade?

Professora: São fotos do trabalho de um artista brasileiro chamado Eduardo Srur.

Não são garrafas de verdade, elas são feitas de plástico como esses de pula pula.

P: - E deixaram ele colocar lixo lá?

L: - Não é lixo! Olha só que bonito!

Professora: Por que vocês acham que ele colocou essas garrafas gigantes aí?

L: - Pra enfeitar?

Professora: Será? Quando vocês veem uma garrafa largada na rua, parece um enfeite?

Estudantes em coro: “não”

Professora: Alguém tem alguma ideia do porquê destas garrafas aí?

R: - Pra mostrar bem grande o que é errado.

Professora: - Como assim?

R: - Que é errado colocar garrafas vazias e lixo no rio

F: - Olha, tem luz lá dentro. Como é que acende?

A: - Isso ainda tá lá em São Paulo? A senhora leva a gente pra ver?

M. J: - Parece enfeite de Natal.

R: - A gente pode desenhar isso?

Professora: - Claro que sim!

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Terceiro ano

T: - Que coisa bonita!

M: - Como ele colocou essas garrafas aí?

M.T.: - Como as garrafas não afundam se são tão grandes?

J.V: - Mas se o artista que fez isso está vivo, como que é arte?

Professora: - Por que você acha isso?

J.V: - Ué? Todo mundo que a gente viu até hoje só fazia quadro pintado antigamente,

todos já morreram.

M: - É verdade, teve aquele que a gente viu ano passado que era louco e cortou a

orelha.

Professora: - a tia trabalhou com Van Gogh ano passado? O que vocês fizeram?

M: - A gente copiou o quadro dele, um cheio de flores.

Professora: - Vocês lembram aquele dia que eu mostrei esculturas pra vocês? Que nós

falamos em bidimensional e tridimensional?

Alunos: - siiiim

Professora: - Então, escultura não é pintura, e é arte também. Tem muitas coisas que

são consideradas arte e que não precisam ter sido feitas por alguém que já morreu.

Tem teatro, dança, escultura, fotografia, desenho, gravura...

Jo: - Tá, mas e o que a gente vai fazer hoje?

Professora: - A gente vai olhar essas imagens e conversar, quero saber o que vocês

acham desta instalação. O que vocês entendem?

Jo: - Só conversar? E fazer? Não vai fazer nada?

Professora: Nós podemos fazer também. Que tal se cada um desenhar o que achou

mais interessante nestas imagens que estamos vendo? Pode ser?

Alunos: - pooode

Professora: - Mas o que vocês acham dessas imagens? O que vocês podem me dizer?

J.V: - que é igualzinho ao rio que passa atrás da minha casa.

Professora: - Por que?

J.V: - Lá tá assim agora, cheio de lixo, sacola de plástico, garrafa velha, meu pai nem

vai mais pescar lá.

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T: - É, a minha mãe falou que lá tem cocô!

Alunos: risos

Professora: - E quem joga essas coisas lá?

Alunos: - todo mundo!

Professora: - Todo mundo? Até vocês?

Alunos: - Não.

T: - todo mundo quer dizer os homens.

Professora: - E vocês não acham que dava pra reciclar, fazer alguma coisa com essas

garrafas pra não precisar jogar no lixo?

Alunos: - Dá pra fazer brinquedo!

Quarto ano A: - Quanto tempo ficou lá? Eu fui pra São Paulo e não vi isso.

S: - Pra mim é mais uma bagunça, não é arte coisa nenhuma!

B: - Como isso não afunda na água?

A: - Você não viu que parece um pula pula, acho que boia.

A turma do quarto ano foi a que menos participou do diálogo, mas que melhor se

empenhou no fazer.

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Quinto ano

G: - o artista não pode ter feito isso sozinho, com certeza alguém ajudou.

Professora: - claro que alguém ajudou, o artista teve a ideia, fez um projeto, e reuniu

uma equipe para ajudá-lo.

V: - Eu quero saber que ajudou a pagar isso.

A: - É verdade tia, quem paga o artista? E quem falou pra ele que ele é artista?

D: - Qualquer um pode dizer que é artista se quiser?

An: - Você pode dizer que é artista de circo! (risos)

G: - O que ele fez com essas garrafas depois que tirou de lá?

Professora: - foi por isso que eu mostrei as mochilas, todo esse material foi utilizado

para fazer mochilas desenhadas por um designer chamado Jum Nakao.

G: - Designer? Quem fez as mochilas não foram costureiras?

Professora: - Com certeza as mochilas foram costuradas por costureiras, mas quem

desenhou as mochilas não foram elas, foi um designer. É um profissional que projeta,

que pensa na melhor maneira de se fabricar ou confeccionar coisas (objetos) para as

pessoas.

A: - Consegue uma dessas pra gente tia!

Professora: - é uma pena gente, mas não dá, essas mochilas já foram todas doadas

para crianças de escolas de São Paulo. Mas e vocês, o que vocês acham que a gente

pode fazer com as garrafas para reaproveitá-las?

Alunos: - Brinquedo!

Quando acabou a aula e eu estava saindo da sala um aluno me perguntou: “Mas a

senhora não vai dar aula? A gente não vai fazer nada hoje?”

Professora: - hoje a nossa aula foi só conversar, mas nós podemos fazer os brinquedos

que vocês sugeriram, o que vocês acham? Combinado?

Alunos: - Combinado!

Curiosamente apenas os alunos do quinto ano fizeram algum tipo de comentário

sobre as mochilas produzidas a partir do material utilizado na instalação do artista. Nem

uma das outras turmas traçou sequer um comentário.

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Figura 21. Aluno do segundo ano mostrando sua interpretação da obra de Srur. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, novembro, 2010.

Figuras 22 e 23. interpretações de alunos do segundo ano da instalação PETS. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, novembro, 2010.

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Figura 24. Desenho de aluno do segundo ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, novembro, 2010.

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Confecção dos brinquedos

Quando foi perguntado aos alunos o que eles gostariam de fazer com as

garrafas pet, todas as turmas mencionaram que gostariam de fazer brinquedos, e assim

surgiu a idéia da confecção dos brinquedos.

Para cada turma, foi escolhido um brinquedo diferente para ser confeccionado.

Combinei com os alunos que o que fizéssemos em sala era segredo, que não

contaríamos para as outras turmas que brinquedo havíamos feito, isso só seria revelado

na exposição final dos trabalhos. Os alunos do segundo ano confeccionaram aquários,

do terceiro ano vai e vem, do quarto ano móbiles, e do quinto ano pega bola.

Mesmo sendo um material de fácil acesso, muitos alunos não levavam as

garrafas para a aula. Alguns porque esqueciam, outros porque os pais vendiam as

garrafas e não davam as mesmas para serem usadas na escola.

Figura 25. Alunos do segundo ano trabalhando na confecção dos brinquedos. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 26. Alunos do segundo ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figuras 27 e 28. Alunos do segundo ano. Fonte. Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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.

Figura 29. Alunos do terceiro ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figuras 30 e 31. Alunos do terceiro ano.

Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 32. Alunos do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figuras 33, 34, 35, 36 e 37 . Alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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A exposição dos brinquedos

A pedido da coordenação da escola, a exposição dos brinquedos foi adiada do

dia 21 de junho para depois das férias de inverno, pois uma personagem da região

conhecido como Zé do Paraíba, um caipira que preza pela conservação da natureza,

iria visitar a escola, e a coordenação achou interessante expor os trabalhos durante sua

visita. O tempo passou, a visita não veio, começou a semana do folclore, e toda a

escola trabalhou sobre os hábitos e costumes da região, e mais uma vez a exposição

dos brinquedos foi adiada, terminada a semana do folclore, veio à semana da pátria, e

depois a semana da criança, no fim das contas só conseguimos expor os brinquedos no

mês de novembro, junto com os trabalhos sobre Manet e Faith Ringgold. Confesso que

isso atrapalhou o desenvolvimento do trabalho, pois as crianças já não estavam mais

com o entusiasmo de antes, algumas nem entraram na sala onde os trabalhos estavam

expostos.

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4.2 LE DÉJEUNER SUR L'HERBE, EDOUARD MANET

Figura 38. Manet, Edouard. Le déjeuner sur l'herbe, 1863 óleo sobre tela Dimensões A: 2.08 ; L. 2.645 ; Musée d'Orsay, Paris, França. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4625373056/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Outubro, 2010. Antes de começar a trabalhar a leitura da obra de Manet, achei importante e

necessário trabalhar sobre urbanização. Para isso conversamos sobre o que eles

achavam de sua cidade, e levantei algumas questões sobre o tema:

− Como você acha que eram as cidades antigamente?

− Você acredita que as cidades sempre foram da forma que são hoje?

− Você acha que antigamente as cidades eram poluídas como hoje?

− O que você acha que contribuiu para a poluição das grandes cidades?

− Como era a sua cidade há 50 anos atrás?

− Imagine como era a sua cidade há 50 anos atrás e desenhe.

− Desenhe como você acha que será a sua cidade no futuro.

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Nos desenhos de como era a cidade no passado, os alunos do segundo ano

desenharam dinossauros, já os maiores desenharam plantações de cana, fazendas, e

carroças.

Já nos desenhos de como eles imaginam que será a cidade no futuro, a maioria

desenhou grandes cidades como as atuais, com muitos prédios e helicópteros

sobrevoando as mesmas. Um único aluno confirmou isto verbalmente ao comentar seu

desenho, “acho que no futuro vai ter algum prédio, e quem sabe até com elevador!”

Figura 39. Pessoas fugindo de um dinossauro, desenho de aluno do segundo ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 40. Floresta com um vulcão, desenho de aluno do terceiro ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 41. Fazenda, desenho de aluno do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 42. Fazenda, desenho de aluno do quarto ano Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 43. Plantação de cana, desenho de aluno do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 44. Uma casinha sem nada em volta, só a natureza. Aluno do quinto ano. Fonte. Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 45. “Uma cidade com prédios e quem sabe até com elevador”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 46. Desenho de como será a cidade no futuro. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 47. Desenho de como será a cidade no futuro. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 48. desenho de como será a cidade no futuro Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Conversando com as crianças percebi uma grande decepção deles em relação a

cidade de Canas. Ouvi muitos comentários do tipo “Essa cidade não tem nada”, ou “A

gente vive aqui e não tem nenhum lugar legal pra passear, nada para fazer.” Foram

muitos comentários negativos, que me fizeram conversar com outros colegas

professores que residem na cidade, para minha surpresa os comentários deles também

foram negativos. Procurei saber o que há na cidade, como fábricas, hotéis fazenda, e

me informar sobre um sítio arqueológico sobre o qual tem placas espalhadas pela

cidade, e também sobre a biblioteca municipal. Para meu espanto, a biblioteca não

funciona e o sítio arqueológico é um terreno onde não há nada. Sobraram as cerâmicas

da cidade, fábricas de tijolos e telhas onde os pais de alguns alunos trabalham ou já

trabalharam.

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Figura 49. Biblioteca Pública Municipal de Canas. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Processo de valorização da cidade

Agendamos uma visita da turma do quinto ano em uma das cerâmicas, a

prefeitura cedeu um ônibus para o passeio. Visitamos desde o lugar onde é despejada

a argila até o local de secagem dos tijolos, conhecemos todo o processo de fabricação

dos tijolos.

No ônibus a caminho da cerâmica, conversamos sobre o que iríamos ver, e

comentei que as telhas são objetos que tem design, que não é a toa que elas têm

aquele formato, que existe uma razão para o material das telhas ser aquele. Comentei

que a fabricação das telhas mudou muito através dos tempos, que antigamente as elas

eram moldadas nas coxas das escravas, que depois vieram às olarias manuais e por

fim as mecanizadas, como a que nós iríamos visitar naquele dia. Inicialmente minha

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intenção era levar as crianças à cerâmica mais moderna, e em outro dia em uma olaria

que ainda trabalha de forma manual, mas não foi possível realizar o segundo passeio.

Um dos alunos perguntou ao funcionário se o forno onde é feita a queima dos

tijolos poluía muito o ar, outro perguntou de onde vinha a madeira utilizada nos fornos.

Ao final da visita, enchemos várias sacolas com argila que ganhamos do dono da

fábrica.

Antes de voltarmos para a escola, aproveitei que era dia de feira e pedi ao

motorista que nos levasse até lá. Passeamos pela feira, vimos vários pequenos

agricultores da cidade, entre eles alguns pais de alunos, que mostravam as barracas

dos pais com orgulho. Quando estávamos no ônibus, alguns alunos me pediram algo

inesperado: para eu levá-los a um museu. “Tia, a senhora pode levar a gente no museu

na próxima vez?” “A gente se comportou bem, né tia? Então leva a gente!” Todos

começaram a pedir a mesma coisa: uma visita ao museu. Expliquei para eles que não é

algo que eu poderia fazer sozinha, mas que eu falaria com a direção e com a prefeitura

para ver se existia essa possibilidade, e que se a resposta fosse positiva eu sem dúvida

os levaria.

Os alunos gostaram muito do passeio e voltaram para escola, felizes,

comentando que nunca tinham passeado na feira, nem ido visitar a cerâmica, e como

eles gostaram de saber que tinha um lugar que fazia “coisas importantes que vão virar

a casa de alguém” na cidade deles.

Na aula seguinte conversamos sobre o passeio, e para minha felicidade, a

opinião dos alunos sobre a cidade era diferente, não era mais de uma cidade que não

tem nada, mas sim de uma “cidade pequena, por isso é diferente do que a gente vê na

televisão, mas aqui é legal também!”

Um grupo de alunos se mobilizou e foi até a direção pedir que eu os levasse a

um museu (qualquer um segundo eles, pois apenas queriam ver como era um museu

de verdade e o que havia lá). Conversei com a coordenação e direção da escola, e

infelizmente fui informada que os ônibus da prefeitura são muito velhos, e que seria

impossível fazer tal passeio. Confesso que fiquei aborrecida quando alguns meses

depois fiquei sabendo que a prefeitura estava promovendo um passeio de alunos de um

projeto apoiado pela mesma até o Hopi Hari, em um ônibus da prefeitura. Um dos

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alunos que havia falado com a direção da escola comentou: “Viu só tia? Pra isso tem

ônibus, me falaram até que eles vão comer no Mac Donalds.”

Figura 50. Alunos do quinto ano a caminho da visitação na fábrica de cerâmica. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 51. Chegada na fábrica de tijolos. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

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Figura 52. Alunos durante a visita na fábrica de tijolos. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

Figura 53. Tocando os tijolos recém moldados. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

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Figura 54. Tocando os tijolos recém moldados. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

Figura 55 . recolhendo argila para a escola. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Outubro, 2010.

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Leitura da imagem

Le déjeuner sur l'herbe

Quando comecei a trabalhar com essa obra de Manet, sabia que o que mais

chamaria atenção das crianças seria a moça nua, afinal é o que mais chama atenção

de todos que observam a obra pela primeira vez. Preocupada com esse fato, e

conhecendo os pais de meus alunos, trabalhei apenas com os alunos de 4º e 5º ano.

A primeira reação foi de riso, alguns reagiram com um certo espanto, após

esperar todos se acalmarem e os comentários cessarem, olhei para a imagem e falei:

“Não vejo nada demais aqui, acho que no carnaval aparece muito mais coisa do que

neste quadro.”

Após observarem a obra, foi feita a proposto aos alunos que desenhassem como

seria o cenário desse piquenique nos dias de hoje, e de realizar uma representação da

mesma, com a argila que havíamos pego na fábrica de tijolos.

Quarto ano :

A: - Por que ela está pelada tia?

Professora: O que vocês acham?

B: - O marido dela não quis dar dinheiro pra roupa, e antigamente mulher não podia

trabalhar?

Professora: - Por que tu tens tanta certeza de que a imagem é do passado.

B: - Por causa das roupas deles.

Professora: - e se esse piquenique fosse hoje, como seria a paisagem atrás deles?

A: - no mato, do mesmo jeito.

Professora: - é verdade, ainda existem lugares assim, mas é cada vez mais difícil de

achar. Aos poucos os lugares vão sendo urbanizados.

A: - em são Paulo não tem lugar assim, é tudo cidade!

Professora: - vocês poderiam imaginar como seria esse piquenique hoje e desenhar pra

mim?

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Figura 56. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 57. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 58. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010

Quinto ano A: - coitada da moça, tão desprotegida sem roupa tia.

Professora: - tu achas? A expressão do rosto dela não parece desprotegida.

B: - ela é escrava desses homens, a minha mãe falou que antigamente as escravas

andavam sem roupa.

Professora: - mas, se ela fosse escrava, será que iriam deixar ela sentar assim junto

deles?

V: - eu acho que ela tá de safadeza com esses dois no mato.

Professora: - safadeza porquê? Eles não estão fazendo nada.

V: - a tia... mulher pelada assim no meio de homem não é direito.

A: - deixa de ser bobo, a tia nao ia mostrar pra gente se fosse coisa que não presta!

Professora: - Vamos deixar o fato dela estar nua de lado um pouco, e pensar em outra

coisa: se esse piquenique fosse hoje, como vocês acham que seria a paisagem atrás

deles?

A: - cidade, prédio, casas, hoje eles fariam piquenique em uma praça!

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Professora: - vocês poderiam imaginar como seria esse piquenique hoje e desenhar pra

mim?

Figura 59. “A moça hoje ia poder sentar sozinha, só que na cidade”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 60. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

Figura 61. Interpretação de Le déjeuner sur l'herbe, aluno do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Figura 62. “Se fosse hoje, um deles ia ter um laptop na mão”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Novembro, 2010.

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Por acreditar que quanto mais imagens forem apresentadas aos alunos, maior

será a possibilidade de entendimento acerca do que está sendo estudado, e como eu

ainda não estava convencida de que os alunos tinham entendido o que era releitura,

pois através dos seus desenhos vi que muitos estavam apenas desenhando o que viam

e pareciam não conseguir imaginar aquelas pessoas em um outro cenário, achei que

seria benéfico mostrar algumas releituras da mesma obra que estávamos estudando

para que pelo pensamento visual entendessem que releitura não é cópia mas

reelaboração gráfica e interpretativa. Pensando na multiculturalidade, escolhi

interpretações de artistas de diferentes lugares, como a Turquia, China, Estados

Unidos, França, Inglaterra e Espanha. O que pretendi foi aguçar a curiosidade para que

os alunos não se conformassem em apenas com a reprodução. Como diz Sandra

Richter,

Agir em termos de possibilidades é agir com imaginação e criatividade, formulando hipóteses a partir da evocação do que se sabe e da previsão do que pode ser. Condição que ocorre sempre que a criança, curiosa, não se conforma em só reproduzir aquilo que conhece e passa a reinventar outros modos singulares de fazer, transformando tanto a realidade conhecida pela novidade que conquistou quanto a si mesma pela ação que realizou (RICHTER, p. 187, 2006).

De acordo com diversos autores, como Barbosa(2009, p.39), Rossi (2003, p.19)

e Dutra (2006, p.13 ), cada indivíduo lê uma imagem de maneira diferente do outro,

cada um relaciona o que está vendo com a sua experiência de mundo, com suas

vivências pessoais anteriores, por isso achei que seria interessante para os alunos

verem como outras pessoas haviam interpretado a obra que eles também estavam

interpretando. Embora eu não tenha falado que as imagens que iríamos ver também

faziam menção a Le déjeuner sur l'herbe, os alunos perceberam as semelhanças na

hora, e surpreendentemente pediram para serem fotografados da mesma maneira que

as pessoas são retratadas no quadro de Manet.

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Figura 63. (Le déjeuner sur l'herbe), de Édouard Manet, interpretado pelo grupo Wifipicnic project em Provence, France, data desconhecida. Fonte: Disponível em: << http://www.flickr.com/photos/sachaqs/86213680/>> Acesso em: Novembro, 2010.

Figura 64. Le déjeuner sur l’herbe Interpretação de Pablo Picasso, 1960. Fonte: <<http://www.pbase.com/barthur/image/82140712/original>> Acesso: Novembro, 2010.

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Figura 65. Capa do disco da banda inglesa Bow Wow Wow (1981). Fonte: Disponível em: <<http://en.wikipedia.org/wiki/File:Bowwowwow.seejungle.jpg>>. Acesso em: Novembro, 2010.

Figura 66. Interpretação do artista Americano Bob Kessel, data desconhecida. Fonte: Disponível em: <<http://www.bobkessel.com/>>. Acesso em: Novembro, 2010.

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Figura 67. Personagens da saga Star Wars, de Philip Bond, 2009. Fonte: Disponível em: <<http://www.badlibrarianship.com/2009/09/philip-bonds-le-dejeuner-sur-lherbe.html em 03/02/11>>. Acesso em: Novembro, 2010

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Figura 69. Interpretação do artista chinês Yue Minjun, 1995. Fonte: <<http://www.christies.com/LotFinder/lot_details.aspx?intObjectID=4913768>>. Acesso em: Novembro, 2010

Figura 70. Alunos do quinto ano como uma “banda de rock”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 71. Alunas do quinto ano como “pop stars”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 72. Alunos do quinto ano “como a gente é”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 73. Alunos do quinto ano como “a gente mesmo”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Após apresentar outras interpretações ao alunos, propus que eles fizessem as

suas próprias interpretações de uma maneira diferente, e pedi a eles utilizassem,a

argila que havíamos trazido da fábrica de tijolos que visitamos.

Figura 74. Alunos trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 75. Aluno trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 76. Aluna trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 77. Alunos trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 78. Alunos trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 79. Alunos trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 80. Alunos trabalhando com argila. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 81. Interpretação em argila dos alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 82. Interpretação em argila dos alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 83. Interpretação em argila de Le déjeuner sur l'herbede de alunos do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 84. Interpretação em argila de Le déjeuner sur l'herbede de alunos do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 85. Interpretação dos alunos do quarto ano de Le Dejeuner sur l’herb. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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4.3 TAR BEACH , FAITH RINGGOLD

Figura 86 . Ringgold, Faith. Tar Beach,1988. Acrílico sobre tela, tecido tingido e bordado. Dimensões 74 x 69" , Guggenheim Museum, New York. Fonte: Disponível em: <<http://www.flickr.com/photos/eduardosrur/4625373056/in/set-72157623978422765>>. Acesso em: Outubro, 2010.

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Essa foi a obra que tive mais dificuldades para trabalhar. A primeira delas foi com

as tesouras da escola, elas são para cortar papel, o que dificultou muito na hora de

cortar os tecidos, e outro problema foi em relação ao uso de agulhas. Achei que seria

perigoso para as crianças menores trabalhar com agulhas, então restringi a

interpretação da obra apenas aos alunos dos quartos e quintos anos. Nestas salas me

deparei com outro problema: alguns alunos (e não foram poucos) ficavam espetando os

seus colegas. Mesmo sabendo que o resultado final dos trabalhos não seria o mesmo,

resolvi eliminar o uso das agulhas, ao invés de costurar achei que seria menos perigoso

colar os tecidos.

O que mais chamou atenção dos alunos foi o fato do quadro não ser apenas tela

e tinta, mas também tecido e bordado. Muitos alunos falaram que gostariam de ver, de

tocar a tela. Outros comentaram que as suas mães bordavam e costuravam. Comentei

que no início do ano eu havia ganhado uma manta feita a mão por uma das mães de

meus alunos, e eles começaram a contar com orgulho o que as mães sabiam fazer.

Outro fato que despertou o interesse das crianças foi o da artista não ser

brasileira, pois associaram a imagem que estávamos lendo ao cotidiano das favelas

cariocas. Um dos alunos me perguntou se eu tinha certeza de que ela era americana,

pois no quadro só havia pessoas negras. Eu respondi que nos Estados Unidos também

tem pessoas negras, japonesas, índios, como temos aqui. A reação foi de espanto,

porque eles acreditavam que lá só havia gente “loira de olho azul”. Perguntei sobre os

rappers, ou os artistas como Eddie Murphy, a resposta que ouvi foi “Mas não tem tanto

como aqui né tia?” “Por que a gente só vê quadro de gente branquinha?”. Outra aluna

perguntou em seguida:” tem certeza que essa moça não é do Rio? Isso parece cena de

novela”. Apesar dos problemas relatados anteriormente, quando propus retratar um

cenário da cidade de Canas composto por tecidos todos adoraram a ideia.

Infelizmente devido a péssima qualidade da gravação e ao barulho durante as

aulas, foi impossível transcrever as mesmas.

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Figura 87. Alunos do quarto ano no momento do “fazer”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 88. Alunos do quarto ano no momento do “fazer”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 89. Alunos do quinto ano trabalhando com a obra de Faith Rinngold. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 90. Alunos do quinto ano trabalhando com a obra de Faith Rinngold. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 91. Alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010

Figura 92. Alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 93. Vista aérea da cidade em tecido (trabalho de aluno do quinto ano). Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 94. Interpretação da obra de Faith Ringgold. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 95. Interpretações de alunos do quarto ano da obra de Faith Ringgold. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 96. Interpretações de alunos do quarto ano da obra de Faith Ringgold. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 97. Trabalhos de alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 98. Trabalhos de alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomeq Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 99. Trabalhos de alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 100. Trabalhos de alunos do quinto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figura 101. Trabalhos de alunos do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 102. Trabalhos de alunos do quarto ano. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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4.4 CADEIRA FAVELA, IRMÃOS CAMPANA

Figura 103. Cadeira Favela, Irmãos Campana. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

As fotos das cadeiras foram as últimas imagens que analisamos. Infelizmente,

devido ao planejameto da escola e ao currículo escolar, só consegui chegar a esta

imagem na última semana de aula, pois além das imagens que eu estava trabalhando

com os alunos nesta pesquisa, foi preciso também seguir o planejamento e os projetos

da escola.

Quem é professor sabe como são as últimas aulas do ano letivo: vazias. Por isso

a imagem foi trabalhada apenas com os alunos do quinto ano, em duas aulas, que

merecem ser registradas, pois foram muito produtivas e satisfatórias para mim. Quando

uso essa palavra me refiro ao encantamento das crianças observando as imagens e ao

seu desespero – sim desespero – para conseguirem acabar o trabalho que propus. Por

isso, embora apenas um grupo tenha conseguido esboçar o desenho de uma cadeira

devido ao pouco tempo que tivemos, este trabalho tem para mim o mesmo valor e

importância que as outras imagens tem em minha pesquisa, merecendo ser citado aqui.

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Quinto ano

G: - Nossa! Isso é de verdade tia? Que coisa mais louca!

V: - Meu tio aprendeu a fazer cadeira de prendedor no presídio, é bem parecido. Essa é

de boneca também?

Professora: - é de verdade sim gente, e é uma cadeira tamanho normal, para pessoas

sentarem. Ela foi projetada por dois designers brasileiros conhecidos como “Irmãos

Campana”.

V: - lá vem a tia com essa coisa de Design!

Professora: - (risos) como assim V?

V: - A tia, não consigo entender, pra mim esses dois são artistas

Professora: - Olha V. Tem gente que concorda com o que tu estás dizendo, mas eles

mesmos dizem que são designers, eles tem que projetar o que eles criam de acordo

com as pessoas, por exemplo, uma cadeira é preciso pensar num monte de coisas

como que material eles podem usar, como é feita a estrutura dela para alguém sentar e

ela aguentar o peso, como deve ser o desenho dela pra pessoa se sentir

confortável...eu tenho outras cadeiras deles no meu computador, vocês querem olhar?

Alunos: - sim!

G: - que bonito! Cheio de bichinhos de pelúcia!

Professora: - quero que vocês observem os materias que eles utilizam, estão vendo

como são diferentes?

H: - nem parece cadeira, se eu tivesse uma dessas não ia sentar pra não estragar.

V: - eu não ia sentar porque deve dar aflição sentar num monte de bichos de pelúcia,

deve ser quente pra danar!

B: - mas alguém compra isso?

Professora: - só quem tem dinheiro pra comprar, elas não são muito baratas

H: - quanto custa tia?

G: - onde vende? Eu quero ver! Tem lá no shopping em Guaratinguetá?

Professora: - não tem lá no shopping não, eu também nunca vi uma, mas tenho

vontade.

V: - mas pra mim eles são artistas!

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G: - Vamos fazer uma tia?

Professora: - só no papel... não vai dar tempo de fazer uma cadeira gente, temos só

mais uma aula (senti uma grande decepção dos alunos neste momento) Mas vamos

projetar! Vamos formar grupos e cada grupo vai criar a sua cadeira com o desenho e o

material que achar melhor. Não esqueçam de pensar em materiais diferentes.

Os alunos sentaram e discutiram sobre os materiais que poderiam ser utilizados,

e chegaram à conclusão que as cadeiras poderiam ser de latas de alumínio, garrafas

pet, pedras e bambu.

A aula e o ano letivo terminaram com uma leve frustração por eu não ter a

certeza de ter atingido meu objetivo com a leitura da imagem da cadeira dos Irmãos

Campana, até que no início deste ano, na segunda semana de aula, fui procurada por

um grupo de alunos que me trouxe uma agradável surpresa: eles terminaram de

projetar suas cadeiras durante as férias! Para mim foi muito recompensador ver que

eles estavam levando o que aprenderam em aula para a vida deles, usando seu tempo

livre como as férias para terminar um trabalho apenas por prazer, já que o ano letivo

anterior havia sido encerrado e o trabalho não teria nenhum valor para suas avaliações.

O que chamou minha atenção nos trabalhos que recebi foi a forma como alguns

alunos expuseram suas ideias, um passo a passo de como fazer, quase como uma

receita de bolo. Analisando estes trabalhos com minha orientadora verificamos que

prática eles ligaram a idéia de planejamento à atividade do designer, mas

possivelmente também foram influenciados por programas de TV que ensinam a fazer

artesanato.

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Figura 104. Projeto de cadeira em palha e madeira. “Precisa de bastante palha seca e madeira. Não pode estar molhado”. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 105. Projeto de cadeira confeccionada em corda, bambu e arame. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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“Você vai precisar de 20 fitas de corda, 210 pedaços de arame, 6 pedaços de

bambu e pregos. Como fazer: pegue as cordas, amarre em dois bambus, depois pegue

os restos do bambu e amarre o arame no bambu como a corda, depois amarre os

arames no pau e faça um tipo de balanço”.

Figura 106. Projeto de cadeira confeceionada em bambu. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 107. Projeto em cadeira confeccionada em metal. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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Figuras 108, 109 e 110. Alunos do quinto ano projetando suas cadeiras. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

Figura 111. Esboço de uma cadeira confeccionada com garrafas pet. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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RESULTADOS E CONSIDERAÇÕES FINAIS

As crianças aprenderam para que serve um projeto e puderam executar o

mesmo, nos trabalhos referentes as obras de Eduardo Srur e Faith Ringgold.

Houve também a valorização da cidade onde vivem, reforçando assim o respeito

ao seu meio ambiente. Eles agora não acham mais que a cidade é uma “uma porcaria

que não tem nada”. A visita na fábrica de cerâmica e na feira os fez ver que eles vivem

em um lugar próspero, que mesmo sendo pequeno, produz coisas importantes para a

vida e para o bem-estar das pessoas, e os alunos agora tem esperança de que sua

cidade tem potencial para crescer, e “um dia terá até prédios com elevadores”.

Embora este não seja o conceito contemporâneo de Progresso, nos levou a

conversar sobre a ideia de progresso como qualidade de vida.

A leitura do trabalho de Faith Ringgold juntamente com a obra de Manet deu a

oportunidade de abordarmos a situação das mulheres, das mães que não trabalham

fora de casa para cuidar dos seus filhos, mas que mesmo assim ajudam a aumentar a

renda familiar com a venda de artesanato.

Além disto, a inclusão das crianças aos códigos eruditos de cultura ao mesmo

tempo que valorizamos os códigos culturais de sua comunidade é fator importante para

desenvolvimento de mentes capazes de valorizar diferentes culturas. Mas, um dos mais

importantes resultados obtidos foi a valorização dos alunos em relação ao esforço dos

pais que vendem garrafas, trabalham na cerâmica ou que são pequenos produtores

que comercializam seus produtos na feira livre da cidade. Eles agora acreditam que os

pais mesmo sem saber estão ajudando a preservar o meio ambiente, seja coletando

lixo reciclável nas ruas, trabalhando com adubo orgânico em suas hortas, ou fazendo

sabão em casa com sobras de óleo de cozinha.

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Acima de tudo, o conhecimento crítico do mundo ao seu redor e o

reconhecimento da própria identidade foram os objetivos mais relevantes que atingimos

com o trabalho.

A escolha dos artistas e designers permitiu que entendessem o papel crítico e

analítico acerca da sociedade que a Arte e o Design desempenham assim como a

valorizar o artesanato.

Figuras 112, 113, 114 e 115. Alunos mostrando seus trabalhos. Fonte: Clarissa Palomequé Urbano, Dezembro, 2010.

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