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ano 7 / 2016
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ENTREVISTA
IMUNIDADE BACTERIANAMÚLTIPLAS PERSONALIDADES
Luiz Rodolpho Travassos recorda a participação do pai,
Joaquim Travassos, na criação da SBM
Como funciona o sistema CRISPR, que protege esses micro-
organismos de infecções virais
Técnicas moleculares e de DNA revelam semelhança entre diferentes espécies da
bactéria Bacillus cereus
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60 ANOS DE HISTÓRIAE
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SBM EM FESTA
BIÊNIO 2016-2017 / SBM 2016-2017
Carlos Pelleschi Taborda (ICB-USP)Ana Lucia Figueiredo Porto (UFRPE)
Sergio Eduardo Longo Fracalanzza (UFRJ)
Maria José Soares M. Giannini (UNESP)Gustavo Henrique Goldmann (FCF-USP/RP)
Carla Taddei Neves Castro (FCF-USP)
Waldir Pereira Elias Junior (Inst. Butantã)
Jorge Luiz Mello Sampaio (FCF-USP)
Marcio Lourenço Rodrigues (Fiocruz/UFRJ)
Giliane de Souza Trindade - UFMG
Renato Santana de Aguiar – UFRJ
Luis Henrique Souza Guimarães – FFCLRP – USPIdjane Santana de Oliveira – UFPE
Welington Luiz de Araújo – ICB – USP
Rosely Maria Zancopé Oliveira - Fiocruz/RJ
Iran Malavazi – UFSC
Miliane Moreira Soares de Souza – UFRRJ
Ana Lucia Figueiredo Porto – UFRPE
Célia Maria de Almeida Soares – UFG
Elaine Cristina Pereira de Martinis – FCFRP-USPLeticia de Albuquerque Maranhão Carneiro – UFRJ
Daniel Santos Mansur – UFSC
Fernando Dini Andreote – ESALQ – USP
Afonso Luis Barth – UFRGS
Luiz Fernando Wurdig Roesch – UNIPAMPA
Elizabeth de Andrade Marques, UERJ Roxane Maria Fontes Piazza – IBU
Ilana Lopes B. da Cunha Camargo – FCFRP-USP
Marcela Pellegrini Peçanha – PUC-SP Lucy Seldin – UFRJ
Luis Augusto Nero - UFV
Mateus Matiuzzi da Costa – UNIVASF
COORDENADORES DE ÁREA
Genética de Micro-organismos e Bioinformática
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Ano 7, nº 30
São Paulo: SBM, 2016
Microbiologia in foco
Roxane Maria Fontes Piazza
Periodicidade trimestral
Sergio Eduardo Longo Fracalanzza
Sergio Eduardo Longo Fracalanzza
É com grande satisfação que publicamos a 30ª edição da revista Microbiologia in Foco. Na reportagem de capa, destacamos a comemoração dos 60 Anos de fundação da Sociedade Brasileira de Microbiologia. Por decisão do professor Carlos Taborda, atual presidente, a solenidade foi realizada no Instituto de Microbiologia da Paulo de Góes da UFRJ , que teve pape l preponderante na criação e posterior desenvolvimento da SBM. A ideia era fazer a celebração na instituição onde tudo começou. Para complementar os festejos, nada mais oportuno do que a entrevista da página 6, onde Luiz Rodolpho Travassos, professor titular do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da UNIFESP, fala sobre seu pai, Joaquim Travassos da Rosa, primeiro presidente da Sociedade Brasileira de Microbiologia.
Outros temas importantes são abordados em artigos especiais. Um deles, intitulado CRISPR, o sistema imune adaptativo das bactérias aborda um tema altamente relevante e atual. No locus CRISPR são encontrados genes que codificam proteínas com diversas funções de modificação e interação com o DNA. Essas proteínas são denominadas Cas (proteínas associadas ao CRISPR) e seus mecanismos resultam em um efeito de imunidade da célula bacteriana aos bacteriófagos, protegendo-a de infecções subsequentes, comuns em um ambiente hostil para estes micro-organismos. Aplicações subjacentes desse conhecimento básico, no campo biotecnológico e de síntese artificial de crRNAs, fizeram com que os estudos do locus CRISPR fossem considerados o avanço científico de 2015 pela revista Science.
Já no artigo Bacillus cereus lato sensu: uma única bactéria com personalidades múltiplas? os leitores encontrarão uma discussão sobre a taxonomia e as implicações do estudo deste grupo de microrganismos do gênero Bacillus, particularmente em relação a três espécies: B. cereus, B. thuringiensis, B. anthracis. Estas apresentam grande similaridade genética, mas, historicamente, são consideradas espécies distintas. Entretanto, novos estudos sugerem que essas três espécies seriam, na realidade, um único táxon. As possíveis implicações desses dados são intrigantes, pois mostram que a simples aquisição de plasmídeos parece ser suficiente para que uma espécie apresente características tidas como típicas de outra espécie.
Agradecemos a todos que colaboraram com este número da revista Microbiologia in Foco e contamos com a participação dos colegas para futuras edições.
Circulação
Nacional.Acesso gratuito para
sócios da SBM
Prezado microbiologista,
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Desvendadas as rotas de disseminação da gripe aviária
Fonte: Role for migratory wild birds in the global spread of avian influenza H5N8, Science, 14 de outubro de 2016.
O surto 2014-15 de gripe aviária foi provavelmente iniciado por aves migratórias de longa distância a partir de duas rotas principais – uma que parte do leste asiático (Península
Coreana), passa a norte da costa Ártica da Eurásia e depois segue para o oeste da Europa; e a segunda rota part indo da Península Coreana, seguindo pelo leste até o Estreito de Bering e, depois, rumando para o sul, ao longo da costa da América do Norte. Para identificar as vias pelas quais a doença de e s p a l h o u , p e s q u i s a d o r e s d o G l o b a l Consortium for H5N8 and Related Influenza Viruses (Consórcio Global para H5N8 e Vírus Influenza Relacionados) analisaram as variações do vírus presentes em amostras recolhidas em diferentes locais e épocas ao longo do surto. Depois, cruzaram informações sobre os padrões de migração de aves selvagens com as datas de início do surto em diferentes regiões e com dados sobre o comércio de animais de granja nos países a f e t a d o s p e l o s u r t o . O s r e s u l t a d o s encontrados sugerem que o contato direto com as aves selvagens infectadas, ou indireto, com os materiais contaminados pelas fezes delas, seja a via mais provável de disseminação da doença entre as aves domésticas.
Vírus controlam os ciclos biogeoquímicos dos oceanos Um estudo publicado por pesquisadores italianos, britânicos e franceses na revista Science sugere que as interações entre arqueias e vírus têm um papel até hoje subestimado no funcionamento dos ecossistemas do fundo do mar e nos ciclos biogeoquímicos globais. Para entender o tamanho da participação dos vírus no controle da dinâmica microbiana dos oceanos, os cientistas analisaram amostras de sedimento do fundo dos oceanos Atlântico, Ártico e Pacífico e do Mar Mediterrâneo usando um método molecular que comparou a proporção de genes de bactérias e arqueias liberados pelos vírus e a
quantidade de células bacterianas nas amostras. Os resultados mostraram que o impacto da infecção viral é muito maior sobre as arqueias do que sobre as bactérias. Embora as arqueias representem apenas 12% das células presentes nos primeiros 50 centímetros de sedimento do fundo oceânico, a destruição desse tipo de micro-organismo induzida por vírus corresponde a até um terço da biomassa microbiana morta. Isso significa que o CO liberado pelas arqueias mor-tas por vírus contribui com 15% a 30% de todo o dióxido de carbono gerado pela destruição viral no oceano profundo.
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afeta incidência de doenças infecciosas As mudanças c l imát icas podem promover um aumento do risco das doenças infecciosas? Para investigar o tema, cientistas da Universidade de Toronto, no Canadá, a n a l i s a r a m o i m p a c t o d o f e n ô m e n o meteorológico conhecido como El Niño sobre a incidência desses casos nos Estados Unidos. A metodologia escolhida foi o cruzamento das datas de ocorrência do El Niño com as informações da National Hospital Discharge Survey, uma pesquisa feita com os registros de prontuários de pacientes nos Estados Unidos de 1970 a 2010. A análise
revelou que o El Niño estava associado a uma elevação nos casos de doenças transmitidas por vetores no Oeste do país e a um aumento das doenças gastrointestinais nas demais regiões, particularmente no Nordeste dos Estados Unidos. Para os autores do estudo, os resultados indicam que a mudança climática pode influenc ia r o r i sco de doenças infecciosas com variações regionais.
Fonte: Impact of El Niño Southern Oscillation oninfectious disease hospitalization risk in the UnitedStates, PNAS, 24 de outubro de 2016.
Nota de repúdio contra corte de verbas
A Sociedade Brasileira de Microbiologia vem a público repudiar o corte de verbas para o desenvolvimento científico do Brasil. Em um momento singular com graves problemas econômicos e instituições públicas sendo moralmente questionadas pela população, a comunidade de microbiologistas representada pela SBM ficou estarrecida com as noticias veiculadas na mídia e pela nota de protesto de membros dos Comitês Assessores do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) contra os cortes dos recursos. Ao mesmo tempo que recebemos noticias de cortes nas verbas públicas, deputados apresentam emendas parlamentares para aumentar em bilhões de reais o repasse de verbas públicas aos partidos políticos. O CNPq é uma instituição idônea e essencial para a manutenção do alto grau de desenvolvimento atingido por várias entidades públicas e privadas do Brasil. O atraso no repasse de verbas já aprovadas em editais universais e o corte sugerido de 20% a 30% das bolsas de produtividade em pesquisa ativas deverão ter impacto devastador, no curto prazo, na produção científica e tecnológica do país e, no longo prazo, comprometer a renovação dos grupos científicos. Lembramos que os pesquisadores contemplados com financiamento a pesquisa e com bolsas de
produtividade são regularmente avaliados e auditados quanto ao uso das verbas. Neste sentido, a Sociedade Brasileira de Microbiologia, en t idade representa t iva de c ien t is tas , pesquisadores, professores, tecnólogos, técnicos e de demais profissionais ligados à microbiologia manifesta a necessidade de manutenção e recomposição das verbas destinadas ao CNPq para que o desenvolv imento c ient ífico, tecnológico e de inovação alcançados durante décadas de trabalho não retroceda e aumente a nossa dependência de entidades do exterior.
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Legado pessoal e profissionalcom Luiz Rodolpho Travassos
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Luiz Rodolpho Travassos, filho do primeiro presidente da SBM, herdou do pai a paixão pelas áreas de microbiologia e imunologia. Nesta entrevista, ele recorda o papel de Joaquim Travassos no surgimento da entidade
Em 1956, o microbio-
logista Joaquim Travassos era
apontado como pr imeiro
presidente da recém-criada
Sociedade Brasi le i ra de
Microbiologia. O apreço pela
área foi herdado pelo filho,
Luiz Rodolpho Raja Gabaglia
Travassos, de 78 anos,
professor titular do Departa-
mento de Microbiologia,
Imunologia e Parasitologia da
Universidade Federal de São
Paulo. Nesta entrevista, o
herdeiro do primeiro professor
Travassos fala sobre suas
memórias relacionadas à
criação da entidade, sobre o
legado deixado pelo pai na
área de microbiologia e sobre
os desafios que esse campo
de pesquisa enfrenta.
Joaquim Travassos da Rosa (1898-1967): mérito acadêmico e científico renderam indicação para a presidência da SBM
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Jorge Luiz Rodolpho Travassos
Quais são suas memórias da época em que seu pai assumiu como primeiro presidente da SBM?Eu tinha 18 anos e estava entrando na faculdade de Medicina. Ele foi um presidente de transição, apontado para o posto antes que houvesse a primeira eleição de uma comissão de direção. Meu pai não era uma pessoa que tivesse uma força política no meio, como outros professores. Foi escolhido apenas pelo mérito científico e pelo reconhecimento de seu trabalho.
Que pontos pesaram para essa escolha?Naquela época, ele era um pesquisador com o nome já consolidado por seu trabalho no Instituto Butantan, na pesquisa de bactérias, vírus e ricketsias, destacando-se a toxina estafilocócica, etiologia e imunização na escarlatina, diagnóstico sorológico e vacinas contra o tifo exantemático de São Paulo e Minas e muitos outros. Esse trabalho fez com que ele se tornasse muito conhecido no meio científico. Depois, foi convidado a trabalhar no Rio de Janeiro, para a Fundação Oswaldo Cruz, de onde se tornou diretor, tendo lecionado também no Instituto de Microbiologia da UFRJ, então Universidade do Brasil, onde igualmente dirigiu a Divisão de Virologia.
Como era o envolvimento dele com a comunidade brasileira de microbiologia?Ele foi presidente da Seção do Rio de Janeiro da Society of American Bacteriologists em 1950 e novamente eleito para o período de 1956-57. Foi nessa época que a SBM foi criada, como um braço da entidade americana. Ele também foi um dos impulsionadores da pesquisa científica em Microbiologia no Brasil.
Como avalia a contribuição dele para o surgimento da SBM, que agora chega aos 60 anos?É motivo de orgulho. Esse foi um dos muitos papéis relevantes que ele desempenhou na comunidade científica brasileira. Foi diretor do Instituto Oswaldo Cruz, secretário de Estado do Ministério da Saúde no regime parlamentarista. O exemplo dele me influenciou muito, tanto que hoje sou, como ele foi, membro da Academia Brasileira de Ciências e fiz meu doutorado em Microbiologia e Imunologia. Ou seja, me dediquei às mesmas áreas que ele. Foi escolhido apenas pelo mérito científico e pelo reconhecimento de seu trabalho.
Meu pai não era
uma pessoa que
tivesse uma força
política no meio,
como outros
professores. Foi
escolhido apenas
pelo mérito
científico e pelo
reconhecimento
de seu trabalho
O exemplo dele
me influenciou
muito, tanto que
hoje sou, como
ele foi, membro
da Academia
Brasileira de
Ciências e fiz meu
doutorado em
Microbiologia e
Imunologia
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Num momento em que o surto de microcefalia resultante dos casos de zika colocou a pesquisa brasileira em microbiologia no centro das atenções em nível global, como vê o papel da SBM?
É preciso que os professores tenham recursos para trabalhar. O trabalho na área de ciência experimental é cada dia mais caro. É praticamente impossível produzir pesquisas de qualidade com problemas de
importação, dificuldade de manter laboratórios e de participar de congressos. É preciso que haja investimentos e a entidade pode ajudar a dar visibilidade a essa causa, além de promover cientificamente a área.
Criação do Laboratório de Poliomielite no Instituto Oswaldo Cruz: incentivo de Joaquim Travassos
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SBM em festaEvento científico realizado na UFRJ reuniu comunidade de microbiologistas para recordar
história, celebrar vitórias e comemorar o aniversário de 60 anos da entidade
Em 28 de setembro de
1956, durante o 2o Simpósio
para o Desenvolvimento da
Microb io log ia no Bras i l ,
real izado no Insti tuto de
Puericultura da Universidade do
Brasil – atual Universidade
Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ), um grupo de cientistas
pertencentes à Society of
American Bacteriologists, ramo
do Rio de Janeiro, assinava a
ata de fundação da Sociedade
Brasileira de Microbiologia
(SBM). Por isso, o endereço
escolhido para celebrar o
aniversário de seus 60 anos de
criação da entidade foi o
Anfiteatro do Instituto de Microbi-
ologia Paulo de Góes, na UFRJ.
O evento, para cerca de 100
pessoas, teve início com uma
fala do presidente da SBM,
Carlos Taborda, e do editor da
Microbiologia in Foco, Sérgio
Fracalanzza, que recordaram os
principais momentos da história
da entidade. “Destacamos o
nascimento, a quase morte e a
ressurreição da Sociedade”,
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am
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11
afirma Sérg io. Após sua
fundação, a SBM contava mais
de 300 sócios, mas, com a
dificuldade de organizar eventos
nacionais que congregassem os
pesquisadores espalhados por
todo o país, o interesse foi
caindo, até que as eleições
bianuais da diretoria pararam de
acontecer, no início da década
de 60. A Sociedade só seria
reativada em 1969, com a
realização da 1ª Jornada de
Microbiologia, pelos esforços do
professor Amadeu Cury, então
diretor do Instituto de Micro-
biologia da UFRJ. “A mensagem
que fica é que manter a
entidade viva é responsa-
bilidade de todos”, diz Sérgio
Fracalanzza. O formato escolhido para
comemorar o aniversário da
SBM foi um evento científico,
repetindo o que aconteceu à
época de sua criação. A
programação incluiu confe-
rências sobre o Brazilian
Committtee on Antimicrobial
Susceptibility Testing (BrCAST);
sobre os últimos avanços na
pesquisa para o combate ao
zika vírus e sobre as oportu-
n i d a d e s c r i a d a s p e l a
microbiologia ambiental, além
de uma mesa redonda sobre
patógenos microbianos, que
abordou assuntos como a
resposta do hospedeiro e a
resistência a antimicrobianos. O
coquetel de encerramento
trouxe uma surpresa – os ex-
presidentes da SBM presentes
ao evento foram homena-
geados com um troféu. Os
pesquisadores que colaboram
de forma mais ativa com a
agenda da entidade também
receberam da presidência um
reconhecimento especial.
Cré
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Para a diretoria, garantir a continuidade da
ex is tência da ent idade dependerá de sua
c a p a c i d a d e d e m a n t e r - s e r e l e v a n t e n a s
discussões de assuntos tão variados como
s a ú d e h u m a n a , a g r i c u l t u r a , m i c o l o g i a e
virologia. “A Sociedade precisa ter papel de
destaque na discussão de temas nacionais,
estando sempre disponível para assessorar a
saúde pública, a agricultura etc” diz Sérgio
Fracalanzza. Outro desafio é manter a interação
da comunidade de microbiologistas num país de
dimensões continentais. “Precisamos aumentar
o número de sócios e estimular ainda mais a
participação nos nossos eventos nacionais.
Nosso Congresso é um dos maiores do mundo
nessa área”, completa.
Em 28 de setembro de 1956, durante o 2º
Simpósio sobre o Desenvolvimento da
Microbiologia no Brasil, foi aprovada a criação da Sociedade
Brasileira de Microbiologia, com Joaquim Travassos como presidente
provisório.
Em 1969, numa tentativa de reavivar a Sociedade, durante
a 1ªJornalda de Microbiologia é eleita uma nova
diretoria, com Luiz Rachid Trabulsi como
presidente.
Em 4 de novembro de 1957, com 160
associados em todo o Brasil, foi eleita a
primeira diretoria da SBM, com Genésio
Pacheco como presidente.
Com regionais em 11 estados, em 1959 é
criada a Revista Brasileira de
Microbiologia, editada por Milton
Thiago de Melo.
Devido à impossibilidade de realizar encontros
nacionais, o entusiasmo pela
entidade vai diminuindo e, em 1962, apenas um
associado pagou a anuidade.
Hoje, aos 60 anos, sob o comando do professor Carlos
Taborda, a entidade possui quase 700
associados ativos em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal.
8º
EM MICROBIOLOGIA 2017
CURSO DEAPERFEIÇOAMENTO
Local de realização
Calendário
Informações
De 03 de Fevereiro/2017 a 02de Dezembro/2017.Aulas quinzenais:
Sextas-feiras (19h às 23h) eSábados (9h às 18h).
452 horas compostas por 252horas presenciais e 200 horas
de estudo dirigido.
Carga horária
Até 30 de Janeirode 2017
Prazo de inscrição
Sociedade Brasileira de Microbiologia – Avenida Caxingui, 655 – Vila Pirajussara – São Paulo – SP
+55 11 3037-7095
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Figura 3: Utilização de RNA-guia sintetizado artificialmente e a proteína Cas9 para aclivagem sítio-dirigida de um gene alvo.
Bacillus cereus lato sensu: uma única bactéria com
personalidades múltiplas?
Adriana M. Vivoni; Jeane Q. Chaves & Leon Rabinovitch
O gênero Bacillus forma
um extenso grupo taxonômico
com diversas características
fenotípicas e genotípicas. Esse
gênero é integrado por bactérias
de importância ambiental que
s ã o , n a s u a m a i o r i a , n ã o
patogênicas, e cujo habitat
principal é o solo, onde possuem
um papel importante no ciclo do
carbono e do nitrogênio. A
resistência dos esporos e a
divers idade fisiológica das
formas vegetativas fazem com
que sejam considerados ubíquos,
p o d e n d o s e r i s o l a d o s d e
ambientes como o solo, a água, de
gêneros alimentícios e espécimes
clínicos.
As bactérias deste gênero
são aeróbicas ou aeróbicas
facultativas, porém, algumas
espécies são descritas como
e s t r i t a m e n t e a e r ó b i c a s . O
m e t a b o l i s m o p o d e s e r
respiratório, fermentativo ou
ambos, usando vários substratos,
orgânicos e inorgânicos. No
entanto, a característica mais
m a r c a n t e d o g ê n e r o é a
capacidade de esporulação. Nesse
processo as células vegetativas,
quando em condições específicas,
e m g e r a l d e s f a v o r á v e i s ,
d e s e n v o l v e m u m c i c l o d e
esporulação típico de Bacillus e
gêneros correlatos no qual são
formados esporos bacterianos
que não ex ibem a t iv idade
metabólica e que representam
uma fase altamente resistente
contra um ambiente adverso.Os
bas tone tes são gera lmente
saprófitos e não patogênicos para
o homem ou animais, no entanto,a
espécie B. anthracis apresenta
potencial patogênico, sendo o
agente etiológico do carbúnculo
hemático nos animais e no
homem imor ta l izado pe los
postulados de Robert Koch e do
qual falaremos em detalhes mais
adiante.
Dentro do gênero Bacillus
temos o chamado “grupo do
Bacillus cereus” ou B. cereus lato
sensu. Esses termos se referem a
um grupo de espécies que
apresentam grande similaridade
g e n é t i c a e c u j a p o s i ç ã o
taxonômica tem sido amplamente
discutida. Esse grupo é composto
por sete espécies: B. cereus, B.
thuringiensis, B. anthracis, B.
mycoides, B. pseudomycoides, B.
w e i h e n s t e p h a n e n s i s e B .
cytotoxicus (Lechner et al., 1998;
Nakamura, 1998; Guinebretiere
et al., 2013).
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No grupo B. cereus lato
sensu são três as espécies de maior
r e l e v â n c i a e i m p o r t â n c i a
h i s t ó r i c a : B . c e re u s , u m
reconhecido patógeno de origem
alimentar capaz de causar emese
e/ou diarreia; B. thuringiensis, um
entomopatógeno clássico com
uma ampla gama de atuação em
insetos mas considerado não
pa togênico para homens e
animais; e B. anthracis, o temido
agente do anthrax ou carbúnculo
hemático, que ganhou grande
visibilidade após os ataques
terroristas que sucederam o 11 de
setembro de 2001.
Durante muito tempo
esses microrganismos foram
considerados como espécies
d i s t i n t a s d e v i d o à s s u a s
características, tão típicas e tão
diferentes. No entanto, o advento
d e t é c n i c a s m o l e c u l a r e s
envolvendo o estudo do DNA e a
aplicação dessas técnicas em
estudos taxonômicos trouxeram
outra visão sobre essas três
espécies. Foi demonstrado que a
distinção entre estas espécies do
grupo B. cereus foi baseada
essencialmente nas características
fenotípicas e em propriedades
patogênicas codificadas, muitas
vezes, por genes localizados em
plasmídeos. Esse é o caso da
produção do cristal proteico pelas
células de B. thuringiensis e da
produção de toxinas e de cápsula
pelas células de B. anthracis.
Além disso, observou-se que esses
determinantes genéticos de
pa togen ic idade podem se r
compartilhados entre as espécies
que compõem o B. cereusl.s.,
p r inc ipa lmen te a t r avés da
transferência horizontal de genes
(Stenfors Arnesen et al., 2008).
D o p o n t o d e v i s t a
ecológico, a taxonomia do B.
cereus apresenta-se complexa
q u a n d o c o n s i d e r a m o s a s
variações associadas à simbiose,
como a virulência espécie-
específica. Por exemplo, a
cereulida, normalmente associada
com cepas eméticas de B. cereus,
também é produzida por algumas
estirpes de B. weihenstephanensis
( T h o r s e n e t a l . , 2 0 0 6 ) e
determinadas cepas de B. cereus
podem causar sintomas clínicos
semelhantes àqueles do antraz
pulmonar. Outras propriedades
atribuídas à determinada espécie
podem não ser intrinsecamente
exclusivas, como exemplo, a
psicrotolerância, característica
p r i m á r i a d o B .
weihenstephanensis, que foi
re la tada entre cepas de B.
thuringiensis e B. mycoides.
B. thuringiensis
A s c é l u l a s d e B .
t h u r i n g i e n s i s p r o d u z e m
inclusões cristalinas proteicas,
q u e c o n f e r e m a t i v i d a d e
entomopatogênica para várias
espécies pertencentes a inúmeras
ordens de insetos, destacando-se
Lepidoptera, Diptera, Coleoptera
e Hymenoptera (Schnepf et al.,
1998).
A produção de proteínas
entomotóxicas não é fato único
nas espécies que compõem o
gênero Bacillus. Lysinibacillus
s p h a e r i c u s , L . f u s i f o r m i s ,
P a e n i b a c i l l u s p o p i l l i a e ,
Brevibacillus laterosporuse
certas linhagens do P.lentimorbus
são capazes de sintetizar tais
inclusões proteicas.
E s t a s p r o t e í n a s s ã o
cod ificadas por genes que
geralmente se localizam em
p l a s m í d e o s e , c o m m e n o r
frequência, no cromossomo
bac te r i ano . Os c r i s t a i s de
proteínas são formados por
polipeptídeos, denominados d-
endotoxinas,que compreendem
as toxinas Cry, com atividade
inseticida específica, e Cyt, com
atividade citolítica inespecífica.
A produção desses cr is tais
p r o t e i c o s r e p r e s e n t a u m a
carac te r í s t i ca t íp ica de B.
thuringiensis e o diferencia das
células de B. cereus (Schnepf et
al., 1998).
B. thuringiensis possui
destaque dentro deste grupo
devido à sua importância como
agente de controle biológico.
Essa bactéria é o mais bem suce-
dido princípio ativo bacteriano
21
c o m p õ e m i n s e t i c i d a s
(biopesticidas) de importância
comercial, sendo os produtos com
base nesse ativo responsáveis por
cerca de 90% do mercado no
c a m p o m i c r o b i a n o . S u a s
aplicações para a proteção de
plantações e florestas (controle de
lagartas desfolhantes), bem como
a prevenção de doenças humanas
(controle de larvas do Aedes
aegyptie Culex), são práticas
realizadas em várias partes do
mundo em projetos integrados,
visando diminuir o emprego de
inseticidas químicos, contra os
quais pesa a questão da resistência
de insetos e malefícios que podem
causar ao homem e aos animais.
H o j e e x i s t e m d i v e r s o s
bioinseticidas com base nessa
bactéria, disponíveis no mercado
mundial.
B. cereus
São bactérias amplamente
e n c o n t r a d a s n a n a t u r e z a ,
sobretudo no solo. Originalmente
descrito como um organismo
mesófilo, esta espécie multiplica-
se bem na faixa entre 10ºC a 50ºC,
sendo que a temperatura ótima de
crescimento está entre 28ºC a
35ºC. No entanto, já foram
i d e n t i fi c a d a s e s t i r p e s
psicrotróficas e termodúricas
capazes de se multiplicar na faixa
entre 3ºC e 75ºC. Os mecanismos
de adaptação de B. cereus às
condições ambientais são diversos
e c o n t r i b u e m p a r a s u a
sobrevivência e disseminação no
ambiente (Carlin et al., 2010).
O B. cereus produz uma
variedade de exotoxinas, as quais
são responsáveis pela patogênese
e a maioria das manifestações
clínicas causadas pela espécie. As
doenças alimentares relacionadas
ao B. cereus manifestam-se,
classicamente, sob duas formas
clínicas: a síndrome diarreica e a
síndrome emética.
A síndrome diarreica é
uma in toxicação a l imentar
causada por células vegetativas,
ingeridas como células viáveis ou
e s p o r o s , q u e p r o d u z e m
enterotoxinas prote icas no
intestino delgado, após a ingestão
de alimentos contaminados com
populações de aproximadamente 5 8
10 a 10 células viáveis/g ou mL.
O s a l i m e n t o s m a i s
frequentemente contaminados
incluem produtos à base de carnes,
sopas vegetais, pudins e molhos,
leite e produtos lácteos. Na
maioria dos casos, os sintomas
manifestam-se após 12h do
c o n s u m o d o a l i m e n t o
contaminado, com um período de
incubação compreendido de 8h a
16h, e incluem dores abdominais,
d i a r r e i a a q u o s a ( o u
sanguinolenta) e ocasionalmente
náuseas e vômitos.
Atualmente, entende-se
que a doença alimentar do tipo
diarreico atribuído a B. cereus é
causada por várias enterotoxinas
t e r m o l á b e i s , t a i s c o m o a
h e m o l i s i n a B L ( H B L ) , a
enterotoxina não hemolítica
(NHE) e a citotoxina K (CytK). A
enterotoxina FM (entFM) é
considerada como possível toxina
diarreica, embora não haja relatos
de que a mesma possa ser
causadora de enfermidades
t ransmit idas por a l imentos
(Kotiranta et al., 2000). Porém, foi
re la tado que a entFM está
envolvida com a motilidade
bacteriana, na formação de
biofilme e na adesão do B. cereus
nas células epiteliais.
Asíndrome emética é uma
intoxicação alimentar atribuída a
uma toxina pré-formada no
a l imen to , a ce reu l ida , um
polipeptídio cíclico termoestável
sintetizado por uma enzima
s in t e t a se de pep t í deo não
ribossômico codificada no gene
ces. Esta toxina liga-se nos
receptores do nervo vago aferente
induzindo o quadro emético
caraterizado por ocorrência de
náuseas e vômito (que podem ser
seguidos de diarreia), geralmente
2h após o consumo do alimento
contaminado, com um curto
período de incubação de 30min a
6h. Ao estimular o nervo vago,
inibe a oxidação dos ácidos graxos
pelas mitocôndrias hepáticas,
22
provocando lesões reversíveis nas
células do fígado (Agata et al.,
1996).
Além das doenças de
origem alimentar, o B. cereus pode
c a u s a r a l g u m a s i n f e c ç õ e s
s i s t êmicas e l oca i s , como
s e p t i c e m i a , m e n i n g i t e ,
pneumon ia , endoca rd i t e e
infecções necrosantes (Granum,
1994; Bottone, 2010). Estas
infecções são pouco frequentes e,
geralmente, estão associadas às
hemolisinas, cereolisinas e
fosfolipases produzidas pelo
microrganismo, as quais podem
causar danos extensos nos tecidos
e necrose em órgãos viscerais.
E n t r e a s e n z i m a s q u e
d e s e m p e n h a m u m p a p e l
importante na virulência da
e s p é c i e , b e m c o m o n a
deterioração de diferentes gêneros
alimentícios estão proteases,
fosfolipases, lecitinases, amilases,
colagenases e lípases (Bottone,
2010).
O B. cereus também está
presente no ambiente hospitalar.
Fômites, sistemas de ventilação e
roupas de cama, são algumas das
f o n t e s d e t r a n s m i s s ã o
documentadas de surtos em
unidades de terapia intensiva.A
p r e s e n ç a d e d i s p o s i t i v o s
invasivos, tais como cateteres
intravenosos e umbilicais, sondas
urinárias, além de válvulas
ca rd íacas e marca -passos ,
predispõem à contaminação pelo
bacilo, pois este forma biofilmes
que aderem facilmente a esses
dispositivos, podendo causar
infecção crônica persistente. A
partir do biofilme pré-formado, as
células de B. cereus podem ser
liberadas periodicamente na
c o r r e n t e s a n g u í n e a , s e
dispersando para órgãos distante
causando bacteremia.
B. anthracis
B. anthracis causa uma
doença aguda potencialmente
fatal, o carbúnculo hemático,
também conhecido pela sua
denominação na língua inglesa
anthrax,cuja as mais antigas
descrições datam dos tempos pré-
bíblicos. Em 1877, Robert Koch
descreveu a espéc ie e sua
patogênese, relacionando-a com
carbúnculo hemático e, em 1930,
u m a v a c i n a c o n t e n d o o
microrganismo vivo atenuado foi
descrita por Max Sterne. Com o
advento da vacina, a incidência de
casos de carbúnculo, tanto
humano quanto animal, caiu
drasticamente e, com ela, a
atenção dada à essa bactéria. No
entanto, estudos com intuito de
determinar quais os fatores de
virulência de B. anthracis e como
eles estavam envolvidos na
p a t o g ê n e s e d a d o e n ç a
continuaram a ser conduzidos.
Esses estudos mostraram
que as cepas de B. anthracis
virulentas são caracterizadas pela
p r e s e n ç a d e d o i s g r a n d e s
plasmídeos, pXO1 e pXO2. O
pXO1 carre ia uma i lha de
patogenicidade responsável pela
codificação de três componentes:
o antígeno protetor (PA), fator
edema (EF) e fator letal (LF) que
se unem para formar duas toxinas
ativas. PA funciona como a
molécula de ligação ao receptor
ce lu la r que va i permi t i r a
internalização de EF e de LF no
citosol, onde desempenham seu
papel de toxinas. O plasmído
pXO2 codifica uma cápsula
polipeptídica negativamente
carregadaformada por ácido-poli-
D-glutâmico. Essa cápsula
a p r e s e n t a p r o p r i e d a d e s
antifagocít icas e protege a
bactéria da resposta imune inata
do hospedeiro (Sue et al., 2006).
Esporos latentes de B.
anthracis persistem no ambiente.
Esses esporos podem sobreviver
por longos per íodos e são
altamente resistentes às mudanças
de temperatura. Quando os
esporos são introduzidos em um
hospedeiro mamífero por via
cutânea, gastrointestinal ou
inalatória, eles germinam para
produzir bactérias vegetativas que
podem dividir-se rapidamente e
codificar a cápsula e outros fatores
de virulência, como as toxinas. As
bactérias em divisão requerem a
ação das toxinas para evadir o
23
sistema imune do hospedeiro e se
disseminar, normalmente através
linfonodos regionais associadosà
porta de entrada do agente.
D u r a n t e o p r o c e s s o d e
d i s seminação , ocor re uma
multiplicação exacerbada do
microrganismo, gerando números
muito elevados na corrente
sanguínea, onde a produção das
toxinas leva à letalidade. Com
relação aossintomas, a forma
cutânea da doença énormalmente
associada com edema e necrose,
levando à formação da escara
p r e t a h i s t o r i c a m e n t e
associadacom antraz, enquanto as
fo rmas adqui r idas por v ia
gastrointestinal e inalatória
simplesmente manifestam-se com
sintomas gripais genéricos que,
eventualmente, levam à sepse e ao
colapso vascular semelhante ao
choque (Luna et al., 2006).
N a n a t u r e z a , p o d e m
ocorrer epizootias em equinos,
bovídeos, caprinos e outros
animais selvagens de grande porte
como elefantes, grandes primatas
e rinocerontes. Essas epizootias se
propagam pela ingestão de
vegetação que cresce em solos
contaminados com os esporos de
B. anthracis e também pelo
c o n t a t o c o m c a r c a ç a s
contaminadas.
Em 1979 o primeiro ,
grande surto de antraz humano na
era pós-Sterne-vacinação ocorreu
em Sverdlovsk, União Soviética.
O surto ocorreu após esporos de B.
anthracis terem sido liberados de
uma instalação soviética e causou
96 casos de antraz por inalação em
seres humanos. Em 2001, casos
confirmados de an t raz por
inalação foram relatados nos EUA
em decorrência do envio de
esporos de em cartas B. anthracis
no primeiro uso intencional da
b a c t é r i a c o m o u m a a r m a
biológica. Pequenos surtos da
doença continuam a ocorrer, o
maisrecente sendo de infecções
cutâneas causadas por injeções de
heroína contaminada na Escócia
(Abbara 2014).et al.
As espécies do grupo B.
cereus compartilham um nível
elevado de similaridade genética,
de modo que tanto a hibridização
DNA-DNA, quanto a análise das
sequências do RNAr 16S e
23Snão conseguiram separar
claramente esses taxa que são,
consequentemente, considerados
por alguns taxonomistas como
variantes de uma única espécie,
embora alguns autores reportem
que, pelo menos, o B. anthracis
r e p r e s e n t a u m t á x o n
i n d e p e n d e n t e . A p e s a r d a s
e v i d ê n c i a s c i e n t í fi c a s , a s
característica fenotípicas de B.
cereus B. thuringiensis B. , e
anthracis pesam para que os
mesmo venham sendo mantidos
como espécies diferentes.
No entanto, são vários os
relatos de cepas pertencentes à
uma determinada espécie e que
apresen tam carac te r í s t i cas
fenotípicas e/ou genotípicas
reconhecidas como sendo típicas
de outra espécie. Um exemplo
d i s s o s ã o a s c e p a s d e B .
thuringiensis produtoras de
enterotoxinas, uma característica
inicialmente atribuída ao B.
cereus B. . Desde a década de 90,
thuringiensis vem sendo descrito
c o m o a g e n t e p r o d u t o r d e
enterotoxinas e causador de
intoxicação alimentar. Neste
per íodo, inúmeros es tudos
pesquisaram a ocorrência de genes
de enterotoxinas de em B. cereus
linhagens de . B. thuringiensis
Uma vez que células de B.
thuringiensis provenientes de
aplicações de biopesticidas foram
encontradas em alimentos e
bebidas, a presença de genes que
codificam as enterotoxinas e a
capacidade de produção das
mesmas deve ser considerada,
mesmo que poucos casos de
infecções gastrointestinais por B.
thur ing iens i s t enham s ido
registrados. É possível que em
v i r t u d e d a d i fi c u l d a d e d e
diferenciar o doB. thuringiensis
B . c e r e u s B . o p a p e l d o
thuringiensis em surtos de
d o e n ç a s t r a n s m i t i d a s p o r
a l i m e n t o s p o s s a t e r s i d o
subestimado.
24
Tal fato preocupa e pode
gerar uma série de problemas,
uma vez que produtos à base de B.
t h u r i n g i e n s i s t ê m s i d o
dispersados na natureza para o
controle biológico de pragas
agrícolas e de importantes vetores
de doenças humanas em vários
p a í s e s . A l g u n s a u t o r e s j á
r e l a t a r a m a p r e s e n ç a d e
enterotoxinas em cepas de B.
t h u r i n g i e n s i s i s o l a d a s d e
i n s e t i c i d a s c o m e r c i a i s e
demonstraram que resíduos de
i n s e t i c i d a s à b a s e d e B .
t h u r i n g i e n s i s p o d e m s e r
encontrados em frutas e vegetais
frescos e as cepas isoladas destas
fontes foram potencialmente
enterotoxigênicas(McIntyre et
al., 2008).
Em virtude desse dados há
s u g e s t õ e s p a r a q u e o s
procedimentos de biossegurança
para estas formulações sejam
revistos, e que estes excluam a
u t i l i z a ç ã o d e c e p a s
enterotoxigênicas. Outra opção
para solucionar esse problema
seria a aplicação da radiação gama
(Co60) para inativar esporos em
preparações de biopesticidas de B.
thuringiensis sorovar israelensis
de forma a se evitar a liberação de
esporos viáveis no ambiente.
Como resultado, seria possível a
p r o d u ç ã o d e f o r m u l a ç õ e s
irradiadas que seriam mais
seguras para o meio ambiente e
para os seres humanos, pois a
eliminação dos esporos viáveis
neutraliza o potencial patogênico
de cepas de B. thuringiensis
(Rabinovitch et al. 2014).
Alguns estudos relatam
infecções causadas por B. cereus
que se assemelhavam à forma
pulmonar de carbúnculo. Em
alguns casos as cepas de B. cereus
isoladas abrigavam plasmídeos
q u e a p r e s e n t a v a m g r a n d e
identidade com o plasmídeo
pXO1 do B. anthracis responsável
pela codificação das toxinas fator
de edema, antígeno protetor e
fator letal. Em outros, as cepas
apresentavam produção de uma
c á p s u l a c o m c o m p o s i ç ã o
diferente daquela vista em B.
anthracis e codificada por genes
localizados em um plasmídeo
(Hoffmaster et al., 2006).
Vários casos de infecções
semelhantes ao carbúnculo
ocorridas em animais e causadas
por B. cereus já foram relatados.
Em 2004, várias carcaças de
zebras foram encontradas com
sintomas “carbúnculo-like” na
Namíbia. Foram isoladas dos
animais mortos cepas de B. cereus
que apresentavam um plasmídio
semelhante ao pXO2 e essas cepas
foram denominadas de B. cereus
“zebra-killer”. Mais recentemente
surtos de doença “carbúnculo-
like” foram relatados em primatas
e outros animais em áreas de
reserva na Costa do Marfim e
C a m a r õ e s . E s s a s c e p a s ,
denominadas B. cereus biovar
an thrac i s , ap re sen tam um
cromossoma típico de B. cereus
mas abrigam os plasmídios de
virulência típicos de B. anthracis
(Brézillon et al. 2015).
Todas essas evidências
realmente reforçam a ideia de que,
pelo menos essas três espécies do
grupo do B.cereusl.s. seriam, na
verdade, um único táxon. Essas
evidências também demonstram
que a simples aquisição de
plasmídeos parece ser suficiente
para que uma espécie passe a
apresentar características tidas
como típicas de outra espécie.
Pode-se também especular que o
B.cereus l .s seja uma única
ent idade que comporta um
espectro de indivíduos. Pode-se
imaginar que os indivíduos que
apresentam as características
fenotípicas e patogenicidade
típicas de B. cereus, B. anthracis e
B. thuringiensis formem os
vértices de um triângulo. Dentro
d e s s e t r i â n g u l o e s t a r i a m
posicionados todos os demais
indivíduos que se aproximariam
mais ou menos de cada um do
vértices de acordo com pequenas
diferenças em seus conteúdo
gênicos proporcionadas, na sua
grande maioria, pela aquisição ou
perda de DNA plasmidial. Sob
esse ponto de vista, podemos
25
concluir que apesar do peso dos
fatores históricos e da importância
das características fenotípicas, ao
considerarmos os membros do
grupo do B. cereusl.s. com uma
única espécie, ampliamos os
ho r i zon te s e consegu imos
entender melhor esse grupo de
microrganismos tão fascinantes.
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