Revista Retratos

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REVISTA LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE NORTE DO PARANÁ Edição 1, Ano 2013

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Produção laboratória do 4° ano de Jornalismo/2013 - Unopar.

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REVISTA LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE NORTE DO PARANÁEdição 1, Ano 2013

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expediente

Jornal Laboratório do curso de Comunicação SocialJornalismo da UnoparUniversidade do Norte do ParanáProduzido pelos alunos do 8º semestre de Comunicação Social – JornalismoDiretor Geral: Prof.Rui Fava; Diretora Ensino Presencial: Profª Wilma Jandre Melo; Unidade Catuaí - Diretor: Prof. Mauro TicianelliCurso de Comunicação Social - Prof.Reinaldo César Zanardi; Professor Responsável - Mariana Ferreira Lopes - MTB: 12.549Editor-chefe: Eduardo Assad Sahão; Editores: Bruna Pellegrini, Camila Fagá, Guilherme Michelato, Marcos Belucci, Paulo Ferreira; Editora de imagem: Francine Paladino; Reportagem: Ana Luiza Ré Laço, Bruna Pellegrini, Camila Fagá, Felipe Gomes de Souza, Fernanda Circhia, Guilherme Gimenez, Guilherme Michelato, Marcos Belucci, Paulo Ferreira; Fotografia: Allan Ferreira da Silva; Revisores: Ana Luiza Ré Laço, Felipe Gomes de Souza, Guilherme Gimenez; Arte: Cláudia Milandra; Projeto Gráfico: Bruna Furlan Bozina e Vagner Simões.

CorrespondênciaCentro de CiênciasEmpresariais e SociaisAplicadas - CCESARodoviaCelso Garcia Cid s/nº Km 377 - PR 445Telefone/Fax: (43) 3371-7700CEP 86047-500Londrina - Paraná

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We are young, we run freeComo é a vida dos jovens na atualidade? Foi esta a questão que moveu o interesse dos estudantes de jornalismo na produção da primeira edição da Revista Retratos. A publicação laboratorial

elaborada por alunos do 8º semestre da Universidade do Norte do Paraná tem como objetivo trazer um panorama sobre uma deter-

minada temática por meio de reportagens que contextualizem questões contemporâneas.

A escolha pelo universo jovem veio de indagações de quem vive no seu cotidiano os anseios juvenis, uma vez que a idade da equi-pe da Retratos gira em torno dos 22 anos. Além deste fator, a ju-ventude tangenciou importantes acontecimentos que ocorreram no país ao longo de 2013, como a Jornada Mundial da Juventude

e o protagonismo juvenil nas manifestações de junho. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Ipea, estimou que

em 2010 a população jovem brasileira entre 15 e 29 anos atingiria seu pico. O aumento, cerca de 7% em relação à década passa-da, representaria um número estimado em 51 milhões de jovens,

que se estabilizaria a partir de então. Esta característica de o Brasil ser um país com uma população predominantemente infantil e

juvenil vem da conhecida “onda jovem” das décadas de 1970 e 1980 e parece que irá ser modificada ao longo dos próximos anos.

Mas para além dos números, o que caracteriza esta geração? Uma de suas principais marcas é a imersão na cultura da conver-gência, na qual as relações sociais são constantemente modifica-das. A nova forma de comunicar-se mudou a relação da juventu-de com o mundo e mais profundamente, com a vida. É hipocrisia dizer que não estamos imersos nessa nova realidade. Como isso irá mudar toda nossa relação com religião, valores, cultura, edu-cação, ainda é uma incógnita. E, através do pequeno retrato do cotidiano de alguns protagonistas dessa nova geração, objetiva-

se aqui facilitar o descobrimento dessa terra jovem totalmente inóspita que todos em algum momento já habitaram ou ainda

habitarão.

Boa leitura!Equipe Retratos

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SUMÁRIO

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06 PROTAGONISMO JUVENILLetícia Cardoso da Silva, militante estudantil e negra, fala sobre os jo-vens que estão se organizando para promover mudanças em busca de uma sociedade melhor.

08 JOVENS E SUA FÉAtraídos por novas formas de espiritualidade e por socialização, juven-tude brasileira tem procurado cada vez mais diferentes orientações religiosas.

14 JOVENS EMPREENDEDORES Para os jovens o empreendedorismo pode ser uma saída à falta de vagas no mercado de trabalho.

17 O MUNDO NA PONTA DOS DEDOSEles fazem parte de um novo modelo de sociedade em que a tecnologia está presente em todas as ações, mas afinal, quais os rumos dessa geração 100% conectada?

22 MEU QUARTO, MEU MUNDOA adolescência é o período em que identidade pessoal é construída, por isso, o isolamento, quando moderado, não é ruim, pelo contrário, ele se faz necessário .

VEJA TAMBÉM:

21 CRÔNICA: Faria tudo de novo25 e 26 COLUNAS LIVROS, MÚSICA E CINEMA

05RETRATOS

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O protagonismo juvenil e os movimentos da sociedade civil organizadaLetícia Cardoso da Silva, militante estudantil e negra, fala sobre os jovens que estão se organizando para promover mudanças em busca de uma sociedade melhor.Por FERNANDA CIRCHIA

Nos últimos anos tem-se percebido um aumento sig-nificativo do engajamento de jovens que, insatisfeitos com a situação do país, tentam contribuir na elabora-ção de estratégias capazes de transformar a sociedade. Para entender os motivos e objetivos que levam alguns jovens a organizarem ações coletivas em prol do bem comum, a Revista Retratos conversou com a estudante universitária Letícia Cardoso da Silva, 24 anos, participante ativa de movimentos da socie-dade civil organizada. Confira abaixo a entrevista:

R.R. - Qual sua opinião sobre a politização dos jovens de hoje? Acredita que são politiza-dos? Acredita que estão responsáveis e prontos para lutar pelos direitos que todos merecem?LCS- A politização de jovens está cada vez maior. Hoje com acesso a informação melhorou muito o debate sobre política entre jovens, sem falar dos es-paços que são reservados para a juventude. Temos os Conselhos de Juventude, alguns municípios já possuem secretária de juventude, há programas vol-tados para o jovem e todos esses foi uma conquista dos jovens que buscaram o melhor. E é claro que se considerarmos todo o tipo de jovens vamos entrar em pluralidade. Uma vez vi uma pesquisa, realiza-da pelo Datafolha, que citava que mais de 40% deles acreditavam que podiam mudar o mundo e é esse mesmo número de jovens que são politizados no seu contexto e estão prontos a lutar pelos seus direitos.

R.R - Quando você começou a interessar-se e parti-cipar de movimentos da sociedade civil organizada? LCS – Creio que começou no ensino médio com o grêmio estudantil. Mas quando entrei na faculda-de, passei a participar mais ativamente dos movi-mentos estudantis, primeiro no Centro Acadêmico do meu curso, depois no DCE (Diretório Central dos Estudantes) e a UPE (União Paranaense dos Estudantes). O movimento estudantil me levou para militância em defesa da promoção de igualda-de racial, e foi aí que percebi que ainda temos mui-ta demanda e ações a serem realizadas e efetivadas.

R.R. - Por que os jovens devem participar de movimentos da sociedade civil organizada?LCS- A participação do jovem é muito importan-te, acima de tudo, porque contribui para a forma-ção pessoal e profissional de cada um. Creio que o engajamento permite conhecer situações distantes de sua realidade, fazendo com que os jovens se hu-manizem e entendam o significado do coletivo.

R.R. - Você acredita que os movimentos (es-tudantil e negro) que participa têm ganha-do mais militantes jovens neste ano? Por quê?LCR- Após as manifestações que ocorreram em ju-nho, os movimentos ganharam mais visibilidade, principalmente entre os jovens. Eles começaram a dis-cutir mais sobre temas importantes, como a política e

ENTREVISTA

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a corrupção. Porém, ainda é pre-ciso fazer muita coisa para que os movimentos sejam entendidos como deveriam, e assim, atingir o máximo de pessoas possível.

R.R - Falando nisso, muitos brasileiros diziam que o nos-so país havia finalmente acor-dado. Porém, hoje podemos perceber que os protestos de-ram uma diminuída novamen-te. Qual sua opinião sobre isso?LCS - Os protestos foram funda-mentais para o inicio de um pro-cesso de mudança, no entanto, esta mudança acontecerá de maneira gradual. Vivemos em um país ex-tremamente plural, em questões territoriais, culturais, financeira, por isso as manifestações foram um primeiro passo para uma mu-dança. E o gigante nunca dormiu de fato, devemos considerar os grupos e entidades que saem para a rua para fazer reivindicações e tem conquistado muitas coisas. No fim de 2011, participei de uma passea-ta realizada pela UNE em Brasília, que reuniu 10 mil estudantes para reivindicar que os lucros obtidos com o Pré-sal, fossem destinados exclusivamente à educação. Isso foi um exemplo, mas ocorrem várias lutas que não conseguem mobili-zar um grande número de pessoas como esse, mas mostra que o gigan-te nunca dormiu, e que está na luta.

R.R. - O que você acha que mu-dou após todas as manifestações?LCS - Muitas coisas mudaram. Houve a diminuição ou revogação do reajuste dos valores da tarifa do transporte coletivo público em vá-rias cidades, o que já pode ser con-siderado como uma grande vitória. E mais importante ainda, foram às mudanças ocorridas em fun-ção da pressão popular, por exem-plo, a derrubada da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 37).

R.R. - Quais são as principais causas e lutas do movimen-to estudantil de Londrina? LCS - Uma das pautas norteadoras no movimento estudantil de Lon-drina são as políticas de perma-nência estudantil. Para que o aluno tenha acesso à educação e condi-ções de permanecer estudando, é preciso garantir-lhe o direito ao passe-livre, mais bolsas de estudo, e melhorias no sistema de educação.

R.R. - E o que o movimento es-tudantil significa para você? LCS - Esperança. Quando vejo estudantes se envolvendo com política na universidade, que é uma política de base, eu acre-dito que no futuro vamos ter políticos e cidadãos melhores.

R.R. - E o movimento negro? LCS - Diversidade. Busco um ver-dadeiro enfrentamento ao racis-mo individual e coletivo. Hoje, temos pouquíssimos estudantes negros no Centro de Ciências da Saúde, onde estudo e também, pouquíssimos ocupando espaços no poder. Significa entender que é preciso acabar com a marginali-zação e melhorar as condições de vida dos negros, dando-lhe mais acesso a educação e, consequente-mente, promover a ascensão social.

R.R. - Atualmente, quais são as principais lu-tas do movimento negro?LCS - Em Londrina, lutamos para

o Plano Municipal de Políticas Públicas de Promoção da Igual-dade Racial seja implementado em ações de monitoramento de avaliação. Dentro desse plano, te-mos várias lutas e desafios. Um dos nossos maiores objetivos é trazer o Projeto Nacional – Juven-tude Viva, cujo grande desafio é a busca de alternativas para que os direitos individuais e coletivos, po-lítico-sociais, culturais e educacio-nais, sejam de fato garantidos, res-peitando a Constituição de 1988.

R.R. - Vocês acreditam que ain-da falta muito para todos respei-tarem as liberdades religiosas e raciais? Falta muito, o racismo está muito internacionalizado. LCS- Esse combate ainda está dan-do os primeiros passos, estamos lutando ainda por direitos básicos como garantir aos adeptos das re-ligiões de matrizes africanas o di-reito de atender e serem atendidos nos hospitais. Temos muito que enfrentar para chegar à liberdade religiosa no nosso país e o mes-mo se repete na liberdade racial.

R.R. - Como o movimento lidou com a perda da líder do movimen-to negro Yá Mukumby? O que ela representava para todos vocês?LCS- A morte da Yá Mukumby foi uma perca a nível nacional, ela era uma líder, principalmente, em Londrina. Com o seu falecimen-to, todo o movimento negro uniu forças para lutar pela liberdade religiosa e contra a intolerância.

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A militante Letícia Cardoso da Silva conta que ainda sofre preconceito racial. Ela já chegou a ouvir: “Eu não gosto de gente

negra, mas você é moreninha”.

Crédito: Acervo PessoalRETRATOS

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especial religião

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A Juventude que vive sua

Atraídos por novas formas de espiritualidade e por socialização, juventude brasileira tem

procurado cada vez mais diferentes orientações

religiosas.

Reportagem: Ana Luiza LaçoGuilherme Michelato

Felipe Gomes

Fotografia: Allan Ferreira

RETRATOS

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O que leva a atual juventude a escolher sua doutrina religiosa e es-piritual? Segundo o teólogo Thiago Cantanti, 21 anos, a resposta pode estar nas formas de relacionamen-to da sociedade em que vivemos. “Os jovens estão buscando, dentro das igrejas, pessoas que possam orientá-los em suas vidas, pessoas que possam emprestar seus ouvi-dos e relacionar-se com eles de for-ma que eles se sintam amados em uma sociedade que nem sempre se preocupa com o próximo”, afirma. Para o teólogo, existem dois fatores determinantes na escolha religiosa de um jovem. “Primeiro vem o fator da criação. Quando nasce em uma família de tal reli-gião, o caminho é seguir a mesma. Já o segundo, são as amizades. Se o jovem convive com pessoas que o influenciam positivamente, seja qual for sua religião, tudo coope-ra para que eles se sintam bem e passem a despertar um interesse por aquilo que os amigos falam e, principalmente, vivem”, comenta. Os novos métodos, realiza-dos pelas igrejas para atraírem os jovens, também são citados por Thiago. “Algumas igrejas aderem a shows, campeonatos de skate, even-tos com noites temáticas para cha-mar atenção dos jovens. Felizmente muitas dessas estratégias têm dado certo e a juventude tem despertado o interesse em desfrutar de um re-lacionamento com Deus”, conclui. A busca por uma religião para o jovem de hoje em dia é mais livre do que em outros tempos. Escolher uma determinada doutrina já não é mais algo imposto, mas sim fruto da identificação pessoal e espiritual. A teóloga Amanda Vihagra acredita que a interação entre a igreja e seus seguidores é um cami-nho para atrair mais jovens. “Para ganhar o direito de ser ouvido por esta nova geração, é necessário ter estratégia, criatividade e falar a mesma língua, sem preconceitos

e julgamentos, ou seja, transmitir o evangelho de modo simples para que todos entendam”, defende.Para compreender a relação en-tre juventude e religião, a revista Retratos ouviu o depoimento de sete jovens sobre a doutrina re-ligiosa e espiritual que seguem, inclusive aqueles que não crêem.

CATOLICISMO

O Catolicismo é a mais antiga religião cristã. Com dois mil anos de existência, encontra a necessi-dade de mediar sua doutrina tra-dicional com a sociedade contem-porânea. De acordo com o Censo da Religião realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-tica, IBGE, o número de católicos vem caindo enquanto os evangé-licos cresceu nos últimos 30 anos. A previsão do Instituto é que em até três décadas, as duas religiões estejam empatadas em números. Levando em consideração que grande parte da população conti-nua dentro da igreja, independente da religião seguida, pode-se pensar que muitos católicos estão migran-do para religiões evangélicas. Para a teóloga Amanda Viha-gra, essa troca acontece pela “falta de carisma” da igreja católica. “Os jovens têm visto a crise pela qual a igreja católica tem passado, com seus templos vazios e sua mensa-gem limitada, por isso procuram conhecer a Deus de forma mais espiritual, na busca por barulho, entretenimento e novidades para essa faixa etária. Buscam uma ex-periência pessoal”, aponta. No entanto, ainda se percebe a presença de jovens como Ligia Gomes e Willian Rodrigues, que compartilham do catolicismo. Ela, por influência dos pais, iniciou sua vida na igreja aos oito anos parti-cipando da infância missionária, grupo de evangelização para crian-ças, até se tornar hoje, aos 23 anos,

vice-coordenadora da juventude arquidiocesana de Londrina. Já ele, apesar de contrariado, entrou na paróquia aos nove anos, na ca-tequese, e atualmente participa de missões em prol do próximo. Para Ligia, a igreja sempre foi tratada como sua segunda casa. “Foi onde cresci, conheci pessoas importantíssimas, aprendi valo-res, alimentei a minha fé em Deus. Enfim, foi na igreja que desenvol-vi a minha própria personalidade”, conta. No caso de Willian, o tem-po foi seu maior aliado. “No co-meço não queria frequentar, não gostava. Mas na adolescência, fiz muitos amigos lá e isso me deu mais força para continuar”, diz. Os jovens afirmam que bus-cam viver a risca o que o catoli-cismo propõe. “Não deixo de lado hábitos como ir à missa semanal-mente, comunhão, confissão, ora-ção, castidade e santidade. Pro-curo viver aquilo que é proposto”, confirma Willian. “Os valores da religião, para os jovens que re-almente querem segui-los, é de uma riqueza imensa. Eu vivo a fé católica, com todos seus ensina-mentos e doutrinas”, explica Ligia. Hoje, os dois são praticantes tanto dentro, como fora da igreja. “Atualmente eu participo do grupo de jovens da minha paróquia, sou catequista de adolescentes, vice-coordenadora do setor juventude arquidiocesano, que reúne todos os carismas, os jovens da igreja de Londrina, e também é atuante na Pastoral Juvenil Marista”, esclare-ce a jovem. Já Willian afirma que seu papel é bem mais atuante que antes. “Hoje, participo de mis-sões práticas, como visita a asilos, orientação a adolescentes e vida em comunidades”, ressalta Willian. Entre assuntos debatidos na religião, relacionamentos sempre ganham destaque e ambos con-cordam que manter a castidade até o casamento é fundamental.

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A presença de jovens nas igrejas, independente da religião, é cada vez mais frequente: segundo IBGE, 90% da juventude brasileira segue alguma doutrina.

“Deve ser um namoro saudável, casto. Tem que ser um aprendiza-do conjunto para um crescimento pessoal, espiritual e afetivo, para, no futuro, o casal poder formar uma família através do casamento”, opina Willian Araújo. Para Ligia, o namoro com pessoas de outras re-ligiões é possível. “Talvez os prin-cípios possam não ser os mesmos, mas se houver mesmo o amor, res-peito e desejo de construir aquela relação, acho possível, sim”, afirma. Sobre as diferenças entre a igreja católica e outras religiões, Willian Araújo percebe que é im-portante ficar no propósito maior: Deus. “Acho que a religião é um pretexto para se chegar a um pon-to muito maior, que é Deus. Cada religião tem sua ideologia e tem que ser respeitada, mas o que deve ser mais importante em todas elas é se você vai ser levado até Deus”, aponta. Questionado se a igre-ja sempre está correta, Willian foi claro. “Não, mas acredito que tudo que ela prega tem um funda-mento e um motivo, mas ás vezes não compreendemos”, enfatiza. Já para Ligia, muitos assuntos polêmicos ainda têm que ser deba-tidos pela igreja e todos os católi-cos devem expressar suas opiniões.“Algumas coisas precisam ser re-vistas, como já está sendo feito

com diversos assuntos, entre eles a homossexualidade, a castidade e o aborto. Mas não posso ser um filho rebelde, que não concorda e pula fora. Devo participar das dis-cussões, nos espaços que me cabe, e fazer-me ser ouvida”, concluiu.

JORNADA MUNDIAL DA JUVENTUDE

Em julho deste ano, Willian e Ligia viajaram até o Rio de Janei-ro, ao encontro do Papa Francisco, na Jornada Mundial da Juventu-de (JMJ). De lá, trouxeram novas experiências e a certeza: a igreja faz parte da vida deles. Ligia, que já havia participado da Jornada Mundial realizada em Madrid, na Espanha, em 2011, organizou um grande grupo de sua paróquia para ir ao Rio de Janeiro. “Eu dizia em 2011 que todos que pudessem de-veriam ter essa experiência de JMJ, de Cristo, de juventude”, afirma. Mesmo já tendo ficado perto de outro pontífice, no caso Bento XVI, Ligia Gomes acredita o Papa Francisco é diferente de tudo. “Ele conseguiu trazer um novo ar para a nossa igreja, e não somente para a juventude. Na verdade, acredito que ele impressionou até as pessoas que não são católicas”, diz. “Ele (Papa Francisco) vem tra-

zendo uma nova mensagem para os católicos, e isso tem animado muito os que estavam desanima-dos”, comemora Willian Araújo. Para o rapaz, a experiência foi um momento de reflexão. “Foi ótima a experiência de poder encontrar outros jovens que vivem como eu vivo, e buscam o que eu busco. Pude refletir sobre vários aspectos da minha vida. Participei de ativi-dades, palestras, catequeses, feiras de apresentação, rezamos, convive-mos com pessoas diferentes”, conta.

ASSEMBLÉIA DE DEUS

Uma pesquisa realizada pelo IBGE chama a atenção ao revelar que 17% dos jovens no Brasil, en-tre 15 e 29 anos, são evangélicos. O estudo ainda afirma que desde, a última pesquisa, feita no ano de 2000, o aumento foi de 61%. Muitos dos ex-católicos migra-ram para religiões pentecostais, que adotam um estilo doutriná-rio mais inspirado no cristianis-mo primitivo e nos dons do Es-pírito Santo, que são sabedoria, conhecimento, fé, cura, mara-vilhas, discernimento, profecia, fala e interpretação de línguas. Sabendo disso, os pentecostais vêm se preparando para receber esses novos seguidores, como ex-plica o diácono da igreja Assem-bleia de Deus, Leandro de Souza, de 29 anos. “Minha função como diácono é auxiliar a todos den-tro da igreja, desde o pastor até os novos seguidores, inclusive os fiéis que migram da igreja cató-lica. Nós ajudamos essas pessoas e tratamos bem, para que pos-sam permanecer conosco”, diz. Essa aproximação da igre-ja com seus seguidores podeser um fator favorável na escolha do jovem pela religião. “Os jovens que buscam a Assembleia de Deus têm como objetivo principal en-contrar Jesus e o que ele tem pre-

10Crédito: Ana Luiza Laço

RETRATOS

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Culto da Bola de Neve: A seita religiosa, muito procurada pelos jovens brasileiros, é

conhecida por pregar seu evangelho nos ritmos do rock,

pop e reggae.

parado para nós desde a criação do mundo. Aqui o jovem recebe um acompanhamento e encontra um respaldo espiritual”, explica. Os jovens são tratados como peças fundamentais para qualquer religião, pois podem significar o futuro da igreja. De acordo com Souza, a Assembleia de Deus evo-luiu neste quesito, e, hoje, trata sua juventude de uma forma diferente. “Os jovens têm bastante interação. Nem sempre foi assim, mas atu-almente a igreja cuida deles com mais carinho. Existe grupo de jo-vens, grupo de louvor, onde todos cantam juntos. Aos domingos pela manhã temos uma escola bíbli-ca dominical, onde nós passamos uma hora e meia debatendo a bíblia e aprendendo um com os outros. E, fora da igreja, nós fazemos alguns retiros, que são quando vamos para alguma chácara passar o final de se-mana e conciliar a palavra de Deus com diversão”, explica Leandro. Para viver o pentecostes, a As-sembleia de Deus têm doutrinas consideradas rígidas. Porém, Le-andro de Souza simplifica as ca-racterísticas de seus seguidores. “Nós estamos focados em nos-so destino, ou seja, um algo que Deus preparou para gente. Por isso estamos dentro da igreja, em busca de um futuro melhor. Pre-zamos honestidade, caráter, mo-ral, responsabilidade e procurar dar um bom testemunho”, afirma. O jovem diácono finaliza ex-plicando a sua definição de fé. “É um sentimento imenso que tra-go dentro do meu peito com re-lação a um ser espiritual, um ser que governa todas as coisas. Por ele nós vivemos, ele é a razão da nossa vida. A minha fé é o que me alimenta, me da esperança dede que um dia eu vou encontrar com ele e vou morar no céu”, pontua.

BOLA DE NEVE Ter tatuagens, brincos e pier-

cings é pecado perante a igreja? Segundo a religião sensação dos jovens, não. Essa é a Bola de Neve, doutrina fundada em 2000 por Ri-naldo Luís de Seixas Pereira, mais conhecido como Apóstolo Rina. A Bola de Neve procura defender os princípios básicos do cristia-nismo de forma mais livre e sem preconceitos. O nome vem da ideia principal da igreja, que visa cres-cer e se espalhar durante os anos. Com sua liturgia informal e o slogan “In Jesus We Trust” (Em Je-sus Nós Confiamos), a seita veem conquistando adeptos, principal-mente entre os jovens, que gos-tam da liberdade e da pregação praticada no santuário. É o caso de Diego Natan Ramiro, 23 anos, que entrou na igreja para preen-cher um vazio que existia dentro de si. “Eu estava precisando de algo em minha vida que não era pre-enchido com amigos, balada ou bebidas”, explica o jovem que fre-quenta há seis anos a comunidade. Para Diego, um fato mar-cante foi sua recepção den-tro da igreja. “Quando eu en-trei eu fui muito bem recebido. Per-guntaram quem eu era realmente, como eu estava me sentindo. Nãoera apenas um protocolo a ser se-guido”. Segundo Natan, os hábitosdos frequentadores da Bola de Nevesão os mesmos de qualquer outra

pessoa na juventude. “Nós não so-mos tão diferente como todos ima-ginam. Estamos por dentro de tudo que está acontecendo no mundo, estudamos, nos divertimos, mas sempre colocando Deus no cen-tro de nossas vidas”, esclarece. Hoje, com as redes sociais em alta, o jovem cristão acredita que as novas tecnologias têm papel fun-damental dentro da igreja. “Não somos alienados, somos mais atu-ais que muita gente por aí. Precisa-mos impactar os jovens e para isso é necessário saber o que eles gos-tam e o que pensam. A tecnologia está aí para isso”, afirma o rapaz.Como qualquer escolha na vida, a escolha religiosa também enfrenta alguns preconceitos. No caso de Diego, a crença em Jesus supera isso. “Já aconteceu, mas hoje meu testemunho vale mais que a pa-lavra “religião”. Religião aprisio-na, Jesus Cristo liberta”, enfatiza. Apesar da liberdade pregada pela Bola de Neve, quando o as-sunto é relacionamentos, o jo-vem se mostrou mais cauteloso.“Somos totalmente contra a ter vários relacionamentos. Prega-mos a santidade, como não fazer sexo antes do casamento. Talvez isso seja duro de ouvir e colocar em prática nos dias atuais”. Con-cluindo seu pensamento, Diego Ramiro não acredita em relacio-

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Crédito: A

na Luiza Laço

RETRATOS

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namentos entre pessoas com re-ligiões diferentes. “Não há como uma mesma fonte jorrar água doce e água salgada. O casal deve olhar para um lugar e seguir. Se os dois estiverem caminhando para di-reções opostas eles vão ficar pa-rados e não vão fluir”, aponta. Convicto de sua escolha, o jo-vem ressalta que não existe igreja perfeita. “Não existe religião to-talmente correta. A Bíblia, sim, está totalmente certa. Somos hu-manos e erramos, precisamos ser tolerantes com os erros dos outros para crescermos juntos”, afirma.

MÓRMONS

A Igreja de Jesus Cristo dos San-tos dos Últimos Dias, mais conhe-cida como mórmons, foi instaura-da por Joseph Smith Jr., em 1830. A igreja vem crescendo gradativa-mente desde seu nascimento, sen-do atualmente a 15° denominação religiosa do mundo, com mais de um milhão de adeptos só no Brasil.Um desses frequentadores é Bru-no Panza, 27 anos, participante da religião há sete anos. “Desde criança sempre frequentei en-tidades religiosas, seja católica, evangélica, porém nunca tinha me batizado. Com 20 anos eu sabia o que queria da vida, mas faltava um caminho a seguir. Foi quando um amigo me levou ao “Instituto”, umcentro onde se estuda a Bíblia, es-tudos sagrados e o Livro Mórmon.

Gostei bastante e se tornou indis-pensável em minha vida”, conta. Segundo o jovem, os hábi-tos de um mórmon são os mes-mos de qualquer outra pessoa.“Estudamos, trabalhos, prati-camos esportes, vamos ao ci-nema. Somos iguais a qual-quer outro jovem”, relatou. O trabalho voluntário é um dos destaques da igreja, de acor-do com Bruno Panza. “Todos nós somos voluntários, nem mesmo o bispo tem remuneração. É gra-tificante ver a benção na vida das outras pessoas e, principalmen-te, na sua própria vida”, destaca. E como diferencial perante as outras igrejas, o jovem religio-so cita os trabalhos missionários. “As pessoas doam dois anos de suas vidas, vindas de qualquer lugar do mundo, em prol daque-les que ainda não receberam oevangelho. Eu não tive oportu-nidade de realizar esse trabalho, mas um dia o farei”, diz o rapaz. Apesar de não ser uma religião antiga, as novas tecnologias são tratadas como essenciais. “Todonosso material está disponível na web, podendo ser instalados em ce-lulares, tablets. Particularmente, eu acredito que Jesus Cristo também usaria todos esses recursos, caso ele estivesse aqui hoje”, afirma Panza. Bruno acredita que não exis-te preconceito contra os mór-mons, mas sim uma distorção. “Muita gente confunde e, equi-

vocadamente, confunde nos-sas doutrinas e crenças”, aponta. Sobre relacionamentos, os adep-tos da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias seguem os mesmos princípios das demais religiões. “Ambos devem, primei-ramente, respeitar a si e o próxi-mo, e devem seguir os padrões, como, por exemplo, a castidade”, afirma. De acordo com o rapaz, o relacionamento entre pessoas de religiões distintas não é proibido. “Não há restrições. Eu mesmo, sem ser batizado, conheci minha esposa na igreja, namoramos dois anos e hoje estamos casados e com dois filhos maravilhosos”, conclui.

ESPIRITISMO

Criado por Hippolyte Léon Denizard Rivail, ou simplesmente Allan Kardec, há cerca de dois sé-culos, o espiritismo é uma crença que bate de frente com qualquer outra doutrina religiosa. A religião é descrita por Kardec em cinco li-vros, onde o pedagogo se baseou, segundo ele, nas manifestações de inteligência incorpóreas e imate-riais, denominadas espíritos. Hoje, o Brasil possui a maior comunidade espírita do mundo, com milhões de seguidores e mais de dez mil insti-tuições relacionadas com a crença. Um exemplo da diferença da re-ligião perante as outras doutrinas vem das origens. Para os espíritas, Jesus Cristo não foi enviado à Terra por Deus, mas era um espírito su-perior que servia de exemplo para humanidade. Porém, apesar de dis-cordarem em alguns quesitos, os seguidores do espiritismo também acreditam em Deus, como explicaacreditam em Deus, como explica a estudante Lais Andreolli, de 22 anos. “Acredito em Deus, em Jesus, nas histórias da Bíblia, nos anjos e nos santos. O espiritismo é umacrença em que se prega a palavra de Deus com base na Bíblia e tenta

Grupo de jovens mórmons, em missão pelo Brasil, vai auxiliar

casa de família carente. É tradição na Igreja de Jesus

Cristo dos Santos dos Últimos Dias.

12Crédito: Acervo PessoalRETRATOS

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através dos ensinamentos evoluir a alma. Nós acreditamos que es-tamos neste mundo para, através dos obstáculos do dia a dia, apren-der cada vez mais se tornar um ser humano com boa índole contrito a Deus e sendo assim alcançar a plenitude”, afirma a universitária. A jovem, que seguiu os pas-sos da mãe ao escolher a religião, diz que optou pelo espiritismo de-vido à monotonia das outras reli-giões. “Um fator que me levou a frequentar o espiritismo é devido às outras religiões serem sempre monótonas, seguindo uma re-gra e impedindo que se pudesse estudar mais afundo os ensina-mentos de Deus, questionando o que estava escrito. No espiritismoencontrei pessoas que estuda-ram muito tempo, que são cha-mados de mentores, que estão lá para apoiar em todas as duvidas e sendo assim ajudar em nos-so crescimento intelecto”, diz. Nos centros espíritas, o tra-balho feito com jovens é muito parecido com outras doutrinas religiosas. “Existem grupos de orações para crianças, jovens e adultos, onde, como em qualquer outra igreja, existem horários e dias a serem respeitados. Lá as-sistimos a palestras, lemos livros, a Bíblia e oramos”, explica Laís. Uma das principais característi-cas do espiritismo é acreditar que avida é uma etapa, onde todos estão apenas de passagem, como uma forma de aprendizagem. “A cada evolução que temos estamos mais perto de Deus. Não acreditamos em céu ou inferno, mas sim em pla-nos espirituais. Você vai para o pla-nos espirituais. Você vai para o pla-no que corresponde às atitudes que você teve na Terra”, afirma a jovem. Os espíritas também creem que conseguem comunicar-se com pessoas que já morreram, fato quegerou preconceito à Laís Andreolli. “Muitas pessoas falam e julgam

sem saber exatamente do que estão falando. Existem pessoas que acre-ditam que nos reunimos para en-canar pessoas mortas ou falar com elas. Não digo que isso não aconte-ce, mas não é só isso. Acredito que antes de falar devemos no míni-mo saber do que se trata”, critica. Apesar de convicta dentro do espiritismo, Laís acredita que só terá todas as respostas sobre sua fé após a morte. “Por mais que eu acredite em muita coisa no es-piritismo, existem respostas que acredito que só terei após a mor-te. Ou mesmo respostas que já te-nho talvez possam estar erradas. Não podemos desvendar todos os mistérios de Deus”, completa.

ATEÍSMO

Seguir uma crença e acreditar em Deus é tratado como natural e obrigação para maioria das pes-soas. Já alguns adotam um pensa-mento mais cético. O ateísmo, que significa “sem Deus”, é um questio-namento contra os deuses e qual-quer fato sobrenatural que pode ter acontecido. Para os ateus, que já somam 8% da população bra-sileira segundo o IBGE, a falta de evidências empíricas compravam que não existe divindade na Terra. Uma dessas pessoas é o mes-trando em psicologia Leandro Faz-zano, de 25 anos. O jovem cita sua experiência de vida como o realmotivo para tornar-se ateu. “Foi uma falta de motivos para acre-ditar. Conforme eu fui vivendo e adquirindo mais experiências devida, meu pensamento e minhas crenças evoluíram. Não estou mereferindo a um juízo de valores, ou tentando conotar meu pensa-mento como sendo melhor, ape-nas quero dizer que ele se modifi-cou e se adaptou assim”, afirmou. Apesar de hoje considerar-seum ateísta, nem sempre foi assim. “Nasci e cresci dentro do catoli-

cismo, mas este perdeu o senti-do pra mim. Comecei a estudar mais, e a seleção natural e isso sim começou a fazer mais sentido do que uma crença”, disse Leandro. Segundo o estudante, a exis-tência de um Deus superior é ques-tionável a partir do momento que acontecem fatos que ele poderia impedir. “Se esse Deus é onisciente, onipotente e onipresente, por que não impediu Adão e Eva?”, indaga. Alguns ateus, apesar de não acreditarem em divindades, são muito espiritualistas. Porém, esse não é o caso de Fazzano. “Tenho uma visão um pouco radical, no sentido de não acreditar em es-píritos e almas. Não considero que eu tenha uma espiritualidadeou uma mística espiritual”, afirma. Sem Deus, criador da huma-nidade para os cristãos, os ateus acreditam em seleção natural para existência humana e do mun-do. “Vale ressaltar que o processo de seleção natural não é apenas a evolução da espécie, é também aplicada a nível ontogenético e cultural. Ou seja, toda a aprendi-zagem da pessoa durante sua vida está sujeita ao mesmo principal de seleção pelas consequências que a humanidade esteve e está sujei-ra”, esclarece. Já a morte, é trata-da apenas como o fim. “É apenas o fim da vida. Não existe um de-pois, só deixa de existir”, completa. Tendo uma visão tão diferente da maioria das pessoas, Leandro Faz-zano admite que já sofreu precon-ceito. “Me disseram que eu ‘arderia no inferno’, ou que estava fazendo Jesus chorar. Mas, veja bem, eu não acredito em Jesus e inferno. Como isso poderia me ofender?”, ironiza.Mesmo convicto de sua escolha, Leandro reconhece que possa estar equivocado. “Obviamen-te, posso estar errado quanto a isso, mas dados os fatos e evidên-cias que tenho não consigo che-gar a outras conclusões”, finaliza.

13RETRATOS

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O sucesso profissional muitas vezes está ligado a uma boa for-mação, seja de ensino superior ou técnico. No entanto, uma alterna-tiva viável para quem deseja in-vestir é ser o seu próprio patrão. Segundo a Organização Mundial do Trabalho (OIT), em sua pesqui-sa divulgada em 2013, 74 milhões de jovens, de 15 a 24 anos, estão desempregados, o que representa 12,6% do total dessa faixa etária no planeta. De acordo com os dados, o número deve aumentar até 2017. Cerca de 40% dos jovens de todo o globo procuram por trabalho se-gundo o Manual do Jovem Empre-endedor, elaborado pelo Comitê de Jovens Empreendedores da Fede-ração das Indústrias do Estado de São Paulo (CJE-FIESP). Esta reali-dade se repete no Brasil, uma vez que 3,5 milhões de pessoas nessa

apresentou dados sobre o nú-mero de jovens empreendedores com nível superior entre 2001 e 2011. A pesquisa aponta que, nes-ta década, a quantidade dobrou de 370 mil para 700 mil pessoas.

COMO EMPREENDER?

Para empreender, o interessa-do deve estar atento a elementos fundamentais desde o surgimento da idéia até o nascimento da em-presa como: elaboração do plano de negócios, aporte financeiro, re-cursos materiais e humanos, carac-terísticas do mercado de atuação e do público que irá adquirir os serviços ou produtos, a demanda dos mesmos e documentos para obtenção do alvará de licença.Tudo isto deve ser consi-derado para que o negócio

EMPREENDEDORISMO

faixa etária estão desempregadas. Com o aumento do desemprego entre os jovens, o empreendedo-rismo se torna uma forma de in-gresso no mercado de trabalho. Segundo o CJE-FIESP, empreen-dedor é quem busca realizar coisas novas associando a administração de um negócio. Isto colabora para o fortalecimento econômico local por meio das atividades empresa-riais e, principalmente, da geração de empregos. O interesse por ini-ciativas é algo crescente no Brasil e, hoje, não é incomum encontrar es-tabelecimentos cujos proprietários e/ou sócios sejam considerados jovens e queiram encarar os desa-fios que um negócio próprio exige. Esta tendência é confirmada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que em agosto de 2013

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JOVENS EMPREENDEDORES

Para os jovens o empreendedorismo pode ser uma saída à falta de vagas no mercado de trabalho.

Por CAMILA FAGÁFoto: PAULO FERREIRA

RETRATOS

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tenha uma base firme com admi-nistração de qualidade. O proces-so pode ser auxiliado por meio de consultorias como a do próprio Sebrae, incubadoras das univer-sidades, como a Aintec da Uni-versidade Estadual de Londrina, e iniciativas públicas como a Sala do Empreendedor, que fica localiza-da na Prefeitura de Londrina e até mesmo o Banco do Empreendedor do Paraná, sediado em Curitiba. Estas e outras instituições ope-ram em diversos segmentos, que vão desde o auxílio na elabora-ção do plano de negócios, escla-recimentos sobre as exigências legais, consultoria contábil e ad-vocatícia e também liberação de linhas de crédito e financiamento. É válido lembrar que todo su-porte è necessário e o empreen-dedor não deve esperar retorno financeiro rápido, mas sim a mé-dio ou longo prazo. Ressalta-se que, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Esta-tística (IBGE), de 2007 a 2010, 23,9% das 465 mil empresas aber-tas não passaram do primeiro ano de atividades. Já o Sebrae aponta que 60% dos empreendimentos fecham as portas antes de com-pletarem três anos de existência.

EXEMPLOS DE EMPREENDEDORISMO

Para verificar como jovens estão empreendendo, a Revista Retratos entrou em contato com alguns do-nos de negócio para entender um pouco mais de sua experiência ao abrirem a própria empresa. Entre eles está o do designer Matheus Eduardo Rodrigues Pacheco, 28 , que em abril de 2013, iniciou as ati-vidades de um minibar. Sua idéia é realizar uma espécie de esquenta oficial para as baladas e também um ponto de encontro. “Muitos são profissionais liberais o que me agrada muito porque consigo

conversar sobre várias coisas que me completam. O mais legal que cada um deles se torna uma fonte de informação muito rica”, afirma. A idéia do minibar vem desde julho de 2012, quando achou um ponto na região central da cidade de Londrina, onde fica localizado seu investimento. “O que me fal-tava era encontrar bons exemplos de bares pequenos e com formatos divertidos”, conta. Matheus relata que em uma viagem para Buenos Aires, presenciou várias referên-cias na capital argentina. “Encon-trei um monte de bares estilosos. Fiquei pensando por que não abrir um bar nesse formato? Um deles servia shots (doses) e que a galera ia para lá fazer o aquece. A partir desse ponto comecei a cruzar in-formações, imaginar o que seria o minibar e como ele funcionaria na cidade de Londrina”, explica. O designer diz que teve o auxí-lio de algumas pessoas na execução do seu projeto, sendo por aporte fi-nanceiro ou na própria estrutura-ção do bar. “A ajuda do meu amigo foi prestativa na questão do aluguel do imóvel, pois sem fiador fica bem complicado. Já meus tios e meu avô ajudaram cada um de sua for-ma, seja carregando móveis ou me ajudando a furar paredes”, conta. “Sem contar o cafezinho da mãe”, brinca Matheus. O designer diz que para iniciar o negócio realizou um questioná-rio on-line a fim de saber mais do perfil e preferências do público. “Encaminhei para amigos pergun-

atinge e descobri que é a ter-ceira rua mais movimen-tada de Londrina”, afirma. Segundo Matheus, essa cola-boração do público é muito impor-tante e o retorno tem sido muito bom para o seu negócio, permitin-do até que o minibar se torne uma referência de socialização. “Pessoas que não se encontravam em outros bares, estão se encontrando aqui. O nível de fidelização está vin-do muito alto e rápido”, acredita.Já pensando sobre o futuro do negó-cio, o microempresário afirma que não tem plano de expansão física do bar, mas que possui outros proje-tos futuros. “Tenho planos de criar franquias para algumas cidades universitárias assim que eu alcan-çar um nível que busco”, completa. Para quem deseja empreender, Matheus Pacheco dá suas suges-tões. “Pesquise muito, tenha ami-gos, cuide da família e não queira dar um passo maior que as pernas.Quando você tem seu negócio, quem assume a bronca é você. Além disso, se tiver medo, às ve-zes, de ir um pouquinho a mais, converse com amigos da mesma área que eles vão te ajudar. Não tenha medo de passar experiên-cia para o próximo, o mundo é grande e tem para todo mundo”, afirma o proprietário do minibar. EMPREENDER ESTÁ NA MODA

Vinícius Kurita é um desses jovens que resolveram abrir seupróprio negócio. Com 22 anos

Matheus buscou apoio em seus ami-

gos, tios e avós.

tando o que gostam debeber e o queacham dissoou daquilo.Após essa pesquisa an-dei pela re-gião e vi o impacto que a rua Goiás

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Crédito: Paulo Ferreira

RETRATOS

Page 16: Revista Retratos

ele criou a sua marca de roupas masculinas, que está no merca-do oficialmente há cerca de três anos e já conquistou o seu espaço. Sua experiência trabalhando em grifes de São Paulo fez com que ele sentisse a necessidade de uma linha de vestuário que aten-desse aos gostos do homem mo-derno. A marca idealizada há quatro anos surgiu quando o em-presário Vinicíus Kurita viu uma brecha no mercado da moda. Após passar seis meses nos Estados Unidos, Vinícius captou tendências e decidiu tornar sua boa idéia em um negócio lucrati-vo. Com a ajuda de sua sócia e mãe Cássia Balbinski, seu sonho tor-nou-se real. . “Já é um sonho an-tigo criar uma marca, trabalhei no ramo por um tempo para adquirirexperiência e vi que era o que eu realmente queria. Tive um su-porte familiar muito grande e minha mãe entrou na socieda-de comigo”, comentou Vinícius. A empresa possui dois focos de vendas, pela internet e em lojas multimarcas. Um dos diferenciais da marca é o seu relacionamento com seus clientes, através das redes sociais, como Twiter, Facebook e site. Vinícius acredita que esse rela-cionamento é essencial para o de-senvolvimento da marca. “Acredito muito no poder das mídias sociais, no caso da VK utilizamos elas paradivulgação e vendas. E estou bas-tante satisfeito com o resultado de-las”, comenta. O objetivo do empre-sário é expandir a marca e montar sua loja própria em até dois anos.

FRANQUIAS SÃO OPÇÕES PARA EMPREENDEDORES

Outra alternativa para o jovem que quer empreender sem arriscar-se tanto é aderir ao sistema de fran-quias. Janaina Tróia sempre teve o sonho da independência finan-ceira. Com 21 anos, a empresária abriu uma franquia de produtos naturais em Londrina. A opção de ser uma franqueada foi toma-da com o apoio de seus pais. “A gente estava estudando mais na área de franquia porque não que-ria começar do zero, para já ter umsuporte. Então, optamos pela fran-quia pra ter esse respaldo”, explica. Apesar do sistema de fran-quias ter certa comodidade como fornecedores definidos, planilhas financeiras prontas e sistema de informatização próprio, os futuros empresários têm que ter em men-te que as dificuldades vão existir. Um dos maiores problemas en-frentados por Janaína foi a rotati-vidade de funcionários. Segundo

a microempresária, é difícil en-contrar um funcionário que vista a camisa da empresa e por isso a sua dedicação no começo foi in-tensa. “Quando você abre o pró-prio negocio, no começo você fica escrava dele querendo ou não. No começo você tem que erguer ele e ou você faz ou ninguém faz. En-tão, assim, deu um trabalho, mas um trabalho muito bom. O que eu aprendi nenhuma faculdade ia me ensinar”, comenta Janaina. A empresária que está no úl-timo ano do curso de Direito, ge-rencia a loja e possui um escritório com a mãe. Dividir o tempo entre um negócio próprio e a faculda-de não é fácil, mas também não é motivo para desistir. Ao invés disso, Janaina procurou alguma coisa que a motivasse. “Quando eu abri a loja no segundo ano de faculdade eu estava louca pra lar-gar, agora que eu consegui achar no Direito alguma coisa que mexe com número, com empresa e ago-ra estou me localizando”, comenta.

O Endeavor, organização que pro-move o empreendedorismo através da mobilização de organizações públicas e privadas, realizou uma pesquisa com empreendedores de todo o mundo e identificou as cinco características es-senciais para quem quer empreender.A primeira delas é “comece com o que você tem, ou seja, o futuro em-preendedor deve trabalhar com aqui-

lo que conhece e tem familiarida-de. A segunda é “comece pequeno, mas sonhe grande”, de acordo com a organização você deve trabalhar com os recursos que tem. “Não se pren-da ao plano de negócio”, você deverealizar o plano de negócios mais sai-ba que ele não será seu guia definiti-vo, você pode mudá-lo sempre que precisar. A quarta dica é sobre capi-

tal, “procure investimentos e ganhe conselhos”, você deve procurar in-vestidores e ter em mente que são pessoas experientes e podem te aju-dar. A quinta e ultima dica é “a ex-periência te leva mais longe”, você não precisa se preocupar em errar, é assim que vai aprender a lidar com a dinâmica de ter o seu próprio negocio.

O sistema de franquias fornece ao empreendedor uma opção mais cômoda. Por ser um modelo de

negócios que já está inserido no mercado a chance de sucesso é maior.

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Crédito: A

llan Ferreira

RETRATOS

Page 17: Revista Retratos

TECNOLOGIA

O MUNDO NA

PONTA DOS

DEDOS

Crédito: A

llan Ferreira

Eles fazem parte de um novo modelo de sociedade em que

a tecnologia está presente em todas as ações, mas afinal,

quais os rumos dessa geração 100% conectada?

Por MARCOS BELUCCI

A “geração dedão”

Acordar e checar as notificações que perderam enquanto dormiam. Escovar os dentes conversando com os amigos, almoçar conecta-do, passar o dia interagindo nas redes sociais e não dormir sem ter atualizado tudo o que podiam na-quele dia. Essa é a rotina da maioria dos jovens atualmente.Eles nasce-ram e cresceram com um compu-tador à disposição. Fazem parte de uma nova sociedade em que a tecnologia está presente em todas as suas ações. Em qualquer lugar, sozinhos ou em grupo, é possível encontrá-los manuseando seus dispositivos portáteis (smartpho-nes e tablets), interagindo entre si ou com o mundo, criando e desen-volvendo novas formas de comuni-cação, entretenimento e consumo. Não há fronteira capaz de li-mitá-los. A tecnologia avança de forma desenfreada, se aproveitan-do do novo perfil de consumidor. Os jovens estão mudando as for-mas de se comunicar, informar-

se, divertir-se e, principalmen-te, relacionar-se com as pessoas.Enquanto os jovens de ontem ti-nham o computador como um grande ícone da revolução tec-nológico-cultural, os de hoje ele-geram os smartphones como símbolo de sua geração, que já vem sendo apelidada de “gera-ção dedão” (thumbgeneration, no conceito original, em inglês). Cada vez mais modernos e so-fisticados, os smartphones agre-gam vários recursos em um só apa-relho. É possível não somente fazer uma ligação telefônica, mas enviar mensagens, tirar fotos, filmar, ou-vir músicas, acessar a internet, jogar, interagir nas redes sociais, entre várias outras coisas. E não há dúvida que todos esses recur-sos serão cada vez mais ampliados.

os números e

estatísticas

Com a ascensão da classe média e a queda no preço dos aparelhos, o número de celulares adquiridos no

Brasil nos últimos anos aumentou relevantemente, alcançando um patamar comparável a países como a Alemanha e Japão. De acordo com a pesquisa PNAD 2011, di-vulgada em maio deste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2005 e 2011, a população de 10 anos ou mais que possui um telefone celular para uso pessoal cresceu 107,2%, alcançando 115,4 milhões de pessoas em 2011. Trata-se de quase 70% da população brasileira. Dados divulgados recentemen-te pela empresa de consultoria de mercado IDC Brasil, revelaram que em 2012 foram vendidos 59,5 milhões de aparelhos celulares no país. Um crescimento de 78% em relação ao ano anterior. Deste to-tal, 43,5 milhões foram celulares convencionais e 16 milhões fo-ram smartphones. Praticamente 30 smartphones foram vendidos por minuto no Brasil. Para con-firmar estes números, a equipe da Revista Retratopromoveu uma pesquisa dentro de uma Univer-

17RETRATOS

Page 18: Revista Retratos

sidade privada na cidade de Lon-drina, Paraná. Foram entrevistados 142 estudantes entre 17 e 29 anos de idade. Dentre eles, 70,4% pos-suem smartphones e 29,6% têm celular convencional (Confira o gráfico completa da pesquisa).

totalmente conectados

Não há dúvida que a nova ge-ração está cada vez mais conecta-da com o mundo de várias formas diferentes. Seja em casa, à frente do computador, ou em qualquer lugar através de seus smartphones

ou tablets, os jovens gastam cada vez mais tempo interagin-do com as novas tecnologias. Prova disso é o considerável aumento no tempo médio em que os internautas permanecem online. A equipe da Revista Re-tratos perguntou aos estudantes quanto tempo eles costumam fi-car conectados à internet por dia. O resultado apontou que 47% dos entrevistados que possuem smar-tphones ficam onlineo dia inteiro. Um estudo sobre a internet di-vulgado no começo de 2013, pelo IBOPE Media, revelou que o Brasil

ocupa o ter-ceiro lugar entre os pa-íses com o maior núme-ro de pessoas acessando a web. São 52,5 milhões de internautas bras i le iros , contra in-comparáveis 198 milhões de ameri-canos e 60 milhões de j a p o n e s e s .Em compen-sação, somos o país com o maior tempo de acesso por inter naut a . Em dezem-bro de 2012, por exemplo, tivemos um gasto mensal de 43 horas e 57 minu-tos, enquan-to a França, em segundo lugar, gastou 39 horas e 23 minutos, e a A l e m a n h a ,

em terceiro, 37 horas e 23 minutos.

o poder das redes

sociaias

As redes sociais contribuem e muito para as estatísticas. Nos-sa pesquisa concluiu que 73% dos donos de smartphones usam seus aparelhos para acessar contas no Facebook, Twitter, Instagram, en-tre outros. Segundo o relatório Brazil Digital Future in Focus da comScore, em 2012 os brasileiros passaram pouco mais de um ter-ço do tempo usado para navegar na web utilizando redes sociais. No quesito tempo de uso de smartphones no mundo, o Brasil é líder absoluto. De acordo com o le-vantamento feito no final de 2012, pelo portal CONECTAí em con-junto com a WorldwideIndepen-dent Network of Market Research (WIN), o brasileiro passa em mé-dia 84 minutos por dia interagindo no smartphone. Exatos 10 minu-tos a mais que a média mundial. Mas, entre todas as redes so-ciais, nenhuma supera o Facebook. Conforme as estatísticas do pró-prio site de relacionamento, di-vulgadas em agosto deste ano pela agência de notícias Reuters, o Bra-sil se tornou o principal mercado latino-americano da rede. Até 30 de junho de 2013, a empresa de Mark Zuckemberg atingiu a mar-ca de 76 milhões de usuários ati-vos somente no Brasil. Sendo que mais da metade deles acessam a rede através de seus dispositivos móveis, smartphones ou tablets.

a dependência virtual

Os números nos chamam a atenção para algumas questões sobre os rumos que esta geração tomará no futuro. Uma delas é a questão da dependência virtual. Os jovens não conseguem des-vencilhar-se de seus aparelhos.

18 RETRATOS

Page 19: Revista Retratos

Este é o caso da artista visual Fernanda Silveira, de 22 anos. Ela costuma ficar conectada pratica-mente 24 horas por dia através de seu smartphone de última gera-ção. “A primeira coisa que faço ao acordar é dar uma conferida geral nas notificações. Como meu tra-balho exige que eu esteja conecta-da nas redes sociais, fico on-line a maior parte do dia. E mesmo fora do trabalho, continuo liga-da até a hora de dormir”, declara. Fernanda assume que nunca desligou seu aparelho por livre e espontânea vontade e sente-se to-talmente dependente dele. “Não suporto ficar sem meu celular. Fico desesperada quando acaba a bate-ria e não tenho como carregá-lo. Detesto correr o risco de não ficar sabendo de alguma coisa”, afirma. Assim como ela, a maioria dos jovens também consideram-se de-pendentes. Segundo recente pes-quisa realizada em parceria com o IBOPE Media e o YouPIX, divulga-da pelo portal CONECTAí, 95% dos brasileiros entre 15 e 33 anos con-sideram-se viciados em tecnologia. Poucos são os jovens que ain-da não aderiram totalmente ao uso dos smartphones. O estudante de Farmácia Cássio Ribeiro, 23, por exemplo, prefere conectar-se à in-ternet através de seu computador. “Não me faz falta, prefiro acessar do meu computador”, afirma. Para ele, os aparelhos ajudam muito, mas os recursos complexos do com-putador o tornam mais atrativo. A Gestora de mídias Gabriela Yamamoto, 22 anos, julga-se vicia-da em seu smartphone, mas pro-cura manter o bom senso para que isso não atrapalhe sua vida social. “Se eu saio para encontrar meus amigos, prefiro mantê-lo na bol-sa. Acho muito chato quando al-guém fica com o celular na mão ou na mesa o tempo todo”, comenta. Embora consiga desapegar-se em alguns momentos, Gabriela acaba

recorrendo ao aparelho em ou-tros que, segunda ela, são necessá-rios. “Quando eu fico sem assun-to, ou se o papo está chato, pego o celular. É uma forma de fugir das inconveniências”, completa.

as relações virtuais

É inegável que as relações vir-tuais não devem ocupar maior espaço ou substituírem as rela-ções reais. E esta é mais uma das questões essenciais a serem discu-tidas sobre os rumos desta nova geração. Embora divida opiniões, a maioria dos estudos relacio-nados ao assunto, enfatiza que os jovens estão, cada vez mais, tornando-se seres anti-sociais. Dois livros lançados recente-mente mostram os lados negati-vos e positivos das relações sociais na vida digital. “Networked: The New Social Operating System” (“Em Rede: O Novo Sistema So-cial”, sem edição em português) do sociólogo Barry Wellman e do diretor do Centro de Pesquisas da Internet do Instituto Pew, Lee Rainie, defende que as redes so-ciais são elementos de união. De outro lado, o livro “Vertigem Digi-tal”, do historiador Andrew Keen, procura explicar por que as redes sociais estão dividindo, diminuin-do e desorientando seus usuários. As possibilidades de conexão com várias pessoas em lugares di-ferentes, distantes ou não, somadas à facilidade e velocidade com que as informações chegam a cada um, são grandes atrativos, mas até que ponto essas relações têm alguma relevância na construção social? “O problema não está na tec-nologia em si, mas na forma com que estes jovens a utilizam”, ex-plica o psicólogo especializado em comportamento adolescente Mauro Duarte. Para ele, nenhu-ma tecnologia é boa ou má, mas é preciso aproveitar mais os la-

“Não suporto ficar sem meu

celular. Fico desesperada

quando acaba a bateria e não

tenho como carregá-lo. Detes-

to correr o risco de não fi-

car sabendo de alguma coisa”

dos positivos, como a facilidade de acesso a informação, do que os negativos, como a substituição do contato humano pelo virtual. Mesmo em contato direto, principalmente com as redes so-ciais, a analista de métricas Tatia-na Zimmerman, 26 anos, afirma sentir-se deslocada por não pos-suir um smartphone moderno, e nem ficar conectada o tempo inteiro, como a maioria de seus colegas de trabalho e amigos. Apesar desse sentimento, Ta-tiana demonstra estar preocupa-da com o comportamento de sua irmã mais nova, de 18 anos. “Vejo minha irmã passar horas em seu smartphone, desligada do mundo. Entendo que ela está interagin-do com várias pessoas ao mesmo tempo, mas antes da aquisição do aparelho, os amigos dela viviam

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Crédito: A

llan Ferreira

RETRATOS

Page 20: Revista Retratos

em casa e ela na casa deles. Ago-ra a frequência das visitas dimi-nuiu muito. Se encontram no final de semana e, embora estejam to-dos os presentes de corpo, pare-cem estar ausentes, pois não lar-gam seus smartphones”, comenta.

A construção de falsas

identidades e a artificia-

lidade das relações

Se as novas tecnologias revo-lucionaram as formas de relacio-nar-se entre si ou com o mundo e, consequentemente, transforma-ram os jovens em seres anti-so-ciais, uma outra questão bastante discutida atualmente, é da falsa re-alidade virtual.Todos os dias, mi-lhares de perfis fakes são criados nas redes sociais. Segundo esta-tísticas divulgadas pelo Facebook no ano de 2012, cerca de 83 mi-lhões de perfis da rede social po-dem ser falsos. Quase 10% do to-tal dos usuários ativos no mundo. Definir os motivos pelos quais os jovens optam por assu-mir outras identidades dentro das redes não é tarefa fácil. Se for apenas por diversão ou por uma necessidade de aprovação e aceitação dentro de um ou mais grupos, o fato é que tais fenôme-nos são cada vez mais comuns. Se considerarmos que as re-lações virtuais não são necessa-riamente efetivas como as reais, e que é possível construir ou as-sumir personalidades e identi-dades que nem sempre são con-dizentes com a realidade, afinal, como seria possível discernir o que é real do que é, virtual? O sociólogo espanhol Manuel Castells, teórico sobre a sociedade em rede, defende em seu livro A galáxia da Internet: reflexões sobre a internet, os negócios e a socieda-de, que a proliferação de estudos sobre esse assunto distorceu a per-cepção da prática social da Internet

mostrando-a como o terreno pri-vilegiado para as fantasias pes-soais. Mas segundo Castells, na maioria das vezes, as relações es-tabelecidas nas redes, nada mais são do que uma extensão da vida como ela é, em todas as suas di-mensões e sob todas as suas modalidades. Portanto, não há como separar uma coisa da outra. Se a construção de perfis fakes pode ser, entre outras coisas, uma extensão da própria vida, isto nos sugere que os jovens buscam es-conder-se atrás de alguma coi-sa, ou para libertar-se de si mes-mo, ou quem sabe porque têm medo que a sociedade os repro-ve por algum motivo específico. Para exemplificar, basta ana-lisar os conteúdos que a maioria dos jovens costuma publicar em seus perfis nas redes sociais. É extremamente raro, ver fotos ou comentários de situações desagra-dáveis e tristes de si mesmo. Na maioria das vezes, o que é dividido não se trata de uma real situação, ou seja, há uma grande manipu-

e colocar uma frase de efeito. Pode ter certeza, se fizer direito, todos vão acreditar que está na melhor praia do mundo, tomando o me-lhor drink do mundo”, garante.Se o mundo só existe naquilo que você acredita, essa geração dei-xa de acreditar no que sua vida é, de fato, para acreditar no que gostaria que ela fosse para os ou-tros. É como se pudéssemos en-trar e sair da Matrix, construindo uma vida diferente a cada viagem.Muito embora a tecnologia facili-te muito a nossa vida, ela também pode nos aprisionar, limitando nossa capacidade de lidar com o mundo de forma coesa e coeren-te. Ainda são muitas perguntas para poucas respostas, e não te-mos o distanciamento suficiente para respondê-las. Mas ao longo do tempo, as ciências sociais se encarregarão de ir atrás de res-postas que possam compreender melhor os efeitos destas intensas novidades na vida destes jovens.

lação do que é compartilhado. É como se os jovens tivessem a ne-cessidade de vender-se para os ou-tros o tempo inteiro, e para isso, é preciso mascarar sua realidade.“Ninguém quer parecer ridículo diante dos amigos na internet, por isso posto só o que me convém”, afirma o estudante de Engenharia de Alimentos Carlos André Amo-roso, 22 anos. Segundo ele, sua geração gosta de rir da desgraça alheia, portanto, a não ser quando se está fazendo algum tipo de pia-da, não se costuma compartilhar as besteiras que se faz ou as difi-culdades que se enfrenta na vida. Para Carlos, a internet aceita tudo. “Se estou numa praia, nin-guém precisa saber se ela é boni-ta ou feia, ou se a caipirinha que estou tomando é de pinga ou vo-dka importada. Basta tirar uma foto em um ângulo específico

Gabriela se diz

viciada em seu

smartphone, mas

quando sai com seus

amigos prefere

deixá-lo na bolsa

para não

atrapalhar a saída.

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Crédito: A

llan Ferreira

RETRATOS

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Faria tudo de novo Mal tinha completado 15 anos de idade e teve que sair de casa pra estudar. Saiu do interior e foi pra capital de um estado qualquer. Era 1994. Ele juntou sua ingenui-dade e virgindade na bagagem e partiu sem medo de ser feliz. Sua primeira casa era estra-nha com gente esquisita. Dividia o quarto com um cara que só usava camiseta preta e dormia com a luz acesa. Chorou algumas vezes e pen-sou em voltar, mas preferiu procu-rar outro ambiente menos inóspito. Poucos meses depois, adentra-va pela primeira vez na pensão da Dona Luíza. Casa grande, cheia de estudantes de tudo quanto é lado. Lá,descobriu a vida. Ouviu Mutan-tes pela primeira vez e nunca mais foi o mesmo. Chorou com a mor-te de Senna e fumou seu primeiro cigarro. Depois fumou o segun-do e nunca mais parou de fumar. Semanalmente ia até uma bi-blioteca próxima da pensão, onde adorava tirar longos cochilos na confortável poltrona de couro perfeitamente instalada embai-xo da saída de ar-condicionado. Não era bom nem mau aluno, na verdade, lia bastante e estuda-va pouco. No segundo ano desan-dou. Saiu da pensão e descolou um colchão. O apê era apertado, mas cabia todo mundo. Desbra-vou as fronteiras da percepção e foi até um pouco além. O ga-roto caipira,seduzido pela gera-ção coca-cola, brincou com a li-berdade e tomou pau na escola. De volta pra casa, penou e teve de lidar, pela primeira vez,consigo mesmo. A maiorida-de lhe deu peso e permitiu-lhe loucuras. Enquanto transitava

Quem é o homem mais feliz, aquele que enfrentou a tempestade da vida e viveu ou aquele que permaneceu assegurado na praia e que meramente

existiu? Hunter Thompsonpela poesia e sofria por amores, desdenhava da morte e contes-tava os padrões da sociedade. A faculdade da vida estava ape-nas começando e com a bagagem repleta de sonhos e pretensões, ca-misinhas, discos e livros, ele assis-tiu a sua primeira e verdadeira aula. A pensão da Dona Célia era sua nova casa. O truco valendo a coca-cola do almoço,seu jogo pre-ferido. A filosofia e os Simpsons, o punk e a metodologia, sua diver-são ou frustração de todo dia. Os amigos e professores. Os professo-res amigos. Os amigos professores. Não demorou a perceber que já havia percorrido um longo ca-minho desde que saiu de casa pela primeira vez. Mesmo assim, desde-nhou da sabedoria alheia, desafiou o óbvio e acabou flertando com a política. Realmente acreditou que Marx era um gênio. Depois des-cobriu que ele não era o único. Tomou outra rasteira inesperada e teve que cair na estrada novamente. Resolveu dar uma passada no passado que tanto admirava. Foi ao velho mundo para atravessar a rua do lado oposto aos Beatles e teve a certeza de que a vida era apenas rock n’roll. Ou não!?! Decepcionou-se com a juventude global quando teve que dançar Macarena equanto lhe perguntaram se no Brasil tinha avião. Hora de voltar para casa.Juntou os melhores amigos e mon-tou sua primeira república. Casa grande, um quarto pra cada um. O mundo das ideias nunca fora tão bem aproveitado. Entrou em depressão quando se deparou com Kant e Nietzsche. Travou com Sar-tre e culpou seus pais pela sua exis-tência. Não soube lidar com as pró-

prias emoções.Mas aproveitou cada disco e cada livro emprestado. A loucura era sua fonte de inspiração. A república se desfez e ele deci-diu morar sozinho. Agora sim desfrutava do próprio espaço. Ti-nha até suíte, mas preferia dormir no colchão-sofá da sala. Apren-deu a cozinhar assistindo progra-mas gringos de culinária e nunca mais comeu miojo com salsicha. Na maior cidade do Brasil, ren-deu-se ao caos. Alimentou-se de cultura e bebeu em fontes ines-gotáveis de conhecimento. Far-tou-se. Foi ele mesmo e contou novamente com a sorte. A imen-sidão desordenada nunca o dei-xou sentir-se sozinho. Conheceu tanta gente que imaginou estar no paraíso. Mas o Paraíso era so-mente mais uma estação do metrô. De lá pra cá, muita coisa acon-teceu. E nada vai apagar de sua memória, o exato momento em que encheu sua mochila azul de ilusões e partiu em busca de algo a mais. Clichês a parte, jamais se arrependeu de tudo que passou. Com ou sem culpa, cada tombo lhe deu a experiência necessá-ria para deixar de acreditar que o mundo é muito grande. Para ele, o mundo é tão pequeno que cabe no bolso. Basta sentir na pele. O dia em que saiu de casa a primeira vez foi o dia mais feliz da sua vida. Depois disso, nada se pode garantir além da cer-teza de que, segundo ele mes-mo diz: “Faria tudo de novo”.

Por MARCOS BELUCCI

Trilha Sonora para leitura: Não vá se perder por aí, Os Mutantes

It’s only rock n’roll, Rolling StonesElapartiu, Tim Maia Racional

London Calling, The Clash

CRÔNICA

21RETRATOS

Page 22: Revista Retratos

A adolescência é o período em que identi-dade pessoal é construída, por isso, o isola-mento, quando moderado, nao é ruim, pelo

contrário, ele se faz necessário

Meu quarto,, meu mundo:: meu

universo entre qua-tro paredes!

COMPORTAMENTO

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Por BRUNA PELLEGRINI eFERNANDA CIRCHIA

RETRATOS

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Roupas caindo das gavetas, livros desor-ganizados, embalagens vazias, tênis atira-do em qualquer lugar. Mundo próprio, o quar-to de um adolescente é fácil de reconhecer.Mais do que mero desleixo, este universo particular é um reflexo, um retrato fiel de uma época marcada por anseios, conflitos internos e hormônios em quantida-des torrenciais. Nesta época, o quarto é mais do que abrigo, descanso e dormitório: é um refúgio. Quem vê de fora ou convive por perto tende sempre a dramati-zar: “É um come-dorme, processador de alimentos...”, “fica aí trancado, só sai para comer!”. Será que esta fase é negativa? Certamente que sim. Mas é uma fase essencial para a construção da identidade do jovem. A equipe da Revista Retratos consultou jo-vens, pais, psicólogos e pós-adolescentes para entender melhor este comportamento típico.

Conectado, caseiro e tímido

Ao entrar no quarto do Lucas Pradal, en-contra-se um cenário tipicamente adolescen-te. Guarda-roupa bagunçado, TV ligada, revis-tas em quadrinhos dispersos na cama, pacote de bolacha, tênis jogado e o inseparável notebook. Lucas vive como filho único, já que seu irmão mais velho é casado e mora em outra cidade. Desta maneira, acaba tendo toda atenção dos pais. Mas de acordo com sua mãe, Claudia Pradal, ela não se in-comoda que ele seja caseiro. Até gosta. “Começou apartir dos 11 anos, no início da adolescência. Foi aí que ele começou a querer a privacidade dele”, conta. Claudia já chegou a se incomodar com esse compor-tamento do filho. “Eu pergunto pra ele o que ele está fazendo, eu olho às vezes, porque eu tenho medo, né? Mas eu confio muito nele”, afirma. Hoje em dia, a mãe de Lucas diz entender e respeitar o espaço do filho. Até porque ela e o marido também são assim. “A gente vive unido, mas todos nós precisamos de espaço, donosso tempo. Nós três estudamos, então cada um precisa ter seu tempo, ficar quieto. Aliás, é uma personalidade nossa daqui de casa.”, diz.

“Freud explica”?

A psicóloga infantil, Luciene do Carmo, explica que a adolescência um período critico de definição da identidade. Nesse momento, o jovem faz importantes ajustamentos, como independência emocional, esco-lha de uma vocação, e a própria identidade sexual. “Há uma grande tensão e conflito psíquico. O adolescente tem que aprender a lidar com o corpo e uma persona-lidade em permanente e rápida mudança”, comenta.

A adolescência é conhecida como o processo de transição entre a infância e a vida adulta. Isso explica o apego de alguns jovens com seus antigos brinquedos.“Cada adolescente tem seu próprio tempo.” Tanto o me-nino como a menina que entra na adolescência inicia uma caminhada na qual se dá lentamente o adeus à infância. É normal momentos de inconstâncias, ou seja, uma hora quer os brinquedos e em outros ir às festinhas. Até chegar o momento em que os brinquedos, até então algo inseparável, come-çam a ser deixados de lado”, explica a psicóloga. Luciene entende que o momento de privacida-de seja importante para a construção da identidade dos jovens. “O adolescente precisa de um momen-to só seu, ele precisa de liberdade e de independên-cia para construir o seu próprio caminho. Para os pais esta situação de espera é angustiante, mas ao mesmo tempo sabe-se que ela é necessária”, afirma. Para a psicóloga, os pais devem preocupar-se e considerar o isolamento de seus filhos exagerado quando os mesmo se afastam de forma significativa do âmbito familiar e social e quando demonstram ex-trema dependência por contatos meramente virtuais.Luciene salienta que os exageros são ruins e podem causar danos. “Para os mais retraídos esses quartos são um convite a não se integrarem, nem com a família, nem com ninguém. Os pais devem incentivar hábitos saudáveis, para que a família exista como uma unida-de e todos façam refeições juntos, conversem na sala, saiam juntos, mesmo que uma vez por semana. Isso

Segundo a psicóloga Luciene do Carmo, o adolescente

necessita de um tempo só seu. Apesar da retração natural, os pais devem

incentivar o convívio social e familiar.

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Crédito: A

llan FerreiraRETRATOS

Page 24: Revista Retratos

faz toda diferença na vida do adolescente”, ressalta. A psicóloga explica que os pais antes de qual-quer coisa, devem criar uma relação de confian-ça e amizade com seus filhos. “Muitos pais acre-ditam que não têm mais o quê ensinar nesta fase de rebeldia. Pelo contrário, estudos comprovam que a boa e velha educação familiar ainda é ex-tremamente importante na adolescência”, afirma. Para lidar com esse período turbulento, Luciene diz que os pais devem participar da vida social e esco-lar de seus filhos. “Adolescentes são difíceis e não gos-tam de pais caretas e antiquados. Filhos adolescentes precisam de amor e carinho. Pode não parecer, mas eles necessitam sentir-se seguros e protegidos. Além de afeto, também precisam de limites. É preciso ser firme, porém, justo. Se eles começarem a demons-trar maturidade, as regras podem ser repensadas. Dando liberdade progressiva ao adolescente”, aponta.

A construção da identidade

Mas e a respeito da identidade? Em que momen-to da vida ela começa a ser construída e como isto acontece? Antes de tudo, segundo o psicoterapeuta especialista em saúde mental, Cláudio Américo Spro-esser, nós nunca podemos generalizar o adolescente. Para entendermos essa construção, o psicote-rapeuta dá exemplos desde quando o indivíduo ainda é apenas um bebê. “A criança de 0 a 7 meses não reconhece. Você olha de perfil, ele vê uma si-tuação, a hora que fica frente a frente, ele vê ou-tra situação. Por isso, que nós brincamos de es-conder: esconde o rosto, achou! Então a criança vê situações diferentes do que a gente vê”, comenta. Para explicar como a identidade se constrói, Spro-esser começa avaliando o ser humano de forma ho-lística. “O ser humano é perfeito. Quando você fala em construção tem que imaginar o alicerce. Se você vê a construção de uma casa, nós vemos as paredes erguidas, mas não vemos o que está abaixo do nível do solo, que é, justamente, o alicerce. O alicerce que vaidar a sustentação para esta construção ser erguida. Então aí vamos avaliar a construção do adolescente. “O tijolo, a argamassa e tal, representam a índole do indivíduo, o indivíduo animal tem a índole. Tem a predisposição, tem a dureza do ferro, a consistên-cia do tijolo, a maleabilidade da índole. A forma dessaconstrução quem vai dar é o caráter. Ele que vai dar a forma da segurança do fazer bem ou não. E a belezadisso é a personalidade dele que é a parte espiritual. O ser humano traz uma história genética cromos-

sômica dos seus antepassados”, continua Sproesser. De acordo com o psicoterapeuta, o caráter é construído pela observação na vivência, no modelo. “Você pega um monte de barro de argila e você vai esculpindo este indivíduo, que é como uma pedra bruta, e aí você vai formando seu caráter. A índole é do animal, ele tem a predisposição da sobrevivên-cia da espécie, ele não pensa. Quanto ao caráter, o ser humano já pensa. O meu caráter leva em conta o que é certo e errado, enquanto o lado animal en-tra no cio e faz. Então ele não tem a consciência do certo e errado, já o caráter tem o livre-arbítrio, o que é moral ou imoral. O animal é amoral”, observa. Para Sproesser a construção do indivíduo é bastante diferenciada. “Essa construção da identidade depende do ambiente familiar, mais o caráter e a índole do in-divíduo. O caráter é mental, a índole é carnal, o indiví-duo já traz isso”, resume. “Em via de regra, nós somos frutos do meio e estamos em transição”, acrescenta. O psicanalista alerta que nunca se pode genera-lizar o jovem, ou seja, não existem fórmulas pron-tas de como agir com um adolescente. “Nós nunca podemos crucificar os pais porque o filho caiu nas drogas, por exemplo. Porque existem predisposi-ções, existe o indivíduo curioso, o que busca no-vidades, o habituado, que se tornou viciado e de-pois o dependente”, continua o psicoterapeuta. Sproesser ainda comenta sobre a mudança que ocorreu em relação à fase da puberdade, até mes-mo em relação à altura das pessoas, caso comparar-mos com as pessoas de antigamente, hoje cresce-mos muito mais. Além disso, ocorreram mudanças hormonais bastante intensas. “Hoje nós temos uma menina que tem a primeira menstruação aos 10 anos, quando antes uma menina de 15 anos estava começando ainda a entrar nessa fase, e era apresen-tada para a sociedade como menina-moça”, aponta. “Nesta mudança hormonal, quando o indivíduo está na puberdade ele sai da meninice. Ele é infan-te até os cinco, ou seis anos, ele vem para meninice, depois vem para sua identificação sexual, aí ele passa a ver a menina e o menino, e passa a ter a mudança hormonal. Nesta mudança ele não é nem adulto nem criança. ‘Eu não vou brincar porque não sou mais criança’, chega no meio dos adultos e os adultos não aceitam porque ele não é adulto ainda. Então ele en-tra em devaneio, porque essa própria transformação hormonal o leva em devaneio e idealismo. Graças a juventude a sociedade se transforma. Porque o jovem é um idealista, um revolucionário de tudo”, finaliza.

24 RETRATOS

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Coluna LivrosAs vantagens de ser invisívelAutor: Stephen ChboskyEditora: ROCCO LV

A história é contata por meio de cartas de um adolescente chamado Charlie,

do qual pouco se sabe, a não ser pelo que ele mesmo conta ao amigo nessas correspon-dências – oscilando entre o desejo de viver a própria vida e ao mesmo tempo fugir dela. O livro aborda as dificuldades do ambien-te escolar, as descobertas, os primeiros en-contros, festas, alegrias e angústias, mostran-do o protagonista em fase de amadurecimento. O autor consegue tratar com emoção os autos e baixos dos sentimentos de Charlie, construin-do uma narrativa a partir das cartas endereçadas a um amigo que não se sabe se é real ou imaginário.

O Diário de Anne Frank: Autor: Anne Frank. Editora: RECORDLV

Publicado originalmente em 1947, o bestseller “O Diário de Anne Frank”

já foi lido por milhões de pessoas em todo mundo. Essa edição definitiva traz pela primeira vez, na íntegra, os escritos de Anne, com todos os trechos e anotações que o pai da menina cortou para lançar a versão antiga do livro. A jovem Anne Frank escreveu em seu diário toda a tensão que passou junto a sua família du-rante a Segunda Guerra Mundial. O diário destaca medos, alegrias, o despertar do amor, sentimen-tos de uma menina se transformando em mulher e vivendo em uma situação totalmente incomum. Seu diário está entre os documentos mais dura-douros produzidos neste século, além de ser uma narrativa incrível que retrata a força do ser humano.

Eu Christiane F., 13 anos Drogada Pros-tituídaAutor: Horst Rieck e Kai HermannEditora: Bertrand Brasil

Esse livro nasceu da gravação do depoimento de Christiane F. em 1978 em um tribunal de Berlim. Ela era acusada de consumir de maneira contínua dro-gas proibidas por lei e também de ter-se entregado à prostituição. O livro retrata o drama vivido pela família da jovem e traz o depoimento de Christia-ne, de sua mãe, de policiais e psicólogos, abordan-do de forma realista o perigoso mundo das drogas.

Coluna Música

Bex Marshall – The House of Mercy

Para os reverendos do blues, a artista britânica Bex Marshall apostou em sua potente voz, característica para o gênero. O primeiro disco da cantora, The House of Mercy, produzido e composto por Bex, conquistou o terceiro lugar como melhor álbum britânico de blues no ano de 2013. O destaque vai para a faixa título Hou-se of Mercy, uma potente mistura de blues, country e folk rock, aliado a uma dinâmica instrumental notá-vel. Vale evidenciar também a faixa “Guilty”, que mos-tra a habilidade da cantora como guitarrista, usando a técnica de Slide. Em junho e julho de 2014, Bex fará uma turnê com os músicos que tocavam com Janis Joplin, “The Big Brother and the Holding Company”.

John Mayer – Paradise Valley

Da nova geração de artistas, John Mayer sem dúvida é destaque no conjunto da obra. A execução instrumen-tal precisa, presença de palco e suas simples, porém in-trigantes composições já o fizeram dividir palco com ícones do Rock & Blues/Jazz mundial, como BB. King, Eric Clapton, John Scofield, entre outros. Seu novo ál-bum “Paradise Valley”, lançado pela Columbia Records em agosto de 2013, é derivado do blues rock, mas com uma clara influência da country music norte-ameri-cana. O destaque vai para a faixa “Paper Doll”, que es-treou na posição de número 77 da Billboard Hot 100.

Rodrigo Amarante – Cavalo

Depois da dissolução dos barbudos mais famosos do Brasil, o ex-guitarrista do Los Hermanos Rodrigo Amarante lançou seu álbum “Cavalo”, através da pla-taforma de áudio SoundCloud. Sem deixar de lado a rítmica e instrumental brasileiros que tanto foram ex-plorados em sua carreira, o disco conta com músicas em inglês, francês e português. A inovação também está presente nas referências eletrônicas nas compo-sições, contrapondo com a melancolia melódica de algumas faixas como “Irene” e “Cavalo”, em que até João Gilberto aceleraria o andamento. É notável não só o talento composicional de Amarante, mas o fato de ter gravado o disco inteiro praticamente sozinho.

Por ALLAN FERREIRA

25RETRATOS

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coluna cinema

Jim Stark (James Dean) é um jovem problemático que se muda para Los Angeles com seus pais. Lá, ele é preso de madrugada por embriaguez e

desordem. No distrito policial conhece Judy (Natalie Wood), uma jovem revoltada com seu pai. Jim também se envolve com John Crawford (Sal Mineo), preso por ter atirado em alguns cães. Na cadeia, Jim ganha a

compreensão do policial responsável pelo seu caso e entende que Jim é revoltado por receber um amor superficial de seus pais. Após um rápido contato entre os personagens, na manhã seguinte Judy tenta fazer ami-zade com a sua vizinha e cria um desentendimento com Buzz, o namo-rado da garota. Esta situação acaba envolvendo todos os jovens, levando-os a emocionantes consequências. Destaque para a grande atuação de James Dean, que na época do filme recebeu ótimas críticas. Colocando

esta história como 1º Lugar em qualquer lista nas histórias cinematográ-ficas de “Jovens Problemáticos”.

Ferris Bueller (Matthew Broderick) é um pacato adolescente de familia de classe média. Aproveita o seu último semestre no colégio para matar

aula com sua namorada (Mia Sara), seu amigo (Alan Ruck) e uma Ferra-ri, para dar um grande passeio pela cidade. O filme é certeza de muitas

gargalhadas e momentos de suspense, já que Ferris tem que fugir do diretor da escola (Jeffrey Jones) e de sua irmã mais velha (Jenifer Grey). Este famoso longa apresenta de maneira criativa e cativante a chama que

todo adolescente já nutriu dentro de si.

O que mais chama atenção em “Paraísos Artificiais” é a atuação da bela Nathalie Dill, atriz que passou quase despercebida em Tropa de Elite. José Padilha, diretor do filme sobre o Bope, inclusive é produtor de

“Paraísos”. Dotado de uma forte temática sobre drogas, o longa mostra a vontade

de transgredir as regras e abraçar o mundo na pressa tipicamente jovem de viver. Dono de uma narrativa não-linear, desperta a curiosidade do espectador pela sua criativa montagem. Destaque para a trilha sonora – eletrônica - já que o filme é amplamente ambientado em festas rave e cidades européias. Boa pedida para quem gosta de música eletrônica e

psicodélica.

Juventude Transviada

Curtindo a vida adoidado

paraisos artificiais

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Juventude Transviada

Por ALLAN FERREIRA

RETRATOS

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