Revista de Antropologia - Simetria e Entropia: Sobre a Noção de Estrutura de Lévi-Strauss

16
More More Services on Demand Article Article in xml format Article references How to cite this article Curriculum ScienTI Automatic translation Send this article by e-mail Indicators Cited by SciELO Access statistics Related links Share Permalink Revista de Antropologia Print version ISSN 0034-7701 Rev. Antropol. vol.42 n.1-2 São Paulo 1999 http://dx.doi.org/10.1590/S0034-77011999000100010 Simetria e entropia: sobre a noção de estrutura de Lévi-Strauss Mauro W. B. de Almeida Professor do Departamento de Antropologia – UNICAMP RESUMO: Em um artigo famoso mas pouco compreendido, Lévi- Strauss define as noções de estrutura e de modelos, e afirma a importância dessas noções para as Ciências Sociais. Encontramos ali as noções de "grupo", de "estrutura topológica" e de "estrutura de ordem", a distinção entre "modelos mecânicos" e a de "modelos estatísticos", e uma classificação das Ciências Sociais (a História, a Sociologia, a Etnografia e a Etnologia) a partir dessas noções . Trata-se de "cientificismo" depois abandonado? Não, porque o uso dessas noções não somente permanece em sua obra posterior, como elas envolvem algumas das idéias mais básicas de Lévi-Strauss sobre as sociedades e seu movimento histórico. É verdade que Lévi-Strauss utiliza metaforicamente essas noções, de maneira que não adianta buscar nos seus textos as definições científicas para eles. Em vez disso, guiado por um esforço consciente de combinar sempre sensibilidade e razão, desrespeitando a moderna separação entre "ciências do espírito" e "ciências da natureza", Lévi-Strauss expressou alguns de seus temas centrais. Um deles é a importância das simetrias como propriedades comuns à natureza e à mente humana. O segundo é a visão da história como perda de simetrias. Esses temas encontram-se entremeados em suas análises de mitos e de parentesco, mas também no domínio da arte, na música e na pintura. Curiosamente, os projetos formulados por Lévi-Strauss no seu artigo sobre "A noção de estrutura em Antropologia", bem como no "Pensamento selvagem" e outros trabalhos no mesmo espírito, embora sejam vistos por muitos como ultrapassados, encontram-se em pleno vigor fora do mainstream da Antropologia, em disciplinas como a Neurociência, a Etnociência e a Teoria de sistemas auto- organizativos. 1 PALAVRAS-CHAVE: estruturalismo, estrutura, entropia, simetria, grupos matemáticos, transformação, história.

description

Simetria e Entropia

Transcript of Revista de Antropologia - Simetria e Entropia: Sobre a Noção de Estrutura de Lévi-Strauss

MoreMoreServices on DemandArticleArticle in xml formatArticle referencesHow to cite this articleCurriculum ScienTIAutomatic translationSend this article by e-mailIndicatorsCited by SciELOAccess statisticsRelated linksSharePermalinkRevista de AntropologiaPrint version ISSN 0034-7701Rev. Antropol. vol.42 n.1-2 So Paulo1999http://dx.doi.org/10.1590/S0034-77011999000100010 Simetria e entropia: sobre a noo deestrutura de Lvi-Strauss Mauro W. B. de AlmeidaProfessor do Departamento de Antropologia UNICAMP RESUMO: Em um artigo famoso mas pouco compreendido, Lvi-Strauss define as noes de estrutura e de modelos, e afirma aimportncia dessas noes para as Cincias Sociais. Encontramos ali asnoes de "grupo", de "estrutura topolgica" e de "estrutura deordem", a distino entre "modelos mecnicos" e a de "modelosestatsticos", e uma classificao das Cincias Sociais (a Histria, aSociologia, a Etnografia e a Etnologia) a partir dessas noes . Trata-sede "cientificismo" depois abandonado? No, porque o uso dessasnoes no somente permanece em sua obra posterior, como elasenvolvem algumas das idias mais bsicas de Lvi-Strauss sobre as sociedades e seu movimentohistrico. verdade que Lvi-Strauss utiliza metaforicamente essas noes, de maneira que noadianta buscar nos seus textos as definies cientficas para eles. Em vez disso, guiado por um esforoconsciente de combinar sempre sensibilidade e razo, desrespeitando a moderna separao entre"cincias do esprito" e "cincias da natureza", Lvi-Strauss expressou alguns de seus temas centrais.Um deles a importncia das simetrias como propriedades comuns natureza e mente humana. Osegundo a viso da histria como perda de simetrias. Esses temas encontram-se entremeados emsuas anlises de mitos e de parentesco, mas tambm no domnio da arte, na msica e na pintura.Curiosamente, os projetos formulados por Lvi-Strauss no seu artigo sobre "A noo de estrutura emAntropologia", bem como no "Pensamento selvagem" e outros trabalhos no mesmo esprito, emborasejam vistos por muitos como ultrapassados, encontram-se em pleno vigor fora do mainstream daAntropologia, em disciplinas como a Neurocincia, a Etnocincia e a Teoria de sistemas auto-organizativos.1PALAVRAS-CHAVE: estruturalismo, estrutura, entropia, simetria, grupos matemticos, transformao,histria.

1. Modelos, estruturas e mquinasO estruturalismo de Lvi-Strauss evoca habitualmente a lingstica e o contato com Roman Jakobson nos EstadosUnidos durante a dcada de 40 2. Menos ateno se d reiterada aluso de Lvi-Strauss s origens botnica,zoolgica e geolgica das intuies iniciais que levaram ao estruturalismo, e para as quais a fonologia teria apenasfornecido uma formulao clara e distinta 3. No caso da biologia, Lvi-Strauss deu destaque particular a uma obrade DArcy Thompson, publicada primeiro em l9l8 e reeditada em l942. A dcada de 40 era de fato um ambientefavorvels idias herticas e no-evolucionistas de DArcy Thompson, cujo programa poderia ser assimresumido: buscar na matemtica a chave da unidade perceptvel na diversidade infinita das formas naturais ecomparar tais formas estudando as transformaes que as ligam entre si4.H outros exemplos do clima intelectual desses anos e que so tambm pertinentes para se entender a formulaodas idias de Lvi-Strauss. A caracterizao da diferena entre modelos mecnicos e modelos estatsticos, toimportante no pensamento lvi-straussiano, e retirada diretamente do livro Ciberntica, do matemtico NorbertWiener, no qual a Ciberntica era fundada como cincia, bem como a distino entre histria estacionria e histriacumulativa: ambos os contrastes (que aparecem em obras dos anos 50 como os captulos metodolgicos deAntropologia estrutural, e em Raa e Histria) equivalem oposio traada por Wiener entre a mecnicanewtoniana e a mecnica de Gibbs e de Boltzmann5. Similar em estilo era a contribuio com que Shannon, namesma poca, fundava a Teoria da Comunicao, vista por muitos, juntamente com a Ciberntica, como um aval esperana de emprestar aos estudos de fatos humanos a eficcia e o rigor da cincia fsica6. sabido que, aocaracterizar a noo de modelo, o paradigma de Lvi-Strauss so definies do terceiro livro fundador dos anos 40,aquele em que o matemtico John von Neumann e o economista Oskar Morgenstern criam uma teoria dos jogosaplicada ao comportamento humano7. No absurdo lembrar que a construo da Teoria dos Jogos apia-se nadistino bsica entre jogos a duas pessoas e jogos a n pessoas, anloga que Lvi-Strauss traou entre a trocarestrita (duas classes) e a troca generalizada (n classes), enquanto que a distino entre jogos de soma nula(aqueles em que algum s pode ganhar s custas do outro) e jogos de soma no nula (aqueles em que vriosjogadores podem ganhar simultaneamente) evoca o contraste entre sociedades frias e quentes, entre rito e jogo, eentre estruturas elementares e estruturas complexas de parentesco8.A noo de "grupo de transformaes", que caracterizada no livro de Wiener e em capitulo clebre de DArcyThompson9, foi aplicada a fenmenos da arte e da vida na obra do grande matemtico Hermann Weyl, intituladaSimetria, publicada em Princeton em l951 10. Finalmente, o grupo que se assinava Nicolas Bourbaki comea apublicar nos anos 40 uma reconstruo de toda a matemtica sob uma orientao explicitamente estrutural. AndrWeil, um dos avatares de Nicolas Bourbaki, foi o autor do "Apndice matemtico s estruturas elementares doparentesco." 11Uma idia bsica que perpassa o fascnio de Lvi-Strauss com essas vertentes de ponta na reflexo cientfica dosanos 40 a nfase na construo de modelos como o modo de produo de conhecimento por excelncia. Essaperspectiva, que j estava presente na geometria dos gregos e lembremos que no segundo prefcio Crtica daRazo Pura, Kant atribua-lhe o sucesso das cincias da natureza desde Galileu , via-se oferecida nesses anos aocampo da ao humana pelos ento nascentes modelos de ao econmica e poltica (teoria dos jogos), decomportamento comunicativo (teoria da informao) e de funcionamento de sistemas vivos e pensantes(ciberntica). possvel dizer hoje que von Neumann, Shannon, Wiener e Lvi-Strauss estavam fundando namesma poca e convergentemente teorias da comunicao social sob a forma, respectivamente, de modelos dejogos, dilogos, comandos e trocas.Havia contudo um trao mais geral presente nessa viso da atividade cientfica, alm da nfase metodolgica emseu carter de construo de modelos. Era a idia de que a atividade cientifica consistiria na busca de invariantesrevelados ao nvel dos modelos, mais do que no estudo de propriedades de objetos. Talvez o exemplo maismarcante dessa idia seja a revoluo estruturalista que ocorreu na matemtica e cujas origens esto em fins dosculo XIX. Enquanto desde a antigidade os objetos principais do matemtico haviam sido os nmeros, asgrandezas e as figuras, entes vistos como possuindo propriedades dadas que caberia apenas investigar, ao longodo sculo XIX emerge a noo de que a essncia da matemtica "o estudo das relaes entre objetos que noso mais (...) conhecidos e descritos a no ser por algumas de suas propriedades, precisamente aquelas quecolocamos como axiomas na base de sua teoria" 12. Assim, a exemplo do que ocorre com as geometrias no-euclideanas, as matemticas se reconhecem como estudo de estruturas que regem as relaes entre objetos. Umamesma estrutura pode ento aplicar-se a diferentes domnios de objetos, desde que as relaes entre eles sedescrevam da mesma maneira. A teoria dos grupos uma estrutura que expressa matematicamente a noo deinvarincia numa famlia de objetos, quando eles so transformados por meio de operaes a ferramentabsica dessa perspectiva. Criada na segunda metade do sculo XIX, havia sido aplicada no incio do sculo XX geometria, teoria da relatividade, mecnica quntica, biologia e arte. Foi mrito de Lvi-Strauss introduzirseu esprito no mbito das cincias humanas.Os anos 40 so no apenas o perodo de hegemonia da matemtica estrutural defendida por Bourbaki, mastambm o momento de surgimento de mquinas algortmicas. Tais mquinas surgem primeiro como conceito nocomo hardware palpvel, mas como modelos ideais de processos de trabalho como produo de signos por meio deoutros signos: como mquinas de Post e mquinas de Turing, que representam formalmente a prpria estruturagenrica de clculo; que podem virtualmente calcular tudo que calculvel 13. Promessa virtual, pois, de modelarno apenas comportamentos especiais, mas o prprio pensamento em sua dimenso algortmica. Para os quesonharam com a noo de inteligncia artificial desde ento, todo pensamento seria algortmico. A noo demquina ganha assim um novo estatuto, deixando de ser sinnimo de um autmato cartesiano e que necessitariade uma alma no-mecnica para tornar-se humano. Hoje, a idia de uma alma mecnica, ou de mquinainteligente, perdeu sua estranheza. Estamos afinal acostumados a ouvir que o inconsciente uma mquinasignificante; que romances policiais so mquinas de ler; que gramticas so mquinas de produzir sentenas;sem falar nas mquinas desejantes e, claro, nas mquinas de suprimir o tempo 14. Contudo, estruturas emquinas so fundamentalmente diferentes.A relao entre estruturas (que so construes mentais) e mquinas reais (que precisam obedecer a leis domundo real) envolve uma oposio que um dos temas de Lvi-Strauss nem sempre percebido. Neste artigo,simetria e entropia so os termos dessa oposio, local de uma contradio inconcilivel. O olhar distanciado etriste, paradoxalmente marcado pela obsesso com a invarincia e pela certeza da perecibilidade da forma, buscasuplantar essa contradio insolvel, sem resolv-la jamais. 2. EstruturasA matemtica foi reconstruda por Bourbaki a partir da noo de estrutura. Na ontologia bourbakista, objetos notm propriedades intrnsecas. Nela, cada universo formado de duas coisas: objetos (cuja natureza intrnseca noimporta) e, separadamente, relaes construdas sobre eles. Estruturas so modos de construir relaes ouoperaes entre objetos. Bourbaki destaca algumas poucas estruturas elementares que so a base de todo oedifcio matemtico: as estruturas algbricas, as estruturas de ordem e as estruturas topolgicas 15. Cada umadelas encerra um "modo de usar" ou, se se quiser, um "modo de pensar" objetos. Isso nos d um roteiro paraacompanhar a construo de modelos na obra de Lvi-Strauss.Um conjunto de objetos uma estrutura particularmente simples. Dado um conjunto inicial de objetos, podemosespecificar um subconjunto, e assim a noo de objetos com certa propriedade. Numa estrutura de propriedades,respondemos a perguntas sobre objetos para cada objeto do conjunto de base, dizemos se ele pertence ou noao subconjunto em questo (isto : ele tem ou no uma propriedade). Refinando esse princpio chegamos aclassificaes. Toda propriedade induz uma classificao binria: ela divide o conjunto de base em doissubconjuntos, os dos objetos que satisfazem a propriedade e os que no a satisfazem. Franois Lorrain elaborouem detalhe a noo lvi-straussiana de uma "lgica das oposies binrias".Dado um conjunto inicial de objetos, uma ordem um conjunto de pares sujeitos a certas restries: assim, porexemplo, se o par (a, b) pertence ordem, ento (b,a) no pertence ordem (a no ser que a e b sejam o mesmoobjeto). Isto : se numa ordem dada a domina b, ento b no pode dominar a (a no ser que sejam o mesmoobjeto, j que um objeto domina a si mesmo). Numa estrutura de ordem, respondemos assim a perguntas sobrepares de objetos: para cada dois objetos distintos como a e b, uma estrutura de ordem deve responder se vale(a,b) ou se vale (b,a), ou se a e b so incomparveis. No livro sobre o pensamento selvagem est presente ointeresse por estruturas de ordem.Dado um conjunto inicial de objetos, uma operao (algbrica) um conjunto de pares em que o primeiro termo ,ele mesmo, um par de objetos (os termos da operao) e o segundo um outro objeto (o resultado da operao).Somar e multiplicar so operaes nesse sentido. Combinar movimentos ao caminhar tambm uma operao emque dois movimentos resultam em um terceiro movimento. Numa estrutura algbrica, respondemos a perguntas doseguinte tipo: dado um par de objetos (a,b) obtemos um terceiro objeto c. Dadas duas transformaes discretasqueremos saber qual a transformao resultante. Dadas duas relaes de parentesco, queremos obter a relaoresultante. Uma intuio notvel de Lvi-Strauss e de Andr Weil foi tratar as regras de parentesco comotransformaes de classes de descendncia 16.As estruturas topolgicas so, por assim dizer, modelos da noo de proximidade, no mesmo sentido em queestruturas de ordem modelam escolhas, e estruturas algbricas modelam operaes. Num conjunto munido deuma topologia, para cada objeto sabemos quais so suas vizinhanas, digamos assim. Ento, dados dois objetos(a, b), em uma topologia (que tenha uma mtrica), sabemos qual a distncia entre eles. Com a topologiaganham sentido noes de incluso, proximidade, fronteira, limite, continuidade e descontinuidade. Lvi-Straussutilizou essas idias na anlise de mitos.Enquanto as estruturas de ordem do forma noo de tempo e as estruturas algbricas formalizam a noo demovimentos espaciais, a topologia refina ambas essas noes, injetando-lhes a linguagem da proximidade. NasMithologiques reencontramos grupos (estruturas algbricas) e reticulados (estruturas de ordem), mergulhadosagora em espaos de onde emergem formas como as fitas de Moebius e as garrafas de Klein, centrais entre asmetforas de A oleira ciumenta.Na obra de Lvi-Strauss, lgebra, ordem e topologia se sucedem, numa seqncia que corresponde a publicaesdecisivas, respectivamente, sobre parentesco, classificaes e mitologia. No foi inteno de Lvi-Strauss, contudo,levar adiante de maneira sistemtica um programa kantiano "sem sujeito transcendental" em que as estruturas-me da matemtica tomassem o papel do espao e do tempo como formas a priori da sensibilidade. O que Lvi-Strauss fez foi usar o material etnogrfico que vai de termos de parentesco a mitos indgenas, passando por regrasde cozinha, para construir estruturas sensveis, maneira do que ocorre na msica. claro que Lvi-Strauss assim um exemplo de bricoleur 17.Assim, permaneceu habitando a interface entre o mundo sensvel e o mundo inteligvel, numa juno persistentede mincia emprica e senso esttico na qual termos como "transformaes ", "inversos", "espaos n-dimensionais", "lgebras de Boole", "garrafas de Klein", "grupos", comparecem como instrumentos metafricos econcretos para construir, por bricolagem, estruturas s vezes elusivas em suas implicaes exatas. Mas se no nouso efetivo da matemtica, quer como programa, quer como tcnica, em que reside ento a relao entre Lvi-Strauss e as noes matemticas? Trata-se de mera meno, de flerte verbal com a linguagem da moda, comosugeriu Kroeber a respeito do termo "estrutura"?H algo mais aqui. No estilo lvi-straussiano os tropos matemticos e fsicos tem um peso forte. Expressam idiasbsicas sobre a sociedade humana, e para Lvi-Strauss mesmo essencial que essas metforas venham da fsica eda matemtica, j que entre essas idias est a de que a ordem humana se prolonga na ordem da natureza. Hduas metforas bsicas: uma, baseada na idia de grupo de transformaes, e cuja essncia a existncia desimetria; outra, baseada na idia de mquina, e cuja essncia a noo de irreversibilidade. A primeira relaciona-se com o olhar distante: no limite, um olhar que no se situa em nenhum lugar. A segunda relaciona-se com ostristes trpicos: com a passagem do tempo e com a irrupo inevitvel da desordem 18. 3. O olhar distanciadoQuando localizamos um ponto no espao, atribumos a ele coordenadas: a longitude e a latitude, digamos assim.Para atribuir coordenadas, precisamos partir de uma origem: de um ponto privilegiado sobre todos os demais.Um filsofo procurou sintetizar o recado de Lvi-Strauss afirmando que o estruturalismo no inventou estruturas:apenas dispensou pontos privilegiados na descrio de uma estrutura 19. A anlise estrutural do espao, nessesentido, foi levada a cabo com a matemtica moderna, que deve ser capaz de dispensar por completo a adoo deum sistema de coordenadas particular para a descrio das propriedades de figuras. Seus teoremas devem ser"livres de coordenadas". Para realizar esse programa, perdemos a localizao nica de um ponto no espao. Emcompensao, preservamos as relaes entre esse ponto e outros. Podemos chamar a essas relaes deinvariantes 20.Os invariantes assim preservados quando abandonamos um sistema de coordenadas especfico so o quechamamos de propriedades estruturais. Na geometria, uma reta permanece reta, qualquer que seja o sistema decoordenadas empregado. Deixa de ter sentido, porm, a descrio de uma reta como vertical 21. necessrioento, atravs da idia de transformao, aprender a traduzir mutuamente as "observaes" da reta realizadas emdiferentes sistemas de coordenadas de tal forma que a existncia dessas transformaes que assegura apossibilidade de falar na identidade de objetos 22. Surge aqui outra implicao, pois as transformaes podem serpensadas tanto como mudanas de posio de uma "reta" num sistema de coordenadas especfico, comomudanas no prprio sistema de coordenadas. Torna-se em certo sentido impossvel distinguir entre movimentosde um objeto e movimentos do observador. H um relativismo essencial implicado na atitude estrutural.H dois modos de conceber o programa estrutural. Um, imaginar como descries mudam com a mudana desistemas de coordenadas e buscar propriedades das descries que so invariantes sob essas mudanas. ocaminho do etnogrfo que se translada de um sistema de coordenadas para outro. Outro, observar, num mesmosistema de coordenadas, como objetos se transformam preservando, porm, um ar de famlia. o caminho doetnlogo que constri modelos comparativos. No caso dos mitos, a primeira perspectiva leva o observador a secolocar no interior de uma mitologia particular, atribuindo-lhe sentido porque, ao fazer a translao, o observador-etngrafo antes de mais nada procura identificar as coordenadas locais e situar-se a partir delas 23. A segundaperspectiva levaria a caracterizar ento os invariantes numa famlia de mitos que se transformam permanecendo,no entanto, mutuamente inteligveis ("comunicam-se entre si") 24.As simetrias de um quadrado so representadas pelo grupo de transformaes que o deixam invariante (rotaesde 90 graus em torno do centro compem um subgrupo desse grupo). Que significa, porm, dizer que o quadradopermanece invariante? Isso inclui o quadrado que vemos (talvez seja a forma de uma mesa ) de distncias engulos diversos na sala, ou numa foto em miniatura, ou talvez deformado numa pintura surrealista? A resposta que, a cada um desses sistemas de transformaes, temos uma noo de invarincia e de identidade, e a cadauma delas h um grupo associado de transformaes.Coloquemo-nos numa situao idealizada, no que vemos o quadrado do alto. Se girarmos a figura em torno de seucentro, em rotaes de 90 graus, o resultado ser uma figura indistingvel da original. Se mantivermos umadiagonal fixa e refletirmos o quadrado em torno dela, obteremos ainda uma figura idntica. Rotaes e reflexesdescrevem simetrias que deixam o quadrado invariante num primeiro sentido. Imaginemos agora que o quadradoseja movido no plano. Esses movimentos levam a um novo grupo de transformaes, no qual se preservam todasas dimenses originais do quadrado, o qual se preserva como "objeto rgido", que no perde seus ngulos e suarea. Essa identidade prxima que ligamos noo de objeto fsico.Podemos ir mais longe, e no apenas girar, refletir e deslocar o quadrado, mas tambm ampli-lo ou encolh-lo, ealm disso permitir mudanas regidas pelas leis da perspectiva (estamos no mbito da geometria projetiva). Oresultado a famlia de objetos que reconhecemos perceptualmente como um mesmo quadrado, ao observ-lo emmovimento, ao olhar uma pintura ou filme. Essa noo de identidade associada ao grupo de transformaes dageometria projetiva essencial para que reconheamos objetos na experincia diria como os mesmos. Isso no tudo, porque podemos dispensar a rigidez das retas e admitir verses surrealistas do quadrado na qual ele setransforma insensivelmente em uma verso mole do quadrado original, e talvez vire um objeto informe; contudo,distinguiremos esse objeto informe, mas sem buracos, de uma rosca. Dessa forma, o quadrado mole torna-seidntico a uma panqueca, mas distinto de um pudim de leite (daqueles que tm um buraco no meio). Essa ltimanoo de identidade a que se associa s transformaes topolgicas. Esse alis um pequeno esboo de histriada arte, at o surrealismo pois o cubismo, rasgando objetos, e colando-os arbitrariamente, destri a invarinciatopolgica, ltimo resqucio da conservao da forma. O programa de investigao ento: estudar as simetrias doobjeto, inserindo-o em grupos de transformao 25.H, porm, outro modo de encarar essas mesmas transformaes . Ao girar o quadrado (no grupo inicial) supomosque ns (observadores) estamos imveis. Mas como sabermos que no somos ns que giramos? Quando oquadrado ampliado ou reduzido, podemos representar a situao como uma outra classe de movimento nosistema de referncia. O mesmo vale para os outros grupos de transformao: trata-se ento de estudar assimetrias entre observadores possveis, inserindo-os em grupos de transformao. A noo de uma famlia deinvarincia de objetos associa-se a uma noo dual de uma famlia de invarincia de observadores 26.Essa maneira de pensar foi formulada a respeito da geometria por um matemtico cujo nome se encontra comfreqncia nos escritos de Lvi-Strauss: Felix Klein, o das "garrafas de Klein" de A oleira ciumenta, e tambm do"grupo de Klein" 27. Foi desenvolvida, entre outros, por Hermann Weyl 28, e tornou-se um lugar-comum em vriosdomnios da cincia contempornea. Como diz o bilogo Jacques Monod:Havia uma ambio platnica na busca sistemtica de invariantes anatonmicos a que se devotaram osgrandes naturalistas do sculo XIX aps Cuvier e Goethe. Os bilogos modernos deixam s vezes defazer justia ao gnio dos homens que, por trs da variedade impressionante de morfologias e modosde vida de seres vivos, conseguiram identificar, se no uma "forma nica", pelo menos um numerofinito de arqutipos anatmicos, cada um dos quais invariante no interior do grupo que caracteriza 29 .Foi precisamente nessa tradio de busca da forma como invariante no interior de um grupo de transformaesque DArcy Thompson escreveu sua obra j mencionada, que o sovitico Vladimir Propp analisou centenas decontos populares russos 30, e que Lvi-Strauss escreveu as Estruturas elementares do parentesco e as Mitolgicas.Convm, antes de passar s implicaes mais gerais desse programa, ressaltar a atitude face da multiplicidade eda identidade que nele esto contidas. A identidade no dita de objetos ou de substncias. Ela relaciona-se apropriedades relacionais. A definio de Weyl para simetria a de algo que podemos fazer a uma coisa (umatransformao), conservando algo. Descrever a identidade de um objeto ento equivalente a descrever suassimetrias, isto , o grupo de transformaes a que pertence.Para Leibniz, um mundo em que as relaes espaciais entre objetos fossem idnticas s que valem em nossomundo exceto que direita e esquerda fossem invertidas, ou que todos os tamanhos fossem multiplicados pordois, ou que tudo fosse deslocado por uma translao seria indistinguvel do nosso mundo, mesmo para Deus:em outras palavras, esses mundos seriam de fato um e mesmo mundo. Contra Newton, Leibniz foi assim umestruturalista radical 31, ou um precursor de um raciocnio relativista, o que equivalente. Para Weyl, a noo degrupo de transformao torna-se mesmo equivalente noo de identidade 32.Queremos voltar a Lvi-Strauss mostrando como essa concepo leva a uma forma peculiar de relativismoantropolgico. Nos grupos de transformao tratados pela Antropologia estrutural objetos so, por exemplo,sistemas de parentesco e mitos. Transformaes so simetrias que levam de um mito a outro, de um sistema deparentesco a outro. Objetos ainda mais gerais foram sugeridos em O pensamento selvagem: transformaesligando sociedades distintas, ou sub-sistemas delas, e operando sobre sistemas cognitivos, econmicos, estticos.J em l945 Lvi-Strauss tratou "tomos de parentesco" de um conjunto de sociedades distintas como parte de umnico grupo de transformaes.Sob essa perspectiva, no h objetos privilegiados. Qualquer mito pode ser o ponto de partida para a obteno dogrupo inteiro de transformaes. As propriedades relevantes so justamente aquelas igualmente vlidas ao longodessas transformaes . Em certo sentido, portanto, essas so as propriedades vlidas em todos os sistemas dereferncia: as que no dependem da posio do observador, de sua escala de medida, de sua orientao, de seusvalores. O estruturalismo descreve invarincia nos objetos ou, dualmente, invarincia entre observadores.O estruturalismo , sob esse ponto de vista, relativista, mas no no sentido do relativismo cultural que afirma ocarter irredutvel das diferenas culturais (cada cultura bebeu de uma gua distinta). -o antes num sentidoanlogo ao que os fsicos tm em mente ao falar de relatividade de uma teoria fsica. Pois, nesse sentido,relatividade no implica em declarar que "tudo relativo" (cada observador teria "suas leis" irredutveis), mas, aocontrrio, identificar o grupo das transformaes que permite expressar o que invariante 33. Os invariantes deuma teoria so preservados em todo sistema de referncia. Sem invariantes sob alguma traduo reina osolipsismo, no o relativismo. Traduzem-se assim as observaes feitas de um "ponto de vista" em observaesfeitas de outro "ponto de vista", e mantendo a forma (se no o fraseado) de ambas as observaes (seria comorelacionar as observaes do quadrado visto de diferentes ngulos) 34. A diversidade torna-se compatvel com aunidade.Levando essa idia ao extremo, chegamos a uma tese mais geral. As propriedades que caracterizam a mentehumana so invariantes ao longo das transformaes que levam de uma sociedade a outra. Tais transformaesso reversveis e nos conservam no domnio do humano, e nessa medida constituem um grupo. No h origem,nem sentido, nem escala privilegiada para a humanidade. A natureza humana radica, por assim dizer, num grupode transformaes .Essa idia explica a metfora do olhar distanciado. Esse olhar no se localiza em nenhum lugar privilegiado. Dadecorre uma tarefa conferida aos antroplogos, na medida em que se preocupem em caracterizar a noo dehumanidade: descrever o grupo de transformaes que a deixa invariante. papel do antroplogo descrever, livrede um sistema de referncia particular, o grupo de transformaes que expressaria ao exibir as possibilidades doesprito humano a posteriori uma construo precisa da noo de humanidade, sem apelo a um sujeitotranscendental 35. 4. Tristes trpicosResta a segunda metfora, a da mquina. Pareceria que h apenas uma metfora, j que estruturas podem serdescritas como mquinas. Uma estrutura algbrica, digamos, seria uma mquina que recebe como entrada doisobjetos e d como sada um objeto (essa analogia entre a viso bourbakista das estruturas matemticas e aconstruo de autmatos detalhadamente explorada no interessante livro Ciberntica, de R. Ashby). Estruturasde ordem seriam mquinas de escolher. Estruturas topolgicas seriam mquinas de medir. Mas essas mquinas,como as mquinas de Turing e de Post, so por um lado algoritmos da mente, e por outro atos de trabalho. Nasegunda acepo, precisam se enraizar na matria.Lvi-Strauss est bem consciente das implicaes. O essencial numa estrutura de grupo de transformaes queas transformaes no tm direo privilegiada. Tanto o universo de Newton como o de Einstein podem serdescritos em termos de grupos de transformaes que abrangem sua trajetria temporal. Isso significa que podemfuncionar para frente e para trs. Neles, a ordem do tempo pode ser invertida sem alterar a estrutura: no sentidode que um observador no poderia notar violaes das leis da fsica num sistema solar, por exemplo, que andasseem sentido contrrio ao nosso. O tempo no tem a direo privilegiada. Em termos leibnizianos, nem Deus poderiaestabelecer a direo "correta" do tempo em universos newtonianos e einsteinianos, assim como no poderiadistinguir a esquerda da direita. Os universos newtonianos-einsteinianos, na terminologia de Lvi-Strauss, somodelos "mecnicos". So universos de simetria no apenas espacial mas tambm temporal: nos quais, em certosentido, espao e tempo se equivalem, ou seja, nos quais o tempo pensado espacialmente (poderamos lembraraqui que as transformaes matemticas que DArcy Thompson introduz para relacionar formas da natureza entresi no so representaes de processos evolutivos, aos quais, alis, o autor notoriamente indiferente em seulivro).De fato, Lvi-Strauss usou explicitamente essa idia, no texto anti-racista "Raa e Histria", para argumentarcontra uma interpretao evolutiva da diversidade humana. Cada sociedade equivalente s demais se os modelosque atualiza so transformaes reversveis dos modelos das demais. A noo de progresso, como a demovimento, no absoluta: como quando andamos num trem, a noo de movimento depende do sistema decoordenadas selecionado 36.Mas Lvi-Strauss foi o primeiro a reconhecer e a destacar a existncia de mudanas no-reversveis nas suasgrandes obras sobre sistemas de parentesco e sobre mitos, bem como em numerosas passagens secundrias sobrefenmenos estticos. Os sistemas de troca generalizada da sia estariam nos limites de uma ruptura alm da qualentramos no domnio de sistemas de tipo estatstico exemplificados nas sociedades camponesas europias.Sistemas de parentesco de tipo Crow-Omaha esto na transio de modelos mecnicos para modelos estatsticos assim como os sistemas de maisons cognaticamente transmitidas, objeto de estudos recentes de Lvi-Strauss.Assim, ao passar da Austrlia para a sia e desta para a Europa, transitamos de modelos de troca restrita paramodelos de troca generalizada e destes para modelos estatsticos: da simetria para a assimetria; detransformaes reversveis para transformaes irreversveis; do discreto para o contnuo; do global para o local.Estruturas de parentesco morrem.Tambm os mitos morrem. Um mito que se transforma em outros respeita os invariantes do grupo detransformaes a que pertence at que se cansa. Como ondas que a pedra criou no lago: a forma circular seamortece com a distncia e com o tempo, at deixar de ser distinguvel no movimento da gua sob a brisa damanh 37.Eis a implicao da metfora da mquina. Uma mquina pra com o tempo. A energia inicial perdida por atrito. Atermodinmica surgiu com o estudo da eficincia das mquinas, e sua lei mais clebre sela esse estudo dizendoprecisamente que no existe mquina perptua 38. Assim, natural que a termodinmica d o tom estilstico deum livro intitulado Tristes trpicos. A entropia de um sistema fechado e sempre crescente. Em outros termos, suaestrutura se degrada. Mas o universo, do qual fazem parte a vida e o pensamento, um sistema fechado. Omundo cultural moderno tornou-se ele prprio fechado: aldeia global sem fronteiras com um exterior. A vida, osmitos, as classificaes, os sistemas de casamento, mas tambm a pintura e a msica, perdem estrutura, soirrupes transitrias 39. So flutuaes temporrias no lago, um pr do sol deslumbrante e passageiro.A noo de entropia d um sentido nico ao tempo. O tempo flui no sentido da perda da estrutura, da perda deinformao, da perda de beleza. O paraso estruturalista da diversidade se v ameaado pelo pecadotermodinmico. Transformaes mticas e de parentesco, encarnados na matria, ganham uma flecha temporal.Passamos da matemtica leibniziana fsica da era industrial ou, para usar uma expresso de Lvi-Strauss, dadiferena oposicional diferena histrica: a razo que as transformaes do esprito devem enraizar-se namatria, subordinando-se assim a leis que regem mquinas reais. H ento uma flecha do tempo, mas essa flechano aponta para o positivo, e sim para o negativo. O que o evolucionismo de Leslie White vira como progresso (oaumento da quantidade de energia extrada per capita) , ao contrrio, degradao: diminuio da diversidade percapita (menos linguagens, menos religies, menos sistemas de parentesco, menos estilos estticos, menosespcies naturais, menos animais e plantas), como acontece quando uma floresta tropical arde para alimentarcaldeiras ou bois transformando xams e guerreiros em mo-de-obra barata, amores-perfeitos em eucaliptos,informao em energia.Os tristes trpicos so assim no apenas o campo predileto para a observao in situ de mitos e sistemas decasamento, mas tambm da ao dos processos de degradao contemporneos que geram carne, energia,minrios e valor que uma metrpole absorve para enriquecer a quantidade de mensagens que circulam em seuinterior, um mundo novo dotado de um estilo nico, "moderno" e "ps-moderno" 40. Os universos sociais ebiolgicos, galxias e cristais, caminham para um estado absorvente. A histria tem atrativos. Regida pelo acasode movimentos de bbado, caminha, contudo, para estados que aparecem como a "meta da histria" emretrospecto porque as vias alternativas foram destrudas. Ao faz-lo, apagam-se os rastros das transformaesque expressam as possibilidades da natureza humana. No apenas uma concha ou uma flor, uma sociedade ouuma floresta, mas espcies ticas, gneros de atitudes perante a vida, famlias de tcnicas corporais, filos deconhecimentos e de prazeres com as simetrias que os revelam como parte do mesmo padro com que a mentefunciona. Ironicamente, a prpria espcie humana o antdoto perverso para a diversidade da qual ela uma dasmanifestaes 41.Uma analogia pode ser apropriada, como pausa. Os marxistas da chamada Escola de Frankfurt, por caminhoscompletamente diversos, chegaram a um pessimismo similar, paradoxal porque vindo na esteira do entusiamomarxista pelo mundo novo prometido desde o iluminismo. Esse pessimismo ambguo, porque combinado aentusiasmo de bricoleur voltado para o passado, mais claro em Benjamim, e permite melhor um paralelo comLvi-Strauss. Colagem no primeiro caso; bricolagem no segundo. Benjamim pensava poeticamente e valorizava ametfora como o dom maior da linguagem 42. Lvi-Strauss j comparou toda sua anlise mitolgica a uma vastametfora da beleza musical. No lhe estranha a idia benjaminiana de preservar, num momento ameaado peloperigo, a imagem miniaturizada de uma herana humana sem garantia de futuro 43. A sugesto pode ser expressaem palavras clebres de Benjamin:Onde aparece para ns uma cadeia de acontecimentos ele o anjo da histria v uma nicacatstrofe que continua a amontoar destroos sobre destroos e os arroja a seus ps. O anjo gostariade se deter, despertar os mortos e reunir o que foi despedaado. Mas est soprando uma tempestadeno Paraso e impele-o irresistivelmente para o futuro a que volta suas costas, enquanto o monte derunas sua frente cresce em direo ao cu 44. 5. Mquinas de anular o tempoA irreversibilidade no apenas um operador melanclico que marca limites analise estrutural. Vista comoquebra de uma simetria, um aspecto essencial do esprito com que Lvi-Strauss trabalha com sistemas deparentesco e mitos. Simetria e assimetria fazem parte de um par dialtico. A ordem no um modo natural: antes um artifcio em que se mostra ativa uma possibilidade: pois a formao de galxias, de cristais, de formasvivas e de neurnios so exemplos de ilhas de simetrizao num oceano de entropia. verdade que Lvi-Strauss foi aqui corrigido por uma ortodoxia estruturalista: foi o caso de Rodney Needham,reclamando uma distino clara entre determinismo e aleatoriedade, e de Louis Dumont, reclamando um primadoigualmente inambguo do global sobre o local. Esses autores viram na ascese conceitual radicalizando a simetriae o holismo a soluo para a crtica empirista de Edmund Leach, David Maybury-Lewis e outros. Lvi-Straussno tomou partido nem de uma ortodoxia simetrizante (no qual, na forma de uma verso mentalista doestruturalismo, as estruturas reinariam expressas em regras inambguas), nem de uma ortodoxia holista (no qualas estruturas resultam de uma totalidade preexistente).Lvi-Strauss enveredou em vez disso pelas trilhas metafricas de uma geometria local e de uma temporalidadeirreversvel explorando ento seu papel inquietante na tentativa, talvez sempre ilusria, de obter simetriasglobais. Afinal, havia o exemplo da msica, em que a irrupo da assimetria e da imprevisibilidade parteessencial da beleza. Lvi-Strauss tomou a msica como paradigma bsico em seu primeiro artigo sobre a anlisemtica, e no por acaso. Havia, para continuar com as metforas da fsica, a sugesto de Wiener de estudarfenmenos estatsticos com a prpria teoria dos grupos: em outras palavras, buscar invariantes em fenmenosessencialmente temporais.Ao contrrio do que ocorre com os modelos mecnicos, domnio da simetria, nos quais dispomos de textosprogramticos detalhados de Lvi-Strauss, os modelos estatsticos (nos quais aparecem irreversibilidade e quebrada simetria) no foram tratados oficialmente por Lvi-Strauss. Esto dispersos em passagens das Estruturaselementares do parentesco (a transio de estruturas elementares para estruturas complexas), em passagens dasMitolgicas (transio de mitos para romances), e, de maneira especial, abrindo como que uma nova era, nosegundo prefcio s Estruturas elementares do parentesco, texto que, de certo modo, toma o lugar comoprimeiro de uma srie de textos publicados em obras como A via das mscaras, O olhar distanciado, Palavrasdadas, e em textos como Histria e Etnologia de prefcio a uma edio virtual de Antropologia estrutural:estruturas complexas.Retomemos a distino lvi-straussiana entre modelos mecnicos e modelos estatsticos. Nos modelos mecnicos,estados, em nmero finito, so transformados em outros estados "mecanicamente", isto , sem escolha possvel,como na interpretao dada por Needham para a noo de "sistemas prescritivos" 45. Se o sistema abandona umestado ele pula, num salto discreto, para outro estado, numa transio determinada por regras: como a virgindade,digamos assim, o incesto uma questo de tudo ou nada. Analogamente, a cor branca ou preta. Podemos agoraprecisar a importncia da no-ambigidade(ou, se quisermos, de processos que convertem escalas contnuas emintervalos descontnuos): elas permitem inverter uma operao. Assim, o fato de que a transformao entre umestado e outro seja parte de um grupo significa que a transformao pode ser invertida, sem perda das distinesoriginais. Dois estados distintos levam a dois estados distintos. Vamos agora mergulhar essa idia numa situaoque nos permite passar, quase insensivelmente, para os casos nos quais, ao contrrio, as distines so abolidas ea ambigidade se introduz irremediavelmente 46.Imaginemos uma caixa dividida em duas metades, que rotulamos de A e B. No estado inicial, h n objetos nocompartimento A, e zero objetos no compartimento B. Essa uma representao de um estado discreto, que podeser lido como uma mensagem de tipo sim/no, ou (1,0). Ao contrrio, num estado em que os objetos estivessemigualmente espalhados entre os compartimentos A e B, teramos uma representao de um estado contnuo, quepode ser lido como uma mensagem borrada que nos diz apenas talvez\talvez, ou (0.5, 0.5). Para percebermosmelhor a relao entre essas duas situaes convm imaginar que h uma porta comunicando os compartimentosA e B da nossa caixa. Na primeira situao, a do estado discreto, essa porta estsempre fechada. Na segundasituao, essa porta est sempre aberta. Nessa segunda situao, mais cedo ou mais tarde, os objetos seespalham entre os compartimentos A e B, deixando a caixa num estado cinzento que talvez flutue ligeiramente, etalvez at drasticamente durante fraes da eternidade, mas permanece, na maior parte do tempo, no estadocinzento.As mquinas do primeiro tipo descrevem comportamentos que, segundo uma interpretao durkheimiana, seriamgovernados pela "solidariedade mecnica" (grosseiramente falando, cada indivduo "conheceria seu lugar"). Asmquinas do segundo tipo descrevem ento comportamentos que, segundo a mesma interpretao, seriamdesgovernados pela "anomia".Tais mquinas de segundo tipo descreveriam, voltando metfora inicial, o comportamento de molculas queandam ao acaso nos compartimentos, ricocheteando em suas paredes, e acidentalmente cruzando uma portaaberta. Nestas mquinas anrquicas a entropia atinge um mximo.Em minha opinio foi uma importante realizao terica de Lvi-Strauss perceber que os dois tipos de mquinaacima descritos fazem parte, essencialmente, de uma mesma famlia. Modelos "prescritivos" (mquinasconservadoras), modelos com "preferncias" (mquinas liberais), e modelos "complexos" (mquinas anrquicas)no correspondem a esferas ontolgicas. Correspondem a distintos modos de descrever uma mesma realidade. Ummodelo, se nos lcito recordar noes lvi-straussianas, no modela diretamente a realidade, e sim uma estruturaque captura esses invariantes. Uma mquina poderia representar uma srie de observaes passadas: e como, emcerto sentido, opera a anlise construda por Franoise Hritier, seguindo uma sugesto de Lvi-Strauss, no comduas metades, mas com um nmero bem maior de "compartimentos". Nesse caso, verificou-se que, a despeito daausncia de regras mecnicas operando a curto prazo, um efeito global apareceu a longo prazo, na forma de umfechamento de ciclos de casamentos. Mas nada nos impede de considerar tais mquinas como representao desociedades cujos indivduos incluem estratgias e acaso no seu comportamento (como os atores sociais na teoriados jogos de von Neumann), sendo contudo guiados por um vis que o que gera, a longo prazo, uma curvaturano espao genealgico.Voltaremos a esse ponto adiante. Por enquanto, ressaltamos um outro.Que o seguinte: modelos mecnicos tornam-se, com essa ressalva, casos particulares de mquinas markovians47. No caso em que, para cada classe X, h uma nica classe Y tal que a probabilidade de que X obtenha mulheresem Y igual a um ( com a condio adicional de que duas classes no obtenham esposas na mesma classe), amatriz da mquina markoviana torna-se formalmente idntica matriz de uma permutao, no importando se vista como registro de observaes ou como modelo mental. Ao longo do tempo todos os estados so discretos,igualmente possveis. Se pensarmos cada classe com uma cor, no caso de modelos mecnicos, o mapapermaneceria com as cores iniciais claramente distintas. No caso oposto, a longo prazo, as cores se dispersaro portodas as aldeias, e o mapa se tornar cinzento, por assim dizer.H mquinas reversveis e mquinas irreversveis.O que a irreversibilidade? O modelo da caixa com duas metades fornece uma resposta. Digamos que o nmerode objetos seja igual a quatro. H 16 mundos possveis em que quatro objetos se distribuem por duas metades.Desses, apenas um corresponde distribuio inicial ( p p p p / - ), e um distribuio inversa ( - / p p p p). Osmodelos mecnicos so aqueles que ou mantm a distribuio inicial discreta, ou permitem a transio para adistribuio discreta inversa. Por outro lado, quatro mundos possveis correspondem distribuio preferencial (p pp / p), e quatro mundos possveis correspondem distribuio preferencial oposta (p/ p p p). E seis mundospossveis correspondem distribuio anrquica (p p / p p). A concluso que os estados discretos sosimplesmente os menos numerosos entre os mundos possveis. Mas se a mquina no tem restries oupreferncias, ela tender a passar por todos os mundos possveis, com igual freqncia. Como h mais mundospossveis desorganizados do que discretos, na maior parte do tempo o sistema um mundo desorganizado. essaa idia bsica da irreversibilidade: sistemas passam de estados improvveis para estados mais provveis.Chamamos de entropia uma medida da probabilidade do estado em que o sistema se encontra. Podemos entoparafrasear o que acabou de ser dito da seguinte maneira: um sistema passa de estados de baixa entropia paraestados de entropia alta.A existncia de tempo irreversvel exatamente tal passagem. Sente-se o tempo passar porque, exceto emintervalos fugazes chamados de flutuaes, a entropia aumenta. Se assim, a existncia de mquinas reversveis,isto , mquinas que preservam alguma simetria, requer o congelamento da entropia, ou seja, a imobilizao doaumento da irreversibilidade. Sem essa violao no existiria vida nem cultura.O fsico James Clerk Maxwell representou essa violao antropomorficamente como um demnio postado na portade comunicao entre os dois compartimentos. O demnio fecha ou abre a porta 48, dependendo do que v. Emoutras palavras, o Demnio de Maxwell guiado por informao. Ele utiliza tal informao para preservar estadosimprovveis. Assim, pode fechar a porta na maioria das vezes em que um objeto procura escapar docompartimento A para B, e abrir a porta na maioria dos casos em que um objeto procura voltar de B para A. Dessaforma, ele mantm o compartimento A "marcado", e o compartimento B "no marcado". Preservando assim umestado discreto e improvvel, o demnio impede o aumento da entropia. Demnios de Maxwell so mquinas desuprimir o tempo na nica forma pela qual sua direo reconhecvel: o aumento da desordem, ou entropia.Podemos imaginar os demnios de Maxwell como uma variedade de mecanismos seja represso, conscinciacoletiva, tradio, votao, constituies . Regras, tabus, preferencias, mapas, estilos e cosmologia so demniosde Maxwell 49. Uma mquina anti-entrpica restringe o universo dos mundos possveis introduzindo restries nomovimento de vai-e-vm de objetos, como ocorre precisamente com as regras de casamento e os tabus, emsociedades de pequena escala, ou como regras alfandegrias, sistemas educacionais, ou estilos, em sociedades degrande escala. Como na distribuio de vogais na poesia de Puskhin, que Markov primeiro estudou. Os demniosde Maxwell, regra como regra, vistos de maneira generalizada como uma classe de mquinas markovianas deentropia inferior a um, atuariam no apenas em domnios como o das estruturas elementares de troca economia, linguagem, parentesco mas tambm no domnio generalizado de fronteiras culturais 50, na forma demquinas classificatrias e tnicas. Trata-se de manter objetos nas mesmas caixas (endomquinas, que incluem asmquinas tnicas) ou de manter objetos em caixas diferentes (exomquinas, que incluem as mquinas decasamento). A natureza dos objetos no de fato invocada nos modelos, e sim sua distribuio. Assim, como nateoria da identidade tnica pslvi-straussiana, no so propriedades de objetos que os atribuem a uma ou aoutra caixa, e sim, por assim dizer, critrios polticos: seja a deciso de um grupo A, seja o conflito entre essadeciso e a deciso do grupo B 51. Mas no queremos forar uma metfora . 6. De perto e de longeSe demnios de Maxwell fossem perfeitamente eficientes a entropia poderia ser anulada. Mquinas perptuasseriam possveis, convertendo a diferena perptua em trabalho infindvel. Mas no e fcil livrar-se do tempo.Wiener assim formulou o que acontece com um demnio de Maxwell: o demnio s pode atuar aps receberinformao, e a longo prazo "recebe um grande nmero de pequenas impresses, at cair numa certa vertigem, eficar incapacitado de claras percepes".O prprio demnio parte do sistema que controla e est assim tambm sujeito entropia. Com o tempo ele deixade discriminar, como um porteiro bbado, por influncia da clientela com a qual est em contnuo contato, e nomais capaz de vetar a entrada de fregueses indesejveis. Talvez por no serem capazes, impunemente, de obterinformao, talvez por no serem capazes, sem custo, de se desfazerem da memria intil acumulada em sculos,os demnios de Maxwell morrem enquanto demnios de Maxwell.A durao de um demnio de Maxwell, se no eterna, pode ser prolongada, se ele realimentado de fora 52. como se seu discernimento tivesse que ser reforado pela entrada de energia e de informao recriaosimblica, troca com vizinhos, canais de comunicao com movimentos polticos externos (como em Que Fazer?,de Lnin, em que a organizao proletria vem de fora). Passamos a admitir o carretar ou ttico ou estratgico demecanismos de estabilidade, jamais naturais53.Estruturas dissipativas, diz Prigogine, produzem organizao a partir de flutuaes caticas em sistemas que noesto em equilbrio. Mas essas mquinas antientrpicas s podem funcionar localmente porque alimentadas deenergia por uma fonte exterior. (O problema da sociedade moderna seria, digamos assim, ter eliminado o"exterior" que at agora era formado por um conjunto de universos cosmolgicos, sociolgicos, tecnolgicos eecolgicos diversificados). Da metfora de um universo mecnico e global passamos a um universo markoviano elocal para conservar a invarincia do primeiro em face da ameaa permanente e insidiosa da desordem.Conclumos, aps essa digresso sobre a dialtica simetria/assimetria, com o tema global/local. Aqui cabe falarnuma geometria diferencial.Um ciclista inclina suavemente o guido da bicicleta. O efeito a introduo de uma curvatura em sua trajetria. Ociclista precisa olhar para sua vizinhana, para um mapa local. Ele precisa tambm passar continuamente paranovos mapas em vizinhanas novas. Ele pode descrever um crculo, em certas condies, e poderamos fornecerento um modelo global da trajetria como "todos os pontos eqidistantes do centro". O ciclista, porm, no olhapara o centro (se o fizesse, provavelmente cairia da bicicleta): esse modelo global nosso, e no dele. Nadagarante que a curvatura imprimida a cada momento resultar no crculo geomtrico.A passagem do local para o global simples em situaes em que o espao apresenta uma "curvatura constante"localmente (como num crculo, em que todo ponto possui uma vizinhana identicamente curvada). Mas se tratajustamente de saber, a partir de um fato local, se vale uma propriedade global. O espao pode ser irregular; oupode ser impossvel apreend-lo em forma global 54. A segunda edio das Estruturas elementares do parentescoretoma argumentos que na primeira eram expressos em forma global e indicam como podem ser reformuladoscomo argumentos de passagem do local para o global: passagem que, agora, problemtica. Uma propriedadeglobal leva univocamente a propriedades locais, mas para que possamos passar de uma propriedade local (mesmoque ela seja vlida em "toda parte") a uma propriedade global, preciso pressupor propriedades do espao, comoconectividade e compacidade. Aes de poder e de manipulao deformam a geometria na vizinhana imediata.Assumem importncia, ento, as estratgias aleatrias e individuais que, embora subordinadas a regras do jogoque prescrevem um conjunto finito de jogadas possveis, podem amplificar flutuaes imperceptveistransformando-as em casas reais e genealogias cognticas que lutam contra o azar localmente, em processosestruturantes que evocam o fenmeno das "estruturas dissipativas" que Prigogine estuda. o objeto das pesquisas mais recentes de Lvi-Strauss. Nada impede que estratgias mistas possam ocorrer aqui(emprestando a terminologia da teoria dos jogos), caso em que se pode prever apenas que vrias regras estaroem superposio, embora empiricamente a observao mostre sempre uma regra singular. Se pensamos aformao de formigueiros a partir de fenmenos locais, como no exemplo dado por Ilya Prigogine, no podemosevitar a comparao com os sistemas de casamento de sociedades indgenas das florestas sul-americanas, nosquais o fenmeno da superposio de estados pode explicar ao mesmo tempo a existncia de vrios modelos decasamento simultneos (indo da endogamia ao casamento por rapto, passando pela troca simtrica), e gruposlocais em que cada um, flutuante e instvel, trata seu entorno como fonte de matria e informao, para, "longedo equilbrio", convert-lo em ordem e continuidade internas: canibalismo estruturante.Mitos se reencontram como partculas agregadas em nebulosas num cu estrelado. S vemos aquelas poeirasmticas de nossa vizinhana, e devemos nos contentar em entender tendncias que operam localmente, infletindo oespao mtico, e apontando para o fato de que ele talvez seja afinal visvel como um todo apenas para umobservador virtual situado num ponto no infinito. A anlise de mitos necessariamente local. Prigogine tem razoacerca do estruturalismo de Lvi-Strauss: nele ordem e acaso, simetria e entropia, interpenetram-se.Tambm utopias mudam de natureza: restariam ento, no lugar das utopias globais do sculo XIX, utopias locais,microestruturas, estilos simblicos realimentados por uma dialtica interior/exterior, sem garantia de permanncia.A simetria fundamental no pensamento de Lvi-Strauss. Mas a simetria existe, por assim dizer, para serquebrada. A simetria temporal quebrada primeiro pela interveno de uma flecha temporal na forma de entropia.Essa primeira quebra de simetria tem como conseqncia uma segunda quebra de simetria entre o global e o local.Mas possvel dizer aqui das investigaes de Lvi-Strauss aquilo que ele disse da msica. Onde esperamossimetria, encontramos desordem. Terminamos assim com Blake. A contradio entre a simetria e o fogo quequeima nas florestas da noite no pode ser abolida. Notas1 Este artigo uma verso revisada de um texto original escrito em portugus, cuja traduo foi publicada naCurrent Anthropology em 1992. Foi a base da exposio que fiz no seminrio Lvi-Strauss e os 90, Departamentode Antropologia da FFLCH da USP, em 26-27 de Novembro de 1999.2 Cf. prefcio de C. Lvi-Strauss a Six leons sur le son et le sens, de Roman Jakobson, Paris, Les Editions deMinuit, l976. [ Links ]Republicado em C. Lvi-Strauss. Le Regard Eloign. Paris, Plon, 1983, Chap. IX, pp. l91-201. O prprio Jakobson observou que os conceitos lingsticos no foram simplesmente aplicados por Lvi-Strauss, mas ganhavam novo significado (C. Lvi-Strauss e Didier Eribon. De prs et de loin. Paris, Editions OdileJacob, l988).3 C. Lvi-Strauss. Tristes tropiques. Paris, Plon, pp. 43 [ Links ]e ss. C. Lvi-Strauss e D. Eribon. De prs etde loin, p. 156.4 DArcy Thompson. On Growth and Form. Cambridge, Cambridge University Press, l961 [l9l7; 2a edio l942].[ Links ]Cf. Lvi-Strauss. Anthropologie Structurale, Paris, Plon, l958, p. 358. [ Links ]O artigo que traza referncia datado de l956, e a edio citada de On Growth and Form de l952.5 Norbert Wiener. Ciberntica. So Paulo, Editora Polgono, l971 [l948]. [ Links ]N. Wiener. Ciberntica eSociedade. So Paulo, Editora Cultrix, l973 [The Human Use of Human Beings, 1 ed. l950; 2 ed. revista l954].6 Claude E. Shannon. The Mathematical Theory of Communication. The University of Illinois Press, l952[l950].[ Links ]Wiener era ctico quanto a tais esperanas (Wiener, op. cit., prefcio a 1. ed. e cap. VIII), e Lvi-Strauss concordava com ele (Anthropologie Structurale, pp. 63-65). Na obra de Lvi-Strauss, de fato, as noescibernticas de feedback, controle e equilbrio no desempenham nenhum papel, em contraste com a importnciaque adquirem em Bateson ( G. Bateson. Mente e Natureza. Francisco Alves, l986 [ Links ][Mind and Nature: ANecessary Unity, l979], esp. cap. IV). Assim, Lvi-Strauss desprezou as aplicaes primeira vista imediatas dolivro de Wiener (como feedback e controle), retendo dele noes tericas como a de grupo de transformao, nissocontrastando tambm com Margaret Mead.7 J. Von Neumann e Oskar Morgenstern. Theory of Games and Economic Behavior. Princeton University Press, l980[l944]. [ Links ]Lvi-Strauss. Anthropologie Structurale, pp. 328-329.8 H mais de um paralelo na construo das obras de Lvi-Strauss e de Von Neumann/Morgenstern. Ambaspossuem uma primeira parte ("troca restrita" ou entre duas metades, "jogo a duas pessoas" respectivamente) euma segunda parte ("troca generalizada" ou entre n classes, "jogo a n pessoas"). As "Estruturas elementares"foram pensadas por Lvi-Strauss como um primeiro momento da teoria, que seria continuada pelas "Estruturascomplexas". Ora, para as "Estruturas elementares", Lvi-Strauss encontrou uma soluo completa; para"Estruturas complexas" no encontrou nunca tal soluo. Von Neumann elucidou completamente os "jogos a duaspessoas" (jogo de redistribuio ou troca), enquanto os "jogos a n pessoas" no possuem uma soluo geral.Quanto analogia entre ritual (= estruturas elementares = histria estacionria) e jogos de soma zero por umlado, e entre jogo ( = estruturas complexas = histria cumulativa) por outro, vale lembrar que jogos de soma zero,economicamente falando, so fenmenos de distribuio, enquanto jogos de soma no-zero implicam produo oudegradao (AS, p.328-329; La Pense Sauvage). Em certo sentido, as sociedades frias so preocupadas com adistribuio correta, e as sociedades quentes so obcecadas pela produo.9 A distino entre grupos contnuos e discretos a principal diferena entre os modelos que DArcy Thompson eLvi-Strauss, respectivamente, utilizam. Essa distino freqente em Lvi-Strauss, que tende a associar contnuoa natural, e discreto a cultural, reiteirando assim uma distino j presente na oposio entre fontica e fonologia.Cf. J.M. Benoist (org.). LIdentit. Paris, Bernard Grasset, l977, p. 332. [ Links ]Ver tambm, por exemplo, C.Lvi-Strauss. LHomme Nu.Paris, Plon, l971, p. 605.10 Hermann Weyl trata da unidade profunda entre fenmenos estudados pela matemtica e a fsica (teoria darelatividade, mecnica quntica, teoria das equaes), e fenmenos da biologia e da arte em termos da presenade simetrias, objeto da teoria matemtica dos grupos (Hermann Weyl. Summetry. Princeton University Press,1952).[ Links ]11 Lvi-Strauss chamou a ateno para essas influncias (Wiener, Shannon, von Neumann) e o papel de AndrWeil evidente basta ler as notas do artigo "A noo de estrutura em Etnologia", e o artigo menos conhecido eda mesma poca sobre matemticas e as cincias humanas. O "Apndice" de Weil includo nas Estruturaselementares do parenteco originou uma pequena literatura matemtica (Lvi-Strauss, L'Homme Nu, pp. 567-8).[ Links ]Agradeo ao matemtico Antnio Galves por ter-me introduzido a essa literatura, presenteando-meno incio dos anos 70 com o texto de um curso de Artibano Micali. Esse texto continha um artigo de Pierre Samuelcom a aplicao da teoria dos grupos teoria dos sistemas de casamento.12 Nicolas Bourbaki, lments d'histoire des mathmatiques. Paris, Hermann, 1960, p. 33.[ Links ]13 Uma mquina de Turing (ou, em formulao semelhante mas independente, uma mquina de Post) umaparato que contm um leitor de fita e que pode encontrar-se em vrios estados. A fita, que imaginada como emprincpio infinita, contm casas marcadas com signos (ou ento vazias). A cada estado da mquina correspondeminstrues sobre a ao da mquina ao ler uma casa da fita. As aes podem ser: alterar um signo lido (deix-locomo est, apag-lo, subsitu-lo por outro signo), mover a fita para a direita, e mudar de estado (ou continuar nomesmo estado). Somar dois e trs significa ento apresentar ao leitor da mquina dois signos, uma casa vazia, etrs signos: a mquina conclui a operao mostrando cinco signos contguos, e pra (indo para o estado "fim").Uma operao mais complexa consistiria em apresentar mquina Hamlet, obtendo dela uma traduo de Hamletpara o portugus. A noo de que mquinas desse tipo contm a essncia de qualquer clculo conhecida como atese de Church (cf. Richard L. Espstein e Walter A. Carnielli, Computability: Computable Functions, Logic, and theFoundations of Mathematics, Pacific Grove: Wadsworth & Brooks/Cole Advanced Books & Software,1989).[ Links ]14 J. Lacan, Ecrits I, Paris, Editions Le Seuil, 1966. Esp. pp. 58-75, " [ Links ]La lettre vole". T. Narcejac,Une machine a lire: le roman policier. Paris, Denoel /Gonthier, 1975, pp. 223 e ss. N. Chomsky. SyntaticStructures, La Hague, Nouton, 1957. [ Links ]G. Deleuze e F. Guattari, L'Anti-Oedipe. C. Lvi-Strauss, Le Cruet le Cuit. [ Links ]O otimismo da dcada de 50 quanto inteligncia artificial encontra-se muito abaladocinqenta anos depois, depois que mesmo as tarefas inteligentes mais simples como o reconhecimento deimagens, mostraram-se muito menos tratveis do que se imaginava. Para uma discusso recente dos modeloscomputacionais da inteligncia, ver Zsolt L. Kovcs, O Crebro e a sua mente: uma introduo neurocinciacomputacional, So Paulo, Ed. Acadmica, 1997. [ Links ]Ver tambm, para a histria desses modelos, domesmo autor, Redes neurais artificiais: fundamentos e aplicaes, So Paulo, Collegium Cognitio, 1996.[ Links ]O fsico matemtico Penrose e o filsofo John Searle rejeitam decididamente a noo de intelignciacomputacional (onde computacional significa aqui uma mquina de Turing).15 N. Bourbaki. Elements de mathematique, Livre I, Theorie des Ensembles, Captulo 4. Structures. Paris,Hermann, (2a ed.), pp. 68-76. [ Links ]A definio a presente reduz-se a dois passos. Primeiro, temosobjetos (cuja natureza intrnsica irrelevante). Construmos ento o que poderamos chamar de ontologiarelacional (por exemplo: o conjunto de todos os pares de objetos). Finalmente, introduzimos leis que restringemessa ontologia relacional (por exemplo, exigimos que os pares se comportem de modo a satisfazer os axionmas deordem). Uma estrutura ento uma ontologia relacional munida de uma ou mais leis que restringem essasrelaes possibilidades (os axiomas da estrutura). As consideraes de Bourbaki so particularmente pertinentespara se compreender a dificuldade de antroplogos como Radcliffe-Brown com essa noo de estrutura: "Surtout ila ete assez difficile ...de se liberer de l'impression que les objets mathematiques nous sont "donnes" avec leurstrucutre..." (p. 73). N. Bourbaki, Elements de mathematiques, Livre I, Teories des ensembles, Fascicule desresultats. Paris, Hermann. [ Links ]Sobre as "estruturas-me": N. Bourbaki, " L'Architecture desMathmatiques" in Lionnais, F. Le (org.) Les grands courants de la pense mathematique. Paris, Albert Blanchard,1962 (2a ed.), pp. 35-47.16 As principais anlises "algbricas" de Lvi-Strauss, aps "LAnalyse structurale en linguistique et enanthropologie" (C. Lvi-Strauss. Anthropologie Structurale. Paris, Plon, l958 [ publicado inicialmente em l945], pp.37-62, [ Links ]esto em Les Structures elementaires de la Parent. Paris, Mouton, l971, 2. ed.[1. ed. l949].Esse livro contm um catlogo de exemplos de grupos finitos de pequena dimenso, suas fatoraes em subgrupose suas representaes por equaes sociolgicas.17 Outros seguiram as pistas deixadas por tantalizantes estruturas selvagens construdas por Lvi-Strauss,elaborando teorias precisas. Cf. Pierre Samuel ("Uma aplicao da teoria dos grupos: grupos de permutaes eregras de casamento em algumas sociedades primitivas". em Artibano Micali. Elementos de lgebra. Rio deJaneiro, Instituto de Matemtica Pura e Aplicada, l967), [ Links ]Franois Lorrain. Reseaux Sociaux etClassifications Sociales Essai sur lAlgebre et la Geometrie des Structures Sociales. Paris, Hermann, l975. C.Gregory. (Gifts and Commodities. Cambridge, Cambridge University Press, l983), [ Links ]Paul Ballonoff eThomas Duchamp. "Graphs and Operators of Marriage Theory", em P.A.Ballonoff. Mathematical Foundations ofSocial Anthropology. Paris, Mouton, l976, pp. 23-44); e Jean Petitot. "Approche morphodynamique de la formulecanonique du mythe", LHomme 106-107, avril-sept. l988, XXVIII (2-3), pp. 24-50. [ Links ]E antroplogoscomo Franoise Hritier (F. Heritier. Lexercice de la parent. Paris, Editions du Seuil, l981, chap. 1) e EduardoViveiros de Castro e poucos outros. Conseqncias curiosas podem resultar de se variarem os axiomas de base.Em EEP Lvi-Strauss alude, por exemplo, a um sistema de casamento formado de duas metades endogmicas (EEPl971: 233), que emergem numa estrutura "no-morganiana" que exija uma "exoprtica" de parentesco (nessecaso, uma exofilia) mas no necessariamente uma exogamia.18 Pode-se dizer talvez que, em Lvi-Strauss, simetria ope-se a assimetria, como atemporalidade atemporalidade, conservao a entropia, reversibilidade a irreversibilidade. H tambm a sugesto de que, demaneira anloga, discreto se ope a contnuo, como vida a morte, e cultura a natureza. H aqui duas oposies, eno uma s.19 F. Derrida. A escritura e a diferena. So Paulo, Editora Perspectiva, l97 .[ Links ]20 Esse procedimento freqente na anlise estrutural de Lvi-Strauss. Em lugar de concentrar a ateno em"objetos dados com suas propriedades" (por exemplo, o "tio materno" e a propriedade de ser "duro" ou "suave"), aateno se volta para os invariantes de relaes (por exemplo, as relaes "irmo da me"/"filho da irm", de umlado, e "marido da me"/"filho da esposa" tm "sinais opostos").21 Pensemos no artigo "Raa e Histria", no qual Lvi-Strauss discute a noo de que a histria tem um sentido euma orientao absolutos e intrnsecos. Em vez disso, diz Lvi-Strauss, os eventos histricos podem ganhar umadireo apenas depois que estabelecemos um sistema de coordenadas: para os europeus, a coordenadatecnolgica, permitindo uma ordem linear na histria, mas excluindo outras coordenadas possveis, tais como oconhecimento teolgico, a sutileza nas artes do corpo e assim por diante.22 Essa idia de identidade, e a noo associada de objetividade, assenta-se assim na possibilidade de traduo(um forma de transformao) entre diferentes sistemas de significado. Ela discutida tambm no artigo "Guerrasculturais e relativismo antropolgico" (no prelo Revista Brasileira de Cincias Sociais).23 Um exemplo dado pela perspectiva de Joana Overing em face da cosmologia dos Piaroa.24 a perspectiva adotada freqentemente por Eduardo Viveiros de Castro.25 Para os observadores europeus o sistema de referncia cultural era fixo, e fenmenos (e.g. mitologias, modosde casamento etc.) de diferentes povos giravam em torno deste sistema com um movimento aparentefreqentemente caprichoso ou inexplicvel. O trabalho comparativo, seja sobre mitologias, seja sobre sistemas decasamento, destaca invariantes estruturais entre esses diferentes fenmenos, evidenciados pela construo demodelos adequados.26 Antes de aprender a "transformar" as observaes de sistemas (e.g. mitologias, modos de casamento), foipreciso "transformar" os referenciais deslocando-se o observador ao longo do mundo. As transformaes(sistemas de casamento, mitologias, que se integram em um grupo de transformaes apreensvel pelo observadorimvel; um observador que se translada para outros sistemas de referncia, e neles apreende um sistema decasamento e uma mitologia como "sua") correspondem construo de modelos comparativos e construo deetnografias, respectivamente.27 Felix Klein, "Das Erlanger Program", em F. Klein. Gesammelte Mathematische Abhandlungen. Primeiro Volume,Berlin, Julius Springer, l921 (l872), pp. 460-497.(" [ Links ]Propriedades geomtricas so caracterizadasatravs de sua invarincia faces transformaes do grupo fundamental", p. 463).28 Hermann Weyl. The Classical Groups. Princeton, Princeton University Press, l946 (l939), pp. 13-23 ("Klein`sErlanger Program"). [ Links ]29 Jacques Monod. Chance and Necessity, Fontana Books, l974 [Le hasard et la necessite. Paris, Editions du Seuil,l970], captulo 6. [ Links ]Essa citao foi escolhida ao acaso entre inmeras outras, e corresponde bem aoesprito do celebrado captulo de On Growth and Form intitulado: "On the theory of transformations or thecomparison of related forms" (DArcy Thompson. On Growth and Form. Cambridge, Cambridge University Press,l983: pp. 268-325, [ Links ]Cf. C. Lvi-Strauss, Mythologiques/ LHomme Nu. Paris, Plon, l971, p. 604-6. Nafsica: "The important things in the world appear as the invariants(...) of these transformations(...) The growth ofthe use of transformation theory (...) is the essence of the new method in theoretical physics" (Paul Dirac. Theprinciples of Quantum Mechanics. Oxford , Clarendon Press, l987[l930]. [ Links ]Richard Feynman. TheCharacter of Physical Law. Cambridge (Mass.), M.I.T. Press, l965.30 Vladmir Propp. A morfologia do conto. [ Links ]31 W. Leibniz. Correspondncia com Clark. Terceira Carta, #4-5, Quarta Carta. [ Links ]O objetivo doraciocnio era demolir a noo de espao absoluto de Newton. A realizao dessa demolio exigiu a teoria darelatividade [P.S.: cabem ressalvas aqui.]32 Herman Weyl. The Theory of Groups and Quantum Mechanics. Dover Publications. Cf. Captulo III (pargrafo 1,"Grupos de transformao"), pp. 110-112.[ Links ]33 "(...) the relativity of any physical theory expresses itself in the group of transformations which leave the lawsof the theory invariant and which therefore describe symmetries, for example of the space and time arenas ofthese theories" (W. Rindler. Essential Relativity. Berlin, Springer Verlag, l977, pp. 1-2).[ Links ]34 Sobre invariantes: "(...) lethnologie contemporaine sapplique a decouvrir et a formuler (...) lois dordre dansplusiers registres de la pense et de lactivite humaines. Invariantes a traves les epoques et les cultures, ellesseules pouvront permettre de surmonter lantinomie apparente entre unicite de la condition humaine, et la pluraliteapparemment inepuisable des formes sous lesquelles nous lapprehendons" (Le Regard Eloignee, p. 62).35 Sem esquecer, porm, do ponto anteriormente enfatizado: que o ponto de vista "distanciado" (o que v osistema de transformaes como um todo, "de longe") dual ao ponto de vista "localizado" (no qual oobservador que se coloca como parte de um grupo de transformaes). Assim, um "olhar distanciado" sobre muitasrealidades humanas possvel sob as condies de numerosos "olhares localizados", cada um focalizado em umuniverso humano. Um o dual do outro.36 A metfora relativstica est em "Raa e Histria" (Anthropologie Structurale Deux. pp. 397-8), publicadooriginariamente em l952, e retomada em "Raa e Cultura" (Le Regard Eloigne. Paris, Plon, l983, pp. 29-30,escrito em l971.[ Links ]37 "Comment meurent les mythes" (Anthopologie Structurale Deux. l973, pp. 301-318 [l973]). [ Links ]C.Lvi-Strauss. Mythologiques/LOrigine des Manires de Table. Paris, Plon, l968, p. 106.38 Sobre as relaes entre o "trabalho" dos fsicos e dos economistas, bem como entre este e as mquinas na eraindustrial, ver Jean-Pierre Maury. Carnot et la machine vapeur. Paris, Presses Universitaires de France, 1986.[ Links ]E tambm Franois Vatin. Le travail: Economie et Physique, 1780-1830. Paris, Presses Universitairesde France,1993.39 "(...) la pense mythique (...) ne semble jamais satisfaite dapporter une seule reponse a un probleme: sitotformule, cette reponse sinsere dans un jeu de transformations ou toutes les autres reponses possiblessengendrent ensemble ou sucessivement (...) jusqu ce que les ressources de cette combinatoire se degradent,ou quelles soient simplement epuises" (Le Regard Eloigne, pp.232-3). Sobre pintura, artesanato e espciesnaturais: "(...) On peut craindre quil en soit de lui comme de ces especes vegetales et animales que lhomme,dans son aveuglement, aneantit les unes aprs les autres" (Le Regard Eloigne. p. 343).40 C. Lvi-Strauss. Tristes Tropiques. Paris, Plon, l955, pp. 48-55 e p. 374. [ Links ]O pr do sol o fecho emC. Lvi-Strauss. Mythologiques,IV, LHomme Nu. Paris, Plon, l971, pp. 620-1: "Cette image [( ...) les phases duncoucher de soleil] nest pas celle de lhumanit mme et, par del lhumanit, de toutes les manhifestations de lavie: oiseaux, papillons, coquillages et autres animaux, plantes avec leurs fleurs, dont levolution developpe etdiversifie les formes, mais toujours pour queelles sabolissent et qu la fin, de la nature, de la vie, de lhomme, detous ces ouvrages subtils et raffines que sont les langues, les institutions sociales, les coutumes, les chefs-douvresde lart et les mythes, quand ils auront tire leurs derniers feux dartifice, rien ne subsiste?" (C. Lvi-Strauss.LHomme Nu. p. 620-1).41 A configurao das nuvens no cu a ilustrao de Wiener para a irreversibilidade. N. Wiener. Ciberntica, Cap.1 [p. 58 da ed. brasileira, So Paulo, Perspectiva, l971]. N. Wiener. Ciberntica e Sociedade [The Human Use ofHuman Beings]. So Paulo, Editora Cultrix, pp. 31-40.42 Cf. Anthropologie Structurale Deu. p. 365 e ss. Lvi-Strauss permite nesse artigo uma comparao com RosaLuxemburgo particularmente na reedio recente de suas idias na forma de uma crtica ao "modo de predao"caracterstico do sistema mundial. Para uma viso contrastante do papel da entropia cultural no mundo moderno:E. Gellner. Nation and Nationalism, Londres, Basil Blackwell, l983. [ Links ]Sobre a iluso de "diversidade"gerada na cultura urbana moderna, ver "New York post- et prefiguratif", Le Regard Eloigne. pp. 344-56.43 "La disparition dune espce quelconque creuse un vide, irreparable a notre echelle, dans le systeme de lacreation". Le Regard Eloigne. 374.44 Walter Benjamin. Magia e tcnica, arte e poltica. Ensaios sobre literatura e histria da cultura. ObrasEscolhidas, volume 1. So Paulo, Editora Brasilisense, l985, pp. 222 e ss.[ Links ]45 Rodney Needham. Structure and Sentiment. Chicago, l962. [ Links ]Louis Dumont. "Introduction", DeuxTheories dAntrhropologie Sociale. Paris, Mouton, l971: "On ne peut pas tirer une formule holiste dune rglelocale", diz Dumont (p. 124).46 Lvi-Strauss costuma utilizar uma formulao diferente: modelos mecnicos esto "na escala do observador", emodelos estatsticos esto "fora da escala do observador" (provavelmente Lvi-Strauss retirou essa formulao deWiener). O ponto, porm, o mesmo: em modelos "fora de escala" impossvel aplicar regras determinadas aobjetos individuais, seja porque h objetos demais ( cujas interaes mltiplas tornam o problema intratvel:problema de n corpos da mecnica clssica, problema geral dos jogos a n pessoas), seja porque os objetos sopequenos demais e a observao interfere em seu comportamento (caso quntico, estudo de pequenos grupos).47 C. Shannon. The Mathematical Theory of Communication. p. 45 et passim.[ Links ]48 Mais uma vez, N. Wiener. Ciberntica. So Paulo, Editora Polgono, l971, p. 87. [ Links ]Jacques Monod.Chance and Necessity. Cap. 51. Ilya Prigogine. La nouvelle alliance. Paris, Galimard, l979. [ Links ]Para umaabordagem mais tcnica, porm ainda lcida para o leitor geral desse e de outros temas fsicos tratados nesseartigo, as Physical Lectures de Richard Feynman so ideais.49 Cf. M. Carneiro da Cunha. Antropologia do Brasil/Mito, Histria, Etnicidade. So Paulo, Editora Brasiliense, l987[l986], pp. 97-108, [ Links ]sobre a etnicidade, no como substncia, mas como operador de preservao dadiversidade.50 Em Raa e Histria, como parte de uma crtica ao etnocentrismo, Lvi-Strauss critica a noo de progresso do ponto de vista de sociedades que funcionam como mquinas de anular o tempo. Em Raa e Cultura, mostra que"mquinas tnicas" (que de fato so uma variante das mquinas de anular o tempo) so antientrpicas. Cf. E.Gellner. Nation and Nationalism. London, Basil Blacwell, l983.[ Links ]51 Cf. Manuela C. da Cunha. "Parecer sobre critrios de Identidade tnica". Essa teoria da etnicidade, claro,ilustra a oposio entre teorias "Lvi-Straussianas" e "relativistas" da cultura. Ela no supe a "irredutibilidade" a no ser no sentido de que um fenmeno cultural no irredutvel a um fenmeno econmico ou fisiolgico. J aidia de "irredutibilidade" no sentido de que a linguagem de um grupo social impossvel de ser traduzida nalinguagem de outro, como na hiptese de Whorf, e expresso radical do culturalismo claramente descartada por razes discutidas neste artigo.52 Um par de artigos recentes indicam que a limitao bsica no est no processo de obteno da informao, esim na necessidade que tem o demnio de descartar memria intil: de jogar o lixo das velhas impresses fora. Odemnio precisa ser ajudado a esquecer. Charles Bennet e Rolf Landauer. "The fundamental physical limits tocomputation", Scientific American, 253(1), jul. l985, pp. 38-46. [ Links ]Charles Bennet. "Demons, Enginesand the Second Law", Scientific American. 257(5), nov l987, pp. 88-96.53 Mauro W. B. de Almeida. "Dilemas da Razo Prtica", Anurio Antropolgico 86. Ed. Universidade deBraslia/Tempo Brasileiro, l988, pp. 213-26. [ Links ]54 Jean Petitot. "Local/global", "Sistemas de Referncia" em Enciclopdia Einaudi. vol.4, Local/Global, Lisboa,Imprensa Nacional, l985, pp.11-89.[ Links ] ABSTRACT: In a famous but often misunderstood article, Lvi-Strauss defines the notions of structureand model, and asserts the significance of these notions for the social sciences. We find there notionssuch as "group", "topology" and "order", as well as the distinction between "mechanical models" and"statistical models", and a classification of the social sciences (history, sociology, etnography andethnology) based on such notions. It this a residue of "scientificism", to be discarded in later works,and to be contrasted with the "humanism" of Tristes Tropiques, for instance? The answer is no, notonly because such notions stay alive in Lvi-Strauss later works, but also because some of the mostbasic ideas on society and history, present in Tristes Tropiques, spring from them. It is true that Lvi-Strauss uses such notions in a metaphorical mode, so that it is useless to seek in his texts precisescientific definitions. By employing such notions, always guided by a conscious effort towardscombining sensibility and reason, and disrespecting the currently trendy cleavage between"Geistwissenschaften" and "Naturwissenchaften", Lvi-Strauss has expressed some of his centralthemes. One of them is the significance of symmetry as a fundamental property of culture and naturealike. Another theme is the view of history as a loss of symmetry. These basic themes are interspersedin his analyses of kinship and myth, and also in many texts on music and painting. The researchprogram formulated by Lvi-Strauss in his article on "The Notion of Structure in Anthropology", as wellas in La Pense Sauvage, often treated as if it were outdated, remains influential outside theanthropological mainstream, in disciplines such as neuroscience, ethnoscience and the theory of self-organizing systems. This article tries to explain why.KEY WORDS: structuralism, structure, entropy, symmetry, mathematical groups. Recebido em setembro de 1999.Departamento de Antropologia FFLCH/USPAv. Professor Luciano Gualberto 315Cidade Universitria05508-900 So Paulo SP BrazilTel.: +55 11 3091-2347Fax: +55 11 [email protected]