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António Nóvoa Professores Imagens do futuro presente EDUCA

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António Nóvoa

Professores

Imagens do futuropresente

EDUCA

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Lisboa | 2009

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António Nóvoa

Professores

Imagens do futuro presente

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EDUCA

Lisboa | 2009

EDUCA

Instituto de EducaçãoUniversidade de Lisboa

Alameda da Universidade

1649-013 Lisboa | Portugal

Professores: Imagens do futuro presente

© António Nóvoa

Capa de Mário Seixas,

com colagem de Cruzeiro Seixas [colecçãoparticular]

Fora de colecção

 Julho de 2009

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 Tipografia: Relgráfica artes gráficas Lda., Benedita

Depósito legal: ???????

ISBN: 978-989-8272-02-7

Sumário

Nota de apresentação |pág. 7

Capítulo 1Professores:O futuro ainda demora muito tempo? |pág. 9

Capítulo 2Para uma formação de professoresconstruída dentro da profissão |pág.25

Capítulo 3

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A escola e a cidadania: Apontamentos incómodos| pág. 47

Capítulo 4Educação 2021: Para uma história do futuro |pág. 69

Bibliografia | pág.93

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Nota de apresentação

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Capítulo 1

Professores:

O futuro ainda demoramuito tempo?

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ssistimos, nos últimos anos, a umregresso dos professores à ribaltaeducativa, depois de quase quarenta

anos de relativa invisibilidade. A sua importâncianunca esteve em causa, mas os olhares viraram-separa outros problemas: nos anos 70, foi o tempo daracionalização do ensino, da pedagogia por

objectivos, do esforço para prever, planificar,controlar; depois, nos anos 80, vieram as grandesreformas educativas, centradas na estrutura dossistemas escolares e, muito particularmente, naengenharia do currículo; nos anos 90, dedicou-seuma atenção especial às organizações escolares,ao seu funcionamento, administração e gestão.

A

 Já perto do final do século XX, importantes estudosinternacionais, comparados, alertaram para oproblema das aprendizagens. Learning matters. Equando se fala de aprendizagens, fala-se,inevitavelmente, de professores. Um relatóriopublicado pela OCDE em 2005 – Teachers matter –

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inscreve “as questões relacionadas com a profissãodocente como uma das grandes prioridades das

políticas nacionais”.Paralelamente a estes estudos comparados, degrande difusão mundial, duas outras realidades seimpõem como temas obrigatórios de reflexão e deintervenção.

Por um lado, as questões da diversidade, nas suas

múltiplas facetas, que abrem caminho para umaredefinição das práticas de inclusão social e deintegração escolar. A construção de novaspedagogias e métodos de trabalho põedefinitivamente em causa a ideia de um modeloescolar único e unificado.

Por outro lado, os desafios colocados pelas novas

tecnologias que têm vindo a revolucionar o dia-a-dia das sociedades e das escolas. Mas, como bemescreve Manuel Castells, o essencial reside naaquisição de uma capacidade intelectual deaprendizagem e de desenvolvimento, o que colocaos professores no centro da “nova pedagogia”(2001, p. 278).

Os professores reaparecem, neste início do séculoXXI, como elementos insubstituíveis não só napromoção das aprendizagens, mas também naconstrução de processos de inclusão querespondam aos desafios da diversidade e no

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desenvolvimento de métodos apropriados deutilização das novas tecnologias.

É este o pano de fundo do meu ensaio: o regressodos professores ao centro das nossas preocupaçõese das nossas políticas. Adoptarei um tompropositadamente polémico, e até talvez excessivo,com o propósito de tornar mais nítidas as minhasposições, suscitando um debate que me pareceinadiável sobre a concretização, na prática, de umfuturo há tanto tempo anunciado.

1. Um largo consenso sobre osprofessores e o seu desenvolvimentoprofissional

Para preparar este ensaio recolhi a mais variadadocumentação: relatórios internacionais, artigoscientíficos, discursos políticos, documentos sobre aformação de professores, livros e teses dedoutoramento, etc. Ao reler este conjunto díspar demateriais, produzidos pelas mais diversasinstâncias, percebe-se a utilização recorrente dos

mesmos conceitos e linguagens, das mesmasmaneiras de falar e de pensar os problemas daprofissão docente.

Parece que estamos todos de acordo quanto aosgrandes princípios e até quanto às medidas que é

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necessário tomar para assegurar a aprendizagemdocente e o desenvolvimento profissional dos

professores: articulação da formação inicial,indução e formação em serviço numa perspectivade aprendizagem ao longo da vida; atenção aosprimeiros anos de exercício profissional e àinserção dos jovens professores nas escolas;valorização do professor reflexivo e de umaformação de professores baseada na investigação;

importância das culturas colaborativas, do trabalhoem equipa, do acompanhamento, da supervisão eda avaliação dos professores; etc.

Este consenso discursivo, bastante redundante epalavroso, para o qual todos contribuímos, foi-setornando dominante no decurso da última década.

Não estamos apenas a falar de palavras, mastambém das práticas e das políticas que elastransportam e sugerem.

Dois grandes grupos contribuíram para produzir evulgarizar este discurso.

O primeiro grupo inclui investigadores da área daformação de professores, das ciências da educaçãoe das didácticas, redes institucionais e grupos detrabalho diversos. Nos últimos quinze anos, estacomunidade produziu um conjunto impressionantede textos, que tem como marca o conceito de

  professor reflexivo e que fez uma viragem no

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pensamento sobre os professores e a suaformação.

O segundo grupo é composto pelos especialistasque actuam como consultores ou que fazem partedas grandes organizações internacionais (OCDE,União Europeia, etc.). Apesar da suaheterogeneidade, eles criaram e difundiram, noplano mundial, práticas discursivas fortementealicerçadas em argumentos comparados. A sualegitimidade funda-se sobretudo no conhecimentodas redes internacionais e dos dados comparados enão tanto no domínio teórico de uma área científicaou profissional (Nóvoa & Lawn, 2002).

Estes dois grupos, mais do que os professores,contribuíram para renovar os estudos sobre a

profissão docente. Ao fazer esta afirmação, nãoposso, todavia, deixar de recordar o avisopremonitório de David Labaree: os discursos sobrea profissionalização dos professores tendem amelhorar o estatuto e o prestígio dos especialistas(formadores de professores, investigadores, etc.)mais do que a promover a condição e o estatuto

dos próprios professores (Labaree, 1992).

A inflação retórica sobre a missão dos professoresimplica dar-lhes uma maior visibilidade social, oque reforça o seu prestígio, mas provoca tambémcontrolos estatais e científicos mais apertados,

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conduzindo assim a uma desvalorização das suascompetências próprias e da sua autonomia

profissional. Se não atendermos a este paradoxodificilmente compreenderemos algumas dascontradições que atravessam a história da profissãodocente (Nóvoa, 1998).

Nos últimos anos, houve uma expansão semprecedentes da comunidade da formação deprofessores, em particular dos departamentosuniversitários na área da Educação, dosespecialistas internacionais e também da “indústriado ensino”, com os seus produtos tradicionais(livros escolares, materiais didácticos, etc.)acompanhados agora de uma panóplia detecnologias educativas.

Nestas três esferas de acção produziu-se umainflação discursiva sobre os professores. Mas osprofessores não foram os autores destes discursose, num certo sentido, viram o seu territórioprofissional e simbólico ocupado por outros grupos.Devemos ter consciência deste problema sequeremos compreender as razões que têm

dificultado a concretização, na prática, de ideias ediscursos que parecem tão óbvios e consensuais.

Deixem-me retomar uma provocação que fiz háquase vinte anos e que me causou alguns

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dissabores. Em 1991, reagi ao insulto de BernardShaw, acrescentando-lhe duas máximas:

Quem sabe, faz.

Quem não sabe, ensina.

Quem não sabe ensinar, forma os professores.

Quem não sabe formar professores, faz investigação educacional.

Procurava, num raciocínio ab absurdo, chamar aatenção para certas derivas que legitimavam comofiguras de referência especialistas e universitáriossem qualquer ligação à profissão docente e aotrabalho escolar ao mesmo tempo quedeslegitimavam os professores de uma intervenção

no seu próprio campo profissional reduzindo-os aum papel secundário na formação de professores ena investigação educacional.

O excesso dos discursos esconde, frequentemente,uma grande pobreza das práticas. Temos umdiscurso coerente, em muitos aspectos consensual,

mas raramente temos conseguido fazer aquilo quedizemos que é preciso fazer. Na segunda partedeste ensaio, argumentarei sobre a necessidade deconstruir políticas que reforcem os professores, osseus saberes e os seus campos de actuação, quevalorizem as culturas docentes, e que não

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transformem os professores numa profissãodominada pelos universitários, pelos peritos ou pela

“indústria do ensino”.

2. Como fazer aquilo que dizemos que épreciso fazer?

O que será necesário fazer para dar coerência aosnossos propósitos, materializando na prática oconsenso que se vem elaborando em torno daaprendizagem docente e do desenvolvimentoprofissional? Talvez seja possível assinalar trêsmedidas, que estão longe de esgotar as respostaspossíveis, mas que podem ajudar a superar muitosdos dilemas actuais.

Primeira medida - É preciso passar aformação de professores para dentro daprofissão

A frase que escolhi para subtítulo – É preciso passara formação de professores para dentro da profissão

– soa de modo estranho. Ao recorrer a estaexpressão, quero sublinhar a necessidade de osprofessores terem um lugar predominante naformação dos seus colegas. Não haverá nenhumamudança significativa se a “comunidade dosformadores de professores” e a “comunidade dos

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professores” não se tornarem mais permeáveis eimbricadas. O exemplo dos médicos e dos hospitais

escolares e o modo como a sua preparação estáconcebida nas fases de formação inicial, de induçãoe de formação em serviço talvez nos possa servirde inspiração.

A este propósito, merece referência umapontamento recente de Lee Shulman, intituladoUma proposta imodesta.

Lee Shulman explica que um dia acompanhou arotina diária de um grupo de estudantes eprofessores médicos num hospital escolar. O grupoobservou sete doentes, estudando cada caso comouma “lição”. Havia um relatório sobre o paciente,uma análise da situação, uma reflexão conjunta,

um diagnóstico e uma terapia. No final, o médicoresponsável discutiu com os internos (alunos maisavançados) a forma como tinha decorrido a visita eos aspectos a corrigir. De seguida, realizou-se umseminário didáctico sobre a função pulmonar. O diaterminou com um debate, mais alargado, sobre arealidade do hospital e sobre as mudanças

organizacionais a introduzir para garantir aqualidade dos cuidados de saúde. Lee Shulmanescreve que viu uma instituição reflectircolectivamente sobre o seu trabalho, mobilizandoconhecimentos, vontades e competências. E afirmaque este modelo constitui não só um importante

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processo pedagógico, mas também um exemplo deresponsabilidade e de compromisso. Neste hospital,

a reflexão partilhada não é uma mera palavra.Ninguém se resigna com o insucesso. Há umenvolvimento real na melhoria e na mudança daspráticas hospitalares.

Advogo um sistema semelhante para a formaçãode professores:

(i) estudo aprofundado de cada caso,sobretudo dos casos de insucesso escolar;

(ii) análise colectiva das práticaspedagógicas;

(iii) obstinação e persistência profissional

para responder às necessidades e anseiosdos alunos;

(iv) compromisso social e vontade demudança.

Na verdade, não é possível escrever textos atrás detextos sobre a  praxis e o  practicum, sobre a

 phronesis e a prudentia como referências do saberdocente, sobre os  professores reflexivos, se nãoconcretizarmos uma maior presença da profissãona formação.

É importante assegurar que a riqueza e acomplexidade do ensino se tornem visíveis, do

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ponto de vista profissional e científico, adquirindoum estatuto idêntico a outros campos de trabalho

académico e criativo. E, ao mesmo tempo, éessencial reforçar dispositivos e práticas deformação de professores baseadas numainvestigação que tenha como problemática a acçãodocente e o trabalho escolar.

Não se trata, escusado será dizer, de defenderperspectivas de mitificação da prática oumodalidades de anti-intelectualismo na formaçãode professores  (Ladwig, 2008). Trata-se, sim, deafirmar que as nossas propostas teóricas só fazemsentido se forem construídas dentro da profissão,se forem apropriadas a partir de uma reflexão dosprofessores sobre o seu próprio trabalho. Enquanto

forem apenas injunções do exterior, serão bempobres as mudanças que terão lugar no interior docampo profissional docente.

Segunda medida - É preciso promover novosmodos de organização da profissão

A segunda medida que proponho aponta para anecessidade de promover novos modos deorganização da profissão. Grande parte dosdiscursos torna-se irrealizável se a profissãocontinuar marcada por fortes tradiçõesindividualistas ou por rígidas regulações externas,

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designadamente burocráticas, que se têmacentuado nos últimos anos.

Quanto mais se fala da autonomia dos professoresmais a sua acção surge controlada, por instânciasdiversas, conduzindo a uma diminuição das suasmargens de liberdade e de independência. Oaumento exponencial de dispositivos burocráticosno exercício da profissão não deve ser vista comouma mera questão técnica ou administrativa, masantes como a emergência de novas formas degoverno e de controlo da profissão.

A colegialidade, a partilha e as culturascolaborativas não se impõem por via administrativaou por decisão superior. Mas o exemplo de outrasprofissões, como os médicos, os engenheiros ou os

arquitectos, pode inspirar os professores. A formacomo construíram parcerias entre o mundoprofissional e o mundo universitário, como criaramprocessos de integração dos mais jovens, comoconcederam uma grande centralidade aosprofissionais mais prestigiados ou como sepredispuseram a prestar contas públicas do seu

trabalho são exemplos para os quais vale a penaolhar com atenção.

Não é possível preencher o fosso entre os discursose as práticas se não houver um campo profissionalautónomo, suficientemente rico e aberto. Hoje,

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Mas nada será conseguido se não se alterarem ascondições existentes nas escolas e as políticas

públicas em relação aos professores. É inútil apelarà reflexão se não houver uma organização dasescolas que a facilite. É inútil reivindicar umaformação mútua, inter-pares, colaborativa, se adefinição das carreiras docentes não for coerentecom este propósito. É inútil propor uma qualificaçãobaseada na investigação e parcerias entre escolas

e instituições universitárias se os normativos legaispersistirem em dificultar esta aproximação.

As perguntas sucedem-se. Será que, hoje, muitosprofessores não são bem menos reflexivos (porfalta de tempo, por falta de condições, por excessode material didáctico pré-preparado, por

deslegitimação face aos universitários e aosperitos) do que muitos dos seus colegas queexerceram a docência num tempo em que aindanão se falava do “professor reflexivo”? Numapalavra, não vale a pena repetir intenções que nãotenham uma tradução concreta em compromissosprofissionais, sociais e políticos.

Terceira medida - É preciso reforçar adimensão pessoal e a presença pública dosprofessores

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Em 1984, Ada Abraham escreveu esse belo livro,L’enseignant est une personne, que se tornou um

símbolo de diversas correntes de investigaçãosobre os professores. Mas, apesar dos enormesavanços neste domínio, é preciso reconhecer quefalta ainda elaborar aquilo que tenho designado poruma teoria da pessoalidade que se inscreve nointerior de uma teoria da profissionalidade. Trata-sede construir um conhecimento pessoal (um auto-

conhecimento) no interior do conhecimentoprofissional e de captar o sentido de uma profissãoque não cabe apenas numa matriz técnica oucientífica. Toca-se aqui em qualquer coisa deindefinível, mas que está no cerne da identidadeprofissional docente.

Este esforço conceptual é decisivo para secompreender a especificidade da profissão docente,mas também para que se construam percursossignificativos de aprendizagem ao longo da vida.Recordo Bertrand Schwartz (1967), em texto escritohá mais de quarenta anos: a Educação Permanentecomeçou por ser um direito pelo qual se bateram

gerações de educadores, transformou-se depoisnuma necessidade e agora é vista como umaobrigação.

A aprendizagem ao longo da vida justifica-se comodireito da pessoa e como necessidade da profissão,mas não como obrigação ou constrangimento. A

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crítica de Nikolas Rose à emergência de um novoconjunto de obrigações educacionais merece ser

recordada: “O novo cidadão é obrigado a envolver-se num trabalho incessante de formação e re-formação, de aquisição e reaquisição decompetências, de aumento das certificações e depreparação para uma vida de procura permanentede um emprego: a vida está a tornar-se umacapitalização contínua do self ” (1999, p. 161).

Muitos programas de formação contínua têm-serevelado inúteis, servindo apenas para complicarum quotidiano docente já de si fortementeexigente. É necessário recusar o consumismo decursos, seminários e acções que caracteriza oactual “mercado da formação” sempre alimentado

por um sentimento de “desactualização” dosprofessores. A única saída possível é o investimentona construção de redes de trabalho colectivo quesejam o suporte de práticas de formação baseadasna partilha e no diálogo profissional.

Os lugares da formação podem reforçar a presençapública dos professores. Tem-se alargado o

interesse público pela coisa educativa. Mas,paradoxalmente, também aqui se tem notado afalta dos professores. Fala-se muito das escolas edos professores. Falam os jornalistas, os colunistas,os universitários, os especialistas. Não falam osprofessores. Há uma ausência dos professores, uma

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espécie de silêncio de uma profissão que perdeuvisibilidade no espaço público.

Hoje, impõe-se uma abertura dos professores parao exterior. Comunicar com a sociedade é tambémresponder perante a sociedade. Possivelmente, aprofissão tornar-se-á mais vulnerável, mas esta é acondição necessária para a afirmação do seuprestígio e do seu estatuto social. Nas sociedadescontemporâneas, a força de uma profissão define-se, em grande parte, pela sua capacidade decomunicação com o público.

* * * * *

Ao longo deste ensaio evitei ser redundante naafirmação de princípios que me parecem, hoje,bastante consensuais. Procurei antes transmitir,sem rodeios, a minha opinião sobre a distância quesepara o excesso dos discursos da pobreza daspráticas. A consciência aguda deste “fosso”convida-nos a encontrar novos caminhos para uma

profissão que, neste início do século XXI, volta aadquirir uma grande relevância pública.

Falta-nos talvez, como diz Ann Lieberman (1999),ter a coragem de começar: “Apesar da urgência, énecessário que as pessoas possuam o tempo e as

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condições humanas e materiais para ir mais longe.O trabalho de formação deve estar próximo da

realidade escolar e dos problemas sentidos pelosprofessores. É isto que não temos feito”.

É preciso começar. Parece que todos sabemos, eaté concordamos, com o que deve ser o futuro daprofissão docente. Mas temos dificuldade em darpassos concretos nesse sentido. Por isso, quisorganizar este ensaio em torno da pergunta: Seráque o futuro ainda demora muito tempo?

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Capítulo 2

Para uma formação deprofessores

construída dentro daprofissão

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educação vive um tempo de grandesincertezas e de muitas perplexidades.Sentimos a necessidade da mudança,

mas nem sempre conseguimos definir-lhe o rumo.Há um excesso de discursos, redundantes erepetitivos, que se traduz numa   pobreza de

 práticas.

AHá momentos em que parece que todos dizemos omesmo, como se as palavras ganhassem vidaprópria e se desligassem da realidade das coisas.As organizações internacionais e as redes que hojenos mantêm permanentemente ligados contribuempara esta vulgata que tende a vendar mais do quea desvendar.

O campo da formação de professores estáparticularmente exposto a este efeito discursivo,que é também um efeito de moda. E a moda é,como todos sabemos, a pior maneira de enfrentaros debates educativos. Os textos, asrecomendações, os artigos e as teses sucedem-se a

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um ritmo alucinante repetindo os mesmosconceitos, as mesmas ideias, as mesmas propostas.

É difícil não sermos contaminados por este“discurso gasoso” que ocupa todo o espaço e quedificulta a emergência de modos alternativos depensar e de agir (Nóvoa & DeJong-Lambert, 2003).Mas é preciso fazer um esforço para manter alucidez e, sobretudo, para construir propostaseducativas que nos façam sair deste círculo viciosoe nos ajudem a definir o futuro da formação deprofessores.

O meu ensaio constrói-se em torno de umargumento muito simples: a necessidade de umaformação de professores construída dentro daprofissão. Procurarei iluminar cinco facetas desta

problemática, a partir de palavras que são tambémpropostas de acção: práticas, profissão, pessoa,partilha, público.

O ensaio tem como pano de fundo a convicção deque estamos a assistir, neste início do século XXI, aum regresso dos professores ao centro daspreocupações educativas. Os anos 70 forammarcados pela racionalização do ensino, apedagogia por objectivos, a planificação. Os anos80 pelas reformas educativas e pela atenção àsquestões do currículo. Os anos 90 pela organização,administração e gestão dos estabelecimentos de

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ensino. Agora, parece ter voltado o tempo dosprofessores.

E, num tempo assim, talvez valha a pena regressara uma pergunta que deixámos de fazer há muitosanos: O que é um bom professor? 

O que é um bom professor?

Sabemos todos que é impossível definir o “bomprofessor”, a não ser através dessas listasintermináveis de “competências”, cuja simplesenumeração se torna insuportável. Mas é possível,talvez, esboçar alguns apontamentos simples,sugerindo disposições que caracterizam o trabalhodocente nas sociedades contemporâneas.

Reconheço que o conceito de disposiçãolevanta algumas dificuldades. Limito-me aassinalar, brevemente, as razões por quea ele recorro em vez de competências.

Durante muito tempo, procuraram-se os

atributos ou as características quedefiniam o “bom professor”. Estaabordagem conduziu, já na segundametade do século XX, à consolidação deuma trilogia que teve grande sucesso:saber (conhecimentos), saber-fazer(capacidades), saber-ser (atitudes).

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Nos anos 90 foi-se impondo um outroconceito, competências, que assumiu um

papel importante na reflexão teórico e,sobretudo, nas reformas educativas.  Todavia, apesar de inúmerasreelaborações, nunca conseguiu libertar-se das suas origens comportamentalistase de leituras de cariz técnico einstrumental.

Não espanta, por isso, que se tenhaadaptado tão bem às políticas da“qualificação dos recursos humanos”, da“empregabilidade” e da “formação aolongo da vida”, adquirindo uma grandevisibilidade nos textos das organizaçõesinternacionais, em particular da UniãoEuropeia.

Ao sugerir um novo conceito, disposição,pretendo romper com um debate sobre ascompetências que me parece saturado.Adopto um conceito mais “liquído” emenos “sólido”, que pretende olharpreferencialmente para a ligação entre asdimensões pessoais e profissionais na

produção identitária dos professores.Coloco, assim, a tónica numa(pre)disposição que não é natural masconstruída, na definição pública de umaposição com forte sentido cultural, numa profissionalidade docente que não pode

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deixar de se construir no interior de uma pessoalidade do professor .

1. O conhecimento. Aligeiro as palavras dofilósofo francês Alain: Dizem-me que, para instruir,é necessário conhecer aqueles que se instruem.Talvez. Mas bem mais importante é, sem dúvida,conhecer bem aquilo que se ensina (1986, p. 55).

Alain tinha razão. O trabalho do professor consistena construção de práticas docentes que conduzamos alunos à aprendizagem. Como escreveu GastonBachelard, em 1934, “é preciso substituir oaborrecimento de viver pela alegria de pensar” (cf.Gil, 1993). E ninguém pensa no vazio, mas antes naaquisição e na compreensão do conhecimento.

2. A cultura profissional. Ser professor écompreender os sentidos da instituição escolar,integrar-se numa profissão, aprender com oscolegas mais experientes. É na escola e no diálogocom os outros professores que se aprende aprofissão. O registo das práticas, a reflexão sobre otrabalho e o exercício da avaliação são elementoscentrais para o aperfeiçoamento e a inovação. Sãoestas rotinas que fazem avançar a profissão.

3. O tacto pedagógico. Quantos livros segastaram para tentar apreender este conceito tãodifícil de definir? Nele cabe essa capacidade de

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relação e de comunicação sem a qual não secumpre o acto de educar. E também essa

serenidade de quem é capaz de se dar ao respeito,conquistando os alunos para o trabalho escolar.Saber conduzir alguém para a outra margem, oconhecimento, não está ao alcance de todos. Noensino, as dimensões profissionais cruzam-sesempre, inevitavelmente, com as dimensõespessoais.

4. O trabalho em equipa. Os novos modos deprofissionalidade docente implicam um reforço dasdimensões colectivas e colaborativas, do trabalhoem equipa, da intervenção conjunta nos projectoseducativos de escola. O exercício profissionalorganiza-se, cada vez mais, em torno de

“comunidades de prática”, no interior de cadaescola, mas também no contexto de movimentospedagógicos que nos ligam a dinâmicas que vãopara além das fronteiras organizacionais.

5. O compromisso social. Podemos chamar-lhediferentes nomes, mas todos convergem no sentidodos princípios, dos valores, da inclusão social, da

diversidade cultural. Educar é conseguir que acriança ultrapasse as fronteiras que, tantas vezes,lhe foram traçadas como destino pelo nascimento,pela família ou pela sociedade. Hoje, a realidade daescola obriga-nos a ir além da escola. Comunicar

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com o público, intervir no espaço público daeducação, faz parte do ethos profissional docente.

Aqui ficam cinco disposições que são essenciais àdefinição dos professores nos dias de hoje. Elasservem-nos de pretexto para a elaboração daspropostas seguintes sobre a formação deprofessores. São propostas genéricas que,devidamente contextualizadas, podem inspirar umarenovação dos programas e das práticas deformação.

É escusado dizer que, sobretudo no caso daformação de professores do ensino secundário, odomínio científico de uma determinada área doconhecimento é absolutamente imprescindível.Sem esse conhecimento tudo o resto é irrisório.

Parto do pressuposto que, na actual configuraçãodas políticas europeias, se define o Mestrado comograu académico para a entrada na profissãodocente. Os candidatos ao professorado terão,assim, de percorrer três momentos de formação:

1.º A graduação numa determinada disciplinacientífica;

2.º O mestrado em ensino, com um fortereferencial didáctico, pedagógico eprofissional;

3.º Um período probatório, de induçãoprofissional.

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As propostas seguintes incidem apenas, como éevidente, sobre o segundo e o terceiro momentos

do percurso de formação como professor.

P1 – Práticas

A formação de professores deve assumir umaforte componente práxica, centrada na

aprendizagem dos alunos e no estudo decasos concretos, tendo como referência otrabalho escolar.

O debate educativo esteve marcado, durante muitotempo, pela dicotomia teoria/prática. É certo que,logo no final do século XIX, Henri Marion afirmaque, de entre todas as ciências práticas, a ciência

política é a mais próxima da pedagogia, uma vezque tem como objectivo a acção e não o saber(1887, p. 2238). E, alguns anos mais tarde, em1902, Émile Durkheim avança mesmo o conceito deteoria prática, para tentar escapar a uma inútildicotomia (1993, p. 80).

Mas a verdade é que não houve uma reflexão quepermitisse transformar a prática em conhecimento.E a formação de professores continuou a serdominada mais por referências externas do que porreferências internas ao trabalho docente. Impõe-e

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inverter esta longa tradição, e instituir as práticasprofissionais como lugar de reflexão e de formação.

Não se trata de adoptar uma qualquer derivapraticista e, muito menos, de acolher as tendênciasanti-intelectuais na formação de professores(Nóvoa, 2008). Trata-se, sim, de abandonar a ideiade que a profissão docente se define,primordialmente, pela capacidade de transmitir umdeterminado saber. É esta concepção que temlevado às intermináveis discussões entre“republicanos”, que apenas se interessariam pelosconteúdos científicos, e “pedagogos”, quecolocariam os métodos de ensino acima de tudo oresto (adopta-se aqui a divisão entre “republicanos”e “pedagogos” habitual nas polémicas educativas

em França – ver a tese de doutoramento de Alain Trouvé, 2006).

Não. O que caracteriza a profissão docente é umlugar outro, um terceiro lugar, no qual as práticassão investidas do ponto de vista teórico emetodológico, dando origem a à construção de umconhecimento profissional docente. Como escreve

David Labaree (2000), as práticas docentes sãoextremamente difíceis e complexas, mas, porvezes, alimenta-se publicamente a ideia de queensinar é muito simples, contribuindo assim paraum desprestígio da profissão.

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A este propósito, a comparação com a formaçãodos médicos, que vem desde a origem das

primeiras escolas normais, no século XIX, continuaa revelar-se fértil. Inspirado por um texto de LeeShulman,   An immodest proposal, tive aoportunidade, recentemente, de acompanhar umgrupo de estudantes e professores de Medicinanum hospital universitário. Do que pude observar,quero chamar a atenção para quatro aspectos: i) o

modo como a formação se realiza a partir daobservação, do estudo e da análise de cada caso; ii)a identificação de aspectos a necessitarem deaprofundamentos teóricos, designadamente quantoà possibilidade de distintas abordagens de umamesma situação; iii) a existência de uma reflexãoconjunta, sem confundir os papéis de cada um

(chefe da equipa, médicos, internos, estagiários,etc.), mas procurando mobilizar um conhecimentopertinente; iv) a preocupação com questõesrelacionadas com o funcionamento dos serviçoshospitalares e a necessidade de introduzirmelhorias de diversa ordem.

Estamos perante um modelo que pode servir deinspiração para a formação de professores. Osquatro aspectos acima mencionados encerramquatro lições importantes.

Em primeiro lugar, a referência sistemática a casosconcretos, e o desejo de encontrar soluções que

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permitam resolvê-los. Estes casos são “práticos”,mas só podem ser resolvidos através de uma

análise que, partindo deles, mobilizaconhecimentos teóricos. A formação de professoresganharia muito se se organizasse,preferentemente, em torno de situações concretas,de insucesso escolar, de problemas escolares ou deprogramas de acção educativa. E se inspirasse

 junto dos futuros professores a mesma obstinação

e persistência que os médicos revelam na procuradas melhores soluções para cada caso.

Em segundo lugar, a importância de umconhecimento que vai para além da “teoria” e da“prática” e que reflecte sobre o processo históricoda sua constituição, as explicações que

prevaleceram e as que foram abandonadas, o papelde certos indivíduos e de certos contextos, asdúvidas que persistem, as hipóteses alternativas,etc. Como escreve Lee Shulman (1986) num textoseminal, para ser professor não basta dominar umdeterminado conhecimento, é preciso compreendê-lo em todas as suas dimensões.

Em terceiro lugar, a procura de um conhecimentopertinente, que não é uma mera aplicação práticade uma qualquer teoria, mas que exige sempre umesforço de reelaboração. Estamos no âmago dotrabalho do professor. Nos últimos vinte anos,vulgarizou-se o conceito de transposição didáctica,

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trabalhado por Yves Chevallard (1985), paraexplicar a acção docente. Posteriormente, Philippe

Perrenoud (1998) avançou o conceito detransposição pragmática para sublinhar aimportância da mobilização prática dos saberes emsituações inesperadas e imprevisíveis.Pessoalmente, prefiro falar em transformaçãodeliberativa, na medida em que o trabalho docentenão se traduz numa mera transposição, pois supõe

uma transformação dos saberes, e obriga a umadeliberação, isto é, a uma resposta a dilemaspessoais, sociais e culturais.

Em quarto lugar, a importância de conceber aformação de professores num contexto deresponsabilidade profissional, sugerindo uma

atenção constante à necessidade de mudanças nasrotinas de trabalho, pessoais, colectivas ouorganizacionais. A inovação é um elemento centraldo próprio processo de formação.

P2 – Profissão

A formação de professores deve passar para“dentro” da profissão, isto é, deve basear-sena aquisição de uma cultura profissional,concedendo aos professores mais experientes

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um papel central na formação dos mais jovens.

Esta segunda proposta é a que melhor ilustra oconjunto dos argumentos que procuro desenvolverneste ensaio. Ela poderia estar escrita de outromodo: devolver a formação de professores aosprofessores. A frase pressupõe que os professoresterão sido afastados dos programas de formação. E,de facto, assim é.

Os médicos, os engenheiros ou os arquitectos têmum papel dominante na formação dos seus futuroscolegas. O mesmo não se passa com osprofessores. Se é natural que assim seja no que dizrespeito ao primeiro momento da formação dosprofessores do ensino secundário (licenciatura),

nada justifica o papel marginal que desempenhamno segundo momento (mestrado) e até, por vezes,no terceiro (indução profissional).

Na verdade, houve vários grupos que,progressivamente, foram assumindo umaresponsabilidade cada vez maior na formação dosprofessores, e na regulação da profissão docente,relegando os próprios professores para um papelsecundário. Estou a referir-me a um conjunto vastoe heterogéneo de especialistas que ocupam lugaresde destaque nos departamentos universitários deEducação (ou Ciências da Educação) e nas

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entidades oficiais ou para-oficiais responsáveis pelapolítica educativa.

No primeiro caso, a expansão da “comunidade deformadores de professores” teve efeitos muitopositivos, sobretudo no que diz respeito àproximidade com a investigação e ao rigorcientífico. Mas acentuou, claro está, a tendênciapara valorizar o papel dos “cientistas da educação”ou dos “especialistas pedagógicos” e do seuconhecimento teórico ou metodólógico emdetrimento dos professores e do seu conhecimentoprático. É inegável que a investigação científica emeducação tem uma missão indispensável a cumprir,mas a formação de um professor encerra umacomplexidade que só se obtém a partir da

integração numa cultura profissional.No segundo caso, verifica-se um desenvolvimento,sem precedentes, de uma série de especialistas ede entidades de acreditação e de avaliação quedefinem os currículos da formação de professores,o modo de entrada na profissão, as regras doperíodo probatório e o juízo sobre os desempenhos

profissionais. Estes especialistas são fortementeinfluenciados pelas organizações internacionais(União Europeia, OCDE, etc.) e tendem a ocupar umespaço que deveria ser da responsabilidade dosprofessores mais experientes.

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O contributo destes dois grupos é essencial para aformação de professores. Mas não é possível

escrever textos atrás de textos sobre a  praxis e o practicum, sobre a  phronesis e a  prudentia comoreferências do saber docente, sobre os professoresreflexivos, se não concretizarmos uma maiorpresença da profissão na formação (Birmingham,2004).

Por isso, insisto na necessidade de devolver aformação de professores aos professores, porque oreforço de processos de formação baseadas nainvestigação só faz sentido se eles foremconstruídos dentro da profissão. Enquanto foremapenas injunções do exterior, serão bem pobres asmudanças que terão lugar no interior do campo

profissional docente.Um momento particularmente sensível na formaçãode professores é a fase de indução profissional, istoé, os primeiros anos de exercício docente. Grandeparte da nossa vida profissional joga-se nestes anosiniciais e na forma como nos integramos na escolae no professorado. Neste sentido, este momento

deve ser organizado como parte integrante doprograma de formação em articulação com alicenciatura e o mestrado.

Nestes anos em que transitamos de aluno paraprofessor é fundamental consolidar as bases de

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uma formação que tenha como referência lógicasde acompanhamento, de formação-em-situação, de

análise da prática e de integração na culturaprofissional docente.

P3 – Pessoa

A formação de professores deve dedicar uma

atenção especial às dimensões pessoais daprofissão docente, trabalhando essacapacidade de relação e de comunicação quedefine o tacto pedagógico.

Ao longo dos últimos anos, temos dito (e repetido)que o professor é a pessoa, e que a pessoa é oprofessor. Que é impossível separar as dimensões

pessoais e profissionais. Que ensinamos aquilo quesomos e que, naquilo que somos, se encontra muitodaquilo que ensinamos. Que importa, por isso, queos professores se preparem para um trabalho sobresi próprios, para um trabalho de auto-reflexão e deauto-análise.

  Temos caminhado no sentido de uma melhorcompreensão do ensino como profissão do humanoe do relacional. As dificuldades levantadas pelos“novos alunos” (por aqueles que não queremaprender, por aqueles que trazem novas realidadessociais e culturais para dentro da escola) chamam a

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atenção para a dimensão humana e relacional doensino, para esse corpo-a-corpo diário a que os

professores estão obrigados.Ora esta relação (a qualidade desta relação) exigeque os professores sejam pessoas inteiras. Não setrata de regressar a uma visão romântica doprofessorado (a conceitos vocacionais oumissionários). Trata-se, sim, de reconhecer que anecessária tecnicidade e cientificidade do trabalhodocente não esgotam todo o ser professor . E que éfundamental reforçar a pessoa-professor e oprofessor-pessoa.

Estamos no limiar de uma proposta com enormesconsequências para a formação de professores, queconstrói uma teoria da pessoalidade no interior de

uma teoria da profissionalidade. Assim sendo, éimportante estimular, junto dos futuros professorese nos primeiros anos de exercício profissional,práticas de auto-formação, momentos quepermitam a construção de narrativas sobre as suaspróprias histórias de vida pessoal e profissional.

Refiro-me à necessidade de elaborar umconhecimento pessoal (um auto-conhecimento) nointerior do conhecimento profissional e de captar(de capturar) o sentido de uma profissão que nãocabe apenas numa matriz técnica ou científica.

 Toca-se aqui em qualquer coisa de indefinível, mas

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que está no cerne da identidade profissionaldocente.

O registo escrito, tanto das vivências pessoaiscomo das práticas profissionais, é essencial paraque cada um adquira uma maior consciência do seutrabalho e da sua identidade como professor. Aformação deve contribuir para criar nos futurosprofessores hábitos de reflexão e de auto-reflexãoque são essenciais numa profissão que não seesgota em matrizes científicas ou mesmopedagógicas, e que se define, inevitavelmente, apartir de referências pessoais.

P4 – Partilha

A formação de professores deve valorizar otrabalho em equipa e o exercício colectivo daprofissão, reforçando a importância dosprojectos educativos de escola.

A emergência do professor colectivo (do professorcomo colectivo) é uma das principais realidades do

início do século XXI. Já se tinha assistido a estefenómeno noutras profissões, por exemplo nasaúde, na engenharia ou na advocacia, mas noensino, apesar da existência de algumas práticascolaborativas, não se tinha verificado ainda a

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consolidação de um verdadeiro “actor colectivo” noplano profissional.

Hoje, a complexidade do trabalho escolar reclamaum aprofundamento das equipas pedagógicas. Acompetência colectiva é mais do que o somatóriodas competências individuais. Estamos a falar danecessidade de um tecido profissional enriquecido,da necessidade de integrar na cultura docente umconjunto de modos colectivos de produção e deregulação do trabalho.

Seria demasiado longo percorrer, agora, todas asimplicações do que acabo de afirmar para aformação de professores. Retenho apenas doisaspectos.

Em primeiro lugar, a ideia da escola como o lugarda formação dos professores, como o espaço daanálise partilhada das práticas, enquanto rotinasistemática de acompanhamento, de supervisão ede reflexão sobre o trabalho docente. O objectivo étransformar a experiência colectiva emconhecimento profissional e ligar a formação deprofessores ao desenvolvimento de projectoseducativos nas escolas.

Em segundo lugar, a ideia da docência comocolectivo, não só no plano do conhecimento mastambém no plano da ética. Não há respostas feitaspara o conjunto de dilemas que os professores são

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chamados a resolver numa escola marcada peladiferença cultural e pelo conflito de valores. Por

isso, é tão importante assumir uma éticaprofissional que se constrói no diálogo com osoutros colegas.

A colegialidade, a partilha e as culturascolaborativas não se impõem por via administrativaou por decisão superior. A formação de professoresé essencial para consolidar parcerias no interior eno exterior do mundo profissional. Hoje, num tempotão carregado de referências ao trabalhocooperativo dos professores, é surpreendente afragilidade dos movimentos pedagógicos que, aolongo do século XX, desempenharam um papelcentral na inovação educacional. Estes

movimentos, tantas vezes baseados em redesinformais e associativas, são espaçosinsubstituíveis no desenvolvimento profissional dosprofessores.

É urgente reforçar as comunidades de prática, istoé, um espaço conceptual construído por grupos deeducadores comprometidos com a pesquisa e a

inovação, no qual se discutem ideias sobre o ensinoe aprendizagem e se elaboram perspectivascomuns sobre os desafios da formação pessoal,profissional e cívica dos alunos.

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Através dos movimentos pedagógicos ou dascomunidades de prática, reforça-se um sentimento

de pertença e de identidade profissional que éessencial para que os professores se apropriem dosprocessos de mudança e os transformem empráticas concretas de intervenção. É esta reflexãocolectiva que dá sentido ao desenvolvimentoprofissional dos professores.

Para conseguir esta transformação de fundo naorganização da profissão docente é fundamentalconstruir programas de formação coerentes. Odiálogo profissional tem regras e procedimentosque devem ser adquiridos e exercitados nas escolasde formação e nos primeiros anos de exercíciodocente. Sem isso, continuaremos a repetir

intenções que dificilmente terão uma traduçãoconcreta na vida dos professores e das escolas.

P5 – Público

A formação de professores deve estarmarcada por um princípio de responsabilidadesocial, favorecendo a comunicação pública e aparticipação profissional no espaço público daeducação.

As escolas são lugares da relação e dacomunicação. Mas as escolas comunicam mal com

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o exterior. Os professores explicam mal o seutrabalho. As escolas resistem à avaliação e à

prestação de contas sobre o seu trabalho. E,sobretudo, há uma ausência da voz dos professoresnos debates públicos. É necessário aprender acomunicar com o público, a ter uma voz pública, aconquistar a sociedade para o trabalho educativocomunicar para fora da escola.

Será que a exposição pública vai contribuir paratornar os professores e as escolas maisvulneráveis? Talvez. Mas, paradoxalmente, estavulnerabilidade é condição essencial da suaevolução e da sua transformação.

A escola cresceu como “palácio iluminado”. Hoje, éapenas um pólo – sem dúvida muito importante –

num conjunto de redes e de instituições que devemresponsabilizar-se pela educação das crianças epela formação dos jovens. Curiosamente, é esteestatuto mais modesto que lhe permitirá readquiriruma credibilidade que foi perdendo.

A contemporaneidade exige que tenhamos acapacidade de recontextualizar a escola no seulugar próprio, valorizando aquilo que éespecificamente escolar , deixando para outrasinstâncias actividades e responsabilidades que hojelhe estão confiadas.

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É este o sentido daquilo que tenho designado pornovo espaço público da educação, no qual se

poderá celebar um novo contrato entre osprofessores e a sociedade. Não basta atribuirresponsabilidades às diversas entidades, énecessário que elas tenham uma palavra a dizer,que elas tenham capacidade de decisão sobre osassuntos educativos.

A concretização desta mudança exige uma grandecapacidade de comunicação dos professores e umreforço da sua presença pública. Importa retomaruma tradição histórica das escolas de formação doinício do século XX, que procuravam acentuar opapel social dos professores. Hoje, ainda que numaperspectiva diferente, é necessário reintroduzir esta

dimensão nos programas de formação deprofessores.

Nas sociedades contemporâneas, o prestígio deuma profissão mede-se, em grande parte, pela suavisibilidade social. No caso dos professores estamosmesmo perante uma questão decisiva, pois asobrevivência da profissão depende da qualidade

do trabalho interno nas escolas, mas também dasua capacidade de intervenção no espaço públicoda educação. Se os programas de formação nãocompreenderem esta nova realidade da profissãodocente passarão ao lado de um dos principaisdesafios deste princípio do século XXI.

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Concluindo…

De forma simples, procurei identificar cinco facetasque definem o “bom professor”: conhecimento,cultura profissional, tacto pedagógico, trabalho emequipa e compromisso social.

Admitindo que, pelo menos na Europa, nosencaminhamos para uma formação em três

momentos – graduação, mestrado, induçãoprofissional – estas propostas destinam-se ainspirar, sobretudo, os dois últimos momentos. Elassugerem uma organização integrada e coerente domestrado (2 anos) e da indução profissional (2 a 3anos). Faltaria ainda referir a importância de umaarticuação com as dinâmicas de formação contínua,mas esse não era o tema deste artigo.

No essencial, advogo uma formação de professoresconstruída dentro da profissão, isto é, baseadanuma combinação complexa de contributoscientíficos, pedagógicos e ténicos, mas que temcomo âncora os próprios professores, sobretudo os

professores mais experientes e reconhecidos.As cinco propostas que avancei, marcadas com a

letra P, procuram valorizar a componente práxica,a cultura profissional, as dimensões pessoais, aslógicas colectivas e a presença pública dosprofessores. São princípios que já inspiram muitos

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programas de formação de professores.Infelizmente, nem sempre há uma divulgação

destes programas, nem os meios que permitamdifundi-los junto dos círculos educacionais eprofissionais (Darling-Hammond, Chung & Felow,2002).

Reconheço que nos faz falta dedicar mais tempo àcomunicação e discussão de experiências concretasde formação de professores existentes em váriasuniversidades de referência.

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Capítulo 3

A escola e a cidadania:

Apontamentos incómodos

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um prazer deixar-vos algumas ideiasincómodas sobre a Escola e a cidadania;incómodas, no sentido em que são

polémicas e que vão contra algumas das crençasdominantes ou, melhor dizendo, contra alguns dosprincípios que organizaram a educação desde finaisdo século XIX. A situação actual da Escola, em

Portugal e no mundo, exige de nós um pensamentocrítico, uma atitude de interrogação que não selimite a repetir o que já sabemos, mas que procureantecipar os caminhos do futuro presente.

É

As minhas palavras têm como pano de fundo aconvicção de que estamos a viver uma fase detransição, na qual se assiste ao fechar de um ciclo

histórico, durante o qual se consolidou umadeterminada concepção do sistema de ensino, dosmodos de organização das escolas e das estruturascurriculares, do estatuto dos professores e dasmaneiras de pensar a pedagogia e a educação.

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Na primeira parte, discutirei o transbordamento damodernidade escolar, na segunda parte, os

cenários de futuro da educação e, finalmente, naterceira parte, avançarei três sugestões: maisaprendizagem, mais sociedade, mais comunicação.O texto está escrito, intencionalmente, num registopolémico e, até, provocador. Mas parece-me quechegou o momento de nos despirmos dascarapaças, abrindo-nos com frontalidade a um

debate necessário sobre o papel da escola nassociedades do século XXI.

1. O transbordamento da modernidadeescolar

Resumindo de maneira excessivamente simples ahistória do último século, podemos dizer que aEscola se foi desenvolvendo por acumulação demissões e de conteúdos, numa espécie deconstante transbordamento (Nóvoa, 2005), que alevou a assumir uma infinidade de tarefas.

Começou pela instrução, mas foi juntando a

educação, a formação, o desenvolvimentopessoal e moral, a educação para acidadania e para os valores...

Começou pelo cérebro, mas prolongou a suaacção ao corpo, à alma, aos sentimentos, àsemoções, aos comportamentos...

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Começou pelas disciplinas, mas foiabrangendo a educação para a saúde e para

a sexualidade, para a prevenção dotabagismo e da toxicodependência, para adefesa do ambiente e do património, para aprevenção rodoviária…

Começou por um “currículo mínimo”, mas foiintegrando todos os conteúdos possíveis eimaginários, e todas as competências,tecnológicas e outras, pondo no “sacocurricular” cada vez mais coisas e nada deleretirando...

Esta “evolução” – que estou obviamente acaricaturar – deu-se no quadro de uma imagem daEscola como instituição de regeneração, de

salvação e de reparação da sociedade. Sequisermos isolar um momento histórico, talvez sejapossível referir a famosa Carta de Jules Ferry aos

 professores primários, de 17 de Novembro de 1883,na qual se declara que, de todas as obrigaçõesimpostas pela lei, “aquela que certamente mais vosdiz, aquela que necessita de um maior cuidado e

trabalho da vossa parte, é a missão que vos éconfiada de assegurar a educação moral e ainstrução cívica dos vossos alunos”. O ministrofrancês da Instrução Pública termina a cartaesperando que ela contribua para que osprofessores multipliquem “os seus esforços para

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darem ao nosso país uma geração de bonscidadãos”.

As políticas escolares de Jules Ferry tiveram umgrande impacto em Portugal e em vários paíseseuropeus. Elas traduzem, simbolicamente, umaideia abrangente de educação que se impõe comoa matriz da modernidade escolar. É desnecessáriodizer que não estamos perante uma realidadenova, mas, doravante, esta ideia inscreve-se numadinâmica de escolarização de todas as crianças (achamada “escola de massas”). A legislação dereferência sobre a “obrigatoriedade escolar”elabora-se ao longo do século XIX, atribuindomaiores responsabilidades aos sistemas de ensino.

O apelo à cidadania é indissociável da construção

das identidades nacionais. A educação desempenhaum papel fundamental neste processo, comoexplica Pierre Bourdieu: “Ao impor universalmenteuma cultura dominante, constituída por esta via emcultura nacional legítima, o sistema escolar inculcaos fundamentos de uma verdadeira religião cívicae, mais precisamente, as bases fundamentais da

imagem (nacional) de si” (1993, p. 54). É na ligaçãoentre a cidadania e a construção do Estado-naçãoque se define a importância da escola na transiçãodo século XIX para o século XX: “É através daescola que, com a generalização da educaçãoelementar no decurso do século XIX, se exerce a

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acção unificadora do Estado no domínio da cultura,elemento fundamental da construção do Estado-

nação” (1994, p. 115).O discurso da cidadania é adoptado mesmo porgrupos com concepções de educação distintas, eaté antagónicas. Veja-se, por exemplo, o debateentre laicos e religiosos: os primeiros, na esteira de

  Jules Ferry, sublinhando a importância da“instrução moral” na escola e remetendo para asfamílias e a Igreja a “instrução religiosa”; ossegundos defendendo uma escola que, sem nuncapôr em causa os direitos dos pais, complete a suaacção no plano da “instrução moral religiosa”. Unse outros, explicarão que a escola deve instruir eeducar , alargando a sua influência à totalidade do

ser em formação.O debate instrução versus educação torna-se cadavez mais intenso. Não há, na história da educação,tema mais recorrente, glosado até à exaustão.Quando se afirma que é necessário ir além do actode instruir e promover uma autêntica educação docarácter e do espírito, a frase suscita uma adesão

unânime, ainda que nem todos a interpretem damesma maneira. Nesta afirmação, que parecebanal, define-se toda a modernidade escolar. Sejapor via de um discurso da “educação cívica”, muitopresente nos círculos republicanos, seja por via deum ideário religioso, bem patente nos meios

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nacionalistas, a educação tende a estender-se aoconjunto da vida dos alunos. A pedagogia, assim

imaginada, não pode deixar de se revestir de umacarga doutrinária.

Apenas um exemplo, entre tantos outros: amaneira como é concebida, por diferentes regimespolíticos, uma formação pré-militar, capaz depreparar as crianças e os jovens para cumpriremcomo “cidadãos de corpo inteiro” a missão dedefesa da pátria. Na fase final da Monarquia criam-se os batalhões escolares: as fotografias da épocamostram as crianças, perfiladas, nos recreios dasescolas, com espingardas (de madeira) ao ombro. ARepública trouxe-nos essa novidade curricular quedava pelo nome de “instrução militar preparatória”.

O Estado Novo inventou a Mocidade Portuguesa eas suas paradas fazem parte do imaginário doregime. Mas outros exemplos se poderiam colher,do lado da “moral”, laica ou religiosa, para ilustraresse desejo de uma “educação totalizante”.

Não espanta, por isso, o sucesso do conceito deeducação integral, sem dúvida aquele que melhor

traduz o projecto da modernidade escolar. Aomarcar o desejo de alargar o esforço educativo ao“conjunto das actividades do indivíduo emformação”, ele revela a desmedida da ambiçãopedagógica. Num primeiro momento, a referência àeducação integral consagra a necessidade de

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articular a educação física, intelectual e moral. Naviragem do século XIX para o século XX, este

movimento adquire uma segunda dimensão,“racional”, que tem por fim “criar em cada criança,não um ser mutilado, mas um indivíduosocialmente completo, conhecedor de todos osseus direitos, tendo uma consciência socialintegral” (Lima, 1914). Nesta mesma época, insiste-se cada vez mais na atenção à vida física e à vida

psíquica, ao bem-estar material e ao equilíbrioafectivo dos alunos. Estamos perante uma terceiraacepção do princípio da educação integral, quelegitima a intervenção, no espaço educativo, de umexército de “especialistas da alma” (higienistas,médicos, psicólogos). Apesar de distintas, estasperspectivas fazem parte de uma mesma atitude

pedagógica que procura assegurar a socializaçãoplena e o desenvolvimento total dos alunos.

Em Portugal, o autor que melhor traduz estaamálgama de discursos, que junta as ambiçõesreformadoras do século XIX com o programa doMovimento da Educação Nova, é o pedagogista

António Sérgio. A sua Educação cívica, colectâneade artigos vários escritos em 1914, durante a suaestadia no Instituto Jean-Jacques Rousseau, emGenève, sintetiza crenças que, de uma ou de outramaneira, marcam o século XX:

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“[O civismo] não é uma ciência teórica,mas uma arte de acção, uma arte prática;tão disparatado se me antolha o querer

incuti-lo só com livros, apotegmas,prelecções, como ensinar por esse modo o jogo do pau, a dactilografia ou a guitarra;a educação cívica meramente teóricaparece um ensino de esgrima em que senão empunhasse uma arma, ou umaaprendizagem de piano em que os dedosse não mexessem: é um absurdo” (1984,pp. 41-42).

Em 1984, ao prefaciar uma nova edição daEducação cívica, Vitorino Magalhães Godinho ilustrabem a permanência destas concepções ao definir acidadania como meta, “a partir da escola-cidade eda cidade educativa”, explicando que a escola “éum espaço de viver e não apenas de aprender”. Por

isso, a sua organização deve “fazer-se em funçãodos educandos”:

“E voltamos sempre ao processo de auto-formação, criadora da pessoa, e deformação para a sociedade e cultura emmudança, em construção do porvir,interconexas. O que alarga a educação, daescola, à cidade educativa, num

permanente re-fazer-se e repensar-se,quer informais, quer institucionalizados(educação permanente)” (1984, p. 13).

Na verdade, Vitorino Magalhães Godinho apropria-se do conceito de educação permanente parareconduzir a cidadania ao tempo largo de uma vida.Mas a justificação para uma educação cívica, essa,

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encontra-a ele no ideário sergiano. Se a educaçãopermanente contribui para esse transbordamento

de que tenho vindo a falar, o século XX nãoterminará sem a elaboração de um documento, degrande circulação internacional, que acrescenta àtrilogia clássica – aprender a conhecer, a fazer e aser – um quarto elemento: aprender a viver juntos.

Refiro-me ao relatório para a UNESCO da ComissãoInternacional sobre Educação para o século XXI,coordenada por Jacques Delors (1996), querecebeu, em português, o título: Educação, umtesouro a descobrir . Aqui se faz a defesa de uma“sociedade educativa”, baseada na solidariedade enum novo comunitarismo que “podem ressurgirnaturalmente como princípio orgânico e

organizador de vida” (1996, p. 194).O relatório Jacques Delors foi retomado numimportante documento de orientação, repositóriodas ideias dominantes no sector educativo emPortugal, que, curiosamente, não suscitou grandedebate público: a carta pastoral da ConferênciaEpiscopal Portuguesa, com o título Educação:

Direito e dever – Missão nobre ao serviço de todos,publicada em 2002.

Aqui se defende uma educação integral que inclui aeducação religiosa e que “é o corolário legítimo dadignidade humana”, sublinhando-se a importância

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de um “itinerário que respeita e privilegia oeducando como protagonista principal em todo o

processo educativo”:“Para cumprir a sua missão de educarpara a cidadania, os projectos e ascomunidades educativas têm decontemplar o aprender a conhecer , oaprender a fazer , o aprender a viver  juntos, mas também o aprender a ser .Sem esta consciência personalista, sem o

crescimento pessoal de uma verdadeiraestrutura autónoma vertebrada porvalores e convicções, os cidadãos nãoultrapassarão o limiar de indivíduosenquadrados nas estruturas cívicas comoconsumidores passivos dos esquemassociais apresentados”.

Porquê citar autores e correntes tão distintas?

Porquê juntar ideologias e propostas tãodivergentes? Para sublinhar que o discurso dotransbordamento – que tem no discurso dacidadania uma das suas principais referências –constitui um elemento estruturante damodernidade escolar. Com diferentes propósitos eintenções todos falamos esta linguagem e nela

reconhecemos as nossas convicções eexpectativas. É por isso que se torna tão difícil,talvez mesmo impossível, defender o contrário. Anão ser que nos coloquemos, propositadamente,numa posição provocatória. É o que farei nestetexto, procurando assim iluminar um outro lado do

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problema escolar, evitando a repetição inútil domesmo “credo pedagógico” ou a tentativa,

igualmente inútil, de regressar a um passado que,na verdade, nunca existiu.

2. Cenários de futuro da educação

O ponto anterior coloca, de modo talvezexcessivamente impreciso, algumas interrogações

sobre a educação integral e o transbordamento daEscola. Grande parte dos discursos sobre acidadania – ou, melhor dizendo, sobre a educaçãocívica – sustentam-se nesta alargada e abrangenteconcepção de formação escolar.

De seguida, irei concentrar-me numa reflexão

conduzida no quadro da OCDE sobre os cenários defuturo da educação. Julgo que os autores foramcapazes de situar bem certas tendências actuaisdos sistemas educativos, assinalando opçõesinadiáveis (CERI/OCDE, 2003). Não cuidarei de fazeruma apresentação detalhada do estudo, masapropriar-me-ei dele para desenvolver a minha

própria argumentação.O documento apresentado em 2003, identifica seiscenários de evolução da Escola (e dos sistemas deensino), agrupados em torno de três grandes eixos(ver Luisoni, Instance & Hutmacher, 2004):

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1º EIXO – MANUTENÇÃO DO STATU QUO

Cenário 1.A.Manutenção de sistemas escolaresburocráticosEste cenário representa, no essencial, acontinuação da situação actual, com amanutenção de sistemas burocratizados, querevelam tendências fortes no sentido dauniformização e grandes resistências a

qualquer dinâmica de mudança e deinovação.

Cenário 1.B.Êxodo dos professores –“Desintegração”Este cenário é marcado por uma crise derecrutamento de professores,nomeadamente para certas disciplinas dereferência, provocada pela incapacidade detornar a profissão atraente e prestigiada,bem como por um acréscimo dasdificuldades inerentes ao exercício docente.

2º EIXO – RE-ESCOLARIZAÇÃO

Cenário 2.A. As escolas no centro da colectividadeEste cenário é caracterizado por um reforçoda escola enquanto elemento central do

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espaço social e comunitário, assumindo umconjunto alargado de missões,nomeadamente na luta contra as fracturassociais e no apoio à integração das crianças.

Cenário 2.B. A escola como organização centrada naaprendizagemEste cenário traduz uma vontade derecentrar a escola nas tarefas daaprendizagem, desenvolvendo um programa

solidamente baseado no “saber” no quadrode uma cultura de qualidade, deexperimentação e de inovação.

3º EIXO – DES-ESCOLARIZAÇÃO

Cenário 3.A.Redes de aprendizagem e sociedade-

em-redeEste cenário traduz o desejo de abandonaras escolas, caminhando no sentido de umamultiplicidade de redes de aprendizagem,fortemente baseadas em ferramentastecnológicas, e na construção de umasociedade-em-rede que substituiria osactuais sistemas de ensino.

Cenário 3.B.Extensão do modelo de mercadoEste cenário reflecte as tendências nosentido de considerar a Escola como um“bem privado”, e não como um “bempúblico”, acentuando assim os processos deprivatização do ensino através da oferta de

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um conjunto diversificado de oportunidadese de possibilidades de formação.

Não é este o lugar apropriado para discutir estesseis cenários e as suas implicações para o futuro daeducação. O objectivo não é definir “modelosideais”, mas antes provocar um debate e umareflexão que não fiquem encerradas nas fronteirasdo presente. Nenhum destes seis cenários existe,ou existirá, no estado puro. Bem pelo contrário,

muitas destas tendências estão misturadas,combinadas de modos vários em todos os sistemasde ensino. Mas a sua separação, ainda queartificial, é útil do ponto de vista analítico, poispermite-nos visualizar melhor o sentido de certasopções e escolhas.

Nos diversos inquéritos promovidos pelos autoresdo estudo junto de “actores educativos”(responsáveis políticos, professores, pais, etc.)desenhou-se um consenso em torno das evoluções

 prováveis e desejáveis destes seis cenários.

No que diz respeito à “probabilidade”, há umrelativo equilíbrio entre os diferentes cenários. Os

inquiridos consideram que todos eles têm umarazoável possibilidade de se concretizarem numfuturo próximo. No que diz respeito à“desejabilidade”, a situação é totalmente distinta,pois a esmagadora maioria dos inquiridos (mais de80%) apenas encara positivamente uma evolução

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no sentido dos dois cenários do 2º eixo – Re-escolarização: A escola no centro da colectividade e

  A escola como organização centrada naaprendizagem. Trata-se, no fundo, de recusar, porum lado, a manutenção das actuais estruturasrígidas e burocráticas e, por outro lado, as lógicasde privatização e de mercado.

Mas a aposta num eixo de re-escolarização não fazesquecer que as opiniões se dividem, por igual,entre o terceiro e o quarto cenário, revelando umaclivagem muito interessante entre duas vocaçõesda escola: “o social” e “a aprendizagem”. Areflexão que vos proponho insere-se neste debate,adoptando um ponto de vista particular que meconduzirá à resposta que venho procurando sobre a

cidadania e a escola. A escola no centro da colectividade remete parauma instituição fortemente empenhada em causassociais, assumindo um papel de “reparadora” dasociedade; remete para uma escola de acolhimentodos alunos e, até, de apoio comunitário às famíliase aos grupos mais desfavorecidos; remete para

uma escola transbordante, uma escola utópica queprocura compensar as “deficiências da sociedade”,chamando a si todas as missões possíveis eimagináveis. Num certo sentido, todos nosreconheceremos nesta escola, que consagra muitasdas nossas crenças e convicções. Mas – como é

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evidente – esta opção estabelece prioridades. Não épossível fazer tudo e a tudo dedicar a mesma

atenção. Concentrando-se nas dimensões sociais,esta escola acaba por conceder uma menoratenção às aprendizagens. Primeiro estão osalunos, as suas necessidades e o seudesenvolvimento; depois, vem o trabalho escolarpropriamente dito. Estou a desenhar umacaricatura, extremando intencionalmente posições,

para deixar mais nítido o meu argumento.  A escola como organização centrada naaprendizagem sugere uma valorização da arte, daciência e da cultura, enquanto elementos centraisde uma “sociedade do conhecimento”. Estaperspectiva sustenta-se em três argumentos

principais: primeiro - nas sociedades doconhecimento, mais ainda do que nas sociedadesindustriais, o pior que podemos fazer às crianças,sobretudo às crianças dos meios mais pobres, édeixá-las sair da escola sem uma verdadeiraaprendizagem; segundo - ao olhar para muitospaíses, percebe-se o crescimento de uma “escola a

duas velocidades”, isto é, de uma escola centradana aprendizagem para os ricos e no acolhimentosocial para os pobres; terceiro – hoje, os novosconceitos de aprendizagem envolvem, para alémdos conhecimentos, as emoções, os sentimentos ea consciência, implicam o método, o estudo e a

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organização do trabalho, incluem a criatividade, acapacidade de resolver problemas, a inteligência e

a intuição.Muitos educadores e professores, sem negarem aimportância das aprendizagens, reconhecem-semais facilmente no terceiro cenário –  A escola nocentro da colectividade – que se adapta melhor àhistória da modernidade escolar. É fácil alinharevidências em prol deste cenário: Alguém acreditaque é possível ensinar uma criança com fome ousujeita a maus tratos? Alguém imagina que asquestões da saúde e do bem-estar, físico epsicológico, não interferem no desenvolvimento ena aprendizagem das crianças? Alguém seatreveria a pôr em causa o papel da escola na

prevenção da toxicodependência ou na promoçãode comportamentos saudáveis? Alguém ousarianegar a importância da escola na educação sexualde adolescentes, que vivem por vezes dramas deenorme intensidade? Alguém seria capaz deescrever que a escola não tem qualquerresponsabilidade na formação de cidadãos activos,

conscientes dos seus direitos e dos direitos dosoutros? E assim por diante…

Mas, ao produzir estas justificações, estamospermanentemente a remeter para dentro da escolaum conjunto de tarefas e de missões que são daresponsabilidade primeira de outras instâncias e

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instituições. Na transição do século XIX para oséculo XX, quando a concepção de uma escola

transbordante se impôs, estávamos, sobretudo nocaso português, perante uma sociedade muitofrágil: níveis de analfabetismo que atingiam os80%, inexistência de redes culturais e científicas,situações de pobreza acentuada, taxas altíssimasde mortalidade e de morbilidade infantil, etc. Hoje,um século mais tarde, a imagem da escola como

“templo de saber” irradiando a sua influência sobreuma “sociedade inculta” já não tem sentido. Hoje,não só as famílias possuem níveis culturais eeducacionais mais elevados, como há um conjuntodiversificado de instituições que podem, e devem,assumir as suas responsabilidade próprias na áreada cultura, do desporto, da arte, da saúde, da

ciência, da cidadania.

Por isso, tenho vindo a defender que, se amodernidade escolar se definiu portransbordamento, a contemporaneidade escolar sedefinirá por retraimento. E esta opção conduz-me,naturalmente, a valorizar o quarto cenário, a escola

como organização centrada na aprendizagem. Claroque ninguém me verá reproduzir as dicotomiashabituais, gastas e inúteis: liberdade ou autoridade,ensino ou aprendizagem, instrução ou educação,esforço ou interesse, etc. Em educação, estestermos funcionam sempre simultaneamente, pois a

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aprendizagem não é separável da vida dascrianças, dos seus contextos sociais, dos seus

processos de desenvolvimento, dos seus dilemas,daquilo que lhes acontece na vida para além daescola.

O trabalho escolar tem duas grandes finalidades:por um lado, a transmissão e apropriação dosconhecimentos e da cultura; por outro lado, acompreensão da arte do encontro, da comunicaçãoe da vida em conjunto. É isto que a Escola sabefazer, é isto que a Escola faz melhor. É nisto que eladeve concentrar as suas prioridades, sabendo quenada nos torna mais livres do que dominar aciência e a cultura, sabendo que não há diálogonem compreensão do outro sem o treino da leitura,

da escrita, da comunicação, sabendo que acidadania se conquista, desde logo, na aquisiçãodos instrumentos de conhecimento e de cultura quenos permitam exercê-la.

Uma coisa é dizer que a escola deve recentrar-sena aprendizagem, não ignorando que ela só épossível se atendermos a um conjunto de

circunstâncias da vida pessoal e social dascrianças. E outra, bem diferente, é dizer que aescola deve assumir como responsabilidade suaessa vastidão de tarefas que lhe fomos atribuindo.Não ignoro o risco destas afirmações, que vãocontra a esmagadora maioria das crenças

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dominantes, mas estou convencido de que esta é aúnica saída possível para a crise da escola.

A minha proposta de retraimento exige o reforço deum “novo” espaço público da educação, um espaçomais amplo do que o espaço escolar, um espaço deredes e de instituições no qual se concretiza a“educação integral” das crianças e dos jovens, sejano que diz respeito à formação religiosa ou cívica,ou à aquisição de um conjunto de “competênciassociais”, ou ainda à preparação do momento detransição entre a escola e o trabalho.

3. Mais aprendizagem, mais sociedade,mais comunicação

A defesa do retraimento da escola só é possível se,ao mesmo tempo, houver uma consolidação doespaço público da educação. Este é, a meu ver, odesafio central das sociedades contemporâneas.Que compromissos estamos dispostos a assumir, atítulo individual e colectivo, na educação dascrianças e dos jovens? Queremos reforçar as redes

familiares, culturais, religiosas e associativas edefinir as suas responsabilidades próprias noprocesso educativo ou continuamos a escolher a viamais fácil, isto é, a tudo lançar para dentro dasescolas? Percebemos a importância de libertar aEscola, na medida do possível, de tarefas

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assistenciais, de práticas de tempos livres e deoutras actividades que podem, e devem, ser

realizadas noutros lugares da sociedade? Queremosuma escola que faça tudo, arriscando-se a nadafazer bem, ou estamos dispostos a chamar toda asociedade ao trabalho de educação e formação?

A proposta que vos faço, de uma escola retraída, sótem sentido se se multiplicarem compromissos eresponsabilidades que libertem o dia-a-dia escolarde um sem-número de tarefas e actividades.Utilizando simbolicamente a palavra mais,terminarei a minha intervenção com uma triplasugestão: mais aprendizagem, mais sociedade,mais comunicação.

Mais aprendizagem

Um dos grandes perigos dos tempos actuais é uma“escola a duas velocidades”: por um lado, umaescola concebida essencialmente como um centrode acolhimento social, para os pobres, com umaforte retórica da cidadania e da participação; por

outro lado, uma escola claramente centrada naaprendizagem, e nas tecnologias, destinada aformar os filhos dos ricos. Não vos falo de umasituação puramente imaginária, mas sim do que sepassa hoje em muitos países e até do que se passaem muitos grupos dentro do nosso país!

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Por isso vos digo que a primeira condição dacidadania é a aprendizagem. Uma escola que não

fornece aos seus alunos, a todos os seus alunos, osinstrumentos básicos do conhecimento e dacultura, não é uma “escola cidadã”, por muito quese enfeite com chavões de emancipação, delibertação ou de cidadania.

É preciso inscrever, na realidade, a igualdadeprevista na lei. Na escola, isso significa, como seescreve numa recente proposta de reformaapresentada em França, faire vraiment réussir tousles élèves (fazer com que todos os alunos tenhamverdadeiramente sucesso) (Thélot, 2004). Julgo queé útil acrescentar que este “sucesso” não énecessariamente igual para todos os alunos. Mas

que é da nossa responsabilidade concebermosmodos e percursos que assegurem o sucesso detodos os alunos, cada um à sua medida.

O desafio que temos pela frente é romper com umaexcessiva uniformização escolar, que não conseguedar respostas úteis aos alunos e às distintasnecessidades e projectos de vida de que eles são

portadores. Hoje, talvez mais do que nunca, impõe-se reabilitar os modelos da “diversificaçãopedagógica” como referência para uma escolacentrada na aprendizagem.

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Mais sociedade

A segunda condição da cidadania, na escola, é mais

sociedade. O que é que isto quer dizer? Permitam-me que recorra a uma distinção feliz proposta porPhilippe Meirieu (1997) entre “comunidade” e“sociedade”. Diz ele que o que caracteriza umacomunidade são os afectos, as tradições, os laços.Que há uma escolha na adesão a uma determinadacomunidade (de jovens, de músicos, de bairro,etc.). Que o essencial são as ligações afectivasentre os membros e o seu chefe, são as forçascentrípetas que a reforçam e lhe dão sentido.

Acrescenta Philippe Meirieu que uma escola nãodeve ser encarada como uma comunidade. Desdelogo, porque as pessoas não se escolhem entre si,

estando reunidas naquele lugar, de forma mais oumenos arbitrária, com o objectivo de trabalharem

  juntas durante um período de tempo das suasvidas, independentemente de gostarem ou não dasmesmas coisas, de terem ou não os mesmosinteresses. Uma escola é uma sociedade, e nãouma comunidade.

Claro que, num contexto escolar, há sempre laçosafectivos. Mas o cimento de uma sociedade não é oafecto entre as pessoas ou a semelhança dosgostos, mas o facto de estarem juntas, de terem detrabalhar em conjunto, de se respeitarem e de se

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enriquecerem mutuamente. Diz Philippe Meirieuque certos grupos adolescentes têm, muitas vezes,

“comunidade a mais” e “sociedade a menos”. Eque é preciso instaurar a escola como sociedade,como lugar do trabalho conjunto, como lugar dodiálogo e da comunicação, como espaço desegurança, como uma sociedade na qual ascrianças prefiguram e praticam uma vida futura.

Hoje, os debates da diversidade cultural, damulticulturalidade, da integração de todos numacultura comum, e partilhada, passam por aqui. Estaé a melhor tradição pedagógica e, por isso, CélestinFreinet e muitos educadores sempre estiveram tãoatentos aos rituais e às regras, às rotinas e aosprocessos formais de decisão. É esta, também, a

tradição da Educação Cívica de António Sérgio. Naescola, a cidadania faz-se no dia-a-dia, exerce-se,pratica-se, dá-se mal com um discurso gongórico oudoutrinário.

Mais comunicação

Chego, assim, à minha terceira condição dacidadania, mais comunicação. É certo que asescolas são lugares da relação e da comunicação.

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Mas as escolas comunicam mal com o exterior. Osprofessores explicam mal o seu trabalho,

conduzindo a enormes equívocos. As escolasresistem à avaliação e à prestação de contas sobreo seu trabalho. E, sobretudo, há uma ausência davoz dos professores nos debates públicos. Énecessário comunicar para fora da escola. O “novo”espaço público da educação chama os professoresa uma intervenção política, a uma participação nos

debates sociais e culturais, a um trabalhocontinuado junto das comunidades locais.

Falar de escola e cidadania é prestar contas do quefoi (e do que não foi) realizado na escola, écompreender que nada será conseguido se asociedade não apoiar o trabalho escolar. Será que a

exposição pública vai contribuir para tornar osprofessores e as escolas mais vulneráveis? Talvez.Mas, paradoxalmente, esta vulnerabilidade écondição essencial da sua evolução e da suatransformação  (Hargreaves, 2000).

A escola cresceu como “palácio iluminado”. Já nãoo é. Hoje, é apenas um pólo – sem dúvida muito

importante – num conjunto de redes e deinstituições que devem responsabilizar-se pelaeducação das crianças e pela formação dos jovens.Curiosamente, é este estatuto mais modesto, maisretraído, que lhe permitirá adquirir umacredibilidade que foi perdendo. A

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contemporaneidade exige que tenhamos acapacidade de recontextualizar a escola no seu

lugar próprio, valorizando aquilo que éespecificamente escolar , deixando para outrasinstâncias actividades e responsabilidades que hojelhe estão confiadas.

Em síntese: mais aprendizagem, mais sociedade,mais comunicação.

Por tudo isto, insisto que não há cidadania se osalunos não aprenderem, se não formos capazes deintegrar todos numa escola com regras claras edemocráticas de funcionamento, se a escola nãocomunicar com o exterior e não prestar contas doseu trabalho à sociedade.

Dito de outro modo: não podemos pregarcidadania, sem sermos cidadãos. Impõe-se umaabordagem pragmática (e não retórica). Como diziaAntónio Sérgio, num texto desconhecido emPortugal, a liberdade e a cidadania devem seralimentadas todos os dias, pacientementerecriadas, sempre reconquistadas, pois se nãorealizarmos este treino diário perdemos a forma,perdemos a pujança, e não conseguiremosconstruir o futuro que ambicionamos (1929, p. 2).

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Capítulo 4

Educação 2021:

Para uma história dofuturo

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“O tempo, como o mundo, tem doishemisférios: um superior e visível, que é opassado, outro inferior e invisível, que é ofuturo. No meio de um e outro hemisférioficam os horizontes do tempo, que sãoestes instantes do presente que imosvivendo, onde o passado se termina e ofuturo começa” (Padre António Vieira,

História do Futuro, 1718).

ensar o futuro é um exercício arriscadoe, muitas vezes, fútil. Mas, apesar dosavisos, não resistimos à tentação de

imaginar o que nos irá acontecer, procurando,

assim, agarrar um destino que tantas vezes nosescapa. Como escreve Pierre Furter – o Professorque me iniciou nos debates sobre a utopia – ohorizonte não existe para nos trazer de volta àorigem, mas para nos permitir medir toda adistância que temos a percorrer. O homo viator 

P

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constrói uma casa apenas para o tempo necessário,pois é caminhando que ele se encontra e descobre

o sentido da sua acção (Furter, 1966, p. 26).Precisamos de vistas largas, de um pensamentoque não se feche nem nas fronteiras do imediato,nem na ilusão de um futuro mais-que-perfeito. Àmaneira de Reinhart Koselleck (1990), interessa-mecompreender de que modo o passado está inscritona nossa experiência actual e de que modo o futurose insinua já na história presente.

O texto está organizado numa lógica passado-futuro. Assinalo, simbolicamente, três datas quedefinem momentos de transição: 1870, 1920 e1970. Procurarei contextualizar historicamentecada um destes momentos e explicar de que modo

as questões que eles suscitam abrem, hoje, paraevoluções contraditórias dos sistemas educativos.Na última parte, um tempo futuro, buscarei umasíntese destas evoluções, definindo as minhaspróprias opções quanto ao cenário mais desejávelpara a EDUCAÇÃO 2021.

PRIMEIRO TEMPO HISTÓRICO

1870 – CONSOLIDAÇÃO E DIFUSÃO DO MODELO ESCOLAR

 Tomemos a data de 1870 como marco simbólico.Neste período, um pouco por todo o lado, assiste-seà consolidação do modelo escolar, isto é, de uma

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forma de conceber e de organizar a educação que,no essencial, chegou até aos dias de hoje. Não vale

a pena explicar um “objecto” que é conhecido detodos. Mas é importante assinalar a suapermanência no tempo e o modo como resistiu àsmudanças que tiveram lugar no decurso do séculoXX.

David Tyack inventou uma expressão bemesclarecedora: The one best system. O modeloescolar impôs-se como “o único melhor sistema”,isto é, como a única forma concebível e imaginávelde assegurar a educação das crianças.

No final do século XIX, este modelo generaliza-seao conjunto da infância, através da escolaobrigatória, que se constitui como uma instituição

central na afirmação dos Estados-nação. A difusãomundial deste modelo e, num certo sentido, a suauniversalização confirmam a centralidade que eleadquire nas sociedades contemporâneas.

A acção realizada por estadistas e educadores,médicos e professores, arquitectos e pedagogos,entre tantos outros, contribui para formatar ummodelo que deve assegurar a consolidação daidentidade nacional e a preparação para a novasociedade industrial em espaços que preservem asaúde das crianças e lhes permitam progredir deforma sistemática nas aprendizagens escolares.

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A aquisição pelos professores de um estatutoprofissional é um elemento central deste processo.

Eles serão formados em escolas normais,designação que revela bem a lógica dehomogeneização que prevalece na edificação dosgrandes sistemas públicos de ensino.

A expansão da “escola de massa” (mass schooling)é um dos grandes acontecimentos que vaitransformar as sociedades ao longo do século XX.Ao ganhar a luta secular contra o trabalho dascrianças e dos jovens, a escola define novas formasde organização da vida familiar e social. Éimpossível pensar o século XX sem pensar a escolado século XX.

Do passado ao futuro

O sistema de ensino, público e homogéneo, estáhoje a ser posto em causa por correntes etendências que o consideram obsoleto e incapaz dese renovar. As críticas têm as mais diversas origense alimentam-se de um sentimento de “crise”.

É possível identificar, pelo menos, três cenários de

evolução dos sistemas de ensino que, apesar dedistintos, são portadores de visões semelhantes daeducação. Não são hipóteses futuristas, na medidaem que estão, já hoje, bem presentes na nossarealidade quotidiana.

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O primeiro cenário aponta para o regresso a formasde educação familiar. A partir de argumentos que

vão desde a responsabilidade educativa primordialdos pais até à necessidade de preservar os valoresde uma determinada comunidade local constroem-se propostas que põem em causa a dimensãopública da educação. A ideia de que cada família oucomunidade deve ter a sua própria escola,reservada aos seus e protegida dos outros, situa-se

nos antípodas do projecto de uma escola públicaque assegura a presença de todos e a construçãode uma identidade partilhada. Uma das formasmais evidentes deste cenário é a expansão doensino doméstico, em casa, que se vemdesenvolvendo através de redes familiares,culturais e religiosas, com recurso às novas

tecnologias.

O segundo cenário baseia-se também na definiçãoda educação como “bem privado”, mas insistesobretudo nas vantagens do mercado da educaçãoe na promoção de lógicas de competição entre asescolas. No limite, o Estado deveria abster-se de

intervir no mercado dos serviços educacionais,limitando-se apenas: por um lado, a criar e divulgarindicadores de qualidade das escolas, permitindoassim a cada família fazer uma escolha informadada melhor escola para os seus filhos; por outrolado, a financiar supletivamente os mais

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desfavorecidos, por exemplo através do vale-educação (vale escolar ou cheque-ensino), a fim de

assegurar uma certa equidade no acesso àeducação.

O terceiro cenário alicerça-se na importância dasnovas tecnologias. Imaginam-se formas totalmentedistintas de ensino, que tornam dispensáveis asescolas tradicionais e que promovem aindividualização do ensino. A educação podeacontecer em qualquer lugar e a qualquer hora,tendo como referência professores reais ou virtuais.Autores diversos assinalam a tecnologia como achave para a educação do futuro: “As escolas, talcomo as conhecemos deixarão de existir. No seulugar, haverá centros de aprendizagem que

funcionarão sete dias por semana, 24 horas por dia.Os estudantes terão acesso aos seus professores,mas a distância. As salas de aula passarão a estardentro dos seus computadores”. Frases deste tipoouvem-se todos os dias. É um futuro que osenormes avanços na produção de “ferramentas”interactivas de aprendizagem tornam cada vez

mais possível.Estes três cenários são viáveis e há sinais claros dasua emergência nos últimos anos. Eles procuramcombater a excessiva intervenção do Estado naeducação e ultrapassar os constrangimentos domodelo escolar e de uma organização homogénea

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dos sistemas de ensino. Pessoalmente, receio quecontribuam para acentuar, ainda mais, as

desigualdades escolares e sociais, promovendoformas de “tribalização” da escola.

Por isso, na última parte do texto, argumentarei emfavor de um cenário que valorize a dimensão

 pública da educação, acolhendo, no entanto, umadiversidade cada vez maior de iniciativasorganizacionais, curriculares e pedagógicas,rompendo assim com um sistema excessivamenteburocratizado.

SEGUNDO TEMPO HISTÓRICO

1920 – EDUCAÇÃO NOVA E PEDAGOGIA MODERNA

Em 1920 publica-se o livro-manifesto da EducaçãoNova, Transformemos a escola, da autoria deAdolphe Ferrière. É um marco simbólico damodernidade escolar e pedagógica. Entre 1870 e

1920 assiste-se a um avanço, sem precedentes, nodesenvolvimento de ideias pedagógicas, quemobilizam os mais variados conhecimentos(psicológicos, sociológicos, médicos, filosóficos,etc.) no estudo da criança e na produção de uma“ciência da educação”.

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É difícil resumir, num parágrafo, as teses daEducação Nova. Mas não andaremos muito longe

de uma definição se mencionarmos quatroprincípios – educação integral, autonomia doseducandos, métodos activos e diferenciaçãopedagógica – e se lhes juntarmos a referência deEdouard Claparède à revolução copernicana quecoloca a criança no centro, procurando asseguraruma educação à sua medida (é este o título de uma

obra emblemática deste psicólogo suíço, L’écolesur mesure).

A pedagogia moderna elabora e difundesocialmente modos de conceber a educação que setornarão dominantes na sociedade do século XX.

 Todos, dentro e fora das escolas, somos herdeiros

destas “teorias modernas da educação que vêm docentro da Europa e que consistem numa salgalhadasurpreendente de coisas sensatas e de disparates,as quais contribuíram para revolucionar de alto abaixo o sistema de ensino sob a bandeira doprogresso da educação” (Arendt, 1972, p. 229).

O comentário de Hanna Arendt é, talvez,

demasiado severo, mas nem por isso deixa deretratar bem a amálgama que dá pelo nome deEducação Nova. O conceito de educação integral éaquele que melhor simboliza este movimento e assuas desmesuradas ambições. A escola deveriaencarregar-se da formação da criança em todas as

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dimensões da sua vida. A escola assumiu esteprograma impossível e acreditou que o podia

cumprir. Ao longo do século XX, foi alargando assuas missões, ficando de tal maneira atravancadaque perdeu a noção das prioridades.

A realidade das últimas décadas não tem cessadode confirmar os perigos de uma “escolatransbordante”. É certo que houve ganhosimportantes, sobretudo no plano social, com aescola a compensar ausências da sociedade e dasfamílias, contribuindo para uma melhor integraçãodas crianças e dos jovens. Mas quando tudo éessencial, torna-se impossível concretizar umaacção racional e inteligente. A escola desviou-semuitas vezes das tarefas do ensino e da

aprendizagem para se dedicar às missões sociais.Do passado ao futuro

A crítica principal que hoje se dirige à escola dizrespeito à sua incapacidade para promover asaprendizagens, respondendo assim aos desafios dasociedade do conhecimento. Há quem vá aindamais longe e defina a seguinte prioridade para aescola actual: “Fazer com que todos os alunostenham verdadeiramente sucesso”. A frase constadas conclusões do debate sobre o futuro da escola,que teve lugar em França em 2003-2004 (consultarem www.debatnational.education.fr).

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Em rigor, o que se nos coloca é um problema desentido. Para que serve a escola nas sociedades

contemporâneas? As respostas do passado já nãonos servem e temos dificuldade em encontrarrespostas novas. Regresso aos cenários da OCDEque analisei no Capítulo 3, desta vez de forma maissimplificada:

Statu quoManutenção de sistemas de ensinoburocráticos

ReescolarizaçãoA escola no centro da colectividadeA escola como organização centrada naaprendizagem

DesescolarizaçãoExpansão do modelo de mercadoRedes de aprendentes e sociedade em rede

CriseÊxodo dos professores e desintegração dosistema

Neste momento, interessa-me analisar os doiscenários que são portadores de uma lógica dereescolarização.

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O primeiro destes cenários – A escola no centro dacolectividade – prolonga as tendências de

transbordamento da escola que assinalámosanteriormente. A escola orientar-se-iaprimordialmente para missões sociais, de apoio àscrianças e às suas famílias, sobretudo no caso dosmeios menos favorecidos. Sem negligenciar atransmissão do saber, a escola ocupar-se-ia de umconjunto de outras competências sociais e

culturais, constituindo um lugar de referência paraas comunidades locias. Inserindo-se numa tradiçãolonga de ligação escola-sociedade, este cenárioconcede à escola um relevante papel assistencial ede compensação face à incapacidade das famíliaspara assegurarem as condições necessárias aodesenvolvimento das crianças.

O segundo cenário –  A escola como organizaçãocentrada na aprendizagem – chama a atenção paraa importância do saber e da aprendizagem nassociedades do século XXI. Trata-se de recusar aideia de que a escola pode tudo, identificando osaspectos centrais, específicos e prioritários do

trabalho escolar. O debate não é novo. Há mais devinte anos, Daniel Hameline referia-se ànecessidade de regressar, com inteligência, “aoque constitui a especificidade da escola no meiodas instâncias múltiplas através das quais uma

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sociedade educa os seus membros” (1984/1985, p.80).

Em muitos países verifica-se um dualismo cada vezmais acentuado: as elites investem numa educação(privada) que tem como elemento estruturante aaprendizagem, enquanto as crianças dos meiosmais pobres são encaminhadas para escolas(públicas) cada vez mais vocacionadas paradimensões sociais e assistenciais. É uma tendênciaindesejável para o futuro.

Por isso, na última parte do texto, argumentarei emfavor de uma escola centrada na aprendizagem,

  procurando assim inverter as tendências detransbordamento da escola. Mas sei que a defesadeste cenário só faz sentido se houver,

simultaneamente, um reforço do espaço público daeducação, tese que avançarei no ponto seguinte.

TERCEIRO TEMPO HISTÓRICO

1970 – DESESCOLARIZAÇÃO DA SOCIEDADE

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1870 | 1920 | 1970: cem anos depois, o modeloescolar é seriamente posto em causa por uma série

de movimentos e correntes que pugnam pela“desescolarização da sociedade” (a obra maisconhecida é publicada por Ivan Illich, em 1971,Deschooling society , obra que será traduzida paraportuguês com um título equívoco, Sociedade semescolas). A educação permanente é um dosconceitos-chave deste pensamento radical, que se

elabora ao longo dos anos sessenta.Logo em 1966, Pierre Furter dedica um capítulo doseu livro Educação e Vida a esta problemática,concluindo com a seguinte definição: “Em resumo,constatamos que a Educação Permanente não podeser reduzida nem a uma educação «extra-escolar»,

nem «complementar», nem «prolongada», nem«fundamental», nem tão pouco «de adultos»,porque todas estas interpretações só vêem umaparte do problema. A Educação Permanente não éalgo que se acrescenta a um sistema dado. Não éum novo sector, um novo campo. É uma novapespectiva, que leva os educadores a redefinir toda

e qualquer educação” (1966, p. 136).Pierre Furter antecipa os escritos de Ivan Illich e deuma geração que vai produzir uma crítica forte àinstituição escolar. O famoso relatório da UNESCO coordenado por Edgar Faure,   Apprendre à être,publicado em 1972, continua esta reflexão

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procurando abrir a educação a todos os tempos e atodas as dimensões da vida. Há duas utopias que

atravessam o pensamento deste autores: por umlado, a possibilidade de uma “educaçãodesescolarizada”, isto é, de uma educação libertadas estruturas institucionais e baseada em redesinformais de aprendizagem ou “teias deoportunidades”; por outro lado, a defesa de umaeducação que não se limite, primordialmente, aos

aspectos da formação profissional e que abranja asquestões da sociedade, da cultura e do “aprender aser”.

Cedo se percebeu quão ilusórias eram estasutopias. Os discursos e as práticas da EducaçãoPermanente, ao longo das décadas de setenta e

oitenta, evoluíram, justamente, no sentidocontrário. Em vez da desescolarização, assistiu-seao triunfo de uma “sociedade pedagógica”, de umasociedade que generalizou uma relação pedagógicacom as crianças, os jovens e os adultos. Em vez deuma educação aberta sobre as dimensões da vida,assistiu-se à redefinição da Educação Permanente

como “Educação e formação ao longo da vida”,conceito marcado pelo princípio daempregabilidade.

Do passado ao futuro

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E agora? Podemos imaginar três cenários que, numcerto sentido, se inserem na procura de

alternativas para o modelo escolar e para a formacomo ele se desenvolveu desde finais do séculoXIX.

O primeiro cenário baseia-se na substituição dasestruturas escolares pela valorização educativa deum conjunto de espaços e de instituições sociais. Aideia das redes de aprendizagem surge comnaturalidade, reelaborada a partir de fugas paratrás e para a frente. A “fuga para trás” revela-se nomito de um passado em que não havia escolas, noqual as pessoas se educavam ao ritmo da vida dassociedades, aprendendo de modo informal econvivial. A “fuga para a frente” alimenta-se

sempre de uma utopia tecnológica, de umdispositivo que permita, enfim, colocar aaprendizagem e o saber ao alcance de todos. Ocenário das redes tem vindo a tornar-se, de diapara dia, mais plausível. Do ponto de vista social,as sucessivas baixas de natalidade a par damelhoria dos níveis educativos da população adulta

e do aumento significativo da esperança de vidalibertam um conjunto importante de energiaspessoais para missões de educação e de cultura.Do ponto de vista tecnológico, os espantososdesenvolvimentos da internet  (inter-rede)

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convidam-nos a não excluir, à partida, quaisquerdesenvolvimentos futuros.

O segundo cenário está bem presente, hoje, naspolíticas educativas em todo o mundo, comparticular relevo para a União Europeia. Não é umapossibilidade, é sim uma realidade concreta. Oconceito de lifelong learning (aprendizagem aolongo da vida) é considerado central para adefinição das estratégias educativas.Contrariamente às intenções dos autores daEducação Permanente, a sua operacionalizaçãotem-se feito, fundamentalmente, no quadro daspolíticas do emprego e da requalificaçãoprofissional. O termo empregabilidade, que ocupaum lugar central na famosa Estratégia de Lisboa,

adoptada pela União Europeia em 2000, define osesforços educativos ao longo da vidaessencialmente como uma obrigação de cadatrabalhador para que se mantenha apto adesempenhar novas tarefas profissionais. AEducação Permanente começou por ser um direitopelo qual se bateram sucessivas gerações de

trabalhadores; depois transformou-se numanecessidade ditada pelas mudanças no mundo dotrabalho; e agora impõe-se como uma obrigaçãopara conseguir um emprego digno. O conjunto dossistemas escolares, desde a escola obrigatória até à

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universidade (veja-se o Processo de Bolonha), estáa ser redefinido à luz destas perspectivas.

O terceiro cenário aponta para a necessidade deredefinir a missão da escola, de maneira maismodesta, mas mais orientada do ponto de vista dasaprendizagens. A escola deve libertar-se de umavisão regeneradora ou reparadora da sociedade,assumindo que é apenas uma entre as muitasinstituições da sociedade que promovem aeducação. Nesse sentido, pensar de outro modo oespaço público da educação, através de umaproveitamento das potencialidades culturais eeducativas que existem na sociedade e de umaresponsabilização do conjunto das entidadespúblicas e privadas.

Por isso, a ideia de um novo contrato educativo,celebrado com toda a sociedade, e não apenas coma escola, que tenha como base o reforço do espaço

 público da educação, está no centro do cenário quedefenderei na última parte do texto.

UM TEMPO FUTURO

2021 – AINDA SEM NOME

Nesta última parte, seguirei os conselhos de PierreFurter (1966), procurando introduzir, no presente,um futuro esboçado de maneira a dar a estepresente uma forma que permita a eclosão do

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futuro. Mais do que uma antecipação, tentareiprojectar cenários de futuro, aqueles em que me

revejo de entre os muitos possíveis. Ao fazê-lo,estou a traçar caminhos e a definir orientaçõespara a acção presente. 2021 é um tempo futuro,ainda sem nome, mas suficientemente perto paraque nele possamos inscrever, desde já, as nossaspreocupações.

Nas páginas anteriores, avancei uma série decenários, uns mais prováveis do que outros. Nofinal de cada uma das três partes, em itálico,assinalei as evoluções desejáveis. Vou agoraretomá-las e defendê-las, em conjunto, comoprogramas para pensar e agir na campo educativo:

1.ª Educação Pública, Escolas Diferentes

2.ª Escola centrada na aprendizagem

3.ª Espaço Público de Educação: Um novocontrato educativo

1.ª Proposta

Educação Pública, Escolas DiferentesNos tempos actuais, talvez mais ainda do que emtempos passados, a educação deve definir-se comoum “bem público”. As sociedades contemporâneas,fortemente globalizadas, vivem com enormesafastamentos e divisões no plano social, cultural e

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religioso. Como se a facilidade de comunicaçãoplanetária tivesse conduzido, paradoxalmente, a

fechamentos nas formas de convivialidade.As ideologias da educação como “bem privado”,algumas particularmente sedutoras, contribueminevitavelmente para a tribalização da sociedade.Claro que, no dia em que cada grupo social oureligioso tiver a sua própria escola, fundada emcrenças e valores próprios, a acção pedagógicatornar-se-á mais coerente e harmoniosa. Mas, pelocaminho, perder-se-á uma das principais qualidadesda escola pública, a possibilidade de instaurarnarrativas partilhadas e culturas de diálogo.

Numa reflexão notável, Arwin Appadurai alerta paraos riscos do diálogo, mas explica que não temos

alternativa, sugerindo uma estratégia deselectividade, de modo a que não nos sintamosobrigados “a partilhar toda a nossa humanidade emtodas as ocasiões” (2006, p. 37). A escola é,

 justamente, uma das instituições onde esta partilhapode ter lugar, de forma prudente e selectiva,construindo assim uma base sólida e evolutiva para

a construção de práticas de vida em comum.

Mas a defesa de uma educação pública depende,hoje, de uma mudança dos sistemas de ensino demodo a possibilitar o desenvolvimento de escolasdiferentes. Em vez da homogeneização que

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caracterizou a história do século XX, impõe-seagora uma abertura à diferença, sob todos os

pontos de vista:a) liberdade de organização de escolasdiferentes, por exemplo com base emcontratos com entidades ou associaçõeslocais;

b) liberdade na construção de diferentes

projectos educativos, por exemplo com baseem iniciativas de grupos de professores oude associações pedagógicas;

c) liberdade na definição de percursosescolares e de currículos diferenciados, porexemplo com base em acordos comsociedades científicas ou universidades.

As entidades públicas devem manter,evidentemente, uma capacidade decontratualização e de regulação do sistema públicode ensino. A abertura à diferença permitirá,também, modelos diversos de direcção e gestãodas escolas, bem como uma maior

responsabilização e prestação de contas por partedas diversas entidades. A inovação e aexperimentação, devidamente avaliadas, deverãoinstituir-se como processos naturais.

A abertura à diferença deve, também, traduzir-senuma maior liberdade de escolha dos

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estabelecimentos de ensino. As famílias e os alunosdevem poder escolher a sua escola e,

simultaneamente, participar na definição do seuprojecto educativo. Mas sempre no contexto deuma dimensão pública. Quer isto dizer que osalunos podem escolher a sua escola, mas asescolas não podem escolher os seus alunos. Dito deoutro modo, as escolas não devem usar estaliberdade para seleccionar socialmente os seus

alunos, introduzindo factores de discriminação e dedesigualdade no acesso ao serviço público deeducação.

A proposta que aqui se elabora retoma a aspiraçãode Claparède, “uma escola à medida de cadaaluno”, mas define-a para além dos aspectos

meramente pedagógicos (a aplicação de umapedagogia diferenciada em função dasnecessidades de cada aluno) e projecta-a no planoda organização de escolas diferentes.

2.ª Proposta

Escola centrada na aprendizagemA defesa de uma escola centrada na aprendizagemprocura inverter a deriva transbordante de umaescola a quem a sociedade vai, progressivamente,atribuindo todas as missões. Não se trata deadvogar o regresso a um qualquer passado mítico

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e, muito menos, de defender programas mínimos, oensino do “ler, escrever e contar” ou as tendências

do “back to basics”. Estes movimentos, queganharam grande importância face à crise daescola e à incapacidade de resposta perante amassificação do ensino, baseiam-se na defesa doensino tradicional e têm-se revelado de umaenorme pobreza teórica e prática. Trata-se, bempelo contrário, de abrir novas perspectivas que

coloquem a aprendizagem, em toda a sua riqueza,no centro das nossas preocupações.

Há duas questões fundamentais a resolver. Emprimeiro lugar, assegurar que todas as criançasadquirem uma base comum de conhecimentos;qualquer política educativa deve assumir este

objectivo, não considerando o insucesso e ofracasso como fatalidades impossíveis de combater.Em segundo lugar, promover diferentes vias deescolaridade, percursos adaptados às inclinações eaos projectos de cada um; é preciso que as criançase os jovens, sobretudo aqueles que vêm de meiosdesfavorecidos, reencontrem um sentido para a

escola, pois só assim conseguiremos que “todos osalunos tenham verdadeiramente sucesso”.

Para que a aprendizagem possa tenha lugar aescola terá de cumprir, escusado será dizer,algumas missões sociais e assistenciais. Os dramasda miséria, da fome, dos maus tratos, da gravidez

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precoce ou do consumo de drogas, entre tantosoutros, impossibiitam um projecto educativo

coerente. Mas assumir estas tarefas,provisoriamente, por imperativo ético, não é amesma coisa do que defini-las como missõesprimordiais da escola, e este tem sido o erro maiorda escola transbordante.

Uma nova perspectiva de aprendizagem deve serenriquecida com uma série de estudos econtributos que têm a vindo a ser formuladas emdiversos campos científicos e culturais, mas que,em grande parte, não chegaram ainda às teoriaseducativas e, muito menos, às práticas escolares:os trabalhos recentes das neurociências sobre aimportância das emoções, dos sentimentos e da

consciência na aprendizagem; as pesquisas quetêm posto em destaque o papel da memória e dacriatividade; os desenvolvimentos da psicologiacognitiva, designadamente sobre as diferentesformas de inteligência; as teorias daimprevisibilidade sobre o carácter inesperado e até“desorganizado” de muitas aprendizagens e a

importância de lhes atribuir sentido e significado;as consequências para a aprendizagem das novastecnologias, das distintas formas de navegação ede processamento da informação; etc.

A reflexão anterior levar-me-ia muito longe eobrigar-me-ia a iniciar um novo texto. Subjacente a

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muitas destas teorias está um princípio decomplexidade, que rompe com grande parte das

convicções do ensino tradicional; por exemplo, oprincípio de que se aprende do mais simples para omais complexo ou do mais concreto para o maisabstracto. A aprendizagem não é um processolinear e deve ser equacionada numa perspectivamultifacetada, bem distante dos simplismos quecaracterizam tanto a escola tradicional como a

pedagogia moderna.Promover a aprendizagem é compreender aimportância da relação ao saber, é instaurar formasnovas de pensar e de trabalhar na escola, éconstruir um conhecimento que se inscreve numatrajectória pessoal. Falar de um olhar complexo e

transdisciplinar não é recusar o papel dasdisciplinas tradicionais, mas é dizer que oconhecimento escolar tem de estar mais próximodo conhecimento científico e da complexidade queele tem vindo a adquirir nas últimas décadas.

Simultaneamente – e este não é um aspecto menor– é necessário que as escolas se libertem das

estruturas físicas em que têm vivido desde o finaldo século XIX. Nessa época, há quase 150 anos, osedifícios escolares foram pensados com grandeousadia e criatividade, mobilizando projectos esaberes de professores, arquitectos, higienistas,médicos, pedagogos e tantos outros especialistas.

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Hoje, é necessário mobilizar, com o mesmo vigor,novas energias na criação de ambientes educativos

inovadores, de espaços de aprendizagem queestejam à altura dos desafios dacontemporaneidade.

3.ª PropostaEspaço Público de Educação: Um novo

contrato educativoA frase  À escola o que é da escola, À sociedade oque é da sociedade sintetiza bem as ideias quetemos vindo a apresentar. A proposta anterior –Escola centrada na aprendizagem – só tem sentidose a sociedade se responsabilizar,

progressivamente, por um conjunto de missõesque, até agora, têm sido assumidas pela escola.

É fácil enunciar, propositadamente sem qualquerordem, algumas destas missões: a protecção doambiente, a preservação do património cultural, ocombate à droga e à toxicodependência, aeducação para a saúde e a educação sexual, a

preparação para lidar com situações deemergência, a promoção de comportamentossaudáveis, a educação alimentar, a educação parao consumo, o combate aos maus tratos e àviolência doméstica, a educação para a cidadania,a prevenção da delinquência juvenil, etc.

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Sem ignorar o papel da escola em muitas destasmissões, será que elas não devem ser assumidas

primordialmente por outras instâncias sociais? Seráque não devemos responsabilizar as famílias, mastambém as comunidades locais, as associaçõesculturais, as entidades laborais, as igrejas, osmuseus, as organizações científicas, os centros desaúde e os espaços artísticos e desportivos pelocumprimento de boa parte destas missões?

Não se trata de regressar ao debate sobre a relaçãoescola-sociedade, mas antes de promover aconstrução de um espaço público de educação, noqual a escola tem o seu lugar, mas que não é umlugar hegemónico, único, na educação das criançase dos jovens. A proposta que vos faço rompe com a

tradição de ir atribuindo à escola todas as missõese inspira-se nas formas de convivialidade sugeridaspor Ivan Illich.

A defesa de um espaço público da educação só fazsentido se ele for “deliberativo”, na acepção que

 Jürgen Habermas (1989) deu a deste conceito. Nãobasta atribuir responsabilidades às diversas

entidades, é necessário que elas tenham umapalavra a dizer, que elas tenham capacidade dedecisão sobre os assuntos educativos. Aoperacionalização desta ideia obrigará a equacionarformas de organização dos cidadãos, para o

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exercício destas missões, designadamente atravésdos órgãos locais de governo.

É nesta perspectiva que a proposta adquire todoseu sentido, abrindo para a possibilidade de umnovo contrato educativo, cuja responsabilidade épartilhada por um conjunto de actores e deinstâncias sociais, não ficando apenas nas mãosdos educadores profissionais. Se é verdade que aescola cumpriu, ao longo do século XX, umimportantísimo trabalho social, não é menosverdade que hoje se torna essencial evoluir nosentido de uma maior responsabilidade dasociedade.

Muitas zonas do mundo, e dos nossos própriospaíses, vivem ainda em situações de miséria e de

pobreza, económica e cultural. Mas, de um modogeral, verificou-se uma enorme evolução nasqualificações escolares dos adultos. Durante muitasdécadas houve um fosso geracional: os mais novostinham habilitações académicas muito superioresaos mais velhos. Agora, pela primeira vez, hágerações adultas que têm habilitações académicas

idênticas às das gerações mais novas,possibilitando-lhes assim uma intervençãoeducativa mais consistente. Paralelamente, temaumentado a esperança e a qualidade de vida daspessoas idosas, bem como a sua disponibilidadepara tarefas sociais e culturais. E as sociedades

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têm-se dotado de instituições de cultura, deciência, de desporto ou de arte como nunca

existiram no passado. Todas estas evoluçõestornam viável um cenário que, ainda há poucotempo, seria ilusório.

Em sentido contrário, poder-se-á argumentar que,apesar destas evoluções, a “sociedade civil” revelasinais de uma grande fragilidade, designadamentepela corrosão de alguns laços e estruturastradicionais. Mas este argumento apenas reforça anecessidade de reconstruir solidariedades, espaçosde convivialidade, de vida social e cultural, quetenham como um dos pontos centrais a educaçãodas crianças e dos jovens.

* * * * *

São muitos os futuros possíveis. Mas só um terálugar. E isso depende da nossa capacidade depensar e de agir. Deixo-vos alguns contributosmodestos, em torno de três propostas que poderão

orientar programas de trabalho e políticaseducativas.

É preciso abrir os sistemas de ensino a novasideias. Em vez da homogeneidade e da rigidez, adiferença e a mudança. Em vez do

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transbordamento, uma nova concepção daaprendizagem. Em vez do alheamento da

sociedade, o reforço do espaço público daeducação.

Estas propostas genéricas não se baseiam emsituações concretas, nem em casos específicos.Procuram, sim, provocar um debate, que vai paraalém das fronteiras nacionais, abrindo novoshorizontes para a educação. São ideias que sópoderão ser úteis se forem devidamentecontextualizadas e adaptadas à realidade de cadaregião e de cada país.

Hannah Arendt escreveu que uma crise apenas setorna catastrófica se lhe respondermos com ideiasfeitas, isto é, com preconceitos (1972, p. 225).

 Tinha razão. O pensamento contemporâneo tem deir além do   já conhecido e alimentar-se de umpensamento utópico, que se exprime “pelacapacidade não só de pensar o futuro no presente,mas também de organizar o presente de maneiraque permita actuar sobre esse futuro” (Furter,1970, p. 7).

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