PERRUSI, Artur. A lógica asilar acabou? Uma crítica da critica à assistência psiquiátrica
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PERRUSI, Artur. A lógica asilar acabou? Uma crítica da critica à assistência psiquiátrica. IN: FONTES,
Breno Augusto & FONTE, Eliane Monteiro (orgs). Desinstitucionalização, redes sociais e saúde mental:
análise de experiências da reforma psiquiátrica em Angola, Brasil e Portugal. Recife: Editora UFPE, 2010.
A lógica asilar acabou? Uma crítica da crítica à assistência psiquiátrica
Introdução: respondendo a uma pergunta
Sem maiores delongas, evitando expectativas e tergiversações, responderemos logo à
pergunta do título: não, a lógica asilar não acabou. Mas, o que significa, de fato, dizer que a lógica
asilar não acabou? Significa dizer que o asilo não acabou? Não, já que a noção de “lógica asilar”,
como tal, não se esgota no seu contexto empírico de origem, o asilo; na verdade, ultrapassa-o,
podendo ser percebida não apenas como “lógica”, mas também como “prática” noutras estruturas,
como o hospital psiquiátrico e até em serviços extra-hospitalares, por exemplo.
No fundo, como veremos mais adiante, a resposta a tais perguntas depende da postura
epistemológica diante do saber psiquiátrico. O alcance da noção de “lógica asilar” é diferente
segundo o tipo de crítica que se faz ao saber psiquiátrico: uma crítica total, uma autocrítica ou uma
revalidação do saber psiquiátrico.
a) A primeira crítica nega a validade do saber psiquiátrico como saber científico e médico –
uma das suas conseqüências seria a negação da própria noção de “doença mental” 1;
b) a segunda elenca os diversos erros históricos do saber psiquiátrico, re-configurando seu
lugar na medicina – a noção de doença permanece, mas de forma secundária, e a psicopatologia
passa a se nutrir, também, dos aportes das ciências humanas;
c) a terceira reafirma o saber psiquiátrico como saber médico e profissional – a noção de
doença permanece, sendo naturalizada pelos aportes provenientes da neuropsiquiatria.
As três formas de crítica são diferentes e têm posturas antagônicas quanto à psiquiatria e à
natureza da “doença mental”. Entre as três posições, inclusive, existe uma série de posturas
intermediárias, tanto em relação às instituições psiquiátricas, quanto às definições sobre a loucura.
1 Aspeamos a noção "doença mental" (DM), pois o que existe de fato é o doente ou a pessoa com algum tipo
grave de sofrimento psíquico. Colocar o problema desse modo não é negar a sua pertinência no campo da psicopatologia, mas sim mostrar que a “doença mental" pode ser vista, também, como uma categoria de valor e como "objeto profissional" da psiquiatria.
As posições a) e b) fazem parte do que chamamos de teoria crítica da psiquiatria, enquanto a posição
c), do discurso profissional da medicina psiquiátrica. Situando o alcance da noção de lógica asilar a
partir de tais posturas, podemos percebê-la em dois extremos: num sentido fraco, a lógica asilar
identificar-se-ia à instituição asilar ou, como já dissemos, ao seu referente empírico de origem, o
asilo -- assim, acabando o asilo, conseqüentemente, ela desapareceria de pronto. Num sentido forte, a
lógica asilar confundir-se-ia com todo processo institucional na psiquiatria, independentemente do
fim do asilo. A psiquiatria, nesse caso, seria um mero dispositivo de poder, e o fim da lógica asilar
identificar-se-ia com o próprio fim da psiquiatria.
Tais posições delimitam o campo de tensão que perpassa o saber psiquiátrico, principalmente
no que se refere ao seu objeto profissional: a “doença mental”. Afinal, seria em torno do seu objeto
profissional que gira o debate sobre a validade do saber psiquiátrico. Porém, o que torna tão especial
a discussão sobre a natureza da “doença mental”? Para entender melhor essa questão, inferimos as
seguintes hipóteses sobre as tensões que perpassam o saber psiquiátrico quanto à “doença mental”
(DM) e, de certa maneira, o campo profissional da saúde mental:
• a "doença mental" é um fenômeno sui generis na medicina. Ela jamais conseguiu ser
enquadrada pelo paradigma biomédico da medicina. Sendo o objeto profissional da
psiquiatria, sua instabilidade, enquanto representação médica de doença, condiciona diversas
dificuldades no campo do saber psiquiátrico: falta de consenso etiológico, confronto de
diversos paradigmas de doença, desvalorização do conhecimento psiquiátrico. A psiquiatria,
por causa da sua incapacidade de enquadrar cientificamente a DM, possui uma fragilidade
disciplinar no campo da formação profissional da medicina. Tais problemas estabelecem
diversas tensões na identidade profissional dos profissionais que atuam no campo da saúde
mental;
• a saúde mental possui um aparato institucional (hospital psiquiátrico, rede extra-hospitalar...)
diferente e separado do campo organizativo da saúde. Provavelmente, tal diferença e
separação tenham, entre outros fatores, uma relação com a percepção social da “doença
mental”. Independentemente disso, o fato é que a organização institucional da saúde mental
condiciona o modo como se realiza o trabalho profissional ― a psiquiatria é, por exemplo,
praticamente uma profissão dentro da profissão médica, tendo uma grande importância
institucional no campo da medicina;
• por causa da condição sui generis da “doença mental” e do singular aparato institucional da
saúde mental, a prática profissional, no campo da saúde mental, possui características
diferentes das práticas profissionais dos outros profissionais da saúde.
• Tais situações foram sempre tensas e importantes para a legitimação da psiquiatria. O
reconhecimento científico do saber médico teve um papel capital na legitimação social da
medicina, abjurando outras formas de conhecimento, de tratamento e cura do campo
profissional e se tornando o único detentor de uma competência reconhecida para o
tratamento das doenças (Freidson, 1984; Foucault, 1987). Tal processo de legitimação social,
através de uma forma de organização profissional, baseou-se evidentemente numa luta e no
uso de poder, mas estava conectado aos imperativos da reprodução e manutenção de um
saber.
• A psiquiatria é uma das poucas disciplinas médicas, senão a única, que nunca teve um
consenso etiológico e nosológico2 estável, isto é, uma representação única e estável guiando a
conduta dos psiquiatras, sempre sofrendo assim uma inadequação permanente com a
representação biomédica de doença. Num certo sentido, ela sempre foi "fraca" no aparato de
formação médica e na luta pelo seu reconhecimento disciplinar dentro da própria medicina,
conseguindo tardiamente e de forma mitigada diferenciar-se da neurologia, e "forte" no
campo institucional, com seus aparelhos de tratamento especiais, separados do campo da
saúde em geral. Não conseguindo, do ponto de vista disciplinar, assegurar um consenso, o
saber psiquiátrico fica mais "frágil" diante das interpelações de outras esferas de saber
produtoras de representações sobre a “doença mental”, embora compense essa situação com
seu forte aparato institucional. Por isso, a dificuldade em enquadrar de forma normativa a
“doença mental”, como um objeto profissional da psiquiatria e da saúde mental como um
todo. Não causa surpresa que tal enquadramento tenha sido interpretado, por diversos
autores3, muito mais como uma questão de poder do que de saber. Assim, a transformação da
“doença mental” num objeto profissional da psiquiatria envolve, também, um conflito
político com outras representações de “doença mental”, disseminadas de forma difusa em
vários segmentos sociais, seja incorporando-as, seja eliminando-as ou diminuindo seu alcance
cognitivo (Perrusi, 2007). É um embate importante, pois envolve a preponderância de quem
pode classificar uma categoria social tão vital, como a “doença mental”. Dessa forma, é a
2 Etiológico, porque a psiquiatria nunca teve um consenso a respeito das causas da doença mental;
nosológico, porque nunca teve um consenso a respeito de quais doenças trata a psiquiatria. 3 Foucault (1978, 1979, 1984), Castels (1976, 1981), Basaglia (1976), Berlinguer (1985), entre outros.
disputa por um mandato social que permite a um grupo social determinar, de forma exclusiva,
categorizações sobre um fenômeno social. Ao transformar a “doença mental” em objeto
profissional, logo, numa representação profissional, a “doença mental” torna-se um objeto
específico, pois marcada pelo grupo profissional. E seria através dessa especificidade,
enquanto objetos profissionais, que são valorizados socialmente.
• Assim, como objeto profissional, a “doença mental” é de difícil conformação e, inclusive,
seria fonte de representações exatamente por ser polimorfa e de difícil apreensão. Como tal,
está numa situação diferente da doença dita somática, cuja normalização é mais profunda e
antiga, sendo um objeto profissional de muito mais fácil apreensão e controle. Devido ao seu
caráter um tanto inapreensível, a necessidade de controle do seu objeto profissional, para os
psiquiatras, tornou-se uma questão de identidade e de coesão social (coesão de grupo). Sua
apropriação, enquanto objeto, constitui um desafio que coloca em xeque a legitimidade
profissional da psiquiatria. Ao contrário dos objetos profissionais da profissão médica, a
“doença mental” não possui um consenso etiológico, permitindo assim a concorrência de
diversas representações psiquiátricas do objeto profissional, criando uma profusão de
nosologias e práticas terapêuticas. Sem consenso, os psiquiatras e os profissionais da saúde
mental não estariam, como os neurologistas, por exemplo, submetidos a uma instância de
regulação que definiria um sistema ortodoxo (conjunto de regras e práticas relacionadas, no
caso da medicina, ao diagnóstico e, principalmente, ao tratamento) de controle do objeto
profissional. Além do mais, mesmo que possamos admitir que exista, de fato, um sistema
ortodoxo na psiquiatria, ele não seria consensual, estando sujeito a revisões constantes e
sendo fonte de eternos conflitos entre os psiquiatras e os profissionais da saúde mental.
• Com um sistema ortodoxo de fraco enquadramento normativo, a delimitação de fronteiras
entre saberes e representações é fundamental na construção do campo da saúde mental. A
questão é importante, pois a psiquiatria lutou sempre pela transformação da "loucura" em
"doença mental", portanto, pela ratificação da “doença mental” como seu objeto de
conhecimento e profissional. A luta foi e é também por um monopólio discursivo — a
logorréia da psiquiatria sobre o seu objeto corresponde ao silêncio das outras produções
discursivas sobre o fenômeno mais geral da loucura.
Enfim, tais hipóteses serão o pano de fundo de nossa análise. Posto assim, como nosso objeto
de estudo é outro, voltemos às posições críticas assinaladas acima. Como tais, já que demarcam o
alcance da noção de lógica asilar, têm relações com o debate sobre a instituição psiquiátrica, isto é,
com os diversos modelos de assistência psiquiátrica. Por isso, ao analisar as conseqüências da
Reforma Psiquiátrica, nosso intuito não será fazer uma análise histórica da psiquiatria brasileira.
Preferimos, na realidade, uma discussão sincrônica e conceitual, tentando perceber quais são os
fatores estruturantes da formação assistencial psiquiátrica brasileira. Mesmo assim, achamos
necessário, ainda que de forma esquemática, citar alguns dados que são sintomas da longa transição
da assistência psiquiátrica brasileira: do modelo asilar original, passando atualmente por uma fase
ainda hospitalocêntrica, para um futuro, quiçá, modelo psicossocial (Costa-Rosa, 2000), isto é,
completamente extra-hospitalar. Centraremos nossa atenção no período recente de implantação da
Reforma Psiquiátrica
• Desde 1997 até 2004, a proporção de recursos do SUS destinados aos Hospitais
Psiquiátricos e aos Serviços Extra-Hospitalares mudou consideravelmente. Há uma
clara tendência, embora possa haver retrocessos futuros, de aumento nos gastos extra-
hospitalares em detrimento dos hospitalares:
GASTOS 1997 2001 2004
Gastos
Hospitalares
em Saúde
Mental
93,14 79,54 63,84
Gastos
Extra-
hospitalares
em Saúde
Mental
6,86 20,46 36,16
Fonte: Ministério da Saúde (Brasil, 2005)
• Em 1996, havia 72514 leitos psiquiátricos no Brasil; em 2005, 42076, com 228
hospitais psiquiátricos.
• Em 2007, já existiam 918 CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) em funcionamento,
120 deles voltados, exclusivamente, ao atendimento de dependentes de álcool e
drogas. Havia ainda 475 serviços residenciais terapêuticos, 350 ambulatórios, 36
Centros de Convivência e Cultura (Brasil, 2009). Tais formas de assistência são
organizações que rompem com o modelo hospitalocêntrico, embora possam e, na
verdade, estejam subordinados, na atual conjuntura, ao modelo hospitalar.
• Desde 2003, existe o Programa de Volta para Casa e Inclusão Social pelo Trabalho,
que tem como objetivo “contribuir efetivamente para o processo de inserção social
das pessoas com longa história de internações em hospitais psiquiátricos, através do
pagamento mensal de um auxílio-reabilitação, no valor de R$240,00 (duzentos e
quarenta reais, aproximadamente 110 dólares) aos seus beneficiários. Para receber o
auxílio-reabilitação do Programa De Volta para Casa, a pessoa deve ser egressa de
Hospital Psiquiátrico ou de Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico, e ter
indicação para inclusão em programa municipal de reintegração social” (Brasil,
2005: 17)
Os dados ainda mostram uma assistência psiquiátrica centrada no hospital psiquiátrico,
embora comprovem, também, uma substituição paulatina da estrutura hospitalar por uma extra-
hospitalar. Os dados acima não revelam, porém, as desigualdades regionais na inserção da Reforma
Psiquiátrica nos Estados (ver Brasil, 2005); assim, há regiões bem mais hospitalocêntricas do que
outras, como também regiões onde a Reforma está bem sedimentada do ponto de vista institucional.
De todo modo, podemos dizer que a assistência psiquiátrica está numa situação de transição, com
uma tendência para a perda de hegemonia institucional do hospital psiquiátrico.
Mesmo se existe, de fato, essa tendência, lembramos que está sendo extremamente difícil,
ainda, colocar em prática a lógica institucional do SUS, principalmente na área da saúde mental, pois
a predominância do setor privado inverte a lógica proposta: o privado complementando o público – o
que ocorre é o contrário: 58% dos leitos psiquiátricos eram privados até 2005 (Brasil, 2005). A saúde
mental brasileira é estruturada economicamente de tal forma que o setor privado, inclusive como
modo de sobreviver financeiramente, precisa sufocar o desenvolvimento do setor público. A
manutenção do hospitalocentrismo, além das controvérsias ideológicas, possui um fundamento
econômico e privado: dado o desenvolvimento das instituições psiquiátricas, calcadas no setor
privado, o hospital psiquiátrico é a melhor forma de sustentação econômica, já que a rentabilidade
privada é proveniente da exploração da internação, logo, do leito ocupado. O investimento privado
em estruturas extra-hospitalares não tem contrapartidas financeiras, isto é, por enquanto, não é
rentável. Juntando isso ao fato de que o serviço público em saúde mental jamais escapou
completamente da lógica hospitalocêntrica, até mesmo por causa da falta de recurso para investir em
estruturas extra-hospitalares, pode-se entender por que o hospitalocentrismo hegemoniza a
assistência psiquiátrica brasileira.
Atualmente, a estrutura do sistema psiquiátrico brasileiro organiza-se da seguinte forma:
� hospital psiquiátrico público;
� clínica psiquiátrica privada (sua atividade está regida por contrato com o SUS);
� hospital universitário (mais de um terço dispõe de um serviço psiquiátrico geral. A
formação do psiquiatra brasileiro é realizada nessas instituições, onde domina o
paradigma biomédico, inclusive no ensino da psiquiatria);
� serviço público extra-hospitalar (ambulatório, hospital-dia,CAPS, residência
terapêutica...)
Hospital é Asilo?
Saindo do campo meramente descritivo, colocado acima, o que está em jogo, atualmente, é a
própria definição do hospital psiquiátrico. Seria saber se, apesar da lentidão da reforma psiquiátrica,
o hospital psiquiátrico superou o asilo. Ele é ainda asilar ou já se pode dizer que é uma estrutura
hospitalar? Talvez, o problema não possa ser colocado dessa maneira, principalmente diante de
posições que afirmam que o norte do sistema psiquiátrico é a tutela, o controle social e a exclusão
social do paciente. A contraposição entre hospital e asilo, assim, seria uma falsa questão,
simplesmente porque tais instituições envolvem a mesma modalidade de intervenção. O hospital
psiquiátrico seria, talvez, um asilo recauchutado. Mesmo que a tríade, baseada na tutela, no controle
social e na exclusão social do paciente, tenha mudado para outra, centrada na hospitalização, na
medicalização e na objetivação do paciente (Costa-Rosa, 2000), o hospital continuaria asilar. O velho
asilo, de fato, teria acabado, mas o paradigma (tutela, controle e exclusão), que sempre norteou a
intervenção psiquiátrica, continua a ser reproduzido pelo hospital. O asilo, como entidade
empiricamente detectável, desapareceu; porém, a estrutura asilar, como lógica que baliza a
intervenção psiquiátrica, continua determinando as atividades do hospital. A nova tríade
(hospitalização, medicalização e objetivação) seria, na realidade, uma nova forma de reprodução da
antiga. Em suma, em relação ao hospital psiquiátrico, há uma identificação entre lógica asilar e
lógica hospitalar.
Como dissemos acima, chamamos essa posição, que possui várias teorizações diferentes entre
si, de teoria crítica da psiquiatria. Contudo, em contraposição à teoria crítica, para o discurso
profissional da psiquiatria, o hospital psiquiátrico começou a superar, assim que inserido na reforma
psiquiátrica e com a mudança do estatuto jurídico do louco, o asilo e sua lógica institucional. O
hospital psiquiátrico tornou-se uma estrutura médico-hospitalar, uma organização especializada no
tratamento das doenças mentais. A determinação terapêutica aboliria ou subsumiria a tutela, o
controle e a exclusão. A terapêutica hospitalar, ao se livrar da tutela do paciente, logo, da função
repressiva do asilo, conseguiria escapar da lógica asilar.
Pelo visto, portanto, percebemos acima dois discursos antagônicos que re-configuram o
debate sobre a passagem do asilo ao hospital psiquiátrico. Para examinar melhor esse problema,
analisaremos primeiro o asilo e, depois, discutiremos tanto a pertinência de perceber o hospital
psiquiátrico como reprodutor da lógica asilar, como a de entendê-lo como uma organização médica
tout court.
Asilo e sua determinação última
Analisar o asilo é perfazer um caminho teórico que revele o núcleo causal da exclusão do
paciente psiquiátrico, a sua determinação última: a função repressiva institucional. Se o lado
dominante da estrutura asilar é a sua ação repressiva institucionalizada, conseqüentemente, para
realizar a repressão, é necessário, inclusive como forma de legitimá-la, de um conjunto articulado de
normas que realize uma determinada ordem, acoplada a uma disciplina e a uma hierarquia. Por isso,
a prática repressiva sempre está sobre-determinada por algum fundamento ideológico,
principalmente o reconhecimento social da necessidade de recluir o paciente. O efeito de legitimação
da reclusão, por sua vez, está ancorado e organizado por um tipo de tutela ― entendida aqui,
especificamente, como uma estratégia de poder. E, inserido no processo de legitimação da reclusão,
estaria o saber psiquiátrico que produz uma ação normativa legitimadora da internação de
determinados indivíduos, cujas manifestações não podem ser toleradas socialmente. Cada internação,
nessas condições de clausura, independentemente do fato de o psiquiatra, autor da ação tutelar, ser
contra a situação existente, reproduz à sua revelia o processo de enclausuramento. O asilo, nesse
enfoque, seria uma instituição que, na sua ação repressiva, articularia representações e práticas
(intervenções normativas); assim, a sua análise não ficaria reduzida a um estudo de um conjunto de
normas controladas por um sistema de valores, bem como não se resumiria a uma análise dos papéis
institucionais, isto é, de suas práticas. Nesse sentido, segundo sugestão de Madel Luz, deve-se, no
estudo das instituições, perceber
“o aspecto estrutural (conjunto de normas de conduta, de regras de organização dos
comportamentos) e o aspecto da prática institucional (conjunto de relações sociais
institucionais) como dois aspectos de um mesmo núcleo de poder, mediados por um discurso
institucional”(1986: 33).
As representações não se esgotariam, assim, nas normas (do asilo, por exemplo); elas seriam,
isto sim, "(...) o elo entre relações institucionais de poder e os regulamentos que asseguram a
continuidade da dominação institucionalizada" (1986: 33). Por isso, as representações suportariam
as normas. A necessidade de articular o campo repressivo ao das representações serve para se captar
a conexão de duas formas de institucionalização que estruturam o asilo. Na primeira forma, enquanto
espaço que organiza comportamentos individuais e sociais, portanto, enquanto mundo social, a
estrutura asilar demarca, reconhece e sanciona o que lhe é de direito, ou seja, em relação a tudo que
remete à sua competência ― o falso, o bem e o mal, o justo e o injusto. Na segunda forma de
institucionalização, o asilo estrutura-se em torno de relações sociais que ali ocorrem, e, por
conseguinte, as definições entre o certo e o errado são baseadas nessas relações socais; logo, deve
dotar-se de uma instância burocrático-administrativa para impor a soberania, isto é, deve existir um
aparelho repressivo não autônomo, justamente para adequar a ordem da estrutura asilar às relações
sociais (Guilhon Albuquerque, 1986).
No asilo, o reconhecimento como ordem não é assegurado pela parte fundamental de seus
membros: os pacientes. O reconhecimento vem do exterior. Mas, ao mesmo tempo, ele está
"separado" da sociedade e é um lugar de soberania, inclusive com todo o seu aparato cerimonial e
ritualístico. Na verdade, para existir como ordem soberana, o asilo precisa ser reconhecido pelos
sujeitos cuja soberania é, por sua vez, reconhecida por sua filiação à ordem; mas, no caso, isso não
ocorre porque o efeito de reconhecimento não é produzido pelos pacientes. Portanto, é necessário um
aparato repressivo, inscrito na organização terapêutico-administrativo do asilo, para regular e
controlar a coletividade dos pacientes.
Porém, como garantir o "cimento" dessa repressão institucionalizada?
Segundo Guilhon de Albuquerque, baseado nos estudos de Goffman, a reprodução ideológica
da ação repressiva passa pela constituição da imagem cindida do Outro (1986: 142). Assim, a auto-
imagem que o paciente tem de si mesmo é fragmentada feito um espelho que cai no chão e se
estilhaça. Qualquer unificação dessa imagem, num ou noutro sentido, revolveria irreversivelmente a
dominação institucional. Mas esse tipo de efeito ideológico não é original do asilo e das chamadas
"instituições totais" (Goffman, 1974) — na realidade, a originalidade do asilo e seus congêneres não
é a ocultação da fragmentação da imagem, e sim justamente a transparência e a legitimação dessa
clivagem. Dessa forma, o paciente é submetido a uma despersonalização que nunca retira, entretanto,
a sua capacidade de sujeito — é necessário que ele
“seja absolutamente Outro para que possa submetê-lo a certas práticas e esquivar-se às suas
demandas, mas é preciso que ele seja o mesmo para que se possa até conceber certas
exigências a que deve curvar-se, e ao mesmo tempo justificá-las e esperar que tais exigências
sejam satisfeitas” (Guilhon Albuquerque, 1986: 142)
O asilo, então, possui o seu ponto nodal na repressão institucionalizada, sobredeterminada por
uma pratica ideológica que legitima a reclusão dos pacientes psiquiátricos ― seja no asilo (imagem
cindida), seja socialmente ― através do poder de um saber psiquiátrico sancionado por um mandato
social. Contudo, a ênfase no aspecto repressivo do asilo induz a análise, de certa forma, a esquecer
de que ele é uma organização terapêutica. Talvez, um dos maiores paradoxos do asilo psiquiátrico
seja a combinação de uma "instituição totalitária" com uma organização terapêutica. O asilo, de fato,
surgiu primeiramente como uma instituição de reclusão e de repressão e, depois, foi apropriado pelo
saber psiquiátrico como um espaço terapêutico, por excelência, da psiquiatria. Combinar repressão
com terapia seria uma forma institucional de se tratar uma rejeição social ― os loucos ―
considerada como uma patologia mental, passível de ser, portanto, apropriada pelo discurso médico.
Mas, como uma concepção de terapia pode ser acoplada à repressão, sem que não ocorra uma
evidente contradição? Ora, muitas terapias modernas e antigas conjugaram esse duo. O tratamento
moral, por exemplo, seria um exemplo no qual repressão e pretensão terapêutica andaram juntas. Se
a "loucura" é um desvio moral, seu tratamento passa necessariamente pelo enquadramento moral do
comportamento desviante do "louco" — enquadramento este impossível de não ser repressivo. Se a
"loucura" passa a ser vista, porém, como uma patologia, seu tratamento passa necessariamente por
um enquadramento médico do comportamento doente do "louco".
O asilo psiquiátrico permite olhar o paciente como uma objetividade natural ― uma doença
orgânica ― e, assim, evita o contato comunicativo com o paciente; evita tomar consciência de que,
apesar da doença, ele é um sujeito comunicativo. A neutralidade do psiquiatra, causada pela
naturalização do paciente, evita seu envolvimento com o intenso sofrimento psíquico do paciente,
seja pela sua doença, seja pela sua reclusão numa instituição asilar. A função da naturalização seria
silenciadora, estabilizando a instabilidade estrutural da relação psiquiatra – paciente, mas
estabilizando em detrimento do segundo. Qualquer outra visão de “doença mental” que considere o
doente como um sujeito pode implodir em mil pedaços a relação psiquiatra-paciente e a lógica que a
sustenta: o asilo.
Hospital e asilo
Olhando criticamente a posição acima, não acreditamos que se possa negar a validade de tal
análise sobre o asilo. O problema, talvez, seja torná-la um modelo geral de exame das instituições,
em particular das psiquiátricas, independentemente do período histórico. Novamente, estamos diante
da pergunta: o hospital psiquiátrico reproduz a lógica asilar? A resposta, caso se aceite as premissas
dessa análise institucional, é francamente positiva. Pois a psiquiatria combina necessariamente, no
seu modo de intervenção, uma medicina mental a uma forma de exclusão. Seria ilusão pensar que a
hospitalização do asilo tenha gerado uma exclusividade da prática terapêutica, pois se faz o que
sempre se fez na psiquiatria: o controle social do comportamento desviante ― a ação terapêutica está
inscrita nessa lógica de controle. Lógica de poder, portanto, que se realiza desde que o psiquiatra
aciona o fundamento do seu mandato social: o seu saber.
Todavia, tal posição vai totalmente de encontro à percepção médica - profissional (Ogien,
1989) do hospital psiquiátrico: a hospitalização do asilo significa sua normalização institucional no
sentido da prática médica. O modelo aqui, para se analisar o hospital psiquiátrico, é o do discurso
oficial da medicina: a estrutura hospitalar psiquiátrica reproduz o modelo médico: diagnóstico /
hospitalização / tratamento / remissão ― modelo claramente baseado na atividade terapêutica. Ora,
esse modelo é justamente o oposto daquele construído pela teoria crítica da psiquiatria -- assim, o
diagnóstico vira designação (etiquetagem); a hospitalização, internamento ou reclusão; tratamento,
repressão; remissão, ressocialização. Inclusive, no modelo profissional, a hospitalização psiquiátrica
seria uma típica hospitalização médica: a) faz-se o possível para evitá-la, logo, para implementá-la,
somente quando necessário; b) recusa-se seu prolongamento; c) impede-se sua cronicidade ― em
suma, a hospitalização é um programa de normalização. Assim sendo, a hospitalização do asilo
significa sua desalienação ― a transformação do alienado em paciente psiquiátrico ― e sua
desinstitucionalização ― transformação do asilo num hospital. Tudo isso resume um modelo de
prática profissional ― um tipo-ideal. As disfunções e as distâncias que a realidade efetiva
apresentará em relação ao modelo serão entendidas como erros práticos e não questionarão a
veracidade das normas profissionais. Dessa forma, a permanência da lógica asilar é vista como uma
disfunção da lógica hospitalar, logo, passível de correção, sem a necessidade de se questionar ou
superar o modelo hospitalar.
Curiosamente, do ponto de vista analítico, estamos diante de duas visões (a teoria crítica e o
discurso profissional) que têm a mesma démarche: a prática realiza o modelo teórico que, por sua
vez, idealiza a sua própria realização. O modelo profissional diz que a atividade psiquiátrica aplica
diretamente as normas, as regras e as condutas da medicina. Em relação ao antigo asilo, o progresso
médico induziu modificações no modo de intervenção e na organização institucional, transformando-
o numa instituição que realiza o modelo médico. A teoria crítica, além de colocar que o discurso
profissional é ideológico e, portanto, oculta o que se passa, de fato, na realidade, afirma que a
atividade psiquiátrica realiza, no fundo, um mandato de controle social. A prática não seria, no caso
das duas posições, a soma das atividades manifestadas na intervenção psiquiátrica, e sim a realização
de um modelo. Nos dois casos, o saber psiquiátrico teria um papel central: no modelo profissional, a
efetuação da conduta profissional, adequada ao ambiente hospitalar, é guiada pelo saber profissional
que fixa referenciais claros: diagnóstico, prognóstico, nosografia, medicação...; na teoria crítica, o
mandato social é assumido somente através do domínio de um saber legitimado socialmente. É a
utilização do saber que confirma as duas posições e que permite pensar a prática. Contudo, ela é
pensada de forma negativa, pois a verdade da atividade psiquiátrica encontra-se além do seu âmbito,
em outro lugar que não ela mesma, ou no modelo profissional ou no mandato social (Ogien, 1989:
13).
Crítica da teoria crítica
Chegando nesse ponto da discussão, achamos mais interessante focarmos, inicialmente, a
análise na teoria crítica da psiquiatria -- por dois motivos: primeiro, a própria teoria crítica
desconstrói o discurso profissional de forma pertinente4; segundo, é bem mais difícil desconstruí-la
do que o discurso profissional, uma posição normativa por excelência, já que a teoria crítica é
calcada em modelos acadêmicos e científicos de teorização. De certo modo, o modelo profissional é
explícito e transparente, até mesmo porque serve também na orientação das condutas; a teoria crítica
é mais sinuosa, envolvendo argumentos bem mais complexos.
Para a teoria crítica, a razão da psiquiatria não estaria nela mesma, e sim situada em outro
lugar, apresentando uma função latente, ocultada pela sua função manifesta. E qual seria essa função
latente? Dependendo do autor, a verdadeira função da psiquiatria pode ser expressa, entre outros
exemplos, por vários procedimentos: exclusão social do louco (Foucault), tutela do desviante
(Castel), socialização do doente mental (Gauchet e Swain)... Nesse tipo de análise, o essencial não
são os agentes e sim a instituição, pois a determinação desta prescinde da ação e da consciência
daqueles. A abordagem, assim, terá como objetivo revelar, por trás da legitimidade social da
4 Ver, assim, Foucault (1978; 1984; 1987), Castel (1976; 1983), Swain (1994), Szasz (1979), Machado
(1978), Costa (1976; 1979), Basaglia (1985), Cooper (1971), Laing (1971), entre outros...
psiquiatria e de seu saber, sua verdadeira essência, geralmente entendida sob um único aspecto: a
instituição psiquiátrica é um aparelho de poder.
Por isso, metodologicamente, tais análises centraram seu foco nos discursos oficiais, vistos
como de poder, de determinados agentes, sobretudo psiquiatras e legisladores. Procura-se através dos
discursos uma função social realizada pela instituição. O mecanismo é conhecido e,
independentemente das diferenças entre os autores, a procura é praticamente a mesma: busca-se o
momento originário e fundador de onde surgiu a função institucional e se demonstra que, além de
uma simples função, o que despontou foi uma lógica imanente ao processo de constituição da
instituição – uma razão objetiva que a vem acompanhando, feito um grude, por toda a sua história. O
processo é marcado pela lógica... para sempre. Portanto, se na origem da instituição a função
primordial era a exclusão dos loucos ou a tutela do desviante ou o poder de um saber, a lógica
revelada permanecerá determinando a função institucional ad eternum.
O exemplo mais explícito dessa abordagem é o método genealógico que não escapa de uma
ilusão retrospectiva ao dotar a psiquiatria de uma razão objetiva, cuja imanência sempre é a mesma
(exclusão dos loucos, controle social do desviante, aparelho de poder...), embora sua manifestação
concreta mude no decorrer da história. Dá-se um peso fenomenal aos discursos oficiais, produzindo
uma causalidade direta entre os discursos e suas representações públicas e a atividade prática que
acontece no cotidiano da psiquiatria. O discurso oficial torna-se a realidade. Como afirma Coelho
(1999: 66), ao criticar Roberto Machado (1978), um foucaultiano inconteste, e suas interpretações
sobre a medicina e a psiquiatria no Brasil:
... é suficiente que um grupo enuncie com estridência um determinado projeto de
poder para que o poder se faça tão real a ponto de dispensar o pesquisador de
qualquer posterior averiguação. É o que chamo de Efeito Foucault
Não exageremos, entretanto. É importante analisar os diversos projetos de poder, inclusive os
embutidos nos discursos oficiais. Na verdade, nossa crítica não passa apenas pelo "efeito Foucault",
mas também pela tese, implícita na teoria crítica, de que a gênese esgota o processo ― a postulação
de uma lógica ou de uma razão objetiva que permanece determinante até os confins da história.
Produzir essa relação necessária entre poder, saber e instituição possui, como pano de fundo,
algumas premissas ou, na verdade, algumas desconfianças profundas. Toda intervenção prática sobre
o outro é, por definição, uma relação de poder. Assim, toda forma de reabilitação social, moral ou
física institui por definição uma relação de poder em que o profissional impõe ao seu cliente uma
condição de inferioridade. As chamadas práticas de controle social (psiquiatria, assistência social,
justiça, polícia, medicina, educação) sempre são vistas do ponto de vista de relações de dominação.
Em conseqüência, temos sempre a reprodução dessa eterna tipologia: paciente, delinqüente e
assistido. A tutela é a conclusão lógica dos processos de controle social. É o efeito mecânico da
manifestação antecipada do controle social ― efeito mecânico da razão objetiva, manifestada por
vários modos: mandato social, relações de dominação, saber profissional, poder legítimo.
Por isso, toda intervenção prática sobre o outro implica um saber que possui uma relação
necessária com o poder. Há um trio nefasto na psiquiatria: saber - (poder) - intervenção. Por isso, as
críticas à psiquiatria e ao seu saber são críticas ao poder do psiquiatra. É também crítica institucional,
pois a instituição possibilita e viabiliza a intervenção prática sobre o outro. Com efeito,
"todos os grandes abalos que sacudiram a Psiquiatria desde o fim do século XIX,
essencialmente colocaram em questão o poder do médico. Seu poder e o efeito que produzia
sobre o doente, mais ainda que seu saber e a verdade daquilo que dizia sobre a doença"
(Foucault, 1979: 123).
É esse poder e o posicionamento perante ele que discriminam as diversas teorizações
existentes sobre a instituição psiquiátrica. Assim,
“(...) o que foi questionado é a maneira pela qual o poder médico estava implicado na
verdade daquilo que dizia, e inversamente, a maneira pela qual a verdade podia ser
fabricada e comprometida pelo seu poder” (1979: 124).
Dessa forma, pode-se dizer que existem várias antipsiquiatrias atravessando a história da
psiquiatria moderna. Temos um Szasz (1979), que transforma o psiquiatra num verdadeiro agente
manipulador, afirmando a “doença mental” como um mito da modernidade. Ou David Cooper (1971)
e Ronald Laing (1971) que, além de denunciarem o asilo como um absurdo terapêutico, centraram as
suas análises no questionamento da sociedade e da família, vistas como lugar da gênese da loucura
― a doença, para Laing, seria uma "viagem" introspectiva para escapar da ação alienante da
sociedade. Por fim, desembocamos em Basaglia (1985) que, do nosso ponto de vista, não seria
exatamente um "antipsiquiatra", como os citados acima, justamente por não negar a existência de
“doenças mentais”. A crítica basagliana centrou-se num questionamento político-institucional da
psiquiatria, mostrando as vinculações necessárias entre saber, poder e instituição. De qualquer forma,
podemos perceber novamente o elemento comum de que nos falou Foucault em relação à
antipsiquiatria, e que Cooper e Laing ressaltaram: "a violência está no cerne do nosso problema"
(Laing & Cooper, 1976).
Como se pode notar, a antipsiquiatria é a versão radical da teoria crítica da psiquiatria. É
contundente e produz um impasse: não há possibilidade de se construir qualquer alternativa
institucional ao tratamento das “doenças mentais”. A hospitalização do asilo, por exemplo, é vista
apenas como a fundação de uma nova forma asilar de reclusão do paciente. Nega-se a “doença
mental” e se repudia qualquer tipo de estabelecimento de normas, percebido como imposição de um
poder despótico sobre a pessoa. Há, com efeito, uma coerência nesse niilismo: se não existe “doença
mental”, pode-se descartar logicamente a necessidade de instituições terapêuticas, pois enquadrar,
mesmo terapeuticamente, algo que não está no campo da patologia é uma intervenção totalitária.
Igualmente, a partir do momento em que se relaciona toda norma a um poder, tomando este último
como alienado em si mesmo, pode-se logicamente afirmar que toda instituição envolve intervenções
"normativas" — logo, produzindo e reproduzindo estratégias de poder. Assim, pode-se dizer que
todo processo de institucionalização é alienado. Sendo uma instituição — portanto, envolvendo
normas e poderes —, o hospital psiquiátrico seria tão alienado quanto o asilo. Inclusive, seguindo a
lógica dessa proposição, as instituições extra-hospitalares, por envolverem normas e poderes,
reproduziriam, no fundo, a lógica asilar de tutela do louco.
Aparentemente, a última proposição é também patrimônio dos basaglianos ― no mínimo, são
ambíguos quanto ao tema. Agostino Pirela (IN: Basaglia, 1985: 181), por exemplo, chega a afirmar,
em relação ao asilo, que é necessária "a negação global da instituição", mas escreve, ao mesmo
tempo, que "a negação não pode tornar-se uma norma". Ora, negar uma instituição sem que se
constitua outra (do asilo ao hospital, por exemplo), já que se quer negar também toda norma, implica
ou negar toda e qualquer forma de organização, pois todas possuem normas, ou implica, como
defendem os basaglianos, um processo ininterrupto de mudanças institucionais num eterno
movimento de auto-negação. A primeira opção seria paralisante e completamente niilista, e a
segunda, digamos assim, asfixiante por falta absoluta de fôlego. No fundo, as duas implicações
envolvem o mesmo postulado ― a primeira de forma direta e a segunda de modo velado: existe uma
alienação imanente a qualquer processo de objetivação institucional. Em suma, infere-se dessas
posições ou que toda objetivação institucional é alienada por definição ou, de forma mais sutil, que
as objetivações em geral no capitalismo são alienadas; logo, a alienação é histórica ― entre um
imanentismo ontológico e um histórico, a diferença política é apenas de grau. No primeiro caso, o
essencialismo é tão óbvio que pode ser descartado rapidamente; no segundo caso, o termo "histórico"
elimina o erro de identificar toda objetivação institucional como alienada por natureza. Mas, se o
processo institucional, no capitalismo, é alienado em si, mesmo que o capitalismo seja uma etapa
histórica de desenvolvimento da humanidade e, portanto, por ser histórico, passível de ser superado,
o resultado político dessa visão seria o niilismo completo contra qualquer instituição "burguesa", isto
é, qualquer alternativa institucional ao asilo, por exemplo, inclusive a assistência extra-hospitalar,
está fadada ao fracasso ou, pelo menos, adiada para o futuro.
O imanentismo absoluto de Laing gerou o fracasso da experiência em Kingsley Hall
(instituição onde trabalhava). Já a experiência basagliana teve resultados bem mais complexos e
interessantes. Primeiro, porque os basaglianos nunca negaram a “doença mental” como tal; segundo,
eles têm razão em criticar a redução da desinstitucionalização a apenas uma desospitalização. Pois
assim
"os hospitais psiquiátricos permanecem como centro e paradigma; a criação de
novos serviços psiquiátricos na comunidade, de estruturas extra-hospitalares,
médicas e sociais, não se constituem como alternativa eficaz à internação"
(Nicácio, 1989: 97)
Na verdade, a desospitalização não interrompe a lógica asilar, isto é, não interrompe o
processo de reificação do doente na internação. Manter, mesmo sob o tratamento psiquiátrico, a
cidadania e a autonomia do doente liquida o cerne da lógica asilar: o internamento. Embora
concordemos com esta última questão, não achamos, porém, que isso signifique uma
"desinstitucionalização", mas sim a institucionalização de uma organização terapêutica que não
implica internamento. Inclusive, a transformação do asilo em hospital psiquiátrico condiciona a
transformação do internamento em hospitalização. Uma rede de serviços, incluindo hospital e
estruturas extra-hospitalares, já implica um desmantelamento de uma estrutura de internação
compulsória. O internamento psiquiátrico — reclusão de um paciente numa estrutura asilar —
precisa ser diferenciado da hospitalização psiquiátrica — tratamento médico de um paciente numa
estrutura hospitalar. O primeiro procedimento exclui e tutela o paciente, ignorando seus direitos de
cidadania; o segundo implementa um tratamento, resguardando seus direitos enquanto cidadão.
Logo, a passagem de um modo ao outro é também política. O problema da palavra de ordem de
"desinstitucionalização" é atropelar os avanços da hospitalização em relação à situação asilar e não
perceber que combater o hospitalocentrismo é diferente politicamente da luta contra a estrutura
manicomial.
Talvez, esse ranço contra os processos de institucionalização dos autores, acima citado, seja
produto de sua conceituação de poder. De forma geral, ele é visto de um modo anistórico e imanente.
O que existe, assim, é um "senhor-poder" anterior à própria história e alienado por natureza — sua
alienação é imanente à sua própria ontologia. Por isso, provavelmente, o poder seja praticamente
identificado à violência e, como as regras e as normas são por ele garantidas, podemos chegar à
conclusão de que a violência funda e condiciona a ordem sócio-cultural. Tais posições, no fundo,
parecem ser uma espécie de atualização do jusnaturalismo, aplicado às instituições no capitalismo. A
alienação que é denunciada em toda instituição no capitalismo é a alienação do poder, ou seja, é a
imposição de uma violência que retira do sujeito sua autonomia e soberania. A alienação das
instituições é a alienação do poder enquanto violência institucional. O poder funda, na realidade, a
alienação da instituição.
Já em Foucault (1979), o poder não é imanente e sim relacional. Contudo, para o filósofo
francês,
"a relação de poder não tem outro fundamento que não ela mesma, tornando-se simples
'situação' na qual o poder é sempre imanente e a questão qual poder e para que lhe é
absolutamente perfunctória" (Poulantzas, 1985: 170)
No entanto, não podemos de maneira simples identificar o conceito foucaultiano de poder ao
de violência. Na verdade, Foucault critica uma visão negativa de poder que o identifica à repressão e
à violência; portanto, tal conceito não possui apenas um lado negativo, mas também um positivo,
transformador e produtor do real. O poder interpelaria o indivíduo como sujeito, para usar uma
linguagem althusseriana (Althusser, 2001). Mas não devemos iludir-nos com isso, já que o poder
continua "negativo", pois ainda alienado. Ele é uma correlação de forças, em Foucault,
completamente pífia, porque as resistências só existem como afirmação de princípio. Assim, como
escreveu Poulantzas (1985: 172) sobre a visão foucaultiana de poder:
"(...) esse termo designa ora uma relação, a relação de poder, ora, e muitas vezes
simultaneamente, um dos pólos da relação poder-resistências. É que, na ausência de
fundamento das resistências, o poder acaba por tornar-se essencializado e absolutizado,
transformando-se num pólo "frente" às resistências, uma substância que contamina-as por
propagação, um pólo principal e determinante frente às resistências".
Em suma, o poder, em Foucault, é positivo em relação à negatividade da repressão, mas
negativo porquanto produtor de sujeição. Mas não negamos a pertinência da conceituação
foucaultiana, mas sim o seu alcance. Para muitas situações, provavelmente, será necessário — nos
estudos sobre a relação poder e democracia, por exemplo — distinguir conceitualmente poder de
violência, bem como poder de alienação. Nesse sentido, Hannah Arendt faz tais distinções e tem um
conceito realmente positivo de poder, isto é, segundo sua definição, o poder:
"corresponde à capacidade humana não somente de agir, mas de agir de comum acordo. O
poder nunca é propriedade de um indivíduo , pertence a um grupo e existe somente enquanto
o grupo se conserva unido. Quando dizemos que alguém está no poder, queremos dizer que
está autorizado por um certo número de pessoas a atuar em nome delas. No momento em que
o grupo, do qual se originou a princípio o poder (potestas in populo; sem o povo ou o grupo
não há poder), desaparece, 'seu' poder some também” (H. Arendt, 2001, 123).
Não desconhecemos a fragilidade dessa conceituação; na verdade, queremos ressaltar a
importância e a possibilidade de distinguir poder e violência, bem como poder e alienação. Assim,
concordamos com Basaglia quando afirma que o asilo é uma "instituição da violência" (Basaglia,
1985, 99) ― apesar de entendermos a violência como uma violação intencional das regras e normas
das pessoas (Heller & Ferenc, 1985). Mas não concordamos com a ampliação do conceito para
praticamente todas as instituições da sociedade, bem como com o caráter a priori do poder como
negativo e produtor inevitável de sujeição.
Na verdade, como pano de fundo dessa discussão sobre o poder psiquiátrico, logo, nesse caso,
sobre o saber psiquiátrico, ocorre o que chamaríamos de uma crítica total da razão, diferente "de uma
autocrítica da razão e também de "uma crítica da forma de racionalidade científica dominante na
idade moderna ― na modernidade ― européia (Karl-Otto Apel, 1989, 67). A crítica ao saber
psiquiátrico, no fundo, seria o bode expiatório da crítica total à razão.
A crítica total da razão ignora a necessidade de sentido e validade e, conseqüentemente, de
"pressupor e tomar como exigência a razão intersubjetivamente prescritiva (1989, 68). Mas isso é
impossível, se tomamos como ponto de partida a premissa nietzschiana pela qual a vontade de
verdade é vontade de poder. Nesse caso,
"o argumentar (...) não passa de uma prática retórica de auto-afirmação por meio do
exercício da violência. Formação de consenso através do discurso argumentativo não seria,
com isso, nada mais que a sujeição da espontaneidade e autonomia individuais à exigência
de poder um sistema social e, nessa medida, algo como alienação de si” (1989, 68).
De todo modo, a "crítica total da razão" de Foucault tem como objetivo a destruição do
Homem, este ser imaginário construído a partir do Iluminismo e detentor de uma razão onipotente
que a tudo subsume na sua explicação. Concordamos com Foucault que o Homem, enquanto
entidade abstrata, meio e fim de todas as coisas, assim como outra figura metafísica, Deus, estão
mortos. Talvez Deus exista até na Crença, mas não mais na Razão. O Homem ainda insiste em ter a
sua existência na racionalidade, mas completamente estilhaçado. O problema é que Foucault, ao
jogar o Homem pela janela da História, jogou também a autonomia do sujeito. Perdendo o Absoluto,
ficamos à mercê de forças incontroláveis que nos fazem de marionetes. Certamente, Foucault tem
razão em dizer que o Homem está sendo substituído pelas coisas, mas são coisas "nas quais nos
podemos reconhecer visto como elas nos podem falar" (Henri Atlan, 1978, 15.)
Segundo Henri Atlan,
"em lugar de um Homem que se julga a origem absoluta do discurso e da ação sobre as
coisas, estando na verdade nelas isolado e sendo levado inevitavelmente a um universo
esquizofrênico, são algumas coisas que falam e agem em nós, por nosso intermédio, assim
como por intermédio de outros sistemas, embora de maneira diferente e talvez mais
aperfeiçoada. Graças a isto, se não nos deixarmos sufocar por elas, isto é, se nosso querer
― faculdade inconsciente de auto-organização sob o efeito das coisas do ambiente ―
chegar a se inscrever suficientemente na memória, de tal forma que dele tenhamos um grau
suficiente de consciência, e se esta, em compensação, puder interagir com os processos de
auto-organização sem que haja conflito entre essas duas formas de interação, olhando a
nosso redor, poderemos então nos sentir em casa, pois as coisas também nos falam" (1978,
15).
Por fim, há uma crítica, em algumas passagens da "antipsiquiatria" (Laing, 1971; Cooper,
1976), da relação entre o saber e o poder no capitalismo, como se esta fosse eterna e absoluta, e
tivesse sempre existido, isto é, critica-se uma particularidade histórica pensando-se que é universal.
Certo, pode-se concordar com a afirmação de que o saber sempre sofreu uma interpelação político-
ideológica do poder, não existindo, portanto, um saber, qualquer que seja, desvinculado do poder.
Sim, tal asserção acarretou uma profícua desconstrução de uma visão inocente do saber, visto como
desvinculado das estratégias de dominação. Mas o problema, nessa posição, é que, se o poder é por
definição violento ou alienado, o saber, por sempre ter existido umbilicalmente conectado ao poder,
é visto da mesma forma que o seu par: violento e alienado. Em determinadas situações empíricas,
isso lá tem a sua lógica, mas a questão é se isso possui uma aplicação universal, em todas as
situações. O saber ― em Foucault e na maioria dos "antipsiquiatras" ― já é em si uma estratégia de
poder. É uma estratégia de dominação, por definição. Desse modo, o saber psiquiátrico, como
estratégia de poder, produziu o famigerado asilo; nesse sentido, faz parte dessa estratégia de
dominação universal, personificado pela Razão Ocidental ou Iluminista — o saber psiquiátrico seria
um filho dileto desse Grande Poder.
Sendo o saber psiquiátrico uma forma de poder, seu objeto, a “doença mental”, é um produto
de uma estratégia de dominação. A transformação da loucura em “doença mental” foi o resultado
dessa estratégia. Em outras palavras, a “doença mental” não teria relação alguma com determinações
patológicas, sejam biológicas ou psíquicas — a “doença mental” não teria uma objetividade que
perpassaria a história com conteúdos culturais diferentes, isto é, não teria uma forma patológica
invariante. Cada sociedade teria a doença que merece: sociedade x, logo, doença y. Ou seja, o
conceito de “doença mental” ficaria esfumaçado pelo relativismo e sem efeito, pois seria, digamos
assim, um "produto cultural". Em suma, Foucault destrói todo e qualquer alicerce do saber
psiquiátrico, principalmente aquele que possui um alicerce na clínica médica. Por um lado, esvazia o
conceito de “doença mental”; por outro, afirma o saber psiquiátrico como estratégia de poder
(produtor positivo de sujeição), colocando em xeque toda a possibilidade de organização terapêutica
que envolva uma clínica psiquiátrica.
Por isso, muitas vezes, os representantes mais radicais da teoria crítica têm uma dificuldade
em compreender a cronicidade, já que esta é entendida como resultado exclusivo da
institucionalização. Não reconhecem que o paciente psiquiátrico sofre de uma dupla alienação
(Goffman, 1974): aquela causada pela doença e aquela instituída pela situação social e/ou pela
reclusão num asilo ou num hospital psiquiátrico. Tal situação torna-se um problema quando somos
defrontados com regiões onde a Reforma Psiquiátrica avançou a tal ponto que eliminou a lógica
hospitalar da assistência psiquiátrica – ora, mesmo com uma rede de organizações extra-hospitalares,
logo, sem hegemonia hospitalocentrista, persiste a cronicidade! Não é mais o crônico dos asilos ou
dos internamentos hospitalares, e sim outra geração de crônicos (muitos, inclusive, jamais foram
internados num hospital), isto é, o crônico da rede horizontal de assistência, da emergência, do
consultório, do hospital-dia, do centro de acolhimento (Desviat, 1999)... Uma nova cronicidade,
enfim, que retira do asilo e do hospital o monopólio de sua produção. O que significa tal
cronicidade? Uma reafirmação das postulações mais radicais da teoria crítica de que todo processo
de institucionalização institui a cronificação ou o reconhecimento de que a cronicidade está aquém e
além da interpelação institucional, necessitando de ações institucionais paliativas como a reabilitação
do paciente psiquiátrico cronificado?
Não causa surpresa, assim, que tais análises, do ponto de vista empírico, perdem de vista as
transformações institucionais ocorridas concretamente, uma vez que são sempre vistas como
manifestação de uma estrutura latente de dominação. Dessa forma, por exemplo, algumas
transformações que vêm ocorrendo na psiquiatria foram menosprezadas, embora sejam mencionadas
pela teoria crítica, pois seriam uma reprodução, sob outras bases, da lógica asilar (Ogien, 1989: 21-
24):
• a diferenciação da clientela fora e dentro do hospital. A população psiquiátrica diversificou-se
de maneira extraordinária a partir da década de 50. Houve, e continua acontecendo, uma
explosão de novas enfermidades mentais e, conseqüentemente, novos tratamentos e acessos
diferentes às terapias, novos tipos de intervenção, novos papéis sociais assumidos pelos
pacientes. Tal diferenciação é conseqüência de novos controles sociais? São produtos
patológicos da vida pós-moderna?
• a diversidade profissional no campo profissional. O campo profissional da saúde mental
tornou-se campo, isto é, possui lógicas de ação relativamente autônoma que lhe permitiram,
inclusive, um consistente reconhecimento social como organização especializada de
intervenção. Um dos resultados mais óbvios é a proliferação e a necessidade de novas
especializações e, conseqüentemente, de novos profissionais na cada vez mais desenvolvida
divisão de trabalho da saúde mental. Colocar tudo isso no vale comum do controle social não
é negar a importância dessas novas formas sociais de intervenção e desses novos atores
sociais que as reproduzem? Será que internar perturbadores da ordem estabelecida precisaria
de toda essa estrutura material, de todo esse aparato profissional e de toda essa produção
simbólica, em suma, de toda essa maciça ilusão de que tudo isso é apenas atividade
terapêutica e qualificação profissional em saúde mental?
• heterogeneidade das intervenções de controle e de re-inserção social: medicina, psiquiatria,
profissionais da saúde mental, polícia, justiça, assistência social e instituições... Será que é
possível que ocorra uma coincidência entre as regras e as normas postuladas pelos agentes
formadores de políticas públicas e o que realmente acontece na atividade psiquiátrica? Não
seria ingenuidade pensar que a gestão do dispositivo de controle da loucura acontece sem
múltiplos conflitos de competência entre os diversos agentes sociais envolvidos? Não seria
mais interessante reconhecer as diversas lógicas de ação que perpassam a prática
psiquiátrica? Os diversos registros acionados pelos diversos atores envolvidos? Registros ad
hoc, in loco, espontâneos e formais, proveniente do senso comum ou do saber especializado?
• boa parte da população utiliza o serviço psiquiátrico como um serviço público e não como um
aparato de repressão. Como isso acontece, já que o campo psiquiátrico é um espaço de
reclusão, um aparelho de poder, um aparato de controle social ou uma estrutura de
acolhimento dos renegados sociais? Que tipo de ilusão espetacular faz com que milhares de
pessoas utilizem a psiquiatria sem se dar conta que estão sendo alienadas? Qual é o
mecanismo ideológico que produz tudo isso? O que vemos são diversas interpretações a
respeito da psiquiatria que vão desde a percepção de que é um controle social até sua
consideração como lugar da clínica psiquiátrica ou uma instância de cuidados especializados.
Talvez seja interessante tomar essa polissemia como ponto de partida e estudá-la
concretamente, isto é, produzir uma análise concreta da situação concreta, examinado os
diversos interesses, os diversos atores sociais envolvidos, os vários registros cognitivos que
guiam a ação ― em suma, tomar como ponto de partida a própria prática psiquiátrica.
Tais transformações acima questionam ou, pelo menos, diminuem o peso analítico da
psiquiatria vista como aparato de repressão. Além do mais, houve mais uma mudança importante,
justamente na representação pública da psiquiatria5, embora a reforma psiquiátrica seja lenta e não
tenha trazido as transformações esperadas. Existe atualmente, de forma difusa, uma representação da
curabilidade da “doença mental”, bem como uma "desestigmatização" ou, no mínimo, uma
diminuição da carga de preconceitos contra o paciente psiquiátrico. Como afirma Ogien,
“da mesma maneira que seria raro, atualmente, alguém ter preconceito contra aquele que
consulta um médico ou freqüenta um hospital, pode-se estimar que, cada vez mais, o
atendimento psiquiátrico é um procedimento usual, ao ponto de se poder questionar se ele
causa realmente um transtorno na identidade social do paciente” (1989: 21)
Acreditamos que a mudança na representação pública da psiquiatria tenha sido um dos
resultados da (possível) eliminação da carreira moral do paciente psiquiátrico (Goffman, 1974). O
resultado da carreira moral é a cronicidade do paciente. Ocorre uma degradação do status e uma
5 Pode-se dizer que, em países como a França e a Itália, houve de fato uma transformação qualitativa na
representação pública da psiquiatria.
mudança de identidade e de destino. Há uma transformação na linha biográfica do interno. Isso tudo
ocorre porque o paciente não assume o papel de doente, prescindindo dos recursos sociais à
disposição. A subversão do paciente possui um preço altíssimo: a despersonalização na máquina de
moer almas do asilo. Contudo, com a banalização do tratamento psiquiátrico, o acesso à terapia, a
criação de instituições extra-hospitalares, a duração limitada da hospitalização, enfim, com todas
essas mudanças, o paciente psiquiátrico não precisa mais ser identificado com o recluso do asilo. E
tal transformação pode ser creditada aos efeitos conjuntos da reforma institucional (hospitalização do
asilo + instituições extra-hospitalares) da psiquiatria e do uso dos psicotrópicos no tratamento da
“doença mental” (Ogien, 1989). O paciente pôde deixar de ocupar a linha biográfica, renunciando a
uma carreira moral, e se transformar num... cliente ou usuário.
O uso dos neurolépticos engendrou um processo de diferenciação na clientela psiquiátrica,
produzindo internamentos intermitentes e levando boa parte dos pacientes, devido a uma
compensação clínica, a se servirem do aparelho extra-hospitalar. Atualmente, em muitos países, boa
parte dos pacientes utiliza o serviço psiquiátrico voluntariamente no papel de doentes, isto é, num
papel reconhecido e sancionado socialmente, como qualquer outro serviço de saúde pública ou
privada6. Tal ação terapêutica aliada a uma normalização e a uma otimização do internamento
hospitalar, patrocinada a duras penas pela reforma, contribuiu para desestigmatizar a intervenção
psiquiátrica. Assim, os estados psicóticos cronificados estão deixando de povoar os hospitais
psiquiátricos e um bom número de pacientes reencontrou o meio social, embora muitos sejam
dependentes de uma assistência extra-hospitalar e sofram de uma socialização precária. Talvez, a
dependência dos serviços extra-hospitalares e da ajuda social seja a grande contrapartida da reforma
psiquiátrica. Uma "clínica socializada" socializa também suas dificuldades: a difícil reinserção social
dos pacientes psiquiátricos, principalmente nos países em desenvolvimento. O doente mental, ao sair
da hospitalização, encontra-se diante de um caminho bifurcado: de um lado, a reintegração social,
fundamentalmente profissional7; de outro, o risco de perseverar num estado de invalidez
permanente8. Ao mesmo tempo, se a reclusão no asilo era e ainda é, em vários casos, uma forma de
exclusão social, o paciente psiquiátrico, mesmo escapando de uma hospitalização de longa duração,
6 Evidentemente, ainda existe o internamento psiquiátrico que se caracteriza como uma carreira moral, no
sentido de Goffman, isto é, como um ato de exclusão e isolamento social. 7 As formas variam: o indivíduo pode permanecer ou não usando uma medicação e se submetendo a
consultas de avaliação, ou mesmo utilizar um aparelho extra-hospitalar. O que importa, aqui, é a sua reintegração profissional e afetiva. 8 Que, também, pode variar, segundo uma quantificação percentual.
pode sucumbir a uma forma de exclusão social "aberta" ou a outras formas de reclusão (familiar,
notadamente) e até sofrer um processo de mendigação.
A Reforma Psiquiátrica e os... psiquiatras.
Com a crítica da teoria crítica, queremos voltar agora, para fechar o texto, ao discurso
profissional. Tendo justamente tal característica, ou seja, sendo um discurso baseado num saber
profissional, achamos mais interessante ilustrar o argumento através da interpretação de algumas
entrevistas retiradas da pesquisa de nossa tese de doutorado9; assim, poderemos confrontar as
opiniões e as representações dos psiquiatras a algumas questões relativas à reforma psiquiátrica.
Ora, justamente aqui, há um problema: não há consenso sobre a reforma psiquiátrica, nem
mesmo sobre o papel do hospital ― talvez, das questões da reforma, seja a questão mais polêmica.
Inclusive, o resultado da pesquisa sobre esse assunto invalidou nossa hipótese de base: pensávamos
que haveria uma correspondência entre a defesa da “doença mental”, como uma doença
ontologicamente diferente de todas as outras (dualismo nosológico: separação entre doença orgânica
e “doença mental”), e a defesa de uma instituição especial e separada de todas as outras da medicina
(dualismo institucional: separação entre instituição médica e instituição psiquiátrica) ― logo, a
defesa do hospital psiquiátrico (HP). Para tratar uma doença que é uma singularidade patológica
seria necessário um aparato especial, diferente das outras instituições médicas, o hospital
psiquiátrico. Ou ainda: haveria uma correspondência entre a defesa da “doença mental” como uma
doença igual a qualquer outra (monismo nosológico: identidade entre “doença mental” e doença
orgânica) e a defesa do fim do HP e, conseqüentemente, defesa da hospitalização no hospital geral
(HG ― monismo institucional: a assistência psiquiátrica inserida nas instituições médicas). Para
tratar uma doença convencional seria preciso somente um aparato médico banal, o hospital geral.
Podemos resumir as posições dos psiquiatras, tomando como parâmetro o HP:
� hospitalocentrista baseado no HP: o hospital psiquiátrico é o referencial institucional.
Os outros serviços, inclusive o HG, são secundários, embora cumpram uma função
importante;
9 Perrusi, Artur. Tiranias da Identidade: profissão e crise identitária entre psiquiatras. 2003. 308f. Tese
(Doutorado em Sociologia) – Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2004. O objeto da pesquisa foi a identidade profissional do psiquiatra. Foi uma pesquisa qualitativa realizada na cidade do Recife, capital do Estado de Pernambuco, onde foram efetuadas 50 entrevistas semi-diretas com psiquiatras, além de observação participante nos serviços psiquiátricos locais.
� hospitalocentrista baseado no HG: embora não tenhamos encontrado essa posição
entre os entrevistados, ela é possível logicamente. No limite, alguns psiquiatras
chegaram a insinuar certa simpatia pelo fim do HP e a transferência da estrutura
hospitalar para os hospitais gerais. As estruturas extra-hospitalares estariam numa
situação subalterna, tendo uma função apenas complementar. A referência seria o HG;
� hospitalocentrista mista: a referência seria as duas estruturas hospitalares, o HP e o
HG, os dois estando numa relação de complementaridade. As estruturas extra-
hospitalares continuariam subordinadas à lógica hospitalar. Tal posição, em relação à
referência hospitalar, pode ser considerada como moderada. Um psiquiatra
entrevistado conceituou-a como "múltiplo com predominante", isto é, várias estruturas
de tratamento com a predominância centrada nos hospitais – foi a posição
predominante entre os entrevistados;
� extra-hospitalar pura: não há referência hospitalar alguma, apenas estruturas de
tratamento extra-hospitalares (ambulatório, casa de acolhimento, centro de
emergência psiquiátrica...). Admite-se o hospital-dia e o hospital-noite, considerando
que, por princípio, não são exatamente estruturas hospitalares;
� sistema integrado complementar: seria o múltiplo sem predominante. Não seria
hospitalocentrista, pois haveria a garantia da horizontalidade. As estruturas
hospitalares, com maior peso para o HG, seriam estruturas com funções de
hospitalização rápida.
Outra discussão importante foi aquela a respeito do papel da hospitalização na psiquiatria.
Possui como pano de fundo o debate anterior, embora tenha sua autonomia. Analisando as posições
dos psiquiatras, percebemos uma grande preocupação em diferenciar internamento de hospitalização.
Na verdade, internamento é colocado quase como uma noção tabu, relacionada a uma época
ultrapassada da psiquiatria, os idos do asilo. Os psiquiatras entrevistados admitem que, atualmente,
ainda se está fazendo internamentos e não propriamente hospitalizações, dada as condições precárias
dos hospitais, considerados ainda como semi-asilares, e de um modelo psiquiátrico baseado na tutela
e na exclusão do paciente. A noção de internamento, entretanto, é um tanto vaga, podendo ter vários
significados e associações com outras noções: encarceramento, tutela, perda da cidadania,
cronicidade, loucura... O fato é que "internamento" tem um sentido negativo ― como tentou
sintetizar um entrevistado: "internamento é a hospitalização no asilo". Mas podemos perceber que a
noção é reservada para procedimentos considerados fora do campo médico, embora tenham algum
sentido para a psiquiatria, principalmente durante a sua história. "Hospitalização", assim, recupera
uma psiquiatria mais humanizada e antiasilar. Diante do termo pejorativo “internamento”, é uma
noção ética e cidadã.
Muitos entrevistados, além da denúncia das atuais condições asilares dos hospitais
psiquiátricos, foram contra a hospitalização. Praticamente todos aqueles que pediram o fim do HP,
fizeram severas reticências à hospitalização. Pelo que interpretamos, hospitalização, mesmo num HP
reformado, significaria ainda internamento. Haveria um atendimento emergencial em psiquiatria,
com imediata compensação do paciente e envio do mesmo para outras estruturas extra-hospitalares
― segundo um entrevistado, o fato de um paciente passar uma semana num centro de emergência
psiquiátrica ainda não caracterizaria uma hospitalização. O termo é, assim, identificado a hospital e
daí a internamento. Normalmente, a defesa do fim da hospitalização vem acompanhada, no discurso,
de uma premissa: reforma psiquiátrica com criação de estruturas extra-hospitalares.
Quem não foi contra o fim da hospitalização, sustentou a necessidade de uma forma restrita.
O discurso pode ser resumido dessa forma: tem doença que não tem como não internar. A definição
do caso restrito passa pela definição jurídica (auto e heteropericulosidade) e médica (gravidade dos
sintomas). Comumente, ocorre a mistura das duas definições, principalmente no caso em que a
gravidade dos sintomas seja identificada a tentativas de suicídio ou extrema agressividade. Mas
existe outro tipo de discurso, que encontramos em alguns entrevistados, um tanto paradoxal e
contraditório: há o reconhecimento de que a hospitalização não é necessária, porém deve ser
realizada por causa do preconceito social e mesmo por pressão da família. A hospitalização torna-se
inevitável devido a fatores, digamos assim, extra-médicos. O entrevistado pode até resistir a várias
injunções familiares para a hospitalização; contudo, como a pressão é cotidiana, o psiquiatra
fraqueja, enfim, e abre a guarda. Há certa franqueza nessa confissão, pois a defesa da hospitalização
restrita, na verdade, insere-se de forma cômoda no discurso profissional, já que, na prática, a
hospitalização é ampla e irrestrita. No fundo, o discurso pede desculpa à prática.
Quase como uma escusa, ainda existe outra resposta, do tipo: "devemos fazer o possível para
evitar a hospitalização; ela deve ser breve e rápida; tem casos que é impossível o tratamento sem a
hospitalização". Fica-se sem saber até que ponto, para o entrevistado, a hospitalização não deveria
existir, mas parece que a realidade impõe-na, ao risco de o profissional ter que aceitar a sua
convivência, independentemente da sua vontade. Pareceu-nos evidente que a hospitalização impõe
para o psiquiatra uma série de justificações, devido mesmo ao seu caráter estigmatizante. Existiria
uma espécie de "culpa" em relação à hospitalização, até entre os psiquiatras que defendem o HP.
Apesar da dupla transformação reiterada e aprovada por todos ― do asilo para o hospital; do
internamento para a hospitalização ―, a carga negativa em torno desse ato de passagem da
psiquiatria ainda seria forte o suficiente para causar embaraço.
Não causa surpresa que o debate acima descrito, sobre o hospital e a hospitalização, repercuta
de frente quando se discute a reforma psiquiátrica. Todos os entrevistados foram unânimes em dizer
que a psiquiatria brasileira não pode continuar como está atualmente. Foram a favor da reforma, mas
não existe propriamente consenso a respeito de qual modelo adotar. A maioria dos entrevistados,
inclusive, tem críticas sobre a sua implantação: está lenta demais, está rápida demais, radical em
demasia, conservadora em excesso. Contudo, basicamente o ponto maior de controvérsia seria o
modelo adotado. E, justamente, o grande problema é que somente uma minoria de entrevistado sabe
alguma coisa a respeito do modelo adotado. Uma minoria que, não por mera coincidência, tem algum
interesse ou empatia com o movimento que gerou a reforma.
Nesse sentido, as respostas foram extremamente vagas. Houve raros elogios explícitos à
reforma enquanto prática realizada, ao contrário da unanimidade à necessidade de reforma. De todo
modo, como a reforma combate o hospitalocentrismo, todos os entrevistados, cuja simpatia passava
por qualquer modelo no qual o hospital ainda tem alguma primazia, foram reticentes à reforma; do
mesmo modo, os entrevistados, que foram contra o HP ou que defenderam um sistema integrado sem
predominância hospitalar, mostraram um interesse pela reforma. Mas, se houve controvérsias, pelo
menos ocorreu algum consenso em relação aos problemas que a reforma precisará enfrentar: 1)
preconceito contra a reforma: muitos colocaram que o medo da loucura atrapalha o movimento
reformista, precisando assim de uma campanha acoplada de esclarecimento; ou ainda, que há
resistência ideológica, principalmente por parte daqueles que advogam um modelo asilar de
tratamento psiquiátrico; 2) lobby privado: a maioria dos entrevistados alegou que o sistema privado é
um obstáculo à reforma porque bate de frente com a eliminação de leitos hospitalares e,
conseqüentemente, com a diminuição das hospitalizações.
Inconclusões
Chegando ao final do artigo e, ao mesmo tempo, voltando à pergunta do título do artigo, “a
lógica asilar acabou?”, podemos fazer uma série de considerações:
• praticamente, ninguém na saúde mental defende o asilo. Tal situação, pelo menos, implica a
perda total de significado da antiga hegemonia do modelo empírico de assistência psiquiátrica
baseado no asilo;
• a resposta à pergunta não é propriamente empírica, pois depende do ponto de partida
epistemológico em relação ao saber psiquiátrico, logo, à lógica asilar:
o Caso a lógica asilar seja identificada à entidade empírica “asilo”, pode-se dizer que
ela acabou;
o Caso seja identificada ao hospital psiquiátrico, o hospitalocentrismo atual da
assistência psiquiátrica demonstra que a lógica asilar é hegemônica;
o Caso seja identificada a toda lógica institucional de assistência, a lógica asilar será
sempre potência de qualquer processo de institucionalização no campo da saúde
mental, seja hospitalar ou não;
• A teoria crítica e o discurso profissional têm dificuldades em apreender as diversas mudanças
concretas que estão acontecendo com a implantação da Reforma;
• A teoria crítica não consegue apreender a cronicidade a partir de uma posição que vá além de
um sociologismo da “doença mental”;
• Através dos psiquiatras entrevistados, pudemos perceber que o discurso profissional tem uma
dificuldade em criticar o hospitalocentrismo, isto é, o hospital psiquiátrico é aceito, de forma
hegemônica, como a organização terapêutica da psiquiatria, por excelência. Mesmo assim,
percebemos uma brecha no discurso profissional que permite a seguinte esperança: é
provável que as transformações ocorridas no campo da saúde mental brasileira, com a
implantação da reforma psiquiátrica, influenciem as representações dos psiquiatras, seja em
relação à “doença mental”, seja em relação à hegemonia institucional do hospital
psiquiátrico; em suma, aos poucos, ocorra uma adesão à reforma e um combate mais explícito
contra o hospitalocentrismo na assistência psiquiátrica.
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