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SciELO Books / SciELO Livros / SciELO Libros PASCHOARELLI, LC., and MENEZES, MS., orgs. Design e ergonomia: aspectos tecnológicos [online]. São Paulo: Editora UNESP; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2009. 279 p. ISBN 978-85- 7983-001-3. Available from SciELO Books <http://books.scielo.org >. All the contents of this chapter, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution-Non Commercial-ShareAlike 3.0 Unported. Todo o conteúdo deste capítulo, exceto quando houver ressalva, é publicado sob a licença Creative Commons Atribuição - Uso Não Comercial - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não adaptada. Todo el contenido de este capítulo, excepto donde se indique lo contrario, está bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento-NoComercial-CompartirIgual 3.0 Unported. Análise ergonômica do colete à prova de balas para atividades policiais Iracilde Clara Vasconcelos Luiz Gonzaga Campos Porto

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    PASCHOARELLI, LC., and MENEZES, MS., orgs. Design e ergonomia: aspectos tecnolgicos [online]. So Paulo: Editora UNESP; So Paulo: Cultura Acadmica, 2009. 279 p. ISBN 978-85-7983-001-3. Available from SciELO Books .

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    Todo o contedo deste captulo, exceto quando houver ressalva, publicado sob a licena Creative Commons Atribuio - Uso No Comercial - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 No adaptada.

    Todo el contenido de este captulo, excepto donde se indique lo contrario, est bajo licencia de la licencia Creative Commons Reconocimento-NoComercial-CompartirIgual 3.0 Unported.

    Anlise ergonmica do colete prova de balas para atividades policiais

    Iracilde Clara Vasconcelos Luiz Gonzaga Campos Porto

  • 10ANLISE ERGONMICA DO COLETE

    PROVA DE BALAS PARA ATIVIDADES POLICIAIS

    Iracilde Clara Vasconcelos1

    Luiz Gonzaga Campos Porto2

    Introduo

    Justifi cativa

    Os representantes da ordem constituda, incluindo os policiais, no recebem mais o respeito de pocas passadas, em que a simples presena do policial fardado acalmava os nimos e garantia a ordem pblica. Hoje, o cenrio muito diferente, estamos vivendo em um perodo de perda ou quase inexistncia de referncias essenciais que evidenciem um equilbrio na convivncia social.

    Esse estado de desequilbrio e desordem pblica em que a socie-dade e a polcia se encontram tem situado a violncia no cerne da vida cotidiana, ocupando destaque nos jornais e programas televisivos especiais, gerando um profundo sentimento de insegurana (Ches-nais, 1996), situao em que, invariavelmente, o policial no passa inclume em um enfrentamento armado, tendo, muitas vezes, que se expor a perder a vida em confl itos armados, caracterizando o alto risco epidemiolgico dessa atividade (Santos, 1997).

    1 Mestre em design, Universidade Estadual Paulista.2 Livre-docente, Universidade Estadual Paulista.

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    Essa composio de insegurana, uma psicose coletiva que atin-ge diretamente os profi ssionais de segurana pblica, necessita de aes que objetivem romper esse crculo vicioso, considerando que violncia gera o medo, mas o medo tambm gera violncia. Segundo Fraga (2005), pouca ateno tem se dado sade ocupacional do profi ssional de segurana pblica, especialmente aos policiais mi-litares, embora a temtica sade do trabalhador tenha destaque nas diversas reas que englobam Gesto de Segurana e Sade Ocu-pacional. Estudos quanto segurana pblica geralmente do nfase aos aspectos tcnicos da profi sso, com pouca importncia quanto segurana do trabalho, quadro diferente em relao a pases como Frana e Estados Unidos, onde, exemplarmente, se verifi ca a presen-a constante de pesquisadores e especialistas universitrios voltados para a produo de solues na rea de segurana (Martins, 2007).

    O desempenho do papel de profi ssional de segurana pblica ocorre num ambiente violento, de riscos e tenses, levando os pro-fi ssionais de segurana pblica a receber uma sobrecarga emocional, fatigante e desconfortvel, em situaes adversas e estressantes. Com o aumento da criminalidade, at mesmo nas pequenas cidades, os confrontos diretos com criminosos tm-se tornado frequentes, devendo o Estado priorizar investimentos em equipamentos de segurana. Entre tantos, destacamos equipamentos de proteo individual, de interesse especfi co, neste captulo, o colete prova de balas, que passou a ser difundido no Brasil a partir da segunda metade da dcada de 1980. Embora no haja dvidas em relao a sua efi ccia, ele alvo de frequentes reclamaes em relao ao desconforto, excesso de peso, calor, e outros argumentos facilmente derrubados pela proteo que ele oferece.

    O progresso tecnolgico, um processo inexorvel, vem contri-buindo para aliviar o trabalho fsico do homem com o crescente aumento da produtividade e qualidade dos produtos e servios, provocando gradativamente o deslocamento da atividade humana para tarefas que as mquinas sero capazes de realizar.

    Embora a evoluo tecnolgica aplicada atividade policial seja primordial no combate criminalidade, nesse setor o profi ssional

  • DESIGN E ERGONOMIA 225

    executante operacional no foi nem ser dispensado; ao contrrio, deve-se investir substancialmente no aumento do contingente e em suas condies de trabalho.

    No estado de So Paulo atuam hoje cerca de 130 mil policiais civis e militares. evidente que, dentro desse contingente, tem aumentado a quantidade de mortos e feridos por armas de fogo ou cortantes, muitas vezes porque os policiais no esto equipados com elementos de segurana que possam proteg-los, como, por exemplo, os coletes prova de balas, equipamento imprescindvel aos profi ssionais de se-gurana, expostos pelas condies de trabalho a disparos de armas de fogo, facadas ou golpes. Desde 6 de dezembro de 2006, a Portaria 191 do Ministrio do Trabalho e Emprego (MTE) regulamentou o colete prova de balas como um Equipamento de Proteo Individual (EPI).

    Com a nova regulamentao da legislao trabalhista, at 2011, todos os trabalhadores da segurana pblica devero obrigatoriamen-te possuir e estar treinados para o uso de coletes prova de balas para protegerem-se dos riscos de sua profi sso. Os coletes devero ser de uso individual, por uma questo de higiene, e levando em considera-o a compleio fsica de cada usurio e a durabilidade do produto.

    Objetivos

    Sabe-se, por meio de trabalhos cientfi cos com abordagens meto-dolgicas multidisciplinares, que o desempenho das atividades poli-ciais apresenta maior tendncia para as experincias de sofrimento, de fadiga e de estresse. Nesse contexto, v-se que no desempenho da atividade policial, os profi ssionais, alm de desenvolverem suas atividades em condies de sobrecarga fsica e mental, usam equipa-mentos de proteo individual que so objetos de reclamaes pelo excessivo desconforto, agravado pela fadiga e estresse, caractersticas peculiares atividade e, ainda, intensifi cado pelas altas temperaturas tropicais, alm da zona de conforto trmico, caracterizando fatores que infl uenciam no seu desempenho, ocupando, portanto, um lugar de destaque (Iida, 2005).

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    Procurou-se entender e demonstrar os possveis problemas exis-tentes no uso de equipamentos de proteo individual dos profi ssio-nais de segurana pblica no desempenho da sua funo por uma abordagem ergonmica, estudando, luz dessa concepo, os coletes prova de balas, relacionando as queixas frequentes em relao ao conforto e usabilidade por parte desses profi ssionais, identifi cando os problemas referentes ao uso, visando atender necessidade do usurio, seu conforto, sem desconsiderar os parmetros de segurana, de fundamental importncia, peculiar atividade policial, exaltando parmetros ergonmicos em projetos de produtos, tcnicas opera-cionais para controle e preveno de acidentes e doenas ocupacio-nais; enfi m, implantando e consolidando conceitos de segurana do trabalho na atividade policial.

    Reviso da literatura

    Atividade policial

    A atividade policial caracterizada pela diversidade de aes executadas durante as situaes com as quais ela tem de lidar, tanto que seu papel at confundido, colocando o policial a conviver durante sua jornada de trabalho com muitos imprevistos e perigos, submetendo seu corpo a condies fatigantes. Alm disso, no possui horrio fi xo de trabalho, concorrendo a variadas escalas de servio, diurnas ou noturnas, sem diferena para fi nais de semana ou feriados.

    O trabalho policial solicitado a toda e qualquer ocorrncia, seja por iniciativa prpria, seja por solicitao ou determinao superior (Monjardet, 2002). E, em funo de suas atividades, do meio am-biente em que se encontra e das condies organizacionais que so impostas a essa atividade, so solicitados do corpo do policial dife-rentes sistemas, aparelhos e rgos. Segundo Piva (2005) e Bayler (2001), o policial, ao entrar para a corporao, oferece seu corpo instituio, que o profi ssionaliza, podendo culminar na disposio em ofertar a prpria vida numa misso policial e, ainda, invariavelmente,

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    o submete ao cansao e fadiga e ao consequente aparecimento de doenas ou agravamento de outras preexistentes.

    No policiamento, os processos de locomoo mais utilizados so o motorizado e a p e, eventualmente, montado, areo e em embar-caes. Entretanto, em todas as situaes, o policial expe seu corpo a situaes desfavorveis, trabalha em terrenos irregulares, cubculos, temperaturas anormais, em trfego intenso, enfi m, em inmeras si-tuaes que, invariavelmente, exigem do policial rapidez, percepo, prudncia, observao, memria, concentrao e preciso fsica e psi-colgica (Velho, 1994; Silveira, 1997 apud Rodriguez-Aez, 2003).

    Simes cita que a atividade policial praticada

    sob iluminao defi citria (originando desconforto visual e difi cul-dade de atuao), como tambm atua no trfego intenso de veculos e/ou pedestres, submetendo-se rudos constantes (o que causa interferncia direta nas suas atividades cognitivas, alm de fi siolo-gicamente causar o aumento da produo dos hormnios que so considerados hormnios de estresse, taquicardia, alteraes no sono mesmo horas aps ao contato com o rudo, desconforto, exas-perao, indisposio, ansiedade e depresso) e a produtos qumicos (inspirando fumaas, gases e vapores txicos, exigindo a capacidade mxima do pulmo para oxigenar o sangue). (2003)

    Alm disso, o policial pode sofrer agresses fsicas, ataques por objetos cortantes e perfurantes (projtil de arma de fogo) e, sobre todos os aspectos, os incidentes em tiroteio com armas de fogo so reconhecidos como os mais traumatizantes para o policial.

    E ainda, o policial, durante sua jornada de trabalho, carrega v-rios equipamentos que, em geral, so: arma de porte, algemas, rdio HT, cassetete e bolsa com bloco de infraes, que pesam em torno de 2,10 kg. Alm disso, o peso dos coletes balsticos varia em torno de 1,6 kg a 2,6 kg os masculinos e 1,1 kg a 1,8 kg os femininos, o que dependendo da condio fsica do policial pode ser um fator limitante para o bom desempenho de suas atividades, e assim colaborar para o aparecimento de sinais de cansao, dores nos membros inferiores e nas costas (Simes, 2003).

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    Esse meio laboral exige do policial o mximo de sua coordenao motora e dos seus msculos, com movimentos rpidos, geis e pre-cisos em aes como correr, pular, puxar, carregar pesos, levantar ou caminhar rapidamente.

    Em pesquisa especfi ca sobre Qualidade de Vida no Trabalho de Policiais Militares da Regio Metropolitana do Recife, Asfora (2004) constatou que 60% dos policiais entrevistados consideram o estresse do dia a dia elevado ou excessivo. A mesma autora aborda que nveis muito altos de estresse podem causar problemas mentais e psicolgicos, doenas ou predisposies a doenas.

    Estudando-se os policiais como trabalhadores, observa-se a falta de ateno especfi ca sua sade, assim como aos demais pro-fi ssionais do setor-servio (Souza & Minayo, 2005). Reis (2006) considerou que as regras de Medicina e Segurana do Trabalho no atendem, com a devida profundidade, realidade dos servios da Polcia Militar e, em relao s Normas Regulamentadoras, o autor colabora, sugerindo a implantao de normas especfi cas para a ativi-dade policial, j que, pelo seu estudo, ele conclui sobre a necessidade de regras apropriadas que deem nfase aplicao de mecanismos capazes de aliviar e minimizar principalmente os efeitos do estresse, alm de outros fatores psquicos decorrentes do contato intensivo com mazelas humanas e, tambm, pelo confronto armado, muitas vezes tirando a vida de outro ser humano.

    Ergonomia e design ergonmico

    Por tudo, o autor enfatiza a aplicao de princpios de ergonomia e, abordando a relao entre sade ocupacional e produtividade, conclui que essa ligao

    incorpora elementos que consideram o elemento humano como o principal fator que torna possvel a produo de servios. Assim, pensar em efi cincia das organizaes policiais implica em atentar para as condies de preservao da sade e de preveno contra a perda da sade dos policiais. (idem)

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    Contudo, o gerenciamento da sade ocupacional do policial mi-litar com aes focadas que ponderem os fatores de riscos advindos da atividade policial, alm de reverter em seu bem-estar, reverte em expressivas melhoras nas consequncias individuais e organizacio-nais, abrangendo grande importncia do interesse pblico, pois, para o cumprimento do dever junto sociedade, o policial depende de sua sade de forma intrnseca, ao velar pela paz social.

    Considerando que a contribuio ergonmica no se limita anlise das situaes conhecidas e exposio de recomendaes visando apontar modifi caes dos meios de trabalho (ergonomia de correo), enfatiza-se que essa disciplina tambm tem fundamental importncia na fase inicial de projeto do produto e dos meios de trabalho, fundamentando-se no conhecimento sobre o homem, na atividade de trabalho que ser desenvolvida, e em situaes hipot-ticas, buscando-se a anlise da situao de referncia (ergonomia de concepo). Portanto, a contribuio ergonmica, nas vrias etapas da fase inicial do projeto do produto, da mquina ou do ambiente, poder propor, alm de novos produtos, novos meios de trabalho, prevenin-do problemas futuros e, ainda, intervir na melhoria do ambiente de trabalho (Iida, 2005), proporcionando ao usurio prazer, bem-estar, relaxamento e conforto, visando atender a esses quesitos e usurios mais exigentes, mercados mais competitivos, exigncias normativas mais rigorosas. Alm disso, inovaes tecnolgicas mais frequentes apresentam o denominado design ergonmico definido como a aplicao do conhecimento ergonmico no projeto de dispositivos tecnolgicos, com o objetivo de alcanar produtos e sistemas seguros, confortveis, efi cientes, efetivos e aceitveis (Paschoarelli, 2003).

    Para atender a essa demanda to presente neste incio de sculo, deve-se considerar no desenvolvimento de projeto de produto as-pectos de usabilidade, conforto, desempenho e segurana. Segundo Paschoarelli & Silva (2006), o design ergonmico possui alternativas metodolgicas criadas para melhorar o desenvolvimento dos produ-tos por meio da anlise da interao entre o homem e os produtos ou dispositivos tecnolgicos, e o desenvolvimento de procedimentos metodolgicos de avaliao e anlise do produto deve apresentar uma abordagem cientfi ca que atenda aos aspectos ergonmicos e, assim,

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    considere as capacidades e as limitaes do ser humano, e nesse processo agregue aos produtos propriedades que garantam mxima segurana, funcionalidade e usabilidade.

    Os mesmos autores contribuem complementando que o design ergonmico deve fundamentar-se em abordagens epidemiolgicas, abrangendo conhecimentos fi siolgicos, perceptivos e psicolgicos na interface homem versus tecnologia, em um processo trans e multidis-ciplinar e, dessa forma, analisar e revelar os problemas ergonmicos, tendo-se como fi nalidade principal melhorar a qualidade de vida.

    Nesse sentido, este captulo prope a anlise ergonmica em produtos j existentes, como os coletes prova de balas que foram criados desde os primrdios da histria e desenvolvidos ao longo de sua existncia sem critrios ergonmicos e de usabilidade. Porm, podem ser aprimorados e redesenhados, valendo-se de pesquisas que verifi quem o nvel de adequao do produto ao usurio e, servindo-se desses, aplicar os resultados em indicativos que tenham valores objetivos para melhorar o produto, adequando-o ao usurio e aten-dendo a suas necessidades e caractersticas sem, contudo, perder em segurana, tendo em vista que a inadequao dessa interface gera estresse e frustrao (Fowler, 2003).

    Nesse contexto, o mtodo para a anlise ergonmica pode apre-sentar vrios aspectos que podem se valer da criatividade do designer, considerando-se aspectos de conforto que incluem ajuste, mobilidade e aceitabilidade trmica, e ainda aspectos psicolgicos, com nfase em uma viso holstica da interao do homem com o produto que, alm da adequao das caractersticas e limitaes fsico-humanas, tambm considere seu estilo de vida, seus sonhos, valores, gostos e desejos.

    Colete prova de balas

    Basicamente, um colete prova de balas constitudo de uma capa externa feita de duas camadas de tecido comum, como o terbrim, que acondiciona os dois painis balsticos, um frontal e outro dorsal, estes constitudos de diversas camadas de tecido balstico, que so revestidos por uma capa (fi gura 61).

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    Figura 61. Partes componentes do colete balstico. Fonte: Revista mundo estranho.

    Para a confeco do painel balstico so sobrepostas camadas su-cessivas de tecido balstico em nmero sufi ciente para garantir o nvel de proteo do colete, o que geralmente varia entre 15 e 35 camadas, e, apesar da resistncia do tecido balstico, este pode ser trabalhado com tesouras e mquinas de costura industriais comuns (fi gura 62).

    Figura 62. Camadas de material balstico sobrepostas sendo cortadas com mquina de costura industrial. Fonte: CBC.

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    Esses painis so cortados nos moldes defi nidos (fi guras 62 e 63) e costurados nas extremidades para permanecerem em camadas sobrepostas, formando um painel que revestido de uma capa no-removvel de duas camadas de tecido. Para que o painel balstico no seja molhado, usa-se o nylon, um tecido impermevel que o protege do contato com a umidade e/ou chuva e do suor do corpo do usurio e, para tanto, as bordas devem apresentar arremates que garantam a estanquidade, impedindo a entrada de gua pelos pontos da costura em caso de submerso (fi guras 64 e 65):

    Figura 63. Moldes dos coletes. Fonte: site G5.

    Figura 64. Detalhes do tecido balstico em camadas sobrepostas, formando o painel.

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    Figura 65. Capa interna do painel balstico, com a etiqueta de informaes tcnicas.

    Em atendimento Norma National Institute of Justice (NIJ), o painel balstico e a capa externa devem possuir uma etiqueta com informaes no idioma portugus, de forma legvel e indelvel, em cor contrastante com o nome, logotipo ou outra identifi cao do fabricante; uso masculino ou feminino; modelo; tamanho PP, M, G ou GG; nvel de proteo e certifi cado de conformidade com a Norma NIJ Standard 0101.04; nmero de srie; data de fabricao; data de validade da proteo balstica; munies que suporta (calibre, velocidade, peso e caractersticas do projtil); instrues de uso e conservao dos painis balsticos.

    A capa externa frontal e dorsal geralmente confeccionada em tecido de alta tenacidade, um misto de algodo e polister em forma de envelopes com fechamento em velcro, na qual so introduzidos os painis de proteo balstica frontal e dorsal. Possui regulagem nas laterais e nos ombros, com tiras do mesmo tecido e revestidas com velcro (fi guras 66 a 69).

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    Figura 66. Capa externa frontal.

    Figura 67. Capa externa dorsal.

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    Figura 68. Capa externa do painel balstico frontal e detalhe da etiqueta.

    Figura 69. Capa externa do painel balstico dorsal.

    Metodologia

    Para realizao da pesquisa foi elaborado um questionrio com 11 perguntas que abordava os aspectos de conforto e usabilidade dos coletes prova de balas, para que os entrevistados manifestassem sua opinio quanto aos seguintes aspectos: conforto, grau de conforto em relao ao peso, etiqueta com informaes, abertura com velcro para introduo do painel balstico, grau de conforto em relao ao calor

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    durante o uso, adequao dos tamanhos PP, P, M, G e GG s medidas corporais do usurio, satisfao em relao s medidas dos coletes, partes do colete nas quais as medidas so desconfortveis, adequao do modelo utilizado para a atividade policial e sugestes, diagnstico de problema de sade causado pelo uso do colete, se o desconforto do colete prejudica a atividade policial, nvel de resistncia do policial quanto ao uso contnuo, se o uso do colete contribui para sentir-se fatigado no fi nal do turno de trabalho.

    Iida (2005), em congruncia com outros autores, afi rma que o sentimento quanto ao conforto, usabilidade e fadiga em relao a um produto deve ser manifestado pelo usurio. Levando isso em conta, para este captulo utilizamos medidas subjetivas que repre-sentassem variveis categorizadas nominais (sim e no) e ordinais em escalas de satisfao (como excelente, bom, regular, ruim e pssimo), que melhor indicassem o grau de conforto do produto pesquisado em relao ao peso, calor, medidas, modelo e adequao atividade, en-tre outros aspectos. Portanto, no questionrio o policial pode traduzir seu sentimento, quantifi cando o nvel de conforto e usabilidade do equipamento e suas interrelaes com o nvel de fadiga.

    A populao (N= 761) compreendeu os policiais militares do quadro da Secretaria de Segurana Pblica do estado de So Pau-lo, que realizam o policiamento ostensivo e preventivo na rea de abrangncia do 4 BPM/I, sendo 65 do sexo feminino e 696 do sexo masculino. Todos continuamente durante o turno de trabalho utilizam o colete prova de balas de nvel II, modelo dissimulado, de painel balstico confeccionado com camadas de tecidos de fi os de aramida, de polietileno e da combinao dos dois.

    Resultados e consideraes fi nais

    Os resultados apontaram que mesmo que os entrevistados con-siderem o modelo adequado para a atividade policial, sugeriram que as medidas dos coletes sejam redimensionadas, principalmente na altura frontal, decote e cavas, sendo consenso que o colete apresente

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    um modelo mais confortvel, menos quente e mais leve. Uma frao de 20% dos policiais apontou seu uso como causa determinante de problemas de sade, entretanto, deve-se consider-la, para que este evento seja anulado na totalidade. Para as policiais, a insatisfao em relao ao conforto, ao peso e medida do busto maior quando comparada aos homens. Porm, nas demais avaliaes no se obser-vam diferenas signifi cativas entre os dois sexos.

    Considerando a opinio do usurio, conclui-se que o design desse EPI deve ser repensado. Em relao aos resultados da pesquisa sobre o colete prova de bala enfatiza-se que seu uso parece infl uenciar no desempenho da atividade policial por causar desconforto, ser pesado, oferecer sofrvel conforto trmico e por contribuir para que o policial apresente fadiga no fi nal de turno de trabalho, em detrimento de sua sade e segurana e de sua qualidade de vida, refl etindo diretamente na sociedade que experimenta seus servios.

    Em relao ao peso do colete, as queixas no foram to incisivas, o que pode ser atribudo ao conhecimento e conscientizao, por parte dos policiais, quanto importncia do nmero de camadas para obter-se a devida proteo contra o impacto de projteis e com o menor trauma possvel no ponto de choque.

    Conclui-se que os objetivos foram alcanados por meio da me-todologia aplicada, pois as interferncias indesejveis na qualidade de um produto quanto ao conforto podem ser diminudas ou ex-terminada, por intermdio de uma abordagem ergonmica com a participao do usurio e pela inferncia de sua opinio, sua vivncia, suas queixas quanto ao conforto, usabilidade e fadiga em relao ao produto, estabelecendo a ergonomia como elemento favorvel para a concepo de produtos confortveis e prazerosos, propiciando, assim, mudanas positivas no cenrio policial por intermdio de princpios ergonmicos, dando importncia a essa profi sso.

    Visando s futuras intervenes no design do colete prova de balas, os resultados aqui obtidos devem ser considerados desde a concepo do produto, evitando inadequaes por meio da aplicao de princpios ergonmicos e de usabilidade, como garantia de um produto mais confortvel e usurios mais satisfeitos, contribuindo

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    de forma efetiva para a segurana de trabalho e qualidade de vida do policial.

    Como recomendao para trabalhos futuros sugere-se a realizao de um levantamento antropomtrico do efetivo da PMESP para a adequao de medidas e de molde do colete que melhor se aproxi-me do perfi l de seus usurios e atenda a seus anseios, oferecendo maior conforto e usabilidade, sem perdas em relao segurana de proteo.

    Finalizando, considera-se que este estudo, por ser o primeiro no Brasil a investigar os aspectos ergonmicos do colete balstico, seja um referencial de dados para posteriores pesquisas com essa populao. Recomenda-se acompanhar a implantao de sugestes ergonmicas, alm de investigar os efeitos das possveis mudanas ocorridas, nas quais outros fatores, associados condio de trabalho e conhecimento do ser humano policial, possam ser analisados dentro do contexto ergonmico, implantando e consolidando conceitos de segurana do trabalho na atividade policial, agregando valor a esse profi ssional.

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