Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

16
Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas sobre estranhamento e alteridade no interior da Agroecologia In the knowledge and practice crossroad: anthropological reviews about estrangement and alterity within Agroecology SILVA JUNIOR, Roberto Donato da 1 ; DE BIASE, Laura 2 1Doutorando em Ambiente e Sociedade - Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas/SP - BRasil, [email protected]; 2Doutoranda em Geografia Humana - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH), Universidade de São Paulo (USP), São Paulo/SP - Brasil, [email protected] RESUMO: O objetivo do artigo é apresentar elementos antropológicos que podem contribuir com o processo, já em curso, de edificação da agroecologia como campo de intersecção entre diferentes conhecimentos e práticas. O foco de atenção é a relação entre os agentes de saberes e práticas acadêmicas e os agentes de saberes e práticas locais e etnicamente determinadas. Para tanto, (1) buscamos discutir a incursão teórica da agroecologia sobre a diversidade cultural e suas decorrências práticas; (2) empreendemos uma destilação sobre as principais situações de estranhamento entre técnicos/cientistas e famílias agricultoras; e (3) apresentamos elementos conceituais da antropologia – “cultura”, “alteridade” e “simetria” – que podem contribuir tanto para superação dessas situações de estranhamento, quanto para relações de mútuo aprendizado entre os diferentes sujeitos imersos em contextos agroecológicos. PALAVRAS-CHAVE: agroecologia, antropologia, diversidade cultural, alteridade, simetria. ABSTRACT: This paper aims at presenting anthropological elements that can contribute to the ongoing process of agroecology construction as an intersection field for different knowledge and practices. The focus of attention is the relationship between academic knowledge and practice agents, and ethnically-represented local knowledge and practice agents. Therefore, we intend to (1) discuss the theoretical incursion of agroecology in its cultural diversity, as well as its practical consequences; (2) analyze main situations of estrangement between technicians/scientists and farming families; and (3) present anthropological conceptual elements, such as "culture", "alterity", and "symmetry", that may contribute both to the overcoming of these estrangement situations, and for relationships of mutual learning among the subjects that are immersed in agroecological contexts. KEY WORDS: agroecology, anthropology, cultural diversity, alterity, simmetry. Revista Brasileira de Agroecologia Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) ISSN: 1980-9735 Correspondências para: [email protected] Aceito para publicação em 13/04/2012

Transcript of Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

Page 1: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas sobreestranhamento e alteridade no interior da Agroecologia

In the knowledge and practice crossroad: anthropological reviews about estrangementand alterity within Agroecology

SILVA JUNIOR, Roberto Donato da1; DE BIASE, Laura2

1Doutorando em Ambiente e Sociedade - Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM), Instituto de Filosofiae Ciências Humanas (IFCH), Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), Campinas/SP - BRasil,[email protected]; 2Doutoranda em Geografia Humana - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas(FFLCH), Universidade de São Paulo (USP), São Paulo/SP - Brasil, [email protected]

RESUMO: O objetivo do artigo é apresentar elementos antropológicos que podem contribuir com o processo, já em

curso, de edificação da agroecologia como campo de intersecção entre diferentes conhecimentos e práticas. O foco

de atenção é a relação entre os agentes de saberes e práticas acadêmicas e os agentes de saberes e práticas locais

e etnicamente determinadas. Para tanto, (1) buscamos discutir a incursão teórica da agroecologia sobre a

diversidade cultural e suas decorrências práticas; (2) empreendemos uma destilação sobre as principais situações de

estranhamento entre técnicos/cientistas e famílias agricultoras; e (3) apresentamos elementos conceituais da

antropologia – “cultura”, “alteridade” e “simetria” – que podem contribuir tanto para superação dessas situações de

estranhamento, quanto para relações de mútuo aprendizado entre os diferentes sujeitos imersos em contextos

agroecológicos.

PALAVRAS-CHAVE: agroecologia, antropologia, diversidade cultural, alteridade, simetria.

ABSTRACT: This paper aims at presenting anthropological elements that can contribute to the ongoing process of

agroecology construction as an intersection field for different knowledge and practices. The focus of attention is the

relationship between academic knowledge and practice agents, and ethnically-represented local knowledge and

practice agents. Therefore, we intend to (1) discuss the theoretical incursion of agroecology in its cultural diversity, as

well as its practical consequences; (2) analyze main situations of estrangement between technicians/scientists and

farming families; and (3) present anthropological conceptual elements, such as "culture", "alterity", and "symmetry",

that may contribute both to the overcoming of these estrangement situations, and for relationships of mutual learning

among the subjects that are immersed in agroecological contexts.

KEY WORDS: agroecology, anthropology, cultural diversity, alterity, simmetry.

Revista Brasileira de AgroecologiaRev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)ISSN: 1980-9735

Correspondências para: [email protected] para publicação em 13/04/2012

Page 2: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

...Quem olha só por olharPode ver, mas não conheceO que é e o que parece...(Roque Ferreira)

Introdução“A mentalidade extrativista do ribeirinho, que

espera os frutos cair das árvores, não serve para odesenvolvimento sustentável que queremos”. Essafrase, proferida por um importante técnicoenvolvido na difusão de atividades de manejoflorestal sustentável na Amazônia, expressa comrara clareza uma das dificuldades que permeiamos projetos orientados pelos princípios dasustentabilidade. Caracterizando-se como um dosfundamentos da agroecologia, o diálogo entre osaber-fazer acadêmico e o saber-fazer depopulações etnicamente diferenciadasfrequentemente materializa o encontro entre doisuniversos socioculturais, no qual a consequênciainevitável é o estranhamento. Extensionistas,técnicos e cientistas, de um lado, camponeses edemais grupos etnicamente diferenciados, deoutro, são os protagonistas desse encontro queguarda dentro de si uma dupla potencialidade. Doestranhamento1 podem emergir tanto uma relaçãode mútuo aprendizado quanto situações queimpedem o diálogo e podem colocar em xeque aviabilidade de projetos e estratégias de ação.Nossa proposta, portanto, é buscar na antropologiaas condições teórico-metodológicas para aprodução de práticas de alteridade – a capacidadeexistencial de colocar-se no lugar do ‘outro’ – comofundamentação de projetos que seguem osprincípios agroecológicos.

O ponto de partida é o reconhecimento, porparte de alguns autores, de que boa parte dasexperiências agroecológicas demanda maioraprofundamento entre suas dimensões ecológico-agronômicas e socioculturais. Assim, este artigotem por objetivos: evidenciar os fatores que levamà inevitável relação de estranhamento entre esses

diferentes agentes, assim como os possíveisproblemas decorrentes dessa situação deencontro; e, também, ressaltar as contribuições daantropologia para a construção dos princípiosagroecológicos de inclusão das especificidadessocioculturais de famílias e comunidades rurais.

Para atingir tais objetivos, o artigo percorre osseguintes caminhos: num primeiro momento,discutimos como autores paradigmáticos da teoriaagroecológica concebem a relação entreagricultura sustentável e diversidade sociocultural,expressa no campesinato e outros gruposetnicamente diferenciados; num segundomomento, discutimos as implicações dessasconcepções para o desenvolvimento de políticasde extensão rural agroecológica; num terceiromomento, analisamos, a partir de uma destilaçãoteórica, as formas mais comuns de estranhamentoentre extensionistas e agricultores, a partir danossa experiência profissional e acadêmica notema abordado; e, por fim, elaboramos uma brevecaracterização sobre abordagem da antropologia esuas possíveis contribuições para o fortalecimentoda dimensão sociocultural implícita no saber-fazeragroecológico.

Agroecologia e a diversidade culturalA integração entre aspectos ecológico-

agronômicos e socioculturais é um dos princípiosfundantes da agroecologia. Dentre os autoresparadigmáticos, essa questão já se apresentaformulada e colocada como condição primordialpara a promoção de estilos de agriculturasustentável. Stephen Gliessman, por exemplo,identifica os agroecossistemas “tradicionais” comoponto de referência para a conversão ou transiçãosustentável:

“Baseado no conhecimento obtido a partirdesses sistemas, a pesquisa agroecológicapode desenvolver princípios, práticas e

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)4

Page 3: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

desenhos que podem ser aplicados naconversão de agroecossistemas nãosustentáveis. (...)” (GLIESSMAN, 2002, p. 303).

Miguel Altieri refere-se a essa questão de formamuito semelhante, reconhecendo aí uma fonteprofícua para a agroecologia:

“(...) é possível obter, através do estudo daagricultura tradicional, informações importantesque podem ser utilizadas no desenvolvimentode estratégias agrícolas apropriadas” (ALTIERI,2001, p. 21).

Desse modo, o autor considera que umaabordagem etnocientífica é importante comoestratégia frente ao eminente desaparecimentodessas práticas e conhecimentos, desencadeadopelos processos de modernização da agricultura:“(...) tal transferência de conhecimentos deveocorrer rapidamente, ou essa riqueza de práticasse perderá para sempre” (idem).

Eduardo Sevilla Guzmán e colaboradorescorroboram com o princípio de integraçãosocioecológica na agroecologia, mas a partir deuma inversão no vetor de sua construção. O autorafirma a necessidade de a agroecologia partir “dedentro” de cada realidade social específica, ouseja, partir da própria lógica de organização.Nesse sentido, evidencia a necessidade dofortalecimento da identidade dos grupos sociaisrurais frente ao processo de expansão do modelodesenvolvimentista da agricultura moderna. Para oautor

“não se trata de levar soluções à localidade,senão de detectar aquelas que ali existem e‘acompanhar’ os processos de transformaçãoexistentes através de uma dinâmicaparticipativa: este é o núcleo central de nossaescolha teórica e metodológica” (GUZMANCASADO et al. 2000, p. 139).

Mais do que uma fonte de modelos deprodução sustentável e formas de conhecimentosobre agroecossistemas, os grupos ecomunidades agrícolas etnicamente diferenciadastornam-se aqui a base da ação social coletiva deprodução da própria agroecologia. A construçãoda agroecologia pelo endógeno se fundamentanuma concepção de saber-fazer etnicamentelocalizado diferente da perspectiva altieriana:

“(...) a evidência até agora acumulada nospermite desenhar sistemas de manejo dosrecursos naturais de natureza agroecológica,com base no conhecimento local, inclusivenaquelas zonas de manejo fortementeindustrializado” (SEVILLA GUZMAN, 2001, p.39-40).

Como é possível perceber, existe uma pequenadiferença de concepção, principalmente entreAltieri e Sevilla Guzmán, que acabam por atribuirdiferentes dimensões de potencialidade de açãoàs práticas e saberes localmente enraizados.Assim, enquanto Altieri preconiza odesaparecimento das formas de campesinidadecomo portadoras de vivacidade sociocultural frenteaos processos de modernização, Sevilla Guzmánreconhece a persistência delas mesmo emcontextos socioeconômicos intensamentedesfavoráveis aos seus processos de reprodução.Essa diferença de concepção não se apresentacomo mero refinamento discursivo entre os doisautores. São diferentes concepções sobre adinâmica cultural, que têm implicaçõesimportantes nas práticas de extensãoagroecológica decorrentes desses diferentesaportes teóricos.

A perspectiva apresentada por Sevilla Guzmánparte da premissa de que as diferentesconfigurações socioecológicas, ainda queassoladas por forças econômicas agroindustriais,

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 5

Page 4: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

se mantém e se recriam. Nesse sentido, práticas etécnicas “tradicionais” não fazem parte de umacervo estanque, que remonta a um passado depré-modernização. Sob condiçõessocioeconômicas favoráveis, essas práticasculturalmente localizadas emergem, num processode atualização dos elementos histórico-culturaistradicionalmente cultivados. Nesse sentido, osaber-fazer local não é visto como um livro dereceitas passível de ser perdido ou extraviado.Mas, antes, como uma lógica de operação e deinteração com os elementos sociais e ecológicosdisponíveis em cada contexto, submetidos aprocessos constantes de atualização. A extensãoagroecológica, informada por essa concepção,deve mais gerar as condições para ofortalecimento do potencial endógeno –principalmente no que se refere à relação com oselementos exógenos ao agroecossistema – do queassumir uma posição assimétrica de ensino eaprendizagem. Nessa perspectiva, prática políticae vivacidade sociocultural não estão dissociadas:são os centros difusores das práticasagroecológicas.

Por outro lado, a inevitabilidade do“desaparecimento”, defendida por Altieri, implicaem dissociar técnicas agronômicas locais de seucontexto social de produção, como possibilidadede transferi-las para outros locais. Essa concepçãoengendra um antagonismo interessante de serobservado: por um lado, práticas ecologicamenteajustadas teriam condições de proliferar emcontextos distintos à sua origem socioecológica ecultural; por outro, se essas origens desaparecemdiante dos processos de modernização, significaque para seu livre desenvolvimento, as diferentesespecificidades socioculturais dependeriam decerta “pureza”. Para esta visão, as especificidadesculturais perdem seu conteúdo diante do processode modernização, e se tornam homogêneas.Assim, nasceria um duplo processo depauperização: econômica e sociocultural. Diante

das irreversíveis perdas culturais, caberia àextensão agroecológica a responsabilidade depromover o fortalecimento político-econômico,disseminando técnicas e práticas ecologicamentesustentáveis, economicamente viáveis e validadaspelo conhecimento de base científica. Nessaconcepção, bem entendido, o que é “agronômico”,“econômico”, “cultural” e “político” podem serencarados como entidades autônomas.

Sem desvalorizar o mérito do esforço altierianoem reconhecer essas práticas como tãoimportantes quanto às científicas, alguns aspectosproblemáticos, talvez imprevistos, podem decorrerdessa abordagem. Em primeiro lugar, eladesconsidera a relação interdependente entreessas práticas e significados socioculturaisespecíficos que as construíram. Uma técnicaagrícola localmente elaborada, muitas vezes, estádiretamente articulada a relações de parentesco,padrões específicos de religiosidade, dinâmicaspolíticas e concepções de posse da terrahistoricamente instituídas. A mesma técnica podenão produzir o mesmo efeito em situações quenão apresentam, em dosagens específicas, amesma configuração sociocultural e ecológica.Esse “entrelaçamento” entre práticas, relações econcepções se esvai, se nos preocuparmosisoladamente com as técnicas sustentáveis. Emsegundo lugar, essa dissociação facilita a gestãodas estratégias de ação por parte de técnicos ecientistas, formados num contexto acadêmico dehiperespecialização, mas desfavorece a definiçãode processos de gestão e planejamento que partedos próprios grupos sociais.

Longe de ser uma mera “elucubração” teórica,as questões levantadas acima explicam, em parte,alguns aspectos dominantes da atuaçãoagroecológica em solo brasileiro. A prevalênciados aspectos ecológico-agronômicos naagroecologia brasileira tem sido problematizada háalgum tempo. Caporal e Costabeber (2004, p. 89),por exemplo, têm afirmado que

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)6

Page 5: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

“(...) atualmente, um importante segmentoda pesquisa e da experimentação emAgroecologia ainda se concentra em temas docampo agronômico, ou seja, se apresentabastante vinculado aos aspectos tecnológicosda produção agropecuária”.

Almeida (2003, p. 503), por sua vez, questionaa capacidade dos agentes e técnicos emagroecologia de agir de forma sistêmica2. O autorchama atenção para o fato, ainda, de que adificuldade em lidar com essa complexidade temlevado à construção de “pacotes agroecológicos”como forma de “facilitar a ação tecnológica, ametodologia e a obtenção dos resultados”(ALMEIDA, 2003, p. 503).

Nesse sentido, a tendência observada, queprivilegia os aspectos ecológico-agronômicos emdetrimento dos socioculturais, deve se constituirnum problema a ser enfrentado pelos propositoresda agroecologia. No que diz respeito ao escopodesse artigo, a questão a ser levantada reside noencontro entre extensionistas e agricultores,compreendidos aqui como representantes deuniversos socioculturais distintos e expostos a umainevitável relação de estranhamento. Em nossainserção profissional e acadêmica sobre o tema,temos recolhido uma série de relatos sobresituações de estranhamento que, no limite, têmlevado a sérios empecilhos à conclusão satisfatóriade muitos projetos de sustentabilidade de maneirageral e de agroecologia de forma particular.Sintetizamos aqui três situações que consideramosrelevantes para o tratamento do problema.

Em primeiro lugar, as diferentes concepções de“temporalidade” e “trabalho” entretécnicos/cientistas e famílias agricultoras, levam auma série de conflitos sobre a expectativa deresultados da implantação dos projetos deagricultura sustentável. A suposta “malemolência”

do caiçara e “preguiça” do caipira podemexpressar a incompreensão de técnicos ecientistas em relação a uma concepção detrabalho muito diferente daquela construída emcontextos sociais fortemente influenciados peladinâmica capitalista. O famoso lema racionalista“tempo é dinheiro”, diz muito pouco para culturasonde frequentemente se ouve que “o futuro a deuspertence”. Essas diferentes concepções de tempo– uma manipulável e outra aberta ao imponderável– podem apresentar grandes dificuldades naimplantação de projetos de sustentabilidade. Deum lado, um técnico insatisfeito com baixa adesãoaos projetos e pressionado pelas agências definanciamento; de outro, agricultores desiludidoscom grandes promessas realizadas pelosextensionistas, que “somem” com o trabalho aindainconcluso.

Em segundo lugar, o encontro entretécnicos/cientistas e famílias agricultoras tem sidoestruturado por uma relação de superioridade einferioridade. A expectativa pré-concebida sobre adinâmica desse encontro acaba por influenciardecisivamente os termos no qual a relação éefetivamente estabelecida. Certa concepçãosalvacionista e missionária de ciência – repleta desinceras boas intenções – persiste na extensãoagroecológica, que se traduz numa abordagemeducativa de “garantir acesso” ao conhecimentocientífico e contribuir politicamente para aelevação da condição de pobreza dessaspopulações. Mesmo sem intenção, essa posturaacaba por moldar uma posição de superioridadeque impede um diálogo simétrico entre osdiferentes sujeitos postos em relação.

Finalmente, a estrutura científica de formaçãode pesquisadores e técnicos, fundamentada nahiperespecialização, dificulta severamente acompreensão de realidades muito complexascomo as camponesas, indígenas ou etnicamentediferenciadas. Como vimos, nessas sociedades,

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 7

Page 6: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

uma técnica de plantio pode estar intimamenteconectada a questões socioculturais, comorelações familiares e de gênero, religiosidade ouordenações morais. Treinados para compreenderuma técnica de plantio simplesmente como umaestratégia de ajustamento ecológico e de eficiênciaeconômica, extensionistas frequentemente temdificuldades em conceber o conjunto de relaçõesque compõem certas práticas culturalmentedeterminadas. Não raro, interpretamos essescostumes como destituídos de racionalidade. Doponto de vista da antropologia contemporânea,eles são apenas guiados por outra racionalidade.

Podemos, nesse momento, realizar umapequena síntese das questões discutidas até aquisobre as implicações socioculturais envolvidas nateoria e prática agroecológica. Em primeiro lugar,vimos que, entre os autores “clássicos” daagroecologia, pairam duas abordagens sobre adiversidade cultural: de um lado saberes-fazereslocalmente enraizados – potencialmenteameaçados – reconhecidos como fonte de técnicase conhecimento aplicáveis ao cabedalagroecológico; de outro, como dinâmicas étnicasdotadas de capacidade de recriação ereconfiguração em constante processo deatualização, sendo, assim, o ponto de emergênciada própria agroecologia. Em segundo lugar, dessasdiferentes concepções decorrem respectivamentedois tipos fundamentais de extensãoagroecológica: uma extensão fortemente atreladaaos aspectos ecológico-agronômicos e, outra, quepretende mediar a relação entre a mobilizaçãoendógena e os processos exógenos implícitos naação agroecológica. Em terceiro lugar, vimos que,em solo brasileiro, o modelo tecnicista épredominante, levando, assim, a uma assimetriaentre aspectos ecológico-agronômicos esocioculturais no interior da agroecologia. Efinalmente, vimos que tal assimetria implica numprocesso de potencialização das situações de

estranhamento entre técnicos e agricultores,colocando em xeque o fundamento agroecológicodo diálogo entre saberes.

Como pode a antropologia contribuir para otratamento dessa problemática?

As contribuições da antropologiaCampo científico jovem, se comparado com a

física, e maduro, se comparado com aagroecologia, a antropologia se estruturou comociência reconhecida na segunda metade do séculoXIX, sob os auspícios da biologia, ocupando umvácuo temático deixado pelas outras ciênciashumanas e sociais. Mais coletiva que a psicologia,menos documental que a história e não atreladaao boom da modernização capitalista oitocentistacomo a sociologia, a antropologia seresponsabilizou por abordar cientificamente aenigmática e difusa figura do “outro”. Assim, aampla rubrica de “sociedades não ocidentais”passa a definir o objeto da antropologia. MauriceGodelier, antropólogo francês, prefere o escopometodológico para precisar a atuação daantropologia: o estudo de sociedades nas quais aúnica alternativa ao antropólogo seja “recorrer àobservação direta e ao inquérito oral” (GODELIER,1978, p. 50). Do século XIX até a atualidade, aantropologia foi sucessivamente ampliando seucampo de estudos, a ponto do próprio “sujeito” dainvestigação científica – o cientista – tornar-se umdos possíveis “objetos” de interesse antropológico.Nesse sentido, o recorte analítico identificado porGodelier parece mais atual do que nunca. O“outro”, então, surge aos olhos do antropólogomais como uma construção metodológica – umrecurso heurístico – do que uma distânciageográfica e culturalmente localizada, paraexpressar a miríade de modos de vida queemergem mesmo em sociedades “modernas”.

O alicerce fundamental para a edificaçãoantropológica é o conceito de cultura. Produto e,

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)8

Page 7: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

ao mesmo tempo, produtor da inserção empíricada antropologia, o conceito expressa de maneiramuito intensa o estado da arte desse campo deestudos. Para atender as necessidades específicasdo problema discutido nesse artigo, nossa opçãofoi recorrer à vertente “social” da antropologia, paraa seleção de algumas “perspectivas-sínteses” decultura que contribuam com os nossos objetivos.Feita a ressalva, podemos simplificar a três onúmero de definições que marcam astransformações do conceito ao longo da história daantropologia. Um dos pais fundadores daantropologia, Edward Tylor formula sua definiçãonos seguintes termos:

“Cultura (...), é aquele todo complexo queinclui conhecimento, crença, arte, moral, lei,costume e quaisquer outras capacidades ehábitos adquiridos pelo homem na condição demembro da sociedade. A situação da culturaentre as várias sociedades (...) é um temaadequado para o estudo de leis do pensamentoe da ação humana. De um lado, a uniformidadeque tão amplamente permeia a civilização podeser atribuída, em grande medida, à açãouniforme de causas uniformes; de outro, seusvários graus podem ser vistos como estágios dedesenvolvimento ou evolução (...)” (TYLOR,2005, p. 31).

Dessa concepção, dominante na virada dosséculos XIX e XX, é possível destacar doisaspectos importantes. O primeiro é a ideia do “todocomplexo”. Desde muito cedo, firmou-se entre osantropólogos a noção de que cada realidadesociocultural se constitui por um entrelaçamento deelementos constitutivos, mais ou menos comuns atodas as formas de humanidade. O segundo é aconcepção de “estágios de desenvolvimento ouevolução”. Nesse primeiro momento, aantropologia formulou teoricamente a ideiabastante corrente na Europa de que a diversidade

cultural deveria ser explicada em termos de“superioridade” e “inferioridade”, ou seja, entre“civilizados”, “bárbaros” e “selvagens”. Essesestágios não estariam desconectados entre si,tomados aqui por uma historicidade que vê aselvageria e a barbárie como pré-condição para acivilização. Os “inferiores” seriam, nesse sentido,“museus vivos” ou “reminiscências” fadadas aodesaparecimento. O fascínio dos antropólogosevolucionistas pelos “costumes selvagens” levouLewis Henry Morgan, outro “pai” da antropologia,afirmar que

“(...) a vida cultural das tribos índiasdegenera sob a influência da civilizaçãoamericana; as técnicas e as línguasdesaparecem, as instituições dissolvem-se. (...)Fazemos um apelo urgente para que abordemeste vasto domínio e colham os frutos de tãorica seara” (MORGAN, 1978, p. 8-10).

Todas as gerações posteriores de antropólogosfizeram por destruir essa perspectiva evolucionistade explicação sobre a diversidade cultural. Noentanto, parece que, mesmo com este esforço, aantropologia clássica contribuiu para a fixação deuma matriz cognitiva muito persistente noarcabouço cultural das sociedades industrializadase científicas. Como é fácil perceber, essasconcepções, que envolvem o lugar da diversidadecultural no mundo contemporâneo, pairam atéhoje...

A reflexão crítica sobre a visão doevolucionismo antropológico levou a manutençãodo “todo complexo” que envolve as configuraçõessocioculturais e prescindiu da noção de“evolução”. Bronislaw Malinowski foi fundamentalnesse esforço. Vejamos:

A) A cultura é essencialmente um aparatoinstrumental; através dela o homem é colocadoem posição de melhor tratar os problemas

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 9

Page 8: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

concretos e específicos que enfrenta em seuambiente, no decurso da satisfação de suasnecessidades; B) é um sistema de objetos,atividades e atitudes no qual cada uma daspartes existe como um meio para um fim; C) éuma totalidade, em que os diversos elementossão interdependentes; D) tais atividades,atitudes e objetos estão organizados em tornode tarefas importantes e vitais, em instituiçõescomo a família, o clã, a comunidade local, atribo e as equipes organizadas em atividadespolíticas, legais, educacionais e de atividadeeconômicas. (...) É uma totalidade que nãopodemos retalhar, isolando objetos da culturamaterial, sociologia pura ou linguagem com umsistema contido em si mesmo (MALINOWSKI,1986, p. 171-172).

Muito importante nessa passagem é a ênfaseno processo de constituição interna das culturas,vistas como totalidades que se organizam trêsníveis – materialidade, ações e propriedadessimbólicas – que se entrelaçam em termos de“função” para a manutenção do “sistema”. Essaperspectiva funcionalista de cultura teve grandeimpacto no pensamento antropológico. Ela induziuo fortalecimento de uma interpretação relativistadas diferenças, tomando as realidades culturaiscomo únicas, sem qualificá-las em graushierárquicos de evolução. Além disso, levou outrogrande antropólogo da primeira metade do séculoXX, Marcel Mauss, a afirmar que a maior parte dassociedades constitui-se por “fatos sociais totais”,nos quais se exprimem

“ao mesmo tempo e de uma só vez, todaespécie de instituições: religiosas, jurídicas,morais (...) e econômicas – supondo formasparticulares de produção e consumo, (...) semcontar os fenômenos estéticos nos quaisdesembocam tais fatos e os fenômenosmorfológicos que manifestam essas instituições”

(MAUSS, 1992, p. 41).

Claude Lévi-Strauss adverte que, para Mauss,a ideia de fato social total não exprime ahomogeneidade dos elementos socioculturais,mas, antes, uma totalidade

“(...) folheada (...) e formada de umamultidão de planos distintos e justapostos. (...)Esta totalidade não suprime o caráterespecífico dos fenômenos (...), de tal modo queela consiste, em suma, na rede de inter-relações funcionais entre todos esses planos”(LÉVI-STRAUSS, 1973. p. 14).

A concepção de cultura como totalidades “nãoretalháveis” contribuiu também, como veremos,para a definição de uma orientação teórico-metodológica própria da antropologia. Mas foiduramente criticada tanto por desprezar osaspectos “invisíveis” de constituição das diferentesculturas, quanto por não explicar de formaadequada a relação entre as diferentesconfigurações socioculturais (LÉVI-STRAUSS,1970; GODELIER, 1978).

A contribuição estruturalista de Claude Lévi-Strauss (1973) foi tentar compreender as “opçõessecretas”3 que possibilitam a articulação dessasrelações em cada configuração sociocultural, apartir de um jogo de interações entre os elementoscognitivos do inconsciente humano e as condiçõesecológicas nas quais cada sociedade se realiza.Gregory Bateson, a partir de um longo e tortuosopercurso acadêmico que passa pela antropologia,ecologia, psiquiatria e pela teoria da informação,analisou as relações entre “organismos maisambiente” através de uma perspectiva ecológicasobre a percepção. Essa teorização busca darconta de uma epistemologia das relações entre osseres e o ambiente. Parte do princípio de que asrelações metabólicas entre os indivíduos e seuscontextos nunca estabelecem por si mesmas, mas

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)10

Page 9: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

são mediadas através das percepções econcepções. Para a existência de uma ecologia‘ecossistêmica’, é inevitável, para o autor, uma“ecologia da mente" (BATESON, 1972).

As abordagens de Lévi-Strauss e Bateson – queproduziram intensamente de 1930 a 1980 – sobrea análise das interdependências exerceram grandeinfluência no debate contemporâneo daantropologia. Nos últimos trinta anos, há umsignificativo esforço de se refletir sobre essaarticulação entre propriedades simbólicas epráticas sociais de uma perspectiva que nãoprivilegie os processos de constituição dasidentidades, mas para compreender como cadaconfiguração socioecológica se constitui e serelaciona com elementos exteriores às suaspróprias fronteiras. Como é possível definir culturadentro dessa interpretação?

Uma cultura não é um sistema de crenças,mas antes – já que deve ser algo – um conjuntode estruturações potenciais da experiência,capaz de suportar conteúdos tradicionaisvariados e de absorver novos: ela é umdispositivo culturante ou constituinte deprocessamento de crenças. Mesmo no planoconstituído da cultura culturada, penso que émais interessante indagarmos das condiçõesque facultam a certas culturas atribuir ascrenças alheias um estatuto desuplementaridade ou de alternatividade emrelação às próprias crenças. (VIVEIROS DECASTRO, 2002a, p. 209).

Essa perspectiva, denominada de economiasimbólica da alteridade, traz aspectos muitoimportantes para superar uma tendência – dentro efora da antropologia – de essencialização dasidentidades e práticas culturais. Compreende-se,nessa visão, que os elementos “exteriores” sãoutilizados a partir de uma lógica interna que seapropria deles de forma particular e diferente de

outras configurações socioculturais. Isso nãosignifica que não existam situações no qual arelação com o exógeno se traduza emdesestruturação completa. Mas, evidencia apossibilidade dos processos de desestruturaçãocultural serem mais um “decreto” de um olharexterno pouco acurado do que uma situaçãoefetiva. O contato e incorporação de elementosexteriores se constituem, na maior parte dasvezes, como fundamentos da formação eatualização das particularidades culturais.

Essa noção “centrípeta” de cultura trazconsequências importantes. A noção de totalidadesistêmica, com fronteiras bem definidas, perdesentido. Mais adequado seria pensarmos em“redes sociotécnicas” como pretende Latour(1994), “esquemas de práxis” como sugereDescola (2000), ou ainda “sociabilidadesrelacionais” como propõe Ingold (2000). Outradecorrência importante é que, se as fronteirasentre o endógeno e o exógeno tornam-se difusas,isso não é só válido para a relação entresociedades, mas também entre o “social” e o“natural”. Para esses autores, os intercruzamentossão tantos e dos mais diversos matizes, que já nãofaz muito sentido distinguir estes campos deexistência. Isso tem levado a reformulaçõessurpreendentes: de um lado, estudos etnológicostêm sugerido que a mentalidade ameríndia tratatanto os aspectos “sociais” quanto os “naturais”como uma grande comunidade de sujeitos nosquais os seres humanos são apenas um dos seuspartícipes4 (VIVEIROS DE CASTRO, 2002a). Poroutro, estudos arqueológicos defendem a tese deque não é mais possível pensar na Amazôniacomo um refúgio da natureza intocada, devido aofato da ação ameríndia ter sido decisiva noprocesso de constituição de sua paisagem ebiodiversidade (BALEÉ, 1994; NEVES, 1999).Desse modo, faria mais sentido pensar numaecologia com aspectos culturalmente construídos(VIVEIROS DE CASTRO, 2002a). Corrobora com

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 11

Page 10: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

esta tendência a perspectiva latouriana, que afirmaque nas sociedades tecnocientíficas, quanto maistentamos objetivar e manipular a “natureza” maisnos misturamos a ela. Estaríamos, assim, imersosem artefatos híbridos de “natureza” e “cultura”(LATOUR, 1994).

A partir desse caminho percorrido pelaantropologia temos, então, condições de analisar asua primeira contribuição à Agroecologia. Noencontro entre dois universos socioculturais,representados pela figura do extensionista e doagricultor, é necessário considerar que doisdiferentes modos de ser e estar no mundo entramem contato. Objetos, técnicas, tecnologias,relações e concepções sobre “sociedade” e“natureza” se articulam de forma complexa ediversa. O entendimento de como se dão essesdois universos, assim como a forma pela qualpodem interagir, é fundamental para o êxito dasatividades e dos projetos propostos. Isso éespecialmente importante se considerarmos que asimpressões derivadas do estranhamento inicial –muitas vezes, alimentadas por concepçõesanteriores ao próprio encontro – podem persistir,gerando consequências marcantes. Sem o esforçode ultrapassar a superficialidade dessas primeirasimpressões, corre-se o risco de se cristalizar aquiloque os psicólogos denominam de “viés deconfirmação” (MENDEL et al. 2011): a busca peloentendimento do outro fica restrita à necessidadede legitimar ideias pré-concebidas e socialmenteestabelecidas como “verdade”. Aqui, a hipótesesempre produz a tese. Esse processo, muitasvezes, consiste na projeção de nossas certezas evalores sobre o outro, impedindo-nos de “ver” suacondição existencial nos seus próprios termos,condições, conceitos e valores. Sem osinstrumentos teórico-metodológicos adequados, apossibilidade de emergência das situações deestranhamento, como relatadas na primeira partedesse artigo, é eminente. Quais são as estratégias

que a antropologia dispõe para ultrapassar abarreira do estranhamento? Como alcançar umaforma de análise na qual aspectos objetivos esubjetivos de constituição das configuraçõessocioculturais sejam atendidos?

O que a antropologia propõe para a resoluçãodessa problemática é a busca pela alteridade.Atento a esse dilema, Malinowski fundamentou suaexperiência etnográfica num processo comumentedenominado de observação participante, apesquisa de campo no qual o antropólogo devepartilhar a convivência com o grupo estudado. Elase constitui a partir de um duplo movimento deobservação: um exterior ao grupo, que permiteuma interpretação global da cultura estudada; eoutro, interior, que visa “compreender o ponto devista do nativo, a sua relação com a vida, percebera sua visão do mundo” (MALINOWSKI, 1976, p.36). Esse duplo posicionamento analítico pode serconsiderado como uma importante contribuição daantropologia para a discursividade científica: acombinação de um princípio explicativo – típico deuma relação sujeito/objeto – com um princípiocompreensivo de apreensão da dinâmicasociocultural, a partir de um deslocamentosubjetivo (LÉVI-STRAUSS, 1973). Esse processonão se realiza sem uma entrega existencial dopesquisador que, não raro, passa por umaexperiência subjetiva marcante para a sua vida.Dentre tantos exemplos possíveis na literaturaantropológica, vale a pena ler a posição de Lévi-Strauss sobre o assunto:

Cada vez que está em seu campo de ação,o etnólogo vê-se abandonado a um mundoonde tudo lhe é estrangeiro, frequentementehostil. Não tem senão este eu, do qual dispõeainda, para permitir-lhe sobreviver e fazer suapesquisa; mas um eu física e moralmenteabatido pela fadiga, pela fome, o desconforto, ochoque com os hábitos adquiridos, o

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)12

Page 11: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

surgimento de preconceitos no qual nemsuspeitava; e que se descobre a si mesmonessa conjuntura estranha (...). Na experiênciaetnográfica, (...), o observador coloca-se comoseu próprio instrumento de observação.Evidentemente precisa aprender a conhecer-se,a obter um si-mesmo, (...), uma avaliação quese tornará parte integrante da observação deoutras individualidades. (...) Porque paraconseguir aceitar-se nos outros, é necessário,primeiro, recusar-se a si mesmo (LÉVI-STRAUSS, 1973, p.44).

Assim, a alteridade traz um “efeito colateral”interessantíssimo, de implicações até hoje nãototalmente exploradas: o “colocar-se no lugar dooutro” exige do antropólogo certo “abandono” de simesmo, uma “desnaturalização” de suas própriaspráticas e concepções, por meio de um processode descentramento, no qual a objetividade éalcançada por uma espécie de transição entresubjetividades. A partir da relativização de suaspróprias verdades, o antropólogo tem condições denão somente explicar, mas também compreender asociedade a que se propõe estudar. O olhar “porsobre os ombros” (GEERTZ, 1989, p. 321)daqueles que são analisados, permite captar aconexão entre os objetos materiais, as ações e as

intencionalidades que constituem determinadaespecificidade cultural.

Nesse sentido, o processo de produção daalteridade possibilita colocar “aspas” nos modosocidentais de articulação entre cosmologias epráticas, na medida em que nos colocamos numponto de vista exterior à nossa própria experiênciatardiamente moderna. Podemos, assim, atribuir ànossa configuração sociocultural o mesmotratamento lógico que é dispensado aos gruposnão ocidentais. Ou seja, devemos concebernossas concepções/práticas não como valoresuniversais ou fatos científicos incontestáveis, mascomo um campo de possibilidades (FOUCAULT,2000) nos quais diferentes realidades podememergir.

Isso nos leva à segunda contribuiçãoantropológica para a Agroecologia: o princípio dasimetria. O esforço de compreender o pensamentomítico e científico como diferentes, mas nãodesiguais, remonta aos trabalhos de Lévi-Strauss(1989) e aos debates entre sociologia eantropologia da ciência , sendo proposta por DavidBloor (2008) através do Programa Forte deSociologia da Ciência. Com o objetivo deevidenciar os fatores socioculturais comoprodutores não só da institucionalidade científica,mas, também, do próprio conteúdo teórico das

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 13

Figura 1: Alteridade como deslocamento

Page 12: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

ciências, Bloor formula a simetria como um dosquatros postulados metodológicos de sua proposta:causalidade, imparcialidade, simetria ereflexividade. A simetria, para Bloor, garante arelativização da pretensão à verdade almejadapelo discurso científico, pois dá o mesmo valor aos“erros” e “acertos”. Desse modo, a análise daciência

“(...) deverá ser simétrica em seu estilo deexplicação. Os mesmos tipos de causa deverãoexplicar, digamos, crenças falsas e verdadeiras”(BLOOR, 2008, p. 21).

Ou seja, o importante é superar o julgamento devalor sobre o que é “fato” e “ilusão”, que segundo oautor, obscurece o entendimento sobre o processode formação das concepções sobre a realidade,gerando, assim discursos “vencedores” e“vencidos”. Não se trata, contudo, de umaconcessão ao relativismo e construtivismo radical,onde tudo é possível, mas, antes, de encontrar umcaminho para compreender as diferentes formas deelaborar conceitualmente os elementos do mundo.

A incorporação da simetria ao discursoantropológico foi empreendida por Callon (1986) esistematizada Latour (1994), a partir de umareflexão crítica sobre o conceito. Para os doisprimeiros autores, a proposta de Bloor configura-secomo uma simetria “restrita”, ou digamos, umasimetria assimétrica, pois ela não rompe com asbarreiras ontológicas de separação entresociedade e natureza. Latour propõe, então, oprincípio da simetria generalizada, que engloba aposição de Bloor e a expande para a relação entrehumanos e não humanos. Essa possibilidade seefetiva para Latour (1994, p. 101-102) em trêspassos metodológicos fundamentais: [1] explicar“com os mesmos termos as verdades e os erros –é o primeiro princípio de simetria (restrita)”; [2]estudar “ao mesmo tempo a produção dos

humanos e dos não humanos – é o princípio dasimetria generalizada”; [3] finalmente, ocupar “umaposição intermediária entre os terrenos tradicionaise os novos, porque suspende toda e qualquerafirmação a respeito daquilo que distinguiria osocidentais dos outros”. Ou seja, como umadecorrência do desdobramento do procedimentosimétrico dos erros e das verdades para asrelações entre ‘natureza’ e ‘sociedade’, Latouradvoga uma posição intermediária ao antropólogo,que lhe permite transitar, por exemplo, entreameríndios e físicos, para descrever as respectivasredes sociotécnicas que formularam as suasdiferentes relações entre natureza e de sociedade.

Finalmente, alteridade e simetria são recursosteórico-metodológicos que, acreditamos, podemcontribuir significativamente para a realização dodiálogo entre saberes previsto pela agroecologia.Em primeiro lugar, as práticas de alteridade podemcriar as vias de acesso à complexidade dasdiferentes configurações socioecológicas a partirdo entendimento de como se dão as articulaçõesentre os aspectos tangíveis (elementos, objetos,instrumentos e práticas) e os intangíveis (relações,normas, valores e conceitos). Em segundo lugar, oexercício da alteridade permite, também, aconstrução de uma postura crítica em relação aosvalores do próprio pesquisador/extensionista, noque se refere aos status – e condições sociais deprodução – do conhecimento científico. Em terceirolugar, ao permitir um acesso privilegiado ao “outro”e uma postura vigilante em relação ao “eu”, aalteridade engendra uma condição simétrica entreos diversos saberes e fazeres articulados naprática agroecológica. Nesse sentido, saberescientíficos e saberes localmente enraizados devemser ambos compreendidos como produtossocioecológicos e culturais, diferentes emaplicações e resultados, mas simétricos enquantoestratégias válidas de conhecimento e ação sobreo mundo. Concebê-los como conhecimentos

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)14

Page 13: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

“inferiores” e “superiores” está fora de questão parao pensamento antropológico contemporâneo.

Conclusão: o agroecólogo como aprendizA problematização sobre a dimensão

sociocultural no interior da agroecologia nos levoua quatro questões fundamentais que, por sua vez,estimularam a nossa proposta de aproximaçãoteórico-metodológica com a antropologia. São elas:(1) dentre os autores paradigmáticos daagroecologia, podem ser encontradas duasabordagens sobre a diversidade cultural: de umlado saberes-fazeres localmente enraizados epotencialmente ameaçados como fonte de técnicase conhecimentos aplicáveis ao universoagroecológico e, ao mesmo tempo, alvo de suasações agronômicas e político-econômicas; deoutro, dinâmicas socioculturais dotadas decapacidade de recriação e reconfiguração emconstante processo de atualização, sendo,portanto, o ponto de emergência da própriaagroecologia; (2) dessas diferentes concepções,decorrem respectivamente dois tipos de extensãoagroecológica: uma atrelada aos aspectosecológico-agronômicos e, outra, à mobilizaçãoendógena em relação aos processos exógenosimplícitos na ação agroecológica; (3) o modelotecnicista tem levado a uma assimetria entre osaspectos ecológico-agronômicos e ossocioculturais no interior da agroecologia; e,finalmente, (4) que isso implica num processo depotencialização das situações de estranhamentoentre técnicos e agricultores, colocando em xequeo fundamento agroecológico do diálogo entresaberes.

Nossa proposta é que uma extensãoagroecológica que respeite o fundamento acimamencionado pode encontrar buscar naantropologia as bases de sua ação. Considerando-se que os fundamentos teóricos não estãodissociados da ação, mas que, ao contrário, estão

intimamente relacionados, nosso ponto de partidafoi compreender o conceito de culturahistoricamente lapidado pela experiênciaantropológica. Genericamente, ele atende a duascaracterísticas: (1) compõem-se de articulaçãocomplexa e, até certo ponto, específica entre umamiríade de elementos (ecológicos, econômicos,sociais, políticos e conceituais) que formam umaconfiguração; (2) essa configuração, longe de seruma peça estanque, passa por constantesprocessos de atualização a partir da capacidadede interagir elementos endógenos e exógenos.Vimos também, que o “acesso” antropológico aessas configurações se dá através das (1) práticasde alteridade, que permite uma análise que integraprincípios explicativos e compreensivos; e (2) doprocedimento valorativo simétrico, ou seja, queanalisa diferentes concepções com os mesmosinstrumentos e condições, para além da dicotomiaentre “erro” e “verdade”, “inferior” e “superior” ou“simples” e “complexo”.

Como esses elementos podem contribuir para aextensão agroecológica? Mais do que umcatalogador e disseminador de técnicas e práticas,seria interessante ao agroecólogo (1) compreendercomo determinada prática ou técnica se articulacom outras dimensões e aspectos da configuraçãosociocultural – relações de parentesco,concepções religiosas, relações de gênero egeração, dentre outros – buscando captar asformas de atribuição de sentido (VIVEIROS DECASTRO, 2002b) do ponto de vista daqueles estãoimersos nesses contextos; (2) compreender comodeterminada realidade sociocultural se apropria earticula elementos internos e externos; para, então(3) agir como um mediador entre essasconfigurações e os conhecimentos, práticas etécnicas oriundos de outras realidades (científicasou não). A posição de mediador, mais do queportador, não implica que não se devam promoverintercâmbios de práticas e técnicas, mas, que

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 15

Page 14: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

essas trocas possam ser realizadas respeitando-sea lógica de organização e articulação própria decada realidade cultural.

Não se trata, portanto, de uma extensão quetenta “bloquear” os processos de intercâmbio entreas especificidades culturais e a sociedade“moderna”, para proteger uma pretensa pureza, tãoidílica quanto inexistente. Também não se trata defacilitar o “acesso ao mercado” a todo e qualquercusto, em nome da urgência econômica e dodecreto sobre o desaparecimento da singelezacultural. Mas, antes, de captar e contribuir com asdinâmicas endógenas de apropriação eatualização dos modos de vida, de forma a garantira autonomia político-econômica e as práticas desustentabilidade específicas de cada realidade.

Isso implica numa nova relação doextensionista com as tradicionais técnicas deinserção a aproximação agroecológica, tais comoos Diagnósticos Rurais Participativos (DRP’s). Deum lado, esses instrumentos podem servir comouma primeira aproximação, mas dificilmente sãocapazes de abarcar toda a riqueza de relações queconstitui um determinado grupo ou sociedade. Poroutro, mesmo as informações obtidas por essesmétodos podem ser lidas de forma mais sutil doque um dado factual. Ou seja, é mais importante osignificado e sentido que expressa a informação doque a informação em si. Um “sim” pode ser um“não”, um “talvez”, ou mesmo um simples “sim”,dependendo das condições nas quais foi formuladaa pergunta. Essa riqueza de relações entreaspectos tangíveis e intangíveis só pode serapreendida se adotamos uma posição de aprendizem relação ao modo de vida do outro. Assim,temos condições de compreender adequadamentee agir coerentemente com a perspectiva daquelesque são “alvo” e parte constitutiva dos projetos deagroecologia. Isso permite a frutificação de umambiente não estruturado por relações hierárquicasde ensino-aprendizagem, que possibilita o

intercâmbio não só de práticas e técnicas, mastambém de processos de definição de estratégias,a partir da criação de condições para processos deconstrução coletiva da decisão. Essa perspectivapode ultrapassar as convencionais táticas“participativas”, tão presentes nas iniciativas desustentabilidade.

Finalmente, talvez seja nesse sentidoantropológico que a diretriz “não há docência semdiscência”, formulada por Paulo Freire (1996,p.21), tenha seu significado mais amplo e efetivo.Essa perspectiva – tão anunciada quanto malinterpretada nas hostes do socioambientalismo –talvez tenha mais a dizer sobre o aprendizado demodos de conhecer, agir e apropriar, do que sobreações, técnicas e objetos desconectados dos seuscontextos de produção. Nada mais apropriado,então, do que o agroecólogo na condição deaprendiz dos mundos por anda caminha.

Notas1 Duas considerações acerca do conceito: (1)

compreende-se por “estranhamento” a condição deperplexidade diante do “outro”, ou seja, aqueleque, de alguma maneira, não gera a identificaçãoimediata com a “nossa” forma de viver; (2) enfatiza-se que a situação de estranhamento não se reduzao encontro especificamente tratado neste artigo(cientista e técnicos, de um lado, e agricultores, deoutro), mas trata-se de um fenômeno amplo einerente a todo “encontro” vivenciado pelaexperiência humana.

2 Apesar da análise empreendida por Almeida(2003) ser circunscrita às atividadesagroecológicas realizadas no Rio Grande do Sul,nossa inserção sobre o tema permite-nos tomarsuas conclusões como um importante indicativosobre a situação em contextos mais amplos.

3 A busca por uma lógica que orienta asconfigurações socioculturais é a buscafundamental do autor: “cada vez mais, a etnologia

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)16

Page 15: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

moderna dedica-se menos a erigir um inventário detraços separados, do que a descobrir as origenssecretas dessas opções” (LÉVI-STRAUSS, 1973. p.349). Essas origens, para o autor, residem nas“estruturas” do inconsciente humano, que seconstituem de propriedades universais, mas, apartir das interações com condições sociais eecológicas específicas, combinam-se de maneiraparticular, gerando, assim diferentes modos de sere agir no mundo.

4 No perspectivismo, “(...) os animais sãogente, ou se vêem como pessoas. Tal concepçãoestá quase sempre associada à ideia de que aforma manifesta de cada espécie é um envoltório(uma 'roupa') a esconder uma forma internahumana, normalmente visível apenas aos olhos daprópria espécie ou de certos seres trans-específicos, como os xamãs. Essa forma interna doespírito do animal: uma intencionalidade ousubjetividade formalmente idêntica a consciênciahumana, materializável, digamos assim, em umesquema corporal humano oculto sob a máscaraanimal. Teríamos então, a primeira vista, umadistinção entre uma essência antropomorfa de tipoespiritual, comum aos seres animados, e umaaparência corporal variável, característica de cadaespécie, mas que não seria um atributo fixo, e simuma roupa trocável e descartável. A noção de'roupa' é, com efeito, uma das expressõesprivilegiadas da metamorfose - espíritos, mortos examãs que assumem formas animais, bichos queviram outros bichos, humanos que sãoinadvertidamente mudados em animais -, processoonipresente no "mundo altamentetransformacional" (...) proposto pelas culturasamazônicas (VIVEIROS DE CASTRO, 2002,p.351).

5 Nas palavras do próprio autor: “(...) Em lugarde opor magia e ciência, seria melhor colocá-lasem paralelo, como dois modos de conhecimentodesiguais quanto aos resultados teóricos e práticos

(...), mas não devido à espécie de operaçõesmentais que ambas supõe e que diferem menosna natureza que na função dos tipos defenômenos aos quais são aplicadas” (LÉVI-STRAUSS, 2007, p. 28).

Referências BibliográficasALMEIDA, J. A agroecologia entre o movimento

social e a domesticação pelo mercado. EnsaiosFEE, Porto Alegre, v. 24, n. 2, p. 499-520, 2003.Disponível em:<http://www.ufrgs.br/pgdr/textosabertos/ensaio_agroecologia.pdf>. Acesso em: 12 jan. 2011.

ALTIERI, M. Agroecologia: a dinâmicaprodutiva da agricultura sustentável. PortoAlegre: Editora Universidade/UFRGS, 2001.

BALÉE, W. Footprints of the Forest: Ka'aporethnobotany - the historical ecology of plantutilization by an Amazonian people. NewYork: Columbia University Press. 1994.

BATESON, G. Steps to an Ecology of Mind:Collected Essays in Anthropology,Psychiatry, Evolution, and Epistemology.Chicago: University Of Chicago Press, 1972.

BLOOR, D. Conhecimento e imaginário social.São Paulo: Ed. Unesp, 2009.

CALLON M., Elements pour une sociologie de latraduction. La domestication des coquilles Saint-Jacques et des marins pecheurs en baie deSaint-Brieuc, L 'Anee sociologique, vol. 36, p.169-208,1986.

CAPORAL, F.R.; COSTABEBER, J.A.Agroecologia e extensão rural: contribuiçõespara a promoção do desenvolvimento ruralsustentável. Brasília: MDA/SAF/DATER, 2004.

DESCOLA, P. Ecologia e Cosmologia. In:DIEGUES, A. C. (Org) Etnoconservação:novos rumos para a proteção da naturezanos trópicos. São Paulo. Hucitec, 2000.

FOUCAULT, M. O sujeito e o poder. In: DREYFUS,H. L. & RABINOW, P. Michel Foucault: UmaTrajetória Filosófica – Para além doestruturalismo e da hermenêutica. Rio deJaneiro. Forense Universitária, 2000.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia – saberesnecessários à prática educativa. São Paulo:Paz e Terra, 1996.

GEERTZ, C. A Interpretação das Culturas. Riode Janeiro: Guanabara, 1989.

Na encruzilhada dos saberes

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012) 17

Page 16: Na encruzilhada dos saberes e práticas: inserções antropológicas ...

GLIESSMAN, S.R. Agroecologia: procesosecológicos en agricultura sostenible.Turrialba: CATIE, 2002.

GODELIER. M. Horizontes da antropologia.Lisboa: Edições 70, 1978.

GUZMAN CASADO et al. Introducción a laagroecologia como desarrollo ruralsostenible. Madrid: Ediciones Mundi-Prensa,2000.

INGOLD, T. A Evolução da sociedade. In: FABIAN,A. (org.) A Evolução: a sociedade, a ciência eo universo. Lisboa: Terramar, 2000.

LATOUR, B. Jamais Fomos Modernos. Ensaiode Antropologia Simétrica. Rio de Janeiro:Editora 34, 1994.

LÉVI-STRAUSS, C. Antropologia estrutural dois.Rio Janeiro: Tempo Brasileiro, 1973.

LEVI-STRAUSS, C. Antropologia Estrutural. Riode janeiro: Tempo Universitário, 1970.

LEVI-STRAUSS, C. O Pensamento Selvagem.Campinas: Papirus, 2007.

MALINOWSKI, B. A teoria funcional. In: DURHAM,E. Malinowski. São Paulo: Ática, 1986.

MALINOWSKI, B. Argonautas do pacificoocidental: um relato do empreendimento e daaventura dos nativos nos arquipélagos daNova Guiné melanesia. São Paulo: AbrilCultural, 1976.

MAUSS, M. Sociologia e Antropologia. SãoPaulo. EPU/EDUSP. 1992.

MENDEL, R. Confirmation bias why psychiatristsstick to wrong preliminary diagnoses.Psychological Medicine. 41, 2651–2659, 2011.

MORGAN, L. H. A sociedade primitiva. Lisboa:Presença/Martins Fontes, 1978.

NEVES, E. G. Changing Perspectives inAmazonian Archaeology. In: ALBERTI, B. (ed.)Archaeology in Latin America. London:Routledge, 1999.

SEVILLA GUZMAN, E. Uma estratégia desustentabilidade a partir da Agroecologia.Agroecologia e Desenvolvimento RuralSustentável, Porto Alegre, v.2, n. 1, p. 35-45,jan./mar. 2001.

TYLOR, E. B. A ciência da cultura. In: CASTRO, C.Evolucionismo cultural: textos de Morgan,Tylor e Frazer. Rio de Janeiro: Jorge ZaharEditor, 2005.

VIVEIROS DE CASTRO, E. A inconstância daalma selvagem e outros ensaios de

antropologia. São Paulo: Cosac & Naify,2002a.

VIVEIROS DE CASTRO, E. O nativo relativo.Mana,  Rio de Janeiro,  v. 8,  n. 1, abr.  2002.  Disponível em<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-93132002000100005&lng=pt&nrm=iso>.Acesso em  28  jan.  2012.

Silva Júnior & De Biase

Rev. Bras. de Agroecologia. 7(2): 3-18 (2012)18