Museu Patek Philippe. A herança do tempo · pek & Cia. (1839-1845) e Patek & Cia. (1845-1851):...

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Museu Patek Philippe. A herança do tempo m museu vale pelo seu espólio, mas tam- bém pela sua auréola. O Museu Patek Philippe é rico intrinseca e extrinsecamente, conseguindo incutir no visitante um senti- mento místico que o transforma num autêntico templo... do tempo. Instalada num edifício erigido no início do século XX com passado ligado à joalharia e à relojoaria, a instituição abriu as suas portas em 2001 e tem o grande mérito de conseguir relatar fisicamente a história da paixão relojoeira e de todas as artes que lhe estão associadas – com colecções de relógios, instrumentos, autómatos e esmaltagem que vão desde o século XVI até aos nossos dias. Mas, para além da técnica e da estética, também encer- ra um valioso acervo teórico numa biblioteca com milhares de obras relacionadas com a temática do tempo e a arte de o medir. Através de ponteiros, mostradores, imagens, sons ou palavras, o Museu Patek Philippe é, sobretudo, um monumento à genialidade humana e ao posicionamento do homem no seu mundo... MARCA DE PRESTÍGIO Com origens que remontam à fundação da manufactura Patek, Czapek & Cia., em 1839, e adoptando a sua designação actual em 1851, a Patek Philippe logrou manter desde sempre uma imaculada reputação no universo relojoeiro e essa auréola de excelência é bem traduzida pelos recordes estabelecidos pelas suas peças nos grandes leilões realizados por esse mundo fora. Antoine Norbert de Patek e François Czapek, dois polacos exilados em Genebra, lançaram as bases da companhia. Cinco anos depois, em 1844, numa exposição parisiense, o talentoso relojoeiro francês Jean Adrien Philippe apresentou uma peça revolucionária que não foi devi- damente notada pela maior parte das pessoas... mas que foi justamente apreciada por Antoine Norbert de Patek. A empatia entre ambos e o de- sentendimento com Czapek resultaria numa associação que ficou para a posteridade sob o nome de Patek Philippe, com Jean Adrien a ser bem sucedido na sua demanda pessoal de um sistema fiável que servisse simultaneamente para carregar um relógio e para acertar as horas: estava finalmente dispensada a chave de dar corda, substituída pela coroa. Foi para celebrar o percurso da casa genebrina que em 1989, na comemoração dos 150 anos da marca, o presidente Philippe Stern de- cidiu transformar a sua colecção privada de mais de duas mil peças num museu. A inauguração foi efectuada no dia 8 de Novembro de 2001; o lote consagrava sobretudo peças antigas do património eu- ropeu anteriores à fundação da Patek Philippe (especialmente as que foram criadas em Genebra) e a história da companhia através de algu- mas das suas mais prodigiosas criações. O valor histórico, o carácter tecnicamente inovador e a grande variedade estética dos relógios Patek Philippe reunidos no museu provam que a manufactura genebrina é a única que se pode gabar de apresentar um espólio tão completo e tão representativo da arte relojoeira de Genebra dos séculos XIX e XX. A decoração do edifício foi feita pela mulher do presidente da Patek Philippe, Gerdi Stern, que soube dar ao espaço público a atmosfera calorosa de um salão privado com a ajuda dos arquitectos Jackie Nyfeller (para o interior) e Massimo Bianco (também autor do traçado exterior da nova manufactura da marca em Plan-les-Ouates). O objecti- vo era renovar um prédio antigo respeitando a sua história e dotando- o de uma expressão contemporânea; criar um ‘museu de alta-costura’. A harmonia alcançada transformou-o num estojo ideal para a cele- bração da cultura relojoeira através dos tempos – e traduz bem tudo o que a marca Patek Philippe representa: classe pura e intemporal. Os materiais usados no interior foram criteriosamente escolhidos em função da qualidade e respectivas cores: granito americano para o chão, pedra provençal para as paredes, serpentina dos Alpes para os frisos, mármore espanhol para a entrada e escadarias – juntamente com as madeiras, os tecidos e a iluminação escolhidas, o conjunto oferece uma atmosfera de harmonia e serenidade ideal para o visitante... A ENTRADA O Museu Patek Philippe fica situado numa esquina da Rue des Vieux Grenadiers, no quarteirão de Plainpalais em Genebra – e a sua facha- da inspira imediatamente respeito. Lá dentro, um lanço de degraus conduz à recepção e logo depois a uma sala de outros tempos: sob o Cuidadosamente preparado para desvelar cinco séculos na arte da medição do tempo, o Museu Patek Philippe é talvez o mais belo museu de relojoaria do mundo — e os seus quatro andares constituem uma autêntica viagem transgeracional que é, simultaneamente, uma homenagem ao génio humano. ESPIRAL | 047 046 | ESPIRAL por Miguel Seabra fotos Nuno Correia e arquivo Patek Philippe 01. Entrada do Museu Patek Philippe, em pleno coração de Genebra. Situado numa esquina da Rue des Vieux Grenadiers e ao lado da Plaine de Plainpalais, o edifí- cio data de inícios do século XX. Foto Nuno Correia 01. U S P EDITORIAL SUMÁRIO PERFIL CORREIO LEITOR CALEIDOSCÓPIO EM FOCO REPORTAGEM HISTÓRIA CRÓNICA ENTREVISTA TÉCNICA

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Museu Patek Philippe.A herança do tempo

m museu vale pelo seu espólio, mas tam-

bém pela sua auréola. O Museu Patek

Philippe é rico intrinseca e extrinsecamente,

conseguindo incutir no visitante um senti-

mento místico que o transforma num

autêntico templo... do tempo.

Instalada num edifício erigido no início do

século XX com passado ligado à joalharia e à

relojoaria, a instituição abriu as suas portas em 2001 e tem o grande

mérito de conseguir relatar fisicamente a história da paixão relojoeira e

de todas as artes que lhe estão associadas – com colecções de relógios,

instrumentos, autómatos e esmaltagem que vão desde o século XVI até

aos nossos dias. Mas, para além da técnica e da estética, também encer-

ra um valioso acervo teórico numa biblioteca com milhares de obras

relacionadas com a temática do tempo e a arte de o medir. Através de

ponteiros, mostradores, imagens, sons ou palavras, o Museu Patek

Philippe é, sobretudo, um monumento à genialidade humana e ao

posicionamento do homem no seu mundo...

MARCA DE PRESTÍGIO

Com origens que remontam à fundação da manufactura Patek, Czapek

& Cia., em 1839, e adoptando a sua designação actual em 1851, a Patek

Philippe logrou manter desde sempre uma imaculada reputação no

universo relojoeiro e essa auréola de excelência é bem traduzida pelos

recordes estabelecidos pelas suas peças nos grandes leilões realizados

por esse mundo fora.

Antoine Norbert de Patek e François Czapek, dois polacos exilados em

Genebra, lançaram as bases da companhia. Cinco anos depois, em

1844, numa exposição parisiense, o talentoso relojoeiro francês Jean

Adrien Philippe apresentou uma peça revolucionária que não foi devi-

damente notada pela maior parte das pessoas... mas que foi justamente

apreciada por Antoine Norbert de Patek. A empatia entre ambos e o de-

sentendimento com Czapek resultaria numa associação que ficou para

a posteridade sob o nome de Patek Philippe, com Jean Adrien a ser

bem sucedido na sua demanda pessoal de um sistema fiável que

servisse simultaneamente para carregar um relógio e para acertar as

horas: estava finalmente dispensada a chave de dar corda, substituída

pela coroa.

Foi para celebrar o percurso da casa genebrina que em 1989, na

comemoração dos 150 anos da marca, o presidente Philippe Stern de-

cidiu transformar a sua colecção privada de mais de duas mil peças

num museu. A inauguração foi efectuada no dia 8 de Novembro de

2001; o lote consagrava sobretudo peças antigas do património eu-

ropeu anteriores à fundação da Patek Philippe (especialmente as que

foram criadas em Genebra) e a história da companhia através de algu-

mas das suas mais prodigiosas criações. O valor histórico, o carácter

tecnicamente inovador e a grande variedade estética dos relógios Patek

Philippe reunidos no museu provam que a manufactura genebrina é a

única que se pode gabar de apresentar um espólio tão completo e tão

representativo da arte relojoeira de Genebra dos séculos XIX e XX.

A decoração do edifício foi feita pela mulher do presidente da Patek

Philippe, Gerdi Stern, que soube dar ao espaço público a atmosfera

calorosa de um salão privado com a ajuda dos arquitectos Jackie

Nyfeller (para o interior) e Massimo Bianco (também autor do traçado

exterior da nova manufactura da marca em Plan-les-Ouates). O objecti-

vo era renovar um prédio antigo respeitando a sua história e dotando-

o de uma expressão contemporânea; criar um ‘museu de alta-costura’.

A harmonia alcançada transformou-o num estojo ideal para a cele-

bração da cultura relojoeira através dos tempos – e traduz bem tudo o

que a marca Patek Philippe representa: classe pura e intemporal.

Os materiais usados no interior foram criteriosamente escolhidos em

função da qualidade e respectivas cores: granito americano para o chão,

pedra provençal para as paredes, serpentina dos Alpes para os frisos,

mármore espanhol para a entrada e escadarias – juntamente com as

madeiras, os tecidos e a iluminação escolhidas, o conjunto oferece uma

atmosfera de harmonia e serenidade ideal para o visitante...

A ENTRADA

O Museu Patek Philippe fica situado numa esquina da Rue des Vieux

Grenadiers, no quarteirão de Plainpalais em Genebra – e a sua facha-

da inspira imediatamente respeito. Lá dentro, um lanço de degraus

conduz à recepção e logo depois a uma sala de outros tempos: sob o

Cuidadosamente preparado para desvelar cinco séculos na arte da medição do tempo, o Museu PatekPhilippe é talvez o mais belo museu de relojoaria do mundo — e os seus quatro andares constituem umaautêntica viagem transgeracional que é, simultaneamente, uma homenagem ao génio humano.

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por Miguel Seabrafotos Nuno Correia e arquivo Patek Philippe

01. Entrada do Museu Patek Philippe, em

pleno coração de Genebra. Situado numa

esquina da Rue des Vieux Grenadiers e

ao lado da Plaine de Plainpalais, o edifí-

cio data de inícios do século XX.

Foto Nuno Correia

01.

U

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olhar dos insignes bustos de Antoine Norbert de Patek (1812-1877) e

Jean Adrien Philippe (1815-1894), espraiam-se móveis recheados

com utensílios de relojoaria de outrora (segunda metade do século

XVIII a inícios do século XX) perfeitamente restaurados e inseridos

em ateliers fielmente reproduzidos.

Também é no rés-do-chão que ficam localizados o espaço de restauração

(onde um artesão trabalha num gabinete que evoca um antigo cabinoti-

er genebrino) e o auditório, onde o visitante pode assistir a apresen-

tações audiovisuais. A partir daí, a visita salta para o piso do topo...

O TERCEIRO ANDAR

O terceiro e último andar revela os arquivos históricos Patek Philippe

que relatam o trajecto de uma manufactura relojoeira de excepção, a re-

produção do gabinete de Henri Stern (pai do actual presidente da mar-

ca) e a biblioteca com mais de quatro mil volumes – dedicada não só à

relojoaria mas também a todos os mesteres que lhe são adjacentes.

Só da Patek Philippe são mais de 700 livros de documentos onde estão

escalpelizados todos os projectos da marca e o historial de cada reló-

gio (referência, numeração da caixa e mecanismo, calibre, data de

fabrico e venda, data de revisões), para além de desenhos originais de

Adrien Philippe e relatos manuscritos por Antoine Norbert de Patek.

A biblioteca é baseada numa colecção inicial da família Stern, poste-

riormente enriquecida de modo significativo com a adição do acervo

de um bibliógrafo americano e a filantrópica doação de um aficiona-

do de Basileia.

O catálogo da biblioteca e alguns dos livros mais relevantes foram di-

gitalizados e podem ser consultados de maneira interactiva. O grande

destaque vai para os escritos de Christiaan Huygens (de 1650 a 1680),

os grandes tratados de relojoaria dos séculos XVII, XVIII e XIX (Hen-

ri Sully, Antoine Thiout, Pierre Le Roy) e os catálogos das colecções do

magnata americano Pierpont Morgan.

O SEGUNDO ANDAR

O segundo andar alberga a colecção antiga, desde o século XVI ao sécu-

lo XIX; integra relógios, um salão para autómatos, uma galeria de re-

tratos em miniatura, uma mostra da arte do mestre relojoeiro Abra-

ham-Louis Breguet, relojoaria técnica, relógios de fantasia, e peças

feitas especialmente para os mercados chinês e turco.

É difícil estabelecer uma data precisa para a invenção do relógio

mecânico, mas os primeiros aparelhos – gigantescos – começaram a

surgir no século XII. Foram necessários quatro séculos para que os

progressos no sistema de corda e a progressiva miniaturização tor-

nassem esses aparelhos adequados à vida doméstica e até portáteis. A

mais antiga peça do museu é um relógio-tambor alemão de cerca de

1530, com um mecanismo em ferro encerrado numa caixa cilíndrica de

metal dourado; também em destaque está o relógio em forma de Cruz

da Ordem do Santo Espírito (cerca de 1630).

Estão igualmente apresentados vários modelos que relatam o nasci-

mento da relojoaria genebrina e a própria história da cidade: no fim do

século XVI, a fuga de huguenotes franceses devido à intolerância reli-

giosa de Charles IX fez com que numerosos protestantes se refu-

giassem em Genebra e se dedicassem à relojoaria e à esmaltagem

miniaturizada – muitas vezes associando ambas as artes em peças de

grande preciosidade e algumas obras-primas expostas no museu.

A partir do século XVII, e muito graças às descobertas de Christiaan

Huygens (matemático, físico e astrónomo), a arte relojoeira transfor-

ma-se numa ciência com o estabelecimento do balanço espiral e a in-

clusão do ponteiro dos minutos. O mais antigo relógio existente com

ponteiro de minutos (cerca de 1675) é da autoria de Henricus Jones e é

exibido juntamente com outros fenómenos da altura, como o relógio de

grande e pequena sonnerie e repetição de quartos assinado pelo

parisiense Julien Le Roye (cerca de 1740), e um relógio com segundos

e oito dias de reserva de marcha, concebido por Ferdinand Berthoud

(cerca de 1758). Incontornáveis são também as criações pluricompli-

cadas do genial Abraham-Louis Breguet e seus descendentes.

Paralelamente ao desenvolvimento da arte relojoeira, eram concebidos

autómatos com personagens dotados de uma alma mecânica – sendo

os mecanismos parentes dos calibres relojoeiros, reunindo também o

saber-fazer da melhor metalurgia acústica. A célebre pistola que

dispara um pássaro cantante (da autoria do relojoeiro genebrino Rochat

em 1810) e o mítico autómato Moisés com repetição de quartos (criado

por um anónimo de Le Locle por volta de 1815) são os expoentes da

fascinante secção destinada aos autómatos. O fim do século XVIII as-

sistiu também ao desenvolvimento de relógios excêntricos e da apli-

cação das modas aos instrumentos do tempo.

O PRIMEIRO ANDAR

O primeiro andar é dedicado precisamente à colecção Patek Philippe e

a alguns dos mais valiosos exemplares do planeta – entre relógios

comemorativos, de bolso, de pulso, de pêndulo e complicados, incluin-

do o espólio do coleccionador Henry Graves Jr.

A colecção começa com as primeiras execuções assinadas Patek, Cza-

pek & Cia. (1839-1845) e Patek & Cia. (1845-1851): relógios-sabonete

com retratos de esmalte em miniatura, peças com temas religiosos e

um relógio-pendente tipo sabonete em miniatura (1850) que foi vendi-

do a Maria II de Bragança, rainha de Portugal, com uma alegoria das

virtudes teologicas desenhada por Laminière.

A partir da associação entre Antoine Norbert de Patek e Adrien

Philippe estabelece-se uma nova etapa a partir de 1845 e uma nova assi-

natura conjunta a partir de 1951. A parceria criou então relógios para al-

gumas das mais marcantes personalidades do seu tempo e da era

seguinte, como a Rainha Vitória, Richard Wagner, Leon Tolstoi, Marie

Curie, Rudyard Kipling, Piotr Tchaikovski e Albert Einstein – devida-

mente expostos no museu.

Também em destaque estão os exemplares sob a influência estética da

Art Nouveau, mas sobretudo os modelos Art Déco – já que coincidiram

com o período em que se começaram a democratizar os modelos de

pulso. O museu inclui relógios-bracelete concebidos a partir de 1860,

mas foi após a Primeira Guerra Mundial que esse tipo de instrumen-

tos se masculinizou e só na década de 30 é que começou a substituir

gradualmente os relógios de bolso. O primeiro piso apresenta um lote

excepcional de mais de 500 extraordinários exemplares do primeiro

século de vida do relógio de pulso, incluindo o relógio-bracelete da Con-

dessa Koscowitz (1868), um dos primeiros modelos da linha Calatrava

(1936) e um fenomenal cronógrafo com calendário perpétuo e fases da

lua (1955). E é incrível como muitos dos desenhos de grande sucesso

contemporâneo e que constituem cartão de visita de várias marcas são

inspirados em relógios Patek Philippe de inícios do século XX...

01. e 04. Bancadas e ferramentas

utilizadas desde o século XVIII até ao

século XX por relojoeiros da região de

Genebra. 02. Relógio de mesa hexag-

onal. Movimento com foliot circular e

despertador, assinado por Nicolas

Morel, Paris, cerca de 1530. 03. O

museu atrai diariamente hordas de

turistas e aficionados da relojoaria.

Fotos Nuno Correia

04.01. 02. 03.

Museu Patek Philippe

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ESPIRAL | 051050 | ESPIRAL

Museu Patek Philippe

O museu relata a história da paixão

relojoeira e de todas as artes que

lhe estão associadas — desde o

século XVI até aos nossos dias

04.03. 05.

07. 08.

01. 02.

06.

09.

Alguns desses modelos inspiradores integram a linha Chronometro

Gondolo, desenvolvida pelo distribuidor brasileiro da marca (a casa Gon-

dolo & Labouriau) e também famosa pelos seus exemplares de bolso.

Outra parte fundamental da colecção é a dos relógios com múltiplos fu-

sos horários e exibição da hora universal – na sequência da divisão do

globo em 24 fusos diferentes em 1884. O relojoeiro genebrino inde-

pendente Louis Cottier idealizou, em 1935, um engenhoso dispositivo

de indicação da hora universal e colaborou com a Patek Philippe na cri-

ação de uma longa série de relógios de pulso que inclui alguns dos

mais cobiçados (e caros!) exemplares da actualidade.

Entre os relógios mais nobres e exclusivos estão as grandes compli-

cações – como o Calibre 89, o relógio (de bolso) mais complicado do

mundo concebido para comemorar os 150 anos de vida da marca em

1989 e que apresenta 33 funções geridas por 1728 peças diferentes;

foram necessários nove anos de pesquisa para elevar os seus principais

tipos de complicação (calendário, cronógrafo e sonnerie) a um nível iné-

dito e juntar-lhe complicações astronómicas sensacionais, como a data

pascal, o tempo sideral, a equação do tempo e uma carta celeste com

2800 estrelas!

Ao mesmo nível estratosférico do Calibre 89 podem ser colocadas

peças complicadas de incomensurável valor histórico como o relógio do

III Duque de Régla (relógio de pulso sabonete com repetição de minu-

tos, grande e pequena sonnerie e carrilhão Westminster com cinco tim-

bres, de 1909), o Packard e vários Graves. A ‘rivalidade’ entre os mag-

natas americanos James Ward Packard e Henry Graves Jr. faz com que

solicitem à Patek Philippe os relógios mais complicados do mundo e

esteve na origem das fabulosas proezas de 1916 (a Packard, com 16

complicações) e 1933 (a Graves, com 24 complicações).

Nas curiosidades, podem ser também admiradas algumas incursões

precoces da marca na medição do tempo através da tecnologia do quar-

tzo e vários modelos com indicadores digitais.

Terminada a visita, fica a constatação de que os relógios portáteis mu-

daram a nossa concepção do tempo – mas, sobretudo, que a história da

relojoaria é um legado do génio humano...

O GUARDIÃO DO TEMPLO

Arnaud Tellier é o homem que tem a seu cargo a custódia do Museu Patek

Philippe, depois de ter ganho enorme traquejo na casa leiloeira Antiquorum.

Philippe Stern havia juntado, ao longo de mais de 30 anos, uma fabulosa

colecção inicialmente aconselhada por Alan Banbery, mas foi Tellier que

desenvolveu esse acervo e o transformou no museu dos dias de hoje.

Afável, simpático e aparentemente mais jovem do que é, o director do

Museu Patek Philippe teve formação relojoeira em França e especializou-se

na Suíça; depois embrenhou-se no mundo do coleccionismo, onde passou a

conhecer tudo o que de melhor se fez na história. E não tem dúvidas: «O es-

pólio da Patek Philippe é mesmo o melhor que há na arte de medir o tem-

po e representa bem a filosofia da casa. E no museu podemos encontrar to-

das as mais significativas etapas da relojoaria».

Arnaud Tellier sabe bem que não pode ter todas as maiores preciosidades

jamais feitas na indústria relojoeira e até se regozija por algumas delas

se encontrarem noutros museus temáticos, mas não deixa de lamentar

o desaparecimento de algumas peças que constam dos arquivos da marca

e que gostaria de ter no seu museu...

10.

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01. Le Triomphe d’Amphitrite, PP & Cie Genève N.º 99715; relógio-pendente com decoração em esmalte pintado em 1893 e que pertenceu a Maria-Pia de

Savoia, rainha de Portugal, filha de Victor Emmanuel II (1829-1878), rei de Itália (1861-1878); e casada com Luís I, rei de Portugal (1861-1889). 02. Segun-

do andar do museu, dedicado às colecções antigas (séculos XVI a XIX). 03. Les Vertues Théologales (fé, esperança e caridade), PP Genève N.º 4785;

relógio pendente em miniatura com chave própia para dar corda; esmalte de Gaspard Lamunière (1810-1865) em 1850; perteceu a Maria II de Bragança,

Maria da Gloria (1819-1853), rainha de Portugal (1827-1853). 04. Vitrina do museu. 05. Em primeiro plano, relógio Duke Ellington, PP N.º 863791, ref. 1563;

modelo de pulso de 1946 com cronógrafo rattrapante, contador de 30 minutos às três horas e escala taquimétrica; vendido em 28 de Julho de 1948

ao músico americano Edward Kennedy Ellington (1899-1974). 06. Reversos, PP & Cie Genève N.º 82340, ref. 106; relógios reversíveis. 07. Relógio de pulso

digital N.º 977121, ref. 3414; modelo de pulso com indicação linear dos minutos e das horas, 1958-59, protótipo desenvolvido por Louis Cottier com base

no calibre 9’’’90 e balanço Gyromax. Nunca produzido em série (patente Swiss 1959). 08. Relógio de quartzo miniaturizado completamente autónomo,

1956-57; protótipo que foi vencedor do Prémio de Miniaturização nos Estados Unidos em 1958 e o primeiro relógio quartzo de mesa de alta precisão.

09. Membros do Club PP, fundado no Rio de Janeiro pelo distribuidor brasileiro da marca no princípio do século XX, Gondolo & Labouriau. 10. Mapa

de Genebra, com a localização do museu.

Fotos Nuno Correia excepto 03., 09. e 10. arquivo Patek Philippe