INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU …
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INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM GESTÃO PÚBLICA
ATIVIDADE REGULATÓRIA COMO INSTRUMENTO DA GESTÃO
PÚBLICA EFICIENTE
ADRIANO GONÇALVES ALVES
Prof. Dr. Mario Luiz Trindade Rocha
Rio de Janeiro
2015
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INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM GESTÃO PÚBLICA
ATIVIDADE REGULATÓRIA COMO INSTRUMENTO DA GESTÃO PÚBLICA
EFICIENTE
ADRIANO GONÇALVES ALVES
Dissertação apresentada ao Instituto A Vez do Mestre - AVM para o Curso de Pós-Graduação em Gestão Pública, como pré-requisito para o título de Especialista em Gestão Pública.
Orientador: Prof. Mario Luiz Trindade Rocha
Rio de Janeiro
2015
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AGRADECIMENTOS
Aos diversos amigos que não ouso nomear, visto que fatalmente
acabaria por cometer alguma injustiça, tendo sido tantos os exemplos de
companheirismo, com absoluta relevância durante o longo percurso
acadêmico, auxiliando e incentivando nos momentos mais difíceis.
Aos estimados familiares, pelo incansável afeto e apoio.
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RESUMO
O presente trabalho tem por escopo demonstrar as características da
Regulação enquanto instrumento de política pública, bem como o papel do
Estado-Gestor e os demais atores sociais que interagem no contexto histórico.
É feita uma análise minudenciada mediante o crivo do Direito Administrativo
para entender como o Estado usou historicamente as ferramentas de
Regulação, sua importância na vida dos administrados, e a relevância do tema
no campo da eficiência das Políticas Públicas.
PALAVRAS CHAVE: Políticas Públicas, Estado, Regulação.
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METODOLOGIA
Estudar o papel da regulação do Estado, sob o enfoque do Direito
Administrativo, também significa estabelecer uma relação que possibilite o
entendimento de por que e como determinados eventos ocorrem, ou o
entendimento da natureza ou complexidade dos processos que estão
acontecendo.
Para a construção do presente trabalho, preliminarmente foi realizada
uma revisão bibliográfica que visou aprofundar uma análise teórica e o
desenvolvimento dos conceitos aproveitados.
Desta sorte, embasamos com farta doutrina o conceito do Estado-
Regulador, bem como da Administração Pública, da regulação enquanto fato
administrativo, e a função da regulação e suas finalidades no escopo das
políticas públicas.
Dentro do referencial teórico, os autores de base norteadores do
presente trabalho foram os mestres Hely Lopes Meirelles, Maria Sylvia Zanella
Di Pietro, e Paulo Bonavides.
O método de análise dos dados foi aplicado investigando-se a existência
de fenômenos ditos como relevantes, extraídos da literatura. A coleta de dados
para a realização do estudo se deu primordialmente através desta literatura, e
subsidiariamente através de coletâneas, artigos científicos e pesquisas na
internet, além do acompanhamento periódico de jornais e revistas, já que o
fenômeno da regulação não cessa, se desenvolve diuturnamente e pode ser
avaliado através de diversas fontes e mídias.
A operacionalização do estudo se deu da seguinte forma: após a revisão
bibliográfica e a retirada do referencial conceitual e das variáveis apontadas a
serem analisadas, foi iniciado o estudo sobre o papel da regulação nas
políticas públicas de Estado. Isto feito, depois de esclarecidas as questões de
maior complexidade, foi possível dar início à redação do estudo e à formulação
da conclusão do mesmo.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................... 07
CAPÍTULO I : HISTÓRICO DE ESTADO E GESTÃO PÚBLICA ......... 11
1.1. Estado Liberal ............................................................................. 13
1.2. Estado Social .............................................................................. 15
1.3. Estado Democrático de Direito .................................................... 17
CAPÍTULO II : REGULAÇÃO – CONTEXTO E CARACTERÍSTICAS ............................................................................ 21
2.1. Fontes da Regulação .................................................................. 22
2.2. Estrutura da Regulação .............................................................. 24
2.3. Conteúdo e Veiculação ............................................................... 27
CAPÍTULO III : REGULAÇÃO E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ......... 30
3.1. Regime Jurídico-Administrativo ................................................... 30
3.2. Princípios Constitucionais Administrativos .................................. 32
3.3. Eficiência e Regulação ................................................................ 34
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................. 39
REFÊRENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................... 42
WEBGRAFIA ....................................................................................... 44
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INTRODUÇÃO
As políticas públicas podem ser entendidas como grupo de disposições,
medidas e procedimentos paradigmáticos que exprimem a orientação política
do Estado e regulam os encargos governamentais atinentes às tarefas de
interesse público. São igualmente definidas como todas as ações de governo,
repartidas em atividades diretas de geração de serviços pelo próprio Estado e
nas atividades de regulação de outros agentes econômicos.
Destarte, intenta-se perceber de qual forma é exercido o poder da
Administração Pública, tomando como cerne uma concepção histórica acerca
do desenvolvimento das incumbências reservadas ao Estado e suas
peculiaridades.
Neste escopo, o estudo do papel e da atuação do gestor público
obrigatoriamente perpassa a análise e compreensão do Direito Administrativo
regulatório, que hodiernamente vem sofrendo alterações que implicam em
ressignificação das categorias usualmente escolhidas para se referir à gestão
pública.
Contudo, a alteração do papel reservado ao Estado e sua forma de
interagir com os diversos segmentos sociais pode explicitar a alteração dos
modelos ideais até então projetados.
Ressalta-se que as políticas públicas se consolidam por meio da
atividade de atores sociais que as realizam causam seus respectivos
resultados. Por isso, um marco regulatório concreto, que como verdadeiro
auditor administrativo avalize os processos pelos quais tais políticas serão
implementadas é imperativo.
Basicamente, o que se postula na presente dissertação é um exame
acerca da regulação como fenômeno dialético e estrutural da Administração
Pública e administrados.
Destaca-se aqui a questão da procedibilidade dos marcos regulatórios
estatais no decorrer da história e seu impacto nos dias atuais. No contexto do
presente estudo, essa questão se caracteriza como um dos fatores de maior
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relevância para o início do processo de controle que é observado na
atualidade. Isso, naturalmente, nos leva às seguintes perguntas:
Como tais evoluções correram historicamente para os modelos de
Estado (liberais, sociais, os modernos e contemporâneos)?
Qual o real contexto fático do Estado-Regulador como instrumento
concretista de políticas públicas?
Desta sorte, partindo-se de tais questões centrais, pretende-se entender
e explicar as particularidades dos atos regulatórios, sem esquadrinhar o
fenômeno sob o prisma meramente das agências reguladoras.
No primeiro capítulo, investigaremos o desenvolvimento dos diversos
modelos de Estado sob a ótica da fiscalização de atividade reguladora. A
despeito da formatação regulatória como conhecemos ser um fenômeno
relativamente recente, definitivamente a questão da atuação estatal como
padrão de função, mormente de viés administrativista, possui contexto
reconhecidamente pretérito.
Nesse sentido, nos propusemos a fazer uma análise sobre o histórico do
sistema de Estado-Gestor no correr do tempo, com as principais questões
suscitadas, inclusive as que estão sendo apresentadas no contexto
contemporâneo.
Já no segundo capítulo, objetiva-se evidenciar os meandros regulatórios
e sua caracterização típica e atípica.
Neste diapasão, será estudado o papel da Administração Pública nas
ações de promoção de políticas voltadas ao bem estar dos administrados, sob
o ponto de vista da interconexão entre o Estado e os protagonistas sociais que
fomentam a sua concepção e concretização. Cientes que os nichos onde as
sobreditas relações se dão ensejam litígios e debates, questiona-se tanto os
procedimentos de formulação e gestão de políticas públicas, bem como as
alterações no papel institucional do Estado-Regulador.
Já no terceiro e último capítulo, mediante a fixação da conjuntura que
propicia o estabelecimento da regulação como atividade administrativa,
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objetiva-se realizar a ponderação no que diz respeito à estruturação
procedimental cabível no que se refere à observância do princípio da eficiência.
Ou seja, explanaremos como o fenômeno regulatório se estrutura, se
percebe, atua, e fomenta eficientemente as atividades de controle do Estado.
Desta sorte, pode-se fixar a finalidade da regulação, e a forma pela qual ela se
apresenta no ordenamento jurídico pátrio.
O exame dos variados conceitos que dizem respeito à regulação enseja
a compreensão das próprias características que acedem o instituto e sua
conseguinte realidade fática.
Destarte, no que concerne a classificação da regulação, há que se
ressaltar que tal concepção vincula-se ao próprio papel do Estado-Gestor,
compreendendo o poder de polícia fiscalizador.
Importante frisar que a regulação possui o encargo de mediar os
conflitos gerados no curso das mais variadas atividades de concessão, e
notabiliza-se por dirimir tais demandas conferindo através do ato administrativo
de fiscalização verdadeira “densidade” às normas legais.
No que diz respeito ao ato administrativo de controle, tem-se que a
regulação mantem o procedimento habitual de fiscalização, posto que não se
limita a este. Explica-se. Os métodos de controle consideram as peculiaridades
da regulação em si.
Considerando que a atividade regulatória demanda isonomia na seleção
dos fins e a efetividade na consecução das metas estabelecidas, assume-se
importância à participação dos administrados no controle. Em outro plano, que
se faz relevante, tem-se o controle procedimental das normas a serem
estabelecidas.
Cumpre-se ressaltar que o objetivo central deste trabalho é gerar
reflexões analisando o papel da regulação por parte da Administração Pública
e sua importância nas políticas públicas de um Estado eficiente. Qual seja,
refletindo acerca dos diversos modelos de Estado e o desenvolvimento
histórico da atividade regulatória; analisando o fenômeno específico da
regulação, sua evolução, contextos e características; e ainda estudar a
finalidade da regulação, e as maneiras como e pela qual ela se expressa.
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Por derradeiro, aludimos e reforçamos que o estudo apresentado partiu
da premissa de que as políticas públicas são o instrumento de que se vale o
Estado para concretizar o extenso rol de direitos sociais previstos na Carta
Magna. Depreende-se dessa relação intrínseca entre as políticas públicas e os
direitos sociais as relevantes consequências jurídicas tratadas ao longo do
trabalho, dentre elas a possibilidade, ou melhor, a necessidade; de regulação e
controle administrativo.
No estudo ora encetado, esta é essencialmente a estrutura pela qual a
regulação, enquanto componente imprescindível no regime de políticas
públicas de Estado.
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CAPÍTULO I
HISTÓRICO DE ESTADO E GESTÃO PÚBLICA
Procurar entender a atuação cometida ao Estado-Gestor e de suas
tarefas implica, como ponto de partida, uma perspectiva histórica acerca da
evolução das incumbências reservadas ao Estado e um delineamento, ainda
que breve, acerca das suas características.
Há que se perceber as distintas concepções de Estado, cientes que
estas implicam em diferentes conteúdos em relação ao Direito Administrativo.
Ou seja, os caracteres do enquadramento estatal possuem profunda relevância
em como o Estado exerce suas políticas públicas, tal considerada alvo de
estudo no campo da Administração Pública. Destarte, o próprio caráter material
veiculado na Gestão Pública não é constante, visto ser relativo a depender do
momento em que se debruce na percepção do hermeneuta, e da própria
formação do Estado em apreço. Nesse sentido, distintas percepções acerca do
modelo adotado pelo Estado implicarão em igualmente diferentes conteúdos
vinculados ao campo do Direito Administrativo.
Destarte, despicienda é a pretensão de compreender o atual nível da
atuação do Estado na execução da função regulatória ignorando as premissas
que conduziram até a ocasião da análise, e sem ressaltar as circunstâncias do
tempo em tela. Cumpre-se então, a fim de se interpretar esclarecidamente o
estudo, traçar um panorama geral acerca da dinâmica entre o modelo de
Estado e sua relação com o Direito.
Neste diapasão, os encargos reservados à Administração não são de
natureza abstrata, sendo contingenciados por fatores como tempo e lugar a
serem necessariamente sopesados para compreensão da sua dimensão.
Os óbices que se apresentam a um Estado que admita como
pressuposição de legitimidade sua atividade sobre a ordem particular ensejam
uma percepção da própria atividade administrativa, diferente daquela em que
se estabeleceria acaso a suposição de legitimidade das intervenções fossem
excluídas.
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Assim, o papel administrativo é materializado através de uma miríade de
técnicas que objetivam precisamente fazer a conexão entre o conceito abstrato
de função administrativa e o tipo de atuação concreta que se espera do Estado
com vistas a cobrir demandas específicas.
Ressalta-se que a própria heterogeneidade de técnicas acerca da
apresentação do encargo administrativo regulatório explicita a impossibilidade
de se trabalhar com ela como uma classificação ungida de semântica genérica,
suficiente para dirigir de forma atemporal quaisquer entraves na atuação
estatal.
Neste sentido, um ensaio sobre o exercício da atividade administrativa
não pode prescindir da reflexão acerca do papel estatal e das mutações pelas
quais se submete. Resta claro que partir da premissa de classificação fixa e
acabada conduziria ao um ledo engano.
Ante o exposto, impinge-se ao hermeneuta analisar o tema em uma
perspectiva que privilegie a visualização das diversas manifestações da
atuação administrativa, qual seja, analisar os principais modelos de Estado.
Antes de se entrar definitivamente no tema, apenas para embasamento
didático, faremos o esclarecimento sobre a distinção entre Estado e Governo.
Diz-se que o Estado é uma pessoa jurídica de direito público, ou seja, que goza
de personalidade jurídica, que significa a aptidão para ser sujeito de direitos e
de obrigações, que goza dos direitos da personalidade. O Estado, enquanto
conceito, basicamente se compõe de território, povo, e governo. Quando
falamos de Governo, como visto, trata-se de um elemento do próprio conceito
de Estado, e é estabelecido com a função precípua de administrá-lo.
Mister frisar que para que o Estado seja de Direito, o Governo deve ser
soberano, e sua atuação deve ser limitada pelas leis vigentes. Estado de
Direito será aquele Estado politicamente organizado e que obedece às suas
próprias leis. Governo Soberano será aquele que tem independência no
cenário internacional e supremacia na ordem interna.
Disto isso, começaremos o Estudo tratando do modelo inaugural do
Direito Administrativo como conhecemos. O Estado Liberal.
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1.1. ESTADO LIBERAL
Tradicionalmente, a concepção de Estado de Direito identifica-se com
uma acepção tipicamente liberal, estabelecendo-se enquanto instrumento da
recalcitrante burguesia europeia no combate ao Ancién Régime.
Mister frisar que a própria concepção de “Direito Administrativo” deriva
dos ideais liberais. Estes, por seu turno, ensejaram o surgimento do
embrionário Estado de Direito (como oposição ao Estado Absolutista),
adequando as envelhecidas estruturas administrativas ao ideário das
revoluções burguesas, mais especialmente a Revolução Francesa de 1789,
considerada a sobrelevada relevância deste modelo para o direito regulatório
na Europa, e por conseguinte, tendo em vista a inspiração e influência, ao
Brasil. (MEIRELLES, 2001)
Desse ponto, depreende-se uma miríade de categorias importantes ao
Direito Administrativo, sendo seus elementos primeiramente concebidos sob a
luz dessa concepção teórica.
É sob a influência do Estado-Liberal que nasce o Direito Administrativo,
e por conseguinte, a própria formalização da atividade regulatória estatal,
estabelecendo-se as estruturas precedentes que fomentam e materializam o
exercício da efetividade administrativa.
Oportuno ressaltar que há na doutrina administrativista um debate sobre
a gênese do Direito Administrativo que legitime o Estado-Gestor, em especial
se ele seria um produto exclusivo da revolução francesa, ou teria suas bases
ainda nos feudos ou no absolutismo, haja vista terem sido mantidos esquemas
deste modelo após 1789. (MEDAUAR, 1992)
Sem embargo da existência da polêmica, importante marcar que para
fins da presente análise toma-se como premissa a relação íntima entre Direito
Administrativo e Estado Liberal, pois é neste momento que se lançam as
balizas fundamentais da matéria, que repercutem até os tempos modernos.
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Na esfera de influência de natureza administrativa, competia-lhe
basicamente assegurar o status quo interno e externo, assegurar a convivência
pacífica entre os cidadãos, manter a ordem pública, etc.
Em apertada síntese, podemos caracterizar o Estado Liberal sob o lema
pétreo da liberdade do cidadão. Vem trazer de forma clara a limitação ao poder
absoluto do Estado, confirmando a prevalência dos direitos individuais e
políticos.
O renomado constitucionalista José Gomes Canotilho (1999) nos
recorda que a ideia de um Estado Liberal de Direito construiu-se
paulatinamente nos Estados ocidentais de acordo com as condições e
circunstâncias existentes nos vários países da Europa. Destarte, enquanto na
Alemanha, por exemplo, formou-se o princípio do Estado de direito,
“Rechtsstaat”, isto é, um Estado subordinado ao direito, já na Inglaterra fixou-se
a ideia de “rule of law” (em tradução livre “governo das leis”), em paralelo, na
França, surge a obrigatoriedade do “État legal” (Estado de legalidade).
Desse ponto de vista liberal, o modelo jurídico apregoa a separação
absoluta entre direito público e direito privado, bem como o predomínio da
autonomia da vontade privada na esfera econômica.
O primeiro dos postulados depreende-se do ideário liberal de um espaço
íntimo inábil de ser objeto de disposição pelo Estado. Nessa esfera íntima de
interesse, o Estado não poderia atuar de modo direto, mas sim garantir as
condições para que cada indivíduo satisfizesse os seus próprios interesses,
sem ingerência externa de ordem alguma. Essa nota do Estado Liberal implica
em uma absoluta cisão entre Estado e sociedade, cabendo à este último
apenas dar as garantias para que individualmente o cidadão perseguisse o que
julgasse melhor para si, sem ingerências.
O Estado Liberal foi o reflexo político-jurídico dos anseios de uma nova
sociedade racionalista e expansionista, que vivia um capitalismo ainda
incipiente. As conquistas dessa sociedade representaram o desmanche do
Antigo Regime, uma época em que o Estado detinha grandes poderes de
interferência no mercado através de políticas econômicas conhecidas como
mercantilismo.
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Ao Estado não é facultado promover outra situação que não assegurar
que os administrados ajam em proveito pessoal. E é no cômputo geral das
diversas atuações individuais que floresce o livre mercado como norte
regulador por excelência da economia. Neste espaço, cumpre frisar que o
campo reservado prioritariamente aos cidadãos era alheio a qualquer tipo de
interferência estatal, imune às normatizações ou ações legislativas restritivas
ao patrimônio e direitos individuais do cidadão.
Ou seja, os avanços em favor dos direitos civis e políticos compõem
direitos subjetivos de primeira dimensão, assegurados apenas de maneira
formal, não sendo estendidos a todos na prática. Eram direitos efetivamente
garantidos apenas para a burguesia.
Destarte, já no final do século XIX, há uma crescente demanda social
das massas, precipitando uma crise no Estado Liberal e que viria a ensejar
uma nova dimensão de direitos.
1.2. ESTADO SOCIAL
Notórias são as circunstâncias que levam à superação do Estado Liberal
e o advento de um novo modelo em seu lugar, mas essencialmente, afirma-se
que o Estado Liberal não logrou êxito por meio da livre iniciativa, dar retorno
escorreito ao que tinha se proposto, passando a exigir-se uma alteração radical
dos encargos reservados ao Poder Público.
Por óbvio, em um ambiente de igualdade apenas formal decorrente da
situação supramencionada, ou seja, de forçosa igualdade reservada, é
compreensível que aqueles que não sejam contemplados pelas benesses
passem a se ressentir.
Neste sentido, oportuna é a lição de Bonavides (2004) quando afirma
que:
Quando o Estado, coagido pela pressão das massas, pelas reivindicações que a impaciência do quarto estado faz ao poder
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político, confere, no Estado constitucional ou fora deste, os direitos do trabalho, da previdência, da educação, intervém na economia como distribuidor, dita o salário, manipula a moeda, regula os preços, combate o desemprego, protege os enfermos, dá ao trabalhador e ao burocrata a casa própria, controla as profissões, compra a produção, financia as exportações, concede crédito, institui comissões de abastecimento, provê necessidades individuais, enfrenta crises econômicas, coloca na sociedade todas as classes na mais estreita dependência de seu poderio econômico, político e social, em suma, estende sua influência a quase todos os domínios que dantes pertenciam, em grande parte, à área de iniciativa individual, nesse instante o Estado pode, com justiça, receber a denominação de Estado social. (BONAVIDES, 2004, p. 186)
Ou seja, restaria incompatível a tentativa de promover tais direitos por
meio de um Estado mínimo, por isso estes passam a ser estabelecidos através
de outro modelo, qual seja, de um Estado intervencionista, o que convencionou
se chamar de Estado Social, e que a depender de sua procedência e
sistematização, também alcunhado como Estado de Bem Estar Social.
Inobstante aos ganhos adquiridos desta ideal de viés interventivo,
importante vislumbrar que tal modelo trabalha com a percepção de um Estado
que age através de políticas que ao menos em regra não se originam da
vontade do povo, antes refletindo os interesses de grupos no poder. Logo, aqui
existe o risco de se gerar regimes totalitários, visto que o Estado concentrará o
poder, possuindo não apenas o controle da esfera pública na atividade
regulatória, mas também da privada.
Ante o exposto, com o perigo da distensão ideológica de contornos
totalitários, apresenta-se a necessidade de uma nova modalidade estatal,
devendo-se orientar ao bem comum, sem contudo desprezar os ideais
democráticos liberais.
Em síntese, que seja capaz de garantir os direitos de primeira,, mas
também os de segunda dimensão, com observância às leis, pois estas, em
última análise, representam a vontade popular.
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1.3. ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
Uma vez constatado que no modelo de Estado Liberal destacam-se os
direitos de primeira dimensão, através da postura abstencionista do Estado,
caracterizada por propriamente por uma conduta negativa do mesmo, e visto
que no modelo social, ocorre uma conduta positiva, visando a melhora dos
níveis de qualidade de vida em geral, de modo a reparar a postura
individualista do modelo anterior através da implementação dos direitos de
segunda dimensão, finalmente encontramos o Estado Democrático de Direito,
onde encontram-se os direitos de terceira e quarta dimensão, restando a
regulação neste escopo.
Interessante notar que esse novo raciocínio foge a regra descritiva da
teoria desenvolvida por Karel Vazak, por traçar uma análise prescritiva, na
medida em que prevê a paz como um requisito que deva ser reconhecido pelo
ordenamento jurídico.
Retomando, se o Estado Social objetiva minorar o excesso de
individualismo ínsito ao Estado Liberal, o aparecimento do Estado Democrático
de Direito resta fixado como alternativa aos extremos autoritaristas presentes
no Estado Social.
Considerada a inclinação desajustada entre Estado Social e os
princípios democráticos, surge o ideal do Estado Democrático de Direito,
objetivando sintonia entre a vontade popular mas respeitando-se a submissão
do Estado ao império da lei.
Inobstante, mister ressaltar que o sobredito Estado Democrático de
Direito não corresponde apenas à soma de benefícios de um modelo, com a
mera subtração dos defeitos de outro, sendo antes de tudo uma obra
construída através de um ruidoso processo histórico que claramente absorve
os direitos proclamados pelos dois momentos históricos estudados. Nasce,
portanto, com fulcro de resguardar as liberdades individuais, civis e políticas,
em consonância à proteção dos direitos humanos e as liberdades
fundamentais, estando todos sob o comando da Lei, inclusive, o próprio
Estado.
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Neste sentido, é que o professor e jurista José Afonso da Silva (2005)
compreende a concepção de Estado Democrático de Direito, que não visa
apenas apropriação das benesses do modelo social e celebração da união
formal dos conceitos de estado democrático (soberania popular) e Estado de
Direito (império das normas e garantia dos direitos individuais), posto que
compreende um caráter material e revolucionário de transformação do status
quo, ao passo que ainda atuando no plano do capitalismo, busca efetivação
dos ideais de justiça social em uma real democracia, com verdadeira soberania
popular respeitando a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais.
Ou seja, valendo-se da lógica Bonavides (2004), pode-se afirmar ainda
que os direitos de primeira dimensão tem caráter individual, de ordem civil e
política, os de segunda correspondem aos direitos sociais, econômicos e
culturais, sendo os da terceira referentes aos direitos de solidariedade,
abrangendo, dentre outros, a proteção ao meio ambiente, o desenvolvimento, a
autodeterminação dos povos e a paz. São direitos fraternos, que compreendem
não apenas interesses individuais e sociais, mas ainda os direitos difusos e
coletivos.
Uma democracia que de fato se inspire na soberania popular,
considerado que esta não pode prescindir da atuação do cidadão voltada de
maneira real e efetiva para a coisa pública, atuação que não pode ficar adstrita
à mera representatividade formal, mas exige o aprimoramento para se alcançar
uma representatividade material que fiscalize e controle e regule, todas estas
dimensões de direitos, e seus respectivos conteúdos, estruturam a pirâmide
cujo ápice é o direito à democracia, direito este com traços presentes em todas
as dimensões, mas finalmente desenvolvido em sua plenitude na quarta etapa,
através dos corolários de informação e transparência.
Logo, infere-se que a intenção do constituinte originário ao enunciar logo
no primeiro artigo da Carta Magna o modelo de Estado Democrático de Direito,
qual seja, precipuamente constituir no Brasil o ideário de soberania popular e
consagração e respeito aos direitos fundamentais, atende o preceito de
regulação da atividade administrativa e econômica.
Logo, conclui-se que a CRFB/88 prestigiou características presentes nos
três regimes ora analisados, a modalidade Liberal, evidenciada pela
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supremacia da Constituição, limitando e regulando o poderio estatal, com isso
assegurando os direitos individuais dos cidadãos; a modalidade Social,
considerado prestigiar os princípios e direitos sociais pertinentes ao Estado,
exigindo uma ação dirigente; e a modalidade Democrática, por conta de
franquear a participação popular nas decisões políticas, em contraposição aos
regimes imperiais.
Novamente, lança-se mão do referencial teórico de Bonavides para
evidenciar esse panorama, que de forma lapidar ensina:
A globalização política na esfera da normatividade jurídica introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de institucionalização do Estado social. É direito de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. [...] os direitos da primeira geração, direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia. (BONAVIDES, 2004, p. 572)
Recorda-se que já em 1789, na Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão, estava previsto em seu artigo 15 que a sociedade tem o direito de
pedir contas a todo agente público pela sua administração. A concretização
deste ideário deflagrado na França, e que perpassou os diversos modelos de
Estado de Direito já estudados, inspira no Brasil a própria Carta Magna, que
além de como visto, assegurar esse direito, vai além, estimulando o cidadão a
participar ativamente desta prestação de contas e regulação, o que redunda
nos sobreditos direitos de quarta dimensão.
Nesse sentido, sob a perspectiva dos direitos fundamentais, e
estabelecida em linhas gerais esta clara interdependência entre democracia e
regulação, finalmente se poderá ingressar de maneira mais específica ao tema
principal deste estudo, no que concerne o a gestão pública e o controle
regulatório, que como visto, é indissociável ao conceito do Estado Democrático
de Direito, sem que, contudo, tenha tido a devida atenção legislativa no Brasil.
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E é isso que iremos tratar nos próximos capítulos, a regulação em espécie,
tanto na ordem teórica, quanto na concreta.
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CAPÍTULO II
REGULAÇÃO – CONTEXTO E CARACTERÍSTICAS
Conforme visto no capítulo precedente, os modelos de Estado guardam
enorme relevância para o entendimento da regulação ao longo do tempo. A
necessidade de controle sobre determinadas atividades e setores compreende
as relações de poder que se estabelecem no seio da sociedade.
Entende-se que a regulação corresponde à intervenção estatal diante
dos setores privados com fulcro de impor normas de conduta que visem o bem
estar da coletividade.
O agir regulatório, portanto, variará conforme o modelo do Estado em
que a regulação se desenvolve, considerando o mercado em escopo a ser
regulado, os princípios da autonomia e da especialidade, a posição dos
monopólios, e sempre privilegiando o princípio da supremacia do interesse
público sobre o privado.
Didaticamente, podemos dizer que as noções de regulação representam
um cerne de continuidade em relação às categorias previamente criadas ao
longo da evolução do Estado. Caracteriza-se um resumo das ideias liberais e
sociais, ao defender a necessidade de reconhecer o papel dos particulares na
promoção do bem coletivo sem desfazer com o compromisso do Estado Social
de impor uma obrigação do Poder Público no sentido de assegurar as
condições de desenvolvimento da sociedade.
Tarefa obrigatória neste momento, alude a contextualização do conceito
e a etimologia do vernáculo “regulação”. Dito isso, esclarece-se que
“regulação” relaciona-se ao verbete latino regere, que significa: reger, ordenar,
controlar, dirigir, orientar. Em geral, tal expressão tem valência nas mais
diversas áreas do conhecimento humano, posto que o que objetiva-se nesse
tópico e seguintes é pontuar como a regulação se revela no campo do direito
administrativo e da gestão pública.
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2.1. FONTES DA REGULAÇÃO
Para compreender o termo em sua acepção precisamente utilizada no
Direito Administrativo, recordamos dos ensinamentos da doutora Maria Helena
Diniz (2005). A ilustre professora sustenta serem fontes formais os modos de
manifestação do direito e do conhecimento, mediante os quais o jurista
conhecerá e descreverá o fenômeno jurídico e epistemológico. Logo, quem
quiser conhecer o direito deverá buscar a informação desejada nas suas
fontes, ou seja, na lei, nos arquivos de jurisprudência, nos tratados
doutrinários... O órgão aplicador, por sua vez, também recorre a elas,
invocando-as como justificação da sua norma individual.
Completando a lição exarada pela mestra, diz-se que fonte é aquilo que
provoca a definição de regras do Direito Administrativo. São elas, como já dito:
a lei, a doutrina, e a jurisprudência. Mas também, o costume, e os princípios
gerais de direito.
Quanto a Lei, diz-se de toda e qualquer espécie normativa. O
ordenamento está organizado em uma estrutura escalonada ou hierarquizada.
Nesse sentido, as normas inferiores precisam ser compatíveis com as
superiores, e todas elas, com a Constituição, observando uma relação de
compatibilidade vertical.
Sobre a doutrina, esta é o resultado do trabalho dos nossos estudiosos.
É a opinião dos doutores.
Ao lado da doutrina, exerce papel importantíssimo para o Direito
Administrativo a jurisprudência. Jurisprudência é o julgamento reiterado e no
mesmo sentido referente a um tema. Quando a jurisprudência está
consolidada, o tribunal edita um enunciado de súmula. No Brasil, há dois tipos:
orientadora e vinculante. A súmula vinculante depende de procedimento
próprio e é editada pelo STF.
Ressalta-se que a declaração em sede de repercussão geral vem
assumindo grande importância no Direito Administrativo. A repercussão geral,
definida antes do julgamento de mérito, se dá quando o STF entende que o
23
julgado interessa a terceiros, além das partes. Não tem força vinculante, mas
possui grande influência, chegando a ser chamada por parte da doutrina
decisão com efeitos vinculantes por via torta.
Sobre o costume, fonte do direito de suam importância em países de
raízes anglo-saxãs, refere-se a uma prática habitual, acreditando ser ela
obrigatória. No Brasil, direito consuetudinário (direito costumeiro) serve como
fonte (orienta, sinaliza), mas não cria, nem exime obrigação.
Finalmente, os princípios gerais do Direito são as regras que estão no
alicerce da nossa Ciência. Pode ser regra expressa ou implícita; exemplo:
neminem laedere; enriquecimento sem causa; ninguém pode se beneficiar da
própria torpeza.
Conforme visto, as fontes formais do direito servem para identificar o
modo como este se articula com os seus destinatários, ou seja, como o direito
manifesta-se, correspondendo ao próprio Direito objetivo vigente, confirmando-
se como força normativa obrigatória. A regulação se configura por regras
próprias ao sistema jurídico, e não por observância de padrões externos a ele.
Consoante consulta das fontes aludidas, no entendimento doutrinário, os
professores Salomão Filho (2001) e Maria Di Pietro (2004) sustentam que a
regulação corresponde ao ato de organizar determinado setor, bem como
controlar as entidades que atuam nesse setor. Ou seja, albergaria as maneiras
de se controlar a atividade econômica por meio da intervenção estatal, ora
através da concessão de serviço público, ora no exercício de poder de polícia
administrativo.
Destarte, entende-se que é encargo estatal transformar em ações
concretas os ditames na seara de políticas públicas formuladas pelo Governo,
seja de maneira indireta, através da indução à iniciativa privada, ou por meio
das empresas públicas e sociedade de economia mista, ou diretamente ao
fiscalizar as prestadoras de serviço público.
24
2.1. ESTRUTURA DA REGULAÇÃO
Portanto, a regulação estrutura-se através da delimitação de parâmetros
à atuação privada e da modificação dos comportamentos em livre mercado. Ou
seja, estabelece parâmetros e induz o comportamento do mercado, além de
coibir os excessos que possam prejudicar os destinatários dos serviços
públicos, e ainda subsidiariamente fomenta a atuação dos agentes
econômicos.
Novamente nos valendo do mestre José Gomes Canotilho (2002), vale
recordar que:
[...] o Estado não tem de construir e manter infraestruturas rodoviárias, de energia, de telecomunicações, de tratamento de resíduos, mas deve assumir a responsabilidade regulativa dos serviços públicos de interesse geral. Neste sentido se diz que o Estado Social assume hoje a forma moderna de Estado regulador de serviços públicos essenciais. (CANOTILHO, 2002, p 17)
Neste diapasão, o conceito de regulação sobrepuja por meio de uma
síntese as suas matrizes prévias, mantendo o que cada uma delas tinha de
essencial, agregando apenas certas particularidades como uma especial
preocupação acerca da prática e incremento das normas.
Apesar do conceito de regulação ter, em seu nascedouro, identidade
com uma importância eminentemente econômica, é fato que ela incorporou em
seu bojo missões que vão muito além de meros aforismos de mercado.
Passamos a enxergar com maior clareza, ao analisarmos o campo da
privatização, em seu sentido mais amplo, alcançando toda a forma de minorar
a máquina pública, onde toma corpo a ideia legítima de regulação, como forma
de propiciar que os particulares tenham garantidos os seus direitos mais
elementares, ainda que na ausência de atuação direta do Estado.
Entende-se, neste sentido, que quando se adota em larga escala
esquemas de redução do aparato estatal, pulula-se a ideia de regulação como
forma de explanar o novo modo de relacionamento das políticas públicas de
25
Estado com a sociedade em vista de um ambiente em que este não mais se
faz presente de modo direto.
Fazendo uma digressão temporal básica, podemos dizer que a década
de oitenta foi marcada pela manifestação das posições privatizadoras e
liberalistas. A orientação imperativa se dava pela retirada do Estado da área
econômica, a liberalização dos mercados, a abertura à concorrência e ao
mercado. Validamente, pontua-se que no final dos anos setenta,
marcadamente nos Estados Unidos e na Inglaterra, se começou a ganhar força
um movimento de contínuo arrefecimento do papel do Estado na economia, e
conseguinte valorização do papel do livre mercado e da concorrência.
Essa situação, que teve início ainda no início dos anos oitenta em países
da common law, espraiou-se para a Europa até que posteriormente, no começo
da década de noventa, chegar ao Brasil, preservando-se em seu âmago a
redução do aparato estatal. É precisamente nesse momento histórico que se
dá início a considerações doutrinárias acerca da regulação, conceito estranho
ao direito brasileiro até a onda de privatizações.
Consoante afirma a professora Evelina Dagnino (2004), a necessidade
de instrumentos de participação popular nos processos de decisão e de
controle é uma questão fulcral ao considerar a necessidade da criação de
espaços públicos e a crescente participação da sociedade civil nos processos
de regulação. As três funções inerentes à regulação seriam: a confecção de
regras, a garantia da aplicação das normas, e a conseguinte punição de
infrações.
O marco formal desse processo é a CRFB/88, que ampliou os direitos
civis, sociais, culturais, políticos e a participação popular nas atividades do
poder público, inclusive os de fiscalização, estabelecendo um papel de
protagonismo do cidadão como sujeito ativo em variados processos decisório
no âmbito da coisa pública. Destarte, a CF/88 legitimou os institutos de
democracia participativa e consagrou o princípio de participação da sociedade
civil.
Logo, os atores envolvidos nesse processo convergem em um projeto
democratizante e participativo, construído desde os anos 80 ao redor da
26
expansão da cidadania e do aprofundamento da democracia, o que só é
possível com a fiscalização e controle.
Ante o exposto, cumpre reconhecer uma mudança de paradigma na
atividade administrativa. A Administração Pública, que durante muito tempo se
apoiou no ato administrativo unilateral e impositivo, ou seja, o Estado que
impunha sua vontade ao particular, hodiernamente se inclina para uma
fiscalização de forma mais plural e democrática.
Entende-se que o consenso daria maior legitimidade para a atuação do
Estado. Essa ideia que vem no contexto de uma crise da democracia
representativa. A atuação administrativa tem que corresponder ao anseio da
população.
Nesse sentido, o princípio da participação ou do consensualismo da
administração pública é um instrumento que reforça a participação do cidadão
na coisa pública.
Inobstante o conceito de intervenção já atingisse manifestações não
diretas do Estado sobre o domínio econômico, mister admitir que a
classificação perenemente se fez sentir pela atuação do Estado no mercado
econômico, exemplificando-se pelas empresas públicas e de sociedade de
economia mista.
Cumpre-se constatar que este agir estatal de viés colateral ainda não se
manifestava como contemporaneamente, onde a atuação sobre o domínio
econômico é flagrante, restando evidente que não será tão somente a
presença estatal que ensejará o cumprimento da agenda social balanceando a
sede do lucro ínsita ao capitalismo.
Essa identificação da quase ablação do Estado da atuação direta na
ordem econômica com o surgimento das preocupações com a chamada
regulação é fruto justamente do contexto de redução da atuação direta do
Estado nos domínios econômicos, refletindo uma troca de orientação em
relação aos instrumentos a serem adotados.
Prosseguindo, no que alude aos fundamentos da regulação, algumas
posturas são possíveis de serem visualizadas, visando a explicitar a
racionalidade a ser assumida diante perante a este novo contexto.
27
Isto posto, impinge-se conceber outras maneiras do agir estatal,
trabalhando as características vinculadas ao espectro regulatório sugerem que
os laços construídos, exigem além da simples regulação, se afirma capaz de
dirigismo acerca do alheio ora administrado/regulado.
Conclui-se que o advento da regulação hoje pode ser compreendido
como fonte de esclarecimento do agir estatal, e mais, da própria gestão pública
profissional, responsável e eficiente, esta, aliás, como preceitua o artigo 37 da
Carta Magna.
Mister ressaltar que a regulação vai além de apenas aperfeiçoar as
distorções no livre mercado, incidindo sobre uma miríade se serviços e
produtos importantes à coletividade. O controle regulatório atinge as áreas de
interesse público vislumbradas por Lei, objetivando proteger, resguardar e
fomentar os direitos fundamentais elencados pelo constituinte originário.
2.3. CONTEÚDO E VEICULAÇÃO
A partir do exame histórico dos regimes e modelos estatais, fixada a
conjuntura de onde surge o instituto da regulação, cumpre-se esclarecer o seu
conteúdo e veiculação.
Pode-se afirmar que o ato regulatório está investido de caráter perene,
sistemático, e operativo, se apresentando por meios institucionais (entes
dotados de personalidade jurídica) com a criação de estruturas administrativas
especializadas, objetivando a consecução permanente e racional dos meios,
igualmente, se apresenta por atos não institucionais, ou seja, humanos
(agentes públicos).
Tem-se que a regulação não consiste em mera e aleatória produção de
normas circundantes e atos decisórios, mas sim na ordenada e dirigida
produção destes.
Quando se dá a intervenção direta (consoante art. 173, caput e § 1°, da
CRFB/1988), entende-se que o Estado desempenha o papel de agente
28
econômico, explorando diretamente a atividade econômica pelo regime de
concorrência ou pelo regime de monopólio.
Quando a intervenção se estabelece de forma indireta (art. 174, da
CRFB/1988), afirma-se que a atuação estatal se apresenta como de agente
normativo e regulador da economia. Desta sorte, o Estado desempenhará
conforme a prescrição legal as funções de fiscalização, incentivo e
planejamento.
Ou seja, a regulação, uma vez constituída como procedimento
administrativo obrigatório, é delegada pelo Estado (sempre por meio de Lei)
aos agentes e agências, que assumindo o encargo de fiscalizadores irão até as
concessionárias de serviço público, e exercerão os ditames de maneira não
ordinária, mas de forma absolutamente respaldada e baseada na Lei. Diz-se
que aqui, os atos de agentes e a atuação das agências observa o chamado
“poder dever”, ou seja, só se faz aquilo que previsto em Lei.
Conforme lição do professor Hely Lopes Meirelles (2001), uma vez que a
autarquia é um prolongamento do Poder Público, uma verdadeira longa manus
estatal, executa serviços próprios do Estado, em condições idênticas às dos
Estado, com os mesmos privilégios da Administração e portanto passíveis dos
mesmos controles dos atos constitucionais, o que diversifica a autarquia do
Estado é o modus operandi, que permite maior flexibilidade de atuação, com
possibilidade de decisões rápidas e ações imediatas.
A autonomia e independência concedidas às agências reguladoras são
fundamentais para que a mesma possa exercer adequadamente suas funções,
vez que o maior bem jurídico sob tutela é o interesse comum, não podendo
estar sujeita às constantes mudanças políticas.
Neste diapasão, recordamos os ensinamentos do professor Marçal
Justen Filho (2002), ao afirmar que:
A necessidade de autonomia no desempenho de funções regulatórias não pode imunizar a agência reguladora de submeter-se à sistemática constitucional. A fiscalização não elimina a autonomia, mas assegura à sociedade que os órgãos titulares do poder político não atuarão sem limites, perdendo de vista a razão de sua instituição, consistente na realização do bem comum. (JUSTEN FILHO, 2002, p.98)
29
Neste sentido, oportuna é a lição de Diógenes Gasparini (2005) ao
destacar que o poder dever fiscalizador é o que enseja os atos administrativos
de único comportamento permitido à Administração Pública. Ou seja, a lei
estabelece o “se” e o “quando” e o “como” a Administração Pública deverá agir
na regulação. Tem-se que a vontade da lei só restará completa com a estrita
observância deste comportamento, pois aqui não se possibilita ao agente
público qualquer outra ponderação no decidir ou conduta ao agir.
Pode-se afirmar, portanto, que a regulação estatal corresponde ao
estabelecimento coercitivo de normas que limitam as atividades dos entes
privados nos específicos mercados selecionados por Lei.
Destarte, a atribuição vinculada do poder dever será a atuação da
administração pública em que a lei não lhe possibilite margens de liberdade ou
discricionariedade para agir ou deixar de agir diante de um determinado caso
em concreto.
30
CAPÍTULO III
REGULAÇÃO E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA
Para a compreensão precisa da relação entre regulação e eficiência, se
faz didaticamente recomendável uma base propedêutica acerca do Regime
Jurídico Administrativo, do Serviço Público, do Direito Administrativo, bem
como de seus princípios norteadores.
3.1. REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO
Quanto ao Direito Administrativo, conforme definido por Hely Lopes
Meirelles (2001), trata-se de uma disciplina jurídica que estuda um conjunto
harmônico de princípios e regras. Mesmo conceito teleológico. Esse conjunto
harmônico rege os órgãos, os agentes e a atividade administrativa.
Dá-se o nome de “regime jurídico administrativo” ao sobredito conjunto
harmônico de princípios e regras, guardando entre si uma correlação lógica, ou
seja, que guardam entre si um ponto de coincidência. Nesse sentido, não raro
ocorrer a aplicação de mais de um princípio em determinado caso.
Segundo o professor Celso Antônio Bandeira de Mello (2008), os
princípios da supremacia do interesse púbico e da indisponibilidade do
interesse público como as pedras de toque do direito administrativo, ou seja,
fazem parte do alicerce desse ramo do direito. Inobstante, não existe hierarquia
de plano entre os princípios; podendo no fato concreto, um preponderar sobre
o outro.
Prossegue o professor ao afirmar que o serviço público deverá ser
compreendido enquanto uma utilidade ou comodidade material apta à
satisfação de uma necessidade coletiva. Apesar de ser destinada a uma
coletividade em geral, esses serviços são passíveis de fruição individual, ou
seja, cada pessoa utiliza ao seu modo. Por exemplo, a iluminação pública é
31
disponível a toda coletividade, mas cada um frui a seu modo (quem trabalha no
período noturno, em regra, usará mais).
O Estado assumirá os serviços públicos como dever seu, mas a
prestação pode ser feita direta (segurança pública) ou indiretamente (transporte
público, telefonia). O regime jurídico desse serviço é público, e pode ser total
(quando é prestado diretamente pelo Estado) ou parcialmente público (quando
é prestado indiretamente pela Administração, através de um particular).
Especialmente a partir das desestatizações, parte dos serviços públicos é
prestada de forma indireta.
Entende-se que só se caracterizará como serviço público aquilo que é
uma necessidade, uma demanda, uma exigência da coletividade. Logo,
entende-se que o conceito de serviço público vai mudando de acordo com as
próprias necessidades da sociedade em exame. Fatores como o tempo, local,
desenvolvimento, ou seja, questões circunstanciais poderão incidir sobre o
conceito. A definição de serviço público vai depender do contexto histórico e
social. Por isso não há um rol taxativo de serviços públicos.
Para garantir a supremacia do interesse público, o Estado lança mão de
algumas ferramentas como o poder de polícia, por exemplo, que restringe,
limita, cerceia interesses particulares em razão do público.
A supremacia do interesse público fundamenta a auto-executoriedade da
ação da Administração, assim como a requisição (uso temporário que pode
acarretar indenização) ou a desapropriação (transferência definitiva de
propriedade mediante indenização).
O Estado tem prerrogativas, mas não pode dispor desse interesse
público, este é fundante nos princípios constitucionais do Direito Administrativo,
quais sejam: Legalidade, Impessoalidade, publicidade, e Eficiência. É
justamente sobre este último é que vamos centrar esforços para melhor
elucidá-lo, mormente face ao tipo de relação que constrói em contato com o
fenômeno regulatório.
32
3.2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ADMINISTRATIVOS
Enumerados no caput do art. 37 da CRFB/88, estão expressos os
princípios constitucionais da Administração Pública. Cumpre-se ressaltar que
tal dispositivo foi alterado pela Emenda Constitucional nº 19/1998, que inseriu o
princípio da eficiência. A Emenda de número 19 ficou também conhecida como
a da “reforma administrativa”.
O artigo 37, caput, da CRFB/1988, assim dispõe:
A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência
Esses princípios são aplicados à Administração Direta e Indireta, a todos
os poderes e entes. Retomamos aqui a lição da professora Di Pietro (2004) que
pontua ser Administração Pública o aparelhamento estatal, preordenado à
prestação dos serviços, conduzindo à satisfação das necessidades coletivas.
Guarda-se o aspecto formal, orgânico, ou subjetivo, quando alude aos órgãos,
aos agentes, às entidades, aos bens do Estado, ou seja, a própria máquina
administrativa; e ao cerne material ou objetivo, quando alude propriamente à
atividade administrativa.
Retomando, até 1998, havia uma noção implícita de que a regulação e
as demais atividades administrativas de Estado deveriam observar o princípio
da eficiência, tendo por base apenas o artigo 74, inciso II da CRFB/1988, ao
sustentar que:
Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:(^)
II – comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado.
33
A despeito de haver uma noção implícita de tal princípio no ordenamento
jurídico constitucional, formalmente o advento se deu a partir da já aludida
Emenda Constitucional nº 19/1998.
A expressa menção no texto constitucional como princípio regente da
Administração Pública acompanhou o desenvolvimento dos modelos de Estado
já estudados, sob forte influência do regime liberal (Estado Mínimo) bem como
a cena político-econômica global. Conforme tal influência, optou-se por atribuir
à Administração Pública a tarefa de prestação dos serviços essenciais.
Uma vez que no Capítulo I foram analisadas as diversas mudanças e o
desenvolvimento nos modelos de Estado e de Administração Pública,
constatado que a dimensão de atribuições governamentais foi alargada,
atraindo atividades de regulação e estímulo, bem como da sua ação direta,
perenemente vinculada ao interesse público, conclui-se que especialmente
após o plexo de privatizações dos anos 90, a regulação adquiriu maior relevo
no cenário brasileiro.
Neste sentido, o ministro do Supremo Tribunal Federal, professor Luís
Roberto Barroso, recorda que o Estado naquela ocasião reconheceu não ser
eficiente para exercer a produção direta dos bens e serviços, e mesmo dar
seguimento ao processo de crescimento econômico, podendo estas funções
prosperar de maneira mais adequada quando desempenhadas pela iniciativa
privada.
No atual contexto, a dimensão do princípio da eficiência no que
concerne a regulação e os serviços públicos relaciona-se com esta gestão que
atua no equilíbrio de forças do mercado e da qualidade da prestação de
serviços. Já que é o Estado quem detêm o monopólio coercitivo para controlar
e fomentar o comportamento dos agentes privados, contribuindo para o
benefício da coletividade, se valendo para tanto do comportamento eficiente
dos particulares.
Inobstante, com fulcro de assegurar essa índole comportamental, caberá
ao Estado se estruturar para isso. É na ocasião regulatória que os objetivos
devem ser monitorados, estabelecendo-se baseado nas premissas legais,
34
procurando estabelecer critérios que garantam a prestação eficiente do serviço
público.
3.3. EFICIÊNCIA E REGULAÇÃO
Leciona o professor e constitucionalista Alexandre de Moraes (2002) que
o princípio da eficiência é aquele que obriga à administração pública direta e
indireta e a seus agentes a persecução do bem coletivo, através do exercício
de suas competências de forma isenta, imparcial, transparente, democrática,
eficaz, despida de burocracia e perenemente em busca da máxima qualidade,
adotando-se critérios legais e também morais necessários para melhor
utilização possível dos recursos públicos, de maneira a reduzir eventuais
desperdícios e promover maior rentabilidade social.
Completa seu raciocínio esclarecendo que o princípio da eficiência
dirige-se para a razão e fim maior do Estado, qual seja, a prestação de serviços
essenciais à população, se valendo de todos os meios legais e morais
possíveis para a satisfação do bem comum.
Ora, estando presente o interesse público, certo é que o Estado não
poderá abrir mão dele. O administrador não teria a liberalidade de dispor
daquilo que não possui, visto ser mero depositário do encargo confiado pelo
povo, este, único detentor legítimo da coisa pública. O administrador exerce
função pública, exerce atividade em nome e no interesse do povo, logo, se o
interesse é do povo, o Estado não pode dispor. Não tem a faculdade de dispor
daquilo que não lhe pertence.
Quanto à regulação eficiente, afirma a professora Lúcia Vale Figueiredo
(2000) que:
Deveras, tal controle deverá ser exercido não apenas sobre a legalidade, mas também sobre a legitimidade e economicidade; portanto, praticamente chegando-se ao cerne, ao núcleo, dos atos praticados pela Administração Pública, para verificação se foram úteis o suficiente ao fim a que se preordenavam, se foram eficientes. (FIGUEIREDO, 2000, p.60)
35
Como corroborado por Di Pietro (2004), uma gestão pública eficiente se
obriga a exercer seu múnus com qualidade, presteza e resultados positivos,
constituindo, em termos de administração pública, um dever de mostrar
rendimento funcional, perfeição e rapidez dos interesses coletivos.
Neste diapasão, o princípio da eficiência foi positivado expressamente
na CRFB/1988 a partir da EC 19/98. Entretanto, a eficiência já estava
implicitamente inserida dentre os princípios constitucionais que regem a
Administração e, também, como regra expressa no artigo 6º da Lei 8987/95
que trata de concessão e permissão de serviço, o referido artigo conceitua o
que seria um serviço adequado, determinando, além de outras características,
que seja eficiente. Ora, é esta a ratio do principio da eficiência, promover e
assegurar que tais serviços sejam prestados com as observâncias legais.
Quando fizemos menções as fontes no Capítulo II, afirmamos que a
jurisprudência é de extrema valia ao Direito Administrativo, logo, fazemos
memória da exímia lição exarada do julgado em tela da lavra do Ministro Castro
Meira:
[....] A preocupação com o administrado-cliente é ostensivamente imposta pelo ordenamento jurídico brasileiro, encontrando amparo inclusive no Texto Constitucional. Além de ser preceito-guia da ordem econômica, a proteção ao consumidor é detalhada em legislação específica, que impõe, dentre outros direitos, seja o consumidor plenamente esclarecido quanto aos preços dos serviços que adquire. No campo da Administração Pública, particularmente, enfatiza-se a necessidade de participação do usuário no acompanhamento da prestação dos serviços públicos de que é destinatário. A previsão de execução de serviços públicos por terceiros que não o ente estatal, viabilizada através das concessões e permissões, é acompanhada de determinação legal no sentido de que aos usuários seja garantido serviço adequado, conceituado, pelo próprio legislador, como o que se executa em respeito aos princípios da generalidade (serviço para todos), da continuidade (serviço perene), da eficiência (serviço qualitativa e quantitativamente ótimo), da cortesia (serviço humanizado) e da modicidade (serviço pelo qual se cobram preços razoáveis). [....] (STJ, RESP 888.288, Rel. Min. Castro Meira, DJ 26.04.2007, pág. 238.)
Para que no serviço público se realize a eficiência, devemos abordar
mais dois assuntos, tratados pela doutrina: eficiência quanto aos meios e ao
resultado. O gasto deve ser o de menor, com o melhor resultado. Não adianta
36
gastar pouco e não se atingir um resultado satisfatório; nem gastar demais para
se obter bom resultado. Logo, deve haver meios e resultados eficientes.
O princípio da eficiência traz em seu bojo a necessidade de observância
de produtividade, proatividade, ausência de desperdícios (o gestor não pode
gastar imprudentemente o erário público), economia (obter o melhor resultado
com o menor dispêndio) agilidade e presteza.
O constituinte, à época da Emenda Constitucional nº 19, considerou que
somente colocar a eficiência como princípio da Administração não bastaria, por
isso, criou mecanismos para que a eficiência se concretizasse. Além de agir
corretamente, o administrador deve ser o melhor possível.
A regulação, portanto, observa esse preceito legal, pois é a maneira pela
qual o Estado se torna capaz de sem excessos ou subjetividade (o que feriria o
princípio da impessoalidade) exercer o controle dos agentes econômicos em
determinados setores, especialmente, no que tange a prestação de serviços
públicos.
Não se toma como de fácil atuação àquela atribuída ao agente regulador
para conformar a otimização do beneficio social com o adequado retorno pelo
concessionário (seja ele privado ou público), visto que inexiste um modelo ideal
a ser seguido, mas sim um pontual modo de regular, considerando as
peculiaridades do mercado fixado, dos agentes em atuação, e a circunstancial
situação econômica. A eficiência decorrerá das condições de concorrência,
rentabilidade, mercado, desenvolvimento e evolução do caso em tela em seus
variados modelos de gerenciamento.
No que diz respeito aos aspectos econômicos, a regulação se insurge
contra a existência das chamadas falhas de mercado. Destarte, apresenta-se
como de essencial importância para corrigir as distorções e assegurar a
qualidade e a quantidade do serviço ou bem ofertado.
Aqui, faz-se necessário desvelar uma questão conceitual, o monopólio
natural se identifica quando o custo é reduzido concentrando toda a produção
de um conjunto de bens e serviços em uma única empresa, enquanto a
externalidade se identifica quando o consumo de bens ou serviços por uma
37
pessoa, ou a produção de uma empresa, impacta diretamente o bem-estar de
outras pessoas ou empresas que não estão na relação produtiva.
Tornar a circulação de bens e serviços eficiente obriga o Estado a
regular as relações, atuando ora para corrigir os desvios em relação às
condições ideais de mercado de forma a assegurar resultados socialmente
desejáveis, ora para através das agências reguladoras apresentar o imperativo
de cooperação por parte da empresa regulada em termos de informação
necessária a fornecer para o funcionamento do sistema de regulação, e mesmo
na fixação de preços médios de produção ou do custo marginal e a delimitação
do máximo.
Logo, conclui-se que a regulação corresponde a uma política pública de
alcance mais amplo do que aquele que em geral lhe é atribuído, indo além da
mera precificação de determinados produtos e serviços com fulcro na melhoria
da eficiência do produtor e bem estar do consumidor final, mas como uma das
variáveis a serem definidas no estabelecimento das balizas fundamentais de
políticas públicas e gestão eficiente.
No Estado Democrático de Direito contemporâneo, percebe-se que a
dinâmica regulatória visa ampliar a participação popular no gozo das utilidades
públicas, otimizando a qualidade de tais utilidades, de maneira constante, com
prestígio da concorrência para melhor dinâmica de preços beneficiando ao
destinatário último dos serviços. Logo, implica tal lógica ao bojo de ações
estatais que objetivam concretizar o princípio da eficiência nos termos em que
a doutrina brasileira consagrou.
Como conclui o administrativista Alexandre Aragão (2002),
especialmente no que concerne a atuação estatal na economia, o requisito da
legitimidade da Administração Pública é a observância dos princípios do
Estado Democrático de Direito, notadamente, os princípios da razoabilidade e
da eficiência, limitando os direitos e interesses, sejam de natureza individual ou
coletiva, apenas na medida em que seja capaz de atingir com eficiência os fins
públicos colimados.
38
Forçoso, portanto, é reconhecer que o fenômeno da regulação se
relaciona a uma necessidade do Estado em tornar mais eficientes os serviços
prestados e tomados. Senão, vejamos.
Como afirma o professor Hely Lopes (2001), tais entes se investem de
qualificação de autarquia e fundações, estabelecidas com o preceito de
aumentar a eficiência, mediante a ampliação de sua autonomia paralelamente
à responsabilidade de seus administradores.
A agência reguladora, portanto, terá mais autonomia que as demais
autarquias. Essa liberdade decorre da função que exerce (regular as diversas
atividades em setores elencados por Lei específica).
Essa atividade tradicionalmente exercida pelo Estado, adquire uma nova
formatação, qual seja, a criação de uma pessoa jurídica exclusivamente para
este fim. Ademais, a nomeação dos dirigentes é diferente (investidura
especial), onde o Presidente da República nomeia, mas observando prévia
autorização do Senado, além de que, o dirigente exerce mandato com prazo
fixo (atualmente este prazo é definido pela lei de criação da agência, variando
cada caso).
Apenas a título de esclarecimento, atualmente existe projeto de lei no
Congresso Nacional que pretende fixar o prazo em quatro anos para todas as
agências. O dirigente poderia sair antes do prazo somente por condenação ou
renúncia. Ao sair da agência, o dirigente cumprirá a chamada quarentena (no
mesmo ramo) de quatro meses (salvo algumas exceções, cujas leis
determinam 12 meses), recebendo salário.
Neste diapasão, resta evidente que o próprio advento das agências
reguladoras corresponde à materialização do princípio da eficiência, já que
estamos diante de um ente especializado, determinado em Lei, com propósito
previamente fixado para consecução do bem comum através da regulação de
determinado setor, especificamente envidando esforços para melhor geri-lo.
39
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A monografia apresentada não tem a pretensão de esgotar o assunto,
mas acredita firmemente que o estudo oferecido em um trabalho acadêmico
poderá contribuir para evolução do pensamento coletivo a esse respeito, para
tal, buscou através de uma abordagem científico-acadêmica, tornar possível a
reflexão e o aprimoramento na formação de gestores públicos que contribuam
para o Estado Democrático de Direito contemporâneo.
Destarte, visto como as evoluções correram historicamente para os
modelos de Estado. Conclui o hermeneuta existir indissociável relação entre a
manifestação da regulação e a organização regimental adotada pelo Poder
constituído.
Entende-se, conforme apresentado no estudo, que a compreensão
sobre a regulação administrativa não pode prescindir da reflexão acerca do
papel estatal e das mutações pelas quais se submete. Resta claro que partir da
premissa de classificação fixa se conduziria a uma interpretação superficial.
Infere-se que o estado Democrático de Direito pátrio está atualmente
formatado no sentido de limitar os poderes dos governantes com as devidas
garantias individuais, sendo uníssono o entendimento doutrinário de que
quanto maior o desenvolvimento democrático de um Estado, mais eficiente
será a regulação de seus atos, ou seja, espelha a Regulação como verdadeira
atividade administrativa a ser criteriosamente estudada.
Após o escrutínio minudenciado dos variados conceitos que
compreendem a regulação, depreende-se dessa relação intrínseca entre as
políticas públicas e as dimensões de direitos, as consequências jurídicas
tratadas ao longo do trabalho, dentre elas a necessidade do controle
regulatório e administrativo, por suas próprias características estruturais e
conseguinte realidade fática, como propícia ao regime adotado pelo Estado
(seja Liberal, seja Social, seja Contemporâneo).
Tem-se que as ambições da sociedade, por uma coletividade justa e
participativa no processo democrático, não podem prescindir da concretização
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e regulação eficiente por parte da Administração Pública. Para que isso se
torne realidade, é importante analisar os limites da função administrativa e do
controle do Estado-Gestor, conforme evidenciado, determinando as esferas de
atuação da Administração na interpretação e aplicação das normas pertinentes.
Conclui-se que hodiernamente, os meios de regulação e controle
utilizados pelo Estado ganham relevo na mídia, e vulto neste estudo onde foi
utilizada a estratégia de pesquisa exaustiva da doutrina administrativista e
reflexão sobre esta. Tal linha se apresenta de forma interessante, por trata-se
de uma inquirição acadêmica que investiga um fenômeno histórico,
confrontando este ao seu contexto atual.
Acreditamos ainda, que a escolha do tema desvelou ainda mais sentido
ao perpassar pelo exercício da cidadania, instrumento fundamental para
qualquer país democrático.
Desta feita, cremos que o desenvolvimento das políticas públicas
demanda precipuamente um exaustivo debate nacional de temas como este,
pois coloca no centro das discussões da comunidade acadêmica quais
paradigmas poderiam ser adotados e como se poderia evoluir a partir deles.
Ressalta-se que nos países em desenvolvimento como o Brasil, onde
notoriamente convivemos com níveis de desigualdade social e corrupção
generalizada, a participação em sinergia da Administração Pública e os
administrados pode garantir que haja uma regulação mais eficiente das
políticas públicas, e que esses sejam direcionados no rumo da justiça social, a
vontade da lei só restará completa com a estrita observância deste
comportamento.
Considerado que a Administração Pública, visando atender as
necessidades sociais e buscando a realização do interesse público (primário e
secundário), goza de verdadeiros poderes-deveres (MEIRELLES, 2001). O
exercício de tais direitos se concretiza por intermédio de atos administrativos,
manifestação de vontade funcional apta a gerar efeitos jurídicos, produzida no
exercício da já sobredita atividade administrativa.
Infere-se que a concretização do princípio da eficiência, conforme visto
no caso das agências, por tratar-se de um ente especializado com propósito
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previamente fixado para consecução do bem comum através da regulação de
determinado setor, capitula ante tal compreensão, pois pretendeu-se com isto
adquirir uma visão global de seu funcionamento e de como os agentes estatais
o utilizam, e como o mercado responde.
A atividade administrativa, desta feita, estará albergando os atos
administrativos, que devem por óbvio observar a finalidade do interesse
público, sob pena de estarem eivados de ilegalidade ou mesmo de abuso de
poder.
Conclui-se que o Estado-Regulador eficiente se obrigará a uma atuação
transparente, isonômica e legítima, conforme os valores sociais e a finalidade
das normas e princípios consagrados pelo ordenamento jurídico pátrio.
Por derradeiro, infere-se então que a regulação em uma gestão pública
eficiente é a forma pela qual o Estado investido de legitimidade (adquirida no
Estado Liberal), isonomia (ínsita ao Estado Democrático), e finalidade pública
(fruto do Estado Social), se torna capaz de sem maiores excessos ou
subjetividades, se tornar definitivamente apto a exercer o controle hábil dos
agentes econômicos.
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