Há mais de um ano que ouço falar neste estudo
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Há mais de um ano que ouço falar neste estudo… 20 Jul, 2015 in Escola Disciplina by Alexandre Henriques
No dia 18 de julho saiu esta notícia no DN.
PROFESSORES NÃO TÊM FORMAÇÃO
PARA LIDAR COM A INDISCIPLINA NAS
SALAS DE AULA Há um défice de formação para lidar com a indisciplina em Portugal, de acordo com
um estudo que está a ser desenvolvido pela Universidade do Minho e que contou com a
colaboração de três mil professores. 60% dos participantes, muitos no ensino há várias
décadas, afirmaram nunca ter tido qualquer formação específica para lidar com este
problema, que até ao 25 de Abril de 1974 era resolvido através da aplicação de
castigos severos com réguas e canas-da-índia. A situação agrava-se quando 85% dos
participantes consideram que a indisciplina “aumentou significativamente, ou muito
significativamente”, nas salas de aula nos últimos cinco anos.
Este estudo começou a ser feito há mais de
um ano e foi apresentado na Assembleia da República no passado mês de maio, numa
conferência sobre “Indisciplina em Meio Escolar”. A mesma conferência onde o ComRegras foi
citado pelo Vice-Presidente da ANDAEP, Filinto Lima, e que foi publicada aqui. Portanto, a
notícia de 18 de julho do DN é uma não notícia, o que não é novidade, pois basta estarmos
atentos aos telejornais para assistirmos a várias notícias em loop. A novidade neste caso foi
dar uma não notícia com mais de um mês e meio de atraso…
Sobre o estudo propriamente dito, eu vi o seu inquérito e respondi ao mesmo. Em maio
já tinham respondido aproximadamente 3500 professores, uma amostragem curta tendo
em conta o universo docente, mas infelizmente a adesão voluntária para responder a
inquéritos desta natureza está pelas ruas da amargura… Se este estudo continua a ser
desenvolvido, certamente que não deve ser à custa do mesmo inquérito, tal não faria
sentido tendo em conta que já passou um ano desde o seu início. Continuo a aguardar as
conclusões finais deste estudo, que considero muito relevante, mas infelizmente
tarda em terminar.
Ao menos esta notícia serviu para que o blogue Atenta Inquietude, fizesse uma análise
bastante lúcida sobre a indisciplina em Portugal e que vale a pena ler.
INDISCIPLINA ESCOLAR. PROBLEMAS NOVOS,
SOLUÇÕES NOVAS
Segundo um estudo em curso realizado pela Universidade do Minho envolvendo 3000
professores, 60 % dos participantes revela não ter recebido formação específica para
lidar com problemas de indisciplina na sala de aula. Cerca de 85 % considera que a
ocorrência de episódios de indisciplina aumentou nos últimos cinco anos.
Os professores inquiridos referem (por esta ordem) a família, as políticas educativas, os
alunos, as direcções de escola e os próprios professores como factores contributivos
para situações de indisciplina
Outros estudos sugerem que uma parte bastante significativa do tempo dos professores
em sala de aula é gasta na gestão do comportamento dos alunos em detrimento das
tarefas de ensino.
Algumas notas.
Em primeiro lugar julgo que importa clarificar o que está em causa. Permitir, por
exemplo, que um telemóvel toque na sala de aula ou outros comportamentos
desadequados em sala de aula ou na escola serão indisciplina, insultar, humilhar,
confrontar fisicamente um professor, comportamentos frequentes de agressão ou roubos
a colegas configuram pré-delinquência ou delinquência e comportamentos disruptivos
podem ainda estar ligados a perturbações de natureza psicológica.
A escola não pode ser responsabilizada e considerada competente por e para todo este
universo de problemas nos comportamentos dos mais novos. Para situações de pré-
delinquência ou perturbações do comportamento pode, evidentemente, dar contributos
mas não assumir a responsabilidade pelo que importa clarificar a análise.
Centremo-nos então na indisciplina escolar que considero matéria de competência da
escola e matéria de responsabilidade de toda a comunidade, incluindo os pais,
naturalmente, e todas as figuras com relevância social, por exemplo, não se riam,
políticos ou jogadores de futebol.
O Estatuto do Aluno, no qual o MEC depositava públicas esperanças que me pareceram,
desde sempre, sobrevalorizadas e desadequadas face aos seus conteúdos e à realidade
das escolas e comunidades actuais, qualquer que seja, é um regulador, melhor ou pior,
mas nunca A solução e, pela mesma razão, nunca será A causa da indisciplina. Daí a
minha reserva face aos discursos do MEC acreditando que do lado de fora da escola os
problemas se resolverão.
Parece-me também de referir que todas as figuras sociais a que se colam traços de
autoridade por exemplo, pais, professores, médicos, polícias, idosos, etc., viram alterada
a representação social sobre esses traços. Dito de outra maneira, o facto de ser velho,
polícia, professor ou médico, já não basta, só por si, para inibir comportamentos de
desrespeito pelo que importa perceber o impacto destas alterações nas relações entre
professores e alunos.
As mudanças significativas no quadro de valores e nos comportamentos criam
dimensões novas em torno de um problema velho, a indisciplina. Daqui decorre, por
exemplo, que restaurar a autoridade dos professores, tal como era percebida há décadas,
é uma impossibilidade porque os tempos mudaram e não voltam para trás. Pela mesma
razão, não se fala em restaurar a relação pais – filhos nos termos em que se processava
antigamente e falar da “responsabilização” dos pais é interessante, mas é outro nada.
Um professor ganha tanta mais autoridade quanto mais competente e apoiado se sentir.
O apoio aos professores é um problema central no que respeita à indisciplina mas não
só.
Assim sendo, o MEC não pode desenvolver políticas que socialmente deixem o
professor desapoiado, que comprometam o clima e a qualidade de trabalho nas escolas
e, simultaneamente, afirmar que vai restaurar a sua autoridade e promover a sua
valorização social. Também por isto se questiona a incompetente constituição de mega-
agrupamentos e de escolas e turmas com dimensões excessivas, variável associada à
indisciplina escolar.
É também importante reajustar a formação de professores. As escolas de formação de
professores não podem “ensinar” só o que sabem ensinar, mas o que é necessário ser
aprendido pelos novos professores e pelos professores em serviço. Problemas “novos”
carecem também de abordagens “novas”.
Parece também importante a existência de estruturas de mediação entre a escola e a
família o que implica a existência de recursos humanos qualificados e disponíveis.
Veja-se o trabalho dos GAAFs apoiados pelo IAC, experiências no âmbito da
intervenção da Associação EPIS ou iniciativas que algumas escolas conseguem
desenvolver e que permitam apoiar os pais dos miúdos maus que querem ter miúdos
bons e identificar as situações para as quais, a comprovada negligência dos pais exigirá
outras medidas que envolvam, eficazmente e em tempo oportuno as CPCJ.
Um caminho de autonomia, com a alteração desejável dos modelos de organização e
funcionamento das escolas e na gestão curricular, deveriam permitir que as escolas,
algumas escolas, mais problemáticas tivessem menos alunos por turma, mais assistentes
operacionais com formação em mediação e gestão de conflitos ou ainda que se
utilizassem, existindo, professores em dispositivos de apoio a alunos em dificuldades.
Por outro lado, os estudos e as boas práticas mostram que a presença simultânea de dois
professores é um excelente contributo para o sucesso na aprendizagem e para a
minimização de problemas de comportamento bem como se conhece o efeito do apoio
precoce às dificuldades dos alunos.
As dificuldades dos alunos estão com muita frequência na base do absentismo e da
indisciplina, os alunos com sucesso, em princípio, não faltam e não apresentam grandes
problemas de indisciplina.
Os professores também sabem que na maior parte das vezes, os alunos indisciplinados
não mudam os seus comportamentos por mais suspensões que sofram. É evidente que
importa admitir sanções, no entanto, fazer assentar o combate à indisciplina nos castigos
aos alunos e, eventualmente, nas multas e retirada de apoios aos pais, é ineficaz, é
facilitista na medida em que é a medida mais fácil e mais barata, é demagógica porque
vai ao encontro dos discursos populistas que aplaudem a ideia do “prender” do
“expulsar” até ficarem só os nossos filhos.
O problema é quando também nos toca a nós, aí clamamos por apoios.
Os discursos demagógicos e populistas, ainda que bem-intencionados, não são um bom
serviço à minimização dos muito frequentes incidentes de indisciplina que minam a
qualidade cívica da nossa vida além, naturalmente, da qualidade e sucesso do trabalho
educativo de alunos, professores e pais.
Zé Morgado (2015). “INDISCIPLINA ESCOLAR. PROBLEMAS NOVOS, SOLUÇÕES
NOVAS”. http://atentainquietude.blogspot.pt/, 18 de julho.