Concretos não estruturais utilizando resíduos da indústria ... · mecânicas, avaliadas por...
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CONCRETOS NÃO ESTRUTURAIS UTILIZANDO RESÍDUOS DA INDÚSTRIA DE LOUÇA SANITÁRIA
C. A. MARTINS (1); J. B. BALDO, (1); V. L. SORDI, (1); J. S. da COSTA, (2). (1) UFSCar-DEMa. End: Rod..Washington Luís, km 235
São Carlos –SP CEP – 13565-905. [email protected]
(2) Doutoranda: PPG-CEM-DEMa-UFSCar [email protected]
RESUMO Rejeitos da indústria de louça sanitária, compostos por peças vitrificadas, com
defeitos, foram preparados na forma de agregado graúdo através de britagem.
Foram preparadas composições nas quais estudou-se os efeitos nas propriedades
mecânicas, avaliadas por normalização da ABNT, decorrentes da substituição do
agregado graúdo (brita), por agregados de tamanho similar obtidos da cominuição
adequada dos rejeitos, na composição de um concreto de cimento portland
convencional (150 a 250 kg de cimento por metro cúbico). Foi encontrado que o
concreto resultante é apropriado para confecção de elementos não estruturais
(calçadas, guias, postes domésticos, muros, mourões, etc) com as vantagens da não
utilização de brita, e os conseqüentes benefícios ambientais.
Palavras Chaves: concreto de cimento portland, agregados alternativos, reciclagem,
louça sanitária
1 - INTRODUÇÃO
São dezesseis as fábricas de louça sanitária no Brasil, com seis em São Paulo,
duas em Minas Gerais, três em Pernambuco, duas na Paraíba e uma em cada um
dos seguintes estados: Espírito Santo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. Em
1999, a indústria brasileira produziu 14,2 milhões de peças grandes, sendo a maioria
na região Sudeste (1) . O volume de material descartado pelo setor é considerável,
considerando que a perda média relatada pela indústria situa-se em 3%, o que
significa 426 mil peças descartadas para aterros, anualmente. Uma indústria da
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região de Minas Gerais produz cerca de 170 mil peças mensais, de peso médio 14
quilos, com perda de 3%, descartando mais de 60 toneladas mensais. Isso significa
que apenas essa indústria pode fornecer cerca de 600 metros cúbicos de um
agregado similar a uma areia média por ano.
Aparentemente não existe nenhum estudo fundamental sobre o tema
enfocado, e desse modo o presente trabalho objetiva uma investigação sobre a
utilização da reciclagem de rejeitos de uma das indústrias de louça sanitária da
região de Minas Gerais, no desenvolvimento de argamassas e concretos para uso
na indústria da construção civil.
2 – METODOLOGIA
O estudo usou como base a comparação das propriedades entre dois tipos de
concretos, com a mesma proporção em peso: um utilizando agregados
convencionais de origem natural (concreto REFERÊNCIA), e outro com parte dos
agregados reciclados (concreto CLS). Para determinação dos valores envolvidos,
como o da resistência à compressão, foram utilizadas as normas brasileiras da
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS - ABNT em vigência.
2.1 - Caracterização dos materiais Os agregados graúdos de reciclagem são provenientes da britagem de louça
sanitária, cujo grão passa por uma peneira de malha quadrada com abertura nominal
de 9,4 mm e ficam retidos na peneira ABNT no 4 (4,8mm) (NBR 7211).(2)
Na composição do traço, o agregado graúdo para o concreto CLS foi
constituído totalmente por agregado reciclado de louça sanitária. No concreto
REFERÊNCIA o agregado graúdo utilizado foi a brita denominada brita 1. O
agregado miúdo foi constituído apenas por areia natural. O agregado natural (areia) utilizado tem uma granulometria que o coloca
aproximadamente dentro da faixa considerada areia média, conforme é mostrado na
Figura 1.
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Limites Granulométricos para Areia Média Rio
0 %
10 %
2 0 %
3 0 %
4 0 %
5 0 %
6 0 %
7 0 %
8 0 %
9 0 %
10 0 %
9.56.34.82.41.20.60.30.15Abertura das Peneiras (mm)
% R
etid
a A
cum
ulad
a
Amostra Limites
Figura 1 – Distribuição granulométrica para a areia utilizada; Módulo de Finura = 3,92 e Diâmetro Máximo Característico = 4,8 mm
O cimento utilizado foi o cimento Portland CPII-F-32, da marca Itaú cujas
características estão listadas na Tabela 1, e estão de acordo com a NBR 11578 (4).
Tabela 1 – Características do cimento utilizado
Característica Cimento Tipo CP II-F-32 Finura (%) 3,0 Massa unitária (g/cm3) 1,15
2.2 - Produção do Concreto A proporção em peso utilizada para os concretos foi de 1:2,23:1,77:0,5
(cimento:areia:agregado natural ou reciclado:água). Em volume, essas proporções
estão listadas na Tabela 2.
Tabela 2- Constituintes do concreto, proporção em volume
Constituinte % VolumeCimento 19
Areia 40 Agregado (nautural ou reciclado) 32
água 9 Cada concreto foi misturado em betoneira a uma temperatura de 30°C ± 2°C
e umidade relativa de 68% (ambiente do laboratório), por um período de 3 minutos,
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seguido por repouso de 10 minutos, mistura por mais 1 minuto e em seguida,
descarga da betoneira e moldagem dos corpos de prova.
Os corpos de prova foram moldados no formato cilíndrico, com diâmetro de
100 mm e altura de 200 mm, conforme a NBR 5738 (5). Após desmoldagem, os
corpos de prova foram curados em água por 7, 28 e 91 dias, e em seguida
submetidos ao ensaio para verificação da resistência à compressão, conforme a
NBR 5738 ABNT (5).
2.3 - Propriedades
A consistência dos concretos foi avaliada através do ensaio de abatimento,
fazendo-se uma adaptação da NBR 7223 (7), utilizando um cone de dimensões 7,5
cm de diâmetro no topo, 15 cm de diâmetro na base e 20 cm de altura. Outros
indicadores são mostrados na Tabela 3.
Tabela 3 – Algumas propriedades do concreto fresco e de constituintes; CLS: concreto utilizando o agregado reciclado; REFERÊNCIA: concreto utilizando brita 1.
Densidade de massa (g/cm3)
Fator água/ cimento (a/c)
Abatimento tronco de cone
(mm) Massa unitária
do agregado (g/cm3)
CLS 2.45 0.50 50 1.33 Referência 2,65 0,68 50 1,43 NBR 7223 (7) 7251 (8)
A propriedade avaliada no estado endurecido, tanto no concreto de referência
como no concreto contendo agregado reciclado de louça sanitária, foi a resistência à
compressão nas diversas idades, conforme a NBR 5739 (9), cujos resultados são
mostrados na Tabela 4 e na Figura 2.
Tabela 4 – Resistência à Compressão (MPa) nas diversas idades para os dois tipos de concreto avaliados neste estudo.
RC (MPa) IDADE(dias) CLS REFERÊNCIA 7 18,6 15,2
28 26,6 23.3 91 27,7 24,3
2.4 – Análise Microestrutural
Nas Figuras 3, 4 e 5, estão as micrografias eletrônicas de varredura, as quais
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revelam o aspecto de fratura do concreto aos 28 dias. Pelas micrografias podemos
observar o desenvolvimento do concreto durante sua cura.
RESISTÊNCIA MECÂNICA X IDADE
18,6
26,6 27,7
15,2
24,323,3
0
10
20
30
7 28 91
IDADE (dias)
RC (M
Pa)
CLS
REF
Figura 2 - Resistência à compressão determinada em função da idade, para os concretos CLS e REFERÊNCIA.
Figura 3 - CLS, fratura aos 28dias - Imagem da amostra destacando aglomerados de CSH e feixes fibrosos, que parecem estar preenchendo a porosidade. Nota-se os típicos cristais aciculares de AF(etringita).
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Figura 4 – Micrografia eletrônica de varredura da superfície de fratura do concreto CLS aos 28 dias. Aglomerados típicos de formação de hidratos tipo C-S-H.
Figura 5 – Micrografia eletrônica de varredura da superfície de fratura do concreto CLS aos 28 dias. Imagem da amostra destacando uma aglomeração de feixes fibrosos preenchendo o poro , típicos de cristais aciculares de AF.
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2.5 - Microanálise - EDX
FeTiTi FeCa SMgCa
AlS
OSi
Ca
1 2 3 4 5 6 7 8Full Scale 40285 cts Cursor: 8.410 keV (231 cts) keVFull Scale 40285 cts Cursor: 8.410 keV (231 cts) keVFull Scale 40285 cts Cursor: 8.410 keV (231 cts) keV
Spectrum 1
Figura 6 - Micrografia eletrônica de varredura da superfície de fratura aos 28 dias e respectivo EDAX do concreto CLS.
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3- DISCUSSÃO Quanto à preparação do concreto CLS, não ocorreu dificuldade maior. Uma
vez que os agregados graúdos obtidos a partir dos elementos descartados de louça
sanitária não apresentam porosidade apreciável, o modo de preparação foi igual à
preparação dos concretos que utilizam como brita, o granito ou basalto.
Os resultados obtidos na determinação da resistência à compressão para o
concreto CLS são também animadores. O valor encontrado aos 28 dias, de 26,6
MPa, sugere que um concreto assim preparado pode ser utilizado para fins
estruturais, se nos basearmos apenas por este quesito. Obviamente outros estudos
deverão ser efetuados para garantir, por exemplo, a durabilidade desse concreto.
Nas fotos da Figura 7, notamos que não ocorreu, extensivamente, ruptura nos
grãos do agregado graúdo, no concreto CLS. De certa forma, é um fator positivo,
pois estamos aproveitando totalmente a resistência mecânica que o cimento
desenvolve no concreto, mas isso é um fator que deverá ser verificado com mais
cuidado no futuro, a fim de verificar qual é a extensão ou quais as condições em que
ocorreram rupturas no agregado.
Figura 7- Corpos de prova rompidos com idade de 7 dias, cura por imersão, concreto com agregado graúdo obtido a partir de descartes de louça sanitária. Esquerda: corpo logo após fratura; direita: visão da área fraturada.
O mecanismo de aumento da resistência mecânica com a idade está
associado ao desenvolvimento das fases na hidratação do cimento. Aparentemente,
ocorreu algum crescimento na resistência mecânica observada aos 91 dias, o que
pode significar que o sistema está se comportando de maneira similar àquele
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composto por britas de granito e basalto. Pelos resultados nota-se que o concreto
contendo agregado reciclado grosso de louça sanitária, apresentou uma maior
resistência à compressão do que um concreto comum de mesma classe contendo
brita como agregado grosso.
As micrografias revelam um desenvolvimento normal dos produtos de
hidratação sobre os agregados de louça sanitária. Não se nota nenhum efeito visível
da fase do vidrado cerâmico na concentração e distribuição dos produtos de
hidratação, o que é corroborado pelas micro-análises (EDAX). Isso indica que o fato
dos agregados conterem o esmalte cerâmico não impediu a funcionalidade do
agregado como formador de esqueleto no concreto. O concreto após mistura apresentou-se consistente e coeso, dispensando
maiores teores de água para ajuste da trabalhabilidade, o que se verifica pelo seu
menor índice de consistência, semelhante ao concreto convencional.
. Sendo o consumo de cimento igual entre o concreto comparada, podemos
afirmar que o aumento da resistência à compressão do concreto reciclado pode ter
sido influenciado pela menor relação água/aglomerante.
4- CONCLUSÕES Foi possível confeccionar um concreto utilizando os agregados graúdos, areia
grossa, cimento e água, onde os agregados foram obtidos através da cominuição
adequada de elementos descartados da indústria de Louça Sanitária, e que atingiu
resistência mecânica adequada para fins estruturais, no uso em construção civil, se
considerarmos apenas o quesito resistência mecânica em compressão.
O fato dos agregados reciclados conterem alguma face com esmalte
cerâmico, não impediu a funcionalidade do agregado como formador de esqueleto
no concreto, sem ainda considerar o efeito ao longo de maiores idades, e
conseqüentemente, aspectos de durabilidade. Em vista dos resultados obtidos pode-se concluir pela viabilidade e grande
potencial de uso de tal concreto em aplicações não estruturais.
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5 – BIBLIOGRAFIA 1. CERÂMICA NO BRASIL- PANORAMAS SETORIAIS-LOUÇAS SANITÁRIAS. Disponível em http://www.abceram.org.br, acesso em 20/06/2002. 2. NBR 7211. Agregados para concreto – especificação. Rio de Janeiro, 1983. 3. NBR 7217 Agregado - Determinação da composição granulométrica - Método de Ensaio - 1987 4. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1987). NBR 11578.Cimento Portland para argamassas. Rio de Janeiro, ABNT. 5. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1994). NBR 5738. Moldagem e cura de corpos-de-prova cilíndricos ou prismáticos de concreto. 6. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR -7215- 91. Cimento Portland - Determinação da resistência à compressão. Rio de janeiro,1921, ABNT. 7. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1982). NBR 7223 – Concreto-determinação da consistência pelo abatimento do tronco de cone. 8. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1995). NBR 7251. Agregado no estado solto – Determinação da massa unitária. Rio de Janeiro, ABNT. 9. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1994). NBR 5739. Concreto – Ensaio de compressão de corpos-de-prova cilíndricos.
PORTLAND CEMENT CONCRETE CONTAINING AGGREGATES MADE FROM GLAZED SCRAP FROM SANITARY WARE
ABSTRACT
Glazed Scrap from the sanitary ware industry were grinded and screened to simulate the aggregate size of limestone in Portland cement concrete compositions. The concrete containing de sanitary ware recycled aggregate, used 150kg/m3 of cement. The mechanical properties of this concrete were comparatively evaluated to a convencional Portland cement concrete containing a similar cement content and water to cement ratio, plus river sand and limestone aggregate. Considering the comparable levels of strength found for the concretes containing the recycled aggregate it can be concluded that it is higly feasible the recycling of scrap from sanitary ware as an alternative aggregate in non structural Portland cement concrete, with great benefits from the point of view of environment and mineral resources preservation. Key Words : Concrete, sanitary ware recycling, aggregates.
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