Civil e processual civil. indenização por danos materiais. ação regressiva do estado.
description
Transcript of Civil e processual civil. indenização por danos materiais. ação regressiva do estado.
Página 1 de 7
Apelação Cível n° 2010.008349-0.
Origem: 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal.
Apelante: Estado do Rio Grande do Norte.
Procurador: Dr. José Marcelo Ferreira Costa.
Apelado: Paulo Pinheiro de Macêdo Neto.
Advogado: Dr. Dayvisson Cabral Ferreira.
Relator: Juiz Convocado Nilson Cavalcanti.
EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. AÇÃO
REGRESSIVA DO ESTADO. ACIDENTE DE VEÍCULO
PROVOCADO POR AGENTE DA POLÍCIA MILITAR
NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES. PRESCRIÇÃO
TRIENAL. ART. 206, §3º, v, DO CC.
INAPLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DO DECRETO Nº
20.910/32. NORMA DE CARÁTER ESPECÍFICA.
PRINCÍPIO DA ISONOMIA. APLICAÇÃO DA REGRA
TAMBÉM ÀS DEMANDAS PROMOVIDAS PELO
PODER PÚBLICO EM FACE DO PARTICULAR.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL CARACTERIZADA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. PRECEDENTES
DO STJ.
- Nos termos do artigo 1º do Decreto nº 20.910/32, é de 5
anos o prazo prescricional da ação de indenização
proposta contra a fazenda pública.
- A aplicação principiológica da isonomia, permite a
incidência da regra, também, nas pretensões deduzidas
pelo poder público em face do particular.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 2 de 7
as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara
Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em turma, à unanimidade em harmonia com o
parecer da 7ª Procuradoria de Justiça, conhecer e dar provimento ao recurso, nos
termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Estado do Rio
Grande do Norte em face da sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda
Pública da Comarca de Natal que, nos autos da Ação de Indenização por Danos
Materiais proposta em desfavor de Paulo Pinheiro de Macêdo Neto, julgou extinto o
processo com resolução de mérito, com fulcro no art. 269, IV, do Código de Processo
Civil (reconhecimento da prescrição).
Em suas razões recursais, aduz, em síntese, que, ao
contrário do entendimento firmado pelo juiz a quo, de que os prazos prescricionais
relativos à Fazenda Pública são trienais, aplica-se, ao caso, as regras insculpidas no
Decreto nº 20.910/32 que, em seu art. 1º, expressamente dispõe acerca do prazo
quinquenal.
Assevera que as disposições atinentes ao prazo
prescricional das ações de reparação civil contidas no Código Civil, não podem se
sobrepor às regras de caráter especial do citado Decreto, mormente considerando-se
ser aquela, lei especial objetiva, ao passo que esta possui natureza nitidamente
subjetiva, devendo-se, portanto, aplicar às demandas em que for parte a Fazenda
Pública.
Argumenta que, a teor do art. 10, do Decreto nº 20.910/32,
fixar que seus dispositivos não alteram as prescrições de menor prazo constantes em
outras leis e regulamentos, mesmo assim, impertinente se falar em aplicação da
prescrição trienal disposta na Lei Civil, justificando sua alegação no fato de figurar a
Fazenda Pública no pólo ativo da demanda.
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 3 de 7
Ao final, após colacionar julgado em prol de sua tese,
pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, a fim de que seja reformada a
sentença, aplicando-se, por conseguinte, a prescrição quinquenal ao caso em comento,
nos termos do que dispõe o art. 1º, do Decreto nº 20.910/32.
Contrarrazões pelo improvimento do recurso (fls. 122/138).
A 7ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e
provimento do recurso (fls. 143/150).
É o relatório.
VOTO
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do
recurso.
A questão posta em análise, cinge-se ao debate acerca de
qual prazo prescricional é aplicável às pretensões de reparação civil envolvendo à
Fazenda Pública no pólo ativo, se o trienal previsto no art. 206, §3º, V, da Lei Civil ou
o quinquenal disposto no art. 1º, do Decreto nº 20.910/32.
Pois bem. De início, ressalte-se a inexistência de regra a
fixar, ainda que genericamente, um prazo prescricional a ser aplicado às ações
judiciais pretendendo reparação civil intentadas pelo Poder Público em face do
particular, motivo pelo qual ainda se observa a ausência de posição doutrinária e
jurisprudencial pacífica acerca do tema.
No entanto, não obstante toda essa divergência, filio-me
àqueles que entendem pela prescrição quinquenal em casos como os dos autos,
considerando-se não apenas o caráter específico e subjetivo do Decreto nº 20.910/32,
como também as questões de natureza principiológica aplicadas à hipótese.
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 4 de 7
Primeiramente, vale ressaltar que me parece inapropriado
aplicar ao caso, por analogia, as regras atinentes ao direito civil, posto que as razões
que o informam são tão distintas das que inspiram as relações de direito público, que
nem mesmo em tema de prescrição, caberia buscar inspiração em tal fonte,
devendo-se, antes de tudo, indagar do tratamento atribuído ao tema em regras
genéricas de direito público, estas sim, abrangedoras da espécie.
Dito isto, resta-nos a análise das disposições contidas no
art. 1º1, do Decreto nº 20.910/32, que por tratar de matéria relativa ao direito público;
ser específica, já que dispõe acerca da prescrição; e possuir caráter nitidamente
subjetivo, posto envolver direitos relacionados à Fazenda Pública, aplica-se ao caso
concreto em face de qualquer outra norma existente em nosso ordenamento jurídico.
Sobre esta interpretação, já se manifestou o STJ quando do
julgamento do AgRg no Resp nº 1015571-RJ, pertinentemente frisando que: "As
relações obrigacionais estabelecidas entre os particulares e o Ente Público encontram
no Decreto nº 20.910/32 norma disciplinadora quanto ao prazo prescricional,
constituindo verdadeira lex especialis que se sobrepõe sobre os demais prazos
prescricionais derivados de normas gerais."
No que pertine o fato do dispositivo em enfoque envolver
direitos ou ações promovidas em face da Fazenda Pública, situação diametralmente
oposta à constante dos autos, vale a aplicação principiológica da isonomia, que por si
só, impõe a incidência recíproca do prazo prescricional nas pretensões deduzidas em
face do poder público e deste em face do particular.
De fato, assim como o administrado dispõe do prazo de 5
1 "As dívidas passivas da união, dos estados e dos municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra
a fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da
data do ato ou fato do qual se originarem."
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 5 de 7
anos para se insurgir judicialmente contra ato da Fazenda Pública, da mesma forma
deve ser concedido igual prazo para que o poder público busque a prestação
jurisdicional em face do particular, em nítida submissão aos preceitos do
constitucional princípio da isonomia, já citado supra.
A correção da compreensão ora defendida, encontra
respaldo na doutrina pátria, senão vejamos o posicionamento de Celso Antônio
Bandeira de Melo2:
"Vê-se, pois, que este prazo de cinco anos é uma
constante nas disposições gerais estatuídas em regras de
Direito Público, quer quando reportadas ao prazo para o
administrado agir, quer quando reportadas ao prazo para
a Administração fulminar seus próprios atos. Ademais,
salvo disposição legal explícita, não haveria razão
prestante para distinguir entre Administração e
administrados no que concerne ao prazo ao cabo do qual
faleceria o direito de reciprocamente se proporem ações."
(Destaquei).
Ademais, não é demasiado que se traga à colação, por total
pertinência ao tema em exame, o seguinte julgado proveniente do STJ, senão vejamos:
"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO.
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO A IMÓVEL
PÚBLICO. ACIDENTE OCASIONADO POR VEÍCULO
PARTICULAR. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO DO
DECRETO Nº 20.910/32.
1. O art. 1º do Decreto nº 20.910/32 dispõe acerca da
prescrição qüinqüenal de qualquer direito ou ação contra
2 Celso Antônio Bandeira de Melo, Curso de Direito Administrativo, 17ª Ed. Editora Malheiros, pág. 931.
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 6 de 7
a Fazenda Pública, seja qual for a sua natureza, a partir
do ato ou fato do qual se originou.
2. A aplicação principiológica da isonomia, por si só,
impõe a incidência recíproca do prazo do Decreto
20.910/32 nas pretensões deduzidas em face da Fazenda e
desta em face do administrado. Precedentes do STJ: REsp
946.232/RS, DJ 18.09.2007; REsp 444.646/RJ, DJ
02.08.2006; REsp 429.868/SC, DJ 03.04.2006 e REsp
751.832/SC, DJ 20.03.2006.
3. In casu, a pretensão deduzida na inicial resultou
atingida pelo decurso do prazo prescricional, uma vez que,
inobstante o dano tenha ocorrido em 21.09.1987, a ação
somente foi ajuizada em 09.02.1994, consoante se infere
do excerto do voto condutor do acórdão recorrido.
4. Deveras, a lei especial convive com a lei geral, por isso
que os prazos do Decreto 20.910/32 coexistem com
aqueles fixados na lei civil.
5. Agravo regimental desprovido." (AgRg no REsp
1015571/RJ, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Fux, j. em
04.12.2008). (Destaquei).
O mesmo entendimento foi esposado no Resp nº
946.232/RS, bem como no Resp nº 444.646/RJ, nos quais o STJ firmou a posição pela
aplicação do princípio da isonomia aos preceitos do art. 1º, do Decreto nº 20.910/32, a
fim de que a prescrição quinquenal também atingisse as demandas intentadas pelo
poder público em face do particular.
Desta forma, considerando-se que o fato danoso ocorreu
em 15.03.2003 e a ação de reparação de danos materiais foi ajuizada em setembro de
2006, resta indubitável, a par da previsão contida no art. 1º, do decreto sob enfoque,
Tribunal de Justiça
FL._____________
«Número do processo#Número do processo no»
Página 7 de 7
que a pretensão deduzida na inicial não foi atingida pelo decurso do prazo
prescricional.
Face ao exposto, em harmonia com o parecer da 7ª
Procuradoria de Justiça, conheço e dou provimento ao recurso, para reformar a
sentença e, por conseguinte, determinar a remessa dos autos ao juízo de origem, para o
regular processamento do feito.
É como voto.
Natal, 22 de fevereiro de 2011.
Desembargador OSVALDO CRUZ
Presidente
Doutor NILSON ROBERTO C. MELO (Juiz Convocado)
Relator
Doutor HERBERT PEREIRA BEZERRA
17º Procurador de Justiça