Cap04 TeseELiane
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Eliane Sloboda Rigobello
AVALIAO DA REMOO DE DICLOFENACO E FORMAO DE SUBPRODUTOS EM TRATAMENTO DE GUA
Tese apresentada ao Instituto de Qumica de So Carlos da Universidade de So Paulo, como parte dos requisitos para obteno do ttulo de Doutor em Cincias. rea de concentrao: Qumica Analtica e
Inorgnica.
Orientadora: Prof. Dr. Eny Maria Vieira
So Carlos 2012
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A Deus. Aos meus pais Stefano (in memorian, 1988) e Anna (in memorian,
2012) pela vida, oraes, amor e educao. Ao meu esposo Ronaldo, pelo amor, carinho, compreenso e apoio
durante este trabalho.
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Voc que habita ao amparo do altssimo, e vive sombra do onipotente,
diga ao senhor: Meu refgio, minha fortaleza, meu Deus, em confio em ti.
Ele livrar voc do lao do caador e da peste destruidora.
Ele o cobrir com suas penas, e debaixo de suas asas voc se refugiar.
O brao dele escudo e armadura.
Voc no temer o terror da noite, nem a flecha que voa de dia.
Ele ordenou a seus anjos que guardem voc em seus caminhos.
Eles o levaro nas mos, para que o seu p no tropece em nenhuma pedra.
(Trechos do Salmo 91)
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AGRADECIMENTOS
A Deus e a Nossa Senhora Aparecida, pela vida, sade, fora, iluminao e oportunidade de realizar este trabalho.
prof. Eny Maria Vieira, pela confiana, amizade e orientao durante o doutorado. prof. Angela Di Bernardo Dantas, pela parceria, amizade, apoio e efetiva coorientao no desenvolvimento deste trabalho. Ao prof. Luiz Di Bernardo, pelas contribuies no exame de qualificao e no desenvolvimento deste trabalho e por ter cedido os equipamentos e o laboratrio para a realizao deste trabalho. CAPES, pela bolsa de estudo. FAPESP, pelo auxlio financeiro. Ao Instituto de Qumica de So Carlos da Universidade de So Paulo, pelo suporte tcnico e conhecimentos adquiridos. Ao Departamento de Hidrulica e Saneamento da Escola de Engenharia de So Carlos, pela permisso de uso do laboratrio durante o doutorado. Ao prof. Vitor Hugo Polisel Pacces, pelos esclarecimentos prestados sobre validao de mtodos. Ao prof. Marcos Roberto de Vasconcelos Lanza, pela participao e contribuies no exame de qualificao. prof. Regina V. Oliveira e a ps-doutoranda Bianca Ferreira da Silva da UFSCar pela colaborao nas anlises de LC-MS/MS. Ao prof. Eduardo Bessa Azevedo, pela amizade e ensinamentos. Ao prof. der Tadeu Gomes Cavalheiro, pela oportunidade e experincia adquirida durante a participao do estgio do programa de aperfeioamento em ensino (PAE) junto disciplina de Qumica Analtica Quantitativa Terica e apoio durante o meu doutorado. Gislei (secretria do grupo DQFM), pela amizade, ateno e grandiosa ajuda nas partes burocrticas.
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Aos tcnicos Jlio e Paulo do laboratrio de saneamento da EESC, pela amizade, ajuda e permisso de uso dos equipamentos. Ao tcnico Francisco (Chico) do Departamento de Hidrulica e Saneamento, pela ajuda na montagem dos equipamentos no laboratrio. Aos funcionrios do IQSC, Silvia, Andria e Gustavo (Ps-graduao), Vanessa e Marcos (Financeiro), Eliana (PAE), Eliana (biblioteca), Veroneide, Cladia e Gislei (secretrias do DQFM), aos tcnicos do CAQ (Paulo, Thiago, Sylvana e Carlos) e do laboratrio de ensino (Renatinha, Cidinha e Clauco) e aos motoristas Roberto, Moisis e Sidnei do IQSC. amiga Shirlei Mininel Cndido (Shirloca), secretria do IQSC, pela amizade que construimos desde de quando cheguei na USP, pelas conversas, companheirismo e por todos os momentos de descontrao vividos. Ao amigo engenheiro Paulo Eduardo Nogueira Voltan, pelas sugestes e discusses relevantes para este trabalho. Ao grupo de Qumica Analtica, Ambiental e Ecotoxicologia, que de uma forma ou de outra colaboram para a realizao deste trabalho. Agradeo em especial ao Raphael Verbinnen, pelas sugestes e tambm ao William Vilela, pelas primeiras dicas de operao do HPLC. A toda minha famlia, que mesmo distantes sempre torcem pela minha felicidade e sucesso profissional. A todos meus amigos de So Carlos e de outras cidades pelo apoio e momentos de alegria convividos. As empresas que doaram produtos: SAAE de So Carlos, pelo sulfato de alumnio e hipoclorito de sdio; EKA, pelo dixido de cloro; MEDLEY, pelo padro de diclofenaco sdico e TOBASA, pelo carvo ativado granular de babau. Aos tcnicos Gigante (laboratrio de transportes da EESC), pelo emprstimo das peneiras para separar a areia, e Valdecir (laboratrio de eletroqumica do IQSC), pelo emprstimo do moinho para moer o carvo ativado. Ao meu esposo Ronaldo, com muito amor e gratido, pelas madrugadas que me acompanhou no laboratrio e pela compreenso nos finais de semana, enfim durante todo o meu doutorado. Ao meu pai (in memorian), pela vida e educao recebida no pouco tempo em que convivemos. A minha me (in memorian), pelos ensinamentos, amor incondicional, oraes e exemplos de vida.
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RREESSUUMMOO
Rigobello, S. E. Avaliao da remoo de diclofenaco e formao de subprodutos em
tratamento de gua. 2012. 259 p. Tese (Doutorado) Instituto de Qumica de So Carlos,
Universidade de So Paulo, So Carlos, 2012.
A presena de resduos de frmacos em guas superficiais e de abastecimento pblico tem
preocupado a comunidade cientfica devido principalmente sua persistncia na gua e aos
efeitos adversos causados comunidade aqutica e aos possveis riscos sade humana.
Dentre os frmacos comumente identificados em guas de abastecimento pblico, encontram-
se os anti-inflamatrios, como o diclofenaco (DCF), um dos frmacos mais consumidos no
Brasil e no mundo. Nesse contexto, o presente trabalho, teve como objetivo principal estudar
a eficincia das etapas de tratamento de gua em ciclo completo (coagulao, floculao,
sedimentao, filtrao em areia e desinfeco com cloro) com e sem pr-oxidao com cloro
e com dixido de cloro e adsoro em carvo ativado granular (CAG) na remoo de DCF.
Tambm foram determinados os trialometanos (THM) e identificados os principais
subprodutos do DCF formados na oxidao com cloro e dixido de cloro. Para a determinao
do DCF nas amostras de gua antes e aps as etapas de tratamento de gua foram
desenvolvidos e validados mtodos analticos de extrao em fase slida (SPE) e
cromatogrfico por cromatografia lquida de alta eficincia (HPLC) com deteco no
ultravioleta (UV). A validao do mtodo foi feita de acordo com a resoluo n 899 de 2003
da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria (ANVISA), considerando os requisitos para
mtodos bioanalticos. Os procedimentos analticos empregados foram efetivos e confiveis
para a identificao e quantificao do DCF nas amostras de gua antes e aps os processos
de tratamento de gua. Os ensaios de tratamento de gua foram feitos em equipamento de
reatores estticos (jarteste) e filtros de escala laboratorial empregando-se gua de poo
artesiano no clorada preparada com substncias hmicas aquticas (SHA) para conferir cor
verdadeira de 20 uH, caulinita para conferir turbidez de 70 uT e fortificada com 1 mg L-1 de
DCF. Os resultados indicaram que as etapas de coagulao com sulfato de alumnio,
floculao, sedimentao e filtrao em areia no removeram o DCF. Nas etapas de pr-
oxidao com cloro e dixido de cloro e de ps-clorao houve remoo parcial do DCF,
porm verificou-se a formao de subprodutos provenientes da oxidao do DCF. Dentre os
THM, foi quantificado apenas o clorofrmio na etapa de pr-oxidao com cloro. Em geral,
os resultados indicaram que o dixido de cloro foi mais eficiente na reduo do DCF e
formou menos subprodutos. Entretanto, o tratamento em ciclo completo seguido da adsoro
em CAG foi eficiente na remoo de DCF, com remoo maior que 99,7%. Os subprodutos
formados na oxidao com cloro e dixido identificados por cromatografia lquida acoplada a
espectrometria de massas em srie (LC-MS/MS) consistiram na descaboxilao/hidroxilao
e substituio aromtica de tomos de hidrognio por cloro. Os subprodutos identificados na
oxidao com cloro apresentaram as seguintes frmulas moleculares: C14H11Cl2NO3, C13H10Cl3N e C14H10Cl3NO2. Com o dixido de cloro foi identificado o subproduto de
frmula molecular igual a C14H11Cl2NO3.
Palavras chave: diclofenaco, subprodutos do diclofenaco, tratamento de gua, cloro, dixido
de cloro, ciclo completo, carvo ativado granular, validao de mtodo, cromatografia
lquida-espectrometria de massas (LC-MS)
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AABBSSTTRRAACCTT
Rigobello, S. E. Evaluation of the removal of diclofenac and formation of by-products in
water treatment. 2012. 259 p. Thesis (Ph.D.) - Institute of Chemistry of Sao Carlos,
University of Sao Paulo, So Carlos, 2012.
The presence of pharmaceutical residues in surface waters and in drinking water supply has
concerned the scientific community, mainly in which regards their persistence in water,
adverse effects on the aquatic community and possible risks to human health. Anti-
inflammatory drugs, as diclofenac (DCF), are among those drugs commonly identified in
drinking water supply. In this context, the main objective of this study was to assess the
efficiency of the different stages of the conventional drinking water treatment (coagulation,
flocculation, sedimentation, sand filtration and chlorine disinfection) with and without pre-
oxidation with chlorine and chlorine dioxide and adsorption on granular activated carbon
(GAC) in the removal of DCF. The trihalomethanes (THMs) were also determined and the
main by-products of DCF formed by oxidation with chlorine dioxide and chlorine were
identified. For the DCF determination in water samples before and after water treatment
stages analytical methods of solid phase extraction (SPE) and chromatographic method by
high performance liquid chromatography (HPLC) with detection in the ultraviolet (UV) were
developed and validated. The method validation was based on Resolution no 899 of the 2003
of the Brazilian National Health Surveillance Agency (ANVISA), considering the
requirements for bioanalytical methods. The analytical procedures used were effective and
reliable for the identification and quantification of DCF in the water samples before and after
the water treatment stages. The water treatment tests were carried out in jar test equipment
and filters on laboratory scale employing non chlorinated water of artesian well prepared with
aquatic humic substances (AHS) to yield 20 uH true color, kaolin turbidity of 70 NTU and
DCF concentration of 1 mg L-1. The results indicated that the stages of coagulation with
aluminum sulphate, flocculation, sedimentation and filtration sand did not remove DCF. In
the stages of pre-oxidation with chlorine and chlorine dioxide and chlorine disinfection the
DCF was partially removed, however by-products were formed from the DCF oxidation.
Among the THMs, only chloroform was quantified in the pre-oxidation with chlorine. In
general, the results showed that chlorine dioxide was more effective to reduce the DCF and
fewer by-products were formed. Nevertheless, the complete cycle treatment followed by GAC
adsorption was effective to remove DCF (> 99.7%. removal). The by-products of the
oxidation of DCF with chlorine and chlorine dioxide identified by liquid chromatography
coupled tandem mass spectrometry (LC-MS/MS) consisted in the
descaboxylation/hydroxylation and aromatic substitution of hydrogen atoms by chlorine. The
compounds identified in the oxidation with chlorine showed the following molecular
formulas: C14H11Cl2NO3, C13H10Cl3N and C14H10Cl3NO2. The by-product identified using
chlorine dioxide was C14H11Cl2NO3.
Keywords: diclofenac, by-products of the diclofenac, drinking water treatment, chlorine,
chlorine dioxide, granular activated carbon, method validation, liquid chromatographymass
spectrometry (LCMS)
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Abs Absorbncia
AINE Anti-inflamatrios no esteroides
ANVISA Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria
AH cidos hmicos
AF cidos flvicos
C18 Slica modificada com hidrocarboneto linear C18, octadecilsilano
C8 Slica modificada com hidrocarboneto linear C8, octilsilano
CAG Carvo ativado granular
CAP Carvo ativado pulverizado
CQ Controle de qualidade
Co Concentrao inicial
COD Carbono orgnico dissolvido
COT Carbono orgnico total
CT Concentrao do oxidante em mg L-1 x tempo em mim
CV Coeficiente de variao
DCF Diclofenaco
DPD N,N-dietil-p-fenilenodiamina
DPR Desvio padro relativo
ETE Estao de tratamento de esgoto
ETA Estao de tratamento de gua
EC50 Concentrao mnima capaz de provocar algum efeito em 50% dos organismos testados
EESC Escola de Engenharia de So Carlos
EUA Estados Unidos da Amrica
FLA Filtros de escala laboratorial
Gf Gradiente de velocidade de floculao
Gmr Gradiente de velocidade de mistura rpida
GC-MS Cromatografia gasosa acoplada a um espectrmetro de massas (Gas chromatography coupled mass spectrometry)
GC-MS/MS Cromatografia gasosa acoplada a espectrmetro de massas em srie (Gas Chromatography coupled tandem mass spectrometry)
GC-ECD Cromatografia gasosa acoplada a um detector de captura de eltrons (Gas chromatography with electron capture detector)
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HLB Equilbrio hidroflico e lipoflico
HPLC-DAD Cromatografia lquida de alta eficincia acoplada a um detector de arranjo de diodos (High performance pressure liquide chromatography with diode array detector)
HPO Fraes hidrofbicas
HPO-N Frao hidrofbicas neutras
HPO-A cidos hidrofbicos
HPI Fraes hidroflicas
INMETRO Instituto Nacional de Metrologia, Normalizao e Qualidade Industrial
IV Infravermelho
Kow Coeficiente de partio octanol/gua
LC50 Concentrao letal em 50% dos organismos testados
LOEC Menor concentrao com efeito observvel
LC-MS Cromatografia lquida acoplada a um espectrmetro de massas (Liquid chromatograph coupled mass spectrometry)
LC-MS/MS Cromatografia lquida acoplada a espectrmetro de massas em srie (Liquid chromatography coupled tandem mass spectrometry)
LD Limite de deteco
LQ Limite de quantificao
LIQ Limite inferior de quantificao
MON Matria orgnica natural
MOD Matria orgnica dissolvida
MOP Matria orgnica particulada
MTBE ter metil-terc-butlico
NOEC Concentrao de efeito no observado
pH Potencial hidrogeninico
PI Padro interno
REACH Regulamento da comunidade Europia sobre produtos qumicos e sua
utilizao segura
S Desvio padro
SPE Extrao em fase Slida (Solid phase extraction)
SPME Microextrao em fase slida (Solid phase microexctration)
SH Substncias hmicas
SHA Substncias hmicas aquticas
SUVA Razo entre a absorbncia em 254 nm, em m-1 (que quantifica as
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substncias hmicas), por unidade de carbono orgnico dissolvido, em mg C L-1 (que quantifica a matria orgnica dissolvida)
TPI Fraes transflicas
TPI-A cidos transflicos
THM Trialometanos (clorofrmio, bromodiclorometano, dibromoclorometano e bromofrmio)
TFA cido trifluoractico
Tf Tempo de floculao
Tmr Tempo de mistura rpida
Ts Tempo de sedimentao
USP Universidade de So Paulo
UFSCar Universidade Federal de So Carlos
UV/Vis Ultravioleta/Visvel
Vs Velocidade de sedimentao
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LISTA DE SMBOLOS
C graus celsius
cm centmetros
g mol-1 gramas por mol
h hora
kDa unidade de massa atmica (kilo Dalton)
L litros
L (mg C)-1/m-1 litros (miligramas de carbono)-1 metros-1
m/z massa/carga
mg miligramas
mg L-1 miligramas por litro
min minutos
mL mililitros
mm milmetros
M cm Miliohm vezes centmetros
ng L-1 nanogramas por litro
nm nanmetros
rpm rotaes por minuto
tR tempo de reteno
s segundos
uH unidade Hazen (mg Pt-Co L-1)
uT unidade de turbidez
V Volts
m micrmetros
g L-1 microgramas por litro
S cm-1 microsiemens por centmetros
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SUMRIO
CAPTULO 1 - INTRODUO GERAL, JUSTIFICATIVA, OBJETIVOS E APRESENTAO DO TRABALHO
1.1 INTRODUO GERAL............................................................................................. 21
1.1.1 Frmacos no meio ambiente.................................................................................. 21
1.1.2 Diclofenaco sdico................................................................................................ 25
1.1.3 Toxicidade do diclofenaco..................................................................................... 27
1.1.4 Questes regulamentares e propostas.................................................................... 29
1.2 JUSTIFICATIVA DO TRABALHO........................................................................... 30
1.3 OBJETIVOS................................................................................................................ 32
1.4 APRESENTAO DESTE TRABALHO.................................................................. 33
CAPTULO 2 - EXTRAO E CARACTERIZAO DAS SUBSTNCIAS HMICAS AQUTICAS
2.1 REVISO BIBLIOGRFICA.................................................................................... 35
2.1.1 Substncias hmicas.............................................................................................. 35
2.1.2 Mtodos de extrao das substncias hmicas aquticas...................................... 39
2.2 OBJETIVOS................................................................................................................ 41
2.3 MATERIAIS E MTODOS........................................................................................ 41
2.3.1 Coleta da gua no afluente do rio Itapanha.......................................................... 41
2.3.2 Extrao das substncias hmicas aquticas e dilise........................................... 43
2.3.3 Filtrao do extrato de substncias hmicas aquticas.......................................... 44
2.3.4 Caracterizao das substncias hmicas aquticas................................................ 45
2.3.4.1 Concentrao e liofilizao do extrato de substncias hmicas aquticas...... 45
2.3.4.2 Espectroscopia na regio do ultravioleta/visvel............................................. 45
2.3.4.3 Espectroscopia no infravermelho..................................................................... 46
2.3.4.4 Anlise elementar............................................................................................ 46
2.3.4.5 Determinao de carbono orgnico dissolvido nas fraes de cidos
hmicos e cidos flvicos................................................................................ 46
2.4 RESULTADOS E DISCUSSO................................................................................. 47
2.4.1 Caracterizao da gua coletada no afluente do rio Itapanha.............................. 47
2.4.2 Extrao das substncias hmicas aquticas e dilise........................................... 48
2.4.3 Caracterizaes da frao de substncias hmicas aquticas menor que 0,45 m 48
2.4.3.1 Anlise elementar............................................................................................ 48
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2.4.3.2 Espectroscopia na regio do infravermelho..................................................... 50
2.4.3.3 Anlise espectroscpica na regio do ultravioleta e visvel............................ 51
2.4.3.4 Determinao do carbono orgnico dissolvido nas fraes de cidos
hmicos e cidos flvicos................................................................................ 51
2.5 CONCLUSO............................................................................................................. 52
CAPTULO 3 - DESENVOLVIMENTO E VALIDAO DO MTODO CROMATOGRFICO PARA A QUANTIFICAO DO DICLOFENACO
3.1 REVISO BIBLIOGRFICA.................................................................................... 53
3.1.1 Anlise de frmacos em gua................................................................................ 53
3.1.1.1 Extrao em fase slida (SPE)......................................................................... 54
3.1.1.2 Mtodos de anlise........................................................................................... 57
3.1.1.3 Validao de mtodos...................................................................................... 58
3.2 MATERIAIS E MTODOS........................................................................................ 62
3.2.1 Preparao da soluo padro................................................................................ 62
3.2.2 Condies cromatogrficas.................................................................................... 63
3.2.3 Desenvolvimento do procedimento de extrao do diclofenaco em fase slida... 63
3.2.4 Validao do mtodo para a determinao do diclofenaco em gua..................... 65
3.2.4.1 Especificidade.................................................................................................. 65
3.2.4.2 Limite de deteco e limite inferior de quantificao...................................... 65
3.2.4.3 Linearidade...................................................................................................... 66
3.2.4.4 Preciso, exatido e recuperao do mtodo................................................... 66
3.2.4.5 Estudo de estabilidade do diclofenaco nas condies de anlise..................... 67
3.2.5 Mtodo cromatogrfico para a anlise dos trialometanos..................................... 69
3.2.5.1 Extrao e condies cromatogrficas para a determinao de trialometanos 70
3.2.5.2 Construo das curvas analticas dos trialometanos........................................ 71
3.3 RESULTADOS E DISCUSSO................................................................................. 71
3.3.1 Seleo do comprimento de onda () do diclofenaco sdico ............................... 71
3.3.2 Desenvolvimento do mtodo para a determinao do diclofenaco....................... 72
3.3.3 Otimizao da metodologia de extrao em fase slida........................................ 75
3.3.3.1 Avaliao do pH da amostra............................................................................ 75
3.3.3.2 Volume de amostra.............................................................. 77
3.3.3.3 Vazo da passagem da amostra.......................................................... 78
3.3.3.4 Volume do solvente de eluio do diclofenaco............................................... 79
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3.3.3.5 Avaliao de sorventes slidos na extrao de diclofenaco............................ 80
3.3.4 Validao do mtodo para a determinao do diclofenaco................................... 83
3.3.4.1 Especificidade.................................................................................................. 83
3.3.4.2 Limite de deteco e limite inferior de quantificao...................................... 86
3.3.4.3 Construo das curvas analticas e avaliao da linearidade........................... 88
3.3.4.4 Preciso, exatido e recuperao do mtodo................................................... 93
3.3.4.5 Robustez........................................................................................................... 94
3.3.4.6 Estudo de estabilidade do diclofenaco nas condies de anlise..................... 95
3.3.5 Alguns parmetros da validao do mtodo cromatogrfico para anlise de trialometanos........................................................................................................ 98
3.3.5.1 Seletividade...................................................................................................... 98
3.3.5.2 Linearidade, limite de deteco e limite inferior de quantificao para os trialometanos.................................................................................................. 99
3.4 CONCLUSO............................................................................................................. 100
CAPTULO 4 - AVALIAO DA REMOO DE DICLOFENACO EM TRATAMENTO DE GUA
4.1 REVISO BIBLIOGRFICA.................................................................................... 101
4.1.1 Tratamento de gua................................................................................................ 101
4.1.1.1 Pr-oxidao e desinfeco.............................................................................. 103
4.1.1.2 Coagulao, floculao e sedimentao.......................................................... 112
4.1.1.3 Filtrao........................................................................................................... 115
4.1.1.4 Adsoro em carvo ativado............................................................................ 116
4.1.2 Remoo de frmacos em tratamento de gua....................................................... 119
4.2 MATERIAIS E MTODOS........................................................................................ 123
4.2.1 Materiais, reagentes e solues usados nos ensaios em jarteste............................ 123
4.2.1.1 Preparao da suspenso de caulinita.............................................................. 123
4.2.1.2 Coagulante....................................................................................................... 123
4.2.1.3 Filtros com areia.............................................................................................. 123
4.2.1.4 Filtros com carvo ativado granular ............................................................... 124
4.2.1.5 Preparao da soluo de cloro e de dixido de cloro..................................... 125
4.2.1.6 Preparao e caracterizao da amostra de gua de estudo............................. 125
4.2.1.7 Determinao dos parmetros nas amostras de gua antes e aps os ensaios 126
4.2.2 Ensaios em equipamento jarteste sem a pr-oxidao...................................... 126
4.2.2.1 Construo dos diagramas de coagulao (Srie I)......................................... 126
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4.2.2.2 Escolha das condies de coagulao (Sries II, IIa e IIb)............................. 127
4.2.2.3 Ensaios em ciclo completo e ps-clorao (Srie III)..................................... 128
4.2.2.4 Ensaios em ciclo completo com adsoro em carvo ativado granular (Srie
IV)................................................................................................................... 129
4.2.3 Ensaios com a pr-oxidao.................................................................................. 130
4.2.3.1 Ensaios com a pr-oxidao com cloro e dixido de cloro (Sries V, Va e Vb)...................................................................................................................
130
4.2.3.2 Ensaios em ciclo completo com pr-oxidao e adsoro em carvo ativado granular (Sries VI e VII)............................................................................... 131
4.2.4 Amostras de controle de qualidade........................................................................ 132
4.2.5 Construo da isoterma de Freundlich................................................................... 132
4.3 RESULTADOS E DISCUSSO................................................................................. 133
4.3.1 Caracterizao da amostra de gua do poo artesiano e da gua de estudo.......... 133
4.3.2 Ensaios sem a pr-oxidao................................................................................... 135
4.3.2.1 Construo dos diagramas de coagulao (Srie I)......................................... 135
4.3.2.2 Escolha das condies de coagulao (Sries II, IIa e IIb).............................. 136
4.3.2.3 Ensaios de coagulao, floculao, sedimentao, filtrao em areia e ps- clorao (Srie III).......................................................................................... 140
4.3.2.4 Ensaios de coagulao, floculao, sedimentao, filtrao em areia, adsoro em carvo ativado granular e ps-clorao (Srie IV).................................................................................................................. 146
4.3.3 Ensaios com a pr-oxidao.................................................................................. 150
4.3.3.1 Ensaios de pr-oxidao com o cloro e com o dixido de cloro para selecionar as dosagens e tempos de contato (Srie V, Va e Vb)................... 150
4.3.3.2 Ensaios em ciclo completo com a pr-oxidao com cloro e adsoro em carvo ativado granular (Srie VI)................................................................. 165
4.3.3.3 Ensaios em ciclo completo com a pr-oxidao com dixido de cloro e adsoro em carvo ativado granular (Srie VII)........................................... 171
4.3.4 Amostras de controle de qualidade........................................................................ 176
4.3.5 Isoterma de Freundlich.......................................................................................... 177
4.4 CONCLUSO............................................................................................................. 180
CAPTULO 5 - IDENTIFICAO DE SUBPRODUTOS DO DICLOFENACO POR LC-MS/MS
5.1 REVISO BIBLIOGRFICA.................................................................................... 181
5.1.2 Formao de subprodutos em gua........................................................................ 181
5.2 MATERIAIS E MTODOS........................................................................ 183
5.2.1 Materiais, reagentes e solues.............................................................................. 183
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5.2.3 Identificao dos subprodutos do diclofenaco na oxidao com cloro e dixido de cloro.................................................................................................................. 184
5.3 RESULTADOS E DISCUSSO................................................................................. 186
5.3.1 Degradao do diclofenaco sdico com cloro e dixido de cloro......................... 186
5.3.2 Identificao dos subprodutos do diclofenaco na oxidao com cloro em gua purificada.............................................................................................................. 190
5.3.2.1 Identificao do padro de diclofenaco sdico................................................ 190
5.3.2.2 Amostras de gua purificada sem diclofenaco (brancos) oxidadas com cloro 193
5.3.2.3 Amostras de gua purificada contendo diclofenaco oxidadas com cloro........ 194
5.3.3 Identificao dos subprodutos do diclofenaco na oxidao com dixido de cloro em gua purificada....................................................................................... 200
5.3.3.1 Amostras de gua purificada sem diclofenaco (brancos) oxidadas com dixido de cloro.............................................................................................. 200
5.3.3.2 Amostras de gua purificada contendo diclofenaco oxidadas com dixido de cloro............................................................................................................ 201
5.3.4 Identificao dos subprodutos do diclofenaco na oxidao com cloro e dixido de cloro em gua de estudo................................................................................... 204
5.3.4.1 Amostras de gua de estudo sem diclofenaco (brancos) oxidadas com cloro 204
5.3.4.2 Amostras de gua de estudo sem diclofenaco (brancos) oxidadas com dixido de cloro............................................................................................. 206
5.3.4.3 Amostras de gua de estudo contendo diclofenaco oxidadas com cloro......... 207
5.3.4.4 Amostras de gua de estudo contendo diclofenaco oxidadas com dixido de cloro................................................................................................................. 209
5.4 CONCLUSO............................................................................................................. 211
CAPTULO 6 CONSIDERAES FINAIS E RECOMENDAES PARA TRABALHOS FUTUROS
6.1 CONSIDERAES FINAIS...................................................................................... 213
6.2 RECOMENDAES PARA TRABALHOS FUTUROS.......................................... 114
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS........................................................................... 215
APNDICE A................................................................................................................... 243
APNDICE B................................................................................................................... 247
-
IINNTTRROODDUUOO GGEERRAALL,, JJUUSSTTIIFFIICCAATTIIVVAA,,
OOBBJJEETTIIVVOOSS EE AAPPRREESSEENNTTAAOO DDOO
TTRRAABBAALLHHOO
CAPTULO
1
11..11 IINNTTRROODDUUOO GGEERRAALL
1.1.1 Frmacos no meio ambiente
A presena de frmacos no ambiente aqutico relatada h mais de 30 anos. Na
dcada de 1970, nos EUA, foi encontrado cido clofbrico em efluente de estao de
tratamento de esgoto (ETE) na faixa de 0,8 a 2,0 g L-1 (GARRISON et al., 1976). Tambm
nesta mesma dcada foram encontrados hormnios (TABAK; BUNCH, 1970), cido
saliclico e um metablito em efluentes de esgoto (HIGNITE; AZARNOFF, 1977). Na dcada
de 1980, foi relatada a presena de frmacos em guas de rios do Reino Unido na
concentrao de 1 g L-1 (RICHARDSON; BOWRON, 1985), e tambm no Canad foi
encontrado ibuprofeno e naproxeno em amostras de efluentes de ETE (ROGERS et al., 1986).
Nos ltimos anos, principalmente a partir do ano de 2000, muitos trabalhos foram
publicados sobre a ocorrncia de frmacos em guas naturais e estes compostos tm sido
considerados como microcontaminantes emergentes (KMMERER; HELMERS, 2000;
DAUGHTON; JONES-LEPP, 2001; KOLPIN et al., 2002; PETROVIC, et al., 2005; BILA;
DEZOTTI, 2007; BUCHBERGER, 2007; KUSTER et al., 2008; VAN DE STEENE et al.,
2010; VALCRCEL et al., 2011; HUANG et al., 2011; VULLIET et al., 2011; RODIL et al.,
2012; DANESHVAR et al., 2012).
A preocupao ambiental est relacionada com algumas propriedades intrnsecas dos
frmacos como, lipofilicidade, baixa volatilidade e, frequentemente, baixa
biodegradabilidade. Essas propriedades conferem um grande potencial para a bioacumulao
e persistncia dessa classe de compostos no meio ambiente (CHRISTENSEN, 1998).
A maioria dos frmacos encontrados no meio ambiente proveniente do uso humano e
veterinrio, como os quimioterpicos, antibiticos, anti-inflamatrios, reguladores lipdicos,
antidepressivos, anticonvulsivantes e contraceptivos orais (GHISELLI, 2006). Segundo Fent
et al. (2006), os frmacos pertencentes classe dos anti-inflamatrios no esteroides (AINE)
so uns dos mais frequentemente consumidos pelo ser humano. Dentre os AINE mais
-
22 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
consumidos esto o cido acetilsaliclico, paracetamol, ibuprofeno, naproxeno e diclofenaco
(DCF).
Os frmacos, aps serem administrados, so total ou parcialmente metabolizados e
excretados pelo organismo, principalmente pelas fezes e urina, em quantidades variadas
(RADJENOVIC et al., 2007). Segundo Mulroy (2001), em torno de 50% a 90% de uma
dosagem de um determinado frmaco excretada inalterada e persiste no meio ambiente,
sendo que apenas alguns so degradados quimicamente ou biologicamente.
Na Figura 1.1 apresentado um esquema que sugere possveis rotas de entrada de
frmacos no meio ambiente. Observa-se nessa figura que os frmacos apresentam diferentes
vias de contaminao ambiental. Os frmacos e seus metablitos excretados por meio de urina
e fezes tm seu destino final, geralmente, em fossas spticas, em ETE e nas guas superficiais.
Figura 1.1 - Possveis rotas de frmacos no meio ambiente (adaptado de BILA; DEZOTTI, 2003).
A presena de frmacos em ETE tambm devido ao incorreto descarte dos
medicamentos no utilizados, resduos industriais, esgotos domsticos e hospitalares
(TERNES, 1998; JONES et al., 2004).
Produo
ETE Industriais
Aplicao
Excreo
Esterco Esgoto
Solo ETEAterro
Sanitrio
MedicinaVeterinria
MedicinaHumana
Aquicultura
Sedimento
guas Subterrneas
ETA gua Potvel
guas Superficiais
Indstria
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 23
Entretanto, h vrios trabalhos publicados relatando que alguns frmacos no so
completamente removidos nas ETE (TERNES, 1998; DAUGHTON; TERNES, 1999;
ZWIENER et al., 2000; KMMERER; HELMERS, 2000; STRENN et al., 2004;
GEBHARDT; SCHRDER, 2007; RADJENOVIC et al., 2009; PAILLER et al., 2009;
ROSAL et al., 2010; HUANG et al., 2011; ZIYLAN; INCE , 2011; RODIL et al., 2012).
Em Berlim, estudos demonstraram que o DCF o mais abundante dos compostos
farmacologicamente ativos presentes na gua, e tambm foi relatada a presena desse frmaco
em amostras coletados antes e aps o tratamento nas ETE, nas concentraes de 2,51 a 3,02
g L-1, sendo removidos apenas cerca de 17% do DCF (HEBERER, 2002).
Lindqvist et al. (2005) observaram que, dentre os frmacos estudados, a mais alta
porcentagem de remoo em ETE foi para o ibuprofeno (92 8%) e a mais baixa para o DCF
(26 17%). Nesse ltimo trabalho foram tambm encontrados frmacos em concentrao
mais baixa jusante dos rios do que no efluente da ETE. Os autores desse trabalho atriburam
esses resultados principalmente ao fator de diluio.
Segundo Zhang et al. (2008), a remoo do DCF em ETE varia de 0% a maior que
80%, dependendo principalmente do tipo do tratamento e da concentrao do frmaco no
afluente. Rodil et al. (2012) verificaram que a remoo dos frmacos indometacina, cido
clofbrico, propranolol, salbutamol e DCF em ETE convencional com lodo ativado foi
praticamente desprezvel.
O DCF foi encontrado em efluentes de ETE na concentrao de 0,81 g L-1 na
Alemanha (TERNES, 1998), entre 200 a 370 ng L-1 na Sucia (BUSER et al., 1998), menor
que 2 a 30 ng L-1 no Taiwan (CHEN et al., 2008), 0,67 0,24 g L-1 na Sua (MORASCH
et al., 2010) e na concentrao mdia de 230 ng L-1 na Espanha (RODIL et al., 2012).
Assim, o lanamento contnuo desses compostos no meio ambiente confere-lhes o
carter de persistncia e acarretam a contaminao dos recursos hdricos. No entanto,
produtos farmacuticos e seus metablitos no foram apenas encontrados em efluentes de
ETE, mas em guas superficiais, guas subterrneas (SACHER et al., 2001; HERNNDEZ et
al., 2007; KHALAF et al., 2009; LOOS et al.; 2009; YOON et al., 2010; MARTINEZ
BUENO et al., 2010; LAPWORTH et al., 2011; VULLIET et al., 2011) e de abastecimento
pblico (TERNES et al., 2002; REDDERSEN et al., 2002; WEBB et al., 2003;
STACKELBERG et al., 2004; HERNANDO et al., 2006; VIENO et al., 2007; TOGOLA;
BUDZINSK, 2008; MOMPELAT et al., 2009; VULLIET et al., 2011).
-
24 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
O DCF foi encontrado em guas superficiais na concentrao de 150 ng L-1 (TERNES,
1998), de 20 a 60 ng L-1 (STUMPF et al., 1999), 6,2 ng L-1 (WEIGEL et al., 2002), 1,03 g
L-1 (HEBERER, 2002), de 1,36 a 33,2 ng L-1 (TOGOLA; BUDZINSKI, 2008), 24 a 62 ng L-1
(CHEN et al., 2008) e 94 ng L-1 (HUANG et al., 2011). Tambm foi relatada a presena de
DCF em uma amostra de gua de torneira para o consumo humano na cidade de Berlin na
concentrao de 10 ng L-1 (HEBERER et al., 2002).
Foram encontrados fenazona, propilfenazona e dimetilaminafenazona (analgsico e
antipirtico) em gua de abastecimento pblico em Berlim (Alemanha), com a concentrao
mais elevada para a fenazona de 400 ng L-1 (REDDERSEN, et al., 2002; ZHLKE et al.,
2004). Esta concentrao elevada foi em grande parte atribuda gua subterrnea, usada
como fonte de gua potvel, contaminada com esgoto.
Nas guas superficiais geralmente so encontradas concentraes menores de
frmacos em relao aos efluentes de ETE, principalmente devido ao fator de diluio e
alguns processos de eliminao que podem ocorrer como, sedimentao, biodegradao e
fotodegradao (ANDREOZZI et al., 2003; HEBERER, 2002; BARTELS; TMPLINGA,
2007; ZHANG et al., 2008).
Bartels e Tmplinga (2007) observaram que a fotodegradao do DCF influenciada
pelas condies eutrficas, efeitos sazonais, quantidade de partculas slidas e de matria
orgnica dissolvida (MOD) na gua. A influncia sazonal na concentrao do DCF pode ser
decorrente tambm do uso extensivo desse medicamento durante o perodo de inverno, pois
neste perodo as pessoas esto mais propensas a contrarem doenas inflamatrias
(HEBERER, 2002).
A presena de frmacos e outros compostos xenobiticos no ambiente aqutico e na
gua de abastecimento pblico tm levantado a questo sobre o seu impacto no ambiente e na
sade pblica, uma vez que pouco se sabe sobre o potencial efeito, individual e
principalmente combinado desses compostos, na sade humana associado com o consumo de
gua (STACKELBERG et al., 2004).
Diante do grande nmero de trabalhos publicados sobre a presena de frmacos no
ambiente aqutico, apresentam-se na Tabela 1.1 concentraes mdia, mnimas e mximas de
DCF encontradas em diferentes matrizes ambientais.
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 25
Tabela 1.1 - Concentraes de DCF encontradas em efluentes de ETE, guas superficiais, guas subterrneas e gua de consumo humano.
Amostra/Pas
Concentrao mdia
(mnima e mxima)
(ng L-1)
Referncia
Efluente de ETE/Alemanha 810,0 Ternes (1998) Efluente de ETE/EUA 290,0 Paxus (2004) Efluente de ETE/Coria 40,0 (8,8 127,0) Kim et al. (2007)
Efluente de ETE/Espanha 230,0 Rodil et al. (2012) gua superficial/Brasil (20,0 60,0) Stumpf et al. (1999)
gua superficial/Reino Unido 8,0 Thomas et al. (2004) gua superficial/EUA 120,0 Bendz et al. (2005) gua superficial/Coria 3,0 (1,1 6,8) Kim et al. (2007)
gua superficial/Finlndia (10,0 55,0) Vieno et al. (2007) gua superficial/Unio Europia 17,0 Loos et al. (2009)
gua superficial/China (8,8 150,0) Zhao et al. (2009) gua superficial/Espanha 2040 (313 3363) Valcrcel et al. (2011) gua superficial/China 94,0 Huang et al. (2011) gua superficial/Brasil (96,0 115,0) Montagner e Jardim (2011)
gua subterrnea/Espanha (60,2 219,4) Radjenovic et al. (2008) gua subterrnea/Diferentes pases 121,0 (2,5 590,0) Lapworth et al. (2011)
gua de consumo humano/Reino Unido 6,0 Jones et al. (2005) gua de consumo humano/Frana 2,0 Rabiet et al. (2006) gua de consumo humano/Frana 2,5 Togola e Budzinsk (2008) gua de consumo humano/Espanha ND Valcrcel et al. (2011)
ND: no detectado (limite de deteco 1 ng L-1)
1.1.2 Diclofenaco sdico
O DCF sdico encontrado com o nome comercial de Voltarem e o DCF de
potssio como Cataflan, entre outros. O DCF um dos AINE mais utilizado com efeito
analgsico, anti-inflamatrio e antipirtico. Por ser um potente inibidor da enzima ciclo-
oxigenase, este medicamento utilizado para aliviar a dor e a inflamao nos processos
inflamatrios em geral, e em casos mais especificos de artrite reumatide, osteoartrites,
burcites, tendinites, dor ps-operatria e espondilite aquilosante (REYNOLDS, 1996;
CASTRO, 2005).
Aps administrao oral, o DCF eliminado em um curto perodo de tempo (tempo de
meia-vida no plasma de aproximadamente uma a duas horas). O DCF acumula-se no lquido
sinovial aps administrao oral, o que pode explicar a durao do efeito teraputico
consideravelmente maior que o tempo de meia vida no plasma. Aproximadamente 65% da
-
26 Captulo 1 Introduo
dose administrada excretada na urina;
excretados na forma inalterada
metablitos conhecidos so: 3
hidroxi-diclofenaco; 4-5-diidroxi
cloro-diclofenaco (ZHANG et al., 2008).
A frmula molecular do
conhecido como diclofenaco sdico
O DCF considerado um cido fraco com
pH mais baixos. O DCF mais solvel em pH na faixa de 7,0
solubilidade do DCF em gua varia com a fora inica.
(Kow) do DCF igual a 4,51. A consta
hidrofobicidade do composto (MOMPELAT et al., 2009)
sdico est apresentada na Figura
Figura 1.2 Estrutura molecular do diclofenaco
O DCF sdico levemente solvel em gua, facilmente solvel em metanol, solvel
em etanol, ligeiramente solvel em
praticamente insolvel em ter, clorofrmio e tolueno (FARMACOPIA BRASILEIRA,
2002).
A presena dos tomos de N, O, Cl e Na
portanto, as interaes especficas com determinados solventes afetam a solubilidade do
frmaco. Devido presena do grupamento NH que pode agir tanto como doador ou receptor
de prton para os solventes, e a presena do grupamento carboxila, o frmaco possui carter
cido - base de Lewis (ZILNIK et al., 2007).
Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
dose administrada excretada na urina; desses, cerca de 15% (ALDER et al., 2006)
a e o restante eliminado na forma de metablitos. Os
metablitos conhecidos so: 3-hidroxi-diclofenaco; 4-hidroxi-diclofenaco
diidroxi-diclofenaco; 3-hidroxi-4-metoxi-diclofenaco
diclofenaco (ZHANG et al., 2008).
A frmula molecular do 2-[(2,6-diclofenil) amino] benzenoacetato de sdio
sdico, C14H10Cl2NNaO2, com massa molar de
um cido fraco com pKa igual a 4,1 e apresenta menor solubilidade em
. O DCF mais solvel em pH na faixa de 7,0 a 8,0.
do DCF em gua varia com a fora inica. O coeficiente de partio octanol/gua
A constante Kow um indicativo do potencial de lipof
(MOMPELAT et al., 2009). A estrutura molecular
est apresentada na Figura 1.2 (VIENO et al., 2007; ZHANG et al., 2008).
Estrutura molecular do diclofenaco sdico.
levemente solvel em gua, facilmente solvel em metanol, solvel
em etanol, ligeiramente solvel em cido actico glacial, pouco solvel em acetona,
ter, clorofrmio e tolueno (FARMACOPIA BRASILEIRA,
na dos tomos de N, O, Cl e Na torna a molcula do DCF sdico polar
as interaes especficas com determinados solventes afetam a solubilidade do
do grupamento NH que pode agir tanto como doador ou receptor
de prton para os solventes, e a presena do grupamento carboxila, o frmaco possui carter
base de Lewis (ZILNIK et al., 2007).
geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
(ALDER et al., 2006) so
e o restante eliminado na forma de metablitos. Os
(principal); 5-
diclofenaco e 4-hidroxi-5-
benzenoacetato de sdio,
de 318,13 g mol-1.
e apresenta menor solubilidade em
. Alm do pH, a
ente de partio octanol/gua
ndicativo do potencial de lipofilicidade e
A estrutura molecular do DCF
ZHANG et al., 2008).
levemente solvel em gua, facilmente solvel em metanol, solvel
cido actico glacial, pouco solvel em acetona,
ter, clorofrmio e tolueno (FARMACOPIA BRASILEIRA,
torna a molcula do DCF sdico polar e,
as interaes especficas com determinados solventes afetam a solubilidade do
do grupamento NH que pode agir tanto como doador ou receptor
de prton para os solventes, e a presena do grupamento carboxila, o frmaco possui carter
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 27
1.1.3 Toxicidade do diclofenaco
Embora a maioria dos frmacos e seus metablitos presentes no meio ambiente
estejam em baixas concentraes (g L-1 ou ng L
-1), estudos tm demonstrado que muitos
desses compostos podem ser bioacumulveis e causar efeitos adversos aos organismos
aquticos e terrestres. Esses efeitos podem ser em qualquer nvel de hierarquia biolgica,
podendo atingir clulas, rgos, organismos, populao e ecossistema. Os efeitos podem
incluir interferncia endcrina, genotoxicidade e consequentemente alterao no
comportamento metablico e nas funes da espcie no ecossistema (JORGENSEN;
HALLING-SRENSEN, 2000).
O equilbrio de um soluto nas fases orgnica (hidrofbica) e aquosa (hidroflica) pode
ser estimado pelo valor de Kow. Como o Kow do DCF superior a trs, isso um indicativo de
que ocorre soro desse frmaco na matria orgnica e em sedimentos (BRUN et al., 2006).
Entretanto, o processo de soro no depende apenas da hidrofobicidade e, sim de outras
propriedades fsico-qumicas dos frmacos e da matria orgnica natural (MOMPELAT et al.,
2009). O DCF pode ser bioacumulativo em seres vivos por ser lipoflico (SANDERSON et
al., 2003; SCHWAIGER et al., 2004).
Efeitos secundrios do DCF foram observados em seres humanos, tais como,
alteraes inflamatrias e degenerativas no fgado (BANKS et al., 1995) e alteraes renais
(REVAI; HARMOS, 1999). Os efeitos gastrointestinais so os mais comuns, tendo-se
observado a ocorrncia de sangramento e ulcerao ou perfurao na parede intestinal. Outras
respostas adversas a este medicamento incluem efeitos sobre o sistema nervoso central,
exantemas cutneos, reaes alrgicas, reteno hdrica e edema, e pode tambm ocorrer
comprometimento da funo renal. Alm disso, o DCF no recomendado para crianas,
gestantes e lactantes (HARDMAN et al., 2005).
As doses teraputicas so usadas para estimar os riscos que os frmacos podem causar
sade humana ou para propor valores de referncia. Webb et al. (2003) estimaram
quantitativamente os potenciais efeitos da presena de frmacos em guas de consumo
humano, comparando as doses teraputicas dirias com a sua ingesto via gua potvel. Os
autores obtiveram, por meio de GC-MS, 6 ng L-1 de DCF na gua potvel (valor mximo) e
propuseram, diante desse resultado, que o ser humano teria uma ingesto diria de 12 ng de
-
28 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
DCF por dia (baseado no consumo de 2 litros de gua por dia) e 25 mg de DCF por dia como
dose teraputica de DCF (para artrite reumtica).
Apesar da concentrao de frmacos em gua potvel geralmente se encontrar abaixo
da dose teraputica, a necessidade de avaliao dos efeitos txicos dos frmacos no pode ser
ignorada. Da mesma forma h necessidade de se desenvolver estudos a longo prazo relativos
exposio humana indireta a baixas concentraes de frmacos e de misturas desses
compostos, metablitos e subprodutos gerados no tratamento de gua. A preocupao tambm
est relacionada resistncia aos antibiticos causada pela ingesto de gua potvel
contaminada com esses compostos (KLEYWEGT et al., 2007; WHO, 2011).
Dietrich e Prietz (1999) investigaram a letalidade e teratogenicidade do DCF em
embries de peixe zebra (Danio rerio) aps uma exposio de 96 h. Os autores desse trabalho
relataram que a concentrao letal em 50% dos organismos testados foi de 480 50 g L-1
(LC50/96 h) e a concentrao que teve efeitos adversos em 50% dos organismos foi de 90
20 g L-1 (EC50/96 h). Em testes de toxicidade crnica com Daphnia magna, a concentrao
de efeito no observado (NOEC) do DCF foi igual a 1 mg L-1 e a menor concentrao com
efeito observvel (LOEC) foi de 0,2 mg L-1 (SCHWAIGER et al., 2004).
Ferrari et al. (2003) estudaram os efeitos txicos do DCF em bactrias, algas,
microcrustceos e peixes. Dentre os testes feitos em sistema Microtox com mais de 30 min, os
autores verificaram que a maior concentrao de DCF que causou efeitos adversos em 50%
dos organismos expostos (EC50) foi de 11,4 mg L-1. Tambm foi verificada, nos testes de
toxicidade crnica, a NOEC em rotfero Brachionus calyciflorus aps 48 h que foi de 246 g
L-1 de DCF.
A fim de avaliar efeitos subletais txicos do DCF em peixes, Schwaiger et al. (2004)
estudaram trutas arco-ris (Oncorhynchus mykiss) expostas ao DCF em doses variando de 1 a
500 g L-1 durante um perodo de 28 dias. Exames histopatolgicos dos peixes expostos
revelaram alteraes nos rins e brnquias. A LOEC que causou leses renais e alteraes das
brnquias foi de 5 g L-1. Os autores tambm observaram a bioacumulao do DCF em trutas.
As maiores concentraes do DCF foram encontradas no fgado, seguido pelo rim e ento nas
brnquias.
Triebskorn et al. (2004) estudaram peixes expostos ao DCF e observaram alteraes
citolgicas no fgado, rim e brnquias, isso ocorreu mesmo na concentrao de 1 g L-1 de
DCF. Comparando esses resultados com as concentraes encontradas no ambiente aqutico,
conclui-se que o DCF representa um risco para os ecossistemas.
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 29
Mendes et al. (2010) analisaram o efeito agudo gerado pelo frmaco DCF atravs de
testes de toxicidade com o microcrustceo Daphnia similis (Cladcera, Crustcea). A
concentrao de EC50/48h encontrada para o DCF foi de 43 mg L-1. Com base nos valores de
EC50/48h, este frmaco foi classificado como prejudicial aos orgnismos testados.
Segundo a Directiva da Unio Europeia 93/67/EEC REACH (sobre registro,
avaliao e autorizao de produtos qumicos), as substncias potencialmente perigosas para
organismos aquticos so classificadas de acordo com a concentrao de EC50 em quatro
classes diferentes: muito txicas < 1 mg L-1; txicas entre 1 10 mg L-1; perigosas de 11
100 mg L-1 e sem classificao, maior que 100 mg L-1 (CLEUVERS, 2004).
Porm, h poucos estudos da toxicidade crnica do DCF e da mistura do DCF com
outras substncias sade humana e aos organimos aquticos. Segundo Flaherty e Dodson
(2005), a toxicidade de misturas de frmacos pode ser imprevisvel e complexa quando
comparada com os efeitos causados pelos frmacos individualmente. Alm disso, falta dados
sobre os efeitos txicos dos seus metablitos, intermedirios e subprodutos formados.
Nos ltimos anos, o conhecimento sobre fontes, ocorrncia, destino, efeitos e riscos
associados presena de frmacos em efluentes e em guas naturais tem aumentado
principalmente nos pases Europeus e na Amrica do Norte. No Brasil, ainda h muito poucos
estudos relacionados a esse assunto.
1.1.4 Questes regulamentares e propostas
Atualmente, tanto na legislao brasileira e quanto na internacional, no existe
regulamentao para o controle de resduos de frmacos em gua para consumo humano. Isto
acontece porque a concentrao de frmacos, incluindo o DCF, encontrada na gua potvel
geralmente baixa, da ordem de g L-1 a ng L-1, e tambm porque h falta de conhecimento
sobre o grau de toxicidade aguda e principalmente crnica desses compostos sade humana.
Atualmente, a Comunidade Europeia, Estados Unidos e Japo esto trabalhando nesse
assunto.
Loos et al. (2009) analisaram 35 contaminantes orgnicos por LC-MS/MS, dentre eles
frmacos, em mais de 100 amostras de gua de rios de 27 pases europeus. Os autores
propuseram uma concentrao limite de DCF em guas superficiais de 100 ng L-1 como um
indicativo de risco ambiental.
-
30 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
Segundo a Agncia Europeia para Produtos Medicinais (EMEA), se o valor de
concentrao do frmaco encontrado estiver abaixo de 10 ng L-1 o risco ambiental
considerado improvvel. Acima de 10 ng L-1 a anlise do efeito toxicolgico ambiental deve
ser realizada (CASTIGLIONI et al., 2004).
Muller (2002) props limites toxicolgicos para alguns frmacos em gua destinada ao
consumo humano. Esses limites foram baseados sobre 10% da ingesto diria aceitvel ou
para o limite mximo permitido para resduos de frmacos veterinrios em leite, considerando
uma pessoa de 60 kg e uma dose diria de 2 litros de gua ou de leite. Foram estabelecidos os
seguintes limites para os frmacos em gua destinada ao consumo humano: paracetamol, 150
g L-1; sulfametoxazol, 75 g L
-1; carbamazepina, 50 g L
-1; metoprolol, 50 g L
-1;
diclofenaco, 7,5 g L-1; bisoprolol, 1 g L
-1; bezafibrato, 35 g L
-1; eritromicina, 15 g L
-1;
fenofibrato, 50 g L-1; cido acetil saliclico, 25 g L
-1; ibuprofeno, 150 g L
-1 e cido
clofbrico, 30 g L-1.
1.2 JUSTIFICATIVA DO TRABALHO
A presena de frmacos e de seus metablitos em guas superficiais, subterrneas e de
abastecimento pblico e seus efeitos toxicolgicos causados comunidade aqutica e
provvel riscos a sade humana, pela exposio indireta via ingesto da gua, considerado
como uma questo emergente. A preocupao tambm est relacionada com a presena dos
subprodutos de frmacos formados durante o tratamento de gua, que podem ser
potencialmente txicos a sade humana.
Mundialmente, h poucos trabalhos publicados sobre a aplicao de tecnologias de
remoo de frmacos, onde se inclua o DCF, em guas destinadas ao abastecimento pblico.
A maioria das pesquisas cientficas publicadas atualmente limita-se ao estudo de identificao
e quantificao de frmacos em afluentes e efluentes de ETE, sedimentos, guas superficiais e
gua potvel sem avaliar a remoo em cada etapa do tratamento e a formao de subprodutos
dos frmacos.
Para garantir a qualidade da gua destinada ao abastecimento pblico de
fundamental importncia conhecer as caractersticas fsico-qumicas da gua bruta, bem como
a concentrao de contaminantes orgnicos e inorgnicos e as tecnologias de tratamento.
Dentre as tecnologias existentes no Brasil, a de ciclo completo (constituda pelas
etapas de pr-tratamento (opcional), coagulao, floculao, sedimentao, filtrao em areia,
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 31
desinfeco, fluorao e correo do pH) a mais empregada nas ETA. Diante disso, neste
trabalho empregou-se essa tecnologia, sem as etapas de fluorao e correo de pH, para
avaliar a remoo do DCF em ensaios feitos em equipamento de reatores estticos chamado
de jarteste. A gua utilizada nos ensaios foi preparada com caractersticas semelhantes s
encontradas em mananciais superficiais na poca intermediria entre chuvas intensas e
estiagem.
Com o objetivo de se verificar a remoo de DCF prxima de 100%, considerando o
limite inferior de quantificao do mtodo (3 g L-1) validado por HPLC-DAD e o volume de
gua coletado aps as etapas de tratamento, foi escolhida a concentrao de fortificao, que
foi de 1,0 mg L-1 de DCF.
A importncia de se desenvolver mtodos analticos para a determinao de resduos
de frmacos em gua est no fato de que as ETE e as ETA, em sua grande maioria, no so
eficientes na remoo desses compostos. Para isso h necessidade de mtodos analticos
sensveis, precisos e confiveis na identificao e quantificao de resduos de frmacos em
gua. A extrao e a pr-concentrao de frmacos em amostras de gua normalmente so
feitos por meio de tcnicas de extrao em fase slida (SPE) ou microextrao em fase slida
(SPME). A determinao de frmacos em matrizes ambientais geralmente feita por
cromatografia lquida de alta eficincia com deteco no ultravioleta (arranjo de fotodiodos)
(HPLC-DAD), fluorescncia e principalmente por cromatografia lquida com deteco em
espectrmetro de massas (LC-MS) e cromatografia gasosa com deteco em espectrmetro de
massas (GC-MS).
Sendo assim, no presente estudo empregaram-se as tcnicas de extrao e de
quantificao SPE e HPLC-DAD, respectivamente, as quais cumprem os requisitos deste
trabalho. Para a identificao e quantificao dos trialometanos (clorofrmio,
bromodiclorometano, dibromoclorometano e bromofrmio) foi empregada a tcnica de
cromatografia gasosa com um detector de captura de eltrons (GC-ECD), conforme o mtodo
validado por Paschoalato (2005). Para a identificao dos subprodutos provenientes da
oxidao do DCF com cloro e dixido de cloro foi utilizada a tcnica de LC-MS/MS.
O interesse de se estudar o DCF deve-se ao fato desse frmaco ser uns dos mais
consumidos no Brasil e no mundo e bastante encontrado em efluentes de ETE e guas
superficiais (RABIET et al., 2006) e, alm disso, por ser relativamente persistente na gua
(BARTELS; TMPLINGA, 2007) e pela constatao dos efeitos causados aos organismos
aquticos e possveis efeitos adversos aos seres humanos. Conforme consta em Ribeiro et al.
-
32 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
(2007), no Brasil o DCF um dos medicamentos mais vendidos, principalmente sem
prescrio mdica.
Poucas pesquisas sobre a remoo de resduos de frmacos em ETA tm sido
desenvolvidas, principalmente no Brasil. Adicionalmente, a maioria dos estudos envolve
apenas algumas etapas de tratamento, como os processos de oxidao e adsoro, sem
avaliao dos demais processos e operaes empregados nas ETA. Pelo exposto, surgiu o
interesse em estudar a eficincia do tratamento de gua em ciclo completo complementado
com a pr-oxidao e adsoro em carvo ativado granular (CAG) na remoo de DCF.
Foram estudados os oxidantes cloro e dixido de cloro por serem os mais utilizados em ETA.
Tambm, vale ressaltar que de suma importncia identificar os subprodutos formados
durante o tratamento de gua com o uso dos oxidantes cloro e dixido de cloro devido aos
possveis efeitos txicos desses compostos a sade humana.
Destaca-se tambm o interesse do trabalho conjunto com o Departamento de
Hidrulica e Saneamento da Escola de Engenharia de So Carlos (EESC) da Universidade de
So Paulo (USP) e o Departamento de Qumica da Universidade Federal de So Carlos
(UFSCar) visando integrao entre diferentes linhas de pesquisa, que permitiu a utilizao
de equipamentos especficos para fins deste trabalho, e possibilitou o incremento da
produtividade cientfica dos grupos envolvidos.
1.3 OBJETIVOS
Este trabalho consiste em avaliar as etapas de tratamento de gua em ciclo completo
com e sem a pr-oxidao com cloro e dixido de cloro e adsoro em CAG na remoo de
DCF e a formao de subprodutos (trialometanos e subprodutos do DCF) formados na
oxidao com cloro e dixido de cloro.
Dentro desse contexto, destacam-se os objetivos especficos:
- Desenvolver e validar os mtodos de extrao e cromatogrfico por HPLC-DAD para a
determinao do DCF em gua;
- Verificar a eficincia do tratamento em ciclo completo e adsoro em CAG na remoo do
frmaco em estudo;
- Verificar a influncia da pr-oxidao com cloro e dixido de cloro na remoo do DCF, por
meio de tratamento em ciclo completo e adsoro em CAG;
- Identificar por cromatografia gasosa os THM nas etapas de pr-oxidao e ps-clorao;
-
Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho 33
- Identificar os principais subprodutos formados na oxidao do DCF com cloro e dixido de
cloro por LC-MS/MS.
1.4 APRESENTAO DESTE TRABALHO
No presente item se faz uma breve apresentao do trabalho desenvolvido e da
estrutura da tese. As etapas envolvidas durante a pesquisa esto ilustradas por meio do
fluxograma apresentado na Figura 1.3.
De forma a concretizar os objetivos propostos, a tese foi dividida em seis captulos. O
Captulo 1 apresenta a introduo com um enquadramento geral do tema em estudo. Foram
tambm apresentados os objetivos do presente trabalho com suas devidas justificativas.
Nos Captulos 2 a 5 so apresentados reviso bibliogrfica, materiais e mtodos,
objetivos, resultados e discusso e concluso referente o assunto de cada captulo.
O Captulo 2 trata das etapas de coleta da gua do rio Itapanha, extrao das
substncias hmicas aquticas (SHA) em resina XAD-8 e caracterizao dessas substncias.
O Captulo 3 se refere ao desenvolvimento e validao dos mtodos de extrao
(SPE) e cromatogrfico (HPLC-DAD) para a quantificao de DCF nas amostras de gua
antes e aps as etapas de tratamento de gua. Neste estudo as condies de extrao e pr-
concentrao foram otimizadas pelo mtodo univariado.
O Captulo 4 apresenta os ensaios de tratamento de gua em ciclo completo com e
sem pr-oxidao com cloro e dixido de cloro e adsoro em CAG, feitos em equipamento
jarteste e kit de filtros em escala laboratorial para avaliar a remoo de DCF. A quantificao
de DCF nas amostras de gua aps essas etapas de tratamento foi feita por HPLC-DAD
conforme o mtodo validado no captulo 3. Neste captulo, tambm foi avaliada a formao
de THM nas etapas de tratamento com pr-oxidao e ps-clorao por GC-ECD.
O Captulo 5 se refere ao estudo de identificao de subprodutos do DCF formados na
oxidao com cloro e dixido de cloro, em gua purificada pelo sistema Milli-Q e em gua de
estudo com a presena de SHA e caulinita, por meio de LC-MS/MS.
No Captulo 6 so apresentadas as consideraes finais e sugestes para trabalhos
futuros.
-
34 Captulo 1 Introduo geral, justificativa, objetivos e apresentao do trabalho
Figura 1.3 Fluxograma das etapas envolvidas nos ensaios de tratamento de gua em jarteste.
Coleta da gua no afluente do rio Itapanha, extrao e caracterizao das SHA
Desenvolvimento e validao do mtodo cromatogrfico para a quantificao do diclofenaco por HPLC-DAD
ENSAIOS Preparo e caracterizao da gua de estudo
Srie I - Construo do diagrama de coagulao com sulfato de alumnio (coagulao, floculao e sedimentao)Parmetros de controle: pH, cor aparente e
turbidez remanescente(Seleo de 6 melhores pontos)
Srie V - Ensaios de pr-oxidaocom cloro e dixido de cloro
Parmetros de controle: residual e consumo dos oxidantes
Srie II - Ensaio de coagulao, floculao, sedimentao e filtrao
Parmetros de controle: pH, Al, cor, turbidez.(Reproduo - 6 melhores pontos srie I)
Srie IIa - Ensaio de coagulao,floculao, sedimentao e filtraoParmetros de controle: DCF, cor, Al,
COD e turbidez(Seleo de 1 ponto da srie II)
Sries Va e Vb - Ensaios de pr-oxidaocom cloro e dixido de cloro
Parmetros de controle: residual dos oxidantes, COD, DCF, cor aparente, turbidez,
pH e clorito (para o dixido de cloro)(Seleo das dosagens x tempos de contato)
Srie VI - Ensaios em ciclo completo com pr-oxidao com cloro e
adsoro em CAGParmetros de controle: residual dos
oxidantes, COD, DCF,THM, cor aparente, turbidez, varredura UV/Vis e pH
Srie VII - Ensaios em ciclo completo com pr-oxidao com dixido de cloro
e adsoro em CAGParmetros de controle: residual dos
oxidantes, COD, DCF,THM, cor aparente, turbidez, varredura no UV/Vis,
pH e clorito
Srie IIb Ensaio de coagulao,floculao e sedimentao para
diferentes Vs. Parmetros de controle: DCF, cor, COD, pH, turbidez e Abs254
(Ponto selecionado na srie IIa)
Srie III Ensaio em ciclo completoParmetros de controle: pH, DCF, cor, turbidez, COD, varredura no UV/Vis, Abs254, THM e residual de cloro
Srie IV Ensaio em ciclo completocom adsoro em CAG
Parmetros de controle: pH, DCF, cor aparente, COD, turbidez, varredura no UV/Vis, THM e residual de cloro
Srie VIII - Identificao de subprodutos do diclofenaco por
LC-MS/MS
-
EEXXTTRRAAOO EE CCAARRAACCTTEERRIIZZAAOO DDAASS
SSUUBBSSTTNNCCIIAASS HHMMIICCAASS AAQQUUTTIICCAASS
CAPTULO
2
2.1 REVISO BIBLIOGRFICA
2.1.1 Substncias hmicas
A matria orgnica natural (MON) presente em guas naturais pode ser subdividida
em matria orgnica dissolvida (MOD) e matria orgnica particulada (MOP). A MOD
operacionalmente definida como a frao que atravessa o filtro com poros de 0,45 m, e essa
frao constitui a maior parte da MON presente em guas (aproximadamente 80%). A MOD
possui vrios compostos orgnicos, como protenas, aminocidos, cidos graxos, polmeros e
na maior parte substncias hmicas (SH), s quais correspondem cerca de 50 a 70% da MOD
(AIKEN, 1985; ODEGAARD et al., 1999).
A MOP a matria orgnica retida na membrana de 0,45 m (THURMAN, 1985). A
MOP corresponde a aproximadamente 17% da MON presente em guas naturais e
usualmente facilmente removida pelos mtodos convencionais de tratamento de gua, como
coagulao e filtrao (EDZWALD, 1993).
As SH so encontradas em solos, turfa, sedimentos e guas naturais (THURMAN,
1985; KRASNER; AMY, 1995). As substncias hmicas aquticas (SHA) podem ser
formadas diretamente no meio aqutico pela decomposio de plantas e pela atividade
sinttica de microrganismos, ou ainda SH encontradas em solos e sedimentos podem ser
transportadas para as guas por processos de lixiviao e escoamento superficial (ROCHA;
ROSA, 2003).
De modo geral, as SH podem ser classificadas como substncias orgnicas biognicas,
polieletrolticas com propriedades similares s de biocoloides, de colorao escura, de
natureza heterognea, elevada massa molar e de estrutura complexa e ainda no definida
(STEVENSON, 1985; ROCHA; ROSA, 2003; BOTERO, 2010).
Em Thurman e Malcolm (1981) define-se as SHA como uma poro no especfica,
amorfa, constituda de MOD em pH 2 e adsorvente em resina no inica XAD 8, com altos
valores de coeficientes de distribuio. Samios et al. (2007) definiram SHA como
-
36 Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas
macromolculas orgnicas amorfas e precursoras de subprodutos halogenados, formados
principalmente na clorao da gua bruta.
De acordo com a solubilidade em diferentes condies de pH as SH dividem-se em
fraes de cidos flvicos (AF), cidos hmicos (AH) e humina. Os AF so solveis em toda
faixa de pH, os AH so solveis em valores de pH 2 e a humina a frao insolvel em
toda faixa de pH (STEVENSON, 1994). As trs fraes hmicas diferem quanto massa
molar e quantidade de grupos funcionais, tendo os AF menor massa molar, maior quantidade
porcentual de oxignio e menor contedo de carbono e nitrognio que as outras fraes
hmicas (DI BERNARDO; DANTAS, 2005).
Existem alguns modelos que propem estruturas para as SH. Dentre eles, em Schulten
e Schnitzer (1993) so propostos modelos macromoleculares para os AH e os AF. Na
estrutura proposta para os AH h a existncia de grupos carboxlicos, fenlicos, alcolicos e
grupos nitrogenados como aminas e nitrilas, alm de cadeias alifticas e aromticas. Na
estrutura dos AF contm menor contedo de carbonos aromticos, estrutura menos
condensada e menor massa molar que dos AH. Alm dessas caractersticas, possvel haver a
existncia de vazios de diferentes tamanhos, podendo ser hidrofbicos ou hidroflicos
dentro das molculas de SH.
Em Von Wandruszka (1998) a estrutura das SH definida como pseudomicelar de
natureza polimrica e em Piccolo (2001) o modelo chamado de supramolecular. No modelo
supramolecular as SH so formadas por molculas pequenas e heterogneas de vrias origens,
auto-organizadas em conformaes supramoleculares, o que explicaria o grande tamanho
molecular das SH.
Em Diallo et al. (2003) e Sutton et al. (2005) so excludos os modelos nos quais so
sugeridos que as SH so macromolculas com alta massa molar ou mistura de compostos
orgnicos complexos e heterogneos. Nesse trabalho foi observado que as estruturas
existentes de AH possuem as caractersticas necessrias para formar supramolculas. Essas
supramolculas podem ser formadas por blocos constitutivos relativamente pequenos se
comparados com outras macromolculas, ligados uns aos outros por foras de van der Walls
(interaes do tipo - e de dipolos permanentes ou induzidos), ligaes de hidrognio e por
coordenao com ons metlicos do ambiente.
Porm, devido complexidade das SH ainda no existe um modelo que explique
consistentemente a sua estrutura. Tambm, diante das diferentes origens e mecanismos de
decomposio das SH, composio qumica, pH da gua, da possibilidade de agregao e
-
Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas 37
mudana conformacional, torna-se difcil a determinao precisa do tamanho molecular e a
comparao entre os resultados encontrados na literatura (THURMAN et al., 1982;
ARTINGER et al., 2000). Em geral, os AH possuem tamanho molecular maior que os AF.
Usando cromatografia de excluso por tamanho, foram encontrados tamanhos moleculares na
faixa de 900 a 5000 Da para os AF (CHIN et al., 1997). Em Conte e Piccolo (1999) relatado
tamanho molecular de HA na faixa de 6500 a 9000 Da. Richardson (2002), em uma pesquisa
utilizando cromatografia de permeao em gel, indicou que os AF geralmente tm
distribuies de tamanho molecular na faixa de 200 a 2000 Da e os AH na faixa de 1000 a
100000 Da.
Rigobello et al. (2011) avaliaram o efeito de diferentes tamanhos moleculares
aparentes das SHA na coagulao com sulfato de alumnio e cloreto frrico de guas
preparadas com cor verdadeira igual a 100 uH. Nesse trabalho foi concludo que guas com a
mesma colorao, mas com SHA com propriedades estruturais distintas (grupos funcionais,
aromaticidade, tamanho molecular, proporo de AH e de AF) resultaram em diferentes
condies de coagulao e de remoo de SHA. Para atingir o mesmo grau de remoo de cor
as amostras de gua preparadas com SHA de menor tamanho molecular aparente
necessitaram de dosagens mais elevadas dos coagulantes, tanto de sulfato de alumnio como
de cloreto frrico.
A presena das SHA a principal responsvel pela cor escura nas guas naturais.
Devido principalmente a essa caracterstica, muitas estaes de tratamento de gua (ETA)
apresentam problemas de operao devido ao fato da tecnologia de tratamento empregada no
se adequar qualidade da gua a ser tratada, requerendo o uso da pr-oxidao,
principalmente para a reduo de cor e assim ocorrendo possivelmente a formao de
subprodutos halogenados (DI BERNARDO; DANTAS, 2005).
Quando as SHA no so eficientemente removidas durante as etapas de tratamento de
gua podem causar alguns problemas como: servir de substrato para o crescimento de
microrganismos; reduzir a eficincia do processo de desinfeco; complexar metais (Mn, Pb e
Fe e outros) e dificultar a remoo de metais; interagir com compostos orgnicos
xenobiticos, por exemplo, pesticidas, ftalatos, interferentes endcrinos e hidrocarbonetos
aromticos policclicos; produzir substncias com gosto e odor desagradveis, algumas
txicas e carcinognicas, por exemplo, trialometanos e cidos haloacticos, quando a pr-
oxidao feita com cloro livre e na presena de bromo (WESTERHOFF et al., 2004; DI
BERNARDO; DANTAS, 2005; KALETA; ELEKTOROWICZ, 2009; BOTERO, 2010).
-
38 Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas
Alm disso, a presena de substncias hmicas em guas, principalmente de menor
tamanho molecular, podem dificultar a remoo de frmacos cidos por coagulao. Vieno et
al. (2006) estudaram a influncia de AH na remoo de diclofenaco, ibuprofeno, bezafibrato,
carbamazepina e sulfametoxazol por coagulao com sulfato de alumnio e sulfato frrico. Os
autores concluram que uma elevada quantidade de MOD de elevado tamanho molecular
melhorou a remoo dos frmacos cidos (diclofenaco, ibuprofeno e bezafibrato) na
coagulao.
As SHA podem ser removidas por diferentes processos de tratamento de gua tais
como coagulao, utilizao de membranas (microfiltrao, ultrafiltrao, nanofiltrao,
osmose inversa), oxidao, biofiltrao, resinas de troca inica e carvo ativado
(ODEGAARD et al., 1999).
Durante o processo de coagulao usando sais de ferro ou de alumnio, as SH
carregadas negativamente podem interagir com as espcies hidrolisadas positivas do metal
formando complexos insolveis na forma de humatos ou fulvatos (mecanismo neutralizao
de cargas) ou podem ser adsorvidas no precipitado de hidrxido de metal (mecanismo de
varredura) (JOHNSON; AMIRTHARAJAH, 1983). O mecanismo de varredura mais
apropriado quando a remoo de flocos ocorre por sedimentao ou flotao. O mecanismo
de adsoro e neutralizao de cargas mais efetivo quando as ETA empregam filtrao
direta, pois no h necessidade de formao de flocos para posterior sedimentao ou
flotao, mas sim de partculas desestabilizadas que so retidas no meio granular dos filtros
(CAMPOS et al., 2007).
Edwards e Amirtharajah (1985) concluram que a coagulao de AH com sais de Al3+
ocorreu por meio dos mecanismos de adsoro dos AH sobre o precipitado de hidrxido de
alumnio, Al(OH)3(p), (pH 6,00 - 8,00) e por neutralizao de cargas atravs de alumnio
solvel ou em fase slida ou espcies de alumnio hidrolisadas (pH 4,00 - 5,50). Dempsey et
al. (1984) relataram que os mecanismosde remoo de AF por sais de Al3+ so os de adsoro
dos AF sobre o precipitado Al(OH)3(p) ou de formao de complexo AF-alumnio em pH
superior a 6,25 e precipitao de AF por polmeros de alumnio carregados positivamente em
pH abaixo de 6,00.
Rigobello et al. (2011), em estudos de filtrao direta, verificaram que os mecanismos
de coagulao das SHA com Al3+ provavelmente ocorrem por neutralizao de cargas atravs
das formas de alumnio hidrolisadas carregadas positivamente em pH mais baixo e por
adsoro dos AH e AF no precipitado de Al(OH)3(s) em pH mais elevado.
-
Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas 39
Diante das dificuldades de remoo das SHA em ETA e da possvel formao de
subprodutos e interao dessas substncias com outros compostos presentes na gua, como os
metais e frmacos, de grande interesse o estudo das caractersticas e da presena dessas
substncias na gua.
2.1.2 Mtodos de extrao das substncias hmicas aquticas
Vrios mtodos de extrao de SHA so empregados cujos principais so:
precipitao, ultrafiltrao, extrao por solvente, liofilizao e adsoro (AIKEN, 1985).
Na Tabela 2.1 so apresentados os mtodos de extrao mais utilizados e suas
vantagens e desvantagens.
Tabela 2.1 Mtodos de extrao de substncias hmicas aquticas mais utilizados.
Mtodos Vantagens Desvantagens Referncia
Liofilizao Alto fator de concentrao.
Todos solutos so concentrados, menos os volteis; Mtodo lento.
Sargentini Junior et al. (2001)
Romo e Rocha (2005)
Precipitao Eficaz para guas com alto teor de carbono orgnico dissolvido.
Ineficiente para grandes volumes de amostra;
Contaminao das SH com metais.
Aiken (1985)
Abaixamento de
temperatura
Minimiza alteraes indesejveis nas
caractersticas originais da amostra e baixo custo.
Extrao fortemente influenciada pela
velocidade de abaixamento de temperatura.
Almeida et al. (2003)
Ultrafiltrao
Fracionamento dos solutos por tamanho molecular; Grandes volumes de amostra.
Interao do soluto com a membrana; Colmatao da membrana; Influncia do pH, da fora inica, do tipo de membrana e da presso.
Burba et al. (2001) Leenheer e Crou (2003) Romo e Rocha (2005) Rigobello et al. (2011)
Resinas XAD (adsoro)
Alto fator de concentrao;
Eficiente desoro; Capacidade de
regenerao da resina adsorvente;
Grande volume de amostra pode ser
processado.
Uso de cidos e bases fortes altera levemente as
caractersticas qumicas da MOD; Aumento da polaridade da MOD; Degradao oxidativa;
Contaminaes da amostra proveniente da resina;
Possvel soro irreversvel.
Sargentini Junior et al. (2001)
Romo e Rocha (2005) Oliveira et al. (2007) Samios et al. (2007)
Rigobello et al. (2011)
As resinas a base de estireno de polivinilbenzeno (XAD 1 e XAD 2) so mais
utilizadas na extrao de SH presentes em guas marinhas. As resinas macroporosas inicas
de ster acrlico XAD 7 e XAD 8 so mais utilizadas para a extrao de SH de guas
-
40 Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas
superficiais. Essas resinas apresentam rea superficial elevada e, em geral, a adsoro dos
cidos orgnicos determinada pela solubilidade do soluto, pH da soluo e a
hidrofobicidade. Em baixos valores de pH os cidos fracos so protonados e adsorvidos na
resina; em pH elevado os cidos so ionizados e a desoro favorecida. Diferenas no
tamanho dos poros, rea superficial e composio qumica da resina levam a diferentes
resultados para um mesmo soluto (ROCHA; ROSA, 2003).
A resina XAD 8 adsorve as fraes hidrofbicas (HPO) da MOD a pH 2,0, que
consistem de cidos hidrofbicos (HPO-A) e frao hidrofbica neutra (HPO-N) que so as
fraes hmicas. A frao de HPO-A eluda com soluo de hidrxido de sdio 0,1 mol L-1
(NaOH) a pH 13. A frao de HPO-N retida na resina XAD 8 e pode ser extrada com
acetonitrila em extrao Soxhlet (MALCOLM; MACCARTHY, 1992). As fraes
hidroflicas (HPI) no so adsorvidas nas resinas XAD 8 e XAD 4 (LEENHEER; CROUE,
2003). As fraes transflicas (TPI), que consistem de cidos transflicos (TPI-A) e
transflicas neutras (TPI-N), so adsorvidas na resina XAD 4 e podem ser extradas por
soluo de NaOH 0,1 mol L-1 e solventes orgnicos como a acetonitrila, respectivamente
(AIKEN et al., 1992).
A frao de HPO-A contm, principalmente, cidos carboxlicos alifticos, cidos
aromticos e fenis. A frao de HPO-N contm hidrocarbonetos como polmeros amorfos,
por exemplo, e relativamente estvel e no reativa (AIKEN et al., 1992). Os TPH-A e
TPH-N so as fraes no hmicas. Os TPI-A contm teores mais elevados de oxignio,
nitrognio e enxofre, com um menor carter aromtico. Esses so compostos por cidos
fortes, possivelmente cidos orgnicos polifuncionais e cidos alifticos. As fraes HPO
(AH e AF) tm uma densidade de carga significativamente maior que as fraes HPI (SHARP
et al., 2006). As fraes HPI so constitudas principalmente de carbonos alifticos e
compostos nitrogenados, tais como cidos carboxlicos, carboidratos e protenas
(MATILAINEN et al., 2010).
Navalon et al. (2010) separam fraes de MOD da gua do rio Turia, Espanha, por
nanofiltrao e resinas no inica (XAD-8 e XAD-4), que resultaram em 50% de HPO-A,
24% de TPI-A e 12% de HPO-N. Os principais compostos identificados nessas fraes foram
polissacardeos, cidos graxos, cidos policarboxlicos alifticos e aminocidos. Os autores
observaram que as trs fraes apresentam semelhanas espectroscpicas e que,
particularmente, as fraes HPO-A e TPI-A foram idnticas. Essa semelhana na composio
-
Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas 41
das fraes mostra que o procedimento de fracionamento usando resinas XAD 8 e XAD 4
ineficiente para separar as diferentes fraes: hidrofbicas, hidroflicas e transflicas da MON.
O mtodo mais usado para extrair SHA por resina XAD 8, qual o adotado pela
International Humic Substances Society (IHSS) (THURMAN; MALCOLM, 1981).
Embora haja alguma similaridade entre SH presentes no solo e na gua, a diversidade
no ambiente de formao e nos compostos de origem as fazem apresentar diferenas
peculiares. Ao contrrio das SH extradas de solo, que apresentam predominncia de AH, as
SHA contm quantidade aprecivel de AF, de menor massa molar que os AH. Por esse
motivo, o tratamento de guas com a mesma colorao, mas contendo SH com propriedades
estruturais distintas, pode resultar diferente, conforme foi apresentado em estudos de
coagulao com gua contendo SH de turfa e aqutica (CAMPOS, 2007) e SHA (SLOBODA
et al., 2007). Diante disso, neste trabalho foi empregada SHA ao invs de SH extrada de
turfa, para conferir cor verdadeira na gua de estudo.
2.2 OBJETIVOS
O objetivo foi obter a frao de SHA da amostra de gua coletada em um afluente do
rio Itapanha, com caractersticas prprias de SHA, para conferir cor verdadeira de 20 uH nas
amostras de gua preparadas para a realizao dos ensaios de tratamento de gua em
equipamento jarteste.
2.3 MATERIAIS E MTODOS
2.3.1 Coleta da gua no afluente do rio Itapanha
Foram coletados aproximadamente 1500 L de gua em um afluente do rio Itapanha,
pertencente ao Parque Estadual da Serra do Mar, 7 Grupo de Unidades de Gerenciamento de
Recursos Hdricos (UGRHIs), na Baixada Santista, Bertioga-SP. O ponto de coleta localiza-se
na Latitude 234719,35"S e Longitude 46329,32"O (Figura 2.1). A coleta foi feita em uma nica etapa. Para o transporte e armazenamento das amostras de gua foram utilizados
recipientes plsticos, conforme apresentado nas fotos da Figura 2.2.
O rio Itapanha formado por vrias nascentes da Serra do Mar, prximo do
municpio de Biritiba Mirim, e vrios afluentes, chegando a Bertioga atravs de seu vale. Sua
extenso de aproximadamente 40 km.
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42 Captulo 2 Extrao e caracterizao das substncias hmicas aquticas
O Parque Estadual da Serra do Mar constitudo de vegetao de floresta tropical
fluvial (mata Atlntica), com diversos rios, rico em espcies vegetais e animais1.
(a) Imagem satlite e localizao geogrfica do ponto de coleta da gua do presente trabalho. Fonte: . Acesso em: 22 maio 2012.
(b) Foto do afluente do rio Itapanha.
Figura 2.1 (a) Imagem satlite e (b) foto da localizao do ponto de coleta em um afluente do rio Itapanha, Bertioga-SP.
1 http://sapl.camarabertioga.sp.gov.br:8080/historia/turismo/parque-estadual-da-serra-do-mar
Ponto de coleta Afluente do rio Itapanha
Rio Itapanha
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Captulo 2 Extrao e caracterizao das su