CadernoOrientacaoDidatica_Matematica
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REFERENCIAL DE EXPECTATIVAS PARA O DESENVOLVIMENTO DA COMPETNCIA LEITORA E
ESCRITORA NO CICLO II DO ENSINO FUNDAMENTAL
Matemtica
So Paulo2006
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Secretaria Municipal de EducaoSo Paulo, dezembro de 2006
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)Cmara Brasileira do Livro, SP - Brasil.
So Paulo (SP). Secretaria Municipal de Educao. Diretoria de Orientao Tcnica.
Referencial de expectativas para o desenvolvimento da competncia leitora e escritora no ciclo II : caderno de orientao didtica de Matemtica / Secretaria Municipal de Educao So Paulo : SME / DOT, 2006.
109p.Bibliografia
1.Ensino Fundamental 2.Matemtica I.Programa Ler e Escrever - Prioridade na Escola Municipal de So Paulo
CDD 372
Cdigo da Memria Tcnica: SME-DOT2/Sa005-d/06
PREFEITURA DA CIDADE DE SO PAULOGilberto Kassab
Prefeito
SECRETARIA MUNICIPAL DE EDUCAOAlexandre Alves Schneider
Secretrio
DIRETORIA DE ORIENTAO TCNICAIara Glria Areias Prado
Secretria Adjunta e Responsvel pela DOT
DOT Ensino Fundamental e MdioRegina Clia Lico Suzuki
Diretora da Diviso
DOT Ensino de Jovens e AdultosRomy Schinzare
Diretora da Diviso
Consultora geralProf Maria Jos Martins de Nbrega
Assessoria e Consultoria
Coordenao e elaborao final na rea de MatemticaProf Clia Maria Carolino
Assessoria
Grupo referncia da rea de MatemticaProf. Antonio Rodrigues Neto EMEF Vereador Antnio Sampaio;
Prof Edna Grottoli Fumeiro EMEF Jos Dias da Silveira; Prof. Edson do Carmo EMEF Sergio Milliet; Prof Eliete de Moraes Andrade EMEF Leonardo Villas Boas;
Prof Joelma Angela de Lima Melo EMEF Vinte e Cinco de Janeiro; Prof Licia Taurizano do Prado Juliano EMEF Joo de Souza Ferraz;
Prof Maria de Ftima J. Vieira Wick EMEF Engenheiro Jos Amadei; Prof Mrcia Dias de Oliveira EMEF Fbio da Silva Prado;
Prof Mariucha Baptista de Paula EMEF Henrique F. da Costa; Prof Regina Clia Schoba de Zotti EMEF Joo Carlos da Silva Borges.
Equipe SME / DOTProf. Antonio Gomes Jardim; Prof Benedita Terezinha Rosa de Oliveira; Prof. Carlos Alberto Mendes de Lima;
Delma Aparecida da Silva (Administrativo); Prof Elenita Neli Beber; Prof Ione Aparecida Cardoso Oliveira; Prof. Jarbas Mazzariello; Prof. Jos Alves Ferreira Neto; Prof Lia Cristina Lotito Paraventi;
Prof Maria Virginia Ortiz de Camargo; Prof Rachel de Oliveira; Prof Regina Clia Lico Suzuki; Prof Rita de Cassia Anibal; Prof Romy Schinzare; Prof Rosa Peres Soares; Prof Tidu Kagohara.
Multimeios Pesquisa sobre direitos autorais de textos e imagensLlian L. P. P. Rodrigues; Patricia M. das S. Rede; Waltair Marto; Joseane Ferreira; Conceio Aparecida B. Carlos.
Agradecimentos aos Diretores das EscolasEMEF Vereador Antnio Sampaio; EMEF Fbio da Silva Prado; EMEF Henrique F. da Costa;
EMEF Joo Carlos da Silva Borges; EMEF Joo de Souza Ferraz; EMEF Engenheiro Jos Amadei; EMEF Jos Dias da Silveira; EMEF Leonardo Villas Boas; EMEF Sergio Milliet; EMEF Vinte e Cinco de Janeiro.
Agradecimentos pela cesso de direitosEditora FTD; Editora Scipione.
Coordenao editorial e grfica Trilha Produes Educacionais
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Caro professor,
Em 2006, a Diretoria de Orientao Tcnica da Secretaria Municipal de Educa-
o (DOT/SME) disponibilizou para todos os professores do ciclo II da rede munici-
pal de ensino o Referencial de expectativas para o desenvolvimento da competncia
leitora e escritora no ciclo II do ensino fundamental e acompanhou todas as aes
previstas para implantao e implementao das propostas do programa Ler e es-
crever: prioridade na escola municipal para o ciclo II, tanto no ensino regular como
na Educao de Jovens e Adultos (EJA).
As idias e contedos presentes no Referencial tm como objetivo contribuir
para a reflexo e o debate na escola sobre a necessidade de inserir todos os alunos
da rede municipal em uma comunidade de leitores e escritores, desenvolvendo para
isso as habilidades exigidas para o domnio da linguagem escrita.
Os documentos que temos o prazer de apresentar aos professores especialis-
tas nas diferentes reas do currculo escolar os Cadernos de Orientaes Didticas
pretendem dar continuidade a essas reflexes considerando as especificidades de
cada rea de conhecimento. Eles so fruto de um trabalho coletivo que envolveu
equipe da DOT, especialistas de cada rea de conhecimento e professores da rede
municipal de ensino, constituindo os chamados grupos referncia. Os membros de
cada grupo participaram ativamente de todo o processo de elaborao, desde as
reflexes iniciais sobre as especificidades de sua rea, passando pela construo e
aplicao das propostas de atividades, adequando-as realidade das escolas em que
atuam, at a reviso final da verso que hoje entregamos rede.
Esperamos que esses documentos possam ser recursos teis para a construo
das prticas desenvolvidas em sala de aula.
Alexandre Alves SchneiderSecretrio Municipal de Educao
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental
SumrioApresentao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7
Algumas reflexes na rea de Matemtica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1
O processo de construo do caderno e a insero da Matemtica na proposta global do projeto. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .1
Competncia leitora e escritora e aprendizagem em Matemtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
A comunicao nas aulas de Matemtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
Habilidades de leitura nas aulas de Matemtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
Gneros discursivos nas aulas de Matemtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
Enunciados de problemas e de exerccios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
Leitura, interpretao e construo de tabelas e grficos. . . . . . . . . . 34
Relatos de atividades de leitura nas aulas de Matemtica. . . . . . . . . . 3
Relatos de trabalhos desenvolvidos com base em textos de livros didticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
Relatos de trabalhos desenvolvidos com base em outros textos que no os de livros didticos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
Consideraes finais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
Reflexes sobre o trabalho de explorao de textos nas aulas de Matemtica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
Bibliografia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83
Anexos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
Relatos de outras atividades desenvolvidas pelo grupo referncia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 7
Apresentao
Por que um caderno de orientaes didticas para cada rea de conhecimento?
O desenvolvimento da competncia leitora e escritora responsabilidade de toda a
escola ensina-se a ler contos, poemas, propagandas, informes cientficos, pesquisas e
relatos histricos, biografias, enunciados de problemas matemticos, frmulas, tabelas,
imagens etc. O que delimita o trnsito dos gneros de texto entre as diferentes reas
de conhecimento so os contedos e objetivos especficos de cada uma delas, e isso
implica procedimentos didticos distintos, de acordo com o que se vai ler.
Trabalhar com a diversidade de textos em todas as reas no significa deixar de
definir os objetivos e contedos especficos do ensino de cada rea no ano do ciclo.
preciso lembrar que os gneros, por si mesmos, no so contedos, e sim ferramentas
que possibilitam o acesso ao conhecimento da rea a ser estudada. Assim, cabe a cada
rea definir no planejamento os textos e os suportes que sero trabalhados, bem como
os objetivos a serem atingidos em cada momento de leitura.
A elaborao dos Cadernos de Orientaes Didticas por rea de conhecimento baseou-se nos seguintes princpios: quais gneros aparecem com mais freqncia na
rea de conhecimento e quais procedimentos de leitura devem ser desenvolvidos para
aproximar esses textos dos alunos leitores.
As reflexes de cada grupo referncia pautaram-se tambm em como construir se-
qncias didticas que sejam mais significativas aos alunos e que abram possibilidades
de adequar o ensino a suas necessidades de aprendizagem.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental8
Aspectos a observar no planejamento do ensino da leitura articulado aos contedos das reas de conhecimento
O Referencial de expectativas para o desenvolvimento da competncia leitora e escritora no ciclo II do ensino fundamental traz, nas pginas 56 a 60, orientaes de como organizar o trabalho com os diferentes gneros de texto em cada rea do curr-
culo escolar.
O documento sugere que o planejamento fundamentalmente leve em conta no
apenas os objetivos da rea, como tambm os resultados das avaliaes diagnsticas
realizadas com os alunos na escola, propondo situaes para que estas possam ser
adotadas pelo coletivo dos professores. Qual foi o desempenho dos estudantes no
diagnstico de compreenso leitora nas esferas discursivas a que pertencem os gne-
ros selecionados?
Alm desses instrumentos, os professores podem observar os resultados obtidos
nas avaliaes externas, como a Prova Brasil e o Sistema de Avaliao de Rendimento
Escolar do Estado de So Paulo (Saresp).
Tais dados sero teis para determinar quais esferas discursivas requerem maior
investimento e qual o aprofundamento necessrio para que os alunos possam cons-
truir progressivamente, com a ajuda dos professores, autonomia para ler diferentes
tipos de texto.
Outro aspecto importante nesse processo diz respeito necessidade de definir quais
sero os gneros privilegiados de acordo com o objeto de estudo de cada rea no ano
do ciclo, deciso que no cabe a um nico professor, mas a todos.
Algumas questes precisam ser discutidas por esse coletivo. Quais so os gneros
de texto que aparecem assiduamente nas aulas de cada uma das reas? H gneros co-
muns a todas elas? A que esferas de circulao pertencem? Por meio de que suportes
os alunos tm acesso ao texto: livro didtico, lousa, meio eletrnico, jornais, revistas?
importante que a cada ano do ciclo sejam selecionados gneros das vrias es-
feras de circulao, assim como diversos suportes de texto, para permitir que os estu-
dantes vivenciem os diferentes procedimentos de leitura que caracterizam as prticas
sociais e os distintos modos de ler, para que possam desenvolver as prprias estratgias
de leitura.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 9
Aps a discusso coletiva, cada professor far seu planejamento contemplando os
gneros mais presentes em sua rea de conhecimento.
Vale a pena destacar que cada professor precisa analisar minuciosamente os livros
didticos que sero usados durante o ano, avaliando se trazem textos adequados ao
desenvolvimento do planejamento da rea. Que textos trazem? Que imagens? Quais as
relaes dos textos e imagens com os contedos desenvolvidos? Quais sero trabalhados?
O que ser aproveitado, levando em conta os objetivos didticos a serem desenvolvidos
em cada turma? O que ser excludo? Que outros textos precisaro ser contemplados
para ampliar, contrapor ou desenvolver os conceitos veiculados? Que textos podero ser
lidos com autonomia pelos alunos? Quais precisaro de maior mediao do professor?
Aps a definio dos gneros, possvel selecionar outros a que os alunos tero
acesso com menor freqncia. Nessa escolha, devem ser priorizados os gneros que
foram focalizados nos anos anteriores e os que sero abordados nos anos seguintes.
No primeiro caso, o propsito ampliar o repertrio, favorecer a leitura autnoma; no
segundo, permitir que os estudantes possam familiarizar-se com textos desses gneros
para que sua aprendizagem se torne mais significativa.
Portanto, a construo de uma leitura autnoma requer o planejamento de situaes
didticas em que os alunos possam realmente ler diversos tipos de texto, com diferentes
intenes e funes, e exercitar as habilidades especficas para a leitura compreensiva
de textos reais, sejam ou no escolares.
Como organizar uma rotina de leitura com alunos do ciclo II
Para concretizar as aes educativas que envolvem a articulao do ensino da lei-
tura e escrita e as reas de conhecimento, o professor precisa pensar na organizao do
trabalho pedaggico de modo que aproveite ao mximo o tempo que passa com os alu-
nos, oferecendo-lhes situaes significativas que de fato favoream a aprendizagem.
A organizao do tempo necessria no apenas para a aprendizagem do aluno,
mas tambm serve, em especial, para a gesto da sala de aula, um desafio muito gran-
de para todos os professores do ciclo II.
Quando se opta por apresentar a leitura na escola sem simplificaes, tal como
acontece nas prticas sociais e com a diversidade de propsitos, de textos e de combi-
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental10
naes entre eles, deve-se pensar em uma rotina de trabalho que exige conhecimentos
para prever, seqenciar e pr em prtica as aes necessrias em determinado tempo.
Vrias modalidades de leitura podem ser utilizadas, em diferentes situaes, diante
de um mesmo tipo de texto: possvel ler um material informativo-cientfico para obter
uma informao global, para buscar um dado especfico ou para aprofundar determi-
nado aspecto do tema; a leitura de um artigo de jornal pode ser feita em um momento
simplesmente por prazer e em outro como objeto de reflexo; um poema ou um conto
podem ser lidos primeiro por prazer e depois como forma de comunicar algo a algum;
enfim, h muitas possibilidades de abordagem dos textos.
Quando o objetivo permitir a convivncia freqente e intensa com determinado
gnero de texto, proporcionando aos alunos oportunidades de experimentar diferentes
modos de ler e desenvolver estratgias de leitura diversificadas, necessrio planejar ati-
vidades que se repitam de modo regular, as chamadas atividades permanentes. Nesses
casos, promove-se uma leitura horizontal dos textos, ou seja, de forma ldica, feita apenas
uma vez, provocando o encanto da descoberta, que s se experimenta na primeira leitura.
Essa leitura pode ser realizada em voz alta pelo professor ou pelos prprios alunos.
Sugere-se que tais atividades sejam registradas medida que forem executadas,
com avaliao geral da turma, para que se formem leitores crticos dos textos lidos, co-
mo exemplificado no quadro a seguir.
Atividade permanente em Lngua Portuguesa
Leitura de contos
Histria(s) lida(s) J K L
Pedro Malasartes e a sopa de pedra
A moa tecel
Felicidade clandestina
Quando o objetivo uma leitura mais detalhada e cuidadosa, em que a releitura
condio necessria, pois o que se pretende recuperar as marcas de construo do
texto, procede-se leitura vertical. Esse tipo de leitura requer a mediao do professor,
em atividades organizadas na forma de seqncias didticas ou projetos, dependendo
do aprofundamento que ele queira dar ao estudo do tema, por meio do conjunto de
textos de um mesmo autor ou de textos de um mesmo gnero. Tais atividades tm
de ser planejadas de modo intencional e distribudas no tempo, constituindo-se em ro-
tinas de trabalho.
Como o professor do ciclo II atua com diversas turmas, sugere-se o registro dessas
rotinas para cada uma delas, de modo que a organizao do trabalho a ser realizado se
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 11
torne mais visvel. No quadro a seguir, por exemplo, o professor pode fazer os registros
medida que for realizando o trabalho com leitura com suas turmas, sem abandonar a
diversidade de propsitos de leitura e de abordagem dos textos.
Ms/ano: maio/2007. Turma: 2o ano do ciclo II. rea: Matemtica
Freqncia de atividades desenvolvidas 2 4 7 9 11 14 16 18 21 23 25 21 22 25 26 27 28Ouvir textos lidos pelo professor Ler coletivamente com a colaborao do professor e da classe Ler com um colega (duplas)
Ler individualmente Conversar sobre os textos lidos Selecionar livremente material para ler na sala de leitura ou na sala de informtica Pesquisar material bibliogrfico na sala de leitura ou na sala de informtica Produzir textos coletivos Produzir textos em duplas Produzir textos individualmente
Usar o livro didtico
Discutir ou corrigir atividades realizadas
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental12
Como trabalhar com alunos que no sabem ler e escrever ou que tm pouco domnio da leitura e escrita
Os dados apresentados pelas Coordenadorias de Educao (CEs) em 2006, com
base em um diagnstico elaborado pelas escolas, apontam que, em mdia, 1,7% dos
alunos que freqentam o ciclo II ainda no esto alfabetizados. Ressalte-se que, em al-
gumas escolas, esse percentual menor e, em outras, superior a 3%.
Tal questo no pode ser ignorada nem deixada para os professores das reas en-
frentarem sozinhos. Todos esses alunos devem ter atendimento especial nas Salas de
Apoio Pedaggico (SAPs) ou em projetos de recuperao com o objetivo de construir
aprendizagens em relao a seu processo de alfabetizao.
H tambm alunos que, embora conheam o sistema alfabtico, apresentam pou-
co domnio da leitura e escrita: produzem escritas sem segmentao, tm baixo de-
sempenho na ortografia das palavras de uso constante, elaboram textos sem coeso e
coerncia, lem sem fluncia, no conseguem recuperar informaes durante a leitura
de um texto etc.
A Diretoria de Orientao Tcnica (DOT), juntamente com as Coordenadorias de
Educao, planejou, para 2007, aes voltadas para o desenvolvimento das aprendiza-
gens necessrias para o avano desses alunos. No entanto, fundamental que todos
os professores contribuam para que esses sejam includos nas atividades que propem
para suas turmas. Para que isso ocorra, preciso:
Favorecer o acesso ao assunto ou tema tratado nos textos, permitindo que os
alunos arrisquem e faam antecipaes bastante aproximadas sobre as informa-
es que trazem.
Centrar a leitura na construo de significado, e no na pura decodificao.
Envolver os alunos em atividades em que a leitura seja significativa, despertan-
do-lhes o desejo de aprender a ler.
Organizar trabalhos em grupo para que os alunos participem dos momentos de
leitura com colegas mais experientes.
Envolver os alunos em debates orais para que expressem sua opinio sobre os
temas tratados.
Deve-se levar em conta que esses alunos precisam ter sucesso em suas aprendizagens
para que se desenvolvam pessoalmente e tenham uma imagem positiva de si mesmos.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 13
Isso s ser alcanado se o professor tornar possvel sua incluso e acreditar que todos
podem aprender, mesmo que tenham tempos e ritmos de aprendizagem diferentes.
Cronograma Ler e escrever para 2007
1. Construo das expectativas de aprendizagem e anlise das matrizes de avaliao
2. Produo de material de orientao para trabalho dos professores de Lngua Portuguesa no atendimento aos alunos recm-alfabticos
3. Formao de 65 professores de Lngua Portuguesa e 13 formadores de DOT P-Escolas (DOT Pedaggico) de 65 escolas selecionadas pelas CEs
4. Grupo de trabalho DOT P e CP (Coordenador Pedaggico) para desenvolver pautas de formao continuada
5. Grupo de trabalho CP com professores do ciclo II nos horrios coletivos (formao continuada)
6. Grupo de trabalho DOT/SME e DOT P/CEs
7. Grupos de formao de professores de Lngua Portuguesa pelas CEs (por adeso)
8. Cursos optativos para o ciclo II nas CEs e implementao dos Cadernos de Orientaes Didticas
9. Produo de cadernos de relatos de prtica nas CEs e na SME
10. Encontros nas CEs
11. Encontros semestrais
12. Grupo de trabalho DOT/SME e DOT P/CEs para construo de pautas de formao dos professores das SAPs
13. Formao continuada DOT P/CEs e professores das SAPs
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 1
Algumas reflexes na rea de Matemtica
O processo de construo do caderno e a insero da Matemtica na proposta global do projeto
Este caderno foi construdo com base em um processo coletivo de discusso de
um grupo referncia formado por professores da rede municipal de ensino e teve como
ponto de partida a leitura do Referencial de expectativas para o desenvolvimento da competncia leitora e escritora no ciclo II do ensino fundamental. Nos encontros, foram discutidos temas como a concepo de leitura e escrita da rea de Matemtica, o que
cabe ao professor de Matemtica trabalhar em relao leitura e escrita em suas aulas,
em particular, o que importante fazer antes, durante e depois da leitura e escrita de
textos e, tambm, as habilidades de leitura em funo das especificidades da rea.
A finalidade do projeto oferecer reflexo e discusso da equipe pedaggica da
escola uma indicao daquilo que cada estudante precisa ter capacidade de realizar,
progressivamente, nos diferentes anos do ciclo II do ensino fundamental, em relao ao
domnio das habilidades de leitura e de escrita para gneros de texto da esfera escolar
e tambm de divulgao cientfica, jornalstica e literria.
Uma das primeiras discusses foi relativa ao envolvimento dos professores de Ma-
temtica no projeto, representadas por posicionamentos como, por exemplo:
O Referencial estimula o professor de Matemtica a refletir sobre sua prtica em
sala de aula e a ter um novo olhar sobre sua disciplina assim como em sua funo
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental16
de educador. A sensao descrita como preocupao com o tempo enquanto de-
senvolve habilidades de leitura..., sentida pelo professor de Matemtica, pode ser
enquadrada mais como um temor de estar perdendo o foco da aula, a direo.
Acho que ns, professores de Matemtica, precisamos buscar caminhos e perce-
ber que, justamente ao criar espaos para que essa habilidade seja desenvolvida,
estaremos utilizando mais um recurso didtico para o entendimento de nossa
disciplina, ou seja, tornando-a mais acessvel ao entendimento (professora Edna
Grottoli Fumeiro).
No Referencial, em relao definio do que um texto, cabe perguntar: por
que ao pronunciarmos a palavra texto na escola a maioria dos alunos a relacio-
nam com vrias disciplinas, menos com a Matemtica? Qual o motivo que conduz
os alunos a construrem um conceito sobre a Matemtica distante da leitura e da
interpretao de um texto? So perguntas que indicam que o ensino de Matem-
tica e a prtica escolar podem construir conceitos totalmente distorcidos e con-
trrios ao que a prpria histria da Matemtica demonstra (professor Antonio
Rodrigues Neto).
Atualmente j compreendemos que ler e escrever tarefa de todas as reas. A
grande dificuldade est em nossa formao, pois muitos professores tm dificuldade
para trabalhar com essa nova concepo. Na Matemtica, isso ainda mais difcil, pois
nessa rea a objetividade quase sempre foi uma caracterstica, e o uso de muitos
smbolos e cdigos s vezes dificulta a comunicao. Talvez seja um desafio maior
para o professor trabalhar com leitura e escrita. Mas, com certeza, cabe ao professor
de Matemtica trabalhar textos de sua rea, como por exemplo: textos cientficos,
resoluo de problemas, problemas de lgica, tabelas, grficos e textos jornalsticos
(professora Mariucha Baptista de Paula).
Analisando a trajetria acadmica dos professores de Matemtica no Brasil, veri-
ficamos que os currculos das graduaes so centrados no clculo, e com isso nos
formamos sem ter muito dilogo com outras reas do conhecimento. Essas limita-
es ficam evidentes quando modelos e imagens cristalizadas entre educadores nos
rotulam como: estranhos, diferentes, sintticos demais, que no gostamos de ler,
que somos severos, alienados, que s nos interessamos pelo produto final, que no
sabemos escrever... (professora Mrcia Dias de Oliveira).
No grupo, destacou-se que um dos problemas mais importantes a serem enfrenta-
dos pela escola, no momento atual, relaciona-se ao fato de que a no garantia de uso
eficaz da linguagem, condio para que os alunos possam construir conhecimentos,
impede o desenvolvimento de um trabalho formativo nas diferentes reas do conheci-
mento, particularmente em Matemtica.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 17
Sabemos que as tarefas de leitura e escrita foram tradicionalmente atreladas ao
trabalho do professor de Lngua Portuguesa, e que os demais professores no se sen-
tiam diretamente implicados com elas, mesmo quando atribuam o mau desempenho
de seus alunos a problemas de leitura e escrita.
Hoje, j h um consenso razovel de que o desenvolvimento da competncia lei-
tora e escritora depende de aes coordenadas nas vrias atividades curriculares que a
escola organiza para a formao dos alunos do ensino fundamental. Tais constataes
motivam o desenvolvimento de aes propositivas no mbito da Secretaria de Educa-
o do Municpio de So Paulo e a elaborao deste Referencial de expectativas para o desenvolvimento da competncia leitora e escritora no ciclo II do ensino fundamental.
Passamos ento a refletir sobre a seguinte pergunta: de que forma o professor de
Matemtica pode contribuir, em suas aulas, para a apropriao da leitura e escrita, ati-
vidades to essenciais para o pleno desenvolvimento do aluno e, especificamente, para
a apreenso significativa de conceitos e procedimentos matemticos?
Competncia leitora e escritora e aprendizagem em Matemtica
O ponto de partida dessas reflexes foi a relao entre competncia leitora e es-
critora e aprendizagem em Matemtica. O grupo destacou que, em conversas de pro-
fessores e especialistas, a relao entre desenvolvimento da competncia leitora e escri-
tora e aprendizagem em Matemtica com freqncia estabelecida. Considera-se, por
exemplo, que as dificuldades envolvidas na resoluo de problemas ocorrem em grande
parte pelo fato de os alunos no conseguirem ler nem interpretar textos, j que o desem-
penho nas atividades que no dependem diretamente de compreenso de enunciados
um pouco melhor. Outro fato, comumente relatado, refere-se grande dependncia
que os alunos do ensino fundamental e tambm do ensino mdio tm do professor na
decifrao de enunciados nas aulas de Matemtica, com perguntas do tipo: O que
para fazer?; Estou fazendo certo?.
Os professores integrantes do grupo referncia fizeram reflexes importantes sobre
o tema, como, por exemplo:
No universo matemtico, a concepo de leitura algo simples, porm, no bvio.
Na maior parte dos textos matemticos, a leitura solicitada sempre concisa, asso-
ciada a instrues, a comandos, a situaes-problema e a smbolos especficos. Essa
leitura, em geral muito tcnica, pode ser mediada pelo professor, inicialmente ensi-
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental18
nando e/ou reforando os smbolos matemticos, as ligaes lgicas, diferenciando o
significado das palavras dos textos por exemplo: a palavra diferena significa mate-
maticamente uma subtrao, enquanto na linguagem comum significa uma compa-
rao. O professor deve dar o empurro inicial, mas o objetivo obter a autonomia
do leitor, mostrar caminhos, apontar direes para que ele possa trilh-los sozinho
(professora Eliete de Moraes Andrade).
Alguns depoimentos confirmaram o que j foi apontado por estudos sobre o assun-
to, no sentido de que alunos e professores percebem a importncia de situaes didti-
cas que estimulem o desenvolvimento de habilidades de leitura, escrita e interpretao
nas aulas de Matemtica. No entanto, h sempre a preocupao com o tempo e com
o que se considera ser o trabalho especfico do professor de Matemtica, que no in-
cluiria tarefas de leitura e escrita. Evidentemente, no se trata de estar abandonando
a Matemtica, mas sim de potencializar a aprendizagem dos alunos.
Antes de aprofundar a discusso da leitura e da escrita nas aulas de Matemtica,
o grupo discutiu aspectos educacionais mais amplos.
Sabemos que potencializar o desenvolvimento das crianas e jovens tarefa que
cabe escola, ao professor, e que a sala de aula deve ser um espao em que os alunos
possam ter liberdade para aprender, pensar, criar, respeitar as diferenas e desenvolver
ao mximo suas capacidades. Alm disso, ao longo das ltimas dcadas, o papel da
educao na chamada sociedade do conhecimento tem sido tema muito debatido, pois
o conhecimento passou a ser considerado fator decisivo para a vida em sociedade, cada
vez mais impregnada de informaes vindas de diferentes fontes.
A sobrevivncia na sociedade depende cada vez mais de conhecimento, pois diante
da complexidade da organizao social, a falta de recursos para obter e interpretar
informaes impede a participao efetiva e a tomada de decises em relao aos
problemas sociais. Impede, ainda, o acesso ao conhecimento mais elaborado e difi-
culta o acesso s posies de trabalho (Parmetros Curriculares Nacionais, Ensino
Fundamental, 1997).
Aprender a aprender e ter autonomia para buscar informaes so bandeiras
educacionais contemporneas. No entanto, como torn-las reais se no assegurarmos
na escola competncias bsicas como a leitura e a escrita, considerando o contexto atual
em que essas atividades tm cada vez menos espao no cotidiano das pessoas?
No grupo, foram tambm lembradas algumas contribuies de educadores mate-
mticos que tm destacado, por exemplo, que
aprender Matemtica um direito bsico de todas as pessoas em particular, de
todas as crianas e jovens e uma resposta s necessidades individuais e sociais.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 19
A Matemtica faz parte dos currculos, ao longo de todos os anos de escolaridade
obrigatria, por razes de natureza cultural, prtica e cvica que tm a ver ao mesmo
tempo com o desenvolvimento dos alunos enquanto indivduos e membros da socie-
dade e com o progresso desta no seu conjunto. A Matemtica constitui um patrim-
nio cultural da humanidade e um modo de pensar. A sua apropriao um direito
de todos. (ABRANTES, 1999, p. 34)
Hoje, amplamente discutida, e h consenso entre educadores, pais, autoridades
e at mesmo empresrios, a necessidade de implementar polticas pblicas que
objetivem a melhoria da qualidade da escola pblica, colocando-se em favor de
que todos os alunos tenham uma formao com especial ateno ao desenvolvi-
mento da competncia leitora e escritora. H, porm, um desafio para a escola e
para todos os professores: assumir que ensinar a ler e escrever tarefa de todas as
reas do conhecimento, um compromisso da escola. Essa tarefa contribuir para
que nossos alunos se tornem autnomos, para participar das prticas sociais num
mundo cada vez mais exigente quanto qualidade e diversidade de leituras (pro-
fessor Edson do Carmo).
Foi ainda destacado o fato de as crianas das escolas da rede pblica muitas vezes
no terem livros em casa, nem acesso a revistas e jornais. Assim, a ateno com o ensi-
no da leitura e da escrita ganha especial prioridade, pois dele depende em grande parte
a soluo de problemas de aproveitamento escolar e o fracasso dos alunos da escola
pblica. As competncias na leitura e escrita so determinantes no bom desempenho
ou no fracasso do aluno da escola bsica e tambm condicionantes da possibilidade de
eles darem continuidade ou no a seus estudos.
As dificuldades por que passam nossos alunos no que se refere compreenso de
leitura so, talvez, as mesmas de sempre. A diferena que esses alunos com difi-
culdades antes eram marginalizados e expulsos do sistema educacional, pela desis-
tncia. Agora, esse mesmo sistema, pressionado pela demanda por ensino formal,
os recebe e acolhe, at a concluso do curso. Enfim, o que sempre existiu, e que a
educao brasileira negou, passou agora a ficar sob nossos olhos (professora Edna
Grottoli Fumeiro).
Diferentes autores chamam a ateno para o fato de que a superao de muitas
dificuldades no ensino de Matemtica passa pelo reconhecimento da essencialidade
da impregnao mtua entre a lngua materna e a Matemtica. Documentos como os
PCNEF (Parmetros Curriculares Nacionais, Ensino Fundamental) explicitam o papel da Matemtica no ensino fundamental pela proposio de objetivos que evidenciam a im-
portncia de o aluno valoriz-la como instrumental para compreender o mundo a sua
volta e v-la como rea do conhecimento que estimula o interesse, a curiosidade, o es-
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental20
prito de investigao e o desenvolvimento da capacidade de resolver problemas. Entre
os grandes objetivos do ensino de Matemtica, um se refere exatamente comunicao
matemtica, propondo que o aluno possa:
comunicar-se matematicamente, ou seja, descrever, representar e apresentar resul-
tados com preciso e argumentar sobre suas conjecturas, fazendo uso da linguagem
oral e estabelecendo relaes entre ela e diferentes representaes matemticas.
A linguagem matemtica, como outras, por meio de seus cdigos, constitui um
modo de aprender o significado das coisas, ou seja, de ler e compreender o mundo. A
Matemtica no se traduz em apenas saber operar com smbolos, mas tambm est
intimamente relacionada com a capacidade de interpretar, analisar, sintetizar, significar,
conceber, transcender, extrapolar, projetar.
A impregnao entre as linguagens materna e matemtica est presente em diversas
situaes da vida cotidiana, de tal forma natural que muitas vezes nem nos apercebemos
dela. Na escola, essa imbricao natural muitas vezes desaparece, na medida em que a
Matemtica se reduz a uma linguagem formalizada. A conseqncia a criao de uma
barreira de difcil transposio na passagem do pensamento para a escrita.
Considerando que aceitamos que o desenvolvimento da competncia leitora e es-
critora elemento fundamental e que deve ser tambm tarefa do professor de Mate-
mtica, importante discutir sobre as formas de interveno e de organizao desse
trabalho. Vamos fazer essa discusso, destacando trs aspectos de comunicao: o di-
logo, a leitura e a escrita nas aulas de Matemtica.
A comunicao nas aulas de Matemtica
Qualquer que seja a rea de conhecimento, uma das ferramentas de trabalho
mais importantes do professor na sala de aula o dilogo com os alunos. Teorias re-
ferentes a esse tema evidenciam que, em uma situao ideal de fala mobilizada pelo
dilogo, h participao de todos os envolvidos (locutor e interlocutor), com a garantia
de pronunciamentos com compreensibilidade, argumentao, questionamento, inter-
pretaes e justificativas. A comunicao s possvel se todos tiverem a mesma chan-
ce de se colocar, de expressar idias objetivamente, explicitar valores, sentimentos e
atitudes de forma verdadeira. O entendimento, a aceitao do outro e a tolerncia so
fatores que permeiam e sustentam essas situaes de fala.
O grupo referncia analisou as relaes entre oralidade e leitura, o entendimen-
to por parte do aluno da explicao oral do professor em uma leitura compartilhada e
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 21
a no apropriao do texto quando esse aluno faz uma leitura autnoma, trazendo a
contribuio de alguns autores a esse respeito, como Marcushi:
A escrita extremamente valorizada em detrimento da oralidade; o seu domnio se
tornou um passaporte para a civilizao e para o conhecimento. O letramento um
conjunto de prticas, um processo de aprendizagem social, pois at os analfabetos
so atingidos por uma srie de smbolos e esto sob a influncia de estratgias da
escrita como: o valor do dinheiro, o nmero de um nibus, fazer clculos comple-
xos (2001, p. 232).
No entanto, alguns estudos de caso realizados em salas de aula de Matemtica so-
bre o processo de comunicao verbal que ocorre nesse ambiente, buscando identificar
como o professor conduz seu discurso, como se caracteriza o dilogo entre professor e
alunos e como a lngua materna interfere no desenvolvimento das idias matemticas,
mostram que h muitos aspectos com os quais devemos nos preocupar.
Alguns desses estudos focalizam as perguntas que professores formulam em suas
aulas, uma vez que elas constituem elemento de extrema importncia nas prticas discur-
sivas do professor, pela freqncia com que so utilizadas e por suas potencialidades.
Os professores consideram que as perguntas ajudam a envolver os alunos na din-
mica das aulas e permitem verificar se est havendo aprendizagem.
Ao mesmo tempo, esses estudos mostram, porm, que as regras de convvio que
validam a situao de fala no so observadas, pois os alunos no so ouvidos, h
interrupo freqente e so raros a socializao e o confronto de idias.
Outro aspecto muito interessante refere-se ao fato de que, embora os professores
explicitem suas concepes de ensino-aprendizagem, destacando o papel ativo que o
aluno deve ter na construo de seus conhecimentos, tendo o professor como mediador
do processo, as prticas revelaram-se centradas no ensino, na figura do professor con-
duzindo o processo, com alunos respondendo apenas s perguntas que exigem ateno
e memria. Perguntas que suscitam posicionamento de idias, defesa de argumentos e
investigao parecem raras nas aulas de Matemtica.
Outro fato evidenciado nas pesquisas mostra a chamada assimetria de posies
de poder, que, embora inerente ao trabalho docente, freqentemente explicitada
pelas aes de professores que tolhem as colocaes dos alunos, em um contnuo
processo de no lhes dar voz.
Idealmente, professor e aluno devem ser entendidos como sujeitos que se debruam
sobre um objeto a conhecer e que compartilham, no discurso de sala de aula, contribui-
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es exploratrias na construo do conhecimento. No entanto, pode-se observar na
prtica que questionar se os alunos tm dvida ou no uma forma tmida de promo-
ver o dilogo, no garantindo, efetivamente, a participao deles na construo desse
processo, pois a maioria das perguntas destinada cobrana de ateno e no ao
compartilhamento de idias.
O acesso leitura pelos alunos da escola pblica implica que leitura e produo
de texto se tornem ferramentas de pensamento de uma experincia social renovada.
Ela supe a busca de novos pontos de vista sobre uma realidade mais ampla, que a es-
crita ajuda a conceber e a mudar, a inveno simultnea e recproca de novas relaes,
novos escritos e novos leitores.
Habilidades de leitura nas aulas de Matemtica
O que seriam atividades de leitura eficazes em uma aula de Matemtica para po-
tencializar as habilidades de leitura dos estudantes? Para responder a essa e a outras
questes referentes leitura nas aulas de Matemtica, importante que antes possa-
mos refletir sobre alguns pontos cruciais do tema leitura.
Em primeiro lugar, fazer uma leitura no um ato mecnico de decifrao em que
apenas so decodificados sinais grficos. A atividade de leitura uma prtica social:
quando lemos um texto, colocamos em prtica nosso sistema de valores, crenas e ati-
tudes que refletem o grupo social em que fomos criados. Como entender um quadrinho
do Garfield sem um conhecimento prvio das caractersticas desse personagem?
Das experincias da leitura, geralmente samos transformados, ou porque assumi-
mos nossos pontos de vista ou porque os modificamos em funo do dilogo com
o(s) autor(es) do texto lido. Leitores no interagem diretamente com o texto, mas com
outro(s) sujeito(s). Como j foi destacado por alguns autores, ser leitor saber o que se
passa na cabea do outro para compreendermos melhor o que se passa na nossa.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 23
Ler, portanto, implica compreender o que expresso pela linguagem e, dessa for-
ma, entrar em comunicao com o autor. A leitura da palavra, do smbolo, ou a leitura
do mundo, realiza-se plenamente quando o significado das coisas representadas emer-
ge pelo ato da interpretao.
A leitura, hoje, vista no mais como um processo de pronunciar o texto, mas
como uma atividade complexa que envolve raciocnio, ou seja, ler compreender. A
leitura um processo interativo e construtivo, no qual entram em jogo as relaes en-
tre as diferentes partes do texto e os conhecimentos prvios do leitor. O processo de
compreenso envolve a coordenao de mltiplos fatores: as particularidades do texto,
os objetivos visados com a leitura, as circunstncias em que esta ocorre e as caracters-
ticas pessoais do leitor.
A prtica da leitura na Matemtica requer que faamos reflexes. Para que no haja
uma mera transmisso de informaes, deve-se buscar sempre uma interao entre
textos e leitores. Fica claro que, quanto mais conhecimentos prvios o aluno tiver,
mesmo em relao linguagem matemtica, a interpretao ser mais abrangente.
No processo da leitura, os valores, as crenas e atitudes emergem, o leitor interage
com o texto ativamente, muitas vezes concebendo novas idias e posicionamentos
em relao ao assunto lido. Um dos problemas mais comuns reside na descontextua-
lizao dos textos nos livros didticos: normalmente no so motivadores, carecem
de maiores informaes histricas, como, por exemplo, a real necessidade da desco-
berta de determinada frmula matemtica. Apenas alunos leitores mais perspicazes
e interessados conseguem extrapol-los (professora Maria de Ftima J. V. Wick).
Um professor de Matemtica, com o recurso de um texto de livro didtico geral-
mente objetivo, conciso, impessoal, descontextualizado , tem muitas vezes dificul-
dades na comunicao oral, tanto na clareza das definies como na busca de expli-
caes que no sejam redundantes (professora Edna Grottoli Fumeiro).
Ter competncia em leitura significa possuir um repertrio de procedimentos es-
tratgicos, saber gerenciar de forma adequada sua utilizao e aplic-los, de modo fle-
xvel, em cada situao.
Na escola, entre os diferentes objetos de ensino de que se ocupa o currculo escolar,
a leitura tem lugar privilegiado, porque dela dependem muitas outras aprendizagens.
Alm disso, considera-se que aprender a ler aprender a utilizar a leitura para aprender
e tambm como fonte de prazer.
As concepes tradicionais consideravam a compreenso da leitura um conjunto
de habilidades a ensinar (decodificar, identificar a idia principal etc.).
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Os modelos de compreenso de leitura atuais diferem dos modelos tradicionais
principalmente em relao integrao de habilidades e participao do leitor, que
deixa de ser passiva para uma interao texto-leitor. Num processo de compreenso
da leitura, no est em jogo apenas uma ou outra habilidade, mas sim um conjunto de
habilidades que interagem e se modificam. Nas novas concepes, em sntese, pode-
se dizer que:
a leitura de um texto nunca deve estar desvinculada de seu contexto;
o leitor deixa de assumir uma posio de passividade perante o texto e comea a in-
teragir com ele, criando o sentido do texto, com base em sua inteno de leitura;
h vrias maneiras de interpretar um texto, pois a interpretao depende dos
conhecimentos do leitor, da sua inteno e dos outros elementos do contexto.
Situaes de leitura onde h gneros de textos diversificados, como tabelas em jornais,
textos em revistas cientficas, at mesmo folhetos de ofertas de supermercados, como
tantos outros, devidamente contextualizados, constituem meios favorveis para o ensino-
aprendizagem. consenso entre os professores a dificuldade dos alunos na resoluo
de problemas: h pouca ou nenhuma interpretao da linguagem matemtica e muito
menos se compreende o que o problema pede. Portanto, ao professor cabe enrique-
cer suas aulas com textos contextualizados, na forma motivadora, no desenvolvimento
do contedo ou mesmo nos exerccios em forma de problemas. Situaes-problema
trabalhadas na ressignificao dos contedos costumam estimular o interesse dos alu-
nos, bem como facilitar o aprendizado por meio da construo do conhecimento, pois
abrem espao para a oralidade (questionamentos, coleta de informaes, argumenta-
es). Quando os textos so trabalhados de modo compartilhado, com a orientao
do professor, existe uma sensibilizao do aluno para algumas das infinitas facetas que
o texto carrega em si. J, em um segundo momento, o aluno pode realizar a leitura
sozinho, tendo mais condies de compreenso e reflexo sobre o assunto estuda-
do, sabendo que cada texto apresenta um grau de porosidade diferenciado. Quanto
parte prtica, na resoluo de exerccios e problemas, ns professores devemos ser
mais cuidadosos na escolha: menos mecnicos, buscando situaes didticas ricas em
interpretao e extrapolao (professora Maria de Ftima J. V. Wick).
A compreenso na leitura varia segundo o grau de relao entre trs variveis: lei-
tor, texto e contexto; quanto mais elas estiverem imbricadas umas nas outras, melhor
ser a compreenso.
A interao entre leitor, texto e contexto que efetivar a compreenso de um
texto. Tambm importante considerar todo o conhecimento anterior do sujeito, que
lhe fornecer subsdios para a compreenso do que l.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 2
Para que os alunos se tornem leitores competentes, preciso que o programa esco-
lar seja rico em conceitos de todo tipo: em Histria, Geografia, Cincias, Artes, Literatu-
ra... Qualquer conhecimento adquirido por uma criana poder eventualmente ajud-la a
compreender um texto. Um programa vazio de conceitos, que s se apia em exerccios
artificiais, pode produzir leitores vazios que no compreendero o que lem.
Assim, quanto mais conhecimento os alunos tiverem adquirido, maiores sero suas
possibilidades de sucesso na leitura. Jovens que tiveram experincias variadas, como
a participao em projetos de trabalho, atividades culturais, entre outras, esto mais
bem preparados para ler textos. Mas s essas experincias no bastam; indispensvel
que as crianas possam falar de suas experincias de modo a aumentar a bagagem de
conceitos e o vocabulrio. Mais tarde, esses conhecimentos podero ser utilizados para
compreender textos.
O professor de Matemtica pode promover vrias situaes em que o aluno simul-
taneamente constri conceitos matemticos e melhora sua competncia leitora e
escritora: criando histrias com base em figuras geomtricas, escrevendo em forma
de dilogos para apresentao em forma de teatro de sombras; criando jogos mate-
mticos abertos, elaborando as questes-desafio, o manual de instrues, as regras
do jogo, a caixa do jogo, apresentando captulos selecionados do livro O homem que
calculava e outros, em forma de teatro, vdeo, desafios para a classe, sempre com
fechamentos em forma de relatrios; criando jornais, revistinhas de desafios de lgi-
ca e do contedo trabalhado no momento; montando pasta de classe com questes
de desafio de recortes de jornais e revistas; refletindo sobre notcias veiculadas na
mdia e estudos sobre sua veracidade quanto s que podem envolver manipulao
de dados; propondo a leitura de paradidticos da rea e outros da literatura infantil
envolvendo diretamente ou no Matemtica, tendo o cuidado, porm, de permitir
que o aluno possa manipular o livro vontade, ver suas imagens, suas cores, ler pelo
simples prazer de ler, se envolver no aspecto ldico que o livro carrega para depois
iniciar um trabalho dirigido. Enfim, o professor de Matemtica tem uma srie de re-
cursos facilitadores da aprendizagem que, se forem bem conduzidos, levaro o aluno
a ter afinidades com a disciplina e maior competncia de leitura e escrita (professora
Edna Grottoli Fumeiro).
Se em geral os textos nunca dizem tudo, pois so estruturas porosas que dependem
do trabalho interpretativo do leitor, textos matemticos com sua linguagem simblica
mais ainda necessitam de uma traduo correta para seu entendimento, ou seja, o
leitor nem sempre ficar livre para atribuir qualquer sentido ao que l. O professor
de Matemtica deve atuar como mediador que estabelece essa troca na relao de
seus alunos com o texto, resgatando os conhecimentos anteriormente estudados que
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental26
tenham conexo com o conceito a ser compreendido, levando-os a interpretar ade-
quadamente o texto (professora Licia Taurizano do Prado Juliano).
Da mesma forma que a leitura deve ter expressiva presena nas aulas de Mate-
mtica, a escrita de textos tambm. Elaborao de relatrios, de justificativas, de ar-
gumentos, de formulao de problemas, de respostas uma das situaes em que a
escrita pode ser mobilizada. A escrita deve ser o coroamento do esforo pedaggico
no apenas no ensino da lngua materna, mas em todas as reas do conhecimento e,
em particular, da Matemtica.
Gneros discursivos nas aulas de Matemtica
Com relao aos gneros discursivos possveis de serem explorados nas aulas de
Matemtica, vrios exemplos podem ser pensados. Entre essa variedade de gneros
discursivos, os enunciados de problemas tm especial relevncia, uma vez que pro-
blemas funcionam como motor das atividades de investigao cientfica, tanto para
pesquisadores como para jovens aprendizes de cincias. Alm disso, a ateno para
os enunciados de problemas tambm se deve constatao freqente, destacada por
professores, de que as dificuldades envolvidas na resoluo deles ocorrem, em grande
parte, pelo fato de muitos alunos no conseguirem ler e identificar informaes nos
textos, menos ainda compreend-los e interpret-los. No entanto, alm dos enunciados
de problemas, aparecem nos livros didticos textos de exposio ou explicao, regras
de jogos, relatos histricos.
Mas recomendvel que outros textos sejam explorados na sala de aula, como os
disponveis em jornais, revistas e na Internet, como, por exemplo: artigos de divulgao
cientfica, notcias de jornais, reportagens, resenhas, narrativas de enigmas ou adivinhas,
textos de opinio, relatos de experincias, relatos de investigaes, instrues de uso,
instrues de montagem, resumos etc.
Quando analisamos episdios da histria da Matemtica, verificamos que muitas
vezes os problemas eram formulados como narrativas de enigmas. Um exemplo disso
o livro Lilavati, na verdade, a quarta parte do livro Siddhanta Siromani, escrito por Bhaskara II (1114-1185), possivelmente o mais famoso matemtico indiano, em uma
homenagem sua filha Lilavati. Enquanto Lilavati (A Bela) trata de Aritmtica, as ou-tras trs partes so Bijaganita (Contagem de sementes), lgebra, Grahaganita, sobre Matemtica planetria, e Goladhyaya, sobre o globo celeste. O Lilavati escrito em
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 27
278 versos e trata de vrios assuntos, entre os quais: tabelas, o sistema de numerao,
as oito operaes, fraes, zero, regra de trs, regra de trs composta, combinaes,
porcentagens, progresses, geometria, medies, volumes, problemas geomtricos de
sombras, modificao da Kuttaka (a equao ax + c = by) e permutaes. Vejamos um problema de Aritmtica do Lilavati, do sculo XI:
A quinta parte de um enxame de abelhas pousou na flor da Kadamba, a tera parte
numa flor de Silinda, o triplo da diferena entre estes dois nmeros voa sobre uma
flor de Krutaja, e uma abelha adeja sozinha, no ar, atrada pelo perfume de um jas-
mim e de um pandnus. Diz-me, bela menina, qual o nmero de abelhas (apud
MALBA TAHAN, 1983, p. 159).
Esse estilo foi amplamente explorado por Jlio Csar de Melo e Souza, que ficou
conhecido por, em sala de aula, lembrar um ator empenhado em cativar a platia. Criou
uma didtica prpria e divertida para ensinar Matemtica, inventando Malba Tahan, no-
me fantasia ou pseudnimo, sob o qual assinava suas obras. Na seqncia, reproduzimos
o clssico problema da herana de camelos, um estilo de texto que pode despertar a
curiosidade de jovens estudantes de Matemtica:
Um fictcio matemtico rabe chamado Beremiz Samir, do sculo X, poca em que
os matemticos rabes eram os melhores do mundo, viajava com um amigo pelo
deserto, ambos montados em um nico camelo, quando encontram trs irmos dis-
cutindo acaloradamente. Haviam recebido uma herana de 35 camelos do pai, que
deixava a metade para o mais velho, a tera parte para o irmo do meio e a nona
parte para o irmo mais moo. O motivo da discusso era a dificuldade em dividir a
herana: o mais velho receberia a metade. Acontece que a metade de 35 camelos
corresponde a 17 camelos inteiros mais meio camelo! O irmo do meio receberia
a tera parte, ou seja, 35 dividido por 3, o que resulta em 11 camelos inteiros mais
2/3 de camelo! O caula receberia a nona parte de 35 camelos, ou seja, 3 camelos
inteiros e 8/9 de camelo!
Naturalmente, cortar camelos em partes para repartir a herana seria destru-la. Ao
mesmo tempo, nenhum irmo queria ceder a frao de camelos ao outro. Mas o s-
bio Beremiz resolveu o problema e apresentou a seguinte soluo:
Encarrego-me de fazer com justia essa diviso, se permitirem que eu junte aos 35
camelos da herana este belo animal que, em boa hora, aqui vos trouxe. Os camelos
agora so 36 e a diviso fcil:
o mais velho recebe: 1/2 de 36 = 18;
o irmo do meio recebe: 1/3 de 36 = 12;
o caula recebe: 1/9 de 36 = 4.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental28
Os irmos nada reclamaram. Cada um deles ganhou mais do que receberia antes.
Todos saram lucrando.
Beremiz explicou sua resoluo: O primeiro dos irmos recebeu 18, o segundo, 12 e o
terceiro, 4. O total da herana recebida por eles 18 + 12 + 4, ou seja, 34 camelos.
Sobraram 2 camelos, um deles pertence a meu amigo, o que foi emprestado a vocs
para permitir a partilha da herana, mas agora pode ser devolvido. O outro camelo
que sobra fica para mim, por ter resolvido este complicado problema de herana sa-
tisfatoriamente. (Disponvel em: .
Acesso em: 17 out. 2006.)
J as notcias so bastante caractersticas, por sua forma em geral sinttica e ob-
jetiva, como mostram os exemplos a seguir.
Animais silvestres
A apreenso de animais, em 2005, bate recorde em So Paulo. As apreenses che-
garam a 25.111 animais. Os dados parecem confirmar So Paulo como rota e destino
final de animais retirados da natureza de outras partes do Brasil. Mesmo porque, se-
gundo o Ibama, apenas 18% do total apreendido era de terras paulistas (CREDEN-
DIO, 2006, p. C3).
CPMF ambiental
A compensao ambiental sempre gera polmica. Agora as indstrias travam uma
queda de brao com os rgos ambientais devido taxa de compensao ambien-
tal, criada em 2000 e que serve para criar e manter as Unidades de Conservao. Os
empresrios alegam que a taxa vai encarecer os investimentos. O porcentual mnimo
fixado pela lei de 0,5%. As indstrias e o setor ambiental discutem agora o teto,
que pode ser de at 3%, segundo o Ibama, ou at 5%, conforme prev um projeto
de lei em discusso na Cmara dos Deputados (Jornal do Commercio, 15 ago. 2006,
Caderno de Economia, p. 3).
Tambm so interessantes de serem trabalhados os artigos e os textos de opinio
publicados em jornais e revistas.
Enunciados de problemas e de exerccios
Sabemos que, de modo geral, no possvel determinar se uma tarefa escolar um
exerccio ou um problema, j que depende no s da experincia e dos conhecimentos
prvios de quem a executa, mas tambm dos objetivos estabelecidos enquanto ela se
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 29
realiza. Dependendo do sujeito e da situao, um enunciado pode funcionar como pro-
blema ou como exerccio. Muitas vezes, o processo de resoluo de um problema pode
implicar a explorao do contexto para alm do que surge no enunciado.
De modo geral, os enunciados de tarefas apresentadas como exerccios so menos
contextualizados do que os de tarefas apresentadas como problemas. Isso acontece
porque, sendo os problemas situaes para as quais os alunos no dispem inicialmen-
te de um caminho direto que leve soluo, fundamental que elas tragam elementos
que permitam a eles inserir-se no contexto da situao em questo.
No entanto, importante refletir sobre o fato de que alguns enunciados, presu-
mivelmente elaborados com a preocupao de serem contextualizados, na realidade
apresentam falsas contextualizaes, pois as informaes veiculadas no texto no so
diretamente relacionadas com o que se est propondo resolver/responder.
Uma caracterstica que pode diferenciar os enunciados o fato de serem abertos ou
fechados. Os problemas abertos so aqueles em que a situao de partida ou a situao
caracterizada como objetivo da soluo so ambas abertas ou pelo menos uma delas.
Alguns autores, como Joo Pedro da Ponte, caracterizam as situaes mais abertas
como de investigao. Ele explica sua concepo: Uma investigao uma viagem at
o desconhecido. A idia pode ser ilustrada pela metfora geogrfica: O importante
explorar um aspecto (da Matemtica ou de outras Cincias) em todas as direes. O
objetivo a viagem e no o destino (apud PONTE, 1998, p. 4).
Assim, na resoluo de problemas, o objetivo encontrar o caminho para atingir
um ponto no imediatamente acessvel. um processo convergente. Em uma inves-
tigao, o objetivo explorar todos os caminhos que surgem como interessantes em
dada situao. um processo divergente. Sabe-se qual o ponto de partida, mas no
se sabe qual ser o ponto de chegada. Joo Pedro da Ponte exemplifica uma situao
de investigao com uma atividade proposta a alunos do 1o ano do ciclo II, em uma
atividade denominada Potncias e regularidades, realizada em pequenos grupos, que
transcrevemos a seguir.
1. O nmero 729 pode ser escrito como uma potncia de base 3. Para verificar tal
fato, basta escrever uma tabela com as sucessivas potncias de 3:
32 = 9
33 = 27
34 = 81
35 = 243
36 = 729
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental30
a) Procure escrever como uma potncia de base 2:
64 =
128 =
200 =
256 =
1.000 =
b) Que conjecturas voc pode fazer a respeito de nmeros que podem ser escritos
como potncias de base 2? E como potncias de base 3?
2. Agora observe as seguintes potncias de base 5:
51 = 5
52 = 25
53 = 125
54 = 625
a) O ltimo algarismo de cada uma dessas potncias sempre 5. Ser que isso
tambm se verifica para as potncias de 5 seguintes?
b) Investigue o que acontece com as potncias de 6.
c) Investigue tambm as potncias de 9 e as de 7. (PONTE, 1998, p. 6.)
Enunciados que envolvem conhecimentos tcnicos, mobilizveis e disponveis
Um trabalho desenvolvido pela autora francesa Aline Robert (1997) permite anali-
sar enunciados de acordo com o nvel de conhecimento que o aluno precisa colocar em
ao. Essa autora distingue trs nveis: tcnico, mobilizvel e disponvel.
Algumas formulaes solicitam que os alunos coloquem em funcionamento um
conhecimento de nvel tcnico, pois enunciam questes simples, no sentido de que
correspondem a uma aplicao imediata de uma propriedade, de uma definio ou de
uma frmula.
Vejamos alguns exemplos:
a) Resolva a equao: 2x 1 = 5.
b) Calcule o resultado de 234 28.
c) Calcule a rea de um quadrado de 5 cm de lado.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 31
Em outras formulaes, os conhecimentos utilizados, embora possam ser identi-
ficados, necessitam de alguma adaptao ou de alguma reflexo antes de serem colo-
cados em funcionamento.
Vejamos um exemplo:
Dona Maria foi ao supermercado e comprou 3 kg de arroz, 2 kg de feijo, 4 kg de
batata e kg de caf. Os preos de alguns produtos vendidos no supermercado esto
escritos na tabuleta:
Produto Preo por kgArroz 0,75Caf 5,00Feijo 1,20Cebola 1,00Tomate 1,20Batata 0,80
Quanto dona Maria gastou em sua compra?
H ainda as formulaes em que os alunos no encontram no texto alguma indi-
cao ou sugesto do(s) conhecimento(s) que convm utilizar. Essas so as que apre-
sentam maior dificuldade para eles.
Vejamos um exemplo:
Um alvo para um jogo de flechas tem quatro regies. Se uma flecha cair na re-
gio delimitada pelo crculo menor, ganham-se 11 pontos, e nas regies seguin-
tes, respectivamente 7, 3 e 2 pontos.
Veja o desenho:
Certo dia, trs amigos, Andr, Carlos e Pau-
la, estavam jogando e, depois de cada um
deles ter lanado 6 dardos, todos tinham a
mesma pontuao.
Voc vai descobrir qual foi essa pontuao
com base nas seguintes informaes:
Andr foi o que mais acertou na zona central.
Paula foi a mais regular, pois fez sempre o mesmo nmero de pontos.
Os dardos de Carlos ficaram espalhados uniformemente pelas regies em que
ele acertou.
23711
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental32
Os enunciados podem ser ainda analisados de acordo com o nmero de dados
que oferecem. Tradicionalmente, a maioria dos enunciados fornece, exatamente, todos
os dados que sero utilizados. Alguns estudos mostram a importncia de trabalhar em
sala de aula tambm com enunciados que ou no fornecem alguns dados ou fornecem
mais dados do que os que sero utilizados, levando o aluno a selecionar os relevantes
para resolver o problema ou o exerccio. Na seqncia, falaremos do contrato didti-
co e da resoluo de problemas, e retomaremos a questo dos dados que so ou no
fornecidos.
Diferentes autores destacam que, na relao didtica, certas coisas so ditas, ou-
tras so murmuradas, outras, enfim, ficam sob o silncio, sejam referentes ao fato em
evidncia, sejam aquelas que no podem ser ditas. Isso o que caracteriza a vida na
sala de aula, uma constante interao entre o que informado ao aluno e aquilo que
por ele ser construdo.
A noo de contrato didtico, encontrada em particular nos trabalhos de Guy
Brousseau (1988), indica alguns caminhos para melhor compreendermos esse jogo de
relaes em torno do saber. Para Brousseau, o contrato didtico consiste em um con-
junto de comportamentos do professor esperados pelos alunos e o conjunto de com-
portamentos dos alunos esperados pelo professor. Esse contrato o conjunto de regras
que determinam, uma pequena parte explicitamente, mas sobretudo implicitamente, o
que cada parceiro da relao didtica dever gerir e aquilo de que, de uma maneira ou
de outra, ele ter de prestar conta perante o outro.
Para ilustrar a obrigao que o aluno tem de dar resposta pergunta, apresentamos
um exemplo, retirado de Joshua e Dupin (1993), que trata de um problema proposto a
97 alunos da escola elementar francesa, e cujo enunciado : Em uma embarcao h
26 carneiros e 10 cabras. Qual a idade do capito?.
Joshua e Dupin apontam que, das 97 crianas, 76 deram efetivamente a idade do
capito (36) utilizando os dados apresentados no enunciado. Alguns dos depoimen-
tos dos alunos apontam para uma ordem silenciosa, caracterstica da imposio de um
contrato didtico: um problema possui uma resposta e somente uma, e para chegar a
ela devem-se utilizar todas as informaes que figuram no problema, nenhuma infor-
mao extra se faz necessria, tudo est explicitado, basta manejar os dados e apre-
sentar a soluo.
Na nsia de responder ao que o professor deseja ouvir, verifica-se uma busca inces-
sante por parte dos alunos para encontrar a resposta a um dado problema, partindo do
princpio de que todo problema proposto na escola sempre requer uma soluo e que
esta deve ser numrica. Dada sua freqncia s aulas, o aluno passa a ver isso como uma
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 33
clusula do contrato didtico. As convenes didticas passam, ento, a fazer parte do
contrato didtico e podem ser identificadas como um conjunto de obrigaes.
Por exemplo, no caso dos alunos: obrigao de responder ao professor, de fornecer
a resposta a um problema, de destacar o resultado de outra cor, de usar uma frmula,
de aplicar uma regra que acabou de ser ensinada, de escrever os clculos de forma sis-
tematizada etc. Esse amontoado de regras passa a fixar uma conduta por parte do pro-
fessor e do aluno em relao ao saber, descaracterizando a beleza inerente da cincia,
resumindo seu ensino a regras, tcnicas e convenes que, em algum momento, faro
com que algum se pergunte: Para que serve isto, afinal?.
Problemas e exerccios: uma anlise sob a viso de gneros do discurso
Do ponto de vista do contexto de produo, podemos dizer que problemas so
formulaes em geral de estilo narrativo, com informaes e dados que precisam ser
analisados e selecionados e com uma pergunta a ser respondida pela utilizao de al-
gum tipo de conhecimento.
No contexto escolar, tradicionalmente os problemas so formulados para que os alu-
nos apliquem algum conhecimento recm-aprendido. Em geral contm todos os dados ne-
cessrios (e exatamente os dados necessrios) e uma questo situada ao final do enunciado.
Muitas vezes, no entanto, as situaes apresentadas so bastante artificiais, como
a do famoso problema do pintor que pintou 0,23 de uma parede na segunda-feira, 0,15
na tera-feira e se quer saber que parte da parede restou para pintar na quarta-feira. No
entanto, com a reviso do papel que os problemas devem desempenhar nas aulas de
Matemtica, em que devem funcionar como situaes catalisadoras de aprendizagem,
h uma indicao para que as situaes apresentadas no tenham esse carter artificial,
mas sim um carter de fato problematizador.
Tanto nos problemas como nos exerccios, o contedo temtico algo a respon-
der/resolver relativamente a contedos curriculares da rea. Nos problemas, a resolu-
o envolve um caminho para a soluo no direto, contm certos tipos de relao.
Nos exerccios, a resoluo pode ser feita de forma direta, por exemplo, com o uso de
algoritmos/frmulas ou uma informao direta (que pode incluir memorizao de con-
ceitos/contedos).
Do ponto de vista da forma composicional, nos enunciados de problemas e exer-
ccios so fornecidos dados, de forma direta ou indireta (o que supe inferncia e, por-
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental34
tanto, conhecimentos prvios), por meio da linguagem verbal e de outras linguagens
(grficos, tabelas, esquemas, desenhos etc.), o que requer o desenvolvimento de dife-
rentes capacidades de leitura em funo do que se tem que resolver: a questo do
problema. Esses dados possuem certa relao entre si e com o que deve ser resolvido.
Na maioria dos problemas, fornecido um contexto que situa os dados. Essa contextua-
lizao feita por meio de relatos, explicaes, descries etc.
Leitura, interpretao e construo de tabelas e grficos
Nos ltimos anos, os currculos de Matemtica tm dado especial ateno leitura,
interpretao e construo de tabelas e grficos.
Levando em conta que a informao veiculada em nossa sociedade faz cada vez
mais uso de tabelas e grficos como forma de comunicao, passou-se a recomendar
que o trabalho nas aulas de Matemtica contemplasse seu estudo, em funo de seu
uso social. Pretende-se, portanto, que o aluno construa procedimentos para coletar, or-
ganizar, comunicar dados, utilizando tabelas, grficos e representaes que aparecem
com freqncia em seu dia-a-dia. Com isso, ele pode compreender a funo de algumas
medidas estatsticas como mdia, mediana e moda, que constituem novos elementos
para interpretar dados estatsticos.
Esses procedimentos so importantes no apenas para a construo de conheci-
mentos matemticos, mas tambm para as demais reas do conhecimento que fazem
uso de tabelas simples e de dupla entrada e de grficos de barras, de colunas, de se-
tores, entre outros.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 3
Relatos de atividades de leitura nas aulas de Matemtica
As reflexes apresentadas no item anterior revelam a importncia de trabalhar
com atividades de leitura e escrita nas aulas de Matemtica. Neste item, vamos tratar
de experincias vivenciadas e relatadas pelos professores do grupo referncia, que no
tm o propsito de apresentar modelos prontos para a sala de aula, mas sim o de esti-
mular a colocao em prtica, na sala de aula, de atividades de leitura e escrita. Essas
experincias foram desenvolvidas com textos de livros didticos que esto nas escolas
e muitas vezes so subutilizados, e tambm com textos que no os de livros didticos,
retirados de jornais, livros de literatura etc.
Relatos de trabalhos desenvolvidos com base em textos de livros didticos
Os relatos includos na seqncia foram elaborados pelos(as) professores(as) inte-
grantes do grupo referncia que prepararam atividades e as desenvolveram em suas
salas de aula, com textos ou captulos selecionados de livros didticos.
Os relatos sero apresentados destacando a identificao do texto escolhido, o
que o(a) professor(a) fez antes da leitura, durante a leitura, depois da leitura e algumas
reflexes feitas pelo(a) professor(a) em funo do desenvolvimento da atividade.
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental36
Primeiro relato
Professor proponente: Antonio Rodrigues Neto.
Turma: 1o ano do ciclo II (5a srie).
Ttulo do texto: Um calor de derreter os miolos.
Objetivo da atividade: estimular nos alunos os processos que melhorem o significado das aes para contar e medir.
Contedos envolvidos: unidades de medidas e procedimentos para estimativa.
Reproduo do texto proposto para leituraUma cidade com cerca de 220.000 habitantes, como Baton Rouge, no estado ameri-
cano de Louisiana, tem pontos em que a temperatura do ar chega a 65 graus Celsius.
o que mostra a foto abaixo, batida com uma cmera da Nasa que detecta raios
infravermelhos. O flagrante foi feito no incio de uma tarde de maio, de um jato que
sobrevoou Baton Rouge a uma altura de 2 quilmetros. As chamadas ilhas de calor
so bolhas de ar superaquecido que se criam sobre as construes de concreto e o
asfalto das ruas e estradas, e que ajudam a esquentar o ambiente. Elas aparecem
durante o dia, quando o sol bate forte. Mas, ao contrrio das reas com vegetao e
gua, no se resfriam noite. Segundo Jeff Luvall, que coordena a pesquisa, a me-
lhor soluo para reduzir tanto calor mesmo plantar rvores.
Referncias: Texto extrado de ISOLANI, Cllia Maria Martins; MIRANDA, Djair Tere-
zinha Lima; ANZZOLINI, Vera Lcia Andrade; MELO, Walderez Soares. Matemtica:
ensino fundamental. 2. ed. So Paulo: IBEP, 2005, p. 57.
Antes da leitura
Antes da leitura, procurei fazer um levantamento do conhecimento prvio sobre o
tema. Para tanto, fiz algumas perguntas aos alunos para estimul-los a fazer suposies e
comparaes em relao a grandezas e medidas e pedi que as respostas construdas pela
turma fossem registradas no caderno. As perguntas formuladas foram as seguintes:
Voc sabe o que significa estimativa? E aproximao? Quanto voc acha que o
colega sentado a seu lado pesa? Voc capaz de estimar quantas folhas j fo-
ram arrancadas de seu caderno durante este ano? Hoje, quantos alunos devero
estar no ptio no momento do intervalo para a merenda? O que necessrio
para fazermos estimativas e aproximaes? Pelo que voc j sabe de Matem-
tica, quais os assuntos conhecidos que podem nos ajudar a fazer estimativas e
aproximaes? Qual a altura do colega sentado a sua frente? Como voc fez
essa estimativa? Quais as palavras importantes usadas para falar a altura do seu
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental 37
colega? Qual o aluno mais alto desta sala? E qual o aluno mais baixo? Qual a
diferena entre dizer mais alto e mais comprido? Qual a palavra que mais se usa
para expressar o comprimento das coisas que medimos? Hoje est um dia mais
quente que ontem? Qual a palavra que mais usamos para expressar a tempera-
tura? Quais os lugares no mundo que neste instante devem estar mais quentes
e mais frios, comparados ao lugar em que estamos?
Na seqncia, procurei fazer uma antecipao do tema ou idia principal, apre-
sentando o ttulo Um calor de derreter os miolos, escrito na lousa em letra de for-
ma. Expliquei que foi escolhido um texto suporte do livro didtico extrado da revista
Superinteressante. Minha inteno nesta parte da atividade foi relacionar o ttulo com as perguntas anteriores e com outras que poderiam ser construdas para auxiliar o en-
tendimento da importncia social de definir unidades-padro de medidas. Fiz algumas
questes aos alunos:
Quando voc ouve ou l esse ttulo, que temperatura voc imagina? Quais lugares
do mundo voc pensa que so bem quentes? Como voc v esses lugares?
Depois, os alunos explicitaram suas expectativas de leitura, questionando o que
esperavam ler nesse texto. Discutimos alguns objetivos na busca de informaes sobre
o tema indicado pelo ttulo.
Durante a leitura
Propus a leitura em voz alta do texto. Para a confirmao ou retificao das expec-
tativas criadas antes da leitura, fiz perguntas como:
O que voc acha de uma cidade com uma temperatura de 65 graus Celsius?
Derrete os miolos ou no?
Para a localizao da idia principal, questionei:
Quais as quantidades e medidas informadas pelo texto? O texto informa com
preciso essas quantidades e medidas? Qual a parte do texto que mostra a
aproximao ou exatido dessas medidas?
Discuti com o grupo alguns procedimentos de estimativa relativos a termos como:
acerca, entre, mais ou menos, perto de; e tambm a outros termos como: comprimen-
to, temperatura, populao.
Depois da leitura
Aps a leitura e as atividades descritas anteriormente, troquei impresses a res-
peito do texto lido, sugerindo que alguns alunos narrassem suas impresses, e as re-
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental38
gistrei na lousa. Fiz algumas perguntas com o objetivo de estimular a participao e o
fechamento do texto:
Qual parte do texto foi mais interessante? Por qu?
Finalmente, pedi que escrevessem as respostas e as impresses no caderno e pro-
pus a eles que buscassem informaes complementares sobre a utilizao de vrios
tipos de unidades, pesquisando em jornais e revistas. Pedi que recortassem exemplos
em que ficassem mais evidentes as unidades que esto sendo utilizadas e os colassem
no caderno.
Reflexes sobre a atividadeA atividade proposta desencadeou experincias interessantes na sala de aula. Antes
da leitura, estimar o peso e a altura do colega, alm de ser divertido, deixou bem claro
o procedimento matemtico da estimativa. Tive a preocupao de sugerir que sempre
ficassem de p somente dois alunos, escolhidos ao acaso, para que toda a sala obser-
vasse o processo. Avisei que todos participariam dessa atividade, pedindo aos alunos
sorteados que se lembrassem de seu peso e altura sem fazer nenhum tipo de comen-
trio. Com base nessas informaes secretas (eles adoram esses termos que remetem
a algum tipo de aventura policial), os dois alunos deveriam tentar descobrir o peso e a
altura um do outro que at esse momento seriam desconhecidos.
Esse procedimento de utilizar a medida do prprio peso e altura como referncia
para tentar descobrir o peso e altura do colega possibilitou mostrar, de forma intuiti-
va, que estimar no chutar. Assim, as relaes e conexes com outras informaes
e estimativas, como a temperatura do dia, que serviria de suporte ao texto, ficaram
bem viveis.
Durante a leitura, o envolvimento mais intenso e desafiador, por incrvel que pos-
sa parecer, os alunos lerem em voz alta. Ainda um desafio pronunciar a palavra,
bem soletrada, em voz alta na frente dos colegas. Os alunos gostam desse desafio, e
boa parte se oferece voluntariamente para esse tipo de atividade. Quem gostaria de
ler? uma pergunta simples que muitos professores fazem aos alunos quando tm a
oportunidade de usar o livro didtico; no entanto, precisamos valoriz-la ainda mais em
uma escola que sobrevive sob grande presso da mdia, ou, em outras palavras, sob o
discurso da imagem.
A palavra bem lida, bem pronunciada, o ponto de apoio para desencadear o pro-
cesso de leitura e escrita na sala de aula. No caso da Matemtica, temos muitas palavras
desafiadoras. Nesse texto, especificamente, estavam relacionadas s unidades.
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Depois da leitura, com as informaes do texto, foi possvel desencadear vrias situa-
es-problema. A temperatura e o calor so temas interessantes para construir relaes
com a linguagem matemtica. Imaginar uma situao muito fria e uma muito quente com
turmas de 1o ano do ciclo II bastante divertido. Eles tm a capacidade de se envolver
com a situao a ponto de tremer de frio ou mesmo suar, dependendo da temperatura
proposta pelo professor! Como o tema de nosso texto foi Um calor de derreter os mio-
los, suamos bastante, mais do que o necessrio. Em So Paulo, nesse dia o calor estava
intenso e ficou muito ntida a conseqncia da falta de rvores em nossa cidade.
Para concluir, o plano realizado para a leitura na aula de Matemtica focalizou o
desenvolvimento de algumas habilidades propostas pelo Referencial. No entanto, con-sidero que essas habilidades devem ser analisadas em funo da estrutura do livro ado-
tado, pois essa estrutura algumas vezes restringe o desenvolvimento de algumas delas.
Por exemplo, no livro didtico nem sempre possvel a identificao, durante a leitura,
das pistas lingsticas responsveis por introduzir no texto a posio do autor.
No entanto, o livro didtico o suporte mais vivel na sala de aula e, assim, pode-
r ser uma ferramenta para o estmulo da utilizao de outros livros com estruturas e
estilos diferentes. importante que ele seja explorado nessa perspectiva.
Segundo relato
Professora proponente: Licia Taurizano do Prado Juliano.
Turma: 1o ano do ciclo II (5a srie).
Ttulo do texto: Mnimo mltiplo comum.
Objetivo da atividade: introduzir o conceito de mnimo mltiplo comum.
Contedos envolvidos: noes de divisibilidade e idia de mltiplos.
Reproduo do texto proposto para leituraMnimo mltiplo comum
Nas frias de vero, uma empresa de transportes tem duas linhas partindo para o lito-
ral: a A de 30 em 30 minutos e a B de 45 em 45 minutos. Se a partida desses nibus
coincidia s 9 horas da manh, em que hora ela voltar a coincidir?
O nibus A parte de 30 em 30 minutos:
9 horas 0, 30, 60, 90, 120, 150, 180...
O nibus B parte de 45 em 45 minutos:
9 horas 0, 45, 90, 135, 180, 225...
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RefeRencial de expectativas paRa o desenvolvimento da competncia leitoRa e escRitoRa no ciclo ii do ensino fundamental40
A partida de dois nibus coincidir no mesmo instante aps:
90 minutos, 180 minutos, 270 minutos.
Os prximos dois nibus partiro s 9 horas e 90 minutos, ou seja, 10 horas e
30 minutos.
Os nmeros naturais 0 90 180 270 so mltiplos comuns de 30 e 45.
O menor deles, exceto o 0, 90. O mnimo mltiplo comum 30 e 45 90.
Representamos assim:
mmc (30, 45) = 90
Para encontrarmos os mltiplos de um nmero, multiplicamos esse nmero por 0,
por 1, por 2, por 3, por 4, e assim por diante:
Mltiplos de 6 Mltiplos de 9
6 0 = 0 9 0 = 0
6 1 = 6 9 1 = 9
6 2 = 12 9 2 = 18
6 3 = 18 9 3 = 27
6 4 = 24 9 4 = 36
6 5 = 30 9 5 = 45
6 6 = 36
Os mltiplos comuns de 6 e 9 so: 0, 18, 36...
O menor deles, sem contar o 0, 18:
mmc (6, 9) = 18.
Referncias: Texto extrado de GUELLI, Oscar. Aventura do pensamento. 2. ed.
So Paulo: tica, 2005, p. 140-1.
Antes da leitura
Preparando o ambiente para uma boa compreenso do texto, no incio apresentei
uma situao para ser resolvida pelos alunos, individualmente:
So dois muros. Um est sendo feito com blocos de 20 cm de altura; o outro,
com tijolos de 16 cm. Com quantos centmetros os dois muros ficaro com a altu-
ra comum?.
Solicitei que tentassem resolver o problema cada um de sua maneira e registras-
sem a resposta encontrada.
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Depois de um tempo, pedi que abrissem o livro na pgina indicada e lessem o t-
tulo da unidade: Mnimo mltiplo comum.
Combinei que faria algumas perguntas para responderem no caderno e que, de-
pois, discutiramos as respostas. As perguntas foram as seguintes:
O que voc acha que quer dizer comum? Quando os dois muros do proble-
ma teriam a altura em comum? O que voc acha que quer dizer mnimo? De
que voc se lembra quando ouve a palavra mltiplo? Agora, lembrando que
estamos numa aula de Matemtica, o que voc acha que vai aprender neste
captulo do livro?
Algumas respostas dadas s perguntas foram:
Comum , por exemplo... o Guilherme e o Joo tm algo em comum, os dois
adoram jogos de computador! E a Tain e a Aline adoram conversar sobre a no-
vela Rebelde, isso elas tm em comum!
Os dois muros teriam a altura e