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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO VANESSA DE ABREU CAMASMIE AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO COLÉGIO PEDRO II CAMPUS HUMAITÁ RIO DE JANEIRO 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

VANESSA DE ABREU CAMASMIE

AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I

DO COLÉGIO PEDRO II CAMPUS HUMAITÁ

RIO DE JANEIRO

2017

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Vanessa de Abreu Camasmie

AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I

DO COLÉGIO PEDRO II CAMPUS HUMAITÁ

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Educação da Universidade Federal do Rio de

Janeiro, na linha de pesquisa Currículo, Docência e

Linguagem, como requisito parcial para a obtenção do

título de Doutora em Educação.

Orientadora: Profª. Drª. Patrícia Corsino

Rio de Janeiro

2017

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AGRADECIMENTOS

À professora Patrícia Corsino, que me acompanhou com generosidade e exigência, me

ensinando a beleza de nos darmos a surpresa de ser.

Aos professores Cecília Goulart, Mônica Correia, Ludmila Thomé e Percival Britto,

que, gentilmente, dispuseram-se a dialogar conosco.

Às professoras que tive ao longo do doutorado, pela participação na minha formação.

Aos sujeitos desta pesquisa, que perseguem o saber com o compromisso de concretizar

o direito à literatura na escola.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo

financiamento do doutorado sanduíche.

À Universidade Autônoma de Barcelona (UAB), pelo acolhimento, especialmente por

meio das professoras Teresa Colomer, Cristina Correro, Martina Fittipaldi e Mariona Treball.

À equipe de professores da Creche Can Caralleu, que me deu a oportunidade do

estágio.

Ao Programa de Alfabetização, Documentação e Informação (Proalfa), espaço que me

acolheu generosamente através da minha querida amiga professora Anna Helena Moussatché.

Hoje, que a tarde é de mais um encontro, quero lhe agradecer por ter me ajudado a chegar até

aqui.

Ao amigo que fiz no Proalfa, Ricardo Freitas, revisor desta tese e com quem tive a

honra de trabalhar.

Ao Colégio Pedro II (CPII), por ter permitido a realização da pesquisa e ter me dado

chão desde menina.

Às amigas Rosita Mattos da Silva, Sônia Travassos, Rafaela Vilela, Beatriz Serra,

Helen Queiroz, Cláudia Pimentel, Leonardo, Luciene, Jordana e Nazareth Salutto. A

convivência fraterna e as conversas sobre o mundo da vida e da cultura enriqueceram

sobremaneira os anos de trabalho árduo.

À minha mãe, Andréa Abreu de Oliveira, por ter me ensinado a pôr o quanto somos no

mínimo que fazemos.

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Ao meu pai, Rogério Camasmie, e à sua companheira, pelo apoio incondicional e

amizade.

Ao Patrick, por tudo o que é.

Ao meu filho Davi, que me levou ao encontro do amor mais fiel.

À minha sogra, Jurema Leal, pelo apoio silencioso e amoroso.

Aos amigos que fiz na Espanha, que proporcionaram momentos extraordinários.

Aos meus queridos irmãos, tios, tias, primas e primos, pelas bagunças, encontros

fraternos, risos e colos que me ajudaram a retomar o fôlego para o trabalho acadêmico.

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RESUMO

CAMASMIE, Vanessa de Abreu. Aulas de Literatura do Ensino Fundamental I do

Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio de Janeiro, 2017. Tese (Doutorado em Educação) –

Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

Esta pesquisa de doutorado tem como tema as aulas de Literatura dos anos iniciais do Ensino

Fundamental do Colégio Pedro II. Foi realizada uma pesquisa qualitativa (BAKHTIN, 2003),

por meio da observação participante (TURA, 2003) e de entrevistas (ZAGO, 2003). O campo

de pesquisa foi o Colégio Pedro II campus Humaitá I, e os sujeitos foram duas professoras e

duas coordenadoras pedagógicas. A investigação pretendeu responder às perguntas: Como são

as aulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá? O

que estas aulas fazem com os sujeitos e o que eles fazem nela? O objetivo geral da pesquisa

foi compreender tais aulas e os objetivos específicos foram: 1) Analisar a proposta curricular

de Literatura do Colégio Pedro II e sua articulação com as aulas de Literatura; 2) Conhecer e

analisar o que fazem as professoras e o que orienta a coordenação pedagógica de Literatura no

que se refere à metodologia, aos objetivos, aos conteúdos, às atividades pedagógicas, ao

corpus literário e aos critérios de seleção dele; 3) Compreender o significado que as

professoras e a coordenação pedagógica de Literatura atribuem às aulas, e as concepções de

leitura literária que sustentam suas aulas. O referencial teórico discutiu os conceitos de

letramento literário (COSSON; PAULINO, 2009); educação literária (COLOMER, 2009);

vivência estética (VIGOTSKI, 2010); experiência estética (LARROSA, 2003; BENJAMIN,

1994); contemplação estética (BAKHTIN, 1993b); dimensões da literatura (FITTIPALDI,

2013); e linhas de força de promoção da leitura (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015). A

proposta curricular (CPII, 2008) e as aulas se articulam em certa medida. Elas partem de um

tema, estruturam-se na tríade leitura – conversa – fazer artístico e pretendem formar um leitor

crítico. A literatura é compreendida como arte. As crianças ouvem, conversam, desenham,

debatem e escrevem a partir de livros clássicos e atuais. A proposta curricular e as aulas

apresentam uma tensão entre a educação literária e a formação literária. Partindo da ideia de

que a literatura é um direito (CANDIDO, 2004), a partir da experiência do Colégio Pedro II,

defende-se a formação literária como uma abordagem para aulas de Literatura nos anos

iniciais do Ensino Fundamental.

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Palavras-chave: Linguagem, Letramento Literário, Educação Literária, Formação Literária,

Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

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ABSTRACT

CAMASMIE, Vanessa de Abreu. Aulas de Literatura do Ensino Fundamental I do

Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio de Janeiro, 2017. Thesis (Doctorate in Education) –

Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.

The theme of this doctoral research is the Literature classes of the initial years of Elementary

School of the Colégio Pedro II. A qualitative research was accomplished (BAKHTIN, 2003),

with participant observation (TURA, 2003) and interviews (ZAGO, 2003). The research field

was the Colégio Pedro II, Humaitá I campus, and the subjects were two teachers and two

pedagogical coordinators. The research aimed to answer the questions: How are the Literature

classes of Elementary School of the Colégio Pedro II, Humaitá I campus? What do these

classes do with the subjects and what do they do in it? The general objective of the research

was to understand such classes, and the specific objectives were: 1) To analyze the curricular

proposal of Literature of the Colégio Pedro II and its articulation with the classes of

Literature; 2) To know and analyze what teachers do, and what guides the pedagogical

coordination of Literature in terms of methodology, objectives, contents, pedagogic activities,

literary corpus, and selection criteria; 3) Understand the meaning that the teachers and the

pedagogical coordination of Literature attribute to the classes, and the conceptions of literary

reading that sustain their classes. The theoretical framework discussed the concepts of literary

literacy (COSSON; PAULINO, 2009); literary education (COLOMER, 2009); aesthetic

livingness (VIGOTSKI, 2010); aesthetic experience (LARROSA, 2003; BENJAMIN, 1994);

aesthetic contemplation (BAKHTIN, 1993b); dimensions of the literature (FITTIPALDI,

2013); and reading promotion lines (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015). The curricular

proposal (CPII, 2008) and the classes are articulated in a certain way. They start from a

theme, are structured in the triad reading – talking – artistic making, and intend to form a

critical reader. Literature is understood as art. Children listen, talk, draw, debate, and write

from classic and current books. The curricular proposal and the classes present a tension

between literary education and literary formation. Starting from the idea that literature is a

right (CANDIDO, 2004), from the experience of the Colégio Pedro II, the literary formation

is defended as an approach for Literature classes in the initial years of Elementary School.

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Keywords: Language, Literary Literacy, Literary Education, Literary Formation, Early Years

of Elementary Education.

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LISTA DE DIAGRAMAS, FIGURAS E QUADROS

Diagrama 1. Amarelinha da educação literária................................................................... 64

Diagrama 2. Reação estética de Vigotski............................................................................ 75

Diagrama 3. Contemplação estética de Bakhtin.................................................................. 83

Diagrama 4. Linhas de força de promoção da leitura.......................................................... 104

Diagrama 5. Linhas de força de promoção da leitura e dimensões da literatura.................

107

Figura 1. Brincadeira cama de gato..................................................................................... 72

Figura 2. Mediação do outro na interação criança-cultura..................................................

73

Quadro 1. Ações interlocutórias com a literatura................................................................ 71

Quadro 2. Competências específicas ligadas às estratégias de leitura e escrita literárias... 147

Quadro 3. Temas geradores................................................................................................. 172

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

Abralic Associação Brasileira de Literatura Comparada

ANPEd Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação

Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

Cole Congresso de Leitura do Brasil

CPII Colégio Pedro II

EF Ensino Fundamental

EI Educação Infantil

EJA Educação de Jovens e Adultos

EM Ensino Médio

FioCruz Fundação Oswaldo Cruz

FNLIJ Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil

GPELL Grupo de Pesquisa do Letramento Literário

Gretel Grupo de Investigación de Literatura Infantil y Juvenil y Educación Literaria

GT 10 Grupo de Trabalho Alfabetização, Leitura e Escrita

IECN Instituto de Educação Clélia Nanci

Leduc Laboratório de Estudos de Linguagem, Leitura, Escrita e Educação

Lied Laboratório de Informática Educativa

LIJ Literatura Infantil e Juvenil

MEC Ministério da Educação

NSL Novos Estudos do Letramento

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

PGE Plano Geral de Ensino

Popradel Pauta de Observação/Sistematização de Práticas Didáticas em Educação Literária

PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação

PPP Projeto Político Pedagógico

Proalfa Programa de Alfabetização, Documentação e Informação

PUC Pontifícia Universidade Católica

Saeb Sistema de Avaliação da Educação Básica

Seeduc Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro

Sesop Setor de Supervisão e Orientação Pedagógica

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SOE Setor de Orientação Educacional

SRH Setor de Recursos Humanos

UAB Universidade Autônoma de Barcelona

UCS Universidade de Caxias do Sul

UEM Universidade Estadual de Maringá

Uerj Universidade do Estado do Rio de Janeiro

UFCG Universidade Federal de Campina Grande

UFF Universidade Federal Fluminense

UFJF Universidade Federal de Juiz de Fora

UFMG Universidade Federal de Minas Gerais

Ufopa Universidade Federal do Oeste do Pará

UFPE Universidade Federal de Pernambuco

UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul

UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro

Unesc Universidade do Extremo Sul Catarinense

Unesco Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

Unesp Universidade Estadual Paulista

Unicamp Universidade Estadual de Campinas

USP Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.......................................................................................................................

16

1 O LETRAMENTO LITERÁRIO E A EDUCAÇÃO LITERÁRIA............................... 33

1.1 QUANDO É LITERATURA?............................................................................................ 33

1.2 QUANDO É LITERATURA INFANTIL?........................................................................ 40

1.3 QUANDO A LITERATURA É ARTE?............................................................................. 45

1.4 LETRAMENTO LITERÁRIO........................................................................................... 48

1.5 EDUCAÇÃO LITERÁRIA................................................................................................

54

2 A FORMAÇÃO LITERÁRIA............................................................................................

66

3 AS LINHAS DE FORÇA DE PROMOÇÃO DA LEITURA........................................... 92

3.1 AS LINHAS DE FORÇA................................................................................................... 93

3.1.1 Leitura e Ludismo.......................................................................................................... 96

3.1.2 Leitura e Experiência/Formação.................................................................................. 99

3.1.3 Leitura e Ilustração........................................................................................................ 100

3.1.4 Leitura e Subjetivismo................................................................................................... 101

3.1.5 Leitura e Cidadania....................................................................................................... 101

3.1.6 Leitura e Utilitarismo.................................................................................................... 103

3.2 AS DIMENSÕES DA LITERATURA...............................................................................

104

4 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS................................................................ 108

4.1 PROCEDIMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS..................................................... 113

4.2 CAMPO DE PESQUISA................................. .................................................................. 117

4.3 SUJEITOS DE PESQUISA................................................................................................

118

5 PROPOSTA CURRICULAR DAS AULAS DE LITERATURA DO ENSINO

FUNDAMENTAL I DO COLÉGIO PEDRO II..................................................................

122

5.1 O INÍCIO DAS AULAS DE LITERATURA.................................................................... 124

5.2 AS PROPOSTAS CURRICULARES DAS AULAS DE LITERATURA......................... 130

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5.2.1 Estruturação e objetivos das aulas de Literatura....................................................... 131

5.2.2 Concepções de literatura............................................................................................... 135

5.2.3 Conteúdos, progressão e corpus estabelecidos na proposta curricular..................... 137

5.2.4 Propostas de aproximação ao texto literário...............................................................

143

6 AULAS DE LITERATURA NO COLÉGIO PEDRO II: ENTRE CONCEPÇÕES E

PRÁTICAS..............................................................................................................................

151

6.1 A LITERATURA NO COTIDIANO DO PROFESSOR: O SEU LUGAR, AS

LEITURAS E OS CRITÉRIOS DE SELEÇÃO.......................................................................

151

6.2 METODOLOGIA NAS AULAS DE LITERATURA: O ENSINO-APRENDIZAGEM

DA LITERATURA NA ESCOLA...........................................................................................

155

6.3 TEMAS GERADORES...................................................................................................... 171

6.4 CORPUS NAS AULAS DE LITERATURA: TEXTOS/MATERIAIS, CRITÉRIOS DE

SELEÇÃO E MODOS DE APRESENTAÇÃO.......................................................................

174

6.5 SIGNIFICADO ATRIBUÍDO ÀS AULAS DE LITERATURA E CONCEPÇÕES DE

LEITURA LITERÁRIA...........................................................................................................

185

6.6 OBJETIVOS DAS AULAS DE LITERATURA............................................................... 188

6.7 CONTEÚDOS DAS AULAS DE LITERATURA............................................................. 189

6.8 ATIVIDADES PROPOSTAS NAS AULAS DE LITERATURA.....................................

191

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................

197

REFERÊNCIAS......................................................................................................................

208

LISTAGEM DOS TRABALHOS SOBRE LETRAMENTO LITERÁRIO..................... 215

ARTIGOS................................................................................................................................. 215

TESES....................................................................................................................................... 217

DISSERTAÇÕES.....................................................................................................................

218

LISTAGEM DOS TRABALHOS SOBRE EDUCAÇÃO LITERÁRIA...........................

224

APÊNDICES........................................................................................................................... 225

APÊNDICE A: MAPEAMENTO DOS ARTIGOS SOBRE LETRAMENTO LITERÁRIO:

COLEÇÃO LITERATURA E EDUCAÇÃO, ABRALIC E ANPED......................................

226

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APÊNDICE B: MAPEAMENTO DE TESES E DISSERTAÇÕES SOBRE

LETRAMENTO LITERÁRIO: BANCO DE TESES DA CAPES, SITES DE

UNIVERSIDADES E BIBLIOTECA DIGITAL BRASILEIRA DE TESES E

DISSERTAÇÕES.....................................................................................................................

228

APÊNDICE C: MAPEAMENTO CATEGORIZADO DE TESES, DISSERTAÇÕES E

ARTIGOS SOBRE LETRAMENTO LITERÁRIO.................................................................

236

APÊNDICE D: MAPEAMENTO DE TESES SOBRE EDUCAÇÃO LITERÁRIA:

GRETEL/UAB..........................................................................................................................

240

APÊNDICE E: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS PROFESSORAS.......................... 241

APÊNDICE F: LIVROS LIDOS NAS AULAS DE LITERATURA...................................... 242

APÊNDICE G: ATIVIDADES PEDAGÓGICAS PROPOSTAS NAS AULAS DE

LITERATURA.........................................................................................................................

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa de doutorado (2013-2017), desenvolvida no Programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGE/UFRJ), na linha

de pesquisa Currículo, Docência e Linguagem, no Laboratório de Estudos de Linguagem,

Leitura, Escrita e Educação (Leduc), está inserida na pesquisa Infância, linguagem e escola: a

leitura literária em questão, cujo objetivo geral foi conhecer e analisar políticas de livro e

leitura desenvolvidas pelas Secretarias Municipais de Educação de municípios do estado do

Rio de Janeiro e suas implicações em práticas de leitura literária em creches, pré-escolas e

escolas de Ensino Fundamental (EF). Sob a coordenação da Profª. Drª. Patrícia Corsino, a

pesquisa contou com estudos qualitativos, revisão bibliográfica, além de elaboração e

aplicação de um questionário junto aos setores responsáveis pelas políticas de livro e leitura

nas referidas secretarias.

Além disso, esta pesquisa de doutorado se articula com minha trajetória acadêmica.

Assim, considero que sua origem se deu em 2004, com meu ingresso no curso de Pedagogia

da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). A opção pelo curso veio também da

experiência de aluna que vivi no Colégio Pedro II (CPII), onde, semanalmente, participava de

aulas de Literatura que privilegiavam a leitura compartilhada, a roda de conversa sobre o livro

lido e a produção de trabalhos artísticos.

A Uerj me abriu um espaço de trabalho no Programa de Alfabetização, Documentação

e Informação (Proalfa) como bolsista de Iniciação à Docência, o que me levou a aprofundar a

ideia de que ler literatura é importante, como também a constatar que o trabalho pedagógico

com a literatura era mais complexo do que eu imaginava. Por dois anos trabalhei no programa

como professora regente em uma turma de alfabetização de adultos, com a qual desenvolvi os

projetos de trabalho Lendo a sociedade brasileira através do carnaval carioca e Estudando a

desigualdade social e a escola do Brasil através dos jornais e dos livros.

No primeiro tive a oportunidade de usufruir a biblioteca itinerante De mala e cuia,

projeto do Museu do Folclore Edison Carneiro. A exploração dos livros de literatura da mala

mostrou que os alunos estavam fazendo releituras do mundo em que viviam por meio da

literatura, o que me levou a participar de um grupo de estudos informal no Proalfa sobre a

formação de leitores literários. A participação no grupo me mostrou a necessidade de ampliar

meu repertório e de estudar sobre o ensino da literatura. O movimento, então, foi duplo:

formar leitores e continuar a minha formação leitora. Tal estudo fundamentou o

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desenvolvimento do segundo projeto de trabalho, apresentado no 16º Congresso de Leitura do

Brasil (Cole), na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Concluído o curso de Pedagogia, trabalhei em 2008 com adultos em processo de

alfabetização no projeto Leituras e escritas no cotidiano do trabalhador, do Setor de

Recursos Humanos da Fundação Oswaldo Cruz (SRH/FioCruz) e do Proalfa/Uerj. No projeto

tínhamos o objetivo de colaborar na releitura do mundo do trabalho desses adultos por meio

da literatura.

Todas essas experiências me conduziram ao mestrado em Educação, durante o qual

pesquisei sobre: Como alfabetizandos adultos trabalhadores do projeto Leituras e escritas no

cotidiano do trabalhador se apropriam de práticas de leitura literária? Durante a pesquisa

realizei duas revisões de literatura: a) políticas públicas e alfabetização na Educação de

Jovens e Adultos (EJA) e b) letramento literário. Estudei o processo de apropriação

(KALMAN, 2004) do conhecimento segundo Bakhtin (1986) e o letramento literário na

alfabetização de adultos (COSSON; PAULINO, 2009; SOARES, M., 1998). Realizei

entrevistas coletivas (KRAMER, 2007) na perspectiva compreensiva (ZAGO, 2003) com seis

sujeitos e registrei seus dados socioeconômico-culturais em uma ficha de identificação.

Com o objetivo geral de investigar a relação entre o processo de alfabetização e o

letramento literário no projeto citado, defendi a dissertação, em 2011, sob a orientação da

Profª. Drª. Edith Frigotto, na Universidade Federal Fluminense (UFF). A pesquisa A

apropriação de práticas de leitura literária de alfabetizandos adultos trabalhadores do

projeto Leituras e escritas no cotidiano do trabalhador, à época, revelou que a concepção de

literatura na sua dimensão estética precisava ser construída pelos sujeitos para que pudesse

adquirir valores que fossem além do utilitário. Evidenciou também que não houve relação

direta entre o letramento literário, o nível de escolaridade e as experiências ao longo da vida, e

que há níveis de apropriação das práticas de leitura literária.

O interesse pelo letramento literário possibilitou a participação no grupo de pesquisa e

extensão Letramento Literário e Formação de Professores1. Sob a coordenação da Profª. Drª.

Edith Frigotto, ainda no ano de 2011, oferecemos um curso de extensão para futuros

professores do Instituto de Educação Clélia Nanci (IECN), em São Gonçalo.

Paralelamente à universidade, segui trabalhando em escolas. Alfabetizei crianças na

Rede Municipal de Educação de Itaboraí (2009), e em seguida trabalhei em uma turma de 5º

ano na Escola Municipal Lúcia Miguel Pereira no Rio de Janeiro (2010). Desde 2011 leciono

1 FRIGOTTO, Edith. Leitura literária e formação de professores. In: Revista Sede de Ler, EdUff, n. 2, ano 2,

dezembro de 2011, p. 22-28.

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no CPII a disciplina Literatura, ou atuo como regente em turmas do 1° e do 2º ano do EF, ou

como orientadora pedagógica. Em 2013, junto a duas outras professoras, elaboramos um

projeto intitulado Biblioteca escolar nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Atualmente,

em 2017, estou como professora de Literatura e da biblioteca da escola.

A partir dessas experiências e de reflexões principalmente sobre o EFI do CPII,

apresentei o pré-projeto desta pesquisa em 2013, que perguntava: De acordo com professores

dos anos iniciais do Colégio Pedro II campus Humaitá I, como a experiência estética está

presente em suas práticas escolares de letramento literário?

A participação no grupo de pesquisa coordenado pela Profª. Drª. Patrícia Corsino

possibilitou o estudo do conceito de vivência estética (VIGOTSKI, 2010) e uma reflexão mais

cuidadosa sobre as aulas de Literatura do colégio. Então, para o 1º Exame de Qualificação

alteramos a pergunta de pesquisa. Saímos da experiência estética e seguimos em direção à

vivência estética, não somente do ponto de vista dos professores, mas também dos alunos.

Pretendíamos saber: Como alunos e professores vivenciam esteticamente aulas de Literatura

dos anos iniciais do Colégio Pedro II campus Humaitá I?

Para a construção do projeto realizei uma revisão bibliográfica que tem origem no

mestrado. Na revisão foi feito um levantamento de teses, dissertações e artigos, do período de

1999 a 2013, sobre o letramento literário.

Elegi como critério artigos dos sites dos congressos da Associação Brasileira de

Literatura Comparada (Abralic) e da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em

Educação (ANPEd), em particular os do Grupo de Trabalho Alfabetização, Leitura e Escrita

(GT 10) e os da Coleção Literatura e Educação do Grupo de Pesquisa do Letramento Literário

da Universidade Federal de Minas Gerais (GPELL/UFMG). As teses e dissertações foram

pesquisadas nos sites da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

(Capes), de universidades que tiveram suas dissertações e teses encontradas no portal da

Capes e da Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações2. A seleção dos trabalhos

seguiu o descritor letramento literário, presente em títulos, palavras-chave, sumários,

capítulos e/ou texto dos artigos.

O sintagma letramento literário foi escolhido porque a pesquisa, inicialmente, tratou

de práticas escolares de letramento literário e estava em diálogo com a abordagem teórica de

Cosson e Paulino (2009, p. 67), que concebem o letramento literário como um “processo de

apropriação da literatura”. Posteriormente, houve uma mudança na pergunta da pesquisa, o

2 A necessidade de ir além do portal da Capes deveu-se ao fato de termos encontrado outras teses e dissertações

sobre o tema, no período de 1999 a 2013, que não estavam presentes no portal.

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que provocou a necessidade de realização de outra revisão bibliográfica, apresentada adiante.

Com base nos critérios da primeira revisão, encontrei quarenta (40) artigos: vinte e três

(23) da Coleção Literatura e Educação, onze (11) da ANPEd e seis (6) da Abralic. Concluí

que o ano com o maior número de publicações foi 2007 (7), seguido de 2003 (5) e 2004, 2006

e 2011, com quatro (4) artigos cada. Os demais anos oscilaram de um a três artigos

publicados, exceto 2010, que não apresentou nenhuma publicação com o referido descritor.

A UFMG é a instituição que mais publica artigos sobre o letramento literário e os

autores com maior número de artigos também pertencem à universidade: Maria Zélia Versiani

Machado (5), Aracy Alves Martins Evangelista (4), Maria das Graças Rodrigues Paulino (3),

Marta Passos Pinheiro (2), Marcelo Chiaretto (2) e Aparecida Paiva (2).

Na revisão de teses e dissertações, encontrei cento e onze (111) pesquisas. Mapeando-

as, pude constatar que os estados de Minas Gerais (UFMG) e Rio de Janeiro (UFRJ) vêm

centralizando os estudos acadêmicos sobre o letramento literário no Brasil. Para fins de

sistematização, formei dois grupos de pesquisa que representam as duas grandes áreas do

conhecimento que vêm tratando do tema: Educação, com sessenta e seis (66) pesquisas, e

Letras, com quarenta e cinco (45).

A presença desses grupos de pesquisa das áreas da Educação e das Letras revela-se

também na identificação das professoras que orientaram maior número de pesquisas, a saber:

Patrícia Corsino (UFRJ, Educação, 8), Aparecida Paiva (UFMG, Educação, 7), Miriam

Zappone (Universidade Estadual de Maringá (UEM), Letras, 6) e Flávia Ramos (Universidade

de Caxias do Sul (UCS), Educação, 5).

Quanto aos sujeitos/corpus de pesquisa, há quatro grandes grupos de estudos. Eles se

referem às pesquisas que tratam da escola (educação escolar de crianças e adolescentes:

Educação Infantil, EFI, EFII e Ensino Médio (EM); EJA: EFI e EM; educação do campo;

biblioteca escolar; sala de leitura; documentos, coleções, gêneros discursivos e materiais

didáticos); da universidade (vestibular; formação inicial no curso de Letras; formação

continuada); de outros espaços educativos que não são a escola (biblioteca comunitária;

educação não formal de jovens e adultos); e da formação do leitor literário de maneira geral

(trajetória; experiências).

O levantamento das pesquisas mostra que há poucos estudos sobre a EJA, o Ensino

Superior (formação inicial e formação continuada), bibliotecas comunitárias e documentos

oficiais relativos à Educação Infantil. Nota-se ainda que o número de pesquisas acerca de

práticas escolares de letramento literário na Educação Infantil está em ascensão.

Os anos 1999, 2001, 2002 e 2005 não contaram com teses e/ou dissertações. O

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contrário aconteceu no período de 2008 a 2012, quando houve grande número de pesquisas

publicadas, a saber: 2008 (14), 2009 (17), 2010 (17), 2011 (20) e 2012 (20).

O cruzamento dos dados apresentados no mapeamento dos artigos e das teses e

dissertações apontou algumas recorrências: 1) a UFMG é a instituição que mais desenvolve

estudos e publica sobre o letramento literário no Brasil; 2) as instituições representadas em

ambos os mapeamentos são: UFMG, Pontifícia Universidade Católica (PUC), Universidade

Federal de Pernambuco (UFPE), UFF, UFRJ, Universidade Estadual Paulista (Unesp),

Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), UEM, Universidade do Extremo Sul

Catarinense (Unesc), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Universidade Federal do

Rio Grande do Sul (UFRGS); e 3) há professores que ora aparecem como autores, ora como

orientadores (Machado, Paulino, Evangelista, Pinheiro, Paiva, Maciel, Zilberman, Andrade,

Corsino, Ceccantini, Zappone e Fritzen).

A questão do letramento literário começou a ser discutida no âmbito dos artigos e,

posteriormente, passou a ser tema de uma quantidade cada vez maior de teses e dissertações.

Os anos de 2007 (7), 2003 (5), 2004 (4), 2006 (4) e 2011 (4) tiveram o maior número de

artigos publicados. Já no período de 2008 a 2012 houve grande número de pesquisas

publicadas: 2008 (14), 2009 (17), 2010 (17), 2011 (20) e 2012 (20).

A leitura das cento e onze (111) teses e dissertações e dos quarenta (40) artigos sobre o

letramento literário permitiu tanto o conhecimento das diferentes abordagens teóricas do

conceito quanto a construção de uma categorização. Encontrei dois conceitos de letramento

literário. O hegemônico, referenciado em Cosson e Paulino (2009, p. 67, grifo nosso), que o

entendem, com base no conceito de letramento de Magda Soares (1998), “como o processo de

apropriação da literatura enquanto construção literária de sentidos”. Em seguida, há o

construído a partir do conceito de letramento de Kleiman (1995), cuja apropriação ocorre por

meio da inclusão da palavra “literária” na definição do conceito, a saber: “conjunto de

práticas sociais que usam a escrita literária, como sistema simbólico e como tecnologia, em

contextos específicos, para objetivos específicos” (ANDRADE, 2008, p. 57, grifos nossos).

Entre os cento e cinquenta e um (151) trabalhos encontrados sobre o letramento

literário, dezenove (19) são ensaios e cento e trinta e dois (132), textos de pesquisas. Estes

últimos estão organizados em duas categorias: Práticas de letramento literário e Práticas

escolares de letramento literário. Tais categorias contam com as seguintes subcategorias:

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Práticas de letramento literário:

1) História de leitura literária

2) Práticas de leitura literária

3) Biblioteca comunitária

Práticas escolares de letramento literário:

1) Políticas públicas/programas de livro e/ou de

leitura

2) Biblioteca escolar/sala de leitura

3) Ensino de literatura:

a. Formação docente;

b. Práticas docentes;

c. Práticas docentes e interlocução com discentes;

d. Práticas do pesquisador com discentes ou com

responsáveis de discentes;

e. Propostas didáticas do pesquisador;

f. Práticas de leitura e/ou escrita dos discentes;

g. Textos impressos e digitais.

Toda a revisão bibliográfica realizada está sintetizada em três quadros que se

encontram nos apêndices A, B e C deste trabalho. No apêndice A está o mapeamento dos

artigos; no B, o de teses e dissertações; e no C há o mapeamento categorizado de teses,

dissertações e artigos sobre o letramento literário.

Segundo os critérios explicitados, a revisão bibliográfica revelou que não há estudos

sobre a vivência estética em práticas escolares de letramento literário. Todavia, encontramos

duas pesquisas que tratam da disciplina Literatura no CPII: As histórias da gente que cabem

num livro: experiências de leitura nas aulas de Literatura do primeiro ano do Ensino

Fundamental (SILVA, R., 2011) e Lobato, infância e leitura: a obra infantil de Monteiro

Lobato em diálogo com crianças na escola da atualidade (TRAVASSOS, 2013), ambas da

UFRJ3. Das duas pesquisas, o estudo de Silva (2011) foi o que mais se aproximou da nossa

investigação, pois, além de tratar das aulas de Literatura, refere-se ao currículo da disciplina,

um dos tópicos deste trabalho.

Silva (2011), em As histórias da gente que cabem num livro: experiências de leitura

nas aulas de Literatura do primeiro ano do Ensino Fundamental, teve como objetivo

conhecer e analisar experiências que a literatura proporciona às crianças de uma turma do 1º

ano do Ensino Fundamental do CPII do campus São Cristóvão I. A pesquisadora concluiu

3 Há uma dissertação que também trata da disciplina Literatura no CPII, mas não entrou no levantamento por não

apresentar o descritor letramento literário. Em Formação do leitor: um bicho de quantas cabeças?, Vinco (2006)

investiga aspectos do trabalho de formação de leitores desenvolvidos no colégio no campus São Cristóvão I. A

pesquisadora traz memórias dos professores em relação às práticas de ensino de Literatura nos anos iniciais, e

também memórias dos alunos em relação à sua formação tanto no primeiro segmento do EFI quanto no restante

da escolaridade no colégio. Embora tal dissertação não contemple o descritor letramento literário, é importante para a pesquisa porque aborda a história da disciplina Literatura no CPII por meio de entrevistas com

professores, além de revelar que as experiências vividas pelos alunos dos anos iniciais, não só nas aulas de

Literatura, mas em outras atividades escolares, foram importantes para a constituição de subjetividades mais

sensíveis à linguagem artística.

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que, embora as crianças fossem do 1º ano, as aulas de Literatura tinham como objetivo a

leitura no sentido amplo. Sob a orientação da coordenação pedagógica, a professora planejava

a aula, escolhendo previamente as leituras e as atividades propostas após a leitura. Ela lia de

modo fluente, sem interpretações teatrais, mas de forma envolvente devido às entonações e

pausas e pelo gesto de virar as páginas e mostrar as ilustrações. As crianças se acomodavam

voluntariamente para o momento da leitura. Em seguida, aceitavam bem as propostas a serem

realizadas nas mesas, quando então reteciam as histórias, desenhando, colando fragmentos,

entre muitas conversas nos pequenos grupos.

A pesquisadora concluiu que as crianças leem de diversas formas. A história desloca a

criança do lugar onde está e, de corpo inteiro, ela entra na história e se torna

momentaneamente um personagem. As crianças negociam, confrontam informações, afirmam

um posicionamento social e ampliam suas visões de mundo quando têm a oportunidade de

ouvir e falar. Elas não são facilmente conduzidas e nem sempre leem de forma linear. As

crianças puxam fios de suas experiências e leem com o que trazem de suas culturas. Além

disso, estabelecem relações entre as histórias e seus acervos. A pesquisadora ainda concluiu

que a leitura se faz nas interações com o texto e na troca entre os pares, e que a proposta

curricular do CPII é uma estratégia interessante para a formação de leitores, além de uma

referência para outras escolas. Silva (2011) ressaltou a importância do planejamento

pedagógico para a escolha dos livros que são lidos e a criação das atividades pedagógicas

propostas após a leitura, reiterando a necessidade de haver tempo para ouvir as crianças, pois,

quando ouvidas, podemos aprender com elas a desautomatizar as percepções que temos das

coisas e de nós. É necessário tempo para tecer nossas narrativas e pô-las em rede.

A dissertação de Travassos (2013), intitulada Lobato, infância e leitura: a obra

infantil de Monteiro Lobato em diálogo com crianças na escola da atualidade, tratou das

concepções de infância e leitura da obra infantil de Monteiro Lobato e sobre a leitura da obra

do autor na escola. O objetivo foi analisar tal obra e suas relações com a infância e a leitura,

tanto no âmbito dela própria quanto no diálogo com leitores/crianças do mundo

contemporâneo. A pesquisadora trabalhou com turmas do 1º, 2º e 3º anos e esteve em dois

campos de pesquisa, em uma escola municipal e no CPII, onde investigou turmas do 1º e do

2º ano.

A análise sobre a infância na obra de Lobato concluiu que as principais personagens

são crianças livres, que imaginam, trocam ideias, resolvem problemas, criando e recriando o

universo à sua volta. Elas são sujeitos ativos, constituídos na cultura e produtores de cultura.

Essa criança lobatiana está imersa no imaginário e, a partir dele e com ele, dialoga com o

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mundo real, ressignificando-o. Dessa forma, a marca da concepção de infância do autor é a

valorização e o respeito pelo imaginário infantil.

Travassos (2013) trata ainda da mediação dialógica da atividade proposta e destaca

algumas estratégias significativas para tal mediação: ler em voz alta; ler em capítulos; ler

fazendo gestos; ler mostrando ilustrações; ler, perguntar e anunciar; ler partes do texto e

adaptar outras; ampliar a compreensão dos ouvintes/leitores sobre elementos de outra época

ou ambiente; e ler dramatizando. O professor deve ler sem explicar tudo e traduzir tudo para

os leitores, deixando espaço para eles perguntarem. A pesquisadora também abordou os

modos de ler das crianças, tais como: lendo de corpo inteiro; lendo com a TV; leitura com e

para os pares; negociação e produção de sentidos; produção de sentidos a partir de recriações;

diálogo com os textos a partir da linguagem literária; diálogo com os textos a partir da

identificação com as personagens; e diálogo com os textos a partir das ilustrações.

Conforme dito anteriormente, nesta revisão bibliográfica não encontramos estudos que

tratassem do conceito de vivência estética. Assim, o conceito precisou de mais

aprofundamento teórico, o que foi possibilitado com a realização do doutorado sanduíche, em

2015, na Universidade Autônoma de Barcelona (UAB). Sob a orientação da Profª. Drª. Teresa

Colomer, essa experiência durou quatro meses (setembro a dezembro) e permitiu a minha

participação em duas disciplinas na graduação da Faculdade de Educação Literatura

Infantil e Biblioteca Escolar , em reuniões com o grupo de pesquisa e em aulas do curso de

mestrado em Literatura Infantil e Juvenil. Ademais, possibilitou a realização de um estágio

semanal na Creche Escuela Bressol Can Caralleu, a visita à biblioteca escolar da Escuela

Orlandai, as conversas com pesquisadores e os encontros de orientação com a Profª. Drª.

Teresa Colomer.

A experiência do doutorado sanduíche me levou à constatação de que a vivência

estética é uma parte do todo, isto é: uma das dimensões da literatura no âmbito da educação

literária. Além disso, concluí que, metodologicamente, não é possível descrever e analisar

como uma pessoa vivencia esteticamente aulas de Literatura. No máximo poderíamos dizer

que ela provavelmente vivenciou esteticamente tais aulas, a partir do relato das

transformações que viveu, das emoções que sentiu, das reflexões que realizou.

No doutorado tive acesso ao livro La experiencia de la lectura (LARROSA, 2003),

que propiciou o entendimento de que os conceitos de experiência estética e vivência estética

tratam da mesma questão sob pontos de vista diferentes, um da Psicologia (VIGOTSKI, 2010)

e outro da Filosofia (LARROSA, 2003). Concluí ainda que ambos os conceitos, inclusive o

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bakhtiniano de contemplação estética (BAKHTIN, 1993b), atuam como uma parte do todo

naquilo que o letramento literário e a educação literária abarcam.

O doutorado sanduíche nos aproximou do conceito de educação literária, e para

compreendê-lo melhor realizei outra revisão bibliográfica. Elegi como critério teses

orientadas pela Profª. Drª. Teresa Colomer na UAB. A escolha pela professora se deve ao

marco que sua tese representou no desenvolvimento do conceito de educação literária e ao

fato de que ela é a principal pesquisadora de um dos grupos de pesquisa da área mais

representativos da Europa, o Grupo de Investigación de Literatura Infantil y Juvenil y

Educación Literaria (Gretel/UAB).

Optei pelo período de dez anos, contados a partir do ano em que vivi o doutorado, e

assim busquei teses do período de 2005 a 2015 no site do próprio grupo de pesquisa.

Selecionei trabalhos com o descritor educação literária produzidos no âmbito do

Departamento de Didática da Língua e da Literatura. Encontrei sete (7) teses que podem estar

organizadas em três categorias: Literatura infantil, Educação primária e Educação

secundária. O apêndice D mostra o mapeamento dessas pesquisas.

Das teses encontradas, destaco a pesquisa Qué han de saber los niños sobre

literatura? Conocimientos literarios y tipos de actuaciones que permiten progresar en la

competencia literaria, escrita por Martina Fittipaldi (2013). A pesquisa tratou de currículos de

Literatura do último ciclo da escola primária de Catalunha, Espanha, França, Inglaterra e

Quebec. Os objetivos da pesquisa foram, em primeiro lugar, revisar as principais

contribuições da Didática da Literatura durante as últimas décadas em relação às

aprendizagens e às práticas que favorecem a educação literária das crianças; em segundo

lugar, conhecer as legislações educativas sobre os modos de organizar as competências e as

metodologias de trabalho literário a partir da descrição e da análise dos diferentes currículos.

Além disso, pôr em relação os dois objetivos iniciais a fim de assinalar quais dos aspectos

comuns defendidos pelas pesquisas da área da Didática da Literatura são retomados. Por fim,

estabelecer uma proposta em torno das aprendizagens literárias e das maneiras de organizá-las

para a educação primária. A tese colaborou ainda na descrição e na análise do currículo de

Literatura do CPII.

Além da pesquisa de Fittipaldi (2013), ressalto a investigação de Felipe Munita

(2014), intitulada El mediador escolar de lectura literaria. Un estudio del espacio de

encuentro entre prácticas didácticas, sistemas de creencias y trayectorias personales de

lectura. O pesquisador investiga os mediadores escolares de leitura literária (estudantes do

magistério e professoras em exercício), e sua tese contribuiu para a parte metodológica do

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nosso trabalho. Ele traz perguntas de entrevistas com docentes e apresenta ainda um

instrumento de observação de aulas de Literatura, chamado de Pauta de

Observação/Sistematização de Práticas Didáticas em Educação Literária (Popradel), com o

objetivo de contribuir com a compreensão dos diversos âmbitos que influenciam as práticas

de um mediador de leitura literária no contexto escolar.

Após as duas revisões bibliográficas, foram encontrados cento e cinquenta e oito (158)

trabalhos, e desse universo as dissertações de Silva (2011) e Travassos (2013) e as teses de

Fittipaldi (2013) e Munita (2014) representam os trabalhos que mais dialogaram com esta

investigação.

Considerando a experiência do doutorado sanduíche sob a orientação da Profª. Drª.

Patrícia Corsino, alteramos novamente a pergunta de pesquisa de Como alunos e professores

vivenciam esteticamente aulas de Literatura dos anos iniciais do Colégio Pedro II campus

Humaitá I? para O que se ensina nas aulas de Literatura do Ensino Fundamental I do

Colégio Pedro II campus Humaitá I? Todavia, a banca do 2º Exame de Qualificação

problematizou a última pergunta, afirmando que o trabalho abarcava mais do que estávamos

indagando. Dessa maneira, modificamos mais uma vez a pergunta de pesquisa e saímos do

que se ensina para as aulas de Literatura. Perguntamos: Como são as aulas de Literatura do

Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá? O que estas aulas fazem com

os sujeitos e o que eles fazem nela?

A escolha do CPII como campo de pesquisa se deu por diversas razões. Entre elas

destaco o fato de o colégio apresentar um currículo específico, equipe pedagógica própria e

tempo semanal garantido na grade curricular para as aulas de Literatura4. Sabemos que por lei

não há a obrigatoriedade de um currículo específico de Literatura nas escolas públicas

brasileiras do EFI, e como há no CPII entendemos que valeria a pena investigar tal

especificidade. Ademais, a disciplina no campus Humaitá I nunca fora pesquisada no meio

acadêmico, embora exista há trinta anos. O enfoque no EFI foi escolhido devido à minha

própria trajetória profissional e às questões que envolvem a alfabetização. Esta etapa da

Educação Básica representa uma especificidade, na qual o trabalho com a literatura pode ser

um grande aliado. Queríamos ver como ele era conduzido. Além disso, vivemos um momento

especial do colégio, pois o EFI completou trinta anos em 2016, o que, entre outras coisas,

instigava a equipe a se pensar, a fazer retrospectivas, e também, para alguns professores, a

4 Vale ressaltar que a literatura também está presente em outros espaços e ações docentes, ou seja, não se

circunscreve somente às aulas de Literatura. Como exemplo temos o Clube de Leitura que acontece no campus

São Cristóvão I. Para conhecer mais sobre o trabalho, ver: COELHO, Dione. Crianças leitoras e suas escolhas

literárias: um estudo com alunos do 5º ano do Colégio Pedro II. UFRJ, 2015.

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atingir o tempo para se aposentar. Assim, investigamos a equipe pedagógica, composta por

uma coordenadora e duas professoras, e tivemos contato com duas coordenadoras, a última e

a atual, e com as duas professoras de Literatura que estavam na ativa.

Por tais razões escolhemos esse campo e sujeitos de pesquisa. E por que a Literatura?

O que a disciplina apresenta que faz valer a pena um olhar de pesquisador? Partimos do

princípio, com base em Candido (1972), de que a literatura se constitui como um bem

incompressível, isto é, imprescindível ao sujeito, que se insere na ordem dos direitos

humanos. Já com base em Vigotski (2008) entendemos que a literatura atua no âmago do

processo de desenvolvimento do ser humano, no seu mundo simbólico e no processo de

imaginação e criação, e é uma das responsáveis pelo desenvolvimento não apenas cultural do

homem, mas também artístico, técnico e científico.

A capacidade de criação faz do homem um ser projetado para o futuro, capaz de

modificar o seu presente. Essa capacidade é denominada pela Psicologia de imaginação ou

fantasia. Embora no senso comum a imaginação seja compreendida como o não real, para

Vigotski (2008, p. 13) todo o mundo da cultura, diferentemente do mundo da natureza, é

produto da imaginação e da criação humana.

Larrosa (2003, p. 27) defende que a imaginação tem uma relação reprodutora e

produtiva com a realidade, pois está ligada à capacidade produtiva da linguagem. O autor

relembra que, como fictio vem da palavra facere, podemos afirmar que o que ficcionamos é

algo feito. A imaginação produz, incrementa e transforma a realidade.

Uma das questões importantes da Psicologia e da Pedagogia, no dizer de Vigotski

(2008, p. 15), é a capacidade criadora das crianças. O fomento dessa capacidade, presente nas

brincadeiras, na leitura de textos literários, é fundamental para o desenvolvimento humano.

Ao brincar, ouvir histórias e poemas, as crianças não se limitam a reproduzir a realidade. Elas

reelaboram criadoramente, combinam experiências e criam novas realidades.

Se quisermos proporcionar às crianças bases sólidas para a sua atividade criadora,

Vigotski (2008, p. 20) recomenda que ampliemos as suas experiências. Quanto mais elas

veem, ouvem, experimentam, aprendem, de quanto mais elementos dispõem para imaginar e

criar, mais produtivas serão as atividades de sua imaginação. Para o autor, a imaginação

também se converte em um meio de ampliar a experiência do homem. Ao serem capazes de

imaginar o que não viram, o que não experimentaram diretamente, por via da narrativa de

outro, as crianças não ficam fechadas ao círculo estreito de sua própria experiência

(VIGOTSKI, 2008, p. 21-22). Outra relação que o autor faz entre imaginação e realidade é

que as emoções que nos contagiam por meio das imagens artísticas, filhas da fantasia, são

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reais. Elas nos emocionam mesmo sabendo que são elucubrações da fantasia. Por sua vez, a

fantasia também pode construir algo novo. Ao receber forma nova, começa a existir no

mundo e a influenciar os demais objetos. Assim, na teoria de Vigotski (2008, p. 17) a

imaginação não é um divertimento caprichoso do cérebro, mas uma função vital.

Para Calvino (2016, p. 108-109) a imaginação é a alma do mundo. Uma pedagogia da

imaginação seria uma maneira de nos habituar à visibilidade, “a controlar a própria visão

interior sem sufocá-la e sem, por outro lado, deixá-la cair num confuso e passageiro fantasiar,

mas permitindo que as imagens se cristalizem numa forma bem definida, memorável,

autossuficiente” (CALVINO, 2016, p. 110). Segundo o autor, muitos elementos concorrem

para a formação da parte visual da imaginação literária, como a observação direta do mundo

real, a transfiguração fantasmática e onírica, o mundo figurativo transmitido pela cultura e um

processo de abstração, condensação e interiorização da experiência sensível, importante tanto

na visualização quanto na verbalização do pensamento (CALVINO, 2016, p. 112).

De acordo com Vigotski (2008, p. 98), o homem terá que conquistar o seu futuro com

a sua imaginação criadora. Como a imaginação tem como função básica orientar o porvir, um

dos princípios do trabalho com a literatura na escola consistiria, então, em preparar o aluno

para esse porvir? Por meio da criação artística, que imprime à fantasia uma direção nova que

fica para toda a vida, a criança aprofunda, alarga e depura a sua vida emocional, e, ao

exercitar a imaginação e a criação, vai dominando a linguagem, organizando, formulando e

transmitindo seus pensamentos, sentimentos, seu mundo interior. Em suma, a criação artística

não é apenas uma forma de expressão do sujeito, mas também a possibilidade de ele

desenvolver a imaginação criadora.

Tais afirmações se relacionam com uma das proposições de Larrosa (2003, p. 25-26):

pensar a leitura como formação. Isso significa compreender a leitura como uma atividade

relacionada com a subjetividade do leitor. Trata-se de pensar a leitura como algo que nos

forma, que nos constitui, ou nos põe em questão com aquilo que somos.

Para que a leitura resulte em formação é necessário que haja uma relação íntima entre

o texto e a subjetividade. Essa relação poderia ser pensada como experiência. Do ponto de

vista de Larrosa (2003, p. 29), a experiência seria o que nos passa. Ele explicita que ex-per-

ientia significa sair afora e passar através. Em alemão, experiência (erfahrung) se traduz

normalmente por viajar. Em português, experiência é “aquilo que nos acontece”; em francês,

“aquilo que nos chega”; em italiano, “aquilo que nos sucede”; em inglês, “o que acontece

conosco”. A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos chega (LARROSA,

2003, p. 87, grifos do autor).

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A ciência moderna, desconfiada da experiência, converteu-a em experimento. Nesse

caso, a experiência se torna método da ciência objetiva (LARROSA, 2003, p. 35). A literatura

vem, então, na contramão desse conceito de experiência como experimento, já que “exprime o

homem e depois atua na própria formação” dele (CANDIDO, 1972, p. 804).

Compreendendo também que a literatura responde a um projeto de conhecimento do

homem e do mundo, Compagnon (2012, p. 37-52), ao discutir a literatura ao longo de sua

história, observa seus quatro poderes. Inicialmente, na Grécia Antiga, a literatura era vista

como o que deleita e instrui. Aristóteles colocava o prazer de aprender na origem da arte

poética. Para ele as finalidades da literatura eram duas: instruir ou agradar, ou instruir

agradando. O mesmo era reconhecido por Horácio, que qualificava a poesia como doce e útil

(COMPAGNON, 2014, p. 35). Para o modelo humanista, mais próximo da acepção clássica, a

experiência literária possibilitaria a construção de um conhecimento do mundo e dos homens.

Mas que conhecimento é esse que a literatura daria ao homem? Segundo a tradição clássica,

esse conhecimento tem por objeto o que é geral, isto é, aquilo que permite compreender e

regular o comportamento humano e a vida social. De acordo com a visão romântica, esse

conhecimento se refere ao que é individual e singular. Para Compagnon (2014) essa

concepção de conhecimento literário correspondeu à visão de mundo de uma classe em

particular: a burguesia, que via no leitor o modelo de homem livre. Assim, a subjetividade

moderna teria se desenvolvido com a ajuda da literatura: “Atravessando o outro, ele atinge o

universal: na experiência do leitor, „a barreira do eu individual, na qual ele era um homem

como os outros, ruiu‟ (Proust), „eu é um outro‟ (Rimbaud)” (COMPAGNON, 2014, p. 36).

Se a literatura tem o poder de deleitar e instruir, conforme a visão de uma determinada

classe social, confirmando um consenso, ela também pode produzir a dissensão, o novo, a

ruptura (COMPAGNON, 2014, p. 36-37). Este seria para o autor o seu segundo poder. Já o

terceiro poder da literatura trataria da sua capacidade de falar a todo o mundo, recorrer à

língua comum e transformá-la em uma língua particular, a literária.

Calvino (2016) alerta que, na perspectiva da transformação da língua, a literatura não

pode ignorar a exatidão. O justo emprego da linguagem é que permite o aproximar-se das

coisas (presentes ou ausentes) com discrição, atenção e cautela, respeitando o que as coisas

comunicam sem o recurso das palavras. Tal transformação, para Calvino (2016, p. 41),

também não deve prescindir da leveza. A leveza é uma reação ao peso do viver, um respiro.

Quando um texto literário a alcança, cumpre sua função existencial. Para Compagnon (2012,

p. 52) este seria o quarto poder da literatura.

De acordo com Jouve (2012), nossas leituras literárias organizam e reorganizam a

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nossa experiência, colocam-nos no campo dos possíveis e nos lembram de que as coisas

poderiam ser diferentes do que são. Elas solicitam as nossas capacidades de análise e reflexão,

pois supõem um trabalho ativo e dinâmico sobre o texto. Favorecendo a liberdade de juízo, a

literatura leva o leitor a um trabalho intelectual devido à organização estética do texto. Ela

exprime conteúdos diversos, principais e secundários, evidentes e problemáticos, coerentes e

contraditórios. Aí está um dos seus valores, a natureza e a originalidade dos saberes que

veicula. Isso só é possível por causa da liberdade que a funda (JOUVE, 2012, p. 163-165).

Para Barthes (2013, p. 18), caso todas as nossas disciplinas fossem expulsas do ensino,

somente a Literatura deveria ser salva porque todas as ciências estão presentes nela. A

literatura faz girar os saberes, trabalha nos interstícios da ciência. Ela não diz que sabe alguma

coisa. Mas que sabe de alguma coisa. Coloca lugares diferentes de fala frente a frente. Ela

possibilita vivermos de modo dialético os problemas. Viver de modo dialético significa

apropriar-se de uma visão de conjunto. Conforme observa Carlos Nelson Coutinho (apud

KONDER, 2012, p. 44), a dialética não pensa o todo negando as partes e nem pensa as partes

abstraídas do todo. A dialética pensa as contradições entre as partes, isto é, a diferença entre

elas (o que difere uma obra de arte de um panfleto, por exemplo), como também a união entre

elas, ou seja, a relação entre a arte e a política. Assim, viver de modo dialético os problemas

tem a ver com refletir sobre a parte e o todo, incluindo as contradições existentes.

Em diálogo com a construção de um modo dialético de viver, Calvino (2016, p. 129)

propõe que a multiplicidade seja um valor no âmbito da literatura. Para ele o desafio da

literatura é saber tecer em conjunto os diversos saberes e códigos em uma visão pluralística e

multifacetada do mundo. Um texto multíplice, múltiplo de sujeitos, vozes e olhares sobre o

mundo.

A literatura nos ensina, então, a pensar de modo dialético. Ela nos torna

diferentemente inteligentes (COMPAGNON, 2012, p. 49).

Além de trabalhar nas fronteiras das diferentes ciências, a literatura busca a

representação do real (BARTHES, 2013, p. 22-23). Essa busca vem desde os tempos antigos.

Todavia, o real não é representável, e é por isso que os homens querem sempre representá-lo

por meio de palavras. Dessa maneira, podemos dizer que a literatura também é realista, na

medida em que tem o real por objeto de desejo. Mas ela também é irrealista. Apresenta o

desejo do impossível, da utopia. O escritor teima como um espião que se encontra na

encruzilhada de todos os outros discursos. “Teimar quer dizer, em suma, manter ao revés e

contra tudo a força de uma deriva e de uma espera e é precisamente porque ela teima que a

escritura é levada a deslocar-se” (BARTHES, 2013, p. 27-28). Deslocar-se aqui significa

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transportar-se para um lugar inesperado ou abjurar (renegar) o que escreveu.

Provocando esses deslocamentos, a literatura pode possibilitar ao homem a construção

de traços considerados fundamentais, como “o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a

boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos

problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o

cultivo do humor” (CANDIDO, 2004, p. 22). Ela nos oferece uma nova capacidade de

comunicação com seres diferentes de nós mesmos e possibilita o encontro com outros

sujeitos. Segundo Todorov (2010, p. 80-82), conhecer novas personagens é como encontrar

novas pessoas. Quanto menos essas personagens se parecem conosco, mais ampliado e rico se

torna o nosso horizonte. Tal amplitude interior representa a inclusão na nossa consciência de

novas maneiras de ser junto àquelas que já possuímos. A literatura nos oferece uma nova

capacidade de comunicação com seres diferentes de nós. Aprendemos a pensar colocando-nos

no lugar do outro, sendo o outro pessoas reais ou personagens literários.

Portanto, a literatura tem papel humanizador. Como descrito por Candido (2004, p.

20), o produtor ordena o material bruto, organiza e assim constrói uma mensagem. Por essa

razão o nosso caos interior também se ordena e, dessa maneira, a mensagem atua. A obra

literária pressupõe a superação desse caos, o qual, com um arranjo especial das palavras,

constrói uma proposta de sentido. Compagnon (2012) afirma que a literatura não é a única a

dar forma à experiência humana, mas tem sua especificidade:

Todas as formas de narração, que compreendem o filme e a história, falam-nos da

vida humana. O romance o faz, entretanto, com mais atenção que a imagem móvel e

mais eficácia que a anedota policial, pois seu instrumento penetrante é a língua, e ele

deixa toda a sua liberdade para a experiência imaginária e para a deliberação moral,

particularmente na solidão prolongada da leitura. Aí o tempo é meu. Sem dúvida

posso suspender o desenrolar do filme, pará-lo em uma imagem, mas ele durará sempre uma hora e meia, ao passo que eu dito o ritmo de minha leitura e das

aprovações e condenações que ela suscita em mim. Eis por que a literatura continua

sendo a melhor introdução à inteligência da imagem. E a literatura romance,

poesia ou teatro inicia-me superiormente às finesses da língua e às delicadezas do diálogo [...]. A literatura não é a única, mas é mais atenta que a imagem e mais

eficaz que o documento, e isso é suficiente para garantir seu valor perene

(COMPAGNON, 2012, p. 70-71). Dessa maneira, a literatura acessa regiões da experiência que outros discursos

negligenciam. Ela nos liberta das maneiras convencionais de pensar a vida, a nossa e a dos

outros (COMPAGNON, 2012, p. 64-65). A literatura é vida em discurso.

Para Larrosa (2003, p. 39) o sentido de quem somos está construído narrativamente.

Então, as histórias que escutamos e lemos, assim como o funcionamento dessas histórias no

interior das práticas sociais, como as pedagógicas, terão um papel muito importante. Em

consonância com essa ideia, Colomer (2017, p. 19-20) defende que a literatura deve cumprir,

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principalmente, três funções: a) iniciar o acesso ao imaginário compartilhado por uma

determinada sociedade; b) desenvolver o domínio da linguagem através das formas narrativas,

poéticas e dramáticas do discurso literário; e c) oferecer uma representação articulada do

mundo que sirva como instrumento de socialização das novas gerações.

A literatura tem função vital na escola. Larrosa (2003, p. 45-46) afirma que aprender a

ler não é somente adquirir a capacidade de entender o que o texto enuncia na superfície, e sim

ser capaz de escutar no que foi dito o que está nas entrelinhas, nos presumidos. Assim, a ação

de ler vai além do texto. Permitir que as crianças tomem a palavra implica a ruptura com o

dito. Distanciar-se em relação ao que foi dito e transgredir as regras do dizer. Assim é que, ao

se ensinar a ler, ensina-se uma relação com o texto, uma forma de atenção, uma atitude de

escuta, uma inquietude, uma abertura. Isso não significa somente deixar que as crianças leiam.

Significa fazer com que a experiência seja possível, como manter a biblioteca viva como um

espaço de formação.

Diante do exposto, retomamos a indagação: Como são as aulas de Literatura do

Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá? O que estas aulas fazem com

os sujeitos e o que eles fazem nela?

Com o objetivo geral de compreender as aulas de Literatura do EFI do CPII campus

Humaitá, percorremos os seguintes objetivos específicos:

1) Analisar a proposta curricular de Literatura do CPII e sua articulação com as aulas

de Literatura;

2) Conhecer e analisar o que fazem as professoras e o que orienta a coordenação

pedagógica de Literatura no que se refere à metodologia, aos objetivos, aos conteúdos, às

atividades pedagógicas, ao corpus literário e aos critérios de seleção dele;

3) Compreender o significado que as professoras e a coordenação pedagógica de

Literatura atribuem às aulas, além das concepções de leitura literária que sustentam suas

aulas.

Para tanto, realizamos uma pesquisa qualitativa com base em características da

pesquisa em Ciências Humanas, de acordo com Bakhtin (2003). O encontro entre pesquisador

e pesquisado aconteceu por meio de dois procedimentos teórico-metodológicos: observação

participante (TURA, 2003) e entrevistas (ZAGO, 2003).

A tese está organizada da seguinte maneira:

O primeiro capítulo “O letramento literário e a educação literária” traz a

definição de cada um desses conceitos e discute sobre literatura, literatura infantil e arte.

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O segundo capítulo “A formação literária” apresenta uma abordagem formativa

para se pensar a literatura na escola.

O terceiro “As linhas de força de promoção da leitura” relaciona as linhas de

força que estão em disputa nas aulas de Literatura com as dimensões da literatura.

O quarto “Questões teórico-metodológicas” apresenta o marco metodológico da

pesquisa e o perfil dos sujeitos pesquisados.

O quinto capítulo “Proposta curricular das aulas de Literatura do Ensino

Fundamental I do Colégio Pedro II” apresenta e analisa a proposta curricular das aulas de

Literatura do referido colégio.

O sexto capítulo “Aulas de Literatura no Colégio Pedro II: entre concepções e

práticas” descreve e analisa o que fazem as professoras e o que orienta a coordenadora

pedagógica quanto à metodologia, aos objetivos, aos conteúdos, às atividades pedagógicas e

ao corpus literário; os significados que as professoras de Literatura e a coordenadora atribuem

às aulas de Literatura; e as concepções de leitura literária que sustentam suas aulas.

Em seguida, apresentamos as considerações finais da investigação. E, por fim,

listamos as referências bibliográficas e compartilhamos as revisões bibliográficas, bem como

o roteiro das entrevistas realizadas, os temas geradores e os gêneros discursivos selecionados

para as aulas de Literatura (apêndices).

Para início de conversa, vamos, então, tratar dos conceitos de letramento literário e

educação literária. O que significa cada um deles? Há aproximações?

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1 O LETRAMENTO LITERÁRIO E A EDUCAÇÃO LITERÁRIA

Arte, diriam os „práticos‟, arte para quê? É perda de tempo, é „frescura‟ de gente

desocupada. Arte hoje não tem valor próprio, só vale se virar indústria e comércio,

se tiver valor no mercado. Há muita discussão.

PAULINO, 1999, p. 53

Este capítulo se coloca na tensão entre “o quê” e o “para quê” de se ensinar literatura

para as crianças dos anos iniciais do EF. Há lugar para a arte literária na escola? A utilidade

do inútil dentro da escola encontra espaço na discussão que vamos tecer. Inicialmente,

trazemos algumas definições de literatura. Em seguida, apresentamos dois conceitos, o de

letramento literário e o de educação literária, que são pano de fundo da discussão acerca da

escolarização da literatura.

1.1 Quando é literatura?

Abordar os livros destinados a crianças e jovens como literatura (LAJOLO;

ZILBERMAN, 2017) e literatura como arte supõe termos definidos previamente ambos os

conceitos. No mundo contemporâneo, porém, não há consenso sobre eles, de modo que nosso

posicionamento representa uma das abordagens em disputa.

Em conformidade com Lajolo e Zilberman (2017, p. 12-14), partimos da ideia de que

os livros para crianças e jovens são literatura não infantil, e que pertencem a um amplo

sistema simbólico que inclui todas as “criações de toque poético, ficcional ou dramático em

todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos

folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das

grandes civilizações” (CANDIDO, 2004, p. 16). Tal definição de literatura, a nosso ver, é a

mais adequada para refletirmos sobre a literatura na escola, pois inclui gêneros discursivos

que nela são valorizados, como as parlendas, o cordel e as cantigas de roda. Esse sistema

simbólico é composto por obras

ligadas por denominadores comuns, que [...] são, além das características internas

(língua, temas, imagens), certos elementos de natureza social e psíquica, embora

literariamente organizados, que se manifestam historicamente e fazem da literatura

aspecto orgânico da civilização. Entre eles se distinguem: a existência de um

conjunto de produtores literários, mais ou menos conscientes do seu papel; um

conjunto de receptores, formando os diferentes tipos de públicos, sem os quais a

obra não vive; um mecanismo transmissor, (de modo geral, uma linguagem,

traduzida em estilos), que liga uns a outros. O conjunto dos três elementos dá lugar a

um tipo de comunicação inter-humana, a literatura, que aparece sob este ângulo

como sistema simbólico, por meio do qual veleidades mais profundas do indivíduo

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se transformam em elementos de contacto entre os homens, e de interpretação das

diferentes esferas da realidade (CANDIDO, 2009, p. 25).

A escolha por uma das definições existentes de literatura denota que essa categoria

não é eterna, imutável e muito menos objetiva. Sua instabilidade resulta do fato de juízos de

valor serem variáveis (EAGLETON, 2006, p. 16). De acordo com Eagleton (2006, p. 22-24),

valor é um termo transitivo que significa tudo aquilo que é considerado valioso por

determinadas pessoas em situações específicas, conforme critérios específicos e à luz de

determinados objetivos. Esses juízos de valor têm uma relação estreita com as ideologias

sociais e se referem tanto ao gosto particular quanto aos pressupostos pelos quais certos

grupos sociais exercem e mantêm o poder sobre outros. A estrutura de valores é parte do que

entendemos por ideologia. Para o autor, ideologia é a maneira pela qual o que dizemos e o que

acreditamos se relaciona com a estrutura de poder e com as relações de poder da sociedade

em que vivemos.

O „nosso‟ Homero não é igual ao Homero da Idade Média, nem o „nosso‟

Shakespeare é igual ao dos contemporâneos desse autor. Diferentes períodos

históricos construíram um Homero e um Shakespeare „diferentes‟, de acordo com

seus interesses e preocupações próprios, encontrando em seus textos elementos a

serem valorizados ou desvalorizados, embora não necessariamente os mesmos. Todas as obras literárias, em outras palavras, são „reescritas‟, mesmo que

inconscientemente, pelas sociedades que as leem; na verdade, não há releitura de

uma obra que não seja também uma „reescritura‟ (EAGLETON, 2006, p. 18-19).

Segundo Lajolo e Zilberman (2017), possivelmente, a era do livro fomentou a

literatura. Antes dele tínhamos a poesia, o gesto, a imagem, o som, que, por meio da voz, do

corpo, do olhar e da audição, eram transmitidos. Com a escrita, a visão foi direcionada para as

letras, e com a criação do códice houve a diminuição das tarefas da voz e das funções do

corpo, à medida que um conjunto de manuscritos registrados em pergaminho foi reunido em

volumes.

No século I d.C. apareceu o livro no formato que conhecemos atualmente. Todavia,

sua difusão ocorreu somente com a invenção da prensa mecânica em meados do século XV. A

partir de Gutenberg (1398-1468), diversas práticas que aconteciam paralelamente, como a

leitura silenciosa, a cópia artesanal de manuscritos e a organização dos estudos laicos,

estabilizaram-se nas recentes universidades europeias (LAJOLO; ZILBERMAN, 2017, p. 23).

Com a modernidade (século XVI ao XVIII), Lajolo e Zilberman (2017, p. 27) afirmam

que novos gêneros surgiram, como o conto, a novela, o romance, os quais foram definidos de

acordo com diferentes critérios: ora pelos seus consumidores (literatura infantil e juvenil

(LIJ), literatura de massa), ora pelos seus temas (literatura policial, fantástica), ora pelas

formas de relatar (memórias, autobiografia), ora pela sua aplicação (literatura escolar,

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didática, paradidática), e outras vezes ainda pelo seu emprego, como em dicionários,

enciclopédias e receitas culinárias.

No século XVI, conforme nos informa Jouve (2012, p. 29), a literatura significava

cultura, erudição. “Ter literatura” era o mesmo que possuir um saber e pressupunha a afiliação

a uma elite, a um “grupo de pessoas de letras”. Contudo, no século seguinte a maioria dos

nobres não sabia ler e o trabalho intelectual era pouco rentável. Por isso, os escritores

buscaram mecenas e tentaram trabalhar como secretários, bibliotecários e preceptores.

Escrever não tinha prestígio (ABREU, 2003, p. 12-13).

Apesar disso, na França os letrados se organizaram em academias e salões, onde

passaram a obter maior valorização, e essa situação promoveu a participação do Estado.

Nesses espaços, segundo Abreu (2003, p. 13), conviviam matemáticos, filósofos, poetas,

astrônomos, que, aos poucos, foram colaborando na especialização das áreas do saber (Letras,

Ciências e Artes). Entretanto, os limites entre as áreas do saber ainda eram frágeis. A

autonomização da literatura só viria no século XVIII e, mesmo assim, associada a outras

áreas, o que pode ser visto na definição de literatura da Enciclopédia:

LITERATURA (Ciências, Belas-Letras, Antiq.) termo geral que designa a erudição,

o conhecimento das Belas-Letras e das matérias que com ela têm relação. Veja o

verbete LETRAS, em que, fazendo seu elogio, se demonstra sua íntima união com

as Ciências propriamente ditas (DIDEROT; D‟ ALEMBERT apud ABREU, 2003,

p. 14).

De acordo com Eagleton (2006), a expressão Belas-Letras ou bela escrita denota uma

escrita muito respeitada que pode ou não nos levar à opinião de que um exemplo dela é

“belo”. Tal expressão traz embutida a ideia de que a literatura é a escrita bela e que o estilo

considerado literário tem que ser do tipo considerado belo. Para o autor essa definição de

literatura como escrita bela não tem validade geral, pois, caso contrário, não existiria a “má

literatura” (EAGLETON, 2006, p. 15).

A noção clássica de Belas-Letras representa a literatura no sentido mais amplo.

Literatura é tudo o que é impresso ou manuscrito, são os livros que estão na biblioteca. Nesse

período do século XVIII, conforme explicita Jouve (2012, p. 30), a literatura incluía tanto as

obras de ficção quanto os escritos históricos, filosóficos e científicos. Porém, entendida dessa

forma, Compagnon (2014) adverte que a literatura perdia a sua especificidade, uma vez que

“sua qualidade propriamente literária lhe é negada” (COMPAGNON, 2014, p. 31).

Com as mudanças ocorridas no mundo da leitura, no final do século XVIII e início do

século XIX, houve a elaboração de um novo conceito de literatura (ABREU, 2003, p. 28),

relacionada com o início de uma nova maneira de ver os estudos literários. Segundo

Compagnon (2012, p. 15, grifo do autor), no final do século XVIII, a literatura era

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compreendida como “una e própria, presença imediata, valor eterno e universal”. Essa

concepção é representada pela tradição teórica dos estudos literários, o que significa que a

atenção está voltada para as noções elementares da disciplina. O texto é um fato da língua. Já

no início do século XIX há uma preocupação com o contexto e atenção para com o outro

(COMPAGNON, 2012, p. 21). Nessa outra tradição dos estudos literários, caracterizada por

ser histórica, a literatura é vista como outro na distância de seu tempo e de seu lugar. O texto

é documento (COMPAGNON, 2012, p. 15).

Além do surgimento de um novo conceito de literatura, o mundo da leitura continuava

sofrendo alterações. De acordo com Abreu (2003, p. 19-23), o aumento do número de

alfabetizados tornou a leitura mais acessível, o que possibilitou o surgimento de novas formas

de circulação de notícias e o aumento da produção editorial.

O ato de ler e escrever deixou de ser uma distinção social. Isso fez com que surgissem

novas formas de hierarquização do saber. Alguns dos protagonistas dessa hierarquização

foram os críticos e os acadêmicos, que se constituíram em um grupo que postulava,

reconhecia e avaliava a natureza literária de certos textos. A eles foi dada a responsabilidade

de estabelecer, alterar e legislar sobre a identidade e o valor dos escritos que ansiavam pelo

status de arte (LAJOLO; ZILBERMAN, 2017, p. 27).

Segundo Abreu (2003, p. 18), no início do século XIX, Voltaire introduziu as

categorias gosto e beleza como um critério de qualidade literária. Elas influenciaram a

elaboração das historiografias literárias. Apesar delas, a definição de literatura como um

conjunto de conhecimentos se manteve. No fim do século XIX tal definição mudou, conforme

apontado anteriormente. Foi mantida a noção de saber e acrescentada a de produção.

LITTERATURA: neste e der. S.f. (do Lat.) Erudição, sciencia, noticia das boas

lettras, e humanidades [...] O conjunto das producções literárias d‟uma nação, d‟um

paiz, d‟uma época (SILVA apud ABREU, 2003, p. 31).

O estudo da literatura no período era a via para a compreensão de uma nação. A

filologia do século XIX entendia que pela língua, pela literatura e pela cultura estaria formada

uma unidade que identificaria uma nação. A filologia desse século desejava ser o estudo de

toda uma cultura, da qual a literatura era o testemunho mais próximo (COMPAGNON, 2014,

p. 31).

A literatura reinava, e o tradicional sistema de gêneros poéticos, perpetuado desde a

Antiguidade por Aristóteles, entrava em declínio. Conforme explica Compagnon (2014, p. 32-

38), esse sistema compreendia apenas os gêneros épico e dramático. Ele não incluía o lírico,

pois não o considerava ficção. Na modernidade, a narração e o drama estavam abandonando

cada vez mais o verso para adotar a prosa. Dessa maneira, a literatura, que na Antiguidade era

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chamada de poética, já não representava bem o que estava sendo considerado literatura. O

gênero que Aristóteles excluía da poética, a poesia lírica, tornou-se sinônimo de todo poema e

a literatura passou a englobar o romance, o teatro e o poema. Além disso, os gêneros épico e

dramático, identificados com a prosa, e o poético, com o verso, sofreram mais desconstruções

com a entrada do verso livre e do poema em prosa, da prosa rimada, entre outras.

No século XIX, com o aumento da autonomia das ciências positivas, a literatura

deixou de incluir os escritos científicos. Ou seja, passou a limitar-se ao campo da criação

estética. A literatura passa a ser considerada um discurso não pragmático. Para Eagleton

(2006, p. 12), essa definição de literatura como um discurso não pragmático traz consigo

problemas porque ela fica dependente da maneira pela qual alguém resolve ler, e não da

natureza daquilo que é lido. “Se examino o horário dos trens não para descobrir uma conexão,

mas para estimular minhas reflexões gerais sobre a velocidade e complexidade da vida

moderna, então poder-se-ia dizer que o estou lendo como literatura” (EAGLETON, 2006, p.

14). O fato de poemas, peças de teatro e romances não serem textos pragmáticos não garante

que serão lidos dessa maneira. Há textos que nascem literários. Outros atingem essa condição,

e em outros tal condição é imposta. O que importa pode não ser a origem do texto, mas a

maneira como ele é considerado pelas pessoas. Se decidirem que se trata de literatura, então

ele o será. O autor defende que a distinção entre as maneiras prática e não prática de nos

relacionarmos com a linguagem não nos leva ao seu âmago.

Em contraposição a essa concepção (literatura como discurso não pragmático), Jouve

(2012, p. 30-31) apresenta outra definição de literatura que intenta atingir este âmago. A

literatura é o uso estético da linguagem escrita. A delimitação ao campo da criação estética

remeteu à sua riqueza semântica; a um saber que resulta do humano; ao seu caráter inédito; ou

à menção a uma questão humana essencial. O autor ainda destaca que o texto literário

manifesta conteúdos singulares porque não tem que considerar as exigências da realidade nem

as da moralidade.

Como tantos filósofos repetiram desde Frege, o enunciado de ficção não é nem

verdadeiro nem falso (mas apenas, teria dito Aristóteles, „possível‟), ou é

simultaneamente verdadeiro e falso: ele está além ou aquém do verdadeiro e do falso, e o contrato paradoxal de irresponsabilidade recíproca que ele mantém com

seu receptor é um emblema perfeito do famoso desinteressamento estético

(GENETTE apud JOUVE, 2012, p. 121).

Com o envolvimento no mundo de ficção, a literatura nos leva a reavaliar o mundo em

que vivemos. Sempre que uma obra trata de uma das grandes questões, chamadas por Jouve

(2012) de transculturais, ela adquire um alcance geral.

Por todos os lugares e sempre, encontramos conjuntos temáticos mais ou menos

completos, englobando nossas principais preocupações, sociais ou existenciais. O

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nascimento, o amor, a morte, o sucesso e o fracasso, o poder e sua perda, as

revoluções e as guerras, a produção e a distribuição de bens, o estatuto social e a

moralidade, o sagrado e o profano, os temas cômicos da inadaptação e do

isolamento, as fantasias compensatórias etc. atravessam toda a história da ficção,

desde os mitos mais antigos, até a literatura contemporânea. As mudanças de gosto e

de interesses modificam apenas marginalmente esse inventário (PAVEL apud

JOUVE, 2012, p. 124).

Durante muito tempo a ideia de que a literatura é o uso estético da linguagem foi

valorizada. Tal compreensão possibilitou que, no século XX, um grupo de estudiosos

conhecidos como formalistas russos investisse no estudo do que seria a literatura. Para eles a

literatura passa a ser definível porque emprega a linguagem de uma maneira peculiar. Ela

transforma e intensifica a linguagem comum, afasta-se da fala cotidiana, mais denotativa,

espontânea, pragmática, referencial. A linguagem literária, conforme explicita Compagnon

(2014, p. 39), é sistemática (organizada, coerente, densa, complexa), imaginária e estética, e

explora sem fins práticos o material linguístico. Para os formalistas a literatura representa uma

“violência organizada contra a fala comum”, tem leis específicas, estruturas, mecanismos. A

obra literária é um fato material, é feita de palavras (EAGLETON, 2006, p. 3-4).

Porém, como seguir com essa definição de literário se não há uma única fala comum?

Segundo Eagleton (2006), qualquer linguagem em uso consiste em uma variedade muito

complexa de discursos que se diferenciam de acordo com a classe, a região, o gênero, a

situação etc. e que “de forma alguma podem ser simplesmente unificados em uma única

comunidade linguística homogênea” (EAGLETON, 2006, p. 7). Para os formalistas a

literariedade não resulta da utilização de elementos linguísticos próprios, mas de uma

organização diferente (mais densa, coerente, complexa) dos mesmos materiais linguísticos

cotidianos (COMPAGNON, 2014, p. 42).

Esse critério de literariedade é refutável para Compagnon (2014), pois há textos

literários que não se afastam da linguagem cotidiana. O que se considera literário também

pode ser encontrado na linguagem não literária, como é o caso da publicidade. Para os

formalistas literatura seria, então, toda a literatura ou somente certo tipo de literatura: “a

literariedade, segundo a acepção de Jakobson, não recobria senão uma parte da literatura [...]

somente a dicção (poesia), não a ficção (narrativa ou dramática)” (COMPAGNON, 2014, p.

43, grifos do autor).

Segundo Compagnon (2014, p. 34), a literatura reconquistou no século XX uma parte

dos territórios perdidos. Ao lado do romance, do drama e da poesia lírica, o poema em prosa

ganhou espaço nobre e a autobiografia e o relato de viagem foram retomados. Os livros para

crianças, o romance policial e a história em quadrinhos foram assimilados. Diante dessas

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mudanças cabe perguntar: se o que faz com que um texto seja reconhecido como literário

passa por critérios éticos, sociais e ideológicos, podemos definir literariamente a literatura?

Na segunda metade do século XX, Barthes (2013), em sua aula inaugural da cadeira de

Semiologia Literária do Colégio de França, propôs que pensemos da seguinte maneira sobre a

literatura:

literatura não [é] um corpo ou uma sequência de obras, nem mesmo um setor de

comércio ou de ensino, mas o grafo complexo das pegadas de uma prática: a prática de escrever. Nela, viso portanto, essencialmente, ao texto, isto é, ao tecido dos

significantes que constitui a obra, porque o texto é o próprio aflorar da língua, e

porque é no interior da língua que a língua deve ser combatida, desviada: não pela

mensagem de que ela é o instrumento, mas pelo jogo das palavras de que ela é

teatro. Posso portanto dizer, indiferentemente: literatura, escritura ou texto. As

forças de liberdade que residem na literatura não dependem da pessoa civil, do

engajamento político do escritor que, afinal, é apenas um „senhor‟ entre outros, nem

mesmo do conteúdo doutrinal de sua obra, mas do trabalho de deslocamento que ele

exerce sobre a língua: desse ponto de vista (BARTHES, 2013, p. 17-18, grifo do

autor). Para Barthes (2013, p. 87-88) a escritura é a escrita do escritor. Na mesma aula ele

sugere o uso dos termos literatura, escritura ou texto para tratar de todos os discursos em que

as palavras são encenadas e teatralizadas. Eagleton (2006) também propõe que vejamos a

literatura como escrita. Porém, ele se refere à escrita altamente valorizada. Seguindo essa

acepção, no curso da História, qualquer coisa pode vir a ser literatura e qualquer coisa que é

considerada literatura pode deixar de sê-la. Pensar a literatura como uma escrita altamente

valorativa resulta do fato de que os juízos de valor são notoriamente variáveis, como já

apontamos na introdução.

Se não é possível ver a literatura como uma categoria „objetiva‟, descritiva, também

não é possível dizer que a literatura é apenas aquilo que, caprichosamente, queremos

chamar de literatura. Isso porque não há nada de caprichoso nesses tipos de juízos de

valor: eles têm suas raízes em estruturas mais profundas de crenças, tão evidentes e

inabaláveis quanto o edifício do Empire State. Portanto, o que descobrimos até agora

não é apenas que a literatura não existe da mesma maneira que os insetos, e que os

juízos de valor que a constituem são historicamente variáveis, mas que esses juízos

têm, eles próprios, uma estreita relação com as ideologias sociais. Eles se referem,

em última análise, não apenas ao gosto particular mas aos pressupostos pelos quais

certos grupos sociais exercem e mantêm o poder sobre outros (EAGLETON, 2006,

p. 24). Considerando que o que é definido como literatura está diretamente relacionado com

juízos de valor, grupos sociais, poder e ideologias, Compagnon (2014, p. 44-45) propõe outra

definição: literatura é literatura. Literatura é o que se chama aqui e agora de literatura sem

necessariamente remetê-los a seu contexto de origem.

É nesse contexto que Compagnon (2014) propõe que a pergunta O que é literatura?

seja alterada para Quando é literatura?

E quando é literatura infantil?

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1.2 Quando é literatura infantil?

Nesta pesquisa, que estuda a disciplina Literatura no EFI, tratamos da literatura

infantil como literatura, conforme Lajolo e Zilberman (2017) sugerem.

Tanto no Brasil quanto na Europa esses livros serviram a diferentes funções, que, ao

longo da história, foram mudando, de acordo com a concepção de infância existente. Segundo

Corsino (2014, p. 30), “a visão de infância como período de preparo e de criança em falta em

relação ao adulto restringia a literatura infantil à função educativa-instrucional, com perda do

valor artístico”. A produção literária que correspondia a essa visão de infância era composta

de textos que tinham como objetivo tutelar, dirigir, educar, informar o ouvinte/leitor.

Inicialmente, como explicita Colomer (2017, p. 19), foram produzidos verdadeiros exemplos

didáticos de comportamento.

Contudo, na Europa, o público infantil começou a ler coleções populares de histórias,

lendas e contos que eram escritos para todos os públicos. Isso provocou a edição de livros

feitos diretamente para o seu entretenimento. Apesar disso, a função moral foi mantida. Para

Colomer (2017, p. 154-155), ver a infância como um público leitor foi parte da extensão da

alfabetização que aconteceu na sociedade ocidental durante o século XIX. As mulheres, os

trabalhadores e as crianças se incorporaram à possibilidade de leitura. Já na segunda metade

do século XIX foi ampliada a obrigatoriedade da escola gratuita e os livros passaram a ser

vistos como material escolar.

Os primeiros livros brasileiros escritos para crianças surgiram no final do século XIX,

quando o país substituía a monarquia pela república. Seu aparecimento estava ligado à

ascensão de uma nova classe média urbana que também reivindicava novas iniciativas

educacionais. Segundo Zilberman (2014, p. 15), é nesse ponto que um novo mercado começa

a se apresentar. Porém, os escritores da época não contavam com uma tradição para dar

continuidade. A saída encontrada foi traduzir obras estrangeiras, adaptar livros destinados aos

adultos para as crianças, reciclar o material escolar e trazer a tradição popular à tona.

Naquele momento a Europa tanto inspirava a mudança de regime político quanto

oferecia os modelos utilizados para escrever para crianças. De acordo com Zilberman (2014,

p. 18), Carl Jansen foi um dos escritores pioneiros no Brasil. Chegou jovem ao nosso país,

trabalhou como jornalista, professor e traduziu diversos clássicos após constatar que faltavam

livros de histórias apropriados para seus alunos. Além dele, cita-se Figueiredo Pimentel, que

seguiu o caminho dos Irmãos Grimm e publicou coletâneas de sucesso, os Contos da

carochinha, com histórias da tradição popular e oral. Na mesma época estavam sendo

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editados livros didáticos, chamados de seletas, antologias ou livros de leitura. Um dos autores

mais difundidos nesses livros foi Olavo Bilac.

Efetivamente, como nos esclarece Yunes (apud CORSINO, 2014, p. 30), somente a

partir do século XX, após as pesquisas de caráter psicanalítico e pedagógico voltadas para a

criança, é que a linguagem dos textos infantis passa da mensagem para a função pedagógica.

Por conta dessa mudança a condução da narrativa foi alterada. O adulto passa uma mensagem

para um menor que a recebe, compreende e copia. A informação passa a predominar

(CORSINO, 2014, p. 31).

A presença da função didática e a valorização da tradição oral e popular são

observadas na definição de literatura infantil proposta por Arroyo (2011). O autor

toma a literatura infantil em sua acepção ampla, e não simplesmente restrita. O

critério adotado procura reunir, em seu entendimento, por isso mesmo, a tradição

oral, os contos populares, referências a rondas e parlendas, sem exclusão, em

consequência, da literatura escolar ou „propriamente didática‟ [...]. Tudo quanto se destina à criança [...] pode ser chamado infantil. Assim, em seu sentido amplo, tudo

quanto se lhe dê a ler, e, mais, todas as formas literárias da tradição oral, ou do

folclore, tenham elas formas recreativa ou didática, ou ambas, caberá na rubrica de

literatura infantil (ARROYO, 2011, p. 6).

Seguindo a perspectiva educativa-instrucional de literatura infantil, Carl Jansen,

Figueiredo Pimentel e Olavo Bilac foram os desbravadores da literatura infantil brasileira.

Monteiro Lobato foi o sucessor desse núcleo original e sua obra já apontava para a construção

de um novo paradigma. A dissertação de Travassos (2013), encontrada na revisão

bibliográfica desta pesquisa, tratou da concepção de infância presente na obra do autor. A

pesquisadora afirma que as principais personagens são crianças livres que imaginam, trocam

ideias, resolvem problemas, criam e recriam o universo à sua volta. Elas são sujeitos ativos,

constituídos na cultura e produtores de cultura. A criança lobatiana está imersa no imaginário

e, a partir dele e com ele, dialoga com a realidade, ressignificando-a. A concepção de infância

do Lobato tem como marca a valorização e o respeito pelo imaginário infantil. Além de

Lobato, no inicio do século XX, o leitor brasileiro contava com Viriato Correia, Graciliano

Ramos, Érico Veríssimo, Maria José Dupré e Francisco Marins.

Da função moral, passamos para a didática e começamos a construir com Lobato a

função estética da literatura em livros destinados a crianças. Nessa função os textos literários

convocam o leitor/ouvinte a participar da obra, a pensar junto, a brincar, a interagir, a refletir,

a inferir, a opinar, a apreciar, a rir, a chorar, a sentir (CORSINO, 2014, p. 31). Essa mudança

de perspectiva foi acompanhada de uma nova concepção de infância:

a criança passou a ser pensada na sua singularidade e especificidade em relação ao

adulto, concebida como agente social pleno, sujeito ativo constituído na cultura e

também produtor de cultura, cidadã de direitos desde o nascimento cujas ações no

mundo passam a ser entendidas como formas de reelaboração e recriação. Este

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sujeito histórico social passa a ser pensado também na pluralidade e diversidade de

sua vida, portanto, não mais como uma criança em abstrato e uma infância

idealizada, mas crianças e suas infâncias (CORSINO, 2014, p. 31).

Com essa concepção de infância em jogo, no período da ditadura civil-militar, no

começo da década de 1970, autores contemporâneos começaram a ser valorizados e

propuseram uma literatura de contestação em função da repressão política da época,

preferindo dialogar diretamente com o leitor criança (ZILBERMAN, 2014, p. 11-55).

Entre 1980 e 2000, a poesia brasileira destinada a crianças, de acordo com o novo

paradigma da infância, floresceu com poetas como Sérgio Capparelli, Roseana Murray, Elias

José, Leo Cunha, entre outros. Vale ressaltar que o poema dedicado a crianças veio com

Olavo Bilac e depois contou com a força estética de Cecília Meireles, Manuel Bandeira,

Mário Quintana, Vinicius de Moraes, assim como Cora Coralina, José Paulo Paes, Ferreira

Gullar, Manoel de Barros, entre outros.

Um pouco antes do período da ditadura civil-militar, nos anos 1950, tivemos a

presença de Maria Clara Machado, que é até hoje o maior expoente da produção de teatro para

crianças no Brasil. Seus sucessores, conforme explicita Zilberman (2014, p. 153), não se

desvencilharam da proposta da autora. Chico Buarque de Hollanda produziu a peça Os

Saltimbancos, em 1970, preservando o tom contestador e a presença da cultura popular.

A compreensão da criança como sujeito ativo constituído na cultura e produtor de

cultura também marcou a ilustração brasileira. Segundo a autora, Flicts (1969), de Ziraldo,

traz imagens não figurativas que não são ornamento do texto nem complemento das

informações escritas. Ao contrário, são as cores que falam. O status artístico conferido à

ilustração também pode ser visto na obra Ida e volta (1976), de Juarez Machado, nos livros de

Ângela Lago e Eva Furnari desde os anos 1980 e, atualmente, nas inúmeras obras de Rui de

Oliveira, Roger Mello, Mariana Massarani, Graça Lima, Nelson Cruz, Marilda Castanho,

Odilon Moraes, entre outros.

Com o surgimento de novas tecnologias, Hunt (2010, p. 287), que chama a literatura

infantil de “texto para crianças”, entende que a ideia do livro como uma forma fechada será

substituída pela experiência multidimensional. O recente aparecimento de e-books e de e-

readers, obras literárias digitais e as consequências disso para o livro de papel, para a leitura e

a literatura são temas que, na cena contemporânea, têm preocupado quase todos que estão

inseridos no mundo das letras.

Considerando a pluralidade de suportes, Lajolo e Zilberman (2017, p. 21-26) indagam:

que consequências essa pluralidade pode trazer para a literatura, já que novas tecnologias

trouxeram outros formatos e materiais, novos modos de produção e circulação e diferentes

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maneiras de leitura? E a questão das imagens na literatura com as novas tecnologias? Segundo

as autoras, a plurimidialidade na literatura para crianças e jovens na contemporaneidade se

manifesta em grau mais intenso (LAJOLO; ZILBERMAN, 2017, p. 30). Se antes a literatura

para crianças e jovens poderia prescindir do texto escrito e/ou do papel, na

contemporaneidade ela pode abrir mão do livro. Isso aconteceu com a expansão e a

popularização da internet, que possibilitou a ruptura radical entre literatura e livro.

No ciberespaço o livro pode aparecer sob a forma de e-book, como também incorporar

obras tradicionais digitalizadas. Embora a internet esteja mais popularizada, Lajolo e

Zilberman (2017, p. 37) afirmam que ainda é incipiente o acesso às obras literárias via

internet e escassas tanto a difusão quanto a aquisição de versões digitais de livros de autores

brasileiros. Dizem, ainda, que vivemos em um cenário de mudança e superposição e que o

horizonte traz muitas questões e poucas certezas, “materializado, de uma parte, em sites, e-

readers e e-books, que reproduzem formas de livros; e, de outra, em livros formatados com a

sintaxe de sites” (LAJOLO; ZILBERMAN, 2017, p. 53).

O Manifesto Literatura Digital5, criado por Marcelo Spalding

6, caracteriza essa

literatura como uma obra feita especialmente para mídias digitais, um novo gênero literário

com características que lhe são peculiares pela multimodalidade de que são compostas. A

literatura infantil digital, embora tenha propostas de uso de diversas linguagens, diferencia-se

do jogo digital, pois seus objetivos e propostas não são ganhar uma partida, e sim a entrada no

ficcional.

Embora o cenário seja diverso, autores e ilustradores têm defendido um conceito de

literatura infantil que se aplica independentemente do surgimento das novas tecnologias e das

mudanças que estamos observando. Nosso ilustrador Roger Mello (2012) apresenta o seguinte

posicionamento:

Livro é livro. [...] Há divergências sobre o uso do termo „infantil‟. Por outro lado, os

estudiosos do livro precisam usar esse termo [livro infantil] para estudá-lo em toda a

sua complexidade, respeitando a criança como agente modificador, valorizando a

sua voz, o seu pensamento artístico. A criança é a voz que dialoga ativamente com o

livro. Mas uma coisa é certa: a literatura para criança não é um gênero, ela percorre

todos os gêneros (MELLO, 2012, p. 211).

Na mesma direção, o escritor e ilustrador Ricardo Azevedo (2012) não considera que

exista uma literatura exclusivamente para crianças. Para ele, o que existe é uma grande e

diversificada literatura popular. Dentro dela muitos livros são acessíveis e interessam às

5 Disponível em: www.literaturadigital.com.br. Acesso em: 29/10/2017. 6 Marcelo Spalding é um escritor e jornalista brasileiro. Ele defendeu, em 2012, uma tese de doutorado intitulada

Alice do livro impresso ao e-book: adaptação de Alice no País das Maravilhas e de Através do espelho para

iPad, na UFRGS, no Instituto de Letras. Tal tese o levou à produção do Manifesto Literatura Digital.

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crianças, e podem ser considerados literatura infantil. Para Azevedo uma literatura popular

pode ser mais complexa e cheia de possibilidades do que a literatura apenas infantil

(AZEVEDO, 2012, p. 90).

Em consonância com Roger Mello e Ricardo Azevedo, temos a opinião de Ana Maria

Machado (2016, p. 168), para quem o que mais importa não é o adjetivo, mas o substantivo:

“É a linguagem, não o público-alvo”. Machado defende que os livros infantis façam parte da

literatura como um todo, longe das preocupações psicológicas, pedagógicas ou

mercadológicas.

Para um autor, expressar-se de forma a atingir uma criança implica deixar aberto e

livre um espaço para que a criança também possa se manifestar e responder, se

expressando livremente ao receber esse texto, e por sua vez criando também um

novo texto, por meio de sua leitura e imaginação. O alvo não pode ser um público de

determinada idade, mas sim a garantia do processo, a criação de condições de troca

significativa (MACHADO, 2016, p. 169).

Os autores defendem, então, que o que há é literatura. Uma literatura sem adjetivos

(ANDRUETTO, 2012, p. 52). Concordamos com esse ponto de vista. Andruetto (2012)

defende que certas denominações deveriam ser apenas informativas, e não estéticas, como é o

caso da expressão literatura infantil e juvenil. “Atribui-se à literatura infantil a inocência, a

capacidade de adequar-se, de adaptar-se, de divertir, de brincar, de ensinar e, especialmente, a

condição central de não incomodar nem desacomodar” (ANDRUETTO, 2012, p. 59, grifo da

autora). Pondé (2017, p. 35-36), nos anos 1980, uma das pioneiras nos estudos sobre literatura

infantil no Brasil, ao lado de Arroyo, Coelho, Lajolo e Zilberman, defende a presença do

termo literatura infantil ou livro infantil. Ao definir o termo, ela afirma que

O livro para crianças costuma relacionar-se com essas faixas de interesse, mas não

há uma norma rígida, pois cada leitor tem gosto e percepções particulares. Há

distinções entre interesses de crianças de classe média, alta e baixa; zonas rural e

urbana; regiões Norte, Nordeste, Sul, Sudeste ou Centro-Oeste; e assim por diante.

Por isso, em última análise, é o leitor quem deve escolher qual livro vai ler, não

importa a faixa etária a que se destina a obra que está em suas mãos. No entanto, a prática tem nos mostrado alguns indicadores que podem orientar o adulto na

produção e na sugestão de leitura para os pequenos. O livro é um produto cultural

que deve ser observado pelas relações entre texto, ilustrações e demais aspectos

gráficos. De acordo com a integração desses elementos, somos capazes de

determinar, de modo geral, a que faixa etária ele corresponde (PONDÉ, 2017, p. 35-

36).

Na mesma direção, Coelho (2000) usa o que ela chama de rótulo geral literatura

infantil/juvenil para indicar os livros infantis (para pré-leitores, leitores iniciantes e leitores-

em-processo), infantojuvenis (para os leitores fluentes) e juvenis (para leitores críticos).

Embora a pesquisadora use o termo, ela parte de duas ideias básicas que nos são caras. A

primeira é que a literatura é um fenômeno da linguagem. A segunda é que a literatura é arte. E

como é arte, as relações de aprendizagem e vivência que se estabelecem entre ela e o sujeito

são fundamentais para que haja a formação integral, composta da consciência do eu, mais o

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outro e o mundo. Coelho (2000, p. 10) destaca que a literatura é a mais importante das artes

porque a sua matéria é a palavra, aquilo que distingue a especificidade do humano.

Dessa maneira, concluímos que o posicionamento relativo à literatura infantil se é

ou não literatura e se merece ou não o adjetivo varia conforme a época, o lugar, os grupos

sociais e seus valores. O mesmo vale para a concepção de infância. Para continuar a tecer o

nosso posicionamento, reiteramos que os livros destinados a crianças e jovens são literatura

(LAJOLO; ZILBERMAN, 2017), não carecem de adjetivo (ANDRUETTO, 2012). Partimos

ainda do pressuposto de que a literatura é arte, com base no pensamento de Eco (2010 e

2016), Bakhtin (1993b) e Vigotski (1998).

1.3 Quando a literatura é arte?

Assim como ocorre com os conceitos de literatura e infância, a ideia da arte também

muda conforme as épocas, os povos e aquilo que determinada tradição cultural considera arte.

Ela muda diante de novos modos de operar e de fruir (ECO, 2016, p. 137).

Sobre a origem da arte, Bücher (apud VIGOTSKI, 1998, p. 309-310) nos explica que a

música e a poesia surgem de um princípio geral, o pesado trabalho físico. O autor observou

que os cantos de trabalho acompanham o ritmo do trabalho. Os trabalhadores dão o sinal para

que todos os esforços sejam intensificados simultaneamente; estimulam os companheiros a

trabalhar com zombarias e impropérios; dão expressão à reflexão dos trabalhadores sobre o

próprio trabalho, às alegrias ou aos descontentamentos, às queixas pelo trabalho pesado e pela

baixa remuneração; fazem pedido ao empregador, ao feitor ou ao simples espectador. Nesses

cantos o sentimento angustiante está contido no próprio trabalho. A arte surge como um

instrumento na luta pela existência (VIGOTSKI, 1998, p. 91-92). Quando a arte se separa do

trabalho, ela insere o sentimento angustiante, elemento constituído antes pelo trabalho, na

própria produção. Para o autor a arte sistematiza ou organiza o sentido social e dá solução e

vazão a uma tensão/sentimento angustiante.

Para Vigotski (1998, p. 315-329), quando cada um de nós vivencia uma obra de arte, o

sentimento passa a ser pessoal sem, contudo, deixar de ser social. O fato de o seu efeito ser

processado em um indivíduo isolado não significa que as suas raízes sejam individuais. Por

isso, ele afirma que a arte é o social em nós. Ela sistematiza ou organiza o sentido social, dá

solução e vazão a uma tensão/sentimento e incorpora os aspectos mais íntimos e pessoais do

nosso ser ao ciclo da vida social. O social refere-se tanto ao coletivo, à existência de uma

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multiplicidade de pessoas, quanto a um homem e às suas emoções pessoais. A arte concentra

os processos biológicos e sociais do indivíduo na sociedade.

Vigotski (1998) pensou a arte considerando a emoção, o conteúdo e a forma. Para ele

toda obra de arte é social e implica em uma divergência entre conteúdo e forma. Para explicá-

la melhor, o autor traz uma comparação por Pushkin7 entre a obra de arte e o aeroplano. O

aeroplano é uma máquina mais pesada que o ar, cai sempre que sobe, pois encontra

resistência, supera essa resistência, afasta-se dela e sobe precisamente porque cai. Essa

máquina mais pesada que o ar lembra uma obra de arte porque ela escolhe como material a

matéria mais pesada que o ar. Esse peso do material está sempre contrariando o voo. A partir

da superação dessa oposição é que surge o verdadeiro voo (VIGOTSKI, 1998, p. 272-287).

Essa divergência entre conteúdo e forma dialoga com a ideia postulada por Bakhtin de

que forma e conteúdo se interpenetram, são inseparáveis e se encontram em uma interação

essencial e axiologicamente tensa (BAKHTIN, 1993b, p. 38). A forma personifica o

conteúdo. A arte começa onde começa a forma (VIGOTSKI, 1998, p. 42). Para Bakhtin

(1993b) o artista da palavra (o autor-criador) lida com o conhecimento preexistente a ele

referente ao mundo da vida e da arte. Assim, ele luta contra ou a favor das velhas formas

literárias e ocupa uma posição estética em relação à realidade extraestética do conhecimento e

da ética (BAKHTIN, 1993b, p. 38). O autor-criador encara a luta da forma, a literária, e do

conteúdo, pois ele tem que se posicionar em relação à realidade. O objeto estético é

artisticamente criado e percebido e se constitui a partir de um conteúdo artisticamente

formalizado. A forma é efetivamente realizada no material e a ele ligada, mas, pelo seu valor

axiológico, coloca-nos além dos limites do material.

Segundo Bakhtin (1993b, p. 25-50), o objeto estético conta com dois tipos de formas:

arquitetônica e composicional. As formas arquitetônicas são as formas dos valores morais e

físicos do homem estético, as formas da natureza enquanto seu ambiente, as formas do

acontecimento no seu aspecto de vida particular, social, histórica. As formas composicionais

organizam o material e têm um caráter utilitário.

O conteúdo também é um momento indispensável no objeto estético. Ele se refere à

realidade do conhecimento e do ato estético, que entra com sua identificação e avaliação no

objeto e é submetido a uma formalização multiforme com a ajuda de um material

determinado. A forma esteticamente significante é a expressão de uma relação com o mundo

do conhecimento e da ética. Nessa relação o artista (autor-criador) ocupa uma posição fora do

7 Alexander Sergueievitch Pushkin foi um consagrado poeta russo do século XIX, considerado o fundador da

moderna novela russa.

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acontecimento, mas compreende o sentido axiológico daquilo que se realiza. Tal exterioridade

permite que o autor-criador una, formule e conclua o acontecimento a partir do lado de fora.

A forma estética aborda o conteúdo a partir do lado de fora, exterioriza-o, isto é, encarna-o. O

objeto estético é, então, um conteúdo dotado de forma (BAKHTIN, 1993b, p. 21-69). Em

cada momento da atividade formativa, o autor-criador sente a sua atividade seletiva,

construtiva, determinante, completante, superando o material, dando a ele uma forma

artisticamente plena de conteúdo (BAKHTIN, 1993b, p. 50-69). Do ponto de vista do fruidor

ou contemplador, ele reage

aos estímulos físicos do objeto e reagir a eles não somente com uma elevação de

ordem intelectual, mas através de um complexo de movimentos cenestésicos, com

uma série de respostas emocionais, de modo que a fruição do objeto, complicando-

se com todas estas respostas, não assuma jamais a unívoca exatidão da compreensão

intelectual de um referente unívoco e a interpretação da obra torna-se, por isso

mesmo, pessoal, perspética, mutável, aberta (ECO, 2016, p. 252). Nas antigas concepções de arte o fruidor dispunha de um campo de possibilidades

interpretativas. A ênfase estava na “definição” da obra. O autor orientava o leitor para uma

compreensão exata da obra. Porém, na contemporaneidade o polo foi para a “abertura”, o que

demandou do fruidor reações interpretativas mais livres. Ele complementa a obra segundo a

sua visão particular (ECO, 2016, p. 154-155). Essa abertura da obra acompanha, segundo Eco

(2016, p. 156-159), a evolução da lógica e das ciências, que substituíram os módulos unívocos

por módulos plurivalentes. “O prazer estético foi pouco a pouco mudando a própria natureza e

as próprias condições e, de prazer de caráter emocional e intuitivo que era outrora,

transformou-se em prazer de caráter intelectual” (ECO, 2016, p. 246, grifo do autor).

Houve, então, o fim de certa forma de arte. A obra de arte contemporânea se tornou

um suporte de conhecimento, uma declaração filosófica acerca do modo de ver as coisas com

a arte (ECO, 2016, p. 250). Para Eco (2010, p. 22-23) a obra de arte é uma “mensagem

fundamentalmente ambígua, uma pluralidade de significados que convivem num só

significante”. Tal ambiguidade é a abertura à qual nos referimos anteriormente. A obra é

aberta. Essa pluralidade de significados é provocada pela obra, compreendida aqui como um

objeto dotado de propriedades estruturais definidas que permitem e coordenam o revezamento

das interpretações, o deslocar-se das perspectivas. Tais significados têm como origem a

realidade.

Para Bakhtin (1993b) a obra de arte acolhe a realidade da vida cotidiana. Semelhante

afirmação é encontrada em Vigotski (1998), quando ele afirma que a arte recolhe da vida o

seu material e produz acima dele algo que ainda não está em suas propriedades. Ele compara a

arte à metáfora da transformação da água em vinho (Evangelho) para indicar que a verdadeira

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natureza da arte sempre implica algo que supera o que não encontra vazão na nossa vida

cotidiana, que transforma o sentimento comum (medo, dor, inquietação etc.). Esses

sentimentos quando suscitados pela arte são superados. A água transforma-se em vinho

(VIGOTSKI, 1998, p. 307-308). Ao evocar a realidade, o autor enriquece-a e completa-a,

criando uma unidade entre dois mundos, o mundo da vida e o mundo da cultura/arte

(BAKHTIN, 1993b, p. 30-34).

De acordo com Eco (2016), dois aspectos estão implícitos na noção de obra de arte:

a) O autor realiza um objeto completo e definido, segundo uma intenção bem

precisa, aspirando uma fruição que o reinterprete assim como o autor o pensou e

quis; b) o objeto, no entanto, é desfrutado por uma pluralidade de fruidores e cada

um deles levará ao ato de fruição as próprias características psicológicas e

fisiológicas, a própria formação ambiental e cultural e as especificações da

sensibilidade que as contingências imediatas e a situação histórica comportam [...] o

autor não ignora esta condição da situacionalidade de cada fruição, mas produz a obra como „abertura‟ para essas possibilidades, uma abertura que, todavia, oriente

tais possibilidades no sentido de provocar respostas diferentes, mas consonantes com

um estímulo definido em si (ECO, 2016, p. 153-154). Segundo Corsino (2014), esses aspectos dialogam com as ideias de Vigotski (1998) e

Bakhtin (1993b) quando afirmam que o artístico se dá nas inter-relações entre criador,

contemplador e obra. Trata-se de três elementos sociais. O social está expresso na própria

obra, no que ela é capaz de desencadear no outro e é constitutivo do artista-criador e do

contemplador-apreciador. Ambos são sujeitos históricos socialmente situados.

Portanto, quando a literatura é arte? Quando o autor-criador dá forma artística a um

conteúdo e é percebida enquanto objeto estético pelo contemplador/fruidor/leitor.

1.4 Letramento literário

Como neste capítulo estamos tratando do letramento literário e da educação literária,

foi necessário começar a discussão abordando aquilo que os une: os conceitos de literatura,

literatura infantil e arte. Agora que temos tais ideias definidas, sigamos para a compreensão

do conceito de letramento literário.

Há dois conceitos de letramento literário em disputa. A definição de autoria de Cosson

e Paulino (2009, p. 67) afirma que o letramento literário é um “processo de apropriação da

literatura enquanto construção literária de sentidos”. E a outra acepção que compreende o

letramento literário como o “conjunto de práticas sociais que usam a escrita literária, como

sistema simbólico e como tecnologia, em contextos específicos, para objetivos específicos”

(ANDRADE, 2008, p. 57, grifo nosso).

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As duas abordagens têm como origem o conceito de letramento cuja discussão surgiu

nos anos 1980 e até hoje não conta com uma única definição. No período houve a necessidade

de diferentes sociedades reconhecerem e nomearem práticas sociais de leitura e escrita. No

Brasil, tais práticas foram chamadas de letramento; na França, de illettrisme; em Portugal, de

literacia; e nos Estados Unidos da América e na Inglaterra, de literacy. Embora a necessidade

tenha aparecido em um mesmo período histórico, seus contextos e causas foram diferentes.

Nos países desenvolvidos o letramento surgiu independente da alfabetização, já que

neles a escolaridade básica obrigatória já havia se universalizado e a alfabetização stricto

sensu não se apresentava enquanto questão. Nos países em desenvolvimento o letramento

surgiu enraizado no conceito de alfabetização, de tal forma que esses conceitos se mesclaram,

sobrepuseram-se e até se confundiram. O termo letramento começou a ser usado como

tentativa de separar os estudos sobre a alfabetização levantamento do número de

alfabetizados e analfabetos e sua distribuição dos estudos sobre o letramento

identificação dos usos e práticas sociais de leitura e escrita em determinado grupo social ou

recuperação de práticas de leitura e escrita do passado (SOARES, M., 1998, p. 22-24).

Os primeiros livros a registrar o termo, segundo Soares (1998), foram: No mundo da

escrita: uma perspectiva psicolinguística de Mary Kato (1986) e Adultos não alfabetizados: o

avesso do avesso de Leda Verdiani Tfouni (1988). Desde então a palavra tornou-se frequente

no discurso dos especialistas da Educação e das Ciências Linguísticas, de tal forma que, em

1995, aparece no título do livro Os significados do letramento: uma nova perspectiva sobre a

prática social da escrita, organizado por Ângela Kleiman, e, em 1998, no livro de Magda

Soares: Letramento: um tema em três gêneros.

O dicionário Aurélio não registra a palavra, mas ela aparece na 3ª edição brasileira do

Dicionário contemporâneo da Língua Portuguesa, de Caldas Aulete, editado há mais de um

século. O verbete caracteriza a palavra como “antiga, antiquada” e lhe atribui o significado de

“escrita”; está ligado ao verbo “letrar”, cuja acepção atribuída é de “investigar, soletrando”, e,

como pronominal, a “letrar-se” com a acepção de “adquirir letras ou conhecimentos literários”

(SOARES, M., 1998, p. 16-17). O sentido atual do termo não foi buscado no verbete, mas na

palavra literacy, que significa “estado ou condição que assume aquele que aprende a ler e a

escrever” (SOARES, M., 1998, p. 17). Por trás do conceito está a ideia de que a escrita traz

consequências sociais, culturais, políticas, econômicas, cognitivas e linguísticas para o grupo

social em que ela é introduzida e para o indivíduo que aprenda a usá-la. A palavra letramento,

de acordo com Soares (1998, p. 18) significa o “resultado da ação de ensinar ou de aprender a

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ler e escrever: o estado ou a condição que adquire um grupo social ou um indivíduo como

consequência de ter-se apropriado da escrita”.

Nessa concepção de letramento o letrado é aquele que responde adequadamente às

demandas das práticas sociais de leitura e escrita da sociedade em que vive, o alfabetizado é o

indivíduo que apenas aprendeu a ler e a escrever, mas não necessariamente se apropriou

dessas práticas, e o analfabeto não dispõe da “tecnologia do ler e do escrever” (SOARES, M.,

1998, p. 21), mas pode participar de práticas sociais de leitura e escrita. Ainda que o sujeito

não tenha tido a oportunidade de se apropriar da linguagem escrita, ele pode estar inserido

nessas práticas devido ao meio em que vive e participar delas ainda que de forma restrita.

Para Tfouni (2006) o termo letrado não é uma antítese de iletrado, como também

iletrado não é sinônimo de não alfabetizado. Ela defende a tese de que não existe, nas

sociedades modernas, o letramento grau zero e que a escolarização por si só não garante ao

sujeito níveis mais altos de letramento.

Conforme sinalizamos anteriormente, não há uma definição única de letramento. De

acordo com Kleiman (1995, p. 18-19), ele pode ser compreendido como “um conjunto de

práticas sociais que usam a escrita, como sistema simbólico e como tecnologia, em contextos

específicos, para objetivos específicos”. Essa definição, construída com base nos estudos de

Scribner e Cole (1981), implica na existência de diferentes tipos de práticas sociais, entre elas

as escolares, que são dominantes e de diferentes agências de letramento (escola, família,

igreja). As diversas agências mostram orientações de letramento muito variadas devido às

especificidades dos contextos e objetivos de cada uma das práticas sociais que realizam.

Já Tfouni (2006, p. 11) considera tanto a alfabetização quanto o letramento “processos

de aquisição de um sistema escrito”. Para a pesquisadora o letramento focaliza os aspectos

sócio-históricos da aquisição da escrita enquanto a alfabetização se refere à aquisição da

escrita no sentido de aprendizagem de habilidades para leitura e escrita e das práticas de

linguagem. Segundo a pesquisadora, há duas perspectivas do letramento. A primeira tem

como base Vigotski (1984) e afirma que “o letramento representa o coroamento de um

processo histórico de transformação e diferenciação no uso de instrumentos mediadores”; na

segunda perspectiva “o letramento é compreendido como um produto do desenvolvimento do

comércio, da diversificação dos meios de produção e da complexidade da agricultura”

(TFOUNI, 2006, p. 21).

Conforme o exposto, observamos que o conceito de letramento não conta com uma

única definição, embora sua discussão tenha tido início nos anos 1980. As abordagens dos

Novos Estudos do Letramento (NSL) têm apontado a heterogeneidade das práticas sociais de

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leitura, escrita e usos da língua/linguagem, especialmente nas sociedades letradas, entendendo

o conceito de letramento de forma plural; portanto, haveria letramentos, alguns dominantes e

outros marginalizados. Segundo Rojo (2009, p. 102), os letramentos dominantes ou

institucionalizados estão associados a organizações formais (escola, igreja, trabalho) e os

letramentos vernaculares ou autogerados se originam da vida cotidiana, das culturas locais.

Na perspectiva dos letramentos é que surge a ideia de letramento literário. E esse

termo também tem comportado diferentes definições.

De acordo com Paulino (apud MACHADO, 2003a), é também nos anos 1980 que o

letramento literário começou a ser tema de pesquisas no nosso país. Segundo a autora, na

época, seus principais polos brasileiros de produção acadêmica eram Belo Horizonte:

Educação, UFMG; Porto Alegre: Letras, PUC-RS; Rio de Janeiro: Letras e Educação, PUC-

RJ; Campinas: Letras, Unicamp; e São Paulo: Letras, Universidade de São Paulo (USP).

Entre as instituições citadas destaca-se a UFMG, pois é através de uma das suas

pesquisadoras, Graça Paulino, e de grupos de pesquisa, como o GPELL, que o termo se

consolidou no meio acadêmico. Em 2001 o nome do grupo mudou para Grupo de Pesquisa do

Letramento Literário (GPELL), e tal mudança deveu-se, possivelmente, à reflexão trazida por

Graça Paulino, em 1999, no artigo “Letramento literário: cânones estéticos e cânones

literários”, quando definiu o termo: “O letramento literário, como outros tipos de letramento,

continua sendo uma apropriação pessoal de práticas sociais de leitura/escrita, que não se

reduzem à escola, embora passem por ela” (PAULINO, 2000, p. 16). Portanto, o letramento

literário é uma parte do letramento, compreendido, segundo a definição de Soares (1998, p.

18), como a inserção do sujeito no universo da escrita por meio de práticas de recepção e

produção de diversos tipos de textos escritos. Um deles, o literário.

Dez anos depois, em parceria com o pesquisador Rildo Cosson, Paulino define o

“letramento literário como o processo de apropriação da literatura enquanto construção

literária de sentidos” (COSSON; PAULINO, 2009, p. 67). Eles o consideram um processo de

apropriação, pois, além de ser um ato de tornar próprio, é uma ação continuada em

permanente transformação que trata da apropriação de um conjunto de textos, consagrados ou

não, e de um repertório cultural que possibilita uma forma singular de construção de sentidos,

a literária. Tal singularidade se efetiva por meio de dois procedimentos: 1) a interação verbal

intensa e 2) o (re)conhecimento do outro e o movimento de desconstrução/construção do

mundo. A interação verbal intensa envolve tanto a leitura quanto a escrita e é o primeiro

procedimento do ato de fazer sentido no letramento literário, porque ambas se realizam em

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um mundo feito essencialmente de palavras8. O segundo procedimento se realiza dentro do

primeiro e contribui para compor, convalidar, negociar, desafiar e transformar padrões

culturais, comportamentos e identidades, ao permitir que o sujeito viva o outro na linguagem.

Ao longo da trajetória histórica do conceito de letramento literário, surgiu outro polo

de produção acadêmica além da UFMG que também estuda o conceito, mas sob outra

perspectiva teórica. Segundo Andrade (2008), a UEM desenvolve o projeto Letramento

literário e o ensino de Literatura, sob a coordenação da Profª. Drª. Miriam Hisae Yaegashi

Zappone, com o objetivo de estudar de que forma se pode aplicar o conceito de letramento aos

estudos de literatura, discutindo o que seriam práticas, eventos, orientações, modelo autônomo

e ideológico de letramento literário.

Zappone (2006, p. 5) o define no texto Letramento literário: tecendo conceitos como

“o conjunto de práticas sociais que usam a escrita literária”. Para a compreensão do

letramento literário a autora apresenta as seguintes proposições: a) o letramento literário está

associado a diferentes domínios da vida, pois ele implica em usos da escrita literária para

objetivos específicos em contextos específicos; b) há formas de letramento literário mais

dominantes, valorizadas e influentes do que outras; e c) as práticas de letramento literário, por

serem construídas historicamente, são realizadas por identidades distintas, e os modos de

fazer uso da escrita literária e sua leitura também são diferenciados.

Com relação às práticas escolares de letramento literário, Zappone (2006, p. 6) afirma

que elas podem ser enquadradas no modelo autônomo de letramento literário. Tal modelo

compreende a escrita literária como um produto completo em si mesmo, autônoma, desligada

do seu contexto de produção. Esse modelo conta ainda com outras características, como a

correlação entre a aquisição da escrita e o desenvolvimento cognitivo9; a dicotomização entre

8 Quanto à importância da palavra nesse processo de apropriação, vale a pena estabelecer relações com o que

Bakhtin (1986) afirma sobre a palavra. Para o autor, ela é o primeiro meio da consciência individual, resultado do consenso entre os indivíduos. Ela funciona como instrumento da consciência, acompanhando toda a criação

ideológica, e é neutra em relação a qualquer função ideológica específica, o que quer dizer que a palavra pode

preencher qualquer uma dessas funções, sejam elas da esfera estética, científica, da moral ou religiosa. 9 A maioria dos trabalhos que fazem tal correlação parte do pressuposto de que há um divisor entre grupos ou

povos que usam a escrita e aqueles que não a usam. Esses trabalhos são empíricos e etnográficos, comparam as

estratégias de resolução de problemas utilizadas por grupos letrados e não letrados e remontam à pesquisa de

Luria (1976). Em 1981, Scribner e Cole investigaram um contexto na Libéria isolando as duas variáveis,

escolarização e aquisição da escrita. Os resultados mostraram que o tipo de “habilidade” desenvolvida depende

da prática social em que o sujeito está inserido quando ele usa a escrita, isto é, depende do contexto (KLEIMAN,

1995, p. 23-24).

A tese de doutorado de Tfouni (2006) desconstrói esse discurso etnocentrista do modelo autônomo de

letramento quando mostra que podemos encontrar em grupos não alfabetizados características que são atribuídas a grupos alfabetizados e escolarizados. Para a autora a questão não está em o sujeito ser ou não alfabetizado

enquanto indivíduo, e sim em ser ou não letrada a sociedade em que esses sujeitos vivem, isto é, nas condições

materiais em que esses discursos são produzidos. Mais do que isso, a questão está na sofisticação dos modos de

produção e das demandas cognitivas pelas quais uma sociedade passa quando se torna letrada.

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a oralidade e a escrita10

; e a atribuição de “poderes” e qualidades intrínsecas à escrita11

. No

modelo autônomo o fracasso e a responsabilidade por ele são atribuídos ao indivíduo

(KLEIMAN, 1995, p. 31-37).

Sem discutir a pertinência do modelo autônomo de letramento literário, Zappone

(2006) propõe que se questione a forma como ele aparece para o aluno na escola, pois,

segundo ela, o professor e o aluno trabalham com a escrita literária aceitando os sentidos já

construídos sem compreender as razões pelas quais eles são pertinentes. Esse modelo parte do

pressuposto de que os alunos já são leitores iniciados, situados no mundo da escrita.

Para Samuel R. Soares (2009), as possíveis consequências desse modelo são: a) a

formação de simulacros de leitores; b) a perda da autonomia pelos alunos de manifestarem

suas leituras; c) a restrição do significado da literatura em contexto histórico, características e

biografias de autores; e d) a consideração da literatura como obrigação. Como alternativa,

Street (apud KLEIMAN, 1995) propõe o modelo ideológico de letramento que parte do

pressuposto de que as práticas de letramento mudam segundo o contexto e que elas são

aspectos não apenas da cultura mas também das estruturas de poder de uma sociedade. Nesse

modelo o contexto faz toda a diferença, pois, com ele, temos práticas, e não prática de

letramento, conforme propõe o modelo autônomo.

Atualmente vêm ocorrendo debates acerca da pertinência político-pedagógica do

conceito de letramento. Para Goulart (2014), ele tem sido visto como uma estratégia de

compensação. O uso da noção de letramento tem levado à dicotomia entre forma e sentido,

técnica e conhecimento, individual e social, fonema e linguagem, de maneira que os primeiros

elementos dessas duplas se referem à alfabetização. Já os últimos, ao letramento. Essa

perspectiva estaria vinculada ao que Britto (apud GOULART, 2014, p. 47) chamou de

“alfabetismo pragmático”, que é um tipo de alfabetização que permite à pessoa ler e escrever

10 Essa dicotomização pode ser analisada na perspectiva da diferença ou semelhança. Segundo Olson e Hildyard

(1983), a perspectiva da diferença considera a oralidade informal e sem planejamento, e a escrita planejada e

formal. Já a perspectiva da semelhança trabalha com a interface entre a oralidade e a escrita, propondo a

existência de um contínuo ao invés de polos extremos de diferenciação, tendo em vista que nem toda escrita é

formal e planejada, como também nem toda oralidade é informal e sem planejamento. Essa perspectiva adota

ainda o pressuposto bakhtiniano do dialogismo na linguagem e da polifonia do texto (KLEIMAN, 1995, p. 27). 11 Ong (1982 apud KLEIMAN, 1995, p. 31-34) defende que a escrita aumenta a condição de ser ciente

fundamentado em uma complexa comparação entre processos mentais orais e processos mentais característicos

da escrita. No geral, os processos mentais orais são apresentados como mais simples, subjetivos, tradicionais,

voltados para a exterioridade, enquanto os processos característicos da escrita seriam mais complexos, objetivos,

inovadores e voltados para a interioridade, para a vida psicológica interna. Essas caracterizações reforçam o que

Graff (1979 apud KLEIMAN, 1995, p. 34-37) chamou de “mito do letramento”, que é uma ideologia que confere ao letramento efeitos positivos tanto no âmbito da cognição quanto no social, tais como: efeitos que

garantem a manutenção das características da espécie; efeitos que determinam a ascensão e mobilidade social;

efeitos nos macroprocessos de desenvolvimento econômico e no aumento da produtividade (KLEIMAN, 1995, p

31-37).

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algumas coisas e operar com números, a fim de agir adequadamente em função dos protocolos

e procedimentos de produção e consumo.

Quando o termo letramento entrou na escola, começou a busca pela compreensão

sobre como transformá-lo em conteúdo. Segundo Goulart (2014), tal entrada muitas vezes

significou esvaziamento do sentido cultural que o conceito inclui, como também esvaziou o

conteúdo da alfabetização em seu sentido político. A pesquisadora, então, indaga: “A

existência de textos se torna a garantia para alfabetizar letrando? Que textos? De quem para

quem? Que textos os antecedem e a que textos se ligam?” (GOULART, 2014, p. 41).

Alfabetizar letrando e letrar alfabetizando são duas expressões que, segundo Goulart

(2014, p. 40-41), dividem as dimensões do ensinar-aprender a escrita. Compreender essas

dimensões como dois processos determina uma separação, mesmo que sejam considerados

indissociáveis.

O pragmatismo social que passou a marcar o conceito de letramento nos colocou uma

nova questão. Se estamos trabalhando com a literatura, que é uma categoria estética, já que

aqui está sendo tomada como sinônimo de arte, como, então, seguir com o termo letramento

literário? Ao pesquisar com esse termo, estaríamos esvaziando seu sentido cultural?

Acreditamos que sim.

A literatura é objeto da cultura no sentido amplo e plural, e não da cultura escolar. Ela

não está a serviço do pragmatismo social, que caracteriza o cotidiano da nossa sociedade e

que acaba por abarcar a escola. Assim, as definições de letramento literário nos interpelam:

como pensar a literatura na escola em uma perspectiva que ultrapasse o pragmatismo social e

escolar subjacente ao conceito de letramento literário? Como aproximar as crianças da arte

literária? Como propor práticas de leitura literária em que as crianças possam participar, fruir

a arte na sua multimodalidade? Qual é o lugar na escola do acesso das crianças à literatura?

Na perspectiva de refletir sobre as aulas de literatura no CPII, apresentamos a seguir a

proposta de educação literária do Gretel/UAB, coordenado pela Profª. Drª. Teresa Colomer

(2003), que traz um panorama da função da literatura na educação.

1.5 Educação literária

De acordo com Colomer (2003, p. 125), a escola sempre teve relação com os livros

escritos para crianças. Desde o início da produção desses livros, ela acolheu os livros

didáticos e organizou antologias para o ensino da leitura e para a formação moral dos alunos.

Afirma a autora que, nos anos 1970, as mudanças sociais e a evolução da Teoria Literária

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favoreceram a discussão sobre a função da literatura na educação obrigatória e,

consequentemente, a revisão dos textos e das práticas tradicionais. O questionamento dos

métodos historicistas e a ideia hegemônica do acesso direto aos textos deram lugar a essas

discussões e criaram as condições para reivindicar a leitura das obras literárias próximas às

capacidades e aos interesses dos alunos. Dessa maneira, a LIJ encontrou um quadro mais

favorável para a sua entrada na escola (COLOMER, 2003, p. 126).

As novas formulações da Teoria Literária deram uma causa inicial para a introdução

dos livros infantis na escola. O aparecimento da noção de competência literária conduziu ao

estabelecimento dos objetivos da educação literária12

, como a formação de um leitor

competente. Assim, muitos professores acolheram os livros que pareciam construir,

espontaneamente, a competência dos leitores quando liam fora da escola.

Durante a década de 1970, a competência literária entrou como um objetivo na escola:

“la competência literária era una específica capacitat humana que possibilita tant la producció

d‟estructures poètiques com la comprensió dels seus efectes” (BIERWISCH apud

COLOMER, 1994, p. 37). A escola começou a entender o progresso literário como o

desenvolvimento dessa capacidade, e não como simples transmissão de conhecimentos sobre

a herança literária. Como essa capacidade é adquirida, a escola passou a refletir sobre quais

eram as competências; quando, como e onde as crianças aprendem a entender e a fruir os

textos literários, como também sobre o que a escola podia fazer para ajudar nesse processo

(COLOMER, 1994, p. 37).

No mesmo período o ensino linguístico sofreu uma renovação e começou a conceber a

aquisição da competência literária por meio do uso da literatura na escola como uma forma de

comunicação. Todavia, segundo Colomer (1994, p. 37-38), essa renovação linguística e a

impossibilidade de utilizar no ensino obrigatório o que estava sendo desenvolvido na Teoria

Literária provocaram a redução das competências literárias a competências linguísticas.

A crença de que o leitor literário é formado lendo literatura, na Espanha, conduziu os

professores da escola primária a valorizar a leitura de livros por prazer após o horário escolar.

Os métodos educativos anglo-saxões, baseados na prática da lectoescrita literária e no

comentário oral na aula de leitura, ligaram-se a essa posição mais facilmente do que a tradição

educativa europeia, mais centrada nos programas cronológicos e nos conteúdos formais. O

12 Vale ressaltar que a educação literária se insere na perspectiva didática dos estudos sobre a LIJ. Esses estudos

contam ainda com outras abordagens, como a histórico-bibliográfica, a literária, a psicológica, a sociológica e a

didática.

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fim da fronteira entre a leitura dentro e fora da escola levou a uma nova pergunta: pode-se

formar o leitor literário lendo literatura infantil? (COLOMER, 1994, p. 38).

A educação literária defende que sim, é possível. Considerada como uma

aprendizagem de interpretação dos textos (COLOMER, 2009, p. 74), a educação literária

propõe que um leitor saiba como construir o significado do que lê segundo as instruções

ofertadas pelo texto. Tais instruções guiarão o leitor também no descobrimento do ganho de

significado que a construção literária adiciona às regras da língua natural (BERTONI DEL

GUERCIO apud COLOMER, 1994, p. 40).

Para adotar essa perspectiva, a educação se beneficiou de formulações da Teoria

Literária como o pacto narrativo, segundo o qual o significado é uma construção negociada

por autor e leitor através da mediação do texto. Devido a esse pacto, o leitor deve suspender

as condições de “verdade” da realidade e aceitar que o discurso de um relato, por exemplo, é

uma organização convencional proposta como verdade. Também ele há de respeitar as

condições de enunciação e recepção presentes. A partir dos signos ofertados pelo texto, o

leitor deve distinguir o narrador e o autor. Desde o início do discurso o leitor precisa

concordar com o jogo provocado pelo autor e aprender a seguir elementos metadiscursivos

que instruem sobre como interpretar a obra (COLOMER, 1994, p. 40).

O campo da Teoria Literária mostrou como a linguagem de ficção provê o leitor de

instruções, dá pistas para a construção de uma situação comunicativa e para a produção de um

objeto imaginário. Para Colomer (1994, p. 40-41), o campo da Educação deve estabelecer

como as crianças e adolescentes aprendem a seguir essas pistas. Deve saber quais elementos

da construção literária resultam mais simples e quais mais complexos para oferecer ao longo

do currículo escolar, como também deve escolher os textos que ajudam a seguir esse

itinerário.

Segundo a autora, a pesquisa educativa ajudou a superar, em certa medida, a polêmica

sobre a utilização da LIJ no ensino. O problema não é classificar os textos entre “literatura

autêntica” e “literatura para crianças”, mas ver em quais textos e em quais idades essas

convenções podem ser aprendidas.

Na Espanha, como no Brasil, foi na década de 1980 que a LIJ se tornou mais presente

na escola. O consenso de que os livros para crianças e jovens são imprescindíveis para a

formação leitora e literária propiciou a reflexão sobre esse tipo de literatura do ponto de vista

do ensino regular. Além disso, muitas reflexões psicológicas, sociológicas e literárias

começaram a ser revertidas na articulação da presença desses textos nos objetivos e práticas

educativas que giravam em torno da educação literária (COLOMER, 2003, p. 125-126). De

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acordo com Fittipaldi (2013, p. 92), na mesma década, a didática da literatura se replanejou

em função do seu ensino na escola e dos modos de conceber e propiciar a sua aprendizagem.

Assim foi se constituindo a educação literária.

Para as pesquisadoras do Gretel duas causas parecem ter sido dominantes nas

transformações vividas pela didática da literatura: o desenvolvimento dos estudos

construtivistas e socioconstrutivistas, que levaram a uma perspectiva centrada no aprendiz, e o

alcance das teorias da recepção e das respostas leitoras, que mudaram o foco de interesse para

o diálogo entre o texto e o leitor. As duas perspectivas se complementam e situam o leitor no

centro do processo educativo e das práticas literárias (FITTIPALDI, 2013, p. 93). O

reconhecimento do estudante-leitor como um sujeito ativo, responsável na construção das

aprendizagens, acarretou mudanças nos modos de abordar a literatura no marco didático.

No período foi desenvolvida nova atenção psicopedagógica aos processos de

aprendizagem dos alunos e à sua relação com as práticas de ensino (COLOMER, 2003, p.

128). A introdução da literatura infantil na escola também foi justificada com a concepção

vigotskiana de aprendizagem, com a pesquisa psicolinguística sobre o uso da língua escrita e

com a importância da leitura literária como elemento de aculturação.

Com a perspectiva da educação literária, o objetivo de aprender literatura na escola

mudou. Se antes era conhecer autores e obras relativas à história da literatura, com a educação

literária passou a ter como propósito procurar que as pessoas leiam mais e melhor, oferecer

ferramentas para que saibam interpretar mais finamente o que as rodeia (FITTIPALDI, 2013,

p. 92). No dizer de Colomer,

el objetivo de la educación literaria es, en primer lugar, el de contribuir a la

formación de la persona, formación indisolublemente ligada a la construcción de la

sociabilidad y realizada a través de la confrontación con textos que explicitan la

forma en la que las generaciones anteriores y las contemporáneas han abordado y

abordan la valoración de la actividad humana (COLOMER, 2009, p. 72).

Na proposta de didática da literatura do grupo catalão a escola deve se centrar no

progresso da competência literária. E, por isso, é importante identificar quais competências

são responsabilidade da escola, a saber:

1. Ensinar a ler no sentido amplo com tudo o que sabemos sobre o processo de

leitura e de interpretação dos textos como prática social;

2. Garantir a leitura de livros de qualidade para todos;

3. Assegurar o conhecimento de textos clássicos; 4. Oferecer a experiência de leitura de textos linguisticamente complexos e mostrar

aos leitores o que podem fazer para entender os livros em profundidade e com

espírito crítico;

5. Garantir uma sistematização sobre o funcionamento dos sistemas ficcionais e

literários da sociedade (COLOMER, 2009, p. 75-76).

A compreensão da educação literária como uma aprendizagem de interpretação dos

textos supõe, em primeiro lugar, a adesão afetiva por meio da autopercepção do leitor como

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pertencente a essa comunidade interpretativa e a aprendizagem das convenções que regem as

formas literárias de maneira que se possa revelar o máximo de sentido. Em segundo lugar, ter

como resultado uma prática educativa que se desenvolve por meio da recepção oral ou a

leitura direta dos textos pelos aprendizes e as formas guiadas para ensinar a construir sentidos

cada vez mais complexos. Assim,

Enseñar literatura es algo complejo, en el sentido de que integra distintos elementos.

Debe responder a la conexión entre la capacidad de recepción y de producción literaria, entre la recepción del texto y la posibilidad de elaborar un discurso

analítico y valorativo sobre él, entre la interpretación del lector y los conocimientos

que la potencian, entre la educación lingüística y la educación literaria, entre los

aspectos lingüísticos y los aspectos culturales que configuran el fenómeno literario o

entre la literatura y los restantes sistemas artísticos y ficcionales existentes en las

sociedades actuales (COLOMER, 2009, p. 80).

Colomer (2003, p. 128) afirma que a preocupação com a melhora da primeira

aprendizagem leitora foi um dos maiores debates na escola nas últimas décadas. A

fundamentação teórica sobre a importância da compreensão e do interesse do leitor pelo texto

lido provocou a substituição das antigas cartilhas pelos contos infantis.

Afirma a autora que a presença dos contos infantis foi reforçada pelo aumento da

narração oral de histórias e do uso de textos do folclore. Na época a pré-escola iniciou e o uso

desses materiais foi aumentando nos diferentes níveis de ensino. Rapidamente, todo o

primário aderiu à ideia de incentivar a leitura livre e as atividades sobre textos de tradição

oral. Os estudos literários de Propp13

acerca dos contos populares deram cientificidade à

análise do material folclórico usado na escola. Ainda, assevera a autora que na época foram

divulgadas as propostas de Rodari14

sobre a escrita criativa e a utilização de contos infantis.

Daí surgiu uma grande quantidade de materiais didáticos sobre a relação entre o ensino da

leitura e a LIJ (COLOMER, 2003, p. 128-129).

Diversas obras sobre a compreensão e a resposta leitora destacaram a necessidade de

haver na escola um contexto de construção compartilhada na interpretação do texto. A LIJ

passou a ser vista como um fórum apropriado para a discussão sobre as intenções do autor, as

características dos personagens e o desenvolvimento da narrativa. Mesmo que os livros

possam ser entendidos em uma primeira leitura individual, foi observado que poderiam ser

aprofundados na troca de opiniões da comunidade de leitores. Assim, ganhou força o

argumento de que os livros deveriam ser selecionados não só pelos méritos literários, mas

13 Vladimir Propp (1895-1970) foi um acadêmico russo que analisou os contos populares russos. Ele teve como

objetivo identificar uma estrutura nos contos. É considerado um dos expoentes da narratologia. 14 Gianni Rodari (1920-1980) foi um jornalista, escritor e poeta italiano. Escreveu muitos livros infantis e

recebeu, em 1970, o Prêmio Hans Christian Andersen. Seu livro de destaque é Gramática da fantasia.

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também pela oportunidade que ofereciam para discutir, comparar e favorecer a introspecção e

a comunicação (COLOMER, 2003, p. 129).

No dizer de Colomer (2003, p. 129-139), o fato de a LIJ ter entrado na escola não quer

dizer que se saiba o lugar que ela deve ocupar nesse espaço. Com a entrada do conceito de

competência literária, foram formulados itinerários leitores que preveem uma ampliação

progressiva do corpus que deve ser desfrutado pelos alunos. A seleção desse corpus não se

refere ao consagrado pela tradição literária.

Na prática, aumentou o objetivo de incentivar o prazer do texto, porém, manteve-se a

tensão com os textos consagrados por essa tradição. Divididos entre os objetivos de formação

de hábitos de leitura e os de acesso a formas complexas de conhecimento cultural que

requerem mediação educativa, os participantes dos debates da didática da literatura continuam

discutindo esse ponto.

Atualmente, os leitores infantis e juvenis estão imersos em um amplo caudal textual

por meio de diferentes formas de acesso: orais, escritas, visuais, audiovisuais etc. Essa

diversidade, segundo Fittipaldi (2013, p. 96-97), deve se manifestar e ser trabalhada no corpus

escolar. Se damos o acesso aos livros e, posteriormente, oferecemos um espaço e um tempo

efetivos destinados à leitura deles, os leitores se sentem convidados a realizar uma busca ativa

de indícios no corpo do texto, nos recursos e materiais utilizados pelos escritores, ilustradores

ou editores. Essa atitude interpretativa leva os leitores a pôr em jogo seus saberes e a conceber

a compreensão do texto como um todo, a partir da análise e da leitura detalhada de seus

diversos aspectos.

Assim, para a pesquisadora, não basta aproximar os livros das crianças. Mas levá-las a

frequentar os textos literários. Entendem que precisam avançar no esclarecimento sobre que

tipos de textos contribuem melhor para esse trabalho e quais são os modos de aproximação

das crianças com essas obras que seriam mais frutíferos. Assim, o acesso aos textos e a

discussão sobre eles são o núcleo da educação literária. É importante prever um tempo dentro

do horário escolar para a leitura literária autônoma, na biblioteca escolar ou na sala de aula.

Além disso, propõe a promoção de atividades literárias baseadas na oralidade, como a

narração de contos, a recitação de poemas, dramatizações, a leitura em voz alta, a associação

textual com a imagem. Outra forma de acesso à literatura é a escrita literária. Portanto,

considera importante aprender a conhecer e a valorizar um corpus cada vez mais amplo de

textos, a partir do estabelecimento de um itinerário rico de leituras (FITTIPALDI, 2013, p.

76-99).

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De acordo com Colomer (2003, p. 132), a análise dos critérios mais inovadores de

atuação educativa evidenciou que a LIJ exerce um papel importante nos dois tipos de

objetivos que configuram a educação literária: a) a maneira de suscitar a cumplicidade e b) a

resposta dos alunos à complexidade interpretativa das obras.

Para a educação literária o estudo formal da literatura é essencial, pois a possibilidade

de obter acesso a esse tipo de comunicação depende do domínio das convenções implícitas

que governam o pacto entre o autor e o leitor. Por essa razão, outros autores renovaram a ideia

anterior de dar atenção às características formais dos textos, mesmo que a partir do uso da LIJ

no ensino. Foi defendido que esses textos podem cumprir uma função formativa na aquisição

explícita das convenções literárias. Essa questão situa-se na interseção entre a didática da

literatura e os estudos sobre essa literatura (COLOMER, 2003, p. 136).

Para Fittipaldi (2013, p. 382) há diferentes modos de abordar a literatura. Ao ordenar

as contribuições realizadas por diversos trabalhos ligados ao campo da Didática da Literatura,

a pesquisadora chegou a cinco aspectos ou dimensões da literatura que precisam ser

considerados pela escola: as dimensões afetiva, sociocultural, cognitiva, ético-filosófica e

estético-linguística. Cada uma dessas dimensões está ligada a diferentes aprendizagens, que

podem ser desenvolvidas por meio de algumas práticas pedagógicas.

Vale ressaltar que as práticas apontadas para cada uma das dimensões literárias

apresentadas a seguir não estabelecem relação unívoca entre elas e as aprendizagens listadas.

Um mesmo saber pode ser construído ou reforçado por diferentes práticas. Ao mesmo tempo,

uma mesma prática pode servir para a aprendizagem de vários conhecimentos. Para as autoras

catalãs o trabalho com as dimensões da literatura é uma tarefa contínua e progressiva a ser

desenvolvida em um processo em espiral, em um movimento dialético.

A dimensão afetiva ou pessoal apresenta o reconhecimento das práticas literárias como

atividades relevantes na vida pessoal das crianças e no desenvolvimento de seus hábitos de

leitura (FITTIPALDI, 2013, p. 444-445). Nessa dimensão as aprendizagens que a constituem

são a atitude positiva para os textos e os processos de lectoescrita; a familiarização com uma

diversidade de gêneros; a associação dos textos com a própria experiência; o reconhecimento

e a valorização das próprias leituras, práticas e saberes sobre o literário; o fortalecimento da

autoimagem leitora; a construção e ampliação progressiva de um cânone pessoal de leituras; a

ampliação do corpus apreciado e das possibilidades de desfrute dos textos literários e

culturais; o reconhecimento da leitura e da escrita literárias como atividades pessoais

significativas e a implicação pessoal com a literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 167).

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Essas aprendizagens estão ligadas a práticas pedagógicas, como o acesso direto a um

corpus amplo e diversificado; leitura livre ou optativa; realização de exibições de livros,

murais com citações, blogs de recomendações, caixas de correio de leitura; justificativa das

preferências e manifestação de opiniões sobre as leituras; valorização dos textos e de seus

aspectos significativos; elaboração de seleções pessoais de leitura; autobiografias leitoras,

cenas de leitura ou outros tipos de evocações de textos ou situações de leitura (FITTIPALDI,

2013, p. 167).

A dimensão sociocultural entende a literatura como uma atividade de caráter

individual e social, a partir da qual referentes culturais comuns podem ser construídos. Para

Fittipaldi (2013), tal dimensão compreende:

1) Conhecimentos sobre a cultura (conhecimentos de textos, tradições e

referências culturais comuns, vinculações dos textos literários entre si e com outras

formas da cultura, reconhecimento de lugares comuns e identificação de

singularidades e localização no mapa cultural e constituição de um horizonte onde inscrever as leituras);

2) o contexto de produção (saberes sobre os livros como objeto, sobre o ato de

escrever e sobre o funcionamento editorial);

3) e o contexto de circulação e recepção (canais de circulação, mercado do livro,

transformações sócio-históricas dos textos, crítica literária e cultural e modos de

leitura diversos ao longo do tempo);

4) além disso, inclui o entendimento da literatura como prática social

(socialização das leituras, aprendizagem sobre como discutir e negociar

interpretações, reconhecimento do sentido como construção compartilhada,

valorização da comunidade interpretativa da que se é membro e compreensão da

literatura como sistema cultural e prática social) (FITTIPALDI, 2013, p. 444-445).

As práticas pedagógicas relacionadas à dimensão sociocultural são diversas: redes de

leitura; organização de uma biblioteca; projeto de edição de um livro, revista ou periódico;

conversa com autores, ilustradores, editores ou outros mediadores de LIJ; visita a livrarias,

editoras, bibliotecas ou entornos virtuais de circulação da literatura; comparação do texto-

fonte e suas versões, traduções, adaptações; passagem de textos a outros códigos; escrita de

versões, traduções, adaptações; leitura e escrita de comentários, recomendações e resenhas;

leitura compartilhada; discussões literárias; clubes e oficinas de leitura (FITTIPALDI, 2013,

p. 168).

A dimensão cognitiva nos possibilita compreender as práticas literárias como

processos interpretativos em que os leitores são ativos e constroem sentidos (FITTIPALDI,

2013, p. 444-445). Estão incluídas nessa dimensão as seguintes aprendizagens: a

diversificação das entradas aos textos; a integração das práticas de leitura e escrita; o

conhecimento e a explicitação progressiva das convenções literárias (estruturas, gêneros,

aspectos relevantes de cada um dos gêneros...); o desenvolvimento e a ampliação das

estratégias de leitura (antecipação, inferência, verificação, autocontrole, releitura etc.); a

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reflexão sobre a diversidade de modos de construção textual; a complexificação dos processos

interpretativos, o reconhecimento de diferentes níveis de leitura e a capacidade de olhar

“globalmente”; o reconhecimento da leitura e da escrita literárias como processos contínuos e

progressivos e do texto como obra aberta caracterizada por sua polifonia e polissemia.

As práticas pedagógicas que remetem a essa dimensão podem ser diferentes

dispositivos de apresentação de um texto, como a leitura em rede, por descobrimento

progressivo, quebra-cabeça e com ou sem imagens. Pode haver ainda diferentes dispositivos

de problematização de um texto: escritas, desenhos e trocas orais (FITTIPALDI, 2013, p.

169).

A dimensão ético-filosófica permite refletir sobre a literatura como discurso em que se

manifestam representações e juízos de valor presentes na sociedade (FITTIPALDI, 2013, p.

444-445). Nessa reflexão o leitor tem a oportunidade de realizar várias aprendizagens: o

reconhecimento da inexistência de uma “neutralidade” enunciativa e dos valores inscritos no

imaginário textual e coletivo; a formulação de dilemas éticos e filosóficos a partir das leituras;

o desenvolvimento progressivo de um olhar crítico e de uma atitude reflexiva sobre os

modelos ou esquemas organizadores do pensamento e sobre os discursos que os rodeiam

cotidianamente; a exploração das trocas que sofrem historicamente os valores que sustentam

os textos e inscrição destes em seu contexto; a confrontação com os próprios valores ou

sistemas de valores pessoais e culturais; a reflexão sobre a literatura como discurso que dá

conta de representações e juízos de valor da sociedade sobre determinados fenômenos, formas

de ser etc.

No que se referem às práticas pedagógicas associadas a essa dimensão, há a leitura

guiada de textos; a releitura de textos; os fóruns e debates sobre as leituras realizadas; as

investigações e trabalho por projetos; as tarefas de análise e reflexão sobre os valores e

questões morais que se tecem e a partir das produções abordadas (FITTIPALDI, 2013, p.

170).

A dimensão estético-linguística sublinha a importância do jogo com os aspectos

materiais da linguagem e considera a literatura como uma práxis artística (FITTIPALDI,

2013, p. 444-445). Ela permite a exploração da linguagem (verbal e visual) de maneira lúdica,

a observação de seus recursos retóricos e a reflexão sobre seus efeitos estéticos e suas

possibilidades expressivas; a escrita, a revisão e a correção de textos e o conhecimento sobre

os diversos modos de construção da linguagem literária; a apropriação, a integração e o uso da

metalinguagem visual e literária; a reflexão sobre os sentidos que potencializa o uso de

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determinados recursos linguísticos e da imagem; o reconhecimento da literatura como prática

artística e de linguagem, e da língua como objeto.

As práticas pedagógicas que potencializam tais aprendizagens são a narração oral e

jogos com a linguagem; a leitura em voz alta; a leitura coletiva; a recitação poética em classe;

a realização de festivais de poesia; a dramatização e a realização de espetáculos teatrais; a

indagação das eleições linguísticas e das ressonâncias que sugerem determinados vocábulos

ou expressões; a escrita criativa individual ou colaborativa; as oficinas literárias de troca de

leituras e de escritas (FITTIPALDI, 2013, p. 171).

A proposta das dimensões literárias, suas aprendizagens e práticas culminaram na

construção de um panorama geral, um mapa de rota de diversos aspectos que conformam a

competência literária. No mapa da página seguinte, desenhado como uma amarelinha, alunos

e professores podem ter clareza sobre a existência de diferentes pontos ou lugares a que

podem ir, a fim de alcançar uma visão mais ampla sobre a literatura (FITTIPALDI, 2013, p.

450).

Fittipaldi (2013) destaca que, nesse jogo, os estudantes podem ir e voltar sobre os

diferentes aspectos literários, saltar de um a outro ou ficar mais tempo em um. A imagem da

amarelinha também suscita a ideia de que, na educação literária, podemos transitar por rotas

diversas, voltar, experimentar novos movimentos, parar, acelerar. Ademais, a analogia com a

amarelinha traz em si duas ideias caras à educação literária: o caminho e o jogo

(FITTIPALDI, 2013, p. 451-452).

A ideia de caminho implica no entendimento de que as aprendizagens não se dão de

uma vez e para sempre. Elas vão avançando pouco a pouco, vão se construindo e

reconstruindo. O caminho começa em algum ponto e nos leva a algum lugar. É importante

que tenhamos a consciência de onde partimos e aonde queremos chegar. No caminho vamos

reconhecendo a rota e os passos já dados no trajeto. Nessa rota o indivíduo, às vezes, segue o

seu próprio ritmo ou o dos outros, joga em tempos diferentes, acompanhado ou recebendo

orientação de alguém. Contudo, todo o tempo, o indivíduo assume que ele tem a

responsabilidade pessoal de saber que o caminho deve ser percorrido por cada um. Fittipaldi

(2013, p. 452) afirma que a ideia de jogo na educação literária remete ao lúdico, do ponto de

vista da fabulação. Nela as crianças movem peças da linguagem, sentem-se capazes de

manipular as palavras e de combiná-las entre si com a própria experiência para dizer coisas

novas.

Para entrar no jogo é necessário que as crianças se assumam como leitoras,

construtoras e produtoras de sentido. Assim, oferecer desde a escola a oportunidade de

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experimentar as diferentes dimensões da literatura torna possível a construção de uma

resposta aos textos a partir de uma visão mais global sobre a literatura. Além disso, há fatores

históricos, políticos, sociais, econômicos que incidem sobre a situação da educação literária

em cada escola. Contudo, saber quais conhecimentos e práticas colaboram para que as

crianças sigam sendo leitoras além da escola pode ser um primeiro passo no desenvolvimento

da educação literária (FITTIPALDI, 2013, p. 453).

Diagrama 1. Amarelinha da educação literária.

Fonte: Figura 7.1: Educación literaria como rayuela, FITTIPALDI, 2013, p. 451.

Agora que os conceitos de letramento literário e educação literária estão explicitados,

sigamos para o necessário contraste entre eles. Afinal, há diferenças? Em que medida esses

conceitos se aproximam?

10. Atividade que põe em jogo

um processo interpretativo

9. Diálogo entre textos

literários e culturais

8. Prática social

7. Âmbito onde se jogam

valores e ideologias

5. Construção de

mundos possíveis

6. Formalização dos

modos de representar a

experiência

4. Produção artística feita de

linguagens

2. Objeto material

1. Espaço pessoal

Literatura

3. Sistema de produção e

de circulação cultural

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Contrastando ambos os conceitos, parece-nos que apropriar-se da literatura

(letramento literário) esteja próximo de aprender a interpretar textos literários (educação

literária). Contudo, a escolha das palavras “letramento” e “educação” apontam para uma

direção diferente. A educação literária circunscreve a literatura a espaços educacionais,

principalmente à escola. Já o letramento literário inclui qualquer espaço onde a literatura

esteja presente como uma prática social de leitura e/ou escrita.

O principal objetivo da educação literária vai ao encontro do que o letramento literário

considera como um processo de apropriação: a formação da pessoa por meio da construção

literária de sentidos. A educação literária e o letramento literário compreendem a literatura da

mesma maneira, considerada um sistema simbólico, e, portanto, cultural. Para a educação

literária e o letramento literário, o leitor literário é aquele que constrói significados e vive o

pacto ficcional. O letramento literário parece ser o estado ou a condição de quem teve uma

educação literária.

Diante do exposto, afirmamos que os conceitos de letramento literário e educação

literária dialogam. Contudo, o primeiro abrange todas as práticas sociais de leitura e escrita

literárias, enquanto o segundo se circunscreve ao âmbito educacional.

Todavia, observamos que a educação literária tal qual proposta pelo grupo de

pesquisadores espanhóis carece de um aporte filosófico do campo da linguagem. Por essa

razão sentimos a necessidade de pensar o ensino de literatura no EFI, acrescentando outros

elementos às discussões até agora postas tanto pelo letramento literário quanto pela educação

literária.

No capítulo a seguir, intitulado “A formação literária”, vamos apresentar uma

abordagem da literatura na escola.

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2 A FORMAÇÃO LITERÁRIA

Pois qual o valor de todo o nosso patrimônio cultural, se a experiência não mais o

vincula a nós?

BENJAMIN, 2012, p. 124

Benjamin nos instiga a pensar sobre a possiblidade de, a contrapelo, buscarmos formas

de vincular a experiência a nós. Assim, indagamos: o que pode a literatura em relação à

experiência e à formação do sujeito?

O capítulo anterior apresentou duas abordagens da literatura na escola, o letramento

literário e a educação literária. Vimos que as duas abordagens, em certa medida,

complementam-se. Para pensar aulas de literatura no espaço escolar é necessário considerar o

processo de apropriação da literatura pelos alunos, como também o aprendizado de vários

elementos do texto literário que contribuem para a interpretação de textos. Considerando os

conceitos apresentados no capítulo anterior, decidimos refletir agora sobre os verbos

escolhidos para compor ambas as definições.

Um primeiro aspecto a ser observado no conceito de letramento literário se refere à

noção individual que o verbo “apropriar-se” sugere. Quem se apropria da literatura? O

contemplador, fruidor, leitor. O sujeito é o centro.

No âmbito da educação literária o verbo “aprender” não se coloca como intransitivo

aprende-se algo. Indica também a possibilidade da presença de outrem na relação. Como a

educação literária não se circunscreve somente à escola, esse outrem pode ser de origem

muito variada: professor, bibliotecário, parente, um voluntário, ou até mesmo o próprio leitor.

Comparando os verbos analisados, observamos que “aprender” traz para a cena, além do

leitor, o outro, o que possibilita a formação da tríade leitor – obra – interlocutor, com a qual

estamos de acordo. No caso do verbo reflexivo “apropriar-se”, temos a dupla leitor – obra.

Em ambos os casos, a própria obra pode ser a interlocutora.

Após termos refletido sobre os verbos escolhidos na composição das definições do

letramento literário e da educação literária, voltamos a nossa atenção para os modos de

abordar a literatura na escola. Como cada abordagem propõe?

Cosson (2006), representante do letramento literário, sustenta a existência de três

etapas no modo de abordar a literatura na escola, nesta ordem: antecipação, decifração e

interpretação. Das três, destacamos a segunda etapa. O leitor decifra? Para o autor,

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Entramos no texto através das letras e das palavras. Quanto maior é a nossa

familiaridade e o domínio delas, mais fácil é a decifração. Um leitor iniciante

despenderá um tempo considerável na decifração e ela se configurará como uma

muralha praticamente intransponível para aqueles que não foram alfabetizados. Um

leitor maduro decifra o texto com tal fluidez que muitas vezes ignora palavras

escritas de modo errado e não se detém se desconhece o significado preciso de uma

palavra, pois a recupera no contexto. Aliás, usualmente ele nem percebe a decifração

como uma etapa do processo da leitura (COSSON, 2006, p. 40). De acordo com nosso ponto de vista, entramos no texto literário com o outro por meio

da nossa imaginação, das nossas experiências com a língua escrita e dos nossos

conhecimentos sobre nós mesmos e sobre o mundo. Isso não quer dizer que não

reconhecemos a importância da aprendizagem do sistema alfabético da escrita. Mas que

aprender a língua escrita é mais do que aprender um sistema, é “um processo de aprender a

significar por escrito” (GOULART; GONÇALVES, 2013, p. 22). Então, sob essa ótica, o

leitor literário não decifra, ele significa.

Aprender a significar por escrito inclui aprender o sistema alfabético da escrita, mas

foge ao binômio alfabetização-letramento, cuja discussão trouxe para o campo da

alfabetização dicotomias tais como: forma e sentido, técnica e conhecimento, individual e

social, fonema e linguagem. Aprender a significar por escrito não se circunscreve ao primeiro

elemento de cada dupla citada acima (GOULART, 2014, p. 40). Nesse contexto as expressões

alfabetizar letrando e letrar alfabetizando aparecem como perspectivas diferentes do trabalho

pedagógico.

Ao associarmos estas duas palavras alfabetizar e letrar, estamos significando alfabetizar como a aprendizagem do sistema alfabético de escrita e letrar como a

aprendizagem do sentido social da linguagem escrita. Desse modo, de um lado, ao se

alfabetizar letrando, ensina-se o sistema alfabético da escrita na perspectiva do seu

sentido social. Por outro lado, ao se letrar alfabetizando, parte-se do sentido social

da escrita, na perspectiva do ensino do sistema alfabético de escrita (GOULART,

2014, p. 40-41, nota 6, grifo da autora). Dessa maneira, quando Cosson (2006) afirma que entramos no texto através das letras

e palavras, subentendemos que para o pesquisador o centro do processo de alfabetização é a

análise das palavras em unidades linguísticas (SOARES apud GOULART, 2014, p. 41). Essa

maneira de ver uma das etapas que orienta uma abordagem da literatura na escola traz como

consequência a separação entre forma e conteúdo. Para o pesquisador quanto maior é a nossa

familiaridade e o domínio das letras e palavras mais fácil é a decifração do texto. E se o aluno

não aprendeu o sistema alfabético da escrita, como ele entra no texto literário? Colocada

assim a questão, parece-nos que palavras e letras funcionam como parte de uma engrenagem

técnica que deve ser aprendida. As dicotomias técnica/conhecimento e forma/conteúdo

reaparecem.

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Essa maneira de compreender o processo de alfabetização tem referência em Soares

(2016, p. 46, grifos da autora), para quem o aprendizado da escrita alfabética “é,

fundamentalmente, um processo de converter sons da fala em letras ou combinação de letras

escrita , ou converter letras, ou combinação de letras, em sons da fala leitura”.

Segundo a pesquisadora, tal conversão de sons em letras e de letras em sons é uma invenção

cultural que tem sido caracterizada como a invenção ora de um código, ora de um sistema de

representação, ora de um sistema notacional.

Como o sistema alfabético é o sistema primeiro, ele não pode ser considerado um

código, já que substitui ou esconde os signos de outro sistema já existente. A pesquisadora

esclarece que a escrita alfabética

É um sistema de representação porque, em seu processo de compreensão da língua

escrita, que se inicia antes mesmo da instrução formal, a criança de certa forma

„reconstrói‟ o processo de invenção da escrita como representação, o que não quer

dizer, conforme alerta Tolchinsky (2003, p. 20), que „há uma recapitulação da

história social no processo individual de aquisição‟[...] Por outro lado, a escrita é,

para a criança, um sistema notacional porque, ao compreender o que a escrita

representa (a cadeia sonora da fala, não seu conteúdo semântico), precisa também

aprender a notação com que, arbitrária e convencionalmente, são representados os

sons da fala (os grafemas e suas relações com os fonemas, bem como a posição

desses elementos no sistema (SOARES, 2016, p. 48-49, grifos da autora).

Então, podemos afirmar que para Cosson (2006) a aprendizagem da língua escrita,

compreendida como um sistema representacional e notacional, é um processo de decifração

no qual os sons da fala são convertidos em letras ou em uma combinação de letras e vice-

versa. Todavia, reiteramos que a aprendizagem da língua escrita é “um processo de aprender a

significar por escrito” (GOULART; GONÇALVES, 2013, p. 22). E significar é uma ação que

pertence à dimensão discursiva dos processos de aprendizagem da escrita.

De acordo com Goulart (2014, p. 47), essa dimensão compreende as relações com as

experiências de vida dos sujeitos e seus valores. Por isso, não é suficiente providenciar um

contexto para as unidades de trabalho da linguagem escrita, sejam elas letras, palavras, sílabas

e textos, mesmo que os textos sejam legitimados socialmente. Não é suficiente se a linguagem

for trabalhada como um elemento sem peso, se a prioridade for a análise da língua

encaminhada pelo professor, se o conhecimento e as possibilidades de análise das crianças e

as próprias crianças estiverem subordinadas ao estudo de características do sistema

linguístico. Abordar a língua priorizando a reflexão linguística é incompatível com uma

perspectiva histórica e viva da língua. O caráter discursivo das práticas pedagógicas sobressai

quando o outro dos processos escolares (isto é, as crianças) entra como encontro e confronto

de conhecimentos.

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E como pensar o leitor ouvinte? O leitor ouvinte não “decifra”. Ele compreende o

texto verbal escrito, articula-o às ilustrações, como é o caso da literatura infantil, e o

interpreta. Nesse sentido, ser leitor significa mais do que simplesmente saber ler, saber ler em

voz alta ou em silêncio as palavras escritas. Formar leitor não é sinônimo de ensinar a ler

(BRITTO, 2015, p. 127).

É no mundo possível da ficção que o homem se encontra realmente livre para

pensar, configurar alternativas, deixar agir a fantasia. Na literatura que, liberto do agir prático e da necessidade, o sujeito viaja por outro mundo possível. Sem

preconceitos em sua construção, daí sua possibilidade intrínseca de inclusão, a

literatura nos acolhe sem ignorar nossa incompletude (QUEIRÓS apud BRITTO,

2015, p. 58). Os leitores de ouvido podem viver essa possibilidade de fantasiar com a literatura. Não

saber ler não impede nem de apreciar a obra literária, nem de interpretá-la. Embora

reconheçamos a importância da alfabetização, não a vemos como pré-requisito para viver esse

acolhimento da literatura. O leitor ouvinte, alfabetizado ou não, é capaz de viajar para outro

mundo possível ao compreender o texto literário.

Voltando, então, às três etapas de abordagem da literatura na escola propostas por

Cosson (2006), entendemos que o trio antecipação, decifração e interpretação não convém

nessa abordagem discursiva. Do ponto de vista da educação literária, Colomer (2008) propõe

que pensemos por meio de princípios de atuação que se cruzam, superpõem-se e podem ser

planejados de diferentes maneiras: ler, compartilhar, expandir e interpretar. Observa-se que,

nessa perspectiva, o leitor não decifra. O leitor lê. O que compreende a criação de um espaço

de leitura individual na escola e a oportunidade de ler a todos os alunos. A leitura autônoma é,

segundo Colomer (2007), imprescindível para o desenvolvimento das competências leitoras e

para que os alunos construam sua autoimagem como leitores, aprendendo a avaliar os livros,

criando expectativas e se arriscando na seleção, no abandono e no empréstimo de livros.

O leitor lê com os outros, compartilha as obras. Nesse momento todos se beneficiam

da competência dos outros para construir sentidos e entender mais e melhor os livros. Em uma

comunidade de leitores podemos experimentar a literatura em sua dimensão socializadora, o

que faz com que nos sintamos participantes de uma comunidade com referências e

cumplicidades mútuas. O leitor expande seus conhecimentos, integrando o livro literário com

outros tipos de aprendizados e conhecimentos, como os sociais, filosóficos, éticos, históricos

ou artísticos. “Quanto mais ativo e inter-relacionado é o ensino que se oferece, mais fácil será

que os alunos se encontrem com a literatura em qualquer espaço ou matéria (...) sempre que

nos lembremos de pôr aí as obras” (COLOMER, 2007, p. 160). O leitor interpreta. As

crianças, para aprofundarem suas leituras, precisam da ajuda de leitores mais experimentados

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que lhes deem pistas e caminhos para construir um sentido mais satisfatório do significado

dos livros por meio da leitura guiada.

Comparando os dois modos de abordar a literatura na escola, observamos uma

primeira diferença: uma abordagem pensa em etapas e a outra, em princípios de atuação. As

etapas seguem uma sequência e os princípios entram como elementos que o docente coloca

em jogo, conforme o seu planejamento pedagógico. O outro aparece mais fortemente na

perspectiva da educação literária e ambos consideram a interpretação um momento

importante. Outra comparação importante entre ambos os conceitos se refere à orientação do

pensamento filosófico-linguístico ao qual estão vinculados. A filosofia da linguagem

bakhtiniana (1986) aponta para duas orientações principais: o subjetivismo idealista e o

objetivismo abstrato.

O subjetivismo idealista se interessa pelo ato da fala, de criação individual, como

fundamento da língua. A fonte da língua é o psiquismo individual. As leis da criação

linguística são as leis da psicologia individual. O indivíduo está como protagonista nessa

orientação em relação à língua (BAKHTIN, 1986, p. 72). A outra orientação do pensamento

filosófico-linguístico, o objetivismo abstrato, tem como centro o sistema linguístico, isto é, o

sistema das formas fonéticas, gramaticais e lexicais da língua. Aqui o indivíduo recebe da

comunidade linguística um sistema já constituído. A língua como um sistema estruturado

obedece a leis linguísticas específicas que não dependem da consciência individual. O

indivíduo tem que tomar tal sistema e assimilá-lo tal como ele é (BAKHTIN, 1986, p. 77-79).

Bakhtin problematiza essas concepções de forma dialética refutando tanto a tese quanto a

antítese, fazendo uma síntese que inclui a ambivalência e apresenta as questões discursivas.

Guardadas as devidas proporções, vemos no conceito de letramento literário traços ora

da primeira orientação, ao trazer o processo de apropriação da literatura pelo contemplador,

fruidor, leitor, como algo que coloca o sujeito como protagonista; ora do objetivismo, uma

vez que se refere às práticas sociais de leitura literária de forma instrumental. Já a proposta de

educação literária se apresenta próxima ao objetivismo abstrato, ao tratar do aprendizado da

interpretação de textos. Aqui já não é o indivíduo o protagonista, mas os textos.

Todavia, pensamos que o centro da formação literária não é o leitor ou os textos, mas a

interação verbal entre eles por via do diálogo, no sentido amplo do termo, isto é, toda

comunicação verbal, de qualquer tipo, e não apenas a comunicação em voz alta, de pessoas

colocadas frente a frente (BAKHTIN, 1986, p. 123). Nessa interação verbal o outro aparece

com força. A relação é dialógica. “A palavra se dirige a um interlocutor” (BAKHTIN, 1986,

p. 112). Por isso, propomos que pensemos em ações interlocutórias com a literatura ao invés

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de etapas ou princípios de atuação para abordar a literatura na escola. As ações interlocutórias

com a literatura querem dizer atividades, movimentos com a literatura. Tais ações têm como

produto a palavra, que se apoia sobre o leitor em uma extremidade e na outra, sobre o

interlocutor, que é aquele a quem a palavra se dirige, em uma relação dialógica. A palavra é o

produto da interação do leitor com o texto. Ela é a ponte entre o eu e o outro.

O livro, isto é, o ato de fala impresso, constitui igualmente um elemento da

comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob a forma de diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para ser estudado a fundo,

comentado e criticado no quadro do discurso interior, sem contar as reações

impressas, institucionalizadas, que se encontram nas diferentes esferas da

comunicação verbal (críticas, resenhas, que exercem influência sobre os trabalhos

posteriores etc.). [...] o discurso escrito é de certa maneira parte integrante de uma

discussão ideológica em grande escala: ele responde a alguma coisa, refuta,

confirma, antecipa as respostas e objeções potenciais, procura apoio etc.

(BAKHTIN, 1986, p. 123). Propomos ações interlocutórias com a literatura a partir de três ações: ler, dizer(-se) e

criar.

LER

DIZER(-SE)

CRIAR

Imaginar Apreciar Sentir

Ouvir/assistir

Observar, fruir, conhecer

Antecipar

Especular

Relacionar

Comparar

Relatar

Comentar

Debater Entrevistar

Criticar

Perguntar

Apresentar

Opinar

Discutir

Recordar

Conversar

Argumentar

Inferir

Avaliar

Recomendar Analisar

Descrever

Identificar

Narrar/recontar oralmente

Brincar

Dramatizar

Fotografar

Esculpir

Pintar

Ilustrar Dançar

Recitar

Filmar

Jogar

Brincar

Musicar

Tocar

Cantar

Produzir texto escrito

Quadro 1. Ações interlocutórias com a literatura.

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Tais ações interlocutórias com a literatura não contam com uma ordem preestabelecida

e são previamente pensadas, planejadas, elaboradas e orientadas pelo professor, que

intencionalmente as provoca. Na imagem da brincadeira infantil cama de gato temos a melhor

metáfora, até o momento, para representar o que entendemos que deve tecer um dos modos

possíveis de abordar a literatura na escola, em particular no EFI.

Figura 1. Brincadeira cama de gato.

Com o professor promovendo o encontro com o outro na fabulação, por meio da

leitura, do dizer e da criação, a cada movimento na cama de gato constrói-se um novo laço.

Os pontos de encontro dos dedos com o barbante e do barbante em si se movem e um novo

trançado é criado. Cada ponto é importante, um sustenta o outro. Com uma nova figura

formada, tudo está novamente posto em questão e os pontos entram em tensão. Quem fica?

Quem sai? Quem se transforma? Assim também entendemos que sejam as aulas de literatura.

A vivência de cada ação interlocutória com a literatura forma um laço, um ponto de encontro

com o outro. O aluno deve poder parar para vivenciar cada ação proposta.

Cada vez que as ações interlocutórias com a literatura são vivenciadas, o aluno tem a

oportunidade de significar. “Atribuir significação às coisas as que o homem encontra já

prontas na natureza e as que ele produz agindo sobre ela constitui o que entendemos por

produzir cultura” (PINO, 2005, p. 54). Cultura no sentido das produções humanas, as quais

são portadoras de significação, daquilo que o homem sabe e pode dizer a respeito delas. Na

medida em que as ações da criança vão recebendo a significação que lhe dá o outro, conforme

propõe a tradição cultural do seu meio social, ela vai incorporando a cultura que a constitui

como um ser cultural, como um ser humano (PINO, 2005, p. 59).

Segundo Vigotski, o desenvolvimento humano passa, necessariamente, pelo outro:

“poderíamos dizer que é por meio dos outros que nos tornamos nós mesmos [...] O indivíduo

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torna-se para si o que ele é em si pelo que ele manifesta aos outros” (VIGOTSKI apud PINO,

2005, p. 66). Nesse processo a criança/aluno não desempenha papel passivo.

CRIANÇA

Mediação semiótica do outro

CULTURA

Figura 2. Mediação do outro na interação criança-cultura.

Fonte: PINO, 2005, p. 66.

Do ponto de vista da corrente histórico-cultural da Psicologia, representada por

Vigotski (1998 e 2010), o desenvolvimento humano é cultural. No que se refere

especificamente à arte, o pesquisador elaborou um conceito vivência estética que

dialoga sobremaneira com as reflexões que tecemos até aqui acerca da importância do Outro e

do seu papel ativo no desenvolvimento cultural do sujeito.

Segundo Vigotski (2010, p. 333), a vivência estética é uma “atividade construtiva

sumamente complexa, que é realizada pelo ouvinte ou o espectador [...], o próprio receptor

constrói e cria o objeto estético”. O leitor/ouvinte/espectador é provocado por um estímulo e

reage a ele de modo responsivo, reconstruindo-o. Inicialmente, o organismo percebe o

estímulo, por meio do aparelho receptor15

. Depois, ele elabora o estímulo com o aparelho

central16

. Por fim, através do aparelho respondente, dá-lhe uma resposta17

(VIGOTSKI, 2010,

p. 15-50).

15 O primeiro momento da reação é a percepção pelo organismo dos estímulos enviados pelo meio exterior. Ele é denominado momento sensorial ou percepção do estímulo (VIGOTSKI, 2010, p. 16). Esse momento está

vinculado, segundo Vigotski (2010), ao aparelho receptor, que pertence a três campos do corpo humano. No

campo exteroceptivo ele é representado por todo o sistema de órgãos especiais dos sentidos que estão

predestinados à recepção das estimulações externas, à sua análise e transmissão a um centro. No campo íntero-

receptor, representado pelo estômago, intestino, coração, vasos sanguíneos e outros órgãos relacionados às

funções fundamentais do organismo, o aparelho receptor está adaptado para receber os estímulos internos. O

aparelho receptor também pertence ao campo proprioceptivo. Representado pelos músculos, articulações,

tendões, ele recebe as próprias reações do organismo. Sua única função é perceber as mudanças que

acompanham a reação (VIGOTSKI, 2010, p. 50-52). 16 O segundo momento da reação está relacionado com o aparelho central, também conhecido como aparelho da

elaboração. Ele é constituído pelos segmentos centrais do sistema nervoso, que são a massa da medula espinhal e

do cérebro. A massa da medula espinhal é um espaço de localização da experiência hereditária e das reações hereditárias. A massa do cérebro, mais conhecida como córtex cerebral, é uma espécie de superestrutura erigida

sobre o sistema nervoso central. Ele é o órgão da experiência pessoal do indivíduo, é uma região das respostas

condicionadas, isto é, são reações adquiridas na experiência com o mundo, estribadas em reações hereditárias. O

córtex cerebral decompõe o mundo nos seus elementos integrantes para possibilitar o estabelecimento dos

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Considerando esses momentos, Vigotski (2010) os transporta para o contexto de

quando o ouvinte/espectador/leitor vivencia a obra de arte. Ele denomina todo esse conjunto

de reação estética. Aprendemos a reagir esteticamente. Tal reação surge no processo da

experiência pessoal e depende das particularidades históricas, geográficas, individuais, de

gênero e de classe. Ela é variada e se distingue pela inconstância. O ouvinte, o expectador, o

leitor, quando vivencia a obra de arte, é ativo, reage a ela. De acordo com a sua experiência

pessoal, ele percebe, elabora e responde ao objeto estético (VIGOTSKI, 2010, p. 20-21).

A reação é estética porque suas emoções se resolvem, principalmente, em imagens da

fantasia com um estímulo externo artístico. Porém, do ponto de vista psicológico, a obra de

arte é mais que um estímulo externo (VIGOTSKI, 1998, p. 333). Ela é um sistema organizado

de modo consciente e tem força para provocar emoções que não se manifestam no nosso dia a

dia. Essa força se deve, em parte, ao trabalho do autor-criador, que se esforça para construir

uma divergência interior entre conteúdo e forma. Mas essa força também está relacionada ao

fato de o conteúdo e a forma serem recolhidos do social. Então, no momento em que a obra de

arte é vivenciada, essa divergência entre conteúdo e forma provoca uma contradição

emocional no sujeito, tornando esse sentimento social em pessoal (VIGOTSKI, 1998, p. 272-

273).

A estimulação é “O momento da percepção sensorial da forma, aquele trabalho

desempenhado pelo olho e o ouvido constitui apenas o momento primeiro e inicial da

vivência estética” (VIGOTSKI, 1998, p. 333). Embora a reação estética comece pela

percepção sensorial, ela não se conclui nesse momento (VIGOTSKI, 1998, p. 249-250). Na

elaboração e na resposta, acontece o que o autor denominou de “síntese criadora secundária”.

vínculos entre o organismo e o meio (VIGOTSKI, 2010, p. 50-54). O segundo momento da reação elabora os

estímulos enviados pelo meio exterior e é chamado de central ou momento da elaboração do estímulo. 17 O terceiro é último momento é realizado pelo aparelho respondente ou responsivo. Ele é um sistema formado por todos os órgãos funcionais do organismo, como músculos e tendões para as respostas motoras, pelo coração

e pelos vasos sanguíneos para as respostas somáticas, pelas glândulas de secreção interna e externa para as

respostas secretórias. O homem não pensa só com o auxílio do cérebro, mas por meio de uma atividade

coordenada e determinada do conteúdo de sua caixa craniana em associação com todas as glândulas de secreção

interna. Com isso, tais glândulas são de extrema importância na reação humana. Elas lançam sua secreção

diretamente no sangue e, por isso, são denominadas sanguíneas, endócrinas ou glândulas de secreção interna. Os

produtos da sua secreção no sangue são denominados hormônios. A secreção interna é importante para todo o

organismo, pois os fenômenos do crescimento, a constituição do corpo, o tamanho e as formas dos órgãos

dependem da secreção interna. O sistema hormonal ou secretório depende de outros sistemas, o circulatório e o

nervoso. O sistema circulatório distribui os hormônios por todo o corpo. O sistema nervoso domina os demais

órgãos do corpo e as glândulas endócrinas, e vice-versa. Essas glândulas estão aptas a levar estimulações ao

centro e a receber desses impulsos executivos como qualquer músculo. Nesse sentido, as glândulas de secreção interna integram o aparelho responsivo do sistema nervoso. O cérebro influencia o sistema hormonal e, por meio

dele, torna a exercer influência sobre si mesmo (VIGOTSKI, 2010, p. 54-61). O terceiro e último momento,

denominado motor, é a ação responsiva do organismo, sob a forma de movimento resultante de processos

internos.

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Nela o sujeito deve reunir em um todo e sintetizar os elementos dispersos na totalidade

artística (VIGOTSKI, 2010, p. 334). Esse trabalho de análise é função do córtex cerebral

(órgão da experiência pessoal do indivíduo), que decompõe o mundo nos seus elementos

integrantes e depois estabelece os vínculos entre o organismo e o meio (VIGOTSKI, 2010, p.

52-54).

Por meio da empatia, projetamos o conteúdo e os sentimentos que relacionamos com o

objeto da arte. Segundo Vigotski (1998, p. 334), essa atividade da empatia consiste em um

reatamento de uma série de reações internas, da sua coordenação vinculada e em certa

elaboração criadora do objeto.

A luta entre forma e conteúdo é propriedade fundamental da obra de arte. Segundo o

autor, essa luta provoca no ouvinte/espectador/leitor uma contradição emocional que suscita

uma série de sentimentos opostos entre si e provoca o seu curto-circuito. Esse é o verdadeiro

efeito da obra de arte (VIGOTSKI, 1998, p. 269). “É nessa transformação das emoções, nessa

sua autocombustão, nessa reação explosiva que acarreta a descarga das emoções

imediatamente suscitadas, que consiste a catarse da reação estética” (VIGOTSKI, 1998, p.

272, grifo nosso). Desse modo, resumimos a reação estética de Vigotski no seguinte esquema:

Estimulação Elaboração Resposta

(aparelho receptor) (aparelho central) (aparelho respondente)

Catarse

Diagrama 2. Reação estética de Vigotski

Fonte: Vigotski, 1998.

Vigotski (1998, p. 313-314) entende que, por si só, o sentimento não é capaz de criar

arte. É necessária a criação do autor e do ouvinte/espectador/leitor. Só então a arte se realiza

plenamente. Essa é a razão de a vivência estética ser uma atividade construtiva:

a percepção da arte também exige criação, porque para essa percepção não basta

simplesmente vivenciar com sinceridade o sentimento que dominou o autor, não

basta entender da estrutura da própria obra: é necessário ainda superar criativamente

o seu próprio sentimento, encontrar a sua catarse, e só então o efeito da arte se

manifestará em sua plenitude (VIGOTSKI, 1998, p. 313-314). “A arte é trabalho do pensamento, mas de um pensamento emocional inteiramente

específico” (VIGOTSKI, 1998, p. 57). As emoções estéticas são inteligentes e parciais, pois

não tendem passar à ação. Elas se resolvem principalmente em imagens da fantasia. Esse é o

seu traço distintivo em relação à emoção real (VIGOTSKI, 1998, p. 266-267).

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No entanto, há realidade nas emoções estéticas. Vigotski (1998, p. 264) exemplifica da

seguinte maneira: se confundo uma pessoa com um casaco que ficou pendurado à noite no

quarto, o equívoco é evidente porque nenhum conteúdo real corresponde a essa vivência.

Contudo, o sentimento de pavor que experimento nesse ato é real. Assim, vemos que o

sentimento e a fantasia não são dois processos separados entre si, mas o mesmo. A fantasia é a

expressão central da reação emocional.

Para Vigotski (1998) a emoção é um dispêndio de energia. A descarga das emoções

durante a reação estética não é uma descarga no vazio. Ela é uma reação à obra de arte. É na

fantasia que essas emoções são descarregadas. Quanto maiores são o dispêndio e a descarga

das emoções, maior é a comoção causada pela arte. Desse modo, Vigotski afirma que a reação

estética “encerra em si a emoção que se desenvolve em dois sentidos opostos e encontra sua

destruição no ponto culminante, como uma espécie de curto-circuito” (VIGOTSKI, 1998, p.

270, grifo do autor).

O vivenciamento estético de uma obra de arte pode ter efeito emocional, moral e

cognitivo. O efeito emocional, o momento hedonístico do prazer suscitado pela obra de arte,

pode exercer influência educativa no processo das nossas sensações. Já o efeito moral se

realiza sob a forma de processo íntimo, manifesta-se em certa elucidação interior do mundo

psíquico, em certa superação dos conflitos íntimos e na libertação de certas forças reprimidas,

em especial as forças do comportamento moral. Não é possível saber de antemão o tipo de

efeito moral que qualquer livro irá exercer. Ele pode ser casual e secundário. O vivenciamento

estético de uma obra também pode ter um efeito cognitivo, isto é, ampliar a nossa concepção

de algum campo de fenômenos, levar-nos a vê-lo com novos olhos, a generalizar e unificar

fatos que antes estavam inteiramente dispersos. A vivência estética nunca passa sem deixar

vestígios para o nosso comportamento. Ela dá para futuras ações um novo sentido e leva a ver

o mundo de modo diferente (VIGOTSKI, 2010, p. 325-343).

Se a vivência estética deixa marcas, o mesmo acontece com a vivência estética da

literatura. Para refletirmos sobre esse processo formativo, vamos abordar, inicialmente, a

questão da leitura como formação e a formação como leitura, ambas válidas para o processo

de formação do leitor literário.

De acordo com Larrosa (2003, p. 25-26), a leitura como formação se refere a uma

atividade que tem relação com a subjetividade do leitor, com aquilo que ele sabe e com o que

ele é. A leitura, nessa perspectiva, é algo que nos forma, ou nos de-forma, ou nos trans-forma.

Ela nos constitui, coloca-nos em questão com aquilo que somos. A leitura é algo que nos faz

ser, mas também é o que somos.

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Na leitura como formação não há fronteiras entre o real e o imaginário, o

conhecimento e o sujeito. Nessa perspectiva a leitura é uma experiência de formação. O

estudo da origem do conceito de imaginação explica o uso dos termos subjetivo e experiência

dessa abordagem da leitura. Na ciência moderna, conforme explicita Larrosa (2003, p. 27-28),

a imaginação está ligada ao não real, à ficção, ao delírio, à fantasia, à alucinação, ao sonho.

Vem daí a perda do seu valor cognitivo e sua referência maior ao campo da Psicologia. Aqui a

imaginação está ao lado do subjetivo.

Na Antiguidade a imaginação era considerada o meio essencial do conhecimento. Ela

era a faculdade mediadora entre o sensível e o inteligível, a forma e o intelecto, o objetivo e o

subjetivo, o corporal e o não corporal, o exterior e o interior. Na época a imaginação estava

ligada à experiência. Na contemporaneidade há uma nova compreensão do papel cognitivo da

imaginação. Do ponto de vista linguístico, a imaginação tem uma relação reprodutiva e

produtiva com a realidade. A imaginação produz, incrementa e transforma a realidade.

A leitura como formação é um modo de afirmar a potência formativa e transformativa

(produtiva) da imaginação. Dar luz à palavra “formação” na definição de um conceito para

pensar aulas de Literatura em escolas reafirma tal potência formativa da leitura e,

consequentemente, da literatura, na medida em que estamos tratando de uma questão central

no desenvolvimento intelectual das crianças, a sua imaginação, que está ligada ao subjetivo e

à experiência. A imaginação traz consigo a potência de formar e transformar.

Vimos que a leitura como formação reaproxima o conhecimento com a subjetividade.

Sem a relação entre texto e subjetividade, a leitura não resulta em formação. Para Larrosa

(2003, p. 25) a leitura como formação apenas se dá na medida em que há uma relação íntima

entre o texto e a subjetividade. Quando acontece essa relação, estamos diante de uma

experiência. Portanto, a leitura resulta em formação quando há experiência. Formamos

leitores literários quando há experiência.

A experiência é o que nos passa, nos afeta; é quando trocamos com o que sabemos;

resulta em formação ou na trans-formação do que somos; é quando a arte nos atravessa e

deixa marcas; é quando algo nos agita, altera, inquieta, perturba, afeta, emociona, desloca. A

experiência põe fim à fronteira entre o que sabemos e o que somos, o que passa e podemos

conhecer e o que nos passa, no sentido de que atribuímos sentido a algo em relação a nós

mesmos. A atribuição de sentido é parte da experiência. É vivência ou experiência estética

quando a obra de arte nos forma, de-forma ou trans-forma.

Nessa relação de produção de sentido é imprescindível que o leitor esteja disposto a

ouvir o que não sabe, o que não quer e o que não precisa. Ele deve estar disposto a se

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transformar em uma direção desconhecida. Quando o leitor continua o mesmo frente ao que

lê, ele reduz tudo à sua imagem, à sua medida. Ele não é capaz de ver outra coisa senão a si

mesmo. Aquele que lê apropria-se de si mesmo, converte o outro em uma variante de si

mesmo. É o leitor que lê a partir do que sabe, do que quer, do que necessita. Sua consciência

está cristalizada frente ao que poderia ser posto em questão.

Essa relação de escuta é o que define a outra face da leitura de que Larrosa (2003)

trata: a formação como leitura. Os livros, as pessoas, os objetos, as obras de arte, a natureza,

os acontecimentos que ocorrem ao nosso redor querem nos dizer algo. É uma relação de

produção de sentido, de escuta entre o leitor e o outro. Uma pessoa que não é capaz de se

colocar à escuta cancelou o seu potencial de formação e de trans-formação. Diríamos ainda

que ela pôs em suspenso o seu potencial de vivência e experiência estética. Nela o outro deve

permanecer o outro e não se tornar o outro eu.

[...] fazer uma experiência com algo significa que algo nos acontece, nos alcança;

que se apodera de nós, que nos tomba e nos transforma. Quando falamos em „fazer‟

uma experiência, isso não significa precisamente que nós a façamos acontecer,

„fazer‟ significa aqui: sofrer, padecer, tomar o que nos alcança receptivamente,

aceitar, à medida que nos submetemos a algo. Fazer uma experiência quer dizer,

portanto, deixar-nos abordar em nós próprios pelo que nos interpela, entrando e

submetendo-nos a isso. Podemos ser assim transformados por tais experiências, de

um dia para o outro ou no transcurso do tempo (HEIDEGGER apud LARROSA,

2003, p. 30-31).

Pensar a leitura literária como experiência recupera criticamente a ideia de formação.

Para a educação tecnocientífica o conhecimento é essencialmente a ciência e a tecnologia,

algo infinito, universal e objetivo. É algo que está fora de nós e de que podemos nos apropriar

e utilizar. Nessas condições, a mediação entre o conhecimento e a vida é a apropriação

utilitária. A experiência é experimento e formar significa dar forma e desenvolver um

conjunto de disposições preexistentes, levar o homem para a conformidade com um modelo

ideal fixado e assegurado de antemão. Assim, a educação se converte em uma questão de

transmissão de conhecimento. O professor transmite conhecimentos, antecipa o sentido do

texto e as atividades de leitura são um meio para chegar a um saber previsto de antemão. A

leitura como experimento é uma parte definida e sequenciada de um método ou de um

caminho seguro para um modelo prescritivo de formação.

Porém, nem sempre o conhecimento foi separado da vida. A categoria experiência

serviu muitos séculos para pensar a relação entre conhecimento e vida como mediação. Ela

era chamada de “saber humano” ou “saber de experiência”. Esse saber é finito, particular,

subjetivo, relativo, pessoal e inerente ao indivíduo. O saber da experiência ensina a viver

humanamente. Sob tal perspectiva, o professor transmite no sentido de permitir uma relação

com o texto, uma forma de atenção, uma atitude de escuta, uma inquietude, uma abertura. Isso

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não quer dizer que o professor fique passivo ou que somente administre o ato de leitura

durante a aula, como também não significa somente deixar os alunos lendo. O professor tenta

fazer com que a leitura como experiência seja possível.

... enseñar es aún más dificil que aprender. (…) No porque el maestro deba poseer

un mayor caudal de conocimientos y tenerlos siempre a disposición. El enseñar es

más dificil que aprender porque enseñar significa: dejar aprender. Más aún: el

verdadero maestro no deja aprender más que „el aprender‟. Por eso también su obra

produce a menudo la impresión de que propiamente no se aprende nada de él, si por

„aprender‟ se entiende nada más que la obtención de conocimientos útiles. El

maestro posee respecto de los aprendices como único privilegio el que tiene que aprender todavía mucho más que ellos, a saber: el dejar aprender. El maestro debe

ser capaz de ser más dócil que los aprendices. El maestro está mucho menos seguro

de lo que se lleva entre manos que los aprendices. De ahí que, donde la relación

entre maestro y aprendices sea la verdadera, nunca entra en juego la autoridad del

sabihondo ni la influencia autoritaria de quien cumple una misión (HEIDEGGER

apud LARROSA, 2003, p. 45). A perspectiva da leitura como experiência está articulada a uma concepção de

educação que para Larrosa (2003) não está vinculada ao par ciência e técnica e nem à teoria e

à prática. O autor propõe uma terceira via, a educação como experiência.

Se no par ciência e técnica a perspectiva é positivista, em teoria e prática a abordagem

é política e crítica. Em uma os sujeitos são técnicos que aplicam diversas tecnologias

pedagógicas, desenhadas por cientistas, tecnólogos e especialistas. Na outra os sujeitos são

críticos, comprometidos com práticas educativas concebidas desde uma perspectiva política.

Na dupla ciência e técnica a educação é uma ciência aplicada. Já em teoria e prática a

educação é compreendida como práxis política. Larrosa (2003, p. 39-41) não se localiza em

nenhum desses pontos de vista acerca da educação, e traz, então, uma proposta. Ver a

educação e a leitura a partir da experiência. Para tal se faz necessário trazer à cena o conceito

de palavra, pois ela é constituinte da abordagem larrosiana.

Para Larrosa (2003, p. 70-71) as palavras produzem sentido, criam realidade, têm

poder e força. Nós fazemos coisas com as palavras e elas fazem coisas conosco. As palavras

determinam nosso pensamento porque pensamos com palavras, pensamos desde as nossas

palavras. Pensar, nesse sentido, não se restringe somente a racionalizar, calcular e argumentar.

Pensar também é dar sentido ao que somos e ao que nos passa.

O modo como nos colocamos ante nós mesmos, ante os outros e ante o mundo em que

vivemos e ainda o modo como atuamos diante de tudo tem relação com as palavras. Essa

maneira de pensar sobre a palavra vai ao encontro do que Aristóteles definiu como homem:

vivente dotado de palavra. Ele é um vivente de palavra. O homem é palavra. O humano se dá

na palavra.

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Quando fazemos coisas com as palavras, como criticar, eleger, cuidar, inventar, jogar,

impor, proibir, transformar, estamos dando sentido ao que somos e ao que nos passa. Nomear

o que fazemos não é somente uma questão terminológica. Do ponto de vista da técnica

aplicada, da práxis reflexiva e da experiência, nomear o que somos, fazemos, pensamos,

percebemos e sentimos é diferente. A luta pelas palavras, pelos significados, pelo controle ou

silenciamento das palavras, pela imposição ou desativação de certas palavras, são lutas em

que se joga algo mais do que simplesmente palavras.

A experiência literária nos coloca dentro da luta pelas palavras. Por que é difícil viver

tal experiência no sentido daquilo que nos passa? Como fazer com que vivamos experiências?

Larrosa (2003, p. 87-94) nos traz algumas questões que revelam o que dificulta vivê-las.

O excesso de informação. Uma sociedade que está fundada na informação é uma

sociedade em que a experiência é impossível. Informação não é experiência. O sujeito da

informação sabe muitas coisas, passa todo o tempo buscando informações, cada vez sabe

mais. Embora saiba mais, nada lhe passa. Saber coisas (estar informado) é diferente do saber

da experiência. Nesse tipo de sociedade parece que a informação, o conhecimento e a

aprendizagem são sinônimos, como se o conhecimento se desse ao modo da informação e

aprender fosse adquirir e processar informações.

O excesso de opinião. O sujeito da opinião passa a vida opinando sobre qualquer

coisa. Se alguém não tem opinião, se não tem uma posição própria sobre o que passa, se não

tem um juízo preparado sobre qualquer coisa que se apresente, ele se sente em falta.

A falta de tempo. Ela traz consigo a falta de silêncio e de memória. Tudo passa

depressa e se reduz a um estímulo fugaz e instantâneo. Um estímulo é substituído

imediatamente por outro estímulo ou excitação igualmente efêmera e fugaz. Assim, o

acontecimento se dá na forma de choque, de sensação, vivência instantânea, desconectada. A

velocidade com que as coisas acontecem no mundo moderno impede a sua conexão

significativa, a memória. O sujeito moderno é informado, opina, consome notícias, é curioso,

está sempre insatisfeito, é incapaz do silêncio, é agitado. Ele é o sujeito do estímulo. Tudo o

atravessa, excita-o, agita-o, choca-o. Mas nada lhe passa. Nessa mesma lógica atua a

educação, em que temos o sujeito da formação permanente e acelerado. Ele usa o tempo como

uma mercadoria.

Além do excesso de informação e de opinião, como também da falta de tempo, o

excesso de trabalho nos impede de viver a experiência. Ao não poder parar, nada nos passa. O

sujeito moderno trabalha e muito. Segundo Larrosa (2003), o sujeito moderno se acha

onipotente. Ele crê que pode fazer tudo o que lhe é proposto e que, se não pode, algum dia

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poderá. Ele se relaciona com o acontecimento do ponto de vista da ação. Ele sempre se

pergunta o que pode fazer, deseja produzir algo, modificar algo. O sujeito moderno se

encontra atravessado pelo afã de trocar as coisas. Está sempre querendo o que não é porque

está sempre ativo, mobilizado. Ele não pode parar.

La experiencia, la posibilidad de que algo nos pase, o nos acontezca, o nos llegue,

requiere un gesto de interrupción, un gesto que es casi imposible en los tiempos que

corren: requiere pararse a pensar, pararse a mirar, pararse a escuchar, pensar más

despacio, mirar más despacio y escuchar más despacio, pararse a sentir, sentir más

despacio, demorarse en los detalles, suspender la opinión, suspender el juicio,

suspender la voluntad, suspender el automatismo de la acción, cultivar la atención y

la delicadeza, abrir los ojos y los oídos, charlar sobre lo que nos passa, aprender la

lentitud, escuchar a los demás, cultivar el arte del encuentro, calar mucho, tener

paciencia, darse tempo y espacio (LARROSA, 2003, p. 94).

Portanto, o sujeito moderno é ultrainformado, repleto de opiniões, superestimulado,

cheio de vontade e hiperativo. E quem é o sujeito da experiência? Ele é território de passagem

uma superfície de sensibilidade na qual o que passa o afeta , é lugar de chegada

aonde chegam coisas, e ao recebê-las dá lugar a elas e espaço do acontecer nele tem

lugar acontecimentos. O sujeito da experiência se define pela sua atividade e passividade,

receptividade, disponibilidade e abertura.

Porém, essa passividade não se refere aos antônimos ativo e passivo. Ela é feita de

paixão, padecimento, paciência e atenção. Ela é uma primeira receptividade, uma

disponibilidade fundamental, uma abertura essencial. Nessa passividade, que significa

abertura, recepção e disponibilidade, encontramos o conceito de contemplação estética,

postulado por Bakhtin (1993a, p. 92, grifo do autor): “contemplar esteticamente significa

submeter um objeto ao plano valorativo do outro”.

A “contemplação é a ativa, efetiva exotopicidade do contemplador com relação ao

objeto contemplado” (BAKHTIN, 1993a, p. 90). A exotopia do contemplador é espacial,

temporal e valorativa. Quando contemplo o outro, nossos horizontes não coincidem porque

sempre verei e saberei algo que ele, da sua posição fora e diante de mim, não pode ver. Esse

excedente da minha visão deve-se à minha singularidade e à insubstitutibilidade do meu lugar

no mundo. Nesse momento e nesse lugar, em que eu sou o único a estar situado em dado

conjunto de circunstâncias, todos os outros estão fora de mim. A contemplação estética não

pode abstrair a singularidade do lugar que o sujeito dessa contemplação ocupa na existência.

O excedente da minha visão em relação ao outro condiciona certa esfera do meu ativismo, ou

seja, um conjunto daquelas ações internas ou externas que só eu posso praticar em relação ao

outro. Ao outro tais ações são inacessíveis no lugar que ele ocupa fora de mim. Elas

completam o outro justamente naqueles elementos em que ele não pode completar-se. Essas

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ações são infinitamente variadas em função da diversidade de situações da vida em que eu e o

outro nos encontramos em um dado momento (BAKHTIN, 2003, p. 21-23).

Para o autor a contemplação é ativa e eficaz. As ações de contemplação que decorrem

do excedente de visão externa e interna do outro são ações estéticas. O excedente de visão é

como se fosse o broto que repousa a forma e de onde ela desabrocha como uma flor. No

entanto, para que esse broto realmente desabroche na flor da forma concludente, é necessário

que o excedente de minha visão complete o horizonte do contemplado sem perder a

originalidade deste. Eu devo entrar em empatia com o outro, o que significa colocar-me no

lugar dele, retornar ao meu lugar, completar o horizonte dele com o meu excedente de visão,

convertê-lo, criar para ele um ambiente concludente a partir do meu conhecimento, da minha

vontade e do meu sentimento (BAKHTIN, 2003, p. 23).

A vida conhece dois centros de valor que são importantes e diferentes, embora tenham

relação entre si: eu e o outro (BAKHTIN, 2003, p. 91). As categorias eu e outro implicam

vivenciamentos distintos. O modo como eu vivencio o eu do outro é diferente do modo como

vivencio o meu próprio eu. Isso entra na categoria do outro como elemento integrante. Para o

ponto de vista estético, para mim, eu sou o sujeito de qualquer espécie de ativismo

(participação ativa em alguma coisa), é como se eu partisse de dentro de mim e me

direcionasse em um sentido adiante de mim, para o objeto. O objeto se contrapõe a mim-

sujeito. O outro indivíduo está no objeto para mim, o seu eu é apenas objeto para mim

(BAKHTIN, 2003, p. 35-36). No caso da contemplação estética, o outro é o objeto estético

que se encontra fora, no mundo exterior do contemplador. Na contemplação estética um

momento essencial é a empatia estética, ou seja, a identificação com um objeto individual.

Esse momento de empatia é sempre seguido pelo momento de objetivação, isto é,

colocar-se do lado de fora da individualidade percebida pela empatia, um separar-se

do objeto, um retorno a si mesmo. E apenas essa consciência de volta a si mesmo dá forma, de seu próprio lugar, à individualidade captada de dentro, isto é, enforma-a

esteticamente [...] Eu me identifico ativamente com uma individualidade e,

consequentemente, eu não me perco completamente, nem perco meu lugar único do

lado de fora dela, sequer por um momento. Não é o objeto que inesperadamente

toma possessão de mim como alguém passivo. Sou eu que me identifico ativamente

com o objeto: criar empatia é um ato meu [...]. A empatia realiza alguma coisa que

não existia nem no objeto de empatia, nem em mim mesmo, antes do ato de

identificação [...] (BAKHTIN, 1993a, p. 32-33, grifos do autor).

A empatia estética [...] realiza-se ativamente deste lugar único exotópico e é nesse

mesmo lugar que a recepção estética se realiza, isto é, a afirmação e a formação do

material absorvido através da empatia (BAKHTIN, 1993a, p. 84).

Com uma ampla concepção de atividade estética, Bakhtin (2003, p. 424) não a

circunscreve apenas no âmbito de uma obra de arte. Ele descreve três momentos da atividade

estética que dialogam com o que foi citado acima acerca da contemplação estética. Segundo o

autor, o primeiro momento da atividade estética é a compenetração, isto é, eu devo vivenciar

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o que o outro vivencia (ver e inteirar-me), colocar-me no lugar dele. Esse momento, a nosso

ver, corresponde à empatia estética. A compenetração deve ser seguida de um retorno a mim

mesmo (objetivação). Quando retornamos a nós mesmos, a atividade estética começa

propriamente. Enformamos e damos acabamento ao material da compenetração (recepção

estética). Vale ressaltar que os elementos da compenetração e acabamento não se sucedem

cronologicamente (BAKHTIN, 2003, p. 22-25).

Assim, para o autor, criar empatia é um ato necessário, mas insuficiente para a

contemplação estética como um todo (BAKHTIN, 1993a, p. 101). A contemplação estética é

cocriação, é uma criação do autor-criador e do autor-contemplador (BAKHTIN, 2003, p.

137). O autor-criador deve ser entendido como um orientador autorizado do leitor, aquele que

guia ativamente o autor-contemplador (BAKHTIN, 2003, p. 191).

Na contemplação da obra de arte eu devo experimentar-me, em certa medida, como

criador da forma, a fim de realizar inteiramente uma forma artisticamente significante

enquanto tal. Eu devo experimentar a forma como a minha relação ativa com o conteúdo que

se opõe à forma como algo passivo que precisa dela. Eu, autor-contemplador, torno-me ativo

na forma e através dela ocupo uma posição fora do conteúdo (enquanto orientação cognitiva e

ética), e isso possibilita pela primeira vez o acabamento. Para Bakhtin (1993b), a forma é a

expressão da relação ativa do autor-criador e do autor-contemplador com o conteúdo.

Deste modo, durante a leitura ou a audição de uma obra poética, eu não permaneço

no exterior de mim, como o enunciado de outrem, que é preciso apenas ouvir e cujo

significado prático ou cognitivo é preciso apenas compreender; mas, numa certa medida, eu faço dele o meu próprio enunciado acerca de outrem, domino o ritmo, a

entonação, a tensão articulatória, a gesticulação interior (criadora do movimento) da

narração, a atividade figurativa da metáfora etc., como a expressão adequada da

minha própria relação axiológica com o conteúdo, ou seja, na percepção não viso as

palavras, os fonemas, o ritmo, mas com as palavras, com os fonemas e com o ritmo

viso ativamente um conteúdo: envolvo-o, formo-o e arremato-o [...] (BAKHTIN,

1993b, p. 59). Assim, resumimos a contemplação estética de Bakhtin (1993b) no seguinte esquema:

Empatia estética (compenetração)

Objetivação (retorno a mim mesmo)

Recepção estética

Acabamento (formação e acabamento)

Diagrama 3. Contemplação estética de Bakhtin.

Fonte: BAKHTIN, 1993b.

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Os conceitos de experiência, contemplação estética e vivência estética não apresentam

a mesma definição. No entanto, encontramos pontos em comum, a saber: a) são ações

construtivas, ativas; b) são realizadas pelo ouvinte/espectador/leitor; e c) constroem e criam o

objeto estético. Além disso, a vivência e a contemplação estética não se concluem no primeiro

momento, apresentam três momentos e trazem o conceito de empatia.

As diferenças consistem, principalmente, no processo de construção do objeto estético.

A vivência estética resume-se em três momentos: estimulação, elaboração e resposta. Na

contemplação estética os três momentos são outros: empatia estética, objetivação e

acabamento. A correlação que é possível estabelecer entre ambos é a questão do acabamento.

Interessante notar que nos dois conceitos é possível que o ouvinte, espectador ou leitor

realize somente o primeiro momento: a estimulação (vivência estética) e a empatia estética

(contemplação estética). Contudo, isso não quer dizer que ele realizou todo o processo, apenas

o iniciou. “A percepção mais simples da forma ainda não é, por si mesma, um fato estético”

(VIGOTSKY, 1998, p. 68). “Só porque vemos ou ouvimos algo não quer dizer que já

percebemos a sua forma artística [...] é preciso ingressar como criador no que se vê, ouve e

pronuncia” (BAKHTIN, 1993b, p. 58-59, grifo do autor).

O sujeito da experiência, da vivência e da contemplação estética é um sujeito que lê,

diz e cria, ou seja, é um sujeito exposto, o que pode ser visto na etimologia da palavra

experiência, estudada por Larrosa (2003). Ela vem do latim experiri, que significa provar. A

experiência é um encontro ou uma relação com algo que se experimenta, que se prova. Periri

é um radical que também é encontrado em periculum, que significa perigo. Per é raiz indo-

europeia com a qual se relaciona a ideia de travessia e de prova. Dessa raiz em grego temos os

seguintes derivados: peirô (atravessar), pera (mais adiante), peraô (passar através), perainô

(ir até o final), peras (limite) e peiratês (pirata). Esse per grego tem na palavra peiratês. O

sujeito da experiência tem a ver com os piratas, pois se expõe atravessando um espaço

indeterminado e perigoso, coloca-se à prova e busca sua oportunidade. Ex de exterior,

estrangeiro, exílio, estranho e existência. A experiência é a passagem da existência. A

passagem de um ser que não tem essência, ou razão, ou fundamento, que simplesmente existe

de uma forma singular, finita, imanente e contingente. Em alemão, experiência tem relação

com viajar, perigo, pôr em perigo. Então, na língua germânica e nas latinas, a palavra

experiência contém inseparavelmente a dimensão de travessia e perigo.

O sujeito da experiência, da vivência e da contemplação estética é território de

passagem, lugar de chegada, espaço do acontecer, como são os piratas. O sujeito da

experiência não se concebe como dado. Ele se inventa e se experimenta. Esse sujeito não está

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por descobrir, mas por inventar; não está para ser realizado, mas para ser conquistado; não

está para ser explorado, mas para ser criado da mesma maneira que a obra de arte é criada

pelo artista. Larrosa (2003) conclui que, para chegar a ser o que é, devemos ser artistas de nós

mesmos.

El llegar a ser lo que se es presupone el no barruntar ni de lejos lo que se es. Desde

este punto de vista tienen su sentido y valor próprios incluso los desaciertos de la

vida, los momentaneos caminhos secundarios y errados, los retrasos, las „modestias‟,

la seriedade dilapidada en tareas situadas más allá de la tarea. Em todo esto puede

expresarse una gran cordura, incluso la cordura más alta: cuando el „nosce te ipsum‟

(conócete a ti mesmo) sería la receta para perecer, entonces el olvidarse, el

malentenderse, el empequenecerse, el estrecharse, el mediocrizarse se transforman

en la razón misma (NIETZSCHE apud LARROSA, 2003, p. 135-136).

Para chegar a ser o que é, de acordo com Larrosa (2003), deve-se seguir o próprio

instinto e deixar que o inconsciente atue. Além disso, é necessário que os professores sejam

utilizados como pretexto temporário para a experimentação de si. Depois, deve-se saber

deixá-los. Nessa viagem somos tomados por outros, passados por outros, divididos de nós

mesmos. Tudo isso não é “eu”, mas ao mesmo tempo é.

Esses três conceitos vivência estética, experiência estética e contemplação estética

conferem muita força à função formativa da literatura, o que, em certa medida, também

aparece na etimologia da palavra experiência. Nesses conceitos ela encontra condição de

possibilidade de ser vivenciada. Por nos ser tão cara essa função, pensamos que ela merecia

maior destaque na definição de um conceito que aborde aulas de literatura. Reconhecemos

que o letramento literário e a educação literária levam em conta tal função. Do ponto de vista

do letramento literário,

a literatura permite que o sujeito viva o outro na linguagem, incorpore a experiência

do outro pela palavra, tornando-se um espaço privilegiado de construção de sua

identidade e de sua comunidade. Na verdade, todos nós construímos e reconstruímos

nossa identidade enquanto somos atravessados pelos textos. O que cada um é, o que quer ser e o que foi dependem tanto de experiências efetivas, aquelas vividas, como

da leitura que faz das próprias possibilidades de ser e das experiências alheias a que

tenha acesso por meio dos textos. Em outras palavras, somos construídos tanto

pelos muitos textos que atravessam culturalmente os nossos corpos, quanto pelo

que vivemos. O mesmo acontece com a nossa compreensão do que vivemos e da

comunidade onde vivemos. A experiência da literatura amplia e fortalece esse

processo ao oferecer múltiplas possibilidades de ser o outro sendo nós mesmos,

proporcionando mecanismos de ordenamento e reordenamento do mundo de uma

maneira tão e, às vezes, até mais intensa do que o vivido (COSSON; PAULINO,

2009, p. 69-70, grifo nosso). Para a educação literária seu objetivo é,

en primer lugar, el de contribuir a la formación de la persona, formación

indisolublemente ligada a la construcción de la sociabilidad y realizada a través de la

confrontación con textos que explicitan la forma en la que las generaciones

anteriores y las contemporáneas han abordado y abordan la valoración de la

actividad humana (COLOMER, 2009, p. 73, grifo nosso).

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Contudo, ambas definições “o processo de apropriação da literatura” e “o

aprendizado da interpretação de textos literários” não dão luz à função formativa da

literatura.

Devido à acepção ampla que o termo letramento sugere, entendemos que talvez não

seja apropriado incluir na definição de letramento literário a palavra formação. O termo

letramento se refere às culturas escritas e trata de um campo de pesquisa complexo, no qual

diferentes áreas do conhecimento buscam compreender as diversas facetas da escrita. Além

disso, procuram compreender seus usos em diferentes contextos históricos e sociais, suas

funções e consequências para grupos ou indivíduos específicos (STREET, 2014, p. 7). A

cultura escrita tem sido objeto de interesse de muitas disciplinas, como a História,

Antropologia, Filologia, Psicologia, Sociologia, Pedagogia, Linguística, Linguística Aplicada

e Literatura. Os pesquisadores passaram a viver o desafio de compreender a escrita não

somente do ponto de vista da Linguística ou da Psicolinguística, mas também do ponto de

vista histórico, antropológico e cultural, considerando ainda as relações de poder. No que

tange à educação literária, talvez a inserção da palavra formação na sua definição possa

também não ser pertinente por ela abranger uma rede de espaços muito diversificada onde a

literatura circula, como escolas, museus, bibliotecas, centros culturais, domicílios, livrarias.

Essa preocupação não se faz tão presente no conceito de educação literária,

possivelmente, porque o termo foi cunhado no âmbito da cidade de Barcelona, reconhecida

pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) desde

2015 como a Cidade da Literatura. A cidade conta com sólidas editoras, um grande número de

projetos em torno do livro e da leitura, e uma preocupação com a distribuição igualitária de

espaços culturais. Cada bairro possui a sua escola e biblioteca local, que funcionam em

parceria, e ainda centros culturais, associações de moradores, além de livrarias que propõem à

população local diversas atividades culturais em torno do livro e da leitura. Isso mostra que a

questão da escola como a principal formadora de leitores de literatura está superada. A

aprendizagem da interpretação de textos literários também pode passar pela escola, conforme

o próprio termo indica educação literária. Mas a escola não está posta como protagonista

desse processo.

No caso do Brasil, acreditamos que a formação de leitores literários não está superada.

Embora a escola não seja o espaço exclusivo dessa luta, conforme nos mostra a cidade de

Barcelona, entendemos que ela tem um papel central, já que a escola pública brasileira pode

vir a ser o único espaço onde o aluno tem acesso à literatura.

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Levando em conta o exposto até o momento, qual conceito será mais adequado para

dar suporte teórico à presente pesquisa: letramento literário ou educação literária? A noção de

processo, conforme postula o letramento literário, e a ideia de que há um aprendizado escolar

(educação literária) são aspectos importantes. Mas suas definições não conferem destaque à

escola e à função formativa da literatura. Pensamos, então, em formação literária. Britto

(2015, p. 34) propõe um termo bem próximo, a pedagogia da formação do leitor.

Na perspectiva da formação literária os livros para as crianças e jovens são entendidos

como literatura não infantil/juvenil. Literatura sem adjetivos (ANDRUETTO, 2012, p. 52).

Estamos de acordo com Candido (2004, p. 16) quando ele afirma que a literatura pertence a

um sistema simbólico que inclui “criações de toque poético, ficcional ou dramático em todos

os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura, desde o que chamamos folclore,

lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da produção escrita das grandes

civilizações”.

Quando falamos de formar o leitor, estamos tratando de um processo infinito de

criação de si mesmo. Então, essa formação não tem um fim, mas tem elementos que, depois

que o sujeito se apropria, ele os leva consigo para qualquer experiência literária. Quando o

sujeito passa a se ver, a se considerar como criador de si mesmo e aberto para o outro. O

outro, no caso, é tudo de imprevisível e de previsível que a literatura traz consigo. Portanto,

podemos dizer que se torna um leitor aquele que compreende que se constrói na relação com

o outro por meio da literatura. Assim, nem todo mundo que lê necessariamente é leitor

porque, na acepção que estamos defendendo, o sujeito que lê é leitor se ele se compreende

como cocriador da sua existência.

Contudo, isso também passa pela concepção de infância que a escola vive. No caso, a

concepção de infância que dialoga com essa ideia de leitor é a que compreende a criança na

sua singularidade e especificidade em relação ao adulto. Ela é vista como “agente social

pleno, sujeito ativo constituído na cultura e também produtor de cultura, cidadã de direitos

desde o nascimento cujas ações no mundo passam a ser entendidas como formas de

reelaboração e recriação” (CORSINO, 2014, p. 31). A criança como sujeito histórico e social

é pensada também na sua pluralidade e diversidade. Por isso, crianças e infâncias no plural.

Os adultos, então, são convidados a olhar as crianças “na sua dinâmica de constituição da

subjetividade e de transformação do mundo” (CORSINO, 2014, p. 31).

Contudo, não há garantias de que haverá a vivência de uma experiência de leitura,

tendo em vista que depende do texto, do momento que quem lê está vivendo, da situação na

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qual o livro chegou, como está sendo lido etc. Tudo isso interfere. Mas, colocando-se dessa

maneira, o sujeito abre condições de possibilidade de vivência literária.

Portanto, a formação do leitor tem um fim, mas a do sujeito não. O leitor se forma e

continua se formando enquanto sujeito. Depois que o leitor se forma, acreditamos que o que

acontece é um desenvolvimento, refinamento, aprimoramento das suas leituras. É claro que

esse desenvolvimento repercute na sua formação. O sujeito não cessa de se formar. Um

sujeito pensante e autor de sua existência vai sendo formado.

Para tanto, a dimensão temporal precisa ser refletida. Essas duas formações passam

pela categoria tempo. Na perspectiva da educação humanística a educação é leitura. As letras,

segundo Larrosa (2003, p. 567), constituíam o núcleo do currículo. Ela era, essencialmente,

um modo de relação com o texto escrito, uma experiência do livro. A experiência do livro

estava ligada a uma experiência do tempo. O tempo da leitura estava separado do tempo da

vida. Na educação humanística a biblioteca encarnava a memória coletiva, ou seja, a presença

e a solidez de uma tradição e sua capacidade de permanecer se renovando, e nessa perspectiva

o leitor estabelecia uma relação com o tempo da tradição e da cultura.

A educação humanística implicava em uma temporalidade diferente da temporalidade

da vida. Os novos alunos eram introduzidos não somente na vida, mas principalmente na

biblioteca, que representava o mundo das palavras escritas, tanto as que já existiam antes do

seu nascimento quanto as que existiriam depois de sua morte. Desse modo, a formação

literária para se constituir como tal precisa promover a separação entre o tempo da vida e o

tempo da leitura. Para isso, é necessário resgatar a dimensão temporal da educação

humanística. O tempo era o tempo histórico e coletivo da cultura porque o livro atualizava no

presente o passado, a tradição. E, assim, o livro representava a manutenção do dito no tempo

para ser infinitamente repetido e renovado.

Para possibilitar a vivência da experiência literária é necessário separar o tempo da

vida do tempo da cultura e trazer o aluno para vivenciar somente o tempo da cultura. Isso é

possível dentro da biblioteca, na relação com a biblioteca.

Na época da educação humanística o tempo da cultura se fazia presente na biblioteca,

considerada um espaço de memória. A educação obtinha o seu valor, seu sentido e sua

dignidade de iniciação do aluno nessa temporalidade, que tinha na biblioteca o seu espaço

próprio de rememoração. Nessa relação com a palavra dos livros, o leitor se forma a si

mesmo. Por isso, a experiência de leitura estava ligada à constituição da memória do leitor.

Formar-se como um homem das letras significava uma familiaridade com as obras literárias.

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A experiência de formação era se apropriar do que estava guardado nos livros na biblioteca. A

experiência de leitura era um modo de relação com texto.

Todavia, Larrosa (2003, p. 567-569) nos informa que houve uma transformação ligada

ao tempo na relação com o livro, na experiência do livro e da leitura, o que provocou uma

crise na educação humanística. Essa transformação também alterou a biblioteca. A biblioteca

humanista era um lugar sem exterior onde a Humanidade se apropriou do tempo e, com ele,

apropriou-se de si mesma. Na biblioteca, o Homem se fazia presente a si mesmo, reconhecia-

se e se celebrava. As palavras depositadas na biblioteca, convertidas em História, tornavam-se

memoráveis. O Homem formado era o homem da compreensão universal. Ele devorava os

livros, refletia, apropriava-se de toda a exterioridade.

A palavra já estava de antemão compreendida, lida e entendida. Seu espaço era um

espaço contínuo e homogêneo, sem exterioridade. Seu tempo era horizontal, acumulativo,

fechado no passado e aberto para o futuro. A biblioteca humanista podia ser um depósito

sempre disponível para novas utilizações e reutilizações.

Para Larrosa (2003, p. 582) o leitor da biblioteca humanista era soberano. Mas a ideia

da educação humanista já não é mais viável. Está em curso uma nova maneira de ler, uma

nova experiência do livro que implicará em uma nova experiência do tempo. A categoria

tempo entra com força e traz mudanças nas concepções de leitor e biblioteca.

A educação humanística representava a conservação de uma tradição. Sua seta era para

o passado. O sentido dessa conservação era um dos temas da reflexão filosófica. A formação

construía o futuro, mas sempre através do passado. Esse era um modo de conservação e

renovação da tradição cultural. Todavia, na educação moderna a nossa maneira de

compreender a educação está orientada para o futuro.

Na ideia de formação humanística Larrosa (2003, p. 582) destaca que há um sentido de

continuidade do tempo, do crescimento do futuro através de uma conexão com o passado.

Essa ideia tinha a ver com a palavra, especialmente as palavras dos livros da biblioteca. A

biblioteca era um espaço privilegiado. As palavras guardadas ali não eram quaisquer palavras.

E a experiência de leitura não representava qualquer relação com a palavra. As paredes da

biblioteca definiam uma interioridade fechada, um lugar onde o tempo não fluía. Era um

espaço separado da habitualidade dos espaços exteriores, cotidianos, onde o tempo

irremediavelmente se perde e as palavras são esquecidas. Essa separação em relação aos

espaços cotidianos conferiu à biblioteca a ideia de templo, de espaço sagrado e extraordinário

destinado à contemplação. No tempo da formação humanística o passado se guardava e se

assumia e se renovava para abrir um futuro.

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No âmbito da formação literária almejamos que a biblioteca se torne um espaço

cotidiano, no sentido de entrar na vida das pessoas, de elas terem dentro da sua rotina o hábito

de frequentá-la. Por outro lado, ansiamos também que ela seja reconhecida como um espaço

extraordinário, especial e importante. A palavra extraordinária é simbólica nessa ideia que

estamos tratando: extra, não no sentido de a biblioteca ser algo extra e nem exterior;

ordinária, no sentido de fazer parte do nosso cotidiano, ser habitual; extraordinária,

significando algo incrível. Relacionando essa ideia de biblioteca com o conceito de leitor, a

biblioteca pode ser compreendida como um espaço cotidiano de deslocamento.

Na sociedade de consumo a biblioteca deixou de ser templo. Os livros não são mais

sagrados. A biblioteca virou lugar profano. Os livros viraram produtos de consumo. O leitor

contemporâneo busca esquecer-se de si. Ele não é mais soberano nessa relação como fora na

educação humanista.

Por isso, Larrosa (2003, p. 593) afirma que somente a escola seria o último lugar onde

ainda haveria o leitor soberano e uma biblioteca no sentido humanista. A biblioteca escolar

seria um lugar onde, no meio da cultura de massa, os livros estariam valorizados, seria

mantida uma fronteira entre os textos valiosos da cultura e os textos não valiosos do consumo

ordinário. A biblioteca escolar manteria firme a distinção entre as boas e as más leituras. A

escola seria, então, um espaço de resistência à completa dessacralização da biblioteca. É

possível resistir?

O autor nos explica que a experiência do livro como experiência de formação

significava que a biblioteca era o lugar de construir sua própria identidade. Nesse sentido, a

experiência de leitura estaria submetida a uma finalidade moral, cognitiva ou puramente

estética. A leitura, na perspectiva humanista, era meio para chegar a algo, para saber mais, ser

melhor, aumentar nossa sensibilidade e conseguir prazer sem consequências.

Na contemporaneidade o homem está despossuído de sua experiência. A todo tempo

nos acontece um monte de coisas. Tudo o que acontece nos está disponível imediatamente em

forma de notícia. Porém, nada se traduz em experiência. O que acontece, acontece fora de

nós. Não podemos nos apropriar. Assistimos fascinados, divertidos ou comovidos ao que

acontece lá fora. O homem contemporâneo termina a sua jornada vazio, esgotado, mudo. Em

contrapartida, nunca leu tanto.

Na cultura de massas a relação com o livro é de ócio e consumo. Com o livro

buscamos nos esquecer de nós. Não somos soberanos nessa relação. Por isso que Larrosa

(2003) reitera que a escola seria o último lugar onde ainda poderíamos experimentar o lugar

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do leitor soberano. As leituras banais, exteriores, do homem comum estariam de fora. Nesse

sentido, entendemos que é importante recuperar o protagonismo da biblioteca.

O leitor, ao se apropriar da cultura, converte-se em dono do tempo e da palavra, autor

de sua existência. Aqui está uma chave. Na sociedade contemporânea quem tem a chave da

nossa casa não somos nós. Para nos tornarmos donos precisamos pertencer a um lugar

dedicado exclusivamente à formação humana. Esse lugar seria a escola? E qual seria o lugar

da leitura na escola? E da biblioteca escolar?

De acordo com essa perspectiva, propomos que a escola seja um lugar de resistência

da educação humanística, que reconheça a biblioteca escolar como uma esfera de circulação

cultural. Lugar onde grande parte do trabalho de formação do leitor possa acontecer. Onde

crianças, jovens e adultos possam viver esse espaço cultural e fazê-lo resistir à cultura de

massa. Quem é o leitor dessa perspectiva? É o leitor dono do tempo e da palavra. Precisamos

retomar a escola e a biblioteca escolar como o espaço da cultura, onde o tempo para para

formar. Na biblioteca o autor, a obra e o leitor se encontram em interlocução e participam

ainda de um diálogo entre diferentes disciplinas. O trabalho pedagógico realizado, então, no

âmbito de uma biblioteca escolar na perspectiva da formação literária precisa trabalhar com

essas duas categorias: o outro e o tempo, além da imaginação.

Nessa interlocução há diferentes forças em disputa no espaço da escola pública, que,

ao longo da sua história, apresentou diferentes concepções e práticas relativas à leitura. Há

diferentes razões para promover a formação do leitor literário, pois diferentes grupos sociais

conferem à leitura sentidos e significados distintos. Portanto, embora concordemos que é

importante formar o leitor, o que move os docentes a desenvolver essa formação carece de

consenso. Considerando essa questão, abordaremos no capítulo seguinte as linhas de forças de

promoção da leitura em articulação com as dimensões da literatura apresentadas no primeiro

capítulo.

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3 AS LINHAS DE FORÇA DE PROMOÇÃO DA LEITURA

A práxis, atividade projetiva, teleológica, antecipadora de objetivos, fundada sobre

opções, necessita da teoria. E nada lhe assegura que ela venha a ter, no nível de que

carece, a teoria pela qual anseia. Entre o praticismo do militante disciplinado que

se limita a cumprir tarefas e o sábio que tem vocação especulativa e se dedica

exclusivamente à teoria, encerrado na biblioteca, há diversos espaços que podem

proporcionar mediações fecundas entre a paixão vivida na ação e a reflexão crítica

independente, mas comprometida com o projeto transformador (e com sua concretização)

KONDER, 2002, p. 264, grifos do autor

No capítulo anterior discutimos sobre a formação literária e entendemos a escola como

espaço de formação do leitor por meio da vivência/experiência de ações interlocutórias com a

literatura. Nessa perspectiva, o outro, o tempo e a imaginação são três categorias que se

destacam como principais eixos do trabalho pedagógico na escola, em uma perspectiva

formativa da leitura. Entretanto, conforme já apontamos, muitas são as concepções e práticas

de promoção da leitura, e elas disputam lugar e diferentes forças entram em tensão. Forças

que se tensionam nas teorias com repercussões nas práticas e nas políticas de promoção da

leitura. Forças que também estão presentes nas concepções e práticas do trabalho de literatura

no CPII.

O presente capítulo visa a articular as dimensões da literatura (capítulo 1) e o conceito

de linhas de força de promoção da leitura com base, principalmente, em Britto (2012 e 2015),

Compagnon (2012) e Fittipaldi (2013)18

.

A ideia de linha de força surgiu inicialmente em 2015, no processo de análise dos

Melhores Programas de Incentivo à Leitura para Crianças e Jovens, da Fundação Nacional do

Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ). Durante o processo, formamos agrupamentos de programas

em função de suas intenções e ações e observamos que, apesar da distância geográfica, eles

tinham muito em comum. Percebemos também que os programas poderiam estar juntos em

outros agrupamentos, mas que havia uma intenção que prevalecia, predominava. Então, vimos

que os programas apresentavam direções diversas, mas, ao mesmo tempo, contraditórias. Isso

nos levou a pensar sobre a possibilidade de coexistência de intenções opostas em um mesmo

trabalho pedagógico.

18 É importante informar que este capítulo foi construído a partir da experiência vivida, em 2015, durante o desenvolvimento desta pesquisa, com a FNLIJ. Por meio da Profª. Maria Beatriz Serra, a FNLIJ nos convidou

para construir um retrato dos programas vencedores do concurso Melhores Programas de Incentivo à Leitura

para Crianças e Jovens, sob a supervisão de Elizabeth D‟Angelo Serra (secretária-geral da FNLIJ) e do Prof. Dr.

Luiz Percival Leme Britto, da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa).

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E quais intenções eram essas? Tais intenções deram nome aos agrupamentos de

programas. Como essas intenções estavam em conflito permanente, o Prof. Dr. Percival

nomeou-as de linhas de força19

, pois se assemelhavam à brincadeira do cabo de guerra. Uma

ação do programa puxava a corda para um lado, enquanto outra, para o lado oposto. A

apresentação da análise parcial desse trabalho ocorreu no 17º Salão FNLIJ do Livro Infantil e

Juvenil, no Rio de Janeiro, em 201520

.

É nossa intenção articular as linhas de força às questões abordadas anteriormente, já

que, embora as três perspectivas de ensino de literatura tendam a realçar uma ou outra linha

de força, tensões estão presentes e provocam contradições e ambivalências nas próprias ações

de formação.

3.1 As linhas de força

Se formos ao dicionário buscar pelas palavras linha e força, encontraremos definições

próximas ao campo da leitura. De acordo com o Minidicionário da Língua Portuguesa, linha

pode significar orientação (BECHARA, 2009, p. 559) e força, intensidade, energia, vigor

(BECHARA, 2009, p. 421). Assim, ao falar de linhas de força de promoção da leitura estamos

tratando das diferentes orientações que se mostram mais intensas, fortes, vigorosas quando se

promove a leitura. O termo linha de força também é encontrado na Física. Ao observar as

linhas formadas por limalhas de ferro21

em uma folha de papel colocada sobre um imã,

Faraday propôs o conceito de linhas de força. De acordo com o site Wikipédia22

, as linhas

possibilitam o estudo por onde passa o campo elétrico e a sua intensidade, conforme a

concentração de limalha de ferro. Assim, as linhas de força de promoção da leitura tornam

possível a identificação de por onde passa o trabalho por meio da análise daquilo que é mais

intenso ao promover a leitura.

No campo da leitura as linhas de força são compreendidas como diferentes formas de

compreensão e de ação que conduzem a ação e a percepção para um lugar. Qual é a

motivação de uma pessoa para realizar trabalhos com a leitura? Que direção ela segue?

19 A análise dos programas possibilitou a construção do conceito de linhas de força de promoção da leitura,

expressão cunhada pelo Prof. Dr. Luiz Percival Leme Britto. O aprofundamento do estudo dessas linhas também

contou com a orientação da Profª. Drª. Patrícia Corsino (UFRJ) em articulação com a experiência do doutorado

sanduíche. 20 Para conhecer os resultados preliminares da pesquisa, ver: BRITTO, Luiz Percival Leme; CAMASMIE, Vanessa de Abreu; SERRA, Elisabeth D‟Angelo. 20 anos do Concurso FNLIJ Os Melhores Programas de

Incentivo à Leitura para Crianças e Jovens. In: Notícias, n. 11, suplemento 49, novembro de 2015, p. 1-8. 21 Limalha: pó que cai de um metal quando este é limado (BECHARA, 2009, p. 558). 22 Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Linha_de_for%C3%A7a. Acesso em: 26/05/2016.

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Nesse campo as linhas de força co-ocorrem. Elas são percepções da leitura, da

subjetividade, da alteridade, da identidade. Nelas o conceito de conhecimento e de verdade

jogam e fazem acontecer uma ação. São linhas que se aproximam e se afastam. Elas

coexistem, tensionam, divergem, se suportam, se impõem umas às outras e operam na

promoção da leitura.

E a leitura? Palavra polissêmica que, etimologicamente, tem a mesma origem de

escolha e eleição. Esse sentido parece conter a ideia de que a escolha é do leitor, pois é ele

quem elege e dá sentido ao texto. Britto (2012, p. 19-21), ao se referir à polissemia do termo,

apresenta alguns significados que ele comporta.

Na ideia de leitura da luz, a leitura se aproxima da expressão leitura ótica, em que há a

decodificação de uma informação quantitativa que está codificada em parâmetros

mensuráveis, processada por um instrumento decodificador. A leitura da mão seria uma

leitura esotérica, que também inclui a leitura das cartas, dos búzios. O significado dos signos

“impressos” se manifesta apenas para o vidente (BRITTO, 2012, p. 22-23). A leitura do jogo

usada por esportistas e comentaristas se refere ao modo como jogadores e técnicos percebem

a partida, a tática de jogo e as intervenções possíveis (BRITTO, 2012, p. 24). A leitura do

filme corresponde à percepção e à análise da situação narrativa oferecida ao espectador, é uma

leitura nas entrelinhas (BRITTO, 2012, p. 28-29).

A leitura de imagem provoca uma ação intelectiva para além do simples ver, pois a

pessoa que interage com um livro de imagem precisa preencher vazios, acompanhar as ações,

perceber sentidos na forma dos traços (BRITTO, 2012, p. 30-31). A leitura de mundo,

utilizada para apresentar a opinião de alguém sobre alguma situação específica, aproxima-se

do sentido de encontrar significação pessoal em algo a partir de suas vivências. Sua correlata

seria a expressão leitura do mundo de Paulo Freire (BRITTO, 2012, p. 24-27).

Já a leitura do texto compreende, pelo menos, duas ações que possuem naturezas

distintas, mas estão interligadas: a decifração do escrito e a intelecção do conteúdo do texto

(BRITTO, 2012, p. 20-21). São duas concepções em disputa. A primeira entende que ler

significa o ato de decifrar signos gráficos. Tal concepção de leitura relaciona-se com a vida

cotidiana e tem como referência o senso comum. Associam-se a ela textos cuja interpretação é

fortemente contextualizada e seus referenciais são da ordem do cotidiano. Trata-se de uma

dimensão pragmática da leitura. O ensino da leitura contribui para a participação da pessoa no

cotidiano urbano, na realização de tarefas da vida diária que tem o uso da escrita como

pressuposto.

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A outra concepção entende a leitura como prática social. O conceito de letramento

proposto por Soares (1998, p. 38-43) mostra que a participação na sociedade urbano-industrial

exige dos indivíduos uma capacidade de ler e escrever que supera a condição de alfabetizado.

A leitura de um livro de literatura clássica, por exemplo, exige alguma vivência com a

Estética, a História, a Sociologia, a Política, a Filosofia e a Psicologia.

Essa vivência possibilita que o leitor realize articulações para além da simples

transposição ou ajuste do conteúdo daquilo que se lê ao seu quadro de referências. Assim, a

leitura de produções intelectuais é definida pela ação intelectual realizada na interação entre

um sujeito ou vários com objetos culturais que estão inseridos em diferentes campos de

referência. Nesse sentido, ser leitor depende de diversos fatores que vão além do interesse, do

hábito ou do gosto pela leitura. São necessárias condições objetivas e subjetivas, como tempo

e recursos materiais, formação e disposição pessoal. Tais condições estão distribuídas

desigualmente na nossa sociedade.

Desse modo, a dificuldade de leitura de textos sofisticados resulta do modo como as

pessoas interagem com os objetos da cultura letrada. Nessa concepção, o ensino da leitura

visa à formação das pessoas por meio da experiência e da vivência com o conhecimento nas

suas diversas formas de expressão.

Na disputa entre essas duas concepções leitura como decifração e leitura como

prática social há forças que tensionam a promoção da leitura. O que se quer promover

quando se promove leitura? Na visão de Britto (2012, p. 46-47, grifo nosso), o que se quer é

estimular o hábito de ler, compreendido como um gesto deliberado de ler determinados tipos

de texto com relativa frequência. Lemos para deleite pessoal, fruição, entretenimento, busca

de informação, instrução, aprimoramento pessoal. Então, o destinatário da promoção da

leitura é alguém que sabe ler.

E por que seria relevante estimular uma leitura frequente? Porque ler frequentemente

amplia a subjetividade e a capacidade de agir na sociedade. Trata-se de um processo

humanizador. Todavia, há outras possibilidades de realização desse processo, como a

convivência com pessoas de formações diversas, a interação com produtos diferentes da

cultura, o rádio, a TV e as mídias eletrônicas (BRITTO, 2012, p. 47). Essa concepção de

leitura interação intelectual com um discurso escrito traz consigo o conceito de

discurso. Bakhtin (2008, p. 207) afirma que discurso é “a língua em sua integridade concreta e

viva e não a língua como objeto específico da linguística”, ou seja, discurso é linguagem em

uso (BRAIT, 2008, p. 11).

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Em “O discurso na vida e o discurso na arte”, Bakhtin (1993b, p. 231) defende a arte

como uma espécie de relacionamento, um ato de comunicação, mas de um tipo específico. É

necessário olhá-la em duas direções. Distingui-la de outros tipos de comunicação ideológica,

como a política, a jurídica e a ética. Simultaneamente, essa forma única de comunicação não

existe de modo isolado, ela participa do fluxo da vida social, reflete a base econômica e entra

em interação e troca com outras formas de comunicação (CLARK; HOLQUIST, 2008, p.

221-223).

Bakhtin (1993b) associa arte à liberdade. Como os fatores locais (contexto) são menos

determinantes, a arte é sempre o mundo da maior outridade, a maior brecha através da qual o

presente pode escapar para um futuro não sonhado. Para o autor, o discurso na arte engloba os

criadores, as obras de arte e os perceptores. É na totalidade da relação autor/texto/leitor que se

localiza tal discurso (BAKHTIN, 1993b, p. 223-229).

Dessa maneira, a ação de interagir intelectualmente com um discurso escrito

compreende uma interação entre leitor, autor e obra. Estes três elementos se articulam

mutuamente. Nessa interlocução muitas questões estão envolvidas, tais como: as intenções e

conhecimentos prévios do leitor, a forma e o conteúdo da obra com o texto, imagens,

suportes, texturas, as intenções e valores do autor frente ao tema que aborda e aos leitores

presumidos por ele.

Nessa relação entra ainda, no âmbito da escola, o professor como formador do leitor

literário. Suas concepções de leitura e leitor entram em interlocução com o autor, o aluno-

leitor em formação e a obra. Por trás desse encontro temos a intenção do professor quando

entra na interlocução. É aí que as linhas de força de promoção da leitura encontram espaço de

tensão e se revelam.

3.1.1 Leitura e Ludismo

Na linha de força de promoção da leitura, o prazer, a satisfação e a realização são os

pressupostos dessa dimensão da leitura. Quando o prazer e o lazer estão como pano de fundo

do que é considerado lúdico, essa linha de força liga-se à indústria cultural. De acordo com

essa perspectiva, a experiência se faz pelo perder-se no prazer, na busca pela satisfação. A

leitura lúdica por ela mesma se vincula ao já estabelecido e traz consigo a ideia de que esse

prazer ligeiro forma.

É nesse aspecto que a disciplina e o prazer entram em confronto como se o

desinteresse pela leitura resultasse do caráter autoritário imposto pelas práticas pedagógicas

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tradicionais (BRITTO, 2012, p. 44). Essa leitura, também chamada de entretenimento, ao

espelhar o universo conceitual e valorativo do senso comum, torna-se mais fácil, pois supõe

conhecimentos e valores da vida cotidiana. Por essa razão, afirmamos que a leitura de

entretenimento não contribui para a experiência formativa, pois oferece a falsa ilusão de

crescimento.

Conforme afirmam Horkheimer e Adorno (2014, p. 24-31), a indústria cultural teve

sua origem nos países industriais mais liberais. Como ela se desenvolve conforme as leis

gerais do capital, a arte foi transposta para o consumo. Do ponto de vista desses autores, a

indústria cultural é a indústria do divertimento. Todo o seu poder sobre os consumidores é

mediado pela diversão, que está implícita nos seus elementos e já existia antes da própria

indústria cultural. Os autores ainda alegam que a diversão é o prolongamento do trabalho sob

o capitalismo tardio23

. Quem a procura é aquele que quer subtrair-se dos processos de trabalho

mecanizados para que possa novamente estar em condições de enfrentá-lo. O espectador não

deve trabalhar com a própria cabeça, pois o produto prescreve toda e qualquer reação. Todo

esforço intelectual é evitado.

Para perder-se no prazer e buscar a satisfação, a arte séria foi negada àqueles que

vivem na roda viva. À arte “leve” foi conferida uma aparência de legitimidade. A novidade da

indústria cultural está em unir elementos considerados inconciliáveis na cultura a arte e o

divertimento e reduzi-los a um falso denominador comum. Tal indústria repete conteúdos e

inova técnicas, fornecendo como paraíso a mesma vida cotidiana, manipula as distrações e

permanece vinculada aos clichês ideológicos da cultura (HORKHEIMER; ADORNO, 2014,

p. 29-39).

Na opinião de Horkheimer e Adorno (2014, p. 41-53) divertir-se significa estar de

acordo. A diversão é possível apenas quando se renuncia a refletir o todo da obra. No

entretenimento finge-se tratar as pessoas como sujeitos pensantes. O real objetivo é desabituá-

las ao contato com a subjetividade. Assim, belo é aquilo que a câmera reproduz. Sadio é o que

se repete. O sujeito pensante é combatido.

23 De acordo com Jameson (2007, p. 22-23), a expressão capitalismo tardio vem da Escola de Frankfurt (Adorno

e Horkheimer). Sua preparação econômica começou nos anos 1950, depois que a falta de bens de consumo e de

peças de reposição da época da guerra tinha sido solucionada e novos produtos e novas tecnologias, como a

mídia, puderam ser introduzidos. O capitalismo tardio, ou multinacional, ou de consumo do pós-guerra é a mais pura forma de capital que jamais existiu. Nele há algo novo e historicamente original: a destruição da agricultura

pré-capitalista do Terceiro Mundo pela Revolução Verde e a ascensão das mídias e da indústria da propaganda.

No capitalismo tardio a cultura se torna coextensiva à economia, e ele está marcado por novos padrões de

consumo e produção (ANDERSON, 1999, p. 67-75).

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Tal perspectiva do lúdico como entretenimento dialoga com um dos poderes da

literatura postulados por Compagnon (2012, p. 54): a literatura permite respirar. Para fugir do

processo de trabalho, não realizar esforço intelectual algum, escapar da rotina, a literatura

entrou na vida pós-moderna para “matar o tempo” do “leitor”. Seu poder restringiu-se à

recreação.

Por outro lado, há outra perspectiva do ludismo em disputa. Ligada à formação

humana, ao jogo, à fabulação, essa outra concepção de lúdico estimula a indagação da

condição humana, a crítica e a imaginação (BRITTO, 2012, p. 45-46). Como descrito por

Vigotski (2000, p. 142-143), na brincadeira infantil a criança cria uma situação imaginária.

Quando pequena, os seus desejos tendem a ser resolvidos de modo imediato. Todavia, quando

entram na idade escolar, começam a apresentar desejos irrealizáveis ou que precisam ser

postergados. Quando isso acontece, a conduta da criança sofre uma mudança. Para resolver

essa tensão, ela entra em um mundo ilusório e imaginário. É esse mundo que chamamos de

brincadeira. A imaginação passa a constituir um novo processo psicológico para a criança e

representa uma forma especificamente humana de atividade consciente.

Para o psicólogo russo a situação imaginária de qualquer tipo de jogo contém em si

regras de conduta, mesmo que não tenham sido explicitadas (VIGOTSKY, 2000, p. 144). Da

mesma maneira, o inverso também ocorre. Todo jogo com regras tem uma situação

imaginária (VIGOTSKY, 2000, p. 146). Não há jogo sem regras: “el juego brinda al niño una

nueva forma de deseos” (VIGOTSKI, 2000, p. 152, grifo do autor). Vigotski (2000, p. 152)

alega ainda que o atributo essencial do jogo é uma regra que foi convertida em desejo.

Respeitar as regras é para a criança uma fonte de prazer não no sentido do entretenimento,

mas da possibilidade de no jogo haver a satisfação do que não foi possível na vida real.

O jogo ensina a criança a desejar, relacionando seus desejos com um eu fictício, o seu

papel no jogo e suas regras. Assim, é no jogo que são realizadas as maiores conquistas da

criança que, no futuro, se converterão em seu nível básico de ação. O jogo cria uma zona de

desenvolvimento iminente24

na criança. Durante sua realização a criança está sempre acima de

sua idade e conduta diária. O jogo é o ponto mais elevado do desenvolvimento pré-escolar

(VIGOTSKY, 2000, p. 156).

24 O termo zona de desenvolvimento iminente é defendido pela pesquisadora Zoia Prestes (2012): “Vigotski (2004a, p. 485) define da seguinte forma o conceito de zona de desenvolvimento iminente: [...] os processos que,

no curso do desenvolvimento das mesmas funções, ainda não estão amadurecidos, mas já se encontram a

caminho, já começam a brotar; amanhã, trarão frutos; amanhã, passarão para o nível de desenvolvimento atual”

(PRESTES, 2012, p. 190-207, grifo da autora).

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3.1.2 Leitura e Experiência/Formação

A linha de força Leitura e Experiência/Formação trata da formação do leitor crítico.

Compreende a leitura como produção de sentidos, uma atividade de coautoria, de fruição do

objeto estético. A experiência é autoconhecimento, formação, uma vivência significativa.

É o conceito de experiência postulado por Larrosa (2002) que se articula melhor com

essa linha de força:

Experiência, a possibilidade de que algo nos aconteça ou nos toque, requer um gesto

de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer

parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar

mais devagar, e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar,

demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a

vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir

os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e

espaço (LARROSA, 2002, p. 24). A literatura, em particular o poema, ao brincar com a língua a ultrapassa. A literatura

tem o poder de ultrapassar os limites da linguagem ordinária. O poeta desvela uma verdade

latente até ele escrever inexprimível.

„Com efeito, há séculos que surgem homens cuja função é justamente a de ver e de

nos fazer ver o que não percebemos naturalmente. São os artistas.‟ A arte visa „nos

mostrar, na natureza e no espírito, fora de nós e em nós, coisas que não

impressionavam explicitamente nossos sentidos e nossa consciência‟. O poeta e o

romancista nos divulgavam o que estava em nós mas que ignorávamos porque

faltavam-nos as palavras (BERGSON apud COMPAGNON, 2012, p. 46-47).

A linha de força Leitura e Experiência/Formação também trata do conceito de

formação, e, conforme vimos no capítulo 2, o ato de formar tem dois significados: 1) dar

forma e desenvolver um conjunto de disposições preexistentes e 2) levar o homem para a

conformidade com base em um modelo já fixado e assegurado previamente. O autor defende

que a formação seja pensada sem haver uma ideia prescritiva de seu desenvolvimento nem um

modelo normativo de sua realização.

Refletir sobre a leitura enquanto formação significa pensá-la como uma atividade

relacionada com a subjetividade do leitor. É considerar a leitura como algo que nos forma e

constitui ou que coloca em questão aquilo que somos. A leitura, nessa perspectiva, não é um

passatempo e nem se restringe à ideia de se tornar culto (LARROSA, 2002, p. 25-26).

Para que a leitura resulte em formação é necessário partir do princípio de que a relação

entre o texto e a subjetividade é experiência, no sentido de que experiência é aquilo que nos

passa e que resulta em formação e transformação do que somos. Contudo, na condição de

espectadores, o mundo passa diante dos nossos olhos e trocamos pouco ou quase nada com o

que sabemos (LARROSA, 2002, p. 29).

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Para Walter Benjamin (1994), essa relação com o mundo faz parte da chamada cultura

de vidro. Nela os rastros são apagados e vivemos o que o autor denominou de pobreza de

experiência, na qual os homens “aspiram a libertar-se de toda experiência”. Estranhando tal

relação com o mundo, o filósofo indaga: “qual o valor de todo o nosso patrimônio cultural, se

a experiência não mais o vincula a nós?” (BENJAMIN, 1994, p. 115-118).

Como a experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos chega

(LARROSA, 2002, p. 87, grifo do autor), o que deixa rastros; e como a literatura é “algo que

exprime o homem e depois atua na própria formação do homem” (CANDIDO, 1972, p. 804),

a experiência tem a possibilidade de se efetivar com a literatura. Entretanto, a experiência de

leitura pode não acontecer para todos. Pode-se cuidar que se deem determinadas condições

para que aconteça uma experiência de leitura, mas não garanti-la (LARROSA, 2003, p. 40).

3.1.3 Leitura e Ilustração

A linha de força de promoção da leitura chamada Leitura e Ilustração parte do

princípio de que o conhecimento se acessa pela leitura. A leitura é veículo de ilustração,

instrução, erudição. O cidadão culto, bem formado, ilustrado é leitor. A leitura é voluntária,

gratuita, prazerosa. O leitor ilustrado lê literatura/arte e as obras do espírito (Filosofia,

Psicologia etc.), atualiza-se, instrui-se do cotidiano por meio do jornal, da revista, de obras da

informação.

Esta linha de força se fez presente historicamente no início do século XIX, quando a

associação entre cultura e nação era forte. No período, Compagnon (2012, p. 26) esclarece

que a Filologia pensava que um conjunto formado por uma língua, uma literatura e uma

cultura construiria uma nação. Esse modelo tem relação com o poder que a literatura tem de

deleitar, instruir e contribui para a formação de uma nação.

Entretanto, o século XX viveu muitas transformações e esse modelo de cultura no

singular vai sendo questionado, especialmente pelas vozes que foram silenciadas ao longo da

História e pelo caráter pouco crítico que a mera ilustração pode assumir. Adorno (1995, p.

164), ao discutir Educação pós-Auschwitz e contra a barbárie, questiona o lugar da cultura

frente aos horrores cometidos por homens instruídos: “a cultura que conforme sua própria

natureza promete tantas coisas, não cumpriu a sua promessa. Ela dividiu os homens. A divisão

mais importante é aquela entre trabalho físico e intelectual. Deste modo ela subtraiu aos

homens a confiança em si e na própria cultura”. Nesta perspectiva propõe uma formação

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cultural para além da instrução, já que esta que pode ser preponderantemente adaptativa, uma

formação capaz de emancipar o sujeito.

Retomando a ideia de que a leitura conduz ao conhecimento, Britto (2012) defende

que essa ideia advém do senso comum. O autor argumenta que o estímulo à leitura ou as

instruções de como ler pouco valerão ao leitor se ele não tiver uma formação razoável e

entusiasmo para tanto. Embora concorde que há procedimentos de leitura que podem ser

apreendidos e que o hábito de ler contribui para a desenvoltura da pessoa, Britto (2012, p. 44)

considera que é o conhecimento que promove a leitura, e não o contrário.

3.1.4 Leitura e Subjetivismo

A linha de força de promoção da leitura, intitulada Leitura e Subjetivismo, traz a ideia

do sujeito como agente social que se coloca como protagonista do seu processo de

compreensão. A leitura é entendida como um instrumento de afirmação da individualidade, e

não processo alteritário que se dá no encontro entre eu e o outro. Como Bakhtin (1986)

elucida:

o indivíduo enquanto personalidade responsável por seus pensamentos e por seus

desejos, apresenta-se como um fenômeno puramente sócio ideológico. Esta é a razão

porque o conteúdo do psiquismo “individual” é, por natureza, tão social quanto a

ideologia (...). Todo signo é social por natureza, tanto o exterior, quanto o interior

(BAKHTIN, 1986, p. 58).

Portanto, esta linha de força que entende a leitura como uma atividade autocontrolada,

subjetiva e individual ignora a relação discursiva que se estabelece entre o sujeito e o texto,

ambos situados em um tempo e espaço, desconsidera que os significados e sentidos são

construídos na interlocução entre sujeitos.

Tal visão reitera o individualismo que marca o nosso tempo e se relaciona à ideia de

leitura na perspectiva da vivência (erlebnis), segundo Walter Benjamin. Característica de um

indivíduo solitário; “vivência do indivíduo privado, isolado; impressão forte que precisa ser

assimilada às pressas, que produz efeitos imediatos” (KONDER, 1999, p. 83) e que, portanto,

não deixa marcas e não altera.

3.1.5 Leitura e Cidadania

Na linha de força denominada Leitura e Cidadania promover leitura significa

promover cidadania, a qual pode ser compreendida no âmbito da moralidade ou da formação

do leitor crítico.

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Na esfera da moralidade a cidadania é compreendida como ação civilizatória, um bem

edificante em si, com aspectos como a promoção de valores (dignidade, autonomia), a

reparação, a recuperação, o civismo, os direitos e os valores de convivência (solidariedade,

respeito etc.). Está subjacente a ela a ideia de que a leitura salva e proporciona prazer.

De acordo com essa perspectiva, se as pessoas fossem leitoras seriam melhores e mais

conscientes politicamente, o que possibilitaria o engajamento em movimentos de

transformação da sociedade. Visão que se relaciona à ideia de Street (apud KLEIMAN, 1995)

de letramento autônomo, que desconsidera as questões sociopolíticas e culturais que

envolvem o sujeito e seu grupo social e, consequentemente, sua formação e seus processos de

leitura.

Com isso, são criados movimentos de leitura em presídios, hospitais, parques,

semelhantes aos grupos religiosos e de ações beneficentes. Outra ideia implícita nessa esfera é

a crença de que o sujeito que não lê desconhece o prazer que a leitura proporciona e que,

portanto, é preciso mostrar-lhe isso por meio de animações e atividades descontraídas

(BRITTO, 2015, p. 77-78).

Na perspectiva da cidadania como moralidade é pouco provável que o leitor passe da

leitura frequente de textos simples para textos mais densos. É mais provável que tal leitor

torne-se avesso a eles, argumentando que são complicados e não provocam prazer (BRITTO,

2015, p. 78).

No âmbito da formação do leitor crítico, a cidadania se refere à dimensão humana, à

consciência da vida em sociedade, à afirmação do ser social no seu direito humano. De acordo

com Compagnon (2012, p. 42), já no Século das Luzes os homens pensavam que a literatura

tinha o poder de libertar o indivíduo de sua sujeição às autoridades, de contestar a submissão

ao poder.

Diferentemente do leitor formado na perspectiva da cidadania e moralidade, que toma

a palavra alheia e a reproduz, o leitor crítico entra em diálogo com o texto. Para Britto (2015,

p. 80-81), o leitor crítico se afirma e se reconhece como parte do processo de produção de

sentido, dirige ao texto, ao autor, sua contrapalavra. Está vinculado a um projeto de

transformação social.

Então, de acordo com essa perspectiva, um movimento de leitura é visto como um

direito de poder ler com o objetivo de incentivar a leitura e a vivência cultural como uma

marca de cidadania, e nele as escolas e as bibliotecas públicas são as instâncias mais

diretamente ligadas à formação do leitor e ao acesso aos textos (BRITTO, 2015, p. 82).

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3.1.6 Leitura e Utilitarismo

Nesta linha de força o objetivo é tornar-se mais inteligente, aumentar o vocabulário,

alfabetizar-se. É uma linha de força submetida à ordem do ensinar para fazer. Nela a literatura

se escolariza. Tal escolarização é inevitável, na opinião de Soares (1999, p. 21), pois é o

processo que institui e que constitui a escola. O processo de escolarização se remete à

ordenação de tarefas e ações, aos procedimentos formalizados de ensino, à seleção e à

exclusão de conteúdos, à ordenação e à sequenciação desses conteúdos.

Há problema na escolarização da literatura? Na opinião de Soares (1999), os

exercícios propostos aos alunos sobre textos da literatura infantil não levam à análise da

percepção da literariedade, dos recursos de expressão, do uso estético da linguagem, pois tais

exercícios estão centrados nos conteúdos, voltados para as informações veiculadas pelo texto,

e não pelo modo literário como as veicula.

A autora ressalta que o estudo de um texto literário deve privilegiar “a análise do

gênero do texto, dos recursos de expressão e de recriação da realidade, das figuras autor-

narrador, personagem, ponto de vista (no caso da narrativa), a interpretação de analogias,

comparações, metáforas, identificação de recursos estilísticos, poéticos” (SOARES, 1999, p.

43-44). Ela se refere ao estudo do que é textual e literário.

Até o momento estamos operando com seis linhas de força de promoção da leitura, as

quais foram encontradas quando analisamos diferentes programas de leitura. A síntese e a

dinâmica dessas linhas estão no diagrama a seguir:

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Diagrama 4. Linhas de força de promoção da leitura.

Como a presente pesquisa trata, especificamente, de aulas de literatura, e não de aulas

de leitura de modo geral, achamos pertinente vincular as linhas de força de promoção da

leitura apresentadas acima às dimensões da literatura. Dessa maneira, conseguiríamos incluir

a dinâmica das linhas de força nas aulas de Literatura.

3.2 As dimensões da literatura

Conforme desenvolvido no capítulo 1 da presente pesquisa, a pesquisadora Martina

Fittipaldi (2013), em sua tese, ao discutir a educação literária, sistematizou cinco dimensões

da literatura para pensar o campo da Didática da Literatura:

1. A dimensão afetiva, que trata do reconhecimento das práticas literárias como

atividades relevantes na vida pessoal das crianças e no desenvolvimento de seus hábitos de

leitura;

2. A dimensão sociocultural, que compreende a literatura como uma atividade de

caráter individual e social, a partir da qual podemos construir referentes culturais comuns;

LINHAS DE FORÇA DE PROMOÇÃO DA LEITURA

LEITURA E EXPERIÊNCIA/FORMAÇÃO

LEITURA E LUDISMO

LEITURA E ILUSTRAÇÃO

LEITURA E SUBJETIVISMO

LEITURA E CIDADANIA

LEITURA E

UTILITARISMO

Leitura: instrumento de afirmação da individualidade.

Cada leitor tem o seu trajeto.

Leitura: veículo de ilustração,

erudição. Ser culto, bem formado, ilustrado. Cidadão ilustrado é leitor.

Lúdico:

1) Prazer, satisfação, realização. 2) Algo constitutivo do ser humano, ligado ao jogo, à

fabulação, à formação humana.

Leitura para aumentar o

vocabulário, tornar-se mais

inteligente. Submissão à ordem da eficiência, da compensação e do ensinar para fazer. A ação está

submetida à ordem prática.

Cidadania:

1) Processo civilizatório, civismo,

direitos, valores melhores da convivência (solidariedade, respeito).

2) Consciência da vida em sociedade, afirmação do ser social

no seu direito humano.

Leitura: produção de sentidos,

atividade de coautoria, fruição do

objeto estético.

Experiência: autoconhecimento,

formação, vivências significativas. Formação do leitor crítico.

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3. A dimensão cognitiva, que nos permite entender as práticas literárias como

processos interpretativos em que os leitores têm um papel ativo: o de construtores de sentidos;

4. A dimensão ético-filosófica, que possibilita a reflexão sobre a literatura como um

discurso no qual se manifestam representações e juízos de valor presentes na sociedade;

5. A dimensão estético-linguística, que ressalta a importância da fruição e do jogo

com os aspectos materiais da linguagem e a consideração da literatura como uma práxis

artística.

Estudando as dimensões da literatura propostas por Fittipaldi (2013) e as linhas de

força de promoção da leitura, percebemos a existência de um diálogo estreito entre os dois

conceitos. À dimensão afetiva da literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 444) associamos a linha

de força Leitura e Subjetivismo (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015, p. 7). A vida pessoal

e o protagonismo do sujeito são o elemento em comum entre essa dimensão e a linha de força.

As práticas literárias são relevantes para a vida pessoal do leitor, protagonista do seu processo

de aprendizagem e itinerário leitor.

A dimensão sociocultural da literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 444) articula-se à linha

de força Leitura e Cidadania (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015, p. 6-7). Tal dimensão

compreende a literatura como uma atividade de caráter tanto individual quanto social, que se

relaciona com um dos conceitos de cidadania explicitados na linha de força Leitura e

Cidadania: consciência da vida em sociedade, afirmação do ser social no seu direito humano.

A compreensão da literatura como uma atividade de caráter também social é o elemento de

ligação entre a dimensão sociocultural da literatura e a linha de força Leitura e Cidadania.

A dimensão cognitiva da literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 444) se vincula à linha de

força Leitura e Ilustração (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015, p. 7). O conhecimento, a

cultura leitora e a biografia literária do leitor são as questões que ligam ambas as categorias. A

dimensão cognitiva vê as práticas literárias como processos interpretativos, nos quais é o

leitor quem constrói sentidos. A linha de força Leitura e Ilustração vê o conhecimento como

aquele que promove a leitura e que interfere diretamente nos sentidos que serão construídos

durante a leitura literária.

A dimensão ético-filosófica da literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 445) dialoga com a

linha de força Leitura e Experiência/Formação (BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015, p. 6)

e possibilita a reflexão sobre a literatura como um discurso em que se manifestam

representações e juízos de valor presentes na sociedade. Já a linha de força Leitura e

Experiência/Formação compreende a leitura como algo que nos forma, nos constitui ou que

coloca em questão aquilo que somos. Isso também se encontra no âmbito das representações e

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juízos de valor presentes na sociedade. Então, tais representações e juízos de valor são a

ligação entre a dimensão ético-filosófica da literatura e a linha de força Leitura e

Experiência/Formação.

A dimensão estético-linguística (FITTIPALDI, 2013, p. 445) está associada a duas

linhas de força de promoção da leitura: Leitura e Experiência/Formação e Leitura e Ludismo

(BRITTO; CAMASMIE; SERRA, 2015, p. 6). A dimensão estético-linguística ressalta a

importância da fruição e do jogo com os aspectos materiais da linguagem e considera a

literatura uma práxis artística.

No que tange à fruição da literatura, relacionamos essa dimensão à linha de força

Leitura e Experiência/Formação, pois ela trata da leitura como fruição do objeto estético. No

âmbito da dimensão estético-linguística da literatura, o conceito de experiência de Larrosa

(2003, p. 94) se faz pertinente, na medida em que, do ponto de vista do autor, a experiência

resulta em transformação do que somos. Tal experiência é provocada pelo modo como o autor

da obra literária escolherá jogar com a linguagem.

Quanto ao jogo com a linguagem literária, a dimensão da literatura estético-linguística

entra em conexão com a linha de força Leitura e Ludismo, especialmente na perspectiva do

lúdico ligada à fabulação. De acordo com essa concepção, o lúdico estimula a indagação

humana e a imaginação.

Resumindo, consideramos que a fruição estética e o jogo com a linguagem literária são

os dois aspectos que conectam a dimensão estético-linguística da literatura e as linhas de força

Leitura e Experiência/Formação e Leitura e Ludismo.

Das cinco dimensões da literatura listadas por Fittipaldi (2013) nenhuma delas se

associa à linha de força Leitura e Utilitarismo. Tal falta de conexão se deve, em nossa opinião,

ao objetivo dessa linha de força (aumentar o vocabulário, alfabetizar-se), que não tem relação

com o que a educação literária propõe.

Ao apresentar o diálogo entre os dois conceitos, construímos uma rede de conceitos

que estão em disputa nas aulas de literatura, conforme mostra o diagrama a seguir:

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Diagrama 5. Linhas de força de promoção da leitura e dimensões da literatura.

A seguir, apresentaremos o marco metodológico da pesquisa e o perfil dos sujeitos.

Como chegamos até eles? Por que foram escolhidos?

LINHAS DE FORÇA DE PROMOÇÃO DA LEITURA

DIMENSÕES DA LITERATURA

LEITURA E EXPERIÊNCIA/FORMAÇÃO

Ético-filosófica Estético-linguística

LEITURA E LUDISMO Estético-

linguística

LEITURA E ILUSTRAÇÃO

Cognitiva

LEITURA E SUBJETIVISMO

Afetiva

LEITURA E CIDADANIA

Sociocultural

LEITURA E UTILITARISMO

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4 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS

Pesquisar é isso. É um itinerário, um caminho que trilhamos e com o qual

aprendemos muito, não por acaso, mas por não podermos deixar de colocar em

xeque „nossas verdades‟ diante das descobertas reveladas, seja pela leitura de

autores consagrados, seja pelos nossos informantes, que têm outras formas de

marcar suas presenças no mundo. Eles também nos ensinam a olhar o outro, o

diferente, com outras lentes e perspectivas. Por isso, não saímos de uma pesquisa do

mesmo jeito que entramos porque, como pesquisadores, somos também atores sociais desse processo de elaboração.

ZAGO, 2003, p. 307-308

O itinerário de pesquisa que seguimos pretendeu compreender as aulas de Literatura

do EFI do CPII campus Humaitá. Compreender o processo mediante o qual os sujeitos

constroem significados naquilo que fazem e descrever em que consistem esses significados

(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 70). Optamos, assim, por uma pesquisa qualitativa que foi

construída à luz do referencial teórico bakhtiniano.

Para Bakhtin (2003, p. 395, grifo do autor), a pesquisa nas Ciências Humanas tem

como sujeito o “ser expressivo e falante” que tem como capacidade específica a criação de

textos. Esses textos, por expressarem pensamentos, sentidos e significados do homem,

tornam-se o objeto de estudo das Ciências Humanas, independentemente de quais sejam os

seus objetivos.

As ciências humanas são as ciências do homem em sua especificidade, e não de uma

coisa muda ou um fenômeno natural. O homem em sua especificidade humana

sempre exprime a si mesmo (fala), isto é, cria texto (ainda que potencial). Onde o

homem é estudado fora do texto e independente deste, já não se trata de ciências

humanas (anatomia e fisiologia do homem, etc.) (BAKHTIN, 2003, p. 312). Como o objeto das Ciências Humanas é o homem social, seu estudo passa

necessariamente pela interpretação de textos, de signos25

criados por ele. A investigação

torna-se um processo dialógico entre pesquisador e pesquisado (BAKHTIN, 2003, p. 319). O

contrário acontece nas Ciências Exatas, que estudam o homem fora e independentemente do

texto, estabelecendo-se uma forma monológica do saber: o sujeito de pesquisa é contemplado

como uma coisa muda, um objeto, e o pesquisador é o único que emite enunciado sobre ele.

25 O domínio do ideológico coincide com o domínio dos signos: são mutuamente correspondentes [...]. Cada

signo ideológico é não apenas um reflexo, uma sombra da realidade, mas também um fragmento material dessa

realidade. Todo fenômeno que funciona como signo ideológico tem uma encarnação material, seja como som, como massa física, como cor, como movimento do corpo ou como outra coisa qualquer. [...] Os signos só podem

aparecer em um terreno interindividual. [...] não basta colocar face a face dois homo sapiens quaisquer para que

os signos se constituam. É fundamental que esses dois indivíduos estejam socialmente organizados, que formem

um grupo [...] só assim um sistema de signos pode constituir-se (BAKHTIN, 1986, p. 32-35, grifos do autor).

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Ele mesmo fala e responde. Temos apenas um sujeito na pesquisa, o pesquisador (BAKHTIN,

2003, p. 400).

Entretanto, apesar de qualquer objeto do saber poder ser considerado coisa, nas

Ciências Humanas tal consideração não pode ocorrer pelo fato de, como sujeito, o homem

realiza-se somente na interação de duas consciências, a do eu e a do outro. Para Bakhtin

(2003, p. 395-400) a relação que se estabelece com o sujeito de pesquisa é dialógica. Ele deve

ser contemplado, interpretado, indagado, ouvido, em um encontro entre pesquisador e

pesquisado.

O material de pesquisa é construído na relação com o outro. O pesquisador produz o

material de pesquisa, ou seja, textos. Ele os interpreta e dá a sua organização. Os textos

trazem consigo ainda a criação, e com ela se tornam singulares e individuais, de tal maneira

que representam um novo elo na cadeia histórica da comunicação discursiva (BAKHTIN,

2003, p. 309-310).

Nas Ciências Humanas o sentido empregado ao texto é compreendido como enunciado

porque só ele tem relação com a realidade e com o sujeito (BAKHTIN, 2003, p. 328). Sob o

ponto de vista bakhtiniano, o enunciado é determinado pela situação social mais imediata e

constitui-se no

produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados [...]. A palavra dirige-se a um interlocutor [que] [...] variará se se tratar de uma pessoa do mesmo

grupo social ou não, se esta for inferior ou superior na hierarquia social, se estiver

ligada ao locutor por laços sociais mais ou menos estreitos (pai, mãe, marido, etc.).

Não pode haver interlocutor abstrato; não teríamos linguagem comum com tal

interlocutor, nem no sentido próprio nem no figurado. [...] Na maior parte dos casos,

é preciso supor além disso um certo horizonte social definido e estabelecido que

determina a criação ideológica do grupo social e da época a que pertencemos [...]

(BAKHTIN, 1986, p. 112, grifos do autor). Os enunciados são compreendidos enquanto um conjunto de sentidos; têm a ver com

valores; são irreprodutíveis e determinados por diferentes formas de relação com a realidade,

com o sujeito falante e com outros enunciados. Eles ainda requerem uma compreensão

responsiva26

.

Segundo Bakhtin (2003, p. 333-334), todo enunciado tem sempre um destinatário cuja

compreensão responsiva o autor do enunciado procura e antecipa. Além do destinatário, ele

propõe um supradestinatário, que é o elemento constitutivo do enunciado total que, numa

situação de pesquisa, pode ser descoberto. Isso advém da natureza da palavra que sempre quer

26 A responsividade inclui em si o juízo de valor e é um princípio de qualquer compreensão. A compreensão

responsiva de um conjunto discursivo é de índole dialógica (BAKHTIN, 2003, p. 332). Cf. BAKHTIN, M. Arte

e responsabilidade. In: Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

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ser ouvida, procura uma compreensão responsiva e não para na compreensão imediata. A

palavra quer ser ouvida, entendida, respondida e mais uma vez responder à resposta.

O autor afirma que “As relações dialógicas são relações (semânticas) entre toda

espécie de enunciados na comunicação discursiva” (BAKHTIN, 2003, p. 323). Elas

pressupõem linguagem e somente são possíveis entre enunciados integrais de diferentes

sujeitos do discurso. Mesmo dois enunciados, convergentes em seus sentidos, distantes um do

outro no tempo e no espaço, trazem entre si relações dialógicas.

Observa-se, portanto, que tais relações são mais amplas, diversificadas e complexas

que o sentido restrito de discurso dialógico que compreende as relações dialógicas como as

relações entre as réplicas de um diálogo real (BAKHTIN, 2003, p. 331-332). Nesse diálogo

não existem a primeira nem a última palavra e não há limites para o seu contexto (BAKHTIN,

2003, p. 410). Nas relações dialógicas numa situação de pesquisa encontramos algumas

semelhanças com as ideias propostas por Bakhtin (2003) acerca do autor de uma obra de arte

e seus personagens.

Para ele o autor “é o agente da unidade tensamente ativa do todo acabado, do todo da

personagem e do todo da obra, e este é transgrediente a cada elemento particular desta”

(BAKHTIN, 2003, p. 10). A consciência de um autor é a consciência da consciência, pois ele

enxerga e conhece tudo o que cada personagem e todas elas juntas enxergam e conhecem,

como também enxerga e conhece mais que elas. Isso se deve ao lugar exotópico que ocupa

(BAKHTIN, 2003, p. 21).

Compreendemos, assim, que o pesquisador das Ciências Humanas pode ser

considerado autor, na medida em que ele é o agente do todo acabado do seu texto de pesquisa,

construído, a partir de um lugar exotópico, com o excedente de visão que sua posição de

pesquisador lhe possibilita.

Na obra de arte o autor dá uma resposta estética ao todo da pessoa-personagem. Tal

resposta tem caráter criador e produtivo por princípio e reúne todas as definições e avaliações

ético-cognitivas que dão o acabamento ao todo da obra. Da mesma maneira, o pesquisador

oferece uma resposta estética ao seu objeto de pesquisa, que se configura por ele se colocar no

lugar de seu sujeito de pesquisa, depois retomar o seu lugar de pesquisador para, em seguida,

completar o horizonte do pesquisado (BAKHTIN, 2003, p. 6). Esse vivenciamento criador e

ativo do autor da obra de arte e do pesquisador baseia-se no princípio estético basilar da

relação entre personagem e autor, que se constitui uma

relação de uma tensa distância do autor em relação a todos os elementos da

personagem, de uma distância no espaço, no tempo, nos valores e nos sentidos, que

permite abarcar integralmente a personagem, difusa de dentro de si mesma e

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dispersa no mundo preestabelecido do conhecimento e no acontecimento aberto do

ato ético, abarcar a ela e sua vida e completá-la até fazer dela um todo com os

mesmos elementos que de certo modo são inacessíveis a ela mesma e nela mesma

[...] (BAKHTIN, 2003, p. 12, grifos do autor). No caso da pesquisa acadêmica, tal princípio correlaciona-se com a atividade estética.

Bakhtin (2003, p. 22-23) a define como o “conjunto daquelas ações internas ou externas que

só eu posso praticar em relação ao outro, a quem elas são inacessíveis no lugar que ele ocupa

fora de mim; tais ações completam o outro justamente naqueles elementos em que ele não

pode completar-se”. Para o autor o primeiro momento da atividade estética é a

compenetração, quando me coloco no lugar do outro. Depois dela, devo retornar a mim

mesmo porque só desse lugar o material da compenetração pode ser assimilado. É no

momento do retorno que começa, propriamente, a atividade estética. É quando enformamos e

damos acabamento ao material27

.

O autor de uma obra de arte e o pesquisador vivenciam seu trabalho, escutam e veem o

produto que está sendo criado, mas seu vivenciamento não escuta e nem vê a si mesmo

(BAKHTIN, 2003, p. 25).

Segundo Bakhtin (2003, p. 26-35), não é possível termos acesso à nossa imagem

externa por nós mesmos. Ela é vivenciada sempre de dentro. Todavia, podemos imaginá-la,

por meio da introspecção, quando nos desdobramos um pouco da gente sem romper conosco.

Nesse caso, a nossa imagem externa permanece ligada ao nosso vivenciamento interior

através do cordão umbilical da autossensação. Para ir além, podemos nos imaginar en face,

isto é, desligarmo-nos por completo da nossa autossensação interior. Quando conseguimos

fazer isso, sentimos um vazio que se deve a essa imagem externa não ter um enfoque volitivo-

emocional28

suficiente para vivificá-la. A questão que se impõe nessa situação é que, ainda

que nós consigamos imaginar nossa imagem externa, ela carecerá de persuabilidade interna.

Como ter certeza de que isso somos nós inteiramente? Para ter acesso a essa imagem externa

dependemos do outro. Ele é o único capaz de criar para o homem uma personalidade

externamente acabada.

27 Segundo Bakhtin (2003), há o acontecimento estético, ético e religioso. Um acontecimento estético só pode se

realizar na presença de duas consciências que não coincidem. Quando a personagem e o autor coincidem ou

estão lado a lado diante de um valor comum ou frente a frente como inimigos, termina o acontecimento estético

e começa o acontecimento ético (o panfleto, o manifesto, o discurso acusatório, o discurso laudatório e de

agradecimento, o insulto etc.); quando não há nenhuma personagem, temos um acontecimento cognitivo (um

tratado, um artigo, uma conferência); e onde a outra consciência é a consciência englobante de Deus temos um

acontecimento religioso (uma oração, um culto, um ritual) (BAKHTIN, 2003, p. 19-20). 28 O tom volitivo-emocional, presente na produção de qualquer enunciado, está relacionado ao termo “volição livre”, que tem caráter realizador e significa liberdade de ação, o poder de decidir como se queira, como também

relaciona-se a valor, a como eu me posiciono frente aos valores construídos socialmente (eu – social – outro). O

tom volitivo-emocional é uma atitude de dever da consciência, moralmente válida e responsavelmente ativa, que

orienta e afirma o conteúdo sentido dentro do ser único (BAKHTIN, 1993a).

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Segundo Amorim (2004, p. 28-29), é na análise e no manejo das relações com o outro

que se dá a produção do saber na atividade de pesquisa. Nesse caso, o outro é aquele a quem o

pesquisador se dirige quando em situação de campo e de quem ele fala em seu texto de

pesquisa. A autora afirma, como hipótese de trabalho, que é em torno da questão da alteridade

que se tece grande parte do trabalho do pesquisador.

Do ponto de vista da eficácia do diálogo e encontro com o outro no contexto de

pesquisa, para Amorim (2004, p. 80) o que importa é que ele seja realmente outro para o

pesquisador. Nesse sentido, a autora defende que a simples simpatia dele pelo pesquisador e

vice-versa não representa uma fusão em um ser único, e sim um enriquecimento do encontro

de pesquisa. A eficácia desse encontro está na distância do pesquisador e no uso do seu

excedente de visão.

O outro para existir precisa se tornar estrangeiro para o pesquisador. Porém, tal

estranheza não se trata somente do reconhecimento do outro como diferente, mas também de

um verdadeiro distanciamento do pesquisador em relação ao pesquisado, a fim de que as

evidências fiquem em suspensão e o objeto de pesquisa possa ser posto em questão.

Compreendendo a alteridade dessa forma, de acordo com Amorim (2004), a atividade de

pesquisa torna-se uma espécie de exílio. Em um primeiro momento o pesquisador é hóspede

quando é recebido e acolhido pelo outro, e em segundo momento é anfitrião, recebendo e

acolhendo o estranho29

.

O conceito de polifonia bakhtiniano insere-se como uma marca fundamental da

alteridade. Na pesquisa o pesquisador entra em relação com uma multiplicidade de vozes. O

modo como essa multiplicidade é trabalhada pelo pesquisador (autor) é ativa, conforme nos

esclarece Bakhtin (2003):

O nosso ponto de vista não afirma, em hipótese alguma, uma certa passividade do

autor, que apenas monta os pontos de vista alheios, as verdades alheias, renunciando

inteiramente ao seu ponto de vista, à sua verdade. A questão não está aí, de maneira

nenhuma, mas na relação de reciprocidade inteiramente nova e especial entre a

minha verdade e a verdade do outro. O autor é profundamente ativo, mas o seu

ativismo tem um caráter dialógico especial. Uma coisa é o ativismo (aktívnost) em relação a um objeto morto, a um material mudo, que se pode modelar e formar ao

bel-prazer; outra coisa é o ativismo em relação à consciência viva e isônoma do

outro. Esse ativismo que interroga, provoca, responde, concorda, discorda, etc., ou

seja, esse ativismo dialógico não é menos ativo que o ativismo que conclui,

29 Amorim (2004, p. 51-57) aponta ainda a existência de níveis ou modos de alteridade no trabalho de campo e

de escrita do pesquisador nas Ciências Humanas por meio de três figuras míticas gregas: Górgona, Dionísio e

Ártemis. Ártemis representa a alteridade que se submete ao trabalho teórico-conceitual na produção de conhecimentos; Dionísio corresponde à alteridade que se dá como resultado da experiência interior vivida na

atividade de pesquisa, isto é, onde o outro me alterou e deixou seu rastro; e Górgona encarna um nível de

alteridade absoluta, quando o outro é tão radicalmente outro que rompe com todos os dispositivos de percepção

do pesquisador, deixando como rastro possível um efeito lacunar, sob a forma do silêncio ou da ausência.

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coisifica, explica por via causal, torna inanimada e abafa a voz do outro com

argumentos desprovidos de sentido (BAKHTIN, 2003, p. 339, grifos do autor).

Tal citação nos leva a concluir que a produção de conhecimentos nas Ciências

Humanas é uma questão de voz que se coloca tensamente ao pesquisador no momento da

interpretação e da produção do texto de pesquisa. Tal tensão, segundo Amorim (2002, p. 8),

parece ser própria das Ciências Humanas, pois o caráter de alteridade do encontro com o

outro “não deixa nenhuma margem de previsibilidade ou de controle da parte do autor”.

Ao interpretar os enunciados dos sujeitos de pesquisa, o pesquisador reproduz e cria

outro texto com suas interpretações enquanto pesquisador. Nessa reprodução e criação

considera-se a inter-relação do texto e do contexto a ser criado, momento que se constitui em

um encontro de dois textos e de dois sujeitos. O pesquisador torna-se parte do enunciado a ser

interpretado.

A compreensão dos enunciados integrais e das relações dialógicas entre eles é de

índole inevitavelmente dialógica (inclusive a compreensão do pesquisador de ciências humanas); o entendedor (inclusive o pesquisador) se torna participante do

diálogo ainda que seja em um nível especial (em função da tendência da

interpretação e da pesquisa) (BAKHTIN, 2003, p. 332). Diante do exposto, compreendemos que as Ciências Humanas, na perspectiva

bakhtiniana, têm como objetivo compreender o outro, reconhecido como produtor de

discursos30

. Seu objeto específico é o discurso, produzido na interação de dois sujeitos,

pesquisador e pesquisado. Cabe ao pesquisador, com base na atividade estética, construir o

todo do texto de pesquisa, colocando em diálogo as diferentes vozes participantes da pesquisa.

4.1 Procedimentos teórico-metodológicos

Considerando o objetivo geral da pesquisa de compreender as aulas de Literatura do

EFI do CPII campus Humaitá e o referencial teórico bakhtiniano, propomos a observação

participante (TURA, 2003) e entrevistas (ZAGO, 2003) como procedimentos teórico-

metodológicos.

A escolha pela observação participante se deve ao fato de ela focalizar mais

amplamente o contexto sociocultural do ambiente escolar. Com ela é possível analisar

diferentes atividades e perspectivas dos sujeitos pela observação dos sujeitos em seus locais

de estudo e trabalho (TURA, 2003, p. 189-192). Na observação participante o pesquisador

introduz-se no mundo de seus sujeitos, tenta conhecê-los e ganhar a sua confiança, registra

30 O sujeito “só pode ser apreendido na linguagem a partir das vozes de seu discurso. É por essa razão que se diz

não haver uma teoria do sujeito em Bakhtin, mas, sim, uma teoria da linguagem, fundada na ideia de que a

interação verbal é o modo de ser social dos indivíduos” (TEIXEIRA, 2006, p. 229).

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por escrito de modo sistemático tudo aquilo que ouve e observa (BOGDAN; BIKLEN, 1994,

p. 16).

Segundo Tura (2003, p. 184-186), a observação é a primeira forma de aproximação do

sujeito com o mundo em que vive. A presença do observador no campo coloca em evidência

as suas posições teóricas e ideológicas. Nós somos parte do mundo que estudamos. Não

escapamos do senso comum e nem evitamos a nossa interferência no fenômeno que

investigamos. O nosso material de pesquisa é o que as pessoas dizem, documentam, reagem

em situações de pesquisa.

De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 125) o objetivo do pesquisador é ganhar a

aceitação do sujeito, encorajando-o a falar para que a pesquisa prossiga. Ele registra de forma

discreta o que vai acontecendo e recolhe, simultaneamente, outros dados descritivos. Ele entra

no mundo do sujeito, mas, ao mesmo tempo, continua fora. O estranhamento do objeto de

pesquisa possibilita o distanciamento para a elaboração de indagações, a capacidade de se

surpreender com o que parece ordinário e uma abertura a outros modos de compreender o

campo (TURA, 2003, p. 195).

Segundo Tura (2003, p. 187-189), o pesquisador é o instrumento essencial da

observação. Ele irá coordenar, selecionar e interpretar o conjunto de fenômenos que

presenciou. Nesse processo o observador tem como principal auxiliar o seu diário de campo.

Esse recurso será consultado e relido diversas vezes, diante da necessidade de confrontar

informações díspares, analisar diferentes posições de situações ocorridas ou relembrar uma

sequência de fatos.

A autora afirma que na observação há um mergulho na vida de um grupo com o

objetivo de desvendar as redes de significados. Para que esse objetivo seja alcançado, Geertz

(apud TURA, 2003, p. 189-190) recomenda que a observação seja acompanhada de uma

descrição densa daquilo que foi observado. Tal descrição parte do pressuposto de que os

acontecimentos do cotidiano estão inter-relacionados com estruturas sociais mais amplas e

com tradições que foram sendo incorporadas pelo grupo em ritos e costumes. Ela é o esforço

de articulação entre fatos, o envolvimento, a lógica de sua organização, o decifrar de aspectos

obscuros. Isso exige a interpretação/reinterpretação dos acontecimentos pelo pesquisador. Há

a necessidade de tradução de comportamentos observados, de ritos socialmente reconhecidos,

de crenças compartilhadas.

Nos primeiros contatos o pesquisador precisa ter cuidado com as primeiras

impressões, pois os sujeitos tendem a mostrar um comportamento ou a fazer um discurso que

seja da expectativa do observador (TURA, 2003, p. 195-196). Na observação participante

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diferentes focos de análise vão se delineando a cada momento. São situações que podem

exigir a utilização de outros procedimentos de pesquisa, como é o caso da entrevista.

A entrevista na perspectiva compreensiva (ZAGO, 2003, p. 295) permite a construção

da problemática de estudo durante o seu desenvolvimento e nas suas diferentes etapas. Ela

não tem uma estrutura rígida e o pesquisador se compromete formalmente. O que interessa é a

riqueza do material que descobre. A pesquisa de campo é ponto de partida da

problematização, e não a sua verificação. Uma das características da entrevista é assegurar

informações em maior profundidade. A formulação de perguntas que atinjam esse objetivo,

geralmente, encontra-se apoiada em outros procedimentos teórico-metodológicos, como a

observação. Um procedimento complementa o outro, amplia o ângulo de observação e a

condição de produção dos dados (ZAGO, 2003, p. 297-299).

De acordo com Zago (2003, p. 299), muitos pesquisadores usam o gravador nas

entrevistas. Essa prática exige uma negociação com o informante para obter a sua aprovação.

Com a gravação o pesquisador está mais livre para conduzir as questões, favorecer a

interlocução, avançar na problematização, organizar e analisar os dados.

O pesquisador deve preocupar-se em obter a confiança do entrevistado. A interação

estabelecida entre eles decide o desenvolvimento da entrevista e a natureza das informações.

É fundamental esclarecer os objetivos da pesquisa, o destino das informações, o anonimato de

pessoas e lugares, o horário de encontro e o tempo previsto de duração. Zago (2003, p. 303)

nos alerta que na entrevista o lugar central é do entrevistado. A manifestação de interesse pelo

entrevistado e a capacidade de escuta do que é dito e do não julgamento se fazem necessárias.

O pesquisador precisa focalizar nas riquezas desconhecidas que o entrevistado oferece.

Como a entrevista na perspectiva compreensiva é ponto de partida para a análise da

problemática de pesquisa, ela não tem uma estrutura rígida. Porém, o entrevistador deve

demonstrar aonde quer chegar, sendo importante a elaboração de um roteiro de questões.

Outrossim, é a necessidade de submissão do roteiro à crítica (ZAGO, 2003, p. 303).

De acordo com Zago (2003, p. 305-308), para atingir as informações, o pesquisador

deve se aproximar da conversação. A pesquisa de campo consiste em defrontar-se com os

fatos, discutir com os sujeitos de pesquisa, compreender melhor os processos sociais.

A entrada no campo de pesquisa exigiu o pedido formal ao CPII para poder atuar na

instituição como pesquisadora. Em seguida, solicitei à coordenadora pedagógica de Literatura

uma conversa com ela e sua equipe docente para apresentar o projeto de pesquisa. O encontro

aconteceu em setembro de 2014, durante a reunião de planejamento da equipe. Precisou ser

rápido por causa do curto tempo de que a equipe dispunha. Durante o encontro explicitei o

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projeto de pesquisa e que as observações aconteceriam em turmas do 1º e do 5º ano, já que o

1º ano é o momento de entrada dos alunos na diversidade social do colégio e o início do

trabalho docente de aproximação das crianças com a literatura; e o 5º ano porque representa a

saída do EFI, após quatro anos de participação sistemática em aulas de literatura. Além disso,

pedi para acompanhar somente uma turma de cada ano citado, já que o planejamento é por

ano escolar, e não por turma.

A conversa culminou no aceite de uma professora da equipe, a Mariana. Iniciei as

observações participantes em outubro de 2014, finalizando-as em junho de 2015. A entrevista

ocorreu em março de 2016. Apesar de ter observado aulas do 1º e do 5º ano, sempre que

possível estava presente nas aulas dos demais anos.

No início de 2015, em fevereiro, entrei em contato com a última coordenadora de

Literatura, a Renata, que havia se aposentado em 2012, e que me concedeu uma entrevista.

Em março, mais uma vez entrei em contato com a outra professora de Literatura, a Cláudia.

Felizmente, ela aceitou contribuir com a pesquisa. As observações nas turmas dela duraram

parte do primeiro semestre de 2015 e 2016 (março e abril). Observei aulas que ela ministrava

do 2º ao 5º ano. Cláudia me concedeu a entrevista em julho de 2016.

Em 2016 recebi o convite para compor a equipe de Literatura, o que possibilitou a

participação nas reuniões pedagógicas da equipe. O ano letivo começou e eu não assumi

nenhuma turma de Literatura porque a escola precisava de um novo professor regente para o

1º ano. Enquanto isso, trabalhava como regente em uma turma de 1º ano. No contraturno de

trabalho observava as aulas da professora e da coordenadora de Literatura.

Quando houve esse convite, a coordenadora pedagógica abriu espaço tanto para as

observações de suas aulas quanto para a entrevista. Observei suas aulas do 1º ano e a

entrevistei em maio de 2016.

Portanto, durante quinze meses, realizei observações participantes. De outubro a

julho/2014 com a professora Mariana, e de março a julho/2015 e de março a abril/2016 com a

professora Cláudia. Além disso, observei as aulas da coordenadora pedagógica Sandra de

março a abril/2016. Entrevistei as professoras Mariana e Cláudia em março e julho de 2016,

respectivamente; e a atual e a última coordenadora pedagógica de literatura, Sandra e Regina,

em fevereiro de 2015 e maio de 2016, nesta ordem.

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4.2 Campo de pesquisa31

O CPII foi fundado em 2 de dezembro de 1837. Criado para ser uma referência de

ensino no Brasil, foi inicialmente um colégio de instrução secundária. Sua tradição se

confunde com a história do Brasil. Do Império (1822-1889) à República (1889-atual), o

colégio vem atuando no cenário educacional brasileiro, buscando continuar sendo uma

referência.

Tudo começou com o Colégio dos Órfãos de São Pedro, criado em 1739 pelo bispo

Dom Antônio de Guadalupe. Depois, o colégio passou a ser chamado de Seminário de São

Joaquim em 1766. O seminário funcionava como um polo de cultura na cidade do Rio de

Janeiro, o que foi intensificado com a expulsão dos jesuítas em 1759. Com a saída deles, a

educação dos jovens circunscreveu-se à instrução doméstica com preceptores e aos seminários

ligados às paróquias locais, como o Seminário de São Joaquim.

O ministro interino do Império, Bernardo Pereira de Vasconcelos, transformou então o

seminário no Imperial Collegio de Pedro II. O nome escolhido foi uma homenagem ao

Imperador Dom Pedro II, que, em 2/12/1837, completava 12 anos, data de nascimento do

colégio.

Seu programa de ensino tinha uma base clássica e apresentava uma tradição

humanística. Os formandos recebiam da instituição o diploma de bacharel em Letras, o que os

habilitava a ingressar no ensino superior sem prestar exames. Para entrar no colégio havia um

rigoroso exame de admissão, no qual eram considerados idade, mérito e habilidades inatas.

No período imperial o ensino não era gratuito. Contudo, algumas gratuidades eram

concedidas.

Os primeiros docentes foram indicados pelo ministro Bernardo Vasconcelos e

aprovados pelo imperador. Os professores eram escolhidos por se destacarem na sociedade.

Na verdade, era uma elite intelectual educada na Europa. Posteriormente, instituíram os

concursos.

Em 1889, com a Proclamação da República, o colégio passou a ser denominado

Instituto Nacional de Instrução Secundária. Em 1890, mudou o seu nome para Ginásio

Nacional. Desde 1837, o colégio foi dividido em externato e internato. Todavia, em 1892, o

internato foi extinto e criou-se o 2º Externato, localizado no Centro da cidade do Rio de

Janeiro. A mudança nas denominações não parou. No ano de 1909, o presidente Nilo

31 Todas as informações apresentadas nesta seção foram retiradas do site do CPII. Disponível em:

www.cp2.g12.br. Acesso em: 22/02/16 e 27/02/16.

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Peçanha, ex-aluno do colégio, decretou que o externato se chamasse Externato Nacional

Pedro II, e o 2º Externato passou então a Internato Nacional Bernardo de Vasconcelos.

Somente em 1911, com o presidente Marechal Hermes da Fonseca, também ex-aluno, a

instituição voltou a se chamar Colégio Pedro II.

A partir da década de 1950, o colégio viveu três ciclos de expansão. Nessa década

foram criadas três seções escolares: Engenho Novo (1952), Humaitá (1952) e Tijuca (1957)

que, em 1979, passaram a ser chamadas de Unidades Escolares. Na década de 1960, o

colégio foi transformado em autarquia do MEC e passou a ter autonomia orçamentária,

financeira e patrimonial. O segundo ciclo de expansão ocorreu na década de 1980, com a

criação de unidades voltadas para o EFI. Eram os chamados Pedrinhos. O primeiro Pedrinho

foi inaugurado em 1984, em São Cristóvão. Outras unidades também foram implantadas:

Engenho Novo (1986), Humaitá (1985) e Tijuca (1987). O terceiro ciclo de expansão do

colégio se deu no início deste século. No período de 2004 a 2010 foram criadas as unidades

Realengo, Niterói e Duque de Caxias.

Em 2012 o CPII foi equiparado aos institutos federais. Com isso, foi alterada a sua

estrutura organizacional e as unidades escolares passaram a se chamar campus. Atualmente, o

colégio conta com 14 campi e atende da Educação Infantil ao EM, como também oferece EM

integrado, EJA, especializações e mestrado.

4.3 Sujeitos de pesquisa

Para compreender como são as aulas de Literatura do EFI do CPII campus Humaitá,

optei por entrevistar32

a equipe pedagógica (coordenação pedagógica e professoras) da

disciplina Literatura, pois entendo que ela responde pelo trabalho pedagógico realizado. No

total, foram quatro sujeitos, duas professoras e duas coordenadoras. Busquei entrevistar a

última e a atual equipe, já que a escola passava por um processo de renovação por ocasião dos

seus trinta anos de existência. Dessa maneira, poderíamos analisar as concepções das aulas de

literatura e o histórico da disciplina. Já a análise das práticas pedagógicas ocorreu por meio da

observação de aulas das duas professoras da equipe e ainda da coordenadora, já que, com a

aposentadoria de uma das professoras, ela precisou substituí-la temporariamente.

Cada sujeito de pesquisa recebeu um nome fictício, a fim de garantir o sigilo de suas

identidades. As coordenadoras são Renata (aposentada em 2012) e Sandra (na coordenação

32 O roteiro das entrevistas está disponível no apêndice E.

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desde 2012 até os dias de hoje) e as professoras, Mariana (aposentada em 2015) e Cláudia

(atua na disciplina desde 2012). Vale ressaltar que as coordenadoras aceitaram ser

entrevistadas pessoalmente e ter as entrevistas gravadas. As professoras pediram para

responder por escrito às perguntas da entrevista e responderam quando se sentiram à vontade.

Contudo, essa diferença não significa que houve resistência para participar da pesquisa.

Houve falta de tempo. Elas teriam que ficar na escola, além da carga horária de trabalho, ou

usar o tempo de trabalho em que estariam organizando as aulas. As duas responderam às

perguntas por e-mail.

Apresento, então, a seguir, o perfil dos quatro sujeitos de pesquisa.

Renata, Sandra, Mariana e Cláudia têm entre quarenta e sessenta anos de idade. Todas

são cariocas. Renata e Cláudia têm um casal de filhos. Sandra e Mariana têm um filho cada.

Seus filhos foram alunos do CPII e têm entre vinte e trinta anos de idade. Renata, Mariana e

Cláudia são casadas. Sandra, atual coordenadora, é solteira.

Antes de entrarem no CPII, Renata e Sandra trabalharam na Rede Municipal de

Educação do Rio de Janeiro. Renata trabalhou por dezessete anos no EFI e Sandra, por trinta

anos na Educação Infantil. Renata cita uma diretora que a influenciou positivamente no

exercício do magistério na rede municipal: “ela via que a gente era bem nova. Eu tinha 20

anos. E, ela, assim, interferia bastante para que a gente se modernizasse, não ficasse apegada

aos moldes antigos [...]. Aí, eu comecei a ser mordida pelo bichinho da inovação” (Renata).

Sandra menciona outra pessoa que exerceu influência no seu trabalho, principalmente quando

assumiu uma sala de leitura em uma escola municipal:

Sandra: [...] a responsável pela sala de leitura também atendia uma vez por semana

as crianças em sala de aula. Tinha na grade.

Pesquisadora: E era uma pessoa interessante, com quem você podia trocar?

Sandra: A princípio sim, maravilhosa. Na época ela trabalhava com teatro,

trabalhava com outros recursos, né, para contar a história... aí, eu fui assim: história

com quadro de pregas, história acumulativa, flanelógrafo... (Sandra). Renata e Mariana entraram na escola nos anos 1980 enquanto Sandra e Cláudia, na

década de 1990. Renata trabalhou no CPII com turmas de 2ª e 3ª séries e também como

coordenadora pedagógica de Língua Portuguesa e Literatura. Sandra trabalhou com 2º ano,

orientou o trabalho pedagógico de 2º e 3º anos e atualmente é coordenadora pedagógica de

Literatura. Mariana deu aulas de Literatura por quase toda a sua trajetória profissional dentro

do CPII. Ela foi coordenadora de Literatura e, somente por dois anos, atuou como professora

regente fora da disciplina. Ela terminou a sua trajetória profissional no CPII como professora

de Literatura. Cláudia foi professora de turmas do 3º ano e, atualmente, ministra aulas de

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Literatura. Vale ressaltar que todas estão ou estiveram ligadas à disciplina Literatura por

causa do interesse que têm pela área.

Todas fizeram o Curso Normal. As coordenadoras passaram pelo Instituto de

Educação na década de 1970 e relataram que não havia uma disciplina sobre a literatura

infantil. Tempos depois, quando a professora Mariana fez o mesmo curso, a realidade havia

mudado: “Havia muito pouca informação sobre a literatura infantil nas escolas formais. Tive

uma matéria no Curso Normal e posteriormente em um Curso Adicional para pré-escolares”

(Mariana). O referido curso também foi realizado pela coordenadora Sandra: “no Adicional

que eu tive mais contato com a literatura porque tinha uma cadeira de literatura infantil”

(Sandra). Diferentemente de Renata e Mariana, ambas aposentadas, Sandra e Cláudia fizeram

uma graduação. Sandra fez Pedagogia e Arquitetura, pois houve uma época em que não

queria ser professora; e Cláudia gradou-se em Química.

O trabalho no CPII incluiu a realização de diferentes cursos. Renata, a última

coordenadora, cita que na década de 1980, durante a construção dos Pedrinhos, atuais campi I,

os professores participavam de cursos ligados à Língua Portuguesa, Estudos Sociais e

Matemática. Mariana, professora fundadora da disciplina no campus Humaitá I, disse que

Quando ingressei no CPII como professora, nem havia literatura infantil na grade

curricular. Fui convidada a iniciar este trabalho na escola após dois anos de atuação

como professora de núcleo comum, o que foi um grande desafio, pois eu e uma

equipe de professores das diferentes unidades [atualmente, campi] formatamos os

primeiros objetivos e a programação da literatura na escola, que estaria iniciando. A

partir de então, o próprio colégio começou a investir em cursos de literatura,

oferecendo uma boa variedade para aprimorar a formação de seus professores nesta

área (Mariana). Mariana, antes de Renata, foi a coordenadora de Literatura, e no período da entrevista

ela estava como professora. Cláudia já não cita estes cursos. Ela entrou na escola depois de

Mariana, que disse que, por conta própria, fez uma especialização voltada para a formação de

leitores: “Fiz especialização voltada para a formação de leitores, que me fez avaliar com mais

critério a escolha dos títulos a serem trabalhados com os alunos” (Mariana).

Sandra cita diferentes cursos que realizou sobre literatura infantil: o curso promovido

pela FNLIJ em parceria com a Rede Municipal de Ensino do Rio de Janeiro, um curso com a

Marília Pirillo e um grupo de estudos informal realizado no CPII, na biblioteca escolar.

Desses cursos Sandra menciona aquele que provocou maior reflexão sobre a literatura:

Sabe quem me ajudou muito também? Aqueles encontros de biblioteca que teve com

a Rosita. Porque aí eu mudei alguma coisa. [...] Mas eu achei interessante porque eu

tinha uma visão de literatura, literatura para agradar, a literatura estética e, aí, a Rosita uma vez falou pra mim que a literatura não tem que ser isso, também tem que

ser desafiadora, quebrar paradigmas e tentar... Trazer desconforto. Entendeu? Mexer

um pouquinho com a cabeça, com os nossos valores e tudo. E aquilo ficou na minha

cabeça. Ficou muito na minha cabeça (Sandra).

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Vale ressaltar que Rosita é autora de uma dissertação de mestrado que trata de aulas de

literatura no CPII, especificamente com o 1º ano do EFI. Ela está presente na revisão

bibliográfica deste trabalho com o título As histórias da gente que cabem num livro:

experiências de leitura nas aulas de Literatura do primeiro ano do Ensino Fundamental.

A presente pesquisa contou, então, com quatro sujeitos que vêm desenvolvendo aulas

de literatura no EFI. Exceto por Cláudia, todas já estiveram na função de coordenadora

pedagógica da disciplina. São mulheres com larga experiência profissional e que viveram um

período no qual o Curso Normal era o principal espaço de formação docente. Nem todas

contaram com a Literatura Infantil na sua formação inicial e, durante a trajetória profissional,

houve a participação em cursos que estavam vinculados à disciplina, ora promovidos pela

instituição, conforme narra a professora Mariana, ora realizados por conta própria.

A seguir, trazemos para esta conversa a apresentação do currículo das aulas de

Literatura do EFI do CPII. Quais concepções ele traz? A análise foi tecida a partir da tese de

Martina Fittipaldi (2013), que, ao analisar currículos de Literatura de escolas primárias de

Espanha, Catalunha, França, Inglaterra e Quebec, trouxe categorias de análise preciosas para a

nossa investigação.

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5 PROPOSTA CURRICULAR DAS AULAS DE LITERATURA DO ENSINO

FUNDAMENTAL I DO COLÉGIO PEDRO II

Pode-se afirmar que é por intermédio do currículo que as ‘coisas’ acontecem na

escola. No currículo se sistematizam nossos esforços pedagógicos. O currículo é, em

outras palavras, o coração da escola, o espaço central em que todos atuamos, o que

nos torna, nos diferentes níveis do processo educacional, responsáveis por sua

elaboração. O papel do educador no processo curricular é, assim, fundamental. Ele é

um dos grandes artífices, queira ou não, da construção dos currículos que se

materializam nas escolas e nas salas de aula. MOREIRA; CANDAU, 2007, p. 19

O objetivo deste capítulo de analisar a proposta curricular de Literatura do EFI do

CPII se deve à intenção de articular tal proposta com as aulas de Literatura na perspectiva de

melhor compreendê-las. Concordamos com Moreira e Candau (2007, p. 19) que é por meio do

currículo que as “coisas” acontecem na escola. Então, o que acontece nas aulas de Literatura?

Que sínteses pedagógicas estão presentes no documento curricular? É preciso ressaltar que

não tivemos como objetivo realizar um estudo aprofundado sobre teorias curriculares que

embasam o documento. Nossa intenção foi apresentar e analisar a proposta para compreender

como ela se efetiva nas aulas de Literatura.

A proposta curricular das aulas de Literatura do EFI do CPII faz parte de um

documento mais abrangente, o PPP, que situa o colégio quanto aos seus objetivos e

finalidades. O projeto foi elaborado coletivamente pelo corpo docente sob a liderança das

chefias de departamento, e os professores se encontravam de tempo em tempo para discutir

questões relativas ao documento. As bases teóricas que deram suporte a ele são explicitadas

em cada componente curricular (Língua Portuguesa, Estudos Sociais, Matemática, Literatura,

Artes, Música, Educação Física e Ciências) e ao final do texto introdutório.

Na introdução percebemos que há a influência de Marcos Bagno (1998) quanto à

pesquisa na escola; do MEC, no que se refere aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN,

2001), às Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996) e às Matrizes Curriculares de

Referência para o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb, 1998); de Maria Dolors

Busquets (2001), para tratar dos temas transversais em educação; Terezinha Carraher (1986),

como referência à Psicologia Cognitiva; do próprio CPII, quando aborda o último PPP (2002);

de Ivani Fazenda (2005), quanto à interdisciplinaridade; de Paulo Freire (1997), no que se

refere à Pedagogia da autonomia; Jussara Hoffman (2002) e Philippe Perrenoud (1999), para

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aludir à avaliação; e de Ilma Passos Alencastro Veiga (1995), como referência à construção de

um PPP.

Embora o documento explicite tais bases conforme os estudiosos de cada área,

apresenta o conceito de competência como norte de trabalho de todas as disciplinas, com base

em Perrenoud (1999). Esse posicionamento teórico marca um ponto de vista de caráter

pragmático: “Todos os componentes curriculares trabalharão em prol do desenvolvimento das

competências transdisciplinares, balizadoras de toda ação pedagógica dentro do Colégio

Pedro II” (CPII, 2008, p. 3). De acordo com Perrenoud (1999), os currículos voltados para a

construção de competências devem dar prioridade a conteúdos que possam ser exercitados na

escola em situações complexas. O autor defende que “A escola só pode preparar para a

diversidade do mundo trabalhando-o explicitamente, aliando conhecimentos e savoir-faire a

propósito de múltiplas situações da vida de todos os dias” (PERRENOUD, 1999, p. 75).

Assim, as propostas curriculares construídas com base nessa visão não poderiam se limitar a

ensinar conhecimentos considerados inúteis para a ação. Os saberes considerados válidos são,

então, aqueles que podem ser mobilizados em uma situação precisa para resolver um

problema. São saberes com um para quê utilitário.

A forte presença do conceito de competência ao longo de todo o PPP (CPII, 2008), no

que tange à literatura na escola, revela uma tensão entre as linhas de força Leitura e

Utilitarismo e Leitura e Experiência/Formação. Esta última explicitada no objetivo geral do

documento ainda é tensionada pela linha de força Leitura e Cidadania, a saber: “formar

cidadãos críticos, orientados eticamente para o respeito às identidades, comprometidos

politicamente com a igualdade, sensíveis esteticamente à diversidade, dotados de

competências e valores capazes de mobilizá-los para intervir responsavelmente na sociedade”

(CPII, 2002, p. 70). Em suas finalidades o Colégio revela também o encontro entre as linhas

de força Leitura e Cidadania, Leitura e Ilustração e Leitura e Subjetivismo. A instituição tem

como fim o exercício da cidadania. Além disso, pretende promover o desenvolvimento

pessoal do aluno através da construção de sua identidade pessoal e de suas relações sociais,

como também a apropriação do saber construído historicamente (CPII, 2002, p. 65-67).

Assim, das seis linhas de força de promoção da leitura compartilhadas no capítulo 3,

observamos que as bases do PPP (CPII, 2008) trabalham com quase todas elas, com exceção

da linha Leitura e Ludismo, que está presente na proposta curricular das aulas de Literatura.

Tal constatação evidencia o quanto cada um dos fios das linhas, com suas respectivas

perspectivas, convivem tensionados: ora se somam, ora competem entre si; ora se opõem, ora

se sobrepõem.

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A proposta curricular das aulas de Literatura tem como contexto um trabalho

pedagógico que vem sendo desenvolvido há mais de trinta anos. Um breve histórico do início

dessas aulas no CPII, para crianças de 6 a 10 anos de idade, é abordado a seguir.

5.1 O início das aulas de Literatura

Na contextualização do CPII apresentada no capítulo anterior vimos que a instituição

tem, desde a sua origem, a característica de ser voltada para as Letras. Quando o colégio

passou a ser chamado de Seminário de São Joaquim, em 1766, ele funcionava como um polo

de cultura na cidade do Rio de Janeiro. Tempos depois, o ministro Bernardo Pereira de

Vasconcelos transformou o seminário no Imperial Collegio de Pedro II. Seu programa de

ensino tinha uma base clássica e uma tradição humanística. Quem se formava no colégio

recebia o diploma de bacharel em Letras, que habilitava o ingresso no ensino superior sem

prestar exames. Este histórico é marcado fortemente pela linha de força Leitura e Ilustração,

devido ao fato de o seminário ter sido um polo de cultura da cidade e, depois, na condição do

Imperial Collegio Pedro II, de haver um programa de ensino clássico com forte tradição

humanística.

O destaque a essa tradição também está presente em suas propostas curriculares.

Desde o EFI os alunos têm aulas de Literatura, que são oferecidas semanalmente por uma

equipe pedagógica, a partir de uma proposta curricular específica. Essa especificidade que dá

visibilidade à literatura nos remete à ideia de Calvino (2016, p. 108-109) de pedagogia da

imaginação. Para o autor a pedagogia da imaginação nos acostuma à visibilidade, cuja

formação é muito importante na visualização e verbalização do pensamento (CALVINO,

2016, p. 112). A observação direta do mundo real, o mundo figurativo transmitido pela

cultura, o processo de abstração e a interiorização da experiência sensível nos habituam à

visibilidade. Indagamos: o fato de semanalmente haver aula de Literatura, ao longo de mais

de trinta anos, faz com que o CPII assuma, em certa medida, uma pedagogia da imaginação,

conforme teoriza Calvino?

De acordo com Vinco33

(2006, p. 50), no período da criação do EFI, chamado de

Pedrinho pela equipe, o colégio trabalhava na perspectiva do construtivismo piagetiano, uma

33 A professora do CPII Sônia Regina Vinco trabalha na disciplina Literatura do campus São Cristóvão I. Sua

dissertação de mestrado, intitulada Formação do leitor: um bicho de quantas cabeças?, foi defendida no

PPGE/UFF em 2006, sob a orientação da Profª. Drª. Edwiges dos Santos Zaccur. A pesquisadora investigou

aspectos do trabalho de formação de leitores desenvolvido no CPII campus São Cristóvão I. O segundo capítulo

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orientação progressista para a época. Após a admissão de novas professoras, houve uma

seleção de pessoas que constituiriam as equipes de coordenação pedagógica e administrativa

da escola. Essa primeira equipe pedagógica montou o primeiro Plano Geral de Ensino (PGE)

em 1984, ano da inauguração do primeiro Pedrinho no campus São Cristóvão. A equipe

pensou a grade curricular, a seleção de conteúdos, e no processo observou que havia a

necessidade de ter “aula de biblioteca” (VINCO, 2006, p. 57-58). Assim, o EFI do CPII é

inaugurado com uma discussão que incluía a literatura como parte da sua proposta curricular.

Foi na década de 1980 que a LIJ se tornou mais presente na escola, e o mesmo

aconteceu no CPII. Na mesma década surgiu o primeiro PGE de Literatura. De acordo com

Fittipaldi (2013, p. 92), nesse período, na Europa, a Didática da Literatura foi replanejada em

função do seu ensino na escola.

Segundo Vinco (2006, p. 61-62), o ano letivo de 1987 contou com uma semana de

estudos com assessoras que apresentaram novas propostas metodológicas de ensino. Em

Língua Portuguesa, por exemplo, propunham não realizar ditados, cópias e exercícios formais

de sistematização do conteúdo. No que se refere à antiga 1ª série, as professoras deveriam

inventar os textos a serem usados nas aulas de interpretação. Os textos de autores da literatura

infantil eram raros em sala. As aulas deveriam favorecer as descobertas das crianças.

Entretanto, houve uma tensão entre as novas orientações e as antigas. Uma tensão entre a

inovação e a tradição, o que é uma marca do colégio.

A partir do segundo ano de funcionamento do primeiro Pedrinho (1988), uma cisão foi

sendo construída entre o trabalho de Língua Portuguesa e o da Literatura. Os professores de

ambas as equipes pertenciam ao mesmo departamento. Todavia, os professores de Literatura

não participaram das atividades de assessoria. Segundo Vinco (2006, p. 63-64), parece que a

maior preocupação era construir um trabalho das áreas chamadas de Núcleo Comum (Língua

Portuguesa, Estudos Sociais, Matemática e Ciências). O trabalho das demais disciplinas,

nomeadas de Atividades Complementares (Literatura, Artes, Música e Educação Física), que

proporcionavam à equipe de Núcleo Comum horários para encontros de planejamento, era

secundarizado. Havia um grupo de professores que considerava as Atividades

Complementares um diferencial da escola, mas outro grupo considerava as Atividades de

forma reduzida, como mera oportunidade de encontros para o planejamento coletivo. O

nascimento da disciplina acontece, então, em um contexto bastante pragmático do cotidiano

escolar: a necessidade de encontrar tempo para os encontros de planejamento. As aulas de

da dissertação, “Um lugar no espaço-tempo: encontros e desencontros numa instituição secular”, apresenta um

histórico da disciplina Literatura no EFI e colaborou na construção do presente capítulo.

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biblioteca dariam tempo para os professores planejarem em equipe e os alunos estariam

envolvidos com uma aula importante. Esta é a segunda tensão que marca o cotidiano do

colégio: o pragmático versus o formativo.

Com relação ao trabalho pedagógico comum à época a proposta pedagógica de Língua

Portuguesa era progressista. Todavia, a equipe que trabalhava com a Literatura não via com

bons olhos a orientação daquele trabalho. A recíproca também era verdadeira (VINCO, 2006,

p. 63-64), o que evidenciava a falta de articulação entre as equipes. O primeiro coordenador

de Literatura dos Pedrinhos foi o professor Mário Bruno34

, que havia tido experiência de dois

anos como coordenador de Língua Portuguesa e Literatura. Em 1989 e 1990, porém, as

instâncias superiores do colégio extinguiram a coordenação de Literatura e criaram dois

coordenadores de Língua Portuguesa em cada unidade escolar, que também tinham a

responsabilidade de coordenar a Literatura.

Segundo Vinco (2006, p. 65), em 1988, as assessorias deixaram de existir e aqueles

que participaram delas se tornaram multiplicadores da proposta metodológica implantada.

Tempos depois, sem o controle das assessorias, algumas professoras da Classe de

Alfabetização começaram a romper com a metodologia proposta, voltando-se para uma

prática relacionada às pesquisas de Emília Ferreiro. Mais uma vez aparece a tensão entre

inovação e tradição no contexto escolar. No período a literatura no colégio encontrou outros

espaços, além das aulas de Literatura. Segundo uma das professoras entrevistadas por Vinco

(2006), o ensino da leitura sofreu alterações por meio de ações como o Clube do Livro, a

leitura e a contação de histórias em sala de aula e o questionamento do formato mais

tradicional do trabalho com a língua escrita.

Foi nesse contexto que as aulas de Literatura nasceram. De acordo com Vinco (2006,

p. 65-66), observando o PGE pode-se ver que, desde o primeiro ano de funcionamento dos

Pedrinhos, algumas Atividades Complementares faziam parte da grade curricular, como a

Educação Física e a Música. A equipe sugeriu que também houvesse aulas de Educação

Artística, de Teatro e alguma atividade na área da leitura. As propostas metodológicas de

Artes Plásticas, Teatro e Música se espelharam na publicação do Laboratório de Currículos da

Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro (Seeduc). É interessante notar que, ao

34 Mário Bruno possui graduação em Letras – Português e Literatura (Uerj, 1984), mestrado em Letras (UFRJ, Ciências da Literatura, 1989), graduação em Filosofia (Uerj, 1996), doutorado em Letras (UFRJ, Ciência da

Literatura, 1996) e doutorado em Psicologia (UFRJ, 2003). Atualmente, é professor/pesquisador da UFF e

professor adjunto da Uerj. Estas informações foram retiradas do currículo Lattes do professor, disponível em:

http://lattes.cnpq.br/7232939039544734. Acesso em: 29/02/16.

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invés de o CPII ser referência para o trabalho pedagógico, foi a Rede Estadual de Educação

que ocupou este lugar.

No PGE de 1985 foi reservado um período de quarenta a sessenta minutos semanais

para a biblioteca, somente para a 1ª e a 2ª série. As duas professoras que começaram esse

trabalho foram Dione Coelho35

(2015) e Cristina Vergnano36

(2006). Posteriormente, o

trabalho transformou-se na Atividade Literatura. As professoras escolhiam algumas histórias e

liam para as crianças no horário estipulado. Contudo, vale ressaltar que, embora a Atividade

Biblioteca aparecesse na grade horária, não há no PGE registro de seu de trabalho.

A proposta curricular estava em formação. Com isso, de ano em ano, muitas mudanças

ocorriam. O cotidiano escolar trazia discussões que precisavam ser incluídas. O PGE de 1985

apresentou a atividade Literatura, que previa uma carga horária semanal de quarenta e cinco

minutos para a 1ª e a 2ª série e de uma hora e trinta minutos para a 3ª série. Naquele ano a

Literatura estava ligada ao trabalho de Artes Plásticas. Não havia ainda definição de

conteúdos. Em função do caráter experimental do trabalho, a equipe responsável preferiu

apresentar somente os objetivos e a proposta metodológica.

O cotidiano escolar mostrou que havia dificuldade entre os alunos na leitura,

interpretação e criação de textos literários, o que levou a equipe a implantar um trabalho

específico de Literatura no EFI. A integração entre Artes Plásticas e Literatura, prevista no

projeto, circunscreveu-se à necessidade de se trabalhar com diferentes formas de expressão

(CPII, 1985, p. 66-67). Os objetivos do trabalho eram genéricos e tratavam do

desenvolvimento do “espírito crítico”, da formação de “hábitos e atitudes”, da “coordenação

motora fina” e de uma questão que se tornou motivo de vigorosas discussões: apoiar o

trabalho de Língua Portuguesa.

Em 1985 as aulas de Literatura se resumiam à leitura de histórias para as crianças, no

horário estipulado, como as professoras de Biblioteca faziam em 1984. Entretanto, as aulas

35 A professora Dione Machado Silva Coelho, além de ter realizado este trabalho pioneiro no CPII, realizou uma

pesquisa de doutorado intitulada Crianças leitoras e suas escolhas literárias: um estudo com alunos do 5º ano

do Colégio Pedro II (2015), no PPGE/UFRJ, sob a orientação da Profª. Drª. Patrícia Corsino. A tese teve como

objetivo conhecer o que leem as crianças do 5º ano do EF de duas turmas do CPII campus São Cristóvão I, e

analisar como fazem suas escolhas literárias durante as atividades do Clube de Leitura. Estas informações foram

retiradas do currículo Lattes da professora, disponível em: http://lattes.cnpq.br/9799991152991790. Acesso em:

29/02/16. 36 A professora Cristina de Souza Vergnano-Junger trabalhou no CPII, no EFI, no período de 1984 a 1991.

Depois, de 1992 até 2002, ministrou aulas de língua espanhola no EFII do colégio. Cristina é licenciada em

Letras – Português/Espanhol (Uerj, 1983), possui mestrado em Letras Neolatinas (UFRJ, 1991) e doutorado também em Letras Neolatinas (UFRJ, 2002). Realizou seu pós-doutorado na área de linguística aplicada

(Universidade Pompeu Fabra, 2012-2013). Atualmente, é professora associada da Uerj. Estas informações foram

retiradas do currículo Lattes da professora, disponível em: http://lattes.cnpq.br/9455322284852465. Acesso em:

29/02/16.

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aconteciam nas salas das turmas. A disciplina saíra do seu lugar privilegiado: a biblioteca, o

lugar onde as obras literárias estavam reunidas. Mais tarde a equipe de Literatura conquistou

uma sala específica, e saiu do modelo de leitura compartilhada para uma aula com conteúdo,

objetivo e avaliação. A ida para uma sala específica foi vista como uma conquista. A

conquista de um espaço. Antes a aula acontecia na biblioteca sem vinculação com o conteúdo

escolar. Depois, nas salas de aula, mas acabavam atreladas à Língua Portuguesa. Agora, as

aulas de Literatura contavam com uma sala de aula e um currículo específicos.

Cabe ressaltar que na época, na Rede Municipal de Educação do Rio de Janeiro, como

também na Rede Estadual, havia propostas de trabalhos de Sala de Leitura, e algumas

professoras do CPII haviam atuado nessas redes antes de fazerem concurso para o colégio.

Vinco (2006) entrevistou professores que apontaram diferenças entre os trabalhos, como no

caso da professora Patrícia Fernandes, que se referiu na entrevista ao trabalho coordenado por

Maria Mazetti, no município do Rio de Janeiro, no princípio dos anos 1970. Segundo ela, era

um trabalho mais simples do que o proposto pela Literatura no CPII. Havia uma Sessão de

Bibliotecas e Auditório e cada escola tinha, dependendo do número de turmas, uma ou duas

professoras de biblioteca. Elas recebiam uma história, semanalmente, para cada série. Já a

professora Júlia afirmou na entrevista que a principal diferença entre os trabalhos propostos

era que o CPII queria uma carga horária semanal com as crianças. No município o que havia

era um trabalho de Sala de Leitura, aonde as crianças eventualmente iam para ler, para fazer

um trabalho com o professor, mas sem uma carga horária semanal em uma sala diferente da

biblioteca. Júlia acrescenta, dizendo que no Pedrinho havia conteúdo específico de Literatura

e o trabalho era acompanhado semanalmente pelo mesmo professor em dois tempos de aula.

Foi na coordenação de Mário Bruno que foi publicado o primeiro Plano de Literatura

no PGE de 1985. Na pesquisa de Vinco (2006, p. 68) o professor relatou que quando entrou

no colégio em 1985 encontrou um caos e que não entendia a dinâmica das aulas de biblioteca.

Os professores entravam em sala, iam à biblioteca, pegavam um livro, liam a história para os

alunos e não sabiam o que fazer depois. Mário conta que, diferentemente do que ocorreu nas

áreas do Núcleo Comum (Língua Portuguesa, Estudos Sociais, Matemática e Ciências), não se

estava pensando em uma metodologia especial para as Atividades (Literatura, Artes, Música e

Educação Física). As Artes Plásticas se valeram, no princípio, da proposta do Laboratório de

Currículos do Estado. Porém, a Literatura não contava com nada definido no colégio. Ela foi

criada a partir da prática de ler histórias para as crianças com as professoras Dione Coelho e

Cristina Vergnano. Na época o colégio não tinha biblioteca, os livros ficavam guardados em

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uma sala e, segundo o entrevistado, eram de péssima qualidade. A maioria dos livros era de

doação ou do acervo particular das professoras (Vinco, 2006, p. 69).

De acordo com a professora Júlia, a estruturação do trabalho começou com Mário

Bruno e Cristina Vergnano. As diversas modificações no PGE foram propostas pelo

professor, quando ele era coordenador, e partiam das discussões do grupo. Julia relata que os

professores de Literatura formavam um grupo que se preocupava com o planejamento do

cotidiano escolar e o Mário “puxava lá na frente uma discussão”. Ele estava atento à formação

docente e propunha leituras. As leituras eram de autores variados e, como o coordenador era

ligado à Filosofia, o grupo lia textos dessa área para discutir e embasar o trabalho pedagógico

(Vinco, 2006, p. 70).

Em outra entrevista de Vinco (2006) a professora Cristina relatou que teve acesso ao

embasamento teórico da literatura com o grupo de estudos coordenado por Mário. Com ele e a

professora Júlia ela foi aprendendo o que era um bom texto, uma boa ilustração. Mário

conduzia, segundo Cristina, as reuniões de planejamento junto com a história da literatura

infantil (Vinco, 2006, p. 70).

Segundo Mário, era uma equipe unida, apaixonada e dedicada que, junto dele, criou o

trabalho. A seleção dos textos era feita em equipe. Mas Mário, que tinha formação em Letras,

cursava o mestrado em Teoria Literária, participava de grupos de estudo de Filosofia e trazia

muitas leituras. As discussões iam além da questão da textualidade. No seu depoimento Mário

declara que estava antenado com muitas leituras que não correspondiam à forma com que os

demais professores pensavam o trabalho com o texto. Ele lia Blanchot, Barthes, Foucault,

Deleuze. Para ele, o texto literário tem especificidades que devem ser consideradas ao

trabalhá-lo, que são diferentes quando se estuda uma notícia de jornal ou uma receita de bolo.

A busca pelo tom do trabalho com literatura no EFI revelava a fragilidade da formação

inicial de alguns docentes dos anos iniciais. Mário e Cristina possuíam formação em Letras,

mas pouca experiência como professores dos anos iniciais. O cotidiano da sala de aula

possibilitou o contato com a realidade e o saber do que se aplicaria ou não nas aulas de

Literatura.

Ainda segundo Vinco (2006), o Primeiro Congresso Brasileiro de Literatura Infantil e

Juvenil, em 1985, mudou o rumo do trabalho com a literatura infantil no colégio. No

congresso os professores fizeram contato com o Clã do Jabuti, que trabalhava de forma

teórica e prática com a Literatura Infantil. As oficinas do Clã encantaram a todos, pois

integravam Literatura e Artes, partindo da Literatura. Era uma possibilidade de interpretação

lúdica do texto literário. A ideia dessas oficinas ficou como um ponto de partida para o

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trabalho de Literatura do colégio. O grupo queria um trabalho que incluísse um fazer artístico

e fosse além da contação de histórias. A intenção era criar possibilidades de interpretação

lúdica, por meio das artes plásticas, da música e da integração de diferentes linguagens

(Vinco, 2006, p. 72-73).

Portanto, a Literatura foi criada com a prática de ler histórias para as crianças. Ler é a

ação primeira da disciplina. As professoras escolhiam as histórias e liam para as crianças no

horário estipulado. O professor não sabia o que fazer depois da leitura do livro. A

coordenação pedagógica da época orientou a conversar sobre o livro após a leitura. Mas a

equipe docente queria que houvesse um trabalho pedagógico para além da leitura de histórias;

queria que também houvesse um fazer artístico, uma interpretação lúdica através das artes

plásticas, da música e da integração de diferentes linguagens.

Como se observa, no histórico das aulas de Literatura, as linhas de força de promoção

da leitura que tensionam são as seguintes: Utilitarismo, Experiência/Formação e Ludismo. A

Literatura nasceu da necessidade de apoiar o trabalho de Língua Portuguesa, já que os alunos

apresentavam dificuldades na leitura, interpretação e criação de textos. Então, a aula de

Literatura entraria na grade de estudo com o fim de apoiar esse trabalho. Todavia, a Literatura

não se submeteu inteiramente a essa necessidade. Sua equipe inicial ocupou bastante tempo

das reuniões de planejamento com o estudo de textos de autores ligados ao campo da

Filosofia, da Leitura e da Teoria Literária. Houve muita autoria na construção do primeiro

trabalho pedagógico com a literatura. A equipe docente buscou, em suas aulas, destacar as

especificidades do texto literário e promover sua interpretação lúdica, no sentido da

fabulação. A Literatura não estava na grade curricular do colégio para servir à Língua

Portuguesa, mas para desenvolver algo mais específico. E qual era a sua especificidade? A

equipe encontrou na interpretação lúdica do texto literário uma chave para as suas aulas. A

marca dessa especificidade será vista nas duas propostas curriculares das aulas de Literatura

descritas e analisadas a seguir.

5.2 As propostas curriculares das aulas de Literatura

Em 1985 o CPII publicou o primeiro Plano de Literatura no PGE, que depois foi

reescrito na forma de um PPP. De acordo com Vinco (2006, p. 74-75), a construção do

primeiro Plano de Literatura foi difícil. Para o coordenador da época, Mário Bruno, era

necessário ter uma visão horizontal e vertical do plano para eleger os conteúdos. Isso era um

problema, pois a experiência pedagógica se restringia à 1ª, 2ª e 3ª série. Para tanto, foram

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consideradas a diversidade de gêneros literários e as experiências prévias das professoras.

Todavia, persistia o problema das duas séries iniciais. Durante a coordenação de Mário Bruno

foi possível a criação de um trabalho coletivo. Na época, 1986, as equipes de Literatura de

todas as unidades se encontravam no mesmo horário para planejar. Elas estudavam, discutiam

as aulas, liam Umberto Eco, Roland Barthes, Gianni Rodari, textos da Teoria da Literatura

Infantil (Cadernos da PUC, organizados por Eliana Yunes) (VINCO, 2006, p. 76-79).

A primeira proposta curricular de Literatura foi publicada em 1985 e a mais recente,

em 2008. A versão de 2008 é preliminar. Contudo, ela é a base do atual trabalho pedagógico.

Nas seções a seguir vamos descrever e analisar ambas as propostas a partir de algumas

categorias sugeridas por Fittipaldi (2013) na tentativa de responder às questões: qual o lugar

que ocupa as aulas de Literatura no colégio? Quais são os objetivos do trabalho? Como a

literatura é concebida? Quais conhecimentos literários são privilegiados e qual é o corpus

recomendado? Como a proposta curricular propõe aproximações com a literatura?

5.2.1 Estruturação e objetivos das aulas de Literatura

No PGE de 1985 as aulas de Literatura eram chamadas de Atividade Integrada. O

Plano de Literatura estava integrado ao das Artes Plásticas por causa da necessidade que a

equipe observou de trabalhar com as “diversas formas de expressão” (CPII, 1985, p. 133).

Vale ressaltar a palavra integrada. Ela traz consigo a ideia de encontro, no caso, da Literatura

com as Artes. Hoje, Artes têm uma proposta curricular, assim como a Literatura.

Na medida em que a Literatura se integrou às Artes, priorizou o imaginar e o criar.

Essa integração a vinculou a um dos princípios do trabalho pedagógico preconizado por

Vigotski (2008, p. 98): preparar o aluno para o porvir. Como a imaginação tem como função

básica orientar o porvir, essa preparação acontecerá com a imaginação criadora por meio da

criação artística.

Interessante notar que, embora a implantação de um trabalho específico com a

Literatura tenha surgido a partir da constatação das dificuldades dos alunos na leitura,

interpretação e criação de textos literários (CPII, 1985, p. 133), a proposta curricular dava

mais força à leitura na perspectiva da experiência e da formação, e não do utilitarismo. Em

1985 o tempo previsto para a Literatura na 1ª e 2ª série era de quarenta e cinco minutos

semanais. Para a 3ª série, de uma hora e trinta minutos semanais. As atividades eram

ministradas por professores especializados, com horários pré-fixados. No plano não há

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menção à 4ª e 5ª séries, pois, na época, ainda não havia turmas devido ao início do Pedrinho,

em 1984 (unidade São Cristóvão).

Diferentemente do PGE (CPII, 1985), no PPP (CPII) de 2008 a Literatura não é

apresentada junto às Artes Plásticas, e também não é chamada de Atividade Integrada, mas de

Atividade Complementar. Além disso, do 1º ao 5º ano, os alunos têm dois tempos de aula de

Literatura semanais (1h30). As aulas continuam a ser ministradas por professores

especializados que pertencem a uma equipe específica de Literatura. A equipe tem horários

pré-fixados para as reuniões de planejamento e conta com um coordenador pedagógico por

campus, eleito pelo corpo docente, e com dois professores, no caso do campus Humaitá I.

No caso da nova denominação, vale refletir sobre o significado da palavra atividade.

Segundo o Dicionário Aurélio, considerando o contexto escolar, atividade é “2- Faculdade de

exercer a ação; 3- Exercício ou aplicação dessa capacidade”. No CPII o que não é Atividade é

Disciplina, como Ciências, Estudos Sociais, Língua Portuguesa e Matemática. De acordo com

o mesmo dicionário, disciplina significa “4- Instrução e educação; 5- Ensino; 6- Ação

dirigente de um mestre; 7- Estudo de um ramo do saber humano”. Há muita diferença entre

ambas as palavras. Ao ser considerada uma atividade, a Literatura pode ser conduzida para

uma linha de força de promoção de uma leitura utilitarista (exercício), podendo virar as costas

para a linha de força Leitura e Ilustração (saber) e mais ainda para a de

Experiência/Formação. Tal constatação vai ao encontro da origem da disciplina. Ela surgiu

para apoiar as aulas de Língua Portuguesa. Outra análise que merece destaque são os adjetivos

da Atividade: integrada e complementar. Ao nosso ver a palavra complementar se mostra

menos adequada do que integrada. Entendemos a escolha do termo como uma redução.

Integrada comunicava melhor a especificidade da disciplina que, na condição de

complementar, mantém a ideia de submissão à disciplina Língua Portuguesa. A mudança de

nome também dialoga com o conceito de competência que norteia todo o PPP. Na perspectiva

da competência o valor de uso de cada conhecimento ocupa lugar central.

Em relação aos objetivos, o PGE apresenta apenas objetivos gerais do trabalho

integrado, conforme vemos a seguir:

a) Objetivos que se referem ao trabalho específico com a Literatura e Artes

Plásticas:

- desenvolver as potencialidades criativas globais do aluno;

- desenvolver o espírito crítico;

- desenvolver as percepções, conjugando-as entre si;

- desenvolver a coordenação motora fina.

b) Objetivos referentes ao conteúdo e à proposta metodológica:

- trabalhar todas as formas de expressão, verbais ou não; - desenvolver as potencialidades intelectuais do aluno dentro de uma linha de

trabalho não-formal;

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- integrar as atividades complementares;

- apoiar o trabalho das demais atividades do currículo, principalmente o de Língua

Portuguesa.

c) Objetivos atitudinais:

- desenvolver a capacidade de trabalhar independentemente, com vistas à conquista

da autonomia, e a de trabalhar cooperativamente, com vistas à conquista do

sentimento de solidariedade;

- criar um ambiente favorável ao estabelecimento de relações com os colegas e com

os demais membros da comunidade escolar;

- desenvolver hábitos e atitudes (CPII, 1985, p. 133).

O PGE de 1985 está marcado pela tensão entre as linhas de força Cidadania,

Utilitarismo, Experiência e Ludismo. Nos objetivos atitudinais (CPII, 1985, p. 133) vemos a

intenção de formar um cidadão. Esses objetivos que se referem às atitudes dos alunos revelam

que um cidadão é aquele que se mostra solidário e consegue conviver bem em sociedade. As

aulas de Literatura, portanto, também seriam úteis para a formação do cidadão, no sentido de

cidadania como civismo, processo civilizatório, de desenvolvimento de valores que melhoram

a convivência.

A linha de força Leitura e Utilitarismo se fez presente neste documento por meio do

objetivo referente ao conteúdo e à proposta metodológica: “apoiar o trabalho das demais

atividades do currículo, principalmente o de Língua Portuguesa” (CPII, 1985, p. 133). Nos

objetivos que tratam do trabalho específico com a Literatura e as Artes Plásticas, o objetivo de

“desenvolver o espírito crítico” (CPII, 1985, p. 133) nos conduz à linha de força Leitura e

Experiência/Formação. Nessa mesma direção, o objetivo de “desenvolver as potencialidades

intelectuais do aluno dentro de uma linha de trabalho não-formal” (CPII, 1985, p. 133) nos

remete ao Ludismo. Entendemos que, quando se faz questão de frisar que o trabalho deve

acontecer dentro de uma linha de trabalho não formal, há a intenção de realizar um trabalho

diferente do que as demais aulas oferecem. Talvez o termo não formal pudesse ser substituído

por lúdico, já que esta foi uma preocupação registrada no PGE de 1985. A equipe queria

propor uma interpretação lúdica do texto literário. Um dos princípios metodológicos da época

era o “estabelecimento de propostas lúdicas e agradáveis que conduzam a criança a um

contato prazeroso e à identificação com a Literatura” (CPII, 1985, p. 130). Propostas lúdicas e

agradáveis, contato prazeroso e identificação com a literatura são trechos do documento que

nos levam a relacioná-los com a linha de força Leitura e Ludismo. Observamos a presença das

duas concepções de lúdico. Quando há intenção de propor atividades agradáveis e que o

contato com a literatura seja prazeroso, a concepção de lúdico como prazer, satisfação e

realização se faz presente. Por outro lado, quando há preocupação do leitor se identificar com

a literatura, o lúdico aparece como algo constitutivo do ser humano e ligado à formação

humana.

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No PPP os objetivos gerais descritos acima foram transformados em um único

objetivo geral: “Formação de leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades,

os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias” (CPII, 2008, p. 24). Além

dele, o documento conta com objetivos específicos, que já não fazem referência às questões

atitudinais. Tratam do trabalho com a Literatura, do conteúdo e da proposta metodológica:

1. Reconhecer a especificidade do texto literário e as inúmeras possibilidades de

apropriação de seus elementos. 2. Oportunizar ao aluno o contato com diferentes linguagens e não apenas com a

linguagem-padrão, de uso social.

3. Estimular o gosto pela leitura auxiliando a criança a acelerar o seu processo de

maturação, através da relação real/imaginário.

4. Possibilitar o desenvolvimento das estruturas mentais, através do

estabelecimento de relações, tais como: eu/outro, eu/as coisas verdadeiras/as coisas

inventadas, e do contato com diferentes tipos de tempo e espaço, fazer a criança

refletir sobre os problemas de seu tempo, levando-a a desenvolver o espírito crítico.

5. Incorporar o texto literário às práticas cotidianas na sala de aula (CPII, 2008, p.

123).

Nos objetivos específicos, de certa maneira, permanecem alguns dos objetivos gerais

de 1985. Quando se afirma que ao aluno deve ser oportunizado o contato com diferentes

linguagens (CPII, 2008, p. 123), faz lembrar o objetivo indicado no PGE (1985, p. 133) de

trabalhar todas as formas de expressão, verbais ou não. Em “Possibilitar o desenvolvimento

das estruturas mentais” (CPII, 2008, p. 123) observa-se a proximidade com “desenvolver as

potencialidades intelectuais do aluno” (CPII, 1985, p. 133). O objetivo que une os dois

documentos é “desenvolver o espírito crítico” (CPII, 2008, p. 123; CPII, 1985, p. 133).

O PPP (CPII, 2008) frisa que a criança deve estabelecer relação entre o real e o

imaginário: “Estimular o gosto pela leitura auxiliando a criança a acelerar o seu processo de

maturação, através da relação real/imaginário” (CPII, 2008, p. 123). Trazer essa possibilidade

nas aulas de Literatura significa proporcionar à criança a vivência lúdica da leitura, no sentido

da fabulação, do jogo entre o real e a fantasia.

Esses objetivos também dialogam com o que Candido (2004, p. 22) traz acerca da

humanização que a literatura possibilita. Ela desenvolve traços considerados essenciais para o

homem, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o

próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso

da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor.

Uma especificidade da proposta curricular aparece no seu objetivo geral (CPII, 2008)

quando trata das construções literárias, dialogando com Jouve (2012, p. 30-31) quando define

literatura: a literatura é o uso estético da linguagem escrita. A delimitação ao campo da

criação estética conduziu a Literatura no CPII à linha de força Leitura e

Experiência/Formação mais do que à linha Leitura e Ludismo, mais forte no PGE (1985). A

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primeira proposta volta a sua atenção para a criação artística enquanto a última, para as

construções literárias. Todavia, as expressões “formação de leitores” e “construções literárias”

mostram uma diferença entre os dois documentos. Parece que a orientação do trabalho

mudou, adquirindo maior clareza quanto à especificidade do trabalho. Em 1985 o trabalho

estava ligado à criatividade, e atualmente busca ressaltar as construções literárias para formar

leitores.

De acordo com o objetivo geral de formar “leitores capazes de reconhecer as sutilezas,

as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias” (CPII,

2008, p. 24), acreditamos que o documento se aproxima do conceito de letramento literário

proposto por Cosson e Paulino (2009, p. 67). Nessa perspectiva o letramento literário é um

processo de apropriação da literatura enquanto construção literária de sentidos. Os leitores

devem se apropriar de tais construções.

Além disso, considerando o histórico das aulas, observamos que elas surgiram de uma

demanda de letramento da escola. Na acepção de letramento proposta por Soares (1998, p.

21), letrado é aquele que responde adequadamente às demandas das práticas sociais de leitura

e escrita da sociedade em que vive. O CPII percebeu que seus alunos estavam com

dificuldades na interpretação e na compreensão de textos, como também na produção deles,

embora soubessem ler e escrever. As aulas de Literatura vieram, então, para apoiar o trabalho

pedagógico de Língua Portuguesa, como ressalta o PGE (CPII, 1985).

5.2.2 Concepções de literatura

No PGE (1985, p. 133) a concepção de literatura não está explícita. Contudo, alguns

trechos dão pistas para inferirmos sobre ela. “A integração Artes Plásticas/Literatura, prevista

no projeto, deve-se à necessidade de se trabalhar com as mais diversas formas de expressão,

facilitando o desenvolvimento das potencialidades criativas globais do aluno” (CPII, 1985, p.

133). Aqui a literatura é percebida como expressão da linguagem escrita. Nos objetivos de

desenvolver “o espírito crítico”, “as potencialidades intelectuais do aluno”, “as percepções”,

“hábitos e atitudes” subentende-se que a literatura é considerada uma forma de expressão que

desenvolve potencialidades, espírito crítico, percepções, hábitos e atitudes nos alunos.

Já no PPP (2008) a concepção está explícita e é percebida pela organização do texto,

que apresenta as seções: Histórico da Literatura Infantil brasileira, Literatura Infantil na

escola e fundamentação teórica. Dentro da fundamentação encontramos Uma questão de

diferença: o texto literário, O que é isto: Literatura Infanto-Juvenil? (O texto enquanto

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gênero), Gosto ou não gosto? (Texto de prazer e texto de fruição) e A leitura é um jogo

criativo! (A poética da obra aberta). As seções anunciam que LIJ é um gênero literário. Elas

ainda revelam que Roland Barthes (Gosto ou não gosto? Texto de prazer e texto de fruição) e

Umberto Eco (A leitura é um jogo criativo! A poética da obra aberta) fundamentam o

trabalho.

O referencial teórico do PPP (2008, p. 130) de Literatura, além de incluir Barthes e

Eco, cita um artigo de Mário Bruno (1982) e um livro, Literatura infanto-juvenil: um gênero

polêmico, organizado por Sônia Khede (1986), que sugere a partir do que o grupo construiu a

ideia da LIJ como um gênero literário. Para o CPII,

A literatura infanto-juvenil é um gênero de complexas interligações. Articulou-se a partir de uma tradição somada à emergência de um novo público e de novas formas

de linguagem. Isso implicou (ou implica) o surgimento de uma forma de

textualidade que a todo o momento precisa definir seus limites entre a cultura de

massa e o folclore, entre o mito e a realidade. (...) Nesse conflito entre o novo e o

tradicional, cabe pensar a literatura infanto-juvenil no projeto desafiador próprio a

todo fenômeno artístico. Urge creditar-lhe o papel interrogativo das normas em

circulação; impulsionador do leitor a uma postura crítica; criador de condições de

possibilidade para que os propósitos da leitura se revelem criativos (CPII, 2008, p.

121-122, grifos nossos).

Segundo o documento (CPII, 2008, p. 122), “A noção de obra aberta conceito que

pode ser desenvolvido no campo da física, da pintura, da matemática, da música, etc., em

termos literários, (...) permite explicar uma relação lúdica do leitor com o texto”. Esse

conceito, cunhado por Umberto Eco, começou a ser esboçado com a ideia de discurso aberto.

Para Eco (2010, p. 279-280) o discurso aberto tem duas características: é ambíguo e tem como

primeiro significado a própria estrutura. Assim, o discurso aberto, típico da arte, não tende a

definir a realidade de uma maneira unívoca, definitiva, pronta. Dessa maneira,

A abertura e o dinamismo de uma obra, ao contrário, consistem em tornar-se

disponível a várias integrações, complementos produtivos concretos, canalizando-os

a priori para o jogo de uma vitalidade estrutural que a obra possui, embora

inacabada, e que parece válida também em vista de resultados diversos e múltiplos.

(...) as obras „abertas‟ enquanto em movimento se caracterizam pelo convite a fazer a

obra com o autor (ECO, 2010, p. 63-64, grifos nossos).

Para o PPP (CPII, 2008, p. 121) o texto literário também é compreendido à luz de

Barthes como aquele que oferece múltiplas possibilidades de reapresentação do real. Eco

(2010) afirma que Barthes foi um dos primeiros estudiosos a compreender que uma obra é

uma mensagem plurivalente e que tal disponibilidade é o próprio ser da literatura. Para

Barthes:

Escrever significa fazer estremecer o sentido do mundo, colocar uma pergunta

indireta à qual o escritor, numa derradeira indeterminação, se abstém de responder.

A resposta que dá é cada um de nós, que lhe traz a sua história, sua linguagem, sua liberdade; mas como história, linguagem e liberdade variam infinitamente, a

resposta do mundo ao escritor é infinita: não cessa jamais de responder ao que está

escrito para além de qualquer resposta; afirmados, contraditos depois, por fim

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substituídos, os significados passam e a pergunta permanece... Mas, para que o jogo

se complete (...) devem respeitar algumas regras: é preciso, de um lado, que a obra

seja verdadeiramente uma forma, que ela indique um sentido duvidoso, não um

sentido fechado... (...) Neste sentido, por conseguinte, a literatura (diríamos: toda

mensagem artística) designaria de modo certo um objeto incerto (BARTHES apud

ECO, 2010, p. 40-41).

Ainda com base em Barthes, o PPP (CPII, 2008) afirma que é preciso pensar o texto

literário em um jogo entre duas margens, a do prazer e a da fruição. O texto de prazer como

aquele que contenta e não rompe com a cultura. Em contraposição, o texto de fruição coloca

em questão bases históricas, valores, põe em crise (BARTHES apud CPII, 2008, p. 122).

A concepção de literatura assumida também vai em direção à linha de força

Experiência/Formação na medida em que credita à literatura um papel interrogativo das

normas vigentes e impulsionador de uma postura crítica do leitor. Para embasar tal concepção

o documento traz Umberto Eco quando o autor trata da obra aberta. A ideia de fazer a obra

com o autor significa uma atividade de coautoria do leitor com a obra/leitor. Neste jogo

acontece a formação humana. Em diálogo com essa coautoria, o documento menciona

Barthes. Pensar o texto literário com este autor significa pôr em tensão duas linhas de força:

Leitura e Ludismo, na perspectiva do prazer, da satisfação e da realização, e Leitura e

Experiência/Formação, com a fruição do texto literário.

Podemos dizer que ambas as propostas curriculares (PGE, 1985 e PPP, 2008) buscam

desenvolver hábitos de leitura, ensinar a compreender textos literários, valorizar a literatura e

desenvolver o senso crítico nos alunos. A maior diferença entre os documentos é que o PPP

(CPII, 2008) explicita a preocupação em incluir o conhecimento das convenções literárias.

As propostas curriculares se situam em um dos poderes da literatura que Compagnon

(2012, p. 37-52) desenvolveu: a literatura deleita e instrui. Que conhecimento é esse que só a

literatura dá ao homem? Segundo a visão clássica, tal conhecimento tem por objeto o que é

geral, aquilo que permite compreender e regular o comportamento humano e a vida social. Já

na concepção romântica tal conhecimento se refere ao que é individual e singular. As

propostas curriculares ficam, então, nessa tensão entre uma visão mais romântica e uma visão

clássica de conhecimento. O PGE (CPII, 1985) em uma visão romântica e o PPP (CPII, 2008)

em uma clássica.

5.2.3 Conteúdos, progressão e corpus estabelecidos na proposta curricular

Devido ao caráter experimental do trabalho de Literatura em 1985, a equipe docente

optou por apresentar somente objetivos e proposta metodológica. Os conteúdos deveriam ser

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planejados ao longo do ano, conforme as necessidades (CPII, 1985, p. 133). Com o

amadurecimento do trabalho, a equipe de Literatura construiu, posteriormente, um conjunto

de conteúdos, explicitados no PPP (CPII, 2008) e organizados a partir de dois eixos

norteadores do trabalho: o livro e o texto.

Os conteúdos relativos ao eixo livro são autoria, ilustração, diagramação, recursos

gráficos, paginação, editora, edição, contexto em que o livro foi produzido. Os que se referem

ao texto são o texto poético (acalantos, cantigas de roda, quadrinhos, trava-línguas, canções

populares e poemas de autores contemporâneos), o texto narrativo (contos de fadas, contos

maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas, fábulas, contos fantásticos, narrativa mítica,

provérbios, quadrinhos e crônicas) e o texto dramático (CPII, 2008, p. 124-127). No eixo livro

o documento explicita apenas o ano em que os conteúdos devem ser trabalhados.

Para o primeiro ano o PPP propõe abordar os conteúdos: autoria, ilustração,

diagramação, paginação e contexto em que o texto foi produzido. Esses conteúdos são

considerados básicos e são trabalhados do 1º ao 5º ano. O 2º e o 3º ano apresentam os mesmos

conteúdos de trabalho e diferenciam-se do 1º ano em apenas um conteúdo, a editora. O 4º e o

5º ano apresentam os mesmos conteúdos de trabalho do 2º e do 3º ano. Todavia, incluem o

conteúdo e a edição.

Dessa maneira, vê-se que no eixo livro o 1º ano constrói a base do trabalho. Tais

conteúdos continuam a ser trabalhados até o final do EFI. Os conteúdos, editora e edição

marcam a progressão das aprendizagens literárias. Primeiro, aprende-se os conteúdos gerais.

Em seguida, acrescenta-se o conceito de editora. Posteriormente, o de edição. A razão dessa

progressão não é explicitada. O fato de haver uma seleção de conteúdos mínimos é uma

maneira de nivelar e garantir que todos possam se apropriar desses conteúdos. Todavia, não

nos parece lógico que editora e edição precisem ser postergados. Por que se apropriar do

conceito de editora somente no 3° ano e de edição somente no 4° e 5° ano? Seriam conceitos

mais complexos em relação aos trabalhados todos os anos?

Diferentemente, o eixo texto apresenta progressão dos gêneros literários trabalhados, o

que se espera que o aluno aprenda em cada um deles e o tipo de atividade pedagógica que

deve predominar. No 1º ano apresentam-se os elementos constituintes do texto poético

(sonoridade, ritmo, forma, versos e estrofes). No 2º ano há maior preocupação com o estudo

desses elementos constituintes. No 3º ano explora-se a relação palavras-imagens.

Cada ano também conta com o tipo de atividade pedagógica que deve prevalecer. O 1º

ano estuda a caracterização e criação de personagens, a identificação de ações e a

caracterização do ambiente. O 2º ano caracteriza personagens principais e ambientes.

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Ademais, identifica ações, o narrador e constrói personagens. O 3º ano apresenta o narrador

enquanto personagem do texto, identifica personagens principais e secundários, caracteriza as

ações e contextualiza no tempo e no espaço o texto. O 4º ano trata de todas essas

aprendizagens e acrescenta a identificação de semelhanças e diferenças entre os diferentes

tipos de texto, das características mais marcantes dos personagens mitológicos, da sequência

lógica das narrativas e dos sistemas de significação não linguísticos (signos auditivos e

visuais). O 5º ano também acumula as aprendizagens listadas do 1º ao 4º e inclui a

caracterização dos personagens, ações e situações do cotidiano nas crônicas, e a relação entre

os temas e os valores mais presentes nas narrativas mitológicas.

Analisando os conteúdos e a progressão das aprendizagens, observamos que os saberes

literários diriam respeito aos aspectos materiais, à produção e à circulação social da literatura,

aos conhecimentos culturais e sobre as linguagens com que se constrói o texto e a

metalinguagem literária. A interpretação e a produção de textos é um procedimento bastante

presente. E a consciência dos valores revelados nos textos é uma atitude valorizada.

Embora o PGE (CPII, 1985) não trate de conteúdos e progressão das aprendizagens,

na seção Proposta metodológica há indícios de saberes, procedimentos e atitudes que a equipe

da época valorizava. Poderíamos sugerir que um dos saberes privilegiados é o conhecimento

sobre as linguagens com que se constrói o texto, com base no trecho: “O ponto nodal das

atividades integradas será o processo de criação, recriação e transformação de textos,

narrativas orais” (CPII, 1985, p. 134). Em função da demanda que justificou o nascimento da

disciplina, também poderíamos dizer que a interpretação e produção de textos é, de certa

maneira, um procedimento presente. No trecho “sendo o interesse demonstrado pela criança

no que faz, sua alegria em criar, a procura de soluções próprias, os melhores indícios da

validade do trabalho” (CPII, 1985, p. 134), inferimos que a implicação pessoal com a

literatura e o desfrute do texto literário são duas atitudes que o PGE (1985) destaca.

Desse modo, vimos que o PGE de 1985 prioriza o LER, o DIZER(-SE) e o CRIAR.

Ele confere mais ênfase ao ler e criar. No que se refere ao ler e criar, as ações aparecem na

integração que a disciplina tentou promover entre a Literatura e as Artes Plásticas, como

também em um dos objetivos do plano: “trabalhar todas as formas de expressão verbal ou

não” (CPII, 1985, p. 133). O trabalho com todas as formas de expressão inclui a palavra

escrita e as demais formas, principalmente, as artes plásticas. O ponto nodal da disciplina era

“o processo de criação, recriação e transformação de textos, narrativas orais” (CPII, 1985, p.

134). Portanto, criar era uma ação muito presente. A intenção de desenvolver a criação do

aluno é perceptível em um dos objetivos referentes ao trabalho específico com a Literatura e

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as Artes Plásticas: “desenvolver as potencialidades criativas globais do aluno” (CPII, 1985, p.

133).

A proposta curricular de 1985 era mais aberta do que é atualmente e o objetivo de

apoiar a Língua Portuguesa vincula-se ao conceito de educação literária proposto por Colomer

(2009, p. 74). A educação literária é a aprendizagem de interpretação dos textos. Daí a

presença da interpretação e da produção textual.

Com o PPP (CPII, 2008) houve uma reestruturação da proposta curricular. Que

conhecimentos os alunos deveriam ter para se tornarem leitores críticos? A última proposta

mostra que há a preocupação em compartilhar conhecimentos mínimos ligados à esfera dos

gêneros literários, o que estava pouco presente no PGE (CPII, 1985). Nele o enfoque estava

na fabulação e na criação artística. O PPP (CPII, 2008) tenta juntar a fabulação e a criação

com tais conhecimentos acerca da literatura. Acreditamos que essa mudança representa uma

ampliação.

Quanto ao corpus estabelecido na proposta curricular, os textos poéticos (acalantos,

cantigas de roda, quadrinhos, trava-línguas, canções populares e poemas de autores

contemporâneos) são estudados somente no 1º, 2º e 3º ano.

Os textos narrativos são estudados do 1º ao 5º ano. Eles são os contos de fadas, contos

maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas, fábulas, contos fantásticos, narrativa mítica,

provérbios, quadrinhos e crônicas. O 1º e o 2º ano trabalham os mesmos textos narrativos:

contos de fadas, contos maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas e fábulas. O 3º ano

trabalha, além dos gêneros já listados acima, os contos fantásticos, que são estudados somente

neste ano escolar. O 4º ano estuda, além da narrativa contemporânea, a narrativa mítica,

provérbios e quadrinhos. O 5º ano trabalha a narrativa contemporânea, a narrativa mítica,

provérbios, quadrinhos e crônicas. Vale ressaltar que as crônicas são estudadas somente neste

ano escolar. O gênero trabalhado todos os anos é a narrativa contemporânea. No que se refere

ao texto dramático, o documento indica que este deve ser trabalhado somente no 5º ano.

Observando os gêneros literários da proposta curricular, observamos que ela apresenta

a mesma concepção de literatura de Candido (2004). Os livros para crianças e jovens

pertencem a um amplo sistema simbólico que inclui todas as “criações de toque poético,

ficcional ou dramático em todos os níveis de uma sociedade, em todos os tipos de cultura,

desde o que chamamos folclore, lenda, chiste, até as formas mais complexas e difíceis da

produção escrita das grandes civilizações” (CANDIDO, 2004, p. 16).

Refletindo sobre o nível de detalhamento do corpus no currículo, vemos que ele não é

muito detalhado. Há prescrição dos gêneros literários, mas não há uma lista com os autores e

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obras básicas para serem compartilhadas com os alunos do EFI. Acreditamos que prescrever

um corpus básico de leitura é importante.

O CPII privilegia a LIJ, incluindo seus clássicos e as produções contemporâneas. A

importância dada aos clássicos, às produções atuais e aos contos tradicionais é observada no

documento quando este indica que sejam lidos “poemas de autores contemporâneos” e

“narrativas contemporâneas” (CPII, 2008, p. 128). Além disso, na seção Metodologia afirma-

se que “Os contos clássicos e contemporâneos” contribuem “para o desenvolvimento do

espírito crítico na criança.” (CPII, 2008, p. 130), o que é um dos objetivos específicos do

trabalho. Os contos tradicionais aparecem na seção Conteúdos quando se explicita que “o

conteúdo de Literatura abrange: (...) as lendas e contos populares oriundos de várias culturas”

(CPII, 2008, p. 127).

O livro é concebido como um dos eixos de trabalho, além do texto literário. Contudo,

o livro de literatura conta com “recursos auxiliares”, como enciclopédias, revistas, jornais,

TV, rádio, vídeos, fitas de áudio, filmes, CD e computador (CPII, 2008, p. 130).

No currículo do CPII os gêneros prediletos são os que se referem à narração; em

segundo lugar, à poesia; e, em terceiro, ao teatro. Os textos narrativos são estudados durante

todo o EFI, e a poesia, somente nos três primeiros anos dessa etapa da educação básica. O

teatro entra no currículo de Literatura apenas no último ano do EFI, no 5º ano. Todavia, a

proposta de realizar dramatizações do texto literário está presente no 1º e no 2º ano.

Atualmente, no campo da literatura, há estudos e produções literárias acerca do livro álbum,

também conhecido como livro de imagem e livro ilustrado. Na análise do currículo do colégio

não foram encontradas referências a ele. Porém, a ilustração marca forte presença.

Dessa maneira, o corpus estabelecido no currículo de Literatura do CPII (PPP, 2008)

privilegia a literatura tradicional, os clássicos da LIJ e as produções atuais. Na proposta

curricular de 1985 é possível apenas fazer uma aproximação com o corpus literário

privilegiado. Na seção Proposta metodológica, o trecho “O ponto nodal das atividades

integradas será o processo de criação, recriação e transformação de textos, narrativas orais”

(CPII, 1985, p. 134) indica que, possivelmente, a literatura tradicional era privilegiada no

currículo, e ainda que a narrativa fosse uma tipologia abordada.

Os textos estão organizados de acordo com a tipologia textual (poético, narrativo e

dramático). Os que pertencem a cada uma dessas tipologias estão classificados de acordo com

a sua estrutura ou intencionalidade. Os critérios de seleção dos textos não estão explícitos.

Eles estão presentes, nas entrelinhas, em diferentes partes do texto, principalmente nas

competências específicas. Em Fittipaldi (2013, p. 319-320) encontramos quatro critérios de

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seleção de textos: diversidade cultural, multiplicidade de suportes de leitura, capacidade dos

textos de adequarem-se à idade, aos interesses e às competências dos leitores e o tipo de

leitura que podem propiciar os textos e esses critérios também foram identificados nas

propostas curriculares de Literatura do CPII.

A diversidade cultural está presente na competência geral “Compreender variadas

manifestações do comportamento humano e a existência de diferenças culturais, através da

Literatura” (CPII, 2008, p. 123). Ela também aparece nas competências específicas

“identificar, no texto, elementos que expressam diferenças culturais” e “compreender e

respeitar essas diferenças, superando preconceitos e valorizando todas as manifestações

culturais” (CPII, 2008, p. 125) e nos conteúdos: “o conteúdo de Literatura abrange (...) as

lendas e contos populares oriundos de várias culturas” (CPII, 2008, p. 127).

A multiplicidade de suportes aparece em “Recursos auxiliares: Enciclopédias, revistas,

jornais, TV, rádio, vídeos, fitas de áudio, filmes, CD, computador” (CPII, 2008, p. 130) e

também está presente nas competências gerais do trabalho: “Identificar a existência de

variados tipos de texto, literários ou não, estabelecendo semelhanças e diferenças entre eles”,

“Estabelecer relações comparativas entre o texto literário e outros textos, literário ou não” e

“Posicionar-se criticamente frente a diversos materiais de leitura com os quais tenha contato”

(CPII, 2008, p. 123).

A capacidade de os textos se adequarem à idade, aos interesses e às competências dos

leitores mais uma vez surgiu nas competências específicas, de maneira mais discreta em

relação aos demais critérios, a saber: “Ler textos adequados à sua idade, vivência e interesse”

(CPII, 2008, p. 125). Esse critério também apareceu na seção dos conteúdos em: “As

narrativas contemporâneas, cujos personagens exercem grande fascínio sobre as crianças, pois

refletem o seu mundo, seus problemas, curiosidades, preocupações” (CPII, 2008, p. 127).

O quarto critério o tipo de leitura que podem propiciar os textos mostrou-se

presente na seção dos conteúdos e da metodologia, quando o documento põe luz sobre a

relevância do texto dramático e poético. O conteúdo de Literatura abrange “teatro,

funcionando como mecanismo de identificação em que são recolocadas para as crianças a sua

experiência e a sua pessoa como objetos, ajudando-a a esclarecer o seu lugar entre as coisas”,

e “a poesia, repleta de sonoridade, ritmo, significação afetiva e imaginativa, que oferece à

criança a oportunidade de experimentar a potencialidade linguística, descobrindo novos

efeitos de sentido” (CPII, 2008, p. 127). Na seção Metodologia esse critério também está

presente por meio da ênfase nos valores e na resistência que os textos literários podem

propiciar, o que pode ser visto no trecho: “Os contos clássicos e contemporâneos apresentam

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conflitos políticos, sociais, referências à sexualidade, à realidade trágica e muitas vezes cruel

das relações humanas, contribuindo para o desenvolvimento do espírito crítico na criança”

(CPII, 2008, p. 130).

Por fim, nota-se a preocupação com a possibilidade de vinculação com outros textos.

Tal aspecto aparece bastante nas competências tanto gerais quanto específicas, na medida em

que há seis competências que dialogam com essa questão: “Identificar a existência de

variados tipos de texto, literários ou não, estabelecendo semelhanças e diferenças entre eles”;

“Estabelecer relações comparativas entre o texto literário e outros textos, literários ou não”;

“Estabelecer relações entre o texto e a ilustração”; “Relacionar autores e respectivos textos”;

“Estabelecer associações entre imagens e palavras contidas nos textos”; e “Identificar, num

texto, (lido ou ouvido) referência a outros textos” (CPII, 2008, p. 123-126).

A forte presença das competências em uma proposta curricular de Literatura marca

uma contradição. Se as competências (PERRENOUD, 1999) se vinculam ao valor de uso de

cada conhecimento, qual seria o valor de uso da Literatura? Cremos que esta proposta mais

atual oculta uma marca utilitária que identificou o início das aulas de Literatura no CPII. O

PGE (1985), sem a presença das competências, explicitou o objetivo de apoiar a Língua

Portuguesa. O PPP (2008) não apresenta esse objetivo, mas continuou carregando certo valor

de uso com a presença das competências como eixo norteador da proposta.

O saber que a competência pretende valorizar não se refere ao saber humano ou ao

saber de experiência. O saber da experiência ensina a viver humanamente. O professor, nesta

acepção, permite uma relação com o texto, uma abertura. Isso não quer dizer que ele somente

administre o ato de leitura ou que deixe os alunos lendo. O professor tenta fazer com que a

leitura seja uma experiência. O sujeito da experiência não se forma para agir e resolver tão

somente problemas do cotidiano. Ele se experimenta. Ele está em permanente criação. Essa é

uma forte contradição entre a última proposta curricular e o objetivo de formar leitores

críticos. A tensão entre Leitura e Utilitarismo e Leitura e Experiência/Formação fica vigorosa

com o conceito de competência dando norte ao trabalho pedagógico com a literatura na

escola.

5.2.4 Propostas de aproximação ao texto literário

Quanto aos modos de aproximação ao texto literário, há o predomínio das atividades

de leitura. As práticas de leitura direta de textos literários aparecem para os textos poéticos e

narrativos. Para o texto dramático há duas competências específicas que explicitam como

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deve ser o estudo desta tipologia: “Identificar alguns elementos constituintes do texto

dramático” e “Identificar os principais elementos externos utilizados para a apresentação do

texto dramático” (CPII, 2008, p. 126). No estudo dos textos poéticos está implícito que é o

professor quem lê o texto literário. Ao aluno cabe a realização de atividades ligadas,

principalmente, à expressão oral, plástica e corporal. No que se refere aos textos narrativos, a

tarefa de ler o texto passa a ser dividida com o aluno. No 1º e 2º ano o aluno ouve a leitura do

professor. A partir do 2º ano o aluno também lê o texto. No 4º e 5º ano não há menção sobre a

leitura. No estudo da proposta curricular observamos que há variedade nos modos de abordar

o texto literário:

Para o 1º, 2º e 3º ano: Expressar-se oralmente, plasticamente e corporalmente. Para o 1º e 2º ano: Ouvir, recontar e dramatizar.

Para o 2º e 3º ano: Escrever textos pequenos e ler.

Para o 3º ano: Recortar e recriar textos poéticos.

Para o 4º ano: Escrever histórias em quadrinhos (CPII, 2008, p. 129).

Para o 5º ano há pouca explicitação sobre os modos de aproximação ao texto literário.

Todavia, quando o documento se refere às competências específicas, encontramos trechos que

podem nos dar ideia do modo como o texto dramático e as crônicas devem ser estudados. Três

competências nos informam que o aluno deve “Identificar alguns elementos constituintes do

texto dramático”, “Identificar os principais elementos externos utilizados para a apresentação

do texto dramático” e “Identificar características estruturais de crônicas” (CPII, 2008, p. 126).

O tipo de atividade pedagógica que prevalece do 1º ao 5º ano é a leitura e o dizer sobre

o texto literário, pois os alunos devem caracterizar personagens, ambientes, ações; identificar

ações, narrador, personagens, semelhanças e diferenças; contextualizar o texto. Há também

espaço para o criar, mas ele é menos intenso em comparação com as demais ações. Os alunos

devem criar personagens.

Quando a proposta curricular discrimina as atividades pedagógicas de cada ano, vemos

que há preponderância do criar nas atividades propostas para o 3º e o 4º ano, os quais,

respectivamente, devem recortar e recriar textos poéticos e escrever histórias em quadrinhos.

Já para o 1º e 2º ano encontramos a tríade, já mencionada acima, no PGE de 1985, do ler,

dizer(-se) e criar. A tríade parece estar mais presente no texto do PGE de 1985 porque,

embora cada uma dessas ações esteja presente ao longo do texto do PPP, aparecem juntas

somente nas atividades propostas para o 1º, 2º e 3º ano: ouvir, recontar e dramatizar. Nos

demais anos escolares as ações surgem de modo mais disperso.

Nesses diferentes modos de aproximação ao texto literário nota-se a importância dada

à contextualização do texto na seção Conteúdos: “contexto no qual o texto foi produzido”

(CPII, 2008, p. 127). Contudo, não se pode afirmar que há preocupação explícita com a

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contextualização das atividades propostas e com a inter-relação entre as diferentes atividades.

Pode-se, sim, dizer que há intenção de que as tarefas sejam significativas para o aluno,

conforme indica um dos princípios metodológicos apontados na Metodologia:

“estabelecimento de propostas lúdicas e agradáveis que conduzam a criança a um contato

prazeroso e à identificação com a Literatura” (CPII, 2008, p. 130).

Nas propostas curriculares de Literatura do EFI do CPII (1985 e 2008) não há ênfase

ao trabalho com suportes diversos. Há, conforme já mencionado, uma breve seção, intitulada

Recursos auxiliares em que os diferentes suportes de leitura estão listados (CPII, 2008). No

que se refere ao trabalho colaborativo não há menção.

Encontramos no PPP (CPII, 2008) referência à leitura individual e compartilhada, à

escrita literária e às atividades de expressão oral, plástica e corporal. Com base no documento

não se pode analisar se a escrita literária está ligada à cópia, à redação, ou que lugar ocupa em

relação aos projetos coletivos de escrita, isto é, se há tais projetos e, havendo, se ocupa ou não

um lugar de relevância. Há referência à importância de ouvir textos literários. O PPP deixa

claro que essa atividade deve acontecer, principalmente, no 1º e 2º ano. Subentende-se que os

alunos ouvem a leitura dos textos literários durante todo o EFI. Embora não haja nenhuma

seção dedicada a essa questão, ela está presente como uma competência específica do eixo

texto: “Ouvir com atenção” (CPII, 2008, p. 125). No CPII a recitação não é mencionada

claramente. Contudo, pode ser considerada como uma possibilidade quando são prescritas

atividades de expressão oral (CPII, 2008, p. 129).

Nas propostas curriculares das aulas de Literatura do CPII para o EFI (1985 e 2008)

observa-se a coexistência de duas perspectivas de trabalho: a formação do hábito leitor e a

aprendizagem da interpretação. Contudo, pode-se afirmar que há a prevalência da perspectiva

da aprendizagem da interpretação.

De acordo com o objetivo geral do trabalho, “Formação de leitores capazes de

reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das

construções literárias”, a perspectiva da formação do hábito leitor se faz presente. Isso

também pode ser visto no objetivo específico de “Incorporar o texto literário às práticas

cotidianas na sala de aula” (CPII, 2008, p. 123).

No trabalho de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a

profundidade das construções literárias vê-se a perspectiva da aprendizagem da interpretação

também presente nos objetivos específicos:

- Reconhecer a especificidade do texto literário e as inúmeras possibilidades de

apropriação de seus elementos;

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- Oportunizar ao aluno o contato com diferentes linguagens e não apenas com a

linguagem-padrão, de uso social;

- Estimular o gosto pela leitura auxiliando a criança a acelerar o seu processo de

maturação, através da relação real/imaginário;

- Possibilitar o desenvolvimento das estruturas mentais, através do estabelecimento

de relações, tais como: eu/outro, eu/as coisas verdadeiras/as coisas inventadas, e do

contato com diferentes tipos de tempo e espaço, fazer a criança refletir sobre os

problemas de seu tempo, levando-a a desenvolver o espírito crítico (CPII, 2008, p.

123, grifos nossos).

Observa-se a presença dessa perspectiva de modo mais concreto nos conteúdos. Os do

eixo livro são autoria, ilustração, diagramação, recursos gráficos, paginação, editora, edição e

contexto em que o livro foi produzido. Os do eixo texto são texto poético, narrativo e

dramático. Inclui-se ainda o estudo dos elementos constituintes dos textos poéticos

(sonoridade, ritmo, forma, versos e estrofes) e a exploração da relação palavras-imagens. Tal

perspectiva também é encontrada nas atividades pedagógicas propostas de recontar partes,

dramatizar, escrever e ler pequenos textos, criar novas histórias, produzir histórias em

quadrinhos e recriar textos poéticos.

Por fim, podemos ainda vê-la nas aprendizagens literárias, como na caracterização,

criação, construção e identificação de personagens; identificação de ações; contextualização

no tempo e no espaço do texto; caracterização do ambiente; identificação do narrador;

apresentação do narrador enquanto personagem do texto; identificação de semelhanças e

diferenças entre os diferentes tipos de texto; identificação da sequência lógica das narrativas;

identificação dos sistemas de significação não linguísticos e relação entre os temas e os

valores mais presentes nos textos.

Observamos na proposta curricular de 2008 a forte presença de dois enfoques de

trabalho. Um acerca das estratégias de leitura e escrita literárias (cognitivo) e outro sobre

questões estético-linguísticas. O enfoque cognitivo pode ser visto nos objetivos e nas

competências literárias. Nos objetivos específicos o documento propõe “Estimular o gosto

pela leitura auxiliando a criança a acelerar o seu processo de maturação, através da relação

real/imaginário” e “Possibilitar o desenvolvimento das estruturas mentais, através do

estabelecimento de relações, tais como: eu/outro, eu/as coisas verdadeiras/as coisas

inventadas e do contato com diferentes tipos de tempo e espaço” (CPII, 2008, p. 123).

Nas competências gerais recomenda-se “Estabelecer relações entre o texto e o

contexto no qual o texto foi produzido” e “Interpretar o texto, desvendando a sua estrutura e

descobrindo nas entrelinhas o subentendido e o interdito” (CPII, 2008, p. 123). Das quarenta e

quatro competências específicas listadas, trinta e quatro se referem às estratégias de leitura e

escrita literárias (CPII, 2008, p. 124-126), a saber:

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Eixos Competências específicas

Livro Identificar algumas características de estilo do autor.

Reconhecer que existem textos que pertencem à tradição oral.

Estabelecer diferenças entre textos autorais e os que pertencem à tradição oral.

Identificar dados biográficos de autores significativos de literatura infantil.

Estabelecer relações entre o texto e a ilustração.

Reconhecer a ilustração como uma das possibilidades de interpretação do texto.

Reconhecer a ilustração como uma das possibilidades de recursos narrativos.

Reconhecer a ilustração como um recurso para a ampliação das possibilidades do sentido do texto.

Identificar diferentes recursos utilizados para a ilustração de textos.

Perceber que a distribuição adequada do texto e das ilustrações, no livro, facilita a compreensão da

leitura.

Reconhecer a paginação como um recurso para ampliar as possibilidades de sentido do texto.

Identificar coordenadas espaço-temporais do texto.

Texto Recontar textos obedecendo à sequência lógica dos fatos.

Identificar personagens primários e secundários.

Identificar as ações dos personagens.

Caracterizar personagens.

Criar personagens.

Identificar os elementos que compõem o ambiente dos textos apresentados, caracterizando-os.

Identificar a existência do narrador.

Identificar a existência do narrador enquanto personagem.

Perceber, num texto poético, as similaridades de sons (rimas), as repetições de sons (aliterações) e as

onomatopeias.

Perceber outros elementos constituintes do texto poético: versos e estrofes.

Estabelecer associações entre imagens e palavras contidas nos textos.

Modificar letras de canções conhecidas, cantigas de roda, poemas musicados.

Produzir textos poéticos.

Identificar alguns elementos constituintes do texto dramático.

Identificar os principais elementos externos utilizados para a apresentação do texto dramático.

Identificar características estruturais de crônicas.

Identificar os elementos estruturais dos quadrinhos: balão, onomatopeias, requadros, expressão facial

e corporal dos personagens.

Produzir histórias em quadrinhos, usando os elementos identificados.

Perceber semelhança e diferença entre os diferentes tipos de textos.

Identificar, num texto, (lido ou ouvido) referência a outros textos.

Modificar a estrutura dos textos, introduzindo novos elementos.

Produzir novos textos, partindo de outros textos já conhecidos.

Quadro 2. Competências específicas ligadas às estratégias de leitura e escrita literárias.

O PPP (2008) aponta para dois eixos norteadores do trabalho, o livro e o texto, o que

nos leva a inferir que ler é a primeira ação com a literatura em sala de aula. Observamos que

há predomínio das atividades de leitura, na medida em que a leitura direta dos textos literários

aparece quando o currículo trata dos textos poéticos e narrativos.

Nas competências gerais e específicas os alunos devem aprender a relacionar textos;

posicionar-se criticamente, isto é, o ler e o dizer entram em relação. O dizer está presente nas

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competências específicas acerca do texto dramático e das crônicas e em todas as competências

específicas relativas ao eixo livro. O dizer(-se) aparece quando o aluno deve: identificar,

reconhecer, estabelecer, reconhecer, perceber. Estas são as ações propostas para o eixo livro.

Se o eixo livro está mais ligado ao dizer, o eixo texto está ao dizer(-se) e o criar:

recontar, identificar, caracterizar, criar, perceber, estabelecer, modificar, produzir. As

atividades propostas devem ser de expressão oral, plástica e corporal, em especial para os

alunos do 1º, 2º e 3º anos.

A presença das questões estético-linguísticas aparece em diferentes seções no PPP

(2008). Quando a proposta aborda o conceito de literatura, ele já nos revela o valor conferido

às construções literárias:

Cremos que o texto literário é aquele que permite mais do que uma representação de

si, ele nos oferta múltiplas possibilidades de re-apresentação do real. Eis porque,

para ser lido, ele implica uma re-escrita, solicita uma outra escritura. O modelo do

texto literário é produtivo na medida que só se configura como literário através de leituras que o reescrevem e o compreendem como “coisa viva”, capaz de operar

deslocamentos na linguagem e no sentido em geral (CPII, 2008, p. 121).

Também encontramos essas questões no objetivo geral do trabalho: “Formação de

leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a

profundidade das construções literárias”; e no específico de “Reconhecer a especificidade do

texto literário e as inúmeras possibilidades de apropriação de seus elementos” (CPII, 2008, p.

123). Quando o documento especifica o conteúdo relativo à poesia nos revela mais uma vez

tal perspectiva: “a poesia, repleta de sonoridade, ritmo, significação afetiva e imaginativa, que

oferece à criança a oportunidade de experimentar a potencialidade linguística, descobrindo

novos efeitos de sentido” (CPII, 2008, p. 127).

O PPP de 2008 não apresenta a linha de força Leitura e Utilitarismo. Contudo, mantém

a tensão entre as linhas Cidadania, Ilustração, Experiência/Formação e Ludismo. A cidadania

aparece na competência geral “Compreender variadas manifestações do comportamento

humano e a existência de diferenças culturais, através da Literatura” (CPII, 2008, p. 123); nas

específicas “identificar, no texto, elementos que expressam diferenças culturais” e

“compreender e respeitar essas diferenças, superando preconceitos e valorizando todas as

manifestações culturais” (CPII, 2008, p. 125); e nos conteúdos: “o conteúdo de Literatura

abrange (...) as lendas e contos populares oriundos de várias culturas” (CPII, 2008, p. 127). A

questão da diversidade cultural passa pela linha de força Leitura e Cidadania, no sentido de

afirmação do ser social no seu direito humano. A compreensão de que há diferentes

manifestações do comportamento humano e que há diferentes culturas leva ao respeito a tais

diferenças, superando preconceitos e valorizando todas as manifestações culturais. É com a

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literatura que o cidadão também constrói a consciência da vida em sociedade. Neste ponto o

outro conceito de cidadania (civismo, valores para a convivência harmônica), presente no

PGE de 1985, perde espaço.

O PPP (2008) mostra a preocupação de o aluno aprender a estabelecer relação com

outros textos, o que exige um repertório amplo do leitor. Essa questão aparece bastante nas

competências gerais e específicas, na medida em que há seis competências que tratam dela:

“Identificar a existência de variados tipos de texto, literários ou não, estabelecendo

semelhanças e diferenças entre eles”; “Estabelecer relações comparativas entre o texto

literário e outros textos, literários ou não”; “Estabelecer relações entre o texto e a ilustração”;

“Relacionar autores e respectivos textos”; “Estabelecer associações entre imagens e palavras

contidas nos textos”; e “Identificar, num texto (lido ou ouvido) referência a outros textos”

(CPII, 2008, p. 123-126). Relacionamos essa preocupação com a linha de força Leitura e

Ilustração, na medida em que, por meio dessas competências e dos conteúdos, vamos sabendo

quais conhecimentos o leitor em formação deve construir. Afinal de contas, esse leitor deve

ser culto e se apropriar do saber construído historicamente, conforme aponta uma das

finalidades do colégio. Alguns desses saberes são: autoria, ilustração, diagramação, recursos

gráficos, paginação, editora, edição, contextos em que o livro foi produzido. Além disso, os

que se referem ao texto são: texto poético (acalantos, cantigas de roda, quadrinhos, trava-

línguas, canções populares e poemas de autores contemporâneos), texto narrativo (contos de

fadas, contos maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas, fábulas, contos fantásticos,

narrativa mítica, provérbios, quadrinhos e crônicas) e texto dramático (CPII, 2008, p. 124-

127).

Na mesma direção dessa linha de força, verificamos a presença da Leitura e

Experiência/Formação no objetivo geral do projeto: “Formação de leitores capazes de

reconhecer as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das

construções literárias” (CPII, 2008, p. 24). Nesta síntese está clara a intenção da equipe de

literatura em marcar a especificidade do trabalho pedagógico, como também está implícita

uma concepção de leitor. Leitor é aquele capaz de reconhecer as sutilezas, as particularidades,

os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literária. Ademais, no objetivo

entram as palavras formação e sentido, o que conduz o trabalho para a Experiência/Formação.

Leitura como produção de sentidos e experiência como a formação do leitor. No PPP (CPII,

2008, p. 123) já não encontramos objetivos específicos que mencionem questões atitudinais.

A mudança de perspectiva de trabalho de 1985 para 2008 é significativa. A literatura não está

vinculada ao civismo e à construção de valores de convivência (solidariedade, respeito). A

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literatura é para formar. O trabalho deve possibilitar o estabelecimento de relações, como:

eu/outro, eu/as coisas verdadeiras/as coisas inventadas, e do contato com diferentes tipos de

tempo e espaço fazer a criança refletir sobre os problemas de seu tempo, levando-a a

desenvolver o espírito crítico. De acordo com essa perspectiva o enfoque está no

autoconhecimento, nas vivências significativas, na produção de sentidos.

Com base na primeira proposta curricular de Literatura (CPII, PGE, 1985) e na última

(CPII, PPP, 2008) nós chegamos ao final deste capítulo compreendendo melhor o lugar que a

Literatura ocupa no colégio, os objetivos de trabalho, como a literatura é concebida, os

conhecimentos literários privilegiados, como se dá a progressão das aprendizagens, o corpus

recomendado e os modos de aproximação com a literatura. Passemos, agora, às aulas de

literatura: o que dizem e o que fazem as professoras?

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6 AULAS DE LITERATURA NO COLÉGIO PEDRO II: ENTRE CONCEPÇÕES E

PRÁTICAS

Uma sociedade justa pressupõe o respeito dos direitos humanos, e a fruição da arte e

da literatura em todas as modalidades e em todos os níveis é um direito inalienável.

CANDIDO, 2004, p. 33

O capítulo anterior buscou analisar as propostas curriculares de Literatura do CPII de

1985 e de 2008 a fim de articulá-las com as aulas de Literatura. O que dizem e o que fazem as

professoras? O que acontece nas aulas de literatura? Apresentaremos as respostas conforme as

categorias que guiaram as entrevistas, as quais dão nome às seções deste capítulo.

6.1 A literatura no cotidiano do professor: o seu lugar, as leituras e os critérios de

seleção

A literatura no cotidiano da coordenadora Renata teve origem no seu interesse pessoal:

“A minha história como leitora começou por meu interesse mesmo. A minha mãe era, sabe

aquela vontade que os pais têm que os filhos superem os próprios pais?”. Ela relata que, como

sua mãe era muito pobre e não conseguiu aprender música, o que era valorizado na época,

colocou-a para aprender a tocar piano. Sua mãe também quis ter aprendido outra língua, e

devido a essa vontade inscreveu Renata na Cultura Inglesa. Renata conta que sua mãe foi

também a responsável pela compra dos seus primeiros livros: “O meu amigo de infância foi O

Mundo da Criança, aquela coleção. Tem lá no Pedro II uma. O Mundo da Criança foi a minha

entrada na leitura”. Vemos na preocupação da mãe de Renata a marca da leitura como

ilustração e como ascensão social. Ela queria que a filha fosse culta. Na época isso significava

saber tocar um instrumento (piano), falar uma língua estrangeira (inglês) e ler livros (Coleção

Mundo da Criança).

Renata relatou que aprendeu a ler com cinco anos e estudou “num colégio particular

que era bom. Mas bom entre aspas, né? Depois que eu fui ser professora, eu fui ver o quanto

ele não era bom. Eu nunca vi uma biblioteca lá. Era um colégio que não tinha biblioteca.

Minha biblioteca era a Coleção Mundo da Criança”. Ela contou que, no final do ano, o

colégio realizava uma festa chamada Festa da Aplicação. Na festa os alunos que atingiam

médias acima de setenta ganhavam livros de presente da direção da escola. Também se tratava

de uma festa de talentos. Renata lembra que ganhou medalha e livro durante todo o EFI: “Eu

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ganhei o Sargento verde, eu ganhei A princesa Raio de Sol, e por aí vai. Todo ano. Eu ganhei

os quatro anos. Depois, eu saí de lá e fui para o Pedro II. Mas eu gostava de ler por mim

mesma”. Ela reconhece que a Festa da Aplicação era um evento que reconhecia o esforço

intelectual dos alunos, mas tinha a marca da meritocracia embutida.

Renata disse que não teve nenhum incentivo maior, exceto pela Coleção Mundo da

Criança: “Eu sou uma leitora, mas menos do que eu gostaria. Eu leio muito jornal, eu leio, eu

tenho assinatura de jornal, leio jornal diariamente. Eu me lembro muito do meu pai. Meu pai

não era um homem de livros. Ele era um homem do jornal”. Ela continua: “No domingo meu

pai comprava três jornais, o Correio da Manhã, o Diário da Noite e o Jornal do Brasil.

Acordava às 8h da manhã, lia e, enquanto não acabava de ler os três jornais, não levantava da

cama. Por volta das 11h, 12h, ele terminava e a família se arrumava para ir almoçar fora e ir

ao cinema ou à praia”. Ela reconhece que o seu hábito de ler jornais tem relação com o seu

pai. O pai de Renata era um homem culto, ilustrado. Com a aposentadoria, Renata também se

tornou uma mulher de jornais, e menos de livros. Quando trabalhava, era o contrário devido à

necessidade de encontrar livros para as suas aulas.

Embora se considere mais leitora de jornal, Renata afirmou que também lê livros. Ela

se prometeu ler em 2015, ano da entrevista, um livro por mês. Disse que Pedagogia do

oprimido (Paulo Freire) está na fila para a leitura e que, por incrível que pareça, nunca leu

esse autor. Segundo Renata, tem muitos livros que ela quer ler. Ela olha a lista do jornal O

Globo, no caderno “Prosa e Verso”, e pensa: “quero ler esse livro”. Ela gosta de folhear os

livros: “ir, manusear, entro na Livraria da Travessa, dou uma olhada...”. Na sua casa lê num

canto da sala.

Portanto, a LIJ exerceu um importante papel na vida de Renata durante o seu período

escolar tanto como aluna quanto como professora. Com a aposentadoria, a literatura passou a

não ocupar um lugar central. Contudo, lê diariamente. Ela é uma pessoa bem formada e

informada.

Já a outra coordenadora, Sandra, talvez porque esteja na ativa na escola, tem a

literatura como um lugar central no seu cotidiano: “durante o período em que eu estou

trabalhando, eu leio muito literatura infantil. Eu gosto demais de literatura infantil. Não acho

uma leitura menor nem maior”. Ela relata que quando está de férias lê os livros que ganha.

Diz que as pessoas dão livros para ela não só porque é professora de Literatura, mas também

porque sabem da sua preferência. No período de férias a literatura lida é a mais direcionada

para os adultos. Entre os livros que são dados de presente para Sandra tem “restrições com

esses livros de autoajuda porque eu, não sei, assim, eu tenho preguiça de ler”.

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O critério de escolha das leituras tem relação com o dia a dia da Sandra e com a

maneira como ela imaginou que poderia compartilhar com as crianças o livro lido. Ela adora

quando descobre algum texto que considera interessante. Sente vontade de “aplicar na turma”.

Observamos nas aulas que os livros selecionados por Sandra apresentam muitas

possibilidades de produção de sentidos. Então, quando ela se refere à aplicabilidade de um

livro é no sentido de ele poder ser lido e possibilitar desdobramentos nas aulas de literatura,

como pode ser notado no evento a seguir que aconteceu na turma do 1º ano:

Com as crianças em roda, Sandra disse: “Vou contar uma história que tem um

animal. Vocês vão ter que adivinhar. Ele voa. Não nasce voando.” As crianças

adivinharam que era a borboleta. “Como virou lagarta? Essa escritora foi a mesma

que escreveu a história da última aula. Quem era?” As crianças falaram Ana Maria

Machado e depois, Ruth Rocha. Uma aluna disse: “Essa autora também escreveu o

livro Quem tem medo de quê?” Os alunos assistiram em seguida a um vídeo

informativo sobre a transformação da lagarta em borboleta. As crianças o relacionaram com experiências que já tiveram com borboletas. Depois, a professora

leu “A primavera da lagarta”, de Ruth Rocha. Antes de iniciar a leitura, Sandra

explicou um pouco sobre o livro. Durante a leitura, perguntou: “Quem eram os

caçadores?” Os alunos responderam: joaninha, louva a deus, formiga etc. Ela

perguntou: “Por que será que eles não estavam encontrando a lagarta? Disse o

camaleão que mudava sempre de...”. Ao final do livro, há um texto informativo

sobre a transformação da lagarta em borboleta. Sandra leu e chamou a atenção para a

relação dele com o vídeo exibido no início da aula. Neste momento, uma aluna se

manifestou, dizendo que viu “um vídeo no Disney Chanel que o menino pediu ajuda

para a lagarta”. A professora continuou e perguntou: “A Ruth Rocha para escrever

esse livro ela pegou informações onde?” Uma aluna respondeu: “Em vídeos,

revistas, livros”. Em seguida, Sandra perguntou “A gente sofre metamorfose? Tem outro animal que vocês conhecem que sofre metamorfose? Qual?” Vários alunos

responderam: “O sapo!” Os alunos contaram suas vivências com sapos. Ao final, a

professora queria que eles brincassem com uma borboleta. Ela entregou uma folha

com pontos para serem ligados numa sequência numérica. Após ligarem os pontos,

os alunos teriam o desenho de uma borboleta. Depois pintaram a borboleta,

recortaram e colocaram um palito no verso dela. Enquanto faziam a atividade final,

vários alunos teceram comentários: “toda tarde na sala da minha casa aparece uma

borboleta. Tem uma toda laranja com listras pretas”, “Eu tô imaginando uma

borboleta falando comigo. As borboletas são incríveis”, “Ela vai voar e virar um

pássaro que vai até o arco-íris”, “se eu fosse uma borboleta, e estivesse por aí no sol

voando pegando aquele ventinho, aquela liberdade” (Caderno de campo, 12/12/14, coordenadora Sandra, 1° ano).

No caso deste livro o desdobramento foi em relação a informações sobre a

metamorfose da lagarta. Mas o livro foi escolhido pela equipe docente pela qualidade literária,

o tema, a extensão do texto e o autor. Sandra traz propostas para as professoras e, junto delas,

seleciona os livros que para a equipe possam promover vivências significativas e possibilitar a

produção de sentidos pelos alunos. Talvez a mesma ideia possa ser conferida a ela quando

trata das suas leituras. Quando ela afirma que não gosta de ler livros de autoajuda, talvez seja

porque ele apresenta o sentido único da mensagem e pouca abertura para o imaginário.

Desde criança a literatura ocupa um lugar de destaque na vida da professora Mariana.

“Desde muito pequena possuía um variado grupo de contadores de histórias em minha

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família; meus pais, avós, uma tia especial com dons para os contos gregos e uma querida

empregada baiana que conhecia os mais arrepiantes casos de assombração de sua terra”. Seu

pai tinha uma biblioteca bem grande, era professor, escritor, poeta e pesquisador. Ele criava

suas próprias histórias para Mariana e “trazia os melhores livros e coleções disponíveis para

casa”.

A presença de um grupo variado de contadores de história na vida da Mariana mostra

como a narrativa estava presente na sua casa. Seu pai, culto, possibilitou o acesso aos

melhores livros da época e a leitura literária se constituiu como experiência e formação. Por

ter sido criada nesse ambiente, Mariana afirma que “não é de se admirar que hoje seja a

leitura” a sua “grande companheira”. Atualmente, ela escolhe “livros que ofereçam variadas

emoções”. Busca leituras que possam se constituir como experiência de vida. Mariana

apresenta como principais leituras os “contos, crônicas, ficção, clássicos da literatura, entre

outros”. “De qualquer forma, seja o estilo que for”, Mariana afirma precisar “ler todos os

dias”. A leitura é um momento significativo.

Observa-se que a professora Mariana e a coordenadora Renata tiveram famílias que

valorizavam a leitura e a instrução. Houve um investimento na formação cultural das filhas, o

que parece ter tido relação com suas escolhas profissionais.

Na vida da professora Cláudia a literatura ocupa um lugar de lazer. Para que haja o

encontro entre ambas, Cláudia pensa que precisa estar inteira nessa relação: “Em minha vida,

a literatura está associada aos momentos de lazer (...) não destino um tempo ou momento

obrigatório para as leituras. Preciso estar inteira para acontecer o encontro com o outro: o

escritor, a obra”. Entendemos que lazer está em oposição a trabalho. Então, quando lê, ela não

está a serviço de outra ocupação, pois ela precisa se sentir inteira na relação com o escritor e a

obra. Para fabular Cláudia precisa estar fora da obrigação. O contrário acontece com a leitura

para aperfeiçoamento profissional. No momento da entrevista Cláudia estava lendo o livro

Literatura infantil: teoria, análise, didática, de Nelly Novaes Coelho.

Não há leituras principais na vida da professora Cláudia. Ela lê “TUDO que chega” a

ela. “Agora, atualmente, os livros é que chegam até mim, mais do que eu a eles. Acabo de

ganhar dois livros do Xico Sá e uma tradução de Leda Beck para o Pinóquio, de Carlo

Collodi.” Embora leia tudo que chega até ela, Cláudia gosta de ler livros de literatura que

abordem o “estudo das ciências físicas (por isso amo a obra do astrônomo e físico Marcelo

Gleiser, em que costuma citar Copérnico, Keppler... e faz boas considerações sobre religião)”.

Suas preferências de leitura estão mais vinculadas à linha de força Leitura e Ilustração.

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O critério de seleção dos textos para as aulas passa pelo quanto que o livro pode

inspirar a realização de uma atividade. Além da aula sobre A primavera da lagarta (Ruth

Rocha), observamos a aula com o livro Tanto, tanto, de Trish Cooke (28/03/16, Sandra). O

livro tem como clímax uma festa de aniversário. A atividade final da aula para o 1º ano foi

desenhar uma festa de aniversário dentro de uma dobradura de casa. A festa representada

deveria ser a do aluno. Outra aula para o 1º ano foi construída a partir do livro O menino e o

cachorro, de Simone Bibian (04/04/16, Sandra), que trata de duas histórias com dois pontos

de vista, um do cachorro e outro do menino. A atividade após a leitura e a conversa foi

desenhar uma cena da história promovendo o encontro entre o cachorro e o menino. O que

ocorre é que, embora a intenção seja de propiciar a criação, ligar pontos divertes, não propicia

a criação, e desenhar uma festa e na aula seguinte desenhar novamente repete um modo de

criar. Com isso, por mais que a intenção seja da criação e da fabulação, os modos de criar e o

que criar nem sempre resultam em uma produção que venha da criança, pois acaba sendo

muito direcionada.

6.2 Metodologia nas aulas de Literatura: o ensino-aprendizagem da literatura na escola

Antes do período em que Renata trabalhou como coordenadora pedagógica de

Literatura, as aulas já apresentavam uma estrutura. Primeiro, a equipe elegia um tema e, a

partir dele, planejavam-se as aulas: “Os temas eram trimestrais. Eram três, quatro temas por

ano. Três temas por ano para a gente poder ter bastante tempo para desenvolver. Então, eram

quatro. Depois, eu passei para três porque achei que quatro era pouco tempo, que a criança só

ia lá uma vez por semana”. Os temas permanecem, mas sofreram alterações. Com a nova

coordenação, Renata preocupou-se em manter “as coisas legais e acrescentar outras (...)

avaliar se aquilo vale a pena, se não pode mudar. (...) eu botei grandes autores brasileiros, não

tinha. Esse foi um tema”.

De acordo com Renata, os temas foram considerados o melhor norte de trabalho pelos

professores porque direcionavam a seleção dos livros e dos autores. O critério de seleção dos

livros por meio dos temas perdura. Eles eram escolhidos em função da faixa etária e não

estavam articulados com os temas que as professoras de Língua Portuguesa, Matemática,

Estudos Sociais e Ciências trabalhavam. A equipe de Literatura estabelecia parcerias com

essas outras professoras conforme a demanda. Quando isso acontecia, “fazia um parêntese

naquilo, naquele tema. Uma ou duas aulas” e “pegava aquele tema que a professora solicitou”.

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Atualmente, essa desvinculação não existe mais. Com os planejamentos integrados,

promovidos trimestralmente, os temas de Literatura entraram em diálogo com as demais áreas

sem estar em uma posição de submissão, mas de diálogo. A desvinculação de que fala Renata

tem relação com a tentativa da equipe de Literatura se manter independente em relação à

Língua Portuguesa. A Literatura queria sustentar a sua especificidade. Embora a Literatura

também pertença ao Departamento de 1º Segmento do EF, ela nasceu misturada com a Língua

Portuguesa. Contudo, a Língua Portuguesa nunca deixou de ser considerada uma disciplina. Já

a Literatura, apesar do histórico, se tornou uma Atividade. Porém, com a entrada de novos

professores com outras experiências pedagógicas e a mudança na direção pedagógica da

escola, esse modo de trabalhar desvinculado precisou ser alterado. Percebeu-se a necessidade

de integração, ao menos temática, entre todas as áreas (Língua Portuguesa, Matemática,

Estudos Sociais, Ciências, Música, Artes, Literatura e Educação Física).

No CPII o ponto de partida não é o itinerário de leituras que já considera o texto e a

idade, bem como as convenções literárias previstas de serem aprendidas. A equipe escolhe

primeiro um tema de interesse. Depois, seleciona os textos, considerando tais convenções.

Mas estas estão em segundo plano. De acordo com Colomer (1994, p. 40-41), é necessário

construir um itinerário de leituras considerando o texto, a idade e as convenções literárias

consideradas apropriadas para serem aprendidas pelo grupo que vai viver a aula de Literatura.

Os temas desenvolvidos na época da Renata foram, por exemplo, família e contos de fadas37

(1º ano), contos (2º ano) e terror (5º ano). Além da definição de temas por ano escolar e

trimestre, a equipe utilizava estratégias variadas para fazer com que o aluno entrasse no texto

literário, como a música e a ambientação da sala.

No caso do 5º ano, com as histórias de terror, os alunos pediam histórias bastante

aterrorizantes. Porém, as professoras não colocavam pessoas decapitadas, sangrando. Renata

contou que falava para os alunos: “Não, isso aí vocês já veem na casa de vocês, na televisão.

A mãe deixa, ótimo! Mas aqui não vai ter histórias tão aterrorizantes”. Ela ainda relatou que

houve uma vez em que as professoras fizeram uma ambientação bem legal da sala. Colocaram

papel preto nas janelas, apagaram as luzes, acenderam velas e botaram caveiras e monstros

pendurados. Elas iam vestidas de preto, nessas aulas, pintavam olheiras nos seus rostos,

passavam batom roxo. Selecionavam músicas clássicas para o som ambiente. Quando as

37 A equipe da disciplina optou pelos clássicos no 1º ano “porque hoje em dia as crianças chegam na escola e não

conhecem Cinderela, Rapunzel, Chapeuzinho Vermelho. Não conhecem! Não contam mais histórias pras

crianças” (Renata).

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crianças entravam na sala, sentiam medo. Segundo Renata, uma menina ouviu a leitura da

história abraçada na outra.

Renata também conta que no 1º ano também houve uma situação marcante com o

tema família. Ele foi escolhido “porque a criança ainda está muito com o cordão umbilical

sem cortar”. Nesse tema a equipe “contava histórias de criança e de família de bichinhos”, o

que sempre provocava nos alunos uma identificação. Certa ocasião foi lido um livro que

tratava de uma criança que toda a noite ia para a cama do pai por causa de diferentes razões

(frio, fome, sede, medo de monstro). O pai, então, incomodado com a situação, sentou-se para

conversar com o filho e perguntou: “Por que você vai para minha cama?”. O filho respondeu:

“É que eu sinto saudade de você!”. Essa resposta fez o pai perceber que ele não dava muita

atenção para o filho e passou a dedicar mais tempo a ele. Com isso, o filho nunca mais foi

para a cama do pai. Esse livro foi lido para os pais no Projeto Conhecendo o CPII, idealizado

por uma das profissionais do antigo Setor de Orientação Educacional (SOE), atual Setor de

Supervisão e Orientação Pedagógica (Sesop). Renata contou que os pais dos novos alunos

eram convidados a participarem de aulas que os filhos deles viviam. Nesse projeto os pais se

tornavam alunos. Uma das mães que participou do projeto, durante a realização da aula,

perguntou: “Você contou essa história semana passada? Simplesmente ela parou de ir dormir

na minha cama de repente”.

O tema família não está mais na grade temática das aulas de Literatura. O 1º ano

estuda identidade, animais e contos de fadas. No tema identidade, o mais próximo do assunto

família, os livros selecionados têm crianças como protagonistas. Em 2016, por exemplo,

foram lidos os seguintes livros: O menino Nito, de Sandra Rosa e Victor Tavares; Menina

bonita do laço de fita, de Ana Maria Machado e Rosana Faria; Tanto, tanto, de Trish Cooke;

De bem com a vida, de Bia Hetzel e Mariana Massarani; Ana e Ana (livro animado, Coleção

A Cor da Cultura), de Célia Godoy e Fê; Diversidades, de Tatiana Belinky; Obax, de André

Neves; O menino e o jacaré, de Maté; Grande pequeno, de Blandina Franco e José Carlos

Lollo; O cabelo de Lelê, de Valéria Belém; Bruna e a galinha d’Angola (livro animado), de

Gercilga D‟Almeida e Valéria Saraiva; e O menino e o cachorro, de Simone Bibian e Mariana

Massarani.

O relato de Renata sobre as mudanças de comportamento dos alunos ao vivenciarem

aulas de Literatura mostra o quanto por meio da criação artística a criança aprofunda, alarga e

depura a sua vida emocional (VIGOTSKI, 2008, p. 98). Na mesma direção, Candido (1972, p.

804) afirma que a literatura “exprime o homem e depois atua na própria formação dele”. As

crianças mudam suas atitudes e pensamentos vivendo aulas de Literatura.

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Renata relatou esse caso também para afirmar sua ideia de que havia necessidade de

garantir o espaço da discussão acerca do livro tanto sobre o tema tratado quanto sobre o autor

e o ilustrador. Segundo ela, foi a discussão do livro que possibilitou a mudança de atitude da

criança do caso relatado acima. Renata considerava importante discutir muito:

Olha, esse livro não é um livro brasileiro. Foi escrito pelo autor X (a gente falava o

nome). Ele é inglês ou ele é francês e teve uma pessoa que traduziu para nossa

língua para vocês poderem ouvir e entender a história. O ilustrador é fulano de tal. O

ilustrador se chama tal. Sabe, para a criança perceber. Esse livro aqui foi feito por

uma pessoa que sabia desenhar. Então, ele foi o ilustrador e foi o autor do texto tal

também para valorizar ambas as pessoas porque passar por uma história e não falar

de quem criou, eu acho um pecado com o autor, né? Principalmente, porque eu já

escrevi livro. (...) achei legal discutir bem a história. Falar sobre aquilo. Se as

crianças tinham alguma vivência parecida com aquela, se conheciam algum caso na

vida real e o que eles achavam daquele comportamento. Fazíamos discussões sobre o perfil psicológico dos personagens (...) como ele terminaria aquela história se ele

fosse o autor. E desenvolvia bastante a oralidade porque eu achava que a oralidade

era uma coisa importante (Renata).

Havia uma preocupação em garantir e respeitar o diálogo sobre o livro. Renata

perguntava: “O que vocês acham disso? Não tem certo e errado. Não fica nervoso ou com

medo de dizer. Diz o que você pensa. Esse espaço aqui é o espaço de liberdade, de criação.

Essa sala aqui é mágica!”. O fato de a Literatura não reprovar era usado como argumento para

incentivar a participação dos alunos.

A ideia de que “cada um recebe o texto de acordo com as suas vivências” também era

usada para estimular a participação deles. Ela argumentava com eles que, se as vivências são

diferentes, cada um receberá o texto de uma maneira, um vai rir, outro, chorar. Além disso, se

colocava como uma professora que não diria que a colocação do aluno estaria certa ou errada.

Vale ressaltar que este discurso é da Renata, coordenadora aposentada da escola que nos

concedeu uma entrevista. É um relato. Não observamos isso, pois ela já não atua mais como

coordenadora de Literatura. Tal entendimento se vincula à linha de força Leitura e

Subjetivismo, que postula que cada leitor tem a sua trajetória e que a leitura é um instrumento

de afirmação da sua individualidade.

Um evento de pesquisa observado, no dia 31/03/16, na aula da professora Cláudia,

mostrou esta questão. A professora leu O menino que comia lagartos, de Mercê López, para

uma turma do 3º ano. A aula começou com a apresentação da autora (francesa, viajou pela

África e é artista plástica). No mesmo momento, uma aluna disse: “fui numa apresentação de

jongo onde havia franceses”. O início da aula foi marcado por uma conversa longa que trazia

elementos da história, um deles o baobá. Nesse momento vários alunos começaram a falar ao

mesmo tempo: “no 2º ano, foi apresentada a foto de um baobá”, “é uma árvore rara, serve

como uma casa, parece uma casa”, “gosto tanto da África que pesquisei no tablet o baobá”, “o

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tronco é largo e os gravetos são finos”. Outro elemento da história é o tuaregue. A aluna, ao

observar a fotografia que a professora trouxe, disse: “Parece muçulmano”, “Que deserto será

esse? Do Saara?” A professora convidou os alunos a se sentarem em volta de uma fogueira

que ela havia produzido com cartolina e papel colorido. Ela iniciou a leitura do livro. Durante

a leitura, ela parava para explicar uma cena e perguntava: “quem já viveu uma situação

parecida?”, “o que significa o azul?”. Um aluno disse: “Tem um povo que entende que o azul

é fidelidade”. A conversa e a leitura do livro continuaram e culminaram na vivência de uma

cena em que personagens do livro estavam tomando chá. A aula terminou com a produção de

cruzes tuaregues.

Travassos (2013), citada na revisão bibliográfica desta pesquisa, em sua dissertação

tratou da mediação dialógica e destacou estratégias significativas para tal mediação, como: ler

em voz alta; ler fazendo gestos; ler mostrando ilustrações; ler, perguntar e anunciar; ampliar a

compreensão dos ouvintes/leitores sobre elementos de outra época ou ambiente; ler

dramatizando. Segundo a pesquisadora, o professor deve ler sem explicar tudo e traduzir para

os leitores. É necessário deixar espaço para eles perguntarem.

Renata relatou como procurava garantir este espaço:

Teve um dia que a gente contou uma história que a mãe, a mãe fez uns biscoitinhos

para as crianças, eram dois irmãos. Tocaram a campainha era o nome da história!

Tocaram a campainha, aí chegaram mais dois. Aí, as crianças viram que tinham 12

biscoitos que já ia ser 6 para cada um, ia dividir por três. Depois, chegou mais gente,

ia dividir por quatro, por cinco. Daqui a pouco, sobrou um biscoito para cada um.

Mas, como só tinha um biscoito para cada um, tocaram a campainha. Quem era? A

vovó! Chegou com um prato de biscoitos novos que ela tinha feito. E aí todo mundo:

“Eh! Eh!”. E, aí, nisso, eu me vesti de vovozinha, né, botei um, prendi o cabelinho,

botei o oculozinho assim, botei um xale, comprei rosquinhas Mabel (risos). E aí, comprei rosquinhas Mabel e bati na porta. Aí, a Mariana: “Vocês escutaram alguém

bater na porta?”, “É, bateram”, “Quem é? Pode entrar!”. Aí, eu entrei: “Bom dia!

(com voz de velhinha) Vocês estão bem? Ouvi dizer que acabaram os biscoitos. Eu

trouxe mais para vocês!”. As crianças ficaram malucas. (...) E acabou a aula com

eles comendo mais biscoitos. Entendeu? Uma vez ou outra a gente fazia isso. Que é

um enriquecimento, né? Quer dizer, o personagem saiu do livro e apareceu ali. Eles

adoravam! (Renata, 03/02/15)

Neste evento narrado por Renata, a coordenadora cita a professora Mariana. Em todas

as suas aulas observamos que ela lia em voz alta, fazendo gestos, mostrando ilustrações e

dramatizando. A preocupação em garantir as demais estratégias dialógicas, como ler,

perguntar e anunciar; ampliar a compreensão dos ouvintes/leitores sobre elementos de outra

época ou ambiente aparece no discurso de Renata: “achei legal discutir bem a história. Falar

sobre aquilo. Se as crianças tinham alguma vivência parecida com aquela, se conheciam

algum caso na vida real e o que eles achavam daquele comportamento”.

Ela também disse que levava, uma vez por ano, autores e ilustradores para a feira de

livros da escola. Segundo ela, já foram à escola Graça Lima, João Pedro Roriz e Rui de

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Oliveira. As crianças trocavam ideias com os autores e percebiam que nem todos os autores

estavam mortos. Ela entende que o encontro com os autores e a participação em eventos

literários possibilita vivências significativas com a literatura.

Da perspectiva que defendemos nesta tese, a vivência significativa com a literatura é

aquela que resulta em formação. Formamos leitores literários quando há experiência, quando

com a literatura nos afetamos, trocamos com o que sabemos; nos formamos ou nos trans-

formamos. A experiência estética acontece quando a arte nos deixa marcas, desloca-nos

(LARROSA, 2003). É vivência (VIGOTSKI, 1998) ou experiência estética (LARROSA,

2003 e BENJAMIN, 1994) quando a obra de arte nos forma, de-forma ou trans-forma.

Nesta experiência estética o autor-criador dá forma artística a um conteúdo, que é

percebido enquanto objeto estético pelo contemplador/fruidor/leitor: “contemplar

esteticamente significa submeter um objeto ao plano valorativo do outro” (BAKHTIN, 1993a,

p. 92, grifo do autor). Na contemplação eu devo entrar em empatia com o outro, retornar ao

meu lugar, completar o horizonte dele com o meu excedente de visão, convertê-lo, criar para

ele um ambiente concludente a partir do meu conhecimento, da minha vontade e do meu

sentimento (BAKHTIN, 2003, p. 23). Para Renata o encontro com autores e a participação em

eventos literários possibilitava que o aluno se afetasse, trocasse conhecimentos, se formasse,

se transformando, se deslocando. Fato que pode acontecer também no cotidiano.

Na entrevista Renata, a coordenadora aposentada de Literatura, disse que havia fatores

que limitavam o desenvolvimento da disciplina, como o barulho externo, a limitação do

espaço, o tempo de aula e o desconhecimento por parte das professoras das demais áreas

acerca do que acontece nas aulas de Literatura. Além disso, não havia espaço na sala de aula

para realizar uma encenação, mesmo que fosse bem simples. A sala de aula sofreu uma

reforma. Ela foi ampliada para o equivalente a duas salas de aulas, o que possibilitou arrumar

as mesas em um grande círculo, de modo que todos os alunos se viam. Porém, Renata sentia

falta de um palco “para as crianças sentarem e eles se sentirem artistas”. O tempo de aula era

considerado longo demais para o 1º e 2º ano e curto para as demais turmas. Ela pensava que

seria mais interessante se houvesse três tempos de aula (2h25min) para os 3º, 4º e 5º anos e

apenas 45min para o 1º e o 2º anos.

O desconhecimento de parte dos professores sobre o que era feito na Literatura

provocava a ideia de que ser professora de Literatura e coordenadora dessa área “era o

paraíso, eram férias, era a maior moleza”. Essa ideia era desconstruída quando algumas

professoras passavam a compor essa equipe e, então, descobriam o trabalho que a disciplina

exigia, pois cada professora de Literatura dá aulas para todos os anos e todas as turmas de um

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turno. O planejamento das aulas acontecia uma vez por semana. Havia um horário dedicado a

ele que abrangia quatro tempos. A equipe planejava as aulas das cinco séries. Pensavam: “que

história ia dar, de que jeito ia ser contada, o que ia ser discutido, que ia ser feito depois”.

Sempre havia um trabalho após a leitura e a discussão do livro. Esta estrutura pedagógica das

aulas leitura, conversa e trabalho permanece.

Do 1º ao 5º ano as aulas seguem a tríade citada acima. Como exemplo, temos a aula do

dia 16/03/16, da professora Cláudia, para uma turma de 5º ano. A professora leu três contos

do livro Bá e as visagens, de Augusto Pessoa. Durante a leitura a professora convidou alguns

alunos para fazer a leitura dramatizada dos textos. Além disso, conforme iam lendo, ela trazia

perguntas para a turma: “Quem é Bá? O que será que é uma visagem? Quem está dizendo que

vai contar a história? Quem é o escritor?”. Às vezes, perguntava sobre expressões e

vocabulário: “O que é sepultura? Por que ciranda de ossos? Faltava o quê? Como é que eles

tinham chegado ali?”. Ela trouxe perguntas sobre personagens, cenário e acontecimentos e

ainda indagou sobre a relação dos textos com a vida dos alunos por meio da discussão das

ações dos personagens.

A rotina do planejamento pedagógico também foi constatada por Silva (2011) em sua

dissertação, quando pesquisou aulas do 1º ano do EFI do CPII no campus São Cristóvão. Sob

a orientação da coordenadora pedagógica, a professora planejava a aula, escolhendo

previamente as leituras e as atividades propostas após a leitura. A pesquisadora ressaltou em

sua dissertação a importância desse planejamento para a escolha dos livros que são lidos e a

criação das atividades pedagógicas propostas após a leitura. Ela reitera a necessidade de haver

um tempo para ouvir as crianças, para tecer narrativas e pô-las em rede. O momento da

conversa garante este tempo.

Isso pode ser visto na aula do dia 09/03/16 para uma turma do 5º ano. A professora

Cláudia deu bastante tempo para ouvir as crianças, deixá-las narrar e colocar os diferentes

conhecimentos delas em rede. Ela começou a aula lendo a introdução do livro Bá e as

visagens, de Augusto Pessoa, cujos contos foram lidos na aula subsequente. Ela chamou um

aluno para ler junto com ela e interrompeu a leitura para explicar um eufemismo (“Eu vim

aqui para te buscar”). Ela explorou com os alunos outras expressões relativas à morte. O aluno

que leu com ela fez voz grave para representar a morte. Ela interrompeu mais uma vez a

leitura para explicar a natureza dos contos populares. Um aluno pediu a palavra para dizer: “O

escritor está enrolando a morte”. Os alunos se sentaram em roda, deitaram no chão, ficaram

atentos à leitura. Cláudia destacou o trecho “podemos ir”, e perguntou quem seria. Era a

morte e o escritor. Ela perguntou o que significava. Perguntou, em seguida, o significado da

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palavra epitáfio. Um aluno se lembrou do significado a partir de um desenho animado a que

assistira. Depois, Cláudia leu com a colaboração de outros dois alunos o texto “A morte e o

médico”, do mesmo livro. Na leitura da ilustração inicial os alunos falaram: “parece com o

desenho do Billy Mendy, o Puro Osso!”. Lançou uma pergunta sobre um trecho lido: “Por que

a fome não é justa?”. Ela trouxe ainda outras indagações, como “O que significa encontrou

seu destino?, O que é gadanha?”, e finalizou questionando: “Por que será que dizem que a

morte não é justa?”. Os alunos pensaram sobre a morte, especialmente sobre como seria

perder seus pais. Conforme a leitura dialogada prosseguia, os alunos iam mudando de

posição. A professora recriou uma cena com as crianças. Ao final da leitura elas bateram

palmas.

Observamos que a estrutura seguida nas aulas leitura, conversa e fazer artístico

tem um caráter formativo. As crianças escutam, conversam sobre a história e se mantêm de

alguma forma nela quando estão no fazer artístico em grupo. A leitura ganha, assim, uma

outra temporalidade que pode possibilitar essa relação com a subjetividade do leitor. Podemos

dizer que as aulas de Literatura conferem importância à imaginação e à criação e que buscam

promover a experiência, no sentido que Larrosa (2003) propõe. Entretanto, a sua continuidade

e repercussão em cada um é um processo que não foi/é possível capturar.

Observamos ainda nesta estrutura de aula que os dois procedimentos do letramento

literário, na acepção proposta por Paulino e Cosson (2009, p. 67) estão presentes. A interação

verbal intensa e o (re)conhecimento do outro e o movimento de desconstrução/construção do

mundo. No momento da conversa o leitor compartilha. Ele lê com os outros e todos se

mobilizam para construir sentidos e entender mais e melhor os livros.

Os materiais das aulas também eram produzidos pela equipe. Renata contou que ela

“fabricava trabalhos” porque queria ter a sua autoria no trabalho. Renata relata que sentia

vontade de produzir coisas melhores, ver que a criança via a sala de Literatura como um

espaço gostoso de criação: “(...) às vezes, a gente dava um chapéu de bruxa para ele. E a partir

do chapéu da bruxa, ele ia produzir uma bruxa. A bruxa ia ser dele. (...) a partir daquele

chapéu, ele ia fazer outras coisas”. O chapéu, por exemplo, era feito pela sua colega de

equipe, a Mariana, que era reconhecida pela sua facilidade para desenhar, recortar. Quando

fizeram As lendas do Rio São Francisco: as carrancas, produziram o barco. As carrancas

ganharam uma silhueta, uma forma e foram dadas aos alunos para as criarem: “Então, de um

ponto de partida, a criança viajava. (...) E imprimia o trabalho dela ali, a personalidade dela

ali”.

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A ideia de a aula de Literatura ser um espaço gostoso de criação mostra bem a tensão

que a disciplina vive. Por um lado, há a preocupação com o lúdico, na perspectiva do prazer,

satisfação. Por outro lado, está presente a ideia de imaginação, formação humana, jogo.

De acordo com Renata, a disciplina Literatura no EFI deve contar com várias

condições que descrevemos a seguir: a) um ponto de partida de trabalho a fim de que ele não

fique solto; b) temas previamente selecionados de acordo com os interesses de cada faixa

etária, distribuídos pelos trimestres do ano letivo e com independência em relação às demais

disciplinas escolares; c) longo tempo de planejamento para que a equipe pedagógica possa

pensar as aulas semanais dos cinco anos escolares e produzir os materiais necessários para as

aulas; d) uma equipe pedagógica autônoma e livre para criar e experimentar; e) isenção no

que se refere à aprovação ou retenção dos alunos na disciplina; f) aulas estruturadas com

uma sequência, a saber: a apresentação e contextualização do livro, do autor e ilustrador;

leitura; amplo espaço para a discussão (articulação dos fatos narrados com as vivências dos

alunos, análise dos personagens e imaginação de novas situações pelos alunos a partir do

livro) e a realização de um fazer artístico no qual a criança imagine e imprima a sua

personalidade; g) o protagonismo do livro; h) música e ambientação da sala de aula como

estratégias de trabalho; i) participação dos responsáveis dos alunos (exemplo, o Projeto

Conhecendo o CPII); j) a troca de conhecimentos entre alunos, autores e ilustradores, de

preferência em feiras do livro, realizadas ou não pela escola; k) uma sala de aula ampla, com

um palco para a realização de dramatizações; l) silêncio externo no momento da aula; m)

tempo de aula adequado à faixa etária.

O ponto de partida ao qual Renata se refere é um tema de trabalho. Mas o tema não

pode vir a ser o principal critério de seleção dos livros. O que vem à frente dessa escolha: a

qualidade literária ou o tema? A equipe docente busca conjugar ambos os critérios. Mas, se o

livro tiver qualidade literária e não estiver de acordo com o tema, ele não é selecionado para a

aula.

As observações das aulas evidenciaram que os livros escolhidos geralmente agradam

os alunos. Percebemos que existe uma preocupação em identificar livros que atendam aos

interesses das crianças para que tenham elementos para imaginar e criar com o texto.

Atualmente, as aulas têm independência em relação às demais áreas do conhecimento mesmo

que haja um tema gerador que dê unidade ao trabalho. Na leitura do conto “Devolva a minha

aliança”, de Rosa Amanda Strausz, para uma turma de 5o ano, por exemplo, enquanto a

professora lia, os alunos olhavam avidamente para ela. Ao fundo, havia um som de trovão. A

professora lia, olhando nos olhos dos alunos, alterando a voz. Eles se entreolhavam

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demonstrando estar com um certo medo. Os alunos iam repetindo o final de trechos lidos e

fazendo perguntas, como quem está pensando alto (Caderno de campo, aula da professora

Mariana, 13/04/15, 5º ano). Na leitura do livro animado Ana e Ana, de Célia Godoy e Fê, os

alunos do 1º ano assistiram ao livro com muita atenção e teceram diversos comentários sobre

ele, como: “Você viu? Ninguém é igual. Tem coisa que as pessoas gostam e outras não” e “Eu

tenho um amigo gêmeo que joga bola desde pequeno. Ele chama João. O outro joga muito

bom e o outro joga bom”.

Renata dá muita importância ao tempo da conversa tanto para os professores quanto

para os alunos. Vale ressaltar que os professores de Literatura têm um momento somente

deles para o planejamento.

Planejamento era assim: a gente fazia uma vez por semana. A gente tinha horário e

quatro tempos porque era planejamento para cinco séries. Então, não podia fazer um

planejamento mais curto. A gente planejava que história ia dar, de que jeito ia ser

contada, o que ia ser discutido, que trabalho ia ser feito depois. Que a gente sempre fazia um trabalho, né. (...) acho que a gente tem que discutir muito. (...) discutir bem

a história. Falar sobre aquilo. Se as crianças tinham alguma vivência parecida com

aquela, se conheciam algum caso na vida real e o que eles achavam daquele

comportamento. Fazíamos discussões sobre o perfil psicológico dos personagens. E

como ele terminaria aquela história se ele fosse o autor. E desenvolvia bastante a

oralidade porque eu achava que a oralidade era uma coisa importante. (...). Para dar

espaço para o diálogo para a criança se colocar, dizer o que é que ela achava

(Renata, 03/02/15).

Como há uma proposta curricular específica de Literatura e a formação inicial docente

não conta, na maioria das vezes, com disciplinas obrigatórias ligadas à LIJ, defendemos que

haja uma equipe própria para encaminhar as aulas de Literatura formada por professores que

se dediquem à temática. Talvez valha a pena problematizar se não haveria a necessidade de

um representante da equipe estar presente nas reuniões de planejamento de Língua Portuguesa

com os demais professores das turmas. Esta separação tem relação com a origem das aulas de

Literatura, para dar tempo de planejamento para os professores. A não retenção nas aulas de

Literatura acontece porque ela é considerada uma Atividade Complementar, mas há uma

avaliação.

Onde está a especificidade do trabalho pedagógico com a literatura na escola? Ao

nosso ver ele está na tríade ler, dizer(-se) e criar. Ler, isto é, ouvir, assistir, observar, fruir

conhecer. No dizer(-se) é fundamental: antecipar, especular, relacionar, comparar, relatar,

comentar, debater, criticar, perguntar, apresentar, opinar, discutir, recordar, argumentar,

inferir, avaliar, recomendar, analisar, descrever, identificar. E no criar? Narrar, recontar,

brincar, dramatizar, fotografar, esculpir, pintar, ilustrar, dançar, recitar, filmar, jogar, musicar,

tocar, cantar, produzir texto escrito. Enfim, o núcleo as aulas de Literatura precisa ser

imaginar, apreciar e sentir. O que vamos discutir, na seção Atividades, é o que predomina

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nesse fazer artístico. Sem dúvidas, a preocupação em garantir um momento de conversa e

fazer artístico está relacionada à preocupação com a produção de sentidos e a coautoria, no

sentido que a linha de força Leitura e Experiência/Formação prevê. O fazer artístico é uma

maneira de o aluno dar uma resposta ao texto.

Na aula de 15/05/15, a professora Mariana, com alunos do 1º ano, provocou um

momento de produção de sentidos e coautoria. A partir da exibição do livro animado Ana e

Ana, de Célia Godoy e Fê, a professora brincou de espelho com a turma. Ela pede que a turma

a imite. Depois, chamou alunos para comandarem a brincadeira. Em seguida, Mariana pediu

aos alunos desenhassem uma Ana igual à da folha que entregou. Durante a elaboração do

trabalho, duas alunas começaram a brigar porque uma delas não parava de imitar a outra.

Enquanto isso, outra aluna que é branca e loira transformou a Ana em uma menina loira,

assim como ela. O evento mostra que houve espaço na aula para a criação da empatia com as

personagens principais, o que provocou a produção de sentidos entre os alunos.

Durante a exibição do livro animado, os alunos comentavam: “Ninguém é igual, tem

coisa que as pessoas gostam e outras não” e “A gente não é obrigado a ser igual em tudo”.

Quando a aluna transforma a Ana nela mesma, vemos que houve espaço para uma coautoria

no texto Ana e Ana.

A outra coordenadora, Sandra, tornou-se coordenadora de Literatura em 2012. Antes,

ela era orientadora pedagógica do 2º e 3º ano. Ela entrou após a aposentadoria da Renata. Sua

preocupação nessa transição foi de manter o trabalho da coordenação anterior, mas também

realizar mudanças: “têm coisas que eu acho que tinha que realmente parar (...). Eu acho que

vai acontecer isso comigo também. (...). É um movimento em literatura. Literatura é

movimento”.

Sua ligação com a função tem relação com o trabalho que desenvolveu na Sala de

Leitura do município do Rio de Janeiro e no CPII, quando esteve como regente de turma e

orientadora pedagógica: “quando estava com o primeiro ano, eu já tinha essa visão de

trabalhar com literatura”. Para ela, “O professor de primeiro ano tem que trabalhar com a

literatura não importa como. Há algumas pessoas que questionam isso. Ah! Vamos pegar um

texto literário e trabalhar na alfabetização. Ué, por que não?”.

Do nosso ponto de vista, importa como o texto literário será trabalhado. Entendemos

que as aulas de alfabetização partem de um texto, mas como o texto será trabalhado e qual

será escolhido revelam a concepção de trabalho que o docente confere à alfabetização e à

literatura. É a literatura para ensinar a ler e a escrever, ou é a literatura para a formação

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humana que imprime sentido à leitura e também ensina sobre o que se pode fazer com a

leitura?

Há quatro anos coordenando esse trabalho, Sandra se preocupa com a seguinte

questão: “até que ponto a gente consegue atingir o aluno ou não. Na questão de você avaliar,

será que ele aprendeu ou não aprendeu?”. Uma das maneiras que ela tem de verificar o quanto

atingiu o aluno é a memória dele. Como exemplo, ela cita uma aula, realizada no final do

primeiro trimestre de 2016, que teve como uma das atividades propostas conversar sobre os

livros que haviam sido trabalhados. Observando o desenvolvimento dessa aula, Sandra

percebeu que os alunos citaram os livros e até chamaram a atenção da professora para aqueles

que ainda não haviam sido mencionados. Então, promover uma vivência significativa do texto

literário é uma intenção da coordenadora. Há uma questão subjetiva neste critério de

avaliação que parece que faz com que fique difícil avaliar o aluno em aulas de Literatura. Tal

subjetividade também foi citada por Cláudia.

Vibro bastante quando percebo o envolvimento claro dos alunos com as histórias... Pude perceber isto, muito fortemente, na última aula dada para as turmas de quarto

ano. O texto trabalhado foi um conto extraído do livro Príncipes do destino, que

aborda a mitologia africana relacionada aos odus, representação religiosa associada

ao jogo de búzios. A participação oral foi marcante, com muitas suposições,

desdobramentos e conclusões bastante surpreendentes... Ficou evidente a interação

com a obra! No final, os alunos saíram da sala, interpretando os príncipes do destino,

“carregando” as abóboras presenteadas no conto (Cláudia, 15/07/16).

Após o estudo do conceito de educação literária, percebemos que a vivência estética é

uma parte do todo. Ela é uma das dimensões da literatura no âmbito da Educação Literária.

Metodologicamente, não é possível afirmar que alguém vivenciou esteticamente aulas de

Literatura. No máximo, podemos afirmar que ela provavelmente vivenciou esteticamente tais

aulas, a partir dos relatos que narram transformações que viveu, emoções que sentiu e as

reflexões que fez. Sandra avalia seu aluno com base nos gestos e relatos que mencionam em

sala. Na entrevista ela relata uma aula, a partir do texto O auto da Compadecida, de Ariano

Suassuna:

eu peguei, eu acho assim é uma aula que eu fico lembrando que eu acho que eu vou

repetir esse ano. Eu peguei o filme dele, O auto da Compadecida, e peguei um texto

da peça dele. Então, eu não podia passar o filme todo senão ocuparia a aula. Eu

peguei três trechos do filme. Passei a primeira parte do filme que eu queria passar. Parei o texto. Eles começaram a ouvir as falas dos personagens. E eu determinei três

alunos para serem justamente personagens. Então, nós fizemos uma leitura do texto

junto com as crianças que fizeram o papel dos personagens. O texto era uma peça

teatral. Aí, os alunos tinham já ouvido falar o som, o sotaque nordestino dos

personagens. Eles começaram a ler como os personagens. Aquilo ali foi fantástico!

Tanto os dois alunos lendo, fazendo a leitura do personagem, do texto, do diálogo. E

depois passei a outra parte do filme. Mais uma parte do filme para eles concluírem.

Foi assim dois tempos fechadinho. Não teve, não tive aproveitamento nenhum desse

texto. Aí, quando eu fui dar a reunião de pais, um pai chegou perto de mim e falou

assim: “a senhora”. Porque eu falei com eles: “Olha, esse filme aqui vocês não

podem assistir sozinhos, é um filme mais pesado que realmente tem umas cenas ali”.

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Aí, o pai chegou assim para mim: “você não sabe o que aconteceu! Minha filha

chegou querendo assistir esse filme, pegou na locadora para gente assistir juntos”.

Ah! Eu fiquei emocionada (risos). Então, você vê o alcance. “E eu assisti junto com

ela e porque era da minha terra”, o pai falou. “Era da minha terra”, quer dizer... E ele

resgatou isso pra mim. Eu achei aquilo fantástico, o relato dele! Porque realmente eu

alcancei quem eu tinha que alcançar. Extrapolou a sala. O cinema entrou na casa.

Teve articulação com a origem do pai. Será que os outros 24 [alunos], eu não sei. Eu

sei que depois as crianças queriam assistir a esse filme, pegá-lo. Mas eu acho que

extrapolou (Sandra, 23/05/16).

Como avaliar aulas de Literatura? Segundo Eco (2016, p. 252), o fruidor ou

contemplador reage aos estímulos físicos do objeto de modo intelectual, mas também corporal

e emocionalmente. Assim, a fruição do objeto é pessoal, mutável e aberta. Concordamos com

Sandra quanto à dificuldade de avaliar o aluno em aulas de Literatura devido à complexidade

de questões que são movimentadas durante a experiência literária.

No processo de ensino-aprendizagem da literatura, Sandra concorda com as

orientações da escola de não reprovar o aluno na disciplina: “a gente não vai reprovar nenhum

aluno, a gente tem que ter essa preocupação”. Junto dessa preocupação vem a questão do

gosto do aluno. A tensão entre o lúdico, no sentido do prazer e da satisfação, e do lúdico como

fabulação reaparece:

Mas até que ponto a gente está transmitindo alguma coisa, eles estão aprendendo,

eles estão gostando? Por isso que eu acho tão importante a gente avaliar se o aluno

gostou ou não da leitura. Quando o aluno não suportou a leitura. Então, tem alguma

coisa errada. Ou o livro não está atendendo ou o jeito que a gente está mostrando

esse livro tá precisando ser alterado (Sandra, 23/05/16).

O modo de planejar a atividade também revela como a coordenadora compreende o

processo de ensino-aprendizagem da literatura. Na seleção do texto literário trabalhado, sua

extensão é considerada: “Você não vai dar um livro. Eu acho até difícil de trabalhar um livro.

(...) não dá para você ficar muito tempo com a criança, (...) mais de meia hora, (...) 45 minutos

lendo porque ninguém aguenta”. Sandra considera importante que a leitura aconteça junto

com a discussão do texto: “Vai discutindo e vai contando para as crianças para a leitura poder

avançar naturalmente”. A ênfase na conversa, enquanto a leitura é desenvolvida, é uma marca

da Sandra e também das aulas da Cláudia, o que será visto mais adiante.

Quanto à extensão do texto, é importante problematizarmos que, se os textos literários

mais extensos não estão sendo lidos nas aulas de Literatura, será que são nas aulas de Língua

Portuguesa? A leitura de coleções, de novelas, peças teatrais e romances fica comprometida,

se as aulas de Língua Portuguesa não estiverem contemplando tais textos. Quais obras são

importantes?

A professora Mariana entende que “a literatura infantil deve ser apresentada como arte

onde o aluno pode explorar toda a riqueza de contos e histórias”. Esta concepção de literatura

é a mesma defendida por Coelho (2000). Para a autora literatura é arte e a mais importante das

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artes porque a sua matéria é a palavra, que é a especificidade do humano. Nesse trecho da

entrevista Mariana se posiciona quanto à sua concepção de literatura e dá a entender o que,

para ela, é a especificidade da disciplina: a exploração da riqueza dos contos e das histórias.

Entendemos que ela se refere à riqueza literária. Embora o PPP (CPII, 2008) marque que tal

especificidade se trata das construções literárias dos textos, nas aulas da professora Mariana

não observamos ênfase nessas construções.

Em seu trabalho como professora de Literatura ela considera importante “o ato de

resgatar o papel do contador de histórias na escola”. A busca pelo resgate do papel do

contador de história talvez tenha relação com os contadores que havia na família de Mariana.

Entendemos que, de fato, é relevante resgatar os contadores de história na escola, na medida

em que os textos da tradição oral também pertencem à literatura. Apesar de Mariana ler o

texto literário, ela se coloca como quem conta.

Esta visão do ensino-aprendizagem da literatura era concretizada nas suas aulas por

meio do uso de recursos diversos. A utilização de diferentes recursos com os alunos visava a

“despertar o interesse pelas narrativas e para que pudessem encontrar desafios, criando em

atividades decorrentes, representações espontâneas, bem como soluções para muitas de suas

dúvidas e problemas”.

A turma do primeiro ano, no dia 14/11/14, na aula da professora Mariana, chegou à

sala de Literatura e assistiram a um vídeo sobre as diferentes nações indígenas. Durante a

exibição, os alunos comentavam: “A vida deles é dura!”, “Tem uma moça muito velha”. A

professora se preocupou em destacar a variedade das nações indígenas. Enquanto isso, as

crianças falavam se já haviam visto de perto índios ou não. Nesse momento Mariana

perguntou: “Quem sabe o que é Iauaretê?”. Ninguém sabia. Ela chamou a atenção dos alunos

para um Power Point informativo com os personagens da história (onça pintada e jabuti) e um

pé de jabuticaba, onde parte da fábula lida ia acontecer. Imediatamente, os alunos começaram

a relatar suas experiências com esses animais e a jabuticaba. Perceberam que dentro da

palavra jabuticaba tem a palavra jabuti. Depois, a professora leu a fábula “Iauaretê e o jabuti”,

do livro As fábulas de Iauaretê, de Kaká Wera Jecupé. Enquanto lia, fazia vozes diferentes,

mostrava as ilustrações, fazia caretas e gestos. As crianças perceberam que a onça foi

enganada e qual era a razão das pintas da onça. Mariana perguntou: “Quem acha que o que o

jabuti fez com a onça foi certo? Com o jabuti amarrando a onça na jabuticabeira, o que

aconteceu?”. As crianças compararam a onça-rei com o leão, pois o texto quebrou a

expectativa delas quanto a quem é o rei da floresta. No fim, as crianças produziram a cabeça

do Iauaretê (onça) com origami e desenharam o seu corpo, além do desenho do jabuti e da

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jabuticabeira. Durante o momento de produção os alunos puderam observar as ilustrações do

livro. A professora informou que foi a filha do autor que ilustrou o livro. Por essa razão, todo

mundo quis reler as ilustrações do livro. Os alunos mostravam uns para os outros os seus

trabalhos.

A utilização de diferentes recursos mostra a importância dada ao convite para a leitura.

Nesta preocupação duas ideias podem estar em tensão. Uma de que o próprio texto literário

não basta para convidar o leitor. Então, deve-se envolvê-lo com outros recursos. Outra de que

é importante para chamar o leitor para entrar na fabulação. A presença de objetos, vídeos,

canções na sala possibilita a entrada do aluno no texto, enriquecendo o seu imaginário.

A professora Mariana estava dando aula para o 1º ano, no dia 28/11/14, e começou a

aula apresentando o tema do livro, a história do Brasil, como também a autora e a ilustradora.

Nesse momento inicial os alunos já teciam os seus comentários sobre o tema: “1500 anos é

quase o ano dos negros!” e “Minha tia mora em Portugal!”. A professora perguntou: “Quem

conhece a Ruth Rocha?”. Quase todos os alunos responderam que conheciam. A professora

lia e explicava algumas partes da história, fazia vozes características dos personagens e usou

uma coroa para representar a entrada do rei na história: “O que queria dizer a presença da

águia?”. O aluno respondeu: “Terra à vista!”. “Que gente era essa que eles encontraram?”, a

professora perguntou. “Índios!”. Mariana, em seguida, mostrou fotografias dos lugares que

aparecem na história. Enquanto isso, o livro ficou passando nas mãos dos alunos. A

professora mostrava a fotografia e a ilustração que correspondia ao lugar. Explicou a razão

dos nomes Porto Seguro, Santa Cruz, Cabrália, Coroa Vermelha, Igreja de Nossa Senhora da

Conceição, nau do descobrimento e os índios Pataxós. Ela indaga se alguém já foi a esses

lugares. Em seguida, os alunos assistiram a um vídeo sobre os índios Pataxós. Depois, exibiu

o vídeo A Bahia que a gente gosta. Santa Cruz Cabrália. Os alunos aproveitavam para

perguntar: “Tia, aí existe leão?”, “O Pedrinho da história era o Pedro I?”. Após o vídeo, mais

uma exibição. Agora, os alunos iam assistir a uma animação chamada Pindorama, do grupo

Palavra Cantada. Enquanto assistiam, a professora disponibilizou a coroa do rei para as

crianças brincarem. Mariana dançou com a música e chamou atenção para partes da música

com voz de português.

A professora Cláudia procura não perder de vista “o fato de que é função da escola

formar leitores críticos e a autônomos”. Para ela este é o principal objetivo das aulas de

Literatura. A linha de força Leitura e Experiência/Formação também aparece no discurso de

Cláudia, que repete o objetivo geral do currículo de Literatura.

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Sua visão de ensino-aprendizagem de literatura passa pela compreensão de que o texto

literário “não pode ser compreendido como objeto isolado, sem as interferências do leitor,

sem o conhecimento das condições de produção e sem as contribuições das diversas

disciplinas que perpassam o ato da leitura literária”. O destaque que a professora Cláudia dá à

conversa, bem como as coordenadoras, mostra a influência da Teoria Literária na vida

profissional delas, no que se refere ao pacto narrativo (COLOMER, 1994, p. 40).

Ao contrário de Mariana, que se esforça para que a leitura que ela realiza promova a

maior fabulação possível pelos alunos por meio de uma encenação teatral por parte dela,

Cláudia junta a conversa com a leitura e, nessa junção, deixa os alunos interferirem bastante e

compartilha outros conhecimentos que se articulam com o texto. O texto literário é lido junto

com as intervenções dos alunos, ora provocadas por ela, ora por eles. Em suas aulas Cláudia

se esforça para convocar o leitor/ouvinte a participar da obra, a pensar junto, a brincar, a

interagir, a refletir, a inferir, a opinar, a apreciar, a rir, a chorar, a sentir (CORSINO, 2014, p.

31).

Com uma turma de 4º ano, no dia 18/03/16, Cláudia promoveu a leitura da crônica

“Na delegacia”, de Carlos Drummond de Andrade. Durante a leitura, os alunos perguntavam:

“O que é desmoralizado?”, “Se os policiais sabiam que tinham marginais na casa, por que não

foram lá?”. As perguntas foram respondidas coletivamente. Cláudia trouxe um ponto

polêmico do texto: “Ela teve uma atitude macha. O que quer dizer isso?”. Após conversarem

sobre machismo, a professora conduziu o grupo para a reflexão sobre a forma do texto: “Por

que esta história é curta? Ela tem que tom?”. Os alunos entenderam que crônicas são textos

mais curtos e que podem apresentar o humor. Em seguida, a turma ouviu a canção All Star, de

Nando Reis. Os alunos, com a letra da música nas mãos, cantaram e assistiram ao clip da

canção. Com o fim da exibição, a professora indagou: “Há algo em comum entre esses dois

textos? Qual é a diferença entre os tipos de texto: o poético e a crônica?”. Os alunos

observaram que “As linhas são pequenas”. “Como se chama cada linha dessa?”, tornou a

perguntar Cláudia. “Verso”, responderam. A professora, em seguida, pediu que um aluno

lesse uma estrofe. Ela questionou: “Como ele sabia chegar à casa dela, mas não sabia o

endereço? Vocês têm algum lugar que vocês sabem chegar, mas não sabem o endereço?”. No

final da aula os alunos receberam uma folha A3 e, por meio da dobradura, fizeram uma casa

com portas que se abrem. Na parte de dentro da dobradura os alunos desenharam como

imaginavam a casa da crônica. Enquanto faziam a atividade, a professora colocou a música

All Star novamente.

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Cláudia concretiza sua visão de ensino-aprendizagem da literatura, procurando

proporcionar em suas “aulas um espaço lúdico para construção de novos sentidos, onde a

imaginação do leitor é guiada pelos indícios do texto no ato dinâmico da leitura”. Cláudia traz

para conversa muitas perguntas. As aulas da professora pretendem ser momentos de

formação, o que pode ser observado na aula do dia 11/03/16. Com uma turma de 4º ano

Cláudia leu a crônica “No país do futebol”, de Carlos Eduardo Novaes. Os alunos sentaram no

chão, nas cadeiras, deitaram nos bancos. Sua leitura é bastante interrompida para fazer

perguntas de antecipação, contextualizar um trecho, explicar uma expressão. “Por que ele se

fingiu de mendigo? Ele é um mendigo?”, perguntou a professora. Ela explicou que as crônicas

podem ter presentes o humor e resgatou um trecho do texto: “O que ele quis dizer com sempre

pode pingar alguma coisa e onde está o seu controle remoto?” e “O que são retardatários?”.

Ela recomendou que eles esperassem o término da leitura para inferirem o significado de

retardatários. As crianças não conseguiram identificar. Ela, então, explicou. Depois, os alunos

deram exemplos. Uma aluna se recordou da história da corrida entre a tartaruga e o coelho.

No final os alunos escreveram o que aconteceu depois na crônica.

6.3 Temas geradores

Nas aulas observadas foi possível notar que entre concepções e práticas há um diálogo

estreito. O tema gerador está presente. Os livros lidos são selecionados conforme o tema e há,

de modo geral, espaço para o diálogo. As propostas vêm após a leitura e são planejadas de

acordo com o que o livro suscita, como uma maneira de o leitor conferir uma resposta ao

texto literário.

Vê-se que há a intenção de provocar transformações nos padrões culturais, nos

comportamentos e nas identidades por meio, principalmente, dos temas Rio de Janeiro, A

formação do povo brasileiro, Estereótipos e Memória. Tal intenção fica mais visível no tema

Eu e o outro: diferenças e semelhanças/pontos de vista. Vale ressaltar que a literatura ligada

às culturas indígenas e africanas ocupa um espaço generoso na grade temática.

Os temas geradores são diferentes para cada trimestre e ano escolar. Eles ora são de

fato tema, ora também são um gênero literário. No item a seguir trazemos um quadro com os

temas geradores, mostrando como as aulas de Literatura os organizam. Eles estão de alguma

maneira integrados aos temas propostos pela Língua Portuguesa.

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TEMAS

GERADORES

1º ano 2º ano 3º ano 4º ano 5º ano

1º período Literatura Identidade As diversas

culturas Fábulas e contos Rio de Janeiro Medo e suspense

Língua

Portuguesa

Identidade

Crianças do

mundo/Histórias

de outras partes

do mundo

Eu e o outro:

diferenças e

semelhanças/pontos

de vista (fábulas)

Rio de Janeiro Contos de

medo/Suspense/Terror

2º período Literatura

Animais

A tradição oral

nas culturas

africanas e

indígenas

A formação do povo

brasileiro Medo

Culturas africana e

indígena

Língua

Portuguesa Animais Diversidade

cultural

Bairros da

cidade/Memória

Rio de Janeiro

colonial/imperial

Cultura

Popular/Contos

fantásticos

3º período Literatura Contos de

Fadas Família/Memória

Contos de

encantamento

contemporâneos

A mitologia

grega, romana,

africana e

indígena

As diversas mídias na

literatura

Língua

Portuguesa Contos de

Fadas Memória

Transgressões/Quebra

de estereótipos

Heróis da

ficção/Heróis do

mundo

Crônicas e histórias

clássicas

Quadro 3. Temas geradores.

Os temas geradores são escolhidos pela equipe docente. A coordenadora traz propostas

de mudanças a partir da conversa que tem com as demais coordenadoras pedagógicas da

escola (Língua Portuguesa, Estudos Sociais, Matemática e Ciências). O campus Humaitá I

passou a realizar trimestralmente reuniões de planejamento integrado, quando um tema do ano

escolar é escolhido em equipe e, posteriormente, cada área decide como contribuir. A

intenção da escolha de um tema em comum para um ano escolar é possibilitar a integração

entre as áreas do conhecimento.

Como exemplo, tem o tema identidade que foi escolhido para o 1º trimestre do 1º ano.

Os livros selecionados, a partir dos critérios de qualidade literária, autor, extensão e tema,

foram: O menino Nito, de Sandra Rosa e Victor Tavares; Menina bonita do laço de fita, de

Ana Maria Machado e Rosana Faria; Tanto, tanto, de Trish Cooke; De bem com a vida, de

Bia Hetzel e Mariana Massarani; Ana e Ana, de Célia Godoy e Fê; Diversidades, de Tatiana

Belink; Obax, de André Neves; O menino e o jacaré, de Maté; Grande pequeno, de Blandina

Franco e José Carlos Lollo; O cabelo de Lelê, de Valéria Belém; Bruna e a galinha d’Angola,

de Gergilga D‟Almeida e Valéria Saraiva; e O menino e o cachorro, de Simone Bibian e

Mariana Massarani.

A coordenadora Sandra deu uma aula no dia 21/03/16 a partir do livro Menina bonita

do laço de fita. Em roda, os alunos foram convidados a conversar sobre o que é uma menina

bonita. A professora perguntou quem conhecia o livro e se sabiam contar a história dele. Ela

explorou a capa, nome do ilustrador e do autor e o título. Sandra perguntou: “O que precisa

para ser bonito? Como a gente se torna uma pessoa bonita? Para ser bonito o que a gente

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precisa fazer?”. Os alunos deram respostas diversas, tais como: “ser você mesma”, “ser

educada”, “se maquiar”, “ser comportada”, “se vestir bem”, “pedir desculpas”. A leitura do

livro também foi feita com a exibição do livro animado. O vídeo começa com crianças

conversando sobre o que é uma criança bonita, assim como foi o início da aula. Depois, as

crianças desenharam uma criança bonita e mostraram para os demais, explicando suas

produções. Em seguida, a escritora foi apresentada. A turma, então, se deitou no chão e nos

bancos, preparando-se para a leitura audiovisual. Prestaram muita atenção. No final,

receberam uma folha. De um lado, desenharam a personagem principal do livro e do outro,

uma pessoa bonita. Os alunos podiam ainda escrever o que era ser bonito. Nesse momento

uma aluna começou a chorar dizendo que não sabia escrever. Sandra disse que tudo bem e que

ajudaria a escrever. As crianças apresentaram dificuldade na hora da pintura da menina: preto

ou marrom? Para os alunos, para ser bonito “tem que ser forte”, “respeitar pai e mãe”, “ser

você mesmo”, “ser forte e corajoso”, “ser chique”, “ser educado”, “ter amor”, “ter boas

maneiras”.

Em uma turma de 5º ano a professora Cláudia, em 16/03/16, iniciou o estudo do texto

de apresentação do livro Bá e as visagens, de Augusto Pessoa, que culminou em um teatro de

fantoches realizado pelos alunos na aula de 23/03/16. O livro contém vários contos. Foram

lidos coletivamente quatro, “Bá e as visagens”, “A porca de bobes”, “Ciranda de ossos” e

“Procissão das almas”. Após a leitura dialogada dos contos, na aula seguinte, as crianças

produziram, cada uma delas, um personagem. Elas se dividiram em grupos e cada um tratou

de um dos contos. Os alunos apresentaram lendo o texto na íntegra, fazendo vozes e mexendo

seus personagens. A professora organizou uma mesa com uma toalha para, na hora da

apresentação, aparecerem somente os personagens. Enquanto a dramatização acontecia, a

professora, quando achava pertinente, realizava intervenções quanto à velocidade da leitura e

a aparição dos personagens, os gestos necessários para as cenas, e também acrescentou um

elemento do cenário feito por outra turma. No final da aula Cláudia fez uma avaliação com a

turma e ressaltou os pontos positivos e negativos das apresentações.

Comparando as aulas do 1º ano e 5º ano, vimos que, como os alunos do 1º ano entram

pelo sorteio, há um grupo bastante heterogêneo no que se refere ao repertório literário e aos

conhecimentos relativos à leitura e à escrita. Nas aulas de Literatura essa heterogeneidade

aparece com mais força na conversa sobre o texto literário. A partir do segundo trimestre,

estas diferenças não são mais tão marcantes. A relação afetiva com a professora já está mais

garantida, o repertório de leituras está ampliado e eles se sentem mais confiantes para tecer

comentários, fazer perguntas e relatar experiências que viveram com relação ao livro.

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O 5º ano já sabe como a aula de Literatura acontece e aguenta ficar mais tempo

ouvindo a leitura da professora. Ele já se apropriou da tríade leitura, conversa e produção.

Eles são mais exigidos na leitura e na escrita, como também na argumentação. Por outro lado,

eles também mostram as fragilidades do trabalho. Em uma aula da professora Mariana, no dia

18/05/15, ela levou o livro Contos de assombração, da Editora Ática, coedição Latino-

Americana. A professora propôs, após a leitura e a conversa, a produção de um álbum com

personagens divididos em três partes, de modo que o leitor poderia misturar diferentes

personagens usando a cabeça de um, o tronco de outro e as pernas de outro personagem.

Alguns alunos se recusaram a fazer a atividade: “De novo, professora? Não vamos fazer, não.

Já fizemos esse álbum”.

Vale notar que, na grade temática e na lista dos livros lidos no ano de 2016, em

articulação com os temas propostos, Maria Clara Machado não aparece no itinerário de leitura

dos alunos, assim como os livros mais extensos. No apêndice F há a lista dos livros lidos com

os alunos. Observamos a presença de ilustradores importantes, como Graça Lima, Marilda

Castanho, Eva Furnari, Roger Mello, Mariana Massarani. Mas não vimos Ziraldo, Juarez

Machado, Angela Lago, Rui de Oliveira, Nelson Cruz, Odilon Moraes. No que se refere aos

escritores, há Roseana Murray, Manuel Bandeira, Ferreira Gullar, Vinicius de Moraes. Porém,

tal itinerário de leitura não contemplou Olavo Bilac, Monteiro Lobato, Graciliano Ramos,

Érico Veríssimo, Figueiredo Pimentel, Sérgio Capparelli, Elias José, Leo Cunha, Cecília

Meireles, Mário Quintana, Cora Coralina, José Paulo Paes, Manoel de Barros, por exemplo.

Não observamos a preocupação em garantir um itinerário de leitura que dialogasse

estreitamente com a história da LIJ. Por isso, pensamos que é importante listar obras e autores

imprescindíveis à leitura dos alunos do EFI a fim de garantir o acesso e a apropriação deles

sem excluir os textos que vêm sendo selecionados. Nesta questão a integração entre Língua

Portuguesa e Literatura é fundamental, porque as coordenadoras têm como garantir um

itinerário de leitura que valorize obras e autores importantes para a formação literária dos

alunos.

6.4 Corpus nas aulas de Literatura: textos/materiais, critérios de seleção e modos de

apresentação

Para a coordenadora Renata os textos lidos nas aulas de Literatura eram os livros que

compunham o acervo da disciplina. Outros materiais também eram usados nas aulas, como

adereços (chapéu de bruxa, óculos, roupas, xale); materiais comestíveis (biscoitos); música

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(com a letra digitada); quebra-cabeça, caça-palavras etc. A equipe comprava, na medida da

possibilidade, livros que contemplassem os temas de trabalho: “para facilitar na hora da gente

achar (...) a gente arrumava no armário por temas”, como folclore, clássicos, terror e poesia.

Havia outras seções. Mas Renata não se recordou na entrevista.

O livro era lido no suporte porque “As crianças têm que saber que as histórias, aquilo

tudo sai dos livros”. Na leitura compartilhada do livro Renata contou que as professoras

faziam a voz da personagem e que, às vezes, usavam um ou outro adereço. Mas elas não se

fantasiavam para “contar história”. Porém, eventualmente, a leitura contava com uma

dramatização. Como exemplo, temos uma aula planejada para o 1º ano:

Teve um dia que a gente contou uma história que a mãe, a mãe fez uns biscoitinhos para as crianças, eram dois irmãos. Tocaram a campainha era o nome da história!

Tocaram a campainha, aí chegaram mais dois. Aí, as crianças viram que tinham 12

biscoitos que já ia ser 6 para cada um, ia dividir por três. Depois, chegou mais gente,

ia dividir por quatro, por cinco. Daqui a pouco, sobrou um biscoito para cada um.

Mas, como só tinha um biscoito para cada um, tocaram a campainha. Quem era? A

vovó! Chegou com um prato de biscoitos novos que ela tinha feito. E aí todo mundo:

“Eh! Eh!”. E, aí, nisso, eu me vesti de vovozinha, né, botei um, prendi o cabelinho,

botei o oculozinho assim, botei um xale, comprei rosquinhas Mabel (risos). E aí,

comprei rosquinhas Mabel e bati na porta. Aí, a Mariana: “Vocês escutaram alguém

bater na porta?”, “É, bateram”, “Quem é? Pode entrar!”. Aí, eu entrei: “Bom dia!

(com voz de velhinha) Vocês estão bem? Ouvi dizer que acabaram os biscoitos. Eu

trouxe mais para vocês!”. As crianças ficaram malucas. (...) E acabou a aula com eles comendo mais biscoitos. Entendeu? Uma vez ou outra a gente fazia isso. Que é

um enriquecimento, né? Quer dizer, o personagem saiu do livro e apareceu ali. Eles

adoravam! (Renata, 03/02/15).

A equipe também usava a música. Renata citou A Dona Árvore (Bia Bedran). A

professora lia a história e botava a música para as crianças ouvirem. Ela entregava ainda a

letra da música digitada: “Então, eu fazia questão de mostrar que também tinha uma música

com aquele tema”. Essa intenção mostra que Renata tinha a preocupação de ajudar o aluno a

estabelecer relação entre o texto literário e demais textos, conforme prevê a proposta

curricular (CPII, 2008). Ademais, a equipe preparava quebra-cabeça e caça-palavras. A

presença de jogos parece ter sido uma marca da coordenação de Renata, o que não perdurou

na coordenação de Sandra.

Duas linhas de força estão em tensão no discurso de Renata: Experiência/Formação e

Ludismo. Possibilitar que o aluno estabeleça relações da literatura com outros textos, planejar

uma vivência significativa da literatura por meio da dramatização, fazer o aluno entrar em

uma cena do livro estão na direção da formação. Já os jogos, vimos a presença deles em

algumas poucas aulas, com um quiz sobre contos de terror que haviam sido lidos e quebra-

cabeça de um gato que foi protagonista do livro da aula. Os alunos adoraram ambas as aulas.

Eles entraram no jogo, não foi um momento qualquer.

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No caso do quiz, ele aconteceu na aula do dia 13/04/15 com uma turma do 5º ano.

Após terem passado o trimestre estudando o tema medo e suspense, a professora Mariana

levou um quiz para os alunos sobre os contos estudados. Mariana fez treze perguntas sobre os

três livros de terror que leram, tais como: a morte se apresentou para o autor do livro Bá e as

visagens? Em que livro isso ocorre: a) Sete ossos e uma maldição, b) Bá e as visagens ou c)

Contos de morte morrida? Livro em que todos os contos têm a morte? No conto “A morte e o

pescador”, a morte se torna madrinha do pescador? Visagem é fantasma, assombração ou

coisa de outro mundo? No livro Bá e as visagens o autor diz que Bá era como se chamava a

vó dele Bárbara? Teresa Bicuda antes de morrer pediu que chamassem o padre para ela.

Verdadeiro ou falso? Etc. O quebra-cabeça foi para uma aula do 1º ano com a professora

Mariana, em 08/05/15. A turma leu o livro De bem com a vida, de Bia Hetzel, e depois

recebeu um quebra-cabeça de papel que tinha um gato, personagem principal do livro, para

ser pintado. Em seguida, cortaram as peças do quebra-cabeça e misturaram com as dos

colegas do grupo em que estavam sentados. Brincaram de misturar gatos. As crianças

adoraram. Enquanto isso, um aluno passava pelos grupos segurando uma lixeira e dizendo:

“Alguém tem alguma coisa para a Gulosa? A Gulosa está com fome?”. As crianças foram

dando o lixo produzido no recorte do quebra-cabeça.

Sandra continuou o que Renata iniciou quanto ao cuidado com a articulação dos textos

literários com outros textos: “Eu gosto muito de trabalhar em literatura com outros recursos.

Não só com livro. Por exemplo, você conta um livro, mas você pode passar um documentário.

(...) um curta-metragem. Você pode colocar uma música também. Você pode pesquisar”.

Segundo Sandra, os alunos gostam de ver a interlocução do texto literário com outras artes,

com outros textos. Esses textos, segundo Sandra, podem entrar em pé de igualdade com o

texto literário proposto, como em uma rua de mão dupla, provocando diálogo entre eles. Há,

então, uma preocupação com a formação. Porém, “às vezes, o texto não é o principal da

história (risos). (...) se torna uma coisa secundária naquela aula. De repente, o debate, a

informação é o mais importante do que o próprio texto”. Neste sentido a literatura entrou

como pretexto para o debate de um assunto.

Além do cuidado com a articulação dos textos literários com outros textos, ela

manteve os temas e, na entrevista, citou a metodologia de projetos de trabalho como

contraponto ao trabalho a partir de temas: “eu nunca trabalhei muito com projeto. Projeto é

uma coisa, assim, para mim, é muito recente. (...) eu já trabalhei com projeto quando eu estava

em sala de aula. Mas na literatura eu não estou conseguindo encontrar um meio de trabalhar

com projeto”. Observamos nas aulas que, com a estrutura de um texto para cada aula e o

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planejamento das aulas sem a consideração da demanda dos alunos, a metodologia de projetos

de trabalho realmente fica difícil de entrar. O que os alunos gostariam de fazer nas aulas de

literatura? Segundo Hernández (1998, p. 82) esta metodologia é

Um percurso por um tema-problema que favorece a análise, a interpretação e a

crítica (como contraste de pontos de vista).

Onde predomina a atitude de cooperação, e o professor é um aprendiz, e não um

especialista (pois ajuda a aprender sobre temas que irá estudar com os alunos).

Um percurso que procura estabelecer conexões e que questiona a ideia de uma

versão única da realidade.

Cada percurso é singular, e se trabalha com diferentes tipos de informação. O docente ensina a escutar; do que os outros dizem, também podemos aprender.

Há diferentes formas de aprender aquilo que queremos ensinar (e não sabemos se

aprenderão isso ou outras coisas).

Uma aproximação atualizada aos problemas das disciplinas e dos saberes.

Uma forma de aprendizagem na qual se leva em conta que todos os alunos podem

aprender, se encontrarem o lugar para isso.

Por isso, não se esquece que a aprendizagem vinculada ao fazer, à atividade manual

e à intuição também é uma forma de aprendizagem (HERNÁNDEZ, 1998, p. 82).

Após essa fala de Sandra, perguntamos se ela achava que trabalhar com a metodologia

de projetos de trabalho era necessário na Literatura, e sua resposta foi: “Eu, particularmente,

acho que não, entendeu? Porque eu não sei se está atendendo às minhas expectativas”. Sandra

parece ter pouca intimidade com essa metodologia, de modo que não vê uma maneira de

estabelecer relação entre ela e a estrutura pedagógica das aulas de Literatura.

As expectativas da equipe de Literatura estão atendidas na medida em que o tema do

trimestre já confere contexto para as aulas. E quais são as expectativas dos alunos? Elas são

importantes? Nas falas das coordenadoras e professoras vemos que elas avaliam se a aula foi

boa ou não, conforme o quanto que significaram para os alunos. Então, o que o aluno

responde a essas aulas vale para a equipe. Até agora o aluno entra na conversa sobre o texto.

Sandra defende que a maneira de apresentar os textos seja acompanhada de uma conversa

antes, durante e depois da leitura do texto principal da aula.

A professora Mariana não citou os textos que eram lidos nas aulas de Literatura.

Contudo, reiterou que eles, bem como os diferentes materiais usados, eram “escolhidos de

acordo com as temáticas das séries, durante as reuniões de planejamento da equipe de

literatura com a coordenação”. Os modos de apresentação dos textos e dos materiais variavam

e se mesclavam com as atividades propostas, como leitura de livros, teatro de fantoche,

filmes, vídeos, músicas.

Na aula de 06/04/15 a professora Mariana distribuiu classificados do jornal para a

leitura dos alunos. Ela explica: “Os classificados foram distribuídos para vocês conhecerem

como eles são. Servem para trocar, comprar, alugar, passar o ponto, detetive particular”. Os

alunos pedem que a professora apague a luz e coloque som de terror: “A história é muito de

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terror, aterrorizante? Então, põe som de trovão!”. A professora inicia a leitura do texto

“Crianças à venda, tratar aqui”, de Rosa Amanda Strausz. Ela escreve no quadro o nome da

autora, mostra a sua foto e diz que ela já visitou o colégio: “O título do livro é Sete ossos e

uma maldição. Nós vamos trabalhar um dos contos. De que trata esse conto? Vocês vão

ouvir”. Sua leitura é repleta de gestos e vozes diferentes. Quando Mariana leu o trecho “O

primeiro a ser vendido foi o Tião”, a turma riu bastante porque havia um Tião na turma. Os

alunos mais uma vez pediram que a professora colocasse a música de trovão. Os alunos

prestaram muita atenção. A professora produziu uma casa para ilustrar melhor uma das cenas.

O aluno perguntou: “Tem figura?”. E a professora apontou para a casa que fez. Os alunos

comentaram a leitura: “Tão maltratando o moleque!”, “Ele devia estar morto!”. Mariana

mostrou um cartaz com um homem produzido por ela com o objetivo de mais uma vez ilustrar

uma cena. As crianças foram ficando com um olhar triste. Durante a leitura, alguns alunos

pegaram a casa que a professora fez e ficaram observando, comentando seus detalhes. Um dos

alunos fingiu que chorava conforme a professora narrava a morte de uma personagem. Esse

mesmo aluno repetiu as falas da professora ou respondeu às perguntas que as personagens

faziam entre si. Um aluno pediu: “Conta o resto, conta o resto”. Para a surpresa da turma, não

tinha resto. A professora perguntou: “O que vocês entenderam? O que aconteceu é para a

gente pensar. Essa mãe merece ser culpada ou não?”. As respostas foram diversas, a saber:

“Ela não foi saber do filho”, “Ela queria dinheiro”, “Ela não pensou em visitar a casa

primeiro”, “No começo, ela falou que ela queria um futuro melhor para os filhos do que o

dela. Ela ficou obcecada pelo dinheiro”, “Eu não concordo com algumas pessoas que

disseram que ela só ligou para o dinheiro”, “Essa mãe é e não é culpada porque ela pensava

nos filhos. Não tinha dinheiro para comprar um fogão!”. Uma aluna chorou por causa do final

da história. Quando a conversa esfriou, a professora os convidou para a atividade final, que

era a produção de um classificado, trocando, vendendo ou alugando algo bem absurdo. Os

alunos ficaram muito animados. A aluna que chorou pediu o livro emprestado para a

professora, que não podia emprestá-lo porque a outra professora, a Cláudia, ia usá-lo na aula.

Ela, então, produziu um classificado que dizia assim: “Troco uma tristeza por um livro

grosso”.

A professora Cláudia também não listou os textos e materiais usados nas aulas de

Literatura, justamente porque “Os textos são escolhidos de maneira coletiva, junto à equipe de

Literatura”. Compreendemos que essa dinâmica de trabalho faz com que os textos não sejam

sempre os mesmos todos os anos. Nas reuniões de planejamento vimos que os cadernos de

planejamento dos anos anteriores são consultados sempre que falta uma ideia ou que há a

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necessidade de verificar uma informação. Elas mantêm as aulas que “deram certo” e alteram

sempre que surge um livro mais interessante. Talvez esta seja a razão de elas não se

preocuparem com um número de obras prescritas para serem lidas no EFI. Elas não fazem

uma lista de antemão para depois planejar as aulas. Tal maneira de pensar as leituras corre o

risco de não garantir a leitura de obras literárias consideradas importantes para um aluno do

EFI ter tido acesso.

A professora Cláudia confirma que os critérios de seleção dos textos e materiais

seguem “a temática selecionada para ser trabalhada, no período, para aquela determinada série

escolar. O material vai ser escolhido a partir das atividades inspiradas pelos textos”. Como

este é um critério muito presente qual atividade o texto inspira , talvez essa seja uma das

razões de alguns textos importantes não entrarem.

Os critérios de seleção dos textos não estão explícitos no currículo. Contudo, as

entrevistas e as aulas mostram que são selecionados conforme o tema. Há uma preocupação

em atender a uma diversidade cultural, o que se vincula com a competência geral e as

competências específicas, como também com os conteúdos do PPP (CPII, 2008, p. 123, 125 e

127).

Não foi observada a preocupação com a multiplicidade de suportes de leitura. O que

há é a busca por diferentes materiais que possam contextualizar, dialogar com a obra lida na

aula. Sobre isso, acreditamos que vale a pena inserir o e-book e conversar com os alunos

sobre e-readers, já que há o surgimento de novas tecnologias (HUNT, 2010, p. 287) na cena

contemporânea.

Outra preocupação observada foi a adequação dos livros aos interesses dos alunos e às

suas competências. Vimos que o campus não segue estreitamente a proposta curricular no que

se refere à ordem de estudo dos gêneros literários, pois há a intenção de integrar-se com as

demais áreas, como também a prática pedagógica mostra o que funciona ou não, o que os

alunos dão conta e o que precisa ser postergado. Tal preocupação talvez justifique a diferença

encontrada entre o que prescreve a proposta curricular e o que as professoras fazem.

Por fim, nota-se a preocupação com a possibilidade de vinculação com outros textos.

Tal aspecto aparece bastante nas competências tanto gerais quanto específicas. Esta

preocupação também se concretiza nas aulas realizadas em parceria com o Laboratório de

Informática Educativa (Lied). Com ele, os vídeos e as imagens são mais presentes, já que ele

visa, principalmente, à contextualização da aula e à produção de um trabalho por meio da

ferramenta da informática.

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Os livros lidos nas aulas estão no apêndice F. Eles são variados. Há leituras clássicas e

contemporâneas da LIJ, conforme prescreve a proposta curricular. Em geral, a equipe

seleciona um livro por aula. Ele é o protagonista da aula. Todavia, ele conta com “recursos

auxiliares”, principalmente vídeos e fotografias. Os gêneros prediletos são os que se referem à

narração; em segundo lugar, à poesia e em terceiro, ao teatro.

Os textos narrativos, no campus Humaitá I, são estudados durante todo o EFI. A

proposta curricular postula que a poesia deve ser estudada somente nos três primeiros anos

desta etapa da educação básica. Porém, ela está presente no 1º, 2º, 4º, e 5º anos. Somente no

3º ano a poesia não se encontra. O teatro entra na proposta curricular de Literatura apenas no

último ano do EFI, no 5º ano. O mesmo acontece nas práticas pedagógicas do campus.

Todavia, a proposta de realizar dramatizações do texto literário está presente nos modos de ler

o livro para as turmas, principalmente nas aulas da professora Cláudia. A proposta curricular

prevê que os textos narrativos sejam lidos do 1º ao 5º ano (textos narrativos: contos de fadas,

contos maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas, fábulas, contos fantásticos, narrativa

mítica, provérbios, quadrinhos e crônicas). Há textos narrativos em todos os anos e em todos

os trimestres. Contudo, não registramos a presença de quadrinhos nas aulas.

Não sabemos dizer se a junção do que o campus prevê de leitura com o que a proposta

curricular prescreve ano a ano é possível. Como a seleção de gêneros literários está vinculada

também ao tema gerador e ao acervo literário disponível, cremos que não é possível afirmar

de antemão que há a possibilidade de haver uma junção. De qualquer maneira, a maior parte

dos gêneros literários está contemplada na proposta curricular que o campus organizou. O que

falta é a inclusão dos quadrinhos.

Quanto aos modos de apresentação do texto literário, todas leem de modo fluente, de

forma envolvente, com entonações e pausas e valorizam a ilustração, conforme Silva (2011)

também constatou em aulas de Literatura do 1º ano do EFI do CPII no campus São Cristóvão.

Para Sandra, que ministra aulas somente para o 1º ano, o momento da leitura começa com

uma brincadeira e a leitura é um momento de ouvir e conversar. Enquanto lê, ela faz vozes

diferentes e explora ilustrações. Ela faz perguntas de localização de informações explícitas

(“Quem eram os caçadores? Disse o camaleão que mudava sempre de...?”), levanta hipóteses

(“Por que será que eles não estavam encontrando a lagarta?”), relaciona textos (a professora

leu o texto informativo sobre a lagarta e perguntou que relação ele tinha com o vídeo),

relaciona o texto com a vida dos alunos (“Tem outro animal que vocês conhecem que vive a

metamorfose? Qual? Quem já tinha visto a transformação da lagarta em uma borboleta?”),

antecipa a história com os alunos. Sandra também traz muitas informações. Como exemplo,

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na aula de 04/04/16, antes da leitura, a professora explicou que a primeira história do livro

mostra o ponto de vista do menino e que a segunda história mostra o do cachorro. Ela

explicou o que era ponto de vista. Apresentou a ilustradora e disse que na semana seguinte

leria outro livro da ilustradora. Informou o nome da autora.

O modo de Sandra aproximar o texto literário dos alunos começa com uma conversa

em roda na sala de aula dos alunos antes de partirem para a sala de literatura. Lá, ela faz uma

introdução da aula por meio de brincadeiras (brincadeira de adivinhação para entrar no tema

do livro, descobrir o nome da autora, chama os nomes do último ao primeiro e os alunos ao

invés de falarem presente, devem dizer o nome de um animal sem repetir etc.). Depois, vai

com o grupo para a sala de literatura, onde novamente os alunos se sentam em roda.

Dependendo do texto escolhido pela equipe, a professora exibe algum vídeo que contextualize

a história (exibição do vídeo da borboleta, conversa sobre o vídeo). Quando isso não cabe, ela

faz perguntas de antecipação sobre a história. Depois que percebe que os alunos estão com o

conhecimento mínimo para entrarem na história, ela inicia a leitura do livro. Após a leitura, se

houver algum comentário sobre o livro, ela para e conversa um pouco mais. Caso contrário,

explica a atividade seguinte.

Para Cláudia o momento da leitura é a hora de ouvir e conversar, como também de

dramatizar cenas do texto. Quando ela provoca seus alunos para vivenciarem os personagens

por meio da leitura dramatizada, promove um encontro com novas pessoas. Segundo Todorov

(2010, p. 80-82), conhecer novas personagens é como encontrar novas pessoas e que, quanto

menos essas personagens se parecem conosco, mais ampliado e rico se torna o nosso

horizonte. Nas aulas da Cláudia a leitura é bastante interrompida para explicar algum trecho,

localizar no mapa alguma informação, apresentar o autor e ilustrador (“Quem é o escritor?”),

contextualizar trechos (“O que estava acontecendo nesta época no Brasil e na África? O que

significa ser um país independente?”), ou perguntar sobre informações explícitas do texto

(“Em que lugar aconteceu a história? Vimos que o Kofi nunca tinha visto uma criança branca

e vice-versa. Como ele imaginava essa criança? O que não conheciam? Quais eram os únicos

seres que conheciam o fogo? Qual foi o plano que elas bolaram para conhecer o fogo? O que

aconteceu quando o braseiro ficou pronto? Qual povo foi estudado? Por que será que esse

lagarto recobrou a sua cor? Quem é Bá? Por que ciranda de ossos? Faltava o quê? Como é que

eles tinham chegado ali? Qual era o nome da moça? Por que a Francisca e sua mãe deram um

tempo da cidade? Quem deu a vela para a Dona Maria? Por que ela ficou trancada rezando?

Por que ele se fingiu de mendigo? Ele é mendigo? Como ele sabia chegar na casa dela, mas

não sabia o endereço?”). Ela também faz perguntas de vocabulário (“O que é petrificado? O

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que é um amuleto? O que significa gadanha? O que será que é uma visagem? O que é

sepultura? O que é cabaré? O que é fúnebre? O que são retardatários? O que é All Star?”),

sobre o contexto histórico, sobre a relação do texto com a vida dos alunos (“O que essa

história ensinou pra gente? Quem viveu uma situação parecida? Vocês têm algum lugar que

vocês sabem chegar, mas não sabem o endereço?”), o narrador (“Quem vai contar as

histórias? Quem está dizendo que vai contar a história?”), para chamar a atenção para algum

aspecto da ilustração (chama a atenção para algo específico da África, para as cores utilizadas

nas ilustrações), informar sobre a estrutura de um gênero discursivo (explica a natureza dos

contos populares: “Por que esta história é curta? Esta história tem que tom?”), resumir um

trecho, perguntar sobre o que virá depois (“O que virá em seguida?”), perguntar sobre temas

sociais (“Por que a fome não é justa? Por que será que dizem que a morte é justa? Ela teve

uma atitude macha. O que quer dizer isso?”), explorar metáforas (“O que significa encontrou

seu destino? O que ele quis dizer com sempre pode pingar alguma coisa? O que o autor quis

dizer em onde está o seu controle remoto?”) e eufemismos, além de estabelecer relação entre

gêneros literários (“Há algo em comum entre estes dois textos? Qual é a diferença entre os

tipos de texto: o poético e a crônica?”).

A professora Cláudia começa sua aula de forma parecida com Sandra. Primeiro,

encontra a turma na sala de aula deles, faz combinados, explica a aula brevemente e, depois,

se dirige à sala de literatura. Lá reserva bastante tempo para a contextualização da obra

(vídeos, mapas, imagens) e para a conversa sobre ela. Esta contextualização também é

dividida com o Lied eventualmente, que em cada trimestre acompanha um ano escolar

diferente. Quando estão na sala de Literatura, às vezes, a contextualização vem de outra

maneira, por meio de uma ambientação (as crianças se sentam em volta de uma fogueira de

mentira, a luz da sala é modificada conforme o tema do livro, objetos são espalhados pela

sala, como caveiras, rolos de cabelo e uma vela). Sempre que há a contextualização ou a

ambientação da sala, quando a leitura finaliza, a professora pede que os alunos estabeleçam

relação entre os materiais utilizados para contextualizar o livro. Durante a leitura, a professora

abre bastante espaço para a conversa, como também para a vivência de uma cena a que ela

queira dar destaque (os alunos tomaram chá, por exemplo, o que fazia parte de uma cena do

livro). Ela também apresenta o livro e recria cenas através da dramatização com os alunos.

Observamos que nas aulas da professora Cláudia as crianças eram muito respeitadas

quanto ao seu imaginário. Tal concepção de infância vai ao encontro do que Travassos (2013)

concluiu na sua dissertação, que pertence à revisão bibliográfica desta pesquisa. A autora

concluiu que a concepção de infância de Lobato tem com marca a valorização e o respeito

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pelo imaginário infantil. As principais personagens de Lobato são crianças livres que

imaginam, trocam ideias, resolvem problemas, criam e recriam o mundo à sua volta.

Para Mariana o momento da leitura não é para conversar. Ele é para ouvir, apreciar,

prestar atenção na leitura da professora que, na verdade, traz uma performance teatral. A

professora faz vozes diferentes, caretas, gestos, usa objetos que caracterizem um personagem,

coloca música de fundo, apresenta o autor e o ilustrador, mostra as ilustrações, explica partes

da história e vocabulário pouco conhecido, produz material para ilustrar cenas dos livros

lidos, olha nos olhos dos alunos, altera o tom de voz. Enquanto ela lê, não permite ser

interrompida.

Na hora da história, não levanta o dedinho para falar (28/11/14, turma 103). Não é para interromper e nem desenhar. Por que estão falando junto comigo? Senão

interrompe a leitura. A aula é desse tamanho e se vocês falarem agora fica desse

tamanho [a professora mostra com gestos que a aula fica menor] (28/11/14, turma

101).

Não dá pra ser uma história legal com vocês interrompendo. Não dá para encadear o

pensamento (05/12/14, turmas 101 e 103).

Parece que o fato de a professora não abrir espaço para a conversa se deve a essa

entrada teatral que ela tem com o texto literário. Ela dramatiza. Após a leitura, ela abre um

espaço para a conversa. Pergunta sobre atitudes dos personagens (“Quem acha que o que o

jabuti fez com a onça foi certo? Essa mãe merece ser culpada ou não? O que vocês acharam

da Albertina?”), a estrutura textual (“O que é rima? Tem rima no texto? Quais palavras

rimam?”), alguns trechos (“O que queria dizer a presença da água?”), informações explícitas

(“Quais são os personagens?”), a relação da vida dos alunos com o texto (“Alguém já foi

nesses lugares?”), vocabulário (“O que é estupefato?”), opinião (“Gostaram?”).

De modo geral, a professora começa a aula contextualizando o livro. Quando há a

parceria com o Lied, a professora toma a frente e apresenta o tema do livro por meio de

imagens e vídeos. Quando não há a parceria, a professora Mariana faz como Cláudia e

ambienta a sala (música com som de trovão para a leitura do conto de terror), apresenta o

tema do livro, o autor, ilustrador ou traz algum curta-metragem ou filme. Durante a leitura,

dramatiza a história, explorando ilustrações e objetos. Depois da leitura, acontece uma breve

conversa e, em seguida, ela apresenta a atividade final. Conforme os alunos vão acabando, ela

coloca um DVD musical de que a turma gosta (Palavra Cantada). Geralmente, o material é do

aluno. Então, como sabem que ela abre esse espaço, eles trazem para a aula. A leitura do livro

também pode ser com livros animados (Ana e Ana, DVD da Coleção A Cor da Cultura).

De modo geral, há intenção de que as aulas garantam condições de troca significativas.

As propostas têm a intenção de ser lúdicas (na aula de 12/12/14 a professora Mariana realizou

a produção de uma borboleta com uma turma de 1º ano) e agradáveis, que conduzam a criança

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a um contato prazeroso (na aula de 31/03/16 a professora Cláudia promoveu a vivência de

uma cena do livro que era tomar chá com a turma de 3º ano) e à identificação com a Literatura

(na aula de 06/04/15 a professora leu o conto “Crianças à venda” e perguntou após a leitura se

a mãe merecia ser culpada para uma turma de 5º ano).

No que se refere ao trabalho colaborativo, não há menção na proposta curricular.

Porém, o trabalho está presente na dinâmica da aula. Geralmente, as crianças fazem trabalho

em duplas ou trios. Não observamos nenhuma aula em que a leitura individual estivesse

presente. Sempre vimos a leitura compartilhada. A escrita literária aparece mais, a partir do 3º

ano. Já as atividades de expressão oral, plástica e corporal estão presentes do 1º ao 5 ano. Há

uma ênfase para as brincadeiras no 1º ano (aula 04/04/16, brincadeira de adivinhar os nomes

dos animais) e para os jogos no 5º ano (aula de 13/04/15, quiz sobre os contos de terror lidos

para turma).

Nas aulas a escrita literária não está ligada à cópia e nem se vincula a projetos de

trabalho. Tal escrita entra como: a) nas aulas da professora Mariana: desenho e escrita do que

tem medo (1º ano), produção de um classificado no Lied (5º ano), produção de um texto

informativo sobre a vida do Edgar Allan Poe (5º ano), livro animado com uso do programa

BrOffice com as histórias produzidas pelos alunos na aula anterior, a partir de um jogo com

ações, personagens, lugares, qualidades e objetos (5º ano); b) nas aulas da professora Cláudia:

produção de um bilhete para os autores do vídeo e produção de uma breve apreciação (3º ano)

e escrita: “O que aconteceu depois?” (4º ano).

Conforme prescreve a proposta curricular, de fato, nas práticas há o predomínio das

atividades de leitura. Todas as aulas começam com uma leitura. Aos alunos cabe sempre a

realização de atividades de expressão oral, plástica e corporal. Em todo o EFI o aluno ouve a

leitura do professor. As aulas da professora Cláudia contam com a atuação do aluno na leitura.

O corpus literário selecionado está na perspectiva da linha de força Leitura e Ludismo,

assim como o critério de seleção e os modos de aproximação com o texto literário. Os textos

são escolhidos, principalmente, conforme o tema estudado no trimestre que foi previamente

acordado e está em articulação com as demais áreas do conhecimento, em particular com a

Língua Portuguesa. Conforme dissemos anteriormente, a equipe docente coloca em jogo

vários critérios de seleção dos livros para as aulas, como a qualidade literária, o tema, a

extensão do texto e o autor. Entre esses critérios, o que é mais presente nas reuniões

pedagógicas é o tema. Mas reiteramos que ele não pode vir a ser o principal critério de

seleção dos livros. O principal deve ser a qualidade literária. As aulas de Literatura vivem a

tensão de serem independentes em relação à Língua Portuguesa e de, ao mesmo tempo, se

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articularem com as demais áreas nas reuniões de planejamento integrado. Quando os temas

entraram como um ponto de partida do trabalho pedagógico, as aulas ainda estavam se

estruturando, como também a equipe. Então, o tema apareceu como um critério de seleção dos

textos e orientador das propostas pedagógicas do trimestre. Contudo, hoje com os estudos

acerca da LIJ e a equipe de Literatura já com 30 anos de trabalho consolidado, pensamos que

vale a pena rever a importância do tema na seleção dos livros e na orientação do trabalho

pedagógico. A revisão passa por quem escolhe o tema, a importância dele na LIJ e os livros

escolhidos, que, embora possam ter qualidade literária, precisam equilibrar textos clássicos e

contemporâneos. Outra ideia que merece revisão é a de que em cada aula deve ser sobre um

livro diferente e que a atividade proposta deve ser inspirada no livro que atende ao tema

trimestral. Por que em cada aula deve ser um livro diferente? Por que as atividades de criação

devem se circunscrever sempre ao livro lido? Uma abertura se faz necessária para que as aulas

de Literatura possam ir ao encontro da formação literária.

6.5 Significado atribuído às aulas de Literatura e concepções de leitura literária

Segundo a coordenadora Renata, a literatura desenvolve a imaginação da criança e o

amor pela leitura. A criança descobre que dentro dos livros “tem tanta coisa boa, tanta coisa

divertida, tanta coisa emocionante”. Algumas delas, ao ouvirem a história, choram, abraçam a

professora e no final da aula agradecem: “Eu me emocionava demais ali. (...) Tem criança que

muda de comportamento para melhor com a família depois de vivenciar determinadas

histórias”. Esse retorno Renata via quando, no final do ano, durante a exposição dos trabalhos,

os pais iam falar com as professoras, abraçavam, elogiavam, davam os parabéns: “Era uma

coisa emocionante. Eles diziam: meu filho passou a gostar de ler graças a vocês. Era uma

conquista mesmo dos leitores”. Renata defende a tese de que “quanto mais você lê, você fala

melhor, você escreve melhor, você tem mais ideias”.

Para Renata a literatura colabora no processo de alfabetização na medida em que

desenvolve o amor pela leitura, a imaginação, a oralidade, a leitura e a escrita, como também

pode provocar mudanças de comportamento: “Eu acho que desenvolve a imaginação da

criança. E quando você desenvolve a imaginação da criança facilita a escrita. Ela aprende que

ela pode criar coisas fantasiosas, textos fantasiosos”.

Perguntamos, então, a Sandra por que ela considera importante ensinar literatura:

Ajuda a pensar, ajuda a questionar, ajuda você a entender alguns comportamentos

(...) aprendi muita coisa em relação até mesmo à questão de você aceitar o outro pela

literatura. (...) você entender algumas culturas de outros países. Entender não é só a

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cultura, não, religiosas. Se você não entender isso, você não vai ter tolerância

nenhuma... (...) A gente escuta... (...) você fica tolerante. Eu acho que a literatura

mexe muito com (...) a sensibilidade. Você entender o outro. Se sensibilizar com o

outro. (...) até alguns contos que a gente dá aqui, a gente percebe o quanto as

crianças são preconceituosas. Eu acho difícil dizer que uma criança é

preconceituosa... (...) Tão construindo nela (Sandra, 23/06/16).

No que se refere ao significado da literatura associado ao processo de alfabetização,

Sandra concorda que há uma especificidade no trabalho de literatura com o 1º ano. Para tratar

desse tema, ela recorreu ao trabalho que duas professoras da instituição realizaram há alguns

anos. As professoras Vânia e Solange mostravam nas aulas do Núcleo Comum todos os tipos

de textos para as crianças, de extensão curta ou longa: “Mesmo as crianças sem saber ler, elas

botavam na frente da criança e falava para criança, assim: acompanhe a leitura. Aí, as crianças

faziam isso, ó (Suely pega um papel e finge passar o dedo pelas palavras). Elas iam lendo com

o dedinho”. Nesse período os livros de Ana Maria Machado eram os mais usados. Embora

Sandra reconheça que “Os livros da Ana Maria Machado não são uma literatura genuína”, ela

gosta deles para a alfabetização. “Eu não tenho nada contra porque ela também foi uma

alfabetizadora. Ela alfabetizava com esses textos. E eu usava muito e continuo. E se eu

estivesse no primeiro ano, eu estaria usando”. Sandra cita os livros do Menino Poti, Mico

Maneco. Para ela é uma literatura para o trabalho de Núcleo Comum. A seleção dos textos

trabalhados passa pela preocupação de o texto facilitar o ensino da letra: “Eu só trabalharia...

Eu alfabetizei só com literatura”.

Para as aulas de Literatura Sandra pensa que estes livros não são adequados: “Mico

Maneco. E é uma literatura. (...) Não é uma literatura pra nossa sala de Literatura”. Ela afirma

que “trabalharia qualquer outro texto de literatura... (...) mas não o Mico Maneco”. Ela

selecionaria os livros sem a preocupação de os alunos estarem lendo ou não.

Para Mariana a literatura interfere no processo de leitura do aluno. A relação entre as

aulas de literatura e a alfabetização está na necessidade de ensinar o aluno a gostar de ler para

que o processo de leitura seja iniciado.

Para se começar um processo de leitura do aluno de classe inicial, é preciso ensiná-

lo a gostar de ler. O bom leitor é aquele que estabelece relações, associa fatos,

reflete e tira suas próprias conclusões. A literatura infantil, neste caso, interfere e

auxilia este processo, pois as crianças do primeiro ano inicialmente fazem

interpretação das histórias que ouvem através de seus desenhos ou de outras

atividades lúdicas e desenvolvem desse modo o interesse pelo ensino formal de

letramento em sua alfabetização (Mariana, 05/03/16).

Portanto, na visão de Mariana, o ensino da literatura e o da leitura estão intrincados. A

literatura parece ser a entrada para o aprendizado da leitura. Seria ouvindo literatura e

realizando atividades lúdicas ligadas ao texto que o aluno desenvolveria interesse pelo seu

processo de alfabetização.

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Cláudia pensa que o ensino da literatura é importante porque “A literatura vai

desencadear o pensar, o imaginar e o descobrir de novas verdades”. Ela “pode impulsionar o

leitor a não ter medo de enfrentar suas próprias ideias, representadas por meio da linguagem

oral ou escrita”. Ela defende que o momento da aquisição da linguagem escrita precisa ter

significado. Nesse momento, para Cláudia, a literatura pode exercer esse papel de desencadear

o pensamento, a imaginação e a descoberta de outras verdades, provocando o leitor para o

enfrentamento de suas próprias ideias: “Também acredito que, no momento da aquisição da

linguagem escrita, que precisa necessariamente ter significado, a literatura pode exercer este

papel”.

Quando os sujeitos de pesquisa falam da imaginação e criação no que se refere à

literatura, eles se aproximam de Vigotski (2008). Segundo o autor, quanto mais as crianças

veem, ouvem, experimentam, aprendem, mais elementos elas dispõem para imaginar e criar.

Para Vigotski (2008, p. 21-22), a imaginação também se converte em um meio de ampliar a

experiência do homem. E quando as crianças podem imaginar o que não viram, o que não

experimentaram diretamente através da narrativa do outro, elas não se circunscrevem à sua

própria existência.

Observamos que as aulas de Literatura em turmas de alfabetização não têm um

compromisso com o ensino da leitura e da escrita, mas com dar a palavra às crianças. Ensina-

se uma relação com o texto, uma forma de atenção, uma inquietude, uma abertura. Vimos a

preocupação com o significar. Conforme Goulart e Gonçalves (2013, p. 22) definem,

significar é uma ação que pertence à dimensão discursiva dos processos de aprendizagem da

escrita. O caráter discursivo das aulas de Literatura sobressai quando o outro (os alunos) entra

como encontro e confronto de conhecimentos.

De acordo com a fala dos nossos sujeitos de pesquisa, a literatura é uma forma de

expressão, desenvolve o espírito crítico, percepções e tem papel interrogativo. O conceito de

obra aberta de Eco (2010) aparece nas aulas por meio da contextualização que as professoras

tentam fazer, articulando o livro com diferentes suportes e áreas do conhecimento. A

conversa, principalmente as promovidas pela professora Cláudia, convidam o leitor a fazer a

obra com o autor. Esta maneira de ver a relação do aluno com as aulas de Literatura também

encontra ressonância com Bakhtin (1993b) e Vigotski (1998), quando afirmam que o artístico

se dá nas inter-relações entre criador, contemplador e obra.

A professora Mariana é a que fica mais na tensão entre o texto de prazer e a fruição. O

modo como a professora Mariana conduz a leitura não tem como fim refletir sobre normas,

mas contentar, o que é intensificado com as produções finais (desenhar, jogar). Não vimos

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conversas que buscassem provocar rompimento com a cultura. Em contraposição, nas suas

aulas, principalmente, quando o Lied está presente, por meio da contextualização, há a

discussão das bases históricas, e, às vezes, o texto põe em crise valores já estabelecidos.

Todos os sujeitos de pesquisa valorizam a literatura e buscam desenvolver o senso

crítico nos alunos. A maior diferença entre estes sujeitos é o teor da conversa. A linha de força

mais presente no que se refere à concepção de literatura das professoras e coordenadoras é

Leitura e Experiência/Formação. Para elas a literatura forma, transforma, afeta.

6.6 Objetivos das aulas de Literatura

Para Sandra o objetivo principal das aulas de literatura é “conhecer um pouco da

literatura, de vários gêneros literários para as crianças. (...) Várias formas de expressão. (...)

opinar (...). Criticar também”. Ela se preocupa com a possibilidade de a criança não gostar do

livro e, inclusive, concorda com a ideia de que a criança tem todo o direito de não gostar do

livro e da ilustração. Portanto, o objetivo principal das aulas de Literatura é possibilitar ao

aluno conhecer a literatura e diferentes formas de expressão e abrir espaço para a opinião e a

crítica.

Mariana pensa que “o trabalho da escola é ajudar em um processo já iniciado na

família, oferecendo ao aluno um momento e um espaço dedicados à contação de histórias”.

Segundo ela, “Este processo tem por objetivo introduzir as crianças no universo das narrativas

e estimular assim o hábito da leitura. O encantamento das histórias e as atividades lúdicas

decorrentes visam a desenvolver futuros leitores espontâneos”.

Observamos nas aulas que as professoras se atêm ao objetivo geral de formar leitores

críticos. O ponto de partida é o livro que está vinculado ao tema proposto para o trimestre e a

produção que ele inspira. As aulas contam com a presença de objetivos específicos do PGE

(CPII, 1985), como desenvolver as potencialidades criativas do aluno; desenvolver o espírito

crítico; trabalhar todas as formas de expressão, verbais ou não; desenvolver as potencialidades

intelectuais do aluno dentro de uma linha de trabalho não formal; desenvolver a capacidade de

trabalhar independentemente, com vistas à conquista da autonomia; e a de trabalhar

cooperativamente, com vistas à conquista do sentimento de solidariedade.

Todas as aulas convergem para a o objetivo geral explicitado no PPP (CPII, 2008 p.

123): “Formação de leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as particularidades, os

sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias”. Além disso, elas

concretizam alguns objetivos específicos do mesmo documento, como estimular o gosto pela

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leitura; possibilitar o desenvolvimento das estruturas mentais, através do estabelecimento de

relações, tais como: eu/outro, eu/as coisas verdadeiras/as coisas inventadas, e do contato com

diferentes tipos de tempo e espaço; e fazer a criança refletir sobre os problemas de seu tempo,

levando-a a desenvolver o espírito crítico.

A professora Cláudia quer que seus alunos sejam capazes de reconhecer as sutilezas,

as particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias. Já a

professora Mariana focaliza no desenvolvimento da imaginação, da fabulação. Ela não entra

nas construções literárias. Então, as crianças assistem à sua performance de leitura e depois

fazem uma atividade que pretende ser bastante lúdica. Mariana vive o PGE (CPII, 1985) nas

suas aulas. Ela desenvolve um trabalho mais ligado à criatividade, imaginação e fabulação.

Cláudia, junta isso com as construções literárias, conforme o PPP (CPII, 2008) indica. Os

objetivos do trabalho estão tensionados pelas linhas de força Leitura e Experiência/Formação,

pois há a intenção de formar o leitor crítico, e pela linha Leitura e Ludismo devido à

preocupação com a fabulação.

6.7 Conteúdos das aulas de Literatura

Sandra pensa que a literatura “tem que provocar algum rompimento”. Ela acha que as

aulas de Literatura devem “provocar algum questionamento, alguma discussão”. Isso se

articula com o segundo poder da literatura, anunciado por Compagnon (2014, p. 36-37), de

que a literatura produz dissensão, o novo, a ruptura. Interessante notar que no senso comum é

o contrário. A literatura infantil está vinculada à inocência, à capacidade de se adequar, de se

adaptar, divertir, brincar, ensinar, e de não incomodar e nem desacomodar (ANDRUETTO,

2012, p. 59).

Para mostrar como esse poder da literatura se aplica na prática, ela deu um exemplo de

uma aula do 5º ano em que o texto principal foi o conto “Crianças à venda. Tratar Aqui”, da

escritora Rosa Amanda Strausz, do livro Sete ossos e uma maldição. Após a leitura e conversa

sobre o conto, foi proposta a realização de um julgamento quanto à questão da venda dos

filhos pela mãe: “as crianças ali conseguiram entender que ali tem duas situações: do

problema da mãe, uma situação real, do cotidiano dela, e o problema do fato de você vender

uma coisa que é uma criança, né. (...) Que não é um produto. É um choque”.

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190

Quando indagada sobre os conteúdos priorizados nas aulas de Literatura38

, Sandra

disse: “eu acho que eu priorizo mais o texto escrito, mas também a ilustração. Não, o livro”.

De acordo com Sandra, já houve um período em que ela achava que o texto escrito era mais

importante do que a ilustração. Atualmente, ela pensa que o texto escrito e a ilustração estão

em pé de igualdade. É “Até mais difícil você ilustrar do que você escrever. Às vezes, o

trabalho do ilustrador, ele acaba sendo um autor. Se ele não está ligado a nenhum texto

escrito, tem aquela questão autoral. (...) Ele faz um outro texto paralelo”.

Para Mariana as crianças devem aprender com a literatura a expor suas próprias ideias,

valorizar suas opiniões e discutir valores. Elas devem desenvolver o espírito crítico: “Cada

história apresentada permite ao aluno expor suas próprias ideias, valorizar suas opiniões e

discutir valores modificando, assim, sua visão de mundo”. A partir da apresentação de cada

conto, os alunos “entram em contato com diferentes valores, ações, atitudes e desenvolvem o

espírito crítico, tão importantes ao comportamento em sua vida diária”. Os conteúdos

priorizados têm relação com o conjunto de temáticas que são “escolhidas de acordo com o

interesse e a faixa etária”.

Neste aspecto, achamos que as aulas de Literatura se afastam do modelo autônomo de

letramento literário, descrito na dissertação de Samuel Ronobo Soares (2009), pois não há

perda de autonomia pelos alunos de manifestarem suas leituras, o significado da literatura não

está circunscrito ao contexto histórico e à caracterização e biografias de autores.

Cláudia pensa que, “Quando lê, o leitor cria o seu mundo, o povoa e olha com os olhos

do outro”. É isso que ela espera que seus alunos aprendam com a literatura: criar o seu

mundo, povoá-lo e olhá-lo com os outros. Segundo ela, a partir daí, os alunos serão “capazes

de construir significados que poderão ajudá-los a refletir e mesmo reformular sua visão da

realidade”. A professora Cláudia prioriza em suas aulas os seguintes conteúdos: “o

conhecimento de dados biográficos e do contexto histórico, além da análise do gênero

textual”. Contudo, a aula não se restringe a tais informações. Ela contextualiza a obra e, ao

longo da leitura, a professora vai chamando a atenção dos alunos para os aspectos do gênero

literário, suas construções literárias, vocabulário, ilustrações, e os convida a relacionarem a

obra com eles mesmos.

38 Listados no PPP (CPII, 2008), os conteúdos estão organizados a partir de dois eixos de trabalho: livro e texto.

Os conteúdos do eixo livro são autoria, ilustração, diagramação, recursos gráficos, paginação, editora, edição, contexto em que o livro foi produzido. Os do eixo texto são o texto poético (acalantos, cantigas de roda,

quadrinhos, trava-línguas, canções populares e poemas de autores contemporâneos), o texto narrativo (contos de

fadas, contos maravilhosos, narrativas contemporâneas, lendas, fábulas, contos fantásticos, narrativa mítica,

provérbios, quadrinhos e crônicas) e o texto dramático (CPII, 2008, p. 124-127).

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As aulas mostraram que os conteúdos trabalhados são autoria, ilustração, editora e

contexto em que o livro foi produzido e o que a história suscita. Os alunos não analisam o

texto do ponto de vista da estrutura. De modo superficial, as professoras chamam a atenção

para versos e estrofes, rimas, o humor das crônicas. Fora isso, destaca-se o conteúdo do texto.

O núcleo das aulas de Literatura é o acesso aos textos e a discussão sobre eles. Cremos que a

ausência do estudo da estrutura de um texto literário se deve à tensão que há entre a Língua

Portuguesa e Literatura na escola. O objetivo do PGE (CPII, 1985) de que o trabalho da

literatura não seja formal continua presente. Contudo, para que o aluno estude as construções

literárias do texto é importante que tenha conhecimento da estrutura textual dos gêneros lidos.

O que cabe a cada uma destas disciplinas?

Os conteúdos se vinculam à linha de força Leitura e Ilustração na medida em que ler

literatura não basta. É necessário haver uma aula para ensinar o aluno a ver esse tipo de texto.

Refletir sobre conceitos que pertencem a esse campo do conhecimento. Contudo, alguns

conteúdos não são considerados pelas professoras, como diagramação, recursos gráficos,

paginação e edição.

6.8 Atividades propostas nas aulas de Literatura

Sandra pensa que as atividades propostas para o 1º ano devem ser bastante diferentes

das oferecidas para o 5º ano: “O segundo [ano] se aproxima muito do primeiro [ano]. O

terceiro [ano] fica mais no meio termo. O quarto ano é como se fosse uma preparação para o

quinto [ano] (...) fica difícil a gente separar”. Para ela, o 1º ano exige textos mais curtos

porque o tempo de atenção deles é menor em relação ao 5º ano: “São mais curtos os textos,

mas você pode ler um clássico no primeiro ano. (...) eu li o Ricardo Azevedo que eram três

histórias de bobos, paspalhões. (...) Eu li com o meu segundo ano em duas etapas. (...) a

história era tão envolvente que eles queriam saber”.

Para Sandra, o 1º ano é um momento de “começar a criar empatia com o público

infantil (...). Tem que ter uma parte assim de jogo, de brincadeira, para depois você introduzir

o texto naquela brincadeira e depois você fazer uma proposta”. Já o 5º ano precisa ter debates.

Os textos selecionados devem provocar questionamentos: “É muito mais você lançar uma

literatura mais questionadora”. Nos debates é importante ouvir a opinião das crianças.

Conversando sobre as atividades propostas nas aulas de Literatura, Sandra trouxe à

tona outras duas questões: as atividades que o 5º ano realizava quando Renata era

coordenadora de Literatura e o perfil do professor de Literatura do EFI. Anos atrás, Sandra foi

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chamada para avaliar o 5º ano. Teve um aluno que disse para ela: “Tia, por que que a gente

não faz teatro?”. Esse aluno provocou Sandra. Para ela não é qualquer professor que dá aula

de Literatura, pois “não é qualquer um que sabe ler, fazer uma leitura de um livro literário,

entendeu? As pessoas pensam que contar história é fácil, mas não é fácil não”. Ela pensa que

esse professor deve saber ler com entonação, ter envolvimento com o texto literário, ler de

acordo com a pontuação, olhar, fazer algumas pausas e perguntar sobre o texto.

As aulas de Literatura de Mariana contavam com atividades pedagógicas diversas: “A

apresentação das histórias era feita através da leitura de livros, mas também de teatrinhos de

fantoche, teatros de sombra, filmes, vídeos, poesias, entre outras técnicas, utilizando, sempre

que possível, músicas adequadas para despertar emoções”. Após a contação, os alunos

“representavam cenas, construíam personagens com desenhos, recortes e colagens e

utilizavam jogos”. Os jogos estavam em integração com os contos e com outras áreas do

conhecimento. De acordo com Cláudia, “As leituras dos textos, em nossas aulas de Literatura,

são permeadas com atividades mais lúdicas e plásticas, caracterizando as obras apresentadas”.

De modo geral, as observações e a participação nas reuniões pedagógicas mostraram

que as atividades propostas são leitura, conversa, dramatização, desenho (com ou sem

materiais diversos), escrita, exibição, análise, pintura de desenhos, jogo, dobradura.

Há leitura de literatura; conversa sobre texto, imagens ou vídeos; dramatização do

texto literário durante a leitura compartilhada da professora, ou em grupo, e após o

conhecimento do texto, com fantoches de varas; desenho de cenas, personagens, objetos;

escrita de bilhete, apreciação crítica, texto informativo, resposta a uma pergunta suscitada

pelo livro; exibição de curta-metragem, filmes, fotografias; análise de imagens; pintura de

desenhos de autoria dos alunos, quebra-cabeça; jogo de adivinhação, de cartas; dobraduras de

cenários e personagens. No apêndice G compartilhamos um quadro com as atividades

realizadas após a leitura e a conversa sobre o livro no período de março a outubro de 2016.

De modo geral, o 1º, 2º, 3º e 4º anos ouvem, conversam, desenham e escrevem,

preponderantemente. O 5º ano ouve, conversa, debate e escreve. A linha de força que é mais

presente nas atividades de Literatura é a Experiência/Formação, na medida em que a produção

de sentidos é um vetor muito presente no ato da leitura e da conversa. Também está presente a

linha Leitura e Ludismo. A leitura deve provocar encantamento, trazer o leitor para fabular

com o autor. Embora a intenção da produção, após a leitura, seja provocar uma reflexão ou

sistematização sobre a leitura, observamos que ela nem sempre promove uma resposta do

leitor ao texto. Embora ele tenha que criar nessa resposta, este momento nem sempre é de

criação para os alunos devido à repetição dos modos de criar. Vimos crianças realizando as

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produções de modo tarefeiro, apenas para entregar. Nem sempre isso aconteceu porque o

aluno não era aplicado. Vimos alunos considerados bons desestimulados na realização das

produções. Então, a intenção é provocar a imaginação, mas a variedade de maneiras de

provocar este momento precisa ser revista. O professor tem a intenção formativa, e o aluno

está envolvido para dar a sua contrapalavra. Mas a maior parte das atividades propostas fica

no desenhar e escrever (1º ao 4º ano) e no debater e escrever (5º ano).

Olhando para as atividades propostas, diríamos que a força delas está na leitura. Ela é

cativante, bem contextualizada, o professor está inteiro nela. Os alunos ouvem, observam e

assistem. Percebemos que a leitura pelo aluno aparece quando há a dramatização do texto. A

conversa sobre o texto literário está presente, mas o teor dela fica a cargo do professor. Aqui

acreditamos que vale a pena combinar previamente o que é importante perguntar sobre o texto

para que as reflexões sobre as construções literárias sejam garantidas. Os alunos, de modo

geral, conversam sobre o texto literário, sobre aquilo que o professor quiser dar destaque. A

atividade subsequente à conversa é fundamental. A equipe compreende que o leitor dá uma

resposta e, desde o PGE de 1985, a marca desse momento da aula é a criação. Porém, hoje, a

equipe precisa refletir: em que medida a criação está sendo vivida pelo aluno com as

atividades propostas? O aluno está realizando para entregar uma tarefa, ou para de fato dar

uma resposta ao texto? As aulas de Literatura dão mais ênfase ao conteúdo e à emoção. O que

está mais frágil no trabalho é a criação.

Toda a aula de Literatura vai ao encontro do que Vigotski (2010, p. 333) chamou de

vivência estética. Há esta intenção. As professoras e coordenadoras entendem que o aluno não

está passivo na aula. Tal atividade construtiva é realizada pelo aluno na apreciação da leitura

dramatizada pela professora Mariana, nas leituras dialogadas da professora Cláudia e da

coordenadora Sandra. Todavia, há dúvidas quanto à construção e criação do objeto estético

pelo aluno, na medida em que ele realiza atividades propostas pela professora que nem

sempre fazem sentido para ele. As aulas mostram que os textos são bem aceitos, que a

conversa de fato abre espaço para as reflexões dos alunos. Porém, as atividades nem sempre

são bem aceitas, seja pelo desafio que provocam, pelo sentido que fazem para o aluno, ou pela

repetição de modos de realizar a tarefa. Nesta hora a criação fica em xeque.

Por meio da leitura dialogada ou não o aluno reage. Percebemos que a conversa é um

importante momento de reconstrução do objeto estético, que é quando o aluno entra em

interlocução mais fortemente com a obra, juntando sua experiência com o que a obra traz. A

resposta dada à obra é que, às vezes, é interrompida nas aulas por causa das razões expostas

acima. A reação estética nem sempre se completa.

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Vimos que no momento em que a obra de arte é vivenciada a divergência entre

conteúdo e forma provoca uma contradição emocional no sujeito. Isso é potencializado

quando a professora ressalta tal divergência. O momento da estimulação é potencializado pela

ilustração, pelos objetos, ambientação da sala. A reação estética começa pela percepção

sensorial. Na síntese criadora secundária (VIGOTSKI, 2010, p. 334) o leitor se une à obra.

Esta síntese é potencializada e vivida na conversa sobre o texto literário. Por meio da empatia,

os alunos se projetam na obra, com a professora abrindo ou não espaço. A fragilidade está na

resposta. E por que há dúvidas sobre a resposta? Porque não é possível afirmar que há criação

na atividade proposta após a conversa. Contudo, a intenção é provocar esta criação. Ela é

presente e forte. A importância que a equipe confere à criação se relaciona com o dizer de

Vigotski (1998, p. 313-314):

a percepção da arte também exige criação, porque para essa percepção não basta

simplesmente vivenciar com sinceridade o sentimento que dominou o autor, não

basta entender da estrutura da própria obra: é necessário ainda superar

criativamente o seu próprio sentimento, encontrar a sua catarse, e só então o efeito

da arte se manifestará em sua plenitude (VIGOTSKI, 1998, p. 313-314, grifo nosso).

A leitura e a conversa possibilitam a empatia (BAKHTIN, 1993a, p. 32-33) das

crianças. Mas, para que possam de fato contemplar e vivenciar esteticamente a obra, é

necessário haver uma cocriação. É necessária uma atividade de autoria posterior em relação

ao leitor/contemplador. Questionamos na tese o quanto o aluno está como cocriador da obra.

A atividade proposta deve possibilitar cocriação. Falta garantir a conclusão da

recepção/reação estética. “Só porque vemos ou ouvimos algo não quer dizer que já

percebemos a sua forma artística [...] é preciso ingressar como criador no que se vê, ouve e

pronuncia” (BAKHTIN, 1993b, p. 58-59, grifo do autor). “A percepção mais simples da

forma ainda não é, por si mesma, um fato estético” (VIGOTSKY, 1998, p. 68).

Como os alunos continuam na condição de criadores nas aulas de Literatura após a

leitura e a conversa sobre o texto literário? Acreditamos que é produzindo coletivamente

produtos finais ligados a um projeto de classe, pois dessa maneira o que será produzido é

decidido coletivamente e, portanto, fará sentido para o grupo. Exemplos de produtos finais de

projetos literários são livros, musicalização de poemas, apresentações teatrais, festivais de

poesia/recitais, jornais/boletins informativos, curtas-metragens, animações, cenas de livros,

autobiografias leitoras, teatro de fantoches, radioteca, videoteca com entrevistas, máscaras,

modernização de histórias antigas, produções escritas de finais de contos, registro de histórias

populares contadas na comunidade, adaptações de clássicos para história em quadrinhos,

tapetes de histórias, livros virtuais, propagandas de livros, produções escritas de versões,

traduções e adaptações, escrita de resenhas.

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As aulas de Literatura nada mais são do que a leitura dialogada e guiada do texto

literário. Um grande encontro para construir sentidos coletivamente. Por isso, pensamos que

elas se aproximam mais do conceito de educação literária do que de formação literária, pois a

aprendizagem de interpretação de textos supõe ter como resultado uma prática desenvolvida

através da recepção oral ou leitura direta dos textos pelos alunos e as formas guiadas para

ensinar a construir sentidos (COLOMER, 2009, p. 73).

Constatamos que nas aulas de Literatura há a presença da dimensão afetiva da

literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 444-445), já que as práticas literárias são reconhecidas pelos

sujeitos de pesquisa como relevantes na vida pessoal das crianças e no desenvolvimento de

seus hábitos de leitura. Além disso, a dimensão sociocultural (FITTIPALDI, 2013, p. 444-

445) está presente por meio da entrada de conhecimentos sobre a cultura, o contexto de

circulação e recepção da obra, e o entendimento de que a literatura é uma prática social. A

dimensão cognitiva (FITTIPALDI, 2013, p. 444-445) também aparece nas aulas, pois se

refere à compreensão das práticas literárias como processos interpretativos em que os leitores

são ativos e constroem sentidos. A dimensão ético-filosófica (FITTIPALDI, 2013, p. 444-

445) também comparece com força, na medida em que ela permite refletir sobre a literatura

como discurso em que se manifestam representações e juízos de valor da sociedade.

Observando as aulas de Literatura, destacamos a dimensão estético-linguística porque

acreditamos que ela representa a especificidade das aulas de Literatura. Há momentos de

observação de recursos retóricos e de reflexão sobre seus efeitos estéticos e as suas

possibilidades expressivas, bem como dos diversos modos de construção da linguagem

literária, de reflexão sobre os sentidos que potencializam o uso de determinados recursos

linguísticos e da imagem. Todavia, eles não são tão presentes quanto deveriam. Algumas

práticas pedagógicas que observamos potencializam tal aprendizagem, como a dramatização e

a escrita individual ou colaborativa. Há outras que deveriam entrar, como a narração oral, os

jogos com a linguagem a leitura em voz alta, a leitura coletiva, a recitação poética em classe,

a realização de espetáculos teatrais, a indagação das eleições linguísticas e das ressonâncias

que sugerem determinados vocábulos ou expressões, oficinas literárias de trocas de leituras e

de escritas.

O fato de as aulas terem como ponto nodal a imaginação, a fabulação e a criação

(CPII, 2008) faz com que elas estejam em consonância com a ideia de Vigotski (2008) de que

a literatura atua no âmago do processo de desenvolvimento do ser humano, no seu mundo

simbólico e no processo de imaginação e criação. A ideia de a criação pretender ser um ponto

forte das aulas Literatura também se articula com o que Larrosa (2003) fala sobre a

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imaginação. A imaginação produz, incrementa e transforma a realidade. Fictio vem da palavra

facere, que significa fazer. As aulas de Literatura pretendem fabular e fazer/criar algo.

A importância das aulas de Literatura vem dessa relação entre imaginação e criação.

Do nosso ponto de vista, elas apresentam as seguintes especificidades: a) acessar, organizar e

reorganizar a nossa experiência (JOUVE, 2012); b) ensinar a pensar de modo dialético

(CALVINO, 2016, p. 129); e c) iniciar-nos nas finesses da língua (COMPAGNON, 2012, p.

70-71). As aulas de Literatura devem ter como especificidade a dimensão estético-linguística,

o que não quer dizer que as demais dimensões não entrem nas aulas. Contudo, o

desenvolvimento destas dimensões afetiva, sociocultural, cognitiva, ético-filosófica

pode estar tanto nas aulas de Língua Portuguesa quanto nas de Literatura, ficando a cargo da

Literatura a dimensão estético-linguística por ser o núcleo do seu trabalho. A Literatura é

estética.

Chegamos ao final da análise dos dados construídos durante a realização da pesquisa

de campo. A seguir, apresentamos nossas considerações finais acerca de: Como são as aulas

de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá? O que estas

aulas fazem com os sujeitos e o que eles fazem nela?

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando tomamos a decisão de pesquisar não sabemos o que está por vir. Tantas aulas,

orientações, textos, congressos, escutas. E, no final, sentimo-nos como que montando um

grande quebra-cabeça com peças de diferentes naturezas. Interessante notar que a composição

deste quebra-cabeça também não se faz somente na relação entre pesquisador, orientador e

sujeitos de pesquisa. Além dos autores com os quais dialogamos e buscamos compreensão,

carregamos conosco tudo e todos que estão ou estiveram conosco até o momento da escrita

final da pesquisa.

Sem dúvidas, a experiência do doutorado sanduíche me colocou no lugar de

estrangeira. Estar em uma creche com crianças de diferentes nacionalidades falando catalão,

observando o espaço, as conversas, o comportamento, os combinados, os profissionais. E

ainda, na universidade, junto aos futuros professores catalães. O que discutiam? E a biblioteca

dessa universidade, o que tinha sobre aulas de Literatura? Esse lugar de estrangeira me

marcou profundamente. Tudo o que foi vivido está aqui, no texto, está em mim. Abrir-me

para a experiência foi o que a construção desta pesquisa pediu de mim. As peças antes

dispersas passam a fazer sentido, encontram lugar. Muita coisa me passou, me atravessou, me

alcançou, me afetou. Buscar compreender Como são as aulas de Literatura do Ensino

Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá? O que estas aulas fazem com os

sujeitos e o que eles fazem nela? reuniu tantas pessoas, levou-me a lugares que eu não

imaginava, mobilizou muita energia.

Afinal, o que fazem as professoras e o que orienta a coordenação pedagógica de

Literatura? As professoras fazem o que a coordenação orienta. A coordenadora faz uma

mediação entre as professoras e propõe aulas a cada encontro. Sua ação é sempre no sentido

de chegar a um combinado onde as professoras se sintam bem com a aula planejada. Há

espaço para perguntar, criar. As aulas são uma decisão coletiva. Cada sujeito de pesquisa

marca de maneira diferente as aulas de Literatura. As orientações de Renata, quando

coordenadora, deixaram como marca a renovação do acervo, as mudanças nos temas que

orientavam as aulas e a proposição de outras atividades lúdicas, a partir dos livros. Sandra,

além de ter feito as mesmas mudanças que Renata, conseguiu integrar a Literatura à Língua

Portuguesa sem deixar que a especificidade do trabalho se perdesse. Mariana, que viveu a

mudança de todas as coordenações pedagógicas de Literatura, marcou as suas aulas por meio

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da criação tanto sua quanto das crianças. E Cláudia deixa a marca da leitura dialogada com

ênfase nas construções literárias.

Como a proposta curricular se articula às aulas de Literatura? A proposta curricular

se articula às aulas de Literatura por meio dos gêneros literários estudados; da presença de

livros clássicos e contemporâneos da LIJ; e da presença das atividades de leitura. Durante

todo o EFI os alunos leem textos narrativos; por quatro anos, leem poesias; e, no último ano,

têm contato com o texto teatral. Todavia, durante os cinco anos desta etapa da Educação

Básica, as crianças dramatizam histórias e poemas a partir de leituras feitas nas aulas. Além

disso, a proposta se articula quando observamos que há intenção nas aulas de possibilitar que

as crianças estabeleçam inúmeras relações entre os textos lidos na aula, outros textos e suas

experiências de vida. Há preocupação em atender os interesses das crianças e em garantir

condições de trocas significativas por meio de propostas criativas que possibilitem expressão

e identificação do aluno.

Qual é a metodologia de trabalho? As aulas têm como orientação o tema definido em

equipe com as demais disciplinas. Os temas que são trimestrais são decididos em uma reunião

de planejamento geral que acontece todo trimestre. Cada ano escolar escolhe um tema e, a

partir daí, cada disciplina pensa como vai desenvolver tal tema considerando as

especificidades das aulas. As crianças não participam da escolha dos temas das aulas de

Literatura, embora o interesse delas seja considerado por meio do que as professoras

observam acerca de suas conversas e comportamento nas aulas. Fazemos uma crítica a essa

maneira de selecionar os temas de estudo, ainda mais quando pensamos na perspectiva da

formação literária. Esta abordagem inclui uma atividade de cocriação por parte do leitor em

relação à obra. Como os alunos vão se colocar como cocriadores se a participação deles se

circunscreve basicamente à conversa sobre o texto literário?

Na perspectiva da educação literária, em que as aulas de Literatura são uma

aprendizagem da interpretação de textos, os alunos podem ficar fora dessas escolhas, pois

cabe a eles construir a competência literária que é guiada pela professora. Na perspectiva da

formação literária é construída uma relação com o texto. Isso exige uma abertura dos dois

lados da escola e dos alunos para um encontro com a literatura. As crianças precisam de

fato contemplar e vivenciar esteticamente a obra. Para tanto, é necessário haver uma

cocriação, uma atividade de autoria em relação ao leitor/contemplador. “A percepção mais

simples da forma ainda não é, por si mesma, um fato estético” (VIGOTSKY, 1998, p. 68), “é

preciso ingressar como criador no que se vê, ouve e pronuncia” (BAKHTIN, 1993b, p. 58-59,

grifo do autor).

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Para Larrosa (2003, p. 46-46) a literatura tem função vital na escola. Aprender a ler

não é somente adquirir a competência de interpretar textos, mas ser capaz de escutar o que

está nas entrelinhas. Ler vai além do texto. Isso implica em permitir que as crianças tomem a

palavra. Neste ato elas se distanciam em relação ao que foi dito e transgridem as regras do

dizer. Desse modo, ensina-se uma relação com o texto que é uma forma de atenção, uma

atitude de escuta, uma inquietude, uma abertura.

Entendemos que o tema ajudou a Literatura no início da construção da estrutura das

suas aulas. Hoje, ele fecha, na medida em que os alunos não participam. Mas ele também é

um ponto de encontro com as demais disciplinas da escola. Propomos que o primeiro critério

de seleção dos livros seja a qualidade literária. Ao invés de temas para orientar as aulas de

Literatura, parece mais amplo pensar em projetos literários.

Como ampliar as experiências de leitura e a formação literária das crianças?

Observamos que há uma ampliação na capacidade dos alunos de conversarem sobre o texto,

um alargamento no tempo que conseguem parar para ouvir a leitura e na fluência de leitura.

Não observamos que há uma proposta de ir ampliando as experiências de leitura a cada ano,

como numa progressão. As aulas mostraram que a tendência é mais para a educação literária,

para uma aula de interpretação de textos que pretende promover a formação literária. A

ampliação das propostas pode vir com a proposição de textos, conversas e produções que

peçam pouco a pouco mais desse leitor em formação. O que vale para as aulas do 1º ano não

vale para as do 5º ano, mas para o 2º, 3º e 4º anos há pouca diferença. Todos escutam a leitura

e conversam. O 1º ano brinca e desenha. O 5º ano joga e debate. Do 2º ao 4º ano os alunos

ouvem, conversam, desenham e escrevem. Não observamos muita diferença quanto ao desafio

que oferecem em cada tipo de atividade (conversa, desenho e escrita). Pensamos que as

alterações podem ser pensadas por ciclo ao invés de ano escolar.

As propostas curriculares, tanto a última quanto a primeira, não fazem menção ao

tema como uma maneira de estruturar metodologicamente as aulas de Literatura. A proposta

em vigor (CPII, 2008) não menciona nenhuma questão relativa à metodologia de trabalho.

Nesse ponto, propomos que a metodologia de projetos de trabalho seja uma possibilidade. Os

temas são o norte das aulas de Literatura, que se estruturam sempre na tríade: leitura, conversa

e fazer artístico. As propostas curriculares (CPII, 1985 e 2008) falam sobre a criação. Nas

aulas há a intenção em promover um momento de criação artística com as crianças. Não

observamos a preocupação das professoras com o desenvolvimento das competências

prescritas na proposta curricular de 2008. Elas trabalham o que consideram importante os

alunos saberem acerca dos textos que levam para eles. A equipe se esforça para diversificar as

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propostas de criação. Cada livro suscita uma atividade diferente. Contudo, os modos de criar

precisam de revisão para dar mais liberdade às expressões das crianças, para acolher o

inesperado.

Quais são as atividades pedagógicas propostas? De modo geral, as observações e a

participação nas reuniões pedagógicas mostraram que as atividades propostas são leituras,

conversas, dramatizações, desenhos (com ou sem materiais diversos), escritas, exibição de

filmes de curta-metragem, análise de algum aspecto do texto, pintura de desenhos, jogos,

dobraduras. As crianças dos 1º, 2º, 3º e 4º anos ouvem histórias, conversam, desenham e

escrevem, preponderantemente. As do 5º ano ouvem, conversam, debatem e escrevem. O

debate é a conversa sobre um tema que exige mais vivência por parte das crianças, e é quando

elas expõem seus argumentos e valores morais.

Qual é o objetivo das aulas? O objetivo das aulas é formar leitores críticos, conforme

estabelece a proposta curricular de 2008. Concluímos que há intenção em formar tais leitores,

principalmente por causa da atenção que se dá à conversa sobre o texto literário. Mas, como

as atividades posteriores à conversa carecem de diversificação e de gradação de desafios, a

concretização desse objetivo fica em xeque. As professoras dão voz aos alunos nas conversas

para que eles sejam mais críticos. Todavia, as propostas nem sempre vão se complexificando,

o que compromete tal formação. Os alunos se tornam críticos em relação às diferenças

culturais principalmente.

Quais concepções de leitura literária sustentam as aulas? A concepção de literatura

defendida na proposta curricular (CPII, 2008) é a mesma que a equipe docente defende.

Literatura é arte e é uma obra aberta. Porém, a presença das competências como eixo

orientador da proposta curricular confere um valor de uso às aulas de Literatura. As

professoras, por sua vez, não mencionam as competências no seu cotidiano de trabalho e

desenvolvem o que consideram importante do ponto de vista delas. Nas conversas alunos e

professoras vivenciam o conceito de obra aberta. A literatura enquanto arte faz com que os

sujeitos pensem sobre si, falem deles e sobre os textos. Contudo, o que eles fazem com a arte

é que está como uma questão para essas aulas. Há pouca diversidade nos modos de estar com

a arte. Isso as transforma em tarefas na maioria das vezes.

O que leem? Quais são os critérios de seleção do corpus literário? Os livros lidos nas

aulas são variados. Há leituras clássicas e contemporâneas. Em geral, a equipe seleciona um

livro por aula. O tipo de corpus privilegiado é a LIJ, clássicos e produções contemporâneas,

conforme também mostra a proposta curricular. Os gêneros prediletos são, nesta ordem, a

narração, a poesia e o teatro. Os gêneros literários prescritos na proposta curricular (CPII,

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2008) são estudados, exceto as histórias em quadrinhos. Não estão sendo trabalhados na

ordem que a proposta prescreve em função da demanda de trabalho integrado que o campus

Humaitá I apresenta, o que acarreta rearranjos quanto à ordem de estudo dos gêneros

literários. Achamos que o currículo de Literatura deveria abrir mão da indicação do ano

escolar em que os gêneros literários devem ser estudados. A proposta curricular de 2008 dá

pouca ênfase ao teatro, muita à narração e alguma à poesia. Os critérios de seleção do corpus

que as professoras e coordenadoras apresentam é mais amplo do que a proposta. Pelo

documento, é a riqueza literária. A equipe ainda acrescenta o tema, a extensão do texto e o

autor. Reiteramos a necessidade de a proposta curricular oferecer um itinerário de leituras de

gêneros literários, livros e autores sem indicar o ano escolar. Dessa maneira, a equipe pode

escolher quando cada gênero, livro e autor devem ser estudados e ainda acrescentar outros

quando achar pertinente. A cada reunião pedagógica é pensado o texto da aula. A seleção de

cada texto não parte de um itinerário de leituras acordado previamente entre a equipe docente.

Que significado as professoras e a coordenação pedagógica de Literatura atribuem às

aulas? As professoras e a coordenação pedagógica compreendem que as aulas de Literatura

são um espaço de formação de leitores críticos. Estes leitores são muito respeitados e

valorizados no que se refere ao seu imaginário infantil. Eles têm espaço para trocar ideias,

resolver problemas, criar e recriar. A proposta curricular do Colégio de 1998 não menciona

em nenhum momento a preocupação com a alfabetização quando se refere ao trabalho com o

1º ano. O mesmo foi observado nas aulas. O 1º ano brinca, ouve, conversa, desenha e, às

vezes, escreve. A preocupação é com a fabulação. Essa maneira de abordar a literatura no 1º

ano possibilita que os alunos participem das aulas mesmo que tenham ou não vivenciado a

educação infantil e práticas de leitura literária. As diferenças sociais e culturais aparecem

durante as conversas. Aqueles que têm alguma relação com o livro e a literatura se colocam

mais facilmente. Aqueles que têm pouca ou nenhuma experiência com a literatura escutam e

vão pouco a pouco aprendendo como conversar sobre os livros e a literatura. Isso acontece

porque as crianças entram na escola por meio do sorteio público, o que traz para o CPII uma

grande diversidade de alunos no que se refere às classes sociais e ao acesso à literatura. As

aulas de literatura trazem a leitura em uma concepção ampla. Isso possibilita que todos

participem da aula conforme o que são e sabem sobre o mundo e sobre a linguagem escrita.

Nas aulas as professoras buscam ensinar uma relação com o texto. Nesse primeiro ano de

escola as crianças têm a oportunidade de fantasiar, ser no mundo. E vão aprendendo a

conviver com a literatura, a serem livres para pensar.

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E para que esse direito possa ser usufruído, há que se produzirem as condições

materiais e sociais: crianças leitoras nascem, e crescem, e vivem, e criam em

ambientes em que a leitura desimpedida ocorra espontânea e frequentemente:

ambientes com muitos e bons livros, com muitas e boas histórias e poemas, com

muitas palavras desafiadoras, frases desajustadas, novidadeiras, voadoras,

atrapalhadas, consoladoras, brincalhonas... (BRITTO, 2015, p. 58). Quais são os conteúdos? No que se refere aos conteúdos em aulas de Literatura,

precisamos primeiro refletir: quais conteúdos literários são importantes os alunos saberem?

Que espaço eles devem ter nas aulas? Em todas as aulas observadas as professoras apresentam

o livro, falam do escritor, ilustrador, da editora e do contexto do livro. Sobre a autoria, os

alunos aprendem a relacionar autores e seus textos, e têm contato com dados biográficos de

autores importantes. Quanto à ilustração, estabelecem relações entre o texto escrito e a

ilustração. Os elementos do texto narrativo também são ensinados. As crianças identificam a

sequência dos fatos, personagens e suas ações, caracterizam personagens, o ambiente e o

narrador. Os elementos do texto poético também são estudados, principalmente o ritmo, as

rimas e as repetições de sons, como também os versos e as estrofes. O contexto do texto

literário é outro conteúdo bastante presente nas aulas de Literatura. As professoras o exploram

com muita intensidade. Nele os alunos relacionam ideias contidas nos textos e o cotidiano

deles, estabelecem relações entre o contexto em que o texto foi escrito e o próprio texto,

identificam elementos presentes no texto que expressam diferenças culturais, conversam sobre

preconceitos e manifestações culturais e, se possível, fazem referência a outros textos. Esses

conteúdos, embora prescritos, abrem para a entrada de outros, para aqueles que cada leitura

traz. Estes se referem às experiências de vida que os alunos trazem para as aulas quando

estabelecem relação com o texto literário. Trata-se de um tipo de conteúdo muito subjetivo e

impossível de ser previsto, mas possível de ter um espaço garantido para emergir e ser

compartilhado. Na conversa sobre o texto literário as perguntas que a professora traz

provocam respostas que puxam outras respostas, e assim por diante. Os alunos vão juntos de

maneira singular construindo os sentidos do texto com a orientação da professora. Nesta

interação verbal a palavra se dirige a um interlocutor. “Ela constitui justamente o produto da

interação do locutor e do ouvinte” (BAKHTIN, 1986, p. 113). O importante nesta interação

verbal é que “Através da palavra, defino-me em relação ao outro, isto é, (...) em relação à

coletividade” (BAKHTIN, 1986, p. 113). Neste encontro, compreender a enunciação de

outrem significa formar uma réplica. “A compreensão é uma forma de diálogo; ela está para a

enunciação assim como uma réplica está para a outra no diálogo. Compreender é opor à

palavra do locutor uma contrapalavra” (BAKHTIN, 1986, p. 131-132). Nesta interação

verbal existimos, interagimos e refletimos.

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Como o texto literário é abordado? Quanto a esta questão, a proposta curricular é, em

grande parte, contemplada. Os alunos se expressam oralmente, plasticamente e

corporalmente; ouvem, recontam e dramatizam; escrevem textos pequenos e leem textos

poéticos. Entendemos que tais modos de aproximação ao texto literário poderiam ser mais

diversificados e incluir ações junto à biblioteca escolar e às aulas de Artes.

Como a biblioteca escolar se articula com as aulas de Literatura? A biblioteca

escolar, no período da pesquisa de campo, não tinha articulação com as aulas de Literatura. O

empréstimo de livros na biblioteca acontecia se as crianças quisessem, principalmente, na

hora do recreio. E como as aulas de Literatura se articulam com as atividades da biblioteca,

com as aulas de Língua Portuguesa e com as aulas de Artes? A biblioteca não tinha

atividades. Simplesmente havia uma equipe de técnicos, bibliotecária e auxiliar de biblioteca

que lá trabalhavam. Tal equipe cuidava do acervo. Não havia a proposição de atividades da

biblioteca. As aulas de Literatura se articulam com as aulas de Língua Portuguesa e Artes por

meio dos temas, conversados nas reuniões de planejamento integrado. Anualmente, há uma

gincana literária promovida pela equipe de Literatura em parceria com as professoras de

Língua Portuguesa do 4º ano. Contudo, não observamos a gincana. Mas é um momento de

integração entre as duas áreas e cabe pensar em articulações com a biblioteca.

As propostas curriculares (CPII, 1985 e 2008) se aproximam mais de qual

abordagem: letramento literário, educação literária ou formação literária? As propostas

curriculares analisadas (CPII, 1985 e 2008) se vinculam mais ao conceito de educação

literária. Contudo, algumas diferenças marcam tais documentos. O PGE (CPII, 1985) confere

mais força à dimensão estético-linguística da literatura (FITTIPALDI, 2013) e às linhas de

força Leitura e Ludismo e Experiência/Formação. Já o PPP (CPII, 2008) dá mais ênfase à

dimensão cognitiva da literatura (FITTIPALDI, 2013) e à linha de força Leitura e Ilustração.

O conceito de competência literária orienta toda a proposta curricular de 2008.

Definida como “una específica capacitat humana que possibilita tant la producció

d‟estructures poètiques com la comprensió dels seus efectes” (BIERWISCH apud

COLOMER, 1994, p. 37), a competência literária, na parte que trata da compreensão de

efeitos das estruturas poéticas, literárias, está presente no objetivo geral do PPP (CPII, 2008)

quando são ressaltadas “as sutilezas, as particularidades, os sentidos, a extensão e a

profundidade das construções literárias” (CPII, 2008, p. 24). Nesse sentido, parece que o

objetivo da educação literária formar o leitor competente não se distancia do explicitado

na proposta curricular formar leitores críticos. Compreendida como a aprendizagem da

interpretação de textos na perspectiva da educação literária, o leitor deve saber construir o

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significado do que lê segundo as instruções oferecidas pelo texto. Para Colomer (1994, p. 41-

41) a Educação deve estabelecer como aprendem as crianças e adolescentes a seguir essas

pistas. Deve saber quais elementos da construção literária resultam mais simples e quais mais

complexos para oferecer ao longo do currículo. Isso dialoga como o objetivo geral da

proposta curricular de 2008: “Formação de leitores capazes de reconhecer as sutilezas, as

particularidades, os sentidos, a extensão e a profundidade das construções literárias” (CPII,

2008, p. 24). Reconhecer sutilezas, particularidades, sentidos, extensão e construções

literárias estão bem próximos de saber elementos da construção literária.

Foi durante os anos 1980 que a educação literária entrou na escola. Nesse mesmo

período foram criadas as aulas de Literatura no EFI. As transformações vividas no campo da

Didática da Literatura alcançaram as aulas de Literatura do CPII, a saber: a) desenvolvimento

nos estudos construtivistas e socioconstrutivistas, que levaram a uma perspectiva centrada no

aprendiz e b) o alcance das teorias da recepção e das respostas leitoras, que mudaram o foco

de interesse para o diálogo entre o texto e o leitor. O leitor está no centro do processo

educativo e das práticas literárias. Com a perspectiva da educação literária o objetivo de

aprender literatura na escola mudou de conhecer autores e obras relativas à história da

literatura para procurar que as pessoas leiam mais e melhor, oferecer ferramentas para que

saibam interpretar mais finamente o que as rodeia (FITTIPALDI, 2013, p. 92). As

competências literárias que são de responsabilidade da escola, segundo Colomer (2009, p. 75-

76), estão centradas no aprendizado da interpretação de textos.

Na abordagem da formação literária interpretar não é fim, mas meio. O fim deve ser a

experiência/vivência/contemplação estética da literatura que o CPII tenta promover com a

atividade de criação subsequente à leitura e à conversa. Aqui acontece uma tensão entre a

educação literária e a formação literária. Observamos que o núcleo das práticas pedagógicas

do CPII é o mesmo do que propõe a educação literária: o acesso aos textos e a discussão sobre

eles.

O PPP (CPII, 2008) quer que o aluno vivencie um estudo da literatura a fim de

dominar as convenções literárias implícitas que governam o pacto entre o autor e o leitor.

Essa proposta curricular diz como a literatura pode apoiar o trabalho de Língua Portuguesa.

Institui por meio das competências o valor de uso dessas aulas. Mas, na prática, as aulas de

Literatura buscam um trabalho não formal da Literatura ao garantirem um espaço para a

criação. Dessa maneira, vemos que há uma tensão entre a proposta curricular (CPII, 2008) e

as aulas observadas. A proposta salienta a dimensão cognitiva da literatura e a linha de força

Leitura e Ilustração, o que também está presente nas aulas durante a leitura dialogada.

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Contudo, nas atividades posteriores à leitura dialogada, toma força a dimensão estético-

linguística da literatura e as linhas de força Leitura e Ludismo e Leitura e

Experiência/Formação. Nesse momento há uma abertura para a formação literária, pois dando

ênfase à dimensão estético-linguística da literatura permite a exploração da linguagem de

maneira criativa. O PGE (CPII, 1985) tendia mais para esta dimensão, portanto, para a

formação literária.

O centro da formação literária é a interação verbal entre texto e leitor por meio do

diálogo, no sentido amplo do termo. O sujeito deve experienciar, vivenciar, contemplar

esteticamente a literatura. A palavra é a ponte entre o eu e o outro. A partir do ler, dizer-se e

criar, propusemos que se estruture a aula de Literatura. Cada vez que as crianças têm a

oportunidade de vivenciarem uma ação interlocutória com a literatura, podem produzir

significados. Durante tais aulas, na perspectiva da formação literária, as crianças não apenas

ouvem e interpretam, mas estão com a literatura. A ação de ler vai além da interpretação do

texto. Na perspectiva da formação literária as crianças tomam a palavra. Ensina-se uma

abertura.

Deste modo, durante a leitura ou a audição de uma obra poética, eu não permaneço

no exterior de mim, como o enunciado de outrem, que é preciso apenas ouvir e cujo

significado prático ou cognitivo é preciso apenas compreender; mas, numa certa

medida, eu faço dele o meu próprio enunciado acerca de outrem, domino o ritmo, a

entonação, a tensão articulatória, a gesticulação interior (criadora do movimento) da

narração, a atividade figurativa da metáfora etc., como a expressão adequada da minha própria relação axiológica com o conteúdo, ou seja, na percepção não viso as

palavras, os fonemas, o ritmo, mas com as palavras, com os fonemas e com o ritmo

viso ativamente um conteúdo: envolvo-o, formo-o e arremato-o [...] (BAKHTIN,

1993b, p. 59).

O que as aulas de Literatura do CPII campus Humaitá I fazem com os sujeitos? As

aulas fazem com que os sujeitos ouçam, imaginem, conversem e têm a intenção de que eles

criem. As professoras fazem isso na tensão entre as perspectivas da educação literária e da

formação literária. A intenção de possibilitar a criação ora se concretiza, ora não.

O que defendemos nesta tese? Após este estudo apresentamos algumas recomendações

tanto na perspectiva de aprimorar a proposta das aulas de Literatura no CPII como também

em uma perspectiva de se pensar a formação literária nos anos iniciais do EF, especialmente

das crianças que frequentam escolas públicas brasileiras.

Defendemos que haja uma proposta curricular de Literatura para o EFI e que as aulas

de Literatura aconteçam, se possível, dentro de uma biblioteca na perspectiva da formação

literária.

Recomendamos que a estrutura das aulas de Literatura do EFI do CPII campus

Humaitá possa ser vista como uma possibilidade para pensar este tipo de aula. Ler, conversar

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e criar vai ao encontro do que propomos com as ações interlocutórias com a literatura ler,

dizer(-se) e criar. Todavia, vale uma ressalva. O conceito de competência como norte de

trabalho de Literatura não coaduna com a abordagem da formação literária, devido ao valor de

uso que tal conceito encerra em si. Ao invés de competências, pensemos em saberes literários.

A progressão das aprendizagens é outro ponto que merece atenção. A proposta

curricular do CPII (2008) diz o que deve ser lido e realizado em cada ano escolar. Indagamos

se é possível propor uma progressão das aprendizagens na abordagem da formação literária. É

possível explicitar os saberes literários próprios de cada ano escolar? Talvez não seja possível

explicitar tais saberes. Porém, é possível selecionar textos literários com construções que

demandem mais dos alunos, bem como propor produções diversificadas que movimentem

diferentes saberes das crianças. Essa questão é importante de ser tematizada porque ela traz

consigo a avaliação das aulas de Literatura. Como avaliar as aulas da perspectiva da formação

literária? Esse é mais um ponto que carece de estudo.

As aulas de Literatura partirem de um tema é uma possibilidade metodológica, já que

também torna possível o diálogo com as demais disciplinas que a escola oferece. A ressalva

que fazemos é a decisão dos temas. Entendemos que ela deve ser feita com os alunos, e não

decidida somente entre os professores, já que, sob a perspectiva da formação literária, o aluno

é cocriador. Ele não cria sem contexto significativo. Podem ser feitos projetos literários a

partir da obra de um autor, de um gênero literário, e não apenas de um tema.

Optando por um tema ou por projetos de trabalho, entendemos que é necessário haver

um itinerário de leituras que inclua obras de reconhecida importância para a formação leitora

das crianças e que também esteja aberto para novas inclusões. Sobre esta questão é importante

que, na proposta curricular e entre a equipe pedagógica, os critérios de seleção dos livros

estejam claros. Outro itinerário que precisa ser construído é o de eventos literários, como

feiras de livros, visitas a bibliotecas, vivência de saraus, exposições, lançamento de livros.

Soubemos, após o período de pesquisa de campo, que os alunos do 1º ao 5º anos foram ao

Salão FNLIJ do Livro para Crianças e Jovens. Não observamos nenhuma aula em que as

crianças fizessem um sarau literário, montassem uma exposição ou produzissem um livro

coletivamente e preparassem o seu lançamento. Há exposições dos trabalhos dos alunos pelas

professoras em um evento que a escola realiza anualmente, chamado Mostra Pedagógica.

A dimensão estético-linguística da literatura (FITTIPALDI, 2013, p. 444-445) é a

especificidade da aula de Literatura. O jogo com os aspectos materiais da linguagem e a

compreensão da literatura como práxis artística permitem a exploração da linguagem de

maneira criativa. O momento da criação deve estar vinculado ao livro. Todavia, propomos

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que as estratégias de criação sejam variadas e que, na medida do possível, possam também

contemplar as que acontecem em espaços onde a literatura circula além da escola. Além disso,

as próprias ilustrações dos livros lidos podem ser mais exploradas na sua dimensão plástica e

suscitar desdobramentos.

Se houver uma biblioteca com estrutura para receber uma turma com espaço, tempo,

acervo e equipe, entendemos que as aulas de Literatura podem acontecer na própria

biblioteca, pois, para possibilitar a vivência da experiência estética, é necessário separar o

tempo da vida do tempo da cultura e trazer o aluno para vivenciar somente o tempo da

cultura. Isso é possível dentro da biblioteca, na relação com o acervo de forma mais ampla. A

escola seria o lugar onde ainda haveria o leitor soberano e uma biblioteca no sentido

humanista. Isto significa viver a escola e a biblioteca como um espaço da cultura, onde o

tempo para para formar (LARROSA, 2003).

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RODRIGUES, Luciana Maria Moura. Leituras e leitores de Corações solitários

alternativas para a abordagem do conto em sala de aula. UFCG, 2012.

RODRIGUES, Paula Cristina de Almeida. A literatura no livro didático de Língua

Portuguesa: a escolarização da leitura literária. UFMG, 2006.

SANTOS, Carlos Alberto Suniga dos. As concepções de literatura do professor na formação

do aluno do texto literário. UFMS, 2008.

SANTOS, Érica Cristina dos. Concepções e práticas de literatura de professores: um estudo

sobre os nonos anos da rede municipal de Itabirito. Cefet-MG, 2012.

SCAVASSA, Júlia Sant‟Ana. Leituras de poemas num curso de letramento para adultos:

olhares dos educandos, olhares da educadora. Unicamp, 2009.

SCHUCHTER, Lúcia Helena. Biblioteca escolar e laboratório de informática: espaços para

diferentes letramentos. UFJF, 2010.

SILVA, Aluska. A literatura no Enem: questionamentos, perspectivas e propostas. UFCG,

2013.

SILVA, Antônio Adailton. A literatura no terceiro ano do Ensino Médio em Araguaína (TO):

um estudo de caso comparado entre as práticas de um professor em escola pública e

particular. UFT, 2012.

SILVA, Bruna Lidiane Marques da. Programa Nacional Biblioteca da Escola Edição

2006: a chegada dos acervos na Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte e a leitura de

obras por jovens leitores. UFMG, 2009.

SILVA, Edissa Fragosso da. Leitura do texto literário museificado no manual de Língua

Portuguesa. Uenf, 2010.

SILVA, Elizabeth Maria da. Histórico de letramento e práticas letradas em redações de

vestibular. UFCG, 2009.

SILVA, Fábio Coutinho. Antes que o mundo da leitura acabe: um estudo da recepção de uma

obra juvenil na escola pública paulista. Unesp, 2011.

SILVA, Lúcia Vagna Rafael da. Leitura literária na escola: a experiência de ler contos de

Clarice Lispector. UFG, 2012.

SILVA, Mônica Cristina Ferreira. Formação de indivíduos leitores entre a biblioteca escolar,

a família e outros apelos socioculturais. UFMG, 2006.

SILVA, Rosita Mattos da. As histórias da gente que cabem num livro: experiências de leitura

nas aulas de Literatura do primeiro ano do Ensino Fundamental. UFRJ, 2011.

SILVA, Simone Bueno Borges da. Leitura, literatura e alfabetização de adultos. Unicamp,

1999.

SILVA, Talita Maria da. Blogs: novos espaços para a escrita literária. UPF, 2011.

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223

SOARES, Kalina Lígia Pereira. Da leitura do espaço ao espaço da leitura: um estudo sobre

A cama de Lygia Bojunga Nunes. UFCG, 2008.

SOARES, Mei Hua. A literatura marginal-periférica na escola. USP, 2008.

SOARES, Samuel Ronobo. Letramento literário: materiais didáticos e o ensino da literatura.

UEM, 2009.

SOUSA, Rodrigo Fernandes de. Que estranho! Isso me parece familiar... O conto fantástico

em sala de aula. UFCG, 2013.

SOUZA, Leila Aparecida. A criança na biblioteca pública comunitária “Saber com sabor”

em Cuiabá (MT): formação leitora literária. UFMT, 2006.

SOZZA, Fátima Aparecida de Oliveira. Histórias de leitura: orientações e práticas de

letramento literário. UEM, 2009.

SUGAYAMA, Ariene Mieco. Investigando práticas sociais de leitura de textos literários: a

mediação de leitura como ação cultural e o pensar alto em grupo. PUC-SP, 2011.

TEIXEIRA, Marina Gontijo Santos.

Catálogos de editora de literatura infanto-

juvenil: uma leitura. UFRJ, 2011.

TRAVASSOS, Sônia. Lobato, infância e leitura: a obra infantil de Monteiro Lobato em

diálogo com crianças na escola da atualidade. UFRJ, 2013.

VALLE, Mariana Cavaca Alves do. A leitura literária de mulheres na EJA. UFMG, 2010.

VÉRAS, Ana Flávia Teixeira. Memórias leitoras, narrativas reveladoras: a formação do

leitor que forma leitores. UFRJ, 2009.

VIANA, Claudionor Alves. Leitura e literatura na Escola Livre Porto Cuiabá na perspectiva

da Pedagogia Waldorf. UFMT, 2012.

VIDAL, Fernanda Fornari. Príncipes, princesas, sapos, bruxas e fadas: os “novos contos de

fadas” ensinando sobre infâncias e relações de gênero e sexualidade na contemporaneidade.

UFRGS, 2008.

VILLA, Cristiane Cechinel de. A leitura sem fim: análise das práticas pedagógicas de leitura

de uma escola estadual do município de Içara (SC). Unesc, 2012.

VINCO, Sônia. Formação do leitor: um bicho de quantas cabeças? UFF, 2006.

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224

LISTAGEM DOS TRABALHOS SOBRE EDUCAÇÃO LITERÁRIA

BRICEÑO, Brenda V. Bellorín. De lo universal a lo global: nuevas formas del folklore en los

álbumes para niños. UAB, 2015.

CULEBRO, Francisca Trujillo. Prácticas de lectura literária en dos aulas de segundo de

secundaria. UAB, 2007.

FITTIPALDI, Martina. Qué han de saber los niños sobre literatura? Conocimientos literarios

y tipos de actuaciones que permiten progresar en la competencia literaria. UAB, 2013.

LÓPEZ, Lara Reyes. La formació literària a primària Impacte d’una intervenció educativa

en l’evolució de respostes lectores. UAB, 2015.

MUNITA, Felipe. El mediador escolar de lectura literaria. Un estudio del espacio de

encuentro entre prácticas didácticas, sistemas de creencias y trayectorias personales de

lectura. UAB, 2014.

ORTEGA, Maria Cecília Silva-Díaz. Libros que enseñan a leer: álbumes metaficcionales y

conocimiento literario. UAB, 2005.

POTRONY, Mireia Manresa. Els hàbits lectors dels adolescents Efectes de les actuacions

escolars em les pràctiques de lectura. UAB, 2009.

Page 226: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

225

APÊNDICES

Page 227: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

226

APÊNDICE A: MAPEAMENTO DOS ARTIGOS SOBRE LETRAMENTO

LITERÁRIO: COLEÇÃO LITERATURA E EDUCAÇÃO, ABRALIC E ANPED

Instituição Autor Ano Nº de

artigos Fonte Título

UFMG

(21 artigos)

Maria Zélia

Versiani

Machado

2003 5 Coleção Literatura e

Educação

Escolhas literárias e julgamento de valor por

leitores jovens

2006 Abralic Leitura de poemas no Ensino Médio, pela via do

livro didático

2007 ANPEd GT 10 Jovens leitores e suas bibliotecas íntimas

Coleção Literatura e

Educação

Literatura e alfabetização: quando a criança

organiza o caos

Maria Zélia

Versiani

Machado e

Aracy Alves

Martins

Evangelista

2011 Coleção Literatura e

Educação

A Literatura e a versatilidade dos leitores

Aracy Alves

Martins

Evangelista

2000 4 Coleção Literatura e

Educação

Diversidade na recepção estética

2001 ANPEd GT 10 Algumas reflexões sobre a relação

literatura/escola

2006 Abralic A leitura literária em livros escolares em

Portugal

Maria das

Graças

Rodrigues

Paulino

1999 3 ANPEd GT 10 Letramento literário: cânones estéticos e

cânones escolares

2005 ANPEd GT 10 Algumas especificidades da leitura literária

Coleção Literatura e

Educação

2004

Coleção Literatura e

Educação

Letramento literário no contexto da biblioteca

escolar

Marta Passos

Pinheiro

2004 2 Coleção Literatura e

Educação

Reflexões sobre práticas de letramento literário

de jovens: o que é permitido ao jovem ler?

2006 Abralic Práticas de leitura de literatura em livros

didáticos de Língua Portuguesa: Brasil e

Portugal

Marcelo

Chiaretto

2002 2 Abralic Leitura literária e exclusão digital no contexto

escolar

2003 Coleção Literatura e

Educação

A leitura literária diante da visão moderna de

progresso

Aparecida

Paiva

2004

2 Coleção Literatura e

Educação

Grupo de pesquisa do letramento literário: uma

trajetória em construção

Aparecida

Paiva e

Francisca

Maciel

2005 Coleção Literatura e

Educação

Discursos da paixão: a leitura literária no

processo de formação do professor das séries

iniciais

Hércules

Toledo Correa

e Geórgia

Roberta de

Oliveira

Ribeiro

2004

1 Coleção Literatura e

Educação

Relações entre o letramento literário e a

formação do escritor em A menina do sobrado,

de Cyro dos Anjos

Maria

Antonieta

Pereira

2007 1 Coleção Literatura e

Educação

Jogos de linguagem, redes de sentido: leituras

literárias

Célia Abicalil

Belmiro

2011

1 Coleção Literatura e

Educação

Formação de professores e os desafios

contemporâneos dos livros de literatura

Mônica

Dayrell

1

Rildo Cosson 2011 1 Coleção Literatura e

Educação

Explorando nossa imagem: a aula de literatura

no cinema

Page 228: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

227

PUC

(3 artigos)

Egon de

Oliveira

Rangel

(PUC-SP)

2003

2 Coleção Literatura e

Educação

Letramento literário e o livro didático de Língua

Portuguesa: Os amores difíceis

2005 Coleção Literatura e

Educação

Literatura e livro didático no Ensino Médio:

caminhos e ciladas na formação do leitor

Regina

Zilberman

(PUC-RS)

2003

1 Coleção Literatura e

Educação

Letramento literário: não ao texto, sim ao livro

UFPE

(2 artigos)

Ana Maria de

Oliveira

Galvão

2003 1 Coleção Literatura e

Educação

Folhetos de cordel: experiências de

leitores/ouvintes (1930-1950)

Ester Calland

de Sousa Rosa

2011 1 ANPEd GT 10 A professora na biblioteca escolar: identidade e

práticas de ensino na formação de leitores

UFRJ

(2 artigos)

Ludmila de

Andrade e

Patrícia

Corsino

2007 1 Coleção Literatura e

Educação

Critérios para a constituição de um acervo

literário para as séries iniciais do Ensino

Fundamental: o instrumento de avaliação do

PNBE 2005

Elvira Vigna 2011 1 Coleção Literatura e

Educação

Literatura e internet

UFF Cecília Goulart 2007 1 Coleção Literatura e

Educação

Alfabetização e letramento: os processos e o

lugar da literatura

Ufes Andréa

Antolini Grijó

2007 1 Coleção Literatura e

Educação

Quem conta um conto aumenta um ponto?

Adaptações e literatura para jovens leitores

Unesp João Luís

Ceccantini

2009 1 Coleção Literatura e

Educação

Prazer à revelia: sobre a leitura de O Pica-Pau

Amarelo no Ensino Fundamental

Unicentro Cláudio Mello

e Antonio H.

da Cunha

2008 1 Abralic

Literatura como prática social em contexto

escolar

UFCG

Adriana

Martins

Cavalcante e

Naelza de

Araújo

Wanderley

2012 1

Abralic

Morte e vida Severina em HQ: uma proposta de

mediação do trabalho com o “clássico” em sala

de aula

UFPEL Mitizi Gomes 2012 1 Abralic

Na década de 1980... Utilizando mídias

inovadoras para a formação do leitor

UEM

Miriam Hisae

Yaegashi

Zappone

2006 1 ANPEd GT 10 Letramento literário: tecendo conceitos

EMAT – PBH Diléa Pires 2002 1 ANPEd GT 10 Dinamizando a biblioteca escolar por meio de

projetos integrados

Unesc Celdon Fritzen 2007 1 ANPEd GT 10 O lugar do cânone no letramento literário

UFJF Begma

Tavares

Barbosa

2009 1 ANPEd GT 10 Letramento literário: escolhas de jovens leitores

IFG Micheline

Madureira

Lage

2013 1 ANPEd GT 10 Palavra de professor: ensino, leitura e literatura

sob o foco dos docentes de licenciatura em

Letras

UFRGS

Rosa Maria

Hessel Silveira

e

Iara Tatiana

Bonin

2013

1

ANPEd GT 10

A literatura infanto-juvenil nas reuniões anuais

da ANPEd: espaços e temas

Ulbra

TOTAL 40

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228

APÊNDICE B: MAPEAMENTO DE TESES E DISSERTAÇÕES SOBRE

LETRAMENTO LITERÁRIO: BANCO DE TESES DA CAPES, SITES DE

UNIVERSIDADES E BIBLIOTECA DIGITAL BRASILEIRA DE TESES E

DISSERTAÇÕES

Instituição Programa Orientador Ano Autor Título Sujeitos/corpus da

pesquisa

UFMG

(21)

Educação Aparecida

Paiva (7)

2006 Paula Cristina

de Almeida

Rodrigues

A literatura no livro didático de Língua

Portuguesa: a escolarização da leitura

literária

Coleções Linhas &

Entrelinhas e Bem-

Te-Li (EF I)

2009

Cristiane Dias

Martins da

Costa

Literatura premiada entra na escola? A

presença dos livros premiados pela

FNLIJ, na categoria criança, em

bibliotecas escolares da Rede Municipal

de Belo Horizonte

49 Títulos

premiados pela

FNLIJ, de 1974 a

2006, na categoria

criança (EF I)

Daniela Freitas

Brito

Montuani

O PNBE/2005 na Rede Municipal de

Ensino de BH: uma discussão de

possíveis impactos da política de

distribuição de livros de literatura na

formação de leitores

PNBE/2005 (EF I)

Bruna Lidiane

Marques da

Silva

Programa Nacional Biblioteca da Escola

– Edição 2006: a chegada dos acervos

na Rede Municipal de Ensino de Belo

Horizonte e a leitura de obras por jovens

leitores

Profissionais das

bibliotecas escolares

e alunos (EF II)

Elaine Maria

da Cunha

Morais

Impasses e possibilidades da atuação

dos profissionais das bibliotecas da rede

municipal de Belo Horizonte

Profissionais das

bibliotecas da rede

municipal de BH,

com enfoque nos

auxiliares de

biblioteca

2011 Marina

Gontijo Santos

Teixeira

Catálogos de editora de literatura infan-

to-juvenil: uma leitura

8 catálogos de

editoras dedicadas

ao público

infantojuvenil

2011 Virgínia de

Souza Ávila

Oliveira

Entre as proposições teóricas e a

prática: o uso da literatura infantil nas

escolas municipais de Lagoa Santa

Professoras (EI) e

professoras de

biblioteca (EF I)

Maria das

Graças

Rodrigues

Paulino (4)

2003 Maria Zélia

Versiani

Machado

A literatura e suas apropriações por

jovens leitores

Alunos (EF I e II)

2006 Marta Passos

Pinheiro (tese)

Letramento literário na escola: um

estudo de práticas de leitura de

literatura na formação da “comunidade

de leitores”

Alunos (EF II)

Mônica

Cristina

Ferreira Silva

Formação de indivíduos leitores entre a

biblioteca escolar, a família e outros

apelos socioculturais

Alunos (EF II e

EM), profissionais

da biblioteca,

professora de

Língua Portuguesa

2010 Micheline

Madureira

Lage (tese)

Ensino, literatura e formação de profess

ores na educação superior: retratos e

retalhos da realidade mineira

Professores do curso

de Letras (ES)

Magda

Becker

Soares

2000 Aracy Alves

Martins

Evangelista

(tese)

A escolarização da literatura entre

ensinamento e mediação cultural:

formação e atuação de quatro

professoras.

Professores (EF II)

Francisca

Izabel Pereira

Maciel e co-

2009

Chrisley

Soares Félix

Coleção Literatura Para Todos: análise

das obras em função do público da EJA

Coleção Literatura

Para Todos (EJA)

Page 230: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

229

orientadora

Maria Zélia

Versiani

Machado

Francisca

Izabel Pereira

Maciel

2013 Joaquina

Roger

Gonçalves

Duarte

Formação continuada de rede: um

estudo de caso da formação de

professores no município de Lagoa Santa

Professores (EI e

EF I)

Maria Lúcia

Castanheira

e co-

orientadora

Maria Zélia

Versiani

Machado

2010 Paula Cristina

de Almeida

Rodrigues

(tese)

O letramento literário em uma turma de

quarto ano do Ensino Fundamental

Práticas de

letramento literário

(EF I)

Maria Zélia

Versiani

Machado

2011 Eliana

Guimarães

Almeida

O livro de literatura infantil no primeiro

ciclo: um estudo sobre a mediação

escolar da literatura em um contexto

socioeconomicamente desfavorecido

Alunos (EF I)

Marildes

Marinho

2010 Vânia

Aparecida

Costa (tese)

Práticas de leitura em uma sala de aula

da Escola do Assentamento: Educação

do Campo em construção

Práticas de leitura

(EF I – Educação do

campo)

2007 Rosângela

Assis Feliciano

de Melo

Jovens leitores de meios populares:

histórias e trajetórias de leitura

Alunos (EF II)

Carmem

Lúcia Eiterer

2010

Dorothy do

Abaeté

Andrade Neiva

Letramento literário e os sujeitos da

EJA: práticas, eventos e significados

atribuídos

Professores e alunos

(EF I – EJA)

Mariana

Cavaca Alves

do Valle

A leitura literária de mulheres na EJA Alunas (EF II)

Aracy Alves

Martins

Evangelista

2008 Maria Elisa de

Araújo Grossi

A mediação alfabetizadora na produção

de leitura e de escrita de gêneros e

suportes textuais: o desafio de

alfabetizar na perspectiva do letramento

Professoras (EF I)

UFRJ

(11)

Educação Reuber

Gerbassi

Scofano

2007 Luciana

Guedes

Guimarães

Tinha uma leitura no meio do caminho:

formação do aluno-leitor

Alunos (EM)

Ludmila

Thomé de

Andrade

2008 Fabrícia

Vellasquez

Paiva

A literatura infanto-juvenil na formação

social do leitor: a voz do especialista e a

vez do professor nos discursos do PNBE

2005

Pareceres do PNBE

2005 produzidos por

professores

especialistas,

professores de sala

de aula (EF I) e

professores de sala

de leitura

Patrícia

Corsino

(8)

2009 Ana Flávia

Teixeira Véras

Memórias leitoras, narrativas

reveladoras: a formação do leitor que

forma leitores

Professor (EF I)

2010 Simone Xavier

de Lima

Biblioteca ramal no município de Nova

Iguaçu: letramento e práticas leitoras

Bibliotecária,

responsável pelo

projeto de leitura,

alunos (EF I) e

professoras

responsáveis pela

biblioteca

2011

Rosita Mattos

da Silva

As histórias da gente que cabem num

livro: experiências de leitura nas aulas

de Literatura do primeiro ano do Ensino

Fundamental

Alunos (EF I)

Cláudia

Pimentel

(tese)

Espaços de livro e leitura: um estudo

sobre as Salas de Leitura de escolas

municipais da cidade do Rio de Janeiro

Responsáveis pelo

projeto sala de

leitura, professores

de salas de leitura

(EI e EF I)

Page 231: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

230

2012 Jordana

Castelo Branco

A presença do discurso religioso em uma

escola de Educação Infantil da rede

pública de ensino do município de

Duque de Caxias

Diretora, professora,

auxiliar de turma e

alunos (EI)

2012 Hélen A.

Queiroz

O jogo literário: espaço, função e

reverberação da literatura na formação

do leitor na infância

Alunos (EF I) 5º ano

2013 Sônia M. M. F.

Travassos

Lobato, infância e leitura: a obra infantil

de Monteiro Lobato em diálogo com

crianças na escola da atualidade

Obra infantil de

Monteiro Lobato.

Alunos, professora e

coordenadora de

Literatura (EF I)

2013 Maria

Nazareth de

Souza Salutto

de Mattos

Leitura literária na creche: o livro entre

texto, imagens, olhares, corpo e voz

Alunos, professoras,

auxiliares de turma e

demais funcionários

da creche (EI)

Linguística

Aplicada

Idalina

Azevedo da

Silva

2011 Anderson da

Silva Ribeiro

Textura da leitura: seria uma rima ou

uma solução? Perspectivas em

Linguística Aplicada

Alunos (EM)

UEM

(8)

Letras Miriam Hisae

Yaegashi

Zappone (6)

2008 Juliana Carli

Moreira de

Andrade

O letramento literário em uma

comunidade rural do Pontal do

Paranapanema

Alunos (EF II)

Gilda Teresa

Contreras

López

Um estudo de caso Leitura de narrativa

de acadêmicos do Instituto de Línguas

da Universidade Estadual de Maringá

Professores e alunos

(ES)

Samuel

Ronobo Soares

Letramento literário: materiais didáticos

e o ensino da literatura

Materiais didáticos

(EF I e II e EM)

2009 Fátima

Aparecida de

Oliveira Sozza

Histórias de leitura: orientações e

práticas de letramento literário

Professores

(EF II)

2010 Marcela Dias

Pinto

Leitor comum escolarizado e a leitura de

O caçador de pipas, de Khaled Hosseini

Leitor comum

escolarizado

2012 Letícia Toniete

Izeppe

Bisconcim

Mangá: um estudo de sua forma

ficcional e de sua recepção enquanto

prática de letramento literário no

município de Maringá – Paraná

Mangá. Leitor de

mangás

Sonia

Aparecida

Lopes Benites

2011 Maria Iraides

da Silva

Barreto

Um sarau literário no semiárido baiano:

formação e desenvolvimento de leitores

Alunos e ex-alunos,

professora, equipe

gestora da escola,

coordenadora

pedagógica, pais de

alunos e de ex-

alunos (EM)

Vera Helena

Gomes

Wielewicki

2012 Daiane da

Silva Lourenço

Entre instituições de ensino e mercado

de consumo: a leitura de narrativas em

língua inglesa por adolescentes

brasileiros

Alunos (EF II e ES)

UFCG

(8)

Letras Márcia

Tavares Silva

2008 Kalina Lígia

Pereira Soares

Da leitura do espaço ao espaço da

leitura: um estudo sobre A cama de

Lygia Bojunga Nunes

Alunos (EF II)

Literatura e

Ensino

José Edilson

de Amorim

2009 Isaías de

Oliveira

Ehrich

Entre os apitos da casa-de-força, a

barragem: da análise textual à sala de

aula

Romance A

barragem

Denise Lino

de Araújo

2009 Elizabeth

Maria da Silva

Histórico de letramento e práticas

letradas em redações de vestibular

Provas de redação do

vestibular da UFCG

2007. Candidatos do

vestibular (ES)

José Hélder

Pinheiro

Alves (2)

2012 Luciana Maria

Moura

Rodrigues

Leituras e leitores de Corações solitários

– alternativas para a abordagem do

conto em sala de aula

Alunos (EM)

Fernanda

Aquino

Sylvestre (2)

2013 Adriana

Vicente do

Nascimento

A poética do espaço na teia narrativa:

da crítica à sala de aula

Professor e alunos

(EM)

Linguagem

e Ensino

Fernanda

Aquino

2013 Rodrigo

Fernandes de

Que estranho! Isso me parece familiar...

O conto fantástico em sala de aula

Alunos (EF II)

Page 232: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

231

Sylvestre Sousa

Josilene

Pinheiro

Mariz

e co-

orientador

José Hélder

Pinheiro

Alves

Aluska Silva A literatura no ENEM: questionamentos,

perspectivas e propostas

Provas do ENEM de

2009 a 2012 e

Matriz de

Referência do Enem

(EM)

Maria Marta

dos Santos

Silva

Nóbrega

Andréia Maria

da Silva Lopes

As mulheres da cidade em Lima Barreto:

apreciação crítica e recepção de contos

na sala de aula

Contos do autor

Lima Barreto.

Alunos (EM)

USP

(6)

Educação Neide Luzia

de Rezende

2008

Mei Hua

Soares

A literatura marginal-periférica na

escola

Alunos (EF II e EM)

Idméa

Semeghini-

Siqueira

Márcia Soares

de Araújo

Feitosa

Prática docente e leitura de textos

literários no Fundamental II: uma

incursão pelo Programa Hora da Leitura

Hora da Leitura

Silvia de

Matos

Gasparian

Colello

2012 Priscila Maria

Sbizerra

Bolognesi

Rodas de leitura na escola: do

envolvimento dos alunos aos processos

de reflexão

Alunos (EF I)

Teresa

Cristina Rego

2009 Ana Paula

Carneiro

Renesto

Jovens leitores em meios populares:

paradoxais constituições leitoras

Jovens leitores

Letras Cristina

Moerbeck

Casadei

Pietraróia

2009 Rita Jover-

Faleiros (tese)

Didática da leitura na formação FLE:

em busca dos leitores

Alunos (ES)

Walkyria

Maria Monte

Mór

2011 Roberto

Bezerra da

Silva (tese)

Interpretações: autobiografia de uma

pesquisa sobre letramento literário em

língua inglesa

Pesquisador (ES)

Unesp

(6)

Educação Cyntia

Graziella

Guizelim

Simões

Girotto

2013 Vanessa

Bataus

Leitura, literatura infantil e estratégias

de leitura no contexto escolar:

concepções e práticas

Projeto Educativo da

unidade escolar.

Alunos,

coordenadora

pedagógica e

professora (EF I)

Renata

Junqueira de

Souza (2)

2011 Miriam Raquel

Piazzi

Machado

Alfabetização e letramento literário no

2º ano do Ensino Fundamental de nove

anos: funções e usos da literatura

infantil

Professoras (EF I)

Kelly Cristina

Costa Martins

Da leitura à literatura ao letramento

literário: prática docente em foco

Professora (EF I)

Paulo César

de Almeida

Raboni

2012 Antônia

Aurélio Pinto

Literatura infantil e ensino de ciências:

aproximações e dificuldades

Professoras (EF I)

Letras João Luís C.

Tápias

Ceccantini (2)

2008 Ana Carla

Lanzi Ciola

PISA 2000 e Letramento literário: um

estudo comparativo entre Brasil e

Alemanha

PISA/2000

2011 Fábio

Coutinho Silva

Antes que o mundo da leitura acabe: um

estudo da recepção de uma obra juvenil

na escola pública paulista

Alunos e professores

(EF II)

UCS

(5)

Educação Flávia

Brochetto

Ramos (5)

2009 Janaína

Pieruccini de

Bortoli

Letramento literário: leitura de contos

populares na educação

Alunos (EF I)

2010

Vânia Marta

Espeiorin

Educação pelo poético: a poesia na

formação da criança

Poesias do livro Lili

inventa o mundo do

autor Mário

Quintana

Athany

Gutierres

A mediação docente como estratégia

para o aprimoramento da competência

leitora

Alunos (EM)

2011 Morgana Kich Mediação de leitura literária: o

Programa Nacional Biblioteca da Escola

Professores

bibliotecárias e

Page 233: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

232

(PNBE) / 2008 equipe diretiva (EF

I). Obras do

PNBE/2008

Judithe Eva

Dupont Ló

Educação literária pela mediação:

estudo aplicado no primeiro ano do

Ensino Fundamental

Professora e alunos

(EF I)

UNB

(5)

Linguística Márcia

Elizabeth

Bortone

2009 Maria

Emanuele

Pereira Costa

A interdisciplinaridade na construção da

leitura: um caminho para o letramento

Professores e alunos

(EM)

Stella Maris

Bortoni-

Ricardo (3)

2012 Caroline

Rodrigues

Cardoso (tese)

Letramentos escolares no Ensino Médio Professores e alunos

(EM)

Educação Ângela

Álvares

Correia Dias

2009 Siberia Sales

Queiroz de

Lima

O dialogismo bakhtiniano nas

articulações hipertextuais de diferentes

gêneros discursivos nas aulas de

literatura do Ensino Médio

Alunos (EM)

Stella Maris

Bortoni-

Ricardo

2010 Veruska

Ribeiro

Machado

(tese)

Práticas escolares de leitura: relações

entre a concepção de leitura do PISA e

as práticas da escola

PISA. Professores e

equipe gestora (EF

II)

2012 Thaís de

Oliveira

Letramento literário – a mediação da

leitura de obras literárias no processo de

constituição de leitores competentes

Professores e alunos

(EF I)

UFMT

(5)

Educação Ana Arlinda

de Oliveira

(4)

2006

Rosana

Campos Leite

Experiências de leitura de leitores jovens

de uma escola pública de Cuiabá, Mato

Grosso

Jovens leitores (EM)

Leila

Aparecida de

Souza

A criança na biblioteca pública

comunitária “Saber com sabor” em

Cuiabá - MT: formação leitora literária

Crianças de 9 a 12

anos e mediadores

de leitura.

2011 Sílvia Cristina

Fernandes

Paiva

Literatura infantil: formação do leitor

literário em três escolas de Primavera

do Leste - MT

Professores (EFI)

2012 Claudionor

Alves Viana

Leitura e literatura na Escola Livre

Porto Cuiabá na perspectiva da

Pedagogia Waldorf

Professora e alunos

(EF I)

Estudos da

Linguagem

Cláudia

Graziano

Paes de

Barros

2013 Iara Lopes

Maiolini

Uma proposta enunciativo-discursiva de

leitura de contos para o Ensino

Fundamental

Alunos. Livro

didático de Língua

Portuguesa (EF II)

UFT

(5)

Língua e

Literatura

Dernival

Venâncio

Ramos Júnior

e co-

orientador

Márcio de

Mello Araújo

2012 Gislene Pires

de Camargos

Ferreira

Escola de tempo integral e letramento

literário: um estudo sobre a formação de

leitores

Diretora,

coordenadora e

professoras de

Língua Portuguesa.

Proposta curricular

(2006) (EF II)

Ensino de

Língua e

Literatura

Luiza Helena

Oliveira da

Silva

2012 Francisco de

Assis Neto

O direito de aprender literatura: estudos

sobre o letramento literário envolvendo

uma escola de assentamento rural no

norte do Tocantins

Professores, alunos,

pais e moradores.

Livro didático de

Língua Portuguesa

(EM)

Hilda Gomes

Dutra

Magalhães

(2)

2012 Maria da

Conceição de

Jesus Ranke

O lugar da fruição em aulas de literatura

em um Centro de Ensino Médio de

Araguaína, Tocantins

Professor da

biblioteca,

professores de

Literatura,

coordenadores

pedagógicos e

alunos. Projeto

Político Pedagógico,

Proposta Curricular

do Estado do

Tocantins, PCNEM,

PCN + Ensino

Médio e Orientações

Page 234: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

233

Curriculares para o

Ensino Médio (EM)

2013 Francisco Neto

Pereira Pinto

O leitor real na perspectiva da

complexidade: um estudo de caso

Alunos e professores

(EM). PCNEM

(2000), PCN (2002)

+ Orientações

Curriculares para o

Ensino Médio

(2006), Proposta

Curricular do Estado

do Tocantins para o

Ensino Médio e o

Projeto Político

Pedagógico da

escola

Márcio

Araújo de

Melo

2012 Antônio

Adailton Silva

A literatura no terceiro ano do Ensino

Médio em Araguaína / TO: um estudo de

caso comparado entre as práticas de um

professor em escola pública e particular

Professor,

profissionais da

biblioteca,

coordenadora

pedagógica e alunos

(EM)

UFRGS

(4)

Educação Iole Maria

Faviero

Trindade

2008 Fernanda

Fornari Vidal

Príncipes, princesas, sapos, bruxas e

fadas: os “novos contos de fadas”

ensinando sobre infâncias e relações de

gênero e sexualidade na

contemporaneidade

Contos de fadas

contemporâneos

Linguística

Aplicada

Luciene

Juliano

Simões

2011 Juçara

Benvenuti

(tese)

Letramento, leitura e literatura no

Ensino Médio na modalidade de

Educação de Jovens e Adultos: uma

proposta curricular

Proposta Curricular

de Literatura (EM –

EJA)

Literatura

Brasileira,

Portuguesa

e Luso-

Africana

Regina

Zilberman

2011 Ernani Mügge

(tese)

Ensino Médio e educação literária:

propostas de formação do leitor

Proposta

metodológica (EM)

Literatura

Brasileira

Maria da

Glória

Bordini

2013 Tiane Reusch

Quadros (tese)

A poesia no Ensino Médio: um desafio

da escola e da universidade

Alunos e professoras

(EM)

PUC

(4)

Educação Sônia

Krammer

(RJ)

2004 Leda Maria da

Fonseca

Sala de leitura – concepções e práticas Sala de Leitura

Literatura e

Crítica

Literária

Vera Bastazin

(SP)

2007 Ceciliany

Alves Feitosa

A literatura na escola: o texto literário

no livro didático

Livros didáticos

(EF I)

Linguística

Aplicada e

Estudos da

Linguagem

Mara Sophia

Zanotto (SP)

(2)

2009 Madalena de

Souza Reis

O professor como agente de letramento e

o pensar alto em grupo na leitura de

poemas

Professores (EM)

2011 Ariene Mieco

Sugayama

Investigando práticas sociais de leitura

de textos literários: a mediação de

leitura como ação cultural e o pensar

alto em grupo

Alunas do Projeto

Formação de

Educadores

Mediadores de

Leitura e professora-

pesquisadora (EF II)

Unicamp

(3)

Linguística

Aplicada

Roxane

Helena

Rodrigues

Rojo

2008 Viviane Silva

Coentro

A arte de contar histórias e letramento

literário – possíveis caminhos

Alunos e professor

(EF I)

Sylvia Bueno

Terzi

2009 Júlia Sant‟Ana

Scavassa

Leituras de poemas num curso de

letramento para adultos: olhares dos

educandos, olhares da educadora

Alunos e professora-

pesquisadora

(Educação não

formal)

Raquel Salek

Fiad

2010 Aline Akemi

Nagata

Ensino de literatura: formação, reflexão

e prática

Professores (EM)

Unitau Linguística Vera Lúcia 2008 Maria Elisa Interação em sala de aula de literatura: Alunos (EM)

Page 235: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

234

(2) Aplicada Batalha de

Siqueira

Renda

(2)

Brito Pereira

Pinheiro

vozes leitoras e produtoras de sentido

2012 Glaucia

Cristina

Scarpel Melli

Letramento literário: caminhos e

desafios para a formação de pais leitores

Pais ou responsáveis

de alunos (EI)

Unesc

(2)

Educação

Celdon

Fritzen

2008 Alaim Souza

Neto

Formação do leitor e cânone literário:

relações entre as Orientações

Curriculares e as práticas docentes

Professores (EM)

Gladir da

Silva Cabral

2012 Cristiane

Cechinel de

Villa

A leitura sem fim: análise das práticas

pedagógicas de leitura de uma escola

estadual do município de Içara (SC)

Bibliotecária, alunos

e professores (EF II

e EM)

UFPE

(2)

Educação Lívia

Suassuna

2010 Amanda Silva

Falcão da

Costa

Ensino de leitura literária: um estudo

comparativo

Documentos oficiais

e não oficiais.

Professor (EM)

Linguística Elizabeth

Marcuschi

e co-

orientadora

Gilda Maria

Lins de

Araújo

2010 Sônia Maria

Xavier Duarte

Que leitor se pretende formar no Ensino

Médio?

PCNEM, OCEM,

PNLEM e manuais

do professor de livro

didático de Língua

Portuguesa (EM)

UFG

(2)

Letras e

Linguística

Lucielena

Mendonça de

Lima

2012

Priscila

Rodrigues do

Nascimento

Letramento literário: uma experiência de

leitura com alunos do Ensino Médio

técnico

Alunos (EM

técnico)

Maria de

Fátima

Cruvinel

Lúcia Vagna

Rafael da Silva

Leitura literária na escola: a experiência

de ler contos de Clarice Lispector

Alunos (EM)

UFJF

(2)

Educação Maria Teresa

de Assunção

Freitas

2010

Maria

Leopoldina

Pereira

Blogs literários nas aulas de Língua

Portuguesa: uma possibilidade de

autoria

Professores (EF II)

Adriana

Rocha Bruno

Lúcia Helena

Schuchter

Biblioteca escolar e laboratório de

informática: espaços para diferentes

letramentos

Professores-

bibliotecários,

professora

responsável pelo

laboratório de

informática,

professores regentes

e coordenadoras

pedagógicas

UFMS

(2)

Educação Maria Emília

Borges

Daniel

2008 Carlos Alberto

Suniga dos

Santos

As concepções de literatura do professor

na formação do aluno do texto literário

Professores (EM)

Ana Lúcia

Espíndola

2011 Fé de Souza

Freitas

A leitura da literatura infantil e o

letramento literário: perfil docente na

rede municipal de ensino (REME) do

município de Três Lagoas - MS

Professores (EI) e

profissional

responsável pela

biblioteca escolar

UFF

(1)

Educação Edith Ione

dos Santos

Frigotto

2011 Vanessa de

Abreu

Camasmie

A apropriação de práticas de leitura

literária de alfabetizandos adultos

trabalhadores do projeto Leituras e

escritas no cotidiano do trabalhador

Alunos (Educação

não formal)

UFBA

Educação

Dinéa Maria

Sobral Muniz

2009

(tese)

Maria de

Fátima

Berenice da

Cruz

Memória de leituras literárias de jovens

e adultos alagoinhenses

Alunos (EM – EJA)

UFPR Educação Leilah

Santiago

Bufrem

2012 Elisa Maria

Dalla-Bona

(tese)

Letramento literário: ler e escrever

literatura nas séries iniciais do Ensino

Fundamental

Alunos e professoras

(EF I)

Cefet-MG Estudos de

Linguagens

Marta Passos

Pinheiro

2012 Érica Cristina

dos Santos

Concepções e práticas de literatura de

professores: um estudo sobre os nonos

anos da rede municipal de Itabirito

Professoras (EF II)

Unimep Educação Maria Cecília

Rafael de

Góes

2006 Elaine silva

Dante

Gostar de ler: um estudo com alunos do

Ensino Médio e sua relação com a

leitura

Alunos (EM)

Page 236: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

235

UPF Letras –

Estudos

Literários

Tânia M. K.

Rösing

2011 Talita Maria

da Silva

Blogs: novos espaços para a escrita

literária

Blogs literários

UCP Educação Marlene

Alves de

Oliveira

Carvalho

2010 Giovanna

Rodrigues

Cabral

Programa de formação continuada de

professores: Pró-Letramento em ação

Professoras cursistas

do Programa Pró-

Letramento

Uenf Cognição e

Linguagem

Sérgio Arruda

de Moura

2010 Edissa Fragoso

da Silva

Leitura do texto literário museificado no

manual de Língua Portuguesa

Livro didático (EF

II)

Total 16

Educação: 66

Letras: 45

111 trabalhos: 12 teses e 99 dissertações

Escola: 96

Universidade: 6

Outros espaços

educativos: 4

História de leitura

literária: 5

Page 237: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

236

APÊNDICE C: MAPEAMENTO CATEGORIZADO DE TESES, DISSERTAÇÕES E

ARTIGOS SOBRE LETRAMENTO LITERÁRIO

Abordagem

teórica Ensaios Categorias Subcategorias 1

Teses,

dissertações

e artigos

Subcatego-

rias 2

Teses, dissertações e

artigos

1. Maria das

Graças

Rodrigues

Paulino e

Rildo Cosson

Paulino

(1999)

Evangelista

(2001, 2011)

Paulino (2005)

Zilberman

(2003)

Rangel

(2003)

Aparecida

Paiva (2004)

Rangel (2005)

Fritzen (2007)

Machado

(2007a, 2011)

Goulart (2007)

Pereira (2007)

Grijó (2007)

Gomes (2012)

Silveira e

Bonin (2013)

Vigna (2011)

Cosson (2011)

Belmiro e

Dayrell (2011)

1. Práticas de

letramento literário

1.1. História de

leitura literária

Corrêa e

Ribeiro (2004)

Melo (2007)

Valle (2010)

Renesto (2009)

2.1. Biblioteca

pública

Souza (2006)

Lima (2010)

2. Práticas

escolares de

letramento literário

2.1. Políticas

públicas/Progra-

mas de livro e/ou

de leitura

PNBE:

Andrade e

Corsino (2007)

Montuani

(2009)

Paiva (2008)

Silva, Bruna L.

M. (2009)

Kich (2011)

Coleção

Literatura Para

Todos:

Félix (2009)

Programa Hora

da Leitura:

Feitosa, Márcia

S. A. (2008)

2.2. Biblioteca

escolar/Sala de

leitura

Biblioteca

escolar:

Pires (2002)

Chiaretto

(2002, 2003)

Machado

(2003a, 2003b,

2007b)

Paulino (2004)

Silva, Mônica

C. F. (2006)

Costa (2009)

Morais (2009)

Rosa (2011)

Grossi (2008)

Schuchter

(2010)

Ranke (2012)

Freitas (2011)

Villa (2012)

Oliveira (2011)

Sala de leitura:

Pimentel (2011)

2.3. Ensino de

literatura

2.3.1.

Formação

docente

Paiva e Maciel (2005)

Evangelista (2000a)

Lage (2010, 2013)

Duarte (2013)

Cabral (2010)

Veras (2009)

Page 238: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

237

Bataus (2013)

2.3.2.

Práticas

docentes

Neto (2008)

Oliveira (2011)

Villa (2012)

Branco (2012)

Pinto (2012)

Costa, Maria Emanuele

P. (2009)

Machado, Veruska R.

(2010)

Santos, Érica Cristina

(2012)

Ferreira (2012)

Pinto (2013)

Silva, Antônio A.

(2012)

Freitas (2011)

Santos, Carlos Alberto

S. (2008)

Nagata (2010)

Costa, Amanda S. F.

(2010)

Grossi (2008)

Veras (2009)

Rodrigues (2010)

Bataus (2013)

Machado, Miriam R. P.

(2011)

Martins (2011)

Paiva (2011)

2.3.3.

Práticas

docentes e

interlocução

com

discentes

Evangelista (2000b)

Costa, Vânia A. (2010)

Mattos (2013)

Neto, Francisco de A.

(2012)

Ranke (2012)

Quadros (2013)

Neiva (2010)

Almeida (2011)

Silva, Rosita M. (2011)

Travassos (2013)

Ló (2011)

Viana (2012)

Dalla-Bona (2012)

2.3.4.

Práticas do

pesquisador

com

discentes ou

com

responsáveis

dos discentes

Com discentes:

Ceccantini (2009)

Soares, Kalina L. P.

(2008)

Pinheiro, Maria E. B. P.

(2008)

Reis (2009)

Queiróz (2012)

Travassos (2013)

Bolognesi (2012)

Bortoli (2009)

Oliveira (2012) )

Ehrich (2009)

Rodrigues (2012)

Nascimento, Adriana V.

(2013)

Sousa, Rodrigo F.

Page 239: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

238

(2013)

Lopes, Andréia M. da S.

(2013)

Soares, Mei (2008)

Silva, Fábio C. (2011)

Gutierres (2010)

Lima (2009)

Pereira (2010)

Silva, Lúcia V. R.

(2012)

Sugayama (2011)

Scavassa (2009)

Nascimento, Priscila R.

(2012)

Com responsáveis dos

discentes:

Melli (2012)

2.3.5.

Propostas

didáticas do

pesquisador

Maiolini (2013)

Mugge (2011)

Cavalcante e Wanderley

(2012)

2.3.6.

Práticas de

leitura e/ou

escritas dos

discentes

Barbosa (2009)

Guimarães (2007)

Leite (2006)

Dante (2006)

Maiolini (2013)

Camasmie (2011)

2.3.7.

Textos

impressos ou

digitais

(Materiais

didáticos,

documentos

oficiais,

catálogos de

livros de

literatura,

avaliações,

obras

literárias,

blog)

Ciola (2008)

Neto (2008)

Evangelista (2006)

Machado (2006)

Rodrigues (2006)

Feitosa (2007)

Pinheiro, Marta P

(2006a, 2006b, 2004)

Teixeira (2011)

Travassos (2013)

Ehrich (2009)

Silva, Aluska (2013)

Lopes, Andréia M. da S.

(2013)

Silva, Edissa (2010)

Silva, Talita Maria

(2011)

Duarte, Sônia Maria X.

(2010)

Benvenuti (2011)

Vidal (2008)

Espeiorin (2010)

Pinto (2012)

Machado, Veruska R.

(2010)

Maiolini (2013)

Ferreira (2012)

Neto, Francisco de A.

(2012)

Ranke (2012)

Pinto (2013)

Villa (2012)

Costa, Amanda S. F.

(2010)

2. Ângela B.

Kleiman

Zappone

(2006)

1. Práticas de

letramento literário

1. História de

leitura literária

López (2008)

Sozza (2009)

Page 240: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

239

2. Práticas de

leitura literária

Pinto (2010)

Bisconcim

(2012)

Lourenço

(2012)

2. Práticas

escolares de

letramento literário

2.2. Biblioteca

escolar/Sala de

leitura

Sala de leitura:

Fonseca (2004)

2.3. Ensino de

literatura

2.3.1.

Formação

docente

Mello e Cunha (2008)

Jover-Faleiros (2009)

Silva, Roberto B. (2011)

2.3.2.

Práticas

docentes e

interlocução

com

discentes

Cardoso (2012)

2.3.3.

Práticas do

pesquisador

com

discentes ou

com

responsáveis

de discentes

Coentro (2008)

Ribeiro (2011)

Barreto (2011)

2.3.4.

Práticas de

leitura e/ou

escritas dos

discentes

Andrade (2008)

Silva, Elizabeth Maria

(2009)

2.3.5.

Textos

impressos ou

digitais

(Materiais

didáticos,

documentos

oficiais,

catálogos de

livros de

literatura,

avaliações,

obras

literárias,

blog)

Soares, Samuel R.

(2008)

Bisconcim (2012)

Page 241: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

240

APÊNDICE D: MAPEAMENTO DE TESES SOBRE EDUCAÇÃO LITERÁRIA:

GRETEL/UAB

Instituição Programa Orientadora Categorias Ano Autores Títulos Sujeitos/corpus da

pesquisa

UAB

Didática da

Língua e da

Literatura

Teresa

Colomer

Literatura Infantil

2005

Maria

Cecília

Silva-

Díaz

Ortega

Libros que enseñan a leer:

álbumes metaficcionales y

conocimiento literario

Álbunmes

Metaficcionales

2015 Brenda V.

Bellorín

Briceño

De lo universal a lo global:

nuevas formas del folklore en

los álbumes para niños E

du

caci

ón

Sec

un

dar

ia

Prácticas de

lectura

literaria

2007 Francisca

Trujillo

Culebro

Prácticas de lectura literaria

en dos aulas de segundo de

secundaria

Docentes, discentes

y textos literários

Hàbits

lectors

2009 Mireia

Manresa

Potrony

Els hàbits lectors dels

adolescents Efectes de les

actuacions escolars em les

pràctiques de lectura

Adolecents

Ed

uca

ció

n P

rim

aria

Currículos 2013 Martina

Fittipaldi

Qué han de saber los niños

sobre literatura?

Conocimientos literarios y

tipos de actuaciones que

permiten progresar en la

competencia literaria

Currículos de

literatura de

Cataluña, España,

Francia, Inglaterra y

Quebec (último

ciclo de la escuela

primaria)

Mediadores

escolares de

lectura

literaria

2014 Felipe

Munita

El mediador escolar de lectura

literaria. Un estudio del

espacio de encuentro entre

prácticas didácticas, sistemas

de creencias y trayectorias

personales de lectura

Estudiantes de

Magisterio y

maestras en ejercicio

Formació

literària

2015 Lara

Reyes

López

La formació literària a

primària Impacte d’una

intervenció educativa en

l’evolució de respostes

lectores

Alumnes

Total: 7 teses

Page 242: AULAS DE LITERATURA DO ENSINO FUNDAMENTAL I DO …ppge.educacao.ufrj.br/teses2017/tVanessa.pdfAulas de Literatura do Ensino Fundamental I do Colégio Pedro II campus Humaitá. Rio

241

APÊNDICE E: ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA AS PROFESSORAS

Objetivos Temas Perguntas

Introduzir o tema da educação

literária no Colégio Pedro II

campus Humaitá I.

Literatura no

cotidiano do

professor

Você poderia me contar que lugar ocupa a literatura

na sua vida cotidiana?

Quais são tuas principais leituras no dia a dia, e o

que mais gosta de ler?

Como escolhe suas leituras?

Literatura na

formação

docente inicial e

continuada

Como foi a sua formação inicial docente em

relação ao ensino de literatura?

Você teve outras experiências de formação que

foram importantes para você neste âmbito?

Conhecer e analisar o que fazem

as professoras e o que orienta a

coordenadora pedagógica de

Literatura no que se refere à

metodologia, aos objetivos, aos

conteúdos, às atividades

pedagógicas, ao corpus literário e

aos critérios de seleção dele.

Metodologia Qual é a sua visão do ensino-aprendizagem da

literatura?

Como a concretiza em sua escola?

Objetivos A partir da sua visão sobre a educação literária,

quais seriam os principais objetivos que orientam o

seu trabalho?

Conteúdos Na sua opinião, o que as crianças devem aprender

com/sobre a literatura?

Quais conteúdos você prioriza?

Atividades Quais atividades você realiza para ensinar

literatura?

Corpus Quais textos ou materiais você usa nas aulas?

Como você escolhe as leituras e a forma de

apresentá-las nas suas aulas?

Avaliação Poderia me contar uma aula que você tenha dado

que foi muito boa?

Como você avalia os alunos?

Compreender o significado que as

professoras e a coordenadora

pedagógica de Literatura atribuem

às aulas de Literatura e as

concepções de leitura literária que

sustentam suas aulas.

Significado

atribuído às aulas

de Literatura e as

concepções de

leitura literária

Por que você considera importante ensinar

literatura?

Como você vê a relação entre as aulas de literatura

e a alfabetização?

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APÊNDICE F: LIVROS LIDOS NAS AULAS DE LITERATURA

1º ANO

1º período

O menino Nito, de Sandra Rosa e ilustr. Victor Tavares

Menina bonita do laço de fita, de Ana Maria Machado e ilustr. Rosana Faria

Tanto, tanto, de Trish Cooke

De bem com a vida, de Bia Hetzel e ilustr. Mariana Massarani

Ana e Ana (livro animado – A Cor da Cultura), de Célia Godoy e ilustr. Fê

Diversidades, de Tatiana Belinky

Obax, de André Neves

O menino e o jacaré, de Maté

Grande Pequeno, de Blandina Franco e ilustr. José Carlos Lollo

O cabelo de Lelê, de Valéria Belém

Bruna e a galinha d’Angola (livro animado), de Gercilga D‟Almeida e ilustr. Valéria Saraiva

O menino e o cachorro, de Simone Bibian e ilustr. Mariana Massarani

2º período

A arca de Noé, de Ruth Rocha e ilustr. Claudio Martins

A história do leão que não sabia escrever, de Martim Baltscheit

Elmer, o elefante xadrez, de David L. Mckee e ilustr. Monica Stahel

Um porco vem morar aqui, de Claudia Fries

O hipopótamo calorento (história em DVD)

O patinho feio, de Andersen

Formiga amiga, de Bartolomeu Campos de Queiros e ilustr. Elisabeth Teixeira

Será mesmo que é bicho, de Ângelo Machado e ilustr. Roger Mello

3º período – 2016

João e Maria, dos Irmãos Grimm (imagético de Taisa Borges)

Soldadinho de chumbo, de Hans Christian Andersen

Rapunzel, dos Irmãos Grimm

A bela e a fera, de Jeanne-Marie de Beaumont

Cinderela, dos Irmãos Grimm

Branca de neve, dos Irmãos Grimm

O flautista de Hamlin, dos Irmãos Grimm

O pequeno polegar, dos Irmãos Grimm

Os músicos de Bremen, dos Irmãos Grimm

A roupa nova do imperador, de Hans Christian Andersen

A história dos 3 ursos, de Robert Southey

As fadas, dos Irmãos Grimm

A pequena sereia, de Hans Christian Andersen

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2º ANO

1º período

Escola de chuva, de Janes Rumford

Como as histórias se espalharam pelo mundo (livro animado – A Cor Da Cultura), de Rogério

Andrade Barbosa e ilustr. Graça Lima

Aladim e a lâmpada maravilhosa (livro: Mil e uma noites), rec. de Ruth Rocha

Simbad, o marujo (livro: Mil e uma noites), rec. Ferreira Gullar

Aliá e os Babá e os quarenta ladrões (livro: Mil e uma noites), rec. de Ruth Rocha

Uma história de tapetes (livro: Contos árabes), de Luísa Soriano Martins

Festa no mar/Festa no céu, de Lúcia Hiratsuka

Oriê, de Lúcia Hiratsuka

O rouxinol e o imperador, de Hans Christian Andersen (imagético de Taisa Borges)

O velho, o menino e o burro (livro: As 14 pérolas da Índia), de Ilan Brenman e ilustr. Ionit

Zilberman

Baba Yaga – Rússia (livro: Volta ao mundo em 52 histórias)

Pássaro de fogo, o fabuloso arqueiro e o cavalo mágico (livro: Histórias russas), de Ana Maria

Machado

2º período

Mitos do folclore do mestre André, de Marcelo Xavier

A mosca trapalhona (livro animado: A Cor da Cultura, Bichos da África 1, lendas e fábulas),

de Rogério Andrade Barbosa

O burro e o sal, de Edgar Romanelli e ilustr. Girotto e Fernandes

O veado e a onça, de Elza Fiúza e ilustr. Cecília Iwashita

A onça e o bode (livro: Contos tradicionais do Brasil), de Câmara Cascudo

Os três companheiros (livro: Contos tradicionais do Brasil), de Câmara Cascudo

O macaco que perdeu a banana (livro: Contos tradicionais do Brasil), de Câmara Cascudo

Amigos mas não para sempre (livro animado – A Cor da Cultura: Contos africanos para

crianças brasileiras), de Rogério Andrade Barbosa

Como o gato e o rato se tornaram inimigos, de Rogério Andrade Barbosa

O macaco, a onça e o boi (livro: Macacos me mordam), de Ernani Ssó

Minhas contas, de Luiz Antônio e ilustr. Daniel Kondo

O macaco e a velha, rec. João de Barro (Braguinha) e ilustr. Eva Furnari

3º período – 2016

Cadê meu travesseiro, de Ana Maria Machado

A velha misteriosa, de Ana Maria Machado

Ah, cambaxirra, se eu pudesse, rec. de Ana Maria Machado

Guilherme Augusto Araújo Fernandes, de Mem Fox e ilustr. Julie Vivas

Gabriela e a tia, de Ruth rocha e ilustr. Mariana Massarani

O pintor de lembranças, de José Antonio Del Cañizo e ilustr. Jesús Gabán

Raul e o baú do vovô (imagético), de Silvana Menezes

O homem que amava caixas, de Michael Stephen King

Caixinha de música (poesias), de Roseane Murray

Carona no jipe, de Roseane Murray

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3º ANO

1º período

O papagaio que não gostava de mentiras (livro: O papagaio que não gostava de mentiras e

outras fábulas africanas), de Adilson Martins

Por que o camaleão muda de cor (livro: Histórias africanas para contar e recontar), de

Rogério Andrade Barbosa e ilustr. Graça Lima

A guerra de morcegos (livro: O papagaio que não gostava de mentiras e outras fábulas

africanas), de Adilson Martins

As aves, os animais e o morcego (livro: Fábulas de Esopo), rec. Jean Kent

Iauaretê, a raposa e o jabuti (livro: As fábulas de Iauaretê), de Kaká Wera Jecupé

A lebre e a tartaruga (livro: Fábulas – La Fontaine), trad. Ferreira Gullar

O cassolo e as abelhas (livro: Bichos da África 2, lendas e fábulas), de Rogério Andrade

Barbosa

O lobo e os sete cabritinhos, rec. de Aurélio de Oliveira

O jabuti e o chacal (livro: Bichos da África 4, lendas e fábulas), de Rogério Andrade Barbosa

A águia e o gavião (livro: Bichos da África 4, lendas e fábulas), de Rogério Andrade Barbosa

Porque o cachorro foi morar com o homem (livro: Histórias africanas para contar e

recontar), de Rogério Andrade Barbosa

O lobo e o cão, de Mary França e Eliardo França

A tartaruga e o leopardo (livro: Bichos da África 1, lendas e fábulas), de Rogério Andrade

Barbosa

2º período

O primeiro fogo (livro: Contos dos meninos índios), de Hernâni Donato

Kofi e o menino de fogo, de Nei Lopes e ilustr. Hélène Moreau

O menino que comia lagartos, de Mercê López

Três mercadorias muito estranhas (livro animado – A Cor da Cultura), de Rogério Andrade

Barbosa e ilustr. Maurício Veneza

Irmãos Zulus, de Rogério Andrade Barbosa e ilustr. Ciça Fitipaldi

A serpente de Olumo, de Ieda de Oliveira e ilustr. Roberto melo

2016

A história de Akykysia, o dono da caça, adap. e ilustr. Rita Carelli

Como nasceram os bichos, rec. de Clarice Lispector (livro: Como nasceram as estrelas)

3º período – 2016

Josué e o pé de feijão (curta de animação brasileiro)

A bruxa Salomé, de Audrey Wood e ilustr. Don Wood

Sapo vira rei vira sapo, de Ruth Rocha e ilustr. Walter Ono

Quo ini pó ou baleia (livro: Que história é essa?), de Flavio de Souza

Doze reis e a moça do labirinto do vento, de Marina Colasanti

A moça tecelã, de Marina Colasanti em áudio

Babruxa, o caldeirão e o dragão (painel de pano)

O príncipe que bocejava, de Ana Maria Machado e ilustr. Graça Lima

Como a princesa de Neca de Pitibiriba tornou-se princesa da lagoa da felicidade (livro: Nove

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novos contos de fadas e princesas), de Didier Lévy

Ervilina e princês, de Sylvia Orthof

A história do príncipe sabido e da princesa deslumbrante, de Luciana Sandroni

O chapéu

O passarinho (livro: Que história é essa?), de Flavio de Souza

4º ANO

1º período

No país do futebol (livro: Gostar de ler – crônicas 6), de Carlos Eduardo Novaes

Na delegacia (livro: Crianças d’agora é fogo), de Carlos Drummond de Andrade

A descoberta do mar (livro: Cadeira de balanço), de Carlos Drummond de Andrade

Caso de boa ação (livro: Cadeira de balanço), de Carlos Drummond de Andrade

Bruxas não existem (Revista Nova Escola), de Moacir Scliar

Cãomício no calçadão (livro: Gostar de ler – crônicas 7), de José Carlos de Oliveira

Alô Realengo (1º capítulo), de Sonia Rosa

Trem de ferro, de Manoel Bandeira

Convite carioca (poemas), de Sandra Lopes

2º período

O tesouro enterrado (livro: Contos de assombração), de Maurício Pereira

Gaspar, eu caio (livro: Meu livro de folclore), de Ricardo de Azevedo

A mulher do cemitério (livro: Histórias de índio), de Daniel Munduruku

Aposta (Revista Disney), de Franz Lupo

Contos de assombração, de Maurício Pereira

3º período – 2016

Orfeu e Eurídice

Os príncipes do destino, de Reginaldo Prandi

Ifá, o adivinho, de Reginaldo Prandi

A pérola preciosa (livro: Mar de história), de James Riordan

Caixa de Pandora

Minotauro

Meduza

5º ANO

1º período

Crianças a venda. Tratar aqui, de Rosa Amanda Strausz

Sete ossos e uma maldição, de Rosa Amanda Strausz

Devolva minha aliança, de Rosa Amanda Strausz

O corvo e O gato preto (animação), de Edgar Alan Poe

A morte e o escritor (livro: Contos de morte morrida), de Ernani Ssó e ilustr. Marilda Castanha

A morte e o médico (livro: Contos de morte morrida), de Ernani Ssó e ilustr. Marilda Castanha

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Bá e as visagens, de Augusto Pessôa

2º período

Os sete novelos, de Angela Shelf Medearis e ilustr. Daniel Minter

Uma ideia luminosa, de Rogério Andrade Barbosa

A história de Akykysia, o dono da caça, adap. e ilustr. Rita Carelli

Os três presentes mágicos, de Rogério Andrade Barbosa e ilustr. Salmo Dansa

Igaranhã, a canoa encantada (livro: Lendas e mitos dos índios brasileiros), de Wald-mar de

Andrade e Silva

Esperança Garcia, de Sonia Rosa

O filho de Luísa (livro: Gosto de África. Histórias de lá e daqui), de Joel Rufino dos Santos

Luísa (livro: Heroínas Negras Brasileiras em Cordéis), de Jadid Arraes

Chico rei (cordel), de Sandra Lopes

3º período – 2016

Vida Maria (curta brasileiro)

Auto da Compadecida (texto teatral)

Carta ao prefeito (crônica), de Rubem Braga

Entre amigos (crônica), de Martha Medeiros

A mula teimosa e o controle remoto (curta brasileiro)

Guerra de Botões (longa)

Esquetes (Porta dos fundos)

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APÊNDICE G: ATIVIDADES PEDAGÓGICAS PROPOSTAS NAS AULAS DE

LITERATURA

1º ano 2º ano 3º ano 4º ano 5º ano

tri

Desenho da protagonista

da história e de uma

pessoa bonita

Desenho das

protagonistas da história

Produção de uma

ilustração para um livro

coletivo da turma

Desenho do que imagina

que a pedra pode vir a

ser e escrita

Preenchimento do jacaré

com materiais diversos

Desenho de si mesmo

em cima do jacaré

Reescrita do título do

livro

Desenho

Desenho de um objeto de

uma história que se lembre

com uma lã

Desenho de uma cena da

história com a cabeça de

um leão e de um rato

Produção de máscaras de

animais

Dobradura do rouxinol

Desenho de 4 partes da

história com escrita

Produção de fantoches

Dramatização

Produção de um livro

sanfona

Produção de

autorretratos com escrita

de descrição

Produção escrita de uma

apreciação do vídeo

Desenho de uma cena do

livro com miçangas

Produção de máscaras e

amuletos

Escrita de uma

estratégia para

atravessar o Rio Níger

Reescrita do conto em

dupla

Debate

Desenho de um amuleto

Escrita do que

aconteceu depois

Desenho de uma casa

Desenho da silhueta de

um gigante

Produção de um

poema com banco de

palavras sobre gigante

Jogral

Construção coletiva de

um mural: de que

comício você

participaria?

Produção de postais

poéticos com aquarela

e cópia de um poema

Produção de

personagens com

vara

Dramatização de

contos por meio do

teatro de varas

Participação num

quis

Debate

Desenho da

personagem e de sua

transformação (lixa

e papel A4)

Escrita da

apreciação do livro

tri

Desenho de um casal de

animais

Desenho do leão

Escrita de uma palavra

Pintura coletiva de um

elefante

Desenho de um elefante

Desenho do outro

animal que tem dentro

de um ovo

Produção com massinha

de uma formiga

Produção de um jogo do

porco

Produção de um cartaz:

o que vocês fariam com

a galinha xadrez?

Produção de um cenário

com massinha

Leitura em voz alta de um

mito

Produção coletiva de um

quadro com as cenas

cumulativas do conto

Desenho de uma cena da

fábula

Montagem de um

cineminha

Produção de uma narrativa

com duas cenas

consecutivas usando

papéis coloridos

Pintura do burro e desenho

no verso do que tinha no

saco que ele carregava

Reescrita do verso do

burro

Dobradura de uma casa

Desenho de uma cena da

história

Produção de fantoches

Leitura dramatizada com

os fantoches

Reconto oral de um conto

Produção de um anel de

morcego

Reescrita coletiva do

título e da primeira

estrofe de uma fábula

Desenho no Paint Brush

da fábula

Pintura de mercadores

com estampas africanas

criadas pelos alunos

Reconto em dupla de

uma fábula

Produção de um

marcador de livro

Produção escrita no

Word do desfecho do

mito

Escrita de um desejo

numa pérola (papel)

Produção de um mapa

da mitologia com

legendas literárias

Desenho da rota

Vivência de uma cena

do livro:

experimentação de um

arroz vietnamita

Produção de uma

estante de livros

com lombadas de

livros

Debate

Debate

Reescrita de um

conto

Escrita de uma carta

para uma autoridade

Escrita de um

esquete

tri

Listagem de elementos

da história

Desenhar e escrever a

memória mais antiga

Produção de um livreto

com duas histórias

Produção de um livro

com o formato de um

caixão

Criação de qualquer

objeto com novelos

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Desenho de personagem

Produção em trio de

uma cena com

sobreposição de

personagens

Reconto oral de um

conto

Produção coletiva de

uma cena com

dobraduras, silhuetas de

personagens

Leitura dramatizada de

um conto

Produção de um relato Reconto oral de um

conto

Desenho de uma

ilustração

Escrita com descrição da

ilustração

Escrita em dupla de uma

lei

Debate

Leitura dramatizada de

contos

Escrita de uma ideia

dentro de uma vela

de papel