ARTETERAPIA

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UNP - UNIVERSIDADE POTIGUAR ALQUIMY ART PRÓ REITORIA DE PESQUISA E PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ARTETERAPIA EDUCAÇÃO E ARTETERAPIA UM NOVO OLHAR NA EXPRESSIVIDADE MUSICAL SONIA DA SILVA

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ARTETERAPIA

Transcript of ARTETERAPIA

  • UNP - UNIVERSIDADE POTIGUAR

    ALQUIMY ART

    PR REITORIA DE PESQUISA E PS GRADUAO LATO SENSU

    CURSO DE ESPECIALIZAO EM ARTETERAPIA

    EDUCAO E ARTETERAPIA

    UM NOVO OLHAR NA EXPRESSIVIDADE MUSICAL

    SONIA DA SILVA

  • SO PAULO

    2004

  • SONIA DA SILVA

    EDUCAO E ARTETERAPIA

    UM NOVO OLHAR NA EXPRESSIVIDADE MUSICAL

    Monografia apresentada Universidade Potiguar,

    (RN) e ao Alquimy Art, de So Paulo, como

    parte dos requisitos para a obteno do ttulo de

    Especialista em Arteterapia.

    Orientadora: Prof. MsC. Deolinda

    Florim Fabietti

  • SO PAULO

    2004

  • SILVA, Sonia da

    Educao e Arteterapia- Um Novo olhar na

    Expressividade Musical / Sonia da Silva. So Paulo: [s.n.],

    2004.

    61p.

    Orientadora: Prof. MsC. Deolinda Florim Fabietti.

    Monografia: (Especializao em Arteterapia) UnP/ Universidade Potiguar (RN) Pr - Reitoria de Pesquisa e Ps - Graduao Lato Sensu e Alquimy Art (SP), 2004.

    1. Arteterapia 2. Expressividade Musical

  • SONIA DA SILVA

    EDUCAO E ARTETERAPIA

    UM NOVO OLHAR NA EXPRESSIVIDADE MUSICAL

    Monografia apresentada pela aluna Sonia da Silva ao curso de Especializao

    em Arteterapia em ______/_____/______ e recebendo a avaliao da Banca

    Examinadora constituda pelos professores:

    ________________________________________________________________

    ______

    Prof. MsC. Deolinda Florim Fabietti Orientadora e Coordenadora da

    especializao.

    ________________________________________________________________

    ______

    Prof. Dra. Cristina dias Allessandrini Coordenadora da Especializao.

  • ________________________________________________________________

    ______

    Prof. Dr. Liomar Quinto de Andrade Professor convidado e leitor crtico.

  • Para Lara, meus alunos e todos queles

  • que acreditam no afeto como agente transformador.

  • AGRADECIMENTOS

    Prof. MsC. Deolinda Florim Fabietti que me acolheu como orientadora.

    Prof. Dra. Cristina Dias Allessandrini pelo incentivo de trilhar mais esse

    caminho.

    minha filha Lara pela compreenso e respeito.

  • A todos que compartilham comigo meus sonhos e anseios.

  • No sou a areia

    onde se desenha um par de asas

    ou grades diante de uma janela.

    No sou apenas a pedra que rola

    nas mars do mundo,

    em cada praia renascendo outra.

    Sou a orelha encostada na concha

    da vida, sou construo e desmoronamento,

    servo e senhor, e sou

    mistrio.

    A quatro mos escrevemos o roteiro

    Para o palco do meu tempo:

    O meu destino e eu.

    Nem sempre estamos afinados, nem sempre nos levamos

    a srio.

    Lia Luft, 2004, p.12

  • RESUMO SILVA, Sonia da. Educao e Arteterapia - um novo olhar na Expressividade

    Musical.61p. Monografia (Ps - Graduao Lato Sensu) UnP/Universidade Potiguar RN e Alquimy Art em So Paulo. So Paulo, 2004.

    Esta monografia apresenta a questo da relao entre som e movimento corporal ligada

    prtica educativa e arteteraputica, com portadores de deficincia visual, fsica e mental.

    uma pesquisa qualitativa que visa ressaltar a importncia da transdisciplinaridade e do olhar

    sistmico no enfoque pedaggico e teraputico, estabelecendo paralelos e confrontos entre

    esses dois campos de atuao, tendo a linguagem musical como foco de ateno.Baseia-se nos

    fundamentos tericos de H.J. Koellreuter e R. Laban na prtica pedaggica e na teoria geral

    de sistemas de Kusenbrik na Arteterapia. Demonstra por meio da anlise de dois projetos

    independentes o carter expressivo e acolhedor necessrio aos objetivos de uma proposta de

    Oficinas Criativas em Arteterapia.

    Palavras-chave: Oficinas - Processos Criativos - Educao Musical Arteterapia.

  • ABSTRACT

    SILVA, Sonia da. Education and Art Therapy- a new eyesight into music expression. 61p.

    Monograph: (Post Graduation Certificate) UnP/Universidade Potiguar (Potiguar University of

    Rio Grande do Norte) and Alquimy Art Learning research Center in So Paulo. So Paulo,

    2004.

    This monograph presents the relationship between sound and body movements, related to

    Educational and Art Therapeutic Practice, with seeing impaired, handicapped and mentally ill

    individuals. It is a qualitative research that aims to point out the importance of using multiple

    disciplines and the systemic view point in the educational and therapeutic approach,

    establishing parallels and confrontations between these two fields of acknowledge, having the

    musical language as the focal point. It proposes theoretical principles based on H.J.

    Koellreutter and R. Laban for Education and general theory of the systems of Lusebrink for

    Art Therapy. Through the analysis of two independent projects (in Education and in Art

    Therapy), this work intends to show the expressive and necessary welcoming spirit needed to

    achieve the goals of a proposal of Creative Workshops in Art Therapy.

    Key words: Workshops - Creative process - Musical education - Art Therapy.

  • SUMRIO

    AGRADECIMENTOS............................................................................................................. 05

    RESUMO................................................................................................................................... 08

    ABSTRACT............................................................................................................................... 09

    INTRODUO......................................................................................................................... 10

    I. O CAMINHO.................................................................................................................... 10

    II. COMPONDO A ESCRITA............................................................................................ 12

    Captulo 1: EDUCAO......................................................................................................... 14

    1.1 Teoria da evoluo da conscincia humana segundo Koellreutter............................ 16

    1.2. Teoria sobre anlise do movimento segundo Rudolf Laban...................................... 18

    1.3. Afinidades temporais e espaciais entre movimento corporal e sonoro..................... 23

    1.4. A fluncia do movimento............................................................................................... 24

    Captulo 2: ARTETERAPIA................................................................................................... 30

    2.1. O ser terapeuta............................................................................................................... 30

    2.2. Percursos em arteterapia.............................................................................................. 32

    Captulo 3: OFICINAS DE EDUCAO MUSICAL COM PORTADORES DE

    DEFICINCIA VISUAL.........................................................................................................

    35

    3.1. A criao de um novo territrio................................................................................... 35

    3.2. A oficina de educao musical...................................................................................... 37

    Captulo 4: OFICINAS DE ARTETERAPIA COM PORTADORES DE

    DEFICINCIA FSICA E MENTAL.....................................................................................

    44

    4.1. Sujeitos e caracterizao............................................................................................... 44

    4.2. Atividade: Construo da maquete coletiva................................................................ 47

    4.3. Desvendando processos................................................................................................. 53

    Captulo 5: EDUCAO E ARTETERAPIA....................................................................... 57

    CONSIDERAES FINAIS................................................................................................... 59

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.................................................................................... 60

  • 10

    INTRODUO

    I. O CAMINHO

    H 31 anos trabalho com educao musical de crianas, jovens e adultos e acredito

    que minha viso de ser humano tenha seguido sempre em direo crena de que somos seres

    com caractersticas nicas, prprias, individualizadas e singulares dentro de um universo

    energtico comum a todos os humanos.

    Meu percurso profissional sempre tentou ressaltar esse aspecto da singularidade do

    desenvolvimento humano embora eu no tivesse conscincia e conhecimento de teorias a

    respeito do assunto.

    A constatao de que s se transmite bem aquilo que se vive, levou-me desde cedo a

    indagaes sobre questes relacionadas ao processo de como aprender e de como ensinar; o

    quanto a maneira, a inteno, a postura, o entusiasmo e o contedo do professor poderiam

    transformar a qualidade da educao. Desde o incio, percebi que as relaes deveriam

    necessariamente passar tanto pelo cognitivo como pelo afetivo. Concluso essa bastante bvia

    hoje, mas em 1972, nos meus 20 anos, vinda de uma educao essencialmente positivista, no

    me parecia nada comum pensar nesses aspectos.

    Tive a oportunidade durante esses anos de trabalhar com outras culturas e perceber

    que todas elas tinham o mesmo fundo comum de situaes e comportamentos simblicos.

    Intuitivamente caminhava com o desejo de desvendar o que me parecia a grande riqueza e

    desafio da educao: como podemos lidar com processos conscientes e inconscientes

    simultaneamente?

    Levando em considerao que processos de transformao na conscincia so para se

    vivenciar mais do que para se estudar, acredito que minha trajetria profissional tenha

    ocorrido no s no nvel de uma percepo desperta, como tambm numa evoluo da prpria

  • 11

    conscincia. Um desenvolvimento profissional que surge como resultado de um processo

    global de transformao de mente, crebro, corpo e mudanas de vida.

    Fazer msica fez parte de minha rotina infantil como um gesto de participao na

    sociedade onde o expressar-se encontrou seu caminho no universo sonoro.

    Expresso talvez, no incio, de sensaes, sentimentos e percepes mais intuitivas e

    espontneas do que pensadas e refletidas, talvez reflexo de uma cultura dominante onde o

    criar individual tivesse menor espao e fosse, com certeza, sobretudo subjugado cultura

    positivista herdada da velha Europa.

    Tendncias a superestimar atividades com o hemisfrio esquerdo do crebro foram

    vividas na medida em que nossa educao e cultura nelas se apiam em supremacia. Por ter

    como aliada a prtica musical, o livre trnsito entre os dois hemisfrios felizmente fluiu no

    decorrer do meu crescimento profissional. Acredito que foi rompendo uma antiga ordenao

    que o meu processo de transformao ocorreu com certezas, questionamentos, aflies e

    alegrias no sentido de uma maior maturidade.

  • 12

    II. COMPONDO A ESCRITA

    Podemos pensar que tenha sido uma tenso intelectual que tenha provocado uma

    mudana de paradigmas. Baseando essas observaes na Conspirao Aquariana, de

    Ferguson (1995), acredito que foi dando nomes s coisas que comecei a estruturar a

    conscincia.

    O Ponto de Entrada dentro dos estgios de transformao a que se submeteu meu

    trajeto profissional ocorreu no momento em que surgiu um confronto entre o que eu aprendia

    na Faculdade de Comunicaes e Artes curso de Jornalismo - e o que eu pretendia em

    relao minha atuao na sociedade.

    Foi um assumir efetivo entre o sentir e o fazer.

    O rompimento de uma antiga ordenao.

    Um novo curso.

    A educao.

    A msica.

    A arteterapia.

    A Explorao no necessitou de sistemas novos e sim de um aprofundamento e uma

    maior entrega que permitissem o desabrochar do conhecimento interior .

    A Integrao ocorreu com autoquestionamento, determinao, intuio: a linguagem

    musical permeada de novas aventuras plsticas, corporais e teatrais.

    Conhecer o novo e o desconhecido sem medo de fazer e explorar.

    A Conspirao surge, ainda hoje, trazendo novos paradigmas de relaes entre o eu,

    os amigos, a famlia e o social. Traz consigo as possibilidades de transformar e ajudar o outro,

    tendo a solidariedade humana como condio essencial para a expanso pessoal.

  • 13

    Desapego.

    Tempo policrnico.

    Liberao e no adio.

    Leis da mutao.

    Da quantidade qualidade.

    Viso hologrfica.

    Novos conceitos e metas que nos ajudam a discernir entre cultura e natureza.

    Pensando nessa transformao social lembro-me de ter ouvido, em algum momento da

    vida, que nenhuma grande idia radical pode sobreviver se no estiver incorporada em

    indivduos cujas vidas sejam a mensagem .

  • 14

    Captulo 1: EDUCAO

    Era 1980 e eu retornava de Paris onde fizera um curso de especializao em Educao

    Musical. Na bagagem eu trazia uma inquietao a ser trabalhada como dever de casa: eu

    partira em busca do novo e passara dois anos mergulhada num universo de confronto

    constante entre o acadmico e a vanguarda. E assim - como ningum se decepciona 100% em

    Paris - voltei com o olhar mais inquieto do que quando deixei o Brasil.

    provvel que essa disponibilidade do meu esprito tenha preparado tudo, mas o fato

    que precisei regressar ao ponto de partida para encontrar dois mestres europeus que fizeram

    o caminho inverso ao meu: H. J. Koellreutter (musiclogo e compositor) e Maria Duschenes

    (bailarina e pedagoga). A reflexo do primeiro e a prtica da segunda (que me introduziu no

    universo de seu prprio mestre, Rudolf Laban) tornaram-se elementos de um ato de

    antropofagia que eu estava prestes a perpetrar.

    Para alm da mera coincidncia - hoje vejo - tudo parece ganhar um sabor de

    sincronicidade. Estive em contato com ambos durante o mesmo perodo e tornei-me eu

    mesma, um ponto de convergncia, de dilogo, de interao. Era inevitvel, portanto, que

    minha prtica como arte-educadora em Msica se transformasse num campo de provas, num

    espao experimental para os dois sistemas que pareciam oscilar entre a polaridade e a

    complementao.

    O encontro com Duschenes1 impulsionou-me em direo dana, disciplina com a

    qual eu mantinha uma relao informal. Decidi assumir minha formao na arte do

    movimento e dediquei-me a essa prtica por cinco anos, junto dessa mestra que muito

    contribuiu para minha formao profissional.

    1 Anotaes feitas durante minha participao no curso Arte do Movimento para educadores com Maria

    Duschenes de 1980 a 1990 em So Paulo.

  • 15

    Entrei em contato com a natureza do sistema do movimento criado por Laban (1978)

    que tem dupla funo: libertadora e reintegradora. Ao isolar o gesto e codific-lo, ele resgata

    o indivduo dos automatismos e da massificao. Lana-o na conscincia de si mesmo, atravs

    do movimento.

    Os vnculos entre essa viso de Laban (1978), que intervm nas estruturas

    despersonalizadoras com um olhar esmiuador e revelador do indivduo inserido em um corpo

    que se reconstri - e a viso em espiral simultaneista de Koellreutter (1987), pareciam ganhar

    nitidez tanto em meus processos pessoais quanto em minha prtica pedaggica. A reviso da

    historicidade, luz da percepo humana que Koellreutter preconiza, tambm visa libertar - o

    sujeito, a Histria da Msica - do isolamento que a tirania do linear sucessivo impe ordem

    das coisas. Se que essa ordem j existiu...

    Ao refletir com Koellreutter e danar com Laban, eu buscava uma nova viso

    pedaggica que integrasse a linguagem da dana linguagem da msica.

    A vida movimento, tal qual a conhecemos. No gesto do bailarino, no gesto do

    msico, ou ainda no gesto cotidiano do homem comum, o movimento, resgatado de sua

    obscuridade, representa no s um fato fsico mas um complexo de variadas expresses

    mutantes.

    Meu corpo e meu esprito integravam-se para criar, na prtica, uma terceira linguagem

    possvel, comprometida com a Educao Musical, talvez como resposta aos modelos

    hierticos com os quais eu convivera em minha experincia de Velho Mundo. Como na viso

    de Koellreutter, tudo parecia sobrepor-se e projetar-se para alm do conhecido. Tradio e

    ruptura interpenetravam-se, pensamento e ao, indivduo e coletivo. Barreiras pareciam

    dissolver-se, opostos confraternizavam-se. (KOELLREUTTER, 1987).

  • 16

    1.1. Teoria da evoluo da conscincia segundo H. J. Koellreutter

    Para convidar Koellreutter a contracenar com Laban, imprescindvel que eu recupere

    flashes de sua reflexo sobre a histria da evoluo humana.

    Segundo Koellreutter, (1982)2 se olharmos para o passado, descobriremos 4 nveis de

    conscientizao que marcam toda a vida cultural e todas as artes:

    So eles:

    1 Mgico.

    2 - Pr-Racionalista.

    3 Racionalista.

    4 Integrador.

    Koellreutter no se refere conscincia como conhecimento formal nem como mero

    conhecimento ou qualquer processo de pensamento, mas sim como uma forma de inter-

    relacionamento constante, um ato criativo de integrao.

    Uma breve anlise desses nveis de conscincia, ir nos permitir uma melhor

    compreenso da relao estabelecida entre o pensamento integrador de Koellreutter com a

    proposta de Laban de investir nas potencialidades de crescimento do ser humano como

    indivduo atuando no coletivo.

    1 - No perodo Mgico, o homem comea a sonhar, a confrontar-se com o mundo, sentindo

    que h 2 realidades dinmicas: ele e a natureza. No h conscincia de tempo e espao. A

    msica visa a preservao da vida. O ritmo isomtrico (valores iguais) diferente de

    2 Anotaes feitas durante minha participao no Curso de Especializao na Faculdade Paulista de Arte da

    Academia Paulista de Msica de 1980 a 1982, ministrado por Koellreutter.

  • 17

    isoritmico (valores desiguais). Isso no pulsao, porque pulsao comporta forte e fraco.

    Aqui os valores so iguais e carecem de acentos. um ritmo implacvel, motor, ininterrupto,

    que no se pode abrandar. Uma s intensidade, uma s ocorrncia musical, pontilhista, sem

    princpio, sem fim.

    A msica parece surgir por acaso e no termina. Ela interrompida. polidirecional e

    monodimensional.

    Exemplo desse perodo: msica dos pigmeus.

    2 - Na fase Pr- Racionalista, mais ou menos nos sculos VII - VI AC, inicia-se a

    preocupao com o tempo e o espao. Nessa fase, a conscientizao da alma torna-se

    importante. Toma-se conscincia de que Homem-Deus so diferentes. A msica tem a funo

    de comunicar-se com Deus e portanto restabelecer esse Todo. O conceito de tempo nessa fase

    psquico-intuitivo. No mensurado, nem anotado: depende do fluxo. monodimensional.

    polidirecional. No mais contnuo, mas no tem acentuao sistematizada, no tem carter

    de pulsao, nem compasso. No tem valores de durao fixos ou pr- determinados. A base

    a pulsao natural. O tempo psquico-intuitivo depende do estado de esprito das pessoas.

    Exemplo desse perodo: canto gregoriano.

    3 - O perodo Racionalista abrange do sculo XIV ao incio do XX. O homem descobre a

    perspectiva e a perspectiva passa a dividir o mundo. A melodia um elemento musical

    definido que ainda no existia na fase Pr - Racionalista, quando existiam apenas linhas

    meldicas. A harmonia surge como uma conscientizao das leis da Fsica. O acorde traz a

    tridimensionalidade msica. As peas musicais so divididas em movimentos. Surgem as

    frases, a consonncia, a dissonncia. As especializaes em vrias reas do conhecimento se

    definem no ocidente.

  • 18

    Exemplo desse perodo: Bach e Beethoven.

    4 - O nosso sculo representa a Conscincia Integradora. A partir das descobertas da Fsica

    Quntica, a relao tempo - espao transformou-se totalmente no s na rea das Cincias Exatas,

    como tambm na expresso artstica humana. Na msica surge a poliritmia (Stravinsky), o

    dodecafonismo (A. Schnberg) a planimetria (G. Ligetti) e o minimalismo (Steve Reich). O

    conceito de tempo transcende a metria e cria a ametria- diversa da no-metria. Cria a

    transcendncia do metro e no sua negao.

    1.2. Teoria sobre anlise do movimento segundo Rudolf Laban (1978)

    A distino entre mente e corpo uma dicotomia artificial, um ato de discriminao baseado muito mais na peculiaridade da cognio

    intelectual do que na natureza das coisas. De fato, to ntimo o inter-

    relacionamento dos traos psquicos e corporais, que podemos no

    somente estabelecer inferncias sobre a constituio da psique a partir

    da constituio do corpo, como tambm podemos inferir caractersticas

    corporais a partir das peculiaridades psquicas. (C. G. JUNG, Collected Works Vol. 6 par. 916)

    3 Gostaria de focar minha reflexo partindo dos estudos feitos por Rudolf Laban (1978),

    danarino e pedagogo hngaro que, na primeira metade do sculo XX, dedicou-se ao estudo

    da gestualidade humana a partir de seu contexto cultural e social. Gestual este que

    desembocaria na capacidade expressiva de movimentao corporal no caminho da dana.

    Laban acreditava que cada ser carrega consigo uma bagagem fsica, cultural e social

    que o caracteriza a ponto de podermos traar um perfil de sua personalidade atravs de sua

    movimentao corporal.

    3 Traduo nossa.

  • 19

    Acredito que possam ser esses tambm os primeiros passos para a compreenso da

    aproximao entre a mente e o corpo humano.

    Nosso corpo o reflexo daquilo que pensamos ou pensamos aquilo que nosso corpo

    nos sugere?

    Se somatizar doenas o resultado de uma transformao na estrutura corprea devido

    a um complexo que se constela , no podemos duvidar que a relao entre inconsciente e

    consciente nos revelada atravs das sensaes que se originam dos rgos corporais e

    encontram ressonncia nos smbolos do Self.

    A partir da segunda metade do sculo XX, nossa sociedade tem trazido a questo

    sobre a importncia do desenvolvimento da conscincia corporal e dos cuidados e

    conhecimentos sobre nossa natureza fisiolgica mas freqentemente tem tambm reforado

    ou enaltecido essa dicotomia artificial que privilegia ora a mente, ora o corpo.

    Reconhecer a importncia do TOQUE como um meio de transformaes psquicas no

    processo de individuao uma prova do desenvolvimento dessa conscincia. Por outro lado,

    estimular, estereotipar e vender conceitos de beleza corporal massificados uma prova do

    quanto ainda estamos distantes de um verdadeiro caminho nessa relao ego-Self.

    Para que a cincia e o crescimento individual humano possam caminhar paralelamente

    ser necessrio que prticas que estimulem a relao entre os opostos no processo alqumico

    da coniunctio (JUNG, 2004, p.227) sejam estimuladas desde o incio do processo educacional

    e relacional do indivduo, como por exemplo exerccios de respirao e automassagem nos

    currculos escolares e nas rotinas familiares.

    O processo criador abrange a integrao de todas as linguagens artsticas.

    Partindo, ento, do pressuposto de que nossa cultura atualmente lida com uma nova

    conscincia do tempo - espao, estabeleci alguns paralelos entre a viso de sntese das

  • 20

    experincias de percepo do ser humano ao longo da histria, e a proposta de conscincia

    dos movimentos corporais individuais e coletivos de Laban.

    Rudolf Laban, em 1950, postulou que existem quatro fatores comuns a todo e qualquer

    movimento do ser humano.

    Tais fatores so: Fluncia Espao Peso Tempo.

    TEMPO

    O tempo no existe a no ser atravs da conscincia que cada um tem de passado,

    presente, futuro. Ns podemos at dividi-lo em partes proporcionais, horas e minutos,

    mnimas e colcheias, porm cada um vive o tempo de maneira pessoal. Nossa apreenso do

    tempo est ligada nossa vida psicolgica. A experincia do tempo essencialmente ntima.

    Pensemos aqui a referncia de Tempo (Chronos) da mitologia grega que simboliza a

    fome devoradora da vida, o desejo insacivel.

    Muito mais que isso: com ele comea o sentimento de durao, e mais

    especificamente, o sentimento de uma durao que se esgota, i.e., que extravasa e passa entre

    a excitao e a satisfao (DIEL, 1966, p.115).

    FLUNCIA

    Para estabelecer uma relao entre esse parmetro musical e a dana, devemos nos

    dirigir ao fator Fluncia do movimento.

    Dependendo da ordem em que so acionadas as diferentes partes do corpo, podemos

    distinguir uma fluncia livre ou controlada. O controle da fluncia do movimento est

    portanto, intimamente relacionado ao controle dos movimentos das partes do corpo.

  • 21

    O uso da fluncia livre propicia movimentos para fora, enquanto o uso da fluncia

    controlada tende a propiciar movimentos para dentro. Em outras palavras: ora a tenso

    liberada, ora contida, produzindo formas e qualidades diferentes no movimento. Podemos

    chamar esses movimentos de Fluncia da Tenso e Fluncia da Forma.

    Quando nos expressamos com fluncia controlada (das extremidades do corpo para o

    centro), o tempo pode ser medido com a mesma exatido com que medimos o ritmo, o pulso.

    a chamada msica mtrica.

    A fluncia livre (movimentos do centro do corpo para as extremidades) nos remete

    ametria, que implica na presena do silncio; da expectativa; da tenso; do ataque. uma

    outra forma de perceber as ocorrncias em torno de ns. Sem elas no existiria o tempo.

    A audio no se d por partes isoladas, mas pelas relaes entre as ocorrncias

    sonoras.

    A importncia dessa nova conscincia do tempo fundamental dentro de uma

    pedagogia preocupada com o ensino que d nfase s relaes.

    nesse pressuposto que baseei meu trabalho.

    ESPAO

    Ao analisarmos o fator Espao, estaremos nos referindo, em termos de conscincia

    corporal, ao estica - dobra. Isto nos remete expanso dos movimentos que se distanciam do

    centro do corpo para em seguida retornar a ele, provocando assim uma conscincia de

    prximo-distante, interior-exterior, com deslocamentos no foco do"self".

    A ateno muda constantemente de um lugar para outro quando o corpo est sentindo

    o espao. Quando o corpo penetra o espao todas as energias esto concentradas num ponto,

  • 22

    em direo ao qual o movimento flui. O corpo pode envolver ou repelir o espao. O uso do

    espao est submetido a direes, planos, extenses, caminho e velocidade.

    Podemos observar que na msica, estaremos lidando com o parmetro Altura, na

    criao de melodias, isto ,ondulaes que oscilam, espacialmente, do som mais grave ao som

    mais agudo.

    Brincadeiras sonoras e corporais criadas com Glissandis e Ondulaes meldicas, por

    exemplo, podem sugerir a expresso de diferentes emoes manifestadas atravs de

    movimentos perifricos ou no. A criao musical das crianas nessa fase pode parecer

    catica ou desorganizada mas devemos nos conscientizar do fato de que isso faz parte do

    processo de construo de sua musicalidade e interao com o universo. Todo movimento

    sonoro e corporal a somatria de vrios componentes. Para compreend-los devemos

    sempre levar em considerao essa realidade.

    PESO

    Existe a quantidade - peso, que pode ser medida em "pounds" ou gramas, e a

    quantidade -tempo, que pode ser medida em segundos de velocidade. A qualidade de peso e

    de tempo que no pode ser medida, uma questo de atitude. Um "forte desejo" ou uma

    "sbita urgncia" so falas que se referem a atitudes de peso e tempo.

    A conscincia do fator Peso libera atitudes de toque firme e leve , alternando a

    habilidade e a vitalidade de executar fora ou delicadeza que ultrapassem a passividade. A

    expresso sonora que descreve esse estado de tenso sensitiva manipula o parmetro

    Intensidade do som enquanto as atitudes corporais se concentram na intensidade da

    musculatura.

  • 23

    A escolha de materiais adequados (timbres diferentes) para a pesquisa e reproduo de

    ambientes sonoros de grande importncia nesse processo pedaggico musical onde a

    diversidade e a qualidade sonoras enriquecem a percepo e o gesto musical.

    A energia propulsora do movimento carrega consigo a inteno emocional

    energtica, que seria a colorao do som. Lidamos a com o parmetro Timbre,

    que embora no mensurvel, capaz de corresponder s expectativas exigidas

    por tais mudanas, assim chamadas passionais.

    1.3. Afinidades temporais e espaciais entre o movimento corporal e o

    movimento sonoro

    O gesto musical assim como o gesto corporal dependem da fora propulsora do

    movimento que a energia mental, emocional e fsica. Ambos manipulam o tempo,

    interagindo sucessivamente com alteraes de Lento - Sbito - Sustentado - Curto - Longo.

    A criana na faixa-etria pr-escolar vivencia esse mundo mgico a qual

    Koellreutter (1982) se refere de uma maneira natural e intuitiva. Da a necessidade de criao

    de jogos de improvisao que estimulem a percepo da direo e durao do som no espao,

    estabelecendo relaes diretas entre movimento e som, controlados ou no.

    Na educao, a anlise do comportamento humano deve ser vista com a convico de

    que movimento e msica esto intimamente relacionados desde a infncia ao longo de toda a

    vida.

    Assim como o homem primitivo, a criana percebe o mundo no metricamente. Move-

    se pela respirao. medida que vai crescendo, torna-se consciente do pulso. Anda. Marcha.

    Saltita.

  • 24

    Todas as divises que o mundo sofreu desde a antiga Grcia e que culminaram na 1.

    Guerra Mundial influenciaram nossa percepo de mundo. De educao. A conscincia da

    ametria surge na educao neste momento histrico, cuja tendncia a integrao.

    1. 4. A fluncia do movimento

    Para compreendermos ainda mais a linguagem do movimento relacionada linguagem

    musical e sonora necessrio o conhecimento da estrutura que compe cada uma delas.

    Refiro-me Forma e ao Fraseado.

    O fraseado musical resulta da seqncia de tons alternados, com variaes na

    acentuao, no andamento e na intensidade. As frases corporais e musicais surgem no ser

    humano progressivamente assim como surge, aos poucos, na vida, o domnio da linguagem

    oral.

    A criana recupera nas etapas de seu desenvolvimento os perodos de conscincia que

    Koellreutter (1982) descreve. Nesse sentido, minha inteno lev-la a vislumbrar o

    momento de sntese, no qual ela se descobre capaz de perceber-se e perceber o outro / o

    mundo, atravs de seus movimentos corporais e sonoros.

    O Fraseado corporal uma sucesso de esforos que contm uma preparao, uma

    ao principal e um repouso. A expressividade da frase depende da fluncia assim como a

    msica depende da dinmica e da interpretao.

    Para uma melhor compreenso desses paralelos segue um quadro sintico que

    facilitar a leitura e a associao dos 8 esforos de movimento classificados por Laban (1978)

    (deslizar, flutuar, pontuar, agitar, talhar, torcer, pressionar, socar) com os parmetros do som:

    Altura Intensidade Durao Timbre.

  • 25

    PARMETROS TERMINOLOGIA

    MUSICAL__________ DURAO_________ CURTO/LONGO

    MTRICO

    NO MTRICO

    AMTRICO

    CORPORAL________ TEMPO____________ SBITO/ SUSTENTADO

    MUSICAL__________

    INTENSIDADE______ FORTE/ FRACO

    CORPORAL_________

    PESO_______________ FIRME / LEVE

    MUSICAL__________ ALTURA____________ SONS: AGUDOS

    MDIOS

    GRAVES

    MELODIAS

    CORPORAL_________ ESPAO____________ PLANOS: ALTO

    MDIO

    BAIXO

    FLEXVEL/ DIRETO

    MUSICAL__________ TIMBRE____________ COLORAO DO SOM

    CORPORAL INTENO DO GESTO

    O som existe no tempo, projetado no espao por uma energia que lhe d uma

    determinada dinmica. O trabalho com o gesto na educao musical prope fazer sentir essa

    noo de som em movimento no tempo.

    A viso de Laban (1978) sobre os esforos de movimento que esto respectivamente

    relacionados com atitudes internas de impulso vital, nos ajuda a um resgate revelador da

  • 26

    necessidade de se poder olhar, ouvir.... sentir. Na prtica educativa podemos assim recuperar

    todo o universo da simbologia no verbal que constitui a base de nossa percepo com

    vivncias de :

    ESPAO- que promovem a ________________________ATENO

    TEMPO- que promovem a _________________________PRECISO

    PESO- que promovem a ____________________________DECISO

    FLUNCIA- que geram a _________________________INTENO

    Ao praticar exerccios com esses elementos, podemos realizar frases de movimento

    (saltitar, girar, deslizar, pular) que podem ser acompanhados com improvisaes sonoras. Os

    parmetros do som so assim trabalhados na busca de uma leitura significativa e expressiva

    da frase corporal. Ora o som reproduz o movimento corporal, ora o corpo movimenta-se pelo

    som. A partir da tanto movimento quanto som so passveis de serem transformados em

    escrita. O desenho grfico surge ento como uma conseqncia do gesto, que, fortuito no

    incio, torna-se consciente mais tarde. O traado torna-se ento motivo do gesto. O efeito

    transforma-se em causa. A escrita pode emergir como pesquisa coletiva de anlise sonora,

    como descoberta dos mecanismos de criao e familiarizao com os mesmos, numa

    apropriao do sistema de notao coreogrfica criado por Laban (1978).

  • 27

    Estou convicta que esta proposta de integrao da linguagem musical e corporal

    contribui para a formao de indivduos mais conscientes de um mundo em contnua

    transformao e mais preparados para atuar, com equilbrio, sobre ele.

    Nesse sentido, importante ressaltar que vivemos num pas onde h sinais

    promissores de um feliz convvio entre esses conceitos bsicos revisitados e a disponibilidade

    intelectual e emocional para se vivenciar o novo, o que nem sempre acontece em culturas do

    Primeiro Mundo.

    Este projeto amplia o seu significado a partir do momento em que colocamos em

    prtica a noo da percepo sincrtica (integradora) em detrimento da percepo analtica

    (categorizadora - classificadora) que a que estamos habitualmente acostumados a empregar

    em nossas vidas.

    Minha experincia profissional tem demonstrado que a verdadeira prtica educacional

    est em promover o aprimoramento dos sentidos - como instrumentos que so de percepo

    do mundo e da vida - e o desenvolvimento da capacidade de reconhecimento consciente das

    emoes.

    O trabalho educativo deve ser uma proposta dinmica, organicamente criativa, pois

    acredita na ampliao de uma percepo consciente como uma das experincias

    fundamentais, eu diria at vitais, para o processo do desenvolvimento humano.

    Para haver crescimento e evoluo preciso ousar ser.

    Ousar ser e realizar essa ousadia.

    No tempo, no espao, na msica, no gesto, na vida.

    A educao musical que, j por si s, tinha nas mos um material expressivo, foi

    orientada no desenvolvimento da personalidade como um todo, nas faculdades de percepo,

  • 28

    comunicao, concentrao, trabalho de equipe, discernimento, desembarao, autoconfiana,

    reduo do medo e inibio causados por preconceitos, na sensibilidade de valores

    qualitativos, memria e sobretudo no processo de conscientizao do todo.

    Num processo educacional criativo, a relao aluno - professor facilmente adquire

    uma horizontalidade, visto que a possibilidade do professor tambm aprender com o aluno

    est presente em todos os momentos. Essa abertura na busca daquilo que o aluno quer saber e

    no daquilo que o professor quer ensinar me permitiu caminhar em direo a uma

    aprendizagem autodirigida. Trago, aqui, a idia de que sofrer no poder incluir algo de seu,

    para reforar a questo do oferecer espao na educao, incluindo o sentimento onde - o ousar

    e o romper estruturas-, fundamental .

    Acreditando que vivemos num perodo da histria da humanidade onde os avanos

    tecnolgicos e das cincias evoluem com tamanha rapidez que temos dificuldades em

    acompanhar o desenvolvimento e a transformao da mentalidade, dos hbitos intelectuais e

    psquicos dos jovens. Por isso devemos estar atentos na busca de um novo paradigma para a

    educao, que seja capaz de conciliar o que est acontecendo no mundo da cincia com a

    necessidade da construo e reconstruo do homem e seu mundo interior.

    Minhas propostas pedaggicas foram caminhando em direo a construo de um

    processo onde a criao, o dilogo e o espao para ser adquiriam importncia fundamental.

    Esse foi, acredito eu, o primeiro passo concreto na busca dessa aproximao entre os

    aspectos objetivos e subjetivos do aprender. O primeiro passo tambm na aproximao de um

    olhar sistmico sobre a educao.

    Minhas atividades educacional/artstica/teraputica tornam-se uma s no que se refere

    a fomentar mudanas no indivduo, tentando criar um ponto de convergncia entre a cincia e

    a intuio.

  • 29

    Uma atividade expressiva que visa a busca de um sentido na estrutura formal da

    linguagem musical mais do que uma informao.

    Podemos ver a manipulao dos novos conceitos de tempo, diversidade de timbres,

    contrastes, surpresas, imprevisibilidades, como decorrncias da Teoria dos Sistemas Gerais

    (GASPARIAN, 1998) que refletem uma mudana em nossa viso geral, observando:

    as transformaes

    auto-regulao

    retroao

    relao parte e todo

    rede de relaes

  • 30

    Captulo 2: ARTETERAPIA

    2.1. O ser terapeuta

    Ter conhecimento da Tipologia Humana de Jung (VON FRANZ, 1995) trouxe

    fundamentos para que eu pudesse transitar com mais segurana na observao e comunicao

    com meus alunos, podendo compreender as facilidades e dificuldades na aprendizagem de

    cada um deles.

    Lidar com os introvertidos e extrovertidos, conhecendo os aspectos da intuio,

    sensao, sentimento e pensamento, organizou-me e esclareceu questes relacionadas tambm

    ao meu autoconhecimento. Ajudou-me a compreender e a procurar caminhos mais assertivos

    para alunos/pacientes cujas dificuldades, por exemplo, estavam localizadas no mbito da

    matemtica musical, ou na dificuldade de enxergar e expressar seus desejos pessoais numa

    composio coletiva. A busca do equilbrio estava, agora, para alm da diversidade das

    atividades. Fundamentava-me, tambm, na procura de onde e quando aparecem oportunidades

    de ser, para pessoas de um mesmo grupo cujas tipologias so divergentes. Como favorecer

    esse crescimento coletivo sem a perda do individual?

    A sutileza do trnsito entre o educar e a arteterapia acontece com a chegada de um

    Novo Projeto de trabalho com crianas e adultos portadores de deficincia visual.

    A constatao de que o trnsito entre o educativo e o teraputico tornou-se freqente

    em minha prtica profissional, veio confirmar a crena de que a arte e a criatividade so

    componentes tambm de um processo de cura. Essa forma de trabalho aproximou e atraiu

    pessoas, crianas e adultos portadores de deficincias e dificuldades mltiplas. O

    conhecimento da arteterapia como processo de crescimento e autoconhecimento atravs de

    prticas criativas que utilizam a linguagem verbal e no verbal da expresso pessoal, ajudou-

  • 31

    me nesse olhar mais apurado e sensvel no percurso entre o educar ex- docere (tirar o doce),

    ed- core (tocar o corao) e o curar, onde a capacidade de transformar e ser transformado o

    ponto de partida .

    [...] s aquilo que somos realmente tem o poder de curar-nos (JUNG, 1987, p.43).

    Saber quem eu sou (sentimento-introvertido) empurrou-me para trabalhar e desafiar

    minhas inseguranas de pensamento. Ampliou minha percepo sobre o conhecimento em

    geral enxergando num macro sistema quais so e de onde vm conceitos e tradies de

    comportamento, normas dominantes que regem nossa sociedade. Durante muitos sculos

    permanecemos ouvindo os pensadores. Nosso novo paradigma pode ser o de dar voz aos que

    intuem, sentem e percebem.

    Esse se tornou meu propsito nas entidades onde desenvolvi essa pesquisa e no meu

    espao pessoal de educao.

    No meu processo de imerso na Tipologia Humana, (VON FRANZ, 1995) foram

    enriquecedoras e pertinentes s associaes e s percepes de como outras reas do

    conhecimento podem lidar com essas questes, a partir de materiais mais ou menos

    convencionais. Maneiras e enfoques diversos, por exemplo, de como imaginar e visualizar

    uma rvore.

    Avaliar os processos aproximou-se mais de compreender os procedimentos utilizados

    do que ressaltar erros e acertos. Conduzir a pessoa para uma auto-avaliao pode ser o

    caminho tambm para a superao de dificuldades no caminho do autoconhecimento.

    Eu tive o privilgio de poder seguir minha intuio que conduziu a busca desse novo

    paradigma,antes mesmo de estudar Jung .

    Hoje me sirvo dela confiante no pensamento que tenho desenvolvido inspirada nesse

    grande mestre e que d diretrizes para essa pesquisa a qual proponho realizar, refletindo que,

    [...] a mentalidade do inconsciente de carter instintivo, no tem funes

    diferenciadas, nem pensa segundo os moldes daquilo que entendemos por

  • 32

    pensar. Ele somente cria uma imagem que responde situao da

    conscincia ;esta imagem to impregnada de idia como de sentimento e

    poder ser tudo, menos o produto de uma reflexo racionalista. Seria mais

    certo considerarmos tal imagem como uma viso artstica. (JUNG, 1987,

    p.58).

    Na busca de evitar classificaes fechadas e generalizadas em relao ao perfil

    humano com o qual trabalhava, inspirada nos estudos da Tipologia Humana de Jung, adentrei-

    me no interesse de conhecer pensadores que, como eu, buscaram reflexes dialogando com a

    pluralidade, com as diferentes formas de processar e conhecer o mundo.

    2.2. Percursos em arteterapia

    Minhas prticas educativas j transitavam na fronteira entre o pedaggico e o

    arteteraputico, quando decidi pela formao e aprofundamento dos princpios norteadores da

    Arteterapia.

    J h alguns anos eu trabalhava na formao de arteterapeutas, na Universidade

    Potiguar (UnP), no Alquimy Art por meio de oficinas de expresso sonora tendo como eixo

    a integrao das diferentes artes, buscando a compreenso dos smbolos e sua relao com a

    expressividade criativa numa abordagem junguiana. E a buscas continuaram...

    Eu carregava uma bagagem de vivncias pessoais que circulava entre a expresso

    corpora , teatral e a plstica com pequenas ousadias literrias envolvidas sempre pelo sonoro.

    Aquele era o momento de passar por um processo de experincias plsticas que pudessem me

    levar a uma maior compreenso das possibilidades de encontro entre as mltiplas facetas do

    ser, facilitando o dilogo entre os opostos e as diferenas.

  • 33

    Entrei em contato com as Teorias Gerais dos Sistemas de Kagin e Lusebrink (1978)

    que formularam um modelo conceitual de expresso e interao com o meio em diferentes

    nveis, constituindo O Continuum das Terapias Expressivas (ETC).

    Esses estudos propiciaram relaes e reflexes a respeito do imaginrio, dos smbolos

    e das expresses criativas a partir dos nveis:

    - Cinestsico / sensorial

    - Perceptual / afetivo

    - Cognitivo / simblico

    - Criativo

    As experincias das Oficinas Criativas (ALLESSANDRINI, 1996) relacionadas aos

    Coordenadores Cognitivos (PIAGET apud ALLESSANDRINI, 1966) propuseram um

    trabalho em atelier com uma dinmica entre essas trs aes:

    - Despertar o adormecido

    - Fazer restaurar o caminho adoecido

    - Inaugurar novas aes

    Os Coordenadores Cognitivos foram apresentados por Piaget como um

    processo de aquisio do conhecimento de uma pessoa e esto presentes em

    toda a sua ao. Eles tm a funo de organizar o conhecimento, ou seja ,

    de colocar em ordem duas coisas distintas, mesmo que sejam independentes

    entre si. (ALLESSANDRINI, 1996b, p.32).

    Os Coordenadores Cognitivos se apresentam em trios:

    REPETIO IDENTIFICAO - SUBSTITUIO

    SEMELHANAS E DIFERENAS REUNIO - SUCESSO

    ENVOLVIMENTO DIREO E DESTINO - (Tempo) - DESLOCAMENTO (Espao)

  • 34

    Por trs deste encadeamento est o infra-lgico, que aquilo que sustenta, que d

    suporte, que est por detrs do encadeamento, da ordenao, apontando para a eternidade e

    para a transcendncia.

    O caminho na busca de uma compreenso do inter-relacionamento entre forma e

    contedo, significante e significado dentro de um aprender contnuo e constante se fazia

    presente em minha prtica profissional.

    Partindo do pressuposto que expresses auditivas tm um impacto mais direto no

    indivduo do que a expresso visual, incluindo ritmo e sentimentos. (LUSEBRINK, 1990)

    prossegui na busca da compreenso dos smbolos por meio do estudo da Imagtica de Arietti

    (1967) relacionados ao universo Arquetpico da Humanidade (JACOBI, 1990).

    Estudos, em geral, refletem sobre as grandes transies que marcam a evoluo do

    indivduo e nos ajudam a lidar com essas passagens de forma mais tranqila e consciente.

    Meu projeto, nesse momento, o de ater-me aos aspectos que considero relevantes

    nesses relatos educativo - teraputicos a que me proponho estudar:

    - A liberdade de criao que conduz a uma viagem no imaginrio possvel e

    impossvel.

    - O dilogo com as diferenas, buscando a incluso, no lugar da excluso.

    - O brincar com os opostos e o diferente, desapegando-se do construdo e fechado.

    - O ter sensibilidade para conversar e ouvir o sutil nas entrelinhas dos processos

    criativos.

  • 35

    Captulo 3: OFICINAS DE EDUCAO MUSICAL COM

    PORTADORES DE DEFICINCIA VISUAL

    3.1. A criao de um novo territrio

    Em 1998 fui chamada para participar das oficinas criativas da Associao Brasileira de

    Assistncia ao Deficiente Visual LARAMARA. No seria o meu primeiro contato com este

    tipo de realidade, uma vez que em minha experincia na Oficina de Msica eu j atendia e

    dava aula para crianas cegas.

    O perfil, das pessoas com quem trabalhei no LARAMARA, era composto por dois

    grupos distintos: o das crianas e o dos adultos.

    As oficinas eram freqentadas por crianas acima de 4 anos, jovens e adultos cegos ou

    portadores de baixa viso, assim como com mltipla deficincia. Tinham a durao de uma

    hora semanal e eu contava com a parceria de uma, duas ou trs estagirias de T.O. (Terapia

    Ocupacional) por grupo.

    Tnhamos sala ambiente com revestimento acstico, equipamento de som,

    instrumentos musicais, sala para movimento e um espelho colocado em meu piano para que

    pudesse ver o que se passava por toda a sala, embora, sobretudo neste caso, no bastasse

    somente possuir viso.

    Durante estes cinco anos , tempo que desenvolvi meu trabalho no Laramara, colhi

    resultados significativos na melhoria de vida destas pessoas, utilizando a msica como vetor

    de existencializao para modificar estados de vitalidade e tendo o criar como referncia

    maior. Em 2002, j freqentando o curso de Especializao em Arteterapia, meu olhar e

  • 36

    minha prtica convergiam para um dilogo maior com os diferentes eus, seus poderes e

    limites, e sua relaes com o outro.

    Acreditando que no h vida sem movimento este trabalho de musicalizao buscaria

    encontrar o desejo do movimento interno e espontneo, que natural dos seres vivos, que

    permite ascender criao e s formas mais simbolizadas das aes, como por exemplo,

    educao musical.

    A pesquisa de sonoridades prprias e o fazer espontneo atravs de gestos corporais e

    instrumentais que levam ao gesto expressivo musical o contedo que trabalhamos nestas

    oficinas.

    Trarei o relato de uma vivncia educativa musical para que possamos estabelecer um

    paralelo entre o setting educativo e o arteteraputico e dar um exemplo de uma vivncia onde

    a representao da funo simblica esteve presente e norteou seu encaminhamento.

    Nos limitaremos s questes relacionadas cegueira no que concerne a alguns fatores

    emocionais presentes nas crianas do grupo com o qual trabalhamos. Uma anlise

    aprofundada sobre o desenvolvimento do deficiente visual num processo arteteraputico

    poder ser o tema para futuras investigaes.

    Citaremos alguns fatores psicodinmicos relacionados condio de cegueira,

    levantados em pesquisa de Amiralian (1992):

    - Condio marginalizadora

    - Relao com o outro: amar e ser amado

    - Sentimentos de desqualificao e insuficincia

    - Aceitao ou negao da cegueira

    - Solido e isolamento

    - Inveja

  • 37

    3.2. A oficina de educao musical

    Nosso grupo era composto por crianas de 6 a 8 anos que freqentavam aquele espao

    uma vez por semana com o objetivo de estabelecerem relaes de encontros com o outro,

    consigo e com a msica, propiciadas pelas linguagens sonora e corporal. Era um espao de

    expresso criativa do sensvel na busca de uma comunicao no verbal.

    Nossa rotina era composta de muitas possibilidades e variaes de expresses sonoras.

    Contvamos com vrios instrumentos de percusso, um piano, aparelho de som, bolas, tecidos

    e papis como recursos materiais.

    Aparentemente crivamos ambincias sonoras desarticuladas e confusas que no eram

    outros territrios que os do nvel mgico e pr racionalista, caminhando para o perodo de

    conscincia integradora a que se refere Koellreutter (1982).

    Naquele dia tnhamos 7 crianas no grupo.

    Foi proposto s crianas que lembrassem de cantigas conhecidas. Uma criana sugeriu

    a cano A Casa de Vincius de Moraes (1980), cuja letra :

    Era uma casa muito engraada

    No tinha teto no tinha nada

    Ningum podia entrar nela no

    Porque na casa no tinha cho

    Ningum podia dormir na rede

    Porque na casa no tinha parede

    Ningum podia fazer pipi

    Porque pinico no tinha ali

    Mas era feita com muito esmero

    Na rua dos bobos numero zero.

  • 38

    Para surpresa do grupo, um garoto de seis anos, D. ,com cegueira congnita, ao ouvir a

    letra, para ele desconhecida, no se conformou com a possibilidade da existncia de uma casa

    em que no houvesse teto, paredes, cho e sobretudo tivesse o nmero zero. Conforme o

    grupo ia se envolvendo com a cantiga, o garoto cada vez mais expressava em voz alta sua

    incompreenso e de certa forma sua angstia por aquelas afirmaes. Eu e as outras

    estagirias tentvamos tranqiliz-lo verbalmente, mas foi em vo. Ele sempre perguntava:

    Por qu? Por qu?

    Pude perceber claramente, que D., sentiu- se completamente desamparado diante de

    uma situao de confronto entre a imaginao e a realidade. A ausncia de estruturas fechadas

    e o movimento dos opostos contraditrios a que a letra se propunha causaram-lhe o que

    podemos chamar de paralisaes emocionais. Sua manifestao era ora de introverso e

    angstia, ora de introverso descontrolada.

    Foi a que surgiu a idia de transformar a vivncia sonora da letra da msica em

    movimento e dramatizao. Era o momento propcio para dialogar com a pluralidade, com

    diferentes formas de processar e transformar a experincia.

    Pegamos os tecidos, construmos com eles uma tenda, que s vezes possua sadas, s

    vezes no. s vezes pisvamos em cima e s vezes tirvamos o pano do cho (Foto 1). s

    vezes nos cobramos com ela, s vezes no. D. continuava inquieto e ansioso. Percebi que

    procurava limites, com as mos, mais rgidos do que aqueles que os panos lhe ofereciam.

    Peguei, ento, um basto, da dimenso de um cabo de vassoura, dei-o a ele, e sugeri que

    iramos sim, tocar o teto daquela casa, to estranha. Com a ajuda das estagirias, colocamos

    D. em p sobre um armrio que havia na sala, e segurando o basto ele atingiu o teto real da

    nossa sala, que naquele momento havia se transformado no de sua casa muito engraada. D.

    transformou-se imediatamente, diante daquela experincia sensorial- simblica.

  • 39

    Foto 1

    Como escreve Pelbart,

    No simples fazer tudo isso e ainda estar atento para as diferenas de

    tempo individuais, criando certos ritmos, em que uma modalidade temporal

    possa conectar-se com outra, compor-se, combinar-se, contrapor-se,

    ressoar, destoar. No para fazer bandinha, mas para no deixar que , por

    solido uma temporalidade morra estrangulada, ou que um paciente

    sufoque no seu ponto de horror. (1993, p.46).

    E assim, cantando e manipulando os tecidos e os bastes, pudemos, em grupo,

    estruturar um universo sensrio-motor que permitiu ao garoto lidar com sua dificuldade de

    criar relaes simblicas, inserindo as interaes acrescidas no mundo onde ele se situava.

    Diminuindo fragmentaes e ajudando-o na organizao de suas experincias, na formao de

    uma individualidade, criamos condio necessria para sua integrao.

    Estamos tratando aqui de como habitamos o nosso espao vital, de acordo

    com todas as dialticas da vida, como nos enraizamos, dia a dia, num

    canto do mundo. Porque a casa o nosso canto do mundo. Ela , nosso primeiro universo (p.24).[...] nessas condies, se nos perguntassem qual o

    benefcio mais precioso da casa, diramos: a casa abriga o devaneio, a casa

  • 40

    protege o sonhador, a casa permite sonhar em paz. (BACHELARD, 1993,

    p.26).

    Ao final da aula o garoto comentou: Gostei muito desta casa.

    Durante muitos encontros posteriores, ao chegar na sala, D. pedia para que

    comessemos as atividades com a cano da Casa Engraada. Pedia o basto e oferecia-se

    para ser pego no colo para subir no armrio.

    Ampliamos essa experincia espacial por muitos encontros ainda, reforando a

    importncia da espacialidade como morada do inconsciente. Usamos almofadas , papeles e

    cadeiras na montagem dessas novas moradas. Histrias e cantigas foram lembradas e

    criadas a partir desse projeto, reforando a potencialidade da msica, de harmonizar a

    atividade dos hemisfrios cerebrais: direito e esquerdo e de estimular nveis integrativos de

    conscincia relativos ao corpo, mente e ao esprito.O uso de recursos tridimensionais

    possibilitou o dilogo com o orgnico, o concreto mobilizando as sensaes cinestsicas e

    tteis. (FAGALLI, 2004, p.231).

    O uso de materiais rgidos (bastes) favoreceu a concretizao, relacionada fora e

    ao decisiva de tocar o teto, e os materiais flexveis (panos e almofadas Fotos 2 e 3)

    remeteu ao aconchego das melodias, do afeto e da amorosidade.

    Foto 2

  • 41

    Foto 3

    Acredito que o trabalho musical acontece no brincar com possibilidades mltiplas da

    fala, dos gestos, das imagens, do movimento e dos sons. necessrio trabalhar com o ritmo,

    que estrutura idias, conceitos, gestos e palavras; com a msica que favorece, estimula e

    facilita a organizao interna e a expresso, ajudando nas relaes do sujeito consigo, com o

    outro e com o mundo (Foto 4).

    necessrio buscar uma integrao entre contedo e forma, segundo a fenomenologia

    de Merleau-Ponty: A forma seria a organizao total dos dados que fornecida pela funo

    simblica. Pelo fato de haver uma dialtica entre contedo e forma no podemos organizar

    nada se no houver dados, que quando fragmentados da funo simblica de nada

    adiantam. 4

    4 MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da percepo. So Paulo: Martins Fontes, 1994. Citao retirada de

    apostila feita para uso interno do curso de Especializao em Arteterapia do Alquimy Art, paginao irregular.

  • 42

    Foto 4

    Acredito que esta tenha sido talvez, uma proposta, uma atitude que efetivamente

    trouxe uma possibilidade concreta de insero e incluso social e cultural desta criana, visto

    que o perceber, o percutir, o ressoar aconteceram sem que houvesse a necessidade de retir-lo

    de seu caminho.

    Estamos falando da pulso do movimento que primitiva e fundamental, embora

    aparentemente sem finalidade: de incio o movimento interno que se dirige gradativamente ao

    exterior.

    O contato direto por meio dos objetos, panos, aros, bolas, papis e instrumentos

    musicais usados como transmissores de tenses podem aparecer como apoio comunicao e

    expresso de sentimentos. No primeiro momento, como oposio recproca da criana para

    atrair ou afastar-se de si mesma ou do outro. No momento seguinte, para alcanar um maior

    equilbrio entre as tenses .Quando propomos s crianas cegas ou com demais deficincias

    fsicas, atividades de deslocamento espacial, permeadas de sons vocais espontneos, estamos

    partindo da aventura do risco e da criao, na construo de um universo energtico mais

    especfico.

    Quem cuida de quem? Quem acompanha o outro? Estamos sempre diante do grupo,

    balanando entre o oferecer e o receber, entre o som e o silncio, o conhecido e o

  • 43

    desconhecido e todas as oposies que nos permite a ousadia de educar e cuidar. Uma

    educao que visa o ser, a arte e a alma.

    Estamos falando de uma ampliao de horizontes de atuao, para entrar em conexo

    com saberes vizinhos, numa atitude questionadora permanente dos papis profissionais que

    eles podem usar. Limito-me a expressar uma idia de educao que visa ao ser na sua

    totalidade . O fato que os atrasos no desenvolvimento do deficiente visual, assim como no

    do deficiente mental ocorrem pelo empobrecimento dos aspectos perceptuais e

    representacionais a que so submetidos, mas tambm ocorrem devido s dificuldades das

    pessoas de se relacionarem com aqueles que so diferentes. Fao minhas as palavras de

    Galletti:

    Utilizar a arte ou qualquer outro domnio na terapia pode ser um caminho,

    uma promessa de insero e incluso mas fazer interface com estes

    domnios, conectar-se efetivamente com eles, transitar, deixar-se

    contaminar, misturar-se a eles, deixar-se invadir o que possibilita

    processos de diferenciao, de transmutao e de outramento. (2001, p.111)

    Neste processo de ensino-aprendizagem quem cuida de quem? Quem acompanha o

    outro?

    Na realidade estamos sempre diante do grupo, colocando-o em contato com o oferecer

    e o receber, entre o som e o silncio.

    Foto 5 - O expressar- se de dentro para fora.

  • 44

    Captulo 4 OFICINAS DE ARTETERAPIA COM PORTADORES DE

    DEFICINCIA FSICA E MENTAL

    4.1. Sujeitos: Escolha e caracterizao

    Esse estgio em Arteterapia aconteceu num total de 34 encontros com adultos de 21 a

    65 anos no Laboratrio 1 do Bloco 8 do prdio de Terapia Ocupacional da USP desenvolvido

    no Laboratrio de Estudos e Pesquisa Arte e Corpo em Terapia Ocupacional do

    Departamento de Fisioterapia , Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de

    Medicina da Universidade de S. Paulo.

    Sendo a Arteterapia uma atividade que evoca o processo de crescimento e

    autoconhecimento por meio de prticas criativas que utilizam a linguagem verbal e no verbal

    como recurso, (ANDRADE, 2000, p.31) pensei em trabalhar com pessoas em um grupo

    heterogneo de adultos, usurios de servio de sade mental, que so excludas de

    determinadas oportunidades da vida por questes fsicas, culturais e/ ou econmicas, e que

    necessitam de ocasies para evocar a imaginao, o sensorial e o pensamento de forma que

    no prevalecesse a falta, mas sim o potencial de cada um.

    Os objetivos eram os de acolher, facilitar e potencializar os processos de:

    - descoberta de si;

    - insero e atuao em um grupo social;

    - resgate de vivncias culturais adormecidas;

    - traar um caminho expressivo-criativo para essa busca.

    A metodologia consistiu em:

  • 45

    - Sensibilizao, Expresso livre, Transposio de linguagem e Avaliao, segundo o formato

    das Oficinas Criativas de Allessandrini (1996).

    - Procedimentos do Continuum de Terapias Expressivas (ETC) trabalhados no nvel sensrio-

    motor, perceptivo-afetivo e cognitivo simblico, de Kagin e Lusebrink (1978) que

    nortearam a anlise do encadeamento das atividades propostas.

    Para melhor entender o processo em atelier teraputico ser necessrio ressaltar que as

    etapas propostas pelas metodologias das Oficinas Criativas no so lineares. Podem acontecer

    momentos de progresso e evoluo como momentos de recolhimento e imerso. Uma breve

    anlise do perfil do grupo faz-se necessria.

    Foram atendidos nesse projeto em Arteterapia, adultos com transtornos psquicos,

    idosos e moradores de rua e portadores de deficincia mental. Pessoas que so excludas de

    determinadas oportunidades da vida por questes fsicas, culturais e/ou econmicas, que

    necessitam de ocasies para evocar a imaginao, o sensorial e o pensamento de forma que

    no prevalea a falta, mas sim, o potencial de cada um.

    O objetivo foi o de traar um caminho criativo para essa busca, em encontros semanais

    de 1:15h no Laboratrio de Estudos e Pesquisa Arte e Corpo em Terapia Ocupacional do

    Departamento de Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional da Faculdade de

    Medicina da Universidade de So Paulo, sob a Coordenao da Prof Dra. Eliane Dias de

    Castro e da Prof. Ass. Elizabeth de Arajo Lima, na Cidade Universitria de So Paulo

    Perfil sucinto dos participantes das oficinas teraputicas:

    - T.: Senhora de 60 anos, portadora de Demncia de Pick. Mora com marido e filha em

    Osasco no conseguindo ficar parada. Falava pouco.

    - M.: Jovem de 21 anos, portador de deficincia mental .Mora com me e irmo no Jardim

    ngela. No alfabetizado. Faz trabalhos domsticos.

  • 46

    - F.: Jovem de 28 anos, portador da Sndrome do X frgil, descoberta aos 15 anos. Pai

    falecido. Me viaja muito. Mora com 3 irmos no Butant. Passeia pela rua. Todos o

    conhecem.

    - W.: Jovem de 22 anos, portador de deficincia mental, analfabeto, morador no bairro de

    Paraispolis, sabe escrever o nome.

    - A.: Senhor de 62 anos, portador de ataxia cerebelar aps cirurgia cerebral aos 58 anos. Mora

    com esposa, gosta de ler. Apresenta desequilbrio e incoordenao motora.

    - R.: Senhor de 32 anos, morador de rua h 20 anos j tendo sido metalrgico, com doenas

    pulmonares.

    Descreverei uma das propostas realizadas com esse pblico durante esse perodo de

    encontros arteteraputicos para anlise do processo de transformao pessoal em processos

    criativos.

    4.2. Atividade: Construo da maquete coletiva (1 etapa)

    Sensibilizao

    Nosso encontro foi iniciado com um aquecimento corporal com partes do corpo.

    1. Batimentos dos ps

    2. Braos soltos (elefantinho)

    3. Cabea

    4. Ombros (deixa pra l...)

  • 47

    Expresso livre

    Propus que fizssemos um trabalho coletivo com aqueles elementos plsticos: lpis,

    grafite, guache, colagens que j conhecamos. Poderamos retomar as imagens do encontro

    anterior e acrescentar novas idias. Estendemos, ento, um papel Kraft por toda a mesa e cada

    um foi iniciando sua proposta.

    A. retomou o carvo fazendo o asfalto da estrada que W. props, ao lado de ruas. M.

    copiou os faris que W. havia feito. T. fez uma grande rvore. Surgiram casas, carros e

    prdios.

    Ouvimos: BACH sute solo para cello.

    W. que teve um envolvimento com o processo, logo tomou a frente e foi criando uma

    cidade, com ruas, semforo, faixa de pedestre, etc.

    A. foi quem mais resistiu a entrar em tal atividade. Manteve-se em outra atividade que

    no conseguira dar fim na da semana anterior. Neste dia, A.estava com a coordenao motora

    fina mais dificultada, sua ataxia estava bastante acentuada, e logo percebera a dificuldade que

    teria em realizar qualquer atividade. Mesmo assim, incentivei-o a compor o trabalho em

    grupo. Sugeri que continuasse a realizar a mesma atividade que fizera no trabalho individual.

    Disse-lhe que ficaria timo para o asfalto das ruas de W. continuar trabalhando com o carvo,

    que daria um efeito de textura e cor muito semelhantes ao asfalto real. Animou-se com a idia

    e se prontificou a fazer. Entretanto, foi muito difcil esta realizao: sentar-se no banquinho

    alto, sem apoio e mudar a toda hora de lugar, uma vez que no consegue trabalhar em p. E,

    as ruas que W. construra eram ruas que ocupavam todo o espao, atravessando e interligando

    todo o trabalho.

    Enquanto A. desenvolvia seu trabalho de pintura do asfalto, W. comeara a pintar as

    caladas com pincel e guache preto e em um instante, estava pintando tambm as ruas, sem

    perceber que isto sacrificava todo o trabalho de A., que parou e ficou a observar a ao de W.

  • 48

    Entretanto, W., como de costume, se envolvera tanto com o processo, que ia cobrindo os

    espaos, inclusive os espaos j ocupados pelo dificultoso trabalho de A.

    Mantive-me um tempo s a observar, entretanto, o trabalho de W. estava sendo muito

    rpido e paralisara o de A.. Logo, interferi neste processo, sinalizando o que estava

    acontecendo. Imediatamente W. parou. Mas custou caro, pois A., que j no estava motivado

    devido ao acrscimo de dificuldade que estava tendo naquele dia, simplesmente parou, no

    deu continuidade ao asfalto.

    A partir da, pode-se perceber o confrontamento de diferentes valores, um de ver seu

    produto ser destrudo, o outro por expandir seu processo, e isto ser to intenso que eles no

    notavam que havia outros trabalhando com eles.

    Havia nesse momento uma rica possibilidade de ampliao da vivncia que seria de

    grande valia para o desenvolvimento das relaes deste grupo, da expresso de

    individualidades e do confrontamento das diferenas e dificuldades.

    Foto 6 - Trabalho coletivo sobre papel Kraft e materiais plsticos conhecidos.

  • 49

    Sensibilizao - 2 etapa

    No segundo encontro iniciamos a sensibilizao com batimentos com os ps nos cho

    e com as mos no corpo, com msica tnica reforando o pulso marcado, os sons fortes e

    precisos conduzindo atravs da melodia o dialogar com sentimentos opostos que vinham a ser

    despertados.

    Nos aquecemos para a caminhada que faramos no bosque da USP antes de darmos

    continuidade ao projeto. Estava um dia de sol e foi agradvel sair do prdio. A. mostrou-se

    tranqilo em andar conosco.

    Naquele dia, tivemos a chegada de F. no grupo, rapaz de 27 anos com sndrome do X

    frgil.

    Expresso livre

    Ao voltar par a sala continuamos nossa construo da cidade que agora adquiria

    volume e texturas. Foram usados fios, barbantes, caixas, tampinhas.

    Sensibilizao 3 etapa

    1. Colocar os nomes das pessoas do grupo sobre os batimentos dos ps em 2 tempos.

    2. Seqncia de 4 batimentos : perna palma peito cabea ao ritmo do bong.

    Cada um tocou o bong para o grupo fazer os batimentos.

    Expresso livre

    Foram levados para o grupo novos recursos materiais para a maquete: serragem,

    palitos, celofane picado e tampinhas.(Fotos 7, 8 e 9).

  • 50

    Foto 7

    Foto 8

    Foto 9

    Conversamos que seria nosso ltimo encontro para terminar a parte plstica do

    trabalho. Todos se envolveram muito e o resultado foi prazeroso para todos. Lamentamos a

    falta do A.

    A chegada do F. foi bem vinda pelo grupo e ele logo se envolveu com a proposta.

    Pintou e construiu um carro.

    Wanderley fez uma ponte, T. colocou gua e peixes nos lagos.

    Todo o grupo estava muito envolvido com as idias que iam surgindo e T., s vezes,

    falava nome dos elementos : peixes, casas, carros.....

  • 51

    A presena do F. foi bem recebida pelo grupo. Pareceu-me que ele estava tranqilo e

    vontade com as pessoas e as propostas.

    Sensibilizao - 4 etapa

    Aps a conversa habitual de incio dos encontros, propus um relaxamento com

    visualizao da nossa cidade, ao som do ETERNAL OM, e foi oferecida uma venda para

    poderem ficar mais confortveis com os olhos fechados. Fui narrando uma histria que se

    passava em uma cidade, com seus habitantes, mercados, carros, casas e animais criando um

    clima de tranqilidade e s vezes de tenso pela chuva e tempestade que ocorriam. Ao narrar

    eu ia andando atrs de cada um do grupo fazendo um toque de massagem pelas costas e pelos

    ombros.

    Todos se sentiram muito confortveis com a proposta.

    Expresso livre

    Depois disso nos dirigimos maquete e tentamos reproduzir aquela histria

    coletivamente, com narrativa de todos, orientados por mim. Introduzimos sons sonoplsticos e

    algumas improvisaes no texto. Esse momento foi gravado.

    Num segundo momento, interpretamos a histria ao redor da maquete, momento esse

    de narrativa, sonoplastia e filmagem. Escutamos a gravao e fizemos uma avaliao.

    R. sentiu-se emocionado em ser recebido pelo grupo. No esperava pela massagem

    que o transportou para outro universo, segundo seu depoimento.

    Combinamos de assistir ao vdeo no prximo encontro.

    A. ficou surpreso com a transformao da maquete. Seu crescimento e as novas idias

    que foram acrescentadas.

    Todo o trabalho foi gravado em K7 e VHS.

  • 52

    No ltimo encontro sentimos a falta do R., F. e M., este ltimo, tendo avisado que no

    viria porque iria ao mdico com a me.

    Preparamos a sala para assistir ao vdeo que seria uma novidade para W. que havia

    faltado no encontro anterior.

    O filme ficou expressivo e todos gostaram de se ver. Fizemos uma pequena conversa

    sobre o projeto todo e encerramos esse ciclo do trabalho.

    Foto 10 Detalhes da maquete.

    Foto 11 Maquete finalizada.

  • 53

    4.3. Desvendando os processos

    Esta anlise ter um olhar relacionado ao Tempo Expectativa Olhar Oferecer-

    oportunidades de vivenciar processos criativos conscientes e inconscientes simultaneamente,

    baseados nas teorias do ETC e da Psicologia Analtica de Jung, que o grande desafio a que

    me proponho analisar a partir dessa experincia com o projeto SENTIR E CRIAR em

    Arteterapia.

    O quadro abaixo traz uma sntese da anlise do projeto Construo de Maquete para

    uma melhor compreenso do desenvolvimento da proposta a partir de ETC.

    Nveis de Expresso

    Continuum das Terapias Expressivas (ETC)

    Atividade Nveis

    Aquecimento com batimentos:

    Caxixis e Msica tnica

    Visualizao: riacho/animal da infncia

    Batimentos corporais, nomes, ritmos no

    bong

    Nvel sensrio motor: Liberao da energia corporal

    Liberao da inibio e controle

    1 etapa : desenhos planos no papel craft

    coletivo

    Ruas, estradas, natureza, pessoas, animais

    Sute de Bach

    Nvel Perceptual Afetivo: Focaliza a forma

    Externaliza afetos

    2 etapa : criao de volumes

    Casas, postes, pontes, mercado

    frutas, peixes

    Nvel Cognitivo simblico : Focaliza solues de problemas

    Abstrao e representao

    Verbalizao

    3 etapa : chegada de F.

    Verbalizao Detalhes

    Diversidade de recursos materiais

    Cantigas Infantis

    Nvel Cognitivo simblico : Maior distancia reflexiva

    (objetividade)

    Aparecimento de smbolos regressivos

    4 etapa : chegada de R.

    Criao da histria

    Sonorizao livre / filmagem / gravao

    Nvel Criativo : Enfatiza a sntese (ego e self)

    Unidade entre o material e a mensagem

    Favorece o processo de cura

  • 54

    Podemos verificar que a partir de um estmulo corporal e musical o grupo foi

    estimulado a um vivenciar artstico encantador e envolvente com uma funo teraputica

    definida e consciente, visto ter sido um processo de transformaes e melhorias no jeito de ser

    e pensar a vida.

    Nosso objetivo no sendo o de ensinar artes no sentido usual, nem emitindo juzos de

    avaliao crtica, nos permite concordar com Liebmann que nos diz:

    A arteterapia usa a arte como meio de expresso pessoal para comunicar

    sentimentos, em vez de ter como objetivo produtos finais esteticamente

    agradveis a serem julgados segundo padres externos. Esse meio de

    expresso acessvel a todos, no apenas aos que tm talento artstico.

    (2000, p.18).

    Ressaltamos, aqui, no processo de arteterapia, o ldico e a expresso espontnea

    trazendo tona elementos do imaginrio pessoal de cada componente do grupo e do coletivo

    cultural.

    Uma reflexo sobre a escuta e realizao sonora realizada durante essas oficinas nos

    permite um olhar abrangente sobre o papel e a funo musicoterpica dos sons conforme os

    nveis de conscincia preconizados por Koellreutter (apud BRITO, 2001, p.48 e 49).

    Msica tnica (nvel mgico)

    Contato com partes do corpo.

    Batimentos fortes e rtmicos.

    Momento de unio do grupo.

    Cantigas Infantis - (cantaroladas e na flauta doce ) ( nvel pr- racional)

    Melodias definidas e carregadas de sentimentos.

    Frases musicais com texto e significado.

    Pulsao ligada ao fluxo da respirao.

  • 55

    Sute para violoncelo de Bach (nvel racionalista)

    Momentos de introspeco e recolhimento.

    Busca de materiais imagens e contato com seu ntimo.

    Harmonia Dissonncia e Consonncia que estruturam o pensamento lgico.

    Sons e rudos da sonoplastia urbana da maquete (nvel integrador)

    Relao tempo - espao fragmentadas holsticas.

    Ausncia de tonalidade.

    Presena de ruidosidade, imprevisibilidade, surpresa.

    Necessidade da inteno emocional para a comunicao.

    Este projeto constiuiu-se de vrios momentos onde cada um enfocava algum aspecto

    da arteterapia sem propor um destaque nas artes plsticas como expresso dominante e sim

    ressaltando a integrao das linguagens expressivas.

    Podemos salientar algumas consideraes sobre os resultados observados :

    1. Tentativas de falar pelo outro.

    2. Utilizao de instrumentos musicais como suporte rtmico da fala.

    3. Trabalho corporal com limitao de espao a partir de imitaes.

    4. Resgate das histrias de vida.

    5. Parceria com a psiquiatra da T.

    Observaes perceptveis em T. (100% de presena):

    - Desenvoltura na fala;

    - Alegria na expresso facial;

  • 56

    - Segurana no andar;

    - Independncia em casa;

    - Afetividade corporal;

    - Aumento da iniciativa pessoal - fala e ao.

    Desse modo tivemos a possibilidade de vivenciar o olhar de Allessandrini sobre

    processos criativos de expresso:

    Em Arteterpia evocamos o valor e a abrangncia que a Arte tem sobre o Ser

    Humano: pensante, formador, construtor, sensvel, consciente e intuitivo [...]

    Nossa proposta evoca a presena do Ser Humano em pleno desenvolvimento

    de sua sensibilidade e de suas competncias. (1999, p.24).

  • 57

    Captulo 5: EDUCAO E ARTETERAPIA

    5.1. Paralelos e interseces

    Todos conhecem o compreendem o papel da psicologia dentro do ambiente

    educacional. A importncia da criao de espaos da expresso espontnea e criativa vem

    sendo ressaltada em nossa cultura desde incio do sculo XX com muitos pensadores que a

    isso de dedicaram como um fato de aproximao de processos de transformao psquica e

    emocional.

    Nesse momento, trata-se de levantar quais so realmente os processos de

    aprendizagem que valorizam e do destaque questo do desenvolvimento das funes:

    sentimento, intuio e sensao, em detrimento da funo pensamento. Sem dvida, a

    educao artstica a que pode mais se aproximar desse universo de construo e

    transformao do indivduo. Estamos falando de uma educao artstica que valoriza a

    espontaneidade esttica e que no se contente na transmisso e na aceitao passiva de uma

    verdade ou um ideal de beleza.

    At 1917, nossos mtodos de educao lidavam com o mental consciente e superficial

    da criana. A nova psicologia analtica surgiu trazendo tona a importncia da vida mental

    inconsciente, que o crescimento dos instintos infantis.

    Reconhecemos a importncia vital para o desenvolvimento do ego da liberao de parte dos

    contedos inconscientes atravs de produes artsticas e criativas.

    Essas so questes abordadas tanto na educao como na arteterapia e ambas tm em

    comum o fato de que nem o educador nem o arteterapeuta interpretam a expresso simblica

    do trabalho artstico do aluno ou paciente. Na arteterapia, ele incentiva-o, sim, a descobrir o

    significado de suas produes.

  • 58

    Dentro de uma sala de aula, como em num setting teraputico o aspecto dinmico das

    relaes ilimitado de possibilidades de interao. Essas interaes envolvem tambm o

    inconsciente, ocasionando relaes transferenciais a serem observadas.(ANDRADE, 2000,

    p.95).

    A transdisciplinaridade como um fator de abertura na atuao educativa teraputica

    favorece a flexibilidade para lidar com mudanas, dificuldades e conflitos, assim como para

    ampliar as possibilidades de ao do sujeito.

    Podemos notar que vrios pontos de interseco acontecem em ambas propostas. O

    que difere, evidentemente, o sentido da busca interior de cada um, que passa por esses

    processos de transformao.

    O educador abre o espao da criao e desenvolve habilidades, ao mesmo tempo em

    que o arteterapeuta abre caminhos para a reflexo e autoconhecimento conscientes.

  • 59

    CONSIDERAES FINAIS

    Lembramos que o objetivo desse trabalho foi buscar elementos que contribussem para

    uma reflexo do fazer expressivo dentro da educao e da arteterapia. A importncia desse

    relato foi o de mostrar o processo de transformao do aluno e do paciente, como um ritual de

    iniciao, que no incio assusta porque desconhecido, mas que no decorrer do processo

    torna-se claro e revelador.

    Foi um grande desafio trazer esse olhar analtico prtica to intuitiva, sensvel e

    orgnica do meu fazer profissional.

    Perguntava-me, constantemente, quais eram as fronteiras que me separavam de uma

    ou outra proposta. Vejo que as atuais transformaes na rea do saber buscam esse olhar mais

    abrangente e holstico em relao ao desenvolvimento humano, aproximando campos de

    atuao que at meados do sculo XX estavam separados por especializaes

    compartimentadas.

    Acreditando ser o SER HUMANO um integrante da natureza, ele troca com ela

    energias e as modifica, transforma-as, expressando a si mesmo e suas relaes com o mundo,

    com seu jeito de ser, na sua produo artstica. Quando ele se expressa em arte, possibilita um

    encontro consigo mesmo, entrando em contato com seu interior facilitando uma maior

    conscincia de si e do todo.

    Facilitar esses processos como adentrar na magia csmica da transformao divina.

  • 60

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ALLESSANDRINI, C.D. Oficina criativa e psicopedagogia. So Paulo: Casa do Psiclogo,

    1996.

    ALLESSANDRINI, C.D. O Elemento Criador na Aprendizagem. In: Revista da associao

    Brasileira de Psicopedagogia, 13 (28); 15 (39). So Paulo: [s.n.], 1996b.

    ALLESSANDRINI, C.D. (Org.) et al. Tramas criadoras na construo de ser si mesmo.

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    AMIRALIAN, M.L.T.M. Compreendendo o cego atravs do procedimento de desenhos-

    Estrias: uma abordagem psicanaltica da influncia da cegueira na organizao da personalidade. 190 p. Tese de Doutorado para o IPUSP, So Paulo: [s.n.], 1992.

    ANDRADE, L.Q. Terapias Expressivas. So Paulo: Vetor, 2000.

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    BACHELARD, 1993. A potica do espao . So Paulo:Martins Fontes, 1993

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    Paulo: Peirpolis, 2001.

    DIEL, P. O Simbolismo na Mitologia Grega. Trad. De Roberto Cacuro e Marcos Martinho

    dos Santos. So Paulo: Attar , 1991.

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