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Capítulo “Sei lá o caraças…” Maputo, República de Moçambique. Avenida Marginal, 13 de Março de 2014 05:56 Rodrigo estremeceu. Aquele telemóvel não era suposto tocar tão cedo. Alguma coisa tinha corrido mal. Após confirmar que não tinha ninguém na estrada, em sentido contrário, guinou de repente para o pequeno miradouro imediatamente antes do Clube Náutico de Maputo. Virou para a direita e imobilizou o carro mesmo no meio do largo, fazendo levantar uma nuvem de pó que envolveu as mesas contíguas como um manto. Largou o volante e continuou a olhar para o visor, que continuava piscar no suporte, um pouco acima da consola central do carro. Ao fim de 30 segundos a luz do aparelho apagou-se. Rodrigo expirou lentamente sem nunca tirar os olhos do aparelho. Um baque, seguido de vidros a catapultarem-se violentamente em todas as direcções foi a última coisa que ouviu antes de cair, inerte, em cima do volante, e depois para o lado. Uma bala tinha-lhe acertado na parte traseira da nuca, atravessou-lhe o crâneo e saiu pelo vidro da frente, espalhando uma massa disforme de sangue, cabelo, pele e cérebro por todo o compartimento. Silêncio absoluto. Os primeiros raios de sol despontavam agora na pérola do índico. Alguns veículos passavam na estrada, a 50 metros do local onde o agora defunto tinha imobilizado do seu carro. No sentido Avenida 25 de Setembro - Costa do sol um velho Toyota Corolla desgastado pelo tempo e por alguns acidentes, abrandou ao passar em frente ao Clube Naval. - Para aí! - exclamou o pendura quase que saltando do carro em movimento. O condutor mal teve tempo de imobilizar o veículo já o homem estava a entrar novamente a correr Tinha apontado o seu telemóvel para um velho Mercedes Benz estacionado no meio do parque e com alguns vidros partidos, e tirado algumas fotografias. Uma de trás, outra de lado e uma última, já a correr, para dentro do veículo. - Segue! - ordenou, batendo na porta duas vezes. Os pneus chiaram várias vezes. O Corolla fez inversão de marcha e voltou para onde veio, a

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Capítulo “Sei lá o caraças…” 

 Maputo, República de Moçambique. Avenida Marginal, 13 de Março de 2014 05:56 

 Rodrigo estremeceu. Aquele telemóvel não era suposto tocar tão cedo. Alguma coisa tinha

corrido mal.  Após confirmar que não tinha ninguém na estrada, em sentido contrário, guinou de repente

para o pequeno miradouro imediatamente antes do Clube Náutico de Maputo. Virou para a

direita e imobilizou o carro mesmo no meio do largo, fazendo levantar uma nuvem de pó que

envolveu as mesas contíguas como um manto. Largou o volante e continuou a olhar para o

visor, que continuava piscar no suporte, um pouco acima da consola central do carro. Ao fim

de 30 segundos a luz do aparelho apagou-se. Rodrigo expirou lentamente sem nunca tirar os

olhos do aparelho.  

 Um baque, seguido de vidros a catapultarem-se violentamente em todas as direcções foi a

última coisa que ouviu antes de cair, inerte, em cima do volante, e depois para o lado. Uma bala tinha-lhe acertado na parte traseira da nuca, atravessou-lhe o crâneo e saiu pelo

vidro da frente, espalhando uma massa disforme de sangue, cabelo, pele e cérebro por todo o

compartimento. Silêncio absoluto. 

 Os primeiros raios de sol despontavam agora na pérola do índico. Alguns veículos passavam na estrada, a 50 metros do local onde o agora defunto tinha

imobilizado do seu carro. No sentido Avenida 25 de Setembro - Costa do sol um velho Toyota Corolla desgastado pelo

tempo e por alguns acidentes, abrandou ao passar em frente ao Clube Naval.  - Para aí! - exclamou o pendura quase que saltando do carro em movimento. O condutor mal teve tempo de imobilizar o veículo já o homem estava a entrar novamente a

correr Tinha apontado o seu telemóvel para um velho Mercedes Benz estacionado no meio do parque

e com alguns vidros partidos, e tirado algumas fotografias. Uma de trás, outra de lado e uma

última, já a correr, para dentro do veículo. - Segue! - ordenou, batendo na porta duas vezes. Os pneus chiaram várias vezes. O Corolla fez inversão de marcha e voltou para onde veio, a

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toda a velocidade. No banco detrás alguém perguntou: - Posso levantar-me? Já me doi o corpo todo. O condutor olhou pelo retrovisor e chegou até a levantar-se um pouco, mas não conseguiu

vislumbrar nada. O pendura deu-lhe uma chapada no braço que o fez dobrar para a esquerda

de dor. - Para que foi isso? - reclamou  - Pago-te para conduzir. Só. - Disse com um tom de voz ameaçador. - Sabes que o último

curioso que trabalhou para mim mora agora no Languene ? 1

O condutor, um homem de compleição física média anuiu. Concentrou-se na condução e nada

mais disse. - Deixe-se estar! - informou Jeremias, o pendura. Era um homem possante. Um pouco forte e

certamente com mais de um metro e noventa. Os bícepes desafiavam constantemente as

bainhas da velha t-shirt que tinha vestida. Usava óculos ray-ban espelhados, o que metia

muita confusão a Gerson, o condutor, pois nunca sabia para onde ele estaria a olhar. Depois de entrarem na 25 de Setembro outra vez seguiram em frente até ao cruzamento com

o 33. Viraram à direita e subiram a Avenida Vladimir Lenine e desapareceram algures no

Malhangalene. Nem repararam que atrás deles, a menos e cem metros, 2 motas faziam igual percurso. Do banco de trás, contra o apelo do pendura, um homem de cabelo rapado, muito moreno e

com uma tatuagem no pescoço levantou o tronco ao nível da janela e espreitou.  

 

 

 

 

1 Um dos cemitérios da capital Moçambicana.