Amostra do Português Popular

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AMOSTRAS DO PORTUGUÊS POPULAR: TRANSCRIÇÃO DE INQUÉRITOS E ANÁLISE DE FATOS LINGUISTICOS ARNALDO REBELLO CAMARGO JUNIOR HOSANA DOS SANTOS SILVA SÃO PAULO 2006

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descrição de inqueritos sobre portugues popular de São Paulo

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AMOSTRAS DO PORTUGUÊS POPULAR: TRANSCRIÇÃO DE INQUÉRITOS E ANÁLISE DE FATOS

LINGUISTICOS

ARNALDO REBELLO CAMARGO JUNIOR HOSANA DOS SANTOS SILVA

SÃO PAULO

2006

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S U M Á R I O RESUMO............................................................................................................................3 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................4 1.0 Português Popular .........................................................................................................4 2. CARACTERÍSTICAS DAS SOCIEDADES ESTUDADAS........................6 2.0 Parada de Taipas ...........................................................................................................6 2.1 Largo do Glicério...........................................................................................................7 2.2 resumo do perfil dos informantes.................................................................................9 2.2.0 Informante 1 – bairro de Parada de Taipas .............................................................9 2.2.1 Informante 2 – bairro de Parada de Taipas ...........................................................10 2.2.2 Informante 3 – bairro do Glicério ...........................................................................10 2.2.3 Informante 4 – bairro do Glicério ...........................................................................10 3. METODOLOGIA ....................................................................................................10 3.0 aspectos teóricos ...........................................................................................................10 3.1 metodologia da entrevista............................................................................................11 3.2 Coleta de Dados ...........................................................................................................13 3.2.1 Contato no bairro de Parada de Taipas .................................................................13 3.2.1 Contato na Largo do Glicério .................................................................................13 3.3 As condições das entrevistas........................................................................................14 3.3.1 Parada de Taipas ......................................................................................................14 3.3.2 Largo do Glicério .....................................................................................................14 4. FENÔMENOS LINGÜÍSTICOS ...................................................................... 15 4.1. aspectos fonêticos........................................................................................................ 15 4.2. aspectos morfossintáticos............................................................................................ 17 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................18 6. REFERÊNCIAS BLIOGRÁFICAS...................................................................19 ANEXOS ..........................................................................................................................20

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R E S U M O

O presente trabalho pretende contribuir para a caracterização do português popular

falado em São Paulo. Para isto, descrevemos alguns fenômenos fonéticos e

morfossintáticos de duas comunidades situadas na região urbana da cidade de São Paulo. A

intenção é ressaltar algumas características do português popular brasileiro que confirme

hipóteses já existentes sobre a variedade hora aqui tratada e outras possam direcionar os

estudos futuros da área.

Para tal intento, foram utilizadas a metodologia qualitativa para a análise da

conversação, e a gravação de inquérito conforme prevê a metodologia já consagrada da

sociolingüística investigativa.

Assim, a partir da transcrição dos inquéritos, iniciou-se uma análise das

condicionantes sociais dos entrevistados e uma análise lingüística de aspectos de suas falas

que revelem elementos do português popular do Brasil, permitindo a elaboração do trabalho

ora pretendido.

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1 INTRODUÇÃO

O objetivo deste trabalho é descrever alguns fenômenos lingüísticos por meio da

análise de fatores sociais e lingüísticos encontrados em inquéritos obtidos a partir da fala de

pessoas com baixa escolaridade e residentes nas regiões mais pobres da cidade de São

Paulo.

Trata-se de um estudo qualitativo, que parte dos pressupostos da teoria

sociolingüística e caracteriza a variedade do português não padrão, a partir de teses já

consagradas da bibliografia da área e levantando hipóteses que fomentem o debate acerca

do tema português popular.

Logo após a introdução, no subitem 1.0, procuramos cenceituar o português

popular do Brasil, criando as bases para desenvolvimento do trabalho. No item 2

apresentamos as características gerais das comunidades estudadas, bem como o perfil social

dos informantes. No item 3 apresentamos a metodologia teórica e a metodologia adotada

para coleta do corpus. No item seguinte descrevemos alguns aspectos fonético-fonológicos

e morfossintáticos presentes no corpus. Em Considerações Finais retomamos parte da

bibliogafia que trata dos fenômenos lingüísticos destacados e tecemos alguns comentários

sobre esses fenômenos.

1.0 O português popular

O Português Popular constitui-se em uma variedade lingüística caracterizada pela

falta do processo de letramento do indivíduo, o que o levaria a adquirir a norma padrão

(standard, nos termos de Labov). Isto significa que esta variedade é definida conforme

parâmetros sócio-culturais, e a escolarização é algo decisivo para caracterizarmos este

estrato. Por não terem imposições sociais para adquirirem a norma padrão, o que é dado no

processo de escolarização, os indivíduos que se valem desta variedade tendem a manter os

costumes lingüísticos aprendidos na fase de aquisição da linguagem, não tendo acesso,

dentre outras coisas, ao processo de reavaliação que os indivíduos letrados possuem, uma

vez praticantes da norma padrão, bem aceita socialmente. Conforme Rodrigues (1987) o

português popular constitui-se em uma variedade pertencente à oralidade.

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Isto implica em considerar que o individuo que pertence a este estrato social não

passa pelos estágios de aquisição da Língua-Padrão, conforme estabelecido por Labov, o

que configura a não existência de várias etapas que o indivíduo passa para alcançar esta

norma, ou seja, nesta modalidade o individuo não adquire um desenvolvimento gradual da

norma adulta, por não haver a comparação com a norma de um individuo escolarizado, não

tendo acesso também a outros níveis de aquisição, tais como a percepção social do seu

modo de falar, as implicações que uma variação estilística poderia proporcionar em relação

à sua inserção social.

Outras implicações da não-aquisição da norma padrão podem ser observadas em

Kato (2000) sobre a gramática adquirida no processo de letramento e o tipo de estruturação

lingüística a que o individuo está exposto uma vez inserido no processo de escolarização.

No português do Brasil, Kato observa que há diferenças fundamentais entre a linguagem

adquirida pelo indivíduo na fala e a linguagem adquirida no processo de letramento. Estas

diferenças são tão relevantes que a autora trabalha com a tese de que a gramática aprendida

pela escrita no Brasil se dá por um processo semelhante a aquisição de L2 (ou seja, de uma

língua estrangeira, uma língua diferente da materna), devido, sobretudo, às diferenças

sintáticas às quais a língua escrita está estruturada em detrimento da linguagem oral.

Uma explicação de cunho diacrônico para este fenômeno se dá pelo fato do

Português Vernacular Brasileiro ter sofrido um processo de pidgnização, creoulização e

descreoulização, o que ajudou a distanciar-se do Português europeu.

Outro aspecto estrutural que é evidenciado por Kato com relação à aquisição da

escrita, é a influência que esta gera na fala, pois os processos de transformação da

linguagem oral do letrado se daria da seguinte forma:

Fala1 → Escrita 1 → Escrita 2 → Fala 2

Este esquema prevê que o indivíduo primeiramente, ao iniciar sua aprendizagem da

escrita, levaria a esta a estrutura de sua fala, assim a escrita seria, em um primeiro estágio,

representação fiel da fala. Conforme o indivíduo fosse adquirindo a norma padrão para a

escrita, o processo então se inverteria: ele começaria a levar influências estruturais,

sintáticas, morfológicas e até dialetais de sua norma escrita recém adquirida para a fala,

devido até mesmo as imposições sociais.

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Deste modo, é possível perceber como se configuram ambos os estratos lingüísticos

dos indivíduos letrados e dos que tiveram o processo de escolarização interrompido, ou até

mesmo nulo, configurando assim o que convencionamos chamar de Português Padrão e

Português Popular do Brasil.

2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS COMUNIDADES ESTUDADAS

2.0 – Parada de Taipas

O bairro de Parada de Taipas pertence ao subdistrito do Jaraguá, sendo este último

atendido pela subprefeitura de Pirituba/ Jaraguá. Assim, a história de Parada de Taipas está

ligada à história destes outros dois bairros, mais populosos e desenvolvidos.

O Bairro de Pirituba teve origem no século XIX, com as grandes Fazendas de café,

sendo as principais a fazenda Barreto, de propriedade do médico paulistano Luiz Pereira

Barreto, a Fazenda do brigadeiro Tobias e a Fazenda Jaraguá. A estação de Pirituba deve-se

a necessidade de se receber o carregamento de café que se destinavam ao porto de Santos.

É interessante observar que Pirituba resulta do nome de " Piri", que significa vegetação de

brejo e com o aumentativo "Tuba", que na língua tupi significa" muito".

Com a decadência das fazendas cafeeiras e a morte do seu proprietário em 1922, a

Fazenda Barreto foi dividida entre seus herdeiros; a fazenda foi loteada e, a partir de então

surgiram vilas que se desenvolveram ao lado de seu núcleo inicial.

Posteriormente, o loteamento do restante da fazenda Barreto deu lugar às novas

vilas, dentre elas Vila Bonilha, Vila Zatt, Vila Mirante e Jardim S.José.

Sendo que Pirituba é um dos bairros mais populosos de São Paulo, com 31,84 km2,

e com uma população de aproximadamente 350 mil habitantes, está localizado na zona

Oeste e 13km da Praça da Sé. O território de Pirituba , limita-se ao sul com as margens do

Rio Tietê, ao norte com Jaraguá e Perus, a leste com o distrito da Freguesia do Ó e a oeste

com a Via Anhanguera.

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O Bairro de Parada de Taipas situa-se entre Pirituba e Jaraguá. Trata-se, de acordo

com dados do IBGE, de uma das regiões mais pobres do Brasil, sendo que a renda per

capita nessa região chega a ser dez vezes menor do que a de bairros como Morumbi.

Embora faltem informações detalhadas sobre a região, já que a subprefeitura de

Pirituba/ Jaraguá diz ter perdido1 na última mudança de prédio todos os documentos

históricos sobre o bairro de Taipas, trata-se de uma região de favela.

Evidentemente os moradores não se identificam como favelados, mas em toda a

região, mesmo bem próximo ao trecho considerado central – Largo da Parada de Taipas – ,

observa-se a presença de barracos.

A região conta com escolas públicas, um hospital, farmácias, um EMEI, um posto

de saúde no qual, segundo os moradores da região, enfermeiras atuam como médicos,

examinando e medicando pacientes.

Há rede elétrica e rede de água e esgoto, mas adentrando os bairros observa-se

esgotos a céu aberto, córregos que transbordam em dias chuvosos, diversas ruas não

pavimentadas e sem iluminação.

Segundo a informante 1 (Ane Angeli da Silva), o transporte na região é precário -

a população é atendida pelo serviço de lotações-, há poucas linhas na região e cada linha

conta com poucos veículos;

A informante aponta, ainda, a precariedade dos postos de saúde, mas enfatiza que a

região é atendida por dois hospitais públicos – Hospital Geral de Taipas e Hospital de

Perus2. Constata-se a ausência de EMEIs e creches na região.

2.1 – Largo do Glicério

1 Em visita à subprefeitura de Pirituba/ Jaraguá ( R. Luis Carneiro, 109), conversamos com a sra. Célia, assistente social, e ela nos informou que todos os documentos referentes ao histórico dos bairros desapareceram na última mudança de prédio. 2 O hospital de Perus visa atender os moradores do bairro de Perus, cuja administração é realizada pela subprefeitura Perus.

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O Largo do Glicério é uma área acimentada limitada pelo viaduto do Glicério (que

dá acesso à Radial Leste), pelos prédios de uma igreja evangélica e de orgãos

governamentais, um albergue e um conjunto habitacional, e está situado entre os bairros da

liberdade, Cambuci e Centro. É um lugar de passagem, principalmente de automóveis.

A organização de edifícios institucionais e os viadutos recortam esse plano,

impedindo a integração do fluxo urbano residencial convencional. Toda a região foi

urbanisticamente desconfigurada, o que afastou investimentos imobiliários e atraiu uma

grande massa de população carente e sem-teto. Nesta Região encontra-se a maior

concentração de entidades assistencialistas (albergues, centros comunitários, igrejas) da

cidade. Assim, percebemos que é um lugar onde grandes investimentos em circulação

resultaram num espaço onde a cidade formal não chega, dando margem à ocupação dessa

área residual por moradores de rua. A população que está na área é composta basicamente

por alberguistas e pelos moradores de rua.

O largo situa-se nos limites de diversos planos de intervenções localizadas de

revitalização da área central, como a Operação Urbana Centro, sem que essas iniciativas

tenham conseguido reorientar a ocupação da região. Ele também se localiza logo abaixo do

perímetro previsto para a área de implantação do projeto SP Tower.

Nesta região se sobrepõem a construção de grandes vias expressas, com a conseqüente falta

de investimento e ocupação informal. Isolada pelos viadutos, não pode também ser

integrada aos recentes projetos das subprefeituras regionais de desenvolvimento em grande

escala da Zona Leste. Uma situação que demanda proposições voltadas para a

reconfiguração de áreas adjacentes às vias expressas e, sobretudo, para novas formas de

ocupação de populações sem-teto.

É neste cenário que se encontra, logo abaixo do viaduto Glicério, uma cooperativa

de reciclagem de lixo originalmente organizada pelos carroceiros e catadores de papel do

local em parceria e orientação dos padres franciscanos e a pastoral do colégio Marista

Nossa Senhora da Gloria, um dos núcleos que desenvolve projetos sociais na região. No

espaço situado logo abaixo do viaduto do Glicério, por meio do esforço em conjunto, foi

possível construir um local para o armazenamento e administração do material reciclável,

recolhido pelos carroceiros. Esta cooperativa funciona ao lado do albergue público

municipal.

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Devido a todas estas características, a região é fortemente discriminada e

marginalizada. A criminalidade ali também é alta, tornando o lugar funcional, somente

utilizado como passagem entre duas regiões da cidade. Esta característica tambémculminou

por gerar grande descaso na região por parte da administração pública, cenário este que

tende mudar aos poucos devido aos recentes projetos da prefeitura, que prevê até mesmo

investimentos culturais para o local.

A referida cooperativa de reciclagem de material é administrada pelos próprios

catadores de papel, sendo um deles, Fausto Mariano (o informante no. 3). No entanto, este

cenário tende a mudar, pois a prefeitura descobriu que a cooperativa está rendendo lucros

significativos e por funcionar em área publica, está propondo projetos de intervenção e

administração do movimento de coleta de materiais recicláveis, o que seria bastante ruim

para os catadores de modo geral devido ao fato de diminuir consideravelmente os ganhos

destes trabalhadores. Isto está gerando um movimento contrário de resistência por parte

destes trabalhadores no sentido de não deixar a cooperativa ser administrada pela

prefeitura.

Esta cooperativa possui a característica de dar empregos a pessoas que normalmente

não correspondem ao perfil dos trabalhadores regulares, que possuem carteira assinada e

uma especialidades a ser exercida profissionalmente. São, em geral, migrantes do interior

do estado e do nordeste, ex-moradores de rua, ex-presidiários que, em geral, possuem baixa

escolaridade, o que culmina por excluí-los do mercado de trabalho formal. Assim, esta

cooperativa tem sido um grande projeto de inserção social da região, em boa parte, graças

às entidades católicas que auxiliou este grupo no processo de organização de uma

cooperativa, direcionando estes trabalhadores a uma capacitação profissional (como um

bom exemplo, os cursos do SEBRAP) que naturalmente não teriam acesso.

2.2 - Perfil dos informantes

2.2.0 – Informantes 1 - Bairro de Parada de Taipas

A informante Ani Angeli da Silva tem trinta anos, é solteira, tem três filhos, natural

de São Paulo-SP, cursou até a 4a.série primária e trabalha como costureira.3

3 A ficha completa contendo dados da informantes apresentamos no anexo (A)

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2.2.1 – Informante 2 – Bairro de Parada de Taipas

A informante Ariane da Silva tem 15 anos, é solteira, natural da cidade de São

Paulo, cursou até a 7ª série do ensino fundamental II, não tem filhos e trabalha cuidando

dos irmãos e casa.

2.2.2 - Informante 3 – Largo do Glicério

O informante Fausto Mariano tem 23 anos, seu estado civil é solteiro, no entanto

reside com sua companheira há cerca de três anos. Cursou até a 5a série do ensino

fundamental II, etapa esta do ensino que se encontra incompleta. Possui uma filha e ajuda a

criar outros dois filhos de sua companheira. É ex-presidiário, tendo cumprido pena de dois

anos por furto. Começou a trabalhar na cooperativa de reciclagem de lixo do Glicério como

carroceiro (catador de papel) e atualmente trabalha na parte administrativa. Reside no

município de Poá, em uma casa de três cômodos alugada.

2.2.3 - Informante 4 – Largo do Glicério

O informante José Antero Souza tem 38 anos, é casado, tem dois filhos, é residente

do município de Farraz de Vasconcellos, em um conjunto habitacional (COHAB). Estudou

até a 3a série do ensino fundamental I e também é ex-presidiário, tendo cumprido pena de

um ano na FEBEM (Fundação para o Bem Estar do Menor) e mais 3 anos em penitenciária

do interior. Trabalha como carroceiro (catador de papel) na cooperativa de reciclagem da

Baixada do Glicério.

3 METODOLOGIA

3.0 - Aspectos teóricos

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O método de análise dos dados em sociolingüística prevê principalmente a aplicação

de duas abordagens: i) a quantitativa, que leva em consideração análises de quantidades de

ocorrências de determinados fenômenos estabelecidos por porcentagens e pesos relativos

para o uso em análises contrastivas, e; ii) a qualitativa, que leva em consideração a análise

dos fenômenos por si próprios, suas particularidades e o peso que a ocorrência destes

determinados fenômenos têm na comunidade e na realidade social ao qual os indivíduos

estão expostos.

Deste modo, observa Schiffrin (1987) que essa divisão, na verdade, não deveria

acontecer, pois ambas as abordagens são complementares e devem funcionar em conjunto,

pois a análise qualitativa especifica aspectos dos fenômenos estudado atribuindo, assim,

maior peso às hipóteses levantadas a partir da análise, pois somente uma abordagem

quantitativa por vezes tende a ser vaga. De modo semelhante, uma abordagem somente

qualitativa tende a ser vaga, quanto ao alicerce que constituirá a análise pontual que esta

proporciona. No entanto, para este trabalho, utilizaremos uma abordagem apenas

qualitativa, pelo fato de estarmos tratando de elementos canônicos na literatura da área ora

abordada, ou seja, por estarmos trabalhando com idéias já consensuais na área da

sociolingüística do Português Brasileiro Vernacular.

3.1 - Metodologia da entrevista e transcrição

Os relatos de experiências colhidos na cidade de São Paulo têm em média duração

de cerca de 45 (quarenta e cinco) minutos e foram gravados em fita cassete, por meio de

gravador da marca SONY e com o auxílio de microfone de lapela.

Para condução eficaz da entrevista, elaboramos um roteiro prévio, o qual deveria

ser abandonado tão logo o informante se sentisse a vontade para relatar suas experiências

pessoais. Essa decisão visou o afastamento de realizações lingüísticas pouco naturais, bem

como de respostas elípticas ou ecóicas, como se observa quando se faz uso de questionário.

Solicitamos aos informantes que relatassem fatos referentes a sua profissão, escola,

problemas inerentes ao bairro, história de vida.

Algumas perguntas realizadas no início da entrevista com a informante 2 foram

repetidas no final. Esta decisão visou fugir de realizações lingüísticas pouco naturais, já que

a informante mostrou-se desconfortável no início da entrevista.

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Convém dizer, ainda, que neste tipo de seqüência conversacional (entrevista) há

sempre prejuízo da espontaneidade, entretanto, as marcas de inferência na conversação

analisada, evidenciam que a conversação foi sustentada pela compreensão mútua e

cooperação.

Promovemos a transcrição do texto integral dos relatos colhidos, ou seja,

transcrevemos aproximadamente 45 minutos de conversação.

Para transcrição utilizamos o modelo adotado pelo Projeto Filologia Bandeirante,

conforme sugeridas por RODRIGUES e FERREIRA NETO (1.999), com as alterações ou

acomodações discriminadas abaixo:4

a) grafamos a fala dos entrevistadores de acordo com a ortografia tradicional, ou seja, não

representamos os fenômenos fonético realizados e optamos por não indicar ênfase na

fala dos documentadores, assim, em início de frases, siglas e nomes próprios utilizamos

letra maiúscula. Ignoramos, ainda, na fala do documentador, os prolongamentos de

vogais, não grafamos fonemas repetidos e indicamos o truncamento de palavras como

proposto pela norma de transcrição adotada;

b) Os fáticos foram excluídos da fala do documentador;

c) Algumas vezes fazemos uso de vírgula para marcar pausas sintáticas;

d) Com exceção das acima descritas, todas as demais indicações para transcrição de fala

foram aplicadas à fala do entrevistador;

e) Na fala do informante as letras maiúsculas indicam ênfase, assim siglas e nomes

próprios são grafados com minúscula;

f) marcou-se, na fala do informante apenas as ênfases de maior relevância para o sentido

geral do texto;

g) o ponto de interrogação foi usado para marcar frases interrogativas e imediatamente

após marcadores conversacionais realizados com curva entonacional ascendente;

h) o alongamento de fonemas foi indicado por : :: logo após o fonema alongado;

i) ( ) indica a não compreensão de determinadas palavras/ frases realizadas pelo

informante ou pelo documentador;

É importante observar que as entrevistas 1 e 2, bairro Parada de Taipas, foram

realizadas, observadas e transcritas pela documentadora Hosana dos Santos Silva; as

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entrevistas 3 e 4, bairro do Glicério, foram realizadas, observadas e transcritas pelo

entrevistador Arnaldo Rebello Camargo Junior.

3.2 - Coleta de Dados

3.2.0 – Contato no bairro de Parada de Taipas

O contato com os informantes do bairro de Parada de Taipas foi feito através da

igreja Comunidade Evangélica Shalon, situada na Av. Raimundo Pereira de Magalhães, em

Taipas. As informantes freqüentam as reuniões e foram indicadas por outros membros da

igreja, quando perguntamos a alguns membros se havia na comunidade pais de

adolescentes.

Foram indicados três pais de adolescentes, entretanto dois foram desqualificados por

não preencher os requisitos iniciais, quais sejam, serem nascidos e criados na cidade de São

Paulo, pertencerem as duas faixas etárias – 15 a 20 anos (informante mais jovem) e 30 anos

em diante (informante mais velho).

Por ocasião do contato com a informante 1, no final de novembro de 2.005, fomos

informados de que sua filha adolescente tinha 14 anos e que completaria 15 anos em

janeiro de 2.006, assim, procedemos a entrevista com a segunda informante somente no

mês de Janeiro/2006, para que houvesse tempo para que a informante completasse 15 anos.

Assim, o corpus começou a ser coletado em dezembro de 2005 (ficha social) e só

teve sua conclusão em Janeiro de 2006.

Os informantes responderam a Ficha Social (anexo A), na qual consta dados

pessoais, financeiros e sociais sobre os informantes.

3.2.1 – Contato no Largo do Glicério

O contato com a cooperativa de reciclagem de lixo da baixada do Glicério foi

possível pelo intermédio de uma assistente da pastoral do colégio Marista Nossa Senhora

da Glória, que desenvolve um trabalho social na região e, especificamente, com os

trabalhadores desta cooperativa. Este contato facilitou bastante a interação e coleta de

4 A lista completa das normas para transcrição que alteram ou complementam o texto de RODRIGUES e

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dados junto ao grupo, pois a pastoral do colégio goza de grande confiança por parte da

comunidade.

Foram indicados para a realização da entrevista dois informantes: o primeiro

(informante 3) cuja entrevista encontra-se transcrita no anexo deste trabalho, contava com

23 anos quando da realização da entrevista (que se deu em outubro de 2005), e o segundo

informante, de 38 anos, ambos moradores da grande São Paulo. Constatou-se ainda que na

comunidade da cooperativa de reciclagem do Glicério, praticamente não havia

trabalhadores que morassem ali na região: a grande maioria reside na periferia da Zona

Leste ou em cidades vizinhas, da grande São Paulo.

3.3 - As condições das entrevistas

3.3.0 – Parada de Taipas

A entrevistas com a informante 1 foi realizada em 03 de janeiro de 2.006 e a

entrevista com a informante 2 foi realizada em 10 de janeiro de 2.006. Ambas as entrevistas

foram realizadas na cozinha da casa das informantes, sendo que a informante 1 encontrava-

se sozinha no dia da entrevista, já a informante dois estava acompanhada da mãe e dois

irmãos (6 anos e um ano), que esperaram no quarto ao lado enquanto a conversa se

desenrolava.

O irmão da informante (2) entrou na cozinha algumas vezes, olhou o gravador, mas

não chegou a interromper a entrevista.

Durante a gravação da entrevista com a informante (1) houve apenas uma

interrupção: a informante recebeu a visita de seu irmão, mas apenas cumprimentou-o, não

alterando o andamento da entrevista.

A casa das informantes situa-se em um terreno em declive, com mais três casas

construídas no mesmo terreno. Na casa há dois quartos, uma cozinha e um banheiro e deve

contar com aproximadamente 45m2.5

3.3.1 – Largo do Glicério

FERREIRA NETO segue como anexo (c) .

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A entrevista foi realizada no escritório da cooperativa, que na verdade, como eles

próprios chamam, um box construído por eles para esta finalidade. A cooperativa, para

alguns dos trabalhadores, funciona como se fosse uma segunda casa, pois muitos deles

residem longe do local, o que por vezes faz com que a locomoção do trabalho para casa (e

vice-versa) seja bastante complicado.

Deste modo, os informantes deram entrevista no próprio local, em um sábado,

quando estes estavam confraternizando-se após o trabalho, o que gerou um ambiente

bastante descontraído, favorecendo a espontaneidade da entrevista, tornando assim a

linguagem dos entrevistados bastante informal e não sujeita a contaminação de influencias

e fatores externos, de constrangimento ou outro tipo de elemento que tornasse a linguagem

dos indivíduos artificial, quanto à articulação usual e cotidiana.

Na realização das entrevistas não houve nenhum elemento externo que pudesse

compromete-las. Nenhuma interrupção aconteceu, e os informantes se sentiram bastante à

vontade para falar, o que facilitou bastante o trabalho, gerando assim muitos dados

significativos para a análise ora descrita.

4 FENÔMENOS LINGÜÍSTICOS

A amostra apresentada neste trabalho revelou-se um bom exemplo de algumas

variações já estudadas pelos sociolingüistas brasileiros. Apresentamos alguns exemplos

que auxiliam na reconstrução de parte do universo da variação presente na fala dos

paulistas com baixa escolarização.

4.0 – Aspectos fonéticos

No nível fonético-fonológico, destacam-se a tendência à:

a) monotongação dos ditongos decrescentes [ey] e [ow]

Inf 1 – “mas nunca tinha visto o que que era uma máquina industrial... e resolvi ser

custurera...”

Inf 2 – “que ela não dexa eu fazer as coisas que eu quero...”

5 no anexo (a) apresentamos ficha financeira e social completa dos informantes.

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Inf 3 – “falei é o seguinte, eu num tô fazendo nada, num tô robando ninguém, num tô

matando ninguém”

b) a alternância entre as [l] e [r] e a queda de [r] nos grupos consonantais

(problema/poblema);

Inf 1 – “pra sustentá uma casa... cum filhos... já tava difícil... aí veio mais uma...

compricou mais...”

Inf 2 – “se eu já tive otro pobrema? teve um dia que eu não fui ca camiseta... da

escola e eles me levaram lá pa diretoria...”

c) a queda do [r] pós vocálico, principalmente em infinitos (qualquer/qualquer;

costurar/costurá);

Inf 1 – “é eu go/ eu converso bastante né? Todo mundo fala que eu sou

conversadeira... faLaNte mesmo... e eu se eu tô num lugar eu num to muito afim de

conversá...”

Inf 2 – “ah: :: namorá a gente fica... a gente se vê todo dia... e ficá a gente só fica um

dia e amanhã a gente não se fala...”

Inf 3 – “Me mandá lá pro Jabari, numa usina. Uma usina coisa disativada lá há muitos

anos, um galpãozão lá enorme, o espaço é enorme, tem cinco galpão.”

d) a supressão de /d/ na seqüência -ndo (correndo/correno);

Inf 1 – “é um serviço braçal... mas eu gosto de fazê... eu não tô trabalhano nisso...”

Inf 2 – “na casa da minha avó? ... uma história que tenha acontecido... é eu tava

brincano cas minhas amigas...”

Inf 3 – “começamo a namorá, uns dois meis nóis tava morano junto já, a gente nem/

sem percebê...”

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e) a redução variável da preposição para (para, pra e pa);

Inf 1 – “e: :: lá:: pegá uma outra perua que sobe pa /pra avenida itaberaba que é

próximo da onde eu trabalho”

Inf 2 – “que eu/ que ela achou que eu não queria ir MAis... pa escola e ela me tirô”

Inf 3 – “um com o próprio emerson. por que que ele foi embora daqui? é, porque ele,

ó, ele foi robado aqui aí ele caiu pa rua...”

4.1 – aspectos morfossintáticos

No nível morfossintático, observa-se a presença de um conjunto significativo de

fenômenos. Destacam-se:

a) a variação de concordância no sintagma nominal

Inf 1 – “é o meu quarto... é a minha casa... é as minhas coisa... ((rindo)) vou te que

apren/ muitas vezes ele me corrige né?”

Inf 2 –“ falaram que...é: :: que as menina pegaram o boné do menino... e falaram

que fui eu... aí elas tinham que i pa diretoria e elas foram junto tamém...”

Inf 3 – “aí fizemo a revisão separamo as coisa minha aí...”

b) a variação de concordância entre verbo e sujeito Inf 1 – “eles qué um mínimo de produção e o mínimo de produção tem que tê... no

mínimo cinco máquinas.”

Inf 2 – “ai eles de vez em quando apronta e coloca a...a culpa nas outras

pessoas...”

Inf 3 – “foram conversá e eles virum que ali eles ia pô a mão onde num devia”

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c) emprego do pronome lexical (ele /ela) em lugar do clítico acusativo de

terceira pessoa 6

Inf 1 – “o pai ele vê como um: :: passeio... ( que nem ) o pai dele geralmente

sempre foi muito RÍgido... mas como vê ele só de vez em quando”

Inf 2 – “ah! num vejo ele muito...”

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foi possível constatar a partir da análise dos inquéritos obtidos de falantes com

baixa escolarização, alguns elementos que identificam a variedade popular do português

brasileiro, que é caracterizado sobretudo por não ser influenciada pelo fator escolaridade,

que no Brasil se torna algo muito importante, devido ao fato da modalidade falada e escrita

se distanciarem cada vez mais em sua estrutura pelos motivos já detalhados na seção 2.

Percebe-se que os fenômenos lingüísticos fonéticos-fonológicos tais como

monotongação dos ditongos decrescentes [ey] e [ow], alternância entre as [l] e [r] e a

queda de [r] nos grupos consonantais, queda do [r] pós vocálico, supressão de /d/ na

seqüência -ndo, redução variável da preposição para (para, pra e pa); ou morfossintáticos

tais quais a variação de concordância no sintagma nominal e a variação de concordância

entre verbo e sujeito estão presentes variedade popular do português brasileiro como

comprovam os estudos de Rodrigues(1987) sobre a concordância verbal, ou ainda os

estudos de Duarte (1989), Câmara Junior (1972) e Nunes (1996) acerca de questões tais

como o preenchimento do objeto direto, a função dos clíticos acusativos e usos do pronome

tônico na variedade popular do português brasileiro.

Os aspectos lingüísticos aqui destacados podem direcionar as futuras pesquisas

sobre o português vernacular do Brasil, uma vez que há diversas hipóteses que se tornam

consensuais entre diversos autores tais como os citados neste texto.

6 no PB popular houve uma profunda mudança no paradigma de terceira pessoa, enfraquecendo a função dêitica do pronome ele, reforçado pelo aspecto de concordância desinencial de pessoa e número que o referido

Page 19: Amostra do Português Popular

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6 BIBLIOGRAFIA

CAMARA JR., J. M. A História e Estrutura da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, 1985. Padrão

Livraria Editora.

DUARTE, Maria Eugenia Lamoglia Clítico acusativo, Pronome Lexical e Categoria Vazia no

Português do Brasil. in. Fotografias Sociolingüísticas. Fernando Tarallo (org.) Campinas, SP.

Pontes: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1989

FERNANDEZ, f. m. Metodologia Sociolingüística. Madrid, 1990. Gredos.

FERREIRA NETTO, W. Introdução à Fonologia da Língua Portuguesa. São Paulo, 2001. Hedra.

LABOV, W. Stages in the Acquisition of Standard English. In SHUY, R. (ed.) Social Dialects and

Language Learning. The National council of Teachers of English. Trad. Estágios na Aquisição do

Inglês Padrão. In. Fonseca, M. S. V. e Neves, M. F. (orgs). Sociolingüística. Rio de Janeiro, 1974.

Eldorado, p. 49-85.

ROBERTS, I & KATO, M. A. Português Brasileiro: Uma viagem diacrônica. Campinas, SP: Ed.

da UNICAMP, 1996.

RODRIGUES, A. C. S (1987) A concordância Verbal no Português Popular em São Paulo. São

Paulo: USP. Tese de Doutoramento

RODRIGUES, A. C. S. & FERREIRA NETTO, W (2000) Transcrição de inquéritos: problemas e

sugestões. In. MEGALE, H (org.) (2000) Filologia Bandeirante: Estudos 1. São Paulo, Humanitas,

FFLCH/USP, p. 171-193.

SCHIFFRIN, D Discovering the context of na utterance. Linguistics, 25, 11-32, 1987

TARALLO, Fernando A Pesquisa Sociolingüística. São Paulo, 2004. Ed. Ática. 7a. edição

pronome comporta, como é consensual em vários autores que trataram do assunto.

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Anexo A - Identificação do informante a) INFORMANTE 1 – FAIXA ETÁRIA 30 ANOS EM DIANTE 1- Identificação Nome: Ani Angeli da Silva Sexo: feminino Idade: 30 anos Cor: Branca Estado civil: Solteira Nacionalidade: Brasileira Naturalidade: São Paulo, SP Profissão: Costureira 1 - Dependentes A informante tem 03 filhos:

Arianne da Silva,15; natural da cidade de São Paulo; escolaridade correspondente a 6º série do ensino fundamental II; Jhonatan Machado, 06; natural da cidade de São Paulo; não escolarizado; Iasmim Machado, 01; natural da cidade de São Paulo.

Obs.: Nenhum dos filhos freqüentou escola no ano de 2.005; 3 - Filiação Mãe: Albertina da Silva, 47 anos, natural do Estado do Paraná, ensino fundamental I completo; costureira Pai: Paulo Pereira, falecido, natural do Estado de São Paulo, ensino fundamental II completo. 4 - Escolaridade A informante tem ensino fundamental I completo – 4º série do primeiro grau Realizou o ensino fundamental em diversas escolas públicas e internatos, concluindo seu estudo em uma escola pública situada no bairro da Vila Miriam, Zona Oeste de São Paulo. Estudou sempre em período diurno. 5 - Situação financeira Renda mensal familiar – R$ 700,00, sendo R$350,00 referente ao salário mensal e R$350,00 referente a pensão alimentícia oferecida pelo pai aos dois filhos mais novos. A informante não tem casa própria e paga aluguel no valor de R$300,00 por mês; No total, quatro pessoas são sustentadas por essa renda.

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6 - Descrição dos bens Possui geladeira simples; aparelho de som; dois televisores; uma lavadora de roupas, um aparelho de rádio; um aparelho de DVD; um celular. Não há telefones fixos na residência. A casa contém três cômodos e um banheiro, sendo dois cômodos utilizados como dormitório e um cômodo utilizado como cozinha; A informante não mantém empregados, sendo que os filhos mais novos permanecem sob os cuidados da filha mais velha enquanto a informante trabalha; A informante não possui carro, não possui computadores, nunca acessou a Internet. 7 - Outros dados sobre a informante A informante sempre viveu no estado de São Paulo; por algum tempo morou em colégio interno e foi criada pela avó - até 16 anos , residindo, a maior parte do tempo, no bairro de Pirituba. Há quatro anos a informante reside no bairro de Taipas, Zona Oeste de São Paulo, mas já morou nos bairros de Pirituba, Jardim Rincão, Jardim Rodrigo, Carapicuíba, na cidade de Barueri, dentre outros. b) INFORMANTE 2 – FAIXA ETÁRIA 15 A 20 ANOS 1 - Identificação Nome: Ariane da Silva Sexo: feminino Idade: 15 anos Cor: Branca Estado civil: Solteira Nacionalidade: Brasileira Naturalidade: São Paulo, SP Profissão: estudante 2 - Dependentes A informante não tem dependentes; 3 - Filiação Mãe: Ani Angeli da Silva, 30 anos, natural do Estado de São Paulo, ensino fundamental I completo; costureira Pai: Roberto dos Luis Santos, natural do Estado de São Paulo, ensino fundamental I completo. 4 - Escolaridade A informante tem ensino a 6ª série do ensino fundamental, iniciou a 7ª série, mas não freqüentou a escola no ano de 2005, pois teve que deixar a escola por decisão da mãe.

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Realizou o ensino fundamental em diversas escolas públicas, concluindo o ensino fundamental I em um escola pública situada no bairro da Taipas, Zona Oeste de São Paulo. Atualmente está matriculada na Escola Estadual Humberto...., na 7ª série do Ensino Fundamental, no período diurno. 5 – Dados financeiros Renda mensal familiar – R$ 700,00, sendo R$350,00 referente ao salário mensal da mãe e R$350,00 referente a pensão alimentícia oferecida pelo pai dos irmãos mais novos. A informante não tem casa própria, reside em casa alugada no valor de R$300,00 por mês; No total, quatro pessoas são sustentadas por essa renda. 6 - Descrição dos bens Possui geladeira simples; aparelho de som; dois televisores; uma lavadora de roupas, um aparelho de rádio; um aparelho de DVD; um celular. Não há telefones fixos na residência. A casa contém três cômodos e um banheiro, sendo dois cômodos utilizados como dormitório e um cômodo utilizado como cozinha; A informante não mantém empregados, sendo que os filhos mais novos permanecem sob os cuidados da filha mais velha enquanto a informante trabalha; A informante não possui carro, não possui computadores, já acessou a Internet na escola. 7 - Outros dados sobre a informante A informante sempre viveu no estado de São Paulo; segundo a mãe a informante foi obrigada a deixar a escola por estar envolvida com alunos que apresentavam má conduta, inclusive uso de drogas. Morou com o pai por cerca de um ano e há quatro anos a informante reside na Parada de Taipas, Zona Oeste de São Paulo, mas já morou nos bairros Jardim Rincão, Jardim Rodrigo, Carapicuíba, na cidade de Barueri, dentre outros. A informante, num primeiro contato, aparenta ter idade mental inferior à idade biológica, entretanto, a família identifica o comportamento da adolescente como “sintomas” de timidez, introspecção. Convém notar que não há qualquer diagnóstico de problema mental, pois a informante jamais se submeteu a tratamento psiquiátrico ou psicológico. c) INFORMANTE 3 – FAIXA ETÁRIA DOS 20 A 30 ANOS 1 - Identificação Nome: Fausto Mariano Sexo: masculino Idade: 23 anos Cor: parda Estado civil: Solteiro

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Nacionalidade: Brasileira Naturalidade: São Paulo, SP Profissão: catador de papel 2 - Dependentes 1 filha e dois enteados. 4 - Escolaridade O informante estudou até a 5ª série do ensino fundamental II, não tendo concluído esta etapa. Estudou sempre em escola estadual, no bairro da penha, Zona Leste de São Paulo, onde residia com seus pais na infância. Parou de estudar quando mudou-se para Poá, município da grande São Paulo. 5 – Dados financeiros Renda mensal familiar- Entre R$ 1.000,00 e R$ 1.200,00. O informante é a única fonte de renda familiar, pois sua companheira não trabalha e seus filhos são muito novos. 6 - Descrição dos bens Possui geladeira, aparelho de som, um televisor, uma lavadora de roupas, um vídeo-game e um celular. Não há telefones fixos na residência. A casa contém três cômodos e um banheiro, sendo um cômodo utilizados como dormitório, outro como sala e um cômodo utilizado para cozinha. O informante não mantém empregados, sendo que os filhos mais novos permanecem sob os cuidados da mãe. A informante não possui carro, não possui computadores, já acessou a Internet na escola. 7 - Outros dados sobre a informante

O informante residiu até os 13 anos no bairro da Penha, Zona Leste de São Paulo, tendo se mudado para o município de Poá, na Grande São Paulo, onde reside até hoje. Teve problemas leves com drogas e furto, no entanto foram problemas pontuais, de uma determinada época da vida do informante. Atualmente, ele se encontra plenamente recuperado e tem consciência das possíveis causas destes problemas pelos quais passou. Preocupa-se muito com o futuro da filha e dos enteados, e procura conscientiza-los quanto a importância do estudo, devido ao fato de acreditar que estudar mantém as pessoas longe dos problemas.

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ANEXO (B) – TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS

4.1 – Transcrição da entrevista 4.1.1 – Entrevista 1 - Informante 1

Doc. – Acho que agora foi... acho que a parte branca já foi agora da fita deve gravar agora...

vamos lá... eu acho que agora vai dar certo...você... é bom é eu não posso esconder de você

que é uma entrevista, né? eu não sei como você vai se sentir porque geralmente o pessoal

não gosta muito dessa história de fazer entrevista.

Inf – bom...eu não sei nem como eu vou me sentir porque é minha primeira entrevista, eu

nunca dei entrevista ((rindo))...então vamo vê.

Doc. – Mas você gosta de falar?

Inf – é eu go/ eu converso bastante né? Todo mundo fala que eu sou conversadeira...

faLaNte mesmo... e eu se eu tô num lugar eu num to muito afim de conversá... você

pergunta alguma coisa eu respondo e pronto...agora se eu tivé afim de conversá você

conhece a minha vida inteira... e a pessoa... eu acabo conhecendo a dela também... então

depende do astral ((rindo))

Doc. – ((rindo)) EU espero que hoje seu astral esteja bom então

Inf – falante? vamo vê (rindo)

Doc. – olha, bom, primeiro eu quero saber dos dados sobre você... quantos anos... sua

faMÌlia né? o que você tiver pra falar para eu te conhecer um pouquinho também

Inf – bom...eu acabei de completá trinta anos

Doc. – Acabou de completar?

Page 25: Amostra do Português Popular

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Inf – é... entrei na casa dos trinta (( rindo))... é:... tenho três filhos... é::... moro com eles...

só eu e meus filhos no momento... vou me casá brevemente... moro próxima de todos os

meus parentes... eles moram tudo próximo de mim... sou custureira... é... eu acho que é isso

Doc. – Já deu bastante informação né? Então me fala um pouquinho... primeiro dos seus

filhos... qual a idade... como é que eles são?

Inf – bom... a minha mais velha tem catorze anos já (é uma moçona)...maior que eu... quem

vê na rua assim nem fala que é minha filha... pergunta se é minha irmã de tão grande que

ela é ((rindo)).

Doc. – Ca/ catorze ANOS...você está com trinta... você teve filho super nova?

Inf – tive ela com dezesseis anos... também era meu sonho tê uma filha mulher né? na

época eu era muito louca pra ser mãe logo... e pra ter uma filha mulher... e realmente veio

certinho...uma menina... que era meu sonho na época

Doc. – Atrapalhou sua adolescência?

Inf – é eu acho que fui muito imatura né? de ter filho muito CEdo...amadureci na MArra...

não TIve adolescência POR causa disso... realmente... se eu falá pa/pra você que não

atrapalhou... que não interferiu no meu amadurecimento eu tô mentindo...realmente... mas

assim...eu costumo não si arrependê do que já tá feito... eu tenho que tentá me arrepende do

que não dá/ainda dá pra deixá de fazê... então do/das minhas experiências ruins eu tento

tirá: algum aproveito delas...tava aí... já tinha feito... já tinha nascido não tinha volta né? o

negócio era criá...e:: eu tentei fazê da melhor maneira possível... e:: vendo hoje em dia eu

acho que... que eu criei ela bem...ela teve uma boa educação

Doc. – E ela está estudando?

Inf – ta... ela tá na sétima série

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Doc. – Que bom né? Já é uma moça mesmo... e os outros? Você disse que tem três né?

Inf – isso... aí eu tenho mais um minino di:: di seis anos... e tenho uma/a pequenininha que

vai fazê dois agora em fevereiro

Doc. – todas as faixas você tem então? ((rindo))

Inf – (rindo) é... pra ajudar né? quando eu tivé saindo da adolescência de um... já tá

entrando o próximo e assim em diante...tô lascada né? ((rindo)) preocupação por muito

TEMpo...muito cabelo branco que num tá pouco já aos trinta...imagina mais tarde ((rindo))

Doc. – E::: e e você? Você é costureira... você sempre foi costureira?

Inf – não... eu não fui sempre custureira...eu já trabalhei di tudo...já trabalhei di

doMÉstica...como diarista... ou por mês...já trabalhei em lanchonete... já trabalhei em

padaria...uma vida assim bem...já:: sofrida digamos né? nunca tive... uma carrera

profissional... então eu... tinha emprego que era o que tava acessível no momento... sem

podê escolhê muito...agora de custurera isso foi uma opção...aí eu posso falá... não foi uma

coisa empurrada pra mim...eu escolhi... eu falei eu quero ser custureira...era o que tava

dentro das minhas condições no momento e: :: fui atrás como funcionava... eu nunca tinha

visto uma máquina de costura na minha vida... a não ser aquela normal né? aquela máquina

reta que a vovó da gente sempre tem ((rindo))... mas nunca tinha visto o que que era uma

máquina industrial... e resolvi ser custurera... fui atrás de como funcionava...o que que

tinha... quanto que ganhava ...o que eu eu precisava... e: :: aí eu resolvi fazê o curso pelo

senai

Doc. – Você fez curso? Que bom

Inf - eu fiz o curso de duas semanas... né? e passei... terminei bem... é: :: eram quinze

dias...no tre/ no décimo terceiro dia eu já tinha terminado todos os módulos... a professora

me dispensô... e: :: no começo...aí eu consegui o meu primeiro emprego foi numa oficina...

praticamente na minha rua... que era um uns saquinhos pra celulares que a gente tinha que

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fazê... nada tão tão compricado... e: :: nem falei que eu não tinha experiência e meti as

cara... no começo eu morria de medo porque é máquina de orveLOque... é uma máquina

que refila o tecido... ela tem um...uma navalha né? tipo um: :: que corta... e fui

conseguindo... tanto é que depois que a gente terminô esse serviço de um /que foi durante

um mês... quando a mulher da oficina me mostrou meu primeiro saquinho eu não acreditei

que era eu que fiz porque ele era horroroso ((rindo))... muito mal feito...

Doc. – Quanto tempo faz isso já Ani?

Inf – ah três anos atrás... três aninhos já...

Doc.– E é bom? Foi boa a mudança? (como foi) você trabalhava como doméstica e depois

passou pra costura? Ou como foi isso?

Inf – bom... eu já tava cansada de trabalhá de doméstica... é um serviço muito puXAdo...

forÇAdo... você num ganha bem...ganha pouco... pra sustentá uma casa... cum filhos... já

tava difícil... aí veio mais uma... compricou mais... e assim na na área de custura eu tive

mais oportunidade... eu num eu num eu tenho uma profissão...eu sou custurera e: :: eu tive

meu primeiro registro em carteira graças a esse curso... minha carteira até... aos vinte e oito

anos ainda era em branco... eu fui tê o primeiro registro de custurera, e aí vê o que que é

trabalha empregada mesmo... com todos os benefícios... porque... como doméstica eu nunca

tive registro né? eu sempre trabalhava... e ganhava salário Mínimo... custurera não digamos

que a gente ganha rios de dinheiro... mas você já TEM uma opção maior... você tem uma

hora extra... não é um salário mínimo... você tem um piso salarial que as firmas são

obrigadas a pagá... você tem benefício de férias... coisa que eu nunca tinha tido na minha

vida... décimo tercero e tudo mais... então... eu acho que tá bem melhor né? e: :: de

doméstica a gente se/ eu assim/eu acho que quase todos/ você se envergonha de falá ah eu

sou doMÈStica... e de custurera num tenho não... eu falo com orgulho...eu sou custurera.

Doc. – Tem vergonha ? Você acha que... isso mas isso é de/ isso é seu ou você acha que

todo mundo que trabalha como... doméstica acaba tenho esse... esse receio... essa vergonha

de falar?

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Inf – Eu acho que todo mundo que trabalha uh: digamos não posso falar cem por cento...

mas a maioria ... mas não... só...é um preconceito meu... é um preconceito da sociedade...

você quando fala que é doméstica... as pessoas já VÊ com preconceito... já te TRAtam

diferente né? então não é da gente... é da sociedade mesmo...a sociedade é assim...

infelizmente... porque ela devia ser considerada uma profissão como qualqué otra... e sê

bem vista como qualqué otra... e não é...no brasil a gente tem muita discriminação...

principalmente di... classe social... então é compricado...

Doc. - E você... você sofreu algum problema como doméstica? Foi humilhada? Teve

problemas ou foi/ trabalhou em lugares bons?

Inf – ((rindo)) eu nunca fui muito sortuda na vida não...eu sou muito azarada pras coisas...

é: ::...eu nunca tive assim...eu tenho só uma patroa que eu tive que eu posso falá que ela foi

muito boa...mas.. as outras de:/ num num foi boa... já já fui muito discrimiNAda... já: ::

sofri humilhação... e: :: é uma pro /profissão muito soFRIda... quando eu desisti de ser

doméstica um dos meus /eu já tava tendo problema de SAÚde que era problema no

PULso... eu tava tendo pobrema de coLUna... eu... tinha crise de bronquite direto... por ta

sempre mexendo na água... então num /foi uma necessidade tamém... de sai dessa

profissão... então eu num num acho legal... têm pessoas que te tratam como: :: uma

profissão normal e têm otras que querem te diminuí... então é compricado... a última que eu

tive não...me tratava como se eu fosse da família...mas aí quando você vai discutir seus

direitos como... como funcionária aí a coisa pega né? ai você já não é mais da

família...você passa a sê só um funcionário né?

Doc.- Você teve problema pra receber nessa última casa que você trabalhou?

Inf - tive pobrema com as minhas férias... ela achava que não tinha que dá as minhas

férias... como eu nunca tinha tido férias... ela tentou digamos que me enrolá... ela... é:: me

deu primeiro oito dias... e os outros doze dias que faltava ela não queria dá... então nessa

daí a gente se desentendeu... e eu acabei saindo... porque eu também não consigo trabalhá

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num ambiente que eu tô magoada com a pessoa...isso é um deFEIto meu...em qualqué

canto... se eu tivé aborrecida eu saio

Doc. - E ai... como costureira que problemas que você já encontrou? Porque dizem que/

porque em todo trabalho tem problema né? Como... como doméstica você te/ tinha esse

problema de ser discriminada muitas vezes não ser bem tratada... e como costureira?

Inf- como custureira você tem que aprendê a trabalha sob pressão...é produção MESmo...

você tem que trabalhá MESmo e::: a maioria dos lugares... noventa por cento não aceita

defeito na sua custura... e assim... é melhor você: :: tê mais trabalho pra fazer CERTO...

pelo menos eu acho né? do que você tê que concertá... digamos que você perde dez vezes

mais o tempo para fazê um concerto na custura...é hoRRÌvel... e aí um concerto nunca fica

como... deveria ser a primeira peça... mas é o negócio é a pressão... a pressão é muito

grande... quanto maior a firma maior a pressão... e é cansaTIvo mesmo... é um serviço

braçal... mas eu gosto de fazê... eu não tô trabalhano nisso... por necessiDAde financeira...

que doméstica eu trabalhava porque eu precisava de um serviço... eu precisava me sustentar

e sustentar meus filhos... eu era obrigada... por falta de OPÇÂO... mais... na na costura

não... eu gosto... apesar de todo o trabalho...a maioria das pessoas que tão nesse ramo... é tá

porque aprendeu cá vó... cá mãe... e ai aprendeu costurá... não sabe fazê outra coisa e tá ali

por por falta de opção... eu não... foi uma opção minha e eu realmente gosto de custurá...

mas a pressão é grande...é... a cobrança de produção é muito grande... mas como eu já

trabalhei em gráfica também uma época... que também é muita produção então pra mim é

normal... eu trabalho bem sobre pressão ((rindo))

Doc. –Ai que bom... hoje a sensação do mercado de trabalho é isso né? É saber trabalhar

sob pressão.

Inf – é uma correria só né? se você faz dez eles querem vinte né? e assim por diante... é

diFÍcil... é cansaTIvo...mas eu prefiro muitas vezes tê muito serviço do que ficá o dia

inteiro enrolando... (eu) acho mais cansativo

Doc.– Essa empresa que você trabalha agora como é que é?

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Inf – (bom) eu tô... no momento num tô trabalhando em empresa grande... já trabalhei...

mas a no momento... por opção... por enquanto né? eu tô trabalhando numa oficina de

custura de bairro

Doc. – E lá você tem registro...tudo direitinho ou não?

Inf – Não não... aí... a:: a questão da oficina é exatamente isso...voCÊ faz seu horário...você

determina as coisas... mas aí você perde 4 né? eu num tenho registro... num tenho férias...

num tenho décimo terceiro... não tenho nada disso... no momento não...

Doc. - E você gosta de trabalhar lá?

Inf –ah eu gosto...a dona de lá é bem tranqüila...não se estressa e::: acaba num estressando

a gente... eu dô... a produção que ela que né ... o serviço você acaba/ por que assi /eu eu

nunca me dei muito bem com chefe em cima de mim né? eu posso ter uma encarreGAda

em cima de mim ((rindo))... eu posso ter uma LÌder em cima de mim ...cobrando

produção... mas se chefe fica em cima de mim eu não consigo trabalhá... na gráfica era a

mesma coisa... então...e lá não...lá ela... já conhece meu serviço... ela me dá eu vô e faço e

pronto... num fica ninguém enchendo o saco né? e ai eu acabo trabalhando bem e fica tudo

bem... eu gosto sim de trabalha lá...

Doc. – E você tem que produzir quanto por dia?

Inf – bom como é uma oficina pequena... e a gente só é em quatro funcionários... então

você não tem uma produção cobrada assim... é que assim eu trabalho ni:: uma máquina por

dia e a outra por por produção... então eu ganho por peça... na peça então é eu que faço...

quanto mais eu ti/ faze mais eu ganho... então depende de mim mesma... então muitas vezes

eu passo até do meu horário pra tirá um dinheiro a mais...

Doc. – E em média é... quanto que você produz? Eu não vou perguntar seu salário não

((rindo))

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Inf – ((rindo)) ainda bem né? bom no no orveloque eu chego de/ é que ai varia muito... é

difícil você dá um cálculo de produção porque você nunca faz a mesma peça... e:: como/ e

assim eu produzo modinha... modinha é sempre diferente... se você trabalha numa firma só

de camisetas... que eu abri mão que eu não queria... eu arrumei uma assim não quis porque

você nunca muda...só naquilo naquilo naquilo... aí você pode dá uma produção certa... mas

na modinha como... são muitos detalhes né? muita gente nem gosta... eu sou uma exceção

de gostar... então é difícil... mas em média... no orveloque dependendo do que... duzentas

peças por dia... na galoneira também em questão de barra né? bate barra... umas

duzentas...duzentas e pouca por dia.

Doc. – Bastante, né?

Inf – bastante...

Doc. – E você fala modinha...modinha...o que que é modinha?

Inf –((rindo)) modinha são todas as blusinhas possíveis que você pode imaginá é

modinha... saias longas... curtas justa...cuns tecidos diferente... blusinhas de alcinha... top...

isso é modinha...chamado de modinha... porque você nunca faz a mesma... cada é verão que

vem... cada estação que entra... muda os modelos...

Doc. – E você/lá vocês desenham também as peças ou só costuram?

Inf – não não ela/ é::: é como se fosse um serviço terceirizado né? oficina de costura

realmente é isso... então ela/ ela pega de uma outra pessoa... que a gente costura pra uma

outra pessoa... então ele já traz o corte... todo cortado... e a gente só só monta e costura

mesmo... num num é uma confecção né?

Doc. – E pra quem vai essas peças?

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Inf – é::: um boliviano que a gente trabalha... é vendida aqui mesmo... não é nada im/

importado...é: :: vendida no bom retiro.

Doc. – E esse esse... e você se você quisesse pegar as peças pra você fabricar na sua casa?

Inf – É o que eu pretendo mais pra frente... montá uma oficina pra mim... mas no momento

agora não dá... né? porque as máquinas são caras... eu ainda num tenho um local... você tem

que ter o local... e um: :: capital pra tá comprando os maquinários...mas pa/ pra pegar

assim.. é que o o o custo baixo dá pra pegar sim...

Doc. – E você...pra você montar/ é desculpa eu não entendi direito... pra você montar a sua

oficina você precisa do quê?

Inf – oh... pra você pegá serviço em qualqué outro lugar... ou fi/ou confecções grandes ou

não... que algumas lojas/ muitas vezes cê pode passá assim no bom retiro ce vai vê placa

né? precisa-se de oficina... muitas vezes a pessoa nem intendi o que que é... tem que tê no

mínimo cinco máquinas... sem isso... em lugar nenhum te dá serviço... porque eles qué um

mínimo de produção e o mínimo de produção tem que tê... no mínimo cinco máquinas.

((um rapaz aparece na porta olha para o gravador e balança a cabeça afirmativamente, a

informante ri e cumprimenta o rapaz, o rapaz vai para o corredor))

Inf – então... no mínimo cinco máquinas pra podê montá a oficina... então eu tenho que tê

no mínimo cinco máquinas... e um lugar pra tá montando.

Doc. – E ... você pretende mesmo abrir uma oficina? Como que é pra você ser empregadora

e não empregada?

Inf – é estranho... mas eu pretendo sim... até o final do ano quem sabe... tá comprando essas

máquinas... nem que seja o/ eu compro uma agora... otra depois...((rindo)) e e pretendo

sim... mas é estranho você deixá de ser empregada e virá... a patroa né? é bem estranho... cê

tem que sabê lidá com o pessoal

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Doc. – Que que precisa pra uma costureira se sentir bem Ani?

Inf – ((rindo)) ai não sei... como eu me sentiria como empregada? ah você não te já

já/realmente a pressão em cima de você né? muita cobrança... porque ó...o o que eu percebi

assim/ eu aprendi muito trabalhando em oficinas... então ali você todos os pobremas que

pode tê...é:: aonde a pessoa tá errando... aonde ela tá acertando... porque você tem que tê/

um uma pessoa que trabalha lá com você você tem que fazê ela se senti bem no ambiente

de trabalho dela... se a pessoa trabalha infeliz NA produção ela produz menos... então já te

atrapalha... então muita pressão muitas vezes dependendo da pessoa que não sabe lida com

isso... ela vai produzir menos de vez mais... então eu acho que menos pressão é uma das

opções... você pegá um empregado que você respeite também né? porque muitos lugares

não te respeita... cobra demais e acaba até humilhando algumas vezes... eu já trabalhei em

lugar assim... então menos pressão e respeitá o funcionário... que dizê você tem/ e nunca

mistura né? negócio com amizade... realmente num dá certo.

Doc. – E... nesse tempo que você trabalha como costureira... qual o maior problema que

você já enfrentou?

((a informante abaixa a cabeça, pensa um pouco e ri))

Doc. – Fez cara de quem não enfrentou nenhum ((rindo))

Inf- ((rindo)) não...eu já enfrentei VÁrios... é assim... eu já trabalhei em lugares que num

PAga... eu já trabalhe/ mesmo registrado cê fala assim é: :: que... o registro em carteira te

da alguma segurança... não dá... eu trabalhei em oficinas... pequenas... sem registro

nenhum ...e recebi certinho... bem melhor do que em firma registrada... porque eu já

trabalhei em firma registrada... que atrasava o pagamento até em vinte dias... dava a

condução/ seu transporte picado... e te humilhava e cobrava... então depende... eu acho que

isso varia muito né? agora ... pobrema aí aí depende do lugar porque... o ruim também...

vamos supor se fosse pra mim montar a minha oficina... eu pegar uma pessoa que não

trabalha direito e não prestá a atenção no serviço dela... ela errá muitas peças... porque: ::

Page 34: Amostra do Português Popular

34

você paga o que tá errado...para quem te te cedeu o serviço... então tem que tê muito

cuidado... e um deles é esse

Doc. – Que empresa grande você já trabalhou? Você disse que já trabalhou em empresa

grande e empresa pequena, que empresa grande que você já trabalhou? E como é que era?

Que diferença que tinha entre essa empresa e outra?

Inf - [(pra citar nomes?)

Doc. - [Ah! Se você quiser pode falar

os nomes.

Inf – a empresa maior que eu trabalhei que eu acho que todo mundo conhece é a tiptop...

que é confecções infantis... e já trabalhei numa outra que era uma confec/confecção de

médio porte digamos assim... e de restante foi oficinas.... aí se você quisé que eu coloque a

diferença é assim... digamos que na tiptop por exemplo eu tive todos os benefícios de uma

funcionária registrada... mas aí parece que a gente ta num regime militar... você não pode

olhar pro lado... você não pode levar nada pra comê... você não pode ouví um walkman que

EU ADOro... você não pode levantá muitas vezes pra i no banheiro... você não pode

levantá muitas vezes pra beber água... qué dizê cê não pode fazê nada... só trabalhá... e é

por isso que no momento eu optei pela oficina... oficina eu trabalho mais tranqüila... eu

faço a minha produção... eu posso ouví um walkman na máquina...que eu num gosto de

trabalhá em silêncio... eu num /eu posso/ se eu quero ir no banheiro eu levanto... num fica

ninguém ali me controlando... eu acho que o controle... as regras são muito grandes...

muitas vezes é é assim cê tem o benefício de registro... de toda aquele se/ aquela segurança

mas ao mesmo tempo você é muito controlada... aí se tem extra... você é obrigada a fazê ...

cê num tem a opção de falá não... então nessa parte que eu vejo diferença... então não sei

até que ponto vale a pena um registro... na minha opinião... porque numa oficina de

custura... se você pegá uma pessoa que PAgue direitinho igual onde eu to...cê trabalha mais

tranqüila e tem o seu dinheiro no final do mês do mesmo jeito de uma firma grande... você

só não vai tê assim... um décimo terceiro...umas férias né?

Page 35: Amostra do Português Popular

35

Doc. – E isso prejudica?

Inf – é bom...pra/ eu acho que pra quem sempre trabalhou registrado talvez sim né? (rindo)

mas como eu sempre trabalhei sem registro...eu acho que não...não muito

Doc. – Como você faz pra ir trabalhar? Você vai de oni/ aqui só ônibus né? Aqui em Taipas

só o ônibus?

Inf – não eu sou obrigada a pegá a pirua...coisa que eu não gosto...eu sou obrigada a pegá

uma pirua até o terminal cachoeirinha... e: :: lá:: pegá uma outra perua que sobe pa /pra

avenida itaberaba que é próximo da onde eu trabalho

Doc. – E como que é a condução aqui? Como que é o bairro aqui de modo geral né? Que/

faz tempo que você mora em Taipas? Como que é?

Inf – bom... eu como moro de aluguel já morei em vários lugares...né? agora aqui em

TAIpas eu já to há há quatro anos...bom se for pra mim avaliar o bairro...não é ruim... é um

bairro que eu acho seguro...não acho periGOSO...é: :: só eu eu reclamo muito aqui só da

condução... eu acho a condução muito ruim... né? você é obrigada a pegá muito piRUa...

não acho pirua legal...e/ porque você perde a opção de de ônibus... então cê cê num tem

ônibus direto pro centro...da onde eu moro não... você não tem ônibus direto pra

lapa...então a a diferença que eu vi assim foi quando:: foi... criado o terminal pirituba né?

com o terminal pirituba a gente é obrigado a ir pra lá pra tá pegando uma outra condução

pra ir pra otro lugar... então isso eu acho que de que de / é:: digamos que alterou no tempo

de chegada no centro ou na Lapa em meia hora mais... eu acho mais demorado... mais

cansativo... mais... é um bairro que ainda tá crescendo... não tem TANto comércio né? a

gente não tem uma agência banCÁria... é:: em questão de:: tem hospital próximo tudo né?

essa parte é boa

Doc. - Que hospital que tem aqui perto?

Page 36: Amostra do Português Popular

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Inf - A – a gente tem o hospital geral de taipas e tem o perus também né?... que é/ são

prontos socorros públicos que são bem próximos

Doc. – E você pretende mudar daqui... porque logo no comecinho você disse que ia casar...

quando você casar você pretende mudar?

Inf – não...eu vou casá: :: no momento... por aqui o aluguel ser mais em conta a gente vai

continuar aqui mesmo....,mais mais pra frente eu pretendo mudá... não pretendo mora aqui

pra sempre não ((rindo))... eu num gosto muito daqui né? (pra) falá a verdade

Doc. – Só por causa da condução que você não gosta? Ou tem mais motivos?

Inf – não num é só a condução não... em questão de saúde eu acho aqui posto de saúde

preCÁrio... é em questão de de pré e creches né? as escolas aqui são boas né? a gente tem

escolas muitos boas aqui...mas pré e creche... como eu tenho duas crianças nesse período...

é é difícil...eu tentei muito ir pra cachoeirinha mas... por pobremas financeiros não deu pra

i... porque lá a creche e pré cê tem em cada esquina cê tem um...aqui já num tem... a agen/

agente só tem um emei aqui... a vaga é bem difícil de conseguí... e:: a creche também são

muito difícil de conseguí...então nessa parte eu acho ruim...

Doc. – E você morou... diz que morou em vários bairros porque morou sempre de aluguel,

né? Que outros bairros você morou? Era melhor do que Taipas?

Inf – ah com certeza... eu já morei em carapicuíba... já morei em barueri... eu cresCI em

pirituba... são todos bairros melhores do que aqui né?... barueri eu acho que eu nem preciso

falar muito né? que lá ele/ ele serve de modelo... e pirituba também... pirituba é um bairro

muito bom... JÀ desenvolvido... ele tem tudo... tem muitas conduções... escolas creches

pré... você tem um um comércio já totalmente desenvolvido... então lá é bem melhor que

aqui... também aqui eu acho mais distante de tudo né? então dependendo da onde você vai

trabalhá... você cansa mais na condução do que no próprio serviço...

Doc. – E você diz que mo/ cresceu em Pirituba, e Pirituba já é um bairro melhor?

Page 37: Amostra do Português Popular

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Inf – é eu cresci em pirituba... pirituba é um bairro bem melhor... eu eu cresci a minha

infância/ até os dezessete anos eu morei lá... depois que eu comecei mudá de canto pra

canto igual cigano né? ((rindo)) não paro mais

Doc. – E seus pais moram lá ainda?

Inf – não...meu pai ele já é faleCIdo...já: :: há onze anos... minha mãe não... minha mãe

mora aqui em taipas mesmo... bem próximo a mim mesmo...

Doc. - E você tem mais irmãos?

Inf - eu tenho três irmãos... tenho uma irmã e dois irmãos que também moram aqui...

todos já casados... os/ só o caçula que não tem filho... os otros dois já tem filhos... e moram

bem próximo de mim também...

Doc. - Até o caçula é casado?

Inf – até o caçula é casado...com dezessete anos já é casado...

Doc.– Nossa... casaram todos muito cedo?

Inf – é pra segui o exemplo da minha mãe né? que casou aos dezesseis anos (rindo)

Doc. - E a filha? Será que vai também casar cedo?

Inf - ai não... eu pretendo que não... eu espero que não né? espero que ela saia dessa

liNHAgem dos dezesseis anos né? e... amadureça primeiro né? Muito nova... eu por

experiência própria sei que não é uma idade boa pra isso né? é uma idade... que você tá...

confusa digamos...adolescente é muito confuso... e eu fiz tudo que eu tinha que fazer na

adolescência... então... isso traz muitas conseqüências... algumas boas e outras ruins... então

num acho uma boa idade... eu acho que... cê primeiro tem que estudá: ::... que eu não tive

Page 38: Amostra do Português Popular

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oportunidade... você tem que vê que carrera cê vai querê... depois dos VINte... vinte e dois

anos começá a pensá em casamento né? não digo nem casá nessa idade... porque

adolescente qué muito curti... qué se diverti...qué tê amigos... e você casando nessa idade cê

perde tudo isso...tudo... e aí logo vem FIlho... que foi o meu caso... e ai você se priva de um

MONte de coisas né? fica compricado... (espero) que ela não case nessa idade...

Doc. – Do que você acha que se privou Ani? Tendo filho cedo?

Inf– ah... eu me privei MUIta coisa... uma coisa que /delas é a liberdade que eu tinha...que

que eu tinha... que eu queria conquistá ainda...eu ainda nem tinha ela né? mas era louca pra

tê... e:: na esCOla né? porque... eu já tinha saído da esCOla... então quando eu casei

pretendia voltá... porque tive filho não pude...num tinha quem cuiDAsse... então eu me

privei de muita coisa...

Doc. – E hoje o que que você pretende pro seu futuro?

Inf – ah hoje eu pretendo voltá pra escola esse ano de dois mil e seis... pa aprendê o que eu

não aprendi... que... eu fiz só até a quarta série né? tive que sai da escola com catorze anos

pra começá a trabalhá... pra ajudar em casa ...e depois já logo já casei... já tive filho e assim

por diante... acabei nunca estudano... sempre quando eu planejava ir pra escola acabava

tendo mais um filho e num ia... ((rindo))... e agora eu pretendo voltá pra escola... terminá a

minha es/ o o o segundo grau tudo... porque eu pretendo fazê faculdade... faculdade de

istilista

Doc. – Que ótimo né? Então tem bastante planejamento aí pro futuro?

Inf – a eu tenho muitos planos...eu pretendo fazê:: a faculDAde... pretendo começá debaixo

como todo mundo deve né? ninguém consegue começá lá de cima... montá primeiro uma

oficina... e mais pra frente eu te a minha própria confecção... com meus próprios

modelos...criados por mim

Doc. – Que ótimo né? Um plano muito sólido pro futuro

Page 39: Amostra do Português Popular

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Inf – espero que de tudo certo

Doc. – Vai dar sim... e você/ e pra sua filha? Sua filha já está pensando no futuro? Como é

que está?

Inf – ah... ela só tem tamanho né? catorze anos não pensa muito nisso... eles não tão

esquentando muito a cabeça com o que vai fazer o que vai deixar de fazê... eu também não

pressiono... é uma idade tão assim ...que num/ que eles nunca sabem quem eles é direito

quanto mais o que que eles querem... então eu num sei... por eu/ o que eu pretendo é

assim... que ela termine a escola... tudo que eu não FIZ ...e que eu não tive... eu quero que

ela tenha... eu quero que ela faça até a oitava série... faça o ginásio... faça tudo direitinho...

que mais pra frente tenha uma faculdade... porque: :: hoje em dia a gente sem estudo não

consegue nada... toda a minha dificuldade que eu tive em questão... de emprego... já veio

gerado disso... por falta de escolaridade muitas vezes... eu via empregos melhores num

tinha a oitava série num pudia... e hoje em dia até com a oitava série já ta difícil imagina

sem... então eu acho que ela tem mais é que estudá... e aproveitá a adolescência dela...no

momento eu não tô... me preocupando muito com o resto... mais pra frente a gente se

preocupa

Doc. – Isso aí...e você... um fato da infância que marcou a sua vida?

Inf – ah:: minha infância é meio compricada... eu acho que não tive muito infância né?

num/ eu não fui criada cá minha mãe...nem co meu pai... eles já eram separados des(de)...

que eu me conheço por gente... a minha mãe casou de novo... tinha outro marido... e esses

outros meus irmãos são filhos dele né? são irmãos só por parte de mãe... então eu fui criada

um pouco com Vó...um pouco com Tia... no colégio inTERno... então eu acho que não tive

muito infância né? eu acho que:: foi tão sofrido que muitas coisas eu nem lembro direito...

foi foi difícil... então eu num num sei o que marcou mais... eu acho que mais é sofrimento

do que as coisas boas

Doc. – Nossa você chegou a ir pra colégio interno?

Page 40: Amostra do Português Popular

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Inf – cheguei... eu já cheguei a ficá num colégio interno que na época era da igreja

adventista do sétimo dia... lá em pirassununga... não lembro a idade que eu tinha... que

parece que essa parte realmente apagô ...e cheguei a ficar ni um de fleiras no centro da

cidade... em dois colégios

Doc. – E mesmo assim você não conseguiu estudar? Praticamente?

Inf – eu era a rebeldia em pessoa... eu não parei em nenhum dos dois... ((rindo))

Doc. – E sozinha você ficava? Ou ou como que foi? Seus pais... sua mãe colocou você no

colégio e e desapareceu? Como que era isso?

Inf – (bom) no primeiro colégio que eu fiquei que era muito pequena... eu fiquei com uma

irmã minha que já faleCIda... que era irmã de pai e mãe MESmo... mi/ minha mãe que

arrumô com uma ex-patroa dela... e num num lembro o tanto de tempo que eu fiquei... eu

só me lembro que minha vó que me tirou de lá porque lá a gente... era muito judiada, né?

apanhava MUIto...era muito castiGAda... machuCAda... então a minha vó acabô tirando...

mas minha vó também trabaLHAva... não tinha como ficar com nós duas né? e depois

minha irmã logo ficou doente também... e: :: o segundo... já/ o segundo já era pra mim tê

ficado... não era pra mim tê saído... mas aí eu era muito rebelde... eu dava umas fugida lá de

vez em quando (rindo)... que também foi uma patroa da minha mãe que arrumo... e:: antes

de ir pro colégio e/ ela me levou na casa dessa patroa... eu era muito esperta eu marquei o

caminho e de vez em quando eu dava umas fugida pra lá...((rindo)) e descobriram né?

quando descobriram a ani foi expulsa

Doc. – Nossa... você você/ você fala / me deixou assim... falou que muito machucada...

muito maltratada? Mas como?

Inf – é o o que eu me lembro é que a gente /o seu/ o colégio era da igreja adventista do

sétimo dia... mas quem... isso era só a diretora... quem cuidava da gente eram meninas que

vinham da febem... então a gente era muito judiada nem o pessoal do próprio colégio sabia

Page 41: Amostra do Português Popular

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né? judiada (que eu falo é) assim... qualqué coisa apaNHAva... qualqué coisa ficava de

casTIgo... então... realmente eu só tenho má recordações...desse lugar... eu lembro que era

um lugar bem no meio do MAto... com hortas GRANdes... e: :: só tinha meninas né? não

tinha meninos... ALGUmas famílias moravam lá... que eram famílias também que vinham

ali pra cuidá da gente... mas é a gente era muito judiada assim... qualqué coisa apanhava...

qualqué coisa ficava... de casTIgo... era bem sofrido... aí quando minha vó discobriu... ela

fez de tudo e tirô a gente de lá

Doc. – E sua irmã? Você falou que tinha uma irmã por parte de pai e mãe né? E que

também chegou a ficar com você nesse colégio? Você falou que ela já faleceu?

Inf – é minha irmã::...até os: :: sete anos de idade era uma criança normal... depois ela

começou a ter pobremas de fraQUEza... e foi regredindo cada vez mais até ficar em cima

de uma cama... nenhum médico soube expricá o que ela tinha... se fo/ alguns dizem que

recolhimento de sarampo... é como se fosse uma paralisia infantil... foi o que ela teve... e

ela (ainda) viveu praticamente mais sete anos assim... né? aí fico: :: um período com a

minha mãe... que eu me recordo disso... minha mãe cuidando dela em casa como já era

GRANde né? dava trabalho pra dá banho... alimentação tudo... ela foi internada na casa de

davi... ficô um período bem grande lá... e: :: ... o que... eu acho que há ...três anos atrás... ela

teve um atrofiamento no/ nas pernas... foi passá por uma cirurgia e faleceu... na hora da

cirurgia no hospital das clínicas

Doc. – Ela ficou quanto tempo internada?

Inf – se eu não me engano?... quase dez anos internada

Doc. – Nossa... dez anos? E e ela... ela... só tinha paralisia? Como como que ela era?

Inf – ela tinha o tamanho de um adulto... com pé e mão de criança... tudo infantil.. criô

corpo de meNIna tudo né? mas assim... rostinho de/ o mesmo rostinho que ela tinha aos

sete quando começô a ficá assim ela tinha... depois de tantos anos passados...ela num num

anDAva... num faLAva... num sentava soZInha...num comia soZInha...usava FRALda...

Page 42: Amostra do Português Popular

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como um bebê de seis meses...que era o que o médico falava né? que ela vivia como um

bebê de seis meses... totalmente dependente de um adulto pra tá cuidano

Doc. – Nossa...mas que coisa né? E quando mesmo que ela faleceu?

Inf – vai fazer quatro anos... quatro anos

Doc. – E você pensa o que sobre isso agora?

Inf - ah eu acho que ela sofreu demais... muitos anos internada né? a gente não podia tá

vendo sempre... eu acho que Deus levou ela pra descansá... ela sofreu demais...

Doc. – Nossa... desculpa se eu for um pouco indiscreta no que eu vou perguntar... mas você

acha que essa doença que ela teve tem alguma coisa a ver com os maus tratos que vocês

disseram que sofreram?

Inf – bom... eu lembro que quando a gente era pequena minha mãe tinha o hábito de levá a

gente numa psicóloga conhecida dela... e ela faLAva que o caso da tati né...que era essa

minha irmã era um: :: uma forma que ela teve de se esconder dentro de si próprio porque

ela não aceitava o fato de não ser criada pela minha mãe... que esse motivo é porque ela

casou com outro homem que era meu padrasto que não aceitava nós duas...que eu superei

bem né? tudo isso...mas ela já não... então o que a psicóloga exprica é isso... porque na

época que ela ficou doente... levaram em um muitos hospitais tudo... ninguém sabia o que

ela tinha... e por fim falaram que era recolhimento de sarampo que afetô... uma veia do

cérebro que comandava o corpo... né? mas nisso daí... minha mãe na época fez uns

tratamentos naturais...tudo... ela teve uma certa recuperação... coisa que o médico falava

que o negócio dela era só... regredí cada vez mais... então eu acho que o poblema dela era

psicológico mesmo... emocional

Doc. – Nossa...será Ani? Que causou tanto trauma assim?

Page 43: Amostra do Português Popular

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Inf - ela era uma criança... muito doce... muito dependente da minha mãe... ela tinha

louCUra pra viver com a minha mãe né? eu acho que sim... eu acho que... a mente da gente

tem um poder muito grande... dependendo do que você quer pra si mesma... se você quiser

morrê você consegue se matá mentalmente... e ela num queria ficá sem a minha mãe né?

Doc. – E você?

Inf – ah eu acho que quando eu era criança também sentia muita falta... acho que até a

adolescência... ate uns...dezessete dezoito anos eu também senti muita falta de não ser

criada com ela... mas depois cê cresce... eu tenho meus próprios filhos eles me amam

bastante ... então aí cê acaba... amadurecendo... deixa pra lá... mas isso/ já sofri muito por

tudo isso... hoje em dia não ligo mais

Doc. – E sua mãe é viva hoje?

Inf – não minha mãe é viva... ela mora perto de casa

Doc. – E seu relacionamento com ela ?

Inf – péssimo ((rindo))...no momento a gente nem ta se falando mais...é num num dá

certo... porque eu sempre quis cobrá ...e ela nunca tem nada pra me dá né? do que eu

cobrei... então é compricado... ((a informante fica emocionada))

Doc. – Bom... é melhor a gente passar para um outro assunto né ? ((rindo)) É essas coisas

acabam sendo um pouco doloridas né? Me fala/ você falou que lo/ você falou que ia casar e

depois a gente quase não conversou sobre isso ainda... mas e aí... e essa fase nova da sua

vida?

Inf – é uma fase nova... eu acho que eu vou mudar o ciclo né? fechar um e abrir otro... eu

vou casá agora em março... a gente tem... um ano e pouco de namoro...ele se dá muito bem

cum meus filhos... meus filhos gosta dele... a família toda gosta... e:: a gente ta com

planos... firme mesmo... vamo casá agora em março... vai dar tudo certo...

Page 44: Amostra do Português Popular

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(houve uma pequena queda de energia)

Doc. - Que bom... deixa eu ver se ta gravando direitinho

(...)

(( a informante fala sobre as quedas de energia, avisa que ás vezes, no mesmo dia a luz vai

e volta))

Inf - volta ((esse comentário faz parte da conversa sobre as constantes quedas de energia))

Doc. – Espera ai ... acho acho que está gravando certo... vamos ver, deixa eu abaixar aqui

um pouquinho...você falou que foi criada pela sua vó?

Inf – Eu eu acho que minha vó é assim... minha vó é a mãe que eu não tive... ela que se

preocupa... ela que cuidou... é assim...a gente mora em casas separadas agora porque eu

moro eu e meus filhos... mas ela tá sempre preocupada... é uma pessoa MUIto especial pra

mim... muito importante.... assi/ eu fui a primeira neta né? já dei (bis) / eu sou a única que

deu bisneto pra ela (rindo)... nova também... minha vó tá com sessenta e oito anos...

Doc. - [é nova

Inf –muito nova... mas eu adoro ela... e ela sempre preocupou de verdade... sempre teve um

carinho muito especial... e tá sempre preocupada... sempre fazendo tudo... o que pode e até

o que não pode... por mim... pelos meus filhos...pelos outros netos também... e/ ela é muito

apegada... ela se preocupa muito mais cuns/ com a gente todos né? do que com si própria...

também realizou o sonho de ter a casa própria DEla... muitos anos de aluguel né? por isso

que eu também pretendo acho que eu vou realizar o meu também...

Doc. – Ela mora aqui em Taipas também?

Inf – Ela mora na cohab...bem próximo a mim... ela tem um apartamento lá...

Page 45: Amostra do Português Popular

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Doc. – Que bom né? E ela... sessenta e oito anos? Ela trabalha ainda? Não né?

Inf - não... ela já tá aposenTAda... trabalhou muitos e muitos anos de copeira né? na santa

efigênia foi o último emprego... minha vó também num num: :: num teve estudo né?

depois... é:: com sessenta anos na época... sessenta e poco que ela foi entrá no mobral pra

aprendê a escrevê o próprio nome...era o orgulho dela quando ela aprendeu a escrever o

próprio nome...((rindo)) mas largou... num continuou... ela disse que... na iDAde dela... na

caBEça dela ...já num num entra mais muita coisa...ela não conseguia aprendê direito né? e

na época ela ainda tava trabalhando...eu até preciso perguntá pra ela se ela não pretende

voltar a estudar de novo... porque eu pretendo...((rindo))

Doc. – Quem sabe as duas juntas né?

Inf – é... num/ hum/ é...quem sabe as duas juntas...

Doc. – Tá certo...o seu seu noivo estudou bastante?

Inf - é o:: leandro ele tem o segundo grau compreto... não fez faculdade porque não é o que

ele quer fazê... ele qué ir pro ramo de música né? sê::: como que se fala?... ai esqueci o

nome... deu branco... pra trabalhar em estúdio... com música... que ele tem uma banda

também... ele TOca ...

Doc. - [ é mesmo?

Inf – é... ele fa/ é couvert dos Beatles ((rindo))

Doc. - [sério? ((rindo))

Inf – sério... ele é apaixonado pelos beatles... então... ele fala/ ele tá no ramo de digitação

tudo...computação... informática... mas o negócio dele é música... então ele pretende fazê os

Page 46: Amostra do Português Popular

46

cursos que precisa ser feitos... que ele é baterista né? e trabalhá como produtor musical

(lembrei)

Doc. – Ai que interessante né? Eu também gosto muito dos Beatles... e você também faz

alguma coisa na área da música?

Inf – NÃO... eu sou uma negação pra isso... ((rindo)) eu sou muito fã de ouvi música... mas

tocá nada... eu tenho vontade de aprendê a tocá violão... eu /eu acho /eu gosto muito do

alcústico... tudo que é alcústico eu gosto... então eu acho que eu ainda faço uma aula de

violão... mas ele brinca muito que eu ainda vou sê a vocalista da banda dele...impoSSÍvel

né? porque eu acho que minha voz é horrorosa... ((rindo)) e MOrro de vergonha de púbrico

né? eu na frente de uma platéia eu fico: :: ro/ ROXA... não é nem vermelha é roxa...

então... eu acho que pra mim não dá não... eu gosto muito de ouvi... adoro música... sempre

gostei... DESde pequena... gosto muito de música antiga... coisa que não é da minha

geração... mais: :: eu tocá... eu sê o foco ali... não não... não é comigo

Doc. – Mas você não parece tímida não...viu? ((rindo))

Inf – tímida pra conversar aqui né? agora... com uma platéia toda te olhando... ai eu sempre

morri de vergonha... as POUCAS vezes que eu tive... que falá em púbrico foi difícil...difícil

mesmo

Doc. – E ... e você acompanha? Ele ele no caso... ele tem uma banda é...é couvert dos

Beatles mas é profissional? Você acompanha? É profissional...

eu tô deduzindo

Inf – é eles ainda não gravaram cd ...eles sonham com isso né? só... aquele primeiro né? e::

mas toda vez que eu posso ta indo no show dele eu sempre to junto... ele faz questão

disso... adora né? tê eu lá presente...e é gostoso... é muito divertido... eu gosto muito

também... e eu adoro sair a noite né? então... também é legal

Doc. – E ele toca aonde?

Page 47: Amostra do Português Popular

47

Inf – ah ele toca em bai/ ba bares né? e: :: festa... festa da igreja... depende do convite que

vem... alguns são barzinhos... outros são festas em igreja... outros são festas de firma né?

final de ano geralmente tem bastante... e assim... varia muito

Doc. – A igreja ouvindo Beatles?

Inf – é:: a:: esse ano mesmo que passo agora... de dois mil e cinco que acabô teve a festa

da:: com/do/da consciência negra né? e eles foram convidados pra: :: ...porque ai eles tocam

tudo dos anos sessenta né? não é só beatles quando a festa já é mais diversa... aí toca tudo...

e eles foram convidados pra fazer a festa da consciência negra

Doc. – Que interessante, né? Muito bom isso....

Inf - muito legal ((rindo))

Doc. – E...essa essa / ele toca a noite?

Inf – é geralmente é SEMpre a noite né? pra tocá

Doc. - E isso atrapalha ou não?

Inf– já atrapalhou bastante... porque muitas vezes eu ficava sem namorado no [final de

semana né?

Doc. - [ ( )

Inf - nem sempre eu queria ir junto... ou podia tá indo que alguns lugares são fechados pra

gente de fora né?... num podia i... alguns ele conseguia... que eu fosse... mas outros não...

então... era no começo a gente já brigou muito por causa da banda...mas se for pra falá pra

escolhê eu ou a banda é capaz de escolhê a banda... ((rindo))

Page 48: Amostra do Português Popular

48

Doc. – Isso é bom né? É bom ter um hobby... e o seu hobby qual é Ani?

Inf – ah eu não sei... eu gosto muito de pintá... apesar de num tá fazendo isso no momento

né? pintá... ouvi musica... vê filmes... são coisas que eu adoro fazê... eu adoro ir pra

ciNEMA...Amo...amo vê filme

Doc. – Pintar o quê?

Inf - pinturas abstratas...eu ainda pretendo fazê o curso disso tamém... então eu acho que

pra esse ano de dois mil e seis tem bastante cursos ainda pra fazê... (rindo) tem escola...

cursos... mas eu vô fazê...ele ele cobra muito né? pra mim não desisti dos meus sonhos...

então ele sempre dá força... sempre apóia... incientiva... muitas vezes eu to esquecendo

deixando de lado... ele me lembra “o não esqueci...cê ainda vai fazê seu curso de pintura” e

eu vô fazê sim...

Doc. – Bom...e os filhos?

Inf– sobre?

Doc. - E os filhos? No caso você tem um uma série de planos, né? Mas com criança a a

coisa é mais difícil? Ou não?

Inf– é eu acho que quando eu tinha todos pequenos sim né? como eu tenho a a mais velha

já grande já ajuda bastante né? e: :: di /divido um poco com o pai deles também né?

então...( ) eu vou começá a dividi mais... vão pra casa do vô... e assim... eu e/ esses anos

todos eu deixei de fazê um monte de coisa uma delas era voltá pra escola por causa deles

né? e eu acho que agora tá na hora de eu pensá um pouco ni mim

(fim do lado A)

Doc. – (falamos) quarenta e cinco minutos?

Page 49: Amostra do Português Popular

49

Inf – é... faz tempo... nem vi passá...

Doc. – É que você fala bastante hein? ((rindo))... [ô

Inf – [(mais uma pra falar que) eu falo

bastante? ((rindo))

Doc. – Mas isso pra mim é ótimo ((rindo))

Inf - realmente... eu falo bastante ((rindo))

Doc. - Mas me fala uma coisa Ani... casar depois que você tem toda a sua vida construída...

tudo né? Que você mora com seus filhos... casar não perde um pouquinho a liberdade?

Inf – é COM certeza... não só a liberdade como eu já me habituei a... fazê tudo sozinha né?

eu vou tê que: :: aprendê de novo a convivê com outra pessoa... mas eu eu acho que vale a

pena... mas vai ser difícil... (vai)...com certeza... assim... é o meu quarto... é a minha casa...

é as minhas coisa... ((rindo)) vou te que apren/ muitas vezes ele me corrige né? “não... mas

é a nossa casa”... futuramente já vai sê... a gente tá arrumando tudo pra isso... então... eu

acho que nessa parte é meio compricado sim... mas nada que dê pra / que não de pra sê

resolvido com o tempo né? eu acho que eu consigo sim... se eu consigo me dividí em quatro

que é entre três filhos e mais ele... eu consigo resolvê isso né? ((rindo)) bem fácil

Doc. – É verdade... hoje você mandou ce / a a o pai levou as duas crianças pequenas?

Inf – é hoje eles estão passeando... estão todos foras... pra gente podê conversá sossegada

((rindo)) porque senão eles não iam deixá... principalmente a pequenininha

Doc. - Ela é a que bagunça mais?

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50

Inf – é... ela é mais bagunceira e o outro é mais grude né? então se teria dois... danadinhos

aqui enchendo o saco... querendo falá no microfone o tempo todo... ele ia tá fazendo um

monte de pergunta no teu lugar... ((rindo)) ia sê bem assim... a a grandona não... ela é queta

né? mas a iasmim ia tá aqui em pé... querendo cata o microfone... ia sê difícil

Doc. – Mas é bo/ é gostoso ter criança pequena né?

Inf – É ... eu eu eu:: acho assim né? você tem um é uma coisa... cê tem dois é outra... cê

tem o terceiro é outra totalmente diferente... você vê as coisas diferente... e num é só pra

você né? cê tem que dividir tudo... então muitas vezes eu penso mais neles do que ni mim

mesma... e eles preenchem um espaço muito... muito grande... e: :: se acostuma tanto...por

mais que cê / porque filho cansa... uma mãe que falá que não cansa... a mãe que falá que

num cansa é mentira... mas tem hora que cê fala ai eu não güento mais ...eu preciso de

férias de vocês né? Mas por exemplo... quando eu tô em casa sem um deles que seja eu fico

sentindo falta... o:: meu namorado geralmente (que) fala isso... quem sai mais aqui é o

jhonatan com o pai dele né? então muitas vezes ele não tá aqui... eu/ ele tá aqui eu tô

recramando... porque ele sempre grudado... sempre perguntando muito...falando muito... “ai

num enche o saco... fica queto... me dá um tempo” né? porque tem hora que eu não

guento... (rindo) mas aí quando ele não tá eu falo tô com saudade do jhonatan... aí (fala

assim) “ué ...quando ele tá aqui cê recrama... quando ele não sai cê recrama” ((rindo))?...

mas mãe é assim mesmo né? quando ta in/ todo mundo em cima uma hora cansa... cê fala

CHEGA

... mas quando sai também cê tá sentindo falta... e aprendi a dividir isso porque no começo

eu num queria... é/é compricado... mas eu aprendi a convivê com esse negócio dele passá

uma noite fora... imagina quando tive grande que me la/ me largá várias noite fora como

que vai ser né?

Doc. – E a educação dele?

Inf – do jhonatan?

Doc. - (é)

Page 51: Amostra do Português Popular

51

Inf - ele é um menino bem educado... não tenho recramação... as pessoas que conhecem ele

gosta muito dele... é uma criança doce... já me deu bastante trabalho... tem um gêninho

difícil... você fala não ele num/ ele vai negociá o seu não... ele num vai aceitá o não... então

é ele é meio compricadinho

Doc. – Eu digo educação assim... você acaba dividindo a educação dele com o pai né?

Inf – eu acho que nem quando é casado você não divide muito a educação de um filho né?

na minha opinião é muito mais a mãe do que o pai... muito menos morando fora né?

separado... então acho que a educação dele é responsabilidade minha... só minha...

porque... o pai ele vê como um: :: passeio... ( que nem ) o pai dele geralmente sempre foi

muito RÍgido... mas como vê ele só de vez em quando... acaba muitas vezes nem corrigindo

o que é pra corrigí... claro que ele tem aquele respeito... quando o negócio fica feio eu falo

vou falá pro teu pai... ai ele já se preocupa... mas no fundo no fundo a educação aqui tá

dependendo de mim mesma... é mais eu...

Doc.– E ciúme? Não?

Inf – da parte dele?

Doc. – Não... da sua parte

Inf – com o pai?

Doc. – ahã

Inf – não não...eu eu tenho mais ciúme dos avós dele do que o pai... quando ele: :: vai pra lá

e não qué voltá mais... ((rindo)) é:: tipo assim né? porque... lá ele pode TUdo... e aqui... tem

um monte de regras...não é o que ele mais ouve o dia inteiro... ((rindo )) e lá não...lá ele

pode tudo né? eles mimam demais tudo... então de lá eu acho que eu tenho mais ciúme do

que o próprio pai... porque lá ele... muitas vezes ele num qué nem vim imbora... aí quando

Page 52: Amostra do Português Popular

52

eu ligo “cê ta com saudade de mim?”... “to”... “mas qué i imbora? “não mãe deixa eu ficá

mais um dia” ((rindo)) ai: :: cê sente uma pontinha de ciúme... mas eu acho que é natural

também né? mas ele também tem muito ciúme de mim... então estamos quites...

((fim da entrevista))

4.1.2 – Transcrição da entrevista - Informante 2 ( Ariane da Silva)

Doc. – Vamos lá Arianne... então? Gravar aqui um pouquinho? Bom...então começa me

falando da sua escola... você está estudando... não está... como é

Inf – eu não estou estudando... (rindo)não tô estudando e a escola é legal... é e grande...tem

bastante salas... tem bastante amigos lá também.... de: :: todas as séries

Doc. – Que série que você está?

Inf. - eu tô na sétima

Doc. – E porque que você parou de estudar?

Inf. – eu estava cabulando aula e minha mãe me tirô... porque::: ela achou que: :: eu não

tava gostando da escola... que eu/ que ela achou que eu não queria ir MAis... pa escola e

ela me tirô

Doc. – E isso aí não é verdade?

Inf. – ah eu assim que sim... eu acho que é... eu acho que é verdade sim... (aí eu num...)

Doc. – Você disse que cabulava aula... e quando você cabulava você fazia o quê?

Inf. – eu ia pra casa dos amigos ...brin/fazê bagunça

Page 53: Amostra do Português Popular

53

Doc. – E que amigos são esses?

Inf. – são bastante amigos... é: :: carol... rogério... é esses amigos que eu faço bagunça na

sala

Doc. – E onde que é a casa que você ia?

Inf. – era a casa dos o/ do amigos deles... a gente não ia pra casa deles... a gente brincava lá

cos cachorros ... ficava... olhando a rua... olhava a televisão... assistia filme... brincava...( )

Doc. – Que tipo de filme que você gosta?

Inf. – gosto de: :: de terror e comédia...

Doc. – que filme de terror que você já assistiu?

Inf. – ah... assisti bastante... PÂnico... uh... (navio fan)/ é navio fantasma...bastante filme de

terror...

Doc. – E você na escola você gostava de escrever também ou você só gosta de assistir?

Inf. – hum... gostava mais ou menos... mais gosto mais de assistí...

Doc. – E fala dos seus amigos pra mim.

Inf. – dos meus amigos... todos?

Doc. – sim

Inf. – ah...como assim?

Page 54: Amostra do Português Popular

54

Doc. – Como é que eles são? Porque que você acha que eles são legais?

Inf. – não acho que meus amigos são legais porque a gente conversa bastante ... tem

bastante amigos também...conheço o Rogério... marjori... a geisse... o jean....bastante

amigos... não são só da minha sala... também são das outras...

Doc. – E eles estão em que série esses seus amigos?

Inf. – meus amigos? tão na SÉtima... e os outros tão nas outras tamém...na quinta... na

quarta...

Doc. – E você... agora tem contato com eles?

Inf. – não porque quase não vejo eles... porque fico mais em casa do que sai

Doc. – E aí? Que amigos você tem hoje em dia?

Inf. – eu acho que... só na casa da minha bisa... que é a michele... é as menininhas de lá...

dos dos prédios que eu conheço... que é a michele... a patrícia... a iolanda...os meninos

tamém...

Doc. – E namorado Ariane?

Inf. - eu num tenho namorado

Doc. – Nunca teve?

Inf. – não

Doc. – E ficante?

Inf. – uh só um

Page 55: Amostra do Português Popular

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Doc. – Só teve um? Quem era?

Inf. – era um (emerson ) acho que é Emerson...

Doc. – Que que é ser ficante pra você?

Inf. – eu acho que é só ficá e depois... sei lá... esquecê

Doc. – qual a diferença entre ficar e namorar?

Inf. – ah: :: namorá a gente fica... a gente se vê todo dia... e ficá a gente só fica um dia e

amanhã a gente não se fala...

Doc. – Nem se fala?

Inf. – a gente pode se falá um oi tchau ... mais a gente depois a gente não fica de novo...

agora namorá sim... a gente fica quase todo santo dia... assim....

Doc. – E você... acha que é mai/ que acha mais legal o que...namorar ou ficar?

Inf. – ah eu acho que é namorá

Doc. – E as outras suas amigas que que elas pensam disso?

Inf. – eu não sei... eu acho que a mesma coisa

Doc. – Suas amigas namoravam?

Inf. – algumas sim... outras não

Doc. – Fala dessa que namorava... como que ela é?

Page 56: Amostra do Português Popular

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Inf. – ah: :: ela era muito (grudenta) era grude assim (sabe?)... ah namorava assim como as

pessoas ... se abraçava... se beijava... ( )

Doc. – tua mãe deixa você namorar?

Inf. – é eu num acho que sim...

Doc. – você acha que sim ou que não?

Inf. - eu acho que sim ((rindo))

Doc. – e você está com vontade de arrumar um namorado?

Inf. – ah::: eu acho que sim... num sei... talvez sim... talvez não... se aparecê

Doc. – e se aparecer tem que ser como?

Inf. – ((rindo)) tem que sê roMÂntico.... a sei lá... alguma coisa (assim)...tem que sê

bonito... romântico... carinhoso... é: :: assim... que que que: :: nu/ num pode sê maloquero...

são essas coisas

Doc. – Que que é ser maloqueiro?

Inf. – é menino... que: :: que fuma... que fuma maconha assim essas coisa... que BEbe...

Doc. – Tem muito disso na sua escola... Ariane?

Inf. – mais ou menos... tem alguns que sim... alguns que não

Doc. – E esses que sim se comportam como?

Page 57: Amostra do Português Popular

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Inf. – ah: :: são muito... rebelde... eles aprontam muito... a maioria das vezes eles tão na na

diretoria... conversando com o diretor

Doc. – E o que que eles fazem?

Inf. – ah ele apronta demais... faz muita coisa errada ((rindo))na escola

Doc. – (tipo?)

Inf. – ai tipo provoca a professora... não faz a liÇÃO....é: :: responde de: :: mal assim... fala

palavrão... essas coisas... coisa feia ((rindo))

Doc. – Fala... um dia que aconteceu alguma coisa assim com o professor em sala de aula...

alguma história que tenha acontecido na sua escola e que você achou assim... horrível

Inf. – ah uma... ah::: que eu achei horrível?... teve uma vez que ((rindo)) o menino falou

palavrão a professora foi lavá a boca dele com sabão

Doc. – Nossa... nessa escola que você estudava agora?

Inf. - não... era na ôtra....

Doc. – Que série que era?

Inf. – era era na: :: na quarta...

Doc. – E aí aconteceu o que?

Inf. – aí...(ele) lavô a boca dele e levo lá pa diretoria... aí conversô com os pais dele... aí

levô uma suspensão

Page 58: Amostra do Português Popular

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Doc. – E nessa escola com esses meninos que você disse que tem menino maloqueiro lá...

que que eles já fizeram assim de horrível? Ou pelo menos de ruim né?

Inf. – ah eles ficam mexendo com as pessoas assim.... eu acho::: eu acho ruim... fica zuano

cas pessoa sendo que elas... tão queta... num fazem nada

Doc. – Com você também?

Inf. - cumigo assim não... porque eu fico mais no meu canto... não falo muito com eles...

então eu evito conversá com eles... pra não tê confusão...

Doc. – E que confusão que eles já arrumaram que você viu que deu problema?

Inf. – ai eles de vez em quando apronta e coloca a...a culpa nas outras pessoas... aí as

pessoas vão... tem que i pra diretoria sendo que a... que num foi ela que fez... ai ela acabam

se ferrando... sendo que não foi ela...

Doc. – mas me dá um exemplo (de alguma coisa que eles fizeram)

Inf. –uma coisa que fizeram.. ah ficaram sem fazê a liÇÃO... tiveram que i pra

diretoRIA...responderam mal a a professora... assim... falá palavrão... essas coisas

Doc. – E jogar bomba em banheiro...pichar a parede não?

Inf. – ah aí... até hoje num vi disso não

Doc. – Não viu nada disso? Então eles são bonzinhos.

Inf. – ah sei lá... eu acho que são errados

Doc. – Quantos alunos estudiosos tinha na sua sala?Aliás quem era o mais estudioso

também?

Page 59: Amostra do Português Popular

59

Inf. – era mais a ana... ela era a mais quetinha e fazia bastante lição

Doc. – E quantos alunos na sala?

Inf. - oi?

Doc. – Quantos alunos?

Inf. – eu acho que era trinta... acho que era trinta alunos na sala

Doc. – E como é que era sua sala de aula?

Inf. – como é que era? ah era grandona... tinha bastante cadera... a losa... a (professora)

Doc. – E a aula como que era?

Inf. – ah era normal... assim... professores... davam a / passavam lição na losa e a gente

copiava... de vez em quando eles... é::: davam prova... explicavam ...a lição...

Doc. – E durante o/ a explicação do professor os alunos o que faziam?

Inf. – ficava conversano... conversano num fazia a lição... desebedeceno a professora...

Doc. – E a conversa era muita?

Inf. – era ... de vez em quando num dava nem pra escutá o que a professora estava falano...

de vez em quando ela tinha que chamá o diretor pra/pras pessoa cala a boca

Doc. – E você? Achava o que disso tudo?

Inf. – uh::: acho que/ achava que era uma bagunça assim...

Page 60: Amostra do Português Popular

60

Doc. – e você gostava?

Inf. – da bagunça?...

Doc. – Hum hum

Inf. - ah eu acho que não... eu acho que não...

Doc. – O que você mais gostava da escola Ari?

Inf. – o que eu mais gostava da escola? gostava mais da educação física

Doc. – Como que era? Fala pra mim um pouquinho das aulas de educação física

Inf. - a gente jogava vôlei... a gente fazia bastante coisa (assim) a gente brincava... (cos )

professores... fazia brincadera... a gente: :: é... é... como é que fala? ... fazia exercícios...

isso... essas coisa.... te/teve um professor que passô lição de educação FÍsica... ele num era

muito legal não... ele era muito sério

Doc. – E que lição que ele passou?

Inf. – ah lição de futibol... uma lição de futibol... de vez em quando ele num levava a gente

pa quadra porque a gente tava conversano... e passava lição

Doc. – Na sala ele passava lição?

Inf. – é... na sala de aula

Doc. – E aí? Que que se/ que que os alunos faziam nesse caso?

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61

Inf. – tinha que copiá poque senão ele chamava o diretor porque ele era muito bravo... e:::

se ele chamasse o diretor ia todo mundo pa diretoria

Doc. – E chegava na diretoria acontecia o quê?

Inf. – a a gente num chegô a i pa diretoria inda... a gente não chego a i pa diretoria (rindo)...

a gente fi/tentava ficá queto...ai as pessoas tamém ficava queta...e os da frente falava pa

calá a boca poque sinão ia todo mundo pa diretoria... até aqueles que tava(m) queto tamém

Doc. – E você nunca foi pra diretoria?

Inf. – eu já fui uma vez mais::: eu não fiz nada

Doc. – E o que falaram que você fez?

Inf. – falaram que...é: :: que as menina pegaram o boné do menino... e falaram que fui eu...

aí elas tinham que i pa diretoria e elas foram junto tamém...

Doc. – E como que resolveu a situação?

Inf. -ah a diretora marcô meu nome lá... falô que queria falá ca minha mãe...aí depois... aí

depois ela conversô lá com uma mulhé e dexô pra lá... que aí depois ela viu que não fui

eu... aí ela chamô a mãe das menina... que tinha pegado o boné...

Doc. – E... e tua mãe não ficou nem sabendo?

Inf. – não... não

Doc. – Que outros problemas que você já teve na escola Ariane?

Inf. – oi?

Page 62: Amostra do Português Popular

62

Doc. – Você já teve outros problemas na escola? Quais outros problemas você já teve?

Inf. – se eu já tive otro pobrema? teve um dia que eu não fui ca camiseta... da escola e eles

me levaram lá pa diretoria... conversei com eles e eles deixaram pra lá ... falei porque que

eu não tinha ido... porque: :: minha mãe ainda não tinha compado camiseta... aí eles

explicaram pa mim que tinha que i ca camiseta que sinão eles da próxima vez eles num ia

deixá eu entrá...

Doc. – E você/ então tua mãe não tinha comprado a camiseta por quê?

Inf. – porque ela ainda não tinha visto... não tinha dinheiro... aí depois ela foi e comprô

Doc. – Você mora só com tua mãe... Ariane?

Inf. – minha mãe e meus irmãos

Doc. – e seu pai?

Inf. – meu pai não... eu num conheço meu pai...é::: eu coNHEço... mas eu num moro com

ele

Doc. – E onde está seu pai?

Inf. – eu num sei...

Doc. – faz tempo que você não vê?

Inf. – não: :: no no/ quando eu fiz... é treze/ca... treze... é eu acho que foi treze anos eu vi

ele... que ele foi lá casa da minha bisa e a gente conversô...aí eu vi ele... aí depois ele foi

embora... que aí teve uma festinha lá na casa da minha tia e a gente fico lá... mais... eu num

quis ficá muito com ele...

((a Informante fica emocionada))

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63

Doc. – Você não quis ficar com ele?Por quê?

Inf. – porque eu tava com raiva dele...

Doc. – Mas raiva por que Ariane?

Inf. – porque ele sumiu... ele sumiu seis anos...

Doc. – ah ele sumiu seis anos? E.. e aí ele deu que justificativa pra ter sumido?

Inf. – ele num falô nada...

(( a informante começa a chorar))

Doc. – E...Não precisa chorar por causa disso... a gente muda de assunto...tá bom? E sua

mãe? Fala da sua mãe e dos seus irmãos então agora... a gente não precisa falar do seu pai

se você não quiser tá? A gente pode passar para os seus irmãos então... fala um pouquinho

dos seus irmãos... como eles são... como é que é a vida na sua casa com a sua mãe...

Inf. – meus irmãos são bagunceiros... e cá minha mãe tudo bem

Doc. – Como que sua mãe é?

Inf. – minha mãe é legal... ela...é ela é legal... ela é bonita... a gente conversa bastante

Doc. – E o que que tem...o que que tem de/nela de mais chato... o que você acha?

Inf. – que ela não dexa eu fazer as coisas que eu quero...

Doc. – E o que que você quer fazer Ari?

Inf. – ah tem bastante coisa que eu quero fazê e ela num dexa...

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64

Doc. – Me dá um exemplo

Inf. – ah... saí::: assim... ah bastante coisas assim...

Doc. – sair pra onde?

Inf. – ah pra lugares legais... pra casa da minha vó... pra minha bisa... de vez em quando ela

num dexa... que eu tenho que ( )

Doc. – E como que é lá na casa da sua bisa? Você fala muito da sua bisa...como que sua

bisa é?

Inf. – minha bisa é legal tamém... uma turminha legal porque lá tem us amigos... ( lá eu

vejo ) muitos amigos...

Doc. – quais?

Inf. – a michele... a patrícia... a Iolanda... tem os meninos tamém... que são do prédio

abaixo... que aí eu tamém vejo minha tia... minha prima...

Doc. – e sua prima tem a mesma idade que você?

Inf. – não é mais velha...

Doc. – e vocês costumam sair juntas?

Inf. – não... só de vez em quando a gente foi numa festa ca minha tia... que era do trabalho

dela...

Doc. – (e aí)

Page 65: Amostra do Português Popular

65

Inf. – aí foi legal tamém... aí depois a gente voltava durmia lá na casa da minha vó...

Doc. – e com as duas primas você tem amizade, ou só com uma?

((em conversa antes da gravação da entrevista a informante já havia citado as duas primas))

Inf. – é mais cá... cá isa... a natali num é tanto... é mais... nervosas... ( )

Doc. – Falei duas, você falou minhas primas, eu falei duas, mas são várias primas que você

tem ou são só essas duas mesmo?

Inf. – é só as duas... que eu me lembro é...

Doc. – E hoje vive só você... a sua mãe e seus irmãos... e tua mãe tem um namorado...não é

isso? Como é que é o relacionamento com ele?

((utilizamos dados da entrevista anterior com a mãe da informante))

Inf. – é bom... é bom... ele é legal... ele é... engraçado

Doc. – Você não liga pra ela casar?

Inf. – não acho que vai ser bom pra ela...

Doc. – e pra você?

Inf. – também...

Doc. – em que sentido vai ser bom?

Inf. – ah::: ah num sei...talvez

Doc. – Você... acha que sua mãe casar vai mudar o que Ariane?

Page 66: Amostra do Português Popular

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Inf. – uh::: ah... talvez ela vai ter algum parceiro... uma coisa assim?

Doc. – mas eu digo assim...na sua vida na sua família... vai mudar o quê?

Inf. – ah::: bastante coisa... porque aí ele vai entrá tamém aí vai mudá...

Doc. – Ai vai o quê?

Inf. – aí vai mudá... poque ele vai entrá... vai entrá tamém na famía...(quando ele casá ca

minha mãe)... vai mudá as coisas...

Doc. – E o pai dos seus irmãos?

Inf. – o que que tem ele?

Doc. – Como é que é?

Inf. – ah! num vejo ele muito...

Doc. – E quando você vê?

Inf. – é quando ele vai buscá lá meus irmãos... e de vez em quando a gente fala um oi

tchau... assim... a gente num conversa muito não...

Doc. – Mas como que ele é?

Inf. – ah ele é um... ele é alto... magro... branco... tem um cabelo grande...

Doc. – e a personalidade dele?

Inf. – (que)

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67

Doc. – Como que ele é como pessoa?

Inf. – ah ele é meio... meio ruizinho...

Doc. – Mas ruizinho como?

Inf. - de vez em quando ele é meio ruizinho... porque de vez em quando ele nega as coisas

pra minha mãe sendo que é pelos filhos dele...de vez em quando ele não vai buscá os filhos

dele... aí depois ele reclama assim .. que que::: a iasmim parece que num gosta dele... sendo

que a culta é dele mesmo...

Doc. – e faz tempo que eles se separaram?

Inf. – faz...

Doc. – e você ficou chateada quando separaram?

Inf. – NÂO...

Doc. – Por quê?

Inf. - porque eu achei que foi bom pa minha MÃE... pelo menos... ((tosse)) ele parô de

brigá cum ela...

Doc. – Eles brigavam muito?

Inf. – de vez em quando sim...

Doc. – e você chegou a ver alguma briga?

Inf. – não... não só escutava

Page 68: Amostra do Português Popular

68

Doc. – E quando você escutava eles falavam o quê?

Inf. - ah eu num tentava escutá eu tentava... escutá a televisão pa eu num escutá

Doc. – e mesmo assim escutava ou não?

Inf. – de vez em quando assim

Doc. – e quando escutava ouvia o quê?

Inf. – ah eles brigavam muito... gritavam... essas coisa

Doc. – e você não lembra nada do que falava?

Inf. – não...

Doc. – E na sua in / e você sempre morou com sua mãe Ariane?

Inf. – não...ti/teve um tempo quando eu era pequena que eu morei com meu pai...

Doc. – e você lembra alguma coisa que aconteceu quando você morou com ele?

Inf. – que aconteceu? não... não muito

Doc. – você já ia pra escola nessa época?

Inf. – ia... ia pa/pa escolinha

Doc. – e ele te levava?

Inf. – é... ele me levava pa escola...

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Doc. – E morava só você e ele?

Inf. – não morava uma moça tamém... cum marido dela seus...e o: :: filho dele... que era

dois

Doc. – E ( ) ...e seu pai tinha mais dois filhos?...você tem mais dois irmãos... é isso?

Inf. – não era da moça... da moça que morava lá tamém... eu esqueci o nome dela

Doc. – E teu pai tem mais filhos ou só você?

Inf. – teve um tempo que falô assim que ele tava cum filhos... era gêmeos

Doc. – Mas você não sabe se é verdade?

Inf. – não... eu acho que sim... eu acho que é verdade...( ) eu não tenho certeza

Doc. – Que que você pretende fazer no futuro Ariane?

Inf. – quero trabalhá de veterinária

Doc. – E o que que você achou que tem que fazer pra conseguir isso?

Inf. – estudá bastante

Doc. – e você está disposta a estudar bastante?

Inf. – tô...

(( a informante fica emocionada e parece que vai chorar... a entrevista é interrompida por

cerca de dois minutos))

(...)

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Doc. – e você pretende trabalhar logo Ariane?

Inf. – sim... pretendo

Doc. – e você pretende / pretende trabalhar com o que?

Inf. – uh eu acho que eu vou querê trabalhá de babá

Doc. – De babá? Então você não está cansada de cuidar dos seus irmãos?

Inf. –não... não muito

Doc. – E você acha que/ ( ) com o salário de babá dá pra você viver?

Inf. – acho que sim

Doc. – Quanto você acha que ganha uma babá?

Inf. – eu não sei...não faço a mínima idéia

Doc. – Quanto você acha que precisa ganhar pra sobreviver bem?

Inf. – hum... ah...pra se vivê bem? acho que uns duzentos reais ta bom ((rindo))

Doc. –Duzentos reais? Quanto se/ vocês moram de aluguel ou casa própria ?

Inf. – de aluguel...

Doc. – e quanto paga de aluguel? Você sabe? Ou faz idéia de quanto paga?

Inf. – eu acho que é duzentos e cinqüenta

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Doc. – E como é que você quer ganhar duzentos?

Inf. – eu num sei

Doc. – Fala um fato importante que aconteceu na sua vida

Inf. - fato importante?... ah...

Doc. – Qualquer coisa de importante que tenha acontecido.

Inf. – qualquer coisa de importante?...

Doc. – Hum hum

Inf. – eu acho que foi querer voltá cá minha mãe mora... vir morá cá minha mãe...

Doc. – como que foi isso tudo?

Inf. – uh:::

Doc. – Conta a história pra mim

Inf. – contá a história? é eu tava morando com meu pai... aí não queria mais morá com

ele... queria voltá cá minha mãe...aí eu voltei ca minha mãe e foi bom pra mim

Doc. – Fala do dia que ela foi te buscar... você lembra?

Inf. – não... eu num lembro direito...

Doc. – e você lembra porque você queria voltar a morar com ela?

Page 72: Amostra do Português Popular

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Inf. – não...

Doc. – Fala tudo que você faz no dia desde que você acorda até a hora que você vai dormir

Inf.- tomo café... dou café pros meus irmãos... banho na minha irmã... arrumo a casa...

depois arrumo almoço...i::: depois vô assisti... se a casa tive terminada ... se tive ropa pa

passa ( ) aí depois dá a hora da janta... arrumo a janta...aí se tive um filme pa passa eu

assisto... e vô durmi

Doc. – Arrumar a janta é o quê?

Inf. – arrumá a janta? é fazê coMIda... o arroz fejão... com alguma coisinha

Doc. – e que coisinha?

Inf. – ah uma mistura... uma mistura... uma salada... um suco

Doc. – você sabe fazer tudo Ariane?

Inf. – não

Doc. – O que que você sabe?

Inf. – o que eu sei fazê? um arroz... fejão... um ovo... um bife... um frango... uma coisinha

básica... não sei fazê nada de frescura

Doc. – O que que é frescura pra você?

Inf. – ah uma coisa cheia de de de: :: ingrediENte... cheia de negocinho... eu num consigo

Doc. – O que que você mais gosta?

Page 73: Amostra do Português Popular

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Inf. – de fazê?

Doc. – Hum hum

Inf. – eu acho que é macarrão mesmo... macarrão cum lingüiça

Doc. – isso é o que você mais gosta de comer?

Inf. – é...

Doc. – E você está cansada desse dia a dia... de cuidar dos irmãos... fazer comida? Que que

você queria mudar da sua rotina?

Inf. – de vez em quando cansa sim... um poco... ( ) o que eu queria mudá na minha

rotina?... é::: ... acho que é saí um pó: :: co assim... passeá...me diverti um poquinho

Doc. – ter mais amigos?

Inf. – é tamém...

Doc. – pra você/ e namorado... como tem que ser um namorado pra você?

Inf. – tem que sê cariNHOso... roMÂntico... bonzinho... não tem que sê cheio de

frescurinha... (não) pode sê maloquero...

Doc. – Como que é um namorado maloqueiro?

Inf. – é::: ... é que ma/ fuma... que fuma: :: maCOnha...( ) cigarro... que bebe... que que: ::

que apronta... que faz piche... essas coisa...

Doc. – Você conhece alguém assim... não?

Page 74: Amostra do Português Popular

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Inf. – não

Doc. – não? ( )

Inf. – não... acho que não

Doc. – na escola não tem ninguém assim?

Inf. – ah tem mais eu... num falo muito cum eles não

Doc. – fala uma coisa pra mim, é se você começar a trabalhar o que que você acha que vai

mudar na sua vida?

Inf. – o que eu acho que vai mudá na minha vida?... uh... eu acho que... eu vô saí mais...

que eu vô tê bastante amigos no trabalho tamém... assim...

Doc. – Mas se você vai trabalhar de babá você vai cuidar só de uma criança... como você

vai ter amigos?

Inf. – ah... vô passeá com ele... ((rindo)) ca criança... sei lá... ( ) conheço lá na casa da

pessoa... é vô tê amizade cos pais dele tamém...

Doc. – e você não tem dó de deixar seus irmãos?

Inf. – ah tenho...mais...mais eu num vô tá dexando eles... vô acabá veno eles tamém...

Doc. – Mais aí é outra pessoa que tem que cuidar?

Inf. – é: :: ( ) pa creche vão pa escola tamém

Doc. – O que que você mais gosta na sua vida Ariane?

Page 75: Amostra do Português Popular

75

Inf. – que que eu mais gosto na minha vida? ... ah::: num sei... minha mãe... minha

família... é isso aí...

Doc. – E o que você menos gosta na sua vida?

Inf. – o que eu menos gosto... é... ah o que eu menos gosto eu num sei não... acho que nada

Doc. – Não tem nada que você não goste?

Inf. – eu acho que não... acho que não tem não...

Doc. – Qual que é o seu sonho?

Inf. –Sonho de que?

Doc. – Sonho de tudo...de ter... o que que você queria ter?

Inf. – o que eu queria tê? Ah... o que eu queria tê?... é eu acho que tá bom o que eu tenho já

Doc. – Não tem nada que você queria ter e não tem?

Inf. - não... tem não

(( a informante mexe no microfone))

Doc. – mas que estranho... uma moça de quinze anos... não tem vontade de ter nada?

Inf. – eu te:::nho... tenho vontade de... de::: de tê um cachorrinho... de viajá... de tê (os)

carro...assim

Doc. – Agora melhorou, poxa... como assim não tem vontade de ter coisa nenhuma? Tem

vontade de ter um cachorrinho? ( ) você nunca teve um cachorro?

Page 76: Amostra do Português Popular

76

Inf. - tive... tive um monte já...

Doc. – E aconteceu o que com eles?

Inf. – teve uma que morreu... teve uma que(minha mãe) teve que dexá lá... a maioria... eu

acho que a maiori/ é teve umas que minha mãe teve que dá... uma morreu...

Doc. – E teve que dar por quê?

Inf. – porque a casa não aceitava cachorro...

Doc. – e alguma dessas cachorro/ desses cachorros que sua mãe teve que dá era seu?

Inf. – era... a maioria era

Doc. – E... como que foi deixar o cachorrinho ir embora?

Inf. – foi ruim... foi triste... eu senti muita falta... que eu queria continuá com eles... mas

num podia...

Doc. – E você ...ficou chateada com sua mãe?

Inf. – um poquinho... mas num podia ... fazê o quê?

,

Doc. – Você não ligou muito?

Inf. – ah liguei né? mas... o que num podia fazê... num podia tê...

Doc. – Você disse que quer ser veterinária... então você não gosta só de cachorro... que

mais bicho você gosta?

Page 77: Amostra do Português Popular

77

Inf. – ah eu gosto de gato... de passarinho... gosto de bastante animais... gosto de de de de

tigre... gosto de golfinho... gosto de bastante

Doc. – e desses animais quais você já viu?

Inf. –qual que eu já vi? eu já vi o tigre... e o passarinho... gato... ((rindo))

Doc. – tigre... passarinho... gato e o que mais?

Inf. – é eu acho que é só esses... tamém...

Doc. – E você acha que um veterinário faz o quê?

Inf. – cuida dos animais...

Doc. – cuida como?

Inf. – ah... se tive doENte... ele cura... tem que dá banho... sei lá... alguma coisa assim...

tosá...dá a vaCIna

Doc. – você deve ter visto por aí muito animalzinho abandonado... né Ariane? Que que

você faz?

Inf. – que que eu faço... como assim...

Doc. – quando você vê os animaizinhos abandonados... como que fica?

Inf. – como que fica? eu tenho vontade de levá pa casa...((rindo))

Doc. – Já levou algum?

Inf. – se eu já levei algum? não...poque minha mãe não vai dexá

Page 78: Amostra do Português Popular

78

Doc. – você tem medo da sua mãe?

Inf. – se eu tenho medo da minha mãe?... ah um poquinho

Doc. – Você tem medo dela fazer o quê?

Inf. – dela brigá...(rindo)

Doc. – e quando ela briga ela (fica como)?

Inf. – ela fica nervosa...

Doc. – Mas você não apanha não?

Inf. – agora não

Doc. – Mas já apanhou?

Inf. – já

Doc. – conta um dia que você apanhou por algum motivo assim... alguma coisa que você

aprontou

Inf. – que eu aprontei?... quando eu era menor...tava ca minha colega... eu queria escutá::: a

fita e pega a minha boneca pa gente brincá... aí a gente procurô uma chave que tinha lá ...

abriu a porta... aí ela chego... abriu ela me bateu

Doc. – que fita?

Inf. – a fita de de::: do é o tchan... que a gente queria dançá

Page 79: Amostra do Português Popular

79

Doc. – Aí como /eu num eu num entendi direito a história...como é que foi? Você queria

pegar a chave? Eu não entendi direito

Inf. – eu queria pegá a boneca e a fita e a porta tava trancada... e a gente procuro a chave

que tava lá na casa do vô dela e abriu a porta ... na hora que minha mãe chego ela brigô...

((fim do lado A – 30 minutos ))

Doc. – me explica direito, a... a fita estava na sua casa... e a chave estava aonde?

Inf. – a chave tava na casa do vô dela que morava... o vô dela... a mãe dela... a uma... eu

acho que era... irmã... eu num sei direito... e a chave tava co/ na casa do vô dela.. a gente

foi lá na casa do vô dela e pegô a cha/ e procurô um a chave parecida com a nossa...cá

chave da minha mãe... minha mãe tinha levado a chave... tava trancado eu tava na casa da

minha amiga... aí eu fui lá... procurei a chave... e abri a porta ... na hora que minha mãe

chego ela brigô...

Doc. – E teve alguma vez que você apanhou sem motivo?

Inf. - não.. não teve nenhuma...

Doc. – seus irmãos apanham também?

Inf. – sim... quando eles aPRONtam... desobedecem sim

Doc. – Que que eles costumam aprontar? Fala da pequenininha... o que que ela costuma

aprontar?

Inf. – ah ela pega as coisas que não POde... ela mexe na água num pode... essas coisinhas...

Doc. – só assim pouquinho que ela faz? Não faz nada assim mais?

Page 80: Amostra do Português Popular

80

Inf. – que ela faz mais de::: terrível? ... ai... no momento eu não tô lembrando de uma coisa

assim... que ela já fez de tão terrível...

Doc. – Não... não precisa ser nada tão terrível... conta um/uma história assim que aconteceu

com ela...que ela fez que te deixou preocupada

Inf. – ai teve um dia que ela subiu a escada e::: o portão tava aberto e ela foi pará lá na

rua...((rindo))

Doc.- Foi parar na rua?

Inf. – é (rindo)

Doc. – e a rua que você mora é é perigosa?

Inf. – é ... é pa/ é tipo de uma avenida... sorte que... o dono da casa tava no portão ele viu...

aí pegô ela...

Doc. – essa rua aqui de cima é perigosa?

Inf. – é... é passa muito carro... ônibus... moto.. é

Doc. – Aqui passa ônibus também? Que ônibus?

Inf. – eu não sei o nome não...((rindo))

Doc. – nunca pegou esses ônibus daqui?

Inf. – não... só uma vez... só uma vez que/ só uma vez só pa comprá ropa que eu peguei...

Doc. – sozinha?

Page 81: Amostra do Português Popular

81

Inf. – não... com meu/ ca minha mãe... ca minha mãe... o leandro e meus irmãos...

Doc. – Leandro? Leandro quem é?

Inf. – o namorado da minha mãe...

Doc. – Você falou, né? Já no começo que é o namorado da sua mãe... você falou que ele é

legal...tudo... que que tem/ fala uma história que aconteceu com ele

Inf. – uma história que aconteceu com ele? ...ah eu não sei uma história que aconteceu cum

leandro...

Doc. – Com ele e com você... claro... uma história interessante... que já tenha oco/

ocorrido... com vocês... todos

Inf. – uh: ::... acho que não tem nenhuma não... é eu acho que não tem não

Doc. – Não tem nada? E uma história que tenha acontecido lá na casa da sua avó?

Inf. – na casa da minha avó? ... uma história que tenha acontecido... é eu tava brincano cas

minhas amigas... aí já tava ficano tarde eu num queria entrá... aí minha avó foi me

procurá... aí eu me escondi pra ela num me pegá...

Doc. – E se escondeu aonde?

Inf. – me escondi atrás dos prédio... aí teve uma hora que ela me achô e brigô...

Doc. – Brigou com você?

Inf. – é

Doc. – E quando você vai pra lá seus irmãozinhos vão também? Não?

Page 82: Amostra do Português Popular

82

Inf. – só o jhonatan e de vez em quando... não é sempre

Doc. – E quando ele tá lá é melhor ou pior?

Inf. – hum ... num faz tanta diferença... acho que é a mesma coisa

Doc. – E você tem que ficar cuidando?

Inf. – não porque ele fica com os amiguinhos DEle... e ele num fica aprontano muito lá...

que ele obedece minha bisa...

Doc. – sua irmãzinha não apronta quase né? A única coisa que ela fez foi parar lá na rua

né? E seu irmão?

Inf. – meu irmão?... meu irmão ele desobedece basTANte... fica enchendo o SAco... irrita

as pessoas... irrita bastante eu e a iasmim

Doc. – Por quê?

Inf. – eu acho que ele gosta... sei lá

Doc. – Mas o que que ele faz pra te irritar?

Inf. – ah ele fica provocano...enchendo o saco...aí de vez em quando ele fica na frente da

teevisão e eu quero assisti: :: essas coisinhas... assim

Doc. – Ele fica na frente da televisão só pra você não assistir e brigar com ele?

Inf. – é... aí ele fica provocano essas coisinhas pequenas

Doc. – e você acha que... você acha que sua mãe tem que ter mais filhos?

Page 83: Amostra do Português Popular

83

Inf. – não...

Doc. – você quer ter filhos? ariane?

Inf. – quero... quero te quero... eu acho que eu quero tê u/ tê um ou dois... no máximo

dois...

Doc. – E você pretende casar cedo?

Inf. – não... eu acho que lá pelos trinta anos eu vô casá...

Doc. – Trinta? E... vai esperar trintar pra casar?

Inf. – é...

Doc. – Como que tem que ser um marido pra você?

Inf. –um marido? tem que ser trabalhador... bonzinho... num pode sê chatu ... é tem que ser

romântico tamém... bonito... forte...assim

Doc. – Você é bem altona né? Pra... um namorado seu tem que ser altão também ou não?

Você acha que isso não faz muita diferença?

Inf. – tem que sê altão? não... tem que passá um poquinho de mim só

Doc. – Então tem que ser altão né?

Inf. – ah num tem que sê tão ALTÃO... assim também... num pode também sê baixinhu...

Doc. – Por quê?

Page 84: Amostra do Português Popular

84

Inf. – Porque senão fica chatu ... num tem graça... aí eu vô sê mais alta? (rindo)

Doc. - Você acha que essa coisa da aparência é tão importante assim Ariane?

Inf. – não... não...

Doc. – O que é mais importante?

Inf. – acho que é mais importante: :: é: :: ... o que a pessoa é pu dentro... não o que é por

fora assim...

Doc. – mais importante é o que a pessoa é por dentro... mas você não quer namorar com um

com um baixinho... como é que fica?

Inf. – ah cum baxinho tamém não...((rindo)) pode ser até feinho ... mas baxinho não

Doc. – pode ser feinho?

Inf. – mas baxinho não

((risos))

Doc. – Que tipo de homem você acha bonito? Fala/ me dá exemplo assim da televisão

Inf. – que tipo de homem que eu acho bonito?... o leonardo di caprio... uh: :: xeu vê: :: é

que eu num sô muito boa pa nomes... uh: :: o urubu tamém é bonito...

Doc. – Quem?

Inf. – o urubu... da malhação... ((rindo))

Doc. - Ah é? Você assisti malhação?

Page 85: Amostra do Português Popular

85

Inf. – assito...o miguel também da novela...

Doc. – Qual novela?

Inf. – rebelde...o diego...tamém...

Doc. – que tipo de coisa que você gosta de assisti...além de / você já falou que gosta de

assistir malhação? Aliás que que tem na malhação que você gosta?

Inf. – ah que é uma novela mais pra jovens... eu gosto de novela assim

Doc. – Como que é a novela?

Inf. – é uma novela de JOvens... uh::: ... uh::: ah... é uma novela/ ah eu num sei explica

como é que é a novela...((rindo))

Doc. – E o que acontece?

Inf. – que que acontece? ah eles estudam num colégio... aí de vez em quando acontece

umas maldades... outras não...

Doc. – Que que você acha que são as piores maldades que pode acontecer com um jovem?

Inf. - as maldades que pode acontece cum jovem? ah tipo o que o urubu faz... separá um...

casal...assim... sendo que ele nem gosta muito dela de verdade... é o que eu acho

Doc. – E o que que ele faz pra separar o casal?

Inf. – ah ele apronta... fala que/ é: :: droga o menino pra falá que ele traiu a outra...que ele

paga ela pra trair

Doc. –E você acha que na vida real acontece essas coisas também ariane?

Page 86: Amostra do Português Popular

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Inf. – eu acho que sim... sei lá... (vai lá sabê )

Doc. – Você já viu acontecer alguma coisa assim?

Inf. – não... eu acho que não... não vi não...

Doc. – Fala um fato que aconteceu com... alguma colega sua assim de... amoroso... ou

então com você mesmo né?

Inf. – comigo? comigo não... co/ ca minha colega?... ah eu já ajudei minha colega a ficá

cum menino

Doc. – Conta essa história pra mim

Inf. – ah ela tava a fim dele... aí eu fui lá conversei com ele... aí veio as meninas tamém me

ajudaram... aí eles ficaram junto... aí de vez em quando... como ele era tímido... de vez em

quando eles num ficava... aí a gente ia lá e dava uma forcinha...

Doc. – O que que vocês falavam?

Inf. – ah a gente ia lá ... levava eles pra ficá e depois dexava eles sozinho

Doc. –e apresenta/ mostrava um pro outro, é isso? ((rindo))

Inf. – é ((rindo))

Doc. – E você precisa de uma forcinha também pra arrumar um ficante?

Inf. – ah sei lá... acho que não

Doc. – Você disse que já ficou uma vez né?

Page 87: Amostra do Português Popular

87

Inf. – já

Doc. - E como é que foi isso aí?

Inf. – ah a gente/ foi no final da aula... a gente entrô dentro da sala e ficô

Doc. – E ele era da mesma escola então?

Inf. – era da minha sala

Doc. – E como é que ele era?

Inf. – ah ele era branco... alto... meio assim... é: ::... meio pleiboizinho...é... olhinho azul...

cabelo castanho es escuro...

Doc. – já ficaram zoando você na escola ariane?

Inf. – já

Doc. – Como que foi? Conta pra mim

Inf. – ah foi ruim... é chato as pessoas ficarem zuando com você

Doc. – e o que que eles falaram?

Inf. – ah eles me chamaram de gordinha... de cabelo de bombril...

Doc. – e você zoa com alguém?

Inf. – zou

Page 88: Amostra do Português Popular

88

Doc. – E o que que você fala? Com quem você zoa e o que você fala?

Inf. – é eu só zuo com as pessoas que mexem comigo também...igual aquelas pessoas que

estão queta eu num vô zua com elas

Doc. - E o que que você fala? Com quem que você já zoou e o que você falou?

Inf. – ah já zoei com um gordinho ele veio mexê comigo...((rindo)) aí eu chamei ele de

gordinho... baleia... saco de areia... essas coisa

Doc. – e na escola acontece muito isso?

Inf. – acontece

Doc. – já aconteceu alguma coisa assim que deu realmente problema por causa de um zoar

com o outro?

Inf. – teve um... teve um... um tempo que: :: as meninas tava abaixando a calça uma da

outra pa os menino ver a calcinha...aí e/ o diretor acabô vendo uma das meninas e levô ela

pa diretoria

Doc. – E aí? Aconteceu o que?

Inf. – aí ( eu )/ ela foi suspensa e chamaram os pais dela...aí as outras meninas tamém que

tava fazendo isso eles tentaram procura pa levá e/ pá levá elas tamém

Doc. – e você estava junto?

Inf. – não

Doc. – mas você viu?

Page 89: Amostra do Português Popular

89

Inf. - vi

Doc. - e aconteceu o que com essas meninas?

Inf. – ah elas foram suspensa e... chamaram os pais dela pa conversá...

Doc. – Só isso? Depois continuaram lá?

Inf. – é... mais depois elas pararam...

Doc. – e chegaram a abaixar a sua calça?

Inf. - uma vez só...

Doc. - E aí? Como é que foi?

Inf. – aí fui conversá com o diretor... aí ele procurô a menina e levô ela pa conversá...

Doc. – E sua mãe ficou sabendo?

Inf. – NÃO ...

Doc. – Você não conta as coisas que acontecem na casa/ na escola pra sua mãe?

Inf. – ah só quando é uma coisa GRAVÍssima assim...

Doc. – tipo?

Inf. – ah tipo: :: ... ah os menino/ sei lá... alguém tentá me batê... alguma coisa assim... ficá:

:: arrumando turminha pa brigá...e já aconteceu isso com uma menina

Doc. - E como foi?

Page 90: Amostra do Português Popular

90

Inf. – a menina da minha sala queria batê nela e a ela num fazia nada... ela só/ ela é: :: ela

só olhava pra menina e ela achô assim que tava carando/.encarando ela... arrumo uma

turminha pa batê nela teve que ficá perto do diretor pra num acontecê nada com ela...

porque senão ela ia apanhá...

Doc. – e você já brigou na escola?

Inf. – não...

Doc. – Nunca? Está com cara de quem brigou, hein?

Inf. – não... nunca briguei... eu tento me: :: me afastar de de: ::... de briguinhas... de

turminha assim que gosta de encrenca

Doc. – E sua turma como é que é?

Inf. – minha turma? tem alguns bagunceiros... tem alguns estudiosos... tem alguns que é

mais ou menos... que de vem em quando bagunça... de vez em quando fica queto... tem

aqueles safados tamém...((rindo))

Doc. – Safados quem são?

Inf. – ah os meninos... ficam passando a mão na bunda das meninas... ficam mexendo

Doc. – Já aconteceu alguma coisa assim com você?

Inf. – só uma vez... mas aí depois eu briguei com o menino... ((rindo)) e não aconteceu

nada mais...

Doc. – Que que ele fez?

Page 91: Amostra do Português Popular

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Inf. – ele passô a mão ni mim... eu briguei com ele... ele num... veio mexê mais comigo

Doc. – Aí você falou o que pra ele?

Inf. – ah eu briguei... xinguei ele... bati nele... aí ele nunca mais mexeu cumigo...

Doc. – e ele era da sua sala?

Inf. – era...

Doc. – folgado, né?

Inf. – hum hum... é...

Doc. – Mas você brincava com ele antes pra ele fazer isso? Ou não?

Inf. – não... não porque de vez em quando os meninos quando mexe cas menina num tão

nem aí (se eu falo) com eles ou não

Doc. – Então na escola é jogo duro né? Que que é a parte melhor da escola e que que é a

pior?

Inf. – a parte melhor da escola?... uh: :: ...a parte ruim são... aqueles menininhos chatos... a

parte melhor... ah a parte melhor eu num sei... ((rindo))

Doc. – Não tem nada de bom na escola?

Inf. – a parte bo/ boa na escola? ... ah tem os amigos... aqueles professores legais... assim...

as aulas tamém que são legais

Doc. – Como que é um professor legal?

Page 92: Amostra do Português Popular

92

Inf. - ah um professor bonzinho... que num pega muito no pé... que num é muito chato...

muito exigente...

Doc. – Que que os professores exigem de vocês?

Inf. – exige/ ai de vez em quando tem alguns professor que fica pegano no pé sendo que a

gente num faz nada...já aconteceu comigo

Doc. – O que por exemplo? Conta essa história aí do que já aconteceu com você...

Inf. – ah a a professora... o nome dela era Cecília... ela/ ela ( ) eu nunca fui ca cara dela

tamém... e ela tamém nunca foi ca minha ... a gente ( ) se dava muito bem não... pegava

muito no meu pé... ela ( ) tamém num obedecia muito ela

Doc. – E o que que ela fez?

Inf. - que que ela fez? ah ela era muito chata... ela fi/ qualqué coisinha que eu fazia olhava

pro lado ela já tava... brigando comigo

Doc. - E você?

Inf. – ah eu tinha que ficá queta... num podia fala ( ) sem nada...

Doc. – Ela era professora de que?

Inf. – ela era professora de tudo

Doc. – tudo?

Inf. – é

Doc. - que série que foi?

Page 93: Amostra do Português Popular

93

Inf. – foi na na... eu acho que foi na terceira... eu num tenho certeza não... é foi na terceira

porque na segunda eu ainda tava ca outra (professora)

Doc. – E agora...na sexta/ se/ você não chegou a fazer a sétima série não é isso?

Inf. – eu só fiz o começo?

Doc. - só o comecinho?

Inf. – só o começo

Doc. - E agora na sexta... série... na quinta... como que era?

Inf. – como é que era? ah era mais como::: como era... na sétima tamém... só que na sétima

teve umas diferença porque eu/ é: :: no começo a gente tinha que mudá de sala... e depois

era os professores que ia mudano

Doc. – Os professores que mudavam? E vo/ no começo vocês que iam mudando de sala?

Inf. – é ma... é mais num deu certo porque de vez em quando os alunos se escondiam no

banheiro pa num / pra num i pra aula... aí depois eles começaram a fazer o professor... é: ::

mudá de sala

Doc. – E você... já se escondeu no banheiro também ou não? ((rindo))

Inf. – não... num me escondi não

Doc. – É... no dia a dia da aula Ariane... é muito cansativo? Quantos professores são...

quantas matérias... que/ como que é a avaliação?

Page 94: Amostra do Português Popular

94

Inf. – uh: :: professora ce é/ professoras de todas as matérias... tem professor de portu/ de

português... de matemática... ciências... histórias... ah: :: ... ai... ah... ah otro eu num lembro

Doc. – Quantas matérias eram?

Inf. – pêra aí... eu acho que era cinco

Doc. – só cinco?

Inf. – é

Doc. – E como que era a avaliação?

Inf. – avaliação?

Doc. – Tinha que fazer trabalho... prova? Como é que era?

Inf. – tinha...tinha um/ é num era TANta prova assim... era mais no final do ano que tinha

prova... uhm: :: e trabalho ... trabalho era bastante que os professores dava

Doc. – e você chegou a fazer bastante trabalho em casa ou não?

Inf. – sim...de vez em quando era im/ em grupo... e como eu não sabia onde que...minha

colega morava ela fazia sozinha

Doc. – E botava seu nome?

Inf. - é... de vez em quando eu fazia pra ela... assim ( )

Doc. – fazer em grupo mesmo não dava certo?

Inf. – não... uma vez eu tentei mais aí... num deu pra ela ir porque ela num... num

Page 95: Amostra do Português Popular

95

achô minha casa... aí eu tive que/ aí... ela fez sozinha e eu num fiz...

Doc. – Qual que é a profissão da sua mãe Ariane?

Inf. – ela é custurera

Doc. – E você... quer ser costureira também algum dia? Já pensou nisso? Você já falou que

quer ser ba/ que pode ser babá... falou que quer ser veterinária... mas já pensou em ser

costureira também ou não?

Inf. – não... nunca pensei não...

Doc. – O que que você acha dessa profissão?

Inf. – ah... uma profissão boa ... sei lá... mas eu nunca pensei em ser custurera... nunca

passo pela minha mente assim... sê custurera...

Doc. - (por quê)

Inf. – porque: ::... ah porque eu nunca parei pa pensar em sê custurera... só parei pa pensá

nas outras coisas assim ... custurera não...

Doc. – Costureira você acha que pode ser muito cansativo?

Inf. – eu acho que sim... pelo estado da minha mãe sim... de vez em quando ela chega

muito cansada

Doc. – ah é?

Inf. - é

Doc. – Que que/ qual / fala um defeito e uma qualidade da sua mãe

Page 96: Amostra do Português Popular

96

Inf. – u: ::ma qualidade... (xeu vê)... u: ::ma qualidade que de vez em quando ela é

boazinha... e: :: um defeito... que de vez em quando... é: :: ela num dexa eu fazê as coisa

assim que eu quero... é...

Doc. – Quando ela é boazinha ela faz o quê?

Inf. – quando ela é boazinha? de vez em quando ela tá de bom humor ... de vez em quando

ela tá de mal humor...

Doc. – quando ela está de bom humor como que ela é/ faz? O que que ela faz?

Inf. – ah ela é brincalhona... conversa... ela faz palhaçada...((rindo))

Doc. – e quando está de mal humor?

Inf. – quando ela tá de mal humor ela fica mais deitada na cama... assistindo televisão...

não quer mais nem conversá...((rindo))

Doc. – E você quando está de mal humor?

Inf. – quan/ ah... não é MUIto... não é sempre que eu tô de bom humor...

Doc. – Não é sempre que você está de bom humor ou de mal humor?

Inf. – de mal humor

Doc. – E du/ você geralmente está de bom humor... então?

Inf. – é...

Doc. – E aí? Como você é?

Page 97: Amostra do Português Popular

97

Inf. – como eu sou de mal humor ou de (bom) humor?

Doc. – De bom humor

Inf. – de bom humor? ah eu sou boazinha cos meus irmãos...de vez em quando eu tô de mal

humor eu fico mais chata

Doc. – E aí você faz o que?

Inf. – eu tenho que ficá queta pa num fica brigano cum eles...

(( o irmão da informante puxa o fio do telefone. A entrevista é interrompida))

4.1.3 – Entrevista 2 - Informante 3

Doc. Bom, Fausto, fica à vontade, é uma conversa informal, tá?

Inf. nós vamos começar por onde?

Doc. Por onde você quiser (...) fala um pouco sobre a sua vida, né?

Inf. dos oito ano?

Doc. Humhum...

Inf. Eu estudei em duas escola até hoje, eu fiz ó, comecei na... Na... No pré, primeira,

terceira, quarta, quinta, aí mudei pra/ morei doze anos na penha, depois da penha fui morá

em poá, motivos financeiro, o aluguel começô a ficá muito caro aqui em são paulo

Doc. Sempre morou com a sua família?

Inf. humhum ((afirmando)). o custo de vida começô a ficá alto, alto, alto, alto, alto, então

meus pai decidiru achá que era melhó morá em/ um poco mais afastado de são paulo mas

Page 98: Amostra do Português Popular

98

um lugar mai barato a condição de vida era melhor e... na época foi beneficiado, tinha uma

água mineral grátis da água poá

Doc. É? ((risos))

Inf. a melhor água do planeta! cê molhava todo mundo, a garrafa poá! depois de lá pra cá

eu completei dezesseis, dezessete ano comecei a a aprontá algumas besteira na vida, tinha

ido com treis ano de de de de cadeia, aí depois de lá pra cá eu saí, criei um poco de juízo...

um poco, né!... aí me chamaro pra catá papel na rua, aí eu falei ah, dá dinhero? ele falô dá!

dá pra sustentá, meu, a maioria do pessoal que trabaia lá consegue sustentá a família, mãe,

filho, consegue pagá o aluguel... eu vô, vô dá uma olhada... aí fui, dois dia tá certo... dexei o

JUCA na boa aí e escuta mano, vô trabaiá, pra mim tá opinando o dinhero e... e me

sustentá. na época meu vício era vídeo game e futebol num dá pra eu sustentá. num dá pra

eu chegá no bar e comprá um cigarro né? nesse meio tempo conheci a MICHELA, ela

morava sozinha, tava morando cum meus irmão, começamo a namorá, uns dois meis nóis

tava morano junto já, a gente nem/ sem percebê, assim, já tava morano junto, já cum as

coisa grudado na outra, aí ela falô assim é isso memo qui cê qué da sua vida? eu falei meu,

já tô no barco meu, vambora! aí passô menos de um ano meu, já existia a cooperativa aqui

já, o projeto mesmo existia já o... dois anos atrais, eu vô dá uma olhada naquilo ali meu.

nesse meio tempo tinha um conhecido dela, da michela, que trabalhava aqui, até o LUIS, tá

até hoje, falô não fala pra ele dá uma passada lá conversá cum a dona INEGI, co sinhor

NATAN, co nobu, se tivé lá, o pessoal vai consegui incaxá ele lá, aí peguei e conversei co

nolei... conversei cum ela um dia e falô não, pode voltá aqui no otro dia. eu lembro até o dia

até era dia quinze de abril de dois mil e quatro, não, pode voltá aqui no otro dia, intão tá

bom. voltei ela falô assim, ó seu box é aquele ali aí um dia cê toma conta do box. mantê ele

limpo, joga o seu lixo fora, e eu vou se dar muito bem, hum, beleza. aí como eu já tinha um

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99

conhecimento já cum o sistema da reciclagem, aí fui convidado pra trabalhá na

administração, junto com os catadores, aí era co ricon junto, aí passou um tempo enjoamo

da cara dos cara do otro lado, vim trabalhá sozinho. aí fizemo a revisão separamo as coisa

minha aí, sinti uma pancada da adminintração do projeto quase todo aí eu e o GIVANILDO

e um otro colega nosso que trabalha aqui, hoje tá jogando bola. aí passamo a tomá conta e

vai pra cá e vem pra lá e vai pra cá e vem pra lá. aí o FRANGO aí tamém deu uma

assistência boa pra nóis uma, né, deu um empurrão bom pra nóis falou nossa ganhei esses

rapaizinho como que vamo fazê? natan, a nedi, o bolo, o próprio emerson, vc conhece o

emerson? que trabalha lá em cima no ce fazendo hora? trabalhô aqui. o renato já foi

embora, vários otros catadores já passaram, acabou de í embora tamém esses dia o morildo,

ele falô que era muito trabaio pra ele ficá parado, porque é excesso de trabalho ficá parado,

ficá parado cansa! aí... resumino é... num consegue tê um ganho sustentável, quem ganhava

duzentos reais por semana na rua, em uma quinzena consegue fazê seicentos reais numa

quinzena, num mêis mil e duzentos reais, dependendo da estabilidade do papel até mil e

quatrocentos reais, num mês. então pra quem saiu duma penitenciária, cê chegô numa rua

do nada fazê nada pra comprá, num voltei pro crime, consegui me estabelecê hoje... eu me

sinto vitorioso, né! eu, particularmente, reclamo porque eu sô chato memo, né, quando eu

boto eu falo, reclamo que eu sô chato memo, porque se você tem a possibilidade de ganhá

duzentos, por que eu vô ganhá cem, né? então, graças a deus hoje eu tenho minha casa,

pago meu aluguel, crio meus muleque como se fosse meu, os cinco muleque, tenho uma

minininha, né, cinco meses agora, cinco meses/ ... tenho minhas coisa, tenho minha conta

no banco, dei um passo enorme, né. mais ainda tenho alguns poblemas ainda pra resolvê

ainda que num/ inclusive num prejudicô só a mim, prejudicô muita gente lá atrais tamém.

eu trombo co natan hoje em dia e ele fala meu nóis num sabe o que fazê se você num vem

Page 100: Amostra do Português Popular

100

trabalha, tal dia de vim trabalhá aqui meu. sexta-feira memo eu tava num corre-corre

danado aí atráis de dinhero pa fazê o pagamento do pessoal, sei qu’eu passei em ferraz,

dexei uma/ cheguei aqui nem almucei, saí fui pa otro banco, voltei, fui pa oto banco, voltei,

dento do ônibus, sei qu’eu conseguí almuçá era sete e meia da noite. aí eu cheguei em casa

tava a kika, falô onde cê tava? eu tava no banco, num tá vendo? falei ó, dinhero taí, fala pro

pessoal queu tô indo embora. onde cê vai? tô indo embora! não, num vô pagá... falei não, o

sr vai pagá porque eu tô indo embora, vô almoçá! aí fui aí no bar, almocei co rodrigo, o

senhor voltô, falei voltei, pagá um pessoal que tem que pagá, mandamo la o papel do banco

onde tem a conta no bradesco, aí distribui o dinhero, aí todo mundo saiu dando risada, que

nóis tinha combinado de fazê um pagamento tipo assim, fecha a quinzena dia quinze, ia tê

que pagá ou pro dia vinte ou dia vinte e um, dependendo do dia que cai o feriado, sábado i

domingo, intão eu posso dá um nó no baguio mesmo queu num vô pagá tudo duas vezes,

pra num tê qui falá uma coisa, uma pessoa que não adiantava na mão de todo mundo, ó taí

ó, né, porque nóis era/ suprimindo a falta que já seis mil reais que já tinham robado da otra

vez... um com o próprio emerson. por que que ele foi embora daqui? é, porque ele, ó, ele foi

robado aqui aí ele caiu pa rua, quano ele tá subindo pra í embora pra casa os cara roba ele

de novo. aí falô não pô parei. num tinha dado certo de prima, num tem condições! tá vindo

educador novo aí, o pessoal novo aí, qui vai... se nóis consegue, né, reerguê isso aqui, tá

meio caído já por aqui. num é nem pela falta de dinhero, que esse material que cê vê aí, aí

é, dinhero rápido. cê vendeu ali, pegou aqui, pegou aqui, ele sai da lida e tem dinhero

rápido, a maioria dos otro pagamento é tudo à vista, né. só que cê num pode tá andano co

esse dinhero pra lá e pra cá, pra lá e pra cá, olhano o que cê tem no bolso, ah tô cum três

mil aqui vô lá na fêra, não, vô voltá, não... tem que catá ele aqui e vié aqui mandá po banco

lá, aí por esses pequeno motivo que nóis conseguimo abrí uma conta lá conjunta co

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bradesco lá, que a/ tem conta no bradesco, né, a andréa foi lá e conversô co pessoal do

banco, co gerente, até o caio uma ótima pessoa, aí a conta é no nome dos catadores aqui de

dentro mesmo. dia de pagamento cada catadô tem sua conta, seus ... seus cartão aí ele que

se vire cum seus ... lá, nóis se vira cos nosso, e hoje tá faltando é a briga co a prefeitura

hoje, entendeu, na eleição da marta num tinha essa briga, pelo contrário, era quando... nóis

tava muito bem obrigado aqui embaixo memo nóis até feiz uma reforma aqui, construiu

escritório, reconstruiu os box, tem que tê uma verba já pra isso já...

Doc. E o povo reclamava da Marta, né?

Inf. é. já tem uma verba pra isso já meu, foi feita pra isso! esse não ajuda não. esse é

tucano!

Doc. ((risos)) É, todo mundo tem defeito, né?

Inf. é, fazê o quê!

Doc. ((risos))

Inf. mas ocê num é palmerense! ((breve pausa)) aliás tem até uma verba, tava todo mundo

animado tal, ganhamo uma prensa, melhor projeto de cooperativa do brasil, nóis fomo um

dos melhores, tinha cooperativa do brasil intero, nóis ficamo lá em primero lugar no prêmio

da cenp. ganhamo uma prensa hidráulica e kit de ipi né. já tava tudo certinho já pa continuá

aqui pa nóis agilizá aqui aí veio a gestão do serra. aí veio andré matarazzo, cabô caçando

todo mundo, começaro a fechá depósito (...) aí. cê pode oiá aqui ó, aqui tem monte de (...)

só não veio pra cá porque não deu mais espaço que a metade do pessoal que foi dos

depósito tá aqui já, consegui acolhê todo mundo pra cá, só que não cabe todo mundo aqui

dento, e espaço eles não querem dá pro pessoal trabalhá, né? eles vem, conversa, não sei o

quê, não sei o quê, e acaba enrolando. fomo lá, fizemo a reunião, brigamo, discutimo,

fizemo passeata, fizemo num sei o quê, fizemo papelada pra prefeitura, e defendero um

Page 102: Amostra do Português Popular

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poquinho. aí o que eles querem fazê, eles querem montá uma mega cooperativa com duas

mil e setecentas pessoas, trabaiando para a prefeitura, qué dizê o cara ganhava mil reais

aqui ele vai ganhá quatrocentos reais.

Doc. [ Poxa!

Inf. entendeu? ah, mas os cara tão trabaiando... trabaia meu! a nossa finalidade é acabá cum

as carroça, também! é pra isso tem o caminhão! meu, a gente consegue tirá muito mais

rápido o material, coletá muito mais material, criá muito mais rápido, ia tê menas pessoas

na rua, menos tempo, consegue mais/ tá certo vai levá tempo, as carroça tão na rua aí é

quase cinquenta ano, vai levá tempo, sei que ocês precisam do cara, eliminá carroça,

precisa di um caminhão, e se a prefeitura integrasse junto conosco e conseguisse isso,

vamo, vamo fazê isso e isso, mas não, eles quisero do jeito deles, da manera deles, e a gente

vai ganhá o que eles quisé pagá. sendo que há cinco anos atrás a prefeitura num tava nem aí

pra quem catava papel. cê cata papel ó, faça bom proveito! e queira ou não queira agora

virô mercado de trabalho!

Doc. Virou, né?

Inf. é! vinte e oito por cento do material reciclado veio de pessoal que/ no interiô tá fácil

de lidá cum isso que cê vai ali não tão longe de poá, ferraz, ali, a prefeitura ajuda os cara,

pondo os caminhão, sabe o caminhão que faiz o recolho, tem acesso, tem jeito ó, é de

voceis, o material é todo de voceis, aqui já não acontece isso. tem treze centrais da gestão

da marta, treze centrais que funcionava muito bem obrigado, cada central tinha seis

caminhões pa recolho, hoje cada central tem mais/ tem mais caminhão na portaria aqui, tem

dois caminhão, as demais tem um caminhão pa rodá o dia intero pa coletá o material e pa

podê vendê esse material e nem isso dá. e trabaiá/ tava tirando seicentos reais por mês, é

um ganho sustentável, dava pra se sustentá, pagá o aluguel, a água e luz e comê, malemal

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mas dava. hoje o cara ganha lá trezentos reais, trezentos e cinquenta reais nem bem. num

tem material, o cara num consegue coletá material suficiente, o caminhão num faiz o

circuito todo, acaba complicano. e isso num prejudicô só eles lá da central, não, prejudicô

nóis aqui tamém porque se o caminhão deles lá fornecia, ajudava nóis aqui tamém. estocava

material que num guentava, falava manda pros núcleo. aí mandava pa portel, mandava pa

santo amaro, e mandava pra cá, pros dois núcleo aqui de vaz, ia distribuindo material,

entendeu, num beneficiava só centrais, beneficiava num todo, aí a prefeitura achô que tava

gastando muito cum isso, manda cortá, cortaro os caminhão, aí veio o megaprojeto que é

do, num é nem do andré esse projeto, é do juscelino, num sei se cê conhece o juscelino, o

secretário do andré matarazzo

Doc. Hum... não.

Inf. é um chatinho que vei lá da bahia, não, o cara é chato, veio lá da bahia e lotô o quadro

dele em cima da bahia, montô toda a tucanada, montô a coleta seletiva lá, leciona lá muito

bem obrigado, mas lá funciona! lá funciona! sabe por quê lá funciona? porque o sistema de

triagem é otra, o esquema de materiais lá são oto, e quando ele vei querê implantá isso aqui,

isso aqui já existia! bom ou ruim, carroceiro sem carroceiro, cum caminhão, cum carroça,

cum pirua, cum charrete, funciona, entendeu? eles tão quereno que quereno montá uma

grande cooperativa, cum os catadores tudo lá, diminuí o serviço dos catadores, num sei o

quê, num sei o quê, num sei o que lá, biriri, biriri, biriri, biriri... aí ele veio aqui, discutimo,

conversamo, intão tá bão, cêis num vão saí, não nóis num vamo saí daqui. do centro nóis

num sai! meu único ganha pão hoje que eu tenho aqui é no centro de são paulo, saí daqui

pra procurá o quê?

Doc. Tem que brigar mesmo, né?

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Inf. me mandá lá pro jabari, numa usina. uma usina coisa disativada lá há muitos anos, um

galpãozão lá enorme, o espaço é enorme, tem cinco galpão. o projeto é viável, é ótimo,

nossa, maravilha; mas pra quem num é do ramo, pra quem tá desempregado, taí opa vamo

trabalhá lá, opa. tão abrindo mil e setecentas vagas de emprego, é ótimo, né? pra

desempregado isso é ótimo, nossa, maravilha!

Doc. Mas pra quem já está na área...

Inf. peraí, se eu tivesse disimpregado, mano, eu era o primero a falá não, eu vou, começa

quando? mas é o seguinte amigo, eu não vô trocá aqui o certo aqui pelo duvidoso lá... que a

próxima gestão quem vai garantí quem vai sê o próximo prefeito? vai sê o serra, não? vai sê

a marta de novo? e aí?

Doc. Quem sabe, né?

Inf. a erundina? o próprio maluf?

Doc. ((risos)) esse que eleito...

Inf. [rouba mas faiz...

Doc. Não pode ser mesmo!

Inf. o cara ganhô onze por cento dos voto. e a população, tá mal da cabeça? dá onze por

cento de voto prum cara desse? aí tem uns maluco qui são fanático né?

Doc. Quem? É tradição, né? De anos é isso.

Inf. eu tava na mesa, na mesa de reunião lá na subprefeitura da sé, falei beleza, nóis vai pro

seu projeto, que garantia você me dá? ele ficou mudo na mesa. virei pro andré matarazzo e

falei que garantia você me dá? ah, num tem que tê garantia, falei lógico que tem que tê

garantia! que garantia que eu tenho que vô trabalhá pro/ vô passá o resto da minha vida

trabaiando e que que eu recebo aqui? é mas é assim o cooperado, falei não essa parte a

gente tem, amigo, fundo de cooperativismo nóis têm de monte! se moscar nóis tivé é um

Page 105: Amostra do Português Popular

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por semana, quero sabê que garantias eu vô de trombá você lá, junto cos demais catadores.

ah, num posso dá garantia, falei então sinto muito mas eu num posso largá um espaço lá

que praticamente é nosso por um que eu num vô tê certeza que é meu.

Doc. E que não é certinho, né?

Inf. aí fiz reunião cum o movimento nacional aqui, o pessoal da lapa aqui, veio aqui nessa

igreja aqui do lado aqui, conversou cum o pessoal aqui, pá, tem até uma bandera aqui

assim, é, andré matarazzo promete e safa catadores de trabalhá no centro, só que agora o

espaço num chegô né, pelo contrário, tem que pagá pra ficá. e ali mais na frente ali no

viaduto ali mais na frente vai tê um cinema, tem lá na parede, projetô na parede, falei

beleza mano, falei falô parece desenho animado, mano, isso pra quê? pros cara cherá

farinha. aí ele é, mas isso acontece, falei amigo, acontece de tudo lá, a mulecada robando

no farol vinte e quatro horas por dia, vagabundo fumando maconha, vagabundo não sei o

quê, vagabundo não sei o quê. vocês sabe que isso acontece, mano! agora cê qué tirá um

grupo que tá trabalhando lá honestamente, dignamente pra maloquerada tomá conta. falei ó,

a próxima veiz que o jornal descê lá vô sê obrigado a falá isso, falô cê num é loco, falei tá

bom intão, tô esperano só os cara descê. esses dia aí veio a equipe da cultura aí nóis

conversando cos cara, falei não, fica aí que eu vô usá a praça espanhola aqui, aí os cara foi

lá perguntá pra ele que que é uma praça espanhola? aí ele foi explicá, e tal, e tal,

Doc. [((risos))

Inf. [ mas na baixada do glicério? ele falou é, na

baixada do glicéiro! aí o repórter começô a olhá pra cara dele, ((risos)) começava a rí, sabe,

rindo tamém, é, tão debochando de mim, falei não, num tá debochando, só que é meio

complicado né meu amigo! por que cê num mostrô lá na paulista lá, ia ficá lindo! é, mais lá

num tá precisando disso, aí eu falei ainda!

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Doc. ((risos))

Inf. é, é, num é a primera veiz que ela num acende, falo é mano, cêis são muito chato, falei

ainda bem que nóis é chato! falei ó, você me fala isso, minha mulhé me fala isso, o guarda-

volume me fala isso, o trem me fala isso, todo mundo me fala que eu sô chato amigo! já tô

me acostumano com essa idéia, já! falô ô, cê é muito debochado, eu falei graças à deus!

não, porque eles têm mania de conversá com você assim tirando barato da sua cara, ele

acha que ele tá acima de você, e ele falô que ele tava acima da lei. falei é o seguinte, a

nossa lei lá embaixo lá quem faiz é nóis memo, pra sobrevivê no glicério quem faiz é os

catadores memo, entendeu? lá ninguém mete a mão nas coisa do otro puque sabe qual é as

consequência, e você não tem noção disso. ele é que num sei o quê, mas/ eu falei amigo, se

você fô lá tentá tomá o pão da mão dos cara, mano cê já viu uma guerra? não, não sei o

quê/ cê já viu uma guerra? aquele negócio de ... lá em cima lá, aquilo ali é fichinha, pedra,

pau, é fichinha! nóis aqui embaixo é mais pesado, cê sabe disso, convive no glicério, cê

conhece a área! aí o andré não, ele não conhece não, aí eu falei então manda ele num ficá

parado lá embaixo. ele veio aqui duas veiz ainda! veio aqui, começô a montá um grupinho

de catadô fazendo a mente das pessoa, não mas o projeto lá tá/ falei não não amigo, muito

obrigado fica cum seu projeto pra lá que eu vô ficá pra cá memo! tô muito bem ca

província! bom ou ruim nóis tem a província pelas costa! eles pode batê, brigá, xingá, nóis

tem a província! nosso maior iscudo hoje, queira ou não queira, pela sociedade, se gritá

aqui eles manda incômodo pra cá, como já veio,

Doc. [ é mesmo?

Inf. [ veio até incômodo pra

cá. pra brigá por nóis aqui. então qué dizê, então nóis pode subi na prefeitura, xingá a

prefeita, qué dizê, nóis num é loco de fazê isso, né, nóis num é loco né! mas nóis pode que

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num ia sê ixpulso, nóis temo proteção! queira bom, ruim malemal nóis briga aqui, chega

aqui, discute, mas é porque é proteção, eles nunca vão dexá a prefeitura entrá aqui e tomá

os catadores e levá pra otro lugar, nunca! muito pelo contrário, eles tavam cum nóis lá na

reunião lá, o ..., o natan, na época da província, depois eles foram lá conversá com o

pessoal da província, né, cum cum o frei mário, frei johanes, foram conversá e eles virum

que ali eles ia pô a mão onde num devia, né, tem a ação local do são francisco tamém, né,

depois tem a ação local da álvares penteado, que num era das melhores do mundo mas/ é

que a ação local quem toma conta é a manú, num sei se vc conhece a manú

Doc. Não conheço.

Inf. ele é dono mais ou menos de umas cinco empresa de reciclagem. empresa de

reciclagem. metade do material do centro de são paulo quem recicla é ele.

Doc. Ou seja, acaba recebendo coisas de vocês também né?

Inf. não, é tipo assim, nóis viemos na rua já alguns pontos de coleta, outros foi conquistado

com determinado tempo, tamo conquistando mais alguns, e nóis vai, faz entrevista,

conversa com o pessoal, prédio, escritório, e vai tentano agregá cada veiz mais ponto, mais

ponto, mais coleta, mais coleta, pa podê se mantê ali no nível das empresa, igualado cum

eles ali.

Doc. Então na verdade é concorrência?

Inf. é, concorrência desleal! eles chega cum dinhero, nóis vai na conversa, eles chega cum

dinhero! muito dos prédio de são paulo aí o material sai, mas é pago. ó, eu te dô tanto e cê

me dá o material/ cê vai conversá cum o faxineiro, tal, portero do prédio, cum algum dono

de algumas firma, olha, se cê cedê o material eu te pago tanto e vê aí. aí o preço que tivé de

mercado nóis paga! entendeu, ele falava assim, ó tô jogando isso aqui fora, o cara me pagá

cinco real, ah me dá os cinco reais eu levo isso aí! era ali, até onti era lixo! é uma

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concorrência desleal, que nóis num vai tê dinhero pra tá bancando isso. num tem nem

lógica tamém, se nóis já pega pra sobrevivê num tem nem lógica ficá bancando isso! cê

dexa uma caxinha ou ota, ô faxinero, ó uma caxinha aqui procê tomá um café aí final de

semana aí, deiz conto, quinze conto, cê dexa né meu amigo, até aí é troca justa, o cara vai o

trabalho lá, de buscá o material procê lá no fundo do prédio, voltá, muitos precisa até de

ajuda, que nem o dia que eu fui lá na perfumaria 2000. era uma perfumaria só, já abriu uma

otra loja em cima lá na rua direita, os cara falô retira os papel de lá tamém, e os cara vai lá,

tenta comprá, e os cara fala não não, nóis tamo trabalhando co cara já faiz treiz ano co cara

aí, o cara vem, retira, o que tivé que levá ele leva, num cobra nada por isso, pode tá

choveno, pode tá sol ele tá aí então o papelão é dele. tentaro/ falô que o manolo já foi lá

tentá comprá o material e ele falô não não, sem chance, nóis num vende, não, nóis dá. ele

falô assim ó, tem mais onze lojas espalhada por são paulo. se você conseguí arrumá um

caminho pro seu colega o papelão aí é seu. tem até em santos.

Doc. Olha só!

Inf. isso aí é, isso aí eu vô conquistano co tempo, né? já cheguei lá uma veiz pra buscá uma

caixa de papelão, uma caixa! encostá a carroça, tava lá pa mim já, uma caixa. falei só tem

isso? falô só. então brigado, (....) . noutro dia eu voltei lá daí ele falô pô meu, tinha um

monte de papelão aí dento aí meu, mas é o seguinte meu, eu tava fazendo um teste, se cê

vinha buscá memo ou só vinha quando tinha muito. agora nóis viu que cê, pode tê muito ou

pode tê poco, cê tá aqui buscano, então de hoje em diante o material é seu, todo seu. eles

(...) , agora os cara saem chegano no dinhero, dinhero infelizmente em são paulo fala mais

alto, né. o dinhero se tornô uma nota de cem, né? se cê tivé uma nota de cem cê acaba

virano um desses. em são paulo é meio complicada a situação. isso não acontece só aqui,

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não, em vários lugares de são paulo isso acontece. que nem, nóis conseguimo coletá aquela

empresa de valores, a rrj

Doc. Transporte, né?

Inf. é, transporte de valores. vem documentos, vem cheque picado, vem cheque inteiro, um

monte de/ vem dinheiro, aí... nóis pega ó tá aqui, manda de volta lá. na fmu já achamo até

euro, né. devolve. o cara ligô e falô ó mano, perdi um dinhero assim assim, deve tá aí no

meio do lixo, o rapaz achô, falô ó aqui, um bolo assim de euro. aí dona edith, liga pra

margarida, fala pra ela vim buscá o dinhero. entendeu, ele num tinha necessidade de

devolvê, ele achô! ele num roubô, ele achô!

Doc. É, a pessoa ganha confiança, né?

Inf. ele achô, cê falá é, se num quisesse devolvê qual é o pobrema, ele ficô admirado de tê

devolvido, falei meu amigo, nóis viemo buscá aqui o quê? ele falô papel! falei intão pronto!

eu ganho dinheiro catando papel, intão pra mim

Doc. E olha que a confiança não tem dinheiro que paga, viu?

Inf. ah, entendi. hoje nóis tem acesso livre né, nóis chega lá, nóis entra, nóis sai, nóis dá a

volta, nóis sobe no prédio, nóis desce, chega o cara e fala assim ô, nóis vei retirá o material.

o portero faiz assim ó, senta na cadera lá e vai dormi, pode í lá. ó, tem num sei o quê aqui,

não, pode levá, esquenta a cabeça não! mas aí criô a tal confiança que é pro resto da vida

agora. fala ô, esse material aqui é da reciclagem? ele fala não, pode í lá buscá. nóis

chegamo lá o léo dava um curso lá, aí ele tava co a chave do escritório tava assim e liguei

pra ele e falei ó tô co/ cadê a chave? tá no meu bolso, vem aqui buscá. falei cê tá aonde? tô

na fmu, no prédio dez, tá bom. subindo, tava vindo da rua (...) pra í subi, tum tum, aí

cheguei no portero lá e falei ô eu vim aí falá cum rapaiz aí, numa sala tal assim, qual o

senhor que/ ele falô não, pode subí lá meu, vai, vai lá e vai subí! olhei pra cara dele assim

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110

né, meu, subindo as sala lá, tum, tum, tum, aí passava os cara e falava ô beleza? beleza,

beleza, tava entrando na sala de aula do cara pra pegá a chave depoi voltá. ô, tá vendo? se

fô os otro cara os cara num dexa subí não, meu! põe gente pra chamá, vai chamano, vai

chamano de andá em andá, até chegá a sala do cara pro cara descê pa resolvê o problema.

mais alguma coisa, gente?

Doc. Bom...

Inf. tem mais alguma pergunta?

Doc. não, o que é... exatamente isso, o que mais você quiser falar aí sobre a sua vida...

Inf. eu tava esperano algumas pergunta!

Doc. Não, não, na verdade a intenção é essa, deixar você à vontade pra você falar mesmo,

né, o que você, o que você quiser, o que você achar importante, né, dizer, né, sobre a sua

vida, e o que você faz, você contou bastante coisa aí sobre o seu cotidiano, seu dia-a-dia,

isso é bastante importante, bastante... bastante interessante. Você contou aqui coisas que

provavelmente as pessoas, assim, num geral, não tão sabendo né?

Inf. é, né, é...

Doc. Essas coisas da prefeitura, também, né?

Inf. é que é uma coisa meio que maquiada, né, a situação da prefeitura é uma coisa meio

que maquiada, e o psdb ele num vem assim, ele num vem assim e ajuda, ele enfraquece, é

um sistema desse que já vem a trinta, quarenta ano, eles enfraquece

Doc. [ dá pra perceber, em oito anos de governo aí,né?

Inf. [ é, enfraquece, qualqué base, não, é qualqué base! eles vem assim,

enfraquece, vai enfraqueceno, depois toma posse, não, agora é meu! e pega pra eles, eles

num faiz brasir parceria; eles toma posse, isso é em qualqué lugá, qualqué projeto, é de

catadô, é de camelô, qualquém função, eles faiz isso, vem toma posse agora é meu. eles

Page 111: Amostra do Português Popular

111

num trabalha em conjunto com você, eles manda em você, você vai fazê isso, trabalhá

assim, do jeito que nóis qué. se cê num abre ralho pra debatê nem ninguém te segurá, pode

vê, se a província num tá aqui meu, já tinha ido pro saco isso há muito tempo! a intenção

deles é essa, é focá no lixo! e eles já deixaro bem claro que a intenção deles é essa

Doc. E eles ainda se acham social-democrata, né, o próprio partido diz: partido social-

democrata!

Inf. na realidade não funciona assim!

Doc. Onde? ((risos)) Onde?

Inf. e ele pode até falá, o pt cometeu falhas, falhas gravíssimas, gravíssimas, gravíssimas,

isso não tem nem nem/ dirceu, esse nunca mais vai ser eleito. difícil, né?

Doc. [É, né?!

Inf. e o povo meteu o pau, mas, na verdade os cara só queria o que a burguesia já tinha!

charuto caro e whisky pra tomá!

Doc. ((risos))

Inf. fala pra eles lá, a realidade é essa, é tudo o que eles queria, bom, vamo se igualá à

burguesia, os cara sempre teve aqui, nóis sempre teve aqui embaixo, aqui ó. vamos igualá a

coisa! só que saiu o tiro errado! cê acha que o fernando henrique num feiz a mesma coisa

em noventa e oito? cê acha que não? eu tenho certeza que ele feiz porque já estorô uma

bomba em minas, já! aconteceu a mesma coisa na reeleição, e tal, foi comprada a reeleição!

o próprio, o próprio, o próprio, o próprio governador de minas reeleito na época falô, o

próprio governadô, numa entrevista à cbn!

Doc. ((risos))

Inf. então qué dizê... o fernando henrique num feiz... então o lula num feiz! ele nunca sabe

de nada... o que me ataca no lula é isso, meu, por ele sê um cara que saiu da periferia, um

Page 112: Amostra do Português Popular

112

cara humilde, era pra sê um poco mais esperto nessas jogadas, tipo assim, tá acontecendo

tal coisa lá, faiz o seguinte, eu sei mas é o seguinte: quando a bomba estorá... (breve pausa).

então ele tinha que tê essa maldade, ele tinha que tê essa maldade

Doc. Malícia, né?

Inf. é, que...

Doc. isso é que o FHC já tinha, né, porque ele está ali há tanto tempo, se for ver há quantos

anos ele está ali, quantos anos ele passou no governo, que antes de ser presidente ele foi

ministro, né

Inf. [ foi ministro

Doc. [três anos,

Inf. [tributário, foi monte de/ passô mais de quinze ano já

Doc. [ passou mais de/ é, mais de quinze anos no governo.

Inf. agora o lula não, é desde oitenta e alguma coisa que qué sê, que qué sê, que qué sê

presidente da república! nunca vi o lula ocupá otro cargo a não sê querê sê presidente da

republica! e quando foi, foi de uma veiz tamém. era a nossa única esperança, era o lula,

meu! nossa única esperança era o lula!

Doc. Bom, enquanto tem esperança ainda dá pra fazer alguma coisa, né?

Inf. é.

Doc. E, por falar nisso, esperança né, então, eu queria saber um pouco mais sobre a sua...

é... quando você estudou, assim, algumas impressões que você tenha tido, né, da época que

você estudou, cê poderia falar um pouquinho sobre isso? O que você passou na escola, o

que que você achô, é... se houve falhas no sistema de ensino. Alguma reflexão sua sobre o

tempo que você estudou.

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Inf. eu acho que do, do primero ano ao tercero o ensino era até, pra até, pra sê escola

pública era até razoável, né, era até razoável. agora, da quarta série em diante num, num,

num muda muita coisa!

Doc. Você estudou aonde, em Poá, aonde você morava ali?...

Inf. estudei aqui na penha

Doc. [ na Penha

Inf. no, no albergaria, aqui na, na, no aricanduva já, albergaria, até hoje tenho mó conceito

bom daquela escola, velho o ensino era/ depois que eu mudei pra poá, que eu estudava num

tal de caíque que era uma escola-modelo e num sei o quê e tal, mas o ensino era meio fraco!

eu conseguia cabulá na quinta série, eu conseguia cabulá aula e levava o material, voltava,

fazia prova e ainda tirava nota boa! então qué dizê, cê num via muito mudá, assim, da

quarta série pra quinta série num ví muita diferença, né! a única diferença é o seguinte, cê

ô, tô na quinta série, saí do primário aí, tô na quinta série agora, nossa, tô, né, tô cos grande,

tô cos pessoal da oitava, e tal. então cê via/ os cara do primero, você via certa mudança

nisso, né, o comportamento, muda as ropa, muda o estilo de/ mas o ensino memo, assim, o

ensino, pegá pesado no ensino na educação memo aí num tem/ o sistema acho que nacional,

num tem muita/ e meu, e meus irmão que vem da mema escola que eu, na mema caminhada

e tão aprendendo cada veiz menos do que eu aprendi, tem coisas que meu irmão no primero

ano eu ensino pra ele hoje que num sabe! pô, o professô falô que é isso aqui, ó. aí eu falo,

amigo, vai por aqui que é mais fácil, ele fala num é que é verdade? então qué dizê, num

sistema público a educação no brasil hoje infelizmente é falido. é falido, falido, falido,

falido, falido. e isso num vem de hoje, né!

Doc. É, está... faz tempo, né!

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Inf. e pra completá ele então, num há repetência! qué dizê, si você fô na escola no ano

letivo durante os duzentos dia, cê fô os duzentos dia e num fizé nada o ano intero cê vai

passá e conta até os dia nos dedo. tamém assim, falo, num entendo! cê vê crianças na oitava

série que malemal sabe escrevê! pa lê uma palavra lá precisa de duas hora pa lê

pernambuco – brasil. e ainda pergunta brasil é com z ou cum s? e isso num vem de hoje,

vem vindo, vem vindo, vem vindo, vem vindo, vem vindo, vem vindo, vem vindo, e vai

piorano, piorano, piorano, eles prefere aumentá o metrô do que fortalecê a escola! é uma

mega... como é, tá escrito no painel do metrô agora, não, tem uma mega, mega construção

do metrô! cadê a mega educação? isso existe?

Doc. É, né? Infelizmente...

Inf. qué dizê é melhó cê construí um metrô, que vai tê um monte de gente pra í trabalhá

pelo um salário miserável, pelo visto é um salário miserável! e cê investí em educação boa

hoje, esquecê o metrô é investí em educação boa hoje. amanhã no futuro, você pode precisá

usá o metrô, uma condução mais barata, pra podê tê um ganho sustentável pra comprá seu

próprio carro, seu próprio veículo, vamo lá! virássim e falá ó/ eu quando era pequeno

gostava, gostava não, gosto até hoje, escuto até hoje e, e, parece que as letras de antes agora

tem muito a ver com as letra de rap, né. não, o rap num muda nunca. é porque cê desde de

oitenta, dois mil, dois mil e cinco, dois mil e deiz, dois mil e vinte, vai acontecê sempre as

mesmas coisas! pelo contrário, a violência vai aumentá um poco mais, as cadeia acho vão

superlotá um poco mais, a periferia só vai crescê um poco mais, as minina grávida vai sê,

vai, as consequencia vai sê um poco maiores, e vai indo, vai indo, vai indo, vai indo, até,

até o mundo acabá! ((breve pausa)) qué salvá falando tudo isso, é falta de dinhero investi na

educação, não, num é falta de dinhero! por enquanto era sobra de recurso! o estado que

mais paga imposto acho que no mundo, mundialmente falando, é são paulo.

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Doc. Você vê como é isso, né...

Inf. o estado de são paulo consegue, cum o dinhero que é pago em são paulo de impostos

consegue administrá quatro estado.

Doc. Nossa!

Inf. isso o próprio governadô geraldo alckmin fala, ele memo fala! aí cê num vê resultado

dele memo que tá lá o/ passô o covas, né ó, passô o covas, o cara que mais investiu em

educação

Doc. [a Adriana está meio nervosa, hein! ((risos))

Inf. [não, o cara que mais mexeu em educação por aqui foi o

mário covas, entendeu, ele tomô paulada de professor, tomô...

Doc. Nem lembra disso!

Inf. tomô! e é aqueles assim, tome uma paulada, eles dão paulada, mas ele investia em

educação! agora, cê sabe porquê o geraldo alckmin num vai tomá paulada e nem ovada de

professô? porque ele num sai do palácio!

Doc. ((risos))

Inf. é difícil entrá lá, viu o tanto de guarda que tem lá? é complicado entrá lá! a num sê

aquele cara que conseguiu sequestrá cum silvio santos, aquele lá conseguia!

Doc. Mas ele é da elite também, né?!

Inf. é, é elite, cê num pode, é/ que nem a mulecada, vem aqui, roba bolsa no farol aqui,

nunca vai acontecê nada cos muleque, nunca, nunca, nunca, nunca, nunca, nunca. a única

coisa que vai acontecê é o próprio pessoal falá meu, cê tá sujano minha quebrada, ô

muleque, ou cê pára ou cê morre! que a polícia não vai atráis do muleque, tá sussegado,

num tá nem aí cum nada, baxada do glicério, larga pra lá. agora, se o moleque subí lá na

paulista lá, roubá a mala, a bolsa de uma madame, ou de um executivo, ele tá preso, em

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treis dia ele tá morto. pode tê doze ano, quinze ano, vinte ano, ele tá morto. ele ofendeu

quem tem, e quem tem num fica preso. ora, o moleque num tem dinhero pa nem pra comê,

ele tá robano pra comê! uns pa fumá droga, mas otros tá robano pa comê! aí num dá pra

distingui quem tá robano pra comê, quem tá robano pra fumá! os caras fala é tudo

delinquentes, não são! com’eu já vi, a polícia pára eles na praça, polícia na praça, parada ali

co carro da/ co posto comunitário, parado ali, o carro dobra a esquina aqui o muleque pá!,

roba a bolsa, e a polícia olhano! no otro caso tava eu e a minha irmã didi, nóis fomo na

escola ali, duque de caxias, tamo voltano, o farol parado, a polícia na frente, o farol parado,

o moleque veio, tum, tum, tum, quebra o vidro, pega a bolsa, fisss... ((som de escape)). dois

carro assim ó, o da frente era da polícia! só dois carro! qué dizê, é o cúmulo do absurdo!

até a baloa abrí a porta pra corrê atráis dos muleque, ih, vô nada!

Doc. ((risos)) Isso aí, enquanto vocês num estão aí pra isso, né? ((risos))

Inf. infelizmente é compricado. é, hoje em dia é o seguinte, cê tem que conseguí pelo

menos salvá seu côro, conseguí salvá seu côro pelo menos, aí cê pode tentá ajudá alguém,

né. porque eu jamais vô sê roubado ali, eu jamais vô sê robado! eu vô ali, saio, volto, entro,

volto pra cá, vô pra lá, vô até o bar, volto, co a mochila/ já cheguei a largá essa mochila

aqui ó tinha três mil reais na porta do/ tava jogada lá, dexa essa porra jogada aí. falei ah, vô

lá no bar almoçá já volto. eu fui e voltei, a mochila lá jogada, de quem é essa mochila? é

do fausto, dexa aí. agora, de quem é essa mochila? é do natan, ah, então vô levá embora!

num tem um real lá dento, num tem nem um real lá dento, vô levá embora, que é do natan.

meu, os cara chega a milhão aí, fala ah, o natan, o natan ganha quatro, cinco mil reais por

mês aí. meu, tem dia que eles chega naqueles estralo, fausto me arruma um cigarro pa

fumá? pode, fuma co nóis! entendeu, mas pela postura que ele impõe, que nem ele vem

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aqui nas base aqui, não, eu tenho treis faculdade, num sei o quê, natan, cala a boca senão os

cara vai vê que cê tem dinhero!

Doc. ((risos))

Inf. ele fala, pô valdi, falo cala a boca senão eles vão vê qui cê tem dinhero! falei ó, quando

cê vim trabalhá vem cuma ropinha meio esfarrapada já, entendeu, vem cuma calça largada,

vem todo, né, melhor! meu amigo, aqui é periferia do centro de são paulo, meu, tem que

vim todo largado! o cara antes vinha todo bonitinho, não me toque, pa pegá um isquero

tinha que pegá um paninho

Doc. ((risos))

Inf. os cara olhô pra cara dele, meu, nem escalo mais esse boy aí. sei lá meu, pega mal, ele

trab/ ele veio lá do albergue lá, meu. ele falô pô os cara é fresco lá assim? falei num sei!

mas o francisco que eu conheci lá num é! ele é folgado, parece muito co natan, o francisco

né, tentá ele vestí as ropa parece muito co natan, só que ele é um poco mais firme que o

natan. e os cara que eu conheço que trabaia lá num é, meu. e se, tamém mexê co renato

tamém. chegô aí, tal, o renato já é mais maloquero, né. aí num deu otra, meu, o emerson ia

embora pra casa os cara robava óculos dele, ele vinha de manhã os cara robava celular dele,

assim no meio da rua, aí depois discubriru que ele movimentava o dinhero, num deu otra,

no dia do pagamento os cara vum, dois mil e pocos reais. aí veio otro educadô, e tal, beleza,

veio trabalhá na administração tamém, era, era vice-coordenadô do natan, começô a mexê

cum dinhero tamém e foi trocá um cheque. aqui na, na, na, comé essa rua dos banco aqui,

num é a tamandaré... tamandaré, num é? é ali perto da tamandaré né, que sobe direto? cê

num conhece por aqui não?

Doc. A Tamandaré é aquela que sobe até a Paraíso, né?

Inf. é, sobe lá em cima, é a tamandaré, num é?

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Doc. Acho que é, acho que é.

Inf. ele foi num banespa ali da vida ali, daí ele falô ah e tal, beleza, normal, sempre ia trocá

cheque, voltava. saindo do banco, dois pau e seicentos, os cara venha que é meu! dois cara

na moto e venha que é meu! aí até aí eu falei ah, até aí normal né meu, eu fiquei olhano pra

cara dele assim falei meu, cê mora/ cê/ macaco véio, um cara já vivido, trinta e poucos ano,

né, maloquero da zona norte né meu. a malandrage de são paulo é nascida e criada na zona

norte, entendeu? eu num entendo você meu, como que cê vem trabalhá num lugá desses,

meu, de terno, gravata

Doc. Realmente, né!

Inf. é meu amigo, camisa social, relógio... não, me explica isso! ele, é fausto, foi vacilo

meu. olha aí! seu vacilo prejudicô cinquenta pessoas, no mínimo! aí ele se desesperô, entrô

em depressão, chorô, esperneô, falei meu amigo num resolve mais, não, pára, pára. é, mais

no dia-a-dia infelizmente cê vê tanto poblema, tanto poblema, tanto, tanta disgraça

acontecendo, tanta disgraça acontecendo, você se torna uma pessoa gelada, meu. cê num se

abala mais cum nada. cê vê um dando um tiro no otro ali cê fala nossa, acertô o cara! aí cê

passa e vai embora, cê num se abala mais cum nada! cê vê olha assim, parece uma coisa

normal, cotidiana do dia-a-dia, normal, cê vê a polícia espancano um ali cê passa, finge que

nem vê e vai embora, e assim vai, cê tem que í viveno! que se cada caso que cê pará fô olhá

e pará pa chorá ou pará pa ajudá você vai acabá arrumano mais poblema do que você já

tem, e acaba num conseguino resolvê o que você já teve lá atráis, entendeu? esses dia a

cavalaria/ os cara tava saindo daqui e a cavalaria foi enquadrô os cara, trabalhava aqui

dento, foi enquadrô, mão pa cabeça, aí eu tinha tomado umas quatro, né, na hora do

almoço, já tava meio mamado, mão pá cabeça o caraio, aí o cara já puxô a espada né, no

que ele desceu pa dá o nobu saiu, falô opa, o que tá aconteceno aí? ele quem é o sinhô?

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falei não, os rapaizes trabalha conosco lá. e onde cê trabaia? aqui na reciclage. e se eu fô lá

dento lá num, num tivé ninhum deles lá? falei vai levá nóis quatro em cana, então. o cara

olhô prum lado, olhô pru otro, aí o nobu era adevogado, meu. é que ele parô de exercê a

função, tal, ele tem o anel até hoje. quando ele levantô a mão o otro cara do cavalo viu o

anel e falô, meu, dexa isso queto, dexa isso pra lá, dexa esses cara í embora, dexa isso pra

lá, não, vô lá cos cara vê se os cara trabaia lá memo, falei intão vamo, quando ele feiz assim

ca mão o cara viu o anel tamém. falô ó meu senhor, dexa queto, não, já era, num sei o quê,

tal, e forão embora. daí os cara que tava lá ficô sem entendê, falô ué, os cara só olharo um

véinho desse tamanho aí num levô papo e mandô os cara imbora, num sei o quê e tal, falei

cês num intendero meu, olha pra mão do cara. o que que tem na mão do cara? falei olha pra

mão do cara! ah tem um anel lá, um anel todo mundo tem! eu falei ó, presta tenção no que

tá dento do anel, o que que tem no anel. ah, pedrinha vermelha. falei na lateral do anel,

mané! que é aquela balancinha dos negócio de advocacia lá. meu, isso que acontece, sai

desse meio tem ganha um oto/ o cara que tá cursando advocacia terminano na, na, na

faculdade são francisco, cê falô são francisco, né isso?

Doc. Isso.

Inf. tem uns dois, tem um que trabalha lá e um que trabalha aqui que tá fazendo faculdade

na são francisco. adevocacia tamém. esses dia nóis tava parado ali no bar ao lado ali, uma

terça-feira, sete horas da noite, um calô, vamo tomá cerveja? vamo tomá cerveja. a muié foi

comprá o almoço, ah, vamo lá. todo mundo duro, duro, duro, duro, sem dinhero, falei

depois nóis paga, sentamo lá, vê duas cerveja, a mulher deu, caímo na bestera de colocá as

cadera aqui do lado de fora, na rua/ no lado de fora, sentamo lá, cruzamo a perna, né,

bombetinha virada, a bolsa em cima da mesa, fumano, tomano cerveja, quando eu olho pro

lado assim, fechô nove viatura do deic. até aí normal, é, vinte hora passando viatura, nem

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esquentei a cabeça né. continuei sentado, acendi um cigarro, os cara ô levanta! falô é, você

mesmo, levanta! você e o grandão aí, levanta os dois aí. falei é, vai enquadrá o bar intero

né, tinha um monte de/, falei vai enquadrá o bar intero, falô não, é só vocêis dois, pra fora!

falei beleza, segurei as ponta, tirei o boné/ posso tirá o boné? pode, tirei o boné, aí o guarda,

o civil tava meio cherado, ele tava falando se mordeno, o cara tava se mordeno, falei esse

cara tá cherado meu. aí começô a discutí co orildo, que trabalhava cum nóis, começô a

discutí, o orildo já é forgado, começô a discutí, discutí, ele falô assim ê ô, vô enfiá a mão na

sua cara, ele falô então enfia mano! aproveita que você tem tempo ainda! começô a fazê

tiração desse tipo. aí falô assim é, que num sei o quê, que num/ falô não, dá seus documento

aí, aí tirô os documento assim, primera coisa que ele fez, tirô a carterinha da faculdade,

entregô pra ele assim, ele olhô assim todo vixxx. e esse oto aí? trabalho cum ele aí, ó.

((risos))

Doc. ((risos))

Inf. então, trabaio cum ele aí, ô, trabaio aqui do lado aqui ó, esses trem aqui. cê faiz o quê

lá? falei sô carrocero! cê é carrocero? é, sô carrocero! é, em plena terça-fêra tomano

cerveja? falei ô meu amigo, enquanto os cara num proibí, eu vô bebê! é, hoje eu sei que eu

num posso fumá maconha nem cherá farinha, nem consumí pedra, isso é proibido por lei,

mas tomá cerveja, até agora num é proibido! cê é forgado, falei forgado não! falei é o

seguinte, eu num tô fazendo nada, num tô robando ninguém, num tô matando ninguém, não

tô perturbando a ordem pública, tô sentado quieto num bar tomano cerveja, a dona do bar

num tá reclamano, conversá nada de mal. aí o oto falô assim pô meu, ceis são bom de papo

hein? não, num precisa sê bom de papo meu, é questão de direito! cê num tava no seu

direito, cê num pediu preu me levantá, eu num levantei? cê num deu a geral? achou alguma

coisa? não. então, cê faiz a sua função bem feita que eu vô fazê a minha bem feita, a minha

de cidadão e os cara são de policial, ele falô é mas num sei o quê/ posso í embora? não,

num terminei ainda! tá bom então, eu vô continuá aqui di pé aqui! cruzei os braço e fiquei

lá. não, é porque nóis tá procurano uns cara assim, assim, assim, os cara parece cum você, e

num sei o quê e tal, cê num conhece não? falei não, num conheço não. falei eu trabaio/