A Festa do Espírito Santo açoriana - Theses · Festa do Espírito Santo como uma festa cristã e...
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UNIVERZITA PALACKÉHO V OLOMOUCI
Filozofická fakulta
Katedra romanistiky
A Festa do Espírito Santo açoriana
The Azorean Holy Ghost Festival
Bakalářská práce
Autorka: Markéta Čajánková
Vedoucí práce: Mgr. Petra Svobodová, Ph.D.
Olomouc 2016
2
Prohlášení
Prohlašuji, že jsem tuto bakalářskou práci vypracovala samostatně pod odborným vedením
Mgr. Petry Svobodové, Ph.D. a uvedla v ní veškerou literaturu a ostatní zdroje, které jsem
použila.
V Olomouci dne 27.4.2016
3
Poděkování
Ráda bych na tomto místě poděkovala vedoucí své práce Mgr. Petře Svobodové, Ph.D. za
podnětné rady, metodické vedení a trpělivost.
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Índice
Introdução ................................................................................................................................... 5
1. Descrição Geral da festa do Espírito Santo nos Açores ...................................................... 7
1.1. Festa do Espírito Santo como uma festa cristã e pagã ................................................. 7
1.2. Termos ligados com a festa ............................................................................................ 10
1.2.1. Domingas ............................................................................................................. 10
1.2.2. Impérios ............................................................................................................... 11
1.2.3. Irmandades e os cargos dentro do Império .......................................................... 12
1.2.4. Coroação .............................................................................................................. 13
1.2.5. As ofertas de alimentos ........................................................................................ 13
1.2.6. Matança dos gueixos ............................................................................................ 14
1.2.7. Refeição Cerimonial: Sopas do Espírito Santo e Bodos ...................................... 14
2. História do Culto do Espírito Santo ................................................................................... 16
2.1. Hermenêutica de Joaquim de Fiore ........................................................................ 16
2.2. Festas do Espírito Santo em Portugal e o papel da Rainha Isabel na sua
implantação ........................................................................................................................ 17
3. Culto do Espírito Santo nos Açores ................................................................................... 20
3.1. Descobrimento das Ilhas ......................................................................................... 20
3.2. Primeiros povoadores ............................................................................................. 21
3.3. Pressuposições para religiosidade nas Ilhas ........................................................... 23
3.4. Papel da Ordem dos Franciscanos na implantação do Culto do Espírito Santo nos
Açores ................................................................................................................................ 24
3.5. Festas do Espírito Santo a partir do século XVI ..................................................... 24
3.6. Atitude às festas do Espírito Santo no século XXI ................................................. 25
4. Testemunhas da vivência do Culto do Espírito Santo ....................................................... 28
4.1. Emigração Açoriana ............................................................................................... 28
4.2. Festas do Espírito Santo nas comunidades açorianas no mundo ............................ 30
4.2.1. Festas do Espírito Santo no Brasil .................................................................. 31
4.2.2. Festas do Espírito Santo nos Estados Unidos da América .............................. 32
4.2.3. Festa do Espírito Santo em Portugal continental ............................................ 33
Conclusão .................................................................................................................................. 36
Anexo ........................................................................................................................................ 41
5
Introdução
As festas do Espírito Santo nos Açores são as celebrações mais populares de todo
o Arquipélago. Destacam-se entre os outros festejos, sendo maiores em termos da duração e em
número das pessoas que participam na sua realização. A festa do Espírito Santo representa uma
mistura das festas religiosas com as seculares e é muito rica na sua origem – é marcada pelos
rituais pagãos, pela liturgia cristã, pelos ideais filosóficos da idade medieval, pelo folclore,
e ultimamente tem passado por uma modernização, aceitando alguns traços da cultura popular
contemporânea açoriana.
Como a tese mostrara, as festas têm origens longínquas em Portugal medieval e mercê
ao isolamento insular nos Açores, os antigos costumes conservaram-se nelas. O Culto do
Espírito Santo continua a ter grande popularidade nas Ilhas e pelo meio da emigração açoriana
espalhou-se para os outros lugares, sobretudo para o Brasil e América do Norte.
Tive oportunidade de visitar os Açores duas vezes, sempre na época das Grandes Festas
do Espírito Santo em Ponta Delgada. Com muito prazer participei nas celebrações e gozei
da atmosfera que tinha dominado na cidade durante as celebrações. À própria custa
experimentei como os açorianos são fiéis aos ideais da caridade e compartilha conectados com
esta festa. A minha experiência fez com que fiquei ansiosa por descobrir mais sobre esta festa,
por conhecer as suas origens e o significado que ela tem para os habitantes da Ilha.
O objetivo desta tese não é apenas descrever a festa, em termos do seu decurso e sua
origem, mas também apontar para a sua excecionalidade e importância que ela tem como o meio
da manifestação da cultura e identidade açoriana. Gostávamos de mostrar que a festa não
sobrevive na forma fossilizada, artificialmente mantida nas Igrejas com o esforço dos padres,
mas que ainda é viva, dinâmica, desenvolve-se e está em voga. O objetivo deste trabalho
é também pôr em evidência que a festa do Espírito Santo nas comunidades açorianas tem grande
potencial. Gostaria de destacar que a Festa do Espírito Santo preenche os pré-requisitos para
ser reconhecida como o Património Imaterial na UNESCO, apresentando uma vitalidade
e especificidade incontestável.
No primeiro capítulo pretendemos brevemente descrever o decurso da festa, os cargos
principais que os insulares desempenham na sua celebração e os pilares básicos da festa
do Espírito Santo. Vamo-nos focalizar na interpenetração dos rituais pagãos com a doutrina
católica no decorrer dos festejos e vai ser descrita a relação entre a Igreja e os grupos de leigos
na organização e realização da festa.
6
Segundo capítulo vai ser dedicado aos primórdios da festa na Europa medieval. Vão ser
descritos os acontecimentos históricos e as correntes filosóficas da época que prepararam
o caminho para o nascimento do Culto em louvor da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade –
o Espírito Santo. Um subcapítulo vai ser dedicado à Rainha Santa Isabel e ao papel que ela
desempenhou na fundação do tal Culto.
O objetivo do terceiro capítulo é descrever a implantação do Culto nos Açores: delinear
quem foram os primeiros povoadores, sublinhar a religiosidade como um traço prominente dos
habitantes das Ilhas e mostrar quais eram as pressuposições para que as festas se enraizassem
no Arquipélago. Brevemente vamos relatar a evolução da festa a partir do século XV até
o presente. Na parte final do terceiro capítulo vão ser descritas as Grandes festas do Espírito
Santo em Ponta Delgada que representam a modernização da festa e o interesse da Câmara
Municipal na sua realização. Também vamo-nos focalizar na iniciativa dos investigadores
açorianos nos últimos anos, com o objetivo de inscrever a Festa do Espírito Santo nos Açores
na lista da UNESCO.
O último capítulo descreve a expansão das festas do Espírito Santo pelo mundo
e a vivência da devoção nas comunidades açorianas. Gostaríamos de mostrar as circunstâncias
da migração açoriana e datar aproximadamente a chegada das festas para as várias partes
do mundo e destacar as localidades onde as festas prosperam até hoje.
Vou partir das obras dos historiadores, antropólogos culturais, psicóloga social
e teólogo, desde que o meu objetivo é dar uma imagem complexa das festas em todos os seus
aspetos.
7
1. Descrição Geral da festa do Espírito Santo nos Açores
A ideia-base da festa do Espírito Santo é compartilha e caridade. Já no início
da festa, que decorre entre o Domingo de Páscoa e o Domingo de Pentecostes, as pessoas
costumam fazer as promessas ao Espírito Santo, por exemplo para que curasse algum membro
da família ou para que assegurasse uma boa safra, mas as razões podem ser várias. Depois, no
decorrer da festa, os fiéis pagam as promessas com os atos da caridade, tal como compartilha
da comida ou ajudando em decorrer das celebrações particulares. Em geral, as festas consistem
em celebrações que se estendem no período de sete semanas. Durante de cada semana, os que
celebram a festa reúnem-se para rezar o terço, fazer os bailes e fazer preparações para o ponto
culminante da festa – a Coroação do Imperador1, que geralmente tem lugar no último domingo
dos dias festivos. Nos dias que precedem o dia da Coroação distribuem-se os alimentos entre
os fiéis e também entre os necessitados, organizam-se as refeições para o público. Na última
noite da festa há um grande baile e fogos artificiais.
Uma caraterística prominente da festa é que não podemos encaixá-la precisamente
nem como uma celebração puramente religiosa, nem como uma festa exclusivamente secular.
O objetivo deste capítulo é assim descrever ambos os aspetos da festa – tanto o religioso, como
o popular – e como eles funcionam numa síntese. Também pretendemos descrever os pilares
básicos da festa e definir alguns termos ligados com as celebrações, no intuito de depois facilitar
a orientação na temática.
1.1. Festa do Espírito Santo como uma festa cristã e pagã
A Igreja celebra a solenidade do Espírito Santo no Domingo de Pentecostes,
no sétimo domingo depois da Páscoa, ou seja, cinquenta dias depois da Ressurreição de Jesus.
É neste dia que, segundo o Novo Testamento, o Espírito Santo desceu sobre os Apóstolos. E por
volta deste dia é que se estende o culto popular açoriano dedicado ao Espírito Santo.
As festas do Espírito Santo, porém, estão longe de ser puramente religiosas. O Culto
do Espírito Santo podemos ligar às mitologias agrárias europeias proto-históricas. Em muitos
casos, as datas das festas cristãs correspondem às dos festejos pagãos. Em certas fases do ano,
pois, tinham lugar os rituais pagãos e a liturgia católica ainda está ligada a estes rituais,
a significados e entendimentos antigos. Antonieta Costa alude ao facto que há muitos traços
1 a Coroação vai ser pormenorizada no subcapítulo 1.2.4.
8
comuns entre as celebrações do Equinócio da Primavera e do Solstício de Verão, por um lado,
e as celebrações do Espírito Santo nos Açores, por outro lado – especialmente no contexto
religioso original.2 As celebrações que correspondem às localizações temporais dos Solstícios
e dos Equinócios são consideradas como mais próximas às festas pagãs e cósmicas. A festa do
Espírito Santo pertence a estas celebrações, apesar de ter sido situada em datas um pouco
deslocadas do Equinócio de Primavera, devido às tentativas da Igreja Católica de integrar
as suas próprias festas nos respetivos cultos.
A Festa do Espírito Santo parece coincidir com os rituais primaverais, que incluem
o ritual do renascer da vegetação, os rituais de purificação e as Festas das Primícias.3 Em boa
medida, a Festa do Espírito Santo herdou certos comportamentos relacionados aos rituais
pagãos que os fiéis praticam na mesma altura do ano como os rituais pagãos de Primavera.
As festividades ou os rituais concentrados perto do Equinócio de Primavera têm um
traço típico em comum, que Costa designa como “intervenção nas forças naturais“.4 Trata-se
duma reminiscência dos rituais antigamente praticados neste período do ano, com a intenção
de “intervir”, ou seja, de influenciar a natureza. Uma reminiscência, que, até hoje em dia, pode
ser observada em vários atos de caráter comunitário, social ou individual.
O Equinócio da Primavera normalmente tem lugar em 20 de março. No período dos
meses que imediatamente antecedem ou seguem esta data situa-se o Culto Agrário. Reúnem-se
dentro do Culto as temáticas de purificação e erotismo como meios de preparação do homem
para a germinação das plantas.5 A função principal do Culto Agrário era, através dos atos
religiosos ou mágicos, interagir com as forças naturais e assim assegurar a fertilidade da terra
e a safra.
Semelhantemente como Costa, Francisco Ernesto de Oliveira Martins procura
ligação entre os ciclos pagãos e as festas de hoje. Segundo Martins, maio é tomado pelo mês
da alegria e da fecundidade da terra e neste período começam os Ciclos do Espírito Santo e do
Touro.6 O interessante é que o final dos ciclos primaverais corresponde ao final do ciclo
litúrgico pascoal.
O Culto Agrário aparentemente foi muito importante em termos da sobrevivência
das sociedades antigas. As populações migratórias ou as recentemente sedentárias enfrentaram
2 Cf. Antonieta Costa, Festividades populares e mitos arcaicos na nova geografia atlântica (Ponta Delgada:
Direcção Regional da Cultura, 2010), p. 66. 3 Conjunto dos primeiros produtos da terra ou de um rebanho. Dicionário Priberam [online], disponível em
http://www.priberam.pt/ dlpo/prim%C3%ADcias (accesso em 15/01/2016). 4 A. Costa, Festividades populares e mitos arcaicos na nova geografia atlântica, p. 29. 5 Cf. ibidem, p. 26. 6 Cf. Francisco Ernesto de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores (Porto: Casa da Moeda, 1985), p. 18.
9
as dificuldades da sobrevivência o que as levou à mitificação de certos alimentos, sobretudo
do pão. Segundo Costa, isto pode explicar a frequência de ritos relacionados com cereais
(ou seja, com pão) que encontramos nas atuais celebrações do Espírito Santo.7
Evidentemente, não há uma fronteira clara entre a Teologia e a Tradição dentro das
festas do Ciclo do Espírito Santo. Os Ciclos têm sobretudo a função de socialização e de
partilhar o espaço em que as pessoas vivem. Mas, como sugere Oliveira Martins, no centro
de todas estas manifestações culturais há sempre um fenómeno do Sagrado, ou seja, Deus8.
Como meio de ligação entre o homem e o divino desde sempre figurava o sacrifício. Foi através
dos sacrifícios que os insulares tentaram acarear a energia incompreensível, mas poderosa.
A noção do sagrado parece então desenvolver como resposta do homem ao terror de isolamento.
Um grande número de cultos religiosos é ativamente promovido muito mais pelos
leigos, do que pelo clero – o facto que alude à natureza secular destes cultos. As dioceses
portuguesas, então, rumam para a purificação desta devoção e preservação da forma genuína,
fiscalizando os procedimentos dos grupos de leigos que são responsáveis pelo próprio exercício
das festas do Espírito Santo.9
No entanto, o facto é que as atividades laicas com o caráter secular estão a crescer
em popularidade. Ao longo das décadas, o povo açoriano inclinava cada vez mais
às festividades laicas. O resultado é que até as celebrações religiosas perderam algo do seu
genuíno e passaram a ser marcadas pelas atividades mais seculares. Em muitos dos casos estas
celebrações estão a passar por uma descaracterização gradual.10 Até certo ponto, o mesmo
aconteceu com a própria festa do Espírito Santo, que as vezes não se esteve realizando de acordo
com a doutrina válida, mas sim adotou algumas atividades menos próprias à tradição espiritual.
Da maneira semelhante, Pereira da Costa observa que nas festividades do Espírito
Santo não há muito lugar para o clero. Chega até o ponto de designar as manifestações da festa
do Espírito Santo como subversivas, porque colocam o povo no centro da liturgia e assim
transgridem as “ordens sociais”. Os próprios festejos têm lugar ao lado da igreja, em vez
de dentro dela. “A sacristia é substituida pela despensa … frugalidade da hóstia dê lugar
à abundância do pão, da carne e do vinho.”11
7 Cf. A. Costa, Festividades populares e mitos arcaicos na nova geografia atlântica, p. 68. 8 Cf. F. E. de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores, p. 18. 9 Cf. Susana Goulart Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História (Berkeley: Institute of Governmental Studies Press,
University of California, 2008), p. 153 10 Ibidem, p. 153. 11 Vasco Pereira da Costa, apud Antonieta Costa et al., Pelo sinal do Espírito Santo (Angra do Heroísmo:
Presidência do Governo Regional dos Açores, Direcção Regional da Cultura, 2007), p. 9.
10
De qualquer maneira, é interessante que a festa do Espírito Santo não passou, como
muitas outras festas genuinamente religiosas, por o decaimento e a descaracterização. O Culto
do Espírito Santo mantém-se na sociedade açoriana com o mesmo vigor com que foi celebrado
durante os séculos12. Goulart explica-o pelo facto de os festejos nunca terem construído um
monopólio da Igreja.
Hélder Fonseca Mendes fala de uma forma de “cristianismo inculturado”.13
O culto não pretende seguir uma doutrina e evidentemente estão presentes certas divergências
entre o clero e os leigos. Apesar de tudo isso, Mendes sublinha que não se trata duma tentativa
de pôr o povo contra a igreja ou de pôr as autoridades em causa. Os ritos populares manifestam
grande respeito pelo sacro e o Espírito Santo. A vivência da fé e da prática religiosa têm poder
de iniciar um programa social inteiro. No entanto, Mendes também adverte sobre o perigo de
o culto esvaziar-se e tornar-se apenas uma caricatura14.
1.2. Termos ligados com a festa
As festas do Espírito Santo espalham-se por todas as ilhas com particularidades em
cada delas. Não existe uma descrição uniforme e universal que descrevia as devoções ricas
e esplêndidas em todas as nove ilhas dos Açores. Há, porém, alguns traços comuns que definem
o decurso da festa do Espírito Santo, independentemente de ilha. Objetivo deste subcapítulo
é descrever os pilares da festa. Vamo-nos focalizar nos aspetos que as ilhas têm em comum
e considerar se os pontos culminantes da festa provêm mais da liturgia católica ou do culto
agrário pagão.
1.2.1. Domingas
Em todo o arquipélago as celebrações do Espírito Santo são situadas no período
entre o Domingo de Páscoa e o Domingo de Pentecostes. Estas sete semanas chamam-se as
Domingas15. As Domingas do Espírito Santo seguem depois de um período de jejuns
e abstinência que antecede a Quaresma e, como diz Gaspar, no período das Domingas “uma
12 Cf. Susana Goulart Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 153. 13 Cf. Hélder Fonseca Mendes, Do Espírito Santo à Trindade: um programa social de cristianismo inculturado
(Porto: Universidade Católica Portuguesa. 2006), p.12. 14 Ibidem, p. 12. 15 Cf. Manuel Breda Simões, Roteiro Lexical do Culto e Festas do Espírito Santo nos Açores (Lisboa: Instituto da
Cultura e Língua Portuguesa, 1987), p.83.
11
nova vida anima a alma do povo açoriano”16 – são verdadeiramente as semanas da alegria
e dos festejos.17 Hoje, por causa da difusão dos festejos, as sete Domingas do Espírito Santo
são ultrapassadas e a festa prolonga-se pelo verão ou, nalgumas ilhas, até outubro.
1.2.2. Impérios
As próprias festividades do Espírito Santo em cada uma das sete Domingas são
localmente conhecidas como os Impérios18. O período das Domingas designa-se, portanto,
como tempo dos Impérios. A missão dos Impérios é solicitar a graça divina para os fiéis que
cumprissem as suas promessas.19
Jacinto Monteiro dá-nos uma descrição como vários Impérios tinham surgido. Na
maioria dos casos foi como resultado duma promessa dada ao Espírito Santo. São variados
os motivos das promessas. Podia ser uma promessa dada por um filho para que ficasse livre
do serviço militar, uma aflição por um familiar doente, um pedido de ver os seus familiares
ainda vivos (no caso dos emigrantes). Além disso, os sinais do Paráclito ou até conselhos
de curandeiros podem estar por trás da criação dos Impérios.20
Na cultura do Império certamente podemos reconhecer os traços do cristianismo:
é invocada a Terceira pessoa da Santíssima Trindade, os que participam são os fiéis.
Por outro lado, Costa defende a opinião que não existem muitos pontos de ligação
entre o entendimento da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade comungado pela Igreja
Católica e as próprias celebrações do Culto ao Espírito Santo nos Açores.21 Os motivos que
deram surgir aos primeiros Impérios eram frequentemente os desejos de ter uma boa colheita,
facto o qual assimila as celebrações muito ao Culto Agrário pagão.
Sem obstante, temos que tomar cuidado com o termo Império: inicialmente
a palavra Império designava apenas as festividades. No entanto, hoje pode ter também
o significado do lugar do patrocínio do Culto. Às vezes entende-se como Império uma pequena
construção, onde se realiza parte das cerimónias e onde as insígnias do Espírito Santo são
expostas durante o período das festas.22
16 Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S.
Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), 1º Volume. (Ponta Delgada: O Milhafre, 2005), p. 10. 17 Cf. Maria de Jesus Maciel, A casa do Espírito Santo (Ponta Delgada: Nova Gráfica, 2011), p. 6–9. 18 Cf. João Leal, As Festas do Espírito Santo nos Açores. Um Estudo de Antropologia Social (Lisboa: Publicações
Dom Quixote, 1994), p. 17. 19 Ibidem, p. 40. 20 Cf. Jacinto Monteiro, apud Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito
Santo (Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 32. 21 Cf. A. Costa, Festividades populares e mitos arcaicos na nova geografia atlântica, p. 66. 22 Cf. Manuel Breda Simões, Roteiro Lexical do Culto e Festas do Espírito Santo nos Açores, p. 109.
12
1.2.3. Irmandades e os cargos dentro do Império
Os grupos de leigos que promovem a Festa do Espírito Santo são designados como
Irmandades, a sua origem remonta aos tempos passados de Portugal. As Irmandades regulam-
se por estatutos próprios e são de formação livre. Nesta organização cooperativa são integrados
todos os homens, mulheres e crianças que contribuem à realização das festas do Espírito Santo.
O membro da Irmandade chama-se então o Irmão. Nas festas iniciais o número de Irmãos foi
determinado de treze.23 Hoje, porém, o número dos Irmãos basicamente não está limitado.
Todo aquele que festeja o Espírito Santo (ou seja, cada Irmão) é obrigado de
cumprir certos atos em cada uma das semanas em que se realiza o festejo. Há vários cargos
dentro dum Império, os mais importantes são o de Imperador, Imperatriz, Trinchante, e os
ajudantes de Imperador: os Foliões e os Mordomos. São eleitos na sua função pela Irmandade.
O Imperador opera junto com o seu oficiante e principal organizador, o Trinchante.
O Imperador é o mais alto na hierarquia do Império. A função que o Imperador tem é ser
coroado nas Domingas do Espírito Santo, com a ajuda do Trinchante organizar as festas
na Dominga que lhe coube em sorte, ou oferecer o jantar aos seus convidados no domingo
no qual se realiza a Coroação. A função da Imperatriz, a mulher do Imperador, é receber
os convidados no jantar e acompanhar o Imperador nos atos particulares da festa.24
Há grupo de vinte a trinta ajudantes que coadjuva com o Imperador nas suas
funções. Os ajudantes têm desempenhos, insígnias e designações fixos por tradição e chamam-
se Mordomos. Geralmente, os Mordomos são responsáveis por contribuir para as despensas25.
O outro grupo de ajudantes é reunido dentro da folia26. A folia compõe-se de grupo
de chamados Foliões – os músicos que dançam e cantam nas festas do Espírito Santo.
O desempenho da folia é assegurar o acompanhamento musical dos festejos, apresentando um
conjunto de cânticos tradicionais.27
As Irmandades no Culto do Espírito Santo aludem à natureza secular deste culto,
sendo as associações de leigos e seguindo os seus próprios princípios na realização da festa do
Espírito Santo com mínimo controle da Igreja católica.
23 Cf. ibidem, p. 115. 24 Cf. ibidem, p. 108. 25 assim chama-se uma casa anexa ao Império onde se guardam os alimentos destinados às Refeições cerimoniais
da festa. Cf. ibidem, p. 82. 26 Veja a imagem nº 5. 27 Cf. João Leal, As Festas do Espírito Santo nos Açores. Um Estudo de Antropologia Social, p. 40.
13
1.2.4. Coroação
Os Impérios são estruturados em torno da Coroa do Espírito, um símbolo
consagrado da divindade. O ponto culminante da Festa do Espírito Santo é a Coroação.
A Coroação é considerada como a parte religiosa da festa do Espírito Santo. Este ritual sempre
acontece na Igreja, dentro duma missa e dirigido por um sacerdote. Normalmente é no último
domingo dos dias festivos, como uma culminância das celebrações, mas nalguns lugares o dia
da Coroação escolhe-se por sorteio e pode então caber em qualquer dos 7 domingos dos dias
da festa.
No cerimonial da Coroação as Irmandades de cada ilha dirigem-se em cortejo
processualmente a Sé Catedral (ou igreja ou ermida da freguesia), onde se celebra a Missa do
Espírito Santo28. No âmbito da missa, numa cerimónia solene de Coroação, o padre impõe
a Coroa ao Imperador, ou possivelmente à criança que o pode substituir nessa ocasião.29 Depois
geralmente segue-se um cortejo de regresso à casa do Imperador, e realiza-se a tal chamada
Descoroação: o Imperador coloca a coroa num trono onde a coroa depois fica exposta.
1.2.5. As ofertas de alimentos
Em cada Império há alguma forma da recolha de esmolas para o Império
e o arrolamento dos Irmãos. Assim, o Imperador tem ideia quais são os meios disponíveis para
organizar a festa. Antigamente havia uma cerimónia (ainda existente nalgumas freguesias) da
recolha das esmolas com o Imperador e foliões percorrendo as ruas da freguesia de casa em
casa, arrolando as pessoas que desejavam ser Irmãos e recolhendo trigo, milho e vinho.30
Uma ou duas semanas antes do começo dos próprios festejos os carros puxados
pelas juntas de bois transportavam as ofertas para a despensa do Império. Com o andar do tempo
passou ser mais comum dar uma esmola em dinheiro, a quantia é conforme as possibilidades
do Irmão e conforme a promessa feita.31
Manuel Breda Simões chama a atenção à maneira de recolha das pensões, sublinha
a semelhança desta forma de transporte (carros puxados pelas juntas de bois) e recolha das
ofertas de vinho e trigo com o culto da Ceres, uma deusa pagã da agricultura. As primeiras
colheitas são simbolicamente oferecidas ao Espírito Santo, tal como foram oferecidas à deusa
28 Veja a imagem nº 7. 29 a criança coroada em representação do Imperador é chamada o Menino da Mesa. Cf. Manuel Breda Simões,
Roteiro Lexical do Culto e Festas do Espírito Santo nos Açores, p. 130. 30 Veja Maria de Jesus Maciel, A casa do Espírito Santo, Ponta Delgada: Nova Gráfica, 2011. p. 6. 31 Padre Joaquim de Chaves Cabral, Arquivo dos Açores, apud Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em
Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 70.
14
nos tempos remotos.32 Porém, a recolha das esmolas de hoje difere muito da maneira original.
Um conjunto de hábitos perdeu-se devido à modernização.33
1.2.6. Matança dos gueixos
Os lavradores devotos ao Espírito Santo ou os lavradores amigos dos Irmãos
costumam engordar o gado destinado ao bodo do Espírito Santo. Na quinta-feira que precede
a Coroação realiza-se (nomeadamente em São Miguel) uma cerimónia chamada Passeio dos
gueixos, onde o novilho destinado ao bodo é apresentado.34 Na sexta-feira, os irmãos vão buscar
o gado e levam-no à dita Matança dos gueixos.
Este abate do gado tem em todas as ilhas um sentido ritual de cariz pagão. Por outro
lado, em Gaspar encontramos a descrição do abate no final do qual a carne é benzida pelo padre
da localidade.35 De novo, vemos aqui a interligação de tradição pagã com a cristã.
1.2.7. Refeição Cerimonial: Sopas do Espírito Santo e Bodos
A parte da festa do Espírito Santo que se designa Refeição Cerimonial inclui as tais
chamadas Sopas do Espírito Santo, pensões e Bodos.
A Sopa do Espírito Santo é um prato obrigatório dentro dos festejos do Espírito
Santo. É uma refeição oferecida aos convidados pelo Imperador ou pelos Mordomos. Maneira
de preparação, tal como o tempero, difere de ilha à ilha, mas geralmente a sopa consiste de pão
e carne.36
Bodos37 designam uma distribuição gratuita de alimentos, tipicamente carne, pão,
massa sovada e vinho. As massas são preparadas pelos devotos que desempenham o cargo
de cozinheiros e cozinheiras, o trigo para massas, o pão e o vinho geralmente provêm das
pensões. A carne obteve-se na cerimónia da Matança dos gueixos. No Bodo os alimentos nunca
faltam e distribuem-se a toda a gente até que todos fiquem satisfeitos.38 O Bodo realiza-se nos
Domingos de Pentecostes e da Trindade e tradicionalmente era organizado pelos devotos
ao Espírito Santo e os lavradores abastados.
32 Cf. Manuel Breda Simões, Roteiro Lexical do Culto e Festas do Espírito Santo nos Açores, p. 40. 33 por exemplo, já não se cultiva trigo 34 Ibidem, p. 143. 35 Cf. Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S.
Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 83. 36 Cf. Manuel Breda Simões, Roteiro Lexical do Culto e Festas do Espírito Santo nos Açores, p. 165-166. 37 Veja as imagens nº 3. e 4. 38 Ibidem, p. 105.
15
Tal chamado Bodo de leite consiste em distribuição de leite acompanhado de fatias
de massa sovada às pessoas. No presente, em Ponta Delgada o leite é distribuído pelas leitarias
açorianas (a tradição competindo com a comercialização). O que foi a forma original, e o que
ainda acontece nalgumas freguesias rurais, é que conduzem-se as vacas diretamente junto a casa
do Império, onde se realiza o Bodo de leite.39
A Refeição Cerimonial é considerada como parte leiga da festa, possivelmente
tendo a sua origem na tradição das festas agrárias da Europa. As refeições, realizadas na forma
dos Bodos, das pensões e das Sopas do Espírito Santo, incluem carne, pão, massa sovada, vinho
e também outros alimentos, simbolizando fertilidade e aludindo à produtividade da altura na
produção agrícola. Costa compara a Refeição Cerimonial com o ritual pagão das ofertas das
Primícias.40
O vinho pode aludir às figuras do Baco ou Dionísio. Estas semelhanças, junto com
a presença dos ritos relacionados aos cereais, serve a Costa como uma justificação da ideia
da inclusão das celebrações do Espírito Santo na festa Solsticial genuína.41 Vasco Pereira
da Costa, porém, sublinha, que o pão, a carne e o vinho são três elementos substanciais
da mitologia cristã e que não se pode negar a forte ligação do Culto ao cristianismo.42
Como podemos ver, dentro da festa interpenetram os elementos tanto vulgares,
como religiosos, funcionando numa harmonia. A Coroação é considerada pela parte religiosa
da festa, e, por outro lado, um segundo ponto culminante, a Refeição cerimonial, assinala
sobretudo os traços das tradições pagãs.
39 Ibidem, p. 41. 40 A. Costa, Festividades populares e mitos arcaicos na nova geografia atlântica, p. 33. 41 Ibidem, p. 68. 42 Vasco Pereira da Costa apud Antonieta Costa et al., Pelo sinal do Espírito Santo, p. 9.
16
2. História do Culto do Espírito Santo
As raízes da festa do Espírito Santo podem ser procuradas já na época medieval
portuguesa. Apesar de não existir uma teoria unificada sobre o surgimento do Culto do Divino
Espírito Santo no Continente, os historiadores ficam de acordo nos dois principais
acontecimentos que o possibilitaram. Um deles é o surgimento da doutrina do joaquinismo,
descrita no subcapítulo seguinte, que influenciou muitas ordens religiosas, entre outras
os franciscanos, e teve influência na criação da Ordem do Espírito Santo em França no ano de
1160. Outro facto, ao que os historiadores atribuem a maior importância para a criação do Culto,
foi o empenho da Rainha Isabel (1271–1336)43, esposa do Dinis I de Portugal (1261–1325).
Ao que tudo indica, o Culto do Divino Espírito Santo em Portugal foi instituído propriamente
pela Rainha Isabel, que também foi a sua grande divulgadora.
2.1. Hermenêutica de Joaquim de Fiore
Joaquim de Fiore (1132-1202) foi um monge cisterciense e filósofo milenarista que
propôs uma reformulação da hermenêutica bíblica. O seu novo sistema hermenêutico foi
baseado no Antigo e Novo Testamento. O paradigma principal era a noção de Trindade
e a intervenção divina na história de ser-humanos. Na perspetiva de Joaquim de Fiore, as três
pessoas divinas coincidem com certas eras, chamadas idades do mundo: a idade do Pai, a idade
do Filho e a idade do Espírito Santo.44
Joaquim moveu-se pela certeza de que o mundo atual se situava no final da segunda
era, atribuída ao Filho, e que está para entrar na última era, a idade do Espírito Santo. Segundo
Joaquim, a terceira idade do mundo responderia a um novo tempo no qual o império do Divino
Santo era suposto de trazer paz e abundância para todos. Pretendia-se estabelecer a era de
caridade, e o reino do Espírito traria a reconciliação.45 O filósofo afirmava que a idade
do Espírito Santo devia ser liderada por uma nova ordem monástica que ia surgir nas gerações
43 Reino 1282–1325 44 Cf. Noeli Dutra Rossatto, Hermenêutica Medieval: a Compreensão Espiritual de Joaquim de Fiore.
(Trans/Form/Ação, Marília. Edição Especial, 2012, v. 35), p. 111 45 Cf. José Reginaldo Santos Gonçalves; Marcia Contins, “Entre o Divino e os Homens: a Arte nas Festas do
Divino Espírito Santo.ˮ Horizontes Antropológicos, (Porto Alegre, ano 14, n. 29, jan./jun. 2008), p. 74.
17
próximas a 1200. Esta nova ordem monástica, prevista por Joaquim, foi fundada por Francisco
de Assis (1182-1226). O terceiro estado do mundo, foi então protagonizado pela ordem
franciscana.46
Esta doutrina passou a ser conhecida como joaquinismo e influenciou muitos países
europeus da época, especialmente França, Espanha e Portugal. A doutrina joaquimista
certamente aumentou a relevância dada à terceira pessoa da Santíssima Trindade e lançou as
bases para o nascimento de Culto do Divino Espírito Santo. Uma vez que o mundo cristão
tradicionalmente celebra a vinda do Espírito Santo no dia de Pentecostes, depois da Páscoa, foi
neste dia que a celebração do Culto se estabeleceu.
A doutrina de Joaquim de Fiore houve grande impacto na filosofia da época
e contribuiu para a fundação dalgumas associações ou cultos religiosos que seguiram as ideias
de Joaquim. Marcelino Lima nos Anais do Município da Horta descreve as associações
de beneficência que sob a invocação do Espírito Santo socorriam os indigentes. As informações
que temos da época medieval não são exatas e não podemos dizer com certeza quando foi que
nasceram. No entanto, sabemos que em 1160 foi fundada a Ordem do Espírito Santo em França.
Sem dúvida, na altura as classes ínfimas viviam uma vida de miséria. A Ordem fazia a caridade
precisamente entre os pobres e doentes.47 Também este acontecimento podia contribuir para
o surgimento do Culto do Espírito Santo na Europa.
2.2. Festas do Espírito Santo em Portugal e o papel da Rainha Isabel na
sua implantação
A origem da festa do Divino Espírito Santo em Portugal está mais precisamente
situada no Alenquer, no século XIV. Há, porém, outras teorias que situam a origem da festa em
Tomar ou Coimbra. Vários historiadores, como Marcelino Lima, Vieira Gaspar, Gonçalves
e Contins, ou o antropólogo João Leal, descrevem Rainha Isabel e o seu marido Dom Dinis
como os inventores da festa do Espírito Santo em Portugal. Esta devoção, no início espalhada
por todo o país, foi desaparecendo através dos tempos de Portugal. Só nalguns lugares
permanecem ainda as reminiscências que nos lembram da presença da devoção no país.
Evidentemente, no século XIII já houve uma tradição das celebrações dedicadas
ao Espírito Santo em Aragão, e culto consequentemente apareceu também em Portugal, junto
46 Cf. Noeli Dutra Rossatto, Hermenêutica Medieval: a Compreensão Espiritual de Joaquim de Fiore, p. 110. 47 Cf. Marcelino Lima em Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo
(Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 15.
18
com a chegada da Isabel de Aragão, futura Rainha de Portugal.48 Como uma infanta aragonesa,
Isabel chegou para Portugal com o objetivo de desposar D. Dinis I. Tudo leva a crer que
a rainha, mais tarde popularmente conhecida como a Rainha Santa, muito devota à Igreja
católica, trouxe consigo da sua terra natal a tradição de celebração do Culto do Espírito Santo.
Foi sob o seu empenho que surgiu a primeira celebração.
É difícil dizer onde precisamente foi que a Rainha Isabel se inspirou na criação
do Culto. Como uma das possíveis fontes da inspiração para Rainha Santa são apontadas
as associações de beneficência, mencionadas no subcapítulo anterior. Marcelino Lima dá-nos
via Anais a seguinte afirmação: “A rainha Santa Isabel, toda ternura e bondade, certamente
inspirada pela acção benéfica de tais instituições, teve o santo pensamento de também as
implantar em Portugal, onde a pobreza era da mesma sorte extrema. E com grandeza iniciou
o culto ao Divino Espírito Santo. Foi na vila de Alenquer.”49
José Reginaldo Santos Gonçalves e Marcia Contins admitem que a inspiração
religiosa da rainha poderia ter como fonte também as ideias messiânicas do monge Joaquim
de Fiore.50 Foi no século XIV que a Rainha Isabel, inspirada quer pela doutrina joaquimista,
quer pelos costumes da sua terra natal, realizou a primeira peregrinação que teve lugar no dia
de Pentecostes51. Rainha Isabel fez promessa ao Divino Espírito Santo. O objetivo da promessa
foi prevenir a guerra entre D. Diniz e o seu filho legítimo D. Afonso, provocada a partir
do conflito sobre a herança do trono. O pagamento da promessa envolvia uma peregrinação
com uma coroa com a pomba, o símbolo do Espírito Santo, no seu alto, e também uma generosa
distribuição de alimentos aos pobres.52 Existem também as versões segundo as quais a rainha
coroava os pobres, usando a sua própria coroa: Diz-se que por inspiração divina a Rainha
mandou edificar o primeiro templo em honra do Espírito Santo. Este templo foi construído
na Vila de Alenquer e aqui também foi instituído o primeiro Império e, num ato simbólico, pela
primeira vez foi coroado um mendigo. Carne, pão e vinho foram em quantidade abundante
oferecidos para todos.53
48 Veja Carlos Lobão, Um gesto em nome do Espírito Santo (Horta: O Ilhéu, 2010), p. 7. 49 Marcelino Lima apud Manuel Vieira Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo
(Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 15. 50 Cf. José Reginaldo Santos Gonçalves; Marcia Contins. “Entre o Divino e os Homens: a Arte nas Festas do
Divino Espírito Santo.ˮ Horizontes Antropológicos, p. 74. 51 Segundo o Novo Testamento, neste dia – cinquenta dias depois da Páscoa – desceu o Paráclito (o Espírito Santo)
sobre os Apóstolos. 52 Cf. José Reginaldo Santos Gonçalves; Marcia Contins. “Entre o Divino e os Homens: a Arte nas Festas do
Divino Espírito Santo.ˮ Horizontes Antropológicos, p. 74. 53 Cf. Manuel Vieira Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S.
Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 17.
19
Estes primórdios da festa do Espírito Santo podemos encarar por meio duma
escritura pública do tabelião Gomes Pais, que pode ser encontrada num livro de registo,
no arquivo da Câmara Municipal de Alenquer: “Sonhou a rainha, certa noite, como prazia
a Deus que em a dita vila fosse feita uma casa do Sr. Espírito Santo (…) Terminada a edificação
do templo, realizaram a solenidade da coroação do imperador, e com todo o luzimento. Não
só chamaram a nobreza para tomar parte neste Império, mas também convocaram pessoas
de diversas hierarquias (…) e erigiram uma confraria em louvor do Espírito Santo.”54
Vieira Gaspar não nega a possibilidade que as festas do Divino Espírito Santo
tenham originado em Tomar.55 Há, porém, outros historiadores que afirmam estas festas terem
nascido em Coimbra e só depois divulgaram-se para Alenquer, Sintra e outras localidades, onde
a Rainha se encontrava na altura de Pentecostes.56 Também nesta teoria a ação da Rainha Isabel
é vista como a que deu origem às festas.
Finalmente, como já foi mencionado no início deste capítulo, um grande
merecimento na implantação das festividades do Espírito Santo em Portugal continental
é concedido ao Dom Dinis. Trata-se dum decreto assinado por ele, autorizando o povo a cortar
a lenha nas suas florestas com a finalidade de preparar a comida para ser distribuída para
os pobres, em honra da Terceira Pessoa da Trindade.57
Sem dúvida, dos atos executados pelo casal real nasceram os pilares da festa do
Espírito Santo, nomeadamente o ritual da Coroação, as promessas e a tradição da distribuição
de alimentos entre os necessitados.
54 Gomes Pais, apud Manuel Vieira Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo
(Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 17. 55 Cf. ibidem, p. 20. 56 Cf. ibidem, p. 16-19. 57 Manuel Duarte, apud Tony Goulart. The Holy Ghost Festas: A Historic Perspective of the Portuguese in
California. San Jose: Portuguese Chamber of Commerce of California, 2002, p. 9.
20
3. Culto do Espírito Santo nos Açores
Neste capítulo vamos descrever a implantação e desenvolvimento da festa
no Arquipélago. Os próprios açorianos não negam que as origens da festa do Espírito Santo
tenham raízes já na época medieval portuguesa, no reinado de D. Dinis.58 Esta devoção popular
portuguesa florescia e foi levada pelos primeiros povoadores para as ilhas cedo após do seu
descobrimento.
Como vamos ver nos seguintes subcapítulos, a religiosidade é considerada uma
característica principal do povo açoriano através dos tempos, mas especialmente nos começos
do povoamento das ilhas. No processo da implantação do culto nas Ilhas vários historiadores
e antropólogos reconhecem o papel que desempenharam as ordens religiosas – nomeadamente
os franciscanos.
3.1. Descobrimento das Ilhas
O século XV em Portugal está marcado pelo empenho de explorar a costa ocidental
da África. Os navegadores, porém, foram ao encontro das dificuldades ao voltar para Portugal
por causa das correntes e ventos fortes. Única solução foi deixar-se levar pela corrente na
direção norte ou noroeste até atingir o nível do porto de domicílio e conseguintemente tomar
o rumo de leste. Inicialmente, este porto de domicílio foi o de Lagos no sul de Algarve59, e só
mais tarde Lisboa.60
Num retorno da costa africana, nos anos vinte ou trinta do século XIII, ao navegar
a jusante na direção do noroeste, os marinheiros portugueses encontraram pequenos
e desabitados ilhéus que passaram a ser conhecidos como “Formigas”.61 Logo depois do seu
descobrimento as ilhas começaram a ser povoadas e passaram a ser conhecidas como os Açores.
Algumas fontes apontam que os navegadores portugueses descobriram o grupo
central e o de leste dos Açores entre os anos 1426-142762 e o achamento das ilhas do grupo
58 Reino 1261–1325. 59 Isto também significa que o primeiro núcleo de comunicação entre Portugal e o mundo ultramarino foi em
Algarve. A importância sobretudo desta região para o povoamento das ilhas deve ser explorada no subcapítulo
seguinte
60 Cf. Francis M. Rogers, Atlantic Islanders of the Azores and Madeiras (North Quincy: The Christopher
Publishing House, 1979), p. 25. 61 Cf. ibidem, p. 26. 62 Cf. Jan Klíma, Historie Portugalska v datech (Praha: Libri, 2007), p. 123.
21
oriental e central atribui-se ao Diogo de Silves.63 Outras fontes afirmam que Gonçalo Velho
Cabral descobriu a ilha de Santa Maria em 1431 ou 143264 e em 1444, junto com os navegadores
algarvios, ele desembarcou em São Miguel.65 Seguiram-se as ilhas Terceira, São Jorge
e Graciosa e, em 1450, todas as ilhas do grupo oriental já foram descobertas. As Ilhas das Flores
e do Corvo foram descobertas por Diogo Teive, em 1452.
3.2. Primeiros povoadores
Como Rogers acentua, os Açores não devem ser vistos no contexto colonial: nunca
foram colónias no sentido jurídico. Em vez disso, estes novos territórios constituíram um
desafio para o povo empobrecido e uma terra prometida para os oprimidos de Portugal
Continental. Junto com os capitães do donatário e outros governadores das ilhas, para povoar
os Açores saíram as pessoas comuns da tardia Idade Média, em busca de uma vida melhor. Não
obstante, no começo, as famílias portuguesas não viram as terras dos Açores – mais isoladas,
distantes e húmidas – da maneira muito recetiva.66
Primeiro povoamento dos Açores é associado com o nome de Gonçalo Velho
Cabral. Foi um comendador da Ordem de Cristo, do Castelo de Almourol, nomeado pelo
primeiro capitão da primeira ilha descoberta – Santa Maria. Logo como um capitão do donatário
governou não apenas Santa Maria, mas também São Miguel, apoderado pelo ausente Infante
Henrique,67 que procedeu notavelmente ao povoamento dos Açores.
O grupo oriental das ilhas (Santa Maria e São Miguel) foi povoado como primeiro,
porque foi o primeiro descoberto e encontrava-se mais perto da metrópole. Os primeiros
moradores chegaram já na década 40 do século XV.68 O grupo central (Terceira, Graciosa, São
Jorge, Faial, Pico) começou a ser povoado a partir do ano de 1450. Por último foram povoadas
as ilhas do grupo ocidental, Flores e Corvo, no início do século XVI.
Com as primeiras pessoas chegaram também os primeiros costumes, tradições –
entre eles também a devoção ao Espírito Santo – que deram para a cultura própria das ilhas
a desenvolver-se. Mas quem foram os primeiros habitantes? Depois de responder esta pergunta
63 A teoria é baseada na notícia de origem cartográfica sobre a descoberta do arquipélago que data de 1427. S. G.
Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 6., veja também Maria Orísia Melo; Conceição Melo Cabral, Açores
– quem somos / porque somos (Ponta Delgada: Publiçor, 2010), p. 12. 64 Cf. S. G. Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 6; Manuel Vieira Gaspar. Património dos Açores em
Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 59. 65 S. G. Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 7.
66 F. M. Rogers. Atlantic Islanders of the Azores and Madeiras, p. 42. 67 Carlos Melo Bento, História dos Açores: da descoberta a 1934 (Ponta Delgada: Edição do autor, 2008), p. 20. 68 Tal chamada Povoação Velha.
22
podemos criar melhor imagem nas quais regiões de Portugal – ou possivelmente da Europa –
tem as suas raízes a festa do Espírito Santo açoriana contemporâneas.
As evidências linguísticas indicam que os primeiros povoadores vieram do sul de
Portugal, nomeadamente do Algarve, mas também do Alto Alentejo. A outra teoria baseia-se
na abundância das chaminés tipo de Algarve. Estes são mais aparentemente visíveis na Terceira,
mas podemos encontrá-los, na menor quantia, também nas outras ilhas.69 A origem algarvia dos
primeiros povoadores, especialmente da ilha St. Maria, confirmou também o historiador Melo
Bento, acrescentando ainda a ilha de Madeira como outra fonte.70
O povoamento dos Açores, porém, não foi feito apenas com algarvios
e madeirenses. Entre outros, também capitães flamengos foram ativos no grupo central das
ilhas. No ano de 1450, D. Henrique pediu Jácome de Bruges, um nobre flamengo, que povoasse
a ilha Terceira. Com o andar do tempo vieram também bretões, espanhóis, mouriscos e outros.71
Além disso, Francis M. Rogers apresenta as evidências da antropologia física que
indicam que alguns insulares, que seguiram os primeiros povoadores, vieram também do norte
de Portugal. Rogers e Bento fazem de conta que os emigrantes tardios tiveram provavelmente
origem na região do Minho.72
Resumido, apesar de os primeiros povoadores terem sido da origem variada,
a maioria dos habitantes sempre eram os portugueses, dominantemente do Algarve. A cultura
que nasceu nas ilhas parecia refletir sobretudo a do sul de Portugal, principalmente a cultura de
Algarve: cultura com carácter urbano, com apenas muito poucas moradas entre as vilas.
Segundo Rogers, essa é precisamente a natureza da vida nas Ilhas, onde as pessoas tendem
a reunir-se em vilas e cidades e evitam vida nas fazendas isoladas.73 De mesma maneira,
podemos concluir que os costumes da celebração do Culto do Espírito Santo trazidos para os
Açores provêm de Portugal, predominantemente da região do sul.
69 Cf. F. M. Rogers. Atlantic Islanders of the Azores and Madeiras, p. 46. 70 Cf. C. M. Bento. História dos Açores: da descoberta a 1934, p. 18. 71 Cf. Carlos Melo Bento. História dos Açores: da descoberta a 1934, p. 19 e Francis M. Rogers. Atlantic Islanders
of the Azores and Madeiras, p. 40. 72 Cf. Carlos Melo Bento. História dos Açores: da descoberta a 1934, p. 19 e Francis M. Rogers. Atlantic Islanders
of the Azores and Madeiras, p. 48. 73 Cf. Francis M. Rogers. Atlantic Islanders of the Azores and Madeiras, p. 54.
23
3.3. Pressuposições para religiosidade nas Ilhas
Como já sabemos, D. Henrique concorreu para o descobrimento das Ilhas e foi
o responsável por criação das primeiras donatarias. Mas o facto é que, de maneira significativa,
também contribui à divulgação da fé católica na nova terra, como podemos verificar na seguinte
citação: “D. Henrique, depois dos primeiros descobrimentos das ilhas dos Açores, a ele
devidas, concedendo a donatária delas, recomendava aos seus povoadores que tratassem de
as povoar com pessoas da fé católica.”74
As Ilhas foram então habitadas principalmente por católicos, ainda acompanhados
por missionários. Mas, segundo Manuel Vieira Gaspar, a força da devoção, persistente já quase
seis séculos, evidencia que há raízes muito mais profundas do que uma deixa dos padres
e missionários.75 A forte religiosidade, própria aos insulares, derivava das escabrosidades que
os habitantes das ilhas enfrentavam. Povo, descrito pelo Gaspar como simples mas crente,76
sentiu-se ameaçado pelas forças da natureza. Ainda não compreendendo as suas leis, implorava
a proteção do Céu:
„Ninguém, hoje, pode imaginar o que foi ter de deixar tudo de um momento para
outro, vendo a lava de um potente vulcão ameaçador e destruidor, cobrir todos os seus haveres,
ou uma epidemia devastando dezenas de pessoas. Só havia uma solução: famílias fugiram
o mais que podiam; sacerdote levando o Santíssimo Sacramento para lugar mais seguro onde
se pudessem reunir com os seus paroquianos e implorar clemência e perdão a Deus “77 (p.7,
Gaspar, 2005).
Da mesma maneira como Gaspar, Martins confronta-nos com a ideia que foi
a história do vulcanismo nas ilhas dos Açores que, prolongando-se até aos nossos dias,
concorreu poderosamente para o caráter religioso das Ilhas e para a implantação
e desenvolvimento dos festejos do Espírito Santo: “O temor provocado pelas convulsões da
terra, alliado á commoção religiosa dos espíritos, animou a idéia de votos e o cumprimento
fiel de taes promessas. A devoção do Paracleto é portanto um acto da maior religiosidade dos
povos açorianos.”78
74 M. Lima, apud M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria,
S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 23. 75 Cf. ibidem, p. 7. 76 Cf. ibidem, p. 7. 77 Cf. ibidem, p. 7. 78 F. E. de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores, p. 147.
24
Pois bem, os insulares foram vexados pelas calamidades naturais e até assaltados
pelos piratas. Como uma sociedade muito religiosa, eles naturalmente procuraram a proteção
nas forças divinas. Esse foi a presunção para que o costume religioso trazido da terra natal
lançasse raízes.
3.4. Papel da Ordem dos Franciscanos na implantação do Culto
do Espírito Santo nos Açores
As festas do Espírito Santo devem ter sido introduzidas nos Açores logo após os
primeiros povoadores chegaram para as Ilhas, acompanhados pelos franciscanos. A razão por
que foi como a principal expressão da fé escolhido o Culto do Espírito Santo é a ação dos
franciscanos espirituais.
Os franciscanos, influenciados pela ideologia joaquimista, enviaram grande esforço
para levar a difundir a devoção ao Espírito Santo por todas as ilhas. Já em 1446 instalaram-se
em Santa Maria e no mesmo ano fundaram o seu primeiro convento e ao longo do século XVI
passaram também para as ilhas mais povoadas, ou seja, São Miguel, Terceira e Faial.
Os franciscanos logo edificaram no total sete conventos nestas quatro ilhas: três em São Miguel,
dois na Terceira79 um em Santa Maria e um no Faial.80
3.5. Festas do Espírito Santo a partir do século XVI
No século XVI, quase em todas as Ilhas, já se faziam os Impérios do Espírito
Santo. Um caso especial é a ilha do Corvo onde, por causa do extremo isolamento, o primeiro
Império só se estabeleceu em 1871.81 No ano de 1597 saiu uma Provisão real que proibia as
festas do Espírito Santo porque o seu exercício arruinava os seus promotores.82 No entanto,
o Culto já tinha as raízes tão profundas e tinha tanta popularidade, que se empenharam vários
donatários ricos, que contribuíam para o bodo dos pobres, e inventaram o tal chamado Império
dos Nobres e desta maneira foi assegurada a continuação da tradição.
Em 1665, os habitantes de São Miguel conseguiram do Bispo a licença oficial
para reestabelecer as festas do Espírito Santo.83 No século XVIII as festas do Espírito Santo
79 Em 1452, fundaram o primeiro convento em Angra, na ilha Terceira. J. Klíma, Historie Portugalska v datech,
p. 134. 80 Cf. S. G. Costa, Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 138. 81 Cf. Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores
e Corvo), 2º Volume. (Ponta Delgada: O Milhafre, 2005), p. 340. 82 Cf. ibidem, p. 131. 83 F. E. de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores, p. 147.
25
experimentaram um reforçamento – na segunda década do século, por causa dum ciclone
tropical houve uma contra-safra que causou uma epidemia de fome e peste. Todas as ilhas foram
afetadas e alguns milhares de pessoas morreram. A catástrofe consolidou a religiosidade e as
pessoas faziam as promessas ao Deus que depois pagaram nos Impérios (ou seja, nas festas)
do Espírito Santo.
A sensibilidade católica dos açorianos foi consolidada também pelos atos dentro da
Reforma Católica do século XVI, que aumentou a administração paroquial e beneficiou
a doutrinação ou a cura de almas, entre outras. Ao longo dos séculos XVII, XVIII e XIX
podemos observar o esforço das dioceses do arquipélago de controlar as festas do Divino
Espírito Santo e fazer com que esteja paralela a expressão de fé popular com a doutrina
institucional. A partir da década de 1940, os bispos particularmente sublinham a necessidade
da purificação das maneiras como a fé se manifesta nas devoções, especialmente nas dedicadas
ao Espírito Santo84.
As festas do Espírito Santo tinham se mantido sem quebra em todas as ilhas
durante os séculos XIX e XX. Apesar de terem passado por algumas modificações
e modernização, ainda continuam a refletir com bastante fidelidade as celebrações originais do
século XVI.
3.6. Atitude às festas do Espírito Santo no século XXI
As festas do Espírito Santo nos Açores são certamente muito vivas e populares.
Os açorianos atribuem-nas grande importância. Isso resolveu em que as festas do Espírito Santo
nos Açores candidataram-se a UNESCO em 2000 como o património Imaterial
da Humanidade.85 A candidatura das festas do Espírito Santo nos Açores de 2000 não foi
apreciada porque supostamente não foi considerado que o culto estivesse em risco de
se perder.86 Depois de 10 anos a UNESCO ter rejeitado uma candidatura idêntica, como
resultado do V Congresso Internacional sobre as Festas do Divino Espírito Santo em 2012,
surgiu uma iniciativa dos investigadores em contribuir para a nova candidatura. A iniciativa
84 S. G. Costa, Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 142–153. 85 M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e Corvo),
p. 429. 86 “Festas do Divino Espírito Santo candidatas a Património Imaterial da UNESCO.” Açoriano Oriental [online],
disponível em http://www.acorianooriental.pt/noticia/festas-do-divino-espirito-santo-candidatas-a-patrimonio-
imaterial-da-unesco (acesso em 04/03/2016).
26
é liderada pela antropóloga e psicóloga social Antonieta Costa, pelos vários investigadores
e centros de investigação de universidades. Como resultado, nos últimos anos têm nascido
o número de novos livros e artigos que se dedicam à festa do Espírito Santo.
No século XXI há também crescentes tentativas de promover as festas do Espírito
Santo também como uma atração turística e deslocá-las para as férias de verão para que os
emigrantes açorianos espalhados pelo mundo pudessem participar na celebração. Um exemplo
desta tentativa, tal como da tentativa de promover a festa para conseguir a inscrição a UNESCO,
podem ser as Grandes festas do Espírito Santo em Ponta Delgada.
Em 2004, as festas do Espírito Santo foram pela primeira vez escudadas pela
Câmara Municipal de Ponta Delgada, na ilha de São Miguel. Desde então, celebram-se
anualmente. As festas operam-se na cidade no segundo fim de semana de julho, começando já
na sexta feira. Foram definidas as funções particulares para que tratassem das tarefas ligadas às
preparações e realização das festas nestes três dias.
No primeiro dia da festa tem lugar a bênção da carne e do pão na despensa,
um cortejo leva a Bandeira do Centro Municipal de Cultura de Ponta Delgada para o Quarto
do Espírito Santo, colocando-a no altar junto com coroas e bandeiras do Espírito Santo das
Mordomias do Conselho participantes.87 Uma coroa gigante, montada na Praça Gonçalo Velho,
costuma ser iluminada.
No sábado, Instituições Particulares de Solidariedades Sociais88 colaboram na
distribuição de pensões. Ao meio dia as Sopas do Espírito Santo servem-se para o público
no Campo de São Francisco89, seguidas pela atuação de grupos de foliões. À tarde muitos carros
de bois, carros alegóricos, grupos folclóricos e folias das freguesias do concelho desfilam pela
Avenida Infante D. Henrique90.
O terceiro dia das festas, o domingo, começa com o Bodo de leite, seguido pela
Missa Campal e Procissão de Coroação. Vários palcos costumam ser montados na cidade,
e assim, à noite são as festas acompanhados ainda pela atuação dos grupos folclóricos. Várias
bandas de música acompanham também os cortejos. No final do terceiro dia festivo, um solene
fogo de artifício termina as celebrações. Há cargo do Júri o qual apregoa o melhor Carro
de Bois, Junta de Bois, melhor Chavelha e melhor Folia. Em São Miguel, as festas principais
das freguesias, inclusivamente a do Espirito Santo, são indispensavelmente acompanhadas com
87 na altura as 110 coroas e bandeiras 88 Aproximadamente 27 instituições. Cf. M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito
Santo (Santa Maria, S. Miguel, Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 207. 89 Veja a imagem nº 6. 90 Veja as imagens nº 1. e 2.
27
massa sovada. O modo de preparação difere muito, dependendo do lugar e da freguesia. Durante
os três dias festivos a Câmara consegue atrair não apenas a população do conselho, mas também
as pessoas da ilha inteira. Muitos insulares que emigraram para as várias localidades do mundo
costumam voltar para os Açores por ocasião da festa.
28
4. Testemunhas da vivência do Culto do Espírito Santo
Neste capítulo vai ser brevemente descrita a emigração açoriana e os lugares do destino
mais importantes. Conseguintemente vamos relatar o espalhamento do Culto do Espírito Santo
nestes lugares e destacar onde podemos encontrar com as festas do Espírito Santo da origem
açoriana nos tempos atuais. O objetivo é dar os testemunhos do que o Culto do Espírito Santo
não perdeu a sua popularidade e é uma viva e dinâmica manifestação das tradições açorianas.
Vai ser mostrado como o Culto faz parte indispensável da cultura e mesmo da identidade dos
habitantes das Ilhas. Como vamos ver nos seguintes subcapítulos, a devoção espalhou-se por
todas as localidades onde há as comunidades açorianas e as festas realizam-se nestas localidades
até hoje.
4.1. Emigração Açoriana
A vida no Arquipélago era desde sempre acompanhada por dificuldades.
Já falámos das catástrofes naturais e epidemias, mas ao longo dos séculos os insulares
enfrentaram também crises económicas.91 A partir do século XVII, a população dos Açores era
excessiva e a oferta era maior do que a procura. Sequeira Dias afirma que nunca se investia em
bens de capital. Da população só se exigia o trabalho pesado e por isso nunca houve necessidade
de educá-la.92
Desde os inícios da população até a Revolução de 25 de Abril de 1974, a única
maneira como melhorar a sua vida era emigrar. As terras que ofereceram mais prosperidades
para os Açorianos era o Brasil e a América do Norte.93 Mont´Alverne Sequeira fala sobre
a vontade de emigrar como um corte com a “pátria madrasta”94.
Sequeira Dias considera a emigração por um meio de luta pela mudança, pela
inovação e contra a pobreza. Fala duma “revolução pacífica (…) sem sangue, mas de lágrimas,
que, pela destruição do statu quo, tem permitido aos que cá têm ficado a viver melhor.”95
91 por exemplo durante da chamada “economia da laranja”, quando a distribuição da laranja para o estrangeiro – o
artefacto mais importante da produção e económica açoriana no século XVIII – diminuiu-se dramaticamente por
causa da infestação. 92 Sequeira Fátima Dias, Os Açores na História de Portugal – Séculos XIX-XX (Lisboa: Livros Horizonte, 2008),
p. 23. 93 M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e Corvo),
p. 265. 94 Mont´Alverne Sequeira, apud S. F. Dias. Os Açores na História de Portugal – Séculos XIX-XX, p. 23. 95 Ibidem, p. 23.
29
A emigração açoriana podemos dividir entre várias fazes. Em cada dela podem ser
destacados as razões específicas para a emigração e o destino que foi mais popular para emigrar.
Pela primeira fase de emigração consideramos o período entre os séculos XVII e XVIII. Nesta
faze os emigrantes dirigiam-se para o Brasil.96 A coroa portuguesa pretendia fixar as fronteiras
da sua colónia sul-americana (especialmente junto às zonas sob dominância dos espanhóis). Por
isso, neste período o Reino controlou a emigração, oferecendo aos casais as passagens para a
nova terra, concessão de terras, sementes, animais e alfaias agrícolas.97 Não foi apenas este
apoio, que ajudou os emigrantes adaptar-se. Além da fertilidade do Brasil o grande papel
desempenhou o auxílio cultural na forma da devoção religiosa, nomeadamente do culto do
Espírito Santo.
A segunda fase da emigração é o século XIX. A emigração dirige-se
especialmente para o Rio de Janeiro e a Baía, sendo as regiões mais ricas do que a Santa
Catarina. O Brasil tenha grande atração para os emigrantes açorianos e a emigração aumentou-
se. Isso é dado por acontecimentos históricos. Em 1822, o Brasil proclamou a sua
independência. Primeiro, o país abriu os portos aos emigrantes para obter mais recursos
humanos. Segundo, coroa portuguesa reforçou a presença dos seus exércitos – tratou-se também
duma forma da emigração.
O Brasil continua a ser uma destinação principal também na segunda metade
do século XIX. Além do Brasil, os destinos de emigração foram também na pequena quantia
a Ásia ou as colónias portuguesas na África. No entanto, nos anos setenta, para uma década, as
ilhas de Havai tornaram-se um novo destino para os açorianos. Os primeiros emigrantes
provinham de Faial e do Pico, seguidos por os de São Miguel. Os insulares eram atraídos pelas
informações que ouviram dos caçadores de baleias americanos.
Como terceira fase da emigração consideramos os finais do século XIX
e o século XX. Nesta fase, o Brasil acabou de ser o ponto de destino principal. Já nos finais do
século XIX existia uma ligação estável entre o Arquipélago e os Estados Unidos da América,
por causa de caça à baleia.98 Maioria da tripulação de navios baleeiros americanos era formada
por açorianos. Os baleeiros frequentemente chegavam até à costa da América do Norte
ou Havai, tendo aqui as bases baleeiras. Por este meio, os Açorianos migravam para a Nova
Inglaterra e Califórnia.99 A base baleeira dos Açores situava-se na Horta, capital do Faial.
96 Cf. José Maria Teixeira Dias, A história do povo açoriano, (Ponta Delgada: Publiçor, 2011), p. 129. 97 Cf. S. G. Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 119. 98 Cf. João António Apalhão; Victor M. Pereira da Rosa, Da emigração à aculturação: Portugal insular e
continental no Quebeque (Lisboa: Casa da Moeda, 1983), p. 20–22. 99 Cf. Tony Goulart, The Holy Ghost Festas: A Historic Perspective of the Portuguese in California, p. 19-20.
30
Logicamente, os primeiros emigrantes para a América eram os habitantes do Faial. Além deles
foram os da Angra do Heroísmo (Terceira) e os de Ponta Delgada (São Miguel), que formaram
maior grupo de emigrantes no século XX.100
Um dos destinos principais para os emigrantes açorianos tornou-se a Califórnia.
O importante é realizarmos que em 1848 as minas de ouro foram descobertas na Califórnia
e isso atraiu muitas pessoas. Os insulares, porém, nunca se interessavam tanto por extração
mineira, mas sim aproveitaram do desenvolvimento geral da região, concentrando-se nos
sectores da agricultura e do comércio. É na Califórnia onde há uma das maiores aglomerações
açorianas.101
No entanto, não foi só na Califórnia, onde os insulares se fixavam. Outra destinação
popular era costa leste dos Estados Unidos, nomeadamente o estado Rhode Island
e Massachusetts, instalando-se sobretudo nas cidades de New Bedford e Fall River.
4.2. Festas do Espírito Santo nas comunidades açorianas no mundo
Graças à emigração açoriana a partir do século XVII, as festas do Espirito Santo
espalharam-se pelas várias partes do mundo. Em alguns lugares, as festas tinham se mantido
até hoje em dia, sem perder a sua popularidade. Trata-se sobretudo dos lugares onde há uma
maior concentração dos descendentes açorianos. Mais notícias das festas do Espírito Santo
de origem açoriana temos do Brasil e do continente da América do Norte – especialmente dos
Estados Unidos da América. Em número menor podemos, porém, observar as festas também
nas outras localidades, como no Canadá (precisamente na cidade de Oakville)102 ou em Angola
(em São Jorge de Catofe, Quanza Sul, ou em Celas).103 Um facto interessante é que, com
a emigração açoriana, as festas voltaram também ao país da sua origem – Portugal continental.
Às festas do Espírito Santo no Brasil, nos Estados Unidos e em Portugal continental,
que achamos mais importantes, vão ser dedicados os subcapítulos seguintes.
100 Cf. S. G. Costa. Açores: Nove Ilhas, Uma História, p. 120. 101 Cf. ibidem, p. 120. 102 Veja em Manuel Vieira Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (4), Festas do Espírito Santo (Pico, Faial,
Flores e Corvo), p. 385–386. 103 Veja ibidem, p. 379–384.
31
4.2.1. Festas do Espírito Santo no Brasil
O Culto do Espírito Santo provavelmente foi introduzido no Brasil já pelos
missionários jesuítas que chegaram ao país junto com os primeiros colonos. Isso é o caso dos
estados de Minas Gerais e Goiás. No entanto, no sul do Brasil, a devoção ao Espírito Santo foi
com grande probabilidade trazida pelos imigrantes açorianos durante a primeira fase
da emigração (século XVII). Eles instalaram-se sobretudo nas zonas de Santa Catarina e Rio
Grande do Sul.104
Os emigrantes açorianos fizeram com que a festa lançou raízes na zona Sul
do Brasil. Nalgumas cidades do Brasil a festa tenha decaído ou até completamente desapareceu,
nas outras mantém-se viva e muito popular.
As festas do Espírito Santo celebram-se apenas nalguns estados do Brasil,
nomeadamente no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Espírito Santo, Rio
de Janeiro105 e Bahia. Nestes estados é que há o maior número de descendentes açorianos
ou portugueses. As festas brasileiras ainda continuam a manter algumas semelhanças com
as festas originais, mas o facto é que nos últimos tempos as festas tenham passado por muitas
alterações.
As folias dos açorianos, junto com os bailes, foram proibidas pela igreja e polícia
no Brasil durante do Estado nacional brasileiro.106 Hoje já não se realizam na forma de então.
Em vez delas, apareceram os mascarados a as representações ao ar livre. Além disso, a palavra
folia nunca se usava muito – o preferível foi o termo bandeira. Assim se designava a folia
e o grupo dos mordomos que recolhiam as pensões. Os textos das canções, porém, são
semelhantes aos açorianos.107
As festas funcionam como meios de compartilha da experiência biográfica
e coletiva entre os descendentes açorianos. No seu decurso, porém, participam também
os imigrantes de Portugal continental ou da Itália, tanto como os nativos brasileiros.
104 M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e Corvo),
p. 386. 105 Na cidade do Rio de Janeiro as festas do Espírito Santo existem desde o século XVIII. A festa foi proibida com
a proclamação da república. No fim do século XIX iniciaram as festas do Espírito Santo celebradas por irmandades
açorianas. Cf. José Reginaldo Santos Gonçalves; Marcia Contins. “Entre o Divino e os Homens: a Arte nas Festas
do Divino Espírito Santo.ˮ Horizontes Antropológicos, p. 70–73. 106 Cf. ibidem, p. 70–73. 107 M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e Corvo),
p. 389–393.
32
4.2.2. Festas do Espírito Santo nos Estados Unidos da América
Os açorianos que chegaram para a Califórnia adaptaram-se bem e rapidamente
na nova terra. Tornaram-se agricultores, comerciantes e criadores do gado. Os Açorianos até
tiveram fama de ser bons agricultores e prosperavam na Califórnia.
Como é habitual aos açorianos através dos séculos, permaneceram fiéis às tradições
trazidas da terra natal. Para os emigrantes açorianos, a religião desempenhava o papel da
consolação e identificação, ligava os emigrantes com a terra natal e as memórias. Reforçava
o senso da identidade na terra e na cultura aliena. Quando os açorianos se tornaram
economicamente independentes, começaram a construir as primeiras Igrejas e fundar várias
associações, entre outros as Irmandades do Divino Espírito Santo. A primeira Irmandade parece
datar de 1887.108
O número de Irmandades multiplicou-se e no presente deve chegar até a algumas
centenas. Há, claro, grandes mudanças nas festas. São as Irmandades que só têm como membros
os descendentes açorianos, são as Irmandades que não dependem da raça. “A língua
desapareceu, mas a fé ficou”109, é a descrição certeira do Gaspar.
Entre 1860 e a década de 1900 os açorianos emigravam para o território de São
Francisco, onde encontravam terras férteis. Os açorianos foram os agricultores sucessíveis
e logo ganharam boa posição na sociedade. Começaram a fundar as organizações comunitárias,
tal como bancos, hospitais, hotéis, igrejas e primeiras Irmandades do Espírito Santo. Uma das
primeiras Irmandades, Irmandade do São Leandro, foi fundada em 1870.110
“A saudade da terra que muitos nunca mais viram, a caridade e a fé inspiraram
os primeiros Açorianos a dar continuidade às Festas do Divino Espírito Santo no Novo Mundo,
formando cerca de 150 Irmandades na California.”111 Com estas palavras Gaspar sugere quais
foram as razões para fundar as Irmandades.
Como já sabemos, na segunda fase da emigração, os emigrantes açorianos
chegaram às ilhas isoladas do Havai. Como é típico para os açorianos, conservaram os seus
costumes mesmo nas novas terras. Um dos costumes que se manteve até hoje são as festas do
Espírito Santo. Os descendentes dos emigrantes açorianos no Havai costumam visitar
os Açores, tendo consciência sobre as suas raízes.112
108 Cf. T. Goulart. The Holy Ghost Festas: A Historic Perspective of the Portuguese in California, p. 23. 109 M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e Corvo),
p. 375. 110 Cf. ibidem, p. 379–380. 111 Ibidem, p. 380. 112 Cf. Ibidem, p. 401.
33
Alguns emigrantes açorianos vieram com a ideia de congregar todas as irmandades
do Espírito Santo nos Estados Unidos e Canadá. As irmandades oriundas dos vários estados
da América do Norte e Canadá conseguintemente concentraram-se na Nova Inglaterra,
precisamente em Fall River. É aqui onde têm lugar as grandes festas em honra do Divino
Espírito Santo. No dia 8 de Março de 1986 saiu uma ata que estabelecia uma realização anual
das Grandes Festas do Espírito Santo.113
4.2.3. Festa do Espírito Santo em Portugal continental
Apesar de a festa do Espírito Santo original ter quase desaparecido no Continente,
existem ainda alguns vestígios que testemunham que foi em Portugal continental que a festa,
agora tão popular nos Açores, originou. Em Portalegre, Marvão e Nisa existem os documentos
datados do século XV, onde podemos encontrar as referências ao Culto do Espírito Santo.114
Também há lugares como Penedo, Tomar e Monchique, onde as festas do Espírito Santo
sobreviveram até hoje, mesmo que numa forma alterada.
As festas do Espírito Santo do Penedo (conselho da Sintra) são consideradas as mais
fiéis às celebrações originais, introduzidas em Portugal pela Rainha Isabel. A festa toma lugar
no dia de Pentecostes. Antigamente aludia às tradições de três dias simbólicos do ritual
tradicional – matança do boi, coroação do imperador e bodo. Na localidade do largo à frente
duma pequena ermida, era montado um trono, ricamente decorado com flores e ramos. Um dos
mais pobres da freguesia era sentado neste trono e coroado. No largo instalaram-se também
as mesas e as mulheres serviam os pobres com carnes que os homens coziam em grandes
panelas junto ao largo. Demonstrava-se assim a ideia de partilhar a riqueza com os pobres. Hoje
em dia há tentativas de manter vivo o culto do Espírito Santo e passar a tradição para as novas
gerações. Os três dias simbólicos são, porém, substituídos por um piquenique e existe o perigo
de festas desparecerem completamente, por causa dos problemas económicos.115
Na cidade de Tomar a devoção sobreviveu na forma da Festa dos Tabuleiros que
se realiza de 4 em 4 anos. A reminiscência da celebração original é um cortejo, que, no dia da
festa, ricamente decorado percorre as ruas da cidade de Tomar.116
113 Cf. Ibidem, p. 379–384. 114 Cf. F. E. de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores, p. 37. 115 Cf. M. V. Gaspar, Património dos Açores em Filatelia (3). Festas do Espírito Santo (Santa Maria, S. Miguel,
Terceira, Graciosa e S. Jorge), p. 21. 116 Cf. Ibidem, p. 20.
34
Oliveira Martins menciona as notícias que temos das folias que figuravam nas
procissões de Corpus Christi117 em Coimbra, Guimarães, Castelo Branco e Viseu, desde
o século XV até os meados do século XVIII. Foi nas figurações que iam na procissão de Corpus
Christi onde originaram as festas do Espírito Santo. A relação com a folia era tão íntima e o seu
papel tão importante em tais festas, que nalgumas localidades do Continente a festa do Espírito
Santo confundiu-se completamente com a folia. Por exemplo, no Monchique (Algarve) a festa
do Espírito Santo sobreviveu na forma duma festa com seis foliões designada folia.118
Graças às reminiscências das festas do Espírito Santo originais em Portugal
continental, junto com a festa católica de Corpus Christi, o Culto do Espírito Santo manteve-se
na consciência do povo e com a imigração açoriana para o Continente a tradição foi reiniciada
sem dificuldades.
Há grande número dos açorianos que mudaram para o Continente, na maioria dos
casos por razões económicas ou por causa dos estudos. Muitos os insulares têm raízes culturais
bastante fortes e, mesmo que deslocados do Arquipélago, costumam manter contacto entre si
e não querem perder as suas tradições. Existem as associações açorianas, nas quais os
portugueses oriundos dos Açores encontram-se e discutem sobre a sua terra natal, com
o objetivo de promover todos os seus aspetos: a cultura, a música, os artesanatos e outros.
As associações reúnem os açorianos, naturais ou descendentes, de todas as ilhas.
Entre estas associações permanece o chamado Grémio dos Açores, que foi
fundado em 27 de março de 1927 em Lisboa. No ano de 1928, o Governo português reconheceu
a associação como instituição de Utilidade Pública. Hoje em dia, a associação chama-se Casa
dos Açores e tem se espalhado para outras cidades, como o Porto e Faro, e até para
as comunidades na América. Graças à Casa dos Açores podemos assistir à festa do Espírito
Santo com o mesmo aparecimento que tem nos Açores: há coroações, procissões e sopas.
Centenas de açorianos reúnem-se por ocasião da festa no local da sua realização.119
Como já foi dito, a Casa dos Açores existe também no Porto e em Faro. A do Porto
chama-se a Casa dos Açores do Norte. Foi criada no dia de 6 de março de 1980.120 A missão
da Casa é permanecer leal às tradições do Arquipélago, entre outras também à devoção ao
Espírito Santo.
117 Também designadas como Corpo de Deus 118 Cf. F. E. de Oliveira Martins, Festas Populares dos Açores, p. 293. 119 Cf. M. V. Gaspar. Património dos Açores em Filatelia (4). Festas do Espírito Santo (Pico, Faial, Flores e
Corvo), 2º Volume. Ponta Delgada: O Milhafre, 2005, p. 372. 120 Cf. ibidem, p. 373.
35
A Casa dos Açores do Algarve tem a sua sede em Faro. É apoiada pelas Câmaras
Municipais dos Açores e do Algarve e junto organizam as festas do Espírito Santo. Uma parte
da festa consta de um cortejo, refeição e esmolas alimentares para as famílias necessitadas e os
residentes do local da festa. Outra parte é mais aberta ao público e consta de espetáculos com
artistas açorianos e algarvias e de apresentações de produtos açorianos. Além dos açorianos
e algarvias, participam na festa os representantes da Assembleia Legislativa e do Governo da
Região Autónoma dos Açores.121
121 Cf. ibidem, p. 373–374
36
Conclusão
Em todo o Arquipélago há celebrações semelhantes, geralmente situadas no período
entre o domingo de Páscoa e o domingo de Pentecostes. As festas do Espírito Santo têm dois
pontos culminantes: a Coroação e a Refeição Cerimonial. Sobre estes acontecimentos
concentram-se as cenas características do Culto. Hoje as festas são típicas por procissões,
abundância das esmolas e almoços e geralmente têm grande beleza.
Não existe uma clara fronteira entre a parte religiosa e a parte secular da festa.
Os ritos tradicionais dentro das festas populares do Espírito Santo estão cheios de
reminiscências pagãs. Entretanto, o seu significado passou, na medida diferente, por um
processo de cristianização. Ambos os aspetos, religioso e profano, são interligados
e inseparáveis e em conjunto criam uma festa única e excecional.
Sem dúvida, as Festas do Espírito ocupam o lugar central dentro de conjunto das
expressões da cultura popular dos Açores. Esta devoção originou na Europa medieval, com
o andar do tempo praticamente desapareceu de Portugal continental, mas manteve-se nos
Açores, com o grande vigor. Há vários fatores que alimentaram o culto do Espírito Santo nos
Açores e possibilitaram ao culto antigo sobreviver até hoje na forma tão viva e dinâmica.
Destacam-se entre elas a influência dos franciscanos, o isolamento dos ilhéus,
a inescrutabilidade da natureza ou o carácter popular da devoção. O Culto do Espírito Santo
espalhou-se também para os outros territórios onde os emigrantes do Arquipélago se radicaram.
Graças a isso, as festas do Espírito Santo da origem açoriana celebram-se sobretudo no Brasil,
na América do Norte e voltaram também para Portugal continental. As festas, porém, não são
em exclusivo um assunto dos descendentes das Ilhas e nas suas celebrações participam também
as pessoas nativas do respetivo país, sendo esta divulgação e a crescente popularidade outros
fatores que alimentam o Culto.
Devido a todos os fatores acima mencionados, podemos concluir que a festa do Espírito
Santo merece ser reconhecida como o património Imaterial da Humanidade da UNESCO. A
festa cumpre os fatores necessários para este reconhecimento. Primeiro, trata se dum património
cultural imaterial que é transmitido de geração em geração, tem raízes profundas na história de
Portugal, é dinâmica e constantemente recriada. Segundo, a comunidade açoriana reconhece
a festa como fazendo parte das suas tradições, da sua identidade e do seu património cultural.
Terceiro, a festa mostra a especificidade indiscutível: é uma mistura excecional da festa
37
religiosa com uma festa popular, promovida e realizada pelos leigos. Finalmente, não há dúvida
sobre a vitalidade da festa, desde que mostrámos a extensão enorme da expansão do Culto
do Espírito Santo açoriano pelo mundo.
Como foi mostrado neste trabalho, a festa do Espírito Santo nos Açores tem tanto uma
tradição profunda, como um potencial enorme para se manter viva também nos futuros anos.
Portanto, acreditamos que a festa logo suceda nas suas tentativas de entrar em UNESCO como
o património Imaterial da Humanidade.
38
Resumé
Slavnost Ducha svatého je nejvýznamnější lidová a náboženská slavnost na Azorech.
Tradičně se slaví v období mezi Velikonocemi a církevním svátkem seslání Ducha svatého,
ačkoliv v současné době se často přesouvá až do letních měsíců. Oslavy vychází z ideálů lásky
k bližnímu a sdílení. V rámci slavnosti se realizují průvody, distribuce jídla a prostředků
potřebným, veřejná pohoštění a také různé kulturní události, jako hudební vystoupení a taneční
zábavy. Vrcholným bodem slavnosti je rituál korunovace (s křesťanskou symbolikou)
a společné pohoštění určené pro širokou veřejnost.
Slavnost má původ ve středověké Evropě, na Azory přišla již v patnáctém století
z Portugalska, společně s prvními obyvateli. Přestože původní slavnosti v kontinentálním
Portugalsku již téměř vymizely, na Azorech se dále rozvíjely a získaly na popularitě.
K faktorům, které přispěly k zakořenění slavnosti na ostrovech a jejímu dalšímu rozvoji řadíme
působení církevního řádu františkánů (zejména v počátcích osidlování ostrovů), izolovanost
ostrovů, přírodní katastrofy a také skutečnost, že slavnosti mají spíše lidový než náboženský
charakter. Slavnosti Ducha svatého se zejména od sedmnáctého století začaly spolu s azorskou
emigrací šířit do dalších zemí. Díky tomu dnes původně azorské svatodušní slavnosti existují
také v Brazílii, Spojených státech amerických, Kanadě a v neposlední řadě se vrátily také
do kontinentálního Portugalska.
Slavnosti Ducha svatého se již od roku 2000 pokouší o zapsání mezi nehmotné památky
UNESCO. V souvislosti s tím v posledních letech vzniká stále více studií o slavnosti, dochází
k její propagaci a popularizaci. Tato bakalářská práce ukazuje, že slavnosti Ducha svatého
na Azorech splňují požadavky pro zapsání do seznamu nehmotného dědictví UNESCO.
39
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41
Anexo
1. Junta de bois a carregar a refeição. Grandes festas em Ponta Delgada em 2015.
Fonte: foto da autora
2. Carro enfeitado com os símbolos do Espírito Santo, pomba e coroa. Grandes festas em
Ponta Delgada em 2015.
Fonte: foto da autora
3. Carro no desfile com massa sovada. Grandes festas em Ponta Delgada em 2015.
Fonte: foto da autora
4. Distribuição da massa sovada. Grandes festas em Ponta Delgada em 2015
Fonte: foto da autora
A folia.
5. A folia na Avenida Infante D. Henrique. Grandes festas em Ponta Delgada em 2015
Fonte: foto da autora
6. As Sopas do Espírito Santo no Campo de São Francisco. Grandes festas em Ponta
Delgada em 2015
Fonte: “Câmara espera servir 14 mil Sopas do Espírito Santo no sábado.” Ponta
Delgada, Câmara Municipal [online], disponível em http://pontadelgadaportal.ambisi
g.com/site/frontoffice/default.aspx?module=news/news&id=92831&AspxAutoDetect
CookieSupport=1 (acesso em 26/04/2016).
7. Missa campal do Espírito Santo na frente da igreja Matriz. Grandes festas em Ponta
Delgada em 2015
Fonte: foto da autora
8. Presidente de Câmara Municipal com a coroa e a bandeira do Espírito Santo. Grandes
festas em Ponta Delgada em 2015
Fonte: foto da autora
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1. Junta de bois a carregar refeição
2. Carro enfeitado com pomba e coroa
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3. Carro no desfile com massa sovada
4. Distribuição da massa sovada
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5. A folia
6. Sopas do Espírito Santo
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7. Missa campal do Espírito Santo
8. Presidente de Câmara Municipal com a coroa e a bandeira do Espírito Santo
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Anotace
Autorka: Markéta Čajánková
Fakulta, Katedra: Filozofická fakulta, Katedra romanistiky
Název bakalářské práce: A Festa do Espírito Santo açoriana
Vedoucí práce: Mgr. Petra Svobodová, Ph.D.
Počet znaků: 86 938 (bez mezer 73 258)
Počet příloh: 8
Počet titulů literatury a internetových zdrojů: 23
Klíčová slova: festa do Espírito Santo, Açores, Impérios, Irmandades, Coroação, Refeição
Cerimonial, UNESCO
Abstrakt: Bakalářská práce pojednává o azorských slavnostech Ducha svatého. První kapitola
podává obecné informace o slavnosti, popisuje její hlavní pilíře a definuje pojmy spojené
se slavností. Druhá kapitola se zabývá původem a historií slavnosti, popisuje dobovou filosofii
a další okolnosti, které zapříčinily zrod slavnosti ve středověké Evropě a její šíření
do Portugalska. Třetí kapitola popisuje příchod slavnosti na Azorské ostrovy a její vývoj až
do dnešní podoby. Poslední, čtvrtá kapitola se věnuje šíření slavností Ducha svatého
z Azorských ostrovů do dalších zemí světa.
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Annotation
Author: Markéta Čajánková
Faculty and Department: Faculty of Philosophy, Department of Romance studies
Title of the thesis: The Azorean Holy Ghost Festival
Work Supervisor: Mgr. Petra Svobodová, Ph.D.
Number of characters: 86 938 (no spaces 73 258)
Number of used sources of literature: 24
Key words: Holy Ghost Festival, Azores, Empires, Coronation, Ceremonial feast, UNESCO
Abstract: This bachelor thesis deals with the Azorean Holy Ghost festival. The first chapter
provides general information about the festival, it describes its main pillars and defines some
terms connected with the festival. The second chapter deals with the origin and history
of the festival, it describes the philosophy of that time and the circumstances that initiated
the festival in the medieval Europe and caused its later spreading to Portugal. The introduction
of the festival on Azores and its later development to the present form is described in the chapter
three. The last, fourth chapter examines the further spread of the Holy Ghost festival from
the Islands to other parts of the world.