A Crise Atual
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A CRISE ATUAL: A LÓGICA RENTISTA E A NOVA FACE DO ESTADO, DO TERRITÓRIO E DAS FORMAS DE DESENVOLVIMENTO*
Ruy Moreira**
Uma comparação da forma como governos e instituições econômicas
encaminham a superação da crise que começou em 2008 e já se arrasta por cinco anos e
encaminharam a superação da crise de 1929 ajuda-nos a entender o momento e as
formas do capitalismo de nosso tempo. E, assim, a forma e função do Estado, do território
e do desenvolvimento que se apresentam nesta quadra de tempo.
A posologia de ontem e de hoje
Na crise de 1929 a dificuldade de venda de seus produtos leva as empresas à
prática, que se tornara hábito diante das crises cíclicas, e de que esta era mais uma
delas, do que Marx designara no O Capital de queima de capital variável. Isto é, demissão
de empregados em larga escala, no suposto de isto levar à redução dos custos e assim a
lograr-se administrar o momento difícil, que se esperava fosse passageiro. Assim, o que
era um problema de superprodução ou subconsumo ainda mais se agravava. A queda
das vendas, combatida com demissões, ainda mais aumentava o desemprego
generalizado, retraindo mais ainda o mercado consumidor, assim chegando-se a um
ponto sem retorno de falência e fechamento de empresas. O resultado foi um mergulho
em parafuso na recessão da economia como um todo. Foi isso a recessão, transformada
depressão de 1929.
A saída foi a intervenção estatal – o new deal nos Estados Unidos – na forma da
realização de grandes obras de infraestrutura, a exemplo do TVA (Tennessee Valey
Authority), destinadas a um começo de retomada dos níveis de emprego, e assim do
consumo, das vendas, da produção, do funcionamento das empresas, condutora duma
recuperação, por fim, da economia e ultrapassagem do estado de crise em definitivo.
A crise atual vem sendo enfrentada de forma diferente. Tendo origem diferente,
tem assim uma agenda de recuperação diferente. Embora a ação de intervenção do
Estado, visando garantir os níveis de consumo, dê a sensação de uma mesma posologia,
na forma como este se relaciona com a esfera do consumo, transferindo dinheiro público
* Texto de intervenção na conferência de encerramento do 1º. Seminário Internacional – Estado, Território e Desenvolvimento: contradições, desafios e perspectivas, promovido pelo Departamento de Geografia da UFBA, em junho de 2012, e na mesa redonda As metamorfoses do capital: novos conceitos, velhas práticas, do XVII Encontro Nacional dos Geógrafos, promovido pela AGB em julho de 2012.** Professor do quadro permanente do Programa de Pós-Graduação em geografia da UFF e dos cursos de graduação e pós-graduação em geografia da FFP-UERJ.
para repasse pelos agentes financeiros ao crédito ao consumidor, ao invés de combate ao
desemprego como alavanca de retomada do consumo, reside toda diferença.
Seja como for, por trás das semelhanças e diferenças está na entrada da
sociedade capitalista num modo novo de movimento da produção e do consumo, cujo
efeito é uma completa redefinição das formas igualmente do Estado, do território e do
desenvolvimento social e econômico, o que distingue aquele deste momento.
A dominação rentista e a natureza da crise atual
A crise de agora tem os mesmos Estados Unidos como ponto de origem. Mas sua
ocorrência não só se dá no âmbito do consumo, como em 1929, como encontra nele o
próprio terreno de solução. O foco da eclosão foi a chamada bolha imobiliária. O estado
de inadimplência a que a classe média norte-americana fora jogada diante de um quadro
de dívida de compra de imóvel provocado pelo próprio modo como programou-se seu
financiamento. O modo de financiamento desdobrando-se numa dívida inapagável,
mesmo o capital imobiliário usando o recurso do alongamento do prazo, tornando o tempo
da dúvida mais dilatado, mas com a aparente vantagem da redução a uma prestação a
um nível mensal mais palatável. Sucede que a mesma lógica do financiamento que
estimula a compra fácil, amplamente financiável a créditos fartos, é a que leva esta classe
média – na prática a população norte-americana como um todo – a adquirir pelo mesmo
sistema de crédito de financiamento em simultânea uma diversidade de outros bens, num
acúmulo que inadvertidamente um dia se revela um montante de dívida e juros maior que
a própria renda mensal do endividado. Assim decretando-se o estado falimentar de
insolvência que deu na “bolha” (Foster, 2004).
A saída, tal como na crise de 1929, desloca-se da esfera do trato econômico para
a esfera do Estado. Mas aqui para o fim do governo norte-americano encaminhá-la
através a pura e simples transferência de maciços recursos públicos aos bancos de
financiamento de consumo, para o repasse, por esses, por sua vez, para o universo dos
consumidores. O Estado estimulando e avalizando a expansão das compras, no
argumento de que seu contínuum é o antídoto a uma tendente generalização da crise
para o campo produtivo, que a transforme de uma crise pontual do sistema de crédito
imobiliário numa crise da indústria e por meio desta da totalidade do todo sistêmico da
economia do país, numa nova, e muito mais complicada, crise de 1929.
No fundo, está-se buscando evitar vir à transparência da crise a novidade de
conteúdo do próprio sistema. A percepção pública da origem no próprio mecanismo do
funcionamento rentista. E, assim, tratar-se agora da crise de uma economia cuja lógica é
o endividamento pelo financiamento sem limite do consumo, a lucratividade desse
endividamento sendo o roteiro do enriquecimento do capital que agora domina (Moreira,
2012). A inconsistência da liquidez de um mecanismo desse tipo e o esquema de
regulação pensado para equilibrá-lo sendo a essência do problema.
O fato é que as agências de financiamento de consumo – a instituição criada pelo
rentismo em substituição ao antigo banco mercantil do sistema financeiro – financiam
compras a crédito, emprestando sem lastro basicamento algum, dizendo, no limite, se
apoiar numa instituição de retaguarda, também ela fictícia, a agência de seguro, quando
na verdade é o recurso público do Estado o lastro de garantia real e verdadeiro que está
por trás do seguro de tudo. Daí que declarada a insolvência da classe média e logo em
seguida do público consumidor norte-americano, todo este castelo de faz de contas vê-se
em ruínas. O Estado tendo que intervir como o avalista verdadeiro do rentismo. Sendo
esta a forma como o combate à crise é encaminhado. E o teor da diferença do
encaminhamento da crise de 1929.
A transferência de recursos públicos para repassagem ao consumidor pelas
agências de financiamento do consumo tem, todavia, o limite de recursos do Estado.
Esgotado este recurso, para dar sequência ao movimento de contínuidade de repasses
que, supõe-se, supere e ultrapasse a crise do consumismo rentista, o Estado tem que
repô-lo. Indo buscá-lo no próprio sistema de crédito, num círculo vicioso, a insolvência e
dívida rentista privada se transfigurando em insolvência e dúvida pública de caráter
permanente. A insolvência privada virando uma insolvência pública. Logo transformada
numa dívida e insolvência sem limites do Estado,
Foi o que ocorreu nos Estados Unidos, após os sucessivos aportes de dinheiro
público postos nas mãos das agências rentistas para crédito financiado ao consumo. A
insaciedade sem limites do capital rentista mostrando seu parasitismo sem fim, no
argumento da insuficiência dos aportes sucessivos do Estado, mesmo ampliado e em
regularidade, é o que se vê. Aqui não se excluindo a levada de sujeição do governo ao
vai-vem das disputas dos partidos políticos dentro do Parlamento, ao qual, ao fim e ao
cabo, o governo Obama necessitou recorrer, em vista da necessária autorização de
ultrapassagem do limite de pedidos de empréstimo ao sistema financeiro global pelo
governo estabelecido por lei.
Se ao cabo do fluxo contínuo o Estado, como segurador real e verdadeiro da
estabilidade do sistema de financiamento ao consumo do rentismo, logra um mínimo de
restabelecimento da manutenção do nível de consumo global da sociedade americana,
não logra impedir, todavia, os efeitos reflexos da crise sobre a esfera da produção
industrial. Uma fatia crescente de indústrias vem a declarar-se em estado de falência, o
Estado também tendo que para estas voltar seus repasses, mas a um preço diferente
daquele estabelecido para a esfera das financeiristas, a indústria tendo que alienar parte
de seu património frente ao Estado, numa espécie de hipoteca, distante do repasse a
fundo perdido dado às agencias do rentismo.
O resultado é o movimento de um volumoso montante de recurso em dinheiro que
estabiliza a situação financeira das agências do rentismo, mas ao preço de uma dilatação
e alongamento agônico da crise socioeconômica que não vê prazo para terminar. Seja
para a situação semifalimentar do mundo da indústria. E seja já agora para a do aumento
do desemprego industrial e terciário da classe trabalhadora norte-americana.
É, assim, que a crise mundialmente se amplia rumo às economias nacionais da
Europa do euro. Aqui, o mecanismo da eclosão e o grau de afetamento continental são
diferentes, mas é a mesma a sistemática de debelamento da crise por meio de
transferência de recurso público para o repasse pelo rentismo ao mercado de crédito de
financiamento do consumo. Além de que “bolha” é aqui a insolvência dos Estados
mediterrânicos, Grécia, Espanha e Portugal, a que logo se acrescenta a Itália, face o
estado de endividamento público, denominada dívida soberana, gerado pela forma como
seus governos valem-se do uso dos recursos a eles ofertados, também no sistema de
repasse a fundo perdido, pelos países mais avançados quando da entrada deles na
unidade européia do euro. Usado, em geral, em obras de transporte e comunicação
destinadas ao estímulo ao turismo, numa forma de igualmente priorizar-se o mecanismo
de consumo, não em obras gerais de infraestrutura destinadaa a elevar o nível global de
produtividade do sistema integral da economia, como era o intuito original do repasse, o
investimento estatal cedo ultrapassa o volume do recurso disponível, os governos levando
seus Estados a um endividamento crescente com os bancos europeus de financiamento,
até o limite da quebra. O apetite insaciável do rentismo aqui se manifesta igualmente por
intermédio da sua ação combinada às empreiteiras, no caso europeu através de obras de
longas e modernas vias de circulação levado a cabo pelas empreiteiras, não de
habitações residenciais, como fora nos Estados Unidos, essa interrelação rentismo-capital
imobiliário também aqui se pondo na origem da crise.
Entretanto, se nos Estados Unidos a dívida da “bolha” atinge a esfera do
consumidor privado, ao passo que na Europa do euro é a esfera pública do Estado a
instância atingida. De resto, o desdobramento é praticamente o mesmo: aumento da
dívida dos Estados, crise da esfera produtiva e desemprego no setor industrial e dos
serviços, o sistema industrial e, sobretudo, a classe trabalhadora pagando a conta. Com a
juventude, sejam os filhos da classe média e sejam da classe trabalhadora, respondendo
pela maior parcela. E, mais aqui que lá, o modo de acerto do pagamento da dívida mostra
o grau de insaciedade desmedida do capital rentista, os Estados nacionais “tendo de
honrar” suas dívidas com o capital especulativo, inusitada e cinicamente posto a um só
tempo como endividado e emprestador, pagando, a taxas escorchantes de 7% ao mês,
uma dívida que é do rentismo, o recurso sendo agora buscado na política de austeridade
que transfere o ônus da crise do âmbito do rentismo para o todo da nação, numa saída de
resto nada difrente da norte-americana.
No limite, o banco central europeu do euro vê-se, então, chamado a intervir.
Financiando, a juros mais baixos que os cobrados pelo emprestador rentista aos governos
falidos, numa socialização da crise dos Estados do sul para o todo da população
trabalhadora européia do euro, esta nova dívida, eufemisticamente chamada dívida
soberana, sendo paga por estes Estados às próprias às agências de especulação
européias. As principais delas, por sinal, sediadas na Alemanha e na França!
A sobreacumulação dos anos 1970, o neoliberalismo e a origem do capital rentista
A emergência do rentismo é um fenõmeno já percebido por Bukarin no começo do
século XX, em sua obra, pouco divulgada, La economia política del rentista: crítica de la
economia marginalista, de 1913 (Bujarin, 1974). Enquanto Lênin vê-se às voltas com a
emergência da aristocracia operária e o mecanismo da exportação do capital como
essência estrutural do capitalismo em sua fase imperialista (Lênin, 1979) e Rosa
Luxemburgo com o tema da reprodução do capitalismo por meio da reprodução do não-
capitalismo (Luxemburgo, 1983), Bukarin vislumbra para além da emergência do
capitalismo financeiro o embrião do capital rentista, vinculado já então ao discurso da
soberania do consumidor da economia marginalista, neo-clássica, hoje amplamente
evidenciado empiricamente comoa regra por excelência do modo de acumulação do
rentismo (Moreira, 2011). Para compreendê-lo, desloca-se então da Rússia para ir
estudar na Áustria com Menger, Jevon e Walras, teóricos do capital financeiro, mas com
os pés já amarrados no nascimento do capital rentista, assim captando o fenômeno em
plena fase de surgência. Suas teses logo sendo incorporadas por Lênin, como explica no
Prefácio que faz para O imperialismo e a economia mundial, e Bukarin põe na abertura
que antecede as edições posteriores a 1917 (Lênin, apud Bukharin, s\d).
No então, nota-se já o característico descompromisso do rentismo com o
processo da produção, o esquema da reprodução D-M-D` – em que se envolve
fundamentalmente ainda o capital financeiro, um ente oriundo da fusão do grande banco e
da grande indústria –, traço do seu caráter essencialmente especulativo. É na década de
1970, entretanto, que por fim o capital rentista se descola do capital financeiro, ganha
autonomia em relação a ele e se lança ao domínio do sistema do capitalismo no seu todo,
impondo-lhe sua hegemonia. E o gatilho é o estado de sobreacumulação em que a
aconomia capitalista se encontra nessa década (Harvey, 2004; Foster, 2009). Arrumado
numa relação reprodutiva de esquema diretamente D-D`, o capital rentista tem porém de
nutrir-se sempre no movimento da acumulação industrial-financeira. Sobranceiro, mas
vinculado de algum modo à produção industrial e de serviços terciários necessariamente.
Já começa que vem de origem do forte volume de capital-dinheiro que o conjunto
de medidas tomadas pelo próprio rentismo emergente libera da elevada escala de
sobreacumulação que a economia industrial adquirira estruturalmente no correr do
desenvolvimento acumulativo dos anos 1950 aos anos 1970. Fortemente assentada na
estatização da infraestrutura e dos ramos estratégicos de uma estrutura econônomica
enraizada na esfera da indústria, a acumulação capitalista cresce ininterruptamente por
três décadas – os anos gloriosos do pós-guerra – até que nos anos 1970 este mesmo
suporte infraestrutural ganha uma estatura material fortemente engessada e engessadora,
passando contraditoriamente a funcionar como um bloqueio ao movimento sequencial da
própria acumulação capitalista para cujo socorro viera. Vira, assim, uma massa de capital
estatal empatada na forma de capital fixo e capital constante – o famoso capitalismo
monopolista de Estado de Bocarra e economistas do PCF –, que enseja a pressão de
liquefação que converta e libere esse capital em forma de capital-dinheiro num amplo
espectro de liquidez circulante para e por todo o sistema. Pressão que vem justamente do
capital rentista, por meio de seus epígonos do Consenso de Washington. Proponentes de
uma liberação do capital assim sobreacumulado na forma da privatização que entregue
via venda as empresas estatais, seja no terreno da infraestrutura e seja do parque
industrial de bens intermediártios e de serviços, à propriedade do empresariado privado e
em sentido contrário essa venda traduza numa disponibilização para o Estado de um
volumoso montante em dinheiro para usos outros. Cujo destino acaba sendo o fundo de
segurança voltado para o fim de garantir o desenvolvimentoo dum processo generalizado
de consumo em larga escala, intermediado pelo crédito de endividamento fácil e farto
oferecido ao mercado pelas agências do financiamento rentista. Um amplo remonte
patrimonial e institucional com impacto maior sobre o Estado, o sistema empresarial e o
arranjo do território tem assim lugar, rearrumando suas formas de organização e funções,
num forte reajuste desses setores ao novo modo de funcionamento sistêmico do modo de
produção capitalista. E é isto o neoliberalismo. E a chamada reestruturação neoliberal.
O neoliberalismo é esta simultaneidade de liquefação desse enorme volume de
capital-dinheiro empatado em infraestrutura e instituições produtivo-administrativas do
Estado e seu despejo na esfera do consumismo sem limites. Para isso desmontando-se e
remontando-se o todo estrutural do capitalismo num novo modo sistêmico, com o Estado
e o território moldados agora segundo as necessidades e ausência de emperramentos à
livre mobilidade do capital rentista. Daí que ao invés de uma fase nova do capitalismo,
como se aventou amplamente na literatura política e de estudos, e duma pura
reestruturação flexível, o neoliberalismo mais não é que o conjunto de medidas
destinadas a rearticular num novo modo de regulação o modus operandi do sistema
capitalista, trocado da base industrial para a base funcional puramente especulativa do
sistema rentista. A plêiade de desmontes-remontes – daí seus próprios criadores
preferirem designá-lo um ajuste neoliberal –, realizadores da transição, essa, sim, fásica,
que se fazia necessária de uma forma para outra de acumulação capitalista, tornou-se por
isso seu traço mais conhecido.
O modus operandi rentista
Eis a razão da diferente forma de encaminhamento da crise de 1929 e de 2008. A
sequencial de recuperação dos níveis estruturais da economia capitalista, com ponto de
partida e ponto de chegada no plano do funcionamento da indústria, característica de
1929. E a na aparência puramente epidérmica, com ponto de partida e ponto de chegada
no plano do sistema de financiamento do consumo rentista, característica de 1008. Ao
lado da carrada de similitudes de ocorrências.
O fato é que todo o conjunto de medidas tomadas pelos governos relativas ao
encaminhamento da crise do presente visa manter o quadro de referências sem o qual a
acumulação rentista não se consuma. E fazer convergir as intervenções do Estado para
este sentido. Independente das consequências. Seja a contunuidade e expansão do
processo do consumo mesmo diante do crescimento da inadimplência. E seja a
perenidade do endividamento da sociedade e do Estado daí advinda. Consumam e
consumam. Eis a legenda da fala dos governos, dos Estados Unidos aos países europeus
do euro, passando pelos países chamados emergentes como o Brasil. Que assim não só
cuidam de garantir a transferência regular e vultosa de seus fundos públicos para as
agências de financiamento, com a formalidade da exigência do repasse destes para o
sistema de crédito ao consumo de massa, que o rentismo nunca consuma. Como agem
reduzindo o rol de dificuldades que induzam à queda do preço de vendas e forjem a
atitude de ida ao consumo, a exemplo da redução de impostos cobrados à produção, ao
consumo e às próprias instituições financeiras.
Foi este sobretudo o procedimento do governo brasileiro, visando antecipar-se e
debelar a possibilidade da chegada crise ao Brasil antes mesmo que ela aqui chegasse.
Junto ida à televisão conclamando a população a continuar consumindo, reduziu impostos
cobrados à indústria, em particular o IPI, cobrado à produção de automóveis, por longo
tempo o carro chefe do desenvolvimento brasileiro e ainda agora mantém o poder
germinativo que fez da indústria automobilística o ramo de ponta da expansão global da
economia brasileira até os anos 1970. Acrescentando-se o fato de ser este ramo a base
sindical do governo Lula. Assim como na área de materiais de construção, destinado a
estimular o mercado imobiliário. Desse modo, repetindo internamente no Brasil uma,
senão a principal, medida do governo Obama frente à iminência de irradiação da crise do
setor rentista-consumista para o setor da indústria. O que acabou por acontecer, abalando
empresas e áreas industriais simbólicas e históricas da geografia econômica norte-
americana como a combinação Ford-Detroit.
Sendo assim, tal como nos Estados Unidos, também no Brasil a eclosão e
propagação da crise não foi evitada. A inadimplência não só se instala, como põe sob
ameaça a própria performance da indústria que se visava proteger. Poucos anos após tais
medidas, 60% da nova classe média cai na inadimplência, sobretudo pela compra a
crédito e financiado de automóveis. E de 25% a 33% da classe trabalhadora brasileira vê
seu salário mensal comprometido pelo acúmulo de dívidas de compras diversas.
A compra-venda financiada de automóveis, origem do problema da chamada
nova classe média brasileira, é por sinal um exemplo típico do modus operandi da ação
rentista. A compra de automóvel faz-se sobre a base do financiamento pelas agências do
rentismo. Feita numa revendedora, a dívida da compra a crédito vê-se invariavelmente
repassada por esta para a agência de financiamento pertencente ao mesmo grupo da
revendedora e da indústria – na aparência jurídica três distintas empresas que mal
escondem seu parentesco no uso do mesmo logotipo – o comprador vendo-se assim
assinando notas promissórias de dívidas de prestações mensais com a agência de
financiamento sem mesmo ter entrado nela, tudo a título da liquidez necessária da
revendedora no dia-dia de seus negócios. Vendidos os carros da vitrine, diz a atendente
da empresa, novo estoque tem que ser feito, e a revendedora teria de esperar o pinga-
pinga dos meses da prestação para dispor do recurso para isso. Abreviando, com o
repasse da dívida do comprador para a agência de financiamento o tempo de espera, a
revendedora viabiliza para uso de imediato o montante do dinheiro das prestações do
crédito, assim dando sequência sem problema de continuidade ao seu negócio. Tudo
lógico, não fora a concentração de tudo no acúmulo de tributos e juros que da fábrica à
revendedora e à agência de financiamento do consumo se passa para o comprador como
despesa de consumo, num aumento do montante e alongamento do tempo de pagamento
da compra que estica a dívida por vários meses. Um quadro de reinvenção mágica da
categoria do excedente capitalista para além da mais valia. Mas que, estimulado por
facilidades como essa, faz o consumidor usar seu já comprometido salário para realizar
uma multuplicidade de outras compras, num acúmulo de endividamentos que, no limite,
leva-o a um inevitável estado de inadimplência. Basicamente, foi isto a origem da “bolha”
imobiliária que deu origem à crise de 2008 nos Estados Unidos, extensiva à Europa do
euro e ao mundo, e ao seu já amplo tempo de alongamento.
A face nova do Estado, do território e das formas de desenvolvimento
A eclosão e a duração sem previsão de término que assim se percebe do estado
de crise do presente indicam, para além de um caráter insaciável de lucros do rentismo –
em escala redobrada em relação à insaciabilidade congenial a todas as formas históricas
de capital hegemônico: o capital comercial nos albores do modo de produção capitalista, o
capital industrial nas fases atrasada e avançada do capitalismo em sua base industrial e o
capital financeiro na fase monopolista que se instala no período que cerca os anos 1870
–, sua dificuldade de controlar e conter os limites de seu movimento. Parte dado vir esse
movimento da acumulação por endividamento agregativo, generalizado e crescente de
pessoas, empresas e governos. E parte por vir também de sua recente história de
emergência e hegemonia, a década de 1970. Quadro por si impeditivo do
estabelecimento concomitante dum instituto de regulação.
A reforma neoliberal veio no fundo para esta finalidade. Num fracasso de intenção
que é o melhor exemplo dessa dificuldade congênita. O desmonte neoliberal do Estado
destinou-se a levá-lo a desfazer-se do patrimônio por décadas por ele implantado com
recurso público e mantido organizado sob seu próprio controle administrativo. Ao tempo
que nesse passo reinventar sua função. O propósito foi estruturar e organizar na
regulação industrial a marcha da mundialização do mundo relacional do capitalismo. Dos
países desenvolvidos aos países subdesenvolvidos – estes principalmente, por motivos
visíveis –, o Estado é chamado a instalar o grosso do capital fixo na forma de
infraestrutura (em particular meios de transferência: transportes, comunicações e rede de
transmissão de energia) e de capital constante na forma de indústrias estratégicas de
base, indústrias de bens intermediários, sobretudo (siderurgia, petroquímica, cimento e
diferentes metalurgias). Isto é, setores-chave do seu erguimento e arrancada econômica à
escala de um sistema mundial de capitalismo avançado. Dos anos 1920 aos anos 1970
vai, assim, se acumulando sob o domínio do Estado uma fatia importante do sistema
econômico, necessária à sua alavancagem a um estágio sucessivamente mais elevados
de nível de desenvolvimento, socializando investimentos com recursos públicos para fins
de acumulação privada. Mas que chegado aos anos 1970, visto vencida a etapa de
mundialização do capitalismo em fase avançada, o chamado Consenso de Washington
passa a ver a materialidade desse investimento como um volumoso acúmulo de capital
imobilizado em meios de produção, pronto para, pela privatização, ser liberado e
transformado na forma líquida do dinheiro, seja para formar fundo de recursos e seja para
efetuar pagamento de dívidas, nas mãos do Estado proprietário-vendedor, para movê-lo
sob essa forma no circuito privado. E de que o Estado disporá, transferindo, entre outras
formas, grande parte do montante havido, via intermediação do rentismo, ao mercado de
crédito do consumo de massa. É assim que um modo novo de presença e função está
sendo cumprido pelo Estado. Sinônimo de um perfil não mais de Estado-investidor,
Estado-planejador e Estado-empresário, um Estado indutor de desenvolvimento, aliado e
êmulo da hegemonia industrial, mas Estado assegurador de garantias de estabilidade
expansiva de consumo de massas, constituidor e transferidor de meios financeiros
voltados para este novo princípio da economia, êmulo do apetite rentista de repasse de
meios que lhe permita o ganho com o endividamento generalizado do alheio, na certeza
de um braço seguro que regule o princípio, sem regular o mecanismo e movimentos de
seu agente. Este o Estado que hoje temos. A dívida é o seu estado imanente. E a caução
da especulação segura sua função.
Propósito idêntico o capital espera do território. Este deve ser despojado
igualmente das gorduras estrutural e institucional a ele atribuidas pelo sistema industrial-
financeiro. Estruturado e estruturador agora de um sistema mundial organizado à base de
um modo integralmente integrado de meios fluidos de transferência. Desse modo, um
território aliviado de fronteiras que obstem a livre mobilidade territorial que o rentismo
precisa. Conhecidamente, um território-rede. Liso, rápido e leve em seus ordenamentos.
Simultâneas e combinadas, estas duas refuncionalizaçõe foram, a do Estado e do
território, por isso mesmo, motivo da série de equívocos que, tendo por pano de fundo um
entendimento torto do neoliberalismo, lançou a compreensão do Estado, particularmente,
a um nível conceitual inteiramente confuso no correr dos anos 1980-1990. Falou-se de fim
do Estado. Junto ao fim da história. Ao fim de tudo. Nem o Estado, no entanto, teve um
fim: reformulou-se em suas funções, às quais tende a voltar agora, mas em forma nova,
de intervenção frente à necessidade de enfrentamento da primeira crise do sistema
rentista. Nem teve fim o ordenamento do território, reinventado em suas formas, na
função de relacionamentos globais, fluidos e imediatos que a mobilidade rentista reclama.
É assim que na mesma linha tende a redefinir-se o desenvolvimento,
tradicionalmente infraestrutural e sistêmico econômica e socialmente em sua função
capitalista. O grande período de planos estatais forjados à base de extensas e
ramificadas obras de infraestrutura destinadas a mitigar as despesas das empresas em
capital fixo que o punha na aparência acima e para além da sociedade e das empresas,
dá lugar ao entrecruzamento que casa as ações globais do Estado com as ações pontuais
das empresas privadas (os famosos PPPs, planos de parceria público-privado). Visto este
entrelaçamento por dentro e ao lado da intervenção das agências de regulação, num
modo redefinido de administração cônjuge do Estado e de empresas sobre o arranjo
sistêmico-global do território.
As contradições do modelo
Três formas de contradição têm lugar nesse formato novo do modo de produção
capitalista comandado pelo movimento da acumulação rentista. E que com a ausência de
um sistema de regulação correspondente se agrava, criando a impressão de a crise e seu
prolongamento mais expressarem um caso de incompetência de governabilidade que de
fundamentos econômicos.
A primeira é a que envolve a relação do capital rentista com a indústria. Nenhum
modo de acumulação do sistema econômico-social capitalista se sustenta sem base
industrial. Na fase industrial-financeira, que a rentista vem para substituir, a própria
nominação diz da importância da indústria. Não somente tudo vem e passa pelo processo
da produção industrial, mas é a própria indústria que detém o comando do todo. Os
próprios grandes bancos, que formam a segunda vertente do capital financeiro, são
obrigados a inserir-se no movimento D-M-D´ para poder amealhar sua parte no processo
acumulativo. A indústria produz e comanda pelo controle da esfera da circulação a
transformação e repartição da massa da mais valia realizada no lucro, que, daí então, se
divide e se direciona para as demais formas de capital coparticipantes do sistema da
acumulação, desde o capital agrário em seu benefício de renda fundiária até o capital
bancário em seu benefício da taxa de juros, passando pelo capital mercantil e pelo próprio
capital industrial, epicentro do sistema.
A acumulação rentista rompe com esse modelo. Já começa que nenhuma
participação tem com o processo da produção, acumulando às espenças deste, por meio
dum esquema próprio, o circuito D-D´. No entanto, ainda assim o rentismo depende em
certa medida da produção industrial e da rede do comércio, sem o que não dispõe do
universo de produtos e serviços e o ciclo da circulação sem os quais não pode especular.
Como financiar consumo, se ele mesmo não produz mercadorias e estas não caem do
céu ou nascem de geração espontânea? De modo que há que o capital rentista de
alguma forma interagir com o sistema produtivo sem que seja a do compartilhamento do
seu movimento orgânico, antes a este se ligando por fora para o fim estrito de dele se
beneficiar. E esta deve ser uma forma de relação múltipla, uma das quais é o
refinanciamento da venda de automóveis que linhas atrás nos serviu de exemplo, já que o
segredo é cercar o capital produtivo industrial em todas as frentes de sua necessidade de
realização-reincorporação do valor produzido, controlando o todo da esfera da circulação
e pondo-se na intermediação seja do movimento de realização e repartição do valor
industrial e seja de retorno da parcela do valor realizado à esfera da indústria na forma
líquida do dinheiro. E assim como o limite da contradição com o Estado é a insolvência, o
limite da contradição com a indústria é o da necessária possibilidade da liquidez desta.
Usando da intermediação como ponto de manobra.
Todavia, se esta relação de parasitismo explícito é a fonte da acumulação
rentista, o é também da tensão que envolve rentismo e indústria. Esta reage a esta
sujeição que lembra um retorno aos tempos da subsunção formal do período da
acumulação primitiva e da fase do capitalismo atrasado, então reino da mais valia
absoluta (Marx, 1975). Subsumida agora ao rentismo pelo domínio que este exerce sobre
a esfera da circulação, agora na forma direta da ação e controle do dinheiro, nome e
forma real da liquidez, não mais da intermediação mercantil, como na fase histórica
seminal do modo de produção capitalista, é toda a sociedade que cai a ele submetida,
uma vez que a tensão da relação com a indústria é mediatizada pela disseminação do
conflito pelo todo da sociedade.
A segunda contradição é a que envolve a relação do rentismo com o Estado.
Êmulo real da movimentação rentista e veículo pelo qual a tensão com o capital industrial
é disseminado para resolver-se no todo sistêmico da sociedade, o Estado é o ponto
nevrálgico da regulação sem regulação que pela crise está se mostrando a essencia da
sociabilidade rentista. Não regulado por natureza em seu movimento acumulativo, o
rentismo busca precaver-se no esquema de regulação do todo que por natureza é a
função global do Estado em sociedade das consequências disso. Todavia, ao colocar o
Estado como reabastecedor cíclico de meios financeiros, a título de regular a
expansibilidade contínua do mercado de crédito ao consumo em benefício do todo, o
rentismo tende a pô-lo num quadro de endividamento e insolvência parmanente. Gerando
uma relação de contradição próxima ao descontrole. A chamada desgovernabilidade. E
que também aqui se resolve por sua disseminação pelo todo da sociedade, num
agravamento das outras duas. À exemplo da forma de eliminação da insolvência, na qual,
no frigir dos ovos, o Estado transfere a dívida para o conjunto do sistema, seja obtendo
empréstimos junto às instituições privadas e governamentais congêneres (origem da
dívida soberana), seja, esgotado este meio, gravando o sistema com novos tributos, num
acúmulo de despesas que irão pagar a sociedade e os demais setores econômicos. Esta,
por sinal, é uma das causas da generalização da crise da esfera seminal do rentismo para
a esfera reflexa da indústria, afetada em seus custos por ter de compartilhar da
socialização tanto dos juros de empréstimos bancários quanto das taxas de tributação
criadas que lhe subtraem fatia poderável do lucro e afetam a margem da liquidez que lhe
é necessaria, levada pela compulsoriedade que lhe impõe o ganho ou reposição de ganho
do rentismo. Indústria e rentismo tendencialmente caminhando reciprocamente na contra-
mão no movimento do processo acumulativo. A contradição rentismo-Estado assim se
reconfigurando na contradição rentismo-indústria, numa ordem inversa ao movimento
acumulativo e regulatório de antes em que indústria e Estado se imunizavam
reciprocamente nos momentos de crise. Se no sistema de base industrial a despesa
estatal vinha na forma dos investimentos em infraestrutura e setores industriais de base,
que o Estado de alguma forma recuperava com o retorno dos tributos cobrados a um
sistema econômico que gerava riqueza a partir desses mesmos meios de capital fixo
estatalmente investidos em seu nome, no sistema de base rentista a despesa vem, a
título de transferência regularizadora, na forma de fundo perdido, recurso saído e em
ponto nenhum retornado ao Estado. O exaurimento deste sendo pago pela sociedade no
seu todo, aqui agora se incluindo a indústria. Tudo ao preço de Estado e a sociedade cair
ciclicamente como um todo na situação de ingovernabilidade política e financeira de
agora.
A terceira contradição, por fim, é a que envolve o rentismo com a classe
trabalhadora. A classe trabalhadora é o fim da linha dessa logística de transferir do campo
do rentismo para o campo geral da sociedade o pagamento da fatura das críses e seus
teatros de dívida. Amortecido no tecido dum quadro de pacto capital-trabalho mediado
pelos sindicatos que vige desde o fim da guerra e foi a base por definição da performance
sócio-econômica expansiva do capitalismo de base industrial dos trinta anos gloriosos que
findam justamente nos anos 1970, o conflito capital-trabalho volta a animar-se no
confronto de no limite a classe trabalhadora vir a ter de responder sozinha pelo
pagamento da saída da crise. Pacto a custo mantido ativo por um formato de Estado
montado para mostrar-se receptivo aos mandos e demandas do rentismo. Entre resolver
a crise de liquidez a favor do desanuviamento do céu da agonia rentista e quebrar o pacto
historicamente traçado com o sindicalismo industrialmente organizado via medidas de
austeridade, sinônimo de desemprego em escala crescente da massa trabalhadora, o
Estado perde num repente a face bifronte que habituara-se a buscar ou fingir ter por trás
do pacto. O fato é que na política de transferência que socializa a classe trabalhadora
uma crise nascida da lógica da acumulação rentista, este na prática dela passando ao
largo, difícil é manter o discurso de harmonia de antes. Incólume frente a um quadro onde
tudo esboroa ao seu redor, o rentismo age como se a crise fosse de todos. Inclusive do
Estado que vem em seu socorro. Esvaziando o Estado financeiramente com os aportes
de transferências financeiras recebidas a título de repasse ao crédito do consumo, de
que, ao fim e ao cabo, é ele o verdadeiro beneficiário, empresta-lhe simultaneamente
dinheiro a juros de taxas altíssimas. Que o Estado, desarrumado administrativa e
financeiramente, responde com um volume redobrado de atos de austeridade. Desviando
para a classe trabalhadora o ônus do pagamento agora do lucro da recuperação rentista e
do gasto da restituição funcional da máquina do Estado. Com um resultado que, no limite,
só faz o desemprego crescer celeremente. Na Espanha emblemática, o desemprego
chega já a 24% da população ativa e atinge 50% da população jovem em idade de
trabalho. Um quadro que se repete em Portugal, Grécia, Itália e Estados Unidos. E é o
único elo comum do modo de debelamento da crise de 1929 e 2008.
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