18 Uma questão de conscientização - Abracopel |...

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Uma questão de conscientização Como medida de segurança, legislação torna compulsória a inspeção de instalações elétricas em prédios no Rio de Janeiro. Especialistas esperam que este seja o pontapé inicial para a obrigatoriedade em todo o País O governo do Estado do Rio de Janeiro instituiu a Lei n˚ 6400/13 que determina a obrigatoriedade de vistoria da estrutura e das instalações de prédios residenciais, comercias e públicos. A vistoria, que deve ser realizada por profissional habilitado, é mais uma iniciativa na busca por segurança nas instalações elétricas no Brasil, sendo que a obrigatoriedade de inspeção já ocorre em outras cidades brasileiras. Apesar de este tipo de legislação ser um passo importante e já estar em vigor em algumas partes do País, o número de acidentes ainda é grande. Dados da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (Abracopel) mostram que cerca de 300 acidentes fatais de origem elétrica ocorreram em 2012, e, por conta do grande descaso de profissionais, da população e das autoridades, levantamentos realizados neste início de ano apon- tam que esse número deve aumentar em 2013. A existência de normas técnicas e leis por si só não é o suficiente para mudar esse quadro sem que exista fiscalização aliada a uma conscientização da sociedade. Uma das principais iniciativas nesse sentido é feita pela Abracopel, entidade sem fins lucrativos criada em 2005, a partir da preocupação dos profissionais do setor com o número de acidentes elétricos que acontecem no Brasil. A Abracopel conta com cerca de 100 associados entre mem- bros da diretoria, do conselho consultivo e associados colabo- radores, e tem como objetivo organizar e desenvolver conceitos de segurança e técnicas de controle do risco em instalações e serviços com eletricidade. Entre seus principais objetivos, estão a padronização dos procedimentos e metodologias seguras de trabalho, conscien- tização de profissionais, promoção de melhorias na atitude e no comportamento dos trabalhadores do setor e divulga- ção de boas práticas em segurança com energia elétrica, de forma a minimizar os acidentes que acontecem por falta de informação e conscientização. Desde o início de 2013, a Abracopel conta com uma nova presidente, a psicóloga organizacional e gestora de projetos e empresas Elizabeth Faria Coelho de Souza, que foi diretora do Sindicato da Indústria das Instalações do RJ por oito anos, até 2011. A convite da Revista Lumière Electric, Elizabeth Souza falou a respeito da nova legislação do Estado do Rio de Janeiro, das demais iniciativas que existem no País e sobre seus principais desafios à frente do cargo de presidente da entidade. Quais são os seus principais objetivos agora que ocupa a presidên- cia da Abracopel? A Abracopel realiza um trabalho contínuo. O que nós da atual diretoria pretendemos fazer é ampliar o público ao qual destinamos as nossas ações. Hoje em dia, já chegamos a três capitais do País (Rio de Janeiro, Recife e Salvador), com nossos tradicionais eventos, o Elétrica Segura, o Elétrica Industrial e o Encontro para Docentes, mas gostaríamos de estendê-los para mais cidades em território nacional. Além disso, desejamos ampliar nossas parcerias com ou- tros órgãos e instituições que atuam na área elétrica, que apoiam a causa defendida pela Abracopel. Pretendemos levar nossa mensagem e missão para o maior número possível de pessoas, e, para isso, as parcerias são fundamentais em todas as cidades. Esse é o motivo de termos inaugurado as regionais Rio de Janeiro e Recife, e, este ano, queremos efetivar ainda outras regionais, porque isso torna nossas ações mais focadas nas realidades culturais de cada região. Outra de nossas metas é expandir o Prêmio de Redação e Desenho, que foi um sucesso no ano passado. Conseguimos di- vulgar bastante o curso em São Paulo e em Minas Gerais, mas no Rio de Janeiro e em outros Estados, foram poucas as inscrições. Temos ainda o Prêmio Abracopel de Jornalismo, por meio do qual buscamos cada vez mais motivar e sensibilizar a mídia a pautar matérias sobre acidentes com a eletricidade, oferecendo soluções e formas de evitar que ocorram tragédias. Hoje, nós temos ações muito bem estruturadas e a ideia é ampliá-las para que possamos envolver, a partir do trabalho da Abracopel, o maior número possível de pessoas. Entrevista 18 Elizabeth Souza Por Ricardo Casarin

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Uma questão de conscientizaçãoComo medida de segurança, legislação torna compulsória a inspeção de instalações elétricas em prédios no Rio de Janeiro. Especialistas esperam que este seja o pontapé inicial para a obrigatoriedade em todo o País

O governo do Estado do Rio de Janeiro instituiu a Lei n˚ 6400/13 que determina a obrigatoriedade de vistoria da estrutura e das instalações de prédios residenciais, comercias e públicos. A vistoria, que deve ser realizada por profissional habilitado, é

mais uma iniciativa na busca por segurança nas instalações elétricas no Brasil, sendo que a obrigatoriedade de inspeção já ocorre em outras cidades brasileiras. Apesar de este tipo de legislação ser um passo importante e já estar em vigor em algumas partes do País, o número de acidentes ainda é grande.

Dados da Associação Brasileira de Conscientização para os Perigos da Eletricidade (Abracopel) mostram que cerca de 300 acidentes fatais de origem elétrica ocorreram em 2012, e, por conta do grande descaso de profissionais, da população e das autoridades, levantamentos realizados neste início de ano apon-tam que esse número deve aumentar em 2013.

A existência de normas técnicas e leis por si só não é o suficiente para mudar esse quadro sem que exista fiscalização aliada a uma conscientização da sociedade. Uma das principais iniciativas nesse sentido é feita pela Abracopel, entidade sem fins lucrativos criada em 2005, a partir da preocupação dos profissionais do setor com o número de acidentes elétricos que acontecem no Brasil.

A Abracopel conta com cerca de 100 associados entre mem-bros da diretoria, do conselho consultivo e associados colabo-radores, e tem como objetivo organizar e desenvolver conceitos de segurança e técnicas de controle do risco em instalações e serviços com eletricidade.

Entre seus principais objetivos, estão a padronização dos procedimentos e metodologias seguras de trabalho, conscien-tização de profissionais, promoção de melhorias na atitude e no comportamento dos trabalhadores do setor e divulga-ção de boas práticas em segurança com energia elétrica, de forma a minimizar os acidentes que acontecem por falta de informação e conscientização.

Desde o início de 2013, a Abracopel conta com uma nova presidente, a psicóloga organizacional e gestora de projetos e

empresas Elizabeth Faria Coelho de Souza, que foi diretora do Sindicato da Indústria das Instalações do RJ por oito anos, até 2011.

A convite da Revista Lumière Electric, Elizabeth Souza falou a respeito da nova legislação do Estado do Rio de Janeiro, das demais iniciativas que existem no País e sobre seus principais desafios à frente do cargo de presidente da entidade.

Quais são os seus principais objetivos agora que ocupa a presidên-

cia da Abracopel?

A Abracopel realiza um trabalho contínuo. O que nós da atual diretoria pretendemos fazer é ampliar o público ao qual destinamos as nossas ações. Hoje em dia, já chegamos a três capitais do País (Rio de Janeiro, Recife e Salvador), com nossos tradicionais eventos, o Elétrica Segura, o Elétrica Industrial e o Encontro para Docentes, mas gostaríamos de estendê-los para mais cidades em território nacional.

Além disso, desejamos ampliar nossas parcerias com ou-tros órgãos e instituições que atuam na área elétrica, que apoiam a causa defendida pela Abracopel. Pretendemos levar nossa mensagem e missão para o maior número possível de pessoas, e, para isso, as parcerias são fundamentais em todas as cidades.

Esse é o motivo de termos inaugurado as regionais Rio de Janeiro e Recife, e, este ano, queremos efetivar ainda outras regionais, porque isso torna nossas ações mais focadas nas realidades culturais de cada região.

Outra de nossas metas é expandir o Prêmio de Redação e Desenho, que foi um sucesso no ano passado. Conseguimos di-vulgar bastante o curso em São Paulo e em Minas Gerais, mas no Rio de Janeiro e em outros Estados, foram poucas as inscrições.

Temos ainda o Prêmio Abracopel de Jornalismo, por meio do qual buscamos cada vez mais motivar e sensibilizar a mídia a pautar matérias sobre acidentes com a eletricidade, oferecendo soluções e formas de evitar que ocorram tragédias. Hoje, nós temos ações muito bem estruturadas e a ideia é ampliá-las para que possamos envolver, a partir do trabalho da Abracopel, o maior número possível de pessoas.

Entrevista18

Elizabeth Souza

Por Ricardo Casarin

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Você poderia enumerar os principais desafios enfrentados pela

entidade atualmente?

Os desafios são muitos, porque culturalmente, não há preo-cupação com a segurança. Quando se fala sobre os riscos ao lidar e trabalhar com a energia elétrica em indústrias ou em grandes comércios, os profissionais ficam preocupados com adicionais por insalubridade. A mensagem que tentamos trans-mitir é de que é necessário haver um procedimento seguro para lidar com a eletricidade, porque, afinal, a vida não tem preço.

Ainda existe bastante a cultura do “Quanto eu posso ganhar?” em casos de risco. É preciso mudar esse pensamento, pois isso é um grande empecilho.

Outro ponto importante está ligado ao apoio que necessita-mos, uma vez que nossos cursos e treinamentos ministrados pelo País inteiro são gratuitos. Sendo assim, nós precisamos da parceria e do patrocínio de empresas fabricantes e de ins-tituições, e temos batalhado para isso. Normalmente, é muito difícil, pois fabricantes e instituições optam por investir em propagandas em meios de divulgação. Nós, por outro lado, tentamos mostrar a eles que é muito melhor e mais benéfico que haja investimento em conscientização.

Comente um pouco sobre as últimas ações da Abracopel.

Desde o ano passado, temos realizado treinamentos de segu-rança com clientes da Light (distribuidora de energia elétrica do Rio de Janeiro) e temos observado um avanço bem interessante. A Light convida seus clientes a participarem de um evento que informa os limites da responsabilidade da concessionária, assim como do cliente, o qual precisa entender que, muitas vezes, problemas de qualidade de energia e/ou de acidentes ocorridos são de sua responsabilidade enquanto consumidor.

Nos encontros, foi distribuído um questionário de ava-liação do evento, e os participantes tiveram que responder quais são as principais demandas e os principais problemas existentes, e com isso, conseguimos fazer uma análise e um levantamento de quais são as questões de maior importância para os clientes, o que foi muito importante para a distri-

buidora, para os clientes, e para nós também. Pretendemos ampliar e levar essa proposta de projeto também a outras distribuidoras de energia elétrica.

A situação das instalações elétricas no Brasil ainda continua muito

crítica?

Eu diria que houve melhorias. Cada vez mais, a mídia tem pautado matérias sobre a importância de garantir a seguran-ça nas instalações elétricas, e isso faz com que a mensagem alcance um grande número de pessoas. Contudo, posso dizer que se trata de um trabalho de “formiguinha” e que o processo é lento. O que não pode acontecer é a perda da determinação das pessoas que abraçaram essa causa.

Em âmbito legislativo, existem iniciativas no País no que remete

à inspeção e à qualidade das instalações elétricas?

Existem algumas iniciativas, sim. Na cidade de São Caeta-no do Sul (SP), existe a legislação que exige a inspeção das instalações elétricas, mas a grande novidade neste âmbito ocorre no Rio de Janeiro, o qual possui uma legislação que já está bastante definida, faltando apenas o Poder Executivo acertar alguns detalhes.

O governador Sergio Cabral assinou a lei de número 6.400 que determina a revisão das instalações elétricas. Essa lei cita que construções com mais de 20 anos são obrigadas a realizar, a cada cinco, uma revisão mediante um laudo. Falta ao Poder

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Elizabeth Souza Presidente da Abracopel

Divulgação

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Executivo determinar o formulário padrão desse laudo, e também as penalidades para quem não atender a legislação.

A lei torna obrigatória a revisão de todas as instalações, inclusive da elétrica, com laudo assinado por um profissional habilitado, ou seja, um eletrotécnico ou engenheiro com registro no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agrono-mia (Crea), no caso das instalações elétricas. Se por ventura, esse profissional encontrar um risco iminente, ele é obrigado a comunicar os órgãos públicos para a interdição do local.

Isso traz uma responsabilidade enorme para esse profissional, pois, caso encontre alguma irregularidade e não comunique o órgão público, ele passa a ser o principal responsável, em casos de eventuais acidentes.

Existe fiscalização para assegurar o cumprimento da legislação?

Esse é o grande problema do Brasil. Não faltam leis; o que falta é respeitá-las. Além disso, deveria haver uma efetiva fiscalização É justamente por isso que a Abracopel acredita que exista apenas um caminho: o da conscientização. As pessoas precisam dar valor à vida, entender que são importantes para o próximo e zelar por si mesmas.

Como você avalia a qualidade dos profissionais que trabalham com

instalações elétricas?

Existe de tudo no mercado, mas nós temos boas capacitações e qualificações. O que vemos que falta nas escolas formais é a consciência e informação sobre as normas técnicas e das regulamentadoras. Em minha opinião, deveria ser dada uma ênfase maior para essa questão.

Os profissionais que chegam ao mercado de trabalho precisam estar preparados e dominar as normas técnicas para garantir a segurança de todos.

A população está mais consciente acerca dos perigos gerados pela

eletricidade?

Posso afirmar que houve certo avanço em lugares em que há movimentos como o da Abracopel, porém, ainda não atingimos o mínimo de pessoas deste País, dada a dimensão de seu território.

É comum entrarmos em uma residência ou em um pequeno comércio e encontrarmos um adaptador com cinco tomadas a ele ligadas. As pessoas ainda não têm a consciência de que

esse ato pode causar um incêndio e que existe o risco da perda de vidas e de patrimônio.

Nos últimos anos, houve um aumento do uso de aparelhos ele-

troeletrônicos por parte da população. Qual tem sido o impacto em

relação à segurança das instalações?

Há construções que foram projetadas e construídas há vinte anos, quando era inimaginável o número de eletroeletrônicos alimentados por energia elétrica que hoje em dia são utilizados.

Construções antigas não preveem o número adequado de tomadas para o uso atual dos equipamentos, e isso que faz com que as pessoas façam uso dos adaptadores, mais conhecidos informalmente como “benjamins” e “réguas de tomada”, sobrecarregando cabos de uma instalação que não foi concebida para este suporte.

Atualmente, com os mecanismos de certificação, houve melhorias

na qualidade dos materiais elétricos?

Sim. Hoje, as empresas estão mais preocupadas em obter certificações, e o nosso trabalho envolve a conscientização de que as pessoas precisam adquirir materiais certificados.

A comprovação da qualidade do produto se refere a questões de desempenho e segurança, nas quais tenho visto melhoras. Face a isso, mantemos negociações e parcerias apenas com fabrican-tes certificados, aos quais podemos associar a nossa imagem.

Foi registrado aumento do índice de acidentes neste ano em re-

lação aos anteriores?

No Brasil, não há estatísticas oficiais de acidentes. Nós, da Abracopel, pesquisamos tudo o que é noticiado de aci-dente, utilizando a imprensa e o Corpo de Bombeiros como fontes. Mas isso não é uma estatística oficial. Então, temos batalhado junto aos nossos parceiros e patrocinadores para conseguirmos levantar um estudo oficial desse número.

Os últimos dados de acidentes que consolidamos são de 2012 e mostram a ocorrência de 278 acidentes fatais de origem elé-trica. Este valor é um pouco menor do que o número de 2011, porém, a redução é pequena e não reflete uma realidade, pois no início do ano de 2013, os números aumentaram, mas ainda não temos um levantamento consolidado.

Não faltam leis; o que falta é respeitá-las. Além disso, deveria haver uma efetiva fiscalização

Entrevista20

Elizabeth Souza