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O MAPA DO IGD-M NO BRASIL: UM ESTUDO SOBRE AS VARIAÇÕES NA
EFETIVIDADE DA IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
ENTRE AS GESTÕES MUNICIPAIS BRASILEIRAS (2007– 2015).
JULIANO, Maíra Cabral 1
RODRIGUES, Priscila Alves2
Eixo Temático: GT 09 - Gestão Pública e Desenvolvimento Social: construindo indicadores.
RESUMO
Em que medida os municípios brasileiros têm conseguido implementar o Programa Bolsa
Família eficazmente? À luz das formulações de O’Donnell sobre a relação do Sistema Legal
com as burocracias do Estado, bem como do debate sobre os impactos do federalismo na
capacidade de coordenação da União, busca-se responder à questão através do mapeamento
dos resultados apurados pelo Índice de Gestão Descentralizada Municipal (IGD-M). Pela
Matriz de Informação Social obtiveram-se os valores acumulados dos IGD-Ms nos 5.565
municípios de 2007 a 2015. Comparando-se os dados no tempo e espaço, identificaram-se
variações na eficácia da gestão do Programa entre as gestões municipais. As primeiras
análises indicam que a qualidade da gestão se mostra bastante homogênea, além de
satisfatória. Questiona-se, porém, a viabilidade tais resultados haja vista à dimensão do
território brasileiro, e as diferentes capacidades institucionais das gestões locais.
Palavras-Chave: Bolsa Família, Índice de Gestão Descentralizada Municipal, Gestão
Pública.
1 INTRODUÇÃO
Para O’Donnell (2013), é dever de um Estado democrático de direito garantir aos cidadãos
do seu território, um patamar mínimo de capacidades3 que habilitem a condição de agente das
1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre e Doutoranda em Ciência Política. Email: maira_cabral@yahoo.com.br. 2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Mestre e Doutoranda em Ciência Política. Email: priscila.priae78@gmail.com 3O’Donnell recorre ao conceito de capacidades cunhado por Amartya Sen (1999), que se refere à liberdade que as pessoas têm para ser e fazer aquilo que consideram valioso.
pessoas, a qual é necessária à própria ampliação da esfera da cidadania, através do exercício
democrático. Sem estas garantias, que são viabilizadas pela fruição de direitos sociais, não se
pode dizer que os cidadãos gozam da plena cidadania (MARSHAL, 1967). O autor destaca
que a pobreza e a desigualdade, problemas prementes em muitos países da América Latina,
põem em risco a própria possibilidade de reconhecer a todos como agentes (2013). Para ele
a conquista e a expansão de um conjunto de capacidades básicas não é considerada só algo ao que os seres humanos têm um direito moral, nem só una meta que as pessoas de boa vontade podem propor, mas um direito de todos os que sofrem privação dessas capacidades. Este é um autêntico interesse humano, cuja satisfação pode ser legitimamente exigida dos demais, especialmente do estado (2013, p.18)
Nesta perspectiva, a implementação de políticas de transferência de renda que nas
últimas décadas vêm se constituindo como o principal instrumento de combate à pobreza na
região, vem a ser uma resposta do Estado a esta responsabilidade. No Brasil, o Programa
Bolsa Família (PBF) pretende através de suas ações, não apenas aliviar os efeitos da pobreza
através das transferências de renda, mas também desenvolver as capacidades das famílias,
seja de modo intergeracional, por meio das condicionalidades em saúde e educação, seja de
forma mais imediata, pela articulação do Programa como outras políticas e ações que venham
a criar condições para que as famílias saiam da situação de vulnerabilidade (MDS, 2016).
A gestão do Programa é descentralizada, operada pela União, estados e municípios.
Neste arranjo, são os últimos que operacionalizam o Bolsa Família no âmbito local, sendo os
entes mais diretamente responsáveis pelo bem-estar dos cidadãos. Contudo, a vinculação do
sucesso da política ao desempenho institucional dos municípios, em um modelo federativo
altamente descentralizado como o brasileiro, é uma questão problemática, uma vez que a
maior parte dos municípios detém uma máquina administrativa precária e em desigualdade de
condições econômicas e administrativas entre si (ABRUCIO, 2005, p. 48). Isso significa que
se pode obter uma provisão de serviços tanto deficiente em municípios com menor capacidade
institucional, como desigual entre populações vivendo em diferentes localidades do país. Já na
perspectiva mais otimista de Arretche (2012), a União possui mecanismos de coordenação
que garantem a efetividade e a uniformidade da gestão em torno dos objetivos estabelecidos
na esfera nacional. Foi com este fim que o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate
à Fome (MDS) criou, em 2006, o Índice de Gestão Descentralizada Municipal (IGD-M), para
avaliar a qualidade da gestão do Bolsa Família nos municípios. Sendo assim, para responder à
pergunta proposta, o trabalho utiliza os resultados apurados pelo IGD-M no período
compreendido entre 2007 e 2015 como indicador de eficácia das gestões locais.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Conceitos Teóricos Mobilizados
Segundo O’Donnell (2013), o Estado se expressa na gramática do Direito. Juntos, o
seu sistema legal e conjunto de burocracias “presumem gerar, para os habitantes de seu
território, o grande bem público da ordem geral e a previsibilidade de uma ampla gama de
relações sociais” (p. 21). A efetividade do sistema legal, ou seja, o grau com que este
realmente ordena as relações sociais, se dá através de quatro dimensões: em sua dimensão
territorial, um sistema legal democrático deve se estender homogeneamente através do
espaço delimitado pelo Estado, garantindo direitos em todas as regiões subnacionais; em sua
dimensão estratificacional deve tratar todos os cidadãos independentemente dos atributos de
classe, gênero, etnia, etc.; em sua dimensão interinstitucional, deve se articular com outras
instituições para fazer valer a lei; e em sua dimensão horizontal, deve garantir que nenhuma
instituição estatal ou oficial escape ao controle da legalidade de suas ações. Segundo
O’Donnell (2013, p. 52), “em todas estas dimensões, o sistema legal pressupõe o que Linz e
Stepan chamam um ‘Estado efetivo’”.
Para o autor, a efetividade do sistema legal não é garantida somente por uma
legislação adequada, pois ele opera por meio de uma rede de instituições estatais que deve
garantir sua efetividade, o que inclui as burocracias do Estado. Há, portanto, uma relação
íntima entre o sistema legal e as burocracias, pois se supõe que estas atuam nos termos das
faculdades e responsabilidades que lhes são legalmente designadas por autoridades
pertinentes. Assim, em última instância, são as burocracias que – operando conforme os
desígnios do sistema legal – asseguram aos cidadãos os direitos e capacidades próprios de um
Estado democrático de direito.
No Brasil, as burocracias que provisionam os serviços públicos que mais diretamente
atingem o bem-estar dos cidadãos residem nos governos locais. Os municípios são atualmente
os principais provedores dessas políticas públicas (ARRETCHE, 2012, p. 20). É o caso do
Bolsa Família que, estabelecido pela Lei 10.836/2004 e regulamentado pelo Decreto nº
5.209/2004, é executado pelas burocracias locais, com o objetivo de assegurar direitos sociais
básicos, como nutrição, saúde e educação. Portanto, a qualidade da gestão dessa política
pública no âmbito municipal, pode dizer algo sobre a medida em que o Estado brasileiro,
através de seu sistema legal e de suas burocracias, consegue assegurar aos cidadãos o acesso a
direitos sociais básicos.
A literatura geralmente argumenta que a dispersão de poder própria do federalismo se
acentua no caso do Brasil, devido à excessiva autonomia política, fiscal e de competências de
que dispõem as subunidades constituintes, sobretudo os municípios (ARRETCHE, 2012, p.
20). Nesta perspectiva, o federalismo brasileiro seria propenso a constranger a coordenação
federativa (ABRUCIO & SOARES, 2001; AFONSO & ARAÚJO, 2006), constituindo-se
como um obstáculo à implementação de políticas cuja efetividade depende da cooperação de
entes autônomos, como é o caso do PBF. Tal concepção enfatiza a competição
intergovernamental e a dificuldade de coordenação. Segundo esta visão é de se esperar muita
heterogeneidade na gestão do PBF entre os municípios.
Já a interpretação alternativa de Arretche (2012) sustenta que embora os efeitos
centrífugos estejam potencialmente presentes, a Constituição Federal mantém assegurados à
União, mecanismos institucionais que lhe permitem obter a cooperação das subunidades
constituintes para realizar políticas de interesse comum. Tais mecanismos permitiriam ao
governo federal coordenar estados e municípios em torno de objetivos desenhados no plano
nacional, de forma a promover maior efetividade e uniformidade na prestação dos serviços
públicos. Nesta perspectiva, seria de se esperar homogeneidade nas gestões locais. O trabalho
poderá corroborar com uma ou outra tese, a depender de seus achados.
2.2 A Gestão Descentralizada e o IGD-M
O Bolsa Família possui uma gestão descentralizada, que distribui funções entre União,
estados (e distrito federal) e municípios. Esta forma de cooperação está prevista na
Constituição Federal (CF, art. 23, X), que estabelece que o combate às causas da pobreza e
aos fatores de marginalização e a promoção da integração social dos setores desfavorecidos é
competência comum aos três níveis de governo (BRASIL, 1988).
Neste esquema, cabe ao governo federal, na figura do MDS, a coordenação,
articulação e supervisão da política pública junto às unidades constituintes. Os estados por sua
vez, devem oferecer apoio técnico aos municípios, bem como implementar programas
complementares, sobretudo visando à inclusão produtiva. Já os municípios são os entes que
operam mais próximos dos cidadãos, pois cabe a eles a gestão da política no nível local, por
meio da identificação, cadastramento e repasse de benefícios às famílias. O Gestor Municipal,
formalmente designado e supervisionado pelo prefeito, é quem coordena essas atividades.
Desde 2006, o desempenho dos municípios é avaliado pelo Índice de Gestão
Descentralizada Municipal (IGD-M). Normativamente ele está ligado a três Portarias e uma
Lei Federal: foi instituído pela Portaria nº 148 de 27 de Abril de 2006 (alterada pelas Portarias
MDS nº 40 de 03/03/2008 e, MDS nº 66 de 25/01/2007), institucionalizado e transformado
em uma transferência obrigatória, através da Lei Federal nº 12.058 de 13 de Outubro de 2009;
alguns procedimentos alterados pela Portaria GM/MDS nº 754, de 20 de Outubro de 2010 e,
Portaria nº 103 de 30 de Setembro de 2013, referente à mudanças nas datas de transferências
de recursos e apresentação de informações sobre andamento do programa.
Por meio dos resultados apurados pelo IGD-M, os municípios que apresentam bom
desempenho recebem recursos mensais a serem investidos em atividades de gestão do
programa (MDS, 2011). Com essa medida, o governo federal busca auxiliar as gestões
municipais por meio do repasse de recursos federais e ao mesmo tempo incentivar a adesão
local das diretrizes estabelecidas no plano nacional, já que o repasse de recursos está
condicionado ao alcance das metas estipuladas pelo MDS. O instrumento, assim, pretende
atuar como estratégia de apoio e estímulo à melhoria das gestões locais.
O IGD-M é um indicador sintético que varia de 0 a 1, sendo que quanto mais próximo
de 1, melhor a avaliação da gestão municipal. O cálculo considera a média de quatro variáveis
que compõem o Fator de Operação: a) a qualidade e integridade das informações constantes
no Cadastro Único4 (taxa de cobertura de cadastros); b) a atualização da base de dados do
Cadastro Único (Taxa de Atualização de Cadastros); c) informações sobre o cumprimento das
condicionalidades da área de educação (taxa de crianças com informações de freqüência
escolar); d) informações sobre o cumprimento das condicionalidades da área de saúde (taxa de
famílias com acompanhamento das condicionalidades de saúde). A obtenção dos recursos do
IGD-M está condicionado ao alcance do valor mínimo de 0,55 no cálculo do Fator de
Operação bem como à obtenção do valor mínimo de 0,2 em cada uma das quatro taxas que o
compõem (BRASIL, 2006).
Em 2010, a Portaria nº 754 de 20 de Outubro de 2010, alterou o cálculo, incluindo a
inte-relação entre o gestor público responsável pelo IGD-M e o Sistema Único de Assistência
Sociais (SUAS), a partir de 3 fatores: adesão ao SUAS; informação da comprovação de gastos
4 O Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (Cadastro Único) é um instrumento de coleta e gestão de dados que identifica todas as famílias de baixa renda existentes no Brasil (MDS, 2014).
dos recursos do IGD-M recebidos anteriormente ao Conselho Municipal de Assistências
Sociais (CMAS) e, informação da aprovação total, pelo CMAS, desta comprovação de gastos.
Assim, desde 2011, além de atingir aqueles valores, os municípios precisam atender a outros
três fatores para receber os recursos: ter aderido ao Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) (Fator de Adesão); estar em dia com a apresentação da comprovação de gastos
(Fator de Apresentação)5; e estar em dia, com a aprovação total da comprovação de gastos
(Fator de Aprovação)6. Ao cumprimento de cada um desses fatores atribui-se o valor 1 e ao
não cumprimento atribui-se zero.
Embora os fatores de Adesão, Apresentação e Aprovação impactem no recebimento de
recursos e na conseqüente possibilidade de melhoria dos processos de gestão, seu impacto
sobre a provisão do serviço aos beneficiários é indireto. Já o Fator de Operação, por se referir
ao cadastramento das famílias e ao acompanhamento das condicionalidades, tem um impacto
direto sobre a vida dos beneficiários, uma vez que é a partir do cadastro que são selecionadas
as famílias que receberão os benefícios e é através do acompanhamento das condicionalidades
que aumentam as garantias de que as famílias tenham acesso aos serviços de saúde e
educação. Portanto, considerou-se na análise dos dados que o Fator de Operação é mais
significativo em termos de eficácia na gestão da política pública.
O cálculo do IGD-M multiplica o resultado do Fator de Operação por estes outros três
fatores, que se dá pela seguinte fórmula: IGD-M = Fator 1 x Fator 2 x Fator 3 x Fator 4. Logo,
o não atendimento de qualquer um desses três últimos fatores “zera” o valor, implicando no
não recebimento dos recursos.
2.3 Metodologia
Este trabalho foi realizado a partir de dados secundários, obtidos pelo banco de dados
da Matriz de Informação Social7 (versão 2006 1.5). Mapeamos os valores anuais acumulados
do IGD-M dos 5.565 municípios entre os anos de 2006 a 2015, sendo que para o ano de 2015,
os valores correspondem até o mês de Julho (último mês de atualização do sistema). Destaca-
se que devido à mudança no cálculo do IGD-M a partir de 2011, a construção do banco de
5 Indica se o gestor do Fundo Municipal de Assistência Social (FMAS) registrou a comprovação de gastos apresentada ao Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS). 6 Indica se o CMAS registrou a aprovação integral das contas apresentadas pelo gestor do Fundo Municipal de Assistência Social. 7 Mais informações disponíveis em: <http://aplicacoes.mds.gov.br/sagi-data/misocial/tabelas/mi_social.php>. Último acesso em: 08 Ago 2016.
dados divide-se em: apenas Fator 01 (de 2007 a 2011) e Fator 01 x Fator 02 x Fator 03 x Fator
04 (2011 a Julho/2015).
Tomamos como indicador do grau de eficácia na gestão municipal do Bolsa Família o
Índice de Gestão Descentralizada Municipal (levando em conta as suas modificações ao longo
do tempo). Como vimos, o resultado de 0,55 é o mínimo que o governo considera para o
repasse de recursos. Consideramos, porém, que utilizá-lo como parâmetro para o propósito de
avaliar a eficácia na gestão do Programa, seria inadequado, uma vez que ele é pouco exigente
e não permite perceber variações significativas. Assim, optamos pela criação de escores que
possibilitam “ver” as gradações e melhor ranquear o desempenho das gestões municipais
(Tabela 1)8, a seguir.
Tabela 01 - Classificação do IGD-M segundo nível de eficácia
Faixa IGD-M Nível de Eficácia
0,80 – 1,00 Muito Alta
0,70 - 0,79 Alta
0,60 - 0,69 Média
0,50 - 0,59 Baixa
0 - 0,49 Muito Baixa Fonte: Elaboração própria a partir de Atlas Brasil (2013)
Estes critérios foram adotados até 2010, até quando vigorou o cálculo do IGD-M
baseado no Fator 01. A partir de 2011, com a introdução da nova forma de cálculo, o nível
muito baixo passou a iniciar em 0,01, para diferenciar das gestões que independentemente do
desempenho relativo ao Fator 01, zeraram por não cumprir os demais fatores.
Por fim, utilizamos o software livre Gephi (ferramenta de manipulação de grafos),
para construção dos mapas (georeferenciamento) para visualização das mudanças
longitudinais do IGD-M, compreendendo as cores: verde escuro = Muito Alto; verde claro =
Alto; amarelo = Médio; laranja = Baixo; vermelho = Muito Baixo; zerados = roxo e, sem
dados = branco.
8Apesar de arbitrário tomamos como parâmetro o mesmo critério do Índice de Desenvolvimento Humano.
2.4 Resultados
Como se pode observar na tabela 2 e no Gráfico 1, em 2007, ano da primeira avaliação
do IGD-M, os municípios se reuniram em torno das faixas Muito Alto, Alto e Médio, com
uma distribuição bastante uniforme entre elas (respectivamente 29%, 27%, 26%). As faixas
mais baixas concentraram um número menor de municípios, constituindo 19% do total. Estes
resultados indicam que, mesmo no início da avaliação, a maior parte dos municípios
brasileiros já apresentava desempenho satisfatório, destacando-se as faixas Muito Alto e Alto
que juntas, abarcavam 56%. Nota-se também que, em comparação com os anos subseqüentes,
esta é a distribuição mais equilibrada entre estas faixas, mostrando, ainda, alguma
heterogeneidade no desempenho institucional entre os municípios.
Tabela 2 – Percentual de distribuição dos municípios entre as faixas de IGD-M
ao longo dos anos (2007 – 2015)
IGD-M/Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 Muito Alto 29 41 39 56 67 67 81 79 79 Alto 27 34 37 29 24 21 11 17 17 Médio 26 19 19 12 8 4 1 2 2 Baixo 13 5 5 3 1 0 0 0 0 Muito Baixo 6 1 1 0 0 0 0 0 0 Zerados - - - - 0 7 6 1 2 S/ dados 5 5 5 5 5 5 5 0 0 Fonte: elaboração das autoras.
Em 2008 percebemos um aumento de municípios concentrados nas faixas Muito Alto
e Alto, representando 75% do total, ao mesmo tempo em que diminuiu a proporção para as
faixas inferiores, concentrando 25%. Em 2009, mantém-se praticamente a mesma proporção
(76% para 25%). As duas faixas mais altas abarcaram, desde o início, a maior parte de
municípios, sendo a faixa Muito Alto sempre superior à Alta, sugerindo excelentes resultados
de gestão na maior parte do território brasileiro.
Gráfico 1 - Evolução do IGD-M no Período(2007 – 2015)
Fonte: elaboração das autoras.
A partir de 2010, ao passo que as demais diminuem,a faixa Muito Alto, é a única que
aumenta e evolui praticamente num crescente até o final do período, apresentando um pico em
2013, ano em que 81% dos municípios apresentaram um ótimo nível de eficácia na gestão do
Programa. Ao mesmo tempo a faixa Alto, que vinha diminuindo gradativamenteaté este ano
teve uma queda mais brusca, caindo 10% de 2012 para 2013. Depois disso, nos dois últimos
anos do período há uma queda suave, mas mesmo assim mantêm-se uma excelente gestão.
Até 2010, os resultados eram apurados apenas pelo Fator de Operação (dado pelas
exigências cadastrais e a gestão das condicionalidades). Já em 2011, quando o novo cálculo
passa a condicionar a apuração do IGD-M ao cumprimento de exigências relacionadas à
gestão interna do Programa (fatores 2, 3 e 4), nenhum município “zerou”, o que curiosamente
não aponta dificuldades de adaptação à mudança no cálculo. A distribuição dos municípios
entre as faixas ainda apresentou resultados satisfatórios, com apenas 1% de municípios na
faixa Muito Baixo e o restante situado nas faixas superiores (predominando, como sempre,
Muito Alto e Alto). A dificuldade em cumprir as novas obrigações só aparece a partir de 2012
quando se verificam 7% de municípios com IGD-M igual a zero ao mesmo tempo em que não
há municípios na faixa Muito Baixo (que a partir de 2011 passou a ser compreendida entre
0,01 e 0,49). Este padrão (municípios “zerados” e nenhum município na faixa Muito Baixo)
se mantém até o final do período, com uma diminuição significativa das dificuldades em
cumprir as exigências extras nos dois últimos anos analisados.
A proporção de municípios cujos dados não estavam disponíveis (5%) se manteve
estável de 2007 a 2013, só desaparecendo nos dois últimos anos do período. Por outro lado,
isso pode estar relacionado não somente à ausência de repasse de informações, mas até
mesmo a não adesão do município ao Programa em determinado ano, já que esta é voluntária.
Em suma, deduz-se– segundo o indicador da eficácia na gestão adotado neste estudo, o
IGD-M – que a gestão do Bolsa Família nos municípios é satisfatória tanto para os parâmetros
estabelecidos pela coordenação nacional do programa (que exige um desempenho mínimo de
0,55), quanto se tomarmos critérios mais exigentes como fizemos aqui (acima de 0,70)
apresentando excelentes e crescentes resultados ao longo dos 9 anos de vigência do IGD-M
analisados. A distribuição dos resultados apurados pelo IGD-M pela extensão do território
brasileiro ao longo dos anos (Figura 1, no final da seção) também ilustra como o mecanismo
impactou na melhoria da gestão.
Deste modo, o estabelecimento de metas com a instituição do Índice e a oferta de
subsídios financeiros condicionados ao seu alcance indicam ser possível à União, coordenar
as gestões locais na provisão da política pública, na medida em que induz os municípios a
alinharem sua atuação às diretrizes nacionais. A cooperação dos municípios demonstra ser
uma resposta às regras e incentivos dados pela existência de um mecanismo institucional
instituído pelo governo federal. O achado corrobora a tese de Arretche (2012) de que a
efetividade das políticas nacionais depende de desenhos cujas regras e incentivos sejam
interessantes o suficiente para obter apoio de unidades politicamente autônomas. O IGD-M,
portanto, parece ser um instrumento capaz de compensar os efeitos centrífugos do federalismo
brasileiro na execução do Bolsa Família, os quais tenderiam a gerar resultados heterogêneos
entre os municípios.
Este é um elemento importante porque, como vemos em O’Donnell (2013) a cidadania
depende de um sistema legal e um conjunto de burocracias eficientes que se estendam
uniformemente por todo o território nacional, garantindo assim, a fruição igualitária de
direitos, ou seja, para o maior número possível cidadãos.
Figura 1 - Evolução do IGD-M no território brasileiro de 2007 a 2015
Fonte: elaboração das autoras.
Legenda: verde escuro = Muito Alto; verde claro = Alto; amarelo = Médio; laranja = Baixo; vermelho = Muito Baixo; zerados = roxo e, sem dados = branco.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa mostra que, de forma geral, as gestões municipais têm atuado em
consonância com as diretrizes nacionais do programa de modo a atender as metas
estabelecidas pelo MDS. Corroborando com a tese de Arretche, os números apontam para um
panorama onde a política pública é gerida com eficácia e com igualdade territorial entre os
governos municipais, dada a capacidade de coordenação federativa da União.
Entretanto, a alta satisfatoriedade e a uniformidade dos resultados mostrados pelos
dados deixam dúvidas sobre a real efetividade do IGD-M como instrumento de coordenação,
2007 2008 2009
2010 2011 2012
2013 2014 2015
pois até que ponto é de fato possível alcançar uma coordenação tão positiva e homogênea em
uma federação como a brasileira, com tantas esferas autônomas e com tantas desigualdades
regionais? Tal pergunta abre espaço para novas investigações que se fazem necessárias,
principalmente de uma perspectiva mais aprofundada de cunho qualitativo, o que não coube
nesta pesquisa
4 REFERÊNCIAS
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período FHC e os desafios do governo Lula. Revista de Sociologia e Política, Curitiba,
v. 24, p. 41-67, 2005. ABRUCIO, Fernando Luiz. SOARES, Márcia M. Redes federativas no Brasil: cooperação intermunicipal no Grande ABC. São Paulo, Fundação Konrad Adenauer, 2001. 236 p.
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