ETAR de Macrófitas

10
Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo - 2008 Página 1 Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo Goulart, J.P.L. - [email protected] Resumo De acordo com os Censos de 2001 do INE, cerca de 40% da população Portuguesa residia em aglomerados com menos de 2000 habitantes (Ribeiro e Almeida, 2004). Desta forma, a solução habitual para o tratamento das águas residuais domésticas de pequenos aglomerados caracteriza-se por sistemas de fossa unifamiliar com infiltração no terreno, contribuindo directamente para a contaminação dos lençóis freáticos. Em alternativa, o presente estudo propõe uma solução ambientalmente sustentável, nomeadamente através de: Qualidade do efluente, tendo em conta o meio receptor; Inexistentes consumos de energia, recursos e reagentes; Reduzidos encargos em operação e manutenção; Reutilização da água para rega de espaços verdes; Valorização ambiental da área envolvente, nomeadamente em termos visuais; Aceitação social. Este documento destina-se a fornecer uma breve descrição de um Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas com escoamento sub-superficial horizontal para uma habitação unifamiliar. Palavras-chave: sustentabilidade ambiental, tratamento de águas residuais urbanas, plantas macrófitas.

description

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo

Transcript of ETAR de Macrófitas

Page 1: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 1

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para

uma casa de campo

Goulart, J.P.L. - [email protected]

Resumo

De acordo com os Censos de 2001 do INE, cerca de 40% da população Portuguesa residia em

aglomerados com menos de 2000 habitantes (Ribeiro e Almeida, 2004).

Desta forma, a solução habitual para o tratamento das águas residuais domésticas de pequenos

aglomerados caracteriza-se por sistemas de fossa unifamiliar com infiltração no terreno, contribuindo

directamente para a contaminação dos lençóis freáticos.

Em alternativa, o presente estudo propõe uma solução ambientalmente sustentável, nomeadamente

através de:

• Qualidade do efluente, tendo em conta o meio receptor;

• Inexistentes consumos de energia, recursos e reagentes;

• Reduzidos encargos em operação e manutenção;

• Reutilização da água para rega de espaços verdes;

• Valorização ambiental da área envolvente, nomeadamente em termos visuais;

• Aceitação social.

Este documento destina-se a fornecer uma breve descrição de um Sistema de tratamento de Águas

Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas com escoamento sub-superficial horizontal para uma

habitação unifamiliar.

Palavras-chave: sustentabilidade ambiental, tratamento de águas residuais urbanas, plantas

macrófitas.

Page 2: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 2

1. Introdução

O principal responsável pela decomposição de matéria orgânica é a bactéria. Estes

organismos unicelulares podem reproduzir-se a grande velocidade, a partir da matéria

orgânica disponível.

A capacidade de sobrevivência dentro de uma variedade de condições ambientais é uma

característica das bactérias. Há dois grupos, um é as chamadas Aeróbias, só vivem e se

reproduzem num meio que contém oxigénio molecular livre (atmosférico ou dissolvido na

água).

O outro grupo, as Anaeróbias, não necessitam de oxigénio livre e morrem quando estão em

ambiente com oxigénio.

As bactérias decompõem as substâncias orgânicas complexas dos esgotos (hidratos de

carbonos, proteínas e gorduras) em materiais solúveis.

Em condições anaeróbias, ocorre o seguinte processo: a matéria orgânica sedimentável

acumula-se e sofre um processo de digestão anaeróbio:

As bactérias produzem substâncias solúveis, utilizadas

como alimento dentro do ecossistema e que podem ser

convertidas em gases como o dióxido de carbono,

metano, gás sulfídrico e amónia, conforme figura 1.

O ambiente filtrante (brita, areia e terra) é responsável pela remoção de grande parte da

matéria orgânica como as gorduras e sabão.

Os filtros plantados com macrófitas, podem ser construídos empregando-se direcções de

fluxo hidráulico seguindo na horizontal e/ou na vertical, sendo que estas duas concepções de

fluxo diferem-se quanto aos objectivos propostos para o tratamento.

No presente caso aplica-se um conceito de reactor biológico de biofilme fixo, prevendo para

este uma remoção da matéria orgânica segundo a cinética de primeira ordem aplicável mais

especificamente em unidades de fluxo horizontal.

Figura 1 – Balanço biológico do

sistema

Page 3: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 3

2. Tipo de tratamento preconizado

De forma a optimizar o processo de tratamento tendo como objectivo primordial a depuração

e reutilização da água numa lógica de sustentabilidade ambiental, preconizou-se o seguinte

sistema:

� Tratamento primário

O sistema é constituído por fossa séptica de câmara única, recebendo o esgoto (aguas

negras e cinzentas) proveniente das instalações sanitárias e cozinha. Neste órgão, a

matéria orgânica sedimentará e sofrerá acção das bactérias anaeróbias.

O efluente decantado passará para a seguinte fase de tratamento através de descarga com

aspiração abaixo do nível a fim de minimizar a passagem de sólidos suspensos para o

órgão seguinte e consequente colmatação, assim como odores desagradáveis, conforme

figura 2.

Figura 2 – pormenor em corte da fossa séptica para tratamento primário

Page 4: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 4

� Tratamento secundário

O sistema é constituído por um leito de macrófitas baseado na interacção material

filtrante – macrófitas com escoamento sub-superficial horizontal (Seidel e Kirkutch,

1952).

As macrófitas contribuem para oxigenação do meio, devido a possuírem raízes e rizomas

extensos que favorecem o arejamento do solo e o consequente desenvolvimento de

microrganismos aeróbios, responsáveis pelos processos de oxidação da matéria orgânica.

Para além disso, as plantas contribuem para a condutividade hidráulica do meio, ao

formarem canais de escoamento preferencial à medida que as suas raízes e rizomas se

desenvolvem.

O efluente é descarregado numa das extremidades através de um tubo perfurado,

percolando de seguida ao longo do leito, conforme figura 3.

Por sua vez, o leito é constituído (ordenando de baixo para cima), por camadas de

gravilha, areia e por fim terra vegetal, conforme figura 4.

A camada de gravilha destina-se a facilitar a drenagem e evitar a colmatação do órgão. A

camada de areia assente sobre uma manta de geotextil permite a absorção dos nutrientes

por parte das raízes das macrófitas.

Por fim, a camada de terra servirá para fixar as plantas e proporcionar um acamamento

final à superfície.

Em ambas as extremidades do leito, recorreu-se à disposição de seixos para uma boa

drenagem.

Figura 3 – pormenor

em planta da fossa

séptica e distribuidor

de efluente primário no

leito das macrófitas

Page 5: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 5

Há ainda um sistema de ventilação constituída por tubos de PVC ligados aos tubos de

distribuição de forma a proporcionar o ambiente aeróbios.

À superfície serão plantadas macrófitas adaptadas ao clima da região e capazes de

suportar inundações frequentes das raízes e parte inferior do caule. As espécies a utilizar

serão do tipo Typha e Phragmites conforme figuras 5 e 6.

Durante a Primavera e o Verão, ocorre o desenvolvimento e crescimento das plantas. No

Outono e no Inverno verifica-se uma diminuição do seu crescimento, com morte de alguns

componentes das plantas, resultando num acréscimo de matéria orgânica no leito, o que pode

interferir nos processos de tratamento.

Figura 5 – Exemplo de macrófitas

do género Typha

Figura 6 – Exemplo de macrófitas

do género Phragmites

Figura 4 – corte

transversal do leito

das macrófitas

para tratamento

secundário

Page 6: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 6

� Reutilização da água

O sistema é constituído por um tanque para o armazenamento do efluente tratado

conforme figura 7 e 8. A adução foi concebida de forma a poder proporcionar uma

inundação controlada a montante, ou seja, existe uma curva de PVC virada para cima que

irá impor o nível de água no leito onde as plantas irão fornecer oxigénio e absorver os

nutrientes presentes no efluente primário conforme figura 4.

Salienta-se que para efeitos de manutenção do órgão, a curva poder-se-á virar para baixo,

vazando totalmente o tanque.

Existirá ainda uma bomba submersível para transferência da água armazenada para os

canais de superfície de forma a assegurar a rega das árvores de fruto.

3. Dimensionamento

O presente dimensionamento refere-se a uma casa de campo de uso não permanente.

Adoptaram-se as soluções construtivas mais económicas e fiáveis adequadas às exigências do

projecto.

Figura 7 – pormenor em corte do

tanque de águas recuperadas

Figura 8 – pormenor em planta do

tanque de águas recuperadas

Page 7: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 7

3.1 Fossa Séptica

Foi adoptada uma fossa séptica de forma cilíndrica de câmara única, considerando uma

população de 4 pessoas e para um intervalo entre limpezas de 2 anos.

Volume útil

Calculado pela fórmula:

Vu = P x (C x tr + Cld x (tl – td) + ((Clf - Cld) / 2) x td) / 1000

Sendo:

P = População do projecto: 4 pessoas

C = Capitação de águas residuais: 80 [litros/ hab. x dia]

Clf = Capitação de lamas frescas: 0,45 [litros/ hab. x dia]

Cld = Capitação de lamas digeridas: 0,11 [litros/ hab. x dia]

tr = Tempo de retenção: 3 [dias]

tl = Tempo entre limpezas: 720 [dias]

td = Tempo digestão de lamas: 60 [dias]

Vu = 4 x (80 x 3 + 0,11 x (720 - 60) + ((0,45 – 0,11) / 2) x 60) / 1000 = 1,29 m³

Dimensões da fossa séptica: Diâmetro = 1,0 metros;

Profundidade = 1,5 metros;

Volume útil adoptado ���� 2,36 m³

3.2 Leito de macrófitas

Devido à ausência de espaço, foi adoptada um conceito de órgão quadrangular. Em condições

normais seria recomendável a disposição rectangular de forma a aumentar o tempo de

contacto do efluente primário.

Área útil

Calculado pela fórmula: Au = 1 x P

Sendo:

P = População do projecto: 4 pessoas

Au = 1 x 4 = 4 m²

Área útil adoptada ���� 4 m²

Page 8: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 8

4. Expectativas para a eficiência do tratamento

Os principais mecanismos de remoção de poluentes identificados em leitos de macrófitas

incluem sedimentação, filtração, absorção pelas plantas e a degradação por acção de

microrganismos presentes no meio de enchimento do leito.

Dado que este tipo de tratamento assenta em processos

naturais, as eficiências de tratamento podem variar ao longo

do tempo. No quadro 1 apresentam-se algumas gamas de

eficiência para alguns dos principais poluentes

correspondentes a leitos de macrófitas para tratamento

secundário de efluentes domésticos.

5. Concretização do projecto

Em 2008, iniciou-se a construção do sistema de tratamento de águas residuais.

Parâmetro Eficiência

CBO5 > 70%

CQO 70%

SST 80 – 90%

N Variável

P Variável

Patogénicos 1 a 4 Log

Quadro 1 – Eficiências típicas de leitos de

macrófitas para tratamento secundário

Figura 9 – vista em corte do sistema de tratamento de águas residuais

Page 9: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 9

Foram encontradas as soluções construtivas adequadas tendo como pressuposto a economia e

fiabilidade do sistema.

Relativamente à fossa, optou-se por anéis de betão em vez de fossa pré fabricada em PVC,

traduzindo desta forma uma economia de 70% nos custos iniciais.

O órgão foi acabado com um revestimento asfáltico de IMPERCOTE em duas de mão

cruzadas.

O leito de macrófitas inicialmente previsto em tela plástica assente no terreno, acabou por ser

feito em tijolo travado e rebocado, base em betonilha forte e acabamento igualmente

asfáltico.

O tanque de águas recuperadas é exactamente igual à fossa.

Escavação para o leito de macrófitas, com

descarga da fossa em tosco

Execução das paredes do leito de macrófitas

Leito de macrófitas já rebocado

Page 10: ETAR de Macrófitas

Sistema de tratamento de Águas Residuais Urbanas por Plantas Macrófitas para uma casa de campo -

2008

Página 10

As várias fases do enchimento (seixo, gravilha, areia e terra)