0
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CAMPUS UNIVERSITÁRIO DE RONDONÓPOLIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
JOSELITA MARIA SILVA E SILVA
A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I
CICLO: UM ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS
RONDONÓPOLIS-MT
2014
1
JOSELITA MARIA SILVA E SILVA
A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I CICLO:
UM ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso, Campus Universitário de Rondonópolis, linha de pesquisa Linguagens, Cultura e Construção do Conhecimento, como exigência para obtenção do título de Mestre em Educação.
Orientadora: Profª Drª Cancionila Janzkovski Cardoso
Rondonópolis-MT 2014
3
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Rod. Rondonópolis.-Guiratinga, km 06 MT-270 - Campus Universitário de Rondonópolis - Cep:
78735-901 -RONDONÓPOLIS/MT Tel : (66) 3410-4035 - Email : [email protected]
FOLHA DE APROVAÇÃO
TÍTULO : "A APROPRIAÇÃO DA ESCRITA POR ALUNOS DA 3ª FASE DO I CICLO: UM
ESTUDO COM SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS"
AUTOR : Mestranda Joselita Maria Silva e Silva
Dissertação defendida e aprovada em 23/04/2014.
Composição da Banca Examinadora:
_____________________________________________________________________________
____________
Presidente Banca / Orientador Doutor(a) Cancionila Janzkovski Cardoso
Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Interno Doutor(a) Silvia de Fátima Pilegi Rodrigues
Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
Examinador Externo Doutor(a) Telma Ferraz Leal
Instituição : Universidade Federal de Pernambuco
Examinador Suplente Doutor(a) Raquel Gonçalves Salgado
Instituição : UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
RONDONÓPOLIS, 23/04/2014.
4
Para Beto, esposo, amigo e
companheiro de todas as horas e da
vida toda.
Para minha mãe Engrácia e meu pai,
José Rodrigues (in memoriam),
pessoas simples, de grande
sapiência, de quem herdei sonhos e
lutas.
5
AGRADECIMENTOS
Ao Programa de Pós-Graduação em Educação – PPGEdu, por
oportunizar o conhecimento a tantos professores que, como eu, se preocupam
com o futuro de nossos aprendizes.
À professora Drª Cancionila Janzkovski Cardoso, orientadora no sentido
lato da palavra, que, com seu vasto conhecimento, conduziu-me pelos
caminhos iluminados do saber, tornando possível meu olhar para além das
ideias pré-concebidas sobre a escrita das crianças.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –
CAPES, pelo financiamento da pesquisa, possibilitando minha ida a
congressos e adquirindo, assim, maior conhecimento sobre a Educação em
nosso país.
Às professoras da banca examinadora, Drª Telma Ferraz Leal e Drª
Sílvia Maria Pilegi Rodrigues, pelas valiosas contribuições que trouxeram luz
ao meu objeto de pesquisa.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação, por
partilharem conosco os seus saberes, ensinando-nos a crer ainda mais na
força da educação e nas possibilidades de nossas crianças.
Aos professores, sujeitos da pesquisa, por terem me recebido com
entusiasmo e disposição de trabalho.
Aos alunos, também sujeitos da pesquisa, pelos momentos de alegria e
descoberta junto deles.
À equipe gestora e aos funcionários da Escola Arão Gomes Bezerra, por
permitirem a realização de meu estudo na instituição e disponibilizarem o que
era preciso para sua concretização.
À Anabel Beatriz de Col, secretária do PPGEdu, pela diligência, bom
humor e carinho com que sempre nos tratou.
6
Ao meu esposo Beto, pelo amor, companheirismo, compreensão e
incentivo incondicionais em todos os momentos, não medindo esforços para
que eu alcançasse meus objetivos.
Ao meu filho Kaká, por entender que, por vezes, o afastamento era
necessário para que ficássemos mais unidos.
À Engrácia, minha mãe, por compreender minhas ausências e, como um
anjo, estar sempre orando, fortalecendo, assim, meu ânimo.
Aos meus irmãos Maria José, José Rodrigues, Gilmar e Josimar, aos
sobrinhos, cunhado e cunhadas, pelas vezes que estive ausente, mas
compreenderem que meu coração estava com eles.
À minha sogra Ruth e meus cunhados, Celso, Fátima, Adriana e Joel e
meus sobrinhos, por acreditarem no meu potencial e me incentivarem nesse
estudo.
Aos amigos Aguimar, Célia, Cláudia e Neura, pelo interesse nessa
pesquisa e por estarem sempre atentos aos rumos da educação.
À eterna professora e amiga Maria Margarida Correia Leite, que me
ensinou a sonhar com uma educação melhor e lutar por essa conquista.
Aos meus colegas de mestrado, pelas experiências e sapiências
partilhadas, em especial ao Ezer, Molise, Patrícia e Evandro, que me
ensinaram muito sobre amizade e companheirismo. Com eles dividi momentos
de alegrias e angústias.
A Deus e à Nossa Senhora, por terem sido força nos meus momentos
de fraqueza e luz sobre as trevas da angústia e do desânimo.
A todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para a
concretização deste estudo.
7
EPÍGRAFE
A Sabedoria é resplandecente, não murcha, mostra-se facilmente para aqueles
que a amam. Ela se deixa encontrar por aqueles que a buscam. Ela se
antecipa, revelando-se espontaneamente aos que a desejam. Quem por ela
madruga, não terá grande trabalho, pois a encontrará à porta da sua casa.
Refletir sobre ela é a perfeição da inteligência (SABEDORIA 6, 12-15a).
“A Linguagem em seu ventre me modela”. (JOSÉ GERALDO NOGUEIRA
MOUTINHO)
8
RESUMO
Esta investigação foi desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em educação da Universidade Federal de Mato Grosso, campus de Rondonópolis e no interior do Grupo de Pesquisa ALFALE. Apresenta uma abordagem no ensino do gênero textual fábula por meio de sequências didáticas. Deparar com crianças com problemas de produção textual, durante a docência, motivou a investigação do fenômeno. Da mesma forma, questões como um baixo desempenho em escrita e o motivo de a escola nem sempre dar conta de produzir escritores competentes, futuros cidadãos conscientes e críticos inseridos na sociedade. A dúvida de que se intensificássemos o trabalho com produção textual resultaria num melhor aprendizado surgiu, bem como a de qual procedimento efetivaria essa apropriação. O objetivo geral do estudo é analisar a contribuição das sequências didáticas para a aprendizagem dos gêneros textuais por alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e os específicos são compreender como as sequências didáticas, enquanto instrumento pedagógico, interferem na apropriação dos gêneros textuais pelos alunos; investigar as relações entre as estratégias didáticas por meio das sequências didáticas e os resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos; avaliar os avanços obtidos durante o processo de ensino por meio das sequências didáticas nas produções textuais dos alunos. Bakhtin e outros teóricos que abordam gêneros textuais fundamentam o estudo. As sequências didáticas, nas perspectivas de Dolz, Noverraz e Schneuwly, contribuíram para a apropriação da escrita de textos dos alunos. A metodologia de investigação teve cunho de intervenção, valendo-se de entrevistas com os professores, observação de aulas e planejamento conjunto de sequências didáticas, tendo como foco duas turmas da 3ª fase do I ciclo de uma escola pública totalizando 47 alunos. Destes, foram selecionados 12, conforme critério de avaliação do Sistema de Avaliação do Ensino Municipal (SAEM), dos quais foram analisados os textos. A análise dos dados foi realizada partindo da categoria geral “Adequação ao gênero”, como meio de verificar se os textos se organizavam de forma não adequada, parcial ou completamente adequada à proposta de escrita. Secundariamente, foram estabelecidas as subcategorias: a)intertextualidade na escrita; b)apropriação/consolidação da escrita; c)sinais de pontuação e d)marcas da oralidade na escrita. Os resultados evidenciaram que nas produções iniciais, 2 alunos adequaram suas escritas ao gênero de forma parcial, 7 de forma não adequada e 3 completamente. Foram trabalhadas atividades, em sequências didáticas, que auxiliaram os alunos a melhor compreender os gêneros abordados e, assim, nas produções finais, 2 alunos adequaram seus textos de forma parcial, 4 de forma não adequada e 6 completamente ao gênero fábula. Tais resultados permitem concluir que, se esse ensino for ministrado por intermédio das sequências didáticas, as possibilidades de êxito na apropriação da escrita pelos alunos serão maiores.
Palavras-chave: Gênero textual. Sequência didática. Produção textual.
9
ABSTRACT
This research was developed in the graduate program in education at the
Universidade Federal de Mato Grosso, Rondonópolis campus and inside the
ALFALE research group. Presents an approach in the teaching of textual genre
fable through didactic sequences. Come across children with problems of
textual production, during the teaching, motivated the investigation of the
phenomenon. Similarly, issues like a low performance in writing and the
grounds of the school doesn't always handle produce competent writers, future
citizens aware and critics inserted in society. The doubt that if to intensify work
with textual production would result in a better learning emerged, as well as
which procedure permanent this appropriation. The overall objective of the
study is to assess the contribution of the didactic sequences for learning of
textual genres for students of the early years of elementary school and the
specifics are to understand how the didactic sequences, while pedagogical
instrument, interfere in the appropriation of the text genres by students;
investigate the relationships between the didactic strategies by means of
didactic sequences and results about the textual production capacities of
students; evaluate the progress achieved during the teaching process by means
of didactic sequences in the productions of textual students. Bakhtin and other
textual genres which address theoretical underlying the study. The didactic
sequences, in perspectives of Dolz, Noverraz and Schneuwly, contributed to the
writing of texts ownership of students. The research methodology had
intervention slant, using interviews with teachers, classroom observation and
planning set of didactic sequences, focusing on two classes of phase 3 of the
first cycle of a total of 47 public school students. Of these, 12 were selected as
evaluation criterion of Municipal Education Assessment System (LEAVE), of
which the texts were analyzed. Data analysis was performed taking into account
the General category "Fitness to the genre", as a means of checking whether
the texts if not appropriate, organised partly or completely suited to the written
proposal. Secondarily, were established subcategories: the Intertextuality in
writing); b) ownership/consolidation of writing; c) punctuation marks and d)
brands of orality in written. The results showed that the initial productions, 2
students have addressed his writings to the genre of partial form, 7 non-suited
and 3 completely. Were worked in didactic sequences activities, which helped
students better understand the genres covered and thus the final productions, 2
students have adapted their texts partially, 4 non-suitable and 6 completely to
the fable genre. These results allow to conclude that if that teaching is taught
through didactic sequences, the possibilities of success in the appropriation of
writing by students will be bigger.
Keywords: Textual Genre. Instructional sequence. Textual production.
10
LISTA DE QUADROS
Quadro 1– Funções desempenhadas na escola e quantidade de agentes por cargo (2013) 32
Quadro 2 – Distribuição das turmas por modalidades e turnos (2013) 32
Quadro 3 – Caracterização dos professores sujeitos da pesquisa 33
Quadro 4 – Perfil dos alunos conforme avaliação SAEM inicial (2013) 35
Quadro 5 – Classificação dos alunos conforme avaliação SAEM (2013) 36
Quadro 6 – Encontros de estudos sobre gêneros textuais com os professores 37
Quadro 7 – Demonstrativo das aulas observadas 38
Quadro 8 – Demonstrativo das aulas observadas após a apresentação do gênero Fábula 40 Quadro 9- Volume de produções encontradas em teses e dissertações da
CAPES 55 Quadro 10 – Produções de teses e dissertações com os descritores “gêneros
textuais” e “sequência didática” 55 Quadro 11 – Produções de dissertações com o descritor “gêneros textuais” 56 Quadro 12 – Produções de dissertações com os descritores “gêneros textuais”
e “sequência didática” 56 Quadro 13 – Volume de teses com o descritor “gêneros textuais” 57 Quadro 14 – Volume de teses com os descritores “gêneros textuais” e
“sequência didática” 58 Quadro 15 – Artigos encontrados e seus respectivos periódicos 58 Quadro 16 – Volume de teses e dissertações publicadas pela CAPES e artigos
em periódicos 60 Quadro 17 – Síntese das atividades da sequência didática 113 Quadro 18 – Comparativo da apropriação do gênero textual fábula – produção
inicial 168 Quadro 19 – Comparativo da apropriação do gênero textual fábula – produção
final 169 Quadro 20 – Síntese da apropriação do gênero fábula 170
11
LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Esquema da sequência didática 63 Figura 2 – Fábula com atividade de consolidação e interpretação 115 Figura 3 – Produção inicial da fábula de William – turma A 131
Figura 4 – Produção final da fábula de William 132
Figura 5 – Produção inicial da fábula de Tiago – turma B 134
Figura 6 – Produção final da fábula de Tiago 136
Figura 7 – Produção inicial da fábula de Myla – turma A 138
Figura 8 – Produção final da fábula de Myla 139
Figura 9 – Produção inicial da fábula de Caterina – turma B 141
Figura 10 – Produção final da fábula de Caterina 142
Figura 11 – Produção inicial da fábula de Jonathan – turma A 143
Figura 12 – Produção final da fábula de Jonathan 144
Figura 13 – Produção inicial da fábula de Marcos – turma B 145
Figura 14 – Produção final da fábula de Marcos 145
Figura 15 – Produção inicial da fábula de Juliana – turma A 147
Figura 16 – Produção final da fábula de Juliana 148
Figura 17 – Produção inicial da fábula de Manuelle – turma A 150
Figura 18 – Produção final da fábula de Manuelle 152
Figura 19 – Produção inicial da fábula de Juliano – turma B 154
Figura 20 – Produção final da fábula de Juliano 155
Figura 21 – Produção inicial da fábula de Ricardo – turma A 158
Figura 22 – Produção final da fábula de Ricardo 160
Figura 23 – Produção inicial da fábula de Alícia– turma B 161
Figura 24 – Produção final da fábula de Alícia 164
Figura 25 – Produção inicial da fábula de Tânia – turma B 165
Figura 26 – Produção final da fábula de Tânia 167
12
LISTA DE SIGLAS
A Acompanha
AB Acompanha Bem
AEE Atendimento Educacional Especializado
C Crítico
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CODER Companhia de Desenvolvimento de Rondonópolis
EJA Educação de Jovens e Adultos
GESTAR Programa Gestão da Aprendizagem Escolar
HTPC Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira
IDEB Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
MC Muito Crítico
MEC Ministério da Educação
MSN Microsoft Service Network (Rede de Serviços da Microsoft)
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PNAIC Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa
PNLD Programa Nacional do Livro Didático
PPP Projeto Político Pedagógico
PSF Posto de Saúde da Família
RBEP Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos
SAEM Sistema de Avaliação do Ensino Municipal
SciELO Scientific Electronic Library Online
SEA Sistema de Escrita Alfabética
SEMED Secretaria Municipal de Educação
13
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO..................................................................................... 14 2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ............................................ 22
2.1 Objetivos ........................................................................................................ 22
2.2 Pesquisa Qualitativa ...................................................................................... 27
2.3 Locus da pesquisa ......................................................................................... 30
2.4 Quem são os sujeitos da pesquisa ............................................................... 33
2.5 Procedimentos e instrumentos da coleta de dados .................................... 36
2.6 A escolha dos gêneros textuais estudados .................................................. 40
3 MAPEAMENTO DAS PRODUÇÕES NACIONAIS EM GÊNEROS TEXTUAIS E SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS....................................................................................45
3.1 O ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas: pesquisa feita no decênio 2002-2011.........................................................................................46
3.2 A elaboração do estado do conhecimento ................................................... 53
3.3 A abordagem dos temas gêneros textuais e sequências didáticas nos periódicos e banco de teses e dissertações da CAPES .................................... 54
4 PONDERAÇÕES SOBRE OS GÊNEROS DISCURSIVOS E AS
SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS .............................................................................. ....62
4.1 Os gêneros do discurso nas perspectivas de Bakhtin e outros autores................................................. ...................................................................64
4.2 A sequência didática na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly ........ 74
4.3 Como o professor utiliza os gêneros textuais nas aulas............................. 87
5 A PRODUÇÃO DE TEXTOS RELACIONADA AOS GÊNEROS DO
DISCURSO ....................................................................................................93
5.1 A transposição da fala para a escrita ........................................................... 94
5.2 A relevância dos gêneros discursivos nas produções textuais ................... 99
6 AS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS................................................................... .....107
6.1 OS módulos da sequência didática ............................................................. 107
6.2 AS produções iniciais dos alunos ................................................................ 108
6.3 AS produções finais dos alunos ................................................................... 121
7 AS PRODUÇÕES DOS ALUNOS NO GÊNERO FÁBULA..............................126
7.1 Intertextualidade na escrita ......................................................................... 129
7.2 Apropriação/consolidação da escrita ....................................................... 1377
7.3 Sinais de pontuação................................................................................ 14949
7.4 Marcas da oralidade na escrita ................................................................ 1611
CONSIDERAÇÕES..............................................................................................173
3
14
REFERÊNCIAS....................................................................................................178
8
ANEXOS....................................................................... ........................................185
5
1 INTRODUÇÃO
O estudo da gênese e do uso dos signos pela criança mostra claramente como a fala predomina e modela a vida interior, influenciando toda a dimensão simbólica do ser humano. Portanto, a aprendizagem da escrita se faz relacionando-se com a fala.
Cancionila Janzkovski Cardoso
Como educadora, notei que alguns alunos, embora já alfabetizados,
sentem certa resistência em realizar uma atividade de produção escrita. Essa
resistência pode ser oriunda de vários fatores como, por exemplo, o receio de
errar, ocasionado por cobranças; o não entendimento de um comando dado
pelo professor, ou mesmo a solicitação de uma produção que esteja distante
da realidade do aluno. Conforme Cagliari (2009, p. 29),
O ensino de língua portuguesa na alfabetização difere dos de outros anos não pelo objetivo em si, que deve ser o mesmo para todos os anos, mas pela especificidade desse primeiro momento, devido ao grau de desconhecimento que o aluno tem da escrita e da leitura. [...] Há tantas coisas a respeito de escrita e leitura, e de dificuldades tão variadas, que se torna conveniente o seu ensino ao longo de todos os anos de estudo.
Essas dificuldades são demonstradas à medida que alguns alunos
escrevem textos sem uma sequência lógica dos fatos narrados, com ausência
de coesão, coerência ou mesmo unidade temática, embora estudos
comprovem que os alunos vêm escrevendo com maior propriedade, graças à
mediação de professores que, segundo Leal e Melo (2007, p. 20),
compreendem que “[...] é indiscutível que os produtores de texto não se
formam apenas através do contato com materiais escritos [...], mas também
com a leitura de diferentes textos [...]” e, sugerem, ainda, as autoras, que “[...]
para ensinar a escrever textos, devemos proporcionar aos alunos situações de
15
escrita semelhantes àquelas de que participamos fora da escola [...]”. Atitudes
didáticas como essas evitariam ou amenizariam tais dificuldades.
Minha experiência com criança fez-me notar que, na modalidade oral, os
pequenos geralmente mostram aptidão para narrativas. Na sala de aula, não é
difícil criarem ou darem continuidade às histórias começadas pelo professor,
numa atividade oral, ou contar algo sobre seus cotidianos, sobre livros que
leram, situações vividas por eles ou por amigos, estando junto aos colegas, na
escola ou com familiares. Todavia, no momento da escrita, algo parece impedi-
los de avançar.
Surgiram, então, inquietações que me motivaram a investigar o
fenômeno da produção de textos, dentre elas o fracasso escolar presentificado
no baixo desempenho da produção escrita por parte de alguns de nossos
alunos; a escola nem sempre tem dado conta de formar escritores críticos e
competentes, capazes de atuarem numa sociedade letrada como a nossa; se o
trabalho com a escrita de textos fosse intensificado efetivaria a aprendizagem e
como isso poderia ser realizado?
Assim, questões como essas, correlacionadas à escrita, levaram-me a
realizar esta investigação, com a qual tenciono avançar nos conhecimentos
relativos ao ensinar/aprender a língua materna nos anos iniciais do Ensino
Fundamental de Nove Anos.
O trabalho objetiva expor uma pesquisa de produção textual realizada
com crianças da 3ª fase do I Ciclo de uma escola pública, com base nos
gêneros discursivos e enunciados, numa perspectiva bakhtiniana. A proposta
de Dolz, Noverraz e Schneuwly de sequências didáticas, também embasam o
estudo, pois a experiência de trabalhar com alunos desta fase escolar trouxe a
constatação de que muitos deles sentem dificuldades em realizar atividades de
produção de textos.
No Brasil, a partir dos PCNs (1997), os gêneros textuais têm sido, em
grande parte, fundamentadores do ensino-aprendizagem da produção textual
que figuram nas instituições de ensino, bem como têm merecido rodas de
discussões em encontros de educação. Assim, minha inquietação como
professora que se depara com crianças com dificuldade em produzir textos
coesos e coerentes, fez surgir o desejo de conhecer de perto essas formas de
resistência à produção escrita.
16
O capítulo 2 da dissertação vai tratar de aspectos metodológicos da
pesquisa, explicitando como o ensino de produção textual, fundamentado em
sequências didáticas, pode influenciar na apropriação dos gêneros textuais
pelos alunos desta escola pública como problema de pesquisa.
Diante do exposto, a pesquisa tenciona, de uma forma mais ampla,
analisar a contribuição das sequências didáticas para o aprendizado dos
gêneros pelos alunos da 3ª fase do 1º Ciclo e, como objetivos específicos,
Analisar aulas organizadas em sequência didática com foco em fábulas, para
identificar quais conhecimentos foram mobilizados e os modos como os
professores medeiam as atividades. Também investigar as relações entre as
estratégias didáticas aplicadas com intervenção das sequências didáticas e os
resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos e, por fim,
avaliar os avanços em produção de fábulas por alunos participantes da
sequência didática.
Essa pesquisa é qualitativa, pois, segundo Lüdke e André (1986), nela o
pesquisador preocupa-se tanto com o produto da pesquisa quanto com o
processo observado, interessando-lhe a interpretação dos fenômenos e os
fatos observados. O principal método de investigação foi a observação
participativa, que me possibilitou um contato mais estreito com o fenômeno
investigado.
Os registros da observação foram feitos por meio de protocolos que,
ainda de acordo com Lüdke e André (1986), é a forma mais utilizada nos
estudos de observação.
O locus da pesquisa foi a Escola Municipal de Ensino Fundamental Arão
Gomes Bezerra, situada num bairro periférico de Rondonópolis-MT.
Os sujeitos da pesquisa foram os dois professores das duas turmas da
3ª fase do 1º Ciclo, além dos alunos dessas duas turmas, dois quais foram
selecionados doze, seis de cada sala, para serem acompanhados mais de
perto seus processos de aprendizagem do gênero fábula. Esses alunos foram
classificados pelos professores, mediante critérios de avaliação do Sistema de
Avaliação do Ensino Municipal (SAEM), como A (Acompanha), AB (Acompanha
Bem) e C (Crítico). Portanto, foram analisadas as produções iniciais e finais de
dois alunos A, dois AB e dois C de cada turma. Os estudantes têm idade entre
8 e 9 anos. Em ambas as salas foram 220 horas de observação.
17
Depois das entrevistas com os professores sujeitos da pesquisa, eles
expuseram o desejo de trabalhar com a fábula.
Para compor o capítulo 3, pesquisei em sites como o Banco de Teses e
Dissertações da CAPES, no período de 2002 a 2011, Cadernos Cedes,
Cadernos de Pesquisas da Fundação Carlos Chagas e nas revistas: Revista
Brasileira de Educação, INEP e Educação e Sociedade, no decênio de 2003 a
2012, trabalhos publicados na área de Educação, Letras e Linguística, usando
os descritores “gênero textual” e “gênero textual e sequência didática”,
buscando teses, dissertações, artigos e periódicos que me indicassem o norte
para minha própria pesquisa.
Foram coletados trinta e um trabalhos entre teses, dissertações e artigos
de periódicos, dentre os quais destaco alguns, como a tese de Alessandra
Marques da Cunha, de 2010, “Produção textual: o que dizem e escrevem
educandos do 3ª ano sobre o gênero fábula”, cujo objetivo foi verificar e
analisar o que escreviam e diziam as crianças do 3º ano sobre a fábula e os
conhecimentos adquiridos na oralidade e na escrita depois das mediações e
diálogos entre eles, a professora e a pesquisadora.
Stella de Lourdes Garcia escreveu a tese “Os gêneros do discurso e a
prática da produção textual: dialogando sobre os conhecimentos necessários
aos educadores dos anos iniciais do Ensino Fundamental”. A pesquisa
realizada em 2010 foi durante um curso de formação continuada para
professores e estudantes de uma escola de São Carlos-SP e a autora acredita
que as reflexões proporcionadas na formação colaboraram para que houvesse
uma alteração no fazer pedagógico das educadoras envolvidas. O trabalho
com sequência didática foi importante tanto para os professores quanto para os
alunos.
Os trabalhos coletados restringiram-se à 3ª fase do 1º ciclo, fase na qual
minha pesquisa foi desenvolvida. O estado do conhecimento trouxe maior
clareza sobre meu objeto de pesquisa. As teses, dissertações e artigos me
mostraram um caminho a percorrer e, com esse estudo, pude constatar a
relevância dos gêneros textuais para a aprendizagem.
Pude notar, também, que o tema gêneros textuais vem sendo bastante
difundido no meio educacional, entretanto, segundo Marcuschi (2008, p. 147),
18
O estudo de gêneros textuais não é novo e, no Ocidente, já tem pelo menos vinte e cinco séculos, se considerarmos que sua observação sistemática iniciou-se com Platão. O que hoje se tem é uma nova visão do mesmo tema. Seria gritante ingenuidade histórica imaginar que foi nos últimos decênios do século XX que se descobriu e iniciou o estudo dos gêneros textuais. Portanto, uma dificuldade natural no tratamento desse tema acha-se na abundância e diversidade das fontes e perspectivas de análise.
Então, o tema justifica a realização de minha investigação, embora já
tenha sido tratado em várias outras pesquisas e continuará sendo abordado em
muitas mais. Estudos e pesquisas envolvendo gêneros textuais, sempre serão
bem vindos e o tema continuará sendo amplamente explorado, dado ao que
postula Bakhtin (2010, p. 262) sobre a riqueza e a diversidade dos gêneros
discursivos serem infinitas pelo fato de serem inesgotáveis as possibilidades da
multiforme atividade humana,
O capítulo 4 discute os gêneros textuais discursivos na visão de Bakhtin
e as sequências didáticas na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly e
demais autores que abordam esses temas.
Para Bakhtin (2011), o uso da língua acontece por meio de enunciados
orais e escritos e que as ações sócio-comunicativas determinam esses
enunciados, o que equivale a dizer que a linguagem é constituída na interação
verbal de sujeitos com o fenômeno social.
Os gêneros do discurso são primários e secundários, ou simples e
complexos (BAKHTIN, 2011, p. 263), sendo os primários tipos de diálogos
orais, que estão presentes nas conversas se salão, em círculos de amigos ou
entre familiares. Já os secundários ou complexos são os literários, os
científicos e os publicísticos. São predominantemente escritos. Contudo, um
gênero primário pode compor um secundário, como uma receita de bolo
fazendo parte de um romance.
Para Marcuschi (2010), os gêneros textuais são eventos maleáveis,
dinâmicos e plásticos, pois surgem à medida que as necessidades e atividades
socioculturais do homem exigem. Também são fenômenos históricos, por
estarem vinculados à vida cultural e social das pessoas, o que pode ser
observado, se compararmos a quantidade de gêneros que temos hoje às
sociedades de antes do surgimento da comunicação escrita.
19
Se os gêneros textuais se fundamentam na teoria bakhtiniana, seu
ensino, nesse estudo, se dá por meio das sequências didáticas, numa
perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), que apontam que uma
sequência didática é um conjunto de atividades escolares organizadas
sistematicamente em torno de um gênero textual, seja ele oral ou escrito, com
a intenção de ajudar ao aluno a dominá-lo, possibilitando, assim, que ele fale
ou escreva de maneira mais adequada.
De acordo com os autores, o esquema da sequência didática é formado
pela apresentação da situação, a produção inicial e os módulos, finalizando
com a produção final. A sequência didática tem movimento do complexo para
o simples, pois começa com a apresentação da situação, quando o professor
apresenta aos alunos o gênero que será trabalhado, passando pelos módulos e
voltando ao complexo com a produção final, na qual serão avaliados os
avanços obtidos pelos alunos.
Para produzir um texto precisamos ter em mente um interlocutor.
Cardoso (2008) ressalta que é preciso simular uma situação, prever um
destinatário e os efeitos que o texto terá sobre ele. Para tanto, é necessário
fazer uso dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e que já foram
apropriados pelo aluno.
No capítulo 5 é evidenciada a transposição da fala para a escrita,
processo no qual as crianças associam o som das palavras e tiram suas
próprias conclusões a respeito da escrita. Quanto a isso, Cardoso (2000)
afirma que o momento da transição da fala para a escrita é quando a criança
tem uma visão difusa sobre o objeto escrito e, por isso, características da
oralidade são comuns em seus textos.
Tal ensino tem importante função sociocognitiva, se entendida como um
facilitador da ação comunicativa, segundo Marcuschi (2008). Todavia,
diferentes tipos de textos requerem diferentes tipos de conhecimentos e
diferentes habilidades, como também deve ser diferente o ensino de produção
textual e de leitura para todos os gêneros estudados (SANTOS, 2007).
Para Beth Marcuschi (2007), é papel da escola a transposição do gênero
textual, transformando os saberes elaborados pela sociedade em ferramentas
de ensino. E o ensino da produção textual por meio dos gêneros do discurso
20
tem influência sobre esse aprendizado. Desta forma, os gêneros textuais são
de grande importância para a apropriação da escrita.
O capítulo 6 traz que, depois de definido o gênero a ser trabalhado nas
duas salas, foram lidas algumas fábulas para as crianças. Após a leitura, os
professores explicaram o que era o gênero que, segundo Coelho (2000), trata-
se de uma narrativa com a presença de animais em situações humanas e que
transmitem um ensinamento.
Assim, depois dessa apresentação da situação, os professores deram o
comando para que seus alunos fizessem a produção inicial da fábula.
As primeiras produções no gênero fábula foram avaliações diagnósticas
que serviram para nós, professores e pesquisadora, observarmos os
conhecimentos do gênero adquiridos pelas crianças. O resultado dessa
avaliação deu o norte para o planejamento e aplicação das atividades que
vieram a sanar os problemas surgidos. As aulas eram planejadas por mim e
pelos professores, sendo, posteriormente, aplicadas por eles.
Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), a produção inicial regula a
sequência didática tanto para os alunos quanto para os professores, pois ela
definirá o que é preciso trabalhar para desenvolver as capacidades de
linguagem dos alunos.
De acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), “nos módulos, trata-
se de trabalhar os problemas que apareceram na 1ª produção e de dar aos
alunos os instrumentos necessários pra superá-los”.
Assim, nessas primeiras produções surgiram problemas como animais
de estimação, em lugar de personificados, falta de moral da história ou moral
não condizente com o texto, falta de pontuação e marcas da oralidade nas
escritas.
Após os módulos de atividades, que tiveram a duração de 14 aulas de
Língua Portuguesa e incluíram leituras e interpretações de fábulas; pesquisas
em dicionários das palavras da fábula, cujo significado os alunos
desconheciam; reestruturações textuais e produções coletivas de textos no
gênero, houve a produção final.
É na produção final que os alunos apresentam os elementos trabalhados
em aula e que servem de critérios de avaliação. Assim, foi proposto aos
21
pequenos que criassem uma fábula ou fizessem um reconto. A maioria preferiu
a primeira opção.
Vários autores defendem a importância de um trabalho pedagógico por
meio de sequências didáticas. Alguns deles, como Barros-Mendes, Cunha e
Teles (2012) afirmam que uma das vantagens é o de minimizar o déficit de
aprendizagem no ensino da língua; e Marcuschi (2008) que ressalta que o
caráter modular da sequência didática contribui para a compreensão dos
gêneros, podendo ser aplicado a todas as séries do Ensino Fundamental.
No capítulo 7 são analisadas as produções iniciais e finais dos alunos no
gênero fábula. Utilizo como categoria de análise o texto em seu conjunto,
quanto sua adequação ao gênero, considerando o conteúdo temático, o estilo e
a construção composicional, as três dimensões do gênero discursivo, a fim de
verificar os textos que se caracterizaram como fábulas. Além do olhar global,
os textos também são observados em subcategorias como intertextualidade;
apropriação/consolidação da escrita; sinais de pontuação e marcas da
oralidade na escrita.
22
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
Serão evidenciados aqui os caminhos percorridos para a realização da
pesquisa, que é qualitativa e para a qual utilizei como técnica a observação
participativa na coleta dos dados. As atividades observadas foram planejadas
em conjunto por mim e pelos professores e aplicadas por eles.
O estudo, que iniciou com a observação das práticas de ensino dos
professores sujeitos da pesquisa, trouxe a preocupação de me fazer aceita por
eles. Assim, antes mesmo da observação participativa, os objetivos do estudo
foram revelados a eles, a fim de obter as informações que fossem necessárias
para a pesquisa.
Apresentarei, também, os objetivos (geral e específicos) que busquei
alcançar com a investigação, assim como o locus da pesquisa, a escola Arão
Gomes Bezerra, localizada na periferia de Rondonópolis, que atendia às
crianças desde a Educação Infantil até aos alunos do 9º ano e da Educação de
Jovens e Adultos (EJA) e os sujeitos envolvidos na referida pesquisa.
Os textos produzidos pelos alunos no gênero fábula foram instrumentos
de coleta de dados. As entrevistas semiestruturadas com os professores
demonstraram o desejo de que o gênero trabalhado fosse a fábula e,
antecedendo a observação participativa, ocorreram seções de estudo sobre
gêneros textuais sob as perspectivas de alguns autores que discorrem sobre o
assunto, como Leal e Melo (2007); Koch e Elias (2010); Marcuschi (2010).
2.1 Objetivos
Iniciei minha docência no ano de 2007, na mesma escola em que efetuei
a pesquisa e no mesmo ano em que conclui a formação em Letras. Atuei,
primeiramente, com alunos do 1º e 2º segmentos da Educação de Jovens e
Adultos (EJA), para em seguida, trabalhar com alunos da 1ª fase do 1ºciclo,
23
pois a Secretaria Municipal de Educação (SEMED) permitia que professores
graduados em Letras lecionassem para crianças até a 3ª fase do I ciclo. Algum
tempo depois, a SEMED decidiu que apenas professores pedagogos poderiam
trabalhar com os anos iniciais do Ensino Fundamental. Assim, no ano de 2011
fiz uma complementação em Pedagogia por intermédio de uma faculdade de
Brasília- DF, que me habilitou para lecionar para crianças, desde a Educação
Infantil, uma vez que já possuo especialização nessa área, certificada pela
Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
Ao longo de minha docência, percebi a resistência, por parte de alguns
alunos, em produzir textos. E, quando o faziam, eram produções desprovidas
de coesão, coerência ou unidade temática. Assim, como estudos vêm
discutindo a sequência didática para que a criança se aproprie da escrita, optei
por pesquisar como se dá esse aprendizado.
Foi notado, também, que essas crianças, na modalidade oral, são
bastante capazes. Então, o que lhes falta para serem bons escritores?
Intensificar o trabalho de produção de textos? Seria uma possibilidade, afinal,
as crianças necessitam de contato constante com a escrita. Porém, se isso for
feito sem um planejamento que efetive a apropriação de tal instrumento, a
mediação do professor e atividades adequadas às necessidades do grupo,
dificilmente ela ocorrerá e, como numa via de mão dupla, incorrer-se-á na
possibilidade de fazer com que alguns alunos abominem a escrita de textos,
pois a correção gramatical faz com que a criança tenha seu fluxo de
pensamento interrompido para pensar em como se escreve determinada
palavra. E, como nos assegura Cardoso (2008, p. 128),
O texto escolar se configura assim, mais do que nunca, como cumprimento de tarefa. Enquanto tal, quanto mais rápido o aluno puder resolvê-la, melhor será. Para tanto, valem: a definição dos temas, as sugestões de começo, as perguntas, o roteiro. Mesmo que reste a sensação de que a escrita já estava lá, “já vem pronta”, um real problema é colocado, pois esta escrita não possui, a rigor, um objetivo de comunicação. (grifos meus)
Embora o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) subsidie o
trabalho pedagógico dos professores distribuindo livros didáticos aos alunos da
educação básica, permitindo que os professores escolham as coleções,
previamente analisadas e aprovadas pelo Ministério da Educação (MEC),
24
alguns professores se apegam ao livro didático como sendo prescritivo, não
percebendo que alguns, dentre esses, podem trazer sugestões de produção
textual com um roteiro completo a ser seguido, inclusive com a proposta de
título, para que a criança “desenvolva” o texto a partir destes itens, como se
isso facilitasse a atividade de escrita. Evidentemente, a criança desenvolverá
um raciocínio, porém não usará de todo a sua capacidade intelectual de criar
histórias.
Um complicador é a exigência de uma letra primorosa e atenção aos
“erros” relacionados à sintaxe, gramática e outros que não colaboram para um
texto coerente e de fácil entendimento pelo interlocutor. Portanto, a professora
é o destinatário do texto. O aluno escreve para ela corrigir um texto que já vem
com encaminhamentos, fazendo com que ele tenha sua criatividade
prejudicada. Sem contar que, se a escrita não tem outro interlocutor (abordarei
o assunto mais adiante), senão a professora, essa produção falhará na sua
intenção comunicacional.
Produzir textos na escola é algo deveras laborioso, tanto por parte da
professora, que se esforça por ensinar, quanto do aluno que, por vezes, não
consegue encontrar sentido nessa atividade. O exemplo do aluno Guilherme,
do livro de literatura de Christiane Gribel (1999), “Minhas férias, pula uma linha,
parágrafo”, que deveria escrever uma redação sobre as férias, porém não via
sentido em colocar tantas diversões em poucas linhas e diminuto espaço de
tempo, mostra-nos que muitas crianças sentem-se dessa maneira quando
precisam cumprir a tarefa de produzir texto para a escola. O fato de ter a
professora como destinatário da produção deixa o estudante receoso de
“errar”, pois quem ensina, por seu turno, olhará a escrita com olhos de
correção, o que dificulta ainda mais o processo produtivo, uma vez que o aluno
precisa estar atento à gramática e à ortografia perdendo, assim, o fio condutor
dos pensamentos criativos. Assim, “A via de mão única para a produção infantil
em termos de destinatário, pode gerar inseguranças [...]”, como nos aponta
Cardoso (2008, p. 50).
Acerca dessas dificuldades, Albuquerque e Leal (2007, p. 100) salientam
que
25
Se, fora da escola, nós éramos e somos “produtores de textos”, na escola, éramos produtores de “redação”. Escrevíamos um texto específico, para um locutor também específico: o professor; com o objetivo preciso: aprender a escrever. E essa aprendizagem, para muitos de nós, deixou “traumas”, uma vez que nossa escrita estava sempre sendo avaliada como “boa” ou “ruim”, “certa” ou “errada”.
Marcuschi (2001, p. 38) reitera sobre os textos que se constituem como
domínios mistos, como uma aula expositiva, composta por partes em que a
professora lê o que preparou para os alunos e tece comentários a respeito do
assunto e, em outra parte, ela expõe algo sem um texto escrito previamente
como base, porém, pensamos numa aula como um evento oral.
Portanto, oralidade e escrita são parte de um mesmo sistema da língua.
E, assim, para Cardoso (2000, p.135), a linguagem escrita envolve um
movimento determinado pelas experiências da criança em registrar sua fala,
sendo importantes neste processo, os interlocutores e as condições de
produção, de maneira que tal processo de produção textual não termina
quando o produto parece acabado.
Neste contexto, Cardoso (2002, p. 177) aponta que a apropriação de
mecanismos de controle global da produção textual tem ligação com a
apropriação de técnicas e meios de linguagem diferenciados, que marcam as
ideias como encadeamento, continuidade, dependência e ruptura, como,
igualmente, marcam a posição do locutor do enunciado no texto.
Cagliari (2009, p. 86) relata a imposição de moldes que impossibilitam os
pequenos de experimentarem, tentarem e descobrirem, limitados a tarefas de
copiar vários traçados, num exercício de treinamento manual que não faz
sentido para eles. Segundo o teórico (2009, p. 86), “A escola é talvez o único
lugar onde se escreve muitas vezes sem motivo... Certas atividades da escola
representam um puro exercício de escrever”.
Então, Soares (2011, p. 108) diz que: “[...] os ‘textos’ não são mais que
uma lista de orações justapostas, sem elementos de coesão que
estabelecessem a continuidade do discurso”. Vejamos o texto exemplificado no
livro de Soares (2011, p. 108):
Hércules é um homem forte. O herói levanta a barra de ferro. Hoje Hércules vai levar Helena ao circo.
26
Helena é uma noiva habilidosa.
Assim, é natural que as crianças escrevam baseadas nestes modelos,
sem um encadeamento de ideias, sem coerência. Então, por ver este tipo de
escrita, comum nas produções de muitos alunos, é que me veio o desejo de
buscar entender o que acontece em grande parte dos textos de nossos
estudantes.
O PNLD, recriado a partir de 19961, vem distribuindo materiais que vão
para as escolas colaborar para a apropriação da escrita. De acordo com
Bunzem (2007, p. 43) o PNLD contribui para que textos autênticos em gêneros
textuais diversos estejam presentes nos livros de Língua Portuguesa, pois um
dos itens avaliados é a qualidade do material textual considerando quatro
principais aspectos:
a) diversidade de gêneros, de contextos sociais de uso (imprensa, literatura, ciência), de suportes, de registros e dialetos, etc; b) as temáticas e sua abordagem; c) os autores e sua diversidade e representatividade e d) aspectos da textualidade (fidelidade ao suporte, extensão, indicação de cortes nos textos fragmentados, etc.). (grifos do autor)
Desta forma, os livros didáticos têm chegado às mãos dos alunos com
material textual selecionado.
Para que o gênero textual abordado no livro didático, ou fora dele, seja
compreendido pelo aluno, a mediação do professor é fundamental, pois,
segundo Mendonça (2008, p.16),
[...] é preciso pensar em orientações claras sobre as condições de produção e circulação dos gêneros: qual a razão para elaborar o texto, qual o gênero, quem é o interlocutor, em que suporte será vinculado, etc. A partir daí, promover oportunidades para as etapas de planejamento, produção, revisão e reescrita/refacção.
A autora (2008, p.16) reitera que “quanto maior for nossa familiaridade
com um determinado gênero textual, melhor será nossa produção, seja ela oral
1 O Programa Nacional de Livro Didático existe desde 1929, com outra abrangência e outras
nomenclaturas (Instituto Nacional do Livro -INL; Programa Nacional do Livro para o Ensino Fundamental- PLIDEF). Em 1996 é reformulado, recebendo rigorosa avaliação por parte do
Ministério da Educação.
27
ou escrita”. E um coadjuvante no ensino do gênero abordado pelo professor é a
sequência didática.
Quanto às sequências didáticas, essas, segundo Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004, p. 97-98), têm a finalidade de auxiliar o estudante a melhor
dominar determinados gêneros textuais, o que poderá vir a melhorar sua
expressão tanto oral quanto escrita, de acordo com a situação de comunicação
que ele se veja envolvido. Portanto, elas servem para dar acesso às práticas
de linguagens novas ou de difícil domínio por parte dos alunos. Acreditando no
potencial das sequências didáticas e visualizando os problemas enfrentados
pelos discentes no processo de aquisição da escrita, o problema da pesquisa
pode ser assim enunciado: como o ensino de produção textual, baseado em
sequências didáticas, influencia na apropriação dos gêneros textuais por
alunos de 3ª fase do 1º ciclo de uma escola pública?
Desta forma, o objetivo geral desta pesquisa consiste em analisar a
contribuição das sequências didáticas para a aprendizagem de gêneros
textuais por alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental e os específicos
são analisar aulas com foco em fábulas e organizadas em sequência didática,
identificando quais conhecimentos foram mobilizadas e os modos como os
professores medeiam as atividades; investigar as relações entre as estratégias
didáticas aplicadas por meio das sequências didáticas e os resultados sobre as
capacidades de produção textual dos alunos; avaliar os avanços em produção
de fábulas pelos alunos participantes da sequência didática.
2.2 Pesquisa Qualitativa
A pesquisa caracteriza-se como qualitativa, na qual, segundo a
perspectiva de Lüdke e André (1986), o pesquisador preocupa-se tanto com o
produto da pesquisa como com o processo observado. Interessa-lhe a
interpretação dos fenômenos e os fatos observados.
De acordo com Flick (2004, p. 272), os métodos quantitativos são
“apenas ‘atalhos’ econômicos de pesquisa do processo de geração de dados”.
Salienta ainda o autor (2004, p.273) que
[...] os métodos qualitativos podem viver muito bem sem o posterior emprego de métodos quantitativos; já os
28
métodos quantitativos precisam dos métodos qualitativos para explicar as relações encontradas.
O fenômeno pesquisado foi a apropriação da escrita pelas crianças, que
ocorreu por meio dos textos produzidos por elas abordando o gênero fábula. O
método de pesquisa utilizado foi a observação participativa, que proporcionou
maior clareza sobre o objeto investigado e possibilitou um contato mais estreito
da pesquisadora com o fenômeno investigado. Com relação a este tipo de
observação, Lüdke e André (1986, p. 29) asseveram que “o ‘observador como
participante’ é um papel em que a identidade do pesquisador e os objetivos do
estudo são revelados ao grupo pesquisado desde o início”. Assim, o
pesquisador pode ter acesso a informações, com a cooperação do grupo,
tendo a consciência de que esse grupo controlará o que deve ou não se tornar
público pela pesquisa.
Meu papel na escola foi o da observação participante, pois, além de
observar as práticas de ensino dos professores sujeitos da pesquisa,
planejamos juntos as atividades por eles aplicadas. Assim, em conformidade
com Lüdke e André (1986, p. 17 e 28), desde os primeiros contatos com os
participantes da pesquisa, o pesquisador deve se preocupar em ser aceito pelo
grupo, a fim de que ele consiga obter as informações que julgar necessárias. A
estratégia da observação participante, além de envolver a observação direta do
conjunto de técnicas metodológicas, subentende envolvimento do pesquisador
com a situação estudada.
De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 47-51), são necessários cinco
passos para se desenvolver uma pesquisa qualitativa;
1- a fonte direta de dados é o ambiente natural,
constituindo o investigador o instrumento principal; 2- é de natureza descritiva [...], os dados recolhidos são em forma de palavras e imagens e não de números; 3- o interesse está mais no processo do que simplesmente nos resultados ou produtos; 4- os investigadores qualitativos tendem a analisar os seus dados de forma indutiva; não se recolhem dados ou provas com objetivo de confirmar hipóteses construídas à medida que os dados particulares, que foram recolhidos, vão se agrupando; 5- o significado é de importância vital na obra qualitativa.
Esta modalidade de pesquisa permite o envolvimento com o objeto
estudado, a fim de obter dados.
29
Fundamentada nestes estudos, investiguei o universo escolar, as
práticas dos professores e a produção textual dos alunos, pois, de acordo com
Lüdke e André (1986, p. 5), ao pesquisador cabe o papel de “servir como
veículo inteligente e ativo entre o conhecimento acumulado na área e as novas
evidências que serão estabelecidas a partir da pesquisa”. As autoras salientam,
ainda, que não há uma neutralidade do pesquisador sobre o objeto pesquisado,
uma vez que esse está implicado nos fenômenos que conhece e na
importância desse conhecimento que ajudou a estabelecer.
Os registros das observações foram feitos em protocolos, ou seja,
registros que, ainda de acordo com as autoras acima citadas (1986, p. 32), são
as formas mais comumente utilizadas nos estudos de observação. Nos
referidos protocolos de observação registrei os dias, o horário e a turma da sala
observada, bem como as práticas de ensino dos professores, as atividades
planejadas, apenas entre eles e, depois, as programadas em conjunto comigo
para, posteriormente, serem aplicadas por eles. Registrei, igualmente, as
situações do cotidiano vividas pelos alunos na sala de aula, suas perguntas,
dúvidas e comentários sobre o conteúdo exposto.
Foram observadas, entre os meses de março e julho, ou seja, por um
período de cinco meses, as aulas ministradas pelos dois professores. Utilizei,
também, como estratégias entrevistas semiestruturadas, que foram feitas
individualmente, gravadas e, posteriormente, transcritas, pois havia a
necessidade de, previamente, compreender o trabalho desses profissionais e o
universo escolar, do qual professores e alunos são partícipes; coleta das
atividades de Língua Portuguesa, uma vez que a pesquisa teve foco na
aprendizagem da escrita de seis alunos de cada sala, embora todas as turmas
tenham sido partícipes da pesquisa, salvo algumas exceções, cujos pais não
autorizaram a participação no estudo; coleta das produções de textos iniciais e
finais dos alunos, que foram digitalizadas usando o programa HP Smart Install,
em formato PDF (Portable Document Format).
Foram selecionados apenas seis alunos por turma para que os avanços
ou não de cada um pudessem ser acompanhados mais de perto. Esse total de
alunos corresponde a um percentual de vinte e cinco por centro (25%),
considerando a quantidade de alunos existente nas duas salas.
30
Com exceção de 05 alunos da turma A, cujos pais não autorizaram suas
participações, todos os alunos das duas turmas eram sujeitos da pesquisa. Os
doze alunos foram selecionados com base nos critérios do Sistema de
Avaliação do Ensino Municipal (SAEM). Essa avaliação diagnóstica da
educação é exigida pela Secretaria Municipal de Educação de Rondonópolis –
MT (SEMED) e constituída por três provas, SAEM Inicial, Medial e Final, que
são aplicadas logo que o aluno adentra o ano escolar, em meados do ano e ao
final do ano letivo.
A coleta dos textos ocorreu depois da apresentação da situação, isto é,
a apresentação da fábula, de acordo com os estudos fundamentados nas
sequências didáticas de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004). Esse gênero foi
sugerido pela professora Luísa durante a entrevista semiestruturada, inicial e
individual:
Em quais gêneros textuais seus alunos apresentam maior dificuldade de aprendizado? Luísa: [...] no primeiro momento eles vão apresentar mais dificuldade vai ser em fábulas, porque ainda não têm conhecimento sobre fábulas, então eles vão apresentar dificuldades nestes gêneros que eles ainda não conhecem [...] Pesquisadora: Então, que gênero textual você gostaria de trabalhar com eles? Luísa: Eu acredito que um gênero que despertará mais a atenção deles será a fábula. Eu gostaria de trabalhar a fábula, porque é rica em ensinamento e como aparecem os animais, eles vão gostar e aprender muito.
Também o professor Antônio manifestou o desejo de trabalhar o gênero
fábula com seus alunos, conforme trecho de sua entrevista inicial.
Pesquisadora: Se fosse para ensinar um gênero textual específico para seus alunos, qual você escolheria? Qual você imagina que iria despertar a atenção deles? Antônio: Eu não trabalhei ainda neste ano, só nas leituras deleite, mas eu pretendo trabalhar fábulas, porque eu percebo que eles gostam de histórias. Eles conseguem guardar na memória as histórias lidas pra eles, então eu acredito que a fábula pode ensinar bastante pra eles.
Assim, a escolha da fábula se deu por iniciativa dos professores que já
tinham a ideia de trabalhar o gênero no decorrer do ano letivo de 2013.
31
2.3 Locus da pesquisa
A Escola Municipal de Ensino Fundamental Arão Gomes Bezerra foi
fundada em 1987. Atualmente, possui quinhentos e quarenta e nove alunos
matriculados, desses, cento e trinta e cinco no I ciclo, com o número de trinta e
um professores atuando na escola em 2013.
Os estudantes atendidos naquela escola vão até o 9º ano do 3º ciclo.
Terminado o referido ano letivo, os alunos procuram uma escola estadual num
bairro mais centralizado do distrito de Vila Operária, ou em outras regiões para
continuarem os estudos.
A instituição possui oito salas de aula climatizadas, contando, ainda,
com um laboratório de informática, uma biblioteca e uma quadra coberta,
tendo, no mesmo quarteirão, divididos por muros, um PSF (Posto de Saúde da
Família) e a sede da associação de moradores do bairro. No período noturno,
na escola estão matriculados alunos da Educação de Jovens e Adultos (EJA),
dos 1º e 2º segmentos.
É uma das maiores escolas da Rede Municipal. As salas são amplas e
construídas num terreno de grandes dimensões, com possibilidades de
aumento de salas futuramente. Possui, ainda, quatro turmas de pré-escola que
funcionam nos períodos matutino e vespertino, mas em classes anexas, numa
pequena escola do bairro vizinho, Vila Iraci, distante três quarteirões da escola
principal.
A escola atende, também, a Educação de Jovens e Adultos, em salas
anexas funcionando na Companhia de Desenvolvimento de Rondonópolis
(CODER) e na Escola Municipal de Ensino Fundamental José Antônio da Silva,
atendendo aos alunos dos 1º e 2º anos dos 1º e 2º segmentos. Incluindo-se,
ainda, nos períodos da manhã e da tarde o 1º e 2º agrupamentos do 2º ciclo,
que funcionam também em salas anexas da antiga creche da Vila Iraci.
Os professores são qualificados e, em sua maioria, possuem pós-
graduação. O trabalho é coletivo e há trocas de experiências entre eles, o que
garante que a escola fique entre os primeiros lugares no Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) de Rondonópolis, anualmente.
O diretor exerce o cargo há mais de dez anos, contando com a
colaboração das coordenadoras pedagógicas dos períodos matutino,
32
vespertino e noturno. É uma escola bastante procurada pelos moradores dos
bairros Jardim Itapuã, Vila Iraci, Vila Olga Maria, Jardins Ipiranga, D. Bosco,
Taiti e Primavera. As funções desempenhadas naquela escola, no ano
vigente de 2013, ficam assim demonstradas:
Quadro 1 – Funções desempenhadas na escola e quantidade de agentes por
cargo (2013)
FUNÇÃO AGENTES POR FUNÇÃO
Diretor 1
Coordenadoras pedagógicas 3
Agentes administrativos 2
Secretária 1
Auxiliar de serviços diversos 16
Professores
Educação Infantil
4
31 I Ciclo 9
II Ciclo 11
III Ciclo 7
Vigilantes 4
TOTAL 58 FONTE: Elaborado pela autora de acordo com o PPP (2013).
Vejamos como estão distribuídas as turmas por modalidades e turnos.
Quadro 2 – Distribuição das turmas por modalidades e turnos (2013)
MODALIDADES TURNOS TURMAS
Educação Infantil Matutino e vespertino 4
I Ciclo Vespertino 6
II Ciclo Matutino 6
III Ciclo Matutino 4
EJA Noturno 8
TOTAL 28 FONTE: Elaborado pela autora de acordo com o PPP (2013).
Na modalidade Educação Infantil, no período matutino, há uma sala
multifaseal, do 1º e 2º agrupamentos, ou seja, com crianças de 4 e 5 anos e
outra do 2º agrupamento, com alunos de 5 anos. No período vespertino existe
33
uma turma do 1º agrupamento com crianças de 4 anos e outra do 2º
agrupamento, com alunos de 5 anos. Essas salas estão no prédio da antiga
creche Vila Iraci e todas são do 2º Ciclo.
No período vespertino, na modalidade I Ciclo, estão as turmas A e B da
1ª fase, A e B da 2ª fase, A e B da 3ª fase e ainda as turmas A e B da 1ª fase
do II Ciclo. Pela manhã, no 2º Ciclo, estão lotadas as turmas A e B da 2ª fase,
A e B da 3ª fase, A e B da 1ª fase do III Ciclo, Única da 2ª fase e Única da 3ª
fase.
À noite, no prédio da escola Arão Gomes Bezerra, estão as turmas do 1º
e 2º anos A, do 1º segmento, 1º ano A, do 2º segmento e 2º ano A e C do 2º
segmento. No prédio da CODER estão em salas anexas e multifaseadas o 1º e
2º anos B do 1º e 2º segmentos, respectivamente e, anexos à Escola Municipal
José Antônio, os 1º e 2º anos C do 1º segmento.
2.4 Quem são os sujeitos da pesquisa
Em contato com o diretor, ainda no mês de dezembro de 2012, obtive a
autorização para fazer a pesquisa nessa escola. Iniciei com as observações em
março de 2013, totalizando duzentas e vinte horas de observação, antes de
começarmos a trabalhar com o gênero textual escolhido pelos professores.
A pesquisa, inicialmente, se daria com apenas uma turma da 3ª fase do I
ciclo, porém, a professora daquela sala estava na iminência de pedir um
afastamento, do que desistiu em seguida. Ficou decidido, então, que eu
acompanharia as duas turmas da 3ª fase do I ciclo da escola. A turma A, do
professor Antônio, conta com vinte e quatro (24) alunos, enquanto que a turma
B, da professora Luísa, com vinte e três (23)2. Vejamos a seguir o quadro que
caracteriza esses profissionais, sujeitos da pesquisa:
Quadro 3 - Caracterização dos professores sujeitos da pesquisa
PROFESSOR ANTÔNIO LUÍSA
2 Os nomes dados aos sujeitos da pesquisa são fictícios, tanto dos professores quanto dos
alunos.
34
FORMAÇÃO História e Pedagogia. Especialização em Educação
Pedagogia. Especialização em Planejamento Educacional
IDADE 50 anos 40 anos
TEMPO DE DOCÊNCIA 16 anos 20 anos
TEMPO NAQUELA ESCOLA
9 anos 4 anos
SITUAÇÃO FUNCIONAL Contratado Efetiva FONTE: Dados da pesquisa.
Como podemos notar, os professores em questão possuem larga
experiência no magistério e atuam naquela escola há bastante tempo, embora
o professor Antônio tenha vínculo provisório, visto ser contratado.
Os dois professores passaram por cursos oferecidos pela Secretaria
Municipal de Educação (SEMED), como o Programa de Gestão da
Aprendizagem Escolar (Gestar) e Pró-Letramento, tanto de Matemática quanto
de Língua Portuguesa. Atualmente estão participando do Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Quanto ao Programa Gestar, apenas a
professora Luísa teve a oportunidade de cursar, pois o programa atendeu
apenas aos professores efetivos.
Luísa já desempenhou a atividade de professora do Atendimento
Educacional Especializado (AEE), como informado por ela no questionário de
caracterização dos professores, atuando na Sala de Recursos, o que, segundo
ela, foi uma experiência boa, que contribuiu para sua prática e fez perceber que
é possível aprender, desenvolver-se mesmo diante das deficiências.
Ela desempenhou a referida função naquela mesma escola da pesquisa.
Também já trabalhou com todas as fases do I ciclo e com a 1ª fase do II ciclo.
Na ocasião da pesquisa, estava dando continuidade com a turma que assumiu
no ano de 2012.
O professor Antônio, também de acordo com o questionário de
caracterização dos professores, trabalhava naquela escola há nove anos,
inicialmente com os 4º e 5º anos, isto é, 1ª e 2ª fase do II ciclo, lecionando
História. Desde então, não prestou concursos que o efetivasse em sua área.
Embora não saiba precisar o ano, passou num concurso da rede Estadual para
trabalhar História no município de Alta floresta, região Norte de Mato Grosso,
não podendo assumir pelo fato de sua mãe encontrar-se enferma na ocasião e
ser ele o único filho que poderia cuidar dela. No ano de 2009, começou a
35
ministrar aulas para as séries iniciais, mais precisamente para as terceiras
fases, em regime de unidocência, ou seja, trabalhava todas as disciplinas
dessa fase. No período da pesquisa era professor substituto, contratado pela
rede municipal para suprir a reserva técnica da coordenadora pedagógica, que
é lotada na 3ª fase do I ciclo.
Todos os alunos, no começo de cada ano letivo, são submetidos a uma
avaliação diagnóstica, o SAEM, seguindo os critérios e exigência da SEMED,
que os classifica como A (Acompanha), AB (Acompanha Bem), C (Crítico) e
MC (Muito Crítico). Essa avaliação, denominada SAEM Inicial, é composta por
todas as disciplinas da grade curricular referentes à fase e ao ciclo do aluno
avaliado. O aluno A é aquele que acompanha todo o processo ensino-
aprendizagem, sem, no entanto, se destacar muito, na avaliação ele obtém
nota entre 5,5 (cinco e meio) e 7,0 (sete). O AB é o que acompanha e se
destaca em todas as atividades propostas pelo professor, obtendo nota entre
8,5 (oito e meio) e 10,0 (dez). O C é o crítico, que domina o sistema de escrita
alfabética, porém não é um leitor ou escritor convencional, ou o faz com certo
grau de dificuldade, sua nota, na avaliação, fica entre 3,5 (três e meio) e 5
(cinco). O MC é o muito crítico, cujo aprendizado é lento e ainda não se
apropriou do sistema de escrita, necessitando de maior atenção do professor
para deixar essa condição de MC e avançar para C, A e chegar a AB, na
avaliação esse aluno obtém notas entre 1 (um) e 3,0 (três).
De acordo com o SAEM Inicial, os alunos das duas turmas ficaram
assim classificados:
Quadro 4 - Perfil dos alunos conforme avaliação SAEM Inicial (2013)
CLASSIFICAÇÃO DOS ALUNOS
ALUNOS TURMA A PROFESSOR ANTONIO
ALUNOS TURMA B PROFESSORA LUÍSA
A 5 10
AB 7 6
C 12 7
MC 0 0
TOTAL 24 23 FONTE: Dados da pesquisa.
36
Desta forma, da turma A, foram selecionados para a pesquisa os alunos
Juliana e Ricardo, considerados AB, William e Manuelle, alunos A e Jonathan e
Myla classificados como C.
Na turma B, os selecionados foram Tiago e Tânia, como AB; Juliano e
Alícia como A e Marcos e Caterina como C. Em ambas as salas, os
professores não consideram ter alunos muito críticos (MC). Os alunos C das
duas turmas estão se apropriando, aos poucos, da escrita e da leitura.
Jonathan e Myla, da turma A, fazem leitura deleite no início da aula, sempre
que o professor pede. Leem com auxílio do professor, mas não se sentem
inibidos, ao passo que Caterina e Marcos, da turma B, durante a pesquisa,
jamais foram à frente ler alguma coisa, embora a professora insistisse e
oferecesse ajuda. Eles alegavam vergonha, apesar de todos serem respeitados
pelos colegas no ato da leitura. Vejamos o quadro em que aparecem as
classificações desses alunos:
Quadro 5 – Classificação dos alunos conforme avaliação SAEM inicial
ALUNO TURMA CLASSIFICAÇÃO
JULIANA A AB
RICARDO A AB
MANUELLE A A
WILLIAM A A
JONATHAN A C
MYLA A C
TÂNIA B AB
TIAGO B AB
ALÍCIA B A
JULIANO B A
CATERINA B C
MARCOS B C FONTE: Dados da pesquisa.
As crianças das duas turmas têm idade entre 8 e 9 anos e, como
mencionado anteriormente, são moradoras de bairros que circundam a escola.
O alunato dessa escola é formado, em sua maioria, por famílias de médio a
baixo nível socioeconômico.
Mais adiante, no capítulo de análise, mostrarei as produções dos alunos
no gênero textual fábula.
37
2.5 Procedimentos e instrumentos da coleta de dados
Houve, também, durante a pesquisa, reuniões de estudos sobre textos
de autores que abordam gêneros textuais e ambos os professores passaram
por esses encontros, sendo que o primeiro foi somente entre nós três,
professores e pesquisadora. A partir daí, a escola não queria abrir mão de sua
hora de trabalho pedagógico coletivo (HTPC). Então, sugeri que esses estudos
se estendessem aos demais professores e a coordenadora pedagógica
aceitou, já que, segundo ela, a escola trabalhava gêneros textuais diversos
durante o ano letivo. Assim, desses estudos participaram, além dos
professores sujeitos da pesquisa também os colegas dos anos iniciais. Esses
encontros ficaram assim distribuídos:
Quadro 6 – Encontros de estudos de gêneros textuais com os professores
DATA TEXTO AUTOR
30/04/2013 Produção de textos: introdução ao tema
LEAL E MELO – In Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino Fundamental. Leal e Brandão (orgs.) 2007, p.11 a 26.
07/05/2013 Gêneros textuais: o que são? Para que servem?
KOCH e ELIAS – Ler e escrever: estratégias de produção textual, 2010, p. 53 a 62.
14/05/2013 Gêneros textuais: definição e funcionalidade
MARCUSCHI - In gêneros textuais e ensino. In Gêneros textuais e ensino. Dionísio; Machado; Bezerra (orgs.) 2010, p.19 a 38.
21/05/2013 Slides sobre Sequência Didática
Dolz, Noverraz e Schneuwly.
FONTE: Dados da pesquisa.
Em entrevista semiestruturada com os professores, ficou explícito que
eles desejavam que fosse trabalhado esse gênero.
Pesquisadora: Então, que gênero textual você gostaria de trabalhar com eles? Luísa: Eu acredito que um gênero que despertará mais a atenção deles será a fábula. Eu gostaria de trabalhar a fábula, porque é rica em ensinamento e como aparecem os animais, eles vão gostar e aprender muito. Pesquisadora: Se fosse pra ensinar um gênero textual específico para seus alunos, qual você escolheria? Qual você imagina que iria despertar a atenção deles?
38
Antônio: Eu não trabalhei ainda neste ano, só nas leituras deleite, mas eu pretendo trabalhar fábulas, porque eu percebo que eles gostam de histórias. Eles conseguem guardar na memória as histórias lidas pra eles, então eu acredito que a fábula pode ensinar bastante pra eles.
As observações iniciaram em março de 2013, primeiramente se deram
sobre as práticas dos professores Antônio e Luísa e, posteriormente, em maio
de 2013, as observações foram das aulas que planejávamos juntos e eram por
eles aplicadas.
Essas observações se deram nas aulas de Língua Portuguesa, de
segundas a quartas-feiras, iniciando com uma sala até a hora do recreio e indo
para a outra depois deste. Para que nenhuma sala ficasse em desvantagem,
quando eu encerrava a observação do dia na turma A, por exemplo, no outro
dia eu começava por ela. Assim, os comportamentos das turmas eram
observados antes e depois do recreio, visto que após este, as crianças ficam
um pouco cansadas e, consequentemente, menos disciplinadas e, às vezes,
pouco produtivas.
No próximo quadro explicito a distribuição das horas observadas, antes
da apresentação da situação, isto é, antes de eu dar início aos trabalhos com o
gênero textual previsto.
Quadro 7 – Demonstrativo das aulas observadas
PROFESSOR ANTÔNIO PROFESSORA LUÍSA
PROTOCOLO AULA/DIA HORAS PROTOCOLO AULA/DIA HORAS
1e 1A 18 mar 4 2 e 2A 18 mar 4
4 21 mar 4 3 e 3A 21 mar 4
5 25 mar 4 6 25 mar 4
8 26 mar 4 7 26 mar 4
10 27 mar 4 9 27 mar 4
12 01 abr 4 11 01 abr 4
13 02 abr 4 14 02 abr 4
16 03 abr 4 15 03 abr 4
18 08 abr 4 17 08 abr 4
19 09 abr 4 20 09 abr 4
22 10 abr 4 21 10 abr 4
23 15 abr 4 24 15 abr 4
26 16 abr 4 25 16 abr 4
27 17 abr 4 28 17 abr 4
30 22 abr 4 29 22 abr 4
31 23 abr 4 32 23 abr 4
34 24 abr 4 33 24 abr 4
35 29 abr 4 36 29 abr 4
38 30 abr 4 37 30 abr 4
39 06 mai 4 40 06 mai 4
39
42 07 mai 4 41 07 mai 4
43 08 mai 4 44 08 mai 4
46 13 mai 4 45 13 mai 4
47 14 mai 4
49 15 mai 4 48 15 mai 4
50 20 mai 4 51 20 mai 4
53 21 mai 4 52 21 mai 4
54 22 mai 4 55 22 mai 4
TOTAIS 28 aulas 112 horas 27 aulas 108 horas FONTE: Dados da pesquisa.
O dia de observação inexistente no quadro referente à professora Luísa
foi por ocasião da assembleia geral dos funcionários municipais, portanto,
naquela data, as aulas ocorreram até às quinze horas.
Os alunos das duas turmas logo se afeiçoaram a mim e,
frequentemente, pediam ajuda para completar suas atividades, quando não
entendiam perfeitamente. No começo eu fiquei desconcertada, porém, com o
passar dos dias, ajudava-os não lhes dando as respostas, mas fazendo com
que refletissem sobre elas. Todavia, isso ocorreu com a anuência dos
professores.
Durante a hora de trabalho pedagógico coletivo (HTPC), eu e os
professores planejamos as aulas sobre o gênero fábula, sugerido por eles na
ocasião da entrevista semiestruturada, que foram por eles ministradas. Assim,
a partir do dia 27 de maio de 2013, desenvolveu-se a pesquisa com a
apresentação da situação, por meio da leitura de várias fábulas e a explicação
dos professores, cada um em sua respectiva sala, sobre as características
desse gênero.
Na sala do professor Antônio, naquela mesma data, também houve a
apresentação da situação. O gênero fábula teve sua produção final no dia 03
de julho de 2013. O assunto será abordado mais adiante.
A coleta de dados deu-se na seguinte ordem: a observação de duzentas
e vinte horas teve início em 18/03/2013 e as entrevistas iniciais com os
professores ocorreram no dia 09/04/2013. Depois das entrevistas e,
concomitante a observação das práticas dos professores, houve os encontros
semanais para estudos sobre gêneros textuais nos dias 30/04, 07/05, 13/05 e
21/05/2013.
No dia 27/05 houve a apresentação da situação, ou seja, os professores
apresentaram as fábulas aos alunos e, a partir desse dia, a observação das
40
aulas que planejávamos juntos e eles, os professores, aplicavam. Foram
observadas, nesta etapa, cinquenta e duas horas, como demonstra o quadro
seguinte:
Quadro 8 – Demonstrativo das aulas observadas após a apresentação do
gênero fábula
PROFESSOR ANTÔNIO PROFESSORA LUÍSA
PROTOCOLO AULA/DIA HORAS PROTOCOLO AULA/DIA HORAS
57 27 mai 4 56 27 mai 4
58 28 mai 4 59 28 mai 4
60 29 mai 4
61 06 jun 4 62 03 jun 4
64 04 jun 4 63 04 jun 4
65 05 jn 4 66 05 jun 4
68 10 jun 4 67 10 jun 4
69 11 jun 4 70 11 jun 4
72 12 jun 4 71 12 jun 4
73 17 jun 4 74 17 jun 4
76 18 jun 4 75 18 jun 4
77 01 jul 4 78 02 jul 4
79 02 jul 4 81 03 jul 4
80 03 jul 4
TOTAL 13 aulas 52 horas 13 aulas 52 horas FONTE: Dados da pesquisa.
Na aula de 28/05 houve a coleta da produção inicial dos alunos. Os dias
que se seguiram e que estão demonstrados no quadro acima foram
trabalhados os módulos até a data de 03/07, quando houve a coleta dos textos
finais, no gênero fábula, produzidos pelos estudantes.
2.6 O gênero textual escolhido e suas características tomadas como
objeto de reflexão
Perguntei aos professores, durante o primeiro dia de estudos sobre
gêneros textuais, usando o texto de Telma Ferraz Leal e Kátia Leal Reis de
41
Melo, “Produção de textos: introdução ao tema”, o que eles entendiam como
gênero textual e assim me responderam:
Luísa: Pra mim são os diferentes tipos de textos que a gente vê, porque existe diferença de um texto pra outro, né? É os diferentes são fábulas, aí vêm os textos narrativos, contos... Antônio: Até música, né? Luísa: Música, receita, tudo é diferente um do outro. Antônio: Poesia... Luísa: Mesmo quando a gente fala assim: Ah! É um gênero textual. Você lendo um texto você já sabe do que se trata. Antônio: Sabe diferenciar, né, que texto que é. Luísa: E antes quando nós estudamos, não era falado em gêneros textuais. Antônio: Só se falava que era texto e pronto. Vamos trabalhar um texto. Luísa: É, vamos trabalhar um texto. E até quando eu comecei a ouvir falar em gêneros textuais eu encontrei dificuldades até entender o que que era... Antônio: O que que era, como se trabalhava esses textos, né? Pesquisadora: É. E então, nesse texto elas falam “eu costumo escrever e-mail, MSN, ofício e cartas e notas”. Então tudo isso... Luísa: É um gênero. Antônio: Se eu escrever um bilhete, é um gênero também.
Assim, vemos que os professores têm noções sobre gêneros textuais,
pois, de acordo com entrevista, ambos trabalhavam diversos portadores de
textos com suas turmas, nos quais figuravam poesia, convite, bilhete. Inclusive,
no início das observações, estavam trabalhando a poesia “Quintal”, de Elias
José (PROTOCOLO 1). A professora Luísa disse que trabalhava sempre os
gêneros textuais, principalmente a poesia e, junto com elas, a gramática e a
ortografia.
Pesquisadora: Com que frequência você trabalha os gêneros textuais, já que costuma trabalhar como já disse, com que frequência você trabalha? Luísa: Sempre. Todos os dias nós estamos passando, principalmente a poesia. Eu gosto muito de trabalhar a poesia com eles e aí, agora mesmo, nós estamos trabalhando Elias José e aí eu pretendo mudar, passar outros tipos de poesia com Cecília Meireles e trabalhando poesia e, dentro da poesia, já trabalha gramática junto, a ortografia.
42
Depois da entrevista com os professores sujeitos da pesquisa que me
informaram sobre o que gostariam de trabalhar com seus alunos em termos de
gêneros textuais (vide p. 36), ficou decidido que seria apresentado a eles o
gênero textual fábula que, de acordo com o quadro de aspectos tipológicos de
Dolz; Noverraz; Schneuwly (2004, p. 121), pertence à ordem do narrar, pois,
conforme os autores (2004, p. 120), “os gêneros podem ser agrupados em
função de um certo número de regularidades linguísticas e de transferências
possíveis”. Os teóricos informam ainda, que estes aspectos tipológicos
respondem a três critérios: domínios sociais de comunicação, que
correspondem às finalidades sociais atribuídas ao ensino; capacidades de
linguagem implicadas no domínio dos gêneros agrupados, que são narrar,
relatar, argumentar, expor e descrever ações; e os exemplos de gêneros orais
e escritos. Para os autores (2004, p.121) o conto maravilhoso, a lenda, a
narrativa de aventura, de ficção científica, de enigma, a novela fantástica e o
conto parodiado, pertencem, assim como as fábulas, à ordem do narrar.
Segundo Coelho (2000, p.164),
Há ainda uma multiplicidade de formas narrativas que vêm, desde a origem dos tempos, e que [...] consideramos também como pertencentes à grande área do gênero ficção, e às quais definimos como formas simples.
Escreve a autora (2000, p. 164) que se consideram formas simples
certas narrativas que surgiram há milênios e de forma anônima, que circularam
entre os povos da Antiguidade e, com o passar do tempo, transformaram-se no
que hoje conhecemos como tradição popular. Afirma ainda, a autora (2000, p.
165), que
São formas simples porque resultaram de “criação espontânea”, não-elaborada - diferentes, por exemplo, dos romances medievais ou das novelas de cavalaria, que apresentam uma forma ainda rudimentar, mas artisticamente elaborada. Pela simplicidade e autenticidade de vivências que singularizam essas narrativas, quase todas elas acabaram assimiladas pela literatura infantil, via tradição popular.
E as fábulas são exemplos dessas formas simples. De acordo com
Coelho (2000, p. 165),
Fábula (lat. fari = falar e gr. phaó = dizer, contar algo) é a narrativa (de natureza simbólica) de uma situação vivida
43
por animais que alude a uma situação humana e tem por objetivo transmitir certa moralidade. A julgar pelo que a história registra, foi a primeira espécie de narrativa a aparecer.
Informa a autora (2000, p. 165), que a fábula nasceu no Oriente, mas foi
reinventada no Ocidente pelo grego Esopo (séc. VI a.C.), sendo aperfeiçoada
mais tarde pelo escravo romano Fedro (séc. I a.C), que a enriqueceu
estilisticamente e, no séc. XVII, La Fontaine reinventou e introduziu
definitivamente esse gênero na literatura ocidental.
Em conformidade com Coelho (2000, p. 167), o que distingue a fábula
das demais formas metafóricas ou simbólicas é a presença do animal, que
assume característica humana e exemplar. Também os personagens são
símbolos, pois representam “algo no contexto universal (por exemplo: o leão,
símbolo de força, majestade, poder; a raposa, símbolo da astúcia; o lobo,
símbolo do poder despótico; etc.)”.
Segundo a Britannica Escola Online3,
Fábula é um tipo de história que traz uma moral, ou seja, ensina uma lição. É geralmente uma narrativa curta, em que animais falam, pensam e agem como gente. E, por destacarem qualidades e defeitos humanos, os animais mostram quão bobas ou sábias as pessoas podem ser. As fábulas são muito usadas nas sessões de contação de histórias.
Alguns autores caracterizam a fábula como uma narrativa na qual estão
presentes seres inanimados. De acordo com Coelho (2000, p. 168), tal
narrativa trata-se de um apólogo, isto é,
A narrativa breve de uma situação vivida por seres inanimados, ou melhor, sem vida animal ou humana [...], que, ali, adquirem vida e que aludem a uma situação exemplar para os homens [...]. Normalmente, o apólogo tem como personagens seres que ali adquirem valor metafórico. Isto é, não são símbolos como acontece com as personagens da fábula.
Portanto, nesse trabalho, utilizarei o conceito de fábula de Coelho
(2000).
3 Britannica Escola Online. Enciclopédia Escolar Britannica, 2014. Web, 2014. Disponível em
<http://escola.britannica.com.br/article/483330/Jean de La Fontaine. Acesso em 09 de fev. de 2014.
44
As atividades com as fábulas ajudam na apropriação da escrita e
reflexão do uso da língua, pois a partir delas a criança pode compreender o
processo de funcionamento da língua escrita. É por meio da escrita que os
pequenos percebem as estruturas dos textos que os auxiliam nas situações de
comunicação.
Citelli e Bonatelli (2011, p. 124) citam que
O ato de redigir deve ser mais do que um exercício de busca de um padrão modelar, de repetição de esquemas formais e estilísticos, de treino mecânico. A questão reside em fazer com que os alunos desenvolvam uma competência discursiva marcada por um bom domínio da modalidade escrita e por uma visão de que a produção de um texto é um trabalho que exige a superação de jogos de palavras ou frases soltas.
Houve uma etapa, na pesquisa, que foi feita a refacção do texto de um
aluno de cada turma para que todos compreendessem melhor os elementos
composicionais do gênero e alguns aspectos formais do texto como correção
gramatical. Quanto a isso, Citelli e Bonatelli (2011, p. 124) informam que
[...] no movimento de feitura e de refeitura do texto é que o aluno vai dominando a sua escrita, percebendo os recursos expressivos da linguagem, operando as variações intertextuais com a consciência de quem dialoga com uma tradição que o antecede e que o transcende.
Isso é feito, certamente, respeitando-se o ritmo e as peculiaridades de
cada aluno de cada turma.
Bakhtin (2011, p. 289) assevera que “A relação valorativa do falante com
o objeto do seu discurso [...] também determina a escolha dos recursos
lexicais, gramaticais e composicionais do enunciado”.
Escolhendo as palavras do seu discurso o escrevente assume uma
posição ativa no campo do objeto e do sentido, de acordo com Bakhtin (2011).
E, ainda conforme o autor (2011, p. 289), é por isso que
[...] cada enunciado se caracteriza, antes de tudo, por um determinado conteúdo semântico-objetal. A escolha dos meios linguísticos e dos gêneros de discurso é determinada, antes de tudo, pelas tarefas (pela ideia) do sujeito do discurso (ou autor) centradas no objeto e no sentido.
45
Mais adiante, no capítulo 7, as produções dos alunos serão analisadas
numa categoria geral, contemplando as três dimensões do gênero, na visão
bakhtiniana: construção composicional, conteúdo temático e estilo.
Posteriormente, os textos serão examinados por subcategorias transversais,
como intertextualidade na escrita, apropriação/consolidação da escrita, sinais
de pontuação e marcas de oralidade na escrita.
A análise em subcategorias justifica-se pelo fato de poder perceber a
criatividade do aluno ao escrever, quantos estudantes estão em processo mais
inicial e mais consolidado da escrita; o quanto se apropriaram das regras de
pontuação e o quanto a fala desses alunos aparece em suas escritas.
3 MAPEAMENTO DAS PRODUÇÕES NACIONAIS EM GÊNEROS TEXTUAIS
E SEQUÊNCIA DIDÁTICA
Ensinar é criar espaços para fazer valerem estes saberes silenciados para confrontá-los com os “conhecimentos” sistemáticos, mas nem sempre capazes de explicar os fatos.
João Wanderley Geraldi
Os gêneros textuais têm sido, em grande parte, fundamentadores do
ensino-aprendizagem da produção textual que figura nas instituições de ensino,
bem como têm merecido rodas de discussões em encontros de educação, o
que me leva a refletir: se a apropriação da escrita tem se firmado nos gêneros
de texto, muitas crianças deveriam estar menos resistentes às produções
escritas. Desta maneira, minha inquietação como professora que se depara
com alguns alunos com dificuldade em produzir textos coesos e coerentes
suscitou um desejo de conhecer de perto essas formas de resistência à
produção escrita e, assim, poder constatar ou não a eficácia dos gêneros
textuais na construção do arcabouço da escrita dos estudantes sujeitos da
pesquisa.
Pretendendo investigar o que há de produções referentes aos temas
gêneros textuais e sequências didáticas em âmbito nacional, é que me propus
46
a este tipo de investigação que denominamos Estado do Conhecimento, por
meio do qual poderei obter respostas para meus questionamentos.
A referida pesquisa é assim denominada, pois, segundo Therrien e
Therrien (2004, p. 8), ela tem por objetivo “[...] mapear e discutir uma certa
produção acadêmica em determinado campo do conhecimento”, o que
observamos como um valioso recurso que permitiu coletar dados fundamentais
para o presente trabalho, buscando o que se tem produzido no Brasil nos já
mencionados temas.
Apesar de essa pesquisa ter sido realizada tendo o gênero fábula como
alicerce, esse descritor não foi incluído nas buscas pelo fato de que este
levantamento foi feito antes de os professores sujeitos da pesquisa terem se
decidido por ele. Antes de entrevistá-los, a certeza que havia era a de trabalhar
com gêneros textuais organizados em sequências didáticas.
As pesquisas apontadas no estado do conhecimento contribuíram para
essa dissertação na medida em que mostraram a importância dos gêneros
textuais para o ensino da escrita com o respaldo das sequências didáticas.
3.1 O ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas: pesquisa feita
no decênio 2002-2011
Nesta investigação, utilizei o Banco de Teses e Dissertações da
CAPES 4 , no período de 2002 a 2011, Cadernos Cedes, Cadernos de
Pesquisas da Fundação Carlos Chagas e artigos de periódicos publicados nas:
Revista Brasileira de Educação, Educação e Sociedade5 e INEP6, no decênio
de 2003 a 2012.
Em conformidade com Therrien e Therrien (2004, p.8), a pesquisa
estado do conhecimento se faz “utilizando predominantemente fontes de
consulta disponíveis em forma de resumos ou catálogos de fontes”, portanto,
ainda de acordo com os autores, o estado do conhecimento é associado a uma
“metodologia de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e
científica sobre o tema que busca investigar”.
4 Disponível em <http://capesdw.capes.gov.br/capesdw >. Acesso em 12 fev. 2013.
5 Disponível em <http://www.scielo.org/php/index/php >. Acesso em 22 fev. 2013.
6 Disponível em <http://portal.inep.gov.br >. Acesso em 20 fev. 2013.
47
Ferreira (2013, p.1) cientifica que as pesquisas estado da arte são
definidas como de caráter bibliográfico.
Elas parecem trazer em comum o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes campos do conhecimento, tentando responder que aspectos e dimensões vêm sendo destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado, publicações em periódicos e comunicações em anais de congressos e de seminários.
Desta forma, o que diferencia estado do conhecimento do estado da arte
é a quantidade de fontes consultadas na elaboração da pesquisa.
Comumente, vemos professores utilizando variados textos em sala de
aula, mas sem que haja um objetivo que o norteie, como o de efetivamente
auxiliar seu aluno a apropriar-se da escrita. Por vezes escolarizam poesias,
não percebendo a riqueza que têm em mãos, passando uma lista interminável
de questões relativas à interpretação do texto, quando poderiam explorar sua
musicalidade e seu lado lúdico para ensinar a escrever.
Sem dúvidas, há muitos textos circulando nas salas de aula, todavia,
pouco explorados. De acordo com Santos (2007, p. 30), é preciso trabalhar
com a diversidade de textos em sala, mas, sobretudo, abordar os gêneros
textuais no que eles têm de específico e em suas características, o que os
distingue uns dos outros.
Dentre as pesquisas publicadas no site da CAPES, na área de
Linguística, que abordam o ensino de gêneros textuais por meio de sequências
didáticas, destaco a pesquisa de Maria Angélica Cardoso “Leitura de diferentes
linguagens em suporte de texto não-escolar: o gênero embalagem de produtos
alimentícios na atividade pedagógica”(2005), cujo objetivo era descrever e
analisar uma intervenção pedagógica na instituição escolar, partindo de textos
não-escolares, mas que estão presentes no contexto sócio-histórico-cultural de
alunos do ensino fundamental. A pesquisa de Cardoso (2005) deu-se com
crianças da 3ª série do Ensino Fundamental de uma escola pública do
município de Tubarão, em Santa Catarina. A metodologia utilizada foi o estudo
de caso e, quanto ao referencial teórico, embasou-se nos princípios
relacionados ao gênero textual, ao letramento, nos pressupostos da Proposta
48
Curricular de Santa Catarina (1998), em Bronckart (1999/2004), em Dolz e
Schneuwly (1999/2004), em Maingueneau (2002), dentre outros autores que
abordam o trabalho com gêneros textuais.
Os resultados apontaram que as embalagens podem ser utilizadas como
suportes ou portadores de textos, todavia, precisam ser estudadas pelos
professores antes de serem trabalhadas com os alunos, pois esses fazem
diferentes leituras delas, conforme o uso que é feito delas.
A autora (2005, p.45) assinala que o trabalho com produção escrita, na
escola formal adota, ainda hoje, na grande maioria, o conceito de escrita como
representação gráfica da língua, enfatizando o trabalho com alfabetização,
desprezando os aspectos sociais do letramento. Este ensino centrado no
código “tem conduzido o ensino da produção textual a explorar
predominantemente atividades soltas, descontextualizadas do uso, enfatizando
os usos corretos da regência, ortografia, concordância”. Ela reitera (2005, p.
46) que
[...] a ação pedagógica com vistas ao ensino da produção textual deveria centrar-se em um projeto prévio, no qual o ensino é programado de forma a “fazer sentido” para o aluno, ou seja, uma proposta que o permita a apropriação de uma prática linguística ainda não dominada por ele.
Esse ensino pode ser mediado pelas sequências didáticas, pois, como
afirmam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 96),
Criar contextos de produção precisos, efetuar atividades ou exercícios múltiplos e variados: é isso que permitirá aos alunos apropriarem-se das noções, das técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento de suas capacidades de expressão oral e escrita, em situações de comunicação diversas.
A dissertação de Mestrado na área de Educação de Severina Érika
Morais Silva Guerra tem por título “Produção coletiva de carta de reclamações:
interação professoras/alunos” e a pesquisa analisou a interação entre
estudantes e entre estudantes e professoras em situação de produção coletiva
de textos. Participaram do estudo duas professoras e seus respectivos alunos
da 3ª série do Ensino Fundamental da Rede Municipal da cidade de Recife,
que desenvolveram uma sequência didática com o gênero discursivo carta de
reclamação. A metodologia foi um estudo de caso coletivo. O estudo
49
fundamentou-se na teoria dos gêneros discursivos de Bakhtin e na perspectiva
sociointeracionista de Schneuwly.
A pesquisadora percebeu que os conhecimentos sobre o gênero carta
de reclamação foram ativados durante a elaboração do texto e concluiu, assim,
que a produção coletiva de textos è excelente ferramenta didática, já que
possibilitou que os modos de funcionamento próprios de escritores experientes,
os professores, fossem compartilhados com os menos experientes, os alunos.
Quanto ao trabalho com os gêneros textuais, Guerra (2009, p. 50)
ressalta que
A partir desse trabalho sistemático com os gêneros em sala de aula, os alunos são levados a refletir sobre as diferentes dimensões da nossa língua, ao longo da escolaridade, trabalhando com gêneros que tenham semelhança entre si e com gêneros divergentes, deparando-se, assim, com os diferentes graus de complexidade desses gêneros.
Guerra (2009, p. 53) aponta que, mesmo nas produções individuais, há a
interação entre professores e alunos, pois quando o professor auxilia na
reelaboração de um pensamento ou na revisão de um texto são momentos
determinantes da escrita dos alunos e que fazem com que eles desenvolvam
novas habilidades e conhecimentos.
A tese de doutorado na área de Educação de Alessandra Marques da
Cunha, cujo título é “Produção textual: o que dizem e escrevem educandos do
3º ano sobre o gênero fábula”, tem como objetivo verificar e analisar o que
escreviam e diziam os alunos dessa fase escolar sobre a produção escrita e o
gênero fábula, que conhecimentos adquiriram na escrita e na oralidade a partir
de mediações e diálogos entre professora, alunos e pesquisadora. A pesquisa
utilizou a metodologia colaborativo-dialógica e fundamentou-se nos estudos e
trabalhos de Bakhtin, Vygotsky, Dolz e Schneuwly, Pasquier e Bronckart.
Segundo Cunha (2010), o que orientou o estudo foram a linguagem, a
oralidade, a leitura, a escrita, o gênero e a sequência didática. Sobre os
gêneros textuais e o ensino por meio de sequências didáticas, Cunha (2010, p.
42) tem a dizer que
As intervenções sociais, a ação recíproca dos membros do grupo e, em particular, as intervenções formalizadas nas instituições escolares são fundamentais para a organização das aprendizagens em geral e para o
50
processo de apropriação de gêneros em particular. Nesse sentido, as sequências didáticas são instrumentos que podem guiar as intervenções do educador.
Os resultados demonstraram que os estudantes, ao final do processo, se
apropriaram das características do gênero fábula tanto na oralidade quanto na
escrita. A pesquisadora deduziu, assim, que o trabalho desenvolvido com a
produção textual, com foco nos gêneros textuais e organizado em sequência
didática, respaldou a aprendizagem dos alunos.
A tese de doutorado em Educação de Stella de Lourdes Garcia,
intitulada “Os gêneros do discurso e a prática da produção textual: dialogando
sobre os conhecimentos necessários aos educadores dos anos iniciais do
ensino fundamental”, mostra uma pesquisa realizada durante um curso de
formação continuada realizado junto a professoras e estudantes de uma escola
da rede municipal de ensino da cidade de São Carlos-SP que integra o Projeto
“Comunidades de Aprendizagem: aposta na qualidade da aprendizagem, na
igualdade de diferenças e na democratização da gestão da escola”. Teóricos
como Freire, Bakhtin, Dolz, Noverraz e Schneuwly embasaram o estudo. Com
relação aos conhecimentos construídos durante a realização do curso de
formação, a autora acredita que as reflexões proporcionadas pela dinâmica
colaborativa dialógica possam ter contribuído para uma alteração nas práticas
das educadoras envolvidas.
Pode-se afirmar, então, que o trabalho com a sequência didática para o
ensino de um gênero escrito configurou-se como instrumental tanto para as
educadoras, quanto para os educandos, conforme pontua Garcia (2010, p. 6),
Para as educadoras [...] proporcionou orientações metodológicas para o ensino sistematizado de um gênero do Discurso escrito, contribuindo para a construção de uma base de conhecimento para o ensino; e para os educandos, pois permitiu a segurança na escrita uma vez que puderam apreender e vivenciar os conhecimentos e os procedimentos que envolvem a prática da produção textual, se considerando as características do gênero e a situação interlocutiva.
Assim, a autora (2010, p. 53) conclui que o uso das sequências didáticas
possibilita a avaliação formativa e regula o processo de ensino-aprendizagem e
nota-se, também, que o aluno fica mais motivado em suas produções escritas
ou oralizadas uma vez que, desde o início, parte-se do pressuposto de que as
51
atividades realizam-se em um contexto de interação entre quem escreve e
quem lê e também a diversificação de atividades contribui para a maximização
das aprendizagens, respondendo às exigências atuais da diferenciação do
ensino.
A pesquisa de Fabiana Vieira Nunes teve como motivação principal
buscar meios mais eficazes de se trabalhar com a produção de textos em sala
de aula. Bakhtin (1996), Van Dijk (2008), Marcuschi (2007), dentre outros
autores que abordam o ensino de gêneros textuais embasaram a pesquisa.
Nunes (2010) considera o estudo de gêneros textuais uma forma, por
excelência, de permitir aos alunos a conscientização de todos os processos
interacionais que envolvem a produção, distribuição e consumo de textos.
Trata-se de uma dissertação de Mestrado na área de Linguística, realizada em
2010 e cujo título é “Gêneros textuais no ensino: uma experiência por projeto”.
A pesquisadora procurou mostrar os resultados do trabalho realizado a
partir da aplicação do projeto desenvolvido numa escola da rede pública do
Distrito Federal, que previa atividades de análise e produção de gêneros
textuais.
Nunes (2010) expôs aos estudantes os gêneros textuais bilhete, piada,
instruções, receitas culinárias, classificados poéticos e propaganda. O projeto
foi trabalhado por meio de sequências didáticas fundamentadas em Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004) o que, segundo a autora (p. 72), proporciona ao
aluno “procedimentos em que ele possa produzir textos de acordo com o
gênero estudado a partir de tarefas feitas em etapas, de modo que as
dificuldades na produção sejam trabalhadas progressivamente”.
E ainda salienta Nunes (2010, p. 72), que
A proposta parte do pressuposto de que é possível e desejável o ensino de gêneros textuais, tanto orais como escritos, e que isso pode acontecer de forma ordenada. A ideia central da proposta é que situações reais de produção, distribuição e consumo de textos sejam criadas para permitir aos alunos perceberem, em situação concreta de uso, o processo de relação entre produtores e receptores.
O trabalho com gêneros textuais contribui para a construção do saber e
é preciso, sempre, refletir sobre esse procedimento, avaliando os resultados,
buscando o que é melhor e mais eficaz para o aprendizado dos alunos.
52
Cláudia Starling Bosco desenvolveu, no ano de 2010, a dissertação de
Mestrado em Educação intitulada “Práticas de escrita de crianças do primeiro
ciclo de alfabetização em situações reguladas pela professora e pelo grupo”. O
estudo teve como foco as práticas de escrita de gêneros textuais de crianças
de duas turmas do 1º ciclo de alfabetização de uma escola municipal de Belo
Horizonte - MG, em situações reguladas pelas professoras e pelo próprio grupo
de crianças.
A metodologia utilizada na pesquisa foi a perspectiva etnográfica e
observação participante, com registro no diário de campo. Quanto ao
referencial teórico, esse se embasou no conceito de discurso de Bakhtin
(2003); de gêneros textuais em Rojo (2001), Bazerman (2005), Dolz e
Schneuwly (2004) e Marcuschi (2007), além de Ferreiro (1986), Soares (1998),
Costa Val (1991) e Geraldi (2002), sobre a construção da escrita, alfabetização,
letramento e ensino da escrita.
Teve como objetivos investigar como os gêneros textuais se organizam,
se constituem e circulam no contexto escolar, bem como reconhecer o que as
crianças já sabiam sobre os gêneros textuais e refletir sobre o que as crianças
pensavam sobre a escrita dentro e fora da escola.
Bosco (2010, p. 142) pontua que, nessa pesquisa, a concepção de
escrita estava vinculada a uma compreensão dialógica de linguagem e o texto
era entendido como um produto cultural. Portanto, em conformidade com a
pesquisadora (2010, p. 142),
A linguagem não é [...] apenas uma ferramenta que deve ser ensinada pelas professoras para o domínio da escrita. Parto da premissa de que a linguagem está a serviço dos interlocutores que a utilizam em diferentes situações comunicacionais e pode se concretizar em diferentes gêneros textuais.
A autora (2010, p. 148) explicou que as crianças identificaram, em
entrevistas, quais eram os gêneros textuais com os quais elas tinham mais
contato em casa, já que a escola dava maior enfoque às poesias, rimas e
histórias. Foram citados diversos gêneros textuais que, segundo elas, tinham
contato e reconheciam em seu cotidiano, tais como cartas, cartão de
aniversário, textos relacionados à catequese, desenhos e produções textuais
quando brincavam de escola.
53
Para Bosco (2010, p. 148) “as crianças demonstraram [...] que utilizavam
a escrita de diversos gêneros textuais no ambiente familiar, ao contrário do que
foi observado nas atividades reguladas pelas professoras”. Segundo a autora,
os resultados da pesquisa possuem implicações diretas com relação à
necessidade de se repensar o ensino da escrita, vinculando-o a uma
perspectiva dos gêneros textuais e possibilitam melhor compreensão do uso da
escrita pelas crianças em processo de alfabetização.
O critério para a escolha desses trabalhos apresentados foi o fato de os
pesquisadores abordarem o ensino da escrita, utilizando para isso os gêneros
textuais e as sequências didáticas, além de terem sido desenvolvidos com
alunos de 3º ano.
3.2 A elaboração do estado do conhecimento
Objetivando mapear os documentos já publicados no Brasil,
relacionados ao ensino dos gêneros textuais e sequências didáticas, valho-me
da pesquisa do tipo qualitativa/quantitativa que, de acordo com Flick (2004, p.
272), são métodos unidos de diversas maneiras no plano de um estudo, sendo
que os “[...] quantitativos são, em qualquer caso, apenas ‘atalhos econômicos
de pesquisa do processo de geração de dados’”, ao passo que somente os
qualitativos fornecem explicações científicas efetivas dos fatos estudados.
Assim, o teórico (p. 273) afirma que os métodos qualitativos podem
muito bem viver sem o posterior emprego dos quantitativos, porém estes
necessitam dos qualitativos para explicar as relações encontradas.
Na perspectiva de Bogdan e Biklen (1994, p. 47-51), a pesquisa
qualitativa envolve a obtenção de dados descritivos, que foram obtidos de
forma direta do investigador com a situação que investiga. Desta forma, ele dá
maior ênfase ao processo que ao resultado dessa pesquisa, preocupando-se
em descrever a representatividade dos participantes.
No decorrer do capítulo tentarei responder a questões como: qual a
ocorrência de trabalhos que abordam o ensino de gêneros textuais por meio de
sequências didáticas? Qual o volume de produções neste tema no decênio
2002-2011? Que áreas do conhecimento exploram o referido tema?
Interrogações estas que me levaram a desenvolver o presente capítulo.
54
Os dados foram coletados depois de lidos os resumos de teses e
dissertações da CAPES, no decênio de 2002 a 2011 e trabalhos publicados
nas revistas eletrônicas: Revista Brasileira de Educação, Revista Educação e
Sociedade, Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos INEP, nos Cadernos de
Pesquisa da Fundação Carlos Chagas e nos Cadernos CEDES, entre 2003 e
2012, usando os descritores “gêneros textuais; gêneros textuais e sequência
didática”, selecionando apenas os estudos que abrangem até o 3º ano do
Ensino Fundamental de nove anos.
A pesquisa Estado do Conhecimento identifica os trabalhos acadêmicos
realizados sobre determinado tema que venham a contribuir com outras
pesquisas. Assim sendo, os dados foram coletados nos sites anteriormente
mencionados, num estudo quantitativo7.
Iniciei a compilação pelas teses e dissertações da CAPES, selecionando
por áreas como Educação, Linguística e Linguística Aplicada e Letras, fazendo
um recorte posterior dos trabalhos produzidos de interesse de meu foco de
estudo. Depois disso, continuei a busca nos demais sites relatados. Para as
buscas foram adotados descritores, quais sejam: gêneros textuais e gêneros
textuais e sequências didáticas. Assim, ao se colocar o descritor gêneros
textuais, encontrei vinte e dois trabalhos. Posteriormente, adicionando o
descritor gêneros textuais e sequência didática, obtive um resultado de nove
produções.
3.3 A abordagem dos temas gêneros textuais e sequências didáticas nos
periódicos e banco de teses e dissertações da CAPES
No Banco de Teses e Dissertações da CAPES, usando os descritores
gêneros textuais e gêneros textuais e sequência didática, nos níveis de
mestrado e doutorado no período de 2002 a 2011, analisei os dados coletados
selecionando as produções por áreas que abordavam a temática dos gêneros.
As produções encontradas nestes níveis, com o descritor gêneros
textuais, perfazem um total de 20, sendo 12 trabalhos na área da Educação
7 Os dados sobre teses e dissertações da CAPES, com o descritor gêneros textuais, entre 2005
e 2009, foram obtidos por intermédio da pesquisadora Márcia Ormonde Portela Santos (2011).
55
(alfabetização e letramento), 6 na área de Linguística e Linguística Aplicada e 2
na área de Letras, como demonstrado no quadro seguinte.
Quadro 9 - Volume de produções encontradas em teses e dissertações da
CAPES – Descritor: Gêneros textuais
Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada
Letras Total
2002 1 1 1 3
2003 - - - -
2004 1 - - 1
2005 2 2 - 4
2006 1 - - 1
2007 1 - - 1
2008 - 1 - 1
2009 - 1 - 1
2010 4 1 - 5
2011 2 - 1 3
Total 12 6 2 20 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados por Santos e Silva.
Os trabalhos coletados no banco de teses e dissertações da CAPES
usando o descritor “gênero textual” e “sequência didática”, entre os anos de
2002 e 2011, foram apenas 5 na área de Educação, 1 na área de Linguística e
Linguística Aplicada e 3 na área de Letras, portanto, um total de 9 produções.
Quadro 10- Produções de teses e dissertações com os descritores “gênero
textual” e “sequência didática”
Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada
Letras Total
2002 - - - -
2003 - - - -
2004 - - 1 1
56
2005 - - 1 1
2006 1 - - 1
2007 - 1 - 1
2008 - - - -
2009 1 - - 1
2010 3 - - 3
2011 - - 1 1
Total 5 1 3 9 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
As produções coletadas no site da CAPES somente no nível de
mestrado, com o descritor “gêneros textuais” foram, dentro do decênio já
mencionado, onze na área de Educação, seis em Linguística e Linguística
Aplicada e apenas um na área de Letras, perfazendo um total de dezoito
produções.
Quadro 11 - Produções de dissertações com o descritor “gêneros textuais”
Ano Educação Linguística e Linguística
Aplicada
Letras Total
2002 1 1 1 3
2003 - - - -
2004 1 - - 1
2005 2 2 - 4
2006 1 - - 1
2007 1 - - 1
2008 - 1 - 1
2009 - 1 - 1
2010 3 1 - 4
2011 2 - - 2
Total 11 6 1 18 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
Foram referenciadas, ainda no site da CAPES, em nível de mestrado,
com os descritores gêneros textuais e sequência didática, três produções na
área de Educação, um em Linguística e Linguística Aplicada e um em Letras,
totalizando cinco dissertações.
Quadro 12 – Produções de dissertações com os descritores “gêneros textuais”
e “sequência didática”
Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada
Letras Total
2002 - - - -
57
2003 - - - -
2004 - - 1 1
2005 - - - -
2006 1 - - 1
2007 - - - -
2008 - - - -
2009 1 - - 1
2010 1 - - 1
2011 - 1 - 1
TOTAL 3 1 1 5
FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
Entre as teses de doutorado coletadas no referido site, com o descritor
“gêneros textuais”, foram coletadas duas produções, sendo uma na área de
Educação e uma na área de Linguística e Linguística Aplicada.
Quadro 13 - Volume de teses com o descritor “gêneros textuais”
Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada
Letras Total
2002 - - - -
2003 - - - -
2004 - - - -
2005 - - - -
2006 - - - -
2007 - - - -
2008 - - - -
2009 - - - -
2010 1 1 - 2
2011 - - - -
TOTAL 1 1 - 2
FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
Esse descritor aparece a partir de 2010, comprovando a importância que
estudos acadêmicos, em nível de doutorado, têm devotado aos gêneros
textuais para o ensino da leitura e da escrita.
Os gêneros textuais, embora já estejam contemplados nos PCNs, só de
modo recente é que têm sido mais veementemente tematizados em
publicações e nos cursos de formação de professores.
Utilizando os descritores gêneros textuais e sequência didática, foram
pesquisadas, em nível de doutorado, quatro produções: duas na área de
Educação, uma na de Linguística e Linguística Aplicada e uma na de Letras.
58
Quadro 14 - Volume de teses com os descritores “gêneros textuais” e
“sequência didática”
Ano Educação Linguística e Linguística Aplicada
Letras Total
2002 - - - -
2003 - - - -
2004 - - - -
2005 - - 1 1
2006 - - - -
2007 - 1 - 1
2008 - - - -
2009 - - - -
2010 2 - - 2
2011 - - - -
TOTAL 2 1 1 4 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
Com fundamentação nos descritores “gêneros textuais” e “gêneros
textuais e sequência didática”, foi efetivada uma busca no site Scielo, que
agrega revistas eletrônicas com seus respectivos artigos, sendo possível notar
que há poucas produções relacionadas às temáticas citadas.
Os dados coletados foram os textos publicados no decênio de 2003 a
2012, em várias revistas eletrônicas como Revista Educação e Sociedade,
Revista INEP (RBEP e Em Aberto), Cadernos de Pesquisa da Fundação Carlos
Chagas, Cadernos Cedes e Revista Brasileira de Educação.
Quadro 15 - Artigos encontrados e seus respectivos periódicos
Ano Quantidade de artigos encontrados
Fonte
2003 - -
2004 - -
2005 1 INEP/ RBEP
2006 - -
2007 - -
59
2008 - -
2009 - -
2010 - -
2011 1 Rev. Bras. Educação
2012 - -
TOTAL 2 - FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
Embora a coleta tenha sido feita com base nos descritores gêneros
textuais e gêneros textuais e sequência didática, os dois artigos apresentados
foram coletados sob o tema gênero textual e, apenas um em 2005 e outro em
2011.
O fato é que, segundo Marcushi (2010, p. 38), “o trabalho com gêneros
textuais é uma extraordinária oportunidade de lidar com a língua em seus mais
diversos usos autênticos no dia a dia”. E ensiná-los, ainda conforme Marcushi
(2010, p. 38), “é levar os alunos a produzirem ou analisarem eventos
linguísticos os mais diversos”, pois, além de instruir, eles permitem a prática da
produção de textos.
Com relação ao ensino dos gêneros textuais, também Dolz e Schneuwly
(2004, p. 53) afirmam que as estratégias de ensino supõem a busca de
intervenções na escola que facilitem o entendimento, por parte dos alunos, dos
gêneros textuais. Asseveram, ainda (2004, p.53), que essas intervenções são
primordiais para a aprendizagem e apropriação dos gêneros. E é nesse sentido
que as sequências didáticas podem auxiliar o professor na sua prática de
ensino.
A pesquisa do tipo estado do conhecimento permite-nos conhecer
melhor o objeto investigado. Assim, foi possível verificar o que se tem
produzido no país com os temas gênero textual e gênero textual e sequência
didática, nas áreas de mestrado, doutorado e dentre os periódicos publicados
em sites de revistas eletrônicas. Não se trata de um trabalho estanque, embora
os dados levantados e analisados sejam parciais e nem todas as fontes de
publicações brasileiras tenham sido observadas. Todavia, é um estudo que me
serviu de norte para compreender meu objeto de pesquisa.
Desta forma, ao todo foram obtidos trinta e um trabalhos, entre teses,
dissertações e artigos de periódicos. Destes, vinte e dois com os descritores
gêneros textuais e nove com gêneros textuais e sequência didática. Entre as
teses foram apurados dois trabalhos em gêneros textuais e quatro em gêneros
60
textuais e sequência didática. Entre as dissertações, foram observadas dezoito
produções em gêneros textuais e cinco em gêneros textuais e sequência
didática e mais duas produções em periódicos, lembrando que nestes, as
quantidades de artigos publicados são ínfimas, se comparadas às teses e
dissertações encontradas na área do ensino de gêneros textuais.
Quadro 16 – Volume de teses e dissertações publicadas pela CAPES e artigos
em periódicos
Descritor Dissertações Teses Periódicos Total
Gêneros textuais
18 2 2 22
Gêneros textuais e sequência didática
5 4 9
TOTAL 23 6 2 31 FONTE: Elaborado a partir dos dados coletados.
As produções aqui relacionadas limitaram-se ao foco de minha pesquisa,
isto é, trabalhos realizados com crianças das séries iniciais, até o 3º ano do
Ensino Fundamental de nove anos.
Em geral, a metodologia utilizada nas referidas pesquisas é a qualitativa,
cuja coleta de dados se dá a partir de entrevistas, observações, análises de
documentos e questionários, dentre outros.
Muitos trabalhos, embora nem todos aqui relacionados, expressam a
importância que se tem atribuído ao ensino fundamentado na realidade da
criança, para que essa venha de fato a compreender como agir numa
sociedade letrada como a nossa, em seu meio e com seus pares.
Em vista disso, o estado do conhecimento amplia nossos olhares para o
que se tem pesquisado em diversas áreas do conhecimento: o que se tem
discutido nas academias e mesas redondas que debatem sobre educação, o
que se tem ensinado nas escolas, como nossos estudantes têm respondido
aos métodos de ensino e, sobretudo, se estão realmente aprendendo. Enfim, o
estudo estado do conhecimento traz luz ao nosso próprio objeto de pesquisa.
Por meio desse levantamento pude compreender melhor meu objeto de
pesquisa. Foi lendo os trabalhos publicados que entendi a importância dos
61
gêneros textuais para o ensino da escrita e, assim, pude decidir por que
caminhos seguiria minha pesquisa.
O ensino de gêneros textuais fundamentado nas sequências didáticas,
na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), apontados nos trabalhos
pesquisados, mostrou ser esse um meio eficaz para o domínio de
determinados gêneros de textos, podendo o professor atingir seu objetivo de
ensino da linguagem aos seus alunos, pois, de acordo com os autores (2004,
p.100),
[...] as sequências didáticas devem ser realizadas no âmbito de um projeto de classe, elaborado durante a apresentação da situação, pois este torna as atividades de aprendizagem significativas e pertinentes.
Portanto, trabalhar com sequências didáticas na sala de aula não se
trata de encontrar uma solução para todos os problemas de aprendizagem de
nossos alunos, mas será um bom auxiliador desse aprendizado.
62
4 PONDERAÇÕES SOBRE OS GÊNEROS DISCURSIVOS E AS
SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS
Os diferentes gêneros discursivos pressupõem diferentes diretrizes de objetivos, projetos de discurso dos falantes ou escreventes. O empenho em tornar inteligível a sua fala é apenas o momento abstrato do projeto concreto e pleno de discurso do falante
Mikhail Mikhailovitch Bakhtin
Neste capítulo discuto os gêneros discursivos e as sequências didáticas
na visão dos principais autores que abordam esses assuntos, dentre eles
destaco Bakhtin (2011), para quem os gêneros discursivos são tipos de
enunciados elaborados pela língua, que o faz de acordo com suas
necessidades comunicacionais, o que explica a diversidade de gêneros, pois a
atividade humana também é multiforme, na concepção desse teórico. Assim, a
situação de comunicação mediante a qual um falante se vê envolvido é
determinante na escolha do gênero a ser utilizado.
Zayas (2012) relata que o texto, como gênero discursivo, é
fundamentado sobre dois pontos de vista. Um deles é como uma prática
discursiva própria advinda de certa esfera da atividade social. O outro é como
uma construção verbal que reflete o tipo de troca discursiva que se quer
efetivar.
Marcuschi (2010) caracteriza os gêneros textuais como eventos
maleáveis, dinâmicos e plásticos, uma vez que surgem à medida que
necessitamos interagir em situações socioculturais. Também são considerados
fenômenos históricos, pois, se compararmos o número de gêneros de textos
existentes hoje às sociedades de antes do surgimento da comunicação escrita,
notaremos que houve um aumento na quantidade desses.
O autor (2010) fala sobre a transformação do gênero em novos gêneros,
embora esses novos não sejam inovações absolutas, mas assimilações de um
63
por outro gênero, gerando um novo, como no caso do e-mail, que tem como
precedentes as cartas e bilhetes.
Dubeux e Silva (Brasil, 2012) citam, também, a carta e os diários como
precursores do e-mail e do blog, respectivamente, explicando que as
mudanças sociais é que transformam certos gêneros em outros novos.
As sequências didáticas (DOLZ, NOVERRAZ E SCHNEUWLY, 2004)
auxiliam o estudante no domínio dos gêneros textuais abordados em sala de
aula, pois se trata de um conjunto de atividades escolares elaboradas e
aplicadas de forma sistemática pelo professor que fará com que o aluno se
aproprie do conhecimento em torno desse gênero.
A sequência didática, segundo os autores (2004), tem movimento do
complexo para o simples. Ela parte da apresentação da situação, que é a
exposição do gênero que o professor deseja ensinar aos alunos numa
explanação que seja bastante clara para os mesmos. A seguir, vem a primeira
produção, na qual o estudante mostrará o que compreendeu e o que já sabia
com relação ao gênero abordado. Depois dessa produção, ocorrem os
módulos, que são constituídos de atividades que tentarão sanar os problemas
detectados pelo professor na produção inicial. Após passar pelos módulos, o
aluno fará a avaliação ou a produção final, na qual demonstrará o que
apreendeu nos módulos.
Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 98), a estrutura de base
de uma sequência didática é assim representada.
Figura 1 – Esquema da sequência didática
Fonte: Dolz, Noverraz e Schneuwly, 2004, p. 98
64
Produzir textos implica um destinatário, isto é, o aluno precisa de um
motivo para escrever e essa escrita deverá ser endereçada a alguém. Quanto a
isso, Cardoso (2008) informa que para escrever, o estudante necessita prever
um destinatário e o efeito que sua escrita terá sobre ele. Para isso, o educando
deve lançar mão dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e já
apropriados por ele.
4.1 Os gêneros do discurso nas perspectivas de Bakhtin e outros autores
Em consonância com Bakhtin (2011, p.261), o uso da língua se dá por
meio de enunciados orais e escritos e esses expõem as condições e objetivos
de cada campo por intermédio da seleção dos recursos lexicais, fraseológicos
e gramaticais da língua e, principalmente, por sua construção composicional, o
que equivale dizer que as ações sócio-comunicativas determinam o enunciado,
o que significa que, numa perspectiva bakhtiniana, a linguagem é constituída
na interação verbal de sujeitos com o fenômeno social.
Evidentemente, cada enunciado particular é individual, mas cada campo de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, os quais denominamos gêneros do discurso (BAKHTIN, 2011, p.262).
De acordo com Bakhtin (2011, p. 262), os gêneros do discurso são tipos
de enunciados elaborados por cada campo de utilização da língua. Ainda
segundo o autor, a diversidade de gêneros é grande, pois a atividade humana
é multímoda, isto é, se apresenta de muitas formas. Os gêneros discursivos
são “correias de transmissão entre a história da sociedade e a história da
linguagem” (2011, p.268).
Os gêneros do discurso, na visão bakhtiniana, são primários e
secundários (simples e complexos). Os primeiros, tipos de diálogos orais, se
presentificam nas conversas de salão, em círculos de amigos, no cotidiano
familiar, sociopolítico e outros, enquanto que os segundos são os literários,
científicos ou publicísticos, enfim, são predominantemente escritos. Todavia,
65
um gênero poderá integrar outro, como uma carta, que pertencente ao gênero
primário, pode fazer parte de um romance, que é secundário.
Ao falarmos, escolhemos um gênero de discurso, escolha essa que é
feita de acordo com a situação comunicacional na qual estamos inseridos, ou
seja, a seleção se dá por considerações temáticas, pela situação da
comunicação discursiva, ou pela composição pessoal de cada participante.
Bakhtin (2011, p.283) assevera, ainda, que se nós não dominássemos os
gêneros discursivos, se eles não existissem, ou se precisássemos criá-los, pela
primeira vez, a cada condição de comunicação, esta seria quase impossível.
Desta forma, falar é construir enunciados, visto que falamos por
enunciados e não de maneira descontextualizada ou por frases, orações ou
palavras desconexas e isoladas. Então, são os gêneros do discurso os
responsáveis por estabelecerem comunicação, organizando nosso discurso,
bem como as formas sintáticas, em enunciados inteligíveis.
Entender o enunciado como “unidade real da comunicação discursiva”
(BAKHTIN, 2011, p. 269), possibilita-nos compreender de maneira mais
acertada a natureza das unidades da língua, as orações e as palavras,
enquanto sistema. A língua integra a vida pelos enunciados e é através dos
enunciados que a vida entra na língua, isso equivale a dizer que é no
enunciado que a língua nacional se materializa individualmente. E, ainda
conforme Bakhtin (2006, p.93), “[...] o locutor serve-se da língua para suas
necessidades enunciativas concretas (para o locutor, a construção da língua
está orientada no sentido da enunciação da fala)”.
Cada situação de comunicação determina o gênero discursivo a ser
utilizado. Todo enunciado é individual e, por isso reflete a individualidade do
falante ou do escritor, daí a dizer-se que o enunciado tem estilo individual.
O homem necessita da língua para expressar-se e a língua necessita de
um falante e do objeto da fala para a comunicação. A autoria do enunciado
não começa ou termina no locutor. O autor não tem domínio sobre o que seu
interlocutor vai entender do seu discurso, assim, todo enunciado é uma
resposta àquilo que o locutor presume. Bakhtin (2011, p. 271) nos assegura
que seu interlocutor tem uma posição responsiva ativa, no momento que
compreende o significado do discurso, ou seja, ele pode concordar ou
discordar dele; pode completá-lo, aplicá-lo ou prepará-lo para utilizar em seu
66
favor. Assevera-nos o teórico (2006, p. 95), que “Todo ato de compreensão é
uma resposta, na medida em que ele introduz o objeto da compreensão num
novo contexto – o contexto potencial da resposta”. O importante é que essa
posição responsiva do ouvinte vai se constituindo durante o processo de
audição e compreensão do enunciado e, algumas vezes, a partir da primeira
palavra proferida pelo falante.
Portanto, o enunciado é prenhe de expressividade e todo discurso tem
um valor emocional, visto que as palavras não são vazias, elas estão
compostas de expressões, ao que Bakhtin (2011, p. 298) chama de entonação
expressiva, isto é, “A expressão do enunciado, em maior ou menor grau,
responde, ou seja, exprime a relação do falante com os enunciados do outro, e
não só a relação com os objetos do seu enunciado”.
A entonação expressiva está presente no enunciado pedagógico, pois a
linguagem de ensino do professor inexiste fora do enunciado. Portanto, as
expressões de emoção, de juízo de valores ou outras, nascem da utilização no
enunciado concreto. Brait e Melo (2006, p. 67) compreendem a enunciação
como estando na fronteira entre a vida e o aspecto verbal do enunciado. É
como se ela, a enunciação, bombeasse energia de uma situação da vida para
o discurso verbal. Para Brait e Melo (2006, p.68), “O enunciado concreto [...]
nasce, vive e morre no processo da interação social entre os participantes da
enunciação”. É, portanto, a interação que define sua forma e significado.
Desta forma, ensinar, aprender e empregar a linguagem, neste caso, o
ensino da produção de textos, obrigatoriamente passam pelo aluno, sujeito da
interação verbal e que compõe os estilos do discurso. Para produzir seu texto
escrito, é necessário que ele conheça enunciados anteriores, pois, “Cada
enunciado é um elo na corrente complexamente organizada de outros
enunciados” (BAKHTIN, 2011, p. 272).
A perspectiva bakhtiniana sobre língua leva-nos a interessantes
reflexões sobre o modo como a compreendemos, como a conhecemos e que
concepção temos dela.
Os fatores que compõem o enunciado, que possibilitam a atitude
responsiva, a compreensão e acabamento são: 1 – o objeto do
sentido/discurso, o que dizer, qual tema escolher; 2 – o intuito, as intenções
67
discursivas do locutor, o querer dizer; 3 – as formas típicas de estruturação do
gênero do acabamento, a entonação expressiva, como dizer; 4 – a resposta
presumida do interlocutor. Para quem dizer? Como meu enunciado será
compreendido pelo outro? Como ele o receberá? Para quem eu escrevo?; 5 –
o contexto transverbal, que atravessa as interações verbais, extrapola a
relação específica da pesquisa, sendo necessário conhecer os atores da
pesquisa intimamente; 6 – a relação com os enunciados alheios. Dialogismo
interno: que outros textos compõem o meu, que outros discursos atravessam o
meu?
Pode-se notar, então, que conhecer estes fatores constituintes do
enunciado é importante para o ensino dos gêneros discursivos e,
consequentemente, da produção de textos na escola, uma vez que todo
enunciado é atravessado por um gênero do discurso. Neste processo de
aprendizagem da apropriação da escrita de textos, a língua que se internaliza
não é neutra, menos estática. Ela é a língua das relações sociais. Podemos
citar como neutralidade a palavra da língua, a dicionarizada, ela não tem autor,
não provém de ninguém. Opostamente, temos a palavra como enunciado, que
é viva e tem entonação expressiva; é a palavra da comunicação social.
Os gêneros discursivos, prenhes de palavras vivas, pois expressam uma
ideologia comunicativa, isto é, exprimem a intenção do locutor de emocionar,
informar, convencer, fazer rir, dentre outras, são categorizados de acordo com
essas funções. Porém, não é só isso que constitui um gênero discursivo. Suas
intenções dependem, também, do momento da produção e circulação, enfim,
das situações comunicativas.
De opinião semelhante, Zayas (2012, p. 66) afirma que
[...] cada texto, en cuanto género discursivo, ha de ser considerado según estos dos puntos de vista que no pueden separarse: como una práctica discursiva propia de una determinada esfera de actividad social y como una construcción verbal con unas características que reflejan el tipo de intercambio que se lleva a cabo.
Assim, ensinar a escrever é ensinar a apropriação das diversas formas
mediante as quais se efetua a comunicação escrita. Ainda segundo Zayas
(2012, p. 66), é preciso analisar as características de cada gênero ensinado,
68
pois isso ajudará a alcançar os objetivos do ensino-aprendizagem e a planejar
as atividades.
Para trabalhar a produção textual com crianças, faz-se necessário
ensiná-las sobre cada gênero textual abordado, sistematicamente, para que, ao
final, sejam elas hábeis produtoras de textos orais e escritos. Afinal, quando
falamos, escrevemos, lemos ou ouvimos algo, ativamos nossos conhecimentos
prévios sobre os gêneros, pois tivemos acesso a eles em nossas relações com
a linguagem. Todavia, convém lembrar-se de que o gênero discursivo “não é
uma forma da língua mas uma forma típica do enunciado; como tal forma, o
gênero inclui certa expressão típica a ele inerente. No gênero a palavra ganha
certa expressão típica” (BAKHTIN, 2011, p. 293).
Como dito anteriormente, as palavras da língua não são de ninguém,
mas nós as ouvimos transformadas em enunciados individuais, bem como
lemos essas palavras em textos individuais, possuindo uma expressividade
também individual, de acordo com o gênero ao qual pertencem. Por isso, a
utilização dessas palavras na comunicação verbal ativa é marcada pelo
individualismo e contexto. Para os que as dizem, as palavras possuem três
aspectos: o primeiro é a palavra neutra, a palavra da língua, que não pertence
a ninguém; o segundo, a palavra do outro, palavras que vêm de outros
enunciados; e o terceiro, a palavra minha, é a expressividade, o tom conferido
à palavra da língua e à palavra do outro. Para Bakhtin, na linguagem não existe
fronteiras, todo diálogo se constitui e passa a ter algum sentido a partir de um
outro, assim, o dialogismo e o enunciado estão sempre em interação. A língua
não pode ser compreendida a partir da consciência de um só condutor.
Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada enunciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados precedentes de um determinado campo (aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles, subentende-os como conhecidos, de certo modo os leva em conta. (BAKHTIN, 2011, p.297)
Neste sentido, ensinar os gêneros textuais para crianças, é levar em
conta, acima de tudo, que a linguagem se dá na interação delas com os outros.
É compreender que é por meio desta ação mútua que se dá o conhecimento e
69
atribui-se sentido ao discurso. Trata-se, então, de um processo de “assimilação
– mais ou menos criador – das palavras do outro (e não das palavras da
língua)” (BAKHTIN, 2011, p. 294).
Como ressalta Sercundes (2011, p. 83), ao produzir textos, o estudante
deve se apropriar dessa heterogeneidade de vozes. Porém, ficam algumas
dúvidas: quanto tempo levará para que as “palavras alheias” tornem-se
“palavras próprias” na autoria do aluno? Segundo a autora (2011, p. 83), o
tempo transcorrido entre interiorizar informações, modos de composição de um
texto e a escrita é o tempo de “virar uma página”. Então, “este tempo escolar
acaba por produzir, para o aluno, uma imagem de produção de textos: ela
resulta mecanicamente da leitura e da aquisição de informações”. Portanto, ao
interiorizar as informações e os modos de produzir textos, o aluno será capaz
de produzir seus próprios textos escritos.
Ao produzirmos textos escritos, temos em mente um interlocutor. Assim,
Cardoso (2008) afirma que o fato de se dirigir a alguém, também é um índice
constitutivo do enunciado. Não escrevemos de maneira aleatória, sempre o
fazemos para um destinatário. Em certos casos, aparecem palavras do adulto
em textos de crianças, comumente as do professor, num processo de
assimilação, como citado anteriormente.
Neste sentido, presentifica-se, também, a alteridade na língua. Ao
falarmos ou escrevermos algo, nossos enunciados estão sempre repletos das
palavras do outro. Quando o aluno produz um texto escrito, a fala de outras
pessoas perpassa seu enunciado, os discursos não são inéditos. Quanto a
isso, Bakhtin (2011, p. 294-295) nos afiança que nossos enunciados são
plenos de palavras alheias, com certo grau de alteridade ou de assimilabilidade
do discurso do outro e com certo grau de aperceptibilidade e de relevância.
Assim, a palavra do outro nos chegam trazendo sua expressão e o tom
valorativo que assimilamos, reelaboramos e reacentuamos.
É por isso, então, que não há ineditismo em nossos escritos ou em
nossos discursos. Tudo que dizemos ou escrevemos é atravessado pelo
discurso alheio. Portanto, “O falante não é um Adão bíblico, só relacionado com
objetos virgens ainda não nomeados, aos quais dá nome pela primeira vez”
(BAKHTIN, 2011, p. 300).
70
Como citado anteriormente, dirigir-se a alguém, a um interlocutor, é algo
que compõe essencialmente o enunciado e sem ele não haveria enunciado. As
várias formas de endereçar-se a um destinatário são, da mesma forma,
particularidades que compõem e determinam a variedade dos gêneros
discursivos.
Na elaboração do enunciado, o locutor deve levar em conta o fundo
aperceptível do destinatário, com relação à percepção do seu discurso, o que
significa dizer que este destinatário deve estar a par da situação
comunicacional, bem como dispor de conhecimentos no dado campo da
comunicação. O enunciador deve ter em mente as crenças e concepções de
seu destinatário, os preconceitos que ele venha a ter, isso no ponto de vista do
locutor, o que ele gosta ou desgosta. Esses itens determinam a compreensão
responsiva do enunciado por parte do interlocutor. Desta forma, o locutor fará a
escolha do gênero, dos elementos composicionais e do estilo.
Salienta ainda Bakhtin (2006, p.96), que nosso discurso é constituído do
discurso do outro, pois os locutores necessitam de um contexto ideológico
preciso que os dote de compreensão, pois,
Na realidade, não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis [...]. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial. É assim que compreendemos as palavras e somente reagimos àquelas que despertam em nós ressonâncias ideológicas ou concernentes à vida.
Assim, o produtor de texto, considerando tais elementos do enunciado,
produzirá um texto endereçado a um interlocutor ou leitor em especial, que
estará dotado de “um determinado fundo aperceptível de compreensão
responsiva” (BAKHTIN, 2011, p. 302).
Na escola, geralmente, a produção textual do aluno tem como
destinatário o professor que, por seu turno, lê a produção com olhos
profissionais, do ponto de vista gramatical. Destarte, por vezes, a criança se
perde em seus enunciados, pois não encontra no seu interlocutor os elementos
necessários para se fazer entender por ele. Assim, fica evidente o caráter
coercivo das normas linguísticas que, de acordo com Bakhtin (2006, p. 96), só
71
se deixa perceber em momentos de conflito, quase que exclusivamente
associados à expressão escrita.
Os gêneros do discurso ensinados na escola têm como finalidade o
ensino da língua materna, por meio de textos específicos e, segundo Costa
(2000, p. 72),
Apropriar-se, portanto, dos gêneros, sistematicamente, mediados por estratégias de ensino intervencionistas formalizadas, é reconstruir a linguagem em novas situações concretas de comunicação, mais complexas, que certamente levarão os alunos a uma autonomia
progressiva nessas atividades comunicativas complexas.
De acordo com Dolz e Schneuwly (2004, p. 71), “o gênero é que é
utilizado como meio de articulação entre práticas sociais e os objetos
escolares, mais particularmente no domínio do ensino da produção de textos
orais e escritos”.
Como podemos ver, o estudo dos gêneros é imprescindível para a
produção escrita, pois, segundo Dolz e Schneuwly (2004, p. 77), por meio dos
gêneros as práticas de linguagem se materializam nas atividades dos
aprendizes e que o lugar da aprendizagem da linguagem se dá entre as
práticas e as atividades de linguagem e que “nesse lugar, produzem-se as
transformações sucessivas da atividade do aprendiz, que conduzem à
construção das práticas de linguagem”.
Preconizam os PCNs (BRASIL, 2001, p. 65) que se um escritor
competente deseja convencer seu leitor, ele deve selecionar o gênero e
produzirá um texto predominantemente argumentativo, lembrando que um
escritor competente, segundo os PCNs,
É alguém que, ao produzir um discurso, conhecendo possibilidades que estão postas culturalmente, sabe selecionar o gênero no qual seu discurso se realizará escolhendo aquele que for apropriado a seus objetivos e à circunstância enunciativa em questão.
Articulando a reflexão sobre a língua e a prática da escrita está a revisão
de texto, assim denominada pelos PCNs (BRASIL, 2001, p. 80) por tratar-se de
um conjunto de procedimentos pelos quais o texto escrito passa até que se
entenda que ele está bem escrito.
72
Consoante a Marcuschi (2010, p.19), os gêneros textuais são
caracterizados como eventos maleáveis, dinâmicos e plásticos, eles “não são
instrumentos estanques e enrijecedores da ação criativa”, portanto, surgem à
medida que as necessidades e as atividades socioculturais do ser humano
exigem.
Assim, por estarem vinculados à vida cultural e social dos indivíduos,
são considerados fenômenos históricos, haja vista a quantidade de gêneros
existentes hoje, se compararmos às sociedades de antes do surgimento da
comunicação escrita.
O autor ainda nos afiança (Ibidem, p. 23) que seria irrealizável a
comunicação verbal que não fosse intermediada por um gênero, posição essa
defendida também por Bakhtin (2011, p. 283).
Ressalta ainda Marcuschi (2008, p. 79), que “quando um falante ou um
escritor se põe a usar a língua (produzir textos), ele pode fazer escolhas
diversas a partir do sistema virtual da língua, mas tem que se decidir por uma
escolha”. E essa escolha se dá de forma automática, sem que o falante ou
escritor se ponham a construir em suas mentes gêneros para convencer ou se
fazer entender pelos seus interlocutores.
De maneira semelhante, Marcushi (2010, p. 21) fala-nos sobre a
transmutação dos gêneros em novos gêneros. Porém, esses novos gêneros
não são inovações absolutas, pois se trata da assimilação de um por outro
gênero gerando novos, assim, “A tecnologia favorece o surgimento de formas
inovadoras, mas não absolutamente novas” (MARCUSCHI, 2010, p. 21). Nesse
caso, o autor cita o e-mail como um gerador de mensagens eletrônicas, cujas
cartas e bilhetes são seus antecessores, todavia esse correio eletrônico é um
gênero novo com características próprias.
Dubeux e Silva (PNAIC, 2012, p. 7) 8 , relatam que para que haja
interação entre falantes, cada sociedade traz consigo um legado de gêneros e,
por meio deles são partilhados conhecimentos comuns, portanto,
Em consequência das mudanças sociais, os gêneros se alteram, desaparecem, se transformam em outros gêneros. Desse modo, novos gêneros textuais vão se
8 Dubeux, Maria Helena Santos; SILVA, Leila Nascimento da. Por que ensinar gêneros textuais
na escola? in: Pacto Nacional Pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). Ano 02. Unidade 05. Disponível em: <http://www.criciuma.sc.gov.br/site/upload/ckfinder>. Acesso em 14 jan. 2014.
73
constituindo, em um processo permanente, em função de novas atividades sociais.
Assim, como já afirmou Bakhtin (2011, p. 283) sobre o domínio dos
gêneros discursivos pelo falante, também Dubeux e Silva (PNAIC, 2012, p. 7)
compartilham da ideia, afirmando que, caso isso não acontecesse, a
comunicação seria quase impossível, pois cada demanda comunicativa exigiria
a construção de um texto completamente novo que, por seu turno, precisaria
ser entendido pelos envolvidos na atividade, a fim de que se efetivasse essa
comunicação.
As autoras (PNAIC, 2012, p.8) citam, ainda, que nessa dinâmica de
ampliação dos gêneros são apresentados “como exemplos o e-mail e o blog,
que, como recursos recentes decorrentes do progresso tecnológico, são
respectivamente transmutações das cartas e dos diários”.
Marcuschi (2010, p. 36) afirma que alguns gêneros são recebidos de
forma oral, mas são originalmente produzidos na forma escrita como as
notícias de televisão e rádio e as orações que conhecemos. Todas são escritas
e, posteriormente, lidas por um locutor ou proferidas por um fiel religioso,
assim, o teórico assegura que “Ninguém reza por escrito e sim oralmente. Por
isso dizemos que oramos e não que escrevemos a Deus”. Portanto, há que se
ter cautela ao ensinar os gêneros aos alunos, pois é preciso fazer essa
distinção para que eles entendam que, apesar de escritos, esses gêneros são
oralizados.
Existe ainda, segundo o autor (2010, p.37), a produção e uso adequado
dos gêneros textuais, isto é, “contar piadas fora de lugar é um caso de
inadequação ou violação de normas sociais relativas aos gêneros textuais”.
Isso é um caso de adequação tipológica e não somente de uma regra de
etiqueta social, então, contar piada numa reunião formal não fica bem.
Compartilhando dessa mesma posição estão koch e Elias (2010, p.56),
asseverando que nós, falantes e ouvintes, escritores e leitores, construímos
durante nossa vida a “competência metagenérica que diz respeito ao
conhecimento de gêneros textuais, sua caracterização e função”. Como
possuidores de tal competência, sabemos escolher e produzir adequadamente
os textos usados nas situações comunicacionais que nos envolvem. É assim
74
que compreendemos que não devemos contar piadas em velório ou fazer
discursos numa mesa de bar com amigos.
Essa mesma competência (KOCH; ELIAS, 2010, p. 55) possibilita-nos,
numa interação, diferenciar os diversos gêneros, ou seja, podemos perceber
quando estamos diante de uma carta, de um bilhete ou de uma piada, bem
como identificar as práticas sociais que as exigem. É graças a essa
competência, também, que podemos reconhecer num texto a predominância
da narração, dissertação, exposição ou argumentação. Da mesma forma, é ela
que nos dá o norte para a leitura e o entendimento de textos, bem como para
as produções orais e escritas (KOCH; ELIAS, 2010, p. 56).
4.2 A sequência didática na perspectiva de Dolz, Noverraz e Schneuwly
É na perspectiva bakhtiniana que os gêneros devem ser tratados em
sala de aula e o seu ensino pode ser ministrado sob o ponto de vista de Dolz,
Noverraz & Schneuwly (2004, p. 97), ou seja, por sequências didáticas.
Uma “sequência didática” é um conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um gênero textual oral ou escrito. [...] tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação (grifos dos autores).
A sequência didática tem movimento do complexo para o simples, com a
produção inicial, passando por módulos, que trabalham uma ou outra
capacidade necessária ao domínio de cada gênero textual, até chegar à
produção final, na qual o aluno põe em prática o que aprendeu nos módulos.
Ao final de cada gênero apresentado, haverá avaliação diagnóstica, a fim de
verificar-se os avanços. Por fim, o movimento volta ao complexo, que é a
produção final.
A sequência didática, em conformidade com Dolz, Noverraz e
Schneuwly (2004, p. 98-99), apresenta um esquema formado pela
apresentação da situação, ou seja, o gênero de texto a ser trabalhado, ou
ainda, o projeto de comunicação que deve ser bastante detalhado para que o
aluno compreenda o gênero abordado. Nessa etapa duas dimensões principais
são distinguidas: a) apresentar um problema de comunicação bem definido,
75
quando é proposta aos estudantes, de forma explícita, a situação de
comunicação na qual eles deverão agir. Desta maneira, nessa fase, algumas
questões devem ser respondidas, como: 1 - que gênero será abordado? O
professor poderá apresentar uma receita culinária, um conto ou outro. Os
autores (2004, p. 99) sugerem que, “para esclarecer as representações dos
alunos, podemos, inicialmente, pedir-lhes que leiam ou escutem um exemplo
do gênero visado”. A questão 2 – a quem se dirige a produção? Os
destinatários podem ser vários como os pais, colegas de outras turmas ou de
outra escola. 3 – que forma assumirá a produção? Que instrumentos serão
utilizados? Podendo ser gravadores de áudio e vídeo, folheto, carta,
representação em palco ou na sala de aula. 4 – quem participará da produção?
Podem-se escolher todos os alunos da turma, apena alguns, todos da escola,
individualmente ou em grupos.
A segunda dimensão, de acordo com os autores (2004, p.100), trata de
preparar os conteúdos dos textos que serão produzidos. “Na apresentação da
situação, é preciso que os alunos percebam, imediatamente, a importância
desses conteúdos e saibam com quais vão trabalhar”, por exemplo, para
escrever um conto, eles deverão saber que elementos constituem esse gênero
como “personagens, ações e lugares típicos, objetos mágicos etc.”. Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004, p.101) explicam que
Criar uma coletânea de enigmas policiais, participar de um debate organizado por uma revista, ou, mais modestamente, redigir um texto explicativo para uma outra turma num projeto interclasses: são projetos realizáveis, que permitem ao aluno compreender melhor a tarefa que lhe é proposta e que facilitam a apresentação da situação.
A seguir, vem a produção inicial, que almeja entender o que a criança
compreende sobre aquele assunto abordado. Para Dolz, Noverraz e Schneuwly
(2004, p. 101), nessa produção, os aprendizes tentam elaborar um primeiro
texto, revelando para si e para o professor o que compreenderam dessa
atividade. O procedimento mostra que esse encaminhamento não leva os
alunos ao insucesso, pois se a situação de comunicação for bem definida na
apresentação da situação, todos os alunos serão capazes de produzir um texto
que demonstre o entendimento da situação dada, mesmo que não respeitem
76
todas as características do gênero abordado. Os autores (2004, p. 101)
reiteram que
Esse sucesso parcial é, de fato, uma condição sine qua non para o ensino, pois permite circunscrever as capacidades de que os alunos já dispõem e, consequentemente, suas potencialidades. É assim que se definem o ponto preciso em que o professor pode intervir melhor e o caminho que o aluno tem ainda a percorrer [...].
Assim, a produção inicial age como reguladora da sequência didática,
que começa pela definição do que é preciso trabalhar para desenvolver as
capacidades de linguagem dos estudantes. Para os autores (2004, p. 102),
essas primeiras produções não receberão uma nota do professor, mas é esse
momento que permite refinar a sequência, modulá-la e adaptá-la de maneira
mais acertada às necessidades e capacidades da turma. É por meio dessas
produções que o professor obtém as informações necessárias para diferenciar
e até mesmo individualizar o ensino. Relatam, ainda, os autores (2004, p. 101),
que a primeira produção, “guiada por critérios bem definidos, permite avaliar de
maneira bastante precisa em que ponto está a classe e quais são as
dificuldades encontradas pelos alunos”.
Após a realização da produção inicial, temos os módulos, nos quais
serão detectadas e posteriormente sanadas as dificuldades apresentadas pelos
estudantes, dando a eles os instrumentos necessários para superá-las. Dolz,
Noverraz e Schneuwly (2004, p. 103) informam que “a atividade de produzir um
texto escrito ou oral é, de uma certa maneira, decomposta, para abordar, uma
a um e separadamente, seus diversos elementos [...]”.
Organizando o trabalho pedagógico, os autores (2004, p. 103) sugerem
como trabalhar os problemas que se apresentaram na produção inicial: o
primeiro nível é trabalhar problemas de níveis diferentes: o aluno pode se
deparar com problemas específicos de cada gênero e deve ser capaz de
resolvê-los. Segundo os autores (2004, p. 104), para que os alunos sejam
preparados, em cada sequência devem ser trabalhados os problemas relativos
a vários níveis de funcionamento.
Para tanto, pode-se distinguir quatro níveis principais na produção
textual:
77
Representação da situação de comunicação: nesse nível, o aluno deve fazer
uma imagem, o mais real possível, do destinatário de seu texto; do que deseja
comunicar; de sua posição como autor desse texto; e do gênero abordado.
Elaboração dos conteúdos: o estudante precisa entender as técnicas que o
possibilitarão buscar, elaborar ou criar conteúdos. Para cada gênero, uma
técnica diferente.
Planejamento do texto: o texto deve ser estruturado de acordo com o objetivo
de comunicação ou destinatário.
Realização do texto: o vocabulário utilizado na produção do texto deve se
adequar a cada situação, variar os tempos verbais de acordo com o plano de
texto e usar organizadores textuais para estruturar o texto ou introduzir
argumentos.
O segundo principal nível na produção de textos é variar as atividades e
exercícios. É importante, nos módulos, variar os modos de trabalho e, para
isso, existem à disposição inúmeras atividades relacionadas com a leitura e
escrita que facilitarão o trabalho do professor. Em cada módulo, o professor
deve propor atividades diversas, dando ao aluno a possibilidade de acesso às
noções e aos instrumentos, pois, dessa forma, as chances de sucesso desse
aluno aumentam. Essas atividades, conforme os autores (2004, p. 105), podem
ser distribuídas em três grandes categorias:
As atividades de observação e de análises de textos: que podem ser efetivadas
a partir de um texto ou partes desse; podem comparar vários textos de um
mesmo gênero ou de gêneros diferentes.
As tarefas simplificadas de produção de textos: são atividades que impõem
limites ao estudante, permitindo-lhe descartar problemas de linguagem que ele
deve gerenciar, de acordo com os diferentes níveis de produção, podendo,
então, focar melhor um aspecto preciso da elaboração do texto.
A elaboração de uma linguagem comum: que possibilitará falar dos próprios
textos ou dos de outro aluno, comentá-los, criticá-los ou melhorá-los, o que
deve ser feito durante todo o trabalho com sequência didática.
O terceiro nível é capitalizar as aquisições. Para os autores (2004, p.
106), “realizando os módulos, os alunos aprendem também a falar sobre o
gênero abordado. [...] eles constroem progressivamente conhecimentos sobre
o gênero”.
78
Finalizando a sequência didática, há a produção final, que proporciona
ao estudante pôr em prática o que aprendeu nos módulos. Essa etapa indica
ao aluno os objetivos a serem atingidos, bem como lhe dá controle sobre o
processo de aprendizagem, levando-o a refletir: o que aprendi? O que resta a
fazer? Também serve de instrumento para regular e controlar suas produções
na refacção do texto e possibilita que ele avalie seus progressos no domínio
trabalhado.
Após a produção final há a avaliação de tipo somativo que, segundo os
autores (2004, p. 107), é exclusiva sobre a produção final. Nessa etapa, seja
qual for a grade de avaliação escolhida pelo professor, o discente explicita os
elementos trabalhados em aula e que também servem como critérios de
avaliação. Para os autores (2004, p. 107), a grade serve
[...] não só para avaliar num sentido mais estrito, mas também para observar as aprendizagens efetuadas e planejar a continuação do trabalho, permitindo eventuais retornos a pontos mal assimilados [...]. A avaliação é uma questão de comunicação e de trocas. Assim, ela orienta os professores para uma atitude responsável, humanista e profissional.
As escolhas pedagógicas, psicológicas e linguísticas guiaram a
elaboração e as principais finalidades da sequência didática. Entre as escolhas
pedagógicas, Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 108) citam que o
procedimento com as sequências didáticas a) possibilita uma avaliação
formativa, ou seja, de regulação dos processos de ensino e aprendizagem; b)
esse procedimento inclui-se num projeto que incentiva os aprendizes a
escrever ou tomar a palavra; c) pela diversificação das atividades, ele
potencializa as chances do aluno se apropriar dos instrumentos e noções
propostos.
Entre as escolhas psicológicas (2004, p. 109) estão: a) a atividade de
produção textual oral ou escrita é trabalhada também na representação da
situação de comunicação, o trabalho sobre os conteúdos e a estruturação dos
textos; b) a sequência didática tem por objetivo transformar o modo de falar e
de escrever dos alunos; c) a transformação acontece pelo fato de se propor
aos estudantes diferentes instrumentos de linguagem.
Nas escolhas linguísticas, a) a atividade de linguagem produz textos e
discursos. A sequência didática serve-se de instrumentos linguísticos que
79
possibilitam compreender essas unidades de linguagem; b) a língua não é
estudada como um objeto único, que funciona sempre do mesmo modo, ela se
adapta às situações de comunicação; c) os gêneros correspondem a situações
de comunicação típicas, pois são formas históricas relativamente estáveis de
comunicação. São eles que definem o que se pode dizer, por meio de que
textos e com que meios linguísticos, isso porque são o objeto do procedimento
da sequência didática.
Em suma, para os teóricos (2004, p. 110) o procedimento da sequência
didática descrito por eles para o ensino da expressão escrita ou falada, tem as
seguintes finalidades:
Preparar os alunos para dominar sua língua nas situações mais diversas da vida cotidiana, oferecendo-lhes instrumentos precisos, imediatamente eficazes, para melhorar suas capacidades de escrever e falar; desenvolver no aluno uma relação consciente e voluntária com seu comportamento de linguagem, favorecendo procedimentos de avaliação formativa e de auto-regulação; construir nos alunos uma representação da atividade de escrita e fala em situações complexas, como produto de um trabalho, de uma lenta elaboração.
Esse procedimento pode ser aplicado tanto para o trabalho com a escrita
quanto com o oral, pois seu objeto de trabalho é o gênero textual. Todavia, de
acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 111), para adequar as
sequências didáticas às necessidades dos estudantes o professor precisa:
analisar as produções dos alunos conforme os objetivos da sequência e das
características do gênero; selecionar os exercícios e atividades necessários
para a realização da continuidade da sequência; prever e elaborar, em caso de
alcançar os objetivos esperados, um trabalho mais eficaz, com intervenções
diferenciadas.
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) sugerem, ainda, que os textos orais
e escritos que produzimos são diferentes, pois são produzidos em situações
diferentes, porém há algumas regularidades, já que escrevemos textos
semelhantes em situações semelhantes. Estes textos são compostos pelos
“gêneros de textos, conhecidos de e reconhecidos por todos, e que, por isso
mesmo, facilitam a comunicação: a conversa em família, a negociação no
mercado ou o discurso amoroso” (Idem, p. 97). A importância da sequência
didática para a escola é a de ajudar o aluno a dominar melhor determinados
80
gêneros textuais e, desta forma, facilitar a escrita e a oralidade da maneira
mais adequada à situação comunicacional.
O trabalho com sequências didáticas permite que o estudante
compreenda melhor as atividades que envolvem determinado gênero, lançando
mão deles, de forma consciente, em suas produções orais ou escritas, sendo
este trabalho feito sobre gêneros que o aluno ainda não domine ou o faça de
maneira insuficiente. De acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 98),
“As sequências didáticas servem, portanto, para dar acesso aos alunos a
práticas de linguagem novas ou dificilmente domináveis”.
Nos trabalhos com os gêneros textuais durante a pesquisa houve este
aprofundamento, seguindo os passos de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004),
com o esquema da sequência didática (figura 1, p. 63), iniciando pela
apresentação da situação que eram as fábulas.
A apresentação da situação é o primeiro componente da sequência
didática. Ela expõe aos alunos um projeto de comunicação que culminará com
a produção final. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 99) afirmam que “ao
mesmo tempo, ela os prepara para a produção inicial, que pode ser
considerada uma primeira tentativa de realização do gênero que será, em
seguida, trabalhado nos módulos”.
Ainda segundo os autores (2004, p. 99), é durante a apresentação da
situação que o aprendiz constrói uma representação da situação de
comunicação e dos exercícios de linguagem a serem realizados. Para que isso
se efetive, de acordo com Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 99), é preciso
que essa apresentação, que tem duas dimensões, seja bem definida.
A primeira dimensão, conforme os autores (2004, p. 99), “é a do projeto
coletivo de produção de um gênero oral ou escrito”, que deve ser proposto aos
alunos de uma forma bastante clara a fim de que eles entendam muito bem a
situação de comunicação na qual deverão agir. A segunda é a dos conteúdos,
que deverão ser imediatamente percebidos pelos estudantes, a importância
deles e com quais vão trabalhar, o que equivale dizer que os aprendizes devem
entender o que compõe o gênero exposto, a fim de reproduzi-lo
posteriormente.
A escola, ao ensinar a produção de textos, objetiva formar escritores
competentes, produtores de textos coerentes, coesos e eficazes, diz-nos os
81
Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (BRASIL, 2001, p.
65). Desta maneira, um escritor competente é aquele que, produzindo seu
discurso, é conhecedor das possibilidades culturalmente postas, vindo a saber
escolher o gênero, no qual seu discurso se realizará, bem como selecionar o
que melhor se adapta aos seus objetivos e à situação enunciativa em questão.
Mas, afinal, o que é um texto? Geraldi (2011, p. 22) nos explica que o
texto, seja ele oral ou escrito, é exatamente o lugar onde se dão as
correlações: “construído materialmente com palavras (que portam significados),
organiza estas palavras em unidades maiores” e, assim, constrói informações,
cujos sentidos são compreendidos apenas na unidade global do texto. Este
texto, por sua vez, interage com outros textos, sem os quais não existiria.
Para Bakhtin (2011, p. 307), o texto, seja ele oral ou escrito, é um dado
primário de todas as disciplinas e do pensamento filológico-humanista.
Segundo o autor (2011, p. 307) “o texto é a realidade imediata (realidade do
pensamento e das vivências), a única da qual podem provir essas disciplinas e
esse pensamento. Onde não há texto não há objeto de pesquisa e
pensamento”.
Então, o texto conduz nossas experiências pelo fato de estar articulado
ao sistema de linguagem, pois tudo que falamos, pensamos ou escrevemos é
por meio de textos. E Bakhtin (2011, p. 308) reitera que “independentemente
de quais sejam os objetivos de uma pesquisa, só o texto pode ser o ponto de
partida”.
Em Marcushi (2008, p. 79), o texto “se dá como um ato de comunicação
unificado num complexo universo de ações humanas interativas e
colaborativas”, o que equivale a dizer que o texto é um sistema de escolhas
que fazemos no ato da comunicação oral ou escrita.
Santos, Mendonça e Cavalcante (2007, p. 28) afirmam que a língua
funciona não por unidades isoladas como os fonemas, os morfemas ou por
meio de palavras soltas, mas por intermédio de textos. E esses, para serem
compreendidos, contam com o conhecimento do leitor/ouvinte sobre o assunto
abordado, o meio no qual se encontram inseridos e a língua na qual foram
escritos ou falados.
82
Por ser um processo interlocutivo, como descrevem as autoras (2007, p.
28), o texto exige de seus falantes e escritores que articulem seus textos aos
seus interlocutores ou que os tenham em suas mentes. Assim,
[...] a criação e recepção de texto é uma atividade de co-construção de sentidos: tanto quem produz quanto quem recebe os textos está ativamente engajado no propósito de ser compreendido e de compreender; em suma, há o desejo de interagir verbalmente.
Pontuam, ainda, as autoras (2007, p. 28), que os textos não são algo
sem marcas de identidade. Eles se diferenciam não só pelo conteúdo, “mas
porque se configuram como gêneros textuais diversos”.
Conforme as autoras (2007, p. 29), “nas práticas de uso da língua, todos
os textos se organizam como gêneros textuais típicos”, os quais utilizamos em
situações interativas no meio social e histórico em que estamos inseridos. E, é
a partir desses gêneros que somos integrados como falantes à sociedade.
Portanto, “os gêneros [...] são entidades empíricas em situações comunicativas
em que predominam os aspectos relativos a funções, propósitos, ações e
conteúdos”.
Entretanto, as autoras (2007, p. 30) alertam para a insuficiência da
diversidade textual na sala de aula. Não basta que ela esteja presente, mas é
preciso que o professor trabalhe com essa diversidade, abordando os gêneros
textuais no que eles têm de mais específico, levando os alunos a distinguirem
uns dos outros, conforme suas características.
Portanto, gênero e texto são dimensões indissociáveis e, para as
autoras (2007, p.41), “não podemos separar um do outro, pois a textualidade
se manifesta num gênero textual específico e, obviamente, os gêneros se
materializam em textos”.
A intertextualidade entre estes textos que se harmonizam por possuírem
os mesmos temas, dividirem as mesmas opiniões ou mesmo por divergirem e
por coexistirem na mesma sociedade constituem nossa herança cultural
(GERALDI, 2011, p. 22).
À medida que o professor entende o ensino de textos como uma
oportunidade de diálogo com outros textos, outros autores e outros leitores,
oportunizará ao aluno produzir novos textos. Além disso, o texto não deve se
restringir às ações de escritas. Guimarães, Campani-Castilhos e Drey (2008, p.
83
8) asseguram-nos que o texto está também ligado às atividades que
possibilitam o desenvolvimento da oralidade dos alunos.
Com papel relevante no ensino, o texto, de acordo com Santos (2007,
p.18) “[...] passa a ser o centro do ensino de língua prescrito, tendo a gramática
um papel secundário e posterior ao domínio a ao uso da linguagem”.
O texto, depois de escrito, não está definitivamente acabado. O autor
pode sempre voltar-se sobre ele com intenção de revisar a escrita. Essa
revisão é importante, pois “permite separar não só o escritor do destinatário da
mensagem [...], como também permite romper a situação de produção do texto,
separando produtor e produto”. Isso cria um efeito de distanciamento, que
possibilita ao escritor trabalhar sobre o texto depois da primeira escrita
(BRASIL, 2001, p.73). A revisão de texto funciona como um controle de
qualidade da produção. Este procedimento é necessário durante todo o
processo de criação e não só após a finalização do texto.
O princípio da exotopia de Bakhtin, em Cardoso (2008, p. 27), “Esta é
definida pelo fato de uma consciência estar fora de outra e, deste lugar, poder
vê-la como um todo acabado, o que ela não pode fazer consigo mesma”, é um
deslocamento necessário, que permite dar um acabamento ao texto, como se
visto de fora.
Em algumas escolas, a prática de revisão de texto ainda é pouco
corriqueira. Esse espaço em que as práticas de leitura, escrita e reflexão sobre
a língua se articulam é o da atividade de revisão textual.
Chama-se revisão de texto o conjunto de procedimentos por meio dos quais um texto é trabalhado até o ponto em que se decide que está, para o momento, suficientemente bem escrito. Pressupõe a existência de rascunhos sobre os quais se trabalha, produzindo alterações que afetam tanto o conteúdo como a forma do texto (BRASIL, 2001, p. 80).
Nessa atividade de revisar o escrito a fim de melhorá-lo, é importante
que se aprenda a perceber os trechos com problemas de gramática, ortografia,
onde está dito o que não se pretendia dizer, acrescentar ou excluir palavras. A
intenção é de que a produção fique compreensível para o destinatário. Esse
exercício permite, também, “o desenvolvimento da atitude crítica em relação à
própria produção e a aprendizagem de procedimentos eficientes para imprimir
qualidade aos textos” (BRASIL, 2001, p. 82).
84
Todavia, segundo Jesus (2011, p. 105), alguns aspectos são ignorados
pelo professor durante a revisão textual, tais como: o que o aluno vivenciou
sobre o escreveu, que fatos ele selecionou para a construção de seu texto e os
critérios e as implicações dessa seleção. Então, o aluno se vê diante de sua
produção tendo que limpá-la ortograficamente “numa atitude esvaziada de
reflexão sobre a escrita e sobre sua condição de autor, uma vez que essas
duas instâncias são colocadas à margem do processo de reescrita” (JESUS,
2011, p.105).
Desta forma, a reescrita torna-se uma “operação limpeza”, de acordo
com a autora (2011, p. 104), cujo objetivo central é eliminar as “impurezas” do
texto do ponto de vista gramatical. Então, a escrita é vista como se fosse uma
transgressão das normas de ortografia, pontuação e concordância, o que pode
prejudicar essa produção na sua potencialidade de realização, embora esteja
linguisticamente correta.
É importante haver uma discussão, como cita Jesus (2011, p. 111), para
que não haja um sentido único para o texto e “ampliar as categorias
mediadoras da reescrita tendo em vista sobretudo a valorização do dizer do
autor, numa atitude de reflexão sobre a linguagem”. Assim, o aluno verá sua
escrita sendo valorizada pelo professor.
Para Brandão (2007, p. 119),
[...] os termos revisão e refacção buscam passar a ideia de um trabalho de parceria entre professores e alunos, com base no pressuposto de que o texto escrito não é, necessariamente, gerado numa primeira e única tentativa. Ao contrário, o texto passa a ser visto como algo que pode ser reescrito e melhorado, sendo o processo de revisão entendido como um dos elementos constitutivos da atividade de escrita.
Desta forma, conforme a autora (2007, p. 120), o texto passa por várias
etapas de planejamento do que se deseja comunicar tais como preparação e
escrita do que foi planejado, avaliação, replanejamento e reelaboração/edição
final.
A autora (2007, p. 120) salienta que “revisar um texto é torná-lo objeto
de nossa reflexão, é pensar sobre o que foi ou está sendo escrito e encontrar
meios para melhor dizer o que se quer dizer, reelaborando e reescrevendo o já
escrito”.
85
Ressalta, ainda, Brandão (2007, p. 120), que muitos professores
acreditam que a revisão textual é deveras elaborada para um escritor iniciante,
deixando essa etapa de refinamento do texto escrito para mais adiante, no
momento em que esse aluno dominar melhor a escrita de textos. Entretanto, a
tarefa exige mesmo reflexões sobre a escrita, que podem começar desde cedo.
Schneuwly (2004, p. 23) diz que o gênero é um instrumento. Este
instrumento, fator de desenvolvimento das capacidades individuais, possui
considerações psicológicas, pois a psicologia “tende [...] a conceber a atividade
do indivíduo como acontecendo entre dois polos: o sujeito, de um lado, e o
objeto sobre o qual ele age ou a situação na qual ele age, de outro”. Tais
instrumentos é que determinam nossos comportamentos, nos guiam e sua
intervenção modela a atividade. Portanto, a transformação do instrumento
transforma nossos comportamentos. De acordo com Schneuwly (2004, p.24),
ele se torna o lugar distinto de transformação dos comportamentos e “[...]
explorar sua possibilidades, enriquecê-las, transformá-las são também
maneiras de transformar a atividade que está ligada à sua utilização”.
Ainda segundo o teórico, os instrumentos são mediadores, pois há uma
relação entre o produto material existente fora do sujeito, isto é, a situação, e
os esquemas de utilização dos objetos que articulam suas possibilidades às
situações de ação desse sujeito. De forma que, para ser mediador e
transformador da atividade, o instrumento precisa ser apropriado pelo sujeito e,
para sua eficácia, é necessário construir-se os esquemas de utilização (2004,
p. 24). A apropriação do instrumento pela criança instrumentaliza-a, fornecendo
novos conhecimentos e saberes, que sustentarão e orientarão seus atos.
Para Bernard Schneuwly (2004, p. 26) há três elementos centrais na
definição de gêneros discursivos de Bakhtin. O primeiro é a escolha de um
gênero, definida por alguns parâmetros, a saber: a finalidade, os destinatários e
o conteúdo da situação de comunicação. O segundo é a seleção desse gênero
dentro desta base de orientação da ação discursiva acima referida, no interior
de uma esfera de troca dada. O terceiro é que, tendo os gêneros uma unidade
temática, um estilo e uma composição, “eles têm uma certa estrutura definida
por sua função; eles são caracterizados por aquilo que chamamos [...] um
plano comunicacional” (2004, p. 26).
86
A escolha do gênero, então, se dá pela situação que guia a ação,
havendo uma relação entre o meio e o fim, que se trata da estrutura de base da
atividade mediada (SCHNEUWLY, 2004, p.27).
Há esquemas para utilização dos gêneros (SCHNEUWLY, 2004, p. 27):
Um deles é que o gênero é articulado à base de orientação da ação discursiva;
ele pode ser adaptado a um interlocutor, um conteúdo e uma finalidade; o
conhecimento e a concepção da realidade estão inseridos nos modos de agir
sobre essa realidade.
Outros esquemas, segundo o autor (2004, p.28), podem ser concebidos,
como a utilização de diferentes níveis de operações necessárias para a
produção textual e o gênero como megainstrumento que contribui para a
sobrevivência de uma sociedade. Afinal, a comunicação e a interação social,
mantêm viva a cultura de um povo.
Os gêneros são responsáveis pelo desenvolvimento da linguagem. Ao
ingressar na escola, a criança passa por processos de desenvolvimento do
sistema de produção da linguagem. Isso se efetua por meio de estágios
durante sua vida escolar, podendo ser proposto com atividades que
contemplem os conceitos de gêneros primários e secundários.
A construção de gêneros secundários pressupõe a disposição de
instrumentos já complexos, que, de acordo com Schneuwly (2004, p. 34), pelo
seu novo uso, se revestem de novos significados, construindo simultaneamente
outros instrumentos para essa nova função, isto é, outros meios linguísticos
que distinguem ainda mais essa função de mudança de perspectiva textual.
Assim, o ser humano é capaz de construir instrumentos partindo de
outros ainda mais complexos. Numa analogia ao trabalho de um ferreiro,
Spinoza explica o uso que o intelecto faz para a construção de novos
instrumentos de criação dos gêneros.
“[...] para forjar o ferro, precisa-se de um martelo e, para se ter martelo, é preciso fazê-lo, para o que se necessita de outro e de outros instrumentos, os quais também supõem outros instrumentos, e assim ao infinito [...]. Mas como os homens no começo, com instrumentos inatos, puderam fabricar algumas coisas muito fáceis, ainda que laboriosa e imperfeitamente, feito o que fabricaram outras coisas mais difíceis, com menos trabalho e mais perfeição [...] também o intelecto, por sua força nativa, faz para si instrumentos intelectuais e por meio deles adquire
87
outras forças para outras obras intelectuais, graças às quais fabrica outros instrumentos [...].”9
Podemos inferir, então, que o mesmo sucede com nossas mentes, no
que tange às capacidades de construirmos instrumentos necessários, a fim de
lançar mão deles sempre que nos confrontarmos com variadas situações de
comunicação ou de entendimento de um texto lido.
Na perspectiva de Schneuwly (2004), a aparição dos gêneros
secundários na criança não é o ponto de chegada, mas de partida para um
alongado processo de reestruturação, que será capaz de promover uma
revolução nas operações de linguagem, ou seja, a criança passará a ser mais
autônoma em suas produções, pois terá maior controle consciente e voluntário
de operação de linguagem; será capaz de fazer escolhas de unidades
linguísticas, em diversos níveis, principalmente na perspectiva enunciativa; e
poderá, também, fazer combinações livres de gêneros e de tipos textuais.
4.3 Como o professor utiliza os gêneros textuais nas aulas
Uma reflexão se faz necessária: como os gêneros textuais têm pautado
nossas aulas?
E além do mais, eu tenho certeza que a professora nem quer saber de verdade como foram as nossas férias. Ela quer só saber como é a nossa letra e se a gente tem jeito para escrever redação. Aqueles dois meses inteirinhos de despreocupações estavam prestes a virar 30 linhas de preocupações com acentos, vírgulas, parágrafos e ainda por cima com a letra legível depois de tanto tempo sem treino.
O trecho do livro de Gribel (2000, p.9) acima citado e que traz a fala do
personagem Guilherme leva-nos a uma reflexão sobre como temos tratado
nossos alunos. Será que a imposição de produções textuais, exigindo certo
número de linhas, vai ajudar o aprendiz a se apropriar da escrita? Será que já
não evoluímos o bastante, em termos de educação, para deixarmos de exigir
de nossos alunos textos de forma convencional e mecânica?
9 Trecho da versão eletrônica do livro “Tratado da correção do intelecto”, de Spinoza.
Disponível em <http://br.egroups.com/group/acropolis>. Acesso em 25 jul. 2013.
88
Para Geraldi (2013, p. 117), há algum tempo, a escola ensinava seus
alunos com livros didáticos de dois gêneros:
[...] verdadeiros livros de textos para os alunos, e livros-roteiros para os professores, para que aprendessem a servir-se bem daqueles. Automatiza-se, a um tempo, o mestre e o aluno, reduzidos a máquinas de repetição material.
Isso ocorria pelo fato de o professor, conforme Geraldi (2013, p.116),
passar por “formação de professores em cursos rápidos, sem maior
embasamento teórico”, não o preparando como deveria para a profissão e
fazendo-o necessitar do auxílio do livro didático e mecanizando sua prática
pedagógica.
Evidencia, ainda, Geraldi (2013, p. 119) que, quando a criança adentra a
escola, ela já traz consigo, mesmo sem estar ciente disso, o conhecimento
prático dos princípios da linguagem, como o uso de gêneros textuais, de
números e conjugações. É a gramática internalizada, “o sistema de regras que
formam a estrutura da língua, e que os falantes interiorizam ouvindo e falando”.
Quanto às atividades impositivas da escola aos estudantes, Geraldi
(2013, p.121) escreve que “[...] os maus hábitos contraídos ficaram. O primeiro
é o enjôo pelo estudo, o desamor das letras, a repugnância ao trabalho
mental”.
Magda Soares (2011, p. 72) aponta que a escola ensina e a criança
deve responder com determinado discurso e sabe que quando a professora
pede um texto,
Seu interlocutor escolar não quer propriamente que demonstre o que pensa ou sente (não quer o uso da linguagem com função pessoal nem interacional), quer que demonstre o que sabe ou o que é capaz de criar (quer uso da linguagem com função representativa ou imaginativa) (grifos da autora).
Então, segundo a autora (2011, p. 73), os alunos desaprendem a escrita
como condição de interlocução real. Eles escrevem o que a escola quer que
eles escrevam e não o que eles gostariam de escrever, usando uma
interlocução artificial.
Todos nós já passamos pelo suplício das escritas contando como foram
as férias, sobre o final de semana ou o animalzinho de estimação. Porém, essa
89
velha prática continua. Às vezes vem disfarçada com o nome de produção de
texto, todavia, o assunto é posto pelo professor, que pede determinado número
de linhas para o aluno escrever.
Soares (2011, p.81) salienta que, na escola,
[...] o processo de aquisição da língua escrita [...] é desde o primeiro momento, um processo de desaprendizagem da escrita com as funções de interação autor/leitor, de intersubjetividade, e de aprendizagem de uma escrita que, em vez de interação, é reprodução de um modelo escolar de texto, é “prestação de contas” do autor a um leitor que nada mais espera senão reconhecer, no texto produzido, esse modelo; [...].
Como o menino Guilherme da história de Gribel, as crianças se
esforçam para escrever, contam as linhas do caderno, marcam um “x” para
saber até onde escreverão e se lançam na aventura. Então, o educador precisa
valorizar as produções e criar as oportunidades de o aluno mergulhar no
universo da escrita por meio de atividades que, ao longo de sua carreira
escolar, vão dotando-o de habilidades, pois, de acordo com Soares (2011, p
111), “[...] em situações de produção espontânea, alunos, mesmo ainda na fase
de alfabetização, escrevem verdadeiros textos [...] com alto grau de
informatividade e unidade temática”.
Os PCNs (BRASIL, 2011, p. 66) ressaltam que, para que a criança
aprenda a língua escrita, é necessário que ela tenha acesso à diversidade de
textos escritos, testemunhe o uso que se faz da escrita em variadas
circunstâncias e se depare com as reais questões que a escrita impõe aos que
se dispõem a produzi-la, procuram fazer como conseguem e recebem auxílio
de quem já escreve.
Marcuschi (2008, p. 77) compara a produção de textos com jogar um
jogo: é preciso se orientar por regras e ter uma série de jogadores, que devem
assumir seus papeis e funções e, para que o jogo aconteça, todos devem
colaborar e jogar o mesmo jogo ou não haverá jogo algum. Com os textos
também é assim:
Produtores e receptores de texto [...] todos devem colaborar para um mesmo fim e dentro de um conjunto de normas iguais. Os falantes/escritores da língua, ao produzirem textos, estão enunciando conteúdos e sugerindo sentidos que devem ser construídos, inferidos, determinados mutuamente. A produção textual, assim
90
como um jogo coletivo, não é uma atividade unilateral. Envolve decisões conjuntas. (MARCUSCHI, 2008, p. 77)
Assim, segundo o autor (2008, p. 77), a produção textual se caracteriza
como uma atividade sociointerativa. E a interação pode ocorrer entre professor
- aluno, aluno - aluno e aluno-texto-atividades. Então, “o texto se dá como um
ato de comunicação unificado num complexo universo de ações humanas
interativas e colaborativas” (MARCUSCHI, 2008, p. 79).
Exigir do aluno uma atividade de produção textual sem antes muni-lo de
possibilidades para essa tarefa é, no mínimo, perigoso, pois esse aprendiz
poderá vir a abominar a escrita. Momentos de oralidade discutindo o assunto
abordado, orientações para o desenvolvimento do trabalho devem anteceder a
produção.
O texto oral é de grande relevância para o ensino do texto escrito.
Marcuschi (2008, p. 53) pontua que, ao se enfatizar o ensino da escrita, não se
deve ignorar a fala, “pois a escrita reproduz a seu modo e com regras próprias,
o processo interacional da conversação, da narrativa oral e do monólogo”,
dentre outros.
O conhecimento de mundo do estudante conta muito nessas horas, mas
o educador deve levar em conta que nem todos os temas que circulam pela
sociedade são de conhecimento das crianças.
Sercundes (2011, p. 79) denomina os exercícios de escrita sem um
planejamento que os anteceda de “produção sem atividade prévia”,
[...] que apareceram desvinculados do trabalho pedagógico desenvolvido pelo professor, sem nenhuma ligação com o trabalho anterior ou posterior, não representando etapa de um processo mais amplo de construção do conhecimento.
Escrever, portanto, é um exercício que vem de constantes atividades
que encaminhem o aluno para esse fim e da definição de um projeto. A
sociedade exige, cada vez mais, sujeitos capazes de administrar bem suas
vidas, seus negócios e suas profissões. A escola tem que dar conta de
instrumentalizar esses sujeitos, pois as sociedades, não só em nosso país,
assim determinam e, ler e escrever torna-se uma condição de sobrevivência.
Com relação à apropriação da escrita, Koch e Elias (2010, p. 31)
afirmam que,
91
Se houve um tempo em que era comum a existência de comunidades ágrafas, se houve um tempo em que a escrita era de difícil acesso ou uma atividade destinada a alguns poucos privilegiados, na atualidade, a escrita faz parte da nossa vida, seja porque somos constantemente solicitados a produzir textos escritos (bilhete, e-mail, listas de compras, etc., etc.), seja porque somos solicitados a ler textos escritos em diversas situações do dia-a-dia (placas, letreiros, anúncios, embalagens, e-mail, etc., etc.).
Voltando à escola, já foi mencionado anteriormente, que o produtor de
texto precisa de um motivo para escrever. Além desse motivo, necessita
também de um interlocutor e que este tenha uma posição responsiva, que o
faça entender o discurso do outro. Cardoso (2008, p. 32) ressalta que
Escrever um texto pressupõe a simulação de uma situação: prever um destinatário e os efeitos de forma e de conteúdo do texto sobre ele. Significa, portanto, fazer uso dos gêneros discursivos disponíveis na esfera social e já apropriados.
Então, para que o aluno seja um “escritor”, a escola deve lhe
proporcionar eventos de apropriação dos gêneros de textos, fazer com que ele
entenda que existem outros interlocutores que não ele, o professor, enfim, deve
motivá-lo com atividades que o seduzam.
Afirmam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 124) que a expressão
oral ou escrita do aluno se desenvolve por intermédio do ensino-aprendizagem
de diversos gêneros,
[...] iniciado precocemente, graduado no tempo de acordo
com os objetivos limitados e realizado em momentos propícios, isto é, quando a intervenção do professor e as interações com outros alunos podem gerar progressos.
Durante a pesquisa, observei que os professores da escola trabalhavam
gêneros textuais como poesias, bilhetes, músicas, convites, dentre outros.
Todavia, o ensino não era aprofundado, o que impossibilitava alguns alunos
com desenvolvimento mais lento se apropriarem do conteúdo.
De fato, é de suma importância o contato dos estudantes com variados
textos do cotidiano que, se bem apropriados exercitarão o que Koch e Elias
(2010, p. 55) denominam de “capacidade metatextual, que vai nos orientar
quando da construção e intelecção de textos”.
92
Ultimamente, os alfabetizadores, inclusive os da escola pesquisada, têm
participado de cursos de formação oferecidos pelas secretarias de educação.
Programas de alfabetização como Gestar, Pró-Letramento e, hoje, o Pacto
Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), ofertados pelo governo
federal, têm colaborado para melhor instrumentalizar o professor na tarefa de
alfabetizar e letrar as crianças. Todavia, todo esse conhecimento deve estar
aliado ao compromisso do professor tornar efetivo o seu fazer pedagógico,
somado a condições objetivas para tal.
Na perspectiva atual, de acordo com Koch e Elias (2010, p.56), “[...] os
estudos sobre os gêneros textuais vêm contribuindo significativamente para
ampliar a compreensão do processamento cognitivo do texto (recepção e
produção)”. E, em sites que publicam pesquisas nessa área, como CAPES e
SciELO, dentre outros, podemos ver trabalhos profícuos que vêm estudando
formas de tornar nossos alunos escritores competentes.
Dentre estes se destacam os trabalhos encontrados na pesquisa estado
do conhecimento. O trabalho de Maria Angélica Cardoso (2005), por exemplo,
ressalta que a mesma utilizou o gênero embalagens de produtos alimentícios
como suportes ou portadores de textos para a atividade com produção escrita;
Severina Érika Morais Silva (2009) que desenvolveu uma pesquisa com o
gênero textual carta de reclamação e notou que a produção deste gênero de
texto leva os alunos a refletir sobre diferentes dimensões de nossa língua;
Alessandra Marques da Cunha (2010), em seu estudo, analisou o que
escreviam e diziam os alunos de 3º ano sobre a produção escrita e o gênero
fábula e que conhecimentos eles adquiriram na escrita e na oralidade e
Fabiana Vieira Nunes (2010), que em sua investigação considerou o estudo de
gêneros textuais uma maneira de possibilitar aos alunos a conscientização dos
processos interacionais que envolvem a produção textual.
93
5 A PRODUÇÃO DE TEXTOS RELACIONADA AOS GÊNEROS DO
DISCURSO
Se escrever, ser lido e ler é partilhar sentimentos, receber rosas e risos, mostrar nossas margens e oásis; se escrever, ser lido e ler não cabe em “fôrmas” de pura correção gramatical, em camisas de força do mero preciosismo vocabular, escrever, ser lido e ler não faz parte da concepção de ensino descrita. Ao aluno – à margem do seu texto irrequieto, mas sem vazão – resta o silêncio da cópia e da despersonalização.
Beatriz Citelli
Explicito neste capítulo como se dá a transposição da fala para a escrita,
a importância que os gêneros textuais adquiriram nas produções textuais das
crianças em geral e como se deram as produções iniciais e finais dos alunos.
O texto como pretexto para o ensino da gramática, como relata
Mendonça (2007), ainda reflete o método tradicional desse ensino, não
incentivando nos alunos a prática da escrita. Assim, atividades mais
preocupadas com a ortografia são impostas aos estudantes.
94
Para Geraldi (2013), para se produzir um texto é necessário que se
tenha algo a dizer, a quem dizer e uma razão para dizer o que se vai dizer. É o
estímulo que o aluno precisa para escrever. E cabe à escola o papel de
motivadora dessa produção escrita.
Ultimamente, o ensino de Língua Portuguesa tem se pautado na
diversidade textual. Todavia, em alguns casos, esse ensino tem sido
superficial, isto é, não tem havido um aprofundamento no ensino dos gêneros
textuais, dificultando, em certas ocasiões, que o aluno reconheça o gênero
quando se depara com ele.
Mendonça (2007) diz que a grande quantidade de gêneros textuais
existentes demonstra que também é diversa a necessidade de interação social
mediada pela linguagem. Então, o professor precisa familiarizar-se com os
gêneros antes de ensiná-los, a fim de entender como eles funcionam e
circulam nos meios sociais.
As produções iniciais dos alunos, no gênero fábula, foi uma sondagem.
Serviu para compreender o que as crianças haviam entendido sobre o gênero
e, lembrando Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004), essa produção inicial tem o
papel de reguladora da sequência didática. Ela deu o norte para as atividades
que os professores aplicaram, a fim de desenvolver as capacidades de
linguagem dos estudantes.
A produção final é o quarto componente da sequência didática. Foi por
meio dela que os alunos puderam pôr em prática o que aprenderam nos
módulos da sequência didática.
De acordo com Dubeux e Silva (2012, p. 9),
No trabalho em sala de aula com os gêneros duas dimensões se articulam. A primeira se refere aos aspectos socioculturais relacionados a sua condição de funcionamento na sociedade e a segunda se relaciona aos aspectos linguísticos que se voltam para a compreensão do que o texto informa ou comunica.
Assim, estando os alunos em contato com variados suportes e gêneros
textuais, como sugerem as autoras (2012, p. 9), “o ensino da leitura e da
escrita na escola pode ser sistematizado de forma que o aluno possa refletir,
apropriar-se e usar diversos gêneros textuais”. E afirmam, ainda, que o
trabalho com os textos “ocorre de modo articulado ao ensino de gêneros, de
95
forma que refletir sobre o gênero seja uma estratégia que favoreça a
aprendizagem da leitura e da produção de textos”. (2012, p. 9)
5.1 A transposição da fala para a escrita
Para escrevermos precisamos de um motivo. Infelizmente, na escola, o
que vemos na maior parte do tempo é a imposição de tarefas de escrita que
vêm disfarçadas de prática renovada de ensino de português, o que muitos
professores têm chamado de “gramática contextualizada” (MENDONÇA, 2007,
p. 74). Tal prática usa o texto como pretexto para as tradicionais análises
gramaticais e aplicam exercícios que, segundo a autora (2007, p. 74), retratam
o velho método, como: “Retire os adjetivos do texto; Analise sintaticamente o
último período do texto; Leia o texto e sublinhe os verbos transitivos, etc.”.
Assim, aos alunos são impostas cotidianamente atividades mais
preocupadas com a ortografia do que com a escrita motivada.
Em conformidade com Geraldi (2013, p. 137), para produzirmos um texto
é preciso que:
a) Se tenha o que dizer; b) Se tenha uma razão para dizer o que se tem a dizer; c) Se tenha para quem dizer o que se tem a dizer; d) O locutor se constitua como tal, enquanto sujeito que
diz o que diz para quem diz [...]; e) Se escolham as estratégias para realizar (a), (b), (c) e
(d).
Desta forma, a escola tem o papel de incentivadora da produção escrita.
Embora as aulas de Língua Portuguesa sejam, em sua maioria, pautadas no
trabalho com textos, esses servem, muitas vezes, apenas como modelos para
a elaboração de questões gramaticais. Para Geraldi (2013, p. 100), “um texto é
uma sequência verbal escrita coerente formando um todo acabado, definitivo e
publicado: [...] simplesmente dado a público, isto é, cumprindo sua finalidade
de ser lido”. Então, o texto produzido deve ser visto pelo professor não
somente com olhos de correção, mas sim de entendimento do que o estudante
quer dizer. Afinal, quando se pede um texto sobre as férias é para dar nota ou
para saber como foram as férias mesmo? É preciso incentivar o aluno a
produzir textos para os quais haverá destinatários, interlocutores. A produção
textual não endereçada a um interlocutor perde seu efeito “[...] já que um autor
96
isolado, para quem o outro inexista, não produz textos” (GERALDI, 2013, p.
100). E, sem um destinatário, o texto fica sem publicação.
Alguns alunos das duas turmas de 3ª fase pesquisadas estavam ainda
se apropriando da escrita. Nos primeiros dias de observação notei que as
crianças da 3ª fase B se sentiam orgulhosas quando conseguiam identificar
uma palavra escrita na lousa. Foi o caso da aluna Caterina, que leu a palavra
barata.
“[...] a aluna foi até o quadro ler a palavra “barata”, que estava numa frase com as sílabas separadas e leu a palavra, confirmando se era mesmo barata que estava escrito” (PROTOCOLO n. 3, linhas 36-39, de 12/03/2013).
A oralidade tem sua vez nas aulas da professora Luísa, pois, como um
texto suscita outro, as crianças sempre se lembram de algo relacionado ao
texto que está sendo trabalhado e começam a contar histórias e, como no caso
da leitura de “barata”, também foi assim.
Então Caterina contou uma história sobre uma mulher que tinha muito medo de barata e chamava o marido para matar baratas que ela nem via. Outros alunos contaram algumas histórias que envolviam baratas sobre os pais, irmãos e amigos. Esse instante de oralidade foi respeitado pela professora. (PROTOCOLO n. 3, linhas 33-38, de 21/03/2013)
Em muitas outras ocasiões as crianças contavam casos que a
professora ouvia com paciência e, para não ficar uma desorganização geral,
ela pedia que levantassem a mão e cada um, por vez, contava sua história.
As crianças dessa sala conversam muito e vão às mesas uns dos outros. A professora não briga muito com eles com relação a esses comportamentos [...]. Ela chama a atenção deles quando a atividade está na lousa e eles se levantam sem copiar. (PROTOCOLO n. 15, linhas 8-15, de 03/04/2013)
Não considero a atitude da professora como falta de domínio sobre a
turma, mas como respeito a uma forma de interação entre as crianças, afinal,
segundo Bakhtin (2011), é da interação verbal entre indivíduos que surgem os
gêneros textuais.
Além disso, para Azevedo e Tardelli (2011, p.28),
Decorrente das situações de interação social – dentro ou fora do ambiente escolar – a oralidade emerge em sala de aula de maneira informal, numa pluralidade de falas
97
(aqui consideradas como manifestações orais dos alunos) que constitui uma instância discursiva marcada pela heterogeneidade. É o momento em que o conteúdo circundante permeia o tema central estudado, configurando um cruzamento de vozes que caracteriza o processo interação/interlocução entre professor/aluno, aluno/aluno.
Para as autoras (2011, p. 29), a escola é um espaço de socialização e,
mesmo cerceados pela disciplina da sala, os alunos burlam as regras e
mantêm seus discursos paralelos ao do professor ao trocarem informações
entre eles, contarem piadas ou comentarem assuntos particulares. Eles estão
se utilizando da língua para necessidades reais de comunicação.
Os alunos daquela sala tinham a oportunidade de ler livros na leitura
compartilhada, momento em que um deles lia para os demais colegas no início
da aula. Não havia um cantinho da leitura na sala, mas a professora tinha uma
cesta com muitos livros e gibis que, quando algumas crianças terminavam a
atividade antes dos demais, elas podiam escolher um exemplar e ler em suas
mesas.
Durante a leitura compartilhada, a professora Luísa deixava-os à
vontade para ler como conseguiam, sendo respeitados pelos colegas ouvintes
que reclamavam apenas quando a leitura era feita em voz muito baixa. Se a
leitura não ficasse bem audível, ao final, a professora a refazia, sempre
explorando os personagens e as ações contidas na história. Os alunos iam
constantemente à biblioteca da escola em busca de livros. Eles próprios
escolhiam o que levar para a leitura deleite. Desta forma, iam se apropriando
da escrita.
Na sala do professor Antonio a situação era semelhante. Também lá
alguns alunos ainda estavam se apropriando do sistema de escrita. Faziam a
leitura deleite nas aulas de Português, e duas vezes por semana, retiravam
livros da biblioteca escolar. Atividades de pesquisa em dicionário eram comuns
em suas aulas. Alguns verbetes no texto de Cecília Meireles “A chácara do
Chico Bolacha” chamaram a atenção das crianças. “O professor explicou o
significado de algumas palavras. [...] pediu que pesquisassem no dicionário as
palavras ‘charco, coxo e caxambu’” (PROTOCOLO n. 22, linhas 32-35, de
10/04/2013).
98
Durante a pesquisa foi possível notar que algumas crianças que ainda
escreviam pouco, por estarem desenvolvendo a habilidade da escrita,
começarem a escrever mais, sem medo de “errar”. Em muitos momentos,
vinham até mim para perguntar como se escrevia determinada palavra.
Helena veio até mim perguntar como se escreve “olho” e Hellen se adiantou e escreveu na mesa para que a colega visse como é. Heitor disse que também poderiam escrever “ólho”, o de gasolina, segundo ele (PROTOCOLO n. 9, linhas 32-36, de 27/03/2013).
Vemos, então, que esses pequenos, estavam em pleno processo de
apropriação da escrita, associavam o som das palavras e começavam a tirar
suas próprias conclusões a respeito da grafia. Assim, para Cardoso (2000, p.
258),
[...] a transição da oralidade para a escrita se revela como um momento em que a criança possui uma visão difusa sobre o objeto escrito, muito própria de uma etapa de construção. Dessa forma, “envolvimento” e “fragmentação”, embora sejam características da oralidade, são comuns nos textos escritos [...].
Todavia, isso não significa que crianças como Heitor tenham problemas
com a escrita, pois nem todos os conflitos estão ligados aos hábitos de
pronúncia. De acordo com o Pró-Letramento Fascículo 7(BRASIL, 2008, p. 23),
“muitos são simplesmente consequência do caráter arbitrário das convenções
da língua, isto é, um mesmo fonema pode ser representado de duas formas ou
mais”.
Portanto, cabe à escola criar as circunstâncias necessárias e as
atividades para que Heitor e os demais alunos compreendam a transposição da
fala para a escrita.
Lima e Beserra (2012, p. 57) afirmam que, geralmente, os educadores
acreditam que se o aluno já sabe falar, ele pode executar qualquer tarefa que
envolva a modalidade falada da língua e, assim, para eles, trazer para a sala
atividades que desenvolvam a expressão oral é perda de tempo. “Assim, por
muito tempo e por motivos diversos, a supervalorização conferida à escrita
acabou por menosprezar a fala, como objeto de ensino”.
Nos cursos de formação raramente há espaço para o estudo da
oralidade, o que, segundo Lima e Beserra (2012, p. 58), faz com que muitos
99
desses profissionais não se sintam seguros em aplicar atividades que
envolvam tal modalidade.
Conforme as autoras (2012, p. 58), diversos pesquisadores, no século
XX, estudaram sobre a língua falada, objetivando identificar suas
características e diferenciá-la da modalidade escrita. Todavia, tais estudos
centravam-se apenas na análise do código e apresentavam as duas
modalidades como dicotômicas.
Ao aprofundarem os estudos, os pesquisadores puderam notar a
impropriedade dessa abordagem, e nos trabalhos mais atuais que
abandonaram essa dicotomia, perceberam que estudar fala e língua
focalizando as diferenças entre as duas modalidades “não contribui para a
compreensão e percepção dessas atividades como práticas sociais” (LIMA;
BESERRA, 2012, p. 59).
Afirmam ainda, as autoras (2012, p.59), que os estudos modernos
concluem que características sugeridas pelos primeiros estudiosos não devem
mais ser conferidas às modalidades da língua.
Por exemplo, hoje, considera-se que não tem cabimento a oposição “contextualizada x não contextualizada”, uma vez que se defende a ideia de que qualquer texto, seja da fala, seja da escrita, é sempre um texto produzido dentro de um contexto, ou, em outras palavras, é sempre um “texto situado”. (grifos das autoras)
Para Koch e Elias (2010, p. 16) o que realmente ocorre é que nem todas
as características são exclusivas de uma ou outra modalidade. Essas
características sempre foram medidas pelo parâmetro da escrita, levando a
uma visão preconceituosa da fala, que chegou a ser comparada com a
linguagem rústica das sociedades primitivas ou às crianças em fase de
aquisição da linguagem.
Em muitos casos, a sintaxe é sacrificada pelo locutor em favor das
necessidades da interação, o que provoca, no texto falado, “falsos começos,
truncamentos, correções, hesitações, repetições, inserções e paráfrases”, que
não chegam a serem defeitos, pois têm funções cognitivo-interacionais
importantes como:
Ganhar tempo para o planejamento ou para a compreensão por parte do interlocutor (pausas, hesitações, repetições); apresentar esclarecimentos, exemplificações, atenuações do que foi dito, reforçá-lo,
100
etc. (inserções, repetições, parafraseamentos), entre outras. (KOCH; ELIAS, 2010, p. 18)
Em conformidade com Koch e Elias (2010, p.18), a fala não pode ser
considerada absolutamente caótica, desestruturada e rudimentar. O texto
falado tem uma estrutura própria “ditada pelas circunstâncias sociocognitivas
de sua produção e é à luz desta que deve ser descrito e avaliado”.
Portanto, os professores devem ser preparados, em cursos de formação,
para trabalhar atividades que proponham o uso da modalidade oral da língua
nas situações de interação.
5.2 A relevância dos gêneros discursivos nas produções textuais
Ultimamente, parece haver um consenso de que o ensino de Língua
Portuguesa deve se embasar na diversidade textual. Porém, o que temos visto
é um ensino polvilhado de gêneros textuais, mostrando basicamente o que é
cada um, sem aprofundar muito o assunto.
Destacam Albuquerque e Leal (2007, p. 104), que tem ocorrido, por
diversas vezes nas escolas, um trabalho com diversidade textual que se
transforma em conteúdos tradicionais de ensino e, assim,
Nessa perspectiva, mais do que possibilitar aos alunos leituras e escritas diversas, de diferentes gêneros, escritos em contextos diferenciados e para diferentes fins, a ênfase no trabalho com textos têm recaído no ensino de suas características, na importância dos alunos identificarem e os classificarem. Não se nega, aqui, a importância desse conhecimento, mas o que se observa é uma escolarização desses textos, distanciada de seus contextos sociais de produção.
Com relação ao ensino da gramática, Marcuschi (2008, p. 56) diz que é
impossível trabalhar a língua sem atentar para o sistema, o que garante o
trabalho com a gramática no ensino da língua materna. Além disso, segundo o
autor, a gramática tem importante função sociocognitiva, se entendida como
ferramenta que possibilita uma melhor atuação comunicativa.
Santos (2007, p. 22) salienta, uma vez que diferentes gêneros de texto
requerem diferentes tipos de conhecimentos e diferentes conjuntos de
habilidades, também deve ser diferente o ensino da produção de texto e de
leitura para todos os gêneros estudados. Segundo a autora (2007, p. 22)
101
[...] a aprendizagem da escrita não é algo que se dá de modo espontâneo, mas se constrói através de uma intervenção didática sistemática e planejada. Em razão disso, vários pesquisadores têm defendido um ensino sistemático da produção escrita de diferentes gêneros, já a partir das séries iniciais. Não se trata apenas de permitir o acesso, o manuseio, a leitura ou a produção de diferentes tipos de textos, mas efetivar um ensino sistemático [...].
Esse ensino sistemático deve acontecer de maneira que o aluno adquira
o conhecimento implícito do gênero, isto é, entenda as características contidas
nele e aprenda a utilizá-lo nas diversas situações de interação. O ensino
sistemático significa que ele seja ordenado para determinado gênero, isto é,
que passe por etapas que viabilizem o aprendizado do aluno. Entretanto,
mediante a dificuldade de entendimento apresentada pelo discente, somente a
sistematização do ensino pode não ser suficiente para sua aprendizagem,
cabendo ao professor providenciar outras atividades que venham a contemplar
essa aprendizagem, ampliando a sistematização.
O ensino de certo gênero de texto ministrado pelos professores sujeitos
da pesquisa é comum ao que acontece com outros colegas de profissão: o
gênero é ensinado, porém, não de forma sistemática, que dê tempo suficiente
para os estudantes apreenderem, ficando, por vezes, apenas como uma
abordagem superficial sobre o tema.
Assim, ainda de acordo com Santos (2007, p. 23), em situação escolar
o gênero apresenta uma espécie de desdobramento, pois serve como
ferramenta de interação social e objeto de ensino-aprendizagem.
Conforme relata Santos (2007, p. 23), “[...] ao mesmo tempo em que a
escola reflete o mundo extra-escolar, ela difere discursivamente deste mundo”,
o que, segundo a autora (2007, p.23), significa que o conhecimento escolar é
formado por generalizações.
Na prática dos professores o desdobramento ocorre como comumente
acontece nas escolas: o ensino dos gêneros de texto, embora tente se
aproximar ao máximo da realidade extraclasse, não a alcança. Os gêneros
abordados espelham a vida além dos muros escolares, todavia, não
representam as experiências vividas pelos alunos em seus cotidianos. Assim,
os professores ensinam o gênero, mas precisam da metalinguagem, o que
102
quer dizer, como afirma Santos (2007, p. 23), que “[...] faz-se necessário trazer
para a escola explicitamente os “comos” e “porquês” da linguagem”.
A fala de um professor, numa reunião pedagógica, que me fez refletir
muito sobre o que pensam certos profissionais ao ensinarem aos seus alunos,
quando disse que o ensino do gênero textual carta estava ultrapassado, pois
atualmente não se escrevem mais cartas para ninguém, sendo, portanto um
aprendizado inútil.
A posição daquele professor forçou-me a pensar no que temos ensinado
aos nossos estudantes, caso nosso pensamento seja retrógrado assim. De
fato, escrevemos poucas cartas, atualmente, porém, há que se pensar que
esse gênero nada mais é que o precursor dos e-mails.
Diz-nos Marcuschi (2010, p. 21) que “O e-mail (correio eletrônico) gera
mensagens eletrônicas que têm nas cartas (pessoais, comerciais etc.) e nos
bilhetes seus antecessores”. Portanto, as cartas eletrônicas são novas formas
de gêneros textuais que têm identidades próprias, assim como as cartas
escritas de próprio punho.
Além disso, num país imenso como o nosso, existem localidades cujas
tecnologias do correio eletrônico ainda são realidades distantes e seus
habitantes, até hoje, contam com o correio tradicional e a entrega de cartas e
mensagens escritas, provando que este gênero textual não está fora do
contexto social.
Assim sendo, os gêneros discursivos são de grande relevância para a
produção dos estudantes. Não somente para eles, mas, também, para todos
nós, falantes da língua materna, pois organizamos nossos discursos por meio
dos gêneros textuais. Afirma-nos Bakhtin (2011, p. 266) que “uma determinada
função [...] e determinadas condições de comunicação discursiva, específicas
de cada campo, geram determinados gêneros [...]”.
Ao ensinar gêneros textuais aos pequenos, o professor capacita-os para
as mais diversas situações de comunicação oral ou escrita. Desta forma, de
acordo com os PCNs (BRASIL, 2001, p. 25), para organizar seu discurso, o
falante precisa ter conhecimento do que seu interlocutor sabe sobre o assunto
a ser abordado. Necessita supor suas opiniões, convicções, com o que ele
simpatiza e antipatiza, o grau de afinidade e familiaridade que se tem com
103
relação a ele, bem como a posição social e hierárquica que ocupa. Ainda
conforme os PCNs (Idem, p. 25),
Isso tudo pode determinar as escolhas que serão feitas com relação ao gênero no qual o discurso se realizará, à seleção de procedimentos de estruturação e, também, à seleção de recursos linguísticos.
Então, ao aprender os gêneros do discurso, o aluno comunicar-se-á com
maior eficácia, tanto na escrita quanto na oralidade, o que reforça a
necessidade de a escola propor uma diversidade de textos para a apropriação
da escrita. Além disso, como afirma Mendonça (2007, p. 76), “A imensa
variedade de gêneros textuais existentes manifesta, verbalmente, as nossas
diversas necessidades de interação social mediadas pela linguagem, oral ou
escrita”.
Portanto, o professor deve se familiarizar com os gêneros, antes de
ensiná-los, entendendo como eles circulam e funcionam na sociedade. Desta
forma, é inevitável que ele faça estudos e comparações, conhecendo mais
profundamente o material a ser explorado, a fim de obter um melhor
aproveitamento. Mendonça (2007, p. 76) expõe que,
Nesse sentido, o docente deve articular sempre o conhecimento macro sobre o gênero – função social, formas de circulação, interlocutores privilegiados, temas frequentes, organização geral da informação – e o conhecimento micro a respeito – estruturação dos períodos, escolha de palavras, expressões, etc.
Desta maneira, o ensino dos gêneros não ficará muito polvilhado,
possibilitando ao estudante uma maior compreensão sobre cada abordagem.
Com relação a isso, Bezerra (2010, p.234) descreve que
O trabalho com gêneros textuais na sala de aula favorece a aprendizagem da escuta, leitura e escrita de textos diversos, com funções específicas, visto que a orientação do professor não será mais a de considerar apenas o aspecto formal do texto escrito, mas a de proporcionar o uso efetivo do texto por parte de seus alunos, abrindo-lhes oportunidade de se desenvolverem como cidadãos de uma sociedade letrada. Assim, a leitura e a escrita não serão apenas práticas escolarizadas.
Essas práticas, certamente, transporão os muros da escola e teremos
cidadãos mais conscientes e críticos.
104
Beth Marcuschi (2007, p. 62) nos fala que há um “deslizamento de
sentido” quando o gênero textual vai do espaço extraescolar para o escolar. O
que equivale a dizer que, quando trabalhamos com os alunos atividades de
leitura e produção, os gêneros textuais serão uma variação dos gêneros de
referência, “sobretudo no que diz respeito aos aspectos funcionais, mas, em
parte, também quanto às características linguísticas formais e à seleção dos
conteúdos e conhecimentos”. Então, é inevitável e benéfica a escolarização do
gênero, se desejarmos que nossos discentes sejam compreendidos em seus
enunciados e compreendam o enunciado do outro. Porém, a abordagem dada
aos gêneros textuais muitas vezes tem sido apenas como pretexto para o
ensino da gramática e da ortografia, em vez de, também, o ensino da produção
textual.
Ainda segundo a autora (2007, p. 62), cabe à escola a transposição do
gênero textual, transformando os saberes elaborados pela sociedade em
objetos de ensino. Todavia, esses devem ser explorados, não aplicados
superficialmente apenas para que o aluno saiba que existem determinados
gêneros de texto.
Os gêneros textuais, quando mais profundamente explicados, ajudam os
alunos a dominá-los melhor e, de certa forma, vão letrando-os. Um exemplo
disso ocorreu na sala do professor Antônio:
A leitura deleite foi retirada do livro de Língua Portuguesa e Daniel Luís leu “História para boi casar”, de Alessandra
Roscoe. [...] o professor [...] perguntou sobre o texto e qual era o outro texto que ele lembrava. Responderam que era “Boi da cara preta”. (PROTOCOLO n. 22, linhas 3-8, de 10/04/2013)
Como o professor explorava os textos lidos em sala, seus alunos
souberam fazer a intertextualidade entre a “História para boi casar” e a cantiga
“Boi da cara preta”. O professor Antônio, após as leituras deleite, sempre
questionava seus alunos sobre o que ouviram. Perguntava sobre personagens
e suas atitudes, palavras desconhecidas das crianças e o ensinamento que o
texto trouxe.
Certo dia, na leitura feita pela aluna Leyla do livro “O traço e a traça”, de
Roseana Murray, a palavra cotovia foi citada. Logo após a leitura, o professor
Perguntou o que era cotovia citada no texto. Ryan disse que era uma criança e Leyla, que era um animal. O
105
professor explicou o que era. Em seguida, perguntou sobre as personagens do livro. Responderam que eram João e Maria. Mostrou as fotografias [...] da autora e da ilustradora, perguntando se eles imaginavam como elas eram. (PROTOCOLO n. 23, linhas 10 – 16, de 15/04/2013)
Também a professora Luísa procurava letrar suas crianças, ora
explorando os textos lidos, ora explicando as palavras estranhas para eles,
surgidas durante a leitura.
Quando a leitura é feita respeitando as pontuações e dando vida às
vozes dos personagens, também é uma forma de letrar, pois chama a atenção
da criança, que ouve determinadas palavras e, desconhecendo seus
significados, pergunta ao professor. Uma vez conhecida a acepção da palavra,
ela vai procurar empregá-la em suas produções.
[...] a professora leu “A verdadeira história dos três porquinhos”. [...] durante a leitura Brenda perguntou o que era “inflar” e a professora explicou que era encher os pulmões de ar. Daniel perguntou o que era “rechonchuda” e a professora ensinou que era “gordinha” e de novo perguntou o que era “empanturrado” e a resposta foi que o lobo comeu demais, ficou muito cheio. Victor perguntou o que era “ir às favas” e a professora disse que era não dar nenhuma importância a algo. (PROTOCOLO n. 24, linhas 4 – 11, de 15/04/2013)
Ao final da leitura, a professora perguntou se eles emprestariam uma
xícara de açúcar ao lobo e eles, em uníssono, responderam que não
(PROTOCOLO n.24, linhas 11-13, de 15/04/2013). Então, para que haja um
entendimento do texto, são necessárias interrupções como essas, pois, se a
criança não entende o sentido de alguma palavra, também o sentido do texto
fica comprometido.
O ensino da produção textual por meio dos gêneros discursivos interfere
positivamente nesse trabalho. Alguns alunos da turma A escreveram seus
textos com dificuldade, mas por que acharam complicado, no início, escrever
uma história com as características da fábula, conforme vemos no protocolo n.
58, linhas 17-21, de 28/05/2013:
Alguns alunos acharam complicado escrever tendo que obedecer às características do gênero fábula, mas depois de trocarem ideias com os colegas, mais sobre a história que deveriam escrever do que como iriam escrever, desenvolveram seus textos.
106
Assim, depois de tornar a explicar os passos do gênero textual
abordado, as crianças se sentiram mais seguras para produzirem seus textos.
O domínio do gênero, mesmo que superficialmente, ainda, deu aos alunos a
ferramenta para suas produções, mesmo que aqueles estudantes não tivessem
se apropriado por completo dos itens constituintes da fábula.
Marcuschi (2008, p. 84) explica que, entre o discurso e o texto está o
gênero, visto como prática textual-discursiva e social que funciona como ponte
entre o discurso como uma atividade mais universal e o texto, isto é, “gêneros
são modelos correspondentes a formas sociais reconhecíveis nas situações de
comunicação em que ocorrem”.
Para Marcushi (2008, p. 154), os gêneros têm identidade e são
entidades poderosas que regulam a produção textual sob o ponto de vista do
léxico, grau de formalidade ou natureza dos temas e, ao mesmo tempo em que
impõem restrições e padronizações, são um convite a escolhas, estilos,
criatividade e variação.
Na turma B, da professora Luísa a produção textual da fábula também
teve algumas dificuldades. Algumas crianças não entenderam as explicações
sobre a constituição do gênero e a professora precisou retomar o assunto.
Depois de novas explicações, os alunos escreveram, conforme o Protocolo n.
59, linhas 17-22, de 28/05/2013.
Como os alunos ainda apresentavam dificuldade para compreender o gênero, a professora retomou as explicações. Para produzirem suas fábulas, as crianças perguntavam sobre os animais, se podiam fazer um texto com tal animal e algumas criaram estranhas amizades entre animais que realmente só cabem na imaginação fértil dos pequenos [...].
Assim, os alunos produziram seus textos fundamentados nas
explicações da professora sobre o gênero fábula, pois, de acordo com Leal e
Brandão (2007, p. 46),
[...] para produzir um texto, buscamos, na memória, os conhecimentos relativos ao tema, à organização e configuração dos textos, adotando gêneros textuais que, usualmente, estão presentes em situações comunicativas similares à determinada situação com a qual nos deparamos no momento. Precisamos, pois, gerar conteúdos. Organizar tais conteúdos em sequências
107
linguísticas, textualizando o que se quer dizer, e notar (registrar) o texto no papel.
Conforme Schneuwly e Dolz (2004, p. 77), os gêneros textuais
intermediam a aprendizagem e são considerados megainstrumentos pelo fato
de darem suporte para as atividades, nas situações de interação, e serem
referência para os estudantes. E é por ensinar a ler, a escrever e a falar que,
segundo os autores (2004, p. 78), a escola trabalha com os gêneros textuais,
pois “há um desdobramento que se opera em que o gênero não é mais
instrumento de comunicação somente, mas é, ao mesmo tempo, objeto de
ensino-aprendizagem”.
Desta forma, como enfatizam Leal e Brandão (2007, p. 55),
[...] promover a inserção de nossos alunos em diferentes esferas de interlocução, assim como possibilitar o acesso a diferentes gêneros textuais, é imprescindível para que eles construam modelos textuais que sirvam de referência para a escrita de novos textos.
Então, os gêneros discursivos têm grande relevância para a apropriação
da escrita de textos.
6 AS SEQUÊNCIAS DIDÁTICAS
Neste capítulo serão evidenciados os módulos que constituíram a
sequência didática e algumas atividades utilizadas como ferramentas para a
apropriação da fábula e qual o planejamento feito para dirimir as dúvidas
daqueles estudantes no que se referia ao gênero.
Ressalto, também, o principal objetivo do trabalho com sequência
didática, que é o de levar os alunos a se apropriarem da escrita utilizando para
isso o gênero textual fábula, mostrando suas características.
Como auxiliar na tentativa de sanar os problemas surgidos na primeira
produção, os professores aplicaram exercícios, que planejamos em conjunto.
Dicionários foram utilizados para que as crianças compreendessem o
significado de algumas palavras por elas desconhecidas. Textos construídos de
forma coletiva pelos estudantes também foi uma estratégia para o
entendimento do gênero, sendo que alguns alunos se destacaram na criação
do texto pelo fluxo de ideias.
108
Depois da produção inicial houve uma reestruturação de texto, que deu
ênfase à história criada, aos sinais de pontuação, à ortografia e aos parágrafos.
Os alunos participaram dessa atividade com entusiasmo e sempre sabiam
responder às perguntas que os professores faziam sobre a refacção do texto.
6.1 OS módulos da sequência didática
De acordo com Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 26), a
sequência didática “traz em sua proposta um diferencial que é favorecer ao
aluno a ‘ciência do que irá estudar, para que irá servir esse estudo e como irá
desenvolver esse estudo’”.
O ensino por sequência didática, ora apresentado, tinha como objetivo
principal levar os alunos a se apropriarem da escrita por meio do gênero textual
fábula, conhecendo suas características e utilizando-se delas para produzir
seus textos, já que os gêneros são instrumentos de aprendizagem, pois como
relata Marcuschi (2008, p. 212),
[...] quando alguém tem de agir discursivamente, deve instrumentalizar-se com um conjunto de utensílios, por exemplo, usando o garfo para comer, o machado para cortar uma árvore ou então um gênero como instrumento para agir discursivamente.
Desta forma, o gênero textual está presente no processo de ensino-
aprendizagem da escrita. Compartilhando dessa opinião estão Barros-Mendes,
Cunha e Teles (2012, p. 20) que dizem que
O trabalho com sequência didática torna-se importante por contribuir para que os conhecimentos em fase de construção sejam consolidados e outras aquisições sejam possíveis progressivamente, pois a organização dessas atividades prevê uma progressão modular, a partir do levantamento dos conhecimentos que os alunos já possuem sobre determinado gênero textual a ser estudado em todas as suas dimensões.
As autoras ainda ressaltam (2012, p. 21) que uma aprendizagem
significativa precisa de um ensino sistemático, que faça com que a criança
explore, experimente, reorganize informações e conceitos, buscando novas
aquisições.
109
Para Marcuschi (2008, p. 215), a produção inicial pode ser feita apenas
como um treinamento para o gênero, como um primeiro contato com o gênero,
o que é de suma importância, pois representa a primeira atividade de produção
na qual o texto será avaliado e revisto tantas vezes quanto for preciso,
passando por módulos até chegar ao estágio final de elaboração.
Assim, conforme os protocolos n. 58 e 59, de 28/05/2013 (vide p. 105-
106 dessa dissertação), turma A e turma B, respectivamente, fizeram a
primeira produção do gênero fábula. Essa foi a aula n. 2.
6.2 AS produções iniciais dos alunos
Definido o projeto de escrita para trabalharmos com as duas turmas
(vide p. 36 da dissertação) o gênero literário fábula foi exposto às crianças com
a leitura de algumas. Na sala da professora Luísa ocorreu a apresentação da
situação, conforme o Protocolo de Observação n. 56, linhas 4-9; 16-21 e 45-48,
de 27/05/2013. Essa foi a aula n. 1 da sequência didática.
[...] Então a professora disse que leria uma fábula, que eles passariam a estudar. [...] perguntou se eles sabiam o que era fábula. As respostas foram variadas. [...] leu para eles a fábula “A Cegonha e a Raposa”. Depois da leitura, que as crianças acharam muito curta, a professora [...] explicou que toda fábula tem uma moral e disse que nessa a lição era de que não devemos fazer para os outros o que não queremos para nós. [...] contou outra fábula “O Lobo e o Cão”, perguntando se eles perceberam que as fábulas trazem a presença de animais e que eles falam. [...] Explicou, também, que os animais da fábula agem como pessoas e têm sentimentos e que moral é um ensinamento que a história passa para a gente.
Houve uma explicação sobre o que as crianças fariam nos próximos dias
nas aulas de Língua Portuguesa, como uma negociação para as atividades que
estariam por vir, para que elas compreendessem melhor o gênero fábula que
estariam estudando a partir daquele dia.
[...] a professora explicou novamente que, por cerca de dois meses, nas aulas de Língua Portuguesa, eles trabalhariam com a leitura e a produção destas histórias. Os alunos gostaram e Hellen disse que seria “legal” ler muitas histórias na aula e a professora falou para eles prestarem atenção às leituras, pois no dia seguinte eles
110
escreveriam uma. (PROTOCOLO n. 56, linhas 9-15, de 27/05/2013)
Na sala do professor Antônio houve a apresentação da situação no
mesmo dia, porém depois do recreio e, da mesma forma, ele explicou a fábula
para seus alunos, conforme Protocolo de Observação n. 57, linhas 7-8 e 11-16,
de 27/05/2013:
[...] passou na lousa a fábula “O Filhote de Cervo e sua mãe”. [...] perguntou que gênero era aquele. Como não disseram que gênero era, o professor, junto com os alunos, fez a leitura. [...] explicou que nas fábulas os animais conversam como seres humanos e também trazem moral da história. Explicou que, no caso em questão, a moral da história era sobre enfrentar o medo.
O professor conversou com seus alunos sobre o que fariam nas aulas de
Língua Portuguesa nos próximos dias, explicando que eles começariam a
trabalhar o gênero fábula e deu os comandos para a produção textual do dia
seguinte.
Quando o professor leu as fábulas, explicou para as crianças que elas passariam a estudar o gênero nas aulas de Português, nos próximos dias, pois precisavam conhecer o gênero. Explicou, também, que elas produziriam textos e fariam atividades do gênero. Ao ouvir as palavras “produzir textos”, alguns alunos reclamaram, mas outros gostaram e já começaram a falar sobre que animais participariam de suas histórias. Novamente o professor disse para pensarem numa história como as que tinham ouvido para amanhã escreverem suas fábulas (PROTOCOLO n. 57, linhas 25-35, de 27/05/2013).
Assim, os professores das turmas A e B deram os comandos para que
os seus alunos fizessem a produção inicial da fábula.
A produção inicial trata-se de uma sondagem para vermos o que as
crianças abstraíram da apresentação da situação ou o que elas já conheciam
sobre os gêneros abordados. Analisando as primeiras produções é que veio a
constatação dos problemas que surgiram e que era preciso sanar, por meio de
atividades.
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.102) afirmam que “a produção
inicial tem um papel central como reguladora da sequência didática, tanto para
os alunos quanto para o professor”, pois é essa sequência que definirá o que é
111
preciso trabalhar para desenvolver as capacidades de linguagem dos
estudantes.
É durante a primeira produção que os alunos elaboram seu texto e
mostram o que entenderam sobre a apresentação da situação. Dolz, Noverraz
e Schneuwly (2004) afirmam que se a apresentação da situação for bastante
clara, todos os alunos serão capazes de produzir um texto, oral ou escrito, que
responda a situação dada, embora nem todos consigam respeitar as
características do gênero estudado. Os autores (2004, p. 101) informam, ainda,
que “cada aluno consegue seguir, pelo menos parcialmente, a instrução dada.
Esse sucesso parcial é, de fato, uma condição sine qua non para o ensino, pois
permite circunscrever a capacidades de que os alunos já dispõem [...]”.
A produção inicial da turma A (professor Antônio) ocorreu dessa forma,
conforme Protocolo n. 58, linhas 6-12, de 28/05/2013:
O professor explicou o significado de algumas palavras. Em seguida, as crianças partiram para a produção. Ficaram em silêncio por um tempo, pensando em seus textos, depois foram às mesas dos colegas trocarem ideias. [...] Alguns alunos não compreenderam e tiveram dificuldades para escrever.
A professora Luísa afixou um cartaz na lousa com a fábula “O filhote de
cervo e sua mãe” e explicou que, quando escrevemos um texto, não devemos
nos esquecer dos parágrafos e relembrou as características da fábula, de
acordo com o Protocolo n. 59, linhas 7-11, de 28/05/2013.
Depois, a professora distribuiu folhas para as crianças fazerem a primeira produção. Também nesta sala as dúvidas foram muitas. Faltando dez minutos para encerrar a aula, a professora recolheu os textos de quem já havia terminado [...].
Os problemas detectados com a produção inicial da turma A foram a
falta de diálogo entre os animais, sendo que esses apareciam, porém como
animais de estimação e a falta de moral da história, como nos comprova o
Protocolo n. 61, linhas 15-25, de 05/06/2013.
O professor lhes disse que, para ser fábula, eles precisavam dar voz aos animais e não apenas citar os animais. Depois disso, fizeram as atividades pertinentes à tarefa. Quanto a essas tarefas de interpretação do texto, algumas questões o professor perguntou oralmente [...]. Poucos erraram algumas perguntas, mas o mais importante é que entenderam a questão que perguntava
112
o que significava a frase “uma boa ação se paga com outra”, pois responderam que era a moral da história.
Com a turma B, os problemas detectados foram semelhantes, se não os
mesmos: contaram histórias sobre animais de estimação, sem que fossem os
protagonistas do texto e não havia, também, moral da história. O Protocolo n.
63, linhas 17-26, de 04/06/2013 mostra-nos como foi a primeira produção
daqueles alunos.
A professora devolveu as primeiras produções de fábula para os alunos verificarem onde eles se enganaram [...]. Esses alunos entenderam que a fábula tem como uma de suas características o diálogo entre animais, porém, também, nenhum deles escreveu uma moral para a história.
Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 102), essas primeiras
produções constituem ricos momentos de observação, pois elas “[...] permitem
refinar a sequência, modulá-la e adaptá-la de maneira mais precisa às
capacidades reais dos alunos de uma dada turma”. Os autores afirmam, ainda,
que elas também mostram, de maneira precisa em que ponto os alunos estão e
quais dificuldades encontradas por eles. Assim, o professor obtém informações
até para, se for o caso, individualizar o ensino e, a partir daí, aplicar as
atividades que venham de encontro com as dificuldades apresentadas pelos
alunos.
Estes exercícios fazem parte dos módulos, terceiro componente da
sequência didática, assim preconizados por Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004,
p. 103): “Nos módulos, trata-se de trabalhar os problemas que apareceram na
primeira produção e de dar aos alunos os instrumentos necessários para
superá-los”.
Concordando com as ideias de Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004) está
Costa (2000, p. 72), que assegura que
Apropriar-se, [...] dos gêneros, sistematicamente, mediados por estratégias de ensino intervencionistas formalizadas, é reconstruir a linguagem em novas situações concretas de comunicação, mais complexas, que certamente levarão os alunos a uma autonomia progressiva nessas atividades comunicativas complexas.
A sequência didática é um modo de os estudantes apropriarem-se dos
instrumentos de linguagem próprios ao gênero. É, portanto, um modo de
113
preparar os alunos para a produção final e, consequentemente, para produções
de textos orais e escritos que eles venham a produzir no decorrer de suas
vidas.
Detectados os problemas surgidos na primeira produção, tentamos,
professores e pesquisadora, resolvê-los por meio dos módulos das sequências
didáticas, o que explanarei mais adiante.
Analisando a produção inicial, professores e pesquisadora puderam
intervir nos pontos onde surgiram os problemas a serem sanados e, de acordo
com essa avaliação, foram detectados:
Falta de animais personificados, isto é, com características humanas;
Presença de animais de estimação;
Falta de moral da história;
Moral da história não condizente com o texto;
Falta de pontuação;
Marcas da oralidade nos textos.
Tais itens justificaram as escolhas das atividades elaboradas e aplicadas
na sequência didática. Outros problemas surgidos são relacionados ao nível de
alfabetização dos educandos, como ortografia, por exemplo, que tendem a
desaparecer com o decorrer do ano letivo.
6.3 A sequência didática do gênero fábula
Antes de expor como foi o trabalho com a sequência didática e os
módulos, mostrarei um quadro que sintetiza o que ocorreu em cada dia da
pesquisa com o gênero fábula.
Quadro 17 - Síntese das atividades da sequência didática
DIA/MÊS ATIVIDADES
27/05 Apresentação da situação com leituras de fábulas e explicação sobre as características do gênero fábula.
28/05 Leitura e interpretação oral de fábulas; distribuição de textos para leitura e familiarização com o gênero; produção inicial da fábula.
29/05 Leitura e interpretação oral de fábulas; leitura das fábulas distribuídas aos alunos na aula anterior; leituras de fábulas na biblioteca escolar pelos alunos e bibliotecária com discussão sobre o texto.
03/06 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; entrega das produções iniciais para os alunos analisarem; ilustração de fábula.
114
04/06 Início dos módulos: leitura de fábula por meio de cartaz; atividade de consolidação da fábula “A pomba e a formiga”.
05/06 Leitura de fábulas na biblioteca; leitura e interpretação oral e escrita da fábula “O lobo e o burro”; pesquisa em dicionários de palavras da fábula, desconhecidas pelos alunos.
10/06 Leitura e interpretação oral de fábula; reestruturação de fábulas criadas pelos alunos.
11/06 Leitura e interpretação oral de fábula; texto explicativo sobre o gênero.
12/06 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula.
17/06 Leitura e interpretação oral de fábula; reestruturação de fábulas criadas pelos alunos, com ênfase nos sinais de pontuação e parágrafo.
18/06 Leitura e interpretação oral de fábula; produção coletiva de fábula.
01/07 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; pesquisa em dicionários de palavras da fábula, desconhecidas pelos alunos.
02/07 Leitura e interpretação oral e escrita de fábula; agrupamento dos alunos em duplas por nível de conhecimento (alunos A ou AB com alunos C) para trabalharem a interpretação do texto.
03/07 Leitura de fábula; produção final do gênero fábula. Fonte: Dados da pesquisa.
Portanto, atividades de consolidação, interpretação das fábulas,
reestruturação de texto e pesquisa em dicionários das palavras desconhecidas
foram aplicadas, além das leituras diárias de fábulas, até mesmo nas leituras
deleite.
A aula n. 3, conforme protocolo n. 60, linhas 20-30, de 29/05/2013, da
turma B, iniciou com os alunos lendo as fábulas que a professora havia
distribuído para eles na aula anterior e que levaram para casa para lerem. Os
que desejaram, foram à frente para ler seus textos para os demais colegas.
Após a leitura, fomos à biblioteca da escola.
Lá, a bibliotecária leu a fábula “A raposa que sabia tudo”. Depois da leitura e da discussão sobre o texto lido, a bibliotecária distribuiu algumas fábulas para os alunos lerem.
Na sala do professor Antonio, o protocolo n. 61, linhas 25-30, de
03/06/2013, a aula n. 4 começou com a leitura da fábula “A mulher e sua
galinha”, de Esopo. Depois, com base nas produções iniciais, o professor falou
para os alunos que para ser fábula
[...] eles precisavam dar voz aos personagens e não apenas citar os animais. [...] o professor entregou as primeiras produções das fábulas feitas pelos alunos para que eles vissem onde estavam os erros cometidos. Alguns alunos vieram me perguntar onde estava errado e eu expliquei a eles o que estava faltando para ser uma fábula.
115
O primeiro módulo, ou aula n. 5, na sala da professora Luísa, deu-se
como registrado no Protocolo de Observação n. 63, linhas 20-26, de
04/06/2013.
Depois de verificarem os erros, os alunos devolveram seus textos à professora, que seguiu passando atividades de interpretação e consolidação da fábula. Assim, detectado o problema de entendimento com as fábulas, inicia-se o módulo 1, que trata de atividades que venham auxiliar os alunos a dominarem esse gênero.
Na sala do professor Antonio, de acordo com o protocolo n. 64, linhas
13-16, de 04/06/2013.
Os exercícios passados no quadro eram sobre a fábula “A formiga e a pomba”, que está fazendo parte do primeiro módulo, a fim de que as crianças compreendam melhor e venham a dominar esse gênero.
A aula n. 6, na turma A começou com o professor levando os alunos
para a biblioteca escolar, porém a bibliotecária leu para eles um livro sobre
cuidados na escola. Depois da leitura e discussão do texto, como registrado no
protocolo n. 65, linhas 6-9 e 15-19, de 05/06/2013,
[...] a bibliotecária distribuiu alguns livros de fábulas para os alunos lerem. Relutaram, inicialmente, pois os livros não traziam figuras, mas depois começaram a ler e gostaram. Terminado o horário, os alunos retornaram à sala. [...] o professor distribuiu o texto da fábula “O lobo e o burro”, de Esopo. Depois, leu o texto e explorou-o oralmente.
E seguida, o professor trabalhou o vocabulário do texto e escreveu na
lousa as palavras desconhecidas pelos alunos, que eles mesmos ditaram e
depois pesquisaram em dicionários.
A figura 2 demonstra uma das atividades focadas no ensino-
aprendizagem do gênero.
Figura 2 - Fábula com atividade de consolidação e interpretação
A formiga e a pomba
116
Uma formiga sedenta veio à margem do rio para beber água.
Para alcançá-la, devia descer por uma folha de grama. Quando
assim fazia, escorregou e caiu dentro da correnteza.
Uma pomba, pousada numa árvore próxima, viu a formiga em
perigo.
Rapidamente, arrancou uma folha da árvore e deixou-a cair no rio,
perto da formiga, que pode subir nela e flutuar até a margem.
Logo que alcançou a terra, a formiga viu um caçador de pássaros,
que se escondia atrás duma árvore, com uma rede nas mãos.
Vendo que a pomba corria perigo, correu até o caçador e mordeu-
lhe o calcanhar. A dor fez o caçador largar a rede e a pomba fugiu para
um ramo mais alto.
De lá, ela arrulhou para a formiga:
__ Obrigada, querida amiga.
“Uma boa ação se paga com outra”.
(Esopo)
Assinale com um x as respostas corretas
1) Este texto é uma fábula porque apresenta características como
(A) humor e seres encantados
(B) instruções e imagens
(C) tabelas e informações científicas
(D) animais como personagens e moral da história
2) O texto começa dizendo: “Uma formiga sedenta veio à margem do rio para
117
beber água. Para alcançá-la devia descer por uma folha de grama”. A palavra
sublinhada refere-se a
(A) grama (B) água
(C) folha (D) formiga
3) A formiga se salvou da correnteza porque
(A) o rio parou de correr
(B) o caçador a tirou de dentro do rio
(C) caiu um galho de árvore em que ela se apoiou
(D) ela subiu numa folha de árvore jogada ao rio pela pomba
4) A formiga viu o caçador preparado para caçar a pomba no momento em que
(A) se debatia na correnteza (C) se escondia atrás de uma árvore
(B) foi presa pela rede do caçador (D) alcançou a terra
5) No início do texto, diz-se que a formiga estava sedenta. Isto significa que a
formiga estava com
(A) fome (B) frio
(C) sede (D) calor
6) "Uma boa ação se paga com outra". A frase, escrita entre aspas e em letras
maiores que as do texto, indica
(A) a moral da história
(B) que a história acabou
(C) a amizade que se formou entre a pomba e a formiga
(D) que foi o caçador de pássaros quem falou
Fonte: Dados da pesquisa.
A aula n. 7, na turma B, foi aberta com a leitura da fábula “A raposa e a
galinha”, cuja moral não era explícita, mas os alunos compreenderam-na no
decorrer da leitura, como está posto no protocolo n. 67, linhas 4-6 e 9-17, de
10/06/2013.
[...] a professora falou para os alunos que hoje eles fariam a reestruturação de uma fábula escrita por uma das alunas. [...] a fábula em questão foi “O lagarto, o sapo e a mamãe”. A aluna havia escrito “O lagato e o sapo e a mamae”. A professora, com a ajuda dos alunos, linha por linha do texto foi reestruturando-o. [...] os alunos Hellen e Carlos deram sugestões de moral da história. A de Hellen foi “nunca brigue com seu amigo, pois um dia pode precisar dele”. A moral de Carlos foi “uma boa amizade gera outra amizade”. O texto reestruturado foi afixado num cartaz na parede da sala.
118
Na sala do professor Antonio, a turma A, conforme o protocolo n. 68, de
10/06/2013, a fábula reestruturada foi a de Ricardo, “Dico, o lagartinho”, porém,
infelizmente, o professor fez quase que sozinho a reestruturação, sem envolver
a turma como deveria pouco lhes perguntando o que, na opinião deles, estava
incorreto.
Na aula n. 8, o professor voltou a explicar sobre as fábulas e passou na
lousa um texto explicativo sobre o gênero e, em seguida, a fábula “A raposa e
o corvo”, de acordo com o protocolo n. 69, linhas 8-12 e 17-20, de 11/06/2013.
Ao terminar de passar o texto, o professor foi olhar os cadernos e viu que quase todos os alunos copiaram sem respeitar os parágrafos. Então, o professor pediu que eles refizessem o texto da maneira correta. [...] falou que vai exigir uma produção de texto com parágrafos e pontuações corretas, mesmo porque as pessoas que leem seus textos precisam entender o que está escrito.
A aula da professora Luísa começou com ela perguntando às crianças o
que elas aprenderam sobre a fábula. Em conformidade com o protocolo n. 70,
linhas 2-13, de 11/06/2013, as respostas foram variadas.
Alex disse que era uma história pequenininha. Brenda disse que ensina muito. Carlos disse que era “um conto de fadas que faz as crianças lê e aprender a moral”. Tiago diz que “é feita pra ler, gostar e escrever”. Heitor, que são lendas que os animais fizeram. Helena, que “é bom pra ler e aprender ler”. Gabriela, que “é divertido pra ler”. Daniela, que “são história bem legal”. Daniel, que “é bom pra ler e pra brincar”. Eduardo disse que “é história que tem nos livro pra aprender a ler, escrever e responder as pergunta que a senhora faz”. Depois que as crianças falaram, a professora passou um texto resumido, explicando o que é fábula.
A aula 9, na sala de Luísa foi lida a fábula “O pescador e o peixe” e, na
sala do professor Antônio, a leitura deleite também foi uma fábula. Depois das
leituras os professores, cada um em sua respectiva sala, passaram atividades
de interpretação e consolidação do gênero. As aulas foram registradas nos
protocolos 71 e 72, do dia 12/06/2013.
A aula n. 10, na turma A, a leitura deleite da fábula “Assembleia dos
ratos” foi feita pela aluna Juliana. Nessa aula foi feita a reestruturação do texto
de Ryan “O lobo e a raposa”, que foi exposto num cartaz e afixado na parede
da sala. Na turma B, foi feita a reestruturação da história de Tiago, “A tartaruga
119
marinha”. Na reestruturação de textos foram trabalhados os sinais de
pontuação, como os dois pontos e travessões que marcam o diálogo, os
pontos finais, de interrogação e as vírgulas. O assunto vinha sendo abordado
oralmente em todas as aulas.
Todavia, para Marcuschi (2008, p. 218), sobre a revisão ortográfica dos
textos dos alunos,
[...] não são questões de gênero textual, mas podem ser tratados na produção linguística escrita sem dificuldade, dentro dos módulos [...]. O trabalho da ortografia não deve sobrepor-se ao trabalho efetivo com a produção textual, pois a ortografia é um detalhe específico que deve ser cuidado, mas com outro tipo de atenção e exposição do aluno. Transformar a revisão ortográfica em centro dos problemas é desvirtuar todo o trabalho com a sequência didática. (grifos meus)
A aula n. 11 foi composta por leituras e interpretação oral de fábulas e
produção coletiva de textos do gênero. A turma A produziu o texto “O urso e o
peixinho dourado”. A turma B fez o texto “O sapo e a coruja”.
A proposta de produzirem uma fábula, na turma B, logo foi aceita e
construíram coletivamente um texto, tendo a professora como escriba, que ia
perguntando sobre as pontuações, a grafia correta das palavras e ajudando-os
no encadeamento da produção. A história ficou curta e a moral da história não
foi condizente com o texto, porém foi escrita como eles elaboraram e ditaram,
conforme protocolo n. 74, linhas 3-10, de 17/06/2013 (aula n.11).
O sapo e a coruja O Sapo e a Coruja brincavam alegremente, quando um bruxo malvado chegou. Ele falou: -Abram a porta ou eu vou transformar vocês em estátuas. Eles ficaram com medo. E o Sapo falou: - Não vamos abrir a porta! A Coruja teve uma ideia: - Vamos sair pela janela do fundo. Os dois saíram correndo. Quando o bruxo entrou não encontrou ninguém e ele ficou bravo. Moral da história: uma boa pessoa ajuda a outra.
Embora a narrativa acima tenha sido uma produção coletiva dos alunos
da turma B e contenha personagens animais com falas e ações que se
assemelham às humanas, não se trata de fábula.
120
Com a turma A (aula n. 11), a construção do texto assim ocorreu:
[...] o professor passou o cabeçalho no quadro e informou aos alunos que eles fariam uma produção coletiva de uma fábula. Perguntou, então, se eles se lembravam das características das fábulas e eles responderam que eram os animais que falavam como gente. Durante a produção os alunos foram bastante participativos, produzindo a fábula “O Urso e o Peixinho Dourado”. Souberam também dar uma moral condizente com o texto. (PROTOCOLO n. 77, linhas 4-13, de 01/07/2013)
Nessa sala os alunos conseguiram trabalhar bem a produção coletiva,
iam tendo as ideias e o professor registrando, foram bastante participativos,
tanto que o texto ficou um pouco longo. Vejamos:
O Urso e o Peixinho Dourado Era uma vez, um urso que foi pescar. Ele pegou um belo peixe dourado e levou-o para casa, colocou-o num aquário para dar-lhe mais vida. Então o Peixinho falou:
- Ó, meu pai, onde estou? O Peixinho tentou escapar e pulou no chão. Ele estava sufocando fora da água, quando o Urso o encontrou e colocou-o de volta e tampou o aquário para ele não fugir mais. O peixinho teve uma ideia: -Vou me fingir de morto para o urso me tirar daqui, me levar para o lago e eu conseguir fugir e viver longe do Urso. E assim aconteceu! Ao chegar no lago, Peixinho Dourado viu que lá morava um crocodilo que correu atrás dele, mas não conseguiu pegá-lo, pois estava muito cansado. Um pescador pegou o crocodilo, levou-o para o rio, salvando Peixinho Dourado e o Urso que estava por perto, arrependeu-se de aprisionar o peixinho, chamou-o e disse: - Peixinho Dourado, o que eu fiz é muito feio. Você aceita ser meu amigo? Peixinho Dourado aceitou a amizade do urso e sempre estavam juntos e sem brigas. Moral da história: Não devemos maltratar as pessoas, mas ser amigos de todos.
O texto ficou longo, pois os alunos iam dando opiniões, sendo que
William era o maior entusiasta.
121
A aula n. 12, além das leituras deleite que foram fábulas, houve a
interpretação oral e escrita de fábulas e retiradas as palavras de significados
desconhecidos pelos alunos para que pesquisassem em dicionários.
Na aula n. 13, as turmas leram a fábula “O julgamento da ovelha” e,
depois, fizeram atividades de interpretação oral e escrita do texto. Os
professores separaram os alunos em duplas, de maneira que um dos
componentes da dupla pudesse ajudar o parceiro a fazer a tarefa. Isso já foi
feito em outras ocasiões, o que deu um bom resultado, pois os que conversam
muito e se dispersam, são chamados pelos colegas de dupla e voltam às
atividades e, assim, auxiliam uns aos outros. Os agrupamentos foram por
níveis de aprendizado, isto é, um aluno diagnosticado A ou AB, auxilia os
colegas diagnosticados como C, como registrado no protocolo n. 78, linhas 13-
18, de 02/07/2013.
A aula n. 14 foi dedicada à produção final do gênero fábula. Na turma A,
conforme o protocolo n. 80, linhas 4-16, de 03/07/2013, o comando do
professor para a produção foi de que fizessem um texto, criado por eles, ou
recontassem algum que já conhecessem. De toda a turma apenas três alunos
fizeram o reconto e os demais optaram por inventar uma história.
6.4 AS produções finais dos alunos
A produção final é o quarto componente da sequência didática.
Consoante a Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.106), “A sequência é
finalizada com uma produção final que dá ao aluno a possibilidade de pôr em
prática as noções e os instrumentos elaborados separadamente nos módulos”.
Com essa produção, o professor realiza a avaliação somativa.
Nessa avaliação do tipo somativo, conforme os autores (2004, p.107), “o
importante é que o aluno encontre, de maneira explícita, os elementos
trabalhados em aula e que devem servir como critérios de avaliação”. Os
critérios servem para também observar as aprendizagens e planejar a
continuação do trabalho, possibilitando a volta a pontos que não foram bem
apreendidos pelos alunos.
Nas produções finais dos alunos da turma A, do gênero fábula, o
professor propôs às crianças que escrevessem uma fábula de autoria deles
122
próprios ou que fizessem um reconto. As maiores dúvidas foram sobre o que
iriam escrever e, conforme o Protocolo n. 80, linhas 9-16, de 03/07/2013, os
alunos
Iniciaram a produção às 13h30min. [...] A maioria optou por inventar, pois alguns alegaram não se lembrar de nenhuma. Cerca de 30 minutos depois, Ryan entregou sua produção. A última aluna a entregar o fez às 14h30min. Nessa sala, a produção foi feita por 22 alunos. Desses, apenas 3 fizeram o reconto de uma fábula.
Depois da produção, que demorou cerca de uma hora, o professor deu
continuidade a uma atividade de pesquisa em dicionários que eles estavam
fazendo na aula anterior.
Com a turma B, como registrado no protocolo n. 81, linhas 1-15,
de 03/07/2013, o comando da professora para a produção final, foi de que as
crianças fizessem um texto criado por elas ou recontado de algum que já
ouviram anteriormente, dizendo que a pesquisadora sairia de férias e desejava
levar um texto delas como lembrança. Assim, a produção, para a maioria dos
alunos, terminou cerca de quarenta minutos depois de iniciada, pois haveria
um ensaio para a dança da quadrilha da festa junina da escola e algumas
crianças estavam inscritas. Heitor foi o último a entregar, aproximadamente
uma hora e vinte minutos depois de começar e Caterina não quis fazer logo
que a professora pediu, alegando que não se lembrava do gênero e nem de ter
ouvido nenhuma história. Pressionada pela professora, ela resolveu escrever,
porém ficou muito semelhante à primeira produção, que falava de uma amiga e
do cachorro de estimação. Durante a sequência didática, todas as leituras
nessa sala foram fábulas, inclusive as deleite.
Nessa turma a professora Luísa fez a mesma proposta, isto é, que os
alunos produzissem uma fábula já conhecida deles, um reconto, ou que
criassem uma. Assim, ocorreu a produção final de acordo com o Protocolo n.
81, linhas 3- 10, de 03/07/2013.
A produção teve início às 15h35min. A primeira produção foi entregue às 16h05min. Nessa sala, todos os alunos foram autorizados pelos pais a participar da pesquisa. O último aluno a entregar o texto foi Heitor, que o fez às 16h55min.
123
Todos entregaram suas fábulas, exceto Caterina, que não conseguiu
produzir e nem se lembrar de nada que foi lido nas aulas, embora a docente
tenha trabalhado a leitura de fábulas, inclusive nas leituras deleite, porém,
diante da insistência da professora, a aluna resolveu escrever seu texto.
Na sala do professor Antônio, trabalhos envolvendo o uso do dicionário
eram constantes. Na turma da professora Luísa a atividade foi novidade para
as crianças que se envolveram e se encantaram com a tarefa, como se cada
palavra encontrada fosse uma nova descoberta. Vejamos o Protocolo n. 75,
linhas 16-24, de 18/06/2013.
Nos exercícios de consolidação da fábula havia algumas palavras para serem pesquisadas no dicionário. Alguns dicionários não traziam todos os verbetes pedidos, então a professora pediu para formarem duplas e usarem os dicionários mais completos. Quando conseguiam encontrar a palavra que buscavam, ficavam muito felizes e corriam para mostrar à professora. A professora chamou os alunos para pegarem o lanche, mas alguns não quiseram sair, pois estavam gostando da atividade.
O texto referente a essa atividade foi “A Fábula do Porco-espinho” e as
palavras a serem pesquisadas eram “glacial”, “mutuamente”, “conviver”,
“relacionamento” e “admirar”, que foram escolhidas pelos professores e
pesquisadora. As palavras foram explicadas com o verbo no modo indicativo
para que as crianças encontrassem-nas com maior facilidade.
Atividades como essas e as dos módulos da sequência didática,
segundo Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 26), visam
Não somente a desenvolver conhecimento acerca do gênero em estudo (condições de produção, forma de composição, etc), mas [...] também de domínio do SEA [Sistema de Escrita Alfabética] (grafar corretamente palavras com correspondências regulares diretas entre letra e fonemas como em P, B, T, D, F, V; usar letra maiúscula e minúscula nos textos produzidos, segundo as convenções).
Isso foi possível notar, durante a sequência didática, pois os alunos se
esforçaram para grafar as palavras corretamente e até mesmo tentaram utilizar
outras mais formais, incomuns às suas falas cotidianas, mas presentes nos
textos lidos e ouvidos por eles.
Segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 103), os módulos são
aplicados para trabalhar os problemas que apareceram na primeira produção
124
do gênero, dando aos alunos os instrumentos necessários para que venham a
superar esses entraves. Os autores (2004, p.103) sugerem, ainda, que
A atividade de produzir um texto escrito ou oral é, de uma certa maneira, decomposta, para abordar, um a um e separadamente, seus diversos elementos, [...]. O movimento geral da sequência didática vai, portanto, do complexo para o simples: da produção inicial aos módulos, cada um trabalhando uma ou outra capacidade necessária ao domínio de um gênero. No fim, o movimento leva novamente ao complexo: a produção final.
Marcuschi (2008, p. 216) explica que nos módulos, depois que o aluno
aprendeu a falar sobre o gênero e “adquirido meios de observá-lo sob vários
pontos de vista, ele deve adquirir uma linguagem técnica para se expressar
sobre o que está fazendo”.
Os módulos foram trabalhados de acordo com o que foi detectado nas
primeiras produções dos alunos, culminando com a produção final. A produção
final apresentou, ainda, alguns problemas. Alguns alunos não se apropriaram
completamente do gênero, mas gostaram muito das atividades.
Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 23) afirmam que o trabalho
pedagógico por meio de sequência didática tem sido apontado como positivo
pelo fato de apresentar muitas vantagens
Que poderão auxiliar a minimizar o déficit de aprendizagem no ensino de língua materna, desde as séries iniciais ao final da educação básica, pois, apesar de hoje se ter clareza de que os gêneros textuais precisam estar em sala de aula como ferramenta de ensino, ainda há dúvidas de como explorá-lo de modo efetivo.
Nesse trabalho com sequência didática, como será explicitado mais
adiante, alguns alunos que se encontravam em processo mais inicial de
apropriação da escrita, passaram a escrever de maneira mais inteligível, depois
da intervenção. Isso é uma somatória do ensino de gêneros por meio de
sequência didática, que ocupou todas as aulas de Língua Portuguesa no
período de 27/05 a 03/07 e de outros trabalhos com a linguagem feita pelos
professores.
Segundo Marcuschi (2008, p. 213), o caráter modular da sequência
didática contribui para a compreensão dos gêneros e, a exemplo do que
125
disseram as autoras acima citadas, pode ser aplicado a todas as séries do
ensino fundamental. E a ideia central é a de que se
[...] devem criar situações reais com contextos que permitam reproduzir em grandes linhas e no detalhe a situação concreta de produção textual incluindo sua circulação, ou seja, com atenção para o processo de relação entre produtores e receptores. (2008, p. 213)
Para Marcuschi (2008, p. 217), o trabalho com os módulos permite que
os casos em que não houve sucesso na aprendizagem sejam retrabalhados,
podendo haver um trabalho diferenciado sem a necessidade de divisão de
turmas.
A sequência didática foi adotada com a intenção de auxiliar os alunos a
melhor compreenderem esse gênero e produzirem textos melhores. Desta
forma, como apontam Nascimento, Silva e Lima (2012, p. 169),
Diante de uma tarefa de produção textual, oral ou escrita, precisamos lançar mão de todos os conhecimentos que temos em relação ao tema, ao gênero e às práticas de linguagem em que tal gênero circula.
Então, é a sequência didática que vai dar o contributo ao aluno, a fim de
fazê-lo conhecer o gênero e torná-lo um escritor mais competente. Para
Barros-Mendes, Cunha e Teles (2012, p. 23), com as atividades elaboradas em
cada módulo da sequência didática, “a criança mobiliza as capacidades já
construídas integrando-as em um todo maior”.
126
7 AS PRODUÇÕES DOS ALUNOS NO GÊNERO FÁBULA
Acreditar nas sementes Mantê-las bem quentes nas mãos Saber ler do livro dos ventos Saber bem do cheiro do chão.
Gonzaguinha
O ensino de gêneros textuais tenciona lançar uma semente que
produza, sempre e cada vez mais, bons frutos, que as atividades levem os
alunos a refletir sobre a escrita de modo consciente e produtivo.
O gênero fábula estava presente nas duas salas apenas por meio das
leituras deleite, ou seja, os professores liam para as crianças, sem, no entanto,
trabalhar o tema com elas.
A abordagem do gênero fábula para os aprendizes foi interessante, pois
eles estavam acostumados com histórias mais longas e acharam a fábula um
texto bastante curto. O professor Antônio, de acordo com o Protocolo n. 58,
linhas 12 - 17, explicou o gênero em questão para seus alunos:
[...] explicou novamente, lendo num livro, que fábulas são pequenas histórias escritas com a intenção de ensinar
127
algo e que essas histórias mostram situações das vidas dos seres humanos, mas vividas por animais. Ele falou, também, dos maiores fabulistas do mundo.
Na sala da professora Luísa, também houve a explicação, conforme
Protocolo n. 60, linhas 25 - 31:
Retornando à sala, a professora explicou, lendo num livro de fábulas, que elas são histórias curtas que alguns fabulistas escreveram para ensinar algo para as pessoas. Falou sobre os mais famosos escritores de fábulas e que elas mostram situações do dia-a-dia das pessoas, mas vividas por animais.
O texto mencionado nas citações é um livro de fábulas, contos e lendas,
que trazia uma explicação simples sobre esses gêneros e, quanto às fábulas, o
esclarecimento era esse:
As fábulas são pequenas histórias escritas com a intenção de transmitir algum ensinamento sobre a vida, ou o que se chama “lição de moral”; no final de muitas delas o autor coloca uma frase que resume a lição. [...] a maior parte das fábulas mostra situações típicas do dia-a-dia dos seres humanos, mas vividas por animais. Os mais famosos fabulistas (autores de fábulas) foram: Esopo [...] e La Fontaine [...]. No Brasil, Monteiro Lobato [...], reescreveu muitas delas; nos dias de hoje, o mesmo foi feito por Millor Fernandes (BRASIL, FUNDESCOLA/SEF-MEC, 2000, p. 5).
As fábulas apresentadas para as turmas foram, na maioria, as de Esopo.
Algumas fábulas lidas não apresentavam a moral da história, porém as
crianças entendiam o ensinamento implícito no texto.
Em termos bakhtinianos, o emprego da língua consolida-se por meio de
enunciados que refletem as condições específicas e as finalidades de cada
campo da atividade humana. Desta forma, como explicita o teórico (2010, p.
261), os gêneros discursivos são o produto da união de três elementos que os
caracterizam como o conteúdo temático, o estilo e a construção composicional,
que “estão indissoluvelmente ligados no todo do enunciado e são igualmente
determinados pela especificidade de um determinado campo de comunicação”.
Schneuwly (2004, p. 26), com referência à construção composicional do
gênero, diz que essa é um “tipo de estruturação e acabamento e tipo de
relação com os outros participantes da troca verbal”.
Para Cardoso (2002, p. 96), as três dimensões do gênero são:
128
1. Os conteúdos que são (que se tornam) dizíveis através dele;
2. A estrutura (comunicativa) particular dos textos pertinentes ao gênero;
3. As configurações específicas de linguagem, que são sobretudo traços da posição enunciativa do enunciador, e os conjuntos particulares de sequências textuais e de tipos discursivos que formam sua estrutura.
Assim sendo, a construção composicional da fábula são os elementos
que a constituem, como título; animais personificados, ou seja, com atitudes
humanas; moral da história; e o narrador em 3ª pessoa.
De acordo com Coelho (2000, p. 164), “há uma multiplicidade de formas
narrativas que vêm, desde a origem dos tempos [...]. São elas: fábula, apólogo,
parábola, [...] conto maravilhoso, [...] conto de fada, [...] etc.” Em tais narrativas,
prosa ou verso, o narrador relata a história de forma simples e direta.
Geralmente, têm poucos episódios, um desfecho claro e uma frase que indica a
moral da história.
O conteúdo temático da fábula é, pois, o que é possível ser dito em
textos desse gênero. Define o assunto abordado que, no caso da fábula,
geralmente é uma crítica ou ironia a determinados comportamentos humanos.
Nos Cadernos de Apoio e Aprendizagem da Fundação Padre Anchieta (2010,
p. 23), lemos que “a fábula apresenta um conteúdo didático-moralista que
veicula valores éticos, políticos, religiosos ou sociais”.
O estilo nas fábulas obedece às regras de uma linguagem formal, se
escritas e informal, quando oralizadas.Para Schneuwly (2004, p.26) o estilo
“deve ser considerado não como um efeito da individualidade do locutor, mas
como elemento de um gênero”.
Nas palavras de Bakhtin (2010, p. 266), o estilo é
Indissociável de determinadas unidades temáticas e – o que é de especial importância – de determinadas unidades composicionais: de determinados tipos de construção do conjunto, de tipos do seu acabamento, de tipos da relação do falante com outros participantes da comunicação discursiva – com os ouvintes, os leitores, os parceiros, o discurso do outro, etc. o estilo integra a unidade de gênero do enunciado como seu elemento.
Koch e Elias (2010, p. 60) dizem que é a construção composicional, o
conteúdo temático e o estilo que vão definir o contrato como contrato e não
129
como uma declaração ou qualquer outro gênero. Da mesma forma, esses três
elementos vão caracterizar o gênero fábula como sendo uma fábula e não um
conto. Todavia, não irei analisar o estilo nas produções dos alunos.
Então, definidas as dimensões do gênero fábula, Os textos dos alunos
serão analisados de acordo com suas adequações ao gênero, o conteúdo
temático, o estilo e a construção composicional, os três elementos que o
caracterizam.
Desse modo, os textos serão estudados, primeiramente, em seu
conjunto a partir da categoria geral “Adequação ao gênero”. Para tanto, procuro
responder às seguintes questões:
1. Possui título?
2. O título relaciona-se coerentemente ao gênero?
3. O conteúdo temático envolve animais?
4. Os animais são personificados?
5. Há a presença de moral da história?
6. A moral da história é condizente/coerente com o texto?
Dentro dessa categoria maior, as escritas das produções inicial e final
dos alunos serão, também, analisadas em subcategorias, a saber:
1 intertextualidade na escrita;
1.2 apropriação/consolidação da escrita;
1.3 sinais de pontuação;
1.4 marcas da oralidade na escrita.
Assim, será possível perceber se os textos estão de forma parcial,
completamente ou não adequados ao gênero.
É necessário dizer que esses aspectos serão abordados não como algo
que deveria ser aprendido durante a sequência didática, mas como traços
presentes nas produções das crianças e que chamaram minha atenção. Os
textos de alguns alunos apresentam intertextualidade com outros textos lidos
por eles lidos ou mesmo em filmes assistidos.
Os alunos se apropriam ou consolidam a escrita e, em seus textos,
faltam as pontuações, pois têm pressa de escrever, a fim de não perder o fluxo
das ideias e os que ainda estão em processo mais inicial dessa apropriação,
deixam marcas da oralidade em suas produções textuais.
130
1 Intertextualidade na escrita
Um dado importante e interessante nessas primeiras escritas foi a
criatividade que os alunos apresentaram. As fábulas criadas por eles foram
espontâneas e nós não percebemos ligação alguma com outros textos já lidos
para eles anteriormente. Mesmo os que, provavelmente, tenham se baseado
em algum outro trabalho na elaboração do deles, não deixaram pistas claras
disso.
Jolibert e colaboradores(1994, p. 198) explicitam que
[...] a imaginação constrói apenas com materiais tomados na realidade, [...] é que, para alimentar sua imaginação aplicando-a a tarefas suscetíveis de reforçar suas estruturas e ampliar seus horizontes, a criança deve poder crescer num meio rico de impulsos e estímulos.
Então, para que os textos sejam mais criativos é preciso que as crianças
tenham contato constante com materiais que venham a contribuir com o
imaginário delas, como livros, dicionários, jornais, revistas e gibis, dentre
outros. Tal recomendação também é feita pelos PCNs (BRASIL, 2001, p. 76).
Quando se pretende formar escritores competentes, é preciso também oferecer condições de os alunos criarem seus próprios textos e de avaliarem o percurso criador. Evidentemente, isso só se torna possível se tiverem constituído um amplo repertório de modelos, que lhes permita recriar, criar, recriar as próprias criações. É importante que nunca se perca de vista que não há como criar do nada: é preciso ter boas referências. Por isso, formar bons escritores depende não só de uma prática continuada de produção de textos, mas de uma prática constante de leitura.
É evidente que não há ineditismo nos textos, afinal esse fenômeno não
está presente nem mesmo em nossos discursos. Como afirma Bakhtin (2011,
p. 299), “O objeto do discurso do falante [...] não se torna pela primeira vez
objeto do discurso em um dado enunciado, e um dado falante não é o primeiro
a falar sobre ele”, isto é, ninguém é um Adão mítico, o que equivale dizer que
as escritas dos alunos, em algum momento, tiveram uma influência qualquer de
um enunciado alheio.
Refiro-me às escritas que não são cópias de outros textos, mas nos
quais há uma intertextualidade, uma “conversa” com outros textos, o que
advém do entendimento que as crianças adquirem ouvindo e lendo outras
131
histórias. Com relação a isso, Koch e Elias (2010, p. 125) salientam que “No
ensino da produção escrita, importante papel assume o conhecimento textual
do escritor advindo de suas práticas de leitura”. É por meio desse
conhecimento que os alunos elaboram suas produções intertextuais.
Assim, sempre haverá nas produções dos pequenos, um lobo que
persegue meninas ou animaizinhos inocentes, mas não serão os clássicos
Chapeuzinho Vermelho ou Os Três Porquinhos. Vejamos uma dessas criativas
produções.
Figura 3 – Produção inicial de William - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
Para um melhor entendimento, transcrevi o texto do aluno:
Tom e Jerry e a ilha dos dinossauro (dinossauros)
Era uma vez um gato chamado Tom e um ratinho chamdo (chamado) Jerry Um dia us (os) dois correram e foram parar nu
132
(num) navio eo (e o) navio afudou (afundou) padeu (bateu) nua (numa) [pedra] os dois foram para um (uma) ilha Tom achou um coco viro (viram) patas e viu um dinossauro ele coreu (correu) para um coceiro (coqueiro) e Jerry caiu de rir os dois siperdeu (se perderam) na ilha o ratinho encontrou um filhote de ticeratopixs e Tom entrou (encontrou) um mini veloci Rapitor e fez carinho e ele comeu sua mão. Marau (moral) da história: nuca (nunca) devemos agretitar (acreditar) nas diferenças (aparências)
No texto inicial de William, considerando o conteúdo temático, o estilo e
a construção composicional, pode-se caracterizá-lo como uma fábula?
Respondendo às questões postas anteriormente, o aluno atribuiu um título ao
seu texto, que está coerente com a história contada. O conteúdo temático
envolve animais personificados e traz o ensinamento de não se acreditar
somente no que os olhos veem. Quanto à construção composicional, vemos
que o texto possui título, que é condizente com o texto. A moral da história
também está coerente com a escrita. Ao escrever os nomes científicos dos
dinossauros, William demonstra o desejo de utilizar as regras da linguagem
formal.
Portanto, respondendo à pergunta acima, se podemos caracterizar o
texto do aluno como uma fábula, a resposta é sim, pois houve uma adequação
completa do gênero ao texto pedido.
O texto faz uma intertextualidade com o desenho animado da televisão,
embora o aluno tenha usado de criatividade para reproduzir um texto seu,
citando dinossauros que, certamente ele já leu com os nomes parecidos, pois é
aficionado por livros de dinossauros, porém acrescentando uma pitada de sua
imaginação nas cenas reproduzidas. Mesmo que ele tenha feito uma
intertextualidade na sua criação, notemos que a moral da história condiz com o
texto, salvo o engano que ele cometeu em grafar diferenças, quando desejava
escrever aparências. O aluno William é considerado um aluno A, de acordo
com a tabela de classificação do SAEM, e possui muito conhecimento de
mundo pelo fato de gostar de ler.
Exporei agora a produção final deste aluno.
Figura 4 – Produção final de William – turma A
133
Fonte: Dados da pesquisa.
A ideia de trazer a produção final neste momento é a de fazer uma
comparação com a inicial, a fim de vermos quais progressos o aluno fez e no
que ele avançou ou não. Assim, transcrevo o texto.
Mel, a Borboleta Num belo dia nua (numa) floreta (floresta) os animais se encatavam-se (encantavam-se) com Mel sua beleza era linda mais (mas) muito egoísta Rifi seu amigo (?) e responde com um não Rifi ficou muito triste um dia mel (Mel) [disse para?] sua amiga: - Amiga o Rifi e o beto (Beto) são muito egoista (egoísta) sua amia (amiga) beli (Beli) falou! - Egoista é você - Como você ouza (ousa) falar isso vai embora da minha casa mel (Mel) perdeu todos os amigos rifi (Rifi) viu uma placa mel (Mel) passou e nem percebel (percebeu) rifi (Rifi) correu e avisol (avisou) do lago do jacaré ele sauvou (salvou) e bidiu (pediu) descupas (desculpas) para todos. Moral da história: não devemos se (nos) levar pelo egoísmo (egoísmo).
A fábula de William obteve avanços. Seu conhecimento de mundo
permitiu a criação de personagens diferentes. Apesar de ter omitido um trecho
da narrativa (3ª linha), o aluno já empregou os dois pontos e os travessões nos
diálogos criados, o que não ocorreu na produção inicial.
A leitura de outros textos fez com que William trouxesse para o seu,
porém não de forma adequada, pois na fase do ciclo em que se encontra ainda
não foi sistematicamente ensinada, a partícula “se” ao escrever “[...] os animais
134
se encantavam-se [...]”, numa outra tentativa de obedecer às regras da
linguagem formal.
A produção final de William possui título que se relaciona coerentemente
com o conteúdo temático, trazendo uma crítica ao comportamento egoísta do
ser humano, aqui representado pela Borboleta Mel. A construção
composicional da fábula está contemplada no texto, uma vez que há a
presença, além do título, de animais personificados, embora o autor não faça
referência a que tipo de animais seja, o narrador em 3ª pessoa e uma moral da
história que está condizente com o texto. Então, o texto final de William,
também está completamente adequado ao gênero fábula.
William produziu textos narrativos, nos quais inseriu um título, tanto na
produção inicial quanto na final. Suas histórias possuem enredo simples, com a
situação inicial, o desenvolvimento e o desfecho claros. A moral da história está
explícita nas duas produções.
Outro caso de criatividade e intertextualidade esteve presente na
próxima produção, como veremos a seguir.
Figura 5 – Produção inicial de Tiago - turma B
135
Fonte: Dados da pesquisa.
O macaco, banana, leão Era uma vez um homem plantou um pé de banana e deu 1 (uma) banana duas, três, quatro, cinco, seis, sete e 8 (oito) banana (bananas) e um dia o guloso do macaco chegou perto do pé de bananeira E ai (aí) o macaco fui (foi) comendo uma por uma e ai (aí) ele não percebeu que um leão estava atrás (atrás) do pé de bananeira e ai (aí) o leão avançou no macaco e o leão falou assim pro leão [macaco] - Senhor macaco porque que o senhor esta (está) comendo as minhas bananas e o macaco falou por favor deixa eu comer pelomenos (pelo menos) uma banana senhor leão E o leão falou só se você me deixar eu fazer uma coisa com você e o macaco falou pode fazer Senhor leão
136
E o leão com dó do macaquinho falou não Senhor macaco eu não vou fazer nada com você macaco pode ficar tranquilo e (eu) não vou fazer nada com você tabom (está bom)...
Veremos, agora, se a produção inicial de Tiago está suficiente, parcial
ou completamente adequada ao gênero fábula.
No conteúdo temático há uma crítica, não muito explícita ao
comportamento de um ser humano que tira proveito do trabalho de outro,
apesar de isso não estar explícito. Dentre os elementos que compõem o
gênero fábula, nesse texto, há o título, os animais com atitudes humanas e
narração em terceira pessoa, porém não há a moral da história. Embora a
história possua um título, esse não se relaciona coerentemente com o
conteúdo temático, pois cita as bananas que apenas fazem parte da história
sem, no entanto, serem primordiais para o entendimento do texto.
Assim, essa primeira produção de Tiago ficou parcialmente adequada ao
gênero.
A história escrita pelo aluno é bastante criativa, embora a
intertextualidade não esteja no enredo, mas na maneira como escreveu seu
texto, em forma de quadrinhas, como se fosse um poema, apesar de não haver
rimas. Provavelmente, isso tenha ocorrido pelo fato de o aluno já ter visto ou
lido uma fábula escrita com essa estrutura, pois, de acordo com a Britannica
Escola Online, “As Fábulas foram escritas em versos e compõem doze livros.
Os seis primeiros foram publicados em 1668, e os restantes, entre 1678 e
1694”. As Fábulas foram escritas por Jean de La Fontaine.
Os Cadernos de Apoio e Aprendizagem, da Fundação Padre Anchieta
(2010, p.21), informam que
Um olhar mais estético sobre o gênero começou com a inovação introduzida por Fedro e aprimorada por La Fontaine que recuperaram as fábulas de Esopo recriando-as em versos. Essa modificação exigiu a incorporação de elementos da poesia, como as rimas, por exemplo, aproximando a fábula da arte literária. Daí em diante, na história da produção das fábulas passaram a coexistir as duas tendências: a que se manteve no sermão e na didática nua e a que enveredou pela poesia.
137
Não poderia dizer que o aprendiz usou seu conhecimento metagenérico
na produção, embora, inconscientemente o tenha feito, mas, de acordo com
Koch e Elias (2010, p.120), esse é um tipo de produção que ressalta o
conhecimento metagenérico do autor que emprestou ao seu texto (fábula) a
“roupagem” de outro gênero (poesia), sem transferir as funções que lhes são
reservadas.
Tiago começa sua fábula dizendo que um homem plantou um pé de
bananas, mas esse personagem ficou solto na narrativa, participando somente
neste episódio da plantação e dando lugar a um leão, que também surgiu de
repente e se dizendo dono das frutas. O aluno não explicou o que o leão queria
fazer com o macaco, deixando para seus leitores inferirem o que desejarem
sobre o triste fim (ou não) do inocente personagem.
Analisemos agora outro texto de Tiago.
Figura 6 – Produção final de Tiago – turma B
A tartaruga marinha Era uma vez uma tartaruga que gostava de viajar de barco e um dia apareceu um tal de jacaré que gostava de comer tartaruga e a tartaruga com medo tremia coitada.
138
E o jacaré com os demtes (dentes) afiados E a tartaruga falou senhor jacaré Porque o senhor qué (quer) me matar e o jacaré com pena caiu desmaiado no rio a a tartaruga com seu barco coreu (correu) pra (para) socore (socorrer) o jacaré e pegou o jacaré e o jacaré agradeceu a tartaruga e um dia a tartaruga caiu lá do céu (céu) caiu e o jacaré la do rio olhou e viu sua amiga e coreu (correu) pra (para) sucore (socorrer) e peguu (pegou) ela e levou pra (para) um abrigo. Moral: Uma boa ação ganha outra
O conteúdo temático do texto final de Tiago exalta a qualidade humana
da solidariedade. Na construção composicional estão presentes os elementos
que compõem a fábula, como título, a personificação dos animais, a moral da
história e a narração em 3ª pessoa.
A produção recebeu um título. O conteúdo temático envolve animais que
agem como pessoas e, nessa produção, já há a presença da moral da história,
que é condizente com o texto e com o conteúdo temático. Portanto, a produção
final do aluno ficou completamente adequada ao gênero fábula.
O texto de Tiago foi reestruturado como atividade na sala de aula,
quando foi retirado o organizador textual “e” que, de acordo com Cardoso
(2002, p. 193), o que sustenta a história é a “adição contínua de uma ação em
seguida da outra, sempre ligadas pelo E. Há quase uma enumeração das
ações [...]”.
Tanto na produção inicial quanto na final, Tiago produziu narrativas, para
as quais deu um título. Construiu enredos simples, com poucos episódios,
inserindo moral da história, criada por ele, apenas no texto final. Na produção
de William a falta de um diálogo na produção inicial, provavelmente, deveu-se
ao fato de a atração da televisão, Tom e Jerry, ser um desenho “mudo”.
Assim, nas produções dos doze alunos houve muita criatividade, até
mesmo nas dos que ainda não se apropriaram convencionalmente da escrita.
1.2 Apropriação/consolidação da escrita
Como já citado, alguns alunos ainda estavam se apropriando da escrita.
Nessas duas turmas esses alunos estavam classificados, conforme a tabela do
SAEM, como C (críticos). Eles liam e escreviam, porém não de maneira
convencional, contudo, produziram suas fábulas. Vejamos alguns textos.
139
Figura 7 – Produção inicial de Myla - turma A
.
Fonte: Dados da pesquisa.
Faz-se necessária a transcrição do texto da aluna para que fique mais
compreensível.
Era uma vez a princesa Branca de Neve Ela não viu que estava passeando numa floresta E um esquilo falou você esta (está) chorando não eu estava passeando e daí me perdi a rainha apareceu Branca de Neve o que está fazendo não rainha eu tava passando e a rainha foi embora e a Branca de Neve ficou assustada e até que enfim chegou na casa da vovó e ficou feliz para sempre. Moral da história: a rainha apareceu.
Myla estava num nível mais inicial de apropriação da escrita, portanto,
seu texto não apresenta, no plano do conteúdo, crítica, ironia, ensinamento ou
outro elemento referente ao comportamento humano.
No plano composicional não há um título. O animal que aparece é
personificado, pois o esquilo fala com Branca de Neve e a aluna teve o cuidado
de dar uma moral para sua história, embora não seja condizente com o texto.
Sendo assim, o texto, em seu conjunto, não corresponde ao gênero fábula.
A produção de Myla se apresenta com palavras ora segmentadas, ora
emendadas e ora com as letras trocadas de lugar dentro das palavras, como
está grafado na primeira linha de seu texto “E ranu avei” (Era uma vez). A
asserção de Cardoso (2000, p. 133) a esse respeito nos informa que
Falar é uma habilidade adquirida antes de escrever. Consequentemente, as regras gramaticais e textuais (e, é
140
claro, fonológicas) da fala são adquiridas primeiro e formam a base do conhecimento da criança e do uso da linguagem.
Assim, Myla tem tentado transpor para o papel o que já tem apropriado
do Sistema de Escrita Alfabética (SEA). Outra dificuldade enfrentada pela
aluna (e não somente ela) é se fazer entender por meio da escrita, da letra
registrada. As crianças, quando estão em processo de aprendizagem da
escrita, ao passar da letra bastão para a cursiva esbarram em outro entrave: o
de escrever com legibilidade. Pode ocorrer que nesse registro, o leitor, no caso
o professor, não as compreenda e venha a dizer que elas não sabem escrever.
Assim, Cagliari (2009, p. 125) nos relata sobre a “forma estranha de traçar as
letras”.
A escrita cursiva apresenta grandes dificuldades, não só para quem escreve como para quem lê. Às vezes consideramos que existe uma troca de letras numa palavra, mas na verdade estamos fazendo uma má interpretação do que foi escrito.
É o caso da palavra vovó, na última linha do texto de Myla, que ela
escreve semelhante a “varra”, pois a maioria das crianças em aprendizagem
escreve tanto o “v” quanto o “b” separados, sem juntá-los à letra seguinte.
O texto da aluna poderia se enquadrar na categoria anterior, pois conta
uma história com Branca de Neve e a Rainha, além da criatividade de ter
elaborado uma história diferente da original, porém tenciono analisar a
apropriação da escrita. Observemos, agora, a produção final da aluna.
Figura 8 – Produção final de Myla – turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
A transcrição será feita respeitando o texto da aluna, mas com as
devidas correções gráficas para maior compreensão.
141
A onsa (onça)e o buro (burro)
Erauna (era uma) ve (vez) um buro(burro) qfoi (que foi) norio (no rio) bebe (beber) a aga (água) e derepete (de repente) xeqeum (chegou) uma onsa (onça) e a onsa (onça) pergutol (perguntou) o buro (burro) o buro (burro) o qeitafazeto (o que está fazendo?) eusotobebdo aum (eu só estou bebendo água) você nãodeviabebe a qipoqueseriu (você não devia beber água aqui porque esse rio é meu) e o buro (burro) foi bora (foi embora)um dia o buro (burro) aio (achou) uma comida e a onsa (onça) gegia (queria) um poqio (pouquinho) e o buro (burro) não qeria (queria) dar po que (porque) eraso (era só) [ir] na repesa (represa) e a onsa (onça) ficou com votade (vontade) e a onça nuca (nunca) maiceuigoita (mais foi egoísta) [moral da história]: a onsa não dexo o buro bebea a aun (a onça não deixou o burro beber água). O buro não deum conida para a onsa (o burro não deu comida para a onça)
O texto final da aluna obteve progressos, mostrando que ela se
apropriou um pouco mais do gênero. Todavia, o conteúdo temático apresenta
um ensinamento quando a aluna escreve que a onça nunca mais foi egoísta.
No plano da composição, já há um título, que combina com o texto, mas não
com o conteúdo temático. Os animais conversam e a moral da história também
aparece na produção final, contudo, não está coerentemente adequada ao
conteúdo temático. A aluna se esforçou para obedecer às normas da
linguagem formal, entretanto, ainda está numa fase inicial da apropriação da
escrita.
O texto da aluna não está adequado ao gênero fábula.
A produção final de Myla apresenta progressos: a caligrafia melhorou e,
na dúvida, ela escreveu uma dupla moral para a história, embora ainda não
proporcional ao texto, mas na narrativa há o ensinamento de a onça nunca
mais ser egoísta. Isso mostra que a aluna está começando a se apropriar do
gênero textual e da escrita.
No texto de Myla aparece um pequeno diálogo entre a onça e o burro,
apesar de não trazer marcas como os dois pontos e o travessão.
142
A aluna produziu narrativas, porém, atribuiu um título apenas à produção
final. Seus enredos têm poucos episódios, todavia, por estar ainda se
apropriando da escrita, ficaram confusos.
Outra aluna apresentou texto semelhante, com pouca distinção entre
fala e escrita.
Figura 9 – Produção inicial de Caterina - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
Caterina também está se apropriando da escrita, porém, se encontra
num nível mais avançado que Myla. Eis o texto transcrito:
A Raqueile foi na ninha (minha) casa A Raqueile fui (foi) lana (lá na) minha casa i e la (ela) foi vire (ver) o meu cachoro (cachorro) que é la (ela) trrico (brincou) com o meu cachoro (cachorro) então a raqueile foi embora até que ela resolveu voltar la (lá) para ninha (minha) casa e brincar com meu cachorro de novo.
O texto inicial de Caterina mostra que ela ainda não se apropriou do
gênero, pois se trata de uma narrativa sem conteúdo temático. A construção
composicional não traz os elementos necessários ao gênero fábula, somente
um título, que é condizente apenas com o texto. Não há moral da história,
assim, o texto da aluna não está adequado ao gênero fábula.
O fato de estar aprendendo a ler e escrever agora, provavelmente faça
Caterina oscilar entre a escrita correta e a inadequada da mesma palavra ou o
emprego da letra “m”, ora como se fosse “n”, ora com mais “pernas” do que
deveria, como nos casos dos termos “cachorro” e “meu”, respectivamente.
Na segunda linha do texto original, Caterina escreve “trrico”, pois num
lapso, cortou a letra “b”, mas como escreve “b” separado do “r”, ficou
143
parecendo que grafou com dois “r”, evidenciando a dificuldade em passar da
letra bastão para a cursiva, já citada anteriormente, além de ter omitido os
grafemas “n” e “u” da palavra “brincou”, grafando-a adequadamente na
penúltima linha de sua produção.
As junturas intervocabulares apresentadas em “lana” (lá na) e “é la”
(ela), de acordo com Cagliari (2009, p. 125), refletem os critérios usados pela
criança para analisar a fala, uma vez que nessa existe a separação de palavras
somente quando marcada pela entonação do falante. Então, devido à
acentuação tônica, pode ocorrer uma segmentação na escrita.
Outras evidências de apropriação estão nas grafias de “resolveu”,
“voltar”, e “de novo” mostrando que a aluna está em meio ao processo de
aprendizagem.
Os textos espontâneos iniciais das duas alunas mostram que ambas não
se apropriaram, ainda, das características da fábula, embora no texto de Myla,
tenha havido um pequeno diálogo, porém sem marcações, enquanto que
Caterina produziu um texto no qual apenas figuram uma amiga e seu cãozinho
de estimação. A moral da história na escrita inicial de Myla não condiz com o
gênero fábula e Caterina sequer mencionou uma, além de ter alegado não se
lembrar como era a fábula, mas acabou por escrever.
Figura 10 – Produção final de Caterina – turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
A Raqueile e o cão É Ra (era) um dia tao bonido (tão bonito) que uma menina tao (tão) bonita que o mome (nome) é Ra Raqueile a chou (achou) o Pobre ção (cão) e o que faze (fez) a Raqueile le vou (levou) o Pobre cão Pra (para) dreto (dentro) da casa Moral: a Raqueile é muito cu da doza (cuidadosa) do Pobre cão
144
Na produção final da aluna houve uma repetição do que ocorreu na
primeira. Ainda não há um conteúdo temático ou os principais elementos que
compõem o gênero estudado, pois a moral da história não traz um
ensinamento. O texto parece uma continuação da produção inicial.
A orientação dos professores para a produção textual foi a mesma nas
duas salas, embora esses não tenham relembrado aos alunos os passos do
gênero fábula, afinal, tratava-se de uma avaliação dos conhecimentos
adquiridos pelos alunos durante a aplicação da sequência didática.
Todavia, Caterina, alegou não se lembrar de como era uma fábula.
Diante da insistência da professora para que ela produzisse e relembrando as
leituras deleite de fábulas feitas na aula, ela não se lembrou de nenhuma e
decidiu escrever algo parecido com a primeira escrita, na qual figurava sua
amiga. Em seus textos narrativos, apresentou situação inicial, trama e
desfechos claros, como uma história, que não configura fábula. Com isso, o
texto da aluna não está adequado ao gênero.
O progresso obtido por Caterina foi a moral da história que combina
com o texto, porém não com uma fábula. A aluna ainda não se apropriou das
características do gênero e continuou escrevendo sobre um animal de
estimação e a, provavelmente, melhor amiga, visto que Raqueile aparece nas
duas produções dela. A grafia dos “p” maiúsculos no meio da produção,
certamente, deve-se ao fato de as crianças em processo de alfabetização
gostarem de escrever letras como o “P”, o “B” e o “R” assim, pois acham mais
bonito e mais fácil que escrevê-las em minúsculo.
Outro aluno em processo inicial de apropriação da escrita é Jonathan.
Figura 11 – Produção inicial de Jonathan - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
145
É possível compreender algumas palavras do texto como “o gato e a
gata”, o começo da história como “Era uma vez o gato e a gata A gata ficou
apaixonada e o gato ficou apaixonado”. Os termos “Produção textual” escritos
no topo da folha de papel foram copiados da lousa.
Jonathan atribuiu uma moral da história para seu texto: “o gato e a gata
ficou apaixonado em 2013”. Todavia, o texto dele não está adequado ao
gênero. Embora os animais da história apresentem atitudes humanas como o
fato de estarem apaixonados, não há um conteúdo temático. Na construção
composicional o texto mostra um título, animais personificados, moral da
história e narrador em 3ª pessoa. O título relaciona-se com o texto, porém não
com o conteúdo temático, bem como a moral da história. Desse modo, o texto
não está adequado ao gênero. Vejamos agora a produção final do aluno.
Figura 12 – Produção final de Jonathan - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
Ainda nessa produção a leitura ficou impossibilitada. O aluno não
conseguiu ler sua própria escrita. Novamente deu um título ao texto e, pelo que
se pode notar, trata-se agora de um rato e uma rata apaixonados e a moral da
história é possível compreender “seja sempre amiga”.
Como na produção inicial, o título e a moral da história não estão
coerentes com conteúdo temático, embora os elementos que compõem o
gênero estejam presentes como o título, animais personificados, moral da
história e narrativa em 3ª pessoa. Desta forma, a produção de Jonathan não
está adequada ao gênero. Jonathan, de acordo com a tabela do SAEM, está
classificado como C.
146
Ainda nessa categoria, há o texto de Marcos.
Figura 13 - Produção inicial de Marcos - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
Marcos está se apropriando da escrita. Poucas palavras de sua
produção são inteligíveis como “batata”, “o rato pediu ao galo” e “sapo”, embora
não há a certeza de que são mesmo essas as palavras, pois o aluno não
conseguiu ler sua própria produção.
Devido o aluno estar em nível inicial da apropriação da escrita, o texto
não está adequado ao gênero fábula.
Figura 14- Produção final de Marcos - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
Transcrevi-a para uma melhor leitura.
A pomba e o ganvião (gavião) [e a] fomiga (formiga) Um dia [,] a pomba elafoinorio (ela foi no rio) [.] umdiaogavião (um dia, o gavião) estavaecondido (estava escondido) nomato (no mato) [,] ele e a pomba [e a] fomiga (formiga)[.] e pomba elapassou (ela passou) pecoafomiga e o ganvião (pegou a
147
formiga e o gavião) saiuatasidapomba (saiu atrás da pomba)[.] elaecoteu (ela escondeu) [?] e o ganvião (gavião). Moral: nunca brigue com seu amimigo (amigo), pois um dia pode precisar dele.
A produção final de Marcos surpreendeu pelo fato de estar mais
inteligível, exceto pela palavra escrita na antepenúltima linha, num claro sinal
de que o aluno vinha avançando no processo de apropriação da escrita. É
possível notar que a moral da história está bem legível, inclusive com vírgula e
ponto final, porém, essa provavelmente foi retirada de um cartaz afixado na
sala, depois da reestruturação do texto de uma de suas colegas.
O texto do aluno possui um conteúdo temático, uma vez que ele
introduziu uma moral para sua história, embora essa não seja condizente com
o texto. Em sua escrita há título, animais personificados, moral da história e
narrador em 3ª pessoa, elementos que compõem o gênero fábula. Entretanto,
o título não se relaciona coerentemente com o conteúdo temático, que envolve
animais personificados e moral da história, mas essa, também, não está
concordando com o conteúdo temático. Assim, a produção final de Marcos
também está parcialmente adequada ao gênero fábula.
É possível afirmar que a produção final de Marcos seja um texto
narrativo, no qual ele inseriu um título. Por ainda estar se apropriando da
escrita, o aluno construiu um enredo simples com uma situação inicial, o
desenrolar da história não é claro e teve um desfecho interrompido. A moral da
história está explícita.
A escrita consolidada não significa que a criança não cometa enganos
numa produção textual. A apropriação engloba o uso correto das palavras, das
ideias e sinais de pontuação, bem como dominar as relações fonema-grafema.
O fascículo 1 do Pró-Letramento informa que “[...] as marcas que usamos na
escrita para distinguir palavras, frases e sequências de frases não são ‘óbvias’
nem ‘naturais’”(BRASIL, 2008, p.27). Elas são, na verdade, convenções sociais
de nossa língua que a escola precisa ensinar.
A seguir, um exemplo de fábula criado por uma aluna que vinha
avançando no processo de apropriação da escrita, ou seja, ela estava num
nível mais consolidado da escrita.
148
Figura 15 – Produção inicial de Juliana - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
O Gatinho fofoca Era uma vez, um gatinho tão bonito e fofinho. O gatinho chama-se fofoca, fofoca era um gato de pelos lisos e brancos. Na sacada de seu dono tinha uma almofada colorida, bem fofinha. Onde fofoca gostava de ficar. Um dia, fofoca observou dois gatinhos conversando sobre um acidente de outro gato e assim ele foi espalhando e espalhando, até cansar. Moral da história: Quando estiver comverssando (conversando) cuidado, alguém pode estar ouvindo.
O texto de Juliana está adequado ao gênero fábula, pois o conteúdo
temático apresenta uma didática moralista que alerta sobre assuntos que se
propagam de forma indesejada. Em sua construção composicional o texto traz
título, o qual se relaciona coerentemente com o gênero; animais com atitudes
humanas como conversar e disseminar essas conversas; moral da história, que
está coerente com o conteúdo temático; e a narrativa está em 3ª pessoa e a
aluna procura escrever as palavras de maneira correta. Portanto, o texto de
Juliana está completamente adequado ao gênero fábula.
É possível notar, até mesmo pela caligrafia da aluna, que ela se
apropriou com sucesso da escrita, pois utiliza vírgulas e pontos no seu texto.
Usa, de forma inteligente, palavras de sílabas complexas como “almofada”,
“observou”, além de empregar corretamente a partícula “se” em “chama-se”,
embora não tenha grafado o nome do gatinho em letra maiúscula.
149
Ao aprender a escrever, os alunos têm dimensionadas as possibilidades
de enunciação de seu discurso. Quanto a isso, Cardoso (2002, p. 177) afirma
que
A apropriação de mecanismos de controle global do texto escrito está relacionada com a apropriação de técnicas e meios de linguagem diferenciados, utilizados para marcar, na superfície textual, não apenas as relações entre as ideias (encadeamento, dependência, ruptura, etc.), como também a posição do enunciador do texto.
Se Juliana tivesse colocado um ponto de exclamação no final da
primeira oração, teria criado um efeito melhor em seu texto. A produção da
aluna tem um encadeamento, isto é, começo, meio e fim bem organizados,
embora a história seja curta. Analisemos, agora, a produção final da aluna.
Figura 16 – Produção final de Juliana – turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
Assembleia dos ratos
Era uma vez, uma casinha no meio do campo onde moravam ums (uns) ratinhos. Um dia ospedou-se (hospedou-se) um novo morador que era um gato. Quando os ratinhos dormiam o gato malvado ficava vigiando qualquer gemido deles. Sendo assim eles ficaram com raiva, todos formaram um grupo para discutir, o chefe disse: - Alguém tem alguma ideia. E o ratinho Jerri disse: - Vamos aproveitar que o gato está dormindo e colocar uma coleira com sinos pequenos e assim quando ele se aproximar vamos saber que ele esta (está) aqui. Ele teve a maior ideia, mas quando pediu para alguém fazer ninguém levantou a mão. Moral da história: É mil vezes melhor fazer do que apenas falar.
150
A produção final da aluna está completamente adequada ao gênero
fábula. O conteúdo temático faz uma crítica ao comportamento de certas
pessoas que apresentam solução para algum problema, porém não encontram
apoio nas outras para seguir adiante com o plano.
A construção composicional traz todos os elementos que compõem o
gênero fábula, tais como o título, que se relaciona de forma condizente ao
conteúdo temático; esse conteúdo temático envolve animais, que são
personificados e uma moral da história coerente com o gênero.
A fábula de Juliana é um reconto da original de Esopo, com esse mesmo
nome, que a própria aluna havia lido numa leitura deleite na sala, antes mesmo
do início da sequência didática.
A aluna demonstrou ter se apropriado do gênero fábula utilizando os
personagens com características humanas e dando uma moral para o texto,
um pouco diferente do original pela inversão das palavras, pois o original diz
que falar é mais fácil que fazer. Todavia, segundo Juliana, fazer é bem melhor
que falar, o que não subverte a originalidade do texto de Esopo.
A escrita da estudante é aprimorada e ela procura usar palavras mais
rebuscadas para construí-la. Os erros gráficos são raros, em se tratando de
uma criança de oito anos.
Juliana, tanto na produção inicial quanto na final, construiu narrativas, às
quais atribuiu título. Os enredos são simples, com situação inicial,
desenvolvimento e desfechos claros. Ela também atribuiu moral aos textos:
criada por ela, na produção inicial e recontada, na final.
Continuarei vendo, nos próximos textos, a categoria geral de adequação
ao gênero, todavia, o olhar será mais voltado para as subcategorias.
1.3 Sinais de pontuação
Sabemos que os sinais de pontuação são marcações gráficas que
auxiliam na composição da coesão e da coerência textual e ainda ressaltam os
aspectos semânticos dos textos, além de nos dar a perceber as pausas e
entonações feitas pelos falantes no momento da escrita. Todavia, as produções
dos alunos sujeitos da pesquisa apresentaram problemas quanto à utilização
151
desses recursos, ou seja, os sinais como vírgula, ponto de interrogação, ponto
final e marcas de diálogo foram praticamente inexistentes em seus trabalhos.
Analisemos algumas dessas produções.
Figura 17 – Produção inicial de Manuelle - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
As melhores amigas As melhores amigas do muldo (mundo) inteiro uma se chamava lili e a oltra (oltra) se chamava mili e ela tem um gato e a oltra (outra) não gostava de gato mas mesmo asim (assim) elas eram melhores amigas. e a primeira adorava cachorro e gato mas preferia cachorro. ela gostava de bricar (brincar) de boneca e desenhar e a segulta (segunda) de pega pega e a tersera (terceira) se chamava bruna gostava de comer usava lasinho (lacinho) cor de rosa e se achava a mais linda da sala e gostava de rocho (roxo) as tres (três) nunca faltaram a aula se compotaram (comportaram) muito na sala a comida das três era salata (salada) esportes e conversar de mãotão (montão).
152
Moral da história: mesmo não gostando de gato ela são melhores amigas. mas se ela tivesse um cachorro elas não seriam melhores amigas.
O texto da aluna não possui um conteúdo temático, pois não há um
componente didático moralista. Na construção composicional do gênero, a
história possui um título, animais, moral da história e narração em 3ª pessoa.
Entretanto, o título não se relaciona coerentemente ao conteúdo temático.
Esse envolve animais, porém não personificados, apenas animais de
estimação. A moral da história não condiz com o texto.
Assim, considerando o conteúdo temático, o estilo e a construção
composicional, o texto não se caracteriza como fábula, apesar de possuir
elementos estruturais dela. Portanto, não está adequado ao gênero.
No texto de Manuelle já podemos notar a presença do ponto final nas
linhas 4 e 5, na última linha e no final da moral da história, bem como os dois
pontos. Embora não tenha utilizado letras maiúsculas após o ponto final, o fez
no único parágrafo do texto, o inicial. A única vírgula que aparece na escrita (na
linha 9) é um sinal da correção do professor, assim como o acento circunflexo
da palavra “três”, na penúltima linha. A aluna esforçou-se por não deixar seu
leitor confuso com as meninas, pois se referiu a elas como a primeira, e
segunda e a terceira. A produção é criativa, todavia é possível notar traços dos
modernos livros consumíveis para o público infantil com histórias sobre as
bonecas Barbie e Polly e suas amigas.
A aluna perdeu-se um pouco no enredo, pois começa como se as
amigas fossem crianças, que brincam com as bonecas personagens,
terminando como se fossem jovens que gostam de saladas, de esportes e de
conversar muito, características das bonecas e dos desenhos televisivos a elas
vinculados. A moral da história também ficou um adereço quase que avulso do
conteúdo, uma vez que foram citados os animais de estimação apenas no
começo do texto e eles não desenvolveram nenhum diálogo.
De acordo com Cardoso (2002, p.113), a principal dificuldade do
locutor/escritor é a de compartilhar a estrutura linear das informações que
contém o seu discurso com a estrutura não linear e as várias dimensões de seu
universo mental. No caso dessa aluna, é difícil organizar e registrar num papel
as informações que ela tem na mente.
153
Ainda segundo a autora (2002, p. 115), os sinais de pontuação são
utilizados “para delimitar ou segmentar as unidades textuais do tamanho da
expressão, da proposição, da frase e do parágrafo”. Com esse recurso, os
textos ficam mais inteligíveis.
Os PCNs (BRASIL, 2001, p. 87) orientam para duas questões que
sempre a escola se apoia para o ensino da pontuação: uma delas é que a
pontuação serve para indicar pausas na leitura em voz alta e a outra é que as
frases é que são pontuadas, visto que o texto não é um amontoado de frases,
mas um fluxo contínuo que precisa ser dividido em partes que contenham
marcas que possibilitem a legibilidade dele. Assim, de acordo com os PCNs
(BRASIL, 2001, p.88), “Aprender a pontuar é aprender a partir e a regrupar o
fluxo do texto de forma a indicar ao leitor os sentidos propostos [...], obtendo
assim efeitos estilísticos”.
Nos textos dos alunos em questão, a falta de pontuação prejudicou o
sentido. Todavia, todos os trabalhos apresentados até agora têm ponto final na
última linha do texto, marcando que este chegou ao final. Analisemos o texto
final de Manuelle.
Figura 18 - Produção final de Manuelle – turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
154
O burro enteligente (inteligente) Um belo dia um burro enteligente (inteligente)andava pela rua doto (todo) esibido (exibido) só porque era enteligente (inteligente) só tirava nota dez. Mas se distraiu com o porco espinho na rua parado até que um desconhesido (desconhecido) lhe avisou cuidado burro com o porco espinho na rua ele parou e se disviou (desviou) do porco e dise (disse). - Oprigata (obrigado) como poso (posso) agradese-lo (agradecê-lo) por iso (isso)- Não precisa só lhe avisei agora vou em pora (embora) um dia você faz o mesmo com outra pesoua (pessoa). Moral da história. não se distraia se isibido (exibindo) se não (senão) você se machuca.
A produção final da aluna traz visíveis progressos. O conteúdo temático
apresenta uma crítica a determinados comportamentos humanos como a
presunção exagerada. Estão presentes os elementos que compõem o gênero
fábula como título, que se relaciona coerentemente ao conteúdo temático,
animais personificados, como o Burro inteligente, moral da história também
condizente com o conteúdo temático.
Analisando o conteúdo temático e a construção composicional, o texto
caracteriza-se como fábula, ou seja, está completamente adequado ao gênero.
A segunda produção de Manuelle traz um travessão, marcando a fala do
personagem Burro Inteligente e a moral da história está de acordo com o texto.
No trecho do diálogo, o pronome oblíquo (agradecê-lo) que a aluna usou para
enriquecer sua escrita foi um indício da apropriação da norma culta.
Na sexta linha da história, Manuelle escreve “Oprigata” (obrigada),
trocando, por instantes, o papel de narradora pelo personagem, o Burro, que é
masculino.
Seu texto melhorou, pois está se apropriando do gênero textual.
Diferente da primeira produção, seu novo escrito está mais maduro e
demonstrando um esforço por parte da aluna de escrever uma fábula
respeitando as características que apreendeu. Há ainda alguns problemas com
a ortografia, cuja tendência é desaparecer com o tempo, pois a aluna estava
avançando no processo de ensino-aprendizagem.
Manuelle produziu textos narrativos. Inseriu título em ambas as
produções e construiu enredos simples, com situações iniciais, tramas e
155
desfechos claros. Inseriu, também, moral da história, criados por ela para os
textos.
Observemos outro exemplo de falta de pontuação.
Figura 19 – Produção inicial de Juliano - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
O cão e o ratinho Céto (certo) dia o cão falou para o ratinho - vanos (vamos) bricar (brincar) de pégapéga (pega pega) e com meço (começaram) a Bricar (brincar) de pois (depois) i vento (inventaram) outra Bricadeira (brincadeira) e começou a Bricar (brincar) de escondecomde (esconde-esconde) de pois (depois) inventaram outra Brincadeira de cola cola de pois (depois) começo (começou) a Bricar (bricar) de pois (depois) parou de Bricar (brincar) d pois (depois) foi comer.
A escrita inicial de Juliano não apresenta um conteúdo didático
moralista. Possui um título, animais personificados e narração em 3ª pessoa,
mas não uma moral da história.
Apesar de possuir um título, esse não é condizente com o conteúdo
temático. Os animais são personificados, pelo menos é o que mostra a primeira
linha do texto, mas não há uma moral para a história. Dessa forma, o texto não
se caracteriza como fábula.
Temos uma produção cuja falta de pontuação prejudicou o sentido.
Quanto a esse entrave, Jesus (2011, p. 110) explica que “o aluno ao se fazer
enunciador do seu texto pressupôs a pontuação como algo já implícito no seu
156
dizer”. No entendimento do aluno, seu interlocutor/leitor vai compreender
perfeitamente a mensagem que ele quis transmitir. Para ele, sua produção está
enquadrada nos padrões da legibilidade, cabendo à escola, fazê-lo entender as
regras e convenções da língua, porém não com atividades
descontextualizadas, fragmentadas. Jesus (2011, p. 111) expõe que
Devido à forma como as convenções foram apresentadas
ao aluno, estas passam a ser vistas por ele como
elementos de fora, estranhos à historicidade de seu dizer.
Logo, um trabalho fragmentado, no qual pontuação e
enunciação são tratadas de maneira desarticulada, como
se fossem instâncias excludentes, desencadeia uma
reescrita formal e mecânica, destituída de significado e
reflexão, que não facultam ao aluno a apropriação dos
recursos linguísticos necessários a uma melhor
contextualização da pluralidade imanente ao seu
enunciado.
Assim, quando as atividades são do tipo de pontuar frases
descontextualizadas, dificultam a apropriação por parte da criança, portanto, no
entendimento dela, os sinais de pontuação não cabem nos seus textos.
No texto de Juliano houve a ocorrência de um travessão marcando o
diálogo na segunda linha; porém, ainda não apareceu a moral da história.
Houve, também, uma gradação temporal, na qual o aluno escreve “depois
começou a brincar, depois inventou outra brincadeira, depois brincaram, depois
parou de brincar e depois foi comer”. Vamos analisar a produção final desse
aluno.
Figura 20 – Produção final de Juliano – turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
157
O gato e a forniga (formiga) certo dia o gato que gosta de forniga (formiga) ai (aí) o gato a chou (achou) una (uma) formiga e o gato falou para forniga (formiga):’ - como e (é) ceu (seu) nome meu nome e (é) gabriélem (Gabriele): - como e (é) o ceu (seu) Dada bonito o teu tenben (também) e (é) bonito eipóra (embora) bricar (brincar) de cocécoisa (qualquer coisa) ceto (certo) de pega-pega é mes mo (mesmo) é em tem (então) [em] borá (embora) bricar (brincar) a gora (agora) vanos (vamos) bricar (brincar) Moral: não Póde (pode) mau (mal) a gradeser (agradecer) o amigo
A produção final do aluno apresenta progressos, pois já existem alguns
sinais de pontuação, mas a falta de outros deixa o texto um pouco confuso.
Bentes (2007, p. 257) diz que os sentidos de um texto não estão no texto em si,
mas em fatores diversos como linguísticos, cognitivos, socioculturais e
interacionais. Ressalta ainda, (2007, p. 257) que
Texto incoerente é aquele em que o receptor (leitor ou ouvinte) não consegue descobrir qualquer continuidade de sentido, seja pela discrepância entre os conhecimentos ativados, seja pela inadequação entre conhecimentos e o seu universo cognitivo.
Então, em outras palavras, a coerência de uma produção textual está
nos recursos linguísticos, no conhecimento de mundo do leitor, bem como o
papel social desempenhado por ele ou por seu destinatário (BENTES, 2007, p.
261).
Para Marcuschi (2008, p. 119) “há uma distinção bastante clara entre a
coesão como a continuidade baseada na forma e a coerência como a
continuidade baseada no sentido”.
Desta forma, o texto de Juliano está confuso, mas não incoerente, se
aplicarmos a ele nossos conhecimentos linguísticos e de mundo. Quanto a
isso, Marcuschi (2008, p. 121) afirma que
[...] a coerência é em boa parte uma atividade realizada pelo receptor de um texto que atua sobre a proposta do autor. E, nesse afã, o receptor segue as pistas (deixadas pelo autor nas operações de coesão textual) como primeiros indicadores interpretativos. De todo modo, a coerência é uma atividade interpretativa e não uma propriedade imanente ao texto. Liga-se, pois a atividades cognitivas e não ao código apenas.
158
O autor (2008, p. 99) escreve, ainda, que fatores que regem a conexão
referencial e a sequencial dentro do texto são conhecidos como coesão e são
parte dos critérios que constituem a textualidade. Para Marcuschi (2008, p.99),
Os processos de coesão dão conta da estruturação da sequência [superficial] do texto (seja por recursos conectivos ou referenciais); não são simplesmente princípios sintáticos. Constituem os padrões formais para transmitir conhecimentos e sentidos.
Voltando ao texto de Juliano, uma outra pessoa que não estivesse ligada
à educação poderia não entender a escrita, ou melhor, poderia não conseguir
ler o texto. Mas, professores são “treinados” para isso ao longo de suas
docências, o que os capacita para essa compreensão, tanto da letra quanto do
sentido do texto.
A produção final do aluno não está enquadrada ao gênero fábula. No
plano do conteúdo a moral da história não condiz com o gênero. No plano da
composição há um título, a personificação de animais, moral da história e
narração em 3ª pessoa. Todavia, essa moral não é coerente com o conteúdo
temático.
No texto final de Juliano (p. 156) temos a presença da moral da história,
apesar de não combinar com o texto. Provavelmente, o aluno tencionava dizer
que devemos deixar nossos amigos contentes, participando de brinquedos e
brincadeiras com eles, portanto, não os mal-agradecer.
Presente, também, o diálogo entre o gato e a formiga com algumas
marcas dessa conversa, como os dois pontos e travessão, os únicos sinais de
pontuação que constam na história.
Na segunda linha, o aluno colocou os dois pontos e continuou a escrever
o diálogo na mesma linha, porém refletiu, apagou e transferiu para a linha
seguinte, o que é percebido pela sombra da escrita apagada, portanto, indícios
de refacção. Em sua primeira produção, Juliano escreveu “pégapéga” e na
produção final a grafia já está adequada e sem o acento.
Embora ainda haja um caminho a percorrer para o aluno se apropriar do
gênero fábula e da escrita, houve avanços na escrita. Ele produziu textos
narrativos, inseriu título nas produções, construiu enredos com situação inicial,
159
trama e desfechos claros e atribuiu moral da história criadas por ele, ainda que
não tenha adequado seus textos ao gênero fábula.
Vejamos outros trabalhos apresentando problemas de falta de sinais de
pontuação.
Figura 21– Produção inicial de Ricardo - turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
Dico o lagartinho num belo dia dico acordou. e ele estava andando. e apareceu um gato malvado ele disse porque você não vem comer comigo eu tenho um pote cheio de insetos. Não posso tenho um compromiso (compromisso). você pode comer tudo de graça. eu vou comer na minha casa. se você entrar você vai ser o primeiro a chegar e seus amigos vai (vão) ficar com inveja. tabom ( tá bom)eu entro vou ser o primeiro e assim (assim) depois o dico saiu tudo (todo) machucado.
Moral da historia (história): não obedeça as pessuas (pessoas) que você não conheça
Na produção inicial do aluno, no conteúdo temático há uma crítica ao
comportamento humano de planejar ardis para prejudicar o semelhante,
portanto, apresenta um conteúdo didático moralista. Na construção
composicional estão presentes todos os elementos que compõem o gênero
160
fábula, como o título, que se relaciona coerentemente ao conteúdo temático; a
personificação do gato e do lagartinho e a moral da história, cujo ensinamento
é condizente com o conteúdo temático. Portanto, o texto do aluno está
completamente adequado ao gênero fábula.
Na fábula de Ricardo o diálogo entre os animais está presente e até
mesmo os pontos finais, todavia, não há vírgulas. A história foi bem construída
com destaque para a artimanha do gato para convencer sua vítima e torná-la
sua presa e os argumentos do lagartinho Dico para não aceitar o convite.
Ricardo usou pontos finais, porém, ao continuar o texto, não utilizou
letras maiúsculas. Dico e o gato malvado conversaram, mas o diálogo não foi
marcado pelos característicos dois pontos ou travessões. A moral da história
condiz com o texto, num sinal de que o aluno já começou a se apropriar do
gênero fábula e suas características.
Durante o trabalho de campo, pude observar que o aluno tinha
conhecimento de mundo, gostava muito de ler e era atento a tudo o que
acontecia ao seu redor, por isso a construção do texto com um ensinamento
que, certamente, veio de outras leituras ou até mesmo de conversas com
adultos. Bakhtin (2011, p. 295), com relação a isso, relata que “Essas palavras
dos outros trazem consigo a sua expressão, o seu tom valorativo que
assimilamos, reelaboramos, e reacentuamos”.
Assim, Ricardo elaborou seu texto assimilando a palavra de um
enunciado alheio, o que acontece com nossos discursos, inclusive as obras
criadas são plenas de palavras dos outros (BAKHTIN, 2011, p. 294). O aluno
tomou para si e reelaborou as informações que recebeu dos adultos, de outros
discursos e do meio no qual convive.
Observemos a produção final do aluno.
161
Figura 22 - Produção final de Ricardo – turma A
Fonte: Dados da pesquisa.
A cigarra e as formigas
Era uma vez, uma cigarra que só sabia cantar e uma formiginha (formiguinha) pasou (passou) e disse: - Por que você não vai catar comida para você ele respondeu: - Eu gosto de cantar e depois eu cato e foi pasando (passando) o tempo e ficou inverno e a cigarra ficou com frio e ela procurou a formiga no formigueiro e ela falou pra (para) formiga: - Por favor me deixe entrar e a formiga respondeu: - Você não quis pegar comida pra (para) você e depois você corre para meu pé mas eu deixo você entrar e eles foram amigos para senpre (sempre). Moral da história: nós temos que trabalhar para ganhar nosas (nossas) nesessidades (necessidades)
162
O texto final do aluno está completamente adequado ao gênero fábula.
No conteúdo temático, há a presença do ensinamento moralista. No
plano da construção composicional estão presentes o título, que está
coerentemente relacionado com o conteúdo temático, a cigarra e a formiga
personificadas, moral da história condizente com o conteúdo temático e
narração em 3ª pessoa.
O texto de Ricardo é um reconto do original de Esopo, que ele já havia
ouvido em outras ocasiões, porém não nas aulas durante a pesquisa. Como
existem várias versões dessa fábula, Ricardo modificou o final, criando sua
própria versão, transformando, também, a moral da história.
A produção final do aluno traz os dois pontos e travessões que marcam
os diálogos. A vírgula aparece apenas no início do texto e ainda faltam alguns
pontos finais e de interrogação na 3ª linha.
Apesar da falta de pontuações no texto, Ricardo demonstrou que se
apropriou do gênero fábula. Ele produziu textos narrativos, inseriu títulos em
suas produções, construiu enredos simples nos quais figuram a situação inicial,
tramas e desfechos bem claros. Criou uma moral da história para cada um de
seus escritos.
1.4 Marcas da oralidade na escrita
A marca da oralidade, característica principal nas produções de quem
está se apropriando da escrita, aparece em alguns textos dos alunos da
pesquisa.
Figura 23 – Produção inicial de Alícia - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
163
O gato e o rato Era uma vez um gato e o rato eles senpre (sempre) ficava (ficavam) correndo prala (para lá) e praca (para cá) o gato corria corria e não conseguia pegar o ratinho e ele coria (corria) e ele não Dava conta de pegalo (pegá-lo) e ele vivia correndo atras (atrás) dele e até que sin (até que enfim) ele conseguiu pegalo (pegá-lo) e depois ele escapou e aí começou a correr dinovo (de novo).
A aluna, em sua primeira produção, demonstrou não ter se apropriado
completamente do gênero fábula. Os animais figuram em seu texto, têm
atitudes humanas, mas, também agem como os animais que são, inimigos
como sempre. O conteúdo temático não apresenta ensinamento moral.
A construção composicional traz alguns elementos do gênero, como
título, porém esse não se relaciona coerentemente com o conteúdo temático.
Ficou a dúvida se esses animais são personificados e não há uma moral da
história. O termo “pegalo” demonstra que a aluna tentou usar uma linguagem
mais elaborada em seu texto.
Assim, a escrita da aluna não está adequada ao gênero fábula.
O texto de Alícia traz algumas marcas da oralidade na grafia de “prala”
(pra lá), “praca” (pra cá) e “dinovo” (de novo), além dos pronomes oblíquos em
“pegalo” (pegá-lo), que vem da norma culta, mas a aluna a escreve como fala.
Quanto a isso, Koch e Elias (2010, p. 28) salientam que o aprendiz,
[...] ao tentar efetuar a segmentação gráfica adequada, acaba, por vezes, caindo no extremo oposto, isto é, “picando” demais a palavra ou, pelo contrário, emendando vocábulos, conforme a maneira como são pronunciados.
Assim, a aluna foi testando hipóteses em seus escritos. Tentando uma
maneira de escrever adequadamente as palavras, provavelmente Alícia ia
pensando nelas, soletrando-as mentalmente e, por fim, decidiu escrevê-las
como as pronunciava. Alícia não segmentou palavras, mas emendou-as, fato
bastante comum na escrita de principiantes que escrevem como falam.
Segundo Cardoso (2008, p. 31),
[...] a criança inicia seu processo de aprendizagem da escrita apoiada firmemente na sua oralidade e, portanto, essa oralidade vai deixar marcas na sua escrita que, nesse momento, está ainda longe de ser convencional, ortograficamente correta.
164
A escrita é controlada internamente pelo falante que, a cada discurso,
repensa e planeja as palavras, enquanto que na linguagem oral esse controle é
exterior e é construído na interação face a face. Ou seja, a escrita não é
controlada pela situação imediata, mas “pela ‘representação abstrata’ de uma
determinada situação, com um objetivo geral e um destinatário fictício ou, pelo
menos, parcialmente simulado” (CARDOSO, 2008, p. 31).
O texto de Alícia também não tem pontuações, vírgulas ou moral da
história, mas já traz a presença de animais, embora eles não mantenham
conversação. Há, também, algumas palavras grafadas com letras maiúsculas
no meio das frases, provavelmente pela dificuldade que as crianças encontram
em escrever o “p” e o “d” minúsculos ou até mesmo por acharem que as letras
maiúsculas trazem um efeito estilístico melhor ao texto.
A aluna criou seu texto e, como muitas outras, o pensamento é mais
rápido que as mãos e, então, muitos trechos ficam implícitos para o leitor,
porém, na cabeça dela, a história está completa. É o caso do trecho “e até que
sin ele conseguiu pegalo e depois ele escapou e aí começou a correr de novo”.
Houve um lapso temporal no enredo: o gato conseguiu pegar o rato, ele
escapou e começaram a correr de novo. Mas como o rato fugiu? Essa parte da
produção ficou “escondida”, internalizada na mente de Alícia. Provavelmente,
se sua produção fosse oral, esse trecho teria aparecido. Assim, Cardoso (2008,
p. 31) diz que
[...] para se produzir um texto escrito, é necessária uma visão global e antecipada do texto no seu conjunto. Isso nos leva ao caráter voluntário da produção linguística escrita, ou seja, o motivo de agir linguisticamente não decorre da dinâmica da situação imediata, como na oralidade, mas sim de um esforço constante do enunciador (grifos da autora).
Outra marca da oralidade na produção de Alícia é o modo como ela
termina o texto: “e assim termina a história”, como nas rodas de contação de
histórias. Vejamos como ficou a produção final da aluna.
165
Figura 24 – Produção final de Alícia – turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
O sapo e a rã Era uma vez uma rã no rio discansando (descansando) e apareceu [um sapo] e disse asim (assim) oi Rã vamos brincar de pega pega vamos sim quem pega e (é) você sapo eu não quero brincar só que eu não vou brincar mais eu não tonem (to nem) aí e também rã você nunca mais vai ser a minha [amiga] e eu também não voçe (você) aceitar (aceita) as minhas desculpa eu aceito a sua disculpa (desculpa) então vamos brincar de esconde esconde vamos agora sem brigar se nós dois brigarmos nos vamos se (nos) disculpar (desculpar) vamos brincar rã peguei voçe (você) sapo e assim termina a história moral: Uma boa amizade gera outra amizade
A aluna deu indícios de ter se apropriado do gênero fábula, pois o
conteúdo temático apresenta um ensinamento. No plano da construção
composicional há um título, que se relaciona coerentemente com o conteúdo
temático. Os animais, o sapo e a rã, brincam como crianças e a moral da
história é condizente com o conteúdo temático. Desta forma, o texto de Alícia
está completamente adequado ao gênero fábula.
Houve avanços na fábula de Alícia. O diálogo entre o sapo e a rã foi
bastante intenso. A moral da história aparece e está condizente com o texto. A
166
escrita já não tem tantas marcas da oralidade, a não ser no final que se repete
como na primeira produção (“e assim termina a história”).
O fluxo de ideias vem e a aluna vai escrevendo sem parar para refletir
sobre a pontuação, como que por receio de perder o fio condutor do texto. Com
relação a isso, Cardoso (2008, p. 43) denomina “jerky”, um “pensamento que
não se dá de forma linear e contínua, e sim, aos borbotões”. Destaque para a
apropriação da escrita na conjugação correta do verbo brigar, quando a aluna
escreve “brigarmos”.
Embora um dos textos de Alícia não esteja adequado ao gênero fábula,
ela produziu textos narrativos, nos quais inseriu títulos. Construiu enredos
simples, com poucos episódios e deu uma moral da história para a produção
final, criada por ela.
Vejamos outros trabalhos que trazem esses exemplos de marcas da
oralidade.
Figura 25 – Produção inicial de Tânia - turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
a raposa e o corvo Era uma vez uma raposa e o corvo estava (estavam) tomando chá na beira do rio comversando (conversando) No dia seguinte a raposa e o corvo foi (foram) Para a Praia Para entrar tinha que Pagar a raposa
167
pagou o corvo não pagou porque ele não tinha dinhero (dinheiro) para pagar como ela entrou viu que estava sem o corvo ela pagou Para o corvo eles foram banhar e eles comeram de tudo que quiser (quiseram). No outro dia a raposa e o corvo levaram Para fazer Piquinique (piquenique) – melancia – bolo de chocolate cachorro quente Só esse poquinho (pouquinho) Historia
Na produção inicial da aluna não aparece o ensinamento no conteúdo
temático. Na construção composicional identificam-se alguns elementos
constituintes da fábula, como o título, que está relacionado de forma coerente
com o conteúdo temático, que envolve animais e esses são personificados; a
narração é em 3ª pessoa, porém não há a presença de uma moral da história.
Portanto, a produção inicial de Tânia está parcialmente adequada ao
gênero fábula.
No texto de Tânia já se presentificam alguns parágrafos e apenas um
ponto final no meio da escritura. Apesar de não usar os pontos finais, a aluna
inicia algumas frases, onde supomos que deveria haver esse ponto
encerrando-as, com letras maiúsculas. Ao citar os alimentos levados para o
piquenique da raposa e do corvo, esses são separados por traços e não por
vírgulas, como sempre acontece. Cagliari (2009, p. 126) explica que
Estes sinais também não são ensinados logo no início e raramente ocorrem nos textos espontâneos. Às vezes alguns alunos usam sinais como ponto ou travessão para isolar palavras [...], fruto de ensinamentos obtidos em outras atividades que o aluno estende para os textos.
Assim, Tânia, que já deve ter visto os sinais em outros textos, adotou-os
para si.
Os animais, que já não são os de estimação, aparecem na sua
produção, porém não trocam palavras. Mas, há as características humanas
como tomar chá, ir à praia e fazer piqueniques. A história se encerra com uma
frase retirada das rodas de contação de histórias, isto é, marca da oralidade:
“só esse pouquinho de história”.
168
Figura 26 - Produção final de Tânia – turma B
Fonte: Dados da pesquisa.
O rato e a rã Era uma vez, o rato e a rã eles não se gostavam e um dia eles saíram para pescar quando eles chegaram começaram a brigar e a rã estava atrás. acabou pegando a corda e a amarrou e o rato nen (nem) sentiu e os [dois] abou (acabou/acabaram) caindo no rio, e a rã fez de propózito (propósito), e o rato sabia mas a rã não. até que um bombeiro de animais os acudiram (acudiu) e a rã falou ai que raiva e o rato escutou e desse dia em diante a rã nunca mais fez maldade e desse dia [em diante] ele (ela) conversava com o rato. Moral: uma briga se resolve.
O texto da aluna apresenta progressos. No conteúdo temático aparece
um ensinamento, uma moral da história. No plano da composição, também se
presentificam elementos constituintes do gênero fábula: o título, condizente
com o conteúdo temático; os animais personificados, a moral da história,
coerente com o conteúdo temático e o narrador em 3ª pessoa. O texto de Tânia
está completamente adequado ao gênero fábula.
Nessa produção final, Tânia utilizou um pouco mais de vírgulas e pontos
finais. Escreveu uma moral para a história, embora pouco convincente. Usou
alguns pontos finais encerrando as frases, mas não as iniciou com letras
maiúsculas.
169
O texto, inicialmente, dá a impressão de ser um reconto da fábula de
Esopo, “A Rã e o Rato”, todavia, no meio da narrativa, a história de modifica,
tendo um desfecho completamente diferente. Na verdade, a intertextualidade
se dá apenas com os personagens, o rio e a maldade da rã.
Para que não pairassem dúvidas sobre a originalidade de sua fábula,
Tânia inseriu um terceiro personagem, o bombeiro de animais. Faltou a aluna
explicar o porquê de o rato saber da maldade da rã e se deixar levar para a
armadilha. Tânia utilizou os pronomes oblíquos adequadamente ao grafar “e a
amarrou” e “os acudiu”. O texto foi escrito com apenas um parágrafo como
outros de outros alunos, demonstrando que a escola precisa fazer um trabalho
sistemático de como organizar a escrita em partes.
A moral da história condiz com o texto, mas ficaria mais harmônica se
houvesse uma conversação entre o rato e a rã entrando em entendimento e
reatando a amizade, se é que ela houve um dia, pois a aluna inicia o texto
dizendo que os personagens não se gostavam, porém não mencionou o motivo
da desunião entre os dois. A aluna produziu textos narrativos, atribuindo títulos
a eles. Construiu enredos com situações iniciais, tramas e desfechos claros,
inserindo uma moral da história, criada por ela, na produção final.
Vejamos o quadro a seguir, observando as características principais do
gênero fábula contempladas pelos alunos na produção inicial.
Quadro 18 – Quadro comparativo da apropriação do gênero fábula – produção inicial Aluno/turma Classificação
SAEM Título Animais
personificados Moral da história
Moral da história coerente com texto
Adequação ao gênero
Ricardo A AB x X x x Completamente
Juliana A AB x X x x Completamente
William A A x X x x Completamente
Manuelle A A x - x - Não adequado
Myla A C - - x - Não adequado
Jonathan A C - X x - Não adequado
Tiago B AB x X - - Parcialmente
Tânia B AB x X - - Parcialmente
Juliano B A x X - - Não adequado
Alícia B A - X - - Não adequado
Marcos B C - X - - Não adequado
Caterina B C x - - - Não adequado
FONTE: Dados da pesquisa.
170
O quadro mostra que, na produção inicial, dentre os doze (12) alunos,
três (3) se apropriaram do gênero fábula, enquanto que dois (2) o fizeram de
maneira parcial e sete (7) não adequaram seus textos ao gênero.
Os alunos classificados como C pela tabela do SAEM, além de Juliano,
Alícia e Manuelle considerados como A, mediante a mesma avaliação, não
adequaram seus textos ao gênero, provavelmente por não terem entendido os
comandos ou por estarem ainda em processo de domínio do SEA, no caso de
Myla, Jonathan, Marcos e Caterina.
Ricardo, Juliana e William, da turma A, produziram seus textos e estes
estavam completamente adequados ao gênero, pois atribuíram um título, havia
a presença de animais personificados em suas produções e deram uma moral
da história coerente com o texto. Manuelle deu um título e uma moral da
história, todavia, não trouxe os animais personificados para seu texto e a moral
da história não estava em consonância com o mesmo.
Assim, nas produções iniciais, ora faltou título, ora moral da história, ora
animais personificados. Na segunda produção, o quadro se diferencia um
pouco. Vejamos:
Quadro 19 – Quadro comparativo da apropriação do gênero fábula - produção final Aluno/turma Classificação
SAEM Título Animais
personificados Moral
da história
Moral da história
coerente com texto
Adequação ao gênero
Ricardo A AB x x x x Completamente
Juliana A AB x x x x Completamente
William A A x x x x Completamente
Manuelle A A x x x x Completamente
Myla A C x x x - Não adequado Jonathan A C x x x - Não adequado
Tiago B AB x x x x Completamente
Tânia B AB x x x x Completamente
Juliano B A x x x - Não adequado
Alícia B A x x x x Completamente
Marcos B A x - x - Parcialmente
Caterina B A x - x - Não adequado
FONTE: Dados da pesquisa.
Assim, na produção final, Além de Ricardo, Juliana e William (que
escreveram textos completamente adaptados ao gênero na produção inicial),
171
Manuelle, Tânia e Alícia também adequaram completamente seus textos ao
gênero abordado. Marcos, da turma B teve seu segundo texto parcialmente
adequado, enquanto que os demais não avançaram, em se tratando da
apropriação do gênero, o que não significa que não avançaram em outros
aspectos da apropriação do sistema de escrita alfabético.
Um quadro-síntese trará melhor entendimento sobre a apropriação da
fábula por parte dos alunos, antes e depois da sequência didática.
Quadro 20 - Quadro –síntese da apropriação do gênero fábula
ALUNO/TURMA CLASSIFICAÇÃO SAEM
ADEQUAÇÃO AO GÊNERO
PRODUÇÃO INICIAL
ADEQUAÇÃO AO GÊNERO
PRODUÇÃO FINAL
RICARDO A AB COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE
JULIANA A AB COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE
WILLIAM A A COMPLETAMENTE COMPLETAMENTE
MANUELLE A A NÃO ADEQUADO COMPLETAMENTE
MYLA A C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO
JONATHAN A C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO
TIAGO B AB PARCIALMENTE COMPLETAMENTE
TÂNIA B AB PARCIALMENTE COMPLETAMENTE
JULIANO B A NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO
ALÍCIA B A NÃO ADEQUADO COMPLETAMENTE
CATERINA B C NÃO ADEQUADO NÃO ADEQUADO
MARCOS B C NÃO ADEQUADO PARCIALMENTE
Fonte: Dados da pesquisa.
O quadro demonstra que alguns alunos não haviam se apropriado do
gênero na primeira produção. De doze alunos (100%), dois (16,6%) o fizeram
de forma parcial e sete (58,3%) não adequaram seus textos ao gênero fábula
na produção inicial, enquanto que três (25%), desde essa produção já
adequaram suas escritas ao gênero.
A produção final evidencia que dos doze alunos (100%), quatro (33,2%)
não se adequaram ao gênero, um (8,3%) de forma parcial e sete (58,3%)
tiveram seus textos completamente adequados ao gênero fábula.
Com exceção do aluno Juliano, que não teve seu texto adequado ao
gênero, os demais, como Myla, Caterina, Jonathan e Marcos, pelo fato de
estarem em processo inicial de apropriação da escrita, que são classificados
como C, pela tabela do SAEM, também não tiveram seus textos adequados à
fábula.
172
Contudo, esses alunos classificados como C tiveram um desempenho
melhor em seus textos finais, escreveram de forma mais inteligível e se
aproximaram mais do gênero. Isso mostra que a sequência didática pode
ajudar, e muito, o aluno a se apropriar da escrita, juntamente com outras
atividades que o professor venha a desenvolver com seus aprendizes.
Os alunos Tiago e Tânia tiveram suas produções parcialmente
adequadas ao gênero, na produção inicial. Na produção final, seus textos já
estavam completamente adequados. William, Juliana e Ricardo, desde a
escrita inicial, já estavam com seus textos completamente adequados ao
gênero.
Portanto, dos doze (12) alunos sujeitos da pesquisa, sete (7) se
apropriaram do gênero e todos se apropriaram melhor da escrita, também.
De acordo com as entrevistas finais com os professores, ao serem
indagados se a intervenção da pesquisa contribuiu de alguma forma para o
aprendizado de seus alunos, a professora Luísa respondeu: “Sem dúvidas
houve grande contribuição, pois notamos que a cada passo as crianças foram
criando novos textos e desenvolvendo ainda mais a leitura e a participação”. A
resposta do professor Antônio foi: “Com certeza, contribuiu com a leitura, a
escrita e até com a oralidade”.
Segundo os professores, conforme a classificação da avaliação do
SAEM final, seus alunos não deixaram as condições apresentadas no quadro 5
(p. 35), isto é, continuam com as classificações de A, AB e C. Todavia,
relataram que os alunos Myla, Jonathan (turma A) e Marcos (turma B)
avançaram de forma significativa na leitura de palavras e frases simples.
Os resultados das pesquisas levantadas para a elaboração do estado do
conhecimento, assim como minha própria pesquisa, mostraram que o ensino
da produção de texto fundamentado nos gêneros textuais e organizado em
sequência didática auxilia na aprendizagem. Inclusive, um desses trabalhos, o
de Alessandra Marques da Cunha (vide p. 49 dessa dissertação), que também
utilizou o gênero fábula para o aprendizado dos alunos demonstra isso em
suas conclusões.
Os textos dos alunos não estiveram simbolizando os valores ou
comportamentos humanos citados por Coelho (2000, p.166) como “o leão,
símbolo da força, majestade, poder; a raposa, símbolo da astúcia; o lobo, do
173
poder despótico”, mas as ações desses personagens criados por eles, que se
comportavam mal, porém, depois de agirem de forma inadequada, se
arrependiam e ficavam em paz com os amigos a quem magoavam.
174
CONSIDERAÇÕES
O Morcego e a Doninha
Um Morcego desajeitado caiu acidentalmente no ninho de uma Doninha, que, com um bote certeiro o capturou. -Você é um rato, ela disse, e eu sou por natureza inimiga dos ratos. Cada rato que pego, evidentemente, me serve de jantar, essa é a lei. -Mas, a senhora veja bem, eu definitivamente, não sou um rato! Veja minhas asas. Você já viu um rato que é capaz de voar? Claro que sou apenas um tipo de pássaro, de uma variedade um tanto exótica. Por favor, me deixe ir embora! A Doninha, olhando melhor para sua vítima, concordou que ele não era um rato e o deixou ir embora. Mas, alguns dias depois, o mesmo atrapalhado Morcego caiu outra vez no ninho de outra Doninha. Ocorre que esta Doninha era inimiga declarada de todos os pássaros, e logo se preparou para abocanhá-lo. -Você é um pássaro, por isso mesmo o comerei! -O que? Eu, um pássaro! Isso é quase um insulto. Todos os pássaros possuem penas! Cadê minhas penas, você é capaz de vê-las? Claro que não sou nada além de um simples rato. Tenho até um lema que é: “Abaixo todos os gatos!”. E o Morcego teve sua vida poupada pela segunda vez. Moral da história: o sábio aprende a tirar do problema uma solução incapaz de criar outros problemas.
Esopo
Trabalhar com crianças é como plantar sementes e vê-las crescer e
produzir frutos. Com a pesquisa não foi diferente, pois tive a oportunidade de
ver essa sementeira frutificando. Pude ver os avanços dos alunos desde o
período da observação até o momento da produção final do gênero textual
trabalhado.
Alunos que não escreviam, aos poucos foram se apropriando da escrita
e foi possível notar a evolução de suas produções ao compararmos com as
primeiras.
Com relação à fábula, a criatividade dos estudantes foi bastante
exercitada, pois mesmo produzindo textos sustentados em outros, souberam
criar e dar seu traço pessoal à escrita. Ao escreverem a moral da história, nas
produções iniciais, alguns alunos não souberam fazê-la concordar com o texto,
175
ou mesmo deixar um ensinamento ao final. Já nas produções finais a moral da
história estava presente, porém, nos textos de alunos que ainda estavam se
apropriando da escrita, ela continuou sem ligação com estes.
O esforço da pesquisa foi gratificante, pois estar ao lado de crianças nos
ensina muito sobre seus comportamentos, sonhos e necessidades
pedagógicas. Ensina que é preciso enxergar para além do papel escrito, que
erros gráficos ficam em segundo plano quando o que se deseja é o
envolvimento do aprendiz com a escrita e com seu lugar de cidadão consciente
de seus direitos e obrigações, que atua criticamente na sociedade que o
circunda.
Sabemos que o sistema de ensino ainda nos faz caminhar numa estrada
já traçada há algum tempo, da qual não ousamos nos desviar, mas as
formações contínuas para professores estão aí para nos ajudar a ressignificar
nossas práticas pedagógicas. O que aprendemos nas formações oferecidas
pelas redes municipal e estadual transforma nossos olhares.
A pesquisa me proporcionou este olhar diferenciado. Certo dia, numa
reunião de trabalho coletivo na escola, conversando com os professores com
quem trabalhei na pesquisa, estes observavam os “erros” que seus alunos
cometiam em suas produções. Então, me surpreendi olhando os textos de
maneira diferente e dizendo para eles que os alunos haviam escrito algo e isso
era muito importante, que precisávamos ler mais do que as letras impressas no
papel.
Assim, pude verificar que o ensino por meio das sequências didáticas
aprofunda o conhecimento que os alunos já têm sobre os gêneros e ajuda-os a
dominar melhor um gênero no qual sentem alguma dificuldade. E o que se
aprende, verdadeiramente, jamais se esquece.
Meu objetivo era analisar a contribuição das sequências didáticas para a
aprendizagem dos gêneros discursivos pelos alunos e foi constatado que
houve progressos na escrita desses estudantes. De acordo com os
professores, na entrevista final, a intervenção da pesquisa contribuiu para que
os alunos lessem e escrevessem melhor, bem como tiveram sua participação
em eventos de oralidade melhorados.
Alguns alunos obtiveram avanços significativos na apropriação da
escrita, como é o caso de Myla, da turma A, e Marcos, da B. A produção inicial
176
de Myla foi lida com a ajuda da própria aluna, enquanto que na produção final
já foi possível ler e entender o que estava escrito. Depois do período da
pesquisa, tive a oportunidade de ler um texto da referida estudante e notar o
desenvolvimento de sua aprendizagem. Quanto à produção inicial de Marcos,
não foi possível fazer uma leitura. Nem mesmo o aluno leu sua própria escrita.
Porém, sua produção final pôde ser lida sem problemas.
Embora as produções dos alunos Myla e Marcos não tenham atingido a
adequação necessária à apropriação do gênero fábula, suas escritas
melhoraram sensivelmente, o que era desejado e previsto na intervenção.
Assim sendo, o problema da pesquisa consistiu em saber como o ensino
de produção textual baseado em sequências didáticas poderia influenciar na
apropriação dos gêneros textuais pelos alunos. Influenciou na medida em que
as atividades da sequência didática auxiliaram alguns dos alunos a se
apropriarem do gênero fábula e, consequentemente, da escrita. Isso ocorreu
devido ao caráter modular, às possibilidades de diferenciação decorrentes
desse ensino e à relação com outras dimensões de ensino da língua que são
pontos essenciais da sequência didática, segundo Dolz, Noverraz e Schneuwly
(2004, p.96). Isso inclui o objetivo que tentei alcançar com o estudo.
As sequências didáticas, como instrumento pedagógico, interferiram de
maneira positiva na aprendizagem dos gêneros discursivos, permitindo que os
estudantes desenvolvessem suas habilidades de escrita, melhorando
sensivelmente a comunicação e, no decorrer da pesquisa, pude acompanhar o
desenvolvimento desses alunos que foram se envolvendo com os textos, lendo
e produzindo o gênero fábula.
A quase ludicidade dos textos no gênero encantou as crianças e,
provavelmente por esse fato, envolveu-os de uma forma que quase todos
foram apropriando-se do gênero sem se darem conta de que estavam
aprendendo.
A relação entre as estratégias de ensino por intermédio das sequências
didáticas e os resultados sobre as capacidades de produção textual dos alunos
foram perceptíveis quando seus textos finais receberam uma dose maior de
criatividade. Essa criatividade se presentificou mesmo nas produções dos
alunos que ainda não haviam se apropriado completamente do gênero. Uma
das possibilidades de isso ter ocorrido foi o fato de que os estudantes ouviram
177
muitas fábulas, enriquecendo, assim, o repertório de palavras e a imaginação
deles.
Quanto às categorias transversais, essas não estão relacionadas ao
gênero, mas às produções textuais dos alunos sujeitos da pesquisa. Alguns
textos apresentaram problemas com as pontuações e marcas da oralidade.
Outros faziam intertextualidade com diferentes produções. Algumas crianças,
ainda, escreveram demonstrando estarem em processo mais consolidado da
escrita, enquanto que outras, mais inicial de apropriação. Enfim, foram itens
que se sobressaíram nos textos dos estudantes.
Também os professores sujeitos da pesquisa, conforme entrevista final,
reconheceram ser importante o ensino por meio de sequências didáticas, pois
o ensino por etapas produz um efeito melhor na aprendizagem dos alunos. E,
indagados sobre a importância dos gêneros textuais para a interação dos
alunos e suas aprendizagens, responderam que há a necessidade de um
trabalho progressivo e aprofundado; que o professor precisa conhecer as
habilidades que seus alunos já possuem e estabelecer as que almeja alcançar,
explorando bem o gênero textual ensinado.
Ao questionar os professores se já haviam trabalhado anteriormente
atividades ensinadas por meio de sequências didáticas, disseram que sim,
todavia, não obtiveram os resultados esperados, provavelmente, segundo eles,
pela inexperiência no modo como foi abordado esse ensino.
Para Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.111), para adaptar a
sequência didática às necessidades dos alunos é preciso, da parte do
professor, analisar as produções dos alunos de acordo com os objetivos da
sequência e as características do gênero estudado; selecionar as atividades
que serão indispensáveis para a continuidade da sequência; e prever e
planejar, caso não obtenha sucesso, um trabalho mais aprofundado e
intervenções diferenciadas para os problemas que surgirem.
Segundo Bakhtin (2011, p. 261), o gênero discursivo apresenta três
dimensões: o conteúdo temático, a construção composicional e o estilo. No
caso da fábula, a primeira dimensão se refere ao conteúdo didático moralista
dessa. A segunda dimensão são os elementos que constituem o gênero fábula,
como o título, a presença de animais personificados, a moral da história e o
178
narrador em 3ª pessoa. Quanto ao estilo, esse se dá pela seleção dos recursos
lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua.
Ao comparar a produção inicial com a final de cada aluno, foi possível
notar o avanço que eles obtiveram. Com exceção de uma aluna que, ao
escrever seu texto final, praticamente repetiu a primeira produção, os demais
estudantes conseguiram melhorar seus textos, embora nem todos tenham feito
produções adequadas ao gênero fábula, considerando as dimensões do
próprio gênero.
Para Marcuschi (2008, p. 213), na ótica escolar, os gêneros, vistos por
meio dessas três dimensões, tornam-se um ponto de referência concreto para
os estudantes, que permitem que eles entendam os gêneros como unidades
reais, nas quais o ensino se dá.
Cardoso (2002, p. 96) observa que a aprendizagem da linguagem situa-
se entre as práticas e as atividades de linguagem e o desenvolvimento das
capacidades de linguagem apoia-se nos gêneros textuais. Portanto, o gênero
textual é um termo de referência para o ensino-aprendizagem da escrita.
O percurso desta pesquisa me autoriza a acreditar que, se esse ensino
for ministrado por intermédio das sequências didáticas, as possibilidades de
êxito na apropriação da escrita pelos alunos serão maiores. Assim, como
ressaltam Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.114), as sequências didáticas
visam ao aperfeiçoamento das produções orais e escritas, focando a aquisição
de procedimentos e práticas.
179
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Eliana Borges Correia de; LEAL, Telma Ferraz. O contexto
escolar de produção de textos. In: LEAL, Telma Ferraz; BRANDÃO, Ana
Carolina Perrusi (orgs.). Produção de textos na escola: reflexões e práticas
no Ensino Fundamental. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 99-118.
AZEVEDO, Claudinéia B; TARDELLI, Marlete C. Escrevendo e falando na sala
de aula. In: GERALDI, Wanderlei: CITELLI, Beatriz (Coord.). Aprender e
ensinar com textos de alunos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2011, p. 27-49.
BAKHTIN, Mikhail Mikhailovitch.Os gêneros do discurso. In: BAKHTIN, Mikhail
Mikhailovitch. Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. 6 ed.
São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011, p. 261-269.
______. O problema do texto na linguística, na filosofia e em outras ciências
humanas. In: Mikhail Mikhailovitch. Estética da criação verbal. Tradução de
Paulo Bezerra. 6. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011, p. 307-
335.
______. Marxismo e filosofia da linguagem. 12. ed. São Paulo: Hucitec,
2006.
BARROS-MENDES, Adelma; CUNHA, Débora Anunciação; TELES, Rosinalda.
Alfabetização em foco: projetos didáticos e sequências didáticas em diálogo
com os diferentes componentes curriculares. In: Pacto Nacional pela
Alfabetização na Idade Certa. Ano 03. Unidade 06. BRASIL. Brasília:
MEC/SEB, 2012, p. 5-47. Disponível em: <http://pacto.portalceel.com.br>.
Acesso em: 07/01/2014.
BENTES, Anna Christina. Linguística textual. in: MUSSALIM, Fernanda;
BENTES, Anna Christina (Orgs.). Introdução à linguística: domínios e
fronteiras. v. 1. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2007, p.245-285.
BEZERRA, Maria Auxiliadora. Por que cartas do leitor na sala de aula. In:
DIONÍSIO, Ângela Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria
Auxiliadora (orgs.). Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial,
2010, p. 225-241.
BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari. Investigação qualitativa em educação.
Porto: Porto Editora, 1994.
BOSCO, Cláudia Starling. Práticas de escrita de crianças do primeiro ciclo
de alfabetização em situações reguladas pela professora e pelo grupo.
180
2010. 181 f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Federal de
Minas Gerais, 2010. Disponível em:
<http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/handle/1843/1>. Acesso em: 26
fev. 2013.
BRAIT, Beth; MELO, Rosineide de. Enunciado/enunciado concreto/enunciação.
In: BRAIT, Beth (org.). Bakhtin: conceitos-chave. 3. ed. São Paulo: Contexto,
2006, p. 60-78.
BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi. A revisão textual na sala de aula: reflexões e
possibilidades de ensino. In: LEAL, Telma Ferraz; BRANDÃO, Ana Carolina
Perrusi (Orgs.). Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino
Fundamental. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 119-134.
BRASIL, Ministério da Educação. FUNDESCOLA/SEF. Alfabetização: contos
tradicionais, fábulas, lendas e mitos. V. 2. Brasília: MEC, 2000, p. 5, 97-107.
BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa. 3. ed. Brasília: A
Secretaria, 2001.
BRASIL, Ministério da Educação. Pró-Letramento: Programa de formação
continuada de professores dos anos/séries iniciais do ensino fundamental:
alfabetização e linguagem. Brasília: MEC, 2008. Fascículo 7: Modos de falar,
modos de escrever, p. 3-39.
______. Fascículo 3: A organização do tempo pedagógico e o planejamento
do ensino. Brasília: MEC, 2008, p. 3-31.
______. Fascículo 1: Capacidades linguísticas: alfabetização e letramento.
Brasília: MEC, 2008, p. 3-60.
Britannica Escola Online. Enciclopédia Escolar Britannica, 2014. Web. 2014.
Disponível em: <http://escola.britannica.com.br/article/483330/Jean de La
Fontaine>. Acesso em 09 de fev. de 2014.
BUNZEM, Clécio. O tratamento da diversidade textual nos livros didáticos de
português: como fica a questão dos gêneros? In: SANTOS, Carmi Ferraz;
MENDONÇA, Márcia; CAVALCANTE, Marianne C. B. (Orgs.). Diversidade
textual: os gêneros na sala de aula. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p.
43-58.
CADERNOS DE APOIO E APRENDIZAGEM. Língua Portuguesa. 4º ano.
Programas: ler e escrever e orientações curriculares. Livro do professor.
Unidade 3 – Confabulando. São Paulo: Fundação Padre Anchieta, 2010,
181
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização & linguística. São Paulo: Scipione,
2009.
CARDOSO, Cancionila Janzkovski. A socioconstrução do texto escrito: uma
perspectiva longitudinal. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2002.
______. Da oralidade à escrita: a produção do texto narrativo no contexto
escolar. Cuiabá: UFMT/ INEP/ MEC, 2000.
______. O que as crianças sabem sobre a escrita?. Cuiabá, MT: Central de
Texto: EdUFMT, 2008.
CARDOSO, Maria Angélica. Leitura de diferentes linguagens em suporte de
texto não-escolar: o gênero embalagem de produtos alimentícios na atividade
pedagógica. 2005. 112 f. Dissertação (Mestrado em Linguística). Universidade
do Sul de santa Catarina, Tubarão – SC, 2005. Disponível em:
<http://busca.unisul.br/pdf/83406>. Acesso em: 20 mar. 2013.
CITELLI, Beatriz Helena Marão; BONATELLI, Ivanhoé Robson Marques. A
escrita na sala de aula: vivências e possibilidades. In: GERALDI, J. Wanderley;
CITELLI, Beatriz (Coord.). Aprender e ensinar com textos de alunos. 7. ed.
São Paulo: Cortez, 2011, p. 121-176.
COELHO, Nelly Novaes. Literatura Infantil: teoria, análise, didática. 1. ed. São
Paulo: Moderna, 2000, p. 163-183.
COSTA, Sérgio Roberto. A construção de “títulos” em gêneros diversos: um
processo discursivo polifônico e plurissêmico. In: ROJO, Roxane (org.). A
prática da linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. São Paulo:
EDUC; Campinas: Mercado de Letras, 2000, p. 67-90.
CUNHA, Alessandra Marques da. Produção textual: o que dizem e escrevem
educandos do 3º ano sobre o gênero fábula. 2010. 298 f. Tese (Doutorado em
Educação). Universidade Federal de são Carlos, São Paulo, 2010. Disponível
em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto>. Acesso em: 25 fev.
2013.
DOLZ, Joaquim; NOVERRAZ, Michèle; SCHNEUWLY, Bernard. Sequências
didáticas para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In:
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim e Colaboradores. Gêneros orais e
escritos na escola. Tradução de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro.
Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004, p. 95-127.
DUBEUX, Maria Helena Santos; SILVA, Leila Nascimento da. Por que ensinar
gêneros textuais na escola? In: Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade
182
Certa. Ano 02. Unidade 05. BRASIL. Brasília: MEC/SEB. 2012, p.6-9.
Disponível em: <http://www.criciuma.sc.gov.br/site/upload/ckfinder>. Acesso
em 14 jan. 2014.
FERREIRA, Norma Sandra de Almeida. As pesquisas denominadas “estado
da arte”. Disponível em <http://www.fe.unicamp.br>. Acesso em: 22 dez. 2013,
p. 1-11.
FLICK, Uwe. Uma introdução à pesquisa qualitativa. Trad. Sandra Netz. 2.
ed. Porto Alegre: Bookman, 2004.
GARCIA, Stella de Lourdes. Os gêneros do discurso e a prática da
produção textual: dialogando sobre os conhecimentos necessários aos
educadores dos anos iniciais do ensino fundamental. 2010. 249 f. Tese
(Doutorado em Educação). Universidade Federal de São Carlos, São Paulo,
2010. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto>.
Acesso em: 20 fev. 2013.
GERALDI, J. Wanderley. Da redação à produção de textos. In: GERALDI. J.
Wanderley; CITELLI, Beatriz (Coord.) Aprender e ensinar com textos de
alunos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2011, p. 17-25.
______. Portos de passagem. 5. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013.
GRIBEL, Christiane. Minhas férias, pula uma linha, parágrafo. Rio de
Janeiro: Salamandra, 1999.
GUERRA, Severina Erika Morais Silva. Produção coletiva de carta de
reclamações: interação professoras/alunos. 2009. 183 f. Dissertação
(Mestrado em Educação). Universidade Federal de Pernambuco, 2009.
Disponível em: <http://pt.slideshare.net/juliane29/dissertao-27079767>. Acesso
em: 14 abr. 2013.
GUIMARÃES, Ana Maria de Mattos; CAMPANI-CASTILHOS, Daiana; DREY,
Rafaela Fetzner. Gêneros de texto no dia-a-dia do ensino fundamental.
Campinas, SP: Mercado de Letras, 2008.
JESUS, Conceição Aparecida de. Reescrevendo o texto: a higienização da
escrita. In: GERALDI, J. Wanderley; CITELLI, Beatriz (Coord.). Aprender e
ensinar com textos de alunos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2011, p. 101-119.
JOLIBERT, Josette e Colaboradores. Formando crianças produtoras de
textos. Tradução de Walkíria M. F. Settineri e Bruno Charles Magne. Vol. II.
Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
183
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de
produção textual. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2010.
LEAL, Telma Ferraz; MELO, Kátia Leal Reis de. Produção de textos: introdução
ao tema. In: LEAL, Telma Ferraz; BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi (Orgs.).
Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino Fundamental.
1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 11-26.
LEAL, Telma Ferraz; BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi. É possível ensinar a
produzir textos! Os objetivos didáticos e a questão da progressão escolar no
ensino da escrita. In: LEAL, Telma Ferraz; BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi
(Orgs.). Produção de textos na escola: reflexões e práticas no Ensino
Fundamental. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 45-63.
LIMA, Ana; BEZERRA, Normanda. Sala de aula: espaço também da fala. In:
LEAL, Telma Ferraz: GOIS, Siane (Orgs.). A oralidade na escola: a
investigação do trabalho docente como foco de reflexão. Belo Horizonte:
Autêntica Editora, 2012, p. 57-72.
LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens
qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
MARCUSCHI, Beth. Redação escolar: breves notas sobre um gênero textual.
In: SANTOS, Carmi Ferraz; MENDONÇA, Márcia; CAVALCANTE, Marianne C.
B. Diversidade textual: os gêneros na sala de aula. 1. ed. Belo Horizonte:
Autêntica, 2007, p. 59-72.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Da fala para a escrita: atividades de
retextualização. São Paulo: Cortez, 2001.
______. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo:
Parábola Editorial, 2008.
______. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, Ângela
Paiva; MACHADO, Anna Rachel; BEZERRA, Maria Auxiliadora (orgs.).
Gêneros textuais e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2010, p. 19-39.
MENDONÇA, Márcia. Análise linguística: refletindo sobre o que há de especial
nos gêneros. In: SANTOS, Carmi Ferraz; MENDONÇA, Márcia; CAVALCANTE,
Marianne C. B. (Orgs.). Diversidade textual: os gêneros na sala de aula. 1.
ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 73-88.
MENDONÇA, Márcia (Coord.). Diversidade textual: propostas para a sala de
aula. Formação continuada de professores. Recife, MEC/UFPE/CEEL, 2008.
184
NASCIMENTO, Julliane Campelo do; SILVA, Leila Nascimento da; LIMA,
Marineusa Alvino da Silva. O gênero seminário: habilidades a serem
desenvolvidas e o papel da mediação docente. In: Leal, Telma Ferraz; GOIS,
Siane (Orgs.). A oralidade na escola: a investigação do trabalho docente
como foco de reflexão. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012, p. 161-179.
NUNES, Fabiana Vieira. Gêneros textuais no ensino: uma experiência por
projeto. 2010. 171 f. Dissertação (Mestrado em Linguística). Universidade de
Brasília, Distrito federal, 2010. Disponível em:
<http://bdtd.bce.unb.br/tedesimplificado/tde_arquivos>. Acesso em: 03 mar.
2013.
SANTOS, Carmi Ferraz. O ensino da língua escrita na escola: dos tipos aos
gêneros. In: SANTOS, Carmi Ferraz; MENDONÇA, Márcia; CAVALCANTE,
Marianne C. B. (Orgs.). Diversidade textual: os gêneros na sala de aula. 1.
ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 11-26.
SANTOS, Carmi Ferraz; MENDONÇA, Márcia: CAVALCANTE, Marianne C. B.
Trabalhar com texto é trabalhar com gênero? In: SANTOS, Carmi Ferraz;
MENDONÇA, Márcia; CAVALCANTE, Marianne C. B. (Orgs.). Diversidade
textual: os gêneros na sala de aula. 1. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p.
27-41.
SANTOS, Márcia Ormonde Portela; ROCHA, Simone Albuquerque da;
CARDOSO, Cancionila Janzkovski. Os gêneros textuais e sua abordagem no
programa Pró-letramento. In: X Congresso Nacional de Educação –
EDUCERE e o I Seminário internacional de representações sociais,
subjetividade e Educação – SIRSSE, 2011.
SCHNEUWLY, Bernard. Gêneros e tipos de discurso: considerações
psicológicas e ontogenéticas. In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim e
Colaboradores. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução de Roxane
Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004, p. 21-
39.
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Os gêneros escolares – das práticas
de linguagem aos objetos de ensino. In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ,
Joaquim e Colaboradores. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução de
Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004,
p. 71-91.
SERCUNDES, Maria Madalena Iwamoto. Ensinando a escrever. In: GERALDI,
J. Wanderley; CITELLI, Beatriz (Coord.). Aprender e ensinar com textos de
alunos. 7. ed. São Paulo: Cortez, 2011, p. 79-100.
185
SOARES, Magda. Alfabetização e letramento. 6. ed. São Paulo: Contexto,
2011.
THERRIEN, Sílvia Maria Nóbrega; THERRIEN, Jacques. Trabalhos científicos
e o estado da questão: reflexões teórico-metodológicas. In: Estudos em
Avaliação Educacional, v. 5, n. 30, jul. dez. 2004, p. 5-16.
ZAYAS, Felipe. Los géneros discursivos y la enseñanza de la composición
escrita. Revista Ibero-americana de educação. N. 59. 2012. Disponível em
<http://www.rieoei.org/rie59a3.pdf >. Acesso em: 18 ago. 2013.
186
ANEXOS
ANEXO 1 – Roteiro da entrevista inicial com os professores..........................186
ANEXO 2 – Roteiro da entrevista final com os professores............................187
ANEXO 3 – Questionário de caracterização dos professores.........................188
ANEXO 4 – Questionário de caracterização da escola...................................189
187
ANEXO 1 - Roteiro da entrevista inicial com os professores
1 - Como você tem desenvolvido seu trabalho com a Língua Portuguesa?
2 – Que meios você mais utiliza para o ensino da gramática?
3 – A escola escolheu uma coleção de livros didáticos para o ensino da língua
materna. Que livro é este?
4- Em sua opinião, ele dá conta de efetivar o ensino da escrita aos alunos?
5 – Que portadores de textos você mais utiliza para o ensino da escrita?
6 – O que significa para você alfabetizar com textos?
7 – Você utiliza o conhecimento prévio de seus alunos para o ensino da
escrita? De que forma?
8 – De que modo você trabalha a oralidade?
9 – Costuma trabalhar os gêneros textuais com seus alunos?
10 - Quais e com que frequência?
11 – Quais as principais dificuldades que você enfrenta ao ensinar Língua
Portuguesa?
12– Até que ponto você considera a interação social entre seus alunos como
uma ferramenta para a tarefa da produção escrita?
13 – Em quem/que você se embasa ao planejar suas aulas de produção
textual?
14 - Como você explica o fato de um aluno escrever bem ou escrever mal?
15 - Como você costuma trabalhar as produções de textos?
16 – Você considera isso importante ou não?Por quê?
17 – Como é para você a questão da tipologia narrativa, descritiva, dissertativa
e argumentativa e qual é a função dela na escola?
18 – Em quais gêneros textuais seus alunos apresentam maior dificuldade de
aprendizagem?
19 – Você tem feito cursos de atualização? Quais?
20 – Fez o Pró-Letramento?
21 – Tem feito leituras sobre o ensino da Língua Portuguesa? Quais?
22 – De acordo com o plano anual de ensino da escola, quais gêneros serão
abordados neste ano letivo?
188
ANEXO 2 – Roteiro da entrevista final com os professores
1 – Você considera ter compreendido melhor os gêneros textuais com o
decorrer da pesquisa? De que forma isso ocorreu?
2 – A intervenção da pesquisa contribuiu de alguma forma para o aprendizado
dos seus alunos? Como?
3 – Você já trabalhou anteriormente atividades ensinadas por meio de
sequências didáticas? Como foi?
4 – Você considerou a intervenção com alguns dos gêneros mais difícil? Por
quê?
5 – A minha presença em sala de aula prejudicou ou auxiliou de alguma
maneira o aprendizado de seus alunos? Você notou se houve alguma mudança
nos comportamentos e aprendizado deles?
6 – Até que ponto você considera as sequências didáticas importantes para a
aprendizagem dos alunos?
7 – Minha presença na sala de aula fez com que, de alguma forma, você
mudasse sua prática docente na disciplina Língua Portuguesa, intensificando
ou reduzindo-a?
8 – Ensinar a língua materna para os alunos, depois da intervenção da
pesquisa, pode ter uma ressignificação para você? Você mudaria algo na sua
prática docente? Se sim, o que mudaria?
9 – Em sua opinião, qual a importância dos gêneros textuais para a interação
dos alunos e suas aprendizagens?
10 – Observei que nas duas salas há um caderno específico para a produção
de textos. Por que isso ocorre?
11 – Que tipos de atividades você seleciona para auxiliar o aluno em processo
de apropriação da escrita?
12 – Tem obtido bons resultados nessa tarefa? Explique.
13 – Já pensou em ensinar a apropriação da escrita por meio de textos? Como
seria?
189
ANEXO 3 - Questionário de caracterização dos professores
1 – Qual é a sua formação?
2 – Há quanto tempo está na docência?
_______________________________________________________________
3 – Por qual razão se interessou pela docência?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
4 – Há quanto tempo leciona nesta escola?
_______________________________________________________________
5 – Durante este tempo, sempre trabalhou com as séries iniciais?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
6 – Desempenhou outra função nesta escola relacionada ou não à docência?
______________________________________________________________
7 – Que função era esta, quanto tempo durou e como foi a experiência?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
8 – Você é um profissional efetivo da rede?
_______________________________________________________________
9 – Já trabalhou com outras fases do ciclo? Quais?
_______________________________________________________________
10 – Por qual motivo está trabalhando com esta fase do ciclo neste ano letivo?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
190
ANEXO 4 - Questionário de caracterização da escola
1 – Nome da instituição:
2 – Endereço da instituição:
3 – Fundada em:
4 – Nome do diretor:
5 – Coordenadora pedagógica das séries iniciais:
6 – Total de alunos matriculados:
7 – Alunos matriculados no I ciclo:
8 – Número de professores atuando neste ano letivo na escola:
9 – De acordo com o PPP, que gêneros textuais a escola pretende abordar
neste ano letivo?
Top Related