UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍCENTRO DE EDUCAÇÃO BIGUAÇU
CURSO DE PSICOLOGIA
ROBERTO MAC DONALD
DA IMERSÃO À EMOÇÃO:
A PRESENÇA EM JOGOS DIGITAIS
BIGUAÇU
2006
ROBERTO MAC DONALD
DA IMERSÃO À EMOÇÃO:
A PRESENÇA EM JOGOS DIGITAIS
Projeto apresentado para a realização do Trabalho de
Conclusão de Curso no curso de Psicologia da
Universidade do Vale do Itajaí.
BIGUAÇU
2006
IDENTIFICAÇÃO
ÁREA DE PESQUISA: Psicologia e mídias
TEMA: Novas tecnologias de comunicação e entretenimento.
TÍTULO DE PROJETO: Da Imersão à Emoção: A presença em jogos digitais.
ALUNO
Nome: Roberto Mac Donald
Código de Matrícula: 0011487
Centro: Centro de educação Biguaçu Curso: Psicologia, 8° semestre
ORIENTADORA
Nome: Ilma Borges
Categoria Profissional: Psicóloga
Titulação: Mestre em Engenharia de Produção e Inteligência Artificial
Curso: Psicologia
Centro: Centro de Educação Biguaçu
SUMÁRIO
1 ESTRUTURA DO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO...................................................1.1 ELEMENTOS PRÉ-TEXTUAIS .................................................................................................11.1.1 Capa...... .....................................................................................................................................11.1.2 Folha de rosto ............................................................................................................................21.1.3 Identificação ..............................................................................................................................31.1.4 Sumário......................................................................................................................................41.2 ELEMENTOS TEXTUAIS..........................................................................................................51.2.1 Capítulo I – Projeto de pesquisa ................................................................................................51.2.1.1 Justificativa.............................................................................................................................51.2.1.2 Problemática ...........................................................................................................................81.2.1.3 Objetivos...............................................................................................................................101.2.1.3.1 Objetivos gerais .................................................................................................................101.2.1.3.2 Objetivos específicos.........................................................................................................101.2.1.4 Metodologia..........................................................................................................................111.2.1.4.1 Princípios metodológicos ..................................................................................................111.2.2 Capítulo II – Ser humano, virtualidade, e jogos digitais .......................................................121.2.2.1 Jogos digitais e as funções superiores ..................................................................................121.2.2.2 O sujeito e as emoções .........................................................................................................131.2.2.3 O virtual................................................................................................................................151.2.3 Capítulo III – Relações entre imersão, emoção e virtual.........................................................181.2.3.1 A imersão como esquecimento da realidade ........................................................................181.2.3.2 Presença e imersão................................................................................................................211.2.3.3 A experiência afetiva na imersão..........................................................................................271.2.3.4 Fenômenos imersivos ...........................................................................................................301.2.3.5 Da imersão à emoção............................................................................................................311.2.4 Conclusão ................................................................................................................................341.3 ELEMENTOS PÓS-TEXTUAIS ...............................................................................................361.3.1 Referências ..............................................................................................................................371.3.2 Bibliografia complementar ......................................................................................................391.3.3 Anexos .....................................................................................................................................411.3.3.1 Cronograma ..........................................................................................................................42
1.2.1 Capítulo I – Projeto de pesquisa
1.2.1.1 Justificativa
A indústria de jogos digitais se destacou em meados de 1970 e seu desenvolvimento e
alcance social cresceram rapidamente, dando origem a novas tecnologias e novas formas de
entretenimento e educação. Atualmente, esta indústria se desdobrou em uma miríade de faces
diferenciadas com objetivos específicos que contribuem tanto para solidificar sua identidade
como para questionar um meio de interação com um grande potencial a ser explorado e utilizado
social e cientificamente.
Em diversos países, jogos para consoles, computadores, celulares entre outros são
utilizados e desenvolvidos para homens e mulheres de idades diferenciadas, incluindo crianças,
jovens e adultos. Segundo a “Entertainment Software Association”, mais de 248 milhões de jogos
para consoles e computadores foram vendidos nos Estados Unidos em 2004, totalizando
aproximadamente dois jogos por residência, onde o jogador mediano tem 30 anos de idade,
constituindo um público de 43% de jogadoras do sexo feminino e 57% do sexo masculino.
No Brasil, uma pesquisa realizada pela “Associação Brasileira das Desenvolvedoras de
Jogos Eletrônicos” (ABRAGAMES) indicou um crescimento de aproximadamente 40% no
faturamento das empresas nacionais de desenvolvimento de jogos entre 2003 e 2004.
Grupos de diferentes países se organizam em torno de interesses comuns relacionados ao
mundo dos jogos. Congressos, conferências, exposições e comunidades on-line de
desenvolvedores e jogadores são constantes, tratando sobre temas como lançamentos, novas
tecnologias e idéias, jogos independentes entre muitos outros, como a segunda “Annual Women’s
Game Conference”, realizada em 2005 e salientando a importância das mulheres como
consumidoras dos jogos e a “Accesible Game Developer’s community” (AGDev), que busca
formas de tornar os jogos mais acessíveis àqueles com necessidades especiais.
As mudanças culturais e educacionais que os jogos digitais possibilitaram podem ser
observadas em sua ligação com outras formas de entretenimento e técnicas de ensino, e através
de comportamentos específicos advindos desta sua popularização. O simulador HazMat, como
exemplo, é um programa desenvolvido a partir da tecnologia de consoles e tem o intuito de
treinar bombeiros em situações com materiais prejudiciais a saúde. Há um grande número de
títulos baseados em filmes, desenhos animados, livros e contos sendo desenvolvidos com
frequência, concomitantemente estes meios culturais utilizam-se do conteúdo de jogos em muitas
de suas produções.
A passividade física da atividade, a violência presente em muitos títulos, casos extremos
de pessoas que morreram por exaustão depois de um prolongado período de jogo sem descanso e
entre outras situações levaram a emergência de discussões, questionamentos e estudos por
diversas entidades sobre os possíveis efeitos nocivos da prática na saúde e constituição psíquica
do ser humano.
É em sua capacidade de provocar emoções, no entanto, que se fundamenta uma
justificativa de compreender este fenômeno sob uma orientação científica teórica. Os jogos
digitais levam seus usuários a mundos virtuais com desafios e objetivos ao qual buscam vencer
ou alcançar através de uma mídia que possibilita uma interatividade capaz de mudar seu próprio
conteúdo pelo intermédio de um jogador. A virtualidade intrínseca desta atividade, especialmente
combinada à possibilidade de experimentá-la em rede com outros usuários configurando um
espaço social, delimita um campo de pesquisa se faz necessário compreender como as emoções
podem se manifestar a partir da imersão neste ambiente virtual que em um primeiro momento
pode ser tido como “desrealizante” ou “desnaturalizante”.
Um entendimento desta relação, proposto neste trabalho a partir de uma investigação
teórica, pode trazer benefícios a variados campos da ciência onde a questão se mostra pertinente,
assim como àqueles que produzem jogos de entretenimento ou educativos ao fornecer um
conhecimento que permita aos desenvolvedores não se desviarem de aspectos importantes
associados ao prazer potencial da experiência. O material teórico reunido neste trabalho também
pode encontrar utilidade em pesquisas associadas à imersão dentro de outras áreas que não a dos
jogos digitais.
Devido ao seu crescimento nos últimos anos, a indústria de jogos vem passando por
modificações estruturais buscando melhoramentos na qualidade de suas produções assim como
nas divisões de competências daqueles que fazem parte do processo criativo. O desejo de saber
mais acerca dos jogos digitais se converte em necessidade para aqueles que, como o pesquisador,
buscam não apenas aprofundar o conhecimento científico nesta área mas também uma maior
capacitação para estar realizando o trabalho de desenvolvê-los profissionalmente.
1.2.1.2 Problemática
A virtualização é um movimento que está presente em diversas esferas da interação
humana e não diz respeito apenas a presença da tecnologia digitalizada, mas traz novas
estruturações à economia e a política, as formas de transmitir e integrar as informações e as
formas de perceber e conceber a identidade.
O virtual é definido por Levy (1996, p. 12) como “um modo de ser fecundo e poderoso,
que põe em jogo processos de criação, abre futuros, perfura poços de sentido sob a platitude da
presença física imediata”.
Os jogos digitais são diretamente favorecidos por esta característica criativa do virtual,
que lhes dá a possibilidade de um alto nível de complexidade, e o ato de jogá-los está relacionado
a diversos fatores que os constituem como a solução de problemas, a resolução de conflitos e
objetivos, identificações culturais, emoções, competitividade entre usuários on-line, imersão,
interatividade entre muitos outros.
Diante destes elementos, a imersão recebe destaque por ser uma característica essencial
constituinte dos jogos digitais, e remete a capacidade dos usuários situarem-se dentro da
experiência proporcionada por eles. Estar imerso em um jogo digital é possibilitado através de
diversas conexões como técnicas de narrativa, simplicidade da interface entre vários outros
exemplos que podem ser citados. Laurie N. Taylor, em sua tese intitulada “Video-games:
perspectiva, ponto de vista, e imersão” (2002), trabalha com o termo Imersão Situada (Situated
Immersion) para se referir a imersão dentro do espaço virtual criado pelo jogo através da
perspectiva do personagem ou da visão de seu corpo. Neal McGann salienta a importância de
elementos como a consistência lógica do mundo (Spatial Coherence) e número de quadros
(Frames) exibidos por segundo como fatores possibilitadores da imersão nos jogos, em sua tese
“Assistindo jogos e jogando filmes: a influência do cinema em jogos de computador” (2003).
Como é possível observar, não só o termo imersão, mas as características que possibilitam
o processo assim como os limites de sua aplicação devem ser claramente definidos para se
realizar uma pesquisa e discussão teóricas sobre o assunto capazes de gerar intervenções
eficientes nos contextos onde o fenômeno ocorre, e aptas a descrever segundo um ponto de vista
teórico a relação entre as emoções suscitadas no ambiente virtual dos jogos digitais com o
processo imersivo.
1.2.1.3 Objetivos
1.2.1.3.1 Objetivo geral
Identificar conceitualmente a relação sobre as emoções suscitadas no ambiente virtual dos
jogos digitais em relação ao processo imersivo.
1.2.1.3.2 Objetivos específicos
Caracterizar sob o ponto de vista teórico os termos emoção, virtual e imersão,
situados no contexto dos jogos digitais.
1.2.1.4 Metodologia
1.2.1.4.1 Princípios metodológicos
As metodologias de pesquisa são produções teóricas que fundamentam a investigação
científica, determinando visões que compreendem a relação do pesquisador com o conteúdo
pesquisado. Segundo Martins et al (1994, p. 65):
Toda pesquisa científica assim como as descobertas e invenções pressupõemsempre uma posição, uma postura que torna possível investigar os fenômenos apartir de uma certa perspectiva, a qual habilita o pesquisador a encontrar respostaspara sua problemática.
Neste trabalho, a pesquisa bibliográfica será a metodologia orientadora durante todo o
processo, relacionando os termos apresentados através de uma perspectiva conceitual. De acordo
com Marconi et al (1999, p.73):
As pesquisas bibliográficas, ou de fontes secundárias, abrange toda bibliografia játornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas,boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, testes, materialcartográfico etc., até meios de comunicação orais: rádio, gravações em fitasmagnéticas e audiovisuais: filmes e televisão. Sua finalidade é colocar opesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobredeterminado assunto.
A pesquisa bibliográfica permite, através do levantamento de informações pertinentes ao
tema, definir e resolver problemas de pesquisa em campos já explorados ou ainda não
consolidados, possibilitando questionamentos e conclusões inéditas.
1.2.2 Capítulo II – Ser humano, virtualidade, e jogos digitais
1.2.2.1 Jogos digitais e as Funções superiores
Diversas plataformas de jogos digitais existem na atualidade, como computadores,
arcades, celulares, consoles (também chamados de “video-games”), entre outros. Embora os
vários conceitos definidos neste trabalho possam se aplicar a muitas das plataformas de jogos
digitais, o foco da obra está direcionado aos que, segundo a definição da enciclopédia online
Wikipedia1, no verbete sobre jogos de computadores e consoles, há um dispositivo de vídeo
como um monitor ou televisão que tem por função ser o artifício primário de devolução das
informações.
Quando os usuários utilizam-se de jogos digitais, três funções superiores, a sensação,
percepção e atenção, estão associadas ao ato e são mencionadas no decorrer deste texto em
diferentes momentos, fazendo necessário que estes conceitos estejam previamente definidos.
As funções superiores são, para Vigotski (1997, p. 106), entendidas como:
relações internalizadas de uma ordem social, transferidas à personalidadeindividual e base da estrutura social da personalidade. Tudo nelas é social: suacomposição, sua estrutura genética e seu modo de funcionar.
A sensação, como definida por Luria (1991, p. 3), permite ao homem “perceber os sinais e
refletir as propriedades e indícios dos objetos do mundo exterior e dos estados do organismo”,
tendo esta caráter ativo e seletivo, enquanto a percepção (LURIA, 1991, p. 41) “compreende o
resultado do trabalho conjunto dos vários órgãos dos sentidos”, que levam a uma visão integrada
de um objeto ou situação segundo a concepção do sujeito.
A atenção está relacionada (LURIA, 1991, p. 1) “a seleção da informação necessária, o
asseguramento dos programas seletivos de ação e a manutenção de um controle permanente sobre
elas”. Semelhante a percepção, a atenção possui caráter seletivo, e se não fosse por esta
1 http://wikipedia.org/
seletividade, nenhuma atividade se tornaria possível devido ao alto número de informações
desorganizadas que chegariam a nossa consciência.
1.2.2.2 O sujeito e as emoções
“Em uma era de educação estruturada e testes padronizados, a diferençadesta geração pode ainda não ser evidente. Mas a mentalidade dosjogadores – o fato de eles estarem aprendendo em um modo totalmentenovo – significa que eles irão tratar o mundo como um lugar para criação,não consumo. Este é o verdadeiro impacto que os jogos digitais terão emnossa cultura.” Will Wright
Com o intuito de esclarecer ou definir as formas pelas quais se experimentam emoções
utilizando-se das tecnologias digitais da atualidade, como os jogos, é necessário antes responder a
uma pergunta essencial: quem é este sujeito que sente e se encontra implicado nestas tecnologias?
As transformações culturais ao longo dos séculos, especialmente quando ligadas à
introdução de tecnologias e ferramentas, trouxeram novas formas do ser humano se relacionar
com o mundo em que estava inserido, e consequentemente, novas formas de sentir seus limites,
seu corpo e sua subjetividade.
A subjetividade representa uma produção de sentidos que está sempre vinculada a um
determinado tipo de organização social, onde o sujeito se encontra subjetivamente constituído ao
longo de sua história. Os sentidos subjetivos desenvolvidos neste processo irão constituir outros,
que darão significado às diversas atividades realizadas pelo sujeito em uma permanente
integração, organização e mudança.
Partindo da compreensão do sujeito a partir de uma teoria psicológica histórico-cultural
desta subjetividade, é possível caracterizar o ser humano em sua constituição através de espaços
sociais e sistemas de relações ao longo de sua história, permitindo assim compreender a
subjetividade construída dentro de fenômenos atuais como a Internet, globalização, a
virtualização ou os jogos digitais.
O sujeito, este que experimenta, faz uso e atua sobre estes elementos da modernidade
citados é definido por Rey (2003, p. 235) como:
sujeito do pensamento, mas não de um pensamento compreendido de formaexclusiva em sua condição cognitiva, e sim de um pensamento entendido comoprocesso de sentido, ou seja, que atua somente por meio de situações e conteúdosque implicam a emoção do sujeito.
Ao intervir através do pensamento, o sujeito constitui a si mesmo e aos espaços sociais em
que atua num processo em constante desenvolvimento, representando momentos constituintes de
subjetivação onde este se constrói e é construído sempre comprometido com inúmeros outros
sistemas de relações.
Desta forma, o conceito de sujeito remete àquele que está sempre atuando e participando
em uma prática social, mas que está sujeito a um processo de formação de sentido através de um
pensamento que se expressa (REY, 2003, p. 236) “a partir do estado emocional de quem fala e
pensa”.
Esta dimensão emocional da subjetividade, ignorada muitas vezes na psicologia a favor de
esquemas fisiológicos ou sociais, está intimamente e internamente ligada a toda ação do sujeito.
As emoções, segundo Rey (2003, p. 243):
São registros complexos que com o desenvolvimento da condição cultural dohomem passam a ser uma forma de expressão humana ante situações de naturezacultural que surgem em sistemas de relações e práticas sociais; no entanto, essanova condição do registro emocional não elimina sua capacidade de registrossomáticos e fisiológicos que, em sua complexa relação com os anteriores, definemo sentido subjetivo da emoção.
São as emoções que definem a disponibilidade dos nossos recursos subjetivos, como o
interesse, para realizar atividades e atuar nas diversas relações possíveis dentro de um momento
social e cultural. O sujeito atua através de estados de necessidades que se organizam a partir das
emoções já existentes e que participam no sentido subjetivo de suas atividades.
Ainda que a razão humana influencie e expresse a subjetividade, a subjetividade não é um
sistema puramente racional pois a produção de sentido está agregada às necessidades do sujeito,
caracterizando um sistema que não é mero produtor de reflexos exteriores mas distorcedor e
interpretador segundo a subjetividade dos atores envolvidos.
Desta forma, de acordo com esta visão sobre a subjetividade humana, Rey (2003, p. 132)
afirma:
Os sistemas humanos são produtores de sentido, já que são capazes de produzirrealidades a partir dos sentidos dominantes em suas culturas, suas histórias, seusvalores, suas necessidades, seus mitos e suas crenças. Ou seja, são capazes deproduzir realidades culturais que não estão governadas por uma ordem naturalexterna e sim por sistemas subjetivos que têm uma história e podem até parecerirracionais para aqueles que não compartilham essa história.
É desta forma que diante da virtualidade, da realidade virtual, das tecnologias digitais
como jogos para computadores ou consoles, da integração dos corpos com a tecnologia, e entre
várias outras experiências que podem ser interpretadas como “desrealizantes” ou
“desnaturalizantes”, o ser humano não desfalece, mas constrói novas identidades, interpretações e
pensamentos com riqueza e flexibilidade e que continuam a garantir as emoções e sentidos
necessários para mobilizá-lo à ação e a participação.
1.2.2.3 O virtual
Um dos atributos que fazem dos jogos digitais virtuais, é exatamente esta característica
“desrealizante” onde o ato de jogá-los não se dá em um espaço físico ou geográfico definido,
caracterizando uma desterritorialidade, mas que como explicitado, não deixa de permitir a
produção de sentido e a presença de emoções.
Isto não significa, no entanto, que o virtual traduz-se em algo que não existe ou é irreal,
mas sim a uma forma diferente de existência. Pierre Levy, filósofo da informação, discute em seu
livro “O que é o Virtual?” (1996) a questão do virtual e da virtualidade a partir das tecnologias
atuais assim como dos primórdios da humanidade. De acordo com Levy (1996, p. 15):
A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus,força, potência. Na filosofia escolástica, é virtual o que existe em potência e nãoem ato. O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado no entanto à concretização
efetiva ou formal. A árvore está virtualmente presente na semente. Em termosrigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real mas ao atual: virtualidadee atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes.
Enquanto o real assemelha-se ao possível, a um todo já construído que não implica em
uma produção inovadora de uma idéia ou forma, a atualização se caracteriza como uma invenção
criativa, uma resposta a um dado problema ou situação e que será concretizada. A virtualidade,
nesta relação, remete ao que existe em potencial e a uma dinâmica problemática que clama e
reclama por resoluções, onde, nas palavras de Levy (1996, p.17), “o atual em nada se assemelha
ao virtual, responde-lhe”.
Deste modo, a virtualização pode ser entendida como uma dinâmica (LEVY, 1996, p.17):
A virtualização pode ser definida como o movimento inverso da atualização.Consiste em uma passagem do atual ao virtual, em uma “elevação a potência” daentidade considerada. A virtualização não é uma desrealização, mas uma mutaçãode identidade, um deslocamento do centro de gravidade ontológico do objetoconsiderado: em vez de se definir principalmente por sua atualidade (uma“solução”), a entidade passa a encontrar sua consistência essencial num campoproblemático.
O virtual desprende os sujeitos do “aqui e agora”, desterritoriza. Para Levy (1996, p.72)
“Os seres humanos podem se desligar parcialmente da experiência corrente e recordar, evocar,
imaginar, jogar, simular. Assim, eles decolam para outros lugares, outros momentos e outros
mundos”. No entanto, isto não leva os sujeitos para um mundo de relações impossíveis. Pelo
contrário, invenções como o telefone, a televisão ou dispositivos visuais e auditivos de
comunicação pela internet virtualizaram a percepção (a capacidade dos sujeitos de trazerem o
mundo para si) ao permitirem uma presença que não está mais associada apenas ao corpo físico.
Devido ao seu conteúdo virtual, os jogos digitais possuem amplas possibilidades para
envolver o ser humano (LEVY, 1996, p. 73):
Em um videogame, o jogador encontra-se diretamente confrontado com o carátervirtual da informação. O mesmo cartucho de jogo contém (virtualmente!) umainfinidade de partidas, ou seja, de sequências de imagens diferentes das quais ojogador só vai atualizar uma partida.
O conteúdo virtual possibilita criar novas possibilidades e espaços, configurando um dos
atributos principais dos jogos digitais onde através da virtualidade seus usuários podem se lançar
em mundos e desafios extremamente complexos, e que estarão diretamente associados as suas
respostas emocionais nestes momentos. E é nesta complexa integração dos sujeitos com estes
conteúdos, que a imersão surge como uma busca de definir ou explanar alguns dos processos
subjacentes a esta relação.
1.2.3 Capítulo III – Relações entre imersão, emoção e virtual
1.2.3.1 A imersão como esquecimento da realidade
A intensificação da indústria de jogos permitiu que a palavra imersão passasse a ser
comumente utilizada quando o assunto são jogos digitais, encontrando-se no discurso de
desenvolvedores e pesquisadores, em artigos, livros e sendo incorporada no vocabulário de
diversos jogadores, ampliando o conhecimento científico do termo assim como popularizando
interpretações associadas ao senso comum.
Uma das caracterizações do termo imersão, produzida a partir de como os próprios
jogadores a entendem, é encontrada em “A Grounded Investigation of Game Immersion” (2004),
por Emily Brown e Paul Cairns, na época pesquisadores do Centro de Interação da Universidade
de London, e está na concepção da imersão como um processo que ocorre em jogos digitais, que
descreve uma forma de integração que leva o usuário a se sentir dentro da experiência. Assim, ao
envolver-se com um mundo virtual criado por um jogo digital, os sujeitos se encontram imersos
em uma outra realidade ou espaço.
Ao reconhecerem a obscuridade do termo imersão, os autores buscaram alcançar um
conceito robusto do mesmo perguntando aos próprios jogadores como estes a entendiam e
sentiam, e chegaram ao resultado de que a imersão é utilizada como uma forma de descrever o
envolvimento do usuário com um jogo, que a medida que se encontra mais imerso desperta
sensações como interesse, atenção e perda da noção do tempo decorrido durante a experiência.
Quanto mais um jogo possibilita estas emoções com maior capacidade e estrutura, e
quanto maior a disposição do jogador para realizar a tarefa de utilizá-lo, maiores as chances de os
jogadores removerem as barreiras que impedem a imersão e alcançarem a “imersão total”,
definida através de suas próprias palavras como um estado em que se esquece do ato de jogar um
jogo e onde você se encontra dentro dele, sendo cortado do mundo real em que habita.
A “imersão total” é entendida pelos autores como presença, e sendo um desprendimento
da realidade apenas possível quando os usuários “suspendem a descrença” ao envolverem-se com
mais do que apenas os aspectos físicos de um jogo.
Popularmente, a “suspensão da descrença” é um dos elementos citados em relação às
possibilidades de imersão em um jogo digital, e pode estar relacionado com a capacidade de seus
usuários ignorarem pequenas inconsistências para aproveitarem o todo, ou ao aceitarem que o
mesmo é “real”, independente de suas limitações de simulação.
O termo “suspensão da descrença” (Suspension of disbelief), originalmente criado pelo
romancista Samuel Taylor Coleridge e adaptado e apropriado em vários livros e artigos aos jogos
digitais, pode ser interpretado como uma expressão frequente associada ao processo imersivo,
sendo encontrada em diversas fontes como no livro “Game Architeture and Design: A New
Edition”, por Andrew Rollings e Dave Morris (2003), na tese de mestrado “Watching Games and
Playing Movies: The Influence of Cinema On Computer Games” por Neal McGann (2003), no
artigo “Immersion Through Video Games”1 (sem data), ou na crítica do jogo digital “Call of
Cthulhu: Dark Corners of the Earth”, realizada pelo site Gamespot2.
Esta “imersão total”, onde há um desprendimento de outros espaços devido ao uso de um
jogo digital, e possibilitada pela “suspensão da descrença”, está associada ao que está sendo
chamado aqui por modelo de imersão como “esquecimento da realidade”.
Uma crítica a este modelo, ao qual este trabalho irá se orientar em aprofundar
teoricamente, é que embora uma noção de presença dentro de uma mídia esteja inclusa nele, o
que fornece características próprias para a fundamentação e definição de um conceito sobre a
imersão, não é possível saber se na realidade está descrevendo o que pode ser interpretado como
um nível alto de atenção, estado que também pode ser atingido em outras atividades, como pensar
em um problema, pintar ou estudar, onde a imersão não estaria sendo definida como um processo
único e diferenciado a outros estados humanos. Os autores, partindo desta definição de imersão,
estabelecida através do depoimento de como os usuários de jogos digitais a entendiam, percebem
que (BROWN et al, 2004, p.3):
A atenção é uma importante parte da imersão e no caso da imersão total a suaextensão e local é importante. Os jogos parecem se utilizar de três elementos da
1 http://illumin.usc.edu/article.php?articleID=1032 www.gamespot.com
atenção: visual, auditivo e mental. O nível de imersão sentido pelos jogadoresparece estar correlacionado com o número de fontes que requerem atenção assimcomo a quantidade de cada tipo de atenção.
Para Luria (1991, p.5), em relação à atenção, “quando a atividade se automatiza, certas
operações que a compõem deixam de atrair a atenção e passam a desenvolver-se sem
conscientização, ao passo que o objetivo fundamental continua a ser conscientizado”. Por esta
razão, o esquecimento da realidade que os jogadores vivenciam poderia estar associado ao fato de
chegarem a este nível onde a atenção se automatiza, e permite que o foco da experiência esteja
somente no conteúdo do jogo que não é referente as formas de manusear sua tecnologia.
Assim, em um jogo digital de Tetris (fig. 1), que consiste apenas de blocos que o jogador
deve organizar rapidamente, talvez pudesse se enquadrar como possibilitador de “imersão total”
para um jogador que nunca teve contato com este tipo de software antes, pois ele teria o potencial
de fazê-lo desperceber temporariamente o mundo real que o cerca devido a um alto nível de
atenção com uma novidade, e não devido as características da mídia que possibilitam a imersão.
Figura 1: Tetris
Imagem do jogo “Miniclip Tetris”. O jogador deve encaixar as peças que caem de modo aformarem uma linha horizontal completa. Cada linha formada é excluída, e o jogadorperderá caso falhe nesta tarefa e permita que o campo seja preenchido por peças. (Imagemde: Miniclip Tetris, desenvolvido por miniclip.com)
Como os próprios autores apontaram (BROWN et al, 2004, p. 1), podem existir jogos com
mundos realistas e sons ambientes, onde no entanto a imersão não é alcançada. Se em um jogo
extremamente complexo, que possibilite emoções e sensações como a representação de um
personagem através de seu controle, o medo ou o prazer, sons interativos, a sensação da presença
espacial dentro de um mundo virtual entre outros, poderia ou não estar produzindo o estado de
imersão, assim como em um jogo muito mais simples onde o usuário apenas move blocos
coloridos buscando encaixá-los corretamente, a aplicabilidade do termo ser torna dúbia ou pouco
exata.
Portanto, embora exista um entendimento geral do que é a imersão através do modelo de
“esquecimento da realidade”, inclusive conceitualmente preciso na pesquisa de Emily Brown e
Paul Cairns, ainda é necessário traçar uma diferenciação do estado imersivo com outros estados
humanos para alcançar uma conceituação mais clara do termo, especialmente necessária se existe
o objetivo de produzir um conhecimento que possibilite delimitar os processos que levam os
sujeitos a se sentirem imersos.
Como forma de conceituar a imersão buscando uma definição precisa do termo, capaz de
localizá-la e diferenciá-la em relação aos variados momentos do ser humano, outras leituras e
pesquisas de diferentes áreas vinculadas ao tema serão utilizadas e relacionadas conceitualmente,
permitindo outras caracterizações do processo imersivo, e onde esta definição da imersão como
um esquecimento temporário da realidade que nos cerca a favor de um conteúdo que nos é
apresentado por um jogo digital, produzida a partir da experiência dos jogadores, pode ser
entendida como um estado que na verdade é permitido pela imersão, mas que não irá a
caracterizar em sumo.
1.2.3.2 Presença e imersão
A questão da presença é fundamental na problemática da imersão, sendo apontada em
todas as pesquisas e artigos utilizados neste trabalho referentes ao tema, porém, sendo entendida
e definida de diferentes maneiras por eles. A presença está diretamente relacionada ao processo
imersivo, e a compreensão entre estes dois conceitos permite uma identificação mais clara da
imersão.
Emily Brown e Paul Cairns, ainda em “A Grounded Investigation of Game Immersion”,
entendem a presença a partir do discurso dos jogadores, através do “esquecimento da realidade”,
onde o jogo é tudo o que importa, e questionam se os jogadores realmente podem sentir-se
presentes em um jogo digital mesmo não estando envolvidos por estímulos físicos deste.
Neal McGann, em sua tese de mestrado em mídia interativa “Watching Games and
Playing Movies: The influence of cinema on computer games” (2003), entende a presença de
modo similar, sendo ela uma sensação de se estar dentro do jogo, como dirigindo um automóvel
(fig. 2) ou resgatando reféns, ocorrendo quando o jogador “suspende a descrença” e é imerso no
jogo. McGann complementa com a observação de que a estrutura de um jogo deve reforçar a
experiência que é desejada para os jogadores, e que utilizar a informação sensorial para simular a
realidade nem sempre é a melhor maneira de alcançar a imersão.
Figura 2: Simulação
Imagem do jogo “Half-life 2”. Combatendo uma organização fascista aliada a uma forçaalienígena, o jogador assume o papel do cientista Gordon Freeman, e utiliza veículos emalgumas das missões. (Imagem de: Half-life 2, desenvolvido por Valve Corporation,2004.)
Laurie N. Taylor, em sua tese de mestrado em artes “Video Games: Perspective, Point-of-
view, and Immersion” (2002), analisa os variados ângulos de visão em diferentes jogos digitais
assim como os variados ângulos de visão em um mesmo jogo para delinear as diferenças entre as
possibilidades de imersão, criando o termo imersão situada (situated immersion) para se referir à
imersão dentro do espaço virtual criado pelo jogo. A presença, referente à imersão situada, é
entendida pela autora como uma presença personificada (embodied), criada através da percepção
visual e auditiva, e onde é necessário existir para os jogadores uma posição claramente
identificada e demarcada da sua atuação dento do espaço do jogo para que ela se concretize.
Assim, para a autora, em jogos digitais onde a interação com o mundo ou cenário se dá
através de uma visão panorâmica, como em Civilization (fig. 3), jogo onde se assume o papel de
avançar culturalmente e tecnologicamente uma civilização através de épocas, ou em jogos onde
se controlam vários personagens ao mesmo tempo, a presença personificada é comprometida pois
o jogador é (TAYLOR, 2002, p. 26) “fragmentado em diversos corpos ou no espaço que cerca
estes corpos”, não o posicionando em uma única representação corporal que demarca sua atuação
dentro do espaço virtual, pois o jogador atua como uma força externa controladora.
Figura 3: Visão panorâmica
Imagem do jogo “Civilization”. O jogador observa o mundo e controla diversas entidades,como unidades militares ou diplomatas, a partir de uma visão panorâmica. (Imagem de:Civilization, desenvolvido por MicroProse Simulation Software, 1991.)
Taylor entende como imersão a integração do jogador com o espaço do jogo, e a partir de
seu conceito de presença, a define em dois níveis diferenciados (TAYLOR, 2002, p. 12):
Imersão diegética é baseada na habilidade do usuário em ser absorvido no texto aoesquecer o que é exterior a ele. Esta experiência de imersão é uma consquência dafalta de atenção ao campo espacial, não porque o campo espacial é um domínio daexperiência irrelevante (que simplesmente desvanece em segundo plano), masporque a atenção do jogador é simplesmente desviada para outro lugar. Com aatenção desviada para outro lugar, o jogador é capaz de parcialmente esquecer suaexistência independente e desvanecer-se no trabalho como um indiscernível eindiferenciado aspecto do trabalho. Quando o jogador direciona sua atenção para aexperiência do espaço, o jogador se torna consciente, não da imersão, mas dainserção de seu corpo, e, em algum nível, separação do espaço que o cerca.Portanto, existem dois níveis de imersão possíveis em jogos digitais: um onde ojogador é absorvido na experiência de jogar (imersão diegética), e outro onde ofoco do jogador não está somente no jogar, mas também na experiência do espaçodo jogo através de seu personagem dentro deste espaço.
Os níveis de imersão propostos por Taylor aprofundam a discussão do tema ao
introduzirem dois estados possíveis, através da imersão, que se constituem como experiências
diferenciadas. A partir desta colocação, é possível traçar um paralelo inicial que será aprofundado
no desenrolar da obra: emoções humanas, como o medo, a alegria ou a excitação, podem também
ser entendidas como outros estados possibilitados ou influenciados diretamente pela imersão, ou
esta só se configura através de uma presença, corporal, quase que física, em um dispositivo de
mídia onde o usuário dispensa toda sua atenção?
Para Taylor (2002, p.12):
jogos digitais possibilitam imersão intra-diegética, que permitem que o jogador
fique profundamente envolvido dentro do jogo em um espaço experimentado. Em
um jogo digital, seus atributos criam a ilusão de que o jogador está realmente no
espaço da diégese, onde isto é primeiramente uma noção figurada em outros
modos de representação como filmes.
É possível dizer, então, que jogos digitais são mais imersivos que outros dispositivos de
mídia? Ou eles simplesmente fornecem esta outra dimensão, entre várias possíveis, que os
jogadores podem alcançar através da imersão? Para responder a estas questões com objetividade,
a noção de presença, arraigada no conceito da imersão, e como estas ocorrem, devem estar
claramente definidas.
Para Tomas Schubert, Frank Friedmann e Holger regenbrecht, estudiosos da realidade
virtual, segundo seu artigo “Embodied Presence in Virtual Enviroments” (1999), a presença é
muitas vezes vivenciada em ambientes virtuais, e é entendida como o sentido subjetivo de estar
presente neles. A presença pode ser observada quando seres humanos interagem com um mundo
virtual como se eles estivessem lá, por exemplo quando apresentam medo de altura ou estendem
sua mão buscando tocar um objeto, e ela emerge quando as possibilidades de ações do corpo
dentro do mundo virtual são mentalmente representadas. ( SCHUBERT et al,1999, p. 1):
Nos anos 60 o construtivista radical Heinz von Ferster usou um antigo sistema derealidade virtual estereoscópica para exibir objetos virtuais de quatro dimensões.Ele mostrou em seu experimento que apenas os participantes que forampermitidos interagir com os objetos via joysticks foram capazes de entender aquarta dimensão, em oposição aos que meramente viram a exibição. Desta forma,o agir em um ambiente levou a uma realidade percebida deste ambiente.
Embora a noção de presença apontada pelos autores seja similar às noções já discutidas,
se diferenciam em entender a imersão não como um processo que leva diretamente à presença,
mas que ocorre em dicotomia a ela. Os estímulos visuais, representados em um espaço
tridimensional em um ambiente virtual criado por um computador, e a junção deste com seu
usuário é definido como imersão pelos autores, sendo a presença, em contraste, entendida como
um fenômeno psicológico. (SCHUBERT et al, 1999, p. 2):
É tentador ver estes dois em uma relação causal unidirecional, onde os estímulosgovernam a experiência psicológica. Nós pensamos, no entanto, que a atividadecorporal e cognitiva do usuário – sua interação no mundo virtual em vários níveis– é a verdadeira origem da presença.
Antonella Carassa, Francesca Morganti e Maurizio Tirassa, também em uma pesquisa
relacionada à presença em ambientes virtuais, denominada “Movement, Action, and Situation:
Presence in virtual enviroments” (2004), buscam definir uma perspectiva integrada da presença
onde esta depende do movimento e percepção do usuário, de suas ações, e sua concepção da
situação geral em que se encontra, assim como estes aspectos se entrelaçam com as
possibilidades de ação possíveis na interação com o ambiente virtual.
O ambiente, no entanto, sendo este virtual ou não, é entendido como possuindo uma
natureza subjetiva, e não objetiva. (CARASSA et al, 2004, p. 5):
Desta forma, o que acontece quando se entra em um ambiente virtual não que ousuário esquece o mundo real. Ao invés, nós trazemos nossa experiência paradentro do mundo virtual, e, em troca, integramos o mundo virtual em nossaexperiência, ao qual irá sedimentar nossas histórias e projetos futuros. Algosimilar sempre acontece na ficção. Um livro, um filme, ou as histórias que sãocontadas ao redor de uma fogueira, são familiares para nós porque reconhecemosseu significado devido a nossa história prévia, e integramos eles em uma trama denarrativas que nós iremos viver a partir daquele momento.
Assim, segundo os autores, a presença está sujeita a possibilidade de trazer significados
interessantes e integrá-los aos significados propostos por livros, filmes ou ambientes virtuais.
Para Carassa et al (2004, p. 6) “O que faz a diferença não é a perfeição tecnológica, mas o tipo de
interação que a tecnologia permite”.
Respondendo a pergunta de Emily Brown e Paul Cairns, a partir desta ótica, é possível
que os jogadores realmente sintam-se presentes em um jogo digital mesmo não estando
envolvidos em estímulos físicos destes, pois a presença em ambientes virtuais não está associada
a uma reconstituição fiel de uma realidade em um dispositivo de mídia, mas sim às possibilidades
de ação e integração com esta. É por esta razão que, como também questionado por estes mesmos
autores, podem existir jogos com mundos realistas e sons ambientes, onde no entanto a imersão
não é alcançada.
Embora o conceito de presença seja similar nas pesquisas aqui especificadas, entendido a
partir da sensação de “estar lá”, o conceito de imersão continua, utilizando-se das palavras de
Taylor (2002, p. 20) “contestado”.
No entanto, este aprofundamento da noção de presença permite que a imersão seja
considerada semanticamente de forma mais clara. Se a imersão é compreendida a partir de
estímulos sensoriais que podem levar, diretamente ou não, à presença corporal em um ambiente
virtual, como nos encontrados em jogos digitais, é possível concluir que tecnologias que simulam
realidades virtuais são mais imersivas que outras mídias, e outras experiências subjetivas, como
as comentadas por Carassa e Taylor, que não dizem respeito apenas a presença corporal em uma
mídia, se mostram estando sujeitas a um processo diferenciado desta que está sendo denominada
como imersão em ambientes virtuais digitalizados, e que também não se configura como um
conceito transferível capaz de compreender a presença em outras mídias como livros ou filmes.
1.2.3.3 A experiência afetiva na imersão
Adentrando nestes aspectos subjetivos da imersão que não dizem respeito à presença
corporal, em especial à experiência afetiva, J. Yellowlees Douglas e Andrew Hargadon, em um
artigo intitulado “The pleasures of immersion and engagement: schemas, scripts and the fifth
business”, realizado em 2001, apresentam uma definição de imersão que embora apresente
similaridades com as outras pesquisas já discutidas se diferencia em muito a elas. Com o intuito
de compreender a afetividade nas experiências interativas como hipertextos e jogos digitais, o
conceito de imersão foi trabalhado a partir da teoria de esquemas.
Segundo os autores, (DOUGLAS et al, 2001 apud Beaugrande et al 1979, p. 2) “a teoria
de esquemas mapeia como processos de informação podem formar percepções e ações, focando
nossas expectativas e até determinando as características básicas da nossa interação com objetos”.
Definida de modo simples, (DOUGLAS et al, 2001 apud Schank et al 1990, p. 2):
Esquemas são os blocos de construção do processamento de informação, umaestrutura cognitiva que determina o que nós sabemos do mundo, os objetos queele contem, as tarefas que performamos nele, até o que vemos (Schank 1990).
Os esquemas permitem uma compreensão de fenômenos a partir de uma “consulta” a um
entendimento já construído de fenômenos semelhantes, como reconhecer um veículo, uma
árvore, ou situações mais complexas como a expectativa de um herói vencer no final de um
conto, independente dos perigos que ele enfrenta. Desta forma, quando uma situação onde uma
convenção esperada não se concretiza, é comum o sentimento de frustração devido à existência
de um esquema que não pode ser aplicado a ela, e que muitas vezes pode levar a incapacidade de
compreendê-la.
Filmes, livros ou jogos que não se enquadram em esquemas já estabelecidos, ou que se
utilizam de esquemas contraditórios são mais difíceis de serem entendidos e podem ser
experimentados com pouca satisfação. Já mídias que se enquadram em um esquema permitem
enquadrar uma categoria de gênero ao qual pertencem, atraindo audiências específicas e que já
possuem uma expectativa da experiência afetiva que terão.
Assim, a imersão nestas mídias pode ser alcançada através do uso de esquemas que
afastam os sujeitos de processos cognitivos não automáticos, permitindo que o foco da
experiência esteja nos detalhes e características que elas nos apresentam e que podem ser
percebidas sem situar os sujeitos num processo reflexivo que ocupa suas capacidades cognitivas e
que os tira de dentro da situação. (DOUGLAS et al, 2001, p. 4):
Esquemas podem aumentar nosso prazer em, por exemplo, ler John Grisham,porque eles provêm uma estrutura detalhada que nos dá liberdade para focarintensamente nos detalhes da narrativa, nos dando informações, de modo geral, doque esperar dos personagens, eventos e da trama, assim como, obviamente, seueventual desfecho.
Quando imersos em, por exemplo, uma leitura, as percepções, reações e interações dos
leitores se dão no corpo de um texto que apresenta um esquema ou uma série de esquemas
definidos e não contraditórios, o que, embora os autores não se utilizem especificamente do
termo, remete a noção da presença, do “estar lá”. Em oposição, esquemas contraditórios ou que
se opõem a esquemas já esperados levam os leitores ao que os autores chamam de experiência
afetiva engajada (engaged affective experience), que interrompe a imersão ao (DOUGLAS et al,
2001, p. 4) “obrigá-los a assumir uma perspectiva extra-textual ao próprio texto”.
Curiosamente, os autores apontam um outro conceito chamado por Mihaly
Csikszentmihalyi de fluxo (flow), caracterizando-se pela alternância da imersão e do
engajamento e que leva os sujeitos a terem uma noção distorcida da passagem do tempo e da
auto-consciência, e onde são absorvidos em uma mídia devido a um grande nível de atenção –
estado que, como visto, é similar ao que está sendo caracterizado por imersão através do modelo
de “esquecimento da realidade”.
Deste modo, a crítica inicial a este modelo pode ser melhor observada através da teoria de
esquemas, onde o esquecimento da realidade se configura como um estado que é possível através
da imersão, mas esta se caracteriza como um processo mais complexo que a mera absorção,
capaz de integrar ou permitir outras experiências subjetivas e emotivas, como segundo os autores
o prazer, e em contextos variados. Segundo Douglas et al (2001, p. 5):
Ironicamente, o leitor folhando Balzac ou Dickens, ou para este propósito, JudithKrantz, basicamente entrou no mesmo estado imersivo, desfrutando do mesmo
elevado e contínuo funcionamento cognitivo que a criança atirando fixamente emSpace Invaders.
A teoria de esquemas fornece uma explicação científica para um dos conceitos de
desenvolvimento de jogos que é a necessidade da transparência de seus controles e interfaces
para favorecer a imersão, assim como a necessidade que suas regras sigam padrões. Em jogos
como Fable: The Lost Chapters (fig. 4) e Dugeon Siege II, ícones amarelos presentes em um
mapa acessível ao jogador indicam objetivos primários, enquanto ícones prateados indicam
objetivos secundários, permitindo uma identificação automática e ações através do uso de
esquemas que se estende por todo o jogo. (DOUGLAS, 2001, p. 7):
Para que nossa experiência afetiva continue imersiva, tanto a narrativa como ainterface necessitam claramente guiar ou encurtar nossas possibilidades de ação.Jogos interativos realizam sua promessa de imersão quando oferecem esquemasóbvios para as estruturas narrativas e de interface, e quando nos oferecem scriptsinterativos previsíveis.
Figura 4: Padrões
Imagens do jogo “Fable: The lost chapters”. À direita, no mapa, é possível identificarautomaticamente diferentes elementos presentes no jogo a partir de suas cores e formas.(Imagem de: Fable: The lost chapters, desenvolvido por Lionhead Studios, 2005.)
Se os jogadores necessitam constantemente se adaptar e aprender novos aspectos de um
jogo ou se suas regras não seguem padrões claros, impossibilitando o uso de esquemas, o
processo reflexivo cria uma barreira que não permite que estes se situem dentro da experiência,
impedindo a imersão, e, por consequência, muitas vezes impedindo o prazer e levando à
frustração, contrariando um dos objetivos dos jogos digitais.
1.2.3.4 Fenômenos imersivos
“Mesmo se você pudesse por meios mágicos criar este impossível mundoperfeitamente simulado, que resultados teria? Você teria que botar umjogo nele. Você teria que criar xadrez das pedras simuladas em seumundo.” Frank Lantz
Das pesquisas e artigos aqui citados, duas visões gerais sobre a imersão podem ser
identificadas. Uma, associada ao “esquecimento da realidade”, similar ao que está sendo
denominado por fluxo por Mihaly Csikszentmihalyi, e a outra associada às capacidades de
integração com uma mídia, sejam elas através de processos cognitivos ou significados subjetivos.
No entanto, embora estes estudos forneçam conceitos capazes de situar a imersão em
contextos específicos, os conceitos se tornam complexos e incertos quando na tentativa de utilizá-
lo em outras situações, como softwares financeiros, grupos humanos, ou ao ato de se falar em
telefones e videoconferências, pois os limites da imersão, os fenômenos onde esta se encontra e
até onde se estende não estão definidos ou propostos.
Partindo da compreensão do virtual através da obra de Pierre Levy, o pesquisador propõe
acrescentar a partir de uma relação teórico-conceitual com as visões gerais sobre imersão citadas
neste trabalho um demarcador, que permita estabelecer com precisão os fenômenos onde a
imersão pode ocorrer.
Este demarcador, ou esta linha que separa as experiências humanas que podem ser
imersivas das que não, é proposto a partir do conteúdo virtual. A introdução do virtual como
requisito para existir a imersão se justifica a partir do conceito de presença, a sensação do “estar
lá”, apontando pelos diversos estudos aqui citados. O conteúdo virtual, se caracterizando
fundamentalmente como potencial, demanda uma forma de integração para que este possa ser
experimentado por sujeitos através da presença, devido a sua desterritorialidade .
Recapitulando Pierre Levy, o virtual é o campo problemático constante que possibilita
diversas atualizações através da criatividade e invenção, e que permite ao ser humano se desligar
do “aqui e agora” e experimentar, através de recordações, do jogar, da imaginação, outros
momentos e mundos. A presença, então, seja ela através da sensação da presença corporal ou da
capacidade de sentir emoções no contexto de uma mídia, nunca é de imediato possibilitada ou
garantida, pois se dá em um campo fora do que é concreto ou “real”, desterritorizado, que
necessita de possibilidades de integração do usuário com o conteúdo virtual para alcançá-la.
Desta forma, como exemplo, não é possível dizer que um grupo de uma sala de aula está
imerso em suas relações pois não há uma potencialização da situação que permita que os sujeitos
tenham experiências, como sentimentos ou emoções, fora de seus espaços concretos constituídos.
Em oposição, os sujeitos de uma empresa que se virtualiza ou de uma comunidade online estão
imersos em suas relações pois elas se dão em um plano que não tem lugar fixo, potencial.
Os jogos digitais necessitam de imersão se há o objetivo de que seus usuários possam se
situar neles, chegando à presença, ao experimentarem seu conteúdo virtual. Mesmo que a partir
dos avanços tecnológicos na área da informática os jogos digitais cada vez mais surpreendam ao
imitar a realidade, ainda haverão de ser imersivos para permitirem a presença, pois o jogar nunca
se dá no plano concreto da realidade, mas em um virtual, onde as ações e o existir são
potencializados e desterritorizados.
1.2.3.5 Da imersão à emoção
Os sistemas humanos criam realidades a partir de sua história, sua cultura e suas
necessidades, capazes de integrar sentidos em diversas atividades realizadas pelos sujeitos, como
o ato de jogar jogos digitais, e que não são regidas por uma ordem natural externa, mas que se
consolidam através da ação e pensamento dos sujeitos, onde as emoções são uma forma de
expressão humana frente a estes momentos culturais.
Através da imersão, seja direta ou indiretamente a ela, os usuários de jogos digitais ou de
outros contextos virtuais podem experimentar seu conteúdo e reagir emocionalmente de uma
forma particular - a partir da presença.
Esta relação permite uma série de pesquisas que, embora não estejam ao alcance deste
trabalho, podem ser apontadas. Pode o uso da imersão favorecer a aprendizagem realizada em
meios virtuais, como em aulas à distância, por meio da presença, devido a respostas emocionais
diferenciadas? E como este processo pode ser implementado? Seguindo a mesma linha de
raciocínio, a imersão facilita o uso de tecnologias virtuais, como softwares para computadores? E
há diferença nas reações emocionais, ou mesmo fisiológicas, de sujeitos que utilizam um
conteúdo virtual através da presença em relação a um grupo onde a imersão é inexistente?
Investigações que se orientem por esta relação entre a imersão em ambientes virtuais e as
emoções podem produzir conhecimentos que favoreçam diversas disciplinas, como a psicologia,
fisiologia ou pedagogia, e possivelmente capazes de aproximar o ser humano das tecnologias
virtuais cotidianas assim como as que se encontram em processo de consolidação.
No contexto dos jogos digitais, esta relação também pode levar a pesquisas interessantes.
O simulador HazMat, mencionado na justificativa deste trabalho, e que tem o propósito de treinar
bombeiros em situações com materiais prejudicais a saúde, pode ser estruturado de maneira a
permitir a imersão para um determinado grupo, enquanto não a permite para outros, podendo esta
distinção apresentar resultados importantes. A evolução de pesquisas sobre a experiência afetiva
em jogos digitais, como no mencionado trabalho de J. Yellowlees Douglas e Andrew Hargadon
sobre os prazeres da imersão e engajamento em mídias, podem continuar ampliando o
conhecimento sobre a influência da imersão nas emoções humanas e produzindo teorias práticas
e aplicáveis no desenvolvimento destas tecnologias virtuais.
Contudo, mesmo com os avanços científicos relacionados à imersão e seus subsequentes
desenvolvimentos, não será o uso de técnicas que diretamente desenvolverá jogos digitais mais
atrativos, como de acordo com Rollins et al (2003, p.246):
Na busca de uma ciência do entretenimento, algumas companhias dedesenvolvimento contrataram psicólogos para ajudá-las a injetar emoções em seusjogos. Em muitos casos, essas são as mesmas companhias que estão tratando odesenvolvimento como uma arte quando este deveria ser ciência, e agora estãotratando a criatividade como ciência quando esta deveria ser uma arte. Se vocêquer emoção em seu jogo, contrate roteiristas, novelistas, poetas, diretores, ouatores. Estas são as pessoas que sabem como contar histórias.
No entanto, o conhecimento acerca da imersão proporciona aos desenvolvedores de jogos
digitais um mapa, uma ferramenta que lhes permite avaliar objetivamente suas produções, capaz
de orientá-los na criação dos elementos dos jogos que irão estar associados às respostas
emocionais de seus usuários.
CONCLUSÃO
O objetivo geral deste trabalho, estabelecido a partir da identificação da relação sobre as
emoções suscitadas no ambiente virtual dos jogos digitais em relação ao processo imersivo, foi
caracterizado com o reconhecimento que a partir da imersão, os usuários de jogos digitais podem
reagir emocionalmente enquanto se encontram presentes na relação com o conteúdo virtual dos
jogos.
Para alcançar este objetivo geral, questões implicadas na temática desta obra foram
estabelecidas e desenvolvidas conceitualmente.
Primeiramente, foram descritas as funções superiores da sensação, percepção e atenção, e
em sua relação com os jogos digitais. A partir de A.R Luria, a sensação foi compreendida como
capaz de permitir ao ser humano perceber os sinais e as propriedades dos objetos do mundo
exterior e de seu próprio organismo, enquanto a percepção abrange o resultado do trabalho
conjunto dos órgãos dos sentidos, levando a uma visão integrada de um objeto segundo a
concepção do sujeito. A atenção, relacionada à seleção da informação necessária e sua
subseqüente manutenção, permite através da seletividade organizar as informações necessárias
para realizar uma atividade.
Em sua utilização dos jogos digitais, os usuários experimentam sensações como cores
diferenciadas, sons, ou mesmo controles que vibram para simular situações como danos físicos
ou explosões, onde a percepção e a atenção, através da seletividade que as caracteriza,
determinam o foco do jogador em relação aos elementos do jogo.
Após esta etapa, deu-se início ao objetivo específico, onde foram caracterizados os termos
emoção, virtual e imersão, situados no contexto dos jogos digitais.
A emoção, utilizando-se dos conceitos sobre sujeito e subjetividade de F. L. G Rey, é
entendida como uma forma de expressão humana frente a situações de natureza cultural, sem, no
entanto, excluir a capacidade de registros somáticos ou fisiológicos. Os jogos digitais, trazem em
seu enredo e em sua jogabilidade, uma gama de situações que permitem aos usuários sentirem
diversas emoções, como o medo de entrar em uma casa abandonada, a excitação em participar de
batalhas, ou o apego aos diferentes personagens que compõe uma história.
O virtual, definido a partir de uma leitura de Pierre Levy, se caracteriza como um campo
problemático que através da criatividade é constantemente atualizado e que permite ao ser
humano se desligar do “aqui e agora”, e experimentar, através de recordações, do jogar, da
imaginação, outros momentos e mundos. Dentro do contexto dos jogos digitais, o virtual permite
que seus usuários experimentem mundos e desafios complexos, e que por essência, são
desterritorializados devido à virtualidade.
A imersão foi investigada através de estudos e pesquisas de diferentes disciplinas que
buscavam definir o que esta é, e como esta procede em sua relação com o ser humano. Ela foi
caracterizada como um processo que tem por finalidade levar os sujeitos a se sentirem presentes
em um jogo digital, e, dependendo da teoria qual a define, em outros contextos como livros,
filmes ou realidades virtuais. A presença, é entendida como a sensação de se estar dentro da
experiência em uma destas mídias, como ao demonstrar o medo de altura em um ambiente
virtual, ou ao sentir-se dirigindo um automóvel em um jogo digital, entre outras situações
apontadas.
Com o propósito de caracterizar a imersão de forma a compreendê-la não só em sua
relação com estas mídias apontadas, mas estabelecendo precisamente os fenômenos onde esta
pode ou não ocorrer - e devido à inexistência de tal caracterização por parte das pesquisas
utilizadas nesta obra - uma relação com o conceito de virtual, proposto por Pierre Levy, foi
realizada para alcançar tal caracterização.
Sendo o conteúdo virtual, como entendido por Levy, por essência desterritorizado, a
presença ao experimentá-lo não é de imediato possibilitada, diferente de outras experiências não
virtuais onde não há uma desterritorialidade, mas depende de uma forma de integração do sujeito,
entendida aqui como a partir da imersão, com estes conteúdos virtuais para que este a vivencie.
Assim, a imersão se configura como um processo capaz de atuar não apenas em mídias como
livros ou filmes, levando à presença, mas em todos os momentos onde os sujeitos se relacionam
com uma situação que é virtual.
Desta forma, através da relação conceitual entre os termos definidos nestes objetivos
específicos, o objetivo geral é identificado com a imersão sendo compreendida como um
processo capaz de levar os sujeitos a sentirem-se presentes enquanto experimentam um conteúdo
virtual, e onde, no contexto dos jogos digitais, as emoções, assim como as funções superiores, são
vivenciadas enquanto o jogador se encontra presente dentro do jogo.
Estabelecida esta relação, abrem-se perspectivas de novas pesquisas capazes de dar
continuidade ao estudo aqui demonstrado. Em especial, o pesquisador gostaria de apontar que a
presença em ambientes virtuais, permitida pela imersão, sendo um poderoso elemento na reação
emocional dos sujeitos, capaz de levá-los a excitação de resgatar um refém, a paralisá-los frente a
um precipício, e, como demonstrado por J. Yellowlees Douglas e Andrew Hargadon em “The
pleasures of immersion and engagement:schemas, scripts and the fifth business”, esta presença
possa potencializar emoções como o prazer, fica a dúvida se os jogadores realmente desejam a
presença em jogos digitais, e em que momentos a desejam ou não no desenrolar de um jogo.
Para a indústria do entretenimento em jogos digitais, um entendimento desta problemática
é especialmente importante, onde a compreensão da imersão em sua influência na satisfação dos
usuários de jogos é capaz de trazer benefícios para o desenvolvimento de seus produtos.
Por fim, o pesquisador gostaria de concluir que o virtual, atualmente, é um elemento
frequente de interação dos sujeitos em diferentes momentos de uma realidade social, e que
juntamente com as novas invenções tecnológicas permitiu a estes que tivessem experiências antes
não possíveis, como a mudança de identidade através de conversas em salas de bate-papo online,
a presença corporal em realidades virtuais, a simulação interativa de diferentes situações em
jogos digitais, entre outros.
Esta condição traz implicações para o desenvolvimento, tanto de forma positiva como
negativa, da constituição psíquica dos sujeitos. Os jogos digitais, como exemplo, estão presentes
em diversos locais, como em casas de jogos (lan-houses), fliperamas (arcades), assim como nas
residências de famílias, e é um elemento associado à aprendizagem, as emoções, e até permeando
as relações sociais de seus usuários, onde o seu conteúdo apresentado pode incluir temas como a
construção de cidades ou rede de amizades em um jogo online, do mesmo modo como
simulações de morte, guerra ou violência.
Assim, a compreensão do fenômeno da imersão, nos diferentes contextos onde ocorre, e
em sua relação com as emoções, se mostra como um tópico importante de investigação para o
desenvolvimento científico, trazendo possibilidades de atuar nestes contextos de forma a melhor
garantir a saúde mental dos sujeitos, particularmente importante para ciências como a psicologia.
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