ANDRÉA GONÇALVES MENDES OGUIDO
RESPONSABILIDADE CIVIL
E SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDICO
ANDRÉA GONÇALVES MENDES OGUIDO
RESPONSABILIDADE CIVIL NO CASO DO VÔO 3054 DA TAM
E SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDICO
Londrina
2009
ANDRÉA GONÇALVES MENDES OGUIDO
NO CASO DO VÔO 3054 DA TAM
E SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDICO
ANDRÉA GONÇALVES MENDES OGUIDO
RESPONSABILIDADE CIVIL NO CASO DO VÔO 3054 DA TAM
E SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDICO
Trabalho de Conclusão de curso apresentado ao Curso de
Direito da Universidade Pitágoras - Campus Metropolitana,
como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel
em Direito.
Orientadora: Silvia Regina Tacla Pietraroia
Londrina
2009
Londrina, 08 de setembro de 2009.
Prof. Orientador: Silvia Regina Tacla Pietraroia Pitágoras – Campus Londrina
Prof. Membro 2: Mirelle Neme Buzalaf Pitágoras – Campus Londrina
Prof. Membro 3: Fábio Benfatti Pitágoras – Campus Londrina
ANDRÉA GONÇALVES MENDES OGUIDO
RESPONSABILIDADE CIVIL NO CASO DO VÔO 3054 DA TAM E
SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDICO
Trabalho de Conclusão de Curso aprovado, apresentado à Pitágoras – Campus
Metropolitana, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em
em Direito, com nota final igual a 10,0, conferida pela Banca Examinadora
formada pelos professores:
DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho a um grande amor
e pai biológico de minha filha, Márcio
Rogério de Andrade. (in memorian).
AGRADECIMENTOS
A Deus que sempre esteve presente em minha vida e que me deu forças para
continuar.
À minha orientadora pelos encontros semanais e todo carinho e atenção a mim
dedicados, assim como, a todos os professores que me direcionaram nessa conquista.
À minha família, em especial, à minha mãe, Maria de Lourdes Gonçalves Oguido e à
minha filha, Marcella Oguido, que sempre me apoiaram e entenderam minha ausência
durante o período de pesquisa.
Aos meus queridos amigos e companheiros de sala, Andreza Rodrigues Cardoso de
Gouvêa, Luiz Renato Pirolli e Rosane Zonato Pirolli, pela convivência maravilhosa
desses cinco anos.
“O mundo é um lugar perigoso de se viver,
não por causa daqueles que fazem o mal,
mas sim por causa daqueles que
observam e deixam o mal acontecer”.
Albert Einstein
OGUIDO, Andréa Gonçalves Mendes. RESPONSABILIDADE CIVIL NO CASO DO VÔO 3054 DA TAM E SEUS REFLEXOS NO MUNDO JURÍDIC O. 2009. 55p. Monografia (Graduação em Direito) - Faculdade Pitágoras – Campus Metropolitana – Londrina / PR.
RESUMO
A responsabilidade civil é o instrumento jurídico pelo qual o causador de um dano é obrigado a compensá-lo. Como isso será possível quando o dano atingido for a vida? Em 17 de julho de 2007, o Brasil acompanhou o maior acidente aéreo da história da aviação. O vôo 3054 da TAM com passageiros a bordo derrapou na noite de terça-feira quando pousava no aeroporto de Congonhas e bateu contra um depósito da empresa que fica do lado oposto da Avenida Washington Luís, provocando um incêndio de grandes proporções. Quase duzentas pessoas morreram nessa tragédia. Assim, o objetivo do presente trabalho é recolher informações possíveis sobre este acidente e verificar quais são os seus reflexos no mundo jurídico, principalmente no que tange ao dano moral já que o bem prejudicado foi a vida. Palavras-Chave: Responsabilidade Civil, Indenização Moral, Reparar, Compensar, Punir,
Oguido, Andréa Gonçalves Mendes. LIABILITY IN CASE OF FLIGHT 3054 TAM AND ITS CONSEQUENCES IN THE LEGAL WORLD . 2009. 55p. Monograph (Law Degree) - Pitágoras University – Metropolitana Campus - Londrina / PR.
ABSTRACT
The liability is the legal instrument by which the cause of an injury is bound to compensate the victim. How this can be achieved when the damage is life? On July 17, 2007, Brazil followed the greatest crash in the history of aviation. TAM Flight 3054 skid on the evening of Tuesday with passengers on board when lodging at the airport of Congonhas and crashed against a deposit of the company is on the opposite side of Avenida Washington Luís, causing a fire of large proportions. Nearly two hundred people died in that tragedy. The objective of this study is to gather possible information about this accident and determine what are its effect on the legal world, especially regarding the moral as the right to life was jeopardized. Keywords: Liability, Indemnity Moral, Repair, Compensation, Punishment,
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AIRBUS 320 - Modelo de Aeronave
ANAC - Agência Nacional de Aviação Civil
BRA - Transportes Aéreos
CDC - Código de Defesa do Consumidor
CENIPA - Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aéreos.
FAB - Força Aérea Brasileira
GOL - Linhas Aéreas Inteligentes
INFRAERO - Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária
TAM - Linhas Aéreas S/A
TAM EXPRESS - Cargas Rápidas
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 12 1. RESPONSABILIDADE CIVIL 14
1.1. Evolução Histórica da Responsabilidade Civil 15
1.2. Conceito de Responsabilidade Civil 16
1.3. Princípios da Responsabilidade Civil 19
1.3.1. Princípio da irrelevância da culpa 19
1.3.2. Princípio da essencialidade do dano 20
1.3.3. Princípio da preocupação prioritária com a vítima 20
1.3.4. Princípio da reparação integral 20
1.3.5. Princípio da solidariedade entre os causadores do dano 20
1.3.6. Princípio do ajuste da indenização ao valor suportável pelo
Responsável 21
1.4. Espécies de Responsabilidade Civil 21
1.4.1. Responsabilidade Civil Subjetiva 21
1.4.2. Responsabilidade Civil Objetiva 23
1.4.3. Responsabilidade Civil Contratual e Extracontratual 24
1.4.4. Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo 25
1.4.5. Responsabilidade Civil e Penal 29
1. 5. Funções da Responsabilidade Civil 31
2. INDENIZAÇÕES NA ESFERA JURÍDICA 32
2.1. Indenização Material 33
2.2. Indenização Moral 34
3. VÔO 3054 DA TAM 43
3.1. Anac, Infraero e Tam 44
3.2. Airbus 48
3.3. Pilotos 48
3.4. O que foi feito até o momento 50
CONCLUSÃO 53
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 58
ANEXOS
Anexo 1: Tabela do Cenipa
Anexo 2: Imagens do acidente e da vítimas da TAM
Anexo 3: Páginas 79 e 80 do Inquérito Policial
Anexo 4: Termo de ajustamento de conduta
Anexo 5: Revista Afavitam criada pelos familiares da vítimas
Anexo 6: Informações sobre o escritório americano: Masry & Vititoe e
reportagem sobre o escritório Podhurst Orseck.
Anexo 7: Questionários solicitados pelos réus
INTRODUÇÃO
O transporte aéreo ainda é o mais seguro de todos, todavia,
segundo informações do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes
Aeronáuticos (Cenipa), o Brasil teve, em 2008, o maior número de acidentes
aéreos dos últimos 14 anos, como poderá ser observado no decorrer do
trabalho. Dois deles de grandes proporções.
No dia 29 de setembro de 2006, o Boeing 737-800 da Gol, que
fazia o vôo 1907, de Manaus para Brasília, se chocou em pleno ar com um jato
legacy que seguia de São Paulo rumo aos Estados Unidos, ocasionando um
acidente com 154 vítimas a bordo, dentre as quais 149 passageiros e seis
tripulantes. Os destroços da aeronave foram localizados 30 km a leste do
município de Peixoto Azevedo, no Mato Grosso.
Na terça-feira de 17 de julho de 2007, o vôo 3054 da TAM, com
187 passageiros a bordo, derrapou quando pousava no aeroporto de
Congonhas e bateu contra um depósito da empresa que ficava do lado oposto
da Avenida Washington Luís. O choque provocou um incêndio de grandes
proporções, matando quase 200 pessoas entre passageiros e funcionários da
TAM Express. Em menos de um ano, 353 mortes em acidentes aéreos.
Pais perderam seus filhos, filhos perderam seus pais, outros
perderam a família inteira. O que provocou o maior acidente do Brasil? Quais
os fatores que contribuíram para isso? O que tem feito os familiares das
vítimas?
O Direito no Brasil, no que tange à responsabilidade civil, tem a
função de amenizar e compensar o sofrimento. Será que o direito consegue
amenizar a dor de pessoas que tiveram seqüelas irreparáveis? A vida tem um
preço? Como reparar uma tragédia? Quais os critérios utilizados pelos
magistrados? Utiliza-se o Código Civil (CC) ou Código de Defesa do
Consumidor (CDC)? Como fazer justiça num caso como esse?
O objetivo do presente trabalho, portanto, é coletar todas as
informações possíveis sobre o acidente do Vôo 3054 da TAM e verificar como
o instrumento jurídico da responsabilidade civil é aplicado em casos como este.
Além disso, investigar como o dano moral poderá coibir atos ilícitos e
transformar os meios de transportes aéreos mais seguros.
No primeiro capítulo, aprensentar-se-á o instituto da
responsabilidade Civil de acordo com alguns doutrinadores, sempre dando
ênfase e analisando o acidente em questão. Mesmo que as indenizações
façam parte desse mesmo capítulo, optou-se por fazer um segundo, dando
ênfase ao dano moral, já que é tema bastante complexo e muito discutido no
mundo jurídico. No terceiro capítulo, informar-se-ão todos os acontecimentos
sobre o vôo 3054 que vai desde o relato da tragédia (passando por suas
causas) até o que foi feito pelos familiares recentemente, ficando o quarto
capítulo reservado à conclusão.
1. RESPONSABILIDADE CIVIL
Segundo o caput do artigo 5º da Constituição Federal de
19881, “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade , à igualdade, à segurança e à
propriedade” (grifo nosso).
Assim, a liberdade é um direito do ser humano, garantido
pela Carta Magna, no entanto, esse direito não é absoluto, pois há uma
limitação: ser livre desde que não prejudique o outro, caso contrário, terá que
arcar com as conseqüências.
Da mesma forma que a lei protege a liberdade, ela também
a limita, mostrando até que ponto o interesse de um indivíduo pode caminhar
sem chocar-se com o do outro. De acordo com Tomas Hobbes2, a lei é o exato
limite entre o que é justo e o que é injusto, “não havendo nada que seja
considerado injusto e não seja ao contrário a alguma lei”.
Dessa forma, todo aquele que causar dano a alguém,
deverá arcar com o prejuízo, a isso o direito denomina responsabilidade civil.
Assim, segundo o Código Civil3, “aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuizo a outrem, fica
obrigado a reparar o dano”.
Ameaçada ficaria a segurança social se ficassem impunes
aqueles que, no exercício de atividades de prestação de serviço - como
transporte aéreo ou qualquer outro ramo - viessem a causar danos ao
patrimônio ou a integridade física ou moral de terceiros, não fossem punidos de
alguma forma. Responsabilizar as empresas que prestam serviços de
1 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988. Artigo 5º.
2 HOBBES, Thomas. Leviatã, Nova Cultural, São Paulo, 1974, Cap. XXVI, "Das leis civis", p. 165.
3 BRASIL. Decreto Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 159
transportes é recente, todavia, o instituto da responsabilidade existia desde os
primórdios, como poderá ser observado a seguir.
1.1. Evolução Histórica de Responsabilidade Civil
Desde a sua existência até os dias atuais, o homem cuida
daquela pessoa querida ou daquilo que é seu de forma a impedir a ocorrência
de qualquer tipo de prejuízo. Todavia, se esse prejuízo já aconteceu, ele busca
o retorno ao estado anterior ou uma compensação pelo mal sofrido. Como se
percebe, o instituto da reparação é antigo, no entanto, a forma de combater o
dano sofrido é que foi se alterando de acordo o tempo.
Nos tempos primitivos era comum a reparação de um dano
pelas próprias mãos (instinto), conforme afirma Aguiar Dias, Apud Silvio Neves
Baptista4 era “uma reação espontânea e natural contra o mal sofrido; solução
comum a todos os povos nas suas origens, para a reparação do mal pelo mal”.
Aqui bastava ter o dano para que houvesse uma reparação, sem
necessariamente haver culpa. Na maioria das vezes, porém, o lesado não
podia reagir desde logo, mesmo porque, ele nem sempre estava presente no
momento da prática do ato danoso. Quando isso acontecia, o castigo era
posterior.
Surge a necessidade de regulamentação desse castigo com a
pena do “olho por olho, dente por dente”, prevista na Lei de Talião. A justiça
privada vai, aos poucos, sendo substituída pela autoridade que aplicava o que
constava nas Leis das XII Tábuas. Depois surge a composição voluntária “pela
qual o ofensor pagava ao ofendido uma poena (pena), representada por coisa
ou dinheiro, espécie de resgate da culpa” 5, como se o ofensor pagasse pelo
perdão do outro. Aparece ainda a composição tarifada, com uma pena
específica para cada dano.
4 BAPTISTA, Silvio Neves. Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 21.
5 Id. Ib. p. 22.
No entanto, é através da Lex Aquilia que os primeiros preceitos
delituais foram generalizados, substituindo o caso concreto. Surgindo a idéia da
culpa (responsabilidade subjetiva). Segundo, ainda, Aguiar Dias Apud Silvio
Neves Batista6:
Primeiro capítulo regulou o caso da morte dos escravos ou quadrúpedes que “pastam em rebanho”; o segundo capítulo tratou do dano causado por um credor acessório ao principal; e o terceiro capítulo, do dano por ferimento causado aos escravos e animais e da destruição ou deterioração de todas as outras coisas corpóreas.
Atualmente, a ferramenta jurídica utilizada para reparar o dano é
o instituto jurídico da responsabilidade civil que manteve a teoria da culpa como
regra, mas também consagrou, de forma genérica, a responsabilidade objetiva
de acordo com a teoria do risco, ou seja, pelos danos causados pelo exercício
de atividade perigosa como poderá ser verificado nos conceitos e
classificações da responsabilidade civil expostos a seguir.
1.2. Conceito de Responsabilidade Civil
A responsabilidade civil, tanto em seu sentido etimológico como
jurídico, exprime a idéia de obrigação, contraprestação ou encargo. Sobre a
origem do vocábulo responsabilidade, Maria Helena Diniz7, ressalta que o
termo provém do verbo latino respondere (responder), “designando o fato de
ter alguém se constituído garantidor de algo”.
No entanto, definir a responsabilidade civil é um grande
desafio, pois é um tema muito abrangente e cheio de detalhes. Por esse motivo
e para um melhor entendimento, faz-se necessário fazer algumas observações.
O homem deve conduzir-se de acordo com um dever
jurídico, ou seja, respeitando as limitações da Lei sob pena de cometer um ato
ilícito. Esse dever jurídico pode ser originário ou sucessivo. Originário é a
limitação que a Lei impõe a ele, como, por exemplo, não matar. Já o dever
6 Id. Ib. p. 24.
7 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 7º volume. 20ª edição. São Paulo: Saraiva, 2006. p.39.
sucessivo é a violação (ato ilícito) do dever originário, como no exemplo
anterior, matar, implicando num dever de reparar o dano causado tanto à vítima
como à sociedade.
Assim, conforme Sérgio Cavalieri Filho8:
“A violação de um dever jurídico configura o ilícito, que, quase sempre, acarreta dano para outrem, gerando um novo dever jurídico, qual seja, o de reparar o dano”. Há assim um dever jurídico originário, chamados por alguns de primário, cuja violação gera um dever jurídico sucessivo, também chamado de secundário.
Importante também ressaltar que o dever jurídico originário será
sempre uma obrigação, já o sucessivo um dever responsável de ressarcir o
prejuízo. Desse modo, a responsabilidade civil é um vínculo surgido entre
pessoas devido a um evento fático, no que se opõe ao conceito de obrigação,
que é um vínculo oriundo de uma manifestação de vontade. É o instrumento
jurídico responsável pela reparação de um dano causado por um ato ilícito ou
lícito.
Não constituem atos ilícitos os praticados em legítima defesa ou
no exercício regular de um direito reconhecido ou na deterioração ou
destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de remover perigo
iminente, conforme artigo 188 do Código Civil de 2002. Todas as três
modalidades embora lícitas, não excluem o dever de indenizar.
Importante diferencia aqui as causas de excludente de ilicitude
(estado de necessidade, legítima defesa e exercício regular do direito) com as
excludentes da responsabilidade civil (caso fortuito, força maior e culpa
exclusiva da vítima). Na primeira (excludente de ilicitude), o ato não é
considerado ilícito, mas, mesmo assim, o causador do dano deverá arcar com
o prejuízo. O intuito, neste caso, é proteger aquele que sofreu o dano. Já a
segunda (excludente da responsabilidade civil), refere-se àqueles casos em
que não há o dever de indenizar.
8 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 2.
Como bem explica Felipe Braga Netto9
As excludentes de ilicitude retiram a contrariedade ao direito da conduta, mas não isentam, de modo absoluto, o responsável pela reparação dos danos (no estado de necessidade o ato, apesar de lícito, é indenizável; na legítima defesa com erro na execução, embora lícita, gera o dever de indenizar os terceiros atingidos). Já as excludentes de responsabilidade civil, por romperem o nexo de causalidade, afastam o próprio dever de reparar os danos (durante a viagem de ônibus, o assalto à mão armada, que causa danos aos passageiros, é segundo a jurisprudência, caso fortuito e não gera responsabilidade da empresa de transporte).
A legítima defesa, tratada no Código Civil, é a mesma da esfera
penal, ou seja, aquela ação utilizada moderadamente para repelir uma
agressão, mas para que se constitua causa de excludente, importante atentar-
se aos requisitos de Damásio de Jesus Apud Silvio Neves Baptista10:
(1) agressão injusta atual ou iminente; (2) direitos do agredido ou de terceiro; (3) repulsa com os meios necessários; (4) uso moderado de tais meios; (5) conhecimento da agressão e da necessidade da defesa.
O exercício regular do direito são aqueles atos autorizados por
lei, “é o direito exercido regularmente, normalmente, razoavelmente, de acordo
com seu fim econômico, social, a boa-fé e os bons costumes” 11. Assim, quem
pratica um dano no exercício cumprimento da lei também está sujeito à
reparação quando comete ato danoso. Todavia, é o Estado quem responderá
pelo dano, podendo futuramente requerer o prejuízo do causador do dano
(direito de regresso), se provada a culpa do agente.
Conforme exemplos de Aníbal Bruno, destacados na obra de
Silvio Neves Paptista12: “Não age ilicitamente o carrasco que executa uma
sentença de morte, o policial que detém o criminoso, o encarregado da prisão
que o encarcera, embora sejam fatos delituosos matar e privar a outrem de sua
liberdade”.
9 BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 128. 10 Op. Cit. p. 128.
11 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 19.
12 Id. Ib. 127 e .128.
No estado de necessidade, o causador do dano, ainda que com
boa intenção, deverá indenizar o outro quando causar dano físico ou à sua
imagem. No entanto, se esse dano ocorrer por culpa da vítima - como, por
exemplo, uma pessoa que tentando salvar um suicida, quebra sua perna – não
haverá indenização.
O direito pátrio admite, com reservas, que o caso fortuito e a
força-maior excluem a responsabilidade civil. O Código do Consumidor não
estabeleceu como causa excludente de responsabilidade entre as demais
causas elencadas; todavia, pode ser causa para impedir o dever de indenizar.
Diferente quando for culpa exclusiva da vítima que afasta absolutamente a
responsabilidade.
Diante da complexidade do instituto e de suas particularidades,
importante se faz entender alguns princípios, já que contribuem para analisar
cada caso prático.
1.3. Princípios
Segundo o conceito de Cretella Junior, citado por Maria Sylvia
Zanella Di Pietro, 13 “princípios de uma ciência são as proposições básicas
fundamentais, típicas que condicionam todas as estruturações subsequentes.
Princípios, neste sentido, são os alicerces da ciência”.
Dessa forma, importante destacar alguns princípios específicos
da aérea da responsabilidade civil, citados por Felipe P. Braga Netto14, já que
servem para direcionar as decisões jurídicas.
1.3.1. Princípio da irrelevância da culpa
A responsabilidade civil consiste em indenizar aquele que
sofreu com o dano, seja, reparando, seja compensando. Em regra, a culpa não
13 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 61
14 BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 105.
interfere no valor dessa indenização, o que se leva em consideração é a
extensão do dano15.
No entanto, existem exceções quando houver desproporção
entre a culpa e o dano, dano moral, dolo como fator de aumento do valor
indenizatório e no caso de menor responsável pelo dano.
1.3.2. Princípio da essencialidade do dano
O dano na responsabilidade civil é essencial, já que sem ele,
não há que se falar em responsabilidade civil, muito menos em indenização.
1.3.3. Princípio da preocupação prioritária com a v ítima
O objetivo desse princípio é não deixar a vítima sem a
reparação. “Deve-se, dentro das possibilidades do caso, buscar restaurar, tanto
quanto possível, a situação que existia anteriormente ao dano”.
1.3.4. Princípio da reparação integral
O princípio da reparação integral direciona o juiz na fixação de
uma indenização justa, de forma que “a reparação seja integral, cobrindo,
verdadeiramente, os prejuízos havidos” 16, tanto na esfera patrimonial como na
moral.
1.3.5. Princípio da solidariedade entre os causador es do dano
Os causadores do dano responderão solidariamente pela
reparação do dano, conforme artigo 942 do Código Civil. Essa solidariedade é
objetiva, não sendo necessária a prova de que os responsáveis tiveram culpa.
15 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 944.
16 BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 105.
1.3.6. Princípio do ajuste da indenização ao valor suportável pelo
responsável
Diferentemente dos outros princípios, esse protege o causador
do dano, pois direciona o juiz a fixar um valor razoável de maneira que “não
provoque a ruína do ofensor”. 17
1.4. Espécies de Responsabilidade Civil
A Responsabilidade Civil no Direito atual é um tema bastante
estudado devido a sua importância e abrangência na vida cotidiana, mas
também muito complexo, pois seu conceito terá particularidades diferentes em
cada caso, como será exposto a seguir.
1.4.1. Responsabilidade Civil Subjetiva
De acordo com a teoria clássica, a responsabilidade civil
subjetiva exige a existência de quatro pressupostos: Conduta (ação ou
omissão), dano (lesão a um bem jurídico), nexo causal (relação entre a conduta
e o dano) e culpa em sentido amplo (Negligência, imperícia, imprudência ou
dolo). A conduta do agente deve ser analisada se agiu com culpa (sentido lato
senso). Caso isso não seja possível, a vítima direta ou indireta não terá como
exigir seus direitos. Aqui cada um responde por seus atos.
Conforme salienta Sérgio Cavalieri Filho 18, comparando o
Código Civil de 1916 (artigo 159) com o Código Civil de 2002 (artigo 186), a
culpa foi mantida como fundamento da responsabilidade Subjetiva. O autor
ainda analisa o artigo 186 do Código Civil de 2002 e destaca os três
pressupostos da responsabilidade Subjetiva:
17 Op. Cit. p. 105.
18 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 16.
Há primeiramente um elemento formal, que é a violação de um dever jurídico mediante conduta voluntária ; um elemento subjetivo, que pode ser o dolo ou a culpa ; e, ainda, um elemento causal-material, que é o dano e a respectiva relação de causalidade (grifo nosso).
Assim, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito19”. Cavalcanti define a
responsabilidade Subjetiva como “dever jurídico sucessivo do agente de se
submeter à sanção de reparar o prejuízo causado por sua conduta culposa e,
portanto, ilícita”.
A regra na responsabilidade subjetiva, portanto, é a prova da
culpa, cabendo exceções, de acordo com o parágrafo único, do artigo 927, do
mesmo código:
Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
As exceções dizem respeito àqueles casos em que, mesmo
sem culpa, o agente causador do dano deverá arcar com os prejuízos, sejam
eles materiais e/ou morais.
O artigo 21 da Constituição Federal de 1988, em seu inciso XIII,
alínea c, diz que empresas aéreas são concessionárias de serviços públicos e,
portanto, respondem independente de culpa, quando causarem dano a alguém.
Além disso, essas empresas transportam passageiros,
considerada atividade de risco (perigosa) numa relação de consumo (empresa
aérea X passageiros). Dessa maneira, ocorrendo um dano, este será analisado
sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, onde a Responsabilidade é
Objetiva.
19 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 159 .
1.4.2. Responsabilidade Civil Objetiva
Com os avanços tecnológicos e crescimento populacional
sugiram situações que, nem sempre se conseguia provar a culpa, deixando
que a vítima arcasse com os prejuízos, o que não era justo.
Assim, surge a necessidade de uma responsabilidade que não
exija a prova de culpa como pressuposto para a reparação do dano, portanto,
objetiva. O causador arcará com o prejuízo independente de culpa. Ele deverá
assumir o risco de seu negócio. No entanto, isso não quer dizer que provando
depois a culpa de quem deu ensejo ao fato, ele não possa ingressar com uma
ação de regresso contra o verdadeiro culpado.
Trata-se de uma “responsabilidade civil indireta, em que o
elemento culpa não é desprezado, mas sim presumido, em função do dever
geral de vigilância a que está obrigado o réu”20. A responsabilidade civil
objetiva, portanto, exige apenas os três primeiros pressupostos: Conduta, dano
e nexo causal, sendo essa a regra, conforme artigo 12 do Código de Defesa do
Consumidor21:
O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
No caso de acidente aéreo, a empresa responderá pelos danos,
independente de culpa, pois conforme § 6º, do artigo 37, da Constituição
Federal22:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
20 GALIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 200.. p. 15.
21 BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11/ 11/1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 12.
22 BRASIL. Constituição 1988. Constituição da República do Brasil. Brasília, DF, 1988. Artigo 37.
Mesmo se não existisse o código de defesa do consumidor, a
responsabilidade seria objetiva por se tratar de atividade perigosa, conhecida
como Teoria do Risco que surgiu na pós-modernidade como garantia àquelas
atividades de grande risco.
Segundo Sílvio de Salvo Venosa23, “o que se leva em conta é a
potencialidade de ocasionar danos; a atividade ou conduta do agente que
resulta por si só na exposição a um perigo, noção introduzida pelo Código Civil
italiano de 1942 (Art. 2.050)”.
Nesse caso, tendo algum tipo de relação jurídica com o agente
causador do dano, responderá indiretamente por ele. Outro fator analisado
nesses casos é se a responsabilidade civil foi originada por um contrato
anterior ou ao acaso, como se verificará a seguir.
1.4.3. Responsabilidade Civil Contratual ou Extraco ntratual
A relação existente entre o agente causador e a vítima antes do
ato ilícito ou da teoria de risco é que vai distinguir se a responsabilidade é
contratual ou extracontratual. Se houver uma relação jurídica prévia entre
ambos será responsabilidade contratual, mas se um dano acontecer ao acaso,
será extracontratual.
No caso do acidente em questão, os passageiros firmaram um
contrato com a TAM no momento em que compraram seus bilhetes aéreos, ou
seja, contrataram a empresa de transporte aéreo para levá-los de Porto Alegre
à São Paulo com segurança (cláusula de incolumidade).
Os passageiros do vôo 3054 da TAM tinham uma relação de
consumo com a empresa aérea, que responderá objetivamente (independente
de culpa), pelos danos causados.
23 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 10.
Não apenas os passageiros (responsabilidade contratual) terão
a proteção do CDC, como também aqueles que não tinham uma relação
contratual com a transportadora e sofreram com o dano. Como, por exemplo, o
taxista que foi atingido pelo avião (responsabilidade extracontratual).
Isso acontece porque o artigo 17 do CDC equipara a
consumidores “todas as pessoas que embora não tendo participado
diretamente da relação de consumo, vêm sofrer as conseqüências do evento
danoso, dada a potencial gravidade que pode atingir o fato do produto ou do
serviço24”.
Segundo André Uchoa Cavalcanti25:
A Responsabilidade civil do transportador aéreo será contratual quando o dano, decorrente de sua ação ou omissão, atingir alguém com quem tenha uma relação jurídica, anterior ao evento danoso, baseada num contrato (...). Por outro lado, será extracontratual ou aquiliana nas hipóteses em que o seu atuar ilícito lese alguém com quem não tenha qualquer relação jurídica anterior ao evento danoso.
Nas relações de consumo, essa diferenciação passa a não ter
muito peso e por esse motivo, pode ser unificadas futuramente. “A tendência é
caminhar no sentido de reparação integral, desconsiderando filigranas formais,
tão caras ao passado jurídico”.26
1.4.4. Responsabilidade Civil nas Relações de Consu mo.
Antes de abordar a responsabilidade civil e a responsabilidade
nas relações de consumo, importante entender os conceitos de fornecedor e
consumidor de produtos ou serviços. O Código de Defesa do Consumidor27
estabelece no seu artigo 3° o conceito de fornecedo r, afirmando:
Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que
24 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 199.
25 CAVALCANTI, André Uchoa. Responsabilidade civil do transportador aéreo. Tratados internacionais, leis especiais e código de defesa do
consumidor. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.p. 32.
26 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 199.
27 BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11 de novembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 3º.
desenvolvem atividades de produção montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Assim, se quem lhe forneceu o bem ou serviço não se encaixar
no conceito de fornecedor, não haverá relação de consumo e, por conseguinte,
não haverá como acionar o Código de Defesa do Consumidor28.
O artigo 3º, do Código de Defesa do Consumidor29, em seus
parágrafos §1º e §2º conceitua respectivamente o que vem a ser produto e
serviço, estabelecendo:
Produto é qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancárias, financeiras, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Observamos assim, que para se identificar a pessoa como
sendo fornecedora de serviços, é indispensável que a mesma detenha além da
prática habitual de uma profissão ou comércio (atividade), também forneça o
serviço mediante remuneração.
Já consumidor é “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou
utiliza produto ou serviço como destinatário final", conforme estabelece o artigo
2º do Código de Defesa do Consumidor30.
O legislador definiu nesse artigo o conceito jurídico de
consumidor padrão, estabelecendo ser esse qualquer pessoa natural ou
jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço para seu uso pessoal ou de
sua família, não comercializando o serviço ou produto.
28 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 55.
29 BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11 de novembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990.
30 BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11 de novembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990.
Segundo ainda, Paulo R. Roque A. Khouri31:
Pela leitura do artigo, depreende-se que não basta que o cidadão retire o produto do mercado, importa que ele o utilize como destinatário final. De plano, o comerciante não pode ser considerado consumidor, já que ele adquire o produto para a sua revenda, sendo, portanto, um intermediário, e não um destinatário final; destinatário este que vai ser justamente a pessoa a quem ele vai revender o bem.
Sendo a TAM, uma pessoa jurídica de direito privado, que
comercializa o serviço de transportes aéreos regularmente obtendo lucro,
enquadra-se na esfera de fornecedora de serviços e, considerando que os
passageiros (excluindo aqui os tripulantes, pois não é o foco do estudo), são
pessoas físicas que pagam pelo serviço de transporte, caracteriza-se
consumidores.
Dessa forma, os fornecedores podem ser responsabilizados
tanto pelo vício do produto ou serviço como pelo fato do produto ou serviço
também conhecido como acidente de consumo. A doutrina manifesta-se
dizendo que vício é “todo aquele que impede ou reduz a realização da função
ou do fim a que se destinam o produto ou o serviço afetando a utilidade que o
consumidor dele espera”32.
Vício do produto está previsto no artigo 18 do CDC:
Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com as indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
Já o vício do serviço explicita o artigo 20, também, do CDC:
O fornecedor de serviços responde pelos vícios de qualidade que os tornem impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária, podendo o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
31 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 45.
32 LÔBO, Paulo Luiz Neto, Responsabilidade por vício do produto ou do serviço. Brasília: Brasília Jurídica, 1996. p. 52.
O fato do produto ou serviço diz respeito ao dano que um ou
outro pode causar ao consumidor. Como exemplifica Felipe Braga Netto33, se o
consumidor compra lâmpada que explode e atinge o rosto de um consumidor,
causando-lhe danos morais (estéticos) e materiais, “haverá um fato do
produto”.
Diante dessas informações, o acidente ocorrido em 17 de julho
de 2007, com o avião da TAM, configura-se tanto como vício do produto
(aeronave), como também fato do serviço, como poderá ser verificado no
capítulo 3, onde se aponta as causas do acidente.
Além disso, fica mais fácil entender que, mesmo o Código Civil
abordando questões de responsabilidade Civil, tendo como regra a
responsabilidade Subjetiva (prova da culpa pela vítima), no caso desse
acidente em questão, prevalece o Código de Defesa do Consumidor, pelo fato
de as partes serem consideradas: consumidores e fornecedores, portanto,
responsabilidade Objetiva. Havendo exceções quando se tratar de profissionais
liberais, que respondem apenas quando provada a culpa dos mesmos (artigo
14, parágrafo 4º, do CDC).
Existe a possibilidade de se excluir a responsabilidade objetiva
quando o fornecedor comprovar que: I - que não colocou o produto no
mercado; II - que embora haja colocado o produto no mercado, o defeito
inexiste; III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, conforme
parágrafo 3º do artigo 12 do Código de Defesa do Consumidor. Embora não
explícito, o caso fortuito ou força maior, também poderão ser causa de
excludente, como anteriormente destacado.
Além da responsabilidade civil, o fornecedor poderá também ser
responsabilizado na esfera penal, dependendo dos fatos.
33 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 203.
1.4.5. Responsabilidade Civil e Penal
Um ato ilícito poder acarretar sanção tanto na esfera civil como
na esfera penal. Embora o fundamento de ambas seja a restauração da ordem
e paz social, aquela é mais ampla e está mais restrita. As condutas mais
graves que atingem bens sociais maiores são punidas com a lei penal e as de
menor relevância com a lei civil.
Silvio de Salvo Venosa34 analisa a questão figurando os
institutos como dois círculos concêntricos:
A esfera do processo criminal é um circulo menor, de menor raio, porque a culpa criminal é aferida de forma mais restrita e rigorosa, tendo em vista a natureza da punição e ainda porque, para o crime, a pena não pode ir além do autor da conduta. “A esfera da ação civil de indenização é mais ampla porque a aferição da culpa é mais aberta, admitindo a culpa grave, leve e levíssima, todas acarretando como regra o dever de indenizar.”
Sendo assim, a responsabilidade civil é marcada pelo dano que
ocorre face à transgressão de um direito juridicamente tutelado, sem a prática
do crime. Neste caso, haverá reparação do dano (moral ou patrimonial) por
meio de indenização ou recomposição do statu quo ante (no estado anterior),
podendo ser transferível aos herdeiros ou sobre pessoas que não são as
praticantes do ato ilícito, quando a lei assim determinar (casos de
responsabilidade indireta).
A responsabilidade criminal incide face à transgressão de um
tipo penal, caracterizando um crime ou contravenção. O direito penal cuida dos
ilícitos considerados mais graves e lesivos à sociedade como um todo. Por isso
as normas penais são consideradas de direito público.
Neste caso, não haverá reparação e sim a aplicação de uma
pena pessoal e intransferível ao transgressor, como já destacado acima, por
Silvio de Salvo Venosa, em virtude da gravidade de sua infração. 34 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 191.
A reparação na esfera penal pode ser a indenização, o retorno
ao estado anterior, compensação, perdas e danos e até mesmo com o
cumprimento de uma pena. Já na esfera civil é feita basicamente através da
indenização e da restituição do bem jurídico o tanto quanto possível ao estado
anterior.
Vale ressaltar que uma mesma conduta pode incidir, ao mesmo
tempo, nas duas esferas, tanto na civil, como na criminal. De acordo com
Sérgio Cavalieri Filho 35, nesse caso há uma “dupla ilicitude” como aconteceu
com réus do acidente da TAM, vôo 3054. Não apenas os órgãos ou empresas
estão respondendo na esfera civil pelo dano, mas também seus
representantes, na esfera penal.
Assim sendo, 10 (dez) pessoas estão sendo indiciadas
criminalmente por atentado contra a segurança do transporte, conforme página
61 do Inquérito Policial de número 973/2008:
As condutas acima enunciadas, salvo melhor juízo, tipificam infração contra a incolumidade pública, mais especificamente aquela prevista no art. 261, § 3º, c. c. art. 263, do Código Penal, qualificada pelo legislador como Atentado contra a Segurança de Transporte Aéreo , no caso em questão, na modalidade culposa. É importante destacar que os fatos apurados bem demonstram que havia, na oportunidade, risco à vida, à integridade física e ao patrimônio de um número indeterminado de pessoas, na medida em que as ações e omissões culposas atingiram a segurança de importante meio de transporte e de um dos mais movimentados e importantes aeródromos da América Latina. Em razão disso, as cento e noventa e nove mortes, bem como as outras nove lesões corporais, são previstas como circunstâncias qualificadoras do crime de perigo, à luz do que dispõe os arts. 263 e 258 do nosso diploma penal. (grifo nosso).
Dessa forma, pode ser verificado que na esfera penal, a
responsabilidade é mais rigorosa, tendo como fim, punição, enquanto que na
esfera civil a função primordial é reparar e compensar. Importante analisar
essas funções de acordo com a doutrina e com as decisões recentes dos
tribunais, já que é ferramenta importantíssima para se saber como isso se dá
num caso prático, quando o que se quer reparar ou compensar é a vida.
35 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. P. 14.
1.5. Funções da Responsabilidade Civil
A responsabilidade civil tem a função de restaurar o bem
jurídico prejudicado (patrimonial ou/e moral), de punir aquele que cometeu o
dano e de servir de exemplo para a sociedade para que não aconteça
novamente – interessante é uma observação feita por Silvio de Salvo Venosa36,
“um prejuízo ou dano não reparado é um fator de inquietação social”.
Sérgio Cavalieri Filho37, afirma também que, o dano causado
por ato ilícito “rompe o sentimento de justiça” e cita o Princípio da Restitutio in
Integrum (Restituição Integral) que tenta devolver à vítima, a coisa ao estado
anterior.
Existe muita discussão na doutrina se a função da
responsabilidade civil é reparadora ou punitiva. Alguns autores acreditam ter as
duas funções, como no caso de Antunes Varela e Pessoa Jorge citados no livro
de Paulo R. Roque A. Khouri38 que tem opinião similar.
Eles afirmam que o instituto da responsabilidade civil tem em
primeiro lugar a função reparadora /punitiva, já que aquele que deve repor o
prejuízo causado, de certa forma, será punido ao perder patrimônio e
“secundariamente” compensatória / punitiva, pois ao mesmo tempo em que
tenta compensar a dor da vítima direta ou indireta, ela pune o causador do
dano. Paulo R. Roque A. Khouri39 destaca ainda que:
Essas duas funções não se excluem e nem uma tem primazia sobre a outra. Elas estão presentes em todas as condenações decorrentes do instituto da responsabilidade civil; por vezes, uma está mais flagrante que a outra, ora menos flagrante, mas o certo é que elas sempre estão presentes.
Isso se faz através de Indenizações materiais para os danos
financeiros e morais para os danos que afetam os direitos personalíssimos
como à intimidade, a honra, a vida entre outros.
36 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 1.
37 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. P. 13.
38 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.p. 144.
39 Id. IB. 145.
2. INDENIZAÇÕES NA ESFERA JURÍDICA
As indenizações, em geral, são prestações em dinheiro
destinadas a reparar ou recompensar um dano causado a um bem jurídico. “É
a pedra de toque da responsabilidade civil”40. Assim, quem, por ato ou omissão
ilícita, violar o direito de alguém, causando-lhe prejuízo, fica obrigado a reparar
esse dano.
Porém, há casos em que a indenização não decorre
necessariamente de ato ilícito, como as decorrentes de rescisão de contrato de
trabalho em que o trabalhador perde seu emprego ou nas excludentes de
ilicitude (estado de necessidade, legítima defesa e exercício regular do direito).
Importante também salientar que não basta uma conduta ilícita
e o nexo causal para que se tenha o dever de indenizar, “necessário que tenha
havido decorrente repercussão patrimonial negativa material ou imaterial no
acervo de bens, no patrimônio de quem reclama”41.
Como bem salienta Sergio Cavalieri Filho42, “o dano é, sem
dúvida, o grande vilão da responsabilidade civil. Não haveria que se falar em
indenização, nem ressarcimento, se não houvesse o dano. Pode haver
responsabilidade sem culpa, mas não pode haver responsabilidade sem dano”.
Interessante destacar aqui os ensinamentos de Felipe P. Braga
Netto43 que chama atenção sobre a tutela repressiva da responsabilidade civil,
já que sem o dano não há punição. E afirma que “ótima” seria a tutela
preventiva da responsabilidade civil. A tutela repressiva, para os direitos de
personalidade (bens de valor extrapatrimonial), não é a tutela ideal. A tutela
ótima seria, no caso, é uma tutela que evite que os danos ocorram (tutela
preventiva). Só assim tais bens jurídicos são devidamente protegidos e
resguardados.
40 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 11.
41 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 287.
42 CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. P. 70.
43 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 11
A tutela repressiva (indenização compensatória), para os danos
morais, embora necessária, é uma tutela subsidiária, pois não faz voltar o que
se perdeu.
Arthur Ballen, advogado americano, especialista em acidentes
aéreos, transmite a idéia de que cada pessoa tem um valor, conforme
transcrição na obra de Felipe Braga Netto44:
Pode parecer frio, mas é assim que funciona. A verdade é que cada pessoa tem um valor monetário . Um sujeito de 35 anos, casado, com dois filhos e boas perspectivas de ascensão profissional vale no mínimo 1,5 milhões de dólares. Uma mulher nas mesmas condições vale ainda mais. Em casa caso o valor é determinado como a morte afeta a vida de outras pessoas. (grifo nosso).
Assunto de grande relevância e muito discutido devido a sua
complexidade, deixa a cargo dos juizes a fixação do valor indenizatório, já que
não há uma fixação tabelada. Todavia, os magistrados levam em consideração
a situação econômica das partes envolvidas para se arbitrar um valor.
2.1. Indenização Material
A indenização material, como o próprio vocábulo já diz, tem o
intuito de reverter o prejuízo pecuniário causado à vítima: busca-se a
restituição de tanto aquilo que se perdeu efetivamente em bens materiais (dano
emergente), como o que razoavelmente deixou de ganhar por causa do dano
(lucros cessantes). Uma vez demonstrado o dano, ele deverá ser indenizado.
Conforme preceitua o artigo 402 do Código Civil de 200245, “as
perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente
perdeu e o que razoavelmente deixou de lucrar”.
Dessa forma, se alguém invade o sinal vermelho destruindo
veículo que era utilizado como meio de trabalho, o agente causador deverá
44 BRAGA NETO, Felipe P. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 357.
45 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 159 do Código Civil de 2002. Artigo 402.
repor o valor do carro da vítima e ainda o que ela deixou de ganhar com o
acidente.
Para Silvio Neves Baptista46:
Se o dano consiste unicamente na ofensa contra a pessoa, na perda ou danificação do objeto, sem afetar a atividade do ofendido ou sua possibilidade de ganho, diz-se que o dano é emergente ou positivo – damnum emergens; se além do dano emergente (material ou imaterial), a vítima deixar de ganhar ou auferir vantagens em virtude do prejuízo, o dano será definido como cessante ou negativo – lucrum cessans.
A fixação dos danos materiais são ressarcíveis, pois abrange o
dano patrimonial. Essa tarefa não é considerada tão complexa já que existem
meios de provar os valores gastos em conseqüência do dano e suas
conseqüências.
No caso de morte, como o que aconteceu com as vítimas do
vôo 3054 da TAM, caberá aos seus ascendentes e/ou descendentes requerer a
indenização47material, já que foram privados de alimentos, auxílio ou educação
(Decreto nº. 681/12, art. 20 e 22). Isso se dá através da apresentação de
documentos, como por exemplo, o imposto de renda da vítima ou qualquer
outro documento que comprove o valor que ganhava antes do acidente.
Assim, “o dano material é objetivo. Uma vez demonstrado, deve
ser indenizado. Até porque a indenização por danos materiais mede-se, em
regra, não pela gravidade da conduta, mas pela extensão do dano”48.
Complicado mesmo é avaliar o dano moral (o quantum indenizatório), que
apesar de ter sido refutado por muitos anos, já tem aceitação plena pela
doutrina e jurisprudência.
2.2. Indenização Moral
Dano moral é aquela ação ou omissão que fere o direito de
personalidade da vítima que, conforme classificado por Pontes de Miranda, na
46 BAPTISTA, Silvio Neves. Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 86.
47 BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Parágrafo Único do Artigo 20.
48 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.p. 147.
obra de Paulo Roberto Benasse49 são: direito à vida, à integridade física e a
psíquica, à liberdade, à verdade, à honra, à própria imagem, à igualdade, ao
nome, à intimidade, ao sigilo e ao direito autoral. Dessa forma, torna-se
bastante difícil uma avaliação pecuniária para se arbitrar indenização moral.
Por esse motivo, havia divergência entre a doutrina e o
Supremo Tribunal Federal. Aqueles defendiam a necessidade de indenização
para amenizar o sofrimento, enquanto esses não aceitavam o dano moral, visto
que ele não era passível de valor monetário.
Segundo Silvio de Salvo Venosa 50:
A doutrina nacional majoritária, acompanhado o direito comparado,
defendia a indenização do dano moral, com inúmeros e respeitáveis
seguidores, enquanto a jurisprudência, em descompasso, liderada pelo
Supremo Tribunal Federal, negava essa possibilidade.
No entanto, após a Constituição Federal de 1988, o dano moral
passou a ser norma constitucional. No Artigo 5º, inciso V, passou a ser
“assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização
por dano material, moral ou à imagem” e ainda, no mesmo artigo, em seu
inciso X, passou a ser “invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação”.
Da mesma forma, o Código de Defesa do Consumidor51 destaca
em seu artigo 6º, incisos VI, que “são direitos básicos do consumidor a efetiva
prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e
difusos” e no inciso VII:
O acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos assegurados à proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados.
49 BENASSE, Paulo Roberto. A personalidade, os danos morais e sua liquidação de forma múltipla. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Pg. 15.
50 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 297.
51 BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11 de novembro de 1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 6º.
Desde então, passou a aceitar o dano material cumulado com o
dano moral, conforme Súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça52: “São
cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do
mesmo fato”.
Conforme Paulo R. Roque.A. Khouri53:
Em matéria de danos morais, o último obstáculo a ser vencido é justamente o valor da indenização. Ou seja, nos tribunais brasileiros já não se encontram dificuldades com relação ao reconhecimento dos danos que sejam efetivamente morais; o problema é o quantun debeatur.
As indenizações, no que tange ao dano moral, são muito
abrangentes: há danos relativos à imagem, à honra, a integridade física entre
outros. Por esse motivo, importante frisar que, o objeto de estudo do presente
trabalho, está pautado no dano moral causado em virtude de morte, em
transporte aéreo (Vôo 3054 da TAM).
Dano, portanto, originado através de uma relação de consumo
entre o consumidor (hiposuficiente da relação), transportador aéreo (aquele
que comanda a aeronave e tem o poder econômico) e até terceiros envolvidos.
Importante deixar claro que o bem protegido aqui não é a intimidade ou direitos
autorais, mas a vida, que poderá correr perigo caso as empresas não tomem
as devidas precauções.
Tanto a doutrina, como a jurisprudência, entende que as
indenizações devem ser baseadas na situação financeira da vítima e do
causador do dano tendo como objetivo reparar, compensar (maioria) e punir
(minoria).
Silvio de Salvo Venosa54 afirma que a indenização por “dano
moral possui cunho compensatório antes do reparatório somado ao relevante
aspecto punitivo que não pode ser marginalizado”.
52 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 37 do Superior Tribunal Federal. Brasília, 12 de março de 1992.
53 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.p. 145.
O autor salienta também que:
Um dos pontos que o estabelecimento da indenização deve levar em conta, e que não está expresso na lei, é sem duvida o nível econômico das partes envolvidas . Não é porque o ofensor é empresa economicamente forte que a indenização deverá ser sistematicamente vultosa em favor de quem, por exemplo, sempre sobreviveu com um salário mínimo. O bom-senso deve reger as decisões, sob pena de gerar enriquecimento ilícito , o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.
Já o ilustre doutrinador Rui Stoco, que, em sua obra, Tratado de
Responsabilidade Civil55 ensina que:
Segundo nosso entendimento a indenização da dor moral, sem descurar desses critérios e circunstâncias que o caso concreto exigir, há de buscar, como regra, duplo objetivo: caráter compensatório e função punitiva da sanção (prevenção e repressão), ou seja: a) condenar o agente causador do dano ao pagamento de certa importância em dinheiro, de modo a puni-lo e desestimulá-lo da prática futura de atos semelhantes; b) compensar a vítima com uma importância mais ou menos aleatória, em valor fixo e pago de uma só vez, pela perda que se mostrar irreparável , ou pela dor e humilhação impostas. (grifo nosso).
Os tribunais também têm pautado nesses mesmos fundamentos
jurídicos, conforme palavras destacadas nas decisões abaixo:
A INDENIZAÇÃO REFERENTE AO DANO MORAL. A indenização referente ao dano moral visa compensar a dor , a mágoa e o sofrimento sentidos pela vítima, possuindo ainda efeito pedagógico para o ofensor, mas deve o seu valor ser fixado sem extrapolar os limites da razoabilidade. Podem-se utilizar, por analogia, para calcular o valor do dano moral, os parâmetros estabelecidos pela Lei Nº 4.117/62 - Código Brasileiro de Telecomunicações, que adota o critério de que o montante da reparação não será inferior a cinco, nem superior a cem vezes o maior salário mínimo vigente no País, variando de acordo com a natureza do dano e as cond ições sociais e econômicas do ofendido e do ofensor. Recurso Ordinário Patronal parcialmente provido. Recurso Adesivo Obreiro improvido. (Proc. nº TRT – RO 5027/01, 1ª Turma, Juíza Relatora Virgínia Malta Canavarro, DOE/PE 13.07.02) (Grifo nosso).
DANOS MORAIS - DESEMBARQUE DE MENOR DESACOMPANHADO EM CIDADE ERRADA. Transporte - Ação indenizatória por danos morais - Viagem de menor desacompanhado - Companhia aérea que desembarca o menor em cidade errada - Majoração da verba indenizatória arbitrada em Primeira Instância. A questão pertinente à mensuração dos danos morais remete o julgador a analisar critérios vinculados à gravidad e da ofensa e
54 VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 302.
55 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil – 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p. 1709.
a natureza da conduta ilícita, à capacidade finance ira do ofensor em suportar a condenação e à condição socioeconômic a das vítimas. Ainda, necessária à análise dos paradigmas relacionados à natureza punitiva e reparadora da medida, através de efetivo ressarcimento que não represente um enriquecimento sem causa dos ofendidos. O valor arbitrado pelo magistrado singular - R$ 5.250,00 - equivalente a 15 (quinze) salários mínimos, não é suficiente a ressarcir os danos morais provocados nos autores. Pernoitou o menor em cidade estranha, acompanhado por funcionário da companhia aérea, longe de seus pais ou conhecidos, quando deveria ter sido entregue ao final da viagem diretamente à sua mãe. Também não é de pequeno grau a ofensa perpetrada à progenitora que, aguardando a chegada de seu filho, recebe a notícia de que ele foi desembarcado em outra localidade e se encontra aos cuidados de pessoa que não é de sua confiança pessoal. Todavia, o valor pleiteado pelos recorrentes - 200 salários mínimos - é desarrazoado, superando até mesmo o parâmetro utilizado pela Corte para o caso de morte. Parcial provimento do recurso, restando à apelada condenada à indenização no equivalente a 30 salários mínimos. Apelo parcialmente provido. (TJRS - 12ª Câm. Cível; ACi nº 70017405184-Porto Alegre-RS; Rel. Des. Naele Ochoa Piazzeta; j. 7/12/20006; v.u.). (grifo nosso). INDENIZAÇÃO. Dano moral - Arbitramento que deve ser realizado com moderação - Hipótese em que o quantum deve ser proporcional ao grau de culpa, ao nível socioeconômico e ao porte da empresa recorrida - Necessidade de o magistrado se orientar pelos critérios de razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. (grifo nosso). Ementa oficial: Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalidade ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. OBRIGAÇÃO DE FAZER. Mora. Multa diária. Hipótese em que a fixação se faz necessária para compelir o órgão a fazer ou deixar de fazer aquilo que estava obrigado em virtude de sentença judicial. Inteligência do art. 644 do CPC.Ementa oficial: Nas obrigações de fazer e não fazer já é assente na jurisprudência o cabimento da fixação de multa diária pela mora injustificável, a fim de compelir o órgão a fazer ou deixar de fazer aquilo que estava obrigado em virtude de sentença judicial, havendo inclusive previsão legal no art. 644 do CPC. (TRF - 2ª Região - 5ª T.; AP nº 2000.51.10.000340-9-RJ; Rela. Desa. Federal Vera Lúcia Lima; j. 18/3/2003; v.u.) RT 816/387. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE AÉREO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SUBJETIVA DA EMPRESA TRANSPORTADORA. PEDIDOS COMPREENDIDOS NA EXORDIAL. FALECIMENTO DE ESPOSA E FILHO MENOR. VÍTIMA QUE EXERCIA ATIVIDADE REMUNERADA. PENSÃO DEVIDA. PROMOÇÕES. EVENTUALIDADE DO FATO. NÃO INCLUSÃO. DEDUÇÃO DE VALORES PAGOS PELA PREVIDÊNCIA PÚBLICA E PRIVADA. DANO MORAL E MATERIAL. JUROS MORATÓRIOS. SÚMULAS NS. 341-STF E 54-STJ. LEI N. 7.565/86 (CBA).
I. Acidente decorrente de colisão de avião comercial no solo, atingindo fatalmente mulher e filho menor, que trafegavam em automóvel na via pública adjacente ao aeroporto.
II. Compreendendo a exordial da ação tanto o pedido de
indenização pela responsabilidade objetiva da empresa aérea, com base no art. 268 do Código Brasileiro do Ar, como com fundamento na culpa da transportadora, merece reparo o acórdão estadual que identificou na lide apenas a primeira pretensão, limitando-se a decidir pela condenação exclusivamente pelos parâmetros fixados no art. 269 da mesma Lei n. 7.565/86.
III. Ao reconhecer que os autores - esposo e pai, filhos e irmãos das vítimas - fazem também jus ao ressarcimento pelos danos materiais e morais sofridos, pode o STJ, em face do preceituado no art. 257 do Regimento Interno, aplicar o direito à espécie, definindo, de logo, na medida em que possível, à luz dos fatos incontroversos existentes nos autos, a indenização e/ou seus respectivos, consoante cada uma das postulações feitas na inicial.
IV. Devido o pensionamento dos autores pela perda da
contribuição financeira da primeira vítima, bancária, à família, a ser apurada em liquidação de sentença.
V. Impossibilidade de consideração, para efeito do cálculo de
pensionamento, dos benefícios pagos aos autores pela Previdência Pública e Privada (vencido, nesta parte, o relator).
VI. Improcede a pretensão relativa à inclusão de promoções
futuras na carreira quando da apuração do valor da pensão, em face da eventualidade do fato e não se enquadrar no conceito jurídico de "lucros cessantes".
VII. Tratando-se de família de razoável poder aquisitivo , não é
pertinente o pensionamento pelo falecimento do filho menor, de tenra idade, por não se supor que viesse a contribuir para o sustento do grupo até dele se desligar. Precedentes do STJ.
VIII. Dano moral devido como compensação pela dor da perda
e ausência suportadas pelos autores, no equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos por cada uma das vítimas, a serem repartidos equitativamente, consideradas as circunstâncias dos autos. (grifo nosso).
IX. Ressarcimento pelos objetos de uso pessoal danificados ou
perdidos no acidente, bem assim das despesas de funeral não cobertas pelas instituições previdenciárias, em montante estabelecido na fase de liquidação.
X. Recurso conhecido e parcialmente provido.
Como observado nas jurisprudências anteriores, as decisões
destacam as funções de compensar a dor e punir o agressor para que o
mesmo erro (dano) não ocorra. A responsabilidade civil nos Estados Unidos da
América, no que tange ao dano moral, tem apenas a função de “Punite-
Damage” (punir o ofensor), devendo esse critério estar sintonizado com outros
três: “o da gravidade da conduta, o da repercussão da ofensa no meio social e
o da capacidade econômica do ofensor” 56. (grifo nosso).
Esse também é o entendimento de Paulo Henrique
Cremoneze57 quando afirma: “entender que a indenização por danos morais
deve limitar-se ao caráter compensatório é o mesmo que negar a eficácia
jurídico-social dos danos morais” e ainda acrescenta: “mais importante do que
compensar a vítima, os danos morais servem, ou deveriam servir, para punir o
ofensor”.
Além desses critérios de compensar, punir, situação financeira
das partes, fala-se em bom-senso para não configurar enriquecimento ilícito,
vedado pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, importante acompanhar o
relatório do Ministro Castro Filho no Recurso Especial nº. 355.392, de
Responsabilidade Civil por danos morais, já que utiliza um termo novo
(enriquecimento sem causa) e mais adequado para o caso58:
A qualificação do valor a ser pago a título de reparação por dano moral e, deveras, um dos pontos de maior tormento para o magistrado. Deve agir de modo a não prestigiar o ilícito, fixando importância aviltante e até atentatória à dignidade do ofendido, mas, também, de outro lado, deve evitar premiá-lo, com o arbitramento de valor tão elevado que possa reverter em enriquecimento sem causa justa . (grifo nosso) Nessa matéria, com efeito, deve o juiz, valendo-se do bom-senso que é imprescindível ao correto discernimento do julgador, levar em consideração critérios objetivos e subjetivos, tais como o nível cultural do causador do dano; a condição socioeconômica do ofensor e do ofendido; intensidade do dolo ou grau da culpa (se for o caso) do autor da ofensa; as conseqüências do dano no psiquismo do ofendido; as repercussões do fato na comunidade em que vive a vítima etc.; para, só então, estabelecer o quantum a ser pago. Ademais, na fixação da reparação, deve o magistrado agir pedagogicamente, estipulando valor que desestimule a prática de outros ilícitos similares, mas que não sirva a condenação também de contributo a enriquecimento injustificado.
56 KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.p. 148.
57 CREMONEZE, Paulo Henrique. A introdução da doutrina norte-americana do "punitive damage" no sistema jurídico brasileiro para a avaliação
das indenizações por danos morais. Jus Navegandi, 2001.Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3467> Acesso em 28 de
março de 2009.
58 CASTRO FILHO. Responsabilidade Civil. Dano Moral. Critérios para a fixação do valor. Ministro Castro Filho. RECURSO ESPECIAL n.º55.392
– RJ. Disponível em: http://www.parana-online.com.br/colunistas/69/983/ Acesso em 05/05/2009.
Segundo palestra proferida na escola da magistratura do Pará,
pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Antonio de Pádua Ribeiro59, os
valores arbitrados pelos juizes são bastante diversificados dependendo de
cada caso. Catalogando dezenas de julgados, ele afirma que a maioria das
sentenças, no caso de acidentes, foi “fixada entre 200 e 1.000 salários
mínimos, de acordo com a gravidade do dano”.
O dever de responder pela incolumidade do viajante e de
conduzi-lo são e salvo ao seu destino, não poderá ser afastado por estipulação
que exonere o transportador de sua responsabilidade. Nulas serão todas as
cláusulas que isentarem o transportador de responsabilidade ou que reduzam
os limites estabelecidos legalmente, mas tal nulidade não acarretará a do
contrato.
Conforme Paulo Roberto Benesse60:
Existem os danos morais dos próprios ascendentes e descendentes, quer pela ausência ocasionada pelo pai ou pela mãe, agravada quando o filho for menor; bem como pela dor da perda ocasionada no intimo de seus entes queridos.
Além da discussão sobre indenizar ou não ou dano moral, o que
já foi decidido, ainda existe divergência se deve ou não tarifar (limitar) as
indenizações. O entendimento predominante, assim como o de Paulo Roberto
Benasse61, é de que, os valores referentes ao dano moral, não devem ser
tarifados, mas arbitrado pelo juiz no ato da própria sentença.
O novo código civil não estabelece critérios de limitação das
indenizações morais, deixando a cargo de cada juiz essa subjetividade, o que
poderá ter como conseqüências, grandes injustiças.
59 RIBEIRO, Antonio de Pádua. Indenização por danos morais. Ministro do Superior de Justiça, a partir da Constituição de 1988. Palestra
proferida na escola de magistratura do Pará, em 25/05/2001 – Belém _ PA. Disponível em
http://bdjur.stj.gov.br/jspui/bitstream/2011/282/4/Indeniza%C3%A7%C3%A3o_por_Danos_Morais.pdf> Acesso em 06/05/2009.
60 BENASSE, Paulo Roberto. A personalidade, os danos morais e sua liquidação de forma múltipla. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Pg. 106.
61 iD. Ib.g. 103.
Felipe Braga Netto62, retira um exemplo, citado no livro de Maria
Celina Bodin de Morais63 que comprova falha no judiciário pela ausência de
limitação. Ele compara duas pessoas que morreram no acidente da TAM,
provavelmente no acidente de 1996, já que a obra da autora é anterior ao
último acidente da mesma empresa, que aconteceu em 2007.
A autora Maria Celina relata que dois sujeitos, mortos no
mesmo acidente, com idêntico nível socioeconômico, tiveram indenizações
pagas as respectivas famílias com diferença de 2.000%. Enquanto uma ganhou
setenta e cinco mil reais pela morte do ente querido, a outra recebeu dois
milhões, no mesmo Tribunal de Justiça de São Paulo – mas com turmas
diferentes.
Há um projeto de Lei (Nº. 150/1999) em tramitação no
Congresso Nacional para tarifar esses valores em três esferas: ofensa de
natureza leve, média e grave. No entanto, o Supremo Tribunal Federal e o
Superior Tribunal de Justiça não têm visto essas limitações com bons olhos.
Conforme Felipe Braga Netto64:
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, no entanto, tem-se posicionado contrariamente às tarifas legais de reparação, o que indica que o projeto mencionado, ainda que aprovado, poder vir a ter sua inconstitucionalidade declarada nesse ponto.
Diante de tantos detalhes e da dificuldade de aplicar o instituto
da responsabilidade civil no caso de acidentes aéreos quando o bem protegido
é a vida, partiu o desafio de analisar um caso concreto, qual seja o vôo 3054 da
TAM. Para isso, importante se faz analisar os detalhes do caso.
62 BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 29.
63 MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana, Rio de Janeiro: Renovar, 2003: p. 38.
64 BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 32.
3. VÔO 3054 DA TAM
O Transporte aéreo ainda é considerado o mais seguro de
todos. Todavia, nos últimos anos, o Brasil tem acompanhado um aumento no
número de tragédias, conforme informações do Centro de Investigação e
Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa)65. (Ver anexo 1 - Tabela do
Cenipa).
Um desses acidentes aconteceu com o vôo 3054, uma linha
aérea de passageiros que ligava as cidades brasileiras de Porto Alegre e São
Paulo. Tornou-se conhecido pelo vôo do dia 17 de julho de 2007, operado pela
aeronave Airbus A320, prefixo PR-MBK, da companhia brasileira TAM Linhas
Aéreas, que se chocou contra um prédio da empresa Tam Express, situado nas
proximidades da cabeceira da pista do Aeroporto de Congonhas, do lado
oposto da Avenida Washington Luís (ver anexo 2 – Fotos do Acidente - para
que o leitor possa acompanhar a análise do caso concreto).
Conforme divulgado pela imprensa e autoridades, além das 187
(cento e oitenta e sete) pessoas que se encontravam a bordo da aeronave,
mais 12 (doze) pessoas em terra faleceram em decorrência do acidente,
totalizando 199 (cento e noventa e nove) pessoas, quatro das quais não foram
identificadas porque seus corpos não foram encontrados.
O Código Brasileiro da Aeronáutica (Lei 7.565) rege os
acidentes no plano interno ou também chamado de vôos domésticos. Já no
plano internacional, passa a ser da Convenção de Montreal (unificação de
certas regras relativas ao transporte aéreo internacional).
Todavia, como o Código de Defesa do Consumidor e mais
recente e existe a relação de consumo, é ele que regula acidentes aéreos no
Brasil, no caso de prestadora de serviços.
65 Agência Brasil. Número de acidentes aéreos foi maior em 14 anos. 45graus. Piauí. 19 de janeiro de 2009. Disponível em
<http://www.45graus.com.br/geral/33927/numero_de_acidentes_aereos_foi_maior_em_14_anos.html> Acesso em 20 de março de 2009.
Importante salienta que, no CDC, as ações prescrevem em
cinco anos, tempo maior que no Código Civil que são apenas dois. Além disso,
enquanto aquele a responsabilidade é objetiva, nesse tem, como regra, a
responsabilidade subjetiva.
Conforme páginas 79 e 80 do inquérito policial (ver anexo 3),
elaborado pela Autoridade Policial, Dr. Antonio Carlos Menezes Barbosa, a
tragédia que resultou na morte de várias pessoas e ferimentos em outras, foi
resultante de uma somatória de fatores.
Segundo ele, o acidente poderia ter sido evitado, visto que só
ocorreu devido à ação ou omissão dos órgãos e empresas abaixo
relacionadas, as quais, embora plenamente conscientes da previsibilidade do
evento, agiram com inobservância do dever de cuidado.
3.1 Anac, Infraero e TAM.
Em janeiro de 2007, o Ministério Público Federal de São Paulo
entrou com uma ação civil pública66contra a Anac e a Infraero fazendo os
seguintes pedidos, conforme página 63:
1) A Interdição da pista principal do Aeroporto Internacional de Congonhas com a interrupção de todas as operações de pouso e decolagem, até que a obra de recuperação geométrica de toda a pista, com a correção das declividades transversais e longitudinais, e a execução de uma nova capa asfáltica com grooving seja concluída. (grifo nosso). 2) realização das obras necessárias, conforme constatado pela Infraero e tudo o mais que for constatado em perícia a ser realizada de forma a garantir a segurança na utilização da pista principal do Aeroporto. 3) no remanejamento da escala dos vôos do Aeroporto de Congonhas para os Aeroportos de Guarulhos e de Viracopos com a conseqüente informação aos usuários/consumidores das alterações efetuadas.
4) determinação às rés que não ampliem o horário de funcionamento do aeroporto com relação ao uso da pista auxiliar para além das 23
66 O texto da ação civil pública está disponível na íntegra no site da Procuradoria da República no Estado de São Paulo.
horas, bem como o uso desta seja adequado as suas limitações e condições.
Os motivos que ensejaram essa ação, de acordo com o
Ministério Público Federal, foram os quatros incidentes ocorridos em razão de
aquaplanagem com o avião da empresa BRA, em março de 2006, devido ao
acúmulo de água e desgaste da pista; com o avião da GOL, em outubro do
mesmo ano, por causa da pista molhada em razão de chuvas fracas, entre
outros.
A ação Civil Pública destaca ainda em suas páginas 15 e 16
que a ANAC e a Infraero admitiram as deficiências na pista do Aeroporto de
Congonhas, quais sejam: “nível de atrito insatisfatório, escoamento superficial
da água prejudicado e gerando lâmina d’água face à deficiência nas
declividades transversais e longitudinais”.
Além disso, também participaram da decisão de interditar a
pista e, conseqüente, suspender as operações em dias de chuvas. Importante
destacar alguns trechos da Ação Civil Pública que demonstra a seriedade e
preocupação do Ministério Público Federal com a segurança da sociedade:
O deslizamento das aeronaves é gravíssimo, pois ret ira do piloto o controle da aeronave, podendo ensejar acidentes p ela impossibilidade de frenagem da mesma. Considerando, ainda, a inexistência de áreas de escape no aeroporto, conforme anteriormente explanado (fls. 62/64 e 126/127), a possibilidade de que uma dessas aeronaves deslize para fora do aeroporto atingindo uma das avenidas que o circundam é realmente palpável. (p. 15) (grifo nosso). (..) mais uma vez pretendem os operadores do Aeroporto priorizar os interesses econômicos das companhias aéreas em d etrimento da segurança dos passageiros, tripulantes e das pes soas que circulam no aeroporto e ao seu redor, tendo em vista que as novas discussões no setor são no sentido de que sejam retomadas as operações sem que a Recomendação do CENIPA de paralisação para verificação da existência ou não de lâmina d’água seja observada. (p. 17) (grifo nosso). Saliente-se mais uma vez que mesmo com chuva fraca , porém constante, há a formação da lâmina de água, colocando em risco qualquer operação de pouso e arriscando a vida dos passageiros cuja aeronave pode deslizar e cair no meio das Aven idas que circundam o Aeroporto . (p. 17) (grifo nosso)
Quantas vidas mais serão colocadas em risco para que medidas efetivas e satisfatórias sejam tomadas? Quantos incidentes ainda terão que ocorrer para que as autoridades se conscientizem dos valores constitucionais máximos, dentre eles o direito à vida e à integridade física? (p. 24). (grifo nosso).
Essa ação foi extinta em abril de 2007, depois da assinatura de
um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) entre Ministério Público, a
Infraero e a ANAC (Ver anexo 4). Nele os órgãos públicos assumiram o
compromisso de reformar a pista principal de Congonhas e fixaram-se horários
de funcionamento do aeroporto até a conclusão das obras. A nova pista foi
liberada para pousos e decolagens no final de junho sem as ranhuras
(grooving) que facilitam a drenagem das águas da pista.
Conforme a página de número 32 do inquérito policial, de abril a
dezembro de 2006, várias reuniões foram feitas com a Tam, Gol e Bra, com
intuito de minimizar os riscos da pista curta e sem aderência.
Conforme o gerente de padrão e avaliação de aeronaves da
ANAC, Gilberto Pedrosa Schittini, que gerenciava as reuniões, “os incidentes
apontados indicavam a possibilidade de ocorrências mais graves, com
ultrapassagem do final da pista”.
Assim sendo, editaram a norma ANAC ISRBHA 121-189 que,
conforme o responsável pelo Inquérito, as empresas aéreas não mais
operariam em Congonhas sem que todos os sistemas de freios estivessem em
funcionamento (reversores de empuxo incluídos), bem como que não seria feito
o chamado abastecimento econômico em vôos de e para Congonhas.
O abastecimento econômico proibia encher o tanque do avião,
pois se por um lado haveria uma economia para a empresa aérea, por outro, o
avião ficaria muito pesado e exigiria maior atenção operacional na hora do
pouso.
A interdição da pista foi liberada após a apresentação da norma
ANAC ISRBHA 121-189 à Desembargadora do Tribunal Regional Federal, pois
se conclui que se haviam normas para não se pousar em dias de chuva, elas
seriam cumpridas.
De acordo com o site oficial da Anac67, sua função é fiscalizar e
assegurar o cumprimento das normas e procedimentos, no âmbito do Órgão
Regulador, atuando na prevenção e correição de práticas de irregularidades e
desvios funcionais, bem como buscar permanentemente a transparência, a
moralização e a eficiência da gestão pública no campo aviação civil brasileira,
no entanto, se omitiu.
Já a função da Infraero é proporcionar maior segurança aos
vôos, através de serviços de gerenciamento de tráfego aéreo,
telecomunicações e meteorologia, conforme seu site oficial na internet68, mas
não interditou a pista naquele dia.
A Tam também não cumpriu as normas estabelecidas no acordo
sobre pousar com reversos inoperantes em dias de chuva e, mesmo sabendo
das queixas de vários pilotos quanto ao estado da pista no dia do acidente, não
recomendou o pouso em outro aeroporto.
Conforme, afirma o delegado Mario Luiz Sarrubbo, nas páginas
37 e 38 do Inquérito Policial:
Se assim é, omitiram-se ANAC, INFRAERO e TAM, a primeira porque mesmo diante das inúmeras ocorrências apontadas, não conferiu validade jurídica a uma instrução que se mostrava fundamental para a segurança das operações em Congonhas, nem tampouco instrumentalizou efetiva fiscalização para verificação de seu cumprimento. A segunda porque, sendo responsável pelo gerenciamento do Aeroporto de Congonhas, além de ter liberado a pista sem a observância dos padrões de segurança mínimos exigidos (macrotextura e grooving – conforme item anterior) também não tomou qualquer providência para aumentar o 38 nível de segurança. A empresa aérea porque mesmo tendo comparecido a essas reuniões, mesmo tendo conhecimento da necessidade de se impor restrições, ignorou as recomendações impostas e permitiu que sua aeronave voasse para Congonhas no dia 17 de julho, sem que
67 BRASIL. Ministério da Defesa. Anac. Disponível em < http://www.anac.gov.br/anac/corregedoria.asp.> Acesso em 04/02/2009.
68 BRASIL. Ministério da Defesa. Infraero. Disponível em <http://www.infraero.gov.br/item_gera.php?gi=nave&menuid=nave> Acesso em
04/02/2009.
um dos reversores estivesse operando e praticando o abastecimento econômico.
Além desses fatores, houve também irresponsabilidade da
Airbus que contribuiu para o acidente.
3.2 Airbus
A Airbus é a maior fabricante de aviões comerciais no mundo
atualmente e nos últimos anos, suas máquinas estiveram envolvidas em quatro
acidentes: Bacoled – Filipinas (1988), Phoenix – EUA 2002, Moscou – Rússia
2003 e Taipei-Taiwan (2004).
Segundo a página 80 do inquérito policial, esses acidentes
tiveram como fator principal o equivocado posicionamento das manetes de
empuxo (reverso). Por conta disso, a AIRBUS desenvolveu um sistema de
alerta sonoro e visual, designado como FWC H2 F3, destinado a alertar a
tripulação sobre o posicionamento das manetes. Esse sistema, chamado FWC
H2F3, foi classificado pela fabricante como um item desejável, ou seja, sua
aquisição e instalação ficariam a critério do operador.
Segundo as palavras do delegado responsável pelo inquérito69:
É inquestionável que caso o citado dispositivo fosse classificado como MANDATÓRIO e não DESEJÁVEL, o mesmo poderia ter evitado o acidente, admitindo-se a hipótese que tenha havido erro por parte do piloto quanto ao posicionamento das manetes. Outrosim, verifica-se que sendo a AIRBUS signatária da Flight Safety Foundation – FSF, houve por parte da mesma a não observância de normas de segurança de vôo, no que tange aos fatores envolvidos em traspassamento além da pista, constantes do ALA 8.1 e aos fatores que afetam a distância de pouso, constantes do ALAR 8.3, mencionados no laudo final do IC.
3.3 Pilotos
Henrique Stephanini Di Sacco e Kleyber Lima comandavam o
vôo JJ 3054 da TAM. O delegado Antônio Carlos Menezes Barbosa afirma que,
69 Inquérito Policial, p. 89.
dos 29 pilotos e co-pilotos ouvidos em depoimentos, 27 reclamaram da pista
em dias de chuva.
Eles classificam a pista como sabonete e a consideram como o
fator principal do acidente, conforme pode ser verificado nas transcrições
abaixo, retiradas do Inquérito Policial 973/2008:
ELIAS AZEM FILHO, co-piloto TAM – vôo 3215, que tinha como piloto o Comandante Brosco, que esclareceu que pousou em Congonhas em data de 16/07/07, por volta das 13h20, relatando que a pista estava escorregadia (“era um sabão”).
FABIO MOLINA PIROLLA, piloto vôo TAM 3590 que pousou em Congonhas em 17/07/07 ÁS 8H00 e esclareceu que por comentários de colegas ouviu dizer que a pista “estava um sabão”; RINALDO PATRICIO BAYMA JR. Que esclareceu que no dia 16/07/2007 vinha de Salvador – BA para Congonhas/SP pilotando uma aeronave AIRBUS A-320. Disse que embora autorizado pela Torre a pousar na pista principal de Congonhas, arremeteu e foi para Cumbica/Guarulhos, pois não se sentiu seguro para efetuar o pouso, visto que ao avistar a pista ela estava “espelhada”. Disse que após a reforma, pelo fato do asfalto encontrar-se “curando” a pista ficou mais escorregadia; MARCOS GUIMARÃES MORAES, piloto GOL -vôo 1864 que em data de 17/07/07 por volta das 20h00 partiu de Curitiba/PR, com destino a Fortaleza/CE. Disse que pediu o fechamento de Congonhas, em virtude das condições da pista naquela ocasião, devido às chuvas.
De acordo com as investigações, os pilotos não são
classificados como responsáveis pelo acidente, até porque, a transcrição da
caixa preta do avião, revela bem a dificuldade que eles tiveram com os
manetes:
CAM: [som semelhante ao toque no solo]. HOT-2: reverso número um apenas. HOT-2: nada dos spoilers. HOT-1: aaiii [suspiro]. HOT-1: olha isso. HOT-2: desacelere, desacelere. (grifo nosso) HOT-1: não dá, não dá. (grifo nosso) HOT-1: oh, meu Deus... oh, meu Deus. HOT-2: vai vai vai, vira vira vira vira. HOT-2: vira vira para... não, vira vira. CAM: [sons de batidas] CAM: (oh não) [voz de homem] CAM: [pausa nos sons de batidas] CAM-?: [som de um grito, voz de mulher] CAM: [som de batidas]. (fim da gravação)
Legenda: CAM: voz ou fonte sonora no microfone na área da cabine HOT: voz ou fonte sonora no painel de áudio da equipe da cabine PA: voz ou fonte sonora no sistema de comunicação da cabine com os passageiros FWC: aviso automatizado do sistema de alerta computadorizado do avião RDO: transmissões de rádio do vôo 3054 da TAM APP: transmissões de rádio do controle de aproximação TWR: transmissões de rádio da torre de controle de Congonhas CH2: som ouvido no canal 2 do CVR -1: voz identificada como sendo a do capitão -2: voz identificada como sendo a do primeiro oficial -3: voz identificada como sendo a da aeromoça -?: voz não-identificada.
3.4 O que foi feito até o momento
No dia 17/07/2008, o airbus 320 da TAM, vôo 3054, se chocou
com o prédio também da mesma empresa, causando várias vítimas. As
famílias, vivendo um momento muito difícil, ainda tiveram que lidar com
questões jurídicas e financeiras.
Em conseqüência do acidente, em 21/10/2007 criou-se a
AFAVITAM (Associação dos Familiares das Vítimas da TAM) com intuito de
reunir e organizar os familiares e amigos das vítimas do acidente do vôo TAM
JJ3054; lutar pela defesa de todos os direitos e interesses dos que sofreram
com a morte de seus entes queridos; exigir a apuração das causas que
levaram à queda do avião; representar e auxiliar os associados a obter todas
as informações pertinentes ao evento; sensibilizar a população e autoridades
para que se tenha mais segurança, transparência e responsabilidade no setor
aéreo, contribuindo assim para evitar outros acidentes. Vida, Verdade e justiça
é o seu slogan. (Ver Anexo 5 - revista da Afavitan).
Setenta e sete famílias, desacreditada com o governo brasileiro
e com medo da impunidade, ingressou com a ação de indenização nos
Estados Unidos contra vários réus70: TAM Linhas Aéreas, a AIRBUS S.A.S, a
GOODRICH CORPORATION e outros, através dos escritórios americanos
70 Conforme artigo 942 do Código Civil de 2002, se a ofensa tiver mais de um autor, todos respondem solidariamente
Masry & Vititoe71 e Podhurst Orseck (Ver anexo 6 – Folder do escritório Masry
& Vititoe e reportagem do escritório Podhurst Orseck). Além disso, neste país
as indenizações são mais altas e mais rápidas comparadas ao Brasil.
No decorrer das investigações, familiares tiveram que responder
a vários questionários traduzidos para o português, solicitados pela Tam,
Airbus e Goodrich Corporation (Ver anexo 7 - questionários). O intuito deles era
afastar a jurisdição americana, já que as indenizações no Brasil são menores.
Essa questão de competência ainda não foi julgada, ou seja, não se sabe ainda
se a jurisdição daquela corte vai aceitar julgar esse caso.
Depois de vários meses com a ação nos Estados Unidos, a
TAM ofereceu acordo a essas famílias com a intenção de sair do pólo passivo
da ação nos Estados Unidos. A grande maioria aceitou. Dessa forma a ação
continua contra os outros réus.
Outras famílias fizeram acordo direto com a Companhia aérea
acompanhadas por uma câmara de indenização formada pelo Ministério
Público do Estado de São Paulo, Defensoria Pública do Estado de São Paulo,
Fundação Procon/SP e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor
da Secretaria de Direito Econômico, pela TAM Linhas Aéreas S/A e suas
seguradoras. Essa câmara tem a finalidade de ”promover o cumprimento do
direito à efetiva reparação pelos danos causados em decorrência do acidente
com o Vôo 3054, ocorrido no dia 17 de julho de 2007”72.
Diante das dificuldades financeiras, os familiares conseguiram
um termo de compromisso com a TAM, recebendo dela assistência médica e
psicológica por dois anos, até outubro de 2009. Termo esse enviado à Câmara
dos Deputados, na forma de projeto de lei, com o objetivo de que o mesmo
sirva de base para amparar outras famílias na mesma situação, caso novos
acidentes ocorram.
71 Escritório de advocacia Marsry & Vititoe, conhecido pelo tema do filme Erin Brockovich por ganhar a maior indenização dos Estados Unidos.
72 Câmara de Indenização do Vôo 3054. Disponível em <http://www.camaradeindenizacao3054.com.br/index.php> Acesso em 18 de novembro
de 2008.
Os familiares das vítimas do acidente foram obrigados a esperar
das 18 horas e 45 minutos, horário em que ocorreu o acidente, até a 1 hora e
44 minutos do dia 18 de julho de 2007 para serem informados pelo fornecedor
se seus entes queridos haviam ou não, embarcado na aeronave acidentada,
sendo que os primeiros familiares desesperados chegaram ao Aeroporto
Internacional Salgado Filho às 19 horas e 45 minutos.
Conforme artigos o Código de Defesa de Consumidor, a TAM
feriu alguns de seus artigos:
Art. 6º. São direitos básicos do consumidor, dentre outros:
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
X – a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. Art. 7º. Os direitos previstos neste Código não excluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como, dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade.
Feriu também dispositivo da Instrução de Aviação Civil 200-
100173:
3.1.5 – Após a Empresa Aérea tomar conhecimento de um acidente aeronáutico, envolvendo uma de suas aeronaves, deverá confeccionar a lista reconciliada dos passageiros e tripulantes a bordo da aeronave acidentada, no prazo de três horas, para seu próprio uso e para a autoridade aeronáutica, caso esta a solicite.
Por esse motivo, foi multada em (1ª instância) em quase um
milhão de reais pelo Procon do Rio Grande do Sul74.
Outra conquista da associação será a construção de dois
memoriais às vitimas. Um em São Paulo no local onde aconteceu o acidente e
outro em Porto Alegre, o Memorial Largo da Vida. A Tam doou o prédio onde
existia a Tam Express em São Paulo e a prefeitura esta cuidando de
73 BRASIL. Ministério da Defesa. Anac. Instrução de Aviação Civil. Disponível em http://www.anac.gov.br/biblioteca/iac/IAC3134.pdf> Acesso em
10/01/2009.
74 Procon multa TAM por falta de informação em cerca de R$ 1 milhão. São Paulo: 01/10/2007. Disponível em:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u332905.shtml> Acesso em 05/05/2009.
desapropriar os terrenos que ficam ao lado75. O projeto também foi doado pelo
arquiteto Ruy Ohtake.
A associação tem realizado também: reuniões com diversas
autoridades no Rio Grande do Sul, São Paulo e Brasília, dentre eles o
governador do Estado de São Paulo, José Serra, a governadora do Estado do
Rio Grande do Sul, Yeda Crusius, o Ministro da Defesa, Nelson Jobim, Dr.
Marcelo Guaranys da Anac; caminhadas pela vida, verdade e justiça; eventos
Religiosos, ecumênicos e culturais pela valorização da vida; campanha
“segurança é a nossa praia”, por mais segurança nos transportes; plantio de
199 árvores no Largo da VIDA e nas avenidas próximas ao aeroporto,
manifestações em aeroportos para alertar a população e sensibilizar as
companhias e órgãos públicos para que isso não volte a acontecer e
atualização do seguro obrigatório RETA em conjunto com as Associações de
acidentes anteriores.
CONCLUSÃO
O Brasil é um país maravilhoso, rico na extensão, na alegria de
viver de seu povo, na maneira pacífica como resolve seus conflitos. No entanto,
também foi contagiado pelo vírus que faz com que as pessoas olhem o que o
outro tem e não quem ele é. Vírus esse que faz com que as empresas só
pensem em lucrar, esquecendo de suas obrigações e os governos administrem
em proveito próprio, deixando de lado a moralidade pública e o respeito com as
pessoas.
No dia 17/07/2007, os brasileiros acompanharam a grande
conseqüência desse descaso com o ser humano, com os clientes e com a
própria vida. A aeronave da TAM, o Airbus A320, vôo JJ 3054, que partiu de
Porto Alegre, às 17h16, com destino ao aeroporto de Congonhas (SP), não
75 Posto e casas serão desapropriados para memorial do vôo 3054. São Paulo: 06/08/2007. http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL83690-
5605,00.html
conseguiu parar na pista após o pouso e se chocou contra o prédio da TAM,
que ficava do outro lado da Avenida Washington Luís.
O avião explodiu e quase 200 (duzentas) pessoas morreram,
sendo que 187 (cento e oitenta e sete) eram passageiros e 12 (doze)
funcionários da TAM. Famílias sofreram com perdas inestimáveis, outras foram
extintas por completo. Vários foram os fatores que contribuíram para esse
acidente.
Além de a Infraero não ter interditado a pista, não cumpriu a
recomendação que proibia o pouso ou decolagem de aeronaves com reverso
inoperante em Congonhas, em dias de chuva.
A Tam participou da reunião em que proibia o pouso de
aeronaves com apenas um reverso funcionando. Vários pilotos tentaram alertar
do perigo dizendo que a pista estava um “sabonete”, no entanto, a Tam não
tomou as devidas precauções e pensou apenas no lucro.
A Airbus, mesmo tendo ciência de pelo menos quatro acidentes
ocasionados pelo fato de somente um reverso estar funcionando, limitou-se a
considerar como desejável e não obrigatória à instalação de um alarme de
alerta aos pilotos quando isso acontecesse.
Assim, há que se concluir que a aeronave não parou e
ultrapassou os limites da pista por conta do posicionamento irregular das
manetes de empuxo, enquanto a da esquerda determinava que a aeronave
freasse (estava na posição reverso máximo) a da direita (que não funcionava)
determinava que a aeronave acelerasse.
Embora alguns profissionais aleguem ter havido falha humana
dos pilotos, não é a posição da maioria e também das investigações, já que
ambos tinham boas qualificações profissionais e várias horas de vôos.
Numa das reuniões realizadas em São Paulo com os familiares
das vítimas, o delegado-titular do 15º Distrito Policial, Antonio Carlos Menezes
Barbosa, que preside as investigações, afirmou não acreditar em falha humana
como fator principal do acidente, pois como pôde ser analisado na transcrição
da caixa preta, um dos spoilers (freio) não funcionou (ver pg. 35).
Diante de tantas vidas perdidas, resta aos familiares buscar o
direito para que se faça justiça. Isso se faz através do instituto jurídico da
responsabilidade civil que procura reparar o dano causado através de
indenizações materiais e morais. Nas indenizações materiais calcula-se o valor
monetário afetado e para ressarcir o dano. No entanto, nas indenizações
morais, impossível calcular o dano e compensar a falta de um ente querido.
Essa é a grande dificuldade: como calcular o valor de uma vida?
Para estipular esse valor, os magistrados têm levado em conta
o tempo médio de vida que a vítima ainda teria (65 anos), quem ela era na
esfera profissional e social. Deixou filhos? Era um empresário importante? Era
apenas um bebê? Um eletricista? Quem era a vítima?76. Assim, se determinado
empresário ganhava mais enquanto vivo, seus familiares ganharão uma
indenização maior em detrimento daquele que ganhava menos.
Dessa forma, a indenização moral será maior ou menor de
acordo com a condição financeira anterior da vítima - já que leva em
consideração o dano material - e também do agressor. Isso não está de acordo
com a dignidade da pessoa humana, pois a vida acaba tendo um preço. A vida
de um empresário vale tanto quanto a vida de uma pessoa de classe baixa,
pois o bem jurídico afetado foi o mesmo: a vida. Dano material pode e deve ser
levado em consideração o padrão de vida de cada um, mas o dano moral
jamais.
Acredita-se que a função do dano moral deve estar pautada em
punir o agressor, levando em conta apenas à situação financeira dele e não
76 Documento enviado pelos escritórios com o objetivo de conhecer cada vítima e, consequentemente, ter uma noção do dano material.
das vítimas. Na esfera criminal, a vítimas e/ou seus familiares lutam para que o
réu tenha a maior pena possível para que se tenha um sentimento de justiça,
assim também acontece na esfera civil, no caso das indenizações morais.
Quanto maior for a indenização no caso de acidentes aéreos, maior será a
punição daqueles que agiram com culpa, inibindo assim incidência de novos
acidentes e protegendo a sociedade.
A doutrina fala em indenizações não tão baixas que os culpados
fiquem impunes, mas não tão altas que causem enriquecimento ilícito ou
enriquecimento sem causa. Ilícito? Ilícito foi o que fizeram com as pessoas que
entraram naquele avião e, consequentemente, com suas famílias. Ilícito é
desviar verbas de uma escola pública ou de um hospital. Ilícito é roubar
dinheiro público. Enriquecimento sem causa? Um filho ou uma mãe dariam
todo o dinheiro do mundo para ter seus familiares de volta. Houve sim uma
causa e muito grave. O que se busca é punição e não enriquecimento.
Se indenizações morais, no caso de morte em acidentes
aéreos, forem vistas apenas como forma de punir os agentes causadores do
dano - já que os danos são impossíveis de serem ressarcíveis ou
compensáveis - e, se esses valores tiverem certos parâmetros, dependendo de
cada caso, acredita-se que não haveria tanta disparidade e,
conseqüentemente, injustiças.
Como por exemplo, quem foi a empresa causadora do dano?
Existem reclamações judiciais contra ela? Quais tipos de reclamações?
Geralmente é culpada pelos danos? Ela tinha condições de evitar o dano?
Como? Sem a ação dela ou omissão, o dano teria ocorrido mesmo assim? O
que fez ou tem feito para resolver o problema? Qual sua situação financeira?
Qual o arrecadamento bruto e líquido anual? Dependendo dessas respostas a
empresa seria punida com um valor maior ou menor.
As empresas de aviação e suas segurados têm alta capacidade
financeira e, num mundo capitalista como esse, somente uma quantia alta será
passível de punição, assim como se faz com o meio ambiente. Os tribunais
brasileiros fixam altas quantias no caso de danos ambientais, no entanto,
alguns são mais amenos quando tratam da vida. Ambos devem ser protegidos
dando ao ofensor a punição que merece de acordo com o dano e sua
irresponsabilidade.
Assim, o objetivo do presente trabalho é contribuir para que a
ferramenta jurídica da responsabilidade civil se torne mais efetiva e justa. Não
se espera, contudo, encontrar a solução definitiva para o problema, mas que
reflexões sejam feitas e que os meios de transportes passem a ser mais
seguros, beneficiando toda a sociedade.
Respondendo às perguntas feita pelo Ministério Público Federal
na Ação Civil Pública (página 32 deste trabalho) que ingressou contra a
Infraero e Anac, antes do acidente acontecer (“Quantas vidas mais serão
colocadas em risco para que medidas efetivas e satisfatórias sejam tomadas?
Quantos incidentes ainda terão que ocorrer para que as autoridades se
conscientizem dos valores constitucionais máximos, dentre eles o direito à vida
e à integridade física?”): por enquanto, 199 (cento e noventa e nove) vidas
precisaram ser tiradas para que houvesse mudança (Ver anexo 8: Reportagem
sobre as vítimas).
As ferramentas jurídicas precisam ter força coercitiva para que
novos acidentes não aconteçam e para que os meios de transportes fiquem
mais seguros trazendo tranqüilidade à sociedade. Não é apenas lucrar, mas
realmente se preocupar com os passageiros.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988. Artigo 5º. __________ Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 1988. Artigo 37. BRASIL. Lei nº. 8.078 de 11/ 11/1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 12. __________ Lei nº. 8.078 de 11/ 11/1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 3. __________ Lei nº. 8.078 de 11/ 11/1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 2. __________ Lei nº. 8.078 de 11/ 11/1990. Código de Defesa do Consumidor. Brasília, DF. 1990. Artigo 6. BRASIL. Decreto Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 944. __________ Decreto Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 159. __________ Decreto Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 402. __________ Decreto Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, Brasília, DF, 2002. Artigo 20. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula 37 do Superior Tribunal Federal. Brasília, 12 de março de 1992. BAPTISTA, Silvio Neves. Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 21. BAPTISTA, Silvio Neves. Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 128. ___________ Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 22 ___________ Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 24
___________ Teoria geral do dano. De acordo com o novo código civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2003. p. 86. BENASSE, Paulo Roberto. A personalidade, os danos morais e sua liquidação de forma múltipla. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Pg. 15. ____________ A personalidade, os danos morais e sua liquidação de forma múltipla. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Pg. 106. BRAGA NETO, Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 128. ____________Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 105. ____________Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 199. ____________Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 203. ____________Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 11. ____________ Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 29. ____________ Felipe P.. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 32. CASTRO FILHO. Responsabilidade Civil. Dano Moral. Critérios para a fixação do valor. Ministro Castro Filho. RECURSO ESPECIAL n.º55.392 – RJ. Disponível em: http://www.parana-online.com.br/colunistas/69/983/ Acesso em 05/05/2009. CAVALCANTI, André Uchoa. Responsabilidade civil do transportador aéreo. Tratados internacionais, leis especiais e código de defesa do consumidor. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.p. 32. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008.p. 2. ____________Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 19. ____________ Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 127 e .128. ____________Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 105.
____________Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 16. ____________Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 14. ___________ Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 13. ___________Programa de responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 70. CREMONEZE, Paulo Henrique. A introdução da doutrina norte-americana do "punitive damage" no sistema jurídico brasileiro para a avaliação das indenizações por danos morais. Jus Navegandi, 2001.Disponível em: < http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3467> Acesso em 28 de março de 2009. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 7º volume. 20ª edição. São Paulo: Saraiva, 2006. p.39. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21 ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 61. GALIANO, Pablo Stolze. Novo curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 200.. p. 15. HOBBES, Thomas. Leviatã , Nova Cultural, São Paulo, 1974, Cap. XXVI, "Das leis civis", p. 165. KHOURI, Paulo R. Roque A. Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 55. ____________ Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 45. ____________ Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 144. ____________ Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 145. ____________ Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 147. ____________ Direito do consumidor. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 148. LÔBO, Paulo Luiz Neto, Responsabilidade por vício do produto ou do serviço. Brasília: Brasília Jurídica, 1996. p. 52. MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana, Rio de Janeiro: Renovar, 2003: p. 38.
Número de acidentes aéreos foi maior em 14 anos. 45graus. Piauí. 19 de janeiro de 2009. Disponível em http://www.45graus.com.br/geral/33927/numero_de_acidentes_aereos_foi_maior_em_14_anos.html> Acesso em 20 de março de 2009. RIBEIRO, Antonio de Pádua. Indenização por danos morais. Ministro do Superior de Justiça, a partir da Constituição de 1988. Palestra proferida na escola de magistratura do Pará, em 25/05/2001 – Belém _ PA. Disponível em http://bdjur.stj.gov.br/jspui/bitstream/2011/282/4/Indeniza%C3%A7%C3%A3o_por_Danos_Morais.pdf> Acesso em 06/05/2009. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil – 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p. 1709. VENOSA, Silvio de Salvo. Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 10. ______________ Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 191. ______________ Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 1. ______________ Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 287. ______________ Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 297. ______________ Responsabilidade civil. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 302.
Top Related