Recurso Eleitoral Nº 1323-32.2012.6.09.011
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TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DE GOIÁS
RECURSO ELEITORAL 1323-32.2012.6.09.0011 – CLASSE 30 – PROTOCOLO N. 168.881/2012 – CABECEIRAS-GO (11a ZONA ELEITORAL – FORMOSA-GO) RELATOR: JUIZ LEÃO APARECIDO ALVES RECORRENTE: NADIR JOSÉ DE PAIVA ADVOGADO: LEONARDO DE OLIVEIRA PEREIRA BATISTA – OAB: 23188/GO RECORRENTE: JOAQUIM MACHADO SOBRINHO ADVOGADO: LEONARDO DE OLIVEIRA PEREIRA BATISTA – OAB: 23188/GO RECORRENTE: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL LIBERAL DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRENTE: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA CRISTÃO DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRENTE: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRENTE: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRIDO: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL LIBERAL DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRIDO: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA CRISTÃO DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRIDO: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRIDO: DIRETÓRIO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS DE CABECEIRAS ADVOGADO: BARNABÉ ARTUR DA SILVA JUNIOR – OAB: 36208/GO RECORRIDO: NADIR JOSÉ DE PAIVA ADVOGADO: LEONARDO DE OLIVEIRA PEREIRA BATISTA – OAB: 23188/GO RECORRIDO: JOAQUIM MACHADO SOBRINHO ADVOGADO: LEONARDO DE OLIVEIRA PEREIRA BATISTA – OAB: 23188/GO
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CONFIRMAÇÃO DE VOTO
I
Como registrado no Relatório, trata-se de Recursos
Eleitorais interpostos por NADIR JOSÉ DE PAIVA e JOAQUIM MACHADO
SOBRINHO (1ºs Recorrentes) e pelos DIRETÓRIOS MUNICIPAIS DO PARTIDO
SOCIAL LIBERAL (PSL) DE CABECEIRAS, DIRETÓRIO MUNICIPAL DO
PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA CRISTÃO (PSDC) DE CABECEIRAS,
DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT)
DE CABECEIRAS e o DIRETÓRIO MUNICIPAL DO DEMOCRATAS (DEM) DE
CABECEIRAS (2ºs Recorrentes) com a finalidade de reformar a sentença (Fls.
6.270-6.283 e 6.357-6.360) prolatada pelo Juízo da 11ª Zona Eleitoral de
Formosa, GO. O Juízo Singular julgou parcialmente procedente o pedido
formulado na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) ajuizada pelos 2ºs
Recorrentes, reconhecendo a prática de captação ilícita de sufrágio na
distribuição indiscriminada de 1.027 litros de combustível na véspera e no dia da
eleição. Em consequência, o Juízo Singular decretou a cassação dos diplomas
dos 1ºs Recorrentes; condenou os 1ºs Recorrentes ao pagamento de multa no
valor de 50.000 (cinquenta mil) UFIRs, pela prática do ilícito previsto no art. 41-A
da Lei 9.504/1997 (Lei Eleitoral ou Lei das Eleições); e declarou a inelegibilidade
dos 1ºs Recorrentes pelo prazo de 8 (oito) anos, nos termos do art. 22, inciso XIV,
da Lei Complementar 64/1990 (LC 64/1990).
II
Na sessão de 12 de novembro de 2013, proferi voto no
sentido do provimento parcial do recurso dos 2ºs Recorrentes, e negando
provimento ao recurso interposto pelos 1ºs Recorrentes. Em seguida, pediu vista
dos autos o eminente Desembargador WALTER CARLOS LEMES. Na sessão de
21 de novembro de 2013, o Desembargador WALTER CARLOS acompanhou,
integralmente, o voto deste Relator. Depois, pediu vista dos autos o eminente Juiz
MARCELO ARANTES DE MELO BORGES.
Na sessão de 27 de novembro de 2013, o Juiz MARCELO
ARANTES, de ofício, não conheceu do recurso dos 2ºs Recorrentes no ponto
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relativo à imputação de nomeação ilegal de servidores durante o período eleitoral;
afastou a conduta vedada na doação de cestas básicas e a captação ilícita de
sufrágio na distribuição de combustível.
Passo ao exame dos fundamentos do douto voto divergente.
III
A
Os princípios constitucionais relativos ao devido processo
legal (Constituição, artigo 5º, inciso LIV) e ao contraditório e à ampla defesa
(Constituição, artigo 5º, inciso LV) são exercidos e observados nos termos da lei
processual. (STF, MS 23739/DF, Rel. Min. MOREIRA ALVES, Tribunal Pleno,
julgado em 27/03/2003, DJ 13-06-2003 P. 10; MS 25483/DF, Rel. Min. CARLOS
BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 04/06/2007, DJe-101 14-09-2007 DJ 14-09-
2007 P. 32.)
Na petição inicial, os Representantes (2ºs Recorrentes)
requereram, expressamente, a requisição à Prefeitura de Cabeceiras, dos
relatórios das contratações de servidores no período de 3 meses anteriores ao
pleito eleitoral. (Fls. 59-60.)
No entanto, o Juízo Singular somente deferiu esse pedido
depois da audiência de instrução. (Fl. 1.135, Vol. 5.) Assim, em 25 de janeiro de
2013 (Fls. 1.156-1.157, Vol. 5), o Juízo Eleitoral determinou ao Representado
NADIR DE PAIVA, na condição de Prefeito do Município de Cabeceiras, que
encaminhasse ao Juízo os documentos requeridos pelos Representantes na
petição inicial. (Fls. 59-60, Vol. 1.) No ofício respectivo (Fls. 1.158-1.159, Vol. 5)
constou a requisição dos relatórios de contratações de servidores no período
vedado. Em seguida, o Representado NADIR DE PAIVA encaminhou ao Juízo
Eleitoral a documentação solicitada, perfazendo quase 5.000 páginas, distribuídas
em 25 volumes. (Fls. 1.162-6.021; Vol. 6-30.) Nessa pletora de documentos
constam as provas da contratação de servidores durante o período vedado. (Fls.
3.371-3.376, Vol. 17.) Considerando que os servidores foram nomeados pelo
Representado NADIR DE PAIVA, a alegação de desconhecimento dessa
documentação é, no mínimo, “insubsistente e despropositada”. (STF, HC 102930,
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Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 28/09/2010, DJe-097 24-
05-2011.) Além disso, depois da juntada dessa documentação, bem como de
outros documentos, por determinação judicial, as partes foram intimadas para a
apresentação de suas alegações finais. Os Representados foram intimados em 2
de abril de 2013 para a apresentação das suas alegações finais. (Fl. 6.190, Vol.
30.) Em seguida, os Representados promoveram a juntada aos autos de suas
alegações finais. (Fls. 6.192-6.253, Vol. 31.) Dessa forma, os documentos
relativos à nomeação de servidores, no período vedado, já se encontravam nos
autos quando os Representados produziram suas alegações finais. Tendo em
vista que os Representados se manifestaram nos autos, depois da juntada dos
documentos em causa, inexiste ofensa ao artigo 398 do CPC. Por esses
motivos, rejeito a alegação de que os Representados (1ºs Recorrentes) tiveram
negada, pelo Juízo Singular, a oportunidade processual de se manifestarem sobre
essa documentação.
De outra parte, as alegações finais dos Representantes (2ºs
Recorrentes) foram juntadas no Volume 30 (Fls. 6.116-6.189), e, nelas, os
Representantes invocaram, expressamente, como fundamento da procedência do
pedido, a ilegalidade na nomeação de servidores no período eleitoral. Por sua
vez, as alegações finais formuladas pelos Representados (1ºs Recorrentes)
constam do Volume 31 (Fls. 6.192-6.253), enquanto que as provas da contratação
de servidores no período vedado estão juntadas no Volume 17. Porém, os 1ºs
Recorrentes, nas suas alegações finais, se abstiveram de suscitar qualquer
defeito na formulação da causa de pedir relativa à nomeação de servidores no
período eleitoral, bem como, consciente ou inconscientemente, se omitiram sobre
qualquer manifestação a respeito dessa questão.
No recurso dirigido a esta Corte, os 2ºs Recorrentes
(Representantes) sustentaram, dentre outras questões, nas suas razões
recursais, a contratação ilegal de servidores para o preenchimento de cargos
comissionados no período eleitoral. (Fls. 6.403-6.489, Vol. 32.) No entanto, nas
suas contrarrazões (Fls. 6.519-6.561, Vol. 32), os 1ºs Recorrentes, mais uma vez,
ignoraram, completamente, essa questão. Ou seja, os 1ºs Recorrentes,
consciente, ou inconscientemente, passaram ao largo da suposta inovação
recursal no que se refere à nomeação de servidores comissionados. Em suma,
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nas contestações; nas alegações finais e nas contrarrazões, os 1ºs Recorrentes
deixaram de suscitar a suposta inexistência de causa de pedir válida relativa à
nomeação de eleitores para exercer cargo comissionado no período eleitoral. É
inegável que os Representados poderiam, pelo menos nas alegações finais e nas
contrarrazões recursais, ter suscitado a suposta ausência de causa de pedir a
implicar a impossibilidade de análise da questão relativa à nomeação ilegal dos
servidores comissionados.
Como sustentei no voto proferido na sessão de 12 de
novembro de 2013, o que os 1ºs Recorrentes suscitaram, a título de julgamento
extra petita, cingiu-se no seguinte:
Em toda sua narrativa fática e de mérito na incoativa, os Recorridos [2ºs Recorrentes] a todo instante fundamentam que a distribuição de combustível caracteriza captação ilícita de sufrágio (art. 41-A, da Lei nº 9.504/97).
Com efeito, fixou os limites e a causa de pedir.
Entretanto, o i. juízo a quo, ao proferir a r. sentença vergastada, quanto ao fato supramencionado, condenou os Recorrentes por captação ilícita de sufrágio bem como abuso de poder econômico, sem sequer esta tipificação ter sido alegada ou aduzida pelos Recorridos na peça de começo.
(Fl. 6.290, Vol. 31. Grifo original.) Essa preliminar foi expressamente examinada e
rechaçada no voto que proferi na sessão de 12 de novembro de 2013, bem como
foi rejeitada, tanto pelo Desembargador WALTER LEMES, quanto pelo Juiz
MARCELO ARANTES.
No 1º Memorial, datado de 12 de novembro de 2013, o Dr.
Leonardo Batista, advogado dos Representados (1ºs Recorrentes), igualmente,
quedou inerte quanto à alegação de inovação recursal, sob o fundamento de
ausência de descrição da imputação relativa à nomeação de servidores
comissionados. (CPC, artigos 2º, 128 e 460.)
Essa suposta inovação recursal somente foi suscitada pelo
Dr. Leonardo Batista no 2º Memorial, datado de 14 de novembro de 2013, o qual
não foi entregue em nosso gabinete, nem deixado, como sói acontecer, em
nossa bancada neste Plenário. Diante da questão preliminar suscitada pelo
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eminente colega MARCELO ARANTES, na sessão de 27 de novembro de 2013, a
diligente assessoria procurou e obteve cópia do 2º Memorial, a qual foi
gentilmente cedida pelos servidores do gabinete da eminente Juíza DORACI
LAMAR ROSA DA SILVA ANDRADE.
Nos termos do artigo 29, inciso II, do Código Eleitoral,
“Compete aos Tribunais Regionais: [...] II - julgar os recursos interpostos: a) dos
atos e das decisões proferidas pelos juízes e juntas eleitorais. b) das decisões
dos juízes eleitorais que concederem ou denegarem habeas corpus ou mandado
de segurança.” Portanto, os Tribunais Eleitorais estão limitados ao que foi
decidido pelos juízes e juntas eleitorais. Assim, os tribunais de apelação, como é
o caso dos Tribunais Regionais Eleitorais, estão limitados, no exame dos recursos
das decisões e das sentenças dos Juízos Singulares, pelo conhecido princípio
tantum devolutum quantum apellatum. Os tribunais de apelação estão jungidos à
análise das questões suscitadas nos recursos e nas contrarrazões recursais,
segundo o que foi decidido pelo Juízo Singular. Ao examinar os recursos
interpostos das decisões dos Juízos Singulares, os tribunais de apelação estão
desobrigados, em geral, de descer ao exame detalhado da petição inicial para
verificar a existência dessa ou daquela determinada causa de pedir, contida nas
razões recursais.Nessa altura do trâmite procedimental, os tribunais de apelação
assumem que a lide já se encontra devidamente estabilizada nas pretensões
recursais. Quando a causa chega ao tribunal revisor, em grau de recurso,
partimos do pressuposto de que as questões relativas à conformidade da
sentença com o pedido e a causa de pedir já estejam devidamente solucionadas,
ou, então, que matéria dessa importância já tenha sido suscitada e decidida.
Neste caso, porém, os Representados permaneceram inertes em três
oportunidades processuais de capital importância para a determinação da res in
iuditio deducta. Nas contestações (Fls. 587-630 [NADIR] e 936-979 [JOAQUIM]), os
Representados tiveram a primeira oportunidade de sustentar, quanto à situação
dos servidores comissionados, a eventual inépcia da petição inicial, por ausência
de causa de pedir. CPC, artigos 295, inciso I, parágrafo único, inciso I; e 301,
inciso III. Depois das alegações finais apresentadas pelos Representantes,
novamente com a expressa menção à situação dos servidores comissionados, os
Representados tiveram nova oportunidade de suscitar a eventual inépcia da
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petição inicial. Nas contrarrazões ao recurso interposto pelos Representantes, os
Representados tiveram outra oportunidade de suscitar a inépcia da petição inicial.
Finalmente, na sustentação oral apresentada em 12 de novembro de 2013.
Na espécie, e, considerando, de um lado, que o Juízo
Singular, expressamente, rejeitou os embargos de declaração opostos pelos 2ºs
Recorrentes (Representantes), no ponto em que alegaram omissão quanto à
análise do pedido relativo à nomeação ilegal de servidores comissionados, sob o
fundamento de que a questão havia sido examinada (Vol. 31, Fl. 6.359); e, de
outra parte, que os 1ºs Recorrentes, nas contrarrazões respectivas, omitiram a
alegação de inovação recursal, inexistia motivo para, de ofício, submeter a
petição inicial a severo escrutínio quanto ao conteúdo da causa de pedir no
tocante à nomeação de servidores comissionados.
A despeito de ser tardia, passo ao exame da suposta
ausência de descrição, na petição inicial, da causa de pedir relativa à nomeação
de servidores comissionados, suscitada pelos Representados no Memorial datado
de 14 de novembro de 2013.
Os Representados sustentam ofensa aos artigos 128 e 460
do CPC, sob o argumento, em síntese, de que “não consta na petição inicial o
fato „Nomeação de eleitores para ocupar cargos em comissão na Prefeitura
de Cabeceiras‟”. (2º Memorial, p. 26. Grifo original.) Por sua vez, o ilustre Juiz
MARCELO ARANTES entendeu, nesse particular, que “esse fato novo não foi
objeto da exordial e tampouco da sentença. Ele somente foi aventado pela
parte investigante em sede de embargos declaratórios. E, ao decidir sobre os
embargos, o juízo singular também não se pronunciou sobre esses fatos e
documentos, vide sentença de fls. 6357/6360.” (Grifo original.) Segundo S. Exa., a
análise dessa questão “acaba por provocar uma inovação em sede recursal,
configurando indevida supressão de instância e violação ao artigo 264 do
Código de Processo Civil.” (Grifo original.)
No presente caso, os Representantes atenderam à
necessidade da delimitação precisa do pedido, na medida em que requereram,
expressamente, a adoção das providências dos incisos XIV e XV do artigo 22 da
LC 64/1990, bem como das previstas na Resolução TSE 1451-71.2011.6.00.000.
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(Vol. 1, Fl. 60.) Na verdade, “[o] pedido é o que se pretende com a propositura da
ação e se deduz a partir de uma interpretação lógico-sistemática do que foi
estabelecido na petição inicial, levando-se em conta todos os requerimentos
anexados em seu corpo e não apenas os que constam no capítulo da
especificação dos pedidos. (Cf. STJ, RESP 284.480/RJ, Quarta Turma, Ministro
Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 02/04/2001; RESP 120.299/ES, Quarta Turma,
Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 21/09/1998; TRF1, AC
2003.01.99.019204-7/MG, Primeira Turma, Desembargador Federal Antônio
Sávio de Oliveira Chaves, DJ 14/06/2004; AC 1998.01.00.069851-1/PI, Primeira
Turma Suplementar, Juiz João Carlos Mayer Soares, DJ 03/06/2004; AMS
1999.38.00.039419-0/MG, Primeira Turma, Juiz Antônio Sávio de Oliveira
Chaves, DJ 11/03/2002.)” (TRF 1ª Região, AC 1997.01.00.014872-8/MG, Rel. Juiz
Federal JOÃO CARLOS COSTA MAYER SOARES (Conv.), Primeira Turma
Suplementar (Inativa), DJ P.110 DE 30/06/2005.) Além disso, “o pedido deve ser
extraído da interpretação lógico-sistemática da petição inicial, a partir da análise
de todo o seu conteúdo, e não apenas do pleito formulado no fecho da petição.”
(STJ, AgRg no AREsp 156.155/RS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS,
Segunda Turma, julgado em 05/06/2012, DJe 14/06/2012.)
Na petição inicial, no capítulo denominado “DO PEDIDO”, os
Representantes (2ºs Recorrentes) afirmaram que, “[e]stando em poder da
Administração da Prefeitura, requer, ab initio, o depósito, no prazo legal de 3(três)
dias [...]. Requer, destarte, as folhas de pagamentos dos servidores da
prefeitura e os recolhimentos dos encargos trabalhistas acompanhadas de
relatórios de concessão ou supressão de gratificações, demissões e
contratações, do período de 3 meses antecedentes ao pleito até a presente
data.” (Vol. 1, Fls. 59-60. Grifei.) Como se vê dessa transcrição, os
Representantes atenderam, precisamente, ao disposto no artigo 22, caput, da LC
64/1990, na medida em que indicaram na petição inicial a necessidade de
aprofundar a investigação judicial eleitoral visando à juntada aos autos da
documentação relativa à contratação de servidores nos três meses anteriores ao
pleito. No entanto, o Juízo Singular somente deferiu esse pedido depois da
realização da audiência de instrução e julgamento. (Fls. 1.156-1.157, Vol. 5.)
A requisição dos relatórios de contratações no período de
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três meses antes da eleição municipal tem relação direta com o disposto no artigo
73, inciso V, da Lei 9.504/1997, o qual foi transcrito pelos Representantes na
petição inicial. (Vol. 1, Fl. 53.) Em outras palavras, a requisição dos relatórios das
contratações no período eleitoral somente tem sua razão de ser pela necessidade
dos Representantes de comprovar a prática da conduta vedada descrita no artigo
73, inciso V, da Lei 9.504/1997. Os Representantes relataram, na petição inicial, a
prática de inúmeras irregularidades por parte dos Representados. Dentre essas
irregularidades, os Representantes, com esse requerimento, visavam à
comprovação da ocorrência de contratações de servidores no período vedado.
Essas contratações, por sua vez, abrangem tanto os servidores comissionados
quanto os contratados por prazo determinado.
Por outro lado, o fato de a referência à necessidade da
juntada da documentação relativa às contratações, no período vedado, ter sido
feita no capítulo da inicial denominado “DO PEDIDO” é irrelevante, porquanto o
“„[n]ome ou título da ação utilizado pelo autor, na inicial, não conduz nem
tampouco condiciona a atividade jurisdicional, a qual está adstrita tão-somente à
causa de pedir e ao pedido‟.” (STJ, AgRg no Ag 444.573/RJ, Rel. Min. VASCO
DELLA GIUSTINA (Desembargador Convocado do TJ/RS), Sexta Turma, julgado
em 15/09/2011, DJe 03/10/2011.)
Na espécie, o fato e o fundamento jurídico do pedido relativo
à ilegalidade na nomeação de servidores comissionados, no período eleitoral,
foram expressamente referidos na petição inicial. (Fls. 53 e 59-60.) Ora, “[a]
petição inicial não deve ser considerada inepta quando, com a narração dos fatos
contidos na exordial, seja possível a razoável compreensão, por parte do
magistrado, da causa de pedir e do pedido.” (STJ, AgRg no AREsp 207.365/SP,
Rel. Ministro SIDNEI BENETI, Terceira Turma, julgado em 21/03/2013, DJe
02/04/2013.) Além disso, “[e]ventuais falhas verificadas na invocação do
fundamento jurídico do pedido ou no enquadramento dos fatos não constituem
motivos para se declarar a inépcia da inicial.” (TRE/MG, RE nº 8589, Acórdão de
09/09/2010, Rel. MARIZA DE MELO PORTO, DJEMG 17/09/2010.) Em
conseqüência, vista em seu conjunto, a petição inicial, embora de forma lacônica,
invocou, claramente, o fato (nomeação ilegal de servidores comissionados) e o
fundamento jurídico (Lei 9.504/1997, artigo 73, inciso V) do pedido.
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Como se sabe, “[a]o receber a exordial, o juiz deve,
incontinenti, examinar seus requisitos legais. Se necessário, deve discriminar o(s)
vício(s) e determinar, desde logo, a regularização no prazo de dez dias. Só na
hipótese de o autor não sanar a(s) irregularidade(s) apontada(s) proceder-se-á à
extinção do processo sem solução do mérito (CPC, art. 284 e parágrafo único). A
contestação do réu não obsta a possibilidade de emenda, porque a correção da
inépcia relativa ao bem da vida não implica, necessariamente, a mudança do
pedido ou da causa de pedir. O réu será intimado para se pronunciar sobre a
emenda, assegurando-se, dessa forma, o contraditório e a ampla defesa. Não
haverá prejuízo ou nulidade (CPC, art. 244). Eventual inovação do pedido ou da
causa de pedir sofrerá o controle jurisdicional. Preservar-se-á, com isso, a
estabilidade da demanda.” (STJ, REsp 837.449/MG, Rel. Min. DENISE ARRUDA,
Primeira Turma, julgado em 08/08/2006, DJ 31/08/2006, p. 266.)
No presente caso, e, ao que tudo indica, o Juízo Singular
compreendeu a petição inicial como incluindo a causa de pedir relativa à
ilegalidade na nomeação de servidores comissionados, e, por isso, não
reconheceu o vício de inépcia. CPC, artigos 267, inciso I, e 295, inciso I,
parágrafo único, inciso I. Por essa razão, o Juízo Singular, ao decidir os embargos
de declaração opostos pelos Representantes (2ºs Recorrentes), afirmou “que a
matéria havia sido enfrentada nos itens I e II da sentença prolatada.” (Vol. 31, Fl.
6.359.) Para melhor esclarecimento da questão, transcrevo da sentença que
apreciou os embargos de declaração opostos pelos Representantes, as seguintes
e reveladoras passagens:
Às fls. 6.309/6.340 os representantes ofereceram EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, sob o argumento de que haveria obscuridade e omissão no decisum de fls. 6.270/6.283 quanto aos efeitos da sentença que decretou a cassação dos diplomas dos representados (obscuridade), bem como ausência de análise (omissão) acerca: a) das irregularidades das contas da Prefeitura pelo Tribunal de Contas; b) da usurpação de dotação orçamentária; c) da distribuição de gratificações e contratação de cargos comissionados.
[...]
Aduzem, os embargantes, que a sentença em referência contém omissões, posto que deixou de analisar
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as irregularidades das contas da Prefeitura pelo Tribunal de Contas do Município, a usurpação de dotação orçamentária para execução do “programa de cestas básicas” e as gratificações e cargos comissionados.
[...]
Quanto as supostas omissões em relação a usurpação de dotação orçamentária para execução do “programa de cestas básicas” e das gratificações e cargos comissionados, observo que a matéria foi enfrentada nos itens I e II da sentença prolatada.
(Fls. 6.357-6.359, Vol. 31. Grifei.)
Portanto, e, ainda que se possa sustentar que houve
equívoco por parte do Juízo Singular, S. Exa., expressamente, afirmou que a
questão relativa aos servidores comissionados “havia sido enfrentada”. (Vol. 31,
Fl. 6.359.)
No voto proferido em 12 de novembro de 2013, registrei:
Por outro lado, os 2ºs Recorrentes opuseram embargos de declaração para questionar a ausência de manifestação na sentença sobre a nomeação de diversos eleitores para cargos em comissão. (Fls. 6.309-6.340, Vol. 31.) O Juízo Singular rejeitou os embargos sob o argumento de que a questão teria sido devidamente apreciada. (Fls. 6.357-6.360, Vol. 31.) Porém, “a recusa do órgão julgador em suprir omissão apontada pela parte através da oposição pertinente de embargos declaratórios não impede que a matéria omitida seja examinada pelo STF, como decorre a contrario sensu da Súmula 356.” (STF, AI 439920 ED, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 06/12/2005, DJ 03-02-2006 P. 31.) “O que, a teor da Súmula 356, se reputa carente de prequestionamento é o ponto que, indevidamente omitido pelo acórdão, não foi objeto de embargos de declaração; mas, opostos esses, se, não obstante, se recusa o Tribunal a suprir a omissão, por entendê-la inexistente, nada mais se pode exigir da parte, permitindo-se-lhe, de logo, interpor recurso extraordinário sobre a matéria dos embargos de declaração e não sobre a recusa, no julgamento deles, de manifestação sobre ela.” (STF, RE 210638, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, julgado em 14/04/1998, DJ 19-06-1998 P. 11.) Em idêntica direção: STF, AI 648760 AgR, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 06/11/2007, DJe-152 30-11-2007, RCJ v. 21, n. 138, 2007, p.113.
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Dessa forma, é legítima a análise, por esta Corte, da questão relativa à nomeação ilegal de eleitores para ocupar cargo em comissão.
Note-se que o Juízo Singular também deixou escapar a oportunidade de
responder aos embargos de declaração com o argumento da ausência de
descrição da causa de pedir na petição inicial. Ao contrário, o Juízo Singular
afirmou, de forma inequívoca, que a questão relativa aos servidores
comissionados havia sido apreciada na sentença embargada, donde a ausência
de omissão. Tudo isso, registre-se, se passou sob os olhos dos Representados
(1ºs Recorrentes), os quais tiveram vista dos autos depois da prolação da
sentença que apreciou os embargos de declaração.
Em consonância com a fundamentação acima, afasto as
alegações de ofensa aos artigos 2º, 128, 264 e 460 do CPC e de inépcia da
petição inicial, por ausência de descrição da causa de pedir relativa à nomeação
de servidores comissionados.
B
Além disso, é necessário registrar que a Ação de
Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), como o próprio nome indica, tem natureza
jurídica diversa da das ações penais, cíveis e trabalhistas. No decorrer do
procedimento da AIJE é expressamente admitida a realização de diligências
investigatórias visando a complementar as alegações e os indícios apresentados
pelo Representante com a petição inicial. Essa natureza jurídica diversa decorre,
diretamente, dos precisos termos do artigo 22, caput, da LC 64/1990, segundo o
qual, “[q]ualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público
Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral
ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e
pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou
abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida
de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de
partido político”, obedecido o rito disciplinado nos seus incisos. (Grifei.) Além
disso, o artigo 23 da LC 64/1990 dispõe que “[o] Tribunal formará sua convicção
pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e
prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não
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indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público
de lisura eleitoral.” (Grifei.)
Assim, e, ainda que a petição inicial padecesse, quanto à
contratação ilegal de servidores, no período vedado, do vício da inépcia, cumpre
notar que “[a] causa de pedir abrange todas as hipóteses de justa causa,
notadamente as que foram demonstradas pela prova colhida na instrução,
independentemente de estarem especificadas na inicial ou na contestação.”
(TRE/RN, Petição nº 84403, Acórdão nº 143072012 de 24/07/2012, Rel. JAILSOM
LEANDRO DE SOUSA, DJE 27/07/2012, P. 2-4. Grifei.)
Na verdade, diante do princípio da especialidade1, “[o]
disposto no artigo 460 do Código de Processo Civil cede à previsão contida no
artigo 23 da Lei Complementar nº 64/1990.” (TSE, RESPE nº 104015, Acórdão de
04/12/2012, Rel. Min. MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIAS MELLO, DJE
31/05/2013, P. 46.) A transcrição das partes pertinentes do relatório e do voto do
Ministro MARCO AURÉLIO, nesse precedente, revela que a presente hipótese é
bastante similar à julgada pela Corte Superior. No relator respectivo, o Ministro
MARCO AURÉLIO registrou que os recorrentes:
Articulam com a nulidade do acórdão, por afronta aos princípios do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, do juiz natural e da segurança jurídica, pois, no voto condutor, teriam sido analisados, com apoio no artigo 23 da Lei Complementar n° 64/1990, fatos - datas de transferências de valores e movimentação financeira da conta bancária do Município – não aduzidos na peça primeira tampouco considerados na sentença. Evocam o disposto no artigo 384, § 1º e § 2º, do Código de Processo Penal, para sustentar o cerceamento de defesa, porque não tiveram a oportunidade de rebater previamente os elementos expendidos no voto-vista do Juiz Edinardo Souza.
[...]
1 NORBERTO BOBBIO (Teoria do Ordenamento Jurídico, 7ª edição, Editora UnB, Brasília, 1996, pp. 95-96) esclarece que, na solução de antinomias, “[o] terceiro critério, dito justamente da lex specialis, é aquele pelo qual, de duas normas incompatíveis, uma geral e uma especial (ou excepcional), prevalece a segunda: lex specialis derogat generali. Também aqui a razão do critério não é obscura: lei especial é aquela que anula uma lei mais geral, ou que subtrai de uma norma uma parte da sua matéria para submetê-la a uma regulamentação diferente (contrária ou contraditória)”.
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Sustentam a nulidade da sentença e do acórdão recorrido porque implicaram julgamento fora dos limites do pedido, em virtude de terem sido levadas em consideração causas de pedir não articuladas pelo autor. Esclarecem que os fatos narrados na inicial consistiram em três procedimentos licitatórios, com a argumentação de haverem influenciado no resultado da disputa eleitoral, configurando abuso do poder político e econômico. O Regional, contudo, teria atentado para outros fatos - repasses financeiros, efetuados no lapso temporal vedado, relativos ao convênio do qual decorreriam os citados procedimentos licitatórios -, prevalecendo, no julgamento por maioria, a admissão da prática de conduta proibida, da qual, por presunção, decorreria a conclusão da existência de potencialidade para interferir no resultado das eleições. Destacam trecho do voto divergente, no qual assentado que, ante a não utilização dos valores transferidos, seria impossível presumir desequilíbrio no pleito. A potencialidade, segundo aduzem, teria sido reconhecida em pronunciamento que estaria além dos limites do pleito e lastreada em contradição.
(TSE, RESPE nº 104015, supra. Notas de rodapé omitidas. Grifei.)
Essa alegação recursal, a qual, substancialmente, é idêntica
à lançada no 2º Memorial, foi rechaçada pelo Ministro MARCO AURÉLIO,
acompanhado pela unanimidade de seus pares, com a seguinte argumentação:
Do princípio da inércia da jurisdição
O Regional, aplicando o critério da especialidade, observou o disposto no artigo 460 do Código de Processo Civil como de aplicação subsidiária, considerando o previsto no artigo 23 da Lei Complementar n° 64/1990, a direcionar à possibilidade de o Tribunal, na ação de investigação judicial eleitoral, levar em conta fatos não alegados pelas partes, tudo visando a preservar o interesse público de lisura eleitoral. Mais do que isso, fez ver que a inicial conteria narração de irregularidades quanto à publicidade de licitações cuja execução financeira dependia justamente das verbas advindas do Convênio n° 31/2008 - CEINF/PMS, somando-se essa circunstância às demais veiculadas, não sendo possível, no caso, cogitar de julgamento fora do pedido. Por isso, teve como neutro o silêncio da petição inicial no tocante ao citado convênio.
Não há como vislumbrar, nessa decisão, violência a qualquer preceito de lei. Ao contrário, o que proclamado mostra-se harmônico com o disposto no artigo 23 da Lei Complementar n° 64/1990.
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(TSE, RESPE nº 104015, supra. Nota de rodapé omitida. Grifei.)
Também esta Corte, em julgamento encerrado na mesma
data na qual iniciamos a apreciação dos presentes recursos, afastou, por
unanimidade2, alegação similar de julgamento extra petita, a qual, diferentemente
da espécie, fora suscitada na sessão de julgamento. (TRE/GO, Investigação
Judicial nº 28622, Acórdão nº 14054 de 12/11/2013, Rel. AIRTON FERNANDES
DE CAMPOS, Redatora DORACI LAMAR ROSA DA SILVA ANDRADE, DJ
20/11/2013, P. 4-5.) No voto de adesão ao do Relator, Juiz AIRTON
FERNANDES DE CAMPOS, a eminente Juíza DORACI LAMAR afirmou, com
inteira propriedade:
Com a devida vênia ao douto Procurador Regional Eleitoral, embora a petição inicial e a sentença de primeiro grau não tenham observado a boa técnica, misturando, em certos momentos, o conceito de captação ilícita de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, com abuso de poder econômico do art. 22 caput, da Lei Complementar n° 64/90, não há de se falar em alteração da causa de pedir fática e, por conseguinte, em julgamento extra-petita pelo juízo da 26ª Zona Eleitoral de Pirenópolis/GO.
[...]
A meu ver, outro fator que afasta a alegação processual aduzida em plenário [julgamento extra petita] consiste na própria natureza da Ação de Investigação Judicial Eleitoral prevista no art. 22 da LC n. 64/90, a qual, conforme o próprio nome indica, visa investigar, mediante um rito amplo, a ocorrência de abuso de poder, visando garantir a normalidade e legitimidade das eleições, bens jurídicos indispensáveis ao regime democrático representativo, o que diferencia referida ação eleitoral das ações em geral, as quais, geralmente, discutem direitos disponíveis, de cunho eminentemente econômico, o que não é o caso dos autos.
(TRE/GO, Investigação Judicial nº 28622, supra. Sublinhado original. Negritei.)
Além disso, a eminente Juíza DORACI LAMAR acentuou “que os Recorrentes
participaram de toda a colheita probatória em juízo, e ainda foi-Ihes franqueada a
possibilidade de oferta de alegações finais”. (TRE/GO, Investigação Judicial nº
28622, supra.) Também no presente caso, como acima registrado, os
2 A Juíza DORACI LAMAR se tornou Redatora do Acórdão diante do término do mandato do Relator, Juiz AIRTON FERNANDES.
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Representados tiveram a oportunidade de contraditar a documentação, juntada
pelo próprio Representado NADIR DE PAIVA, por ocasião de suas alegações
finais, bem como por ocasião de suas contrarrazões recursais.
Por outro lado, o precedente do TSE, invocado pelos
Representados no 2º Memorial (AgRg em RESPE nº 159389, Acórdão de
02/10/2012, Rel. Min. GILSON LANGARO DIPP, Rel. designado Min. ARNALDO
VERSIANI LEITE SOARES, DJE 07/11/2012, P. 71-72), foi prolatado no âmbito
de Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME), e, não, em ação de
investigação judicial eleitoral.
Consequentemente, eventual deficiência da petição inicial, na
descrição da imputação relativa à contratação de servidores no período eleitoral,
objeto de pedido expresso de produção de provas, pode ser suprida pelo julgador,
nos termos do artigo 23 da LC 64/1990, sem qualquer ofensa ao disposto nos
artigos 2º, 128, 264 e 460 do CPC.
C
De outra parte, “[e]m face da limitação imposta pelo princípio
tantum devolutum quantum appellatum, fica o Tribunal adstrito ao conhecimento
das matérias efetivamente deduzidas na primeira instância, não se afigurando
possível a inovação do pedido e causa de pedir na fase recursal. Assim, não
merecem ser conhecidas as alegações de nulidade do título, por não constar o
valor originário do débito; de discordância quanto ao laudo apresentado pela
exequente; e de ausência de responsabilidade do atual presidente da empresa
apelante, porquanto somente ventiladas em sede de apelação.” (TRF 1ª Região,
AC 4455.20.00.401430-0/TO, Rel. Desembargador Federal SOUZA PRUDENTE,
Oitava Turma, e-DJF1 p.837 de 10/09/2010. Grifei.)
Na espécie, e, como acima demonstrado, a questão relativa
aos servidores contratados no período eleitoral foi objeto de pedido expresso de
provas na petição inicial; a documentação comprobatória das nomeações foi
juntada aos autos pelo Representado NADIR DE PAIVA; a questão relativa aos
servidores comissionados foi expressamente tratada nas alegações finais dos
Representantes (1ºs Recorrentes) e foi agitada na sentença que apreciou os
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embargos de declaração. Portanto, está equivocada a argumentação de que essa
questão teria sido suscitada, originariamente, nas razões recursais dos
Representantes (2ºs Recorrentes). Dessa forma, inexiste inovação recursal, dado
que, nos termos do artigo 515, caput, do CPC, “[a] apelação devolverá ao tribunal
o conhecimento da matéria impugnada.” O fato de a sentença não haver
examinado, por inteiro, a questão relativa aos servidores comissionados é
insuficiente para afastar a jurisdição do tribunal revisor. O § 1º do artigo 515 do
CPC é expresso ao determinar que, “[s]erão, porém, objeto de apreciação e
julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo,
ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.” Assim, rejeito a alegação
de inovação recursal na pretensão dos Representantes.
Em suma, é lícito concluir que:
A) a questão relativa à nomeação de servidores
comissionados nos três meses anteriores ao pleito foi expressamente indicada na
petição inicial, com pedido expresso de requisição dos documentos respectivos;
B) a documentação relativa aos servidores nomeados sem
concurso nos três meses anteriores ao pleito foi juntada aos autos pelo
Representado NADIR DE PAIVA;
C) nas suas alegações finais, os Representantes (2ºs
Recorrentes) requereram, expressamente, o reconhecimento de ilicitude eleitoral
na nomeação de servidores nos três meses anteriores ao pleito;
D) os Representados (1ºs Recorrentes), em suas alegações
finais, omitiram qualquer consideração sobre os servidores nomeados em pleno
período eleitoral;
E) na sentença que examinou os embargos de declaração
opostos pelos Representantes (2ºs Recorrentes), o Juízo Singular,
expressamente, afirmou que a questão relativa aos servidores comissionados
havia sido examinada na sentença originária, rejeitando, por isso, a alegação de
omissão suscitada pelos Representantes;
F) nas suas razões recursais, os Representantes,
expressamente, requereram o reconhecimento da prática de conduta vedada na
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contratação de servidores no período eleitoral;
G) nas suas contrarrazões, os Representados (1ºs
Recorrentes), novamente, omitiram qualquer manifestação sobre a questão
relativa aos servidores contratados no período vedado.
Finalmente, e, ainda que a petição inicial padecesse, no
ponto em causa (servidores comissionados), do defeito da inépcia, teria ela sido
superada pelo reiterado exame da questão nas alegações finais dos
Representantes (1ºs Recorrentes); nos embargos de declaração opostos pelos
Representantes à sentença originária; na sentença integrativa e nas razões do
recurso interposto pelos Representantes. Nesse sentido, em processo criminal, o
STJ decidiu, quanto à alegação tardia de inépcia da denúncia, nos seguintes
termos: “No caso dos autos, constata-se que as supostas máculas contidas na
exordial acusatória só foram levantadas pela defesa nesta instância superior, por
ocasião da impetração do presente writ, não tendo sido suscitadas em
momento algum durante o curso da ação penal, o que revela a preclusão do
exame do tema.” (STJ, HC 146.289/AM, Rel. Ministro JORGE MUSSI, Quinta
Turma, julgado em 16/08/2011, DJe 01/09/2011. Grifei.) Se assim o é no processo
criminal, no qual está em jogo a liberdade do cidadão, com tanto mais razão o
deve ser no processo eleitoral. Assim sendo, a alegação de inépcia da petição
inicial, por suposta ausência de causa de pedir, ficou superada por não ter sido
suscitada na primeira instância ou nas contrarrazões perante esta Corte, mas,
somente, repita-se, no 2º Memorial apresentado pelos 1ºs Recorrentes, em 14 de
novembro de 2013, depois do voto do relator, proferido em 12 de novembro de
2013. Nesse sentido, ainda, decidiu o STJ: “O tema referente à inépcia da petição
inicial só foi trazido aos autos quando da interposição dos Embargos de
Declaração, traduzindo-se em verdadeira inovação de tese estranha à lide.”
(STJ, REsp 1255034/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Primeira
Turma, julgado em 08/10/2013, DJe 05/11/2013. Grifei.) Por essa razão, a
alegação de inépcia da petição inicial não pode ser suscitada per saltum, e,
especialmente, depois de proferida a sentença. (STJ, AgRg no AREsp
199.276/MS, Rel. Min. SIDNEI BENETI, Terceira Turma, julgado em 28/08/2012,
DJe 17/09/2012.) Decorre daí que, “[n]ão merece provimento o especial no que
toca à alegada infringência ao artigo 535, inciso II, da Lei Processual Civil, seja
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porque arrimaram-se os declaratórios na inépcia da inicial, matéria que não
tinha sido objeto do apelo interposto - cuidando, pois, de indevida inovação
-, seja quanto à alegada omissão, porquanto sobre a matéria manifestou-se o
Tribunal”. (STJ, REsp 743.226/AM, Rel. Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, Quarta
Turma, julgado em 12/09/2006, DJ 30/10/2006, p. 313. Grifei.)
Desse entendimento não destoa a jurisprudência dos
Tribunais Eleitorais. “ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL E FALTA DE
REGULARIDADE NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL DA COLIGAÇÃO
EMBARGADA. MATÉRIAS NÃO SUSCITADAS NO RECURSO E NAS
CONTRARRAZÕES. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. [...] Não é
possível, em sede de embargos de declaração, analisar questões não suscitadas
em recurso eleitoral ou em contrarrazões por caracterizar inovação de
fundamentos.” (TRE/AL, ED-RE nº 31873, Acórdão nº 9245 de 18/09/2012, Rel.
ANTÔNIO JOSÉ BITTENCOURT ARAÚJO, Publicado em Sessão 18/09/2012.
Grifei.) “Não se conhece da prefacial de inadequação do formato da mídia
anexada por acarretar a inépcia da inicial, haja vista que o argumento, já
afastado no decisório combatido, não havia sido suscitado pelo insurgente em sua
defesa, tratando-se de inovação inadmissível, consoante estabelece o art.
517 do CPC.” (TRE/MS, Representação nº 177902, Acórdão nº 6566 de
12/07/2010, Rel. TÂNIA GARCIA DE FREITAS BORGES, DJE 14/07/2010, P. 5-
6. Grifei.)
Em consonância com a fundamentação acima, rejeito a
preliminar de inovação recursal, suscitada no 2º Memorial, datado de 14 de
novembro de 2013, após o voto deste Relator, de 12 de novembro de 2013.
IV
No tocante aos demais pontos objeto do voto divergente
(doação indiscriminada de combustível e doação de cestas básicas), mantenho,
por seus próprios fundamentos, o voto proferido em 12 de novembro de 2013, o
qual peço vênia para ler nos pontos acima enfocados, complementado pela
motivação adiante exposta.
A
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Fl.
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Conduta vedada. Lei 9.504/1997, artigo 73, § 10.
Distribuição de cestas básicas.
Tanto o Juiz MARCELO ARANTES quanto os
Representados sustentam a legitimidade do programa de distribuição de cestas
básicas, porquanto teria ficado caracterizada a exceção prevista na parte final do
§ 10 do artigo 73 da Lei 9.504/1997. No voto proferido em 12 de novembro de
2013, ressaltamos que, na verdade, ocorreu o que a doutrina denomina de fraude
à lei, na medida em que o Representado NADIR DE PAIVA, valendo-se da Lei
Municipal 118/2010, teria, na realidade, fraudado a proibição prevista no § 10 do
artigo 73 da Lei 9.504/1997. Em outras palavras, NADIR DE PAIVA teria utilizado
de um arcabouço legal (Lei Municipal 118/2010) para fraudar uma proibição
prevista em lei. (Lei 9.504/1997, artigo 73, § 10.) Essa conclusão não decorreu de
um só fato ou de um só argumento, mas, sim, de um conjunto de fatos e de
circunstâncias suficientes para justificá-la.
Inexistência de execução orçamentária no ano anterior
ao da eleição.
Após o exame das provas constantes dos autos, concluímos
que houve a dotação orçamentária, regulada pelas Leis Municipais 112/2009,
124/2010 e 134/2011 (Fls. 641-662, Vol. 4), porém sem comprovação da
execução orçamentária. Como já decidido por esta Corte, “[a] execução
orçamentária é a utilização dos créditos consignados no Orçamento Geral e
nos créditos adicionais, visando à realização dos subprojetos e/ou
subatividades atribuídos às unidades orçamentárias. Assim, a execução
orçamentária trata da execução das receitas e despesas públicas. A incidência
da ressalva do art. 73, §10º da Lei das Eleições reclama a ininterrupção do
programa social, ou melhor, uma continuidade na execução do programa
entre o exercício anterior e o ano eleitoral”. (TRE/GO, Recurso Eleitoral nº
5699, Rel. CARLOS HUMBERTO DE SOUSA, DJ 23/10/2009, P. 1. Grifei.)
No 2º Memorial, os Representados sustentam a ocorrência
da execução orçamentária nos anos de 2010 e 2012 com a apresentação de um
resumo dos empenhos, das despesas liquidadas e dos valores anulados, bem
como da duração dos contratos de fornecimento de cestas básicas. (2º Memorial,
Recurso Eleitoral Nº 1323-32.2012.6.09.011
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Fl.
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p. 7.) Porém, ao invés de servir de base para as asserções dos Representados,
esse resumo prova o contrário. Nos termos do resumo em causa, no ano de 2010
as cestas básicas foram fornecidas no período de 5 meses; no ano de 2011 por
um período de 9 meses e no ano eleitoral, 2012, pelo período de 11 meses. Essa
inconstância no fornecimento das cestas básicas é um dos elementos
identificados pela jurisprudência como caracterizador do caráter eleitoreiro,
revelado, claramente, no aumento do período de distribuição dos alimentos na
medida em que a data da eleição se aproximava. Nesse sentido, em caso
análogo: “Distribuição de cestas básicas custeadas com o erário público.
Inconstância da prestação, o que denota o compromisso, apenas, de alicerçar a
reeleição.” (TRE/MG, Recurso Eleitoral nº 46792004, Rel. ANTÔNIO
ROMANELLI, DJMG 02/08/2005, P. 99.)
Inexistência de critérios objetivos, delimitados em
regulamento, para a distribuição das cestas básicas.
A Lei Municipal 118/2010 (artigo 2º, § 1º) autoriza o Poder
Executivo a distribuir alimentos a pessoas em “situação de vulnerabilidade social”.
Como bem registrado por esta Corte, a distribuição gratuita de bens e serviços
deve “cuidadosamente avaliada e seguir critérios rigorosos [na] escolha” dos
beneficiários. (TRE/GO, Recurso Eleitoral nº 35955, Rel. WILSON SAFATLE
FAIAD, DJ 03/05/2013, P. 3-4. Grifei.)
Os Representados olvidaram a necessidade de comprovar a
existência de critérios objetivos, delimitados em regulamento, para a distribuição
das cestas básicas. Ao revés, invocam os processos de concessão das cestas
básicas como prova da existência desses critérios. (Fls. 635-2.979.) No entanto, o
exame dos processos de concessão prova o contrário do pretendido pelos
Representados. Os processos de concessão utilizam fundamentação idêntica,
revelando, apenas, o propósito de cumprir os requisitos formais da exceção
prevista no § 10 do artigo 73 da Lei 9.504/1997.
Como registramos no voto proferido em 12 de novembro de
2013, a amplitude da expressão “situação de vulnerabilidade social” é indicativo
(CPP, artigo 239) da finalidade eleitoreira do programa de distribuição de cestas
básicas. Diante da inexistência de critérios objetivos, o agente político tem à sua
Recurso Eleitoral Nº 1323-32.2012.6.09.011
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Fl.
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disposição uma ampla avenida para transmutar o programa de distribuição de
cestas básicas em programa clientelista de captação ilícita de sufrágio.
Aumento da despesa para a aquisição de cestas básicas
da ordem de 680% acima do previsto no orçamento para o ano de 2012.
Os Representados sustentam que, do ano 2011 para o ano
2012 não teria havido aumento da despesa da ordem de 680%, porquanto a
possibilidade de suplementação da despesa, no percentual de 100%, diz respeito
ao valor total aprovado para o Orçamento Anual. Ainda que a argumentação
lançada no 2º Memorial tivesse procedência, restaria o fato incontestável da
existência de aumento na previsão de despesa em mais de 1.000%, porquanto a
previsão inicial fora fixada em R$ 5.000,00, ao passo que houve o empenho do
valor de R$ 78.000,00. Além disso, toda a argumentação contida no aludido
memorial esconde o fato simples, e, registre-se, admitido pelos Representados,
de que aumentaram de forma exponencial as despesas com a aquisição de
cestas básicas, no ano eleitoral. Esse é outro fato, indicativo do caráter eleitoreiro
da distribuição de cestas básicas, reconhecido na jurisprudência.
Entrega das cestas básicas diretamente pelo vencedor
da licitação, servidor público municipal licenciado.
Além da ofensa ao princípio da legalidade (CF, artigo 37,
caput), a distribuição das cestas básicas adquiridas com recursos públicos por
pessoa alheia à Administração Pública Municipal é um dos elementos
caracterizadores do caráter eleitoreiro. A desobediência a um dos princípios
cardeais da Administração Pública constitui indício de ilicitude na distribuição das
cestas básicas. As cestas deveriam ter sido entregues à Secretaria de Ação
Social, cabendo aos servidores dela a distribuição aos beneficiários respectivos.
Concessão das cestas básicas a cargo da esposa do
candidato à reeleição, Recorrente NADIR DE PAIVA, na condição de
Secretária Municipal de Promoção Social e Habitação; comissão de licitação
integrada por dois sobrinhos do Recorrente NADIR DE PAIVA; entrega de
cestas básicas a pessoas que não se enquadram no largo conceito de
“situação de vulnerabilidade social”.
Os Representados alegam, no 2º Memorial (p. 12), “que não
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há nos autos um indício sequer de que as cestas básicas foram oferecidos em
troca do voto”. Em primeiro lugar, essa prova é irrelevante, porquanto, “[p]ara a
configuração da conduta vedada do art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97 não é
preciso demonstrar caráter eleitoreiro ou promoção pessoal do agente
público, bastando a prática do ato ilícito.” (TSE, AgR-RESPE 36026 -
Brumado/BA, Rel. Min. ALDIR GUIMARÃES PASSARINHO JUNIOR, DJE
05/05/2011. Grifei.)
Em segundo lugar, registramos no voto proferido em 12 de
novembro de 2013 uma série de fatos e circunstâncias que, vistos em conjunto,
comprovam o caráter eleitoreiro na distribuição de cestas básicas. Os fatos acima
registrados, vistos em conjunto com os demais elementos probatórios invocados
por este relator, são suficientes à comprovação do caráter eleitoreiro na
distribuição das cestas básicas. A esposa do Representado NADIR DE PAIVA,
utilizando o largo conceito de pessoa em “situação de vulnerabilidade social”
procede à distribuição de alimentos adquiridos em licitação de cuja comissão
atuam dois sobrinhos de NADIR DE PAIVA, a qual escolheu para distribuir as
cestas básicas um servidor público municipal licenciado. Além disso, os
elementos probatórios contidos nos autos demonstram que algumas pessoas
receberam cestas básicas, foram nomeadas para exercer cargo em comissão no
período vedado e receberam combustível distribuído na véspera e no dia da
eleição.
De outra parte, os Representados, no 2º Memorial, alegam
que os beneficiários das cestas básicas estavam em situação de vulnerabilidade
social, o que teria sido atestado nos processos de concessão respectivos. Porém,
como acima registrado, os despachos de concessão do benefício são todos
idênticos, servindo apenas para cumprir, do ponto de vista formal, a necessidade
de identificar pessoas em situação de vulnerabilidade social, conceito esse que
não foi disciplinado por meio de critérios objetivos. Embora os Representados
aleguem que as pessoas beneficiadas eram carentes, o que importa, na verdade,
é a inexistência de critérios, disciplinados em regulamento, para concluir, por
exemplo, que determinado servidor público, proprietário de um veículo, estava em
situação de vulnerabilidade social. Ou, ainda, que determinada sobrinha do
Representado NADIR DE PAIVA, cujo marido trabalhava para o distribuidor
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informal de cestas básicas, também estava em situação de vulnerabilidade social.
Ausência de acompanhamento pelo Ministério Público
da execução financeira e administrativa do programa.
O Representado NADIR DE PAIVA tinha a obrigação de
comunicar a existência do programa de distribuição de cestas básicas ao
Ministério Público, a fim de que essa instituição pudesse exercer a sua faculdade
de acompanhar a sua execução financeira e administrativa. Os princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade são inaplicáveis, nesse passo, porquanto,
como já registrado, a constatação da prática da conduta vedada resulta do
conjunto dos fatos provados nos autos.
B
Conduta vedada. Lei 9.504/1997, artigo 73, inciso V.
Contratação de servidores, sem concurso, no período eleitoral.
A realização de concurso para a admissão aos quadros da
Administração Pública é um dos elementos de maior capacidade de moralização
do serviço público. No presente caso, repita-se, ficou comprovado, com base na
documentação juntada aos autos pelo próprio Representado NADIR DE PAIVA,
que ele nomeou, durante o período eleitoral, pelo menos 14 servidores para
exercer cargos em comissão, bem como contratou 4 pessoas por tempo
determinado.
O ilustre Juiz MARCELO ARANTES e os Representados
sustentam que não poderia ser exigida deles a prova de que os cargos objeto de
nomeação discricionária teriam sido declarados em lei de livre nomeação e
exoneração, e de que se destinavam às atribuições de direção, chefia e
assessoramento. CF, artigo 37, incisos II e V. No entanto, e, como já registrado,
ad nauseam, nesta confirmação de voto, a documentação comprobatória da
prática da conduta vedada foi juntada pelo próprio Representado NADIR DE
PAIVA. Além disso, e igualmente importante, os Representados tiveram, nas
alegações finais, a oportunidade processual para sustentar a licitude de seu
procedimento, inclusive com a juntada de provas de suas afirmações.
C
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Captação ilícita de sufrágio. Lei 9.504/1997, artigo 41-A.
Distribuição de combustível na véspera e na data da eleição.
A ausência de assinaturas nas requisições de combustível
em nada contribui para a veracidade das alegações dos Representados. Ao
contrário, conspira para demonstrar que havia um entendimento tão grande entre
os Representados e os dirigentes do Auto Posto Cabeceiras, a ponto de
dispensar a assinatura do requisitante do combustível. Somente uma relação
comercial baseada na confiança permitiria que os dirigentes do Auto Posto
Cabeceiras dispensassem a assinatura do requisitante nas diversas requisições
apreendidas. Na realidade, a confiança entre o Sr. Willian Amador e os
Representados era tamanha que, segundo essa testemunha, muitas autorizações
de abastecimento eram feitas verbalmente ou por telefone. (Fl. 1.152, Vol. 5. Grifo
omitido.) Assim, a ausência de assinatura na maioria das requisições reforça, ao
invés de enfraquecer, a tese dos Representantes.
De outra parte, a importância do nome da pessoa no
cabeçalho das requisições foi ressaltada pelo Sr. Willian Amador, do Auto Posto
Cabeceiras. O Sr. Willian explicou que “o nome indicado no cabeçalho é o do
responsável pela nota, sendo que a assinatura na parte de baixo da nota é da
pessoa que estava conduzindo o veículo no momento do abastecimento”. (Fl.
1.153, Vol. 5.)
Como bem registrou a eminente Juíza DORACI LAMAR, em
contexto similar, exigir mais provas do caráter eleitoreiro
seria esvaziar a aplicação da lei nos casos de evidente compra de voto e abuso de poder econômico, especialmente, por se tratarem de ilícitos freqüentemente praticados por intermédio de interpostas pessoas (parentes próximos do candidato, coordenadores de campanha e cabos eleitorais), o que deixaria impunes os principais beneficiários diretos pelos ilícitos eleitorais praticados.
Em caso bastante similar julgado no TSE, o Doutor Procurador Geral Eleitoral à época, Dr. Roberto Gurgel, manifestou-se com bastante propriedade no REspe n. 21.2264/AP, que “Temos, aqui, o que o Ministro Nelson Jobim costuma chamar de „pico do iceberg‟. Jamais teremos em feitos desta natureza, mais do que o pico o ponto do iceberg. Exigir que se tenha todo o esquema montado, na
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sua integralidade, é exigir o impossível. Daí a feliz escolha da figura do iceberg. Basta lembrar o Titanic, que teria sido sufragado por conta de um iceberg totalmente submerso. Revelar apenas a ponta do iceberg já demanda um esforço imenso, mas exigir que tenhamos todo o iceberg exposto é exigir o impossível, é negar a aplicação da legislação eleitoral.”
Nesse mesmo julgamento, o Colendo TSE reafirmou jurisprudência no sentido de que “para que ocorra a violação da norma do art. 41-A da Lei n. 9.504/97, não se torna necessário que o ato de compra de votos tenha sido praticado diretamente pelo próprio candidato. É suficiente que, sendo evidente o benefício, do ato haja participado de qualquer forma o candidato ou com ele consentido”.
Vale registrar ainda que o art. 23 da Lei Complementar n. 64/90 estabelece que a convicção do julgador, nos feitos em que se apuram ilícitos eleitorais, será formada não apenas pela prova produzida, mas também por fatos públicos e notórios, indícios e presunções, conforme inclusive reafirma precedente do TSE (ED-RO n. 2098 — Porto Velho/RO, Acórdão de 03/11/2009 Relator(a) ARNALDO VERSIANI LEITE SOARES, DJE - Diário da Justiça Eletrônico, Data 07/12/2009, Pagina 15).
Dessa forma, reputo que o ato de distribuição maciça de cestas alimentícias é suficientemente grave, tendo em vista as circunstâncias, constituindo evidente abuso de poder econômico e captação ilícita de sufrágio, já que eleitores tiveram ainda vulnerada sua liberdade de sufrágio.
(TRE/GO, Investigação Judicial nº 28622, supra.)
Quanto à alegação de ausência de identificação dos eleitores
beneficiados pela distribuição indiscriminada de combustível, observo que esta
Corte, por unanimidade, tem entendido que é “dispensável a identificação nominal
dos eleitores eventualmente corrompidos, até porque, consoante o dispositivo do
§ 1º do art. 41-A da Lei das Eleições, para a caracterização da conduta ilícita é
desnecessário o pedido explícito de votos”. (TRE/GO, Recurso Eleitoral nº 41096,
Acórdão nº 13836 de 27/05/2013, Rel. ABEL CARDOSO MORAIS, DJ
04/06/2013, P. 3-4.) Em idêntica direção, o entendimento do TSE: “Para a
caracterização do ilícito do art. 41-A da Lei nº 9.504/97, [...] Não é indispensável,
outrossim, a identificação dos eleitores que receberam os benefícios e
vantagens.” (TSE, Recurso Ordinário nº 787, Acórdão nº 787 de 13/12/2005, Rel.
Min. FRANCISCO CESAR ASFOR ROCHA, DJ 10/02/2006, P. 132.)
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V
À vista do exposto, promovo a juntada aos autos dos
Memoriais mencionados nesta confirmação de voto, e, respeitosamente da douta
divergência, mantenho, com os acréscimos acima, o voto proferido em 12 de
novembro de 2013.
Goiânia, 2 de dezembro de 2013.
Juiz LEÃO APARECIDO ALVES
Relator
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