inverno2018distrito federal
padê editorialcole-sã escrevivências
apoio:Fundo Elas de investimento social
desculpa
padê editorial
cole-sã escrevivências n. 08
juliannamotter
por ainda escrever poemas de amor
desculpa por ainda escrever poemasde amorJulianna Motter
edição, diagramação: tatiana nascimentoconcepção da artesania: tatiana nascimento
coordenação das oficinas de encadernação: kati soutorevisão: rose castilho
ilustração y design da capa: Jean [email protected]
padê editorial é um coletivo editorial artesanal
que publica autoras negras y/ou lgbtqi+,fundado por tatiana nascimento y bárbara esmenia,
em brasília / DFwww.pade.lgbt
desculpa por ainda escrever poemas de amor foi feito no df, em agosto de 2018, como parte do projeto “Escreviventes: autopublicação artesanal de narrativas LBTs”, propos-to pela padê e selecionado pelo Fundo Elas de Investimento Social em edital de 2018
tipografia: hero (capa), ogirema e chicago (miolo)
Motter, Juliannadesculpa por ainda escrever poemas de amor / Juli-anna Motter. - 1a. ed. - Brasília (DF): padê editorial, 2018.
ISBN: 978-85-85346-09-6
1. poesia I. título.
sobre a cole-sã escrevivênciasinspirada no conceito de escrevivências de conceição evaristo, a cole-sã escrevivências, da padê editorial, é dedicada a textos de autorxs lgbtqi+ negrxs* estreantes, produzindo literatura contemporânea. são 50 títulos de livros cartoneros (com capa de papelão reutiliza-do!), escritos por autorxs sapatonas, travestis, mulheres y homens trans, gente não-binária, povo preto sexual-dissidente de um mon-te de lugares num brasil que insiste em nos matar, nos impedir de so-nhar, de falar com nossa própria voz. mas mesmo assim: aqui esta-mos, falamos, escrevemos. sonhamos! fazemos nossos próprios livros.
foi no blog de conceição que li “a nossa escrevivência não é para ador-mecer os da casa grande, e sim para incomodá-los em seus sonos injustos”. o racismo htcisnormativo, mola de funcionamento do sistema colonial que fez nossa banda do continente ser como é (es-cravocrata, lgbtqifóbica, espraiante de genocídio negro, indígena, de transfeminicídio, classista, desesperançosa, fundamentalista) tem entre suas principais ferramentas políticas de silenciamento: ten-ta nos roubar de nossas palavras, contaminar colonizando nossa ex-pressão/discurso/narrativas, quer despermitir que plantemos nosso próprio imaginário. difundir seus estereótipos sobre nós enquanto finge que não vê não ouve o que nós mesmxs temos a dizer sobre nós.
selecionar esses textos y autorxs tem a ver com uma fé no contar nossas próprias histórias. y histórias que curem nosso passado, alimentem nos-so presente, construam nosso futuro: além de incomodar sonos injus-tos, embalar os nossos sonhos de mundos, imaginários, afetos, existên-cias possíveis, plenas, autodeterminadas, autoafirmadas literariamente.
todos os livros publicados na cole-sã têm licença creative commons tipo “atribuição-não comercial-sem derivações”, o que significa que você pode compartilhar o material em qualquer suporte ou forma-to, desde que a autoria seja atribuída (“atribuição”) y desde que não seja feito uso lucrativo do material (“não comercial”). se você modi-ficar esse conteúdo, tampouco pode distribuí-lo (“sem derivações”).
tatiana nascimento, organizadora
*75% dxs autorxs publicadxs se autodeclaram negrxs
sobre julianna motter
brasiliense, artivista, comunicadora e sapatona. com sérias dificuldades de falar sobre si mesma. vendo amor onde não existe e lendo romances de porta de banheiro desde 1992.
sobre desculpa por ainda escreverpoemas de amor
dizculpaeutb(,)
por aindaescrever
editary publicar
poemas de amor,dizdigo eu,
lendo teus poemacomo diz/cursos
di(z)/cura,sem precisão de
desculpar,
que:
gracias julianna motterpor ainda escrever
poemasde
amor
tatiana nascimento
julia
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mot
ter:
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poe
mas
de
amor
a.
eu nunca entendi o silêncio mas o respeitei a cada vez que veio
hoje, não escuto a sua voznem seu prenúncio
e me convenço de que tudo bem só te encontrar nos hiatosdos tempos imaginados eu aceito as reticências
os pontos que se dão sem nóseu aceito suas vírgulas
e nem te procuro na tela vazia que ficoue nem nos quartos de uma casa que você não conheceu
porque eu nem sei se você gostaria da luz que entra sem ser [convidada
do barulho enferrujado do ventiladordas pausas demoradas entre as coisas que não saberia te
[dizerda cafeteira quebrada
da imprecisão das palavraseu não entendo o silêncio
será se você já teve medo de nuvens?
julia
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ever
poe
mas
de
amor
b.
existem coisas que escapam à línguacomo as palavras que não tive tempo de te dizerporque não eram palavrasmas sonhos e algumas outras coisas misturadasna vontade de te contaralgo que jamais poderia ser realmente ditoporque me faltariam palavras pra te dizeraquilo que nem eu entendiaporque eu não tinha ainda como saberque você me tiraria o medo de nuvens
c.
o tempo passa tão rápidosinto saudades de você
passo horas a olhar naviosnum lugar onde nem mares
nem riossabem me dizer
onde as águas vão pararo tempo passa tão rápido
sinto saudades de vocêpasso horas a olhar o nada
esperando pra ver se ele me soltaprocuro sua presença nos lugares
mas ir é uma coisa que não voltao tempo passa tão rápidosinto saudades de nascer
julia
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poe
mas
de
amor
d.
parece que há um oceano entre nóse não só parecemas háum oceano propriamente ditoe um milhão de palavras não ditasque transformam a distância em águae fazem diluir os diasescorrendo os números do calendáriodesajustando a pressa do tempoafrouxando o relógio:há um oceanono oceano entre nós
e.
parece que havia um oceano entre nóse não só parece
mas haviaum oceano propriamente dito
e um milhão de palavras não ditasque transformaram a distância em água
e fizeram diluir os diasdesajustando o relógio
dilatando o tempo há um novo oceano
no oceano que um dia houve
entre nós
julia
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ever
poe
mas
de
amor
f.
eu confundi suas coxas com os beijos delae é difícil isso de se perder entre lábioseu troquei suas pernas pelas coxas delamas passei o nariz pela sua nuca cheirando o perfume delae atingi certa altura segurando uma mão que não era suae deitei no seu coloe me enrolei nos cachos que não eram seusabracei os seios delae deitei na camaonde você deitava comigomas onde você não estavae ela se deitoucomo se fosse vocêcomo se fosse eue como se fosse ela na cama que era o sofá e que não era nossoeu me anoiteci com elanas horas em que você me amanheciae eu te amei como se fosse elae amei a ela como se fosse sua
g.
aos domingosme ponho sono
sobre os olhos delae ignoro a luz
o silêncio é a palavraque melhor nos traduz
julia
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poe
mas
de
amor
h.
há sentido em tudoque se dizem tudo que se esqueceem tudo que se repetee em tudo que se silenciaeu queria ter me mudadopra vocênaquele dia
i.
quando toco sua pele sem querere eu não sei se não querer é impossível
não sei se posso apenas querer tocar sua pelee querer atravessá-la inteira
só pra tentar descobriro que é que existe aí dentro
e que torna tão impossívelachar suficiente estar só aqui:
do lado de fora de ti
julia
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poe
mas
de
amor
j.
passo muito tempo a ver naviose vazios, meus olhos buscam por você quem foi que inventou o tempo?procuro nas horas formas de te pedir pra estar aqui e agora há muito o meu relógio parou no seuquem foi que inventou o tempo e aumentou a distância entre
[os corpos?aperto o mundo contra meu peito e nem assim te encontrohoje, no rádio, escutei que vai chover
k.
me despir de tudo que me atravessa e te receber inteira
imersasem ter âncora
e nem portopra transitar
inteiraimensa
por seu corpo
julia
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poe
mas
de
amor
l.
escrevo a 120 km/hsem medo de acelerar escrevo como quem corre perigoe digoporque meu medo nunca foi o de me calara cidade passa pelo canto dos olhos feito um raioe se me distraiochove no meu olharlembra da vida lá fora?da viatura impedindo o trânsito das crianças fazendo barulho
[na praça do ponteiro das horasdos desenhos nos muros do cheiro de café na padaria da
[esquina do ônibus que pegamoserrado do voo atrasado da sombra da árvore favorita de quan-
[do me deu as costas e a gente foipra nunca mais voltarescrevo a 120 km/hcomo quem acelera pelo medo de parara cidade passa pela borda dos olhos feito um rojão e explode em luzes neonescuto sua voz em todas as coisas e até no silênciovejo seu rosto em todos os lugares e até no meuno meu reflexo borrado do retrovisore no vazio das casas demolidas e dos jardins você diz que voltae me pede pra voltarmas o tempo não dá voltase nada o impede de continuara cidade inteira fala de nósmas é impossível construirnovos mapas com suas palavras
m.
em brasíliasinto sua falta
no sofá da casa do meu irmãono centro da cidade
quando amanhece quando o sol se põe
do outro lado do mundo sinto sua falta
no meio da ruadentro do apartamento
fora de casadebaixo da chuva
dentro de vocêsinto sua falta
julia
nna
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poe
mas
de
amor
n.
ali, na beira do marquis descobrirquem vivia ali no mais dentro de vocêquis saber quem carrega seu nomee o peso da sua mão sobre a minhaquis saber como ficaria o horizonte diantedas suas costase ali, na beira de nósquis te dar amormas ali, na beira de amar tive medo das ondasque quebram sem avisar
o.
guardeimeus olhos
nos seuspra nunca mais
te perderde vista
julia
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poe
mas
de
amor
p.
seu corpo todo nue o sol que ousa entrar mesmo através das brechas da cortinao sol manso da manhão ventilador de teto ligadoseu corpo todo tuinundando o horizonte de um apartamento de um quarto e meioa viva vista do seu amanhecera imagem que ficou na memóriaseus olhos pregados de sono emeus olhos pregados em vocête tenho impregnada em tudo que vejo— e mesmo se fecho os olhos
q.
às vezes você fala alto demais
em mime eu tento te silenciar
mas seu corpo falaa minha língua
julia
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poe
mas
de
amor
r.
sonhei que tudo tinha vindo de nóso amor a comida a fome a dançao repouso o pouso o vooo sol e seu movimento natural e inexplicávelos astros a astrologiae depois os egípciosuns deuses e outros cristosas crenças e alguém abaixando as persianase depois subindo aos céuse depois descendo as persianassonhei que tudo tinha vindo dissoo dia a noite o meio-termo de tudosonhei que ainda estávamos aquie que nunca precisaríamos dar nome às cicatrizes
s.
não sei ler cartas de tarôtenho medo de fazer perguntas porque tenho medo das respos-
[tasgosto muito do agora, mas penso muito no depois
fico ansiosa porque não aprendi a lidar com o tempo do relógiovocê veio e eu não vi
você disse que o querer tem força e tem
ele nos desloca do lugar de onde a gente sente que tem con- [trole e nos bota no meio de coisas
das quais a gente ainda nem sabe o nomedá medo e um frio na barriga
não nomear as coisase eu sou muito medrosa
então fico tentando adivinhar pra onde vai o tempomas tenho medo de fazer perguntas porque tenho medo das
[respostase não sei ler cartas de tarô
fico ansiosa porque não aprendi a lidar com o tempo do relógiomas não tenho medo de deixar ele me levar
você mexeu com meus ponteirostenho sonhado acordada com você
julia
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poe
mas
de
amor
t.
na minha casanão tem nem panelaminha fome só se matano corpo dela
u.
eu queriaser uma tesourinha
só pra poderte tirar dos eixos
julia
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poe
mas
de
amor
v.
era pra gente ter se encontrado,eu te disse, um milhão de vezesenquanto a gente se perdia
w.
comprar uma vanpra rodarmos o litoral
e se a gasolina estiver carapelo menos até o jerivá
comer uma pamonhaquem sabe um curau e ver a vida passar
no fim de semana seguinte levar umas cangas pra ficarmos sentadas na beira do lago
no parque da cidadeque é mais perto
dando pipocas pros patosbrincar de pique-bandeirinha
debaixo de pilotise gastar as últimas moedas
com fatias da dom boscosó pra você ficar feliz
fazer de tudopra você ficar aqui
e beijar sua bocacomo quem engole
um gomo dum caqui
julia
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ever
poe
mas
de
amor
x.
depois de um turbilhão o amor é esse hiatoentre a falta de tempoe a falta de tato
y.
não tenho nada contra a saudadenada contra sua falta
mas desconfio das dores que não passam depois que a gente [dorme
julia
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poe
mas
de
amor
z.
uma das melhores coisas do mundoé ficar te olhando ininterruptamente como se essa fosse uma das melhores coisas do mundo
as últimas palavras de uma vítima da monogamia compulsória.
desculpaquero te pedir desculpasdesculpa por ainda escrever poemas de amordesculpa por nutrir ainda um tipo de amor românticopor ainda acreditar no romance e escrever seu nome[nas portas dos banheiros junto ao meupor ainda desenhar corações no seu cadernoe simular nossa filha num aplicativo de celulare por ainda querer dividir o milkshake na lanchonete da[esquina e por um minutoachar que isso é tudodesculpa se na última vez eu ainda usei canudoe me desculpa por esquecer às vezes do meio ambiente e te [escrever uma carta em vez de um e-maildesculpa se eu pareço louca quando você abre os olhos de [manhã e eu estou quase em cima devocê te esperando acordar só pra te ver tirar a mesma [remelinha que aparece todo dia no olho esquerdodesculpa por chegar sempre muito cedoé que tô sempre ansiosa pra te verdesculpa se tô sempre pensando em vocêmas é que aproveitei que você tinha salvo seu mapa no[personare e fiz nossa sinastriadesculpa se quero te ver todo diadesculpa se eu te olho demais e se eu deixei uma muda[de roupas no seu armáriodesculpa se eu comecei a olhar um apartamento maior e[se passei as últimas três semanas dormindo na sua casadesculpa se eu adotei um gato e pareci estar chegando[de mudançadesculpa se isso tudo te cansamas sabe, a gente vive sempre tão cercadas de ódio e[exaustãoque eu só queria ter alguém leve que nem você pra dividir um [caminhãodesculpa por ainda escrever poemas de amor
títulos da padê editorial:
cole-sã escrevivências:
escura.noite, kati soutosal a gosto, esteban rodriguesparagrafia 44, lélia de castro44 sentímentos, cleudes pessoacartas para NegraLua, débora ritaoju oiyn, okan iná, beatriz fernandes aqualtuneágua viva, piera schnaiderdesculpa por ainda escrever poemas de amor, julianna motterflores em coração cerrado, tati carollia saudade é mulher, fernanda fernandes munizdelírios de (re)xistência, geise gênesistrans|bordô, lara ferreirain-quietudes, vandia lealcoração no asfalto, márcia cabralser y estar en otros matices, rocío bravo shuñaolindeza, maryellen cruzconcha, sabrina leonardipiroclastos, lázaroafro latina, formigaalumbramento marginal, bianca chiomadeve haver haveres para que a gente siga existindo, laila oliveiraEP, preto téotinkuy, jade bittencourtno âmago, enzo irokosapa profana, raíssa éris grimmsou travestis: estudando a cisgeneridade como uma possibilidade decolonial, viviane vergueiroamar devagarinho..., bruno santanaa piada que vocês não vão contar, kuma françaguarda-versos: palavras que não pude calar, adriele do carmobricolagem travesti, maria léo ararunanotas de um interior circuntante e outros afetos, calila das mercêscartas para ninguém, diana salu764 – da barragem pra cá, raquel prosa et. al.meus versos e inversos, augusto liras
olho de imbondeiro, lohana káritacantos de proteção, resistência e dengo: cada pétala é um ser, babosa maresia e karina das oliveirascrônicas coyote, márcia marci et. al.fragmentos_, juliana tolentinovagamente, daniel britouma natureza secreta, luci universoecdise, lídia rodriguescaos – recortes de um peito negro, victória salesdiversas maneiras de amar, victor alejandrocomer do próprio coração pra viver na própria pele, capitú
cole-sã Odoyá:
esboço, tatiana nascimento{penetra-fresta}, bárbara esmenialundu,, tatiana nascimentointeriorana, nívea sabinotautologias, daisy serenasangue, nanda fer pimentaperiférica, kika senamil994, tatiana nascimentoafroqueer existência: dor luta amor, pedro ivotribadismo : mas não só – 13 poemas a la fancha + 17 gritos de abya yala, bárbara esmeniamaravilha marginal, letícia fialho
cole-sã Odara
percursos estéticos: abordagens originais sobre o teatro do oprimido, bárbara santos
todos os títulos da cole-sã escrevivênciasestão disponíveis pra venda (impressos) ou download gratuito (.pdf) no
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