CONCEPÇÕES DOS ALUNOS SOBRE MATEMÁTICA FINANCEIRA: UM
ESTUDO DE CASO A LUZ DA APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA
Maria Dolores C. da Silva, Mestranda na UNICSUL, [email protected]
Carlos Fernando Araújo Jr., Professor Titular na UNICSUL, [email protected]
Introdução
Os objetivos da pesquisa relatada neste artigo é investigar as concepções de Matemática
Financeira e estratégias de aprendizagem sustentadas por alunos da 3ª. Série do ensino
médio, e examinar a relação entre as concepções dos alunos e a prática de atividades
contextualizadas.
Sendo a busca do conhecimento de Matemática Financeira nosso objetivo, foram
averiguadas as concepções desses alunos diante de um trabalho com a utilização de
tecnologias da informação como recurso na resolução de atividades contextualizadas.
Mediante essas expectativas, a pesquisa privilegiou os estudos das concepções em
relação à Matemática Financeira, presentes nos alunos e avaliadas no período de um
semestre. Defendeu-se a idéia de que o uso do computador e da calculadora como
instrumento auxiliar dos estudos de Matemática Financeira favorece o desenvolvimento
de concepção coesa em relação a esse conteúdo.
Para a elaboração de nossa pesquisa, executamos uma pesquisa exploratória
objetivando proporcionar maior familiaridade com o problema, visando torná-lo mais
explícito, o que consequentemente nos levou a construir hipóteses. Desta maneira
executou-se então uma pesquisa bibliográfica de autores que abordam o assunto a ser
analisado neste trabalho.
O fato dos alunos sempre demonstrarem interesse diferenciado pelo conteúdo
relacionado à Matemática Financeira Básica, segundo observações da experiência
docente, pode possibilitar a produção de aprendizagem socialmente significativa.
A referida hipótese decorre da experiência adquirida através de anos de observação no
dia a dia da sala de aula e um contato diário com alunos da 3ª. Série do ensino médio.
Realizou-se também uma pesquisa descritiva, visando conhecer as características do
grupo de alunos participantes, tais como sua distribuição por idade, sexo, e, participação
no mercado de trabalho. Efetuou-se um questionário fechado para o grupo com o
objetivo de situar a amostra quanto ao perfil do aluno.
Posteriormente, efetuou-se o estudo de caso. Para a execução do estudo de caso,
inicialmente o aluno é observado, buscando-se mapear suas concepções de Matemática
Financeira, declaradas na construção de mapas conceituais sobre este tema. Em seguida
o aluno é observado lidando com questões contextualizadas, que requerem a aplicação
de Matemática Financeira Básica.
Com este enfoque, verificou-se que ocorreram mudanças nas concepções dos alunos
sobre Matemática Financeira.
A proposta de aprofundar o estudo sobre o conteúdo Matemática Financeira em turmas
de 3ª. Série do Novo Ensino Médio enquadra-se no currículo atual, tanto na proposta
dos PCNEM, quanto na proposta apresentada nos livros didáticos.
As orientações curriculares para o ensino médio sugerem, “dentre as aplicações da
Matemática, tem-se o interessante tópico de Matemática Financeira como um assunto a
ser tratado quando do estudo de função exponencial, juros e correção monetária fazem
uso desse modelo”.
Efetuamos uma rápida reflexão sobre a relação entre Matemática e Tecnologia. É
comum quando nos referimos às tecnologias ligadas à Matemática, tomarmos por base a
informática e o uso das calculadoras, instrumentos instrucionais que podem possibilitar
o enriquecimento do processo aprendizagem.
O avanço da tecnologia da informação vem propiciando uma mudança no paradigma da
produção e divulgação do conhecimento.
O uso da tecnologia de informação na escola é mais uma porta que pode ser aberta e dar
sua contribuição não só intelectual, mas também social.
D’Ambrósio (1990) comenta sobre a necessidade da presença das calculadoras e do
computador no cotidiano das escolas, principalmente das mais carentes, esclarecendo
que desta forma os alunos menos favorecidos sócio-economicamente terão acesso a
essas ferramentas que já se encontram disponíveis no mercado de trabalho e que, num
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futuro muito próximo, estarão presentes em todos os setores produtivos. Afirma ainda,
que se os alunos que pertencem às classes sociais baixas forem privados do
conhecimento e da manipulação desses e de outros instrumentos tecnológicos
certamente serão encaminhados ao subemprego.
Segundo Borba (2005) “o acesso à informática deve ser visto como um direito e,
portanto, nas escolas públicas e particulares o estudante deve poder usufruir de uma
educação que no momento atual inclua, no mínimo, uma alfabetização tecnológica”.
No que diz respeito à formação dos indivíduos, consideramos relevante a atenção que
devemos dar ao desenvolvimento de valores, habilidades e atitudes desses alunos.
Segundo orientações para o ensino médio de Ciências da Natureza, Matemática e suas
Tecnologias “descuidar do trabalho com a formação geral do indivíduo impede o
desenvolvimento do pensamento científico, pois o pano de fundo das salas de aula se
constitui dos preconceitos e concepções errôneas que esses alunos trazem sobre o que é
aprender, sobre o significado das atividades matemáticas e a natureza da própria
ciência”. (MEC, 2006).
Estruturamos a apresentação do artigo nas seguintes seções: A Seção 1 discute os
conceitos de atitude, concepção e crenças, diversos autores são chamados, quer pela
similaridade com a pesquisa, quanto aos resultados ou enfoques dos trabalhos que
desenvolveram, ou ainda, no sentido de justificar as opções de fundamentação teórica.
A seção 2 oferece uma visão geral da Aprendizagem Significativa de Ausubel,
considerações gerais ao Contexto Sócio- Cultural e a conceituação dos mapas
conceituais. A seção 3 oferece uma visão global da pesquisa em suas várias fases. A
seção 4 reúne os resultados principais decorrentes do estudo, contando com o
instrumento da metodologia de estudo de casos. Na Seção 5, terminamos o trabalho
sintetizando os resultados principais obtidos, e conclusão, destacando contribuições
teóricas, e novas possibilidades de pesquisa.
1. Concepções
As concepções de aprendizagem matemática e de matemática podem ser fatores
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determinantes no processo de construção do conhecimento matemático e portanto no
ensino/aprendizagem de matemática. Tal hipótese tem orientado uma série de pesquisas
que buscam uma resposta estudando concepções de matemática e de ensino de
matemática de professores e a repercussão das mesmas na prática docente
(THOMPSON, 1997; FIORENTINI, 1994).
Abordaremos os conceitos de atitude, concepção e crenças , discutiremos a pertinência
do estudo destes conceitos, que identifica as atitudes e concepções mais freqüentes dos
alunos e, apresentaremos alguns trabalhos de autores que investigaram a mudança das
atitudes e concepções dos alunos em ambientes de trabalho inovadores.
Os conceitos de atitude e concepção têm diferentes origens e o seu significado não é
consensual, sendo usados com sentidos diversos em educação matemática
(ABRANTES, 1994; MATOS, 1991, 1992; SARAIVA 1992; SCHOENFELD, 1985,
apud VARANDAS 2000).
Cândida Moreira (1992), afirma que existe pouco consenso sobre o que distingue o
conceito de atitude de outros conceitos afins, tais, como concepção, valor ou opinião.
Contudo, Matos (1992), ibid, estabelece uma relação entre as atitudes e as concepções
dos alunos. Este autor refere que os alunos manifestam a sua representação da
Matemática através das atitudes que tomam face ao trabalho matemático, indicando
também que essa representação tem por base suas concepções acerca da disciplina.
Neste trabalho adaptamos, na linha de Rezende (2004), assim, o construto que
investigou “concepções” foi adotado num sentido amplo, que congrega os construtos
crenças, visão e modelo, e que incorpora o sistema de crenças conforme Thompson
(1997).
O construto concepção de matemática, de aprendizagem matemática, de pensamento
matemático, decorre da história vivida de cada aluno e traz implícito, ou mesmo
explícitos, crenças conscientes ou não, idéias próprias ou emprestadas de outros, valores
internamente desenvolvidos ou aparentemente repetidos, transparecendo uma visão do
mundo, de homem, de sociedade.
Vários pesquisadores, (SKEMP, 1976; FRANK, 1988; SCHOENFELD, 1989;
4
ABRANTES, 1994; CRAWFORD, 1994, 1998 a, b; VARANDAS, 2000; REZENDE,
2004) que estudaram concepções de alunos e processos de aprendizagem tem apontado
descobertas que sugerem que, continua importante examinar essas concepções devido à
influência que estas podem ter na construção do conhecimento matemático dos mesmos.
Frank (1988), citada por Varandas (2000), realizou um estudo com 27 alunos, do 6º ao
8º ano, que freqüentavam um curso intensivo de duas semanas sobre resolução de
problemas com o auxílio do computador. Da análise deste estudo identificou cinco
concepções dos alunos. Uma das concepções identificadas; “A Matemática é cálculo” é,
certamente muito comum quando se pensa no trabalho desenvolvido de modo
tradicional nas aulas de Matemática. Os alunos estudados identificaram a Matemática
com “as quatro operações básicas”. Subjacente a esta idéia está o recurso à
memorização de algoritmos e regras como forma privilegiada de trabalho em
Matemática. No seu estudo, Frank identificou outra concepção que evidencia o caráter
dicotômico “respostas certas ou erradas” como os alunos vêem a Matemática. Com
relação ao papel dos problemas em Matemática, na opinião dos alunos que participaram
deste estudo, os problemas de Matemática “eram tarefas de rotina nas quais os
conhecimentos de algoritmos aritméticos ou algébricos podem ser aplicados”. A quinta
concepção segundo a autora definida pelos alunos é referente os papeis do aluno e do
professor, “o papel do professor de Matemática é transmitir conhecimentos de
Matemática e verificar se os alunos adquiriram esses conhecimentos”. Assim a autora
afirma que, “para os alunos melhorarem a sua capacidade de resolver problemas é
necessário que alterem suas concepções acerca da Matemática”.
Schoenfeld (1989), também citada por Varandas (2000), num estudo que incluiu 125
alunos, do 10º ao 12º ano, identificou diversas concepções. Duas delas; “para se
conseguir resolver problemas é necessário conhecer um conjunto de regras e a
memorização de fórmulas e equações é muito importante pela sua generalidade e
aplicabilidade em muitas situações. De acordo com Schoenfeld, estas concepções
“refletem a prática da sala de aula”, e o discurso do professor: “a chave é praticar”...
tens que saber fazer construções para não perderes muito tempo a pensar nelas” (p.
344). Para este autor, que se refere em particular à Matemática:
“Sistemas de concepções são a visão que uma pessoa tem do mundo matemático, a
perspectiva com a qual a pessoa aborda a Matemática e as tarefas matemáticas”. (p. 45).
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Na pesquisa de Crawford (1994), citada por Rezende (2004), uma amostra de 300
alunos novatos, de uma universidade australiana respondeu a um questionário de cinco
questões abertas, elaboradas com o objetivo de identificar as concepções de matemática
dos alunos e suas abordagens de aprendizagem. As respostas foram analisadas
utilizando-se uma abordagem fenomenográfica e as categorias de descrição foram
concebidas a partir dos dados, consistindo em um dos principais resultados da pesquisa.
Os resultados da pesquisa apontaram que todos os alunos adotaram uma abordagem
superficial em seus estudos matemáticos, sendo que 90% dos estudantes apresentaram
uma visão fragmentada da matemática, enquanto que apenas 10% dos alunos
demonstraram que a matemática é concebida de forma coesiva. Relevante é o fato que
concepções e abordagens de aprendizagem matemática não têm prioridade uma sobre a
outra: concepções de matemática ditam abordagens de aprendizagem e vice-versa,
abordagens induzem a concepções.
Abrantes (1994), analisando as influências que as concepções dos alunos exercem sobre
o comportamento matemático, afirma que: estudar as concepções dos alunos é essencial
para se compreender o seu comportamento matemático e, além disso, a própria
metodologia de investigação sobre as concepções deverá ter em conta o modo como os
alunos se envolvem em atividades matemáticas (p. 72).
Rezende (2004) investigou as concepções de aprendizagem matemática, de matemática
e do pensar matemático de alunos de Cálculo de cursos de engenharia, de uma
universidade particular, indagando sobre a possibilidade da influência de tais
concepções nas estratégias de aprendizagem desses alunos. Os resultados obtidos
permitiram evidenciar que concepções de matemática, aprendizagem matemática e
pensar matematicamente, podem entre outros fatores como motivações, expectativas e
atitudes metacognitivas, contaminar as estratégias, ou melhor, dizendo os estilos de
aprendizagem da matemática e do Cálculo, adotados pelos alunos.
Adotando o mesmo referencial teórico de Rezende (2004), sobre a análise dos mapas
conceituais construídos pelos alunos envolvidos na pesquisa, optamos por adotar a
categorização de concepções, em aprendizagem matemática instrumental ou relacional,
fundamentando-se em Skemp (1976). A primeira concepção conduz à aprendizagem de
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matemática instrumental, que consiste no domínio de um conjunto de planos pré-
definidos e fixos para realizar tarefas matemáticas, planos que prescrevem
procedimentos passo a passo. A aprendizagem de matemática relacional está voltada
para a construção de estruturas conceituais, a partir das quais passam a ser exploradas
possibilidades distintas para a realização de uma mesma tarefa.
2. Aprendizagem significativa, o contexto sócio-cultural e mapas conceituais
De acordo com as orientações curriculares para o ensino médio, a relação didática é
formada por um complexo conjunto de elementos que influenciam diretamente seu
funcionamento.
Em nossa pesquisa é possível sintetizar essa relação, partindo de três eixos; como
estratégias de aprendizagem consideramos a Contextualização das atividades
desenvolvidas. Por outro lado a respeito da elaboração de conteúdos metodológicos,
procuramos referencias na Teoria de Aprendizagem Significativa, considerando que o
aluno manifeste uma disposição para a aprendizagem significativa. Referente à
interação didático- pedagógica, consideramos pertinente o fato de, o aluno depende do
Contexto Social. Assim, essas interações estão relacionadas entre si, e ocorrem dentro
de um sistema de ensino, com influências internas e externas.
Ausubel, Novak e Hanesian (1980), sustentam o ponto de vista de que é possível
desenvolver métodos que facilitem a melhoria do trabalho em sala de aula na busca de
aprendizagem significativa.
Ausubel, Novak e Hanesian (1980) distinguem a aprendizagem significativa da
aprendizagem mecânica, afirmando que tanto a aprendizagem por descoberta como a
receptiva podem ser significativas.
Esses mesmos autores comentam ainda que, independentemente do quanto uma
determinada proposição é potencialmente significativa, se a intenção do aluno é
memorizá-la, tanto o processo de aprendizagem como o produto da aprendizagem será
automático. A retenção neste caso de aprendizagem que não é significativa é mais
limitada e muito mais pode ser aprendido e retido se houver aprendizagem significativa.
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As condições da aprendizagem significativa (seja por descoberta ou receptiva)
dependem de condições importantes como: que o aluno manifeste uma disposição para a
aprendizagem significativa, e, que o material aprendido seja potencialmente
significativo e, principalmente que seja possível incorporá-la à estrutura cognitiva de
determinado aluno, de maneira não arbitrária e substantiva.
Afirmar que um material ou uma tarefa podem ser ou não potencialmente significativos
implica remeter-se a aspectos da estrutura cognitiva do próprio aluno. O potencial de ser
ou não significativo depende de experiência escolar prévia e fatores como idade,
desenvolvimento cognitivo, condições sócio-econômicas e culturais.
Pretendeu-se, com a proposta de ensino aprendizagem de Matemática Financeira,
apresentada neste estudo, que possibilitasse uma aprendizagem significativa. No
ambiente escolar devido à forma com que o conteúdo foi apresentado aos alunos, isto é,
através da realização de atividades na sala de aula e no laboratório de informática, em
torno de tarefas de exploração e investigação.
No entanto é importante lembrar que, como assinala os autores (1980), a significação é
idiossincrática; e é um fenômeno de ordem pessoal que só é alcançado se o sujeito
estiver disposto a despender um esforço ativo para integrar em sua estrutura cognitiva o
novo conhecimento.
A abordagem da questão de que diversos ambientes do contexto escolar, como por
exemplo, a sala de aula interativa mostra-se como um lugar privilegiado para que
aprendizagens significativas ocorram nos remete a referenciar Rego (1995), que
estudando a teoria desenvolvimentista de Vygotsky (1998), sobre ela comenta:
na perspectiva de Vygotsky, construir conhecimentos implica
uma ação partilhada, já que é através dos outros que as relações
entre sujeito e objeto de conhecimento são estabelecidas.
O paradigma esboçado sugere, assim, um redimensionamento do
valor das interações sociais (entre os alunos e o professor e entre
as crianças) no contexto escolar. Essas passam a ser entendidas
como condição necessária para a produção de conhecimentos
por parte dos alunos, particularmente aquelas que permitem o
diálogo, a cooperação e a troca de informações mútuas, no
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confronto de pontos de vista divergentes e que implica na
divisão de tarefas onde cada um tem a responsabilidade que,
somadas, resultarão no alcance de um objetivo comum. Cabe,
portanto, ao professor não somente permitir que elas ocorram,
como também, promove-las no cotidiano das salas de aula.
(REGO, 1995, p.110)
Nesse autor, destacamos a valor das situações interativas que favorecem a troca de
saberes e aprendizagem ativa e significativa.
Nos referenciais; Teoria de Aprendizagem Significativa e em Vygotsky (1998),
encontra se reforço para os três elementos que consiste nosso trabalho; Concepção,
Aprendizagem Significativa e Perspectiva histórica cultural da educação.
Moreira apresenta em seu texto a teoria da educação proposta por Novak, considerada
uma ampliação da teoria da aprendizagem significativa de Ausubel. Segundo Novak,
toda situação educativa envolveria uma ação, cuja intenção seria uma troca de
significados – para os quais seria necessário pensar – e de sentimentos entre o professor
e o aprendiz. Então uma situação educativa abrangeria cinco elementos: aprendiz,
professor, conhecimento, contexto e avaliação. As relações entre esses elementos
podem ser representadas em um mapa conceitual. Novak e Gowin (1999, p. 31) definem
um mapa conceitual como “um recurso esquemático para representar um conjunto de
significados conceituais incluídos numa estrutura de proposições”. (apud MANRIQUE ,
2003)
3. Delineamento da pesquisa
A pesquisa desenvolvida compreende uma amostra de 106 alunos da 3ª. Série do ensino
médio. A investigação, de natureza qualitativa, teve por base o estudo de caso. Assim,
foram realizados dois estudos de caso.
O foco principal da reflexão e análise que apresentamos a seguir, diz respeito às
tentativas de produção de significados que alunos e professora produzem a partir de
uma situação problema considerada matemática financeira. O processo de interação e
significação, será, portanto o nosso foco privilegiado de análise da atividade.
A investigação procurou responder duas questões. Uma, se preferências professadas
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pelos alunos a respeito de matemática financeira estavam refletidas em suas práticas na
resolução de atividades relacionadas a esta temática. A segunda questão, se a utilização
do recurso da calculadora e do computador na resolução de atividades contextualizadas
iria influenciar em suas concepções.
Na busca de respostas a estas perguntas consideramos relevante considerar que no atual
cenário educacional não há como desconsiderar a inclusão de ferramentas tecnológicas
na sala de aula.
Interessaram-nos no contexto escolar as possibilidades e dificuldades que se apresentam
na utilização da tecnologia como recurso pedagógico, sem comparar se é melhor ou pior
do que aquelas nas qual essa tecnologia não é utilizada.
Durante todo o desenvolvimento do trabalho os procedimentos de pesquisa serviram de
base, sobretudo, por conceber a pesquisa como processo. Buscamos nos autores Moreira
(1990), aportes que sinalizam que este estudo configura-se como pesquisa qualitativa.
Definida a amostra de sujeitos, componentes do referido estudo, composto por alunos da
3a. série do ensino médio, buscou-se descrever um processo de intervenção
compartilhada realizado pela professora pesquisadora e os referidos alunos.
Com o objetivo de gerar conjecturas sobre quais poderiam ser as concepções dos alunos,
e então conseguir um melhor direcionamento nas investigações posteriores, podemos
descrever a ocorrência de três momentos ou fases.
A primeira fase permitiu inferências que induziram a uma tentativa de caracterização
das concepções dos alunos com base somente na criatividade da construção
individualmente do primeiro mapa conceitual sobre matemática financeira dos mesmos,
antes de iniciar as atividades propostas.
Na segunda fase, posteriormente a realização de atividades de exploração e
investigação, solicitamos novamente a construção individualmente do segundo mapa
conceitual sobre matemática financeira. Este procedimento pretendeu criar a
oportunidade de verificar se posterior a nossa intervenção ocorreria mudanças de
concepções. As concepções inferidas e as declaradas foram examinadas para
consistência.
Na terceira fase, os alunos construíram em grupo um terceiro mapa conceitual sobre
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matemática financeira. Objetivamos dar oportunidade aos alunos para refletirem sobre
as experiências realizadas, pois acreditamos que as discussões nas aulas são certamente
um bom meio para fazer isso (reflexões) e também há vantagem em complementá-las
com as sugestões dos colegas.
Todas as análises foram feitas sempre em relação ao processo de ensino e aprendizagem
de matemática financeira básica, ao qual todos os sujeitos da pesquisa estiveram
participando. Neste caso, um dos instrumentos usados para avaliar um dos fatores
citados anteriormente foi uma avaliação de matemática, que envolveu os aprendizes em
atividades mentais como, por exemplo, recuperar informações sobre cálculos de
porcentagem (subsunçores) já previamente trabalhado em séries anteriores e, talvez
retido na estrutura cognitiva do aprendiz.
Os instrumentos utilizados para coleta de informações foram: questionário, atividade
avaliativa e construção de mapas conceituais sobre a temática Matemática Financeira,
em três momentos.
4. Resultados obtidos
O estudo quali-quantitativo teve como instrumento básico de coleta de dados, análise de
mapa conceitual sobre a temática Matemática Financeira, elaborado individualmente
por uma população de 104 alunos. O que segue, na Tabela 1, é uma síntese das
concepções de Matemática Financeira demonstradas pelos mesmos.
Tabela 1: representação de informações sobre concepções dos sujeitos
Concepção
Freqüência:
anterior
intervenção
Porcentage
m
Freqüência:
posterior
intervenção
Porcentagem
Relacional:
relaciona teoria e
prática
02 2% 57 54%
Instrumental:
fórmulas, equações,
quatro operações,
etc.
36 34% 05 5%
11
“Outros”: apenas
aplicação cotidiano. 50 47% 35 33%
“Outros”: apenas
conteúdo. - - 09 8%
“Outros”: não se
refere à matemática 18 17% - -
Total 106 100% 106 100%
Para a caracterização das concepções de Matemática Financeira dos alunos, e na
tentativa de minimizar os efeitos da subjetividade, fundamentamos-nos em Skemp
(1976), que define em aprendizagem matemática instrumental ou relacional. Rezende
(2004), que também investigou as concepções de aprendizagem matemática, de
matemática e do pensar matemático de alunos de Cálculo de cursos de engenharia,
apresentando a seguinte categorização das concepções de matemática dos alunos; (i)
matemática são números, regras e fórmulas; (ii) matemática são números, regras e
fórmulas que podem ser aplicadas para resolver problemas; (iii) matemática é um
sistema lógico complexo, uma maneira de pensar; (iv) matemática é um sistema lógico
complexo que pode ser usado para resolver problemas complexos; (v) matemática é um
sistema lógico complexo que pode ser usado para resolver problemas complexos e
possibilita novo “insight” para entender o mundo.
Adotamos a mesma classificação de Rezende (2004), no âmbito do contexto da
Matemática Financeira, que agrupou tais categorias em dois grupos correspondendo a
uma concepção de matemática instrumental (i e ii) e outra relacional (de iii a v).
Entendemos que, os resultados da Tabela 1, permitiram obter evidências favoráveis, este
resultado pode ser explicado pela dinâmica das nossas aulas. Muitas das atividades
apresentadas para os alunos propunham que as mesmas fossem desenvolvidas em
grupos, para que pudessem discutir e socializar os conceitos abordados em sala de aula.
Contamos com problemas sobre porcentagem, juros simples e juros compostos
relacionados nos fascículos destinados ao trabalho com Matemática Financeira, do
Projeto Escola e Cidadania (SCORDAMAGLIO, VASCONCELOS & CÂNDIDO,
12
2000), um material didático destinado aos alunos do Ensino Médio, a partir de uma
perspectiva para atender os princípios da contextualização e da interdisciplinaridade.
Este material deve ser trabalhado pelo professor, o qual recebe um “Manual” que
contém detalhadamente as ações para a prática em sala de aula, conta também com o
Livro do Educador, que tem como objetivo auxiliá-lo na compreensão das propostas
didático-pedagógicas expostas no PEC (Projeto Educação e Cidadania Todos) e com
revistas fascículos que contém várias atividades para serem abordadas em sala de aula.
Nesta proposta metodológica inovadora, segundo as autoras, “partimos sempre daquilo
que interessa ao aluno, do que é presente no seu cotidiano, para depois introduzir o
conhecimento sistematizado”.
Nossos resultados, como os de Rezende (2004), indicam que as concepções dos alunos
podem influenciar na aprendizagem matemática.
A investigação, de natureza qualitativa, teve por base o estudo de caso. Assim, para o
presente artigo foram realizados dois estudos de caso, de um total de 106 alunos
pesquisados. A escolha dos dois alunos foi em virtude do nosso objetivo ser o estudo
detalhado de um caso específico e da comparação desse caso com outros estudados
igualmente com grande detalhe. Através de observações em sala de aula, escolhemos
um aluno com perfil pró-ativo e outro com perfil irreverente. A seguir, é feita uma
análise das concepções professadas pelos dois alunos para explicar diferenças-chave
antes da nossa intervenção e posterior a mesma.
Embora o aluno tenha demonstrado algum conhecimento de Matemática Financeira,
explicitou uma concepção de matemática instrumental, decorrente pela presença das
seguintes expressões: fórmulas, cálculos, adição, multiplicação, divisão e subtração. O
aluno pode ter aprendido mecanicamente vários conceitos de Matemática Financeira.
Skemp justifica que, no nível de compreensão instrumental, o indivíduo só consegue
resolver questões, mecanicamente.
Figura 2:_1º. Mapa Conceitual-anterior à intervenção: (Elaborado pelo aluno Diego).
Figura 3: 1º. Mapa Conceitual-anterior à intervenção: (Elaborado pelo aluno Rômulo).
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Os termos expressos pelo aluno: números, calcular, letras, fórmulas, cifrões, chatice,
problemas, porcentagem, casas decimais, vírgulas, e, frações. Percebemos pelas
palavras ditas, que conteúdos matemáticos específicos relacionados à Matemática
Financeira, tais como: acréscimo, desconto, juros simples e juros compostos , não foram
mencionados pelo aluno, exceto porcentagem. Entretanto, também a palavra “chatice”
que esta relacionada à afetividade é citada. Isso nos remete para uma orientação de
significado amplo para a idéia de concepção na linha de Schoenfield (1992) definida
como “compreensões e sentimentos individuais que moldam as formas como cada um
conceptualiza e se envolve no comportamento matemático” (p. 358)
Figura 4:_2º. Mapa Conceitual - posterior intervenção (Elaborado pelo aluno Diego).
Desta vez o aluno, apresenta uma visão mais relacional de Matemática Financeira,
sinalizada pela tentativa de relacionar o conteúdo estudado às aplicações de situações
reais. Para Skemp, o indivíduo alcança o nível de compreensão relacional na
aprendizagem de conceitos matemáticos quando é capaz de resolver um grande número
de atividades com rapidez e inteligência, justificando as respostas.
Figura 5: 2º. Mapa Conceitual - posterior intervenção (Elaborado pelo aluno Rômulo).
Posterior a intervenção o aluno apresentou uma “mudança” de concepção quando pensa
em Matemática Financeira. Descreve aplicações a situações do dia a dia, porém não
demonstra relacioná-las aos conteúdos estudados.
A terceira fase; neste momento os alunos construíram o mapa conceitual sobre a
temática Matemática financeira em grupo. As análises destes mapas permitiram
observarmos que os indicadores de concepções de Matemática Financeira dos alunos
foram ampliados.
Questionário
Ainda um quarto tipo de procedimento metodológico foi desenvolvido: um questionário
final foi elaborado e aplicado para os alunos com o objetivo de investigar a visão dos
mesmos posteriores ao nosso estudo compartilhado, e confrontar as informações
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fornecidas pelos próprios alunos com as concepções obtidas nas observações dos mapas
conceituais. Sua aplicação ocorreu na última semana de novembro de 2005.
O mesmo foi composto de 04 (quatro) questões abertas para que os sujeitos pudessem
comentar o que sabem e como definem Matemática Financeira, e em linhas gerais que
contribuições acreditam que a mesma trouxe para a vida pessoal deles.
1) Você sabe o que é Matemática Financeira? Defina.
2) Você considera importante estudar o conteúdo de Matemática Financeira no ensino
médio? Por quê?
3) Que contribuições o estudo de Matemática Financeira trouxe para sua vida pessoal?
4) As utilizações do recurso do computador e da calculadora facilitaram na resolução
das atividades referente á Matemática Financeira? Por quê?
Figura 6: Respostas do questionário (Elaborado pelo aluno Rafael)
5. Considerações finais
Os resultados obtidos permitem verificar concepções de alunos da 3ª. Série do ensino
médio envolvidos nesse processo. A análise dos mapas conceituais elaborados pelos
alunos permitiu identificar sinalizadores textuais das concepções de Matemática
Financeira, classificadas segundo os critérios e referenciais teóricos expressos.
Os resultados demonstram mudanças de concepções dos alunos frente ao conteúdo de
Matemática Financeira. Entendemos que os resultados positivos devem ter ocorridos em
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virtude da união de estratégias de ensino aprendizagem, contexto histórico-cultural e
uso de tecnologias da informação.
Dentre as limitações deste trabalho é preciso destacar que, embora tenha sido realizado
estudo de caso com dois alunos, onde se verifica mudanças de concepções, a análise
específica do questionário final aplicado para todos os alunos da 3ª. Série do ensino
médio que compõe nossa amostra, permite algumas generalizações, isto é, sobre qual a
visão dos alunos a respeito do uso do computador e da calculadora, como instrumentos
auxiliares no estudo de Matemática Financeira.
Recomenda-se para estudos futuros, um trabalho que investigue o ensino de todos os
tópicos de Matemática Financeira. Este estudo poderia buscar analisar exaustivamente
dentro do âmbito de concepções, contextualização e o uso da tecnologia da informação
como mais um recurso pedagógico. Igualmente, recomenda-se também a utilização da
metodologia de mapas conceituais como instrumento de avaliação de aprendizagem.
Referências Bibliográficas
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experiência de projeto Mat.789, Tese de Doutorado, Universidade de Lisboa, 1994.
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D’AMBROSIO, U. Etnomatemática: Arte ou Técnica de Explicar ou Conhecer. São
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