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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARCURSO DE ESPECIALIZAO EM FORMAO DE TRADUTORES
A traduo de referncias culturais na dublagem
de Everybody Hates Chris
Gregrio Magno Viana Oliveira
Maio/2011
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GREGRIO MAGNO VIANA OLIVEIRA
A TRADUO DE REFERNCIAS CULTURAISEM EVERYBODY HATES CHRIS
Monografia apresentada como requisitopara a concluso do Curso deEspecializao em Formao deTradutores da Universidade Estadual doCearUECEOrientadora:Prof. Dr. Vera Lcia Santiago Arajo
FORTALEZA2011
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Dados Internacionais de Catalogao na PublicaoUniversidade Estadual do Cear
Biblioteca Central do Centro de Humanidades
O48t Oliveira, Gregrio Magno VianaA Traduo de referncias culturais na dublagem de Everybody
Hates Chris/Gregrio Magno Viana Oliveira.Fortaleza, 2010.49 f. : enc. ; 30 cm.
Monografia (Especializao) Universidade Estadual do Cear,Centro de Humanidades, Curso de Especializao em Formao deTradutores, Fortaleza, 2010.
Orientao: Prof.Ps-Dra. Vera Lcia Santiago Arajo.
1.Traduo2.Dublagem3.Referncias Culturais4.Estrangeirizao5.Domesticao. I.Ttulo.
CDD:418.02
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Gregrio Magno Viana Oliveira
A TRADUO DE REFERNCIAS CULTURAISEMEVERYBODY HATES CHRIS
Trabalho de Trmino de Cursosubmetido Coordenao do Curso dePs-Graduao em Formao de
Tradutores como requisito bsico para aobteno do grau de Especialista emFormao de Tradutores daUniversidade Estadual do Cear.
Orientao:Prof. Dr. Vera Lcia Santiago Arajo
Aprovada em 30/05/2011
BANCA EXAMINADORA
_______________________________________________Profa. Dra. Vera Lcia Santiago Arajo (orientadora)
Universidade Estadual do Cear
_______________________________________________Profa. Ms. Maria da Salete NunesUniversidade Estadual do Cear
_______________________________________________Prof. Ms. Slvia Malena Modesto Monteiro
Universidade Federal do Cear
Maio2011
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H apenas dois [mtodos de traduo]. Ou o tradutor deixa o
autor em paz, tanto quanto possvel, e move o leitor na direo dele;
ou deixa o leitor em paz, tanto quanto possvel, e move o autor na
direo dele.
Friedrich Schleiermacher
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo analisar a traduo de referncias culturais na
dublagem da srie de TV americana Everybody Hates Chris, de Chris Rock e Ali
LeRoi. A srie mostra um tpico jovem negro americano crescendo na parte pobre da
cidade de Nova York nos anos 1980. Consequentemente, h muitas referncias cultura
daquela poca de daquele local, o que representa um desafio para a dublagem, que no
dispe de recursos que as modalidades escritas de traduo geralmente dispem.
Primeiramente, descrevemos o procedimento de dublagem de filmes. Em seguida,
discutimos como a questo cultural abordada dentro da traduo. A anlise da
dublagem se baseou nas teorias de traduo propostas por John Catford, Eugene Nida e,
principalmente, Lawrence Venutti. Dessa forma, as ocorrncias de traduo de
referncias culturais foram classificadas em cinco categorias diferentes, todas variando
desde a estrangeirizao at a domesticao.
PALAVRAS-CHAVE: traduo, dublagem, referncias culturais, estrangeirizao,
domesticao.
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ABSTRACT
This paper aims to analyze the translation of cultural references in the dubbing of the
American TV series Everybody Hates Chris, by Chris Rock and Ali LeRoi. The series
shows a typical young black American growing up in a poor New York City
neighborhood in the 1980s. Consequently, there are many references to the culture of
that time and place, which represents a challenge to dubbing professionals, which do not
have the same resources used in written translation. First, we describe the film dubbing
procedure. Then, we discuss how the cultural question is approached within translation
theories. The analysis of dubbing was based on the translation theories put forward by
John Catford, Eugene Nida and especially Lawrence Venutti. Thus, the occurrences of
cultural reference translation were classified into five different categories, all ranging
from foreignization to domestication.
Keywords: translation, dubbing, cultural references, foreignization, domestication.
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SUMRIO
Introduo.................................................................................................................................... 7
Captulo 1: Fundamentao terica........................................................................................... 12
1.1 A dublagem..................................................................................................................... 12
1.2 Os procedimentos tradutrios da dublagem................................................................. 13
1.2.1 Preparao do roteiro................................................................................................ 14
1.2.2 Escalao do diretor de dublagem e dos atores........................................................ 15
1.2.3 A escolha dos dubladores........................................................................................... 16
1.2.4 Gravao em estdio.................................................................................................. 17
1.2.5 Mixagem..................................................................................................................... 17
1.3 A questo cultural dentro da teoria da traduo.......................................................... 18
Captulo 2: Metodologia............................................................................................................. 23
2.1. Constituio do corpus................................................................................................... 23
2.2. Anlise da dublagem...................................................................................................... 24
Captulo 3: A traduo de referncias culturais em Everybody Hates Chris......................... 25
3.1. Tipo A (expresses mantidas como no original)........................................................... 25
3.2. Tipo B (expresses substitudas por outras em lngua inglesa).................................... 28
3.3. Tipo C (uso de hipernimos).......................................................................................... 31
3.4. Tipo D (domesticao).................................................................................................... 39
3.5. Tipo E (expresses no relacionadas)............................................................................ 40
3. Consideraes Finais.......................................................................................................... 47
4. Referncias......................................................................................................................... 49
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Introduo
grande o nmero de sries de TV americanas exibidas no Brasil. Uma
rpida pesquisa na programao das trs principais redes de TV aberta do pas
permite-nos constatar que, atualmente, nada menos que 42 sries esto em
exibio1. A razo para tal nmero a audincia que as sries conquistam. O
sucesso delas, especialmente com o pblico jovem, inegvel. Legies de fs
seguem quase que religiosamente os episdios, assistindo-os avidamente e
aguardando com ansiedade o incio de cada nova temporada. Fruns online e
websitesso criados para dar vazo curiosidade e para manter os fs atualizados
quanto s ltimas notcias dos seus seriados favoritos. E ainda h a revolta e
indignao geral quando uma srie cancelada, tem sua transmisso interrompidano Brasil ou quando algo (horrio/frequncia, dublagem, etc.) no agrada aos fs.
A enorme popularidade dessas produes audiovisuais contribui de
maneira significativa para a assimilao de aspectos prprios da cultura dos Estados
Unidos. Mesmo que de maneira inconsciente, grande parte dos fs acaba se
familiarizando com aspectos da cultura americana de tal forma que passam a
compreender e at a usar grias, expresses, piadas e gestos dessa cultura. A
traduo serve, assim, de canal para essa transmisso cultural. Como afirmamMartins & Salgueiro, aprtica tradutria colabora como importante ferramenta de
impulso para que as culturas no se limitem s suas fronteiras geogrficas. (p.2)
O impacto causado pela traduo, na verdade, vai alm da simples
assimilao de elementos culturais do pas de origem. Ele acaba influenciado a
maneira como um pas visto por outro, criando, para a cultura-alvo, uma imagem
da cultura-fonte. Nas palavras de Venuti (1995), a traduo tem um enorme poder
na construo de identidades nacionais para culturas estrangeiras2. (p.19)
Os filmes dublados, mais especificamente, acabam sendo um veculo
ainda mais eficiente nessa transmisso, como afirma Whitman-Linsen (1992): no
que diz respeito ao impacto, no h dvida de que a exposio do pblico a filmes
dublados muito superior de tradues escritas3. (p.10)
1Das quais 34 so exibidas pelo SBT, 6 pela Record e 2 pela Globo.
2Translation wields enormous power in constructing representations of foreign cultures.(Todas
as tradues no referenciadas neste trabalho so de minha autoria.)3 As far as impact is concerned, there is no question that the exposure of dubbed films to the
public far outstrips that of translated written material.
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A indstria da dublagem [...] imensamente responsvel pela maneira comoum pas visto por outro. [...] O que geralmente se ignora que a indstriade dublagem que lida com esses filmes que, em ltima instncia, faz afiltragem cultural. A dublagem tem o poder de representar e deturpar,distorcer, persuadir, e, em geral, dar uma tremenda contribuio (positiva ounegativa) imagem dos Estados Unidos no exterior.4(WHITMAN-LINSEN,
1992, p. 11)Apesar desse enorme impacto, poucos estudos abordam a importncia
da dublagem nos intercmbios culturais. Ainda segundo Whitman-Linsen (1992),
no se menciona a dublagem em seu papel como mediadora de trocas
interculturais, em suas funes educativas, sua importncia na promoo da
comunicao artstica e sua contribuio arte cinematogrfica.5 (p. 10) Esse
papel, ao mesmo tempo em que uma das contribuies culturais da dublagem,
constitui um dos seus principais desafios: como transmitir uma mensagem entreculturas, em geral, bastante diferentes -- transferir essa inteno artstica de forma
que ela possa ser adaptada a um novo ambiente um dos obstculos frente de
todos aqueles envolvidos no processo de dublagem.6(WHITMAN-LINSEN, 1992,
p. 15)
O que despertou o interesse para esta pesquisa foi a indagao sobre de
que forma esses aspectos culturais, muitas vezes to especficos da cultura-fonte,
so traduzidos para o pblico da cultura-alvo. De acordo com Whitman-Linsen(1992), o filme tem uma expresso esttica enraizada em um ambiente
culturalmente limitado, parte da funo conotativa do filme. Em outras palavras, o
ambiente cultural contribui para a construo do significado do filme como um
todo. Tal ambiente pode ser percebido no apenas pelas imagens, mas tambm
pelas falas dos personagens, que transmitem aspectos que muitas vezes so cruciais
para se entender as estrias e o contexto em que elas ocorrem. Muitas vezes,
contudo, tais aspectos so to especficos da cultura-fonte que apenas algum que
tenha razovel familiaridade com ela consegue perceber o significado de algumas
cenas em particular.
4The dubbing industry [] is greatly responsible for the way one country is viewed by another.[] What is often overlooked is that it is the dubbing industry handling these films whichultimately does the cultural filtering. Dubbing has the power to represent and misrepresent,distort, sway, and in general make tremendous contribution (positive or negative) to Americasimage abroad.5Yet no mention is made of dubbing in its role as a mediator of intercultural exchanges, in its
educational functions, its importance in promoting artistic communication, and its contribution to
cinematic art.6Transferring this artistic intent so that it can be adapted to the new environment is one of the
highest hurdles facing all those involved in the dubbing process.
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Isso traz a traduo para o primeiro plano, pois atravs dela que a
maioria dos fs pode ter acesso ao contedo dessas obras.Contudo, sabemos que a
traduo audiovisual, especialmente a dublagem, apresenta uma srie de restries,
como a necessidade de sincronismo com os movimentos labiais dos personagens na
tela e a impossibilidade de recorrer a explicaes adicionais (como as notas de
rodap nos livros). Consequentemente, relevante analisar como essas tradues
so feitas, que procedimentos so adotados e, em especial como as dificuldades so
superadas.
Whitman-Linsen (1992) aborda o problema da transmisso de
referncias especficas de uma cultura para outra, atravs da dublagem. Segundo a
autora, os tradutores geralmente adotam solues variadas. Em geral, mantm-se as
referncias cultura-fonte quando estas contribuem para a compreenso do meio
scio-cultural (milieu) local. A disseminao do cinema americano pelo mundo
afora to abrangente que algumas expresses podem ser mantidas como no texto
de partida (Whitman fala de high school promse drive-ins) sem nenhum prejuzo
para o contedo. A autora ainda argumenta que s h mudana no sentido estrito;
caso a noo de contedo tambm englobe as funes pragmticas e contextuais
das falas, ento o sentido mantido (p.128-129).
Quando no h um correspondente na lngua-alvo e o tradutor no quer
colocar a referncia, por achar que no far sentido para o pblico-alvo, geralmente
uma explicao explicitando o significado da expresso colocada no texto.
Whitman (ibid.) taxativa ao condenar essa como a pior soluo possvel,
principalmente quando a referncia usada para um efeito humorstico: de todos
os crimes cometidos contra os espectadores de filmes dublados, esse um dos mais
assombrosos.7(p. 131).
Quanto a referncias mais explicitamente ligadas cultura, Whitmandefende que, caso o pblico-alvo no tenha familiaridade com o referente, no faz
qualquer sentido deix-las na verso dublada. Whitman afirma que o ideal seria
encontrar algum tipo de expresso semelhante na lngua de chegada, algo que
suscite uma resposta parecida. Mesmo assim, ainda alerta certo risco:
O perigo em todas essas adaptaes que, justamente porque elas so re-esculpidas para caberem na frma de um ambiente cultural estrangeiro, outro,
7
Of all the crimes perpetrated against viewers of dubbed films, this is one of the mostmonstrous.
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e substituir referncias originais por outras conhecidas do novo pblico, asassociaes podem ficar distorcidas e o teor do filme comprometido. (p.136)
No caso da dublagem de sries americanas para o Brasil, pode-se notar,
de maneira geral, que algumas das abordagens mencionadas so adotadas. s
vezes, o tradutor usa uma expresso da lngua de partida no texto traduzido,
deixando para o espectador a tarefa de decifr-lo. Outras vezes, certas expresses
so substitudas por outras relacionadas cultura brasileira. H, ainda, ocasies em
que o tradutor parece temer que o pblico, por desconhecer tais expresses, deixe
de captar a mensagem a ser transmitida e acabe ficando frustrado. Nesses casos, a
dublagem apaga tais aspectos. Essa estratgia acaba criando textos que
subestimam a capacidade de compreenso do telespectador, alm de diminurem a
representao da cultura-fonte atravs da lngua-alvo.A opo de se traduzir ou no tais traos, to caractersticos de uma
cultura, quando se tenta transmitir a mensagem para um pblico de uma cultura
diferente pode determinar o modo como o pas da cultura-fonte visto pelo pblico
da cultura-alvo. Segundo Venuti (1995),
O objetivo da traduo recuperar o outro cultural como o mesmo, oreconhecvel, at mesmo familiar, e esse objetivo sempre corre o risco deuma domesticao integral do texto estrangeiro, geralmente em projetosaltamente inseguros, nos quais a traduo est a servio de uma apropriao
de culturas estrangeiras para pautas culturais, econmicas, polticasnacionais.8(p. 18-19)
A omisso de certos traos culturais pode contribuir para a quebra de
paradigmas j estabelecidos e tidos como verdadeiros pelo pblico de outra cultura.
Assim, a traduo pode reforar a viso estereotipada de uma cultura, ou, pelo
contrrio, ajudar a estabelecer outra viso, mais justa e prxima da realidade.
Nosso questionamento busca, justamente, mostrar que atitude o tradutor
geralmente toma quando se depara com tais situaes. Neste trabalho, analisaremos
a traduo de referncias cultura americana na dublagem brasileira da srie de TV
norte-americana Everybody Hates Chris. Por meio da comparao da dublagem
com as falas originais em ingls, podemos notar que, muitas vezes, essas
referncias s fazem sentido para o pblico americano e, portanto, perdem
significado quando traduzidas literalmente para o portugus. Nosso objetivo
8The aim of translation is to bring back a cultural other as the same, the recognizable, even the
familiar; and this aim always risks a wholesale domestication of the foreign text, often in highlyself-conscious projects, where translation serves an appropriation of foreign cultures fordomestic agenda, cultural, economic, political.
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verificar que solues so adotadas com mais frequncia pelo tradutor e se essas
solues tendem a transmitir ou a omitir as referncias cultura americana.
Neste trabalho, pretendemos, portanto, verificar quais dessas
abordagens so adotadas com mais frequncia na dublagem da srie supracitada,
bem como, a partir dessa anlise, identificar tendncias da dublagem de referncias
culturais em geral.
Este trabalho est dividido em trs captulos. No primeiro,
conceituaremos o processo de dublagem, faremos um breve histrico do seu uso e
abordaremos seus objetivos, bem como analisaremos como a questo da
transferncia cultural abordada dentro das principais teorias de traduo. No
segundo captulo, trataremos da metodologia da nossa pesquisa e dos
procedimentos tcnicos do processo de dublagem. No ltimo captulo, tentaremos
demonstrar, atravs de exemplos, quais atitudes tradutrias so mais adotadas e de
que forma elas contribuem para a estrangeirizao ou domesticao do texto de
partida.
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Captulo 1: Fundamentao terica
1.1A dublagem
A dublagem o processo atravs do qual a voz de um ator/atriz,
gravada com sua imagem em um filme, substituda pela voz gravada de outro(a),
o(a) dublador(a), em outra lngua. Whitman-Linsen (1992) a descreve como o
processo cinematogrfico pelo qual uma voz colada, depois do fato, a um ator
falante visvel na tela9 (p.12). Para Chaume (2004), a dublagem consiste na
traduo e ajuste de um roteiro de um texto audiovisual e a posterior interpretao
desta traduo por parte dos atores, sob a direo do diretor de dublagem e os
conselhos do assessor lingustico, quando este existe10 (p. 32). Esse processo
envolve uma srie de procedimentos tcnicos. Neste trabalho, apesar de
descrevermos brevemente certos aspectos tcnicos, discutiremos mais
enfaticamente os aspectos tericos desse tipo de traduo.
O principal objetivo da dublagem tornar uma obra audiovisual
estrangeira acessvel a um pblico que no domina a lngua na qual a obra foi
produzida. Sabe-se, no entanto, que o processo j foi usado diversas vezes e em
vrios pases com o intuito de distorcer a mensagem original contida na pelcula.Esse foi o caso da Alemanha, da Espanha e do Japo, na dcada de 1930, onde os
regimes ditatoriais criaram leis que limitavam ou impediam a transmisso de filmes
estrangeiros (principalmente americanos), eliminando, na dublagem, tudo aquilo
considerado ofensivo para o regime. Diferentemente da legendagem, a dublagem
permite que contedos sejam adicionados ou omitidos sem que o espectador
perceba, pois trabalha com o apagamento da trilha sonora do texto de partida. O
suposto objetivo, nesses casos, era proteger a lngua e o patrimnio cultural de cadapas. Contudo, a realidade revela o temor de que a difuso de produes
estrangeiras ameaasse o totalitarismo desses regimes (CHAUME, 2004, p. 50).
Tais episdios mostram a influncia da traduo audiovisual sobre as culturas dos
pases onde ela veiculada.
9It is the process of cinematography by which a recorded voice is glued, after the fact, to avisible speaking screen actor.
10
El doblajeconsiste en la traduccin y ajuste de un guin de un texto audiovisual y la posteriorinterpretacin de esta traduccin por parte de los actores, bajo la direccin del director dedoblaje y los consejos del asesor lingustico, cuando esta figura existe.
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Nos primrdios do cinema, os grandes estdios americanos abriram
filiais em vrios pases, onde atores locais eram contratados e as produes eram re-
filmadas, cena a cena. Essa prtica, no entanto, mostrou-se demasiadamente
onerosa, e foi abandonada logo que a tecnologia possibilitou a substituio das
vozes originais da pelcula por outras gravadas posteriormente. Como destaca
Whitman Linsen (1992), a prtica da dublagem que surgiu naquela poca
sobreviveu at hoje, talvez com alguma mudana tcnica, mas sem mudanas
conceituais significativas.11
Atualmente, a dublagem amplamente empregada em todo o mundo,
tendo, em muitos casos, preferncia sobre a outra modalidade de traduo
audiovisual mais popular, a legendagem. Chaume (2004) destaca a popularidade da
dublagem de filmes estrangeiros em pases como Espanha, Frana, Alemanha,
ustria, Itlia, Tailndia e Japo. As causas dessa preferncia vo desde a presena
de uma lngua dominante na cultura-alvo at o costume j estabelecido em cada
pas. Cabe ressaltar, tambm, como fator importante na escolha da modalidade de
traduo audiovisual, o nvel de letramento da populao. Quanto mais baixo esse
nvel, maior a resistncia legendagem.
No Brasil, podemos perceber que a dublagem a modalidade de
traduo audiovisual por excelncia na TV aberta. Raramente se v alguma outra
modalidade sendo aplicada, exceto quando se trata de documentrios ou entrevistas
concedidas em lngua estrangeira, nos quais predominam o voice-over, a
interpretao simultnea ou consecutiva e a legendagem. Podemos afirmar,
portanto, que a dublagem goza de vasta aceitao e popularidade.
1.2Os procedimentos tradutrios da dublagem
A dublagem composta de vrios procedimentos. Embora no haja
unanimidade, a maioria dos autores divide o processo em quatro ou cinco etapas.
Chaume (2004) faz um resumo dessas diferentes vises e apresenta as seguintes
etapas do processo de dublagem:
1. Compra do texto audiovisual estrangeiro;
2. Traduo (e eventuais adaptaes) do texto original;
3. Adaptao da traduo inicial;
11The practice of dubbing then emerged has survived until today, perhaps with technical, but nosignificant conceptual changes.
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4. Dramatizao;
5. Mixagem.
Chaume (2004) ainda afirma que, mesmo havendo discordncias entre
os autores quanto ao nmero exato e nomenclatura dessas etapas, todos parecem
estar de acordo em, pelo menos, diferenciar a parte puramente tcnica da parte
puramente tradutria e interpretativa. (p. 63)
1.2.1 Preparao do roteiro
Na Europa, o roteiro de uma dublagem parte, inicialmente, da traduo
do roteiro original, que fica, geralmente, a cargo de um tradutor. Essa traduo
servir de base para todo o restante do processo. Apesar dessa importncia, esse
tradutor raramente tem acesso ao filme. Tudo o que ele tem em mos umatranscrio dos dilogos, com apenas algumas indicaes do que est acontecendo
na tela. Como se pode esperar uma traduo adequada se o tradutor no tem acesso
a informaes vitais transmitidas atravs das imagens? Como o profissional vai
poder retratar, na traduo, informaes extra-lingusticas, como tom de voz,
expresses faciais, movimentos corporais? E as informaes lingusticas que
aparecem na tela na forma escrita, como cartazes, anncios, manchetes de jornal?
(WHITMAN-LINSEN, 1992, p. 105-106). Muitas vezes, essas informaes ssero acrescidas dublagem no momento em que os atores estiverem gravando suas
falas.
Alm disso, essa traduo enfrenta outras dificuldades. Como foi
traduzido sem o recurso s imagens do filme, esse texto inicial no atende s
exigncias fonticas e lingusticas da dublagem. Chaume (2004) cita alguns
problemas que poderiam surgir caso a traduo inicial no passasse por uma
adaptao. Dentre eles, problemas fonticos que podem afetar a correta dico dos
atores (cacofonias, palavras de pronncia difcil, termos estrangeiros sem
transcrio fontica), bem como dificuldades causadas pelo registro oral da
lngua-alvo e as diversas sincronias exigidas pela dublagem.
O ajuste desse texto geralmente feito por um roteirista. De posse da
traduo inicial, esse profissional deve reescrever o texto de tal modo que haja
sincronia labial entre as falas originais e as traduzidas. Gilbert et al. (apud
CHAUME, 2004) dividem esse ajuste em duas fases: sincronizao e adaptao. A
sincronizao consiste em fazer com que a durao e o movimento labial da frase
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na lngua de chegada [...] coincidam ao mximo com a durao e o movimento
labial da frase na lngua de origem, enquanto a adaptao tem a ver com o estilo
do roteiro e com a oralidade dos dilogos. O ajustador deve, assistindo ao filme,
verificar quais falas encaixam nos movimentos labiais dos atores, substituindo
aquelas que no atenderem a esse requisito. Tambm pode adaptar falas que no
soem naturais na lngua de chegada.
Chaume (2004) diz que geralmente so feitos trs tipos de ajuste:
a)O sincronismo labial, que a combinao dos movimentos dos
lbios dos atores na tela com as vozes gravadas em estdio. Alguns
tericos chegam a defender a substituio de certos fonemas da
lngua-fonte pelos mesmos fonemas na lngua-alvo (vogais abertas;
consoantes bilabiais e labiodentais, por exemplo);
b)O sincronismo cintico, que consiste em ajustar a voz do dublador
com os movimentos corporais do personagem na tela. Chaume
(2004) exemplifica afirmando que um personagem que balana a
cabea horizontalmente no pode emitir um sim, ou que outro que
leve as mos cabea deve emitir uma exclamao apropriada
(p.73).
c)O isossincronismo, que se trata do ajuste da durao das vozes
gravadas s vozes originais. Tanto Chaume (2004) quanto Whitman-
Linsen (1992) afirmam ser esta a modalidade de sincronia a
responsvel pela maior parte das crticas, pois nela qualquer erro
como um personagem cuja fala continua a ser pronunciada mesmo
depois que ele fecha a boca, ou um que continua a mover os lbios,
mas cuja fala no se escuta mais fica bastante evidente e causa
desconforto no pblico.No Brasil, o processo parecido, mas com uma diferena marcante. o
tradutor o nico responsvel pela confeco do roteiro. Alm de escrever todas as
falas, o tradutor brasileiro ainda faz o que se chama de espelho da dublagem. O
espelho serve como um guia para os atores e diretores de dublagem, pois para cada
lauda, ele indica quais os atores que gravaro naquele dia.
1.2.2 Escalao do diretor de dublagem e dos atores
Terminado o roteiro, ento so escalados os atores e o diretor de
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dublagem. Da mesma forma que um diretor cinematogrfico, o diretor de dublagem
tambm deve conduzir a atuao dos dubladores, informando-os que tipo de
emoo deve ser expressa e aconselhando-os, quando necessrio, quanto ao tom ou
nfase de certas passagens. Porm, esse profissional tambm desempenha tarefas
especficas de sua funo, como corrigir eventuais erros de pronncia dos
dubladores, substituir, no roteiro, palavras de pronncia difcil e escolher dublar
textos que aparecem escritos no original (cartazes, manchetes de jornal, etc.)
(Chaume, 2004, p. 75).
Alm disso, cabe a esse profissional a tarefa de selecionar os
dubladores, de forma a tentar encontrar aqueles cujas vozes sejam parecidas com as
dos atores que vo dublar. Essa tarefa se mostra especialmente importante quando a
voz original mantida em algumas partes do filme, como o caso em musicais.
Tenta-se, portanto, evitar o estranhamento do pblico quanto diferena entre as
vozes originais e a dublagem.
Muitas vezes, o diretor de dublagem no tem conhecimento da lngua-
fonte. Apenas por meio do roteiro, ele pode conhecer o enredo do filme. Mesmo
assim, o diretor ainda tem vantagem sobre os dubladores, pois esses, muitas vezes,
nem mesmo a histria conhecem. Gravam apenas suas falas, muitas vezes,
separadamente. este o pensamento de Avila (apud Chaume, 2004) que afirma que
a responsabilidade do todoo processo de dublagem recai sobre uma s pessoa,
qual se denomina diretor. (p.76)
1.2.3 A escolha dos dubladores
Os dubladores so profissionais cujas vozes gravadas substituiro as
vozes dos atores originais. Geralmente, so tambm atores. A legislao brasileira
exige o registro profissional de ator para dubladores.
Os critrios para escolha dos atores, nas palavras de Luyken (apud
CHAUME, 2004), so, muitas vezes, suas caractersticas vocais, como sotaque, tom
ou nasalidade, e sua nitidez na pronncia, bem como sua capacidade de
interpretao. Tambm se valoriza muito a autodisciplina e a humildade, que
permitem repetir as sequncias tantas vezes quantas necessrias, sem que, por causa
disso, o ator se incomode.12
12Los criterios de seleccin de actores suelen ser sus caractersticas vocales, como el acento,
tono o nasalidad, y su nitidez en la pronunciacin, as como la capacidad de interpretacin.
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Em pases como o nosso, onde a dublagem a principal modalidade de
traduo audiovisual na TV aberta, a identificao de atores estrangeiros com as
vozes de seus dubladores to significativa que a troca de dublador de um ator
conhecido pode causar rejeio do pblico ao filme (CHAUME, 2004, p. 78).
Para Kahane (apud Chaume, 2004), uma boa dublagem faz
desaparecer todas as diferena entre personagem, protagonista e dublador. Perante o
pblico, quer-se confundir todas as fronteiras. A marca da boa dublagem o
desaparecimento da fronteira. Aspira-se verossimilhana, ao make believetotal.13
(p. 77)
1.2.4 Gravao em estdio
Segundo Chaume (2004), os atores de dublagem so os encarregados dedar vida traduo, de encarnar os personagens. Alm de terem a mesma
habilidade de interpretao de atores de teatro ou cinema, enfrentam um desafio a
mais: dar voz a outro ser, o ator que aparece na tela. Por isso, devem estar atentos
aos trejeitos, movimentos e at mesmo respirao do personagem.
Outro desafio enfrentado pelos dubladores o desconhecimento da
histria a ser gravada. Muitas vezes, como j dissemos, os atores s tm acesso s
suas falas individuais, e as gravam separadamente, em estdios e at mesmo emperodos diferentes. Chaume (2004) argumenta que os dubladores, muitas vezes,
sequer tm uma noo global das falas dos seus prprios personagens. A entra a
figura do diretor, que pode, durante a gravao, fazer alteraes no roteiro, de
forma a facilitar o trabalho dos dubladores e dar mais verossimilhana cena.
1.2.5 Mixagem
Esta a ltima fase do processo de dublagem. Nela, um tcnico de som
combina as gravaes das vozes dos atores (que podem estar em at cinco faixas
diferentes) em uma s faixa. Alguns efeitos sonoros tambm podem ser
acrescentados ou ressaltados, caso o diretor ou o prprio tcnico julgue necessrio.
Asimismo, se valora mucho la autodisciplina y la humildad, que permite repetir las secuencias
tantas veces como sea necesario sin que, por ello, el actor se sienta mal.
13 () lo que se entiende por un buen doblage hace desaparecer toda diferencia entre
personaje, protagonista y doblador. Ante el pblico se quiere confundir toda frontera. La marca
de un buen doblage es la desparicin de la frontera. Se aspira a la merosimilitud, al makebelieve total.
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Alm disso, as vozes gravadas podem ser manipuladas, para ajust-las ao ambiente
da cena (que pode exigir vozes abafadas ou com eco, por exemplo).
1.3A questo cultural dentro da teoria da traduoA questo da teoria da traduo bastante polmica. A principal causa
disso que no h apenas uma teoria da traduo, mas vrias. Diversos estudiosos
j tentaram sistematizar essa atividade, uns com mais sucesso, outros com menos.
Trs dos que mais se destacarame que sero de relevncia para este trabalho
foram John C. Catford, Eugene Nida e Lawrence Venuti. Neste trabalho,
analisaremos como cada autor abordou, dentro de sua teoria, a questo da traduo
de aspectos culturais especficos. Antes disso, no entanto, precisamos discorrer
brevemente sobre os principais postulados de cada teoria.
Catford define a traduo como substituio de material textual em
uma lngua por material equivalente em outra lngua. Sua teoria centrada
justamente na busca por essa equivalncia, muito embora no esclarea
suficientemente esse conceito.
Para este trabalho, o ponto de interesse da teoria de Catford aquele em
que ele aborda a problemtica da traduo de termos que, por serem muito
especficos de uma cultura, no possuem um equivalente na lngua-alvo. De acordo
com essa teoria, tais termos so culturalmente intraduzveis. interessante notar
que, na tentativa de dar uma abordagem lingustica sua teoria, Catford esquece o
carter cultural dessas tradues?
Em muitos casos, pelo menos, o que torna 'intraduzveis' itens 'culturalmenteintraduzveis' o fato de o uso de qualquer equivalente de traduoaproximado no texto da lngua-alvo produzir uma colocao incomum nalngua-alvo. Falar de 'intraduzibilidade cultural' pode ser s mais umamaneira de falar de intraduzibilidade colocacional: a impossibibilidade de
encontrar uma colocao equivalente na lngua-alvo. E isso seria um tipo deintraduzibilidade lingustica. (CATFORD, 1965:101)14
Por outro lado, Nida, criador da teoria da equivalncia dinmica e
tradutor da Bblia, afirma que traduzir consiste em reproduzir na lngua receptora
o equivalente natural mais ntimo da mensagem na lngua-fonte, causando, no
14In many cases, at least, what renders 'culturally untranslatable' items 'untranslatable' is the
fact that the use in the TL text of any approximate translation equivalent produces an unusual
collocation in the TL. To talk of 'cultural untranslatability' may be just another way of talking
about collocational untranslatability: the impossibility of finding an equivalent collocation in theTL. And this would be a type of linguistic untranslatability.
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pblico-alvo, o mesmo efeito causado no pblico original. Segundo Carneiro
(2000), o objetivo de Nida descrever cientificamente o processo de transferncia
de uma lngua para outra (p.63).
As supostas prioridades do processo de transferncia, segundo Nida,
so:
1) o contedo tem que ser transferido a qualquer custo, com o mnimo dedistoro possvel; 2) importante transmitir a conotao e o impactoemocional da mensagem; 3) podem-se tambm transportar elementosformais, mas isso no prioritrio.
Apesar de recomendar o mnimo de distoro possvel, Nida sugere
que uma boa traduo deva se basear no chamado efeito equivalente, ou seja, a
mensagem traduzida deve causar nos seus receptores o mesmo efeito que a
mensagem original causou nos seus (apud CARNEIRO, 2000, p. 75), mas sem usar
os mesmos termos da cultura-fonte. Ao invs disso, o tradutor deve recorrer a
termos prprios da cultura-alvo. A caracterstica da traduo
seria a completa naturalidade de expresso e buscaria relacionar oreceptor com os modos de comportamento relevantes no contexto de sua
prpria cultura, em vez de insistir que ele compreenda os padres culturaisdo contexto da lngua-fonte para que compreenda a mensagem.(RODRIGUES, 2000, p.75-76)
Ao tratar do lxico das lnguas envolvidas, Nida aborda a questo de
elementos culturalmente diferentes e os divide em trs grupos, dos quais os dois
ltimos sero de interesse para nosso trabalho:
1) termos para os quais h paralelismo nas duas lnguas envolvidas; 2)termos que identificam objetos culturalmente diferentes, mas com funessimilares; e 3) termos culturalmente especficos. (RODRIGUES, 2000)
Quanto ao segundo grupo, Nida sugere que o tradutor use outro termo
que reflita a forma do referente, embora com funo no equivalente, ou um que
identifique a funo equivalente, custa da identidade formal (Nida apud
Carneiro, 2000, p.82).
Para exemplificar esse procedimento, sugere trocar, na traduo da
Bblia, nomes de moedas antigas (talentos ou denrios) por dlares, apenas
advertindo os tradutores para adequarem os montantes ao contexto. (Carneiro,
2000:83)
Contudo, Nida defende a manuteno de termos culturalmente
especficos (terceiro grupo), por considerar que certos termos esto de tal forma
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arraigados na prpria estrutura de pensamento em que a mensagem foi construda
(apud RODRIGUES, 2000, p. 81) que seria impossvel retir-los sem prejudicar a
transmisso do significado original. Mesmo assim, minimiza a dificuldade trazida
por tais termos ao considerar que todos os povos reconheceriam que outros povos
podem ter comportamentos diferentes e notas de rodap poderiam explicar essa
diversidade (id. ibid.). No entanto, o que fazer no caso das tradues audiovisuais,
nas quais impossvel aplicar esse recurso? Como declara Whitman-Linsen (1992),
nos filmes, as referncias culturais no podem recorrer s notas de rodap para
esclarecimentos, nem se pode acomodar explicaes longas em movimentos labiais
visivelmente mais curtos na tela.15(p.126)
Voltando ao pensamento de Nida, Carneiro (2000) defende que
Nida mostra, com suas afirmaes, acreditar ser possvel que um assuntopossa permanecer intocado pela relao interlingustica e interculturaldesencadeada pela traduo. Alm disso, parece crer na possibilidade deespelhamento de uma cultura em uma segunda lngua, relacionada a umacultura necessariamente diferente. (RODRIGUES, 2000:82)
Para Carneiro (2000), a primeira das questes levantadas pela maneira
como Nida trabalha a questo da equivalncia dinmica
sobre se realmente seria unnime a noo de que uma traduo tem que serlida como se fosse um original, ou seja, se efetivamente a melhor maneira detraduzir gerar um texto que no lembre o leitor de que ele est lendo umatraduo.
Como se pode notar, ambas as teorias abordadas acima acabam se
comprometendo no esforo de chegar ao conceito de equivalncia. Carneiro (2000)
diz que, nas propostas de Catford e Nida, esse conceito se fragmenta. Isso acontece,
em parte, porque suas teorias deixam de lado um dos aspectos essenciais para a
compreenso da traduo: as culturas envolvidas. Como afirma Agra (2007),
uma lngua natural um sistema de representao do mundo e de seuseventos e, para que ela possa dar conta disso, usa sinais cujos sentidos soespecializados em um cenrio que revela uma cultura.
Isso significa dizer que o desafio do tradutor no apenas achar a
equivalncia entre termos das duas lnguas, mas tambm considerar todo o
contexto em que a comunicao ocorre. A esto includos: o tempo e o local de
utilizao da lngua; o grupo social que a utiliza; a inteno do autor, entre outros.
15
Yet in film, cultural allusions cannot resort to footnotes for clarification nor can lengthyexplanations be accommodated in shorter visually perceived lip articulations on the screen.
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Tanto Catford quanto Nida, contudo, parecem ter ignorado tais fatores.
Opondo-se s idias de Catford e Nida, Venuti prope o conceito de
(in)visibilidade do tradutor. Esse autor defende veementemente que o tradutor
tem sido desvalorizado e esquecido e que uma das causas est justamente na atitude
que esse profissional adota nas suas tradues. Na tentativa de aumentar a aceitao
de um texto estrangeiro, o tradutor tenta faz-lo soar to natural ao pblico-alvo que
parea no ser uma traduo. Venuti (1995) argumenta que essa a atual tendncia
na traduo de textos para a lngua inglesa, mas, como poderemos verificar, isso
tambm ocorre na traduo para o portugus. Como revela Venuti (1995),
um texto traduzido [...] considerado aceitvel [..] quando lidofluentemente, quando a ausncia de quaisquer peculiaridades lingusticas ou
estilsticas o faz parecer transparente, dando a impresso de que ele reflete apersonalidade ou inteno do escritor estrangeiro ou o significado essencialdo texto estrangeiroem outras palavras, a aparncia de que a traduo no, de fato, uma traduo, mas o original.(p. 1)16
O grande problema, nesse caso, est em tentar retratar uma cultura
estrangeira nos termos e padres da cultura local, dando aos leitores a experincia
narcisista de reconhecerem sua prpria cultura em um outro cultural. (VENUTI,
1995, p.15). E, para conseguir esse efeito, o tradutor sacrifica o texto original,
reduzindo-o a representaes j conhecidas e consagradas pelo pblico-alvo. A esse
processo Venuti denomina domesticao, uma reduo etnocntrica do texto
estrangeiro para valores culturais da lngua-alvo.17(p.20)
Uma traduo domesticada pode gozar de imediata aceitao junto a um
pblico monolngue ou pouco exigente. Contudo, no caso de obras audiovisuais, a
discrepncia entre o ambiente mostrado pelas imagens e os significados
transmitidos pela dublagem torna-se evidente. Como aceitar como crvel, por
exemplo, dois adolescentes americanos que vivem na dcada de 80 fazendoreferncias ao futebol brasileiro?
Um argumento que provavelmente pode ser utilizado em defesa da
domesticao de que os termos estrangeiros no faro qualquer sentido para o
16A translated text [] is judged acceptable [] when it reads fluently, when the absence ofany linguistic or stylistic peculiarities makes it seem transparent, giving the appearance that itreflects the foreign writers personality or intention or the essential meaning of the foreign
textthe appearance, in other words, that the translation is not in fact a translation, but theoriginal.17
an ethnocentric reduction of the foreign text to target-language cultural values.
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pblico-alvo, deixando-os a ver navios em passagens que supostamente deveriam
causar algum tipo de reao. Na verdade, como j comentamos, essa a ideia
defendida, at certo ponto, por Whitman (1992). No entanto, essa mesma autora
alerta para os riscos dessas adaptaes, em alguns casos, quando afirma, por
exemplo, que o problema inerente dublagem que se corre o risco de derramar
um molho sem gosto sobre filmes de forte sabor sociocultural.18(p.136)
Venuti (1995) tambm alerta para os perigos da domesticao. Em sua
opinio,
Ao produzir a iluso de transparncia, uma traduo fluente disfara-se deequivalncia semntica verdadeira, quando, na verdade, inscreve o textoestrangeiro com uma interpretao parcial, [...] reduzindo-o, seno
simplesmente excluindo, a diferena que a traduo convidada atransmitir.19(p. 21)
Cary (apud WHITMAN-LINSEN, 1992) tambm segue a linha de
pensamento de Venuti, enfatizando o dilema sofrido pelo tradutor, ao indagar: Ao
fazer uma traduo, devemos nos prender ao original ao ponto de atingir oleitor
(ou ouvinte ou interlocutor) com uma transmisso deliberadamente fiel, ou
devemos naturalizar nossa verso para torn-la mais aceitvel?20(p.108)
deciso de manter uma verso deliberadamente fiel, Venuti (ibid.)
d o nome de estrangeirizao. o oposto da domesticao. Ou seja, mantm-se
os termos tal e qual esto no original, dando assim uma maior representao
cultura-fonte atravs da lngua-alvo. A estrangeirizao, torna o texto um lugar
onde um outro cultural se manifesta embora, obviamente, uma alteridade que
nunca pode se manifestar em seus prprios termos, apenas nos da lngua-alvo
(BERMAN apud VENUTI, 1995, p. 20). Uma traduo estrangeirizadora d
significado diferena do texto estrangeiro, mesmo que apenas perturbando os
cdigos culturais que prevalecem na lngua-alvo. (id.ibid.)
18The problem inherent in dubbing is that it runs the risk of ladling a nondescript gravy over
films of pungent socio-cultural flavor.19By producing the illusion of transparency, a fluent translation masquerades as true semantic
equivalence when it in fact inscribes the foreign text with a partial interpretation, [], reducingif not simply excluding the very difference that translation is called on to convey.
20
Doit-on, en traduisant, coller loriginal au point de heurter le lecteur (ou lauditer, oulinterlocuteur) par une transmission dlibrment fidle, ou doit-on naturaliser sa versionpour la rendre mieux acceptable ?
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Captulo 2: Metodologia
2.1.Constituio do corpus
Para este estudo, escolheu-se a srie americana Everybody HatesChris, produzida por CR Enterprises e 3 Arts Entertainment. uma srie cmica
inspirada na adolescncia do humorista Chris Rock. A histria se passa entre 1982 e
1987 no bairro de Bedford-Stuyvesant, Brooklyn, Nova York. O humorista narra
sua infncia em primeira pessoa e, ao mesmo tempo, retratado como adolescente
(terceira pessoa). Os outros personagens desse centro narrativo so: sua me
Rochelle, seu pai Julius, seus irmos Drew e Tonya, e seu amigo de escola Greg
Ulliger. A srie retrata os preconceitos dos quais Chris era vtima (principalmente
na escola, onde ele era o nico negro) e as dificuldades enfrentadas por uma famlia
negra e pobre nos EUA dos anos 1980.
A escolha dessa srie deu-se pelas seguintes razes: 1) uma srie que
retrata a cultura de um grupo tnico/social especfico dentro da cultura geral
americana. Esse fato nos fez vislumbrar a possibilidade de encontrar referncias
culturais para as quais no haveria equivalentes em portugus, o que, por sua vez,
nos fez indagar qual(is) estratgia(s) seria(m) usada(s) pela dublagem para superar
essa dificuldade; 2) a srie transmitida no Brasil por uma rede de TV aberta (a
saber, Rede Record), o que a faz ter uma audincia potencialmente grande; 3) o
humor da srie agrada pblicos de todas as faixas etrias e, embora sua temtica
seja voltada para o pblico juvenil, a srie tambm pode ser apreciada por crianas
e adultos. Finalmente, por constatarmos que a dublagem a categoria de traduo
audiovisual predominante na TV aberta brasileira, decidimos analisar a verso
dublada dessa srie, trabalho feito pelos estdios VTI21.
Inicialmente, pretendamos assistir a todos os episdios das duas
primeiras temporadas, pois consideramos que a anlise conjunta de temporadas
dubladas por estdios diferentes poderia influenciar a imparcialidade da pesquisa.
Iniciamos o trabalho, portanto, assistindo aos episdios da primeira temporada, em
ordem crescente. Porm, aps assistirmos aos 13 primeiros, notamos que o exguo
tempo para a concluso do trabalho no permitiria que vssemos todos os episdios
pretendidos. Portanto, alm dos treze primeiros episdios da 1 temporada,
21Apenas 1 e 2 temporadas; a dublagem das duas temporadas seguintes ficou a cargo doestdio ArtSound.
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inclumos o vigsimo-primeiro, pois, ao assistir casualmente, notamos uma
ocorrncia digna de anlise, bem como trs outros episdios da segunda temporada.
Estes ltimos foram selecionados aleatoriamente (com exceo do 6, por tambm
termos notado ocorrncias dignas de anlise ao assistir srie casualmente).
Ao final do trabalho, 14 episdios haviam sido assistidos, dos quais
foram extradas 42 ocorrncias de traduo de referncias culturais.
2.2.Anlise da dublagem
A anlise das ocorrncias de traduo foi feita da seguinte maneira:
primeiro, assistamos ao episdio original, com legendas em ingls. Ao notarmos
qualquer ocorrncia de referncia cultural especfica, a mesma cena era vista no
episdio dublado correspondente. Em seguida, decidamos como classificar cadatraduo (em um dos cinco tipos que veremos mais adiante). Aps isso, tomava-se
nota dos tempos e dos personagens envolvidos. Finalmente, os dilogos eram
transcritos e escrevia-se um breve resumo da cena, para ajudar na contextualizao.
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Captulo 3: A traduo de referncias culturais em Everybody Hates Chr is
Ao analisarmos a dublagem da srie, podemos notar que algumas
referncias culturais permanecem no texto de chegada. Isso geralmente ocorrequando os fatos ou pessoas a quem se referem so tambm conhecidos no Brasil,
embora haja algumas que o pblico provavelmente desconhece. Entretanto, muitas
referncias culturais so alteradas e acabam no refletindo a cultura-fonte (norte-
americana). Alm disso, nem sempre ocorre o mesmo tipo de alterao. Ou seja, em
certas ocasies, o tradutor tenta encontrar uma expresso semelhante na nossa
cultura; em outras, a traduo faz referncia a algo completamente diferente.
Baseados nessas diferenas, classificamos as tradues em cinco tipos:
A) as expresses so mantidas como no texto de partida, acrescentando-
se, eventualmente, uma explicao;
B) a expresso substituda por outra, mais amplamente conhecida,
apesar de ainda pertencer cultura inglesa;
C) apaga-se a expresso do texto de partida, colocando-se, em seu
lugar, um hipernimo;
D) tenta-se substituir as expresses por correspondentes na cultura
brasileira;
E) substitui-se as expresses por outras que tm pouca ou nenhuma
relao com o texto de partida.
Apesar de mencionarmos as tradues dos tipos A e B, interessa-nos,
aqui, descrever principalmente os tipos C, D e E, por considerarmos que, alm de
serem mais recorrentes, contribuem para a domesticao do texto de partida e,
consequentemente, com toda uma desvalorizao da cultura-fonte, como j
discutido anteriormente.
3.1.Tipo A (expresses mantidas como no original)
Apesar das vrias ocorrncias de domesticao, detectamos algumas
ocasies em que referncias potencialmente incompreensveis aos telespectadores
brasileiros so mantidas quase que na sua totalidade (tradues do tipo A). Tal tipo
de traduo ocorre, por exemplo, sempre que algum dos personagens faz meno a
Kunta Kinte, personagem principal do livro Roots: The Saga of an American
Family (1976), de Alex Haley, que conta a histria de um negro desde seu
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nascimento na frica, sua captura e venda como escravo para os Estados Unidos,
at a vida dos seus descendentes. Em 1977, a rede de TV ABC produziu e
transmitiu uma minissrie homnima baseada no livro, o que ajudou a popularizar a
imagem do afro-descendente americano. O personagem mencionado em dois
episdios da srieEverybody Hates Chris, como descrito a seguir.
O exemplo 1 mostra a primeira ocorrncia desse tipo de traduo. No
sexto episdio da primeira temporada, intitulado Everybody Hates Halloween,
Chris lembra a poca em que saa com os irmos para pedir doces ( trick or
treating) no feriado. Ao relembrar a fantasia que estava usando, Chris (narrador)
comenta:
EXEMPLO 1TEMPORADA: 1 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates Halloween)TEMPO: 00:3200:36 TIPO: A
ORIGINAL DUBLAGEM(If you think that's bad, you should'veseen the year I was Kunta Kintes foot.)
(Se achou isso um mico, devia me ver no anoque imitei Kunta Kinte, de Razes)
A referncia ao p de Kunta Kinte deve-se ao fato de, no livro, o
personagem, aps ser capturado em sua quarta tentativa de fuga, ter que escolher,
como punio, ser castrado ou ter o p cortado. Ele escolhe a segunda opo, que
executada por seus captores. Como se pode notar, a dublagem manteve a refernciaparcialmente, e ainda acrescentou uma explicao.
No dcimo-primeiro episdio da primeira temporada, intitulado
Everybody Hates ChristmasCaruso, o bully da escola onde Chris estuda (e da
qual este o nico aluno negro), faz um comentrio preconceituoso depois de
derrubar o personagem principal no corredor. A dublagem, apesar de omitir a
primeira referncia (tipo D), deixou a segunda.
EXEMPLO 2
TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: A
ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (para Chris): Happy Kwanzaa ,Kunta Kinte.
Feliz Natal, Kunta Kinte.
Duas ocorrncias da traduo do tipo A esto presentes no sexto
episdio da segunda temporada (Everybody Hates the Buddy System). Aps ver
Caruso espancando Chris, o Sr. Evans, diretor da escola, convoca-os para uma
conversa. Ironicamente, ele libera Caruso e tentar convencer Chris de que este o
22Festival de cultura afro-americana que vai de 26 de dezembro a 1 de janeiro.
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responsvel por tal tratamento. O narrador, em seu comentrio, faz referncia a
Rodney King (1965-), afro-americano que, em 1991, foi espancado por policiais em
Los Angeles. O incidente foi filmado por um cidado e o vdeo foi transmitido
centenas de vezes no s nos EUA, mas em todo o mundo, causando indignao
geral do pblico. A referncia preservada na traduo.
EXEMPLO 3TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 01:19 - 01:26 TIPO: A
ORIGINAL DUBLAGEMMr. Evans: Have you ever consideredthe possibility this is your fault?Chris (narrador):That's what they said toRodney King.
J considerou a hiptese de ser sua culpa?(Foi o que disseram ao Rodney King.)
O outro caso ocorre quando Chris e Caruso, que foram obrigados a ficar
sempre juntos durante uma excurso da escola a um museu, acabam perdendo o
nibus de volta. Eles discutem como vo chegar novamente escola. Caruso insiste
em dizer que ele deve dar as ordens e faz referncia ao filme Silver Streak (O
Expresso de Chicago), comdia estrelada por dois atores: um branco (Gene
Wilder) e um negro (Richard Pryor). A dublagem foi praticamente literal.
EXEMPLO 4TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO:10:4010:45 TIPO: A
ORIGINAL DUBLAGEMCaruso: Gene Wilder made all thedecisions in Silver Streak. Richard Pryorjust followed orders.
Gene Wilder tomou as decises em OExpresso de Chicago. Richard Pryorobedeceu ordens.
Mais uma ocorrncia de traduo do tipo A pode ser encontrada no
dcimo episdio da primeira temporada. Na cena, Rochelle, a me de Chris, est
fofocando para Julius, pai do personagem, que finge estar prestando ateno. As
referncias tambm foram mantidas integralmente.
EXEMPLO 5TEMPORADA: 1 EPISDIO: 10 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 06:3806:51 TIPO: A
ORIGINAL DUBLAGEMRochelle: Julius, you are not gonnabelieve this. But you know that girl JodyWatley that used to be on Soul Train?Well, I heard she's leaving the groupShalamar and starting a new group with
Ashford & Simpson.
Julius, voc no vai acreditar, t? Mas, sabeaquela tal de Jody Watley que cantava noSoul Train? Bom, eu soube que ela largou oconjunto Shalamar pra montar uma bandacom Ashford & Simpson.
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3.2.Tipo B (expresses substitudas por outras em lngua inglesa)
Nas tradues do tipo B, o tradutor, provavelmente por temer que o
telespectador no compreenda a referncia original, adota uma expresso da lnguainglesa, porm, mais amplamente conhecida. Embora as expresses adotadas
geralmente no tenham relao com os originais, mantm-se o sentido, de certa
forma. Alm disso, passa-se a falsa impresso de que o texto continua
estrangeirizado.
Aqui tambm temos que considerar as restries inerentes ao processo
de dublagem, como a exigncia de sincronismo labial e a durao das falas. Em um
ou outro caso, esses fatores podem ter sido decisivos no momento da traduo.
Podemos constatar esse tipo de traduo nas seguintes passagens. No
episdio Everybody Hates Food Stamps(1 temporada, episdio 9), Chris discute
com seu melhor amigo, Greg, e ambos acabam desfazendo a parceria para a
apresentao de um trabalho na Feira de Cincias da escola. Ao comentar a briga, o
narrador compara essa separao ao fim da dupla britnica Wham!, formada por
Andrew Ridgeley e George Michael. A dupla fez bastante sucesso tanto na
Inglaterra quanto nos EUA, desde 1982 at ser desfeita em 1986. O tradutor da
dublagem provavelmente considerou a dupla pouco conhecida no Brasil e, portanto,
optou por usar uma banda bem mais conhecida.
EXEMPLO 6TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2600:31 TIPO: B
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): It was like AndrewRidgeley leaving Wham!
(Era como se o Mick Jagger fosse largar osStones.)
Temos outra ocorrncia desse tipo de traduo no dcimo-primeiro
episdio da primeira temporada (Everybody Hates Christmas). Chris chega
bastante animado escola, pois est imaginando o presente que vai ganhar no
Natal. De repente, Caruso derruba-o e pisa em cima dele, sarcasticamente
desejando um Feliz Natal. O texto de partida, no entanto, faz referncia ao
Kwanzaa, festival de cultura afro-americana que vai de 26 de dezembro a 1 de
janeiro. Esse feriado foi criado na dcada de 1960 com o propsito de ser uma
alternativa dos negros ao Natal, considerado pela comunidade afro-americana uma
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celebrao de brancos cristos. Devido ao fato de ser pouco conhecido no Brasil, o
tradutor preferiu retirar a referncia, usando simplesmente Natal em seu lugar.
EXEMPLO 7TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: B
ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (to Chris): Happy Kwanzaa,Kunta Kinte.
Caruso (para Chris): Feliz Natal, Kunta Kinte.
Vale ressaltar que, na terceira temporada, um dos episdios retrata
exatamente oKwanzaa(Everybody Hates Kwanzaa, 10 episdio).
No mesmo episdio, temos mais uma referncia a grupos musicais. Ao
comentar o otimismo exagerado de Greg, Chris (narrador) afirma que seu amigo
ainda cr no retorno de que Al B. Sure!, nome artstico de Albert Jason Brown III(1968-). Esse cantor, compositor e produtor americano chegou a fazer bastante
sucesso no final da dcada de 1980, mas sua carreira apenas declinou desde ento.
O tradutor preferiu, neste caso, usar uma referncia bem mais clebre.
EXEMPLO 8TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybody Hates Christmas)TEMPO: 14:41 - 14:43 TIPO: B
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): I always liked that Gregwas so optimistic. To this day, he still
thinks Al B. Sure! is gonna make acomeback.
(Eu gostava do Greg ser to otimista. At hojeele acha que os Beatles vo gravar mais um
disco.)
Em uma mesma conversa, no dcimo-terceiro episdio da primeira
temporada, h duas ocorrncias. A situao a seguinte: Chris se prepara para tirar
a foto do anurio da escola. Sua me lhe presenteia com um bluso que custou
trinta e cinco dlares. Ao chegar escola, Chris tira o bluso e guarda em seu
armrio. Pouco antes da hora de bater a foto, porm, ele percebe que o bluso foi
roubado. O primeiro suspeito Caruso, com quem ele se encontra no vestirio
pouco depois. Logo que v Chris preocupado com o sumio do bluso, Caruso o
chama de Scatman, em referncia a Benjamin S. Crothers (1910-1986), cantor,
danarino, ator e msico afro-americano. Na dublagem, no entanto, seu nome
trocado pelo de Louis Armostrong, bem mais conhecido mundialmente. Em
seguida, ainda no mesmo dilogo, Caruso usa, com Chris, o apelido Nipsey,
referncia a Julius Russel (1918-2005), comediante negro conhecido por sua
participao em game shows desde a dcada de 60. Na dublagem, tal referncia
substituda por Shaft, detetive negro personagem principal do filme e minissriehomnimos, transmitidos na dcada de 1970. Embora este termo no tenha
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qualquer relao com o original, essa substituio talvez tenha sido influenciada
pelo lanamento, no ano 2000, de uma nova verso do filme, estrelada por Samuel
L. Jackson.
EXEMPLO 9
TEMPORADA: 1 EPISDIO: 13 (Everybod y Hates Picture Day)TEMPO: 09:2609:47 TIPO: B
ORIGINAL DUBLAGEMCaruso: What's wrong, Scatman?()Chris: That shirt cost U$ 35. And I wantit back.Caruso: I don't have it, Nipsey.
Fala, Louis Armstrong!()Aquele casaco custou 35 dlares, e euquero ele de volta.Eu no t com ele, Shaft.
Na segunda temporada, temos outra ocorrncia do tipo B. No sexto
episdio (Everybody Hates the Buddy System), Chris e Caruso esto embarcando
em uma excurso da escola ao museu. Ao notar a hesitao de Chris, Caruso ochama de Bubbles, uma referncia ao chimpanz que foi adotado como animal de
estimao por Michael Jackson de 1986 a 2003. O narrador comenta tal
comparao dizendo que se sentiria mais seguro no rancho Neverland, propriedade
que foi a residncia de Michael Jackson de 1988 a 2008. Na dublagem, preferiu-se
usar uma referncia a outro chimpanz, mais conhecido: Cheeta, de Tarzan. O
narrador, em seguida, ao invs de no rancho Neverland, menciona no colo do
Michael Jackson. Nesse caso, apesar de conseguir manter um pouco dacomicidade, perde-se o elo cmico entre a fala de Caruso e o comentrio do
narrador.
EXEMPLO 10TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO:06:0806:14 TIPO: B
ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (to Chris): Come on, Bubbles.Chris (narrador): Right now, I'd feel saferat the Neverland Ranch.
Vambora, Cheeta!Naquela hora, eu me sentiria mais segurono colo do Michael Jackson.
No episdio Everybody Hates Christmas, o narrador pondera sobre
como as pessoas s pensam em fazer caridade no Natal, enquanto assegura que
muita gente tambm tem fome no Dia do Presidente, feriado nacional americano
comemorado na terceira segunda-feira de fevereiro. Como no temos um dia do
Presidente no Brasil, o tradutor preferiu usar outro feriado americano, que tem um
equivalente no Brasil: o Dia da Independncia.
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EXEMPLO 11TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 02:4402:52 TIPO: E
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Its funny how mostpeople only think of feeding the needy
during Christmas. Im sure theres a lotof hungry people during Presidents Day.
(Engraado como tem gente que s pensa emalimentar os famintos na poca do Natal. Eu
tenho certeza de que tem gente com fome noDia da Independncia tambm.)
No vigsimo-primeiro episdio da primeira temporada (Everybody
Hates Jail), a professora de Chris avisa a turma de que eles vo fazer uma
excurso a Washington, a capital dos EUA. Caruso diz para Chris se preparar para
ir no fundo do nibus, e o chama de Birmingham. Essa uma referncia cidade
do Alabama onde Martin Luther King Jr. liderou protestos pelos direitos dos negros
americanos. Os protestos atraram a ateno do mundo todo em 1963 e resultaram
no fim da segregao e na subsequente Lei dos Direitos Civis de 1964.
Na dublagem, o tradutor omite Birmingham (uma referncia que
passaria despercebida para a maioria dos espectadores), mas menciona Martin
Luther King. Tal procedimento acaba, de certa forma, validando a traduo, pois
mantm, ainda que parcialmente, a referncia do texto de partida.
EXEMPLO 12TEMPORADA: 1 EPISDIO: 21 (Everybody Hates Jai l)
TEMPO: 00:48 - 00:51 TIPO:BORIGINAL DUBLAGEMCaruso (para Chris):Prepare to sit in theback [of the bus], Birmingham23.
Caruso (para Chris): Voc vai sentar nofundo, Luther King.
Os diversos apelidos racistas que Caruso usa com Chris fazem
referncia, na maioria das vezes, a elementos muito prprios da cultura americana.
Por isso, no so mantidos na dublagem, sendo, ao invs disso, substitudos por
termos igualmente pejorativos do portugus brasileiro. Analisaremos algumas das
tradues desse tipo mais adiante (tipo E).
3.3.Tipo C (uso de hipernimos)
As tradues do tipo C so caracterizadas pelo uso de hipernimos,
palavras de sentido mais genrico. Geralmente esses hipernimos ocorrem quando
a referncia to especfica da cultura fonte que, alm de no fazer sentido na
lngua-alvo, muitas vezes no tem uma expresso que exera a mesma funo na
cultura-alvo. Portanto, tal tipo de traduo geralmente tem um efeito positivo.
23Referncia aos protestos de Birmingham, Alabama, liderados por Martin Luther King Jr. em 1963.
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Outra situao em que o tipo C utilizado, como j vimos no tipo B,
ocorre quando os aspectos tcnicos a necessidade de sincronismo, em particular
foram o tradutor a simplificar o texto de chegada. Alguns exemplos mostram
como os aspectos tcnicos, e no apenas os estritamente lingusticos, podem
efetivamente influenciar as escolhas na traduo audiovisual.
Logo no primeiro episdio da srie, podemos constatar vrias
ocorrncias de tradues desse tipo. Em uma das primeiras cenas, a famlia de
Chris est se mudando para Bed-Stuy (um bairro de Nova York) num furgo
dirigido pelo pai de Chris, Julius. Ao perguntar se podem parar no McDonalds, o
pai pergunta se eles tm dinheiro para McDonalds. Na dublagem, essa referncia
substituda simplesmente por lanchonete. Tal substituio , a nosso ver,desnecessria, pois a cadeia de fast food conhecida mundialmente. O dilogo
apresentado abaixo:
EXEMPLO 13TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO:(01:38 - 01:45) TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEM- Dad, can we stop at McDonald's?- You got some McDonald's money?- Julius, the kids have to eat.- They ain't gotta eat McDonald's.
- Pai, d pra parar na lanchonete?- Tem dinheiro pra lanchonete?- Julius, ele tm que comer.- Mas no tem que ser em lanchonete.
Um pouco mais adiante, Chris, como narrador, afirma que ele era a
nica pessoa negra em um dos nibus que pegava para chegar escola e ressalta
como as pessoas recusavam-se a sentar ao lado dele. Na cena, Chris est sentado e
h um assento vago ao seu lado. Ao oferecer o assento a uma mulher grvida, esta
recusa e ainda parece irritada. O narrador, ento, em seu comentrio, usa, de forma
genrica, o nome de O. J. Simpson. Este famoso jogador de futebol americano foiacusado de assassinar a esposa (que era uma mulher branca) e o amante dela em
1995. O caso ganhou notoriedade internacional e terminou com a absolvio de
Simpson.
Na dublagem, o termo O. J., que fora utilizado no texto de partida
com o significado negro que namora mulher branca, foi substitudo por nego,
como se pode verificar na transcrio das falas.
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EXEMPLO 14TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO:08:12 - 08:15 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):If you think she's madnow, wait 'til her daughter brings home
O.J.24
(T furiosa, minha filha? Espera at tuafilha levar o nego pra casa.)
Durante seu primeiro encontro com Caruso, Chris tenta intimid-lo
dizendo que de Bed-Stuy e que pode trazer metade da Marcy para a escola.
Marcy uma referncia a Marcy Project (ou Marcy Houses), conjunto
habitacional construdo em Bed Stuy pela prefeitura de Nova York nos anos 1950.
Na dcada de 1980, era considerado um dos bairros mais perigosos da cidade, pois
sofria com altos ndices de violncia e consumo de crack. Era nessa vizinhana que
Chris morava.
A dublagem resolveu substituir essa referncia pela palavra gangue,
que no causa estranheza no telespectador.
EXEMPLO 15TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 09:03 - 09:09 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (para Caruso): I don't play that. I'm
from Bed-Stuy, boy! I'll bring half ofMarcy up in here!
Chris (para Caruso): Eu no amarelo! Sou
da Bed-Stuy, moleque! Eu trago uma gangueinteira pra c!
Ao comentar seu primeiro encontro com Caruso, o narrador faz
referncia a DMX, nome artstico do rapper americano Earl Simmons (1970-). O
tradutor poderia ter deixado o nome do cantor, mas preferiu usar hip-hop.
EXEMPLO 16TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 10:02 - 10:10 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador) :Oh, he got away withcalling me nigger that day. But later inlife he said it at a DMX concert, andalmost got stomped to death.
(, naquele dia ele me chamou de neguinhoe se safou. Mas tempos depois ele foi a umshow de hip-hop e quase foi pisoteado at amorte.)
Ocorrncia similar pode ser encontrada no epidsio 11 da primeira
temporada (Everybody Hates Christmas), no qual Chris reflete sobre a
intolerncia do pai de Greg no que diz respeito msica.
24O.J. Simpson (1974-), famoso jogador negro de beisebol.
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EXEMPLO 17TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybody Hates Christmas)TEMPO: 02:26 - 02:29 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Years later, Gregplayed some Ice Cube25and his own
father shot him.
(Anos mais tarde, o Greg comeou a curtirfunk e o prprio pai deu um tiro nele.)
Um caso em que a traduo do tipo C foi bem sucedida ocorre no
quinto episdio da primeira temporada (Everybody Hates Fat Mike). Rochelle, ao
voltar do trabalho, encontra a casa completamente bagunada. Julius finge estar
dormindo no sof e pergunta o que vai ser o jantar. Indignada, Rochelle pergunta se
ela se parece com a Florence dos Jeffersons. Essa uma referncia srie de TV
The Jeffersons, transmitida pela CBS de 1975 a 1985 que retratava a vida de uma
famlia de negros americanos de classe mdia alta. Florence Johnston era a
empregada da famlia.
A referncia obviamente no seria entendida pelo pblico brasileiro,
pois a srie no foi transmitida no Brasil. O tradutor, acertadamente, simplificou a
fala de Rochelle, trocando Florence dos Jeffersonspor domstica.
EXEMPLO 18TEMPORADA: 1 EPISDIO: 05 (Everybod y Hates Fat Mike)
TEMPO: 18:20 - 18:23 TIPO: CORIGINAL DUBLAGEMRochelle: Do I look like Florence fromThe Jeffersons?
Rochelle: Por acaso eu tenho cara dedomstica?
Outro exemplo desse tipo de traduo ocorre no episdio Everybody
Hates Food Stamps (1 temporada, 9 episdio), no qualChris explica que sua me
sempre tentava economizar ao fazer compras, evitando os produtos de marcas
famosas. Ao invs de deixar o nome das marcas, o autor refere-se a elas de maneira
coletiva (coisas para o caf da manh, quando chegava a vez do sabo, etc.). As
falas da verso americana remetem a cereais (Fruit Loops, Cheerios, Frosted
Flakes), biscoitos (Oreos, gingersnaps26, Chips Ahoy!) e sabonetes (Zest, Dial,
Coast, Camay).
EXEMPLO 19TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2601:11 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): So instead of FruitLoops, Cheeriosor Frosted Flakes, we
(Ento, quando ela ia comprar coisas pra ocaf da manh, o que ela escolhia era...)
25Nome artstico de OShea Jackson (1969-), rapper, ator, roteirista e produtor americano.
26Gingersnap, na verdade, no uma marca de biscoito, mas um tipo (biscoito de gengibre).
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gotChris: Cereal?()Chris (narrador):And instead of Oreos,gingersnaps or Chips Ahoy, we gotDrew: Cookie?
()Chris (narrador): When it came to soap,instead of Zest, Dial or Coast, we gotChris: Camay?27
Chris: Cereal?
(...)(Quando ela chegava na seo maisgostosa do mercado, ela comprava...)Drew: Biscoito?
(...)(Quando chegava a vez do sabo, elapassava direto pelas marcas famosas ecomprava...)De coco?
Ainda sobre marcas, no episdio Everbody Hates the Part-Time Job
(1 temporada, 12 episdio), h uma cena em que o xarope Robitussin
mencionado vrias vezes. Na dublagem, em todas as ocorrncias, o nome do
produto substitudopor xarope.
EXEMPLO 20TEMPORADA: 1 EPISDIO: 12 (Everybod y Hates the Part-Time Jo b)TEMPO: 12:1712: 45 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): Going to the doctorwas serious business, because usually ifsomething was wrong with one of us, myparents thought they could fix it withRobitussin.
Drew: I burned my finger!Rochelle: Let me see, boy. Let me see.Now, take some Robitussin.
Julius: Looks like her tooth broke off.Rochelle: I'll go get the Robitussin.
Rochelle: What?Tonya: Momma, Chris just got hit by acar!Rochelle: Oh, my God! I'll go get theRobitussin.
(Ir ao mdico era uma parada sria porque,em geral, se a gente ficava doente, meus paisachavam que ia curar a gente com umxaropinho.)
Ai, me! Puxa, eu queimei meu dedo!Deixa eu ver, menino. Deixa eu ver.Toma um xarope!
Parece que o dentinho dela caiu.
Eu vou buscar o xarope.
O que foi?Mame, o Chris foi atropelado!Ai, meu Deus! T, eu vou pegar o xarope!
Voltando ao nono episdio, encontramos mais uma referncia a grupos
musicais. Na cena, Chris e Greg esto na escola, discutindo sobre o tema de sua
apresentao para a Feira de Cincias. Quando Greg sugere que eles faam um
trabalho sobre as placas tectnicas, Chris (narrador) diz que pensava que esse fosse
o nome original do Wu Tang Clan, grupo nova-iorquino de rapformado em 1992.
Diferentemente das outras ocasies em que h referncias musicais, desta vez, o
nome da banda originalmente mencionada no substitudo pelo de outra mais
conhecida. Ao invs disso, temos uma referncia genrica ao tipo de msica que a
banda toca.
27Sabonete produzido pela Procter & Gamble desde 1926.
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EXEMPLO 21TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2600:31 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): I thought PlateTectonics was the original name of the
Wu Tang Clan.
(Pensei que Placa Tectnicafosse o nomede um grupo de rapestourando por a.)
O tipo C mostra-se bastante til, pois permite que o tradutor transmita
seu sentido geral. Contudo, como j ressaltamos, tal tipo de traduo , s vezes,
utilizado desnecessariamente. Constatamos vrios casos em que o tradutor tinha,
sua disposio, um correspondente na lngua portuguesa. Um desses casos ocorre
no primeiro episdio. Ao relembrar que seus irmos foram matriculados numa
escola perto de casa, onde a maioria dos alunos era de negros, e ele tinha sido
matriculado numa escola predominantemente branca do outro lado da cidade, Chriscomenta o tipo de educao recebida l: No era uma educao do tipo
Harvard. A dublagem, no entanto, preferiu No era educao de primeira. Tal
substituio parece-nos ter sido motivada pela restrio de tempo, pois no seria
possvel fazer a mesma construo em portugus sem along-la, o que no poderia
ser sincronizado com os movimentos labiais do ator na tela. Este um dos
exemplos em que os aspectos tcnicos foram fator decisivo para a traduo.
EXEMPLO 22TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 03:44 - 03:45 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): Not a Harvard-typeeducation...
(No era educao de primeira...)
No nono episdio, Chris fala para Greg que, sempre que ele liga a TV,
sua irm quer assistir aos Care Bears. A dublagem, estranhamente, omitiu a
referncia a essa srie bastante conhecida do pblico brasileiro, dando preferncia
ao termo genrico desenho animado.
EXEMPLO 23TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 02:12 02:18 TIPO: CORIGINAL DUBLAGEMChris: At least you get to watch a game.Every time I turn on the TV my sisterwants to watch the Care Bears.
Pelo menos, voc consegue ver o jogo. Todavez que eu ligo a TV, minha irm quer verdesenho animado.
No mesmo episdio, Chris (narrador) afirma que o Atari era o
Playstationde 1982. Aqui, novamente, o tradutor poderia muito bem ter mantido o
nome do jogo, visto que o console de videogame da Sony bastante popular no
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Brasil. No entanto, a dublagem preferiu uma expresso mais abrangente.
EXEMPLO 24TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 02:2602:29 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEM
Chris (narrador): Atari was thePlayStation of 1982. (Atari era a tecnologia de ponta em 1982.)
Ainda no episdio Everybody Hates Greg, Greg convida Chris para
jogar videogamena sua casa. Quando Chris est prestes a ir embora, o pai de Greg
chega, e Greg impede Chris de sair, afirmando, amedrontado, que seu pai o probe
de receber visitas enquanto estiver sozinho. Nesse momento, o narrador compara o
pai de Greg a Ike Turner (1931-2007), que foi marido da cantora Tina Turner de
1962 a 1978. Ela o acusou de espanc-la violentamente vrias vezes, o que rendeu a
ele a fama de homem violento. O dublador, no entanto, deve ter julgado esse fato
desconhecido do pblico brasileiro, pois omitiu essa referncia, substituindo-a por
uma expresso de sentido vago. Mais uma vez, a dublagem favorece a
compreenso, em detrimento da comicidade da fala.
EXEMPLO 25TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 09:0309:06 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Greg looked at me like
his father was Ike Turner.
(Greg me olhou como se o pai dele fosse o
maior monstro.)
Na segunda temporada, no episdio em que Chris se candidata a
presidente do grmio escolar (Everybody Hates the Class President, 2 episdio),
ele e Greg esto com dificuldades para conseguir votos. Ento, discutem como
podem ser iguais ao DiPaolo, um dos alunos mais populares da escola. Quando
Chris fala que ele burro como uma porta, Greg retruca que, apesar de ser burro,
DiPaolo querido pelas pessoas, Chris (narrador) comenta que isso foi o que
disseram sobre Fabio. Ele se refere a Fabio Lanzoni (1959-), ator e modelo italianoconhecido nos EUA. Na dublagem, essa referncia foi substituda, como podemos
ver abaixo.
EXEMPLO 26TEMPORADA: 2 EPISDIO: 02 (Everybod y Hates the Class President)TEMPO: 06:44 - 06:50 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMGreg: He might be dumb, but people likehim.Chris (narrador): They said the samething about Fabio.
Pode ser burro, mas gostam dele.Dizem a mesma coisa das modelos e dasmanequins.
Em outro episdio (Everybody Hates the Buddy System, 2
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temporada, 6 episdio), o tradutor generalizou duas referncias de uma s vez.
Devido s suas desavenas, Chris e Caruso so chamados sala do diretor. Chris
acusa Caruso de odiar pessoas negras, e este se defende dizendo que gosta de vrios
artistas e celebridades negras. Chris, ento, contesta a validade de tal afirmao
dizendo: S por que voc assiste ao Soul Train, isso no te faz o Don Cornelius..
Soul Train foi um programa musical da TV americana transmitido de 1971 a
2006. Em geral, apresentava artistas negros. Don Cornelius (1936-) foi seu produtor
e primeiro apresentador.
Nesse caso, a dublagem simplificou bastante a fala do personagem,
eliminando as referncias a cones musicais dos Estados Unidos, Mais uma vez,
parece-nos que a durao da fala traduzida no combinaria com os movimentoslabiais do ator.
EXEMPLO 27TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris (para Caruso): Just because youwatch Soul Train, don't make you DonCornelius.
S porque gosta desses caras, voc no virao rei do Soul.
Finalmente, no mesmo episdio, ao ser convidado por Greg para jogar
videogamena casa dele, Chris comenta que as coisas no tem nenhum problema, ao
que o narrador comenta, ironicamente, que isso o que as pessoas diziam quando
estavam embarcando no Amistad. Esse foi um navio negreiro cubano que, em
1839, aps motim dos escravos, foi parar na costa leste dos Estados Unidos, sendo
capturado por autoridades americanas. A situao dos escravos ganhou notoriedade
com o julgamento do caso pela Suprema Corte, que, aps dois anos, decidiu que os
escravos deveriam ser libertados e conduzidos de volta frica.
Apesar de o nome da embarcao mencionada ter se tornado clebre
aps um filme homnimo, dirigido por Steven Spielberg, ter sido lanado em 1997,
o tradutor preferiu eliminar essa referncia e usar um termo mais comum.
EXEMPLO 28TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 05:46 - 05:51 TIPO: C
ORIGINAL DUBLAGEMChris: I mean, it can't get any worse.Chris (narrador):That's what people said
while they were boarding the Amistad.
Pior do que isso no pode ficar.(A rapaziada dizia isso quando embarcava
nos navios negreiros.)
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3.4.Tipo D (domesticao)
Dos tipos de traduo vistos at aqui, o tipo D traz as tradues mais
domesticadas, pois os termos originais so substitudos por palavras e expresses da
lngua da cultura-alvo que, em tese, teriam a mesma funo que eles. O que causa
mais estranheza o fato de que o tradutor, com o intuito de representar o sentido do
texto original com palavras da cultura-alvo, acaba aproximando-o demasiadamente
desta. Assim, o visual indica jovens americanos da dcada de 1980, mas o udio
incoerentemente os mostra fazendo referncias cultura brasileira.
Dois casos nos pareceram dignos de destaque. No segundo episdio da
segunda temporada, Chris convida DiPaolo a ser seu vice na chapa para presidente
do grmio escolar. Tentando soar mais convincente, Chris argumenta que eles
podem ser como Bobby Jones e Henry Bibby, jogadores que faziam dupla no
Philadelpia 76ers, time de basquete da NBA, na dcada de 1980. DiPaolo, ento,
pergunta se eles podem ser como Kevin McHale e Dennis Johnson, dos Celtics, time
rival dos 76ers. Na dublagem, essa passagem foi completamente domesticada, pois
o tradutor procurou fazer referncia a desportistas igualmente famosos, s que no
Brasil. O texto traduzido mostra-se incompatvel com o ambiente em que vivem os
personagens, como podemos verificar na transcrio do dilogo mostrada a seguir.
EXEMPLO 29TEMPORADA: 2 EPISDIO: 02 (Everybod y Hates The Class President)TEMPO: 10:37 - 10:41 TIPO: D
ORIGINAL DUBLAGEMDiPaolo: Vice president?Chris: Yeah, with me. We can be likeBobby Jones and Henry Bibby on theSixers28.DiPaolo: Can we be like Kevin McHale
and Dennis Johnson on the Celtics29?
Vice-presidente?, comigo. A gente podia ser tipo Pel eTosto na Copa de 70.D pra ser Toninho Cereso e Serginho daltima Copa?
Em outro episdio (Everybody Hates the Buddy System), mais uma
vez o tradutor recorre a Pel para substituir o nome de um famoso desportista
americano. Na cena, Julius presenteia Drew com uma camisa de hquei do jogador
Wayne Gretzky (1961-). Porm, o nome do jogador est grafado incorretamente nas
costas da camisa (Gritzky).Chris (narrador) ento diz que, no ano seguinte, seu
irmo ganhou uma camisa dos Yankees com o nome Mezzie Mackson escrito nas
28
Bobby Jones e Henry Bibby foram jogadores de basquete do Philadelphia 76s nos anos 80.29Kevin MacHale e Dennis Johnson jogavam basquete no Boston Celtics, o principal rival do76ers.
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costas. Isso provavelmente uma corruptela do nome de Reggie Jackson, jogador de
beisebol que integrou a equipe do New York Yankees de 1977 a 1981. A dublagem
substituiu o nome errado do jogador por Pil, em uma bvia referncia ao jogador
de futebol brasileiro.
EXEMPLO 30TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 15:0515:10 TIPO: D
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): The next year, Drewgot a Yankees jersey that said MEZZYMAXIN.
(Um ano mais tarde, o Drew ganhou umuniforme com PIL escrito nas costas.)
Finalmente, temos mais uma ocorrncia de domesticao que envolve as
modalidades esportivas preferidas nos dois pases: o futebol americano, nos EUA, e
o futebol, no Brasil. No Dia de Ao de Graas, o pai de Chris mobiliza toda afamlia no preparo da ceia. Chris o compara a um jogador de futebol americano em
ao (quarterback running player), enquanto a traduo faz meno a uma figura
altamente popular no Brasil.
EXEMPLO 31TEMPORADA: 2 EPISDIO: 8 (Thanksgiv ing)TEMPO: 04:05 - 04:10 TIPO: E
ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrator): Because my fatherreally wanted to impress his brother, my
dad was cooking like a quarterback30running player
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