Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
265
GERENCIAMENTO COLABORATIVO
DE PEQUENAS CIDADES:
propostas de reformas administrativas
para a cidade de Portalegre-RN
Moisés Mark Porcinio da Silva1 Fernando Porfírio Soares de Oliveira1
RESUMO Neste artigo propõe-se ampliar os estudos sobre o uso da economia colaborativa como alternativa à dificuldade encontrada pelas pequenas cidades para gerir seus recursos, frente à demanda de serviços perante seus cidadãos munícipes. A partir do estudo de caso da cidade de Portalegre-RN, foi constatada sua fragilidade administrativa na busca por melhores resultados. Por isso, são apresentadas duas propostas de reformas para a gestão municipal. Primeiro, é fornecida uma visão geral sobre o consórcio público, especialmente no âmbito intermunicipal, como possibilidade de colaboração entre os entes administrativos, visando à redução dos custos e incentivando a participação dos munícipes na gestão. Segundo, é apresentada uma alternativa para pequenas cidades que se mostra atual e, possivelmente, mais eficaz, ao proporcionar o uso de ferramentas que integram administração pública, sociedade e iniciativa privada em um processo colaborativo. Chegou-se a essas propostas a partir de uma revisão bibliográfica acerca de alternativas para a gestão municipal, e de uma entrevista com o prefeito da cidade e sua assessoria. Conclui-se no estudo que é necessário expandir o diagnóstico das capacidades institucionais dos pequenos municípios, com intuito de possibilitar a absorção de tecnologias colaborativas que proporcione resultados positivos no gerenciamento da coisa pública. Palavras chave: Gerenciamento colaborativo. Pequenas cidades. Administração municipal. Capacidade institucional.
1 Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA).
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
266
1 INTRODUÇÃO
Ao analisar o atual momento de instabilidade política e econômica do país,
com a União precisando administrar um orçamento deficitário (para o ano de 2017,
foi aprovado um déficit de 139 bilhões de reais - CÂMARA DOS DEPUTADOS,
2016) e diante de vários crimes contra o erário público envolvendo políticos, é
razoável que haja desconfiança da população em relação à capacidade
administrativa dos entes federativos. Esse fenômeno ganha mais força quando se
trata de pequenos municípios, especialmente por dois motivos: maior proximidade
dos resultados da aplicação dos recursos, que pode possibilitar observação e
controle de seu alcance, e maior dificuldade de captação de verbas, tornando os
pequenos municípios dependentes, basicamente, de repasses do governo federal.
Nesse contexto, é possível perceber que os municípios que conseguirem
ampliar a capacidade institucional de gestão de seus recursos, imprimindo maior
eficácia, eficiência e, principalmente, efetividade em seus gastos públicos, estarão
mais próximos de alcançar êxito na promoção do bem estar dos seus cidadãos.
Além disso, maximizar a publicização dos atos administrativos proporcionará aos
gestores municipais maior compromisso com a adoção de políticas públicas, no
sentido de promoverem uma diminuição de desigualdades.
As ideias apresentadas acima remetem ao conceito de uma administração
pública gerencial, introduzida no Brasil por Luiz Carlos Bresser-Pereira, no ano de
1995 (BRESSER-PEREIRA, 2001).
Segundo os estudos de Celso, Silva e Coelho (2012) “a introdução do modelo
gerencial no âmbito da administração pública se configura como um novo modelo de
relacionamento entre Estado-sociedade”, impulsionando tendências em busca de
maior transparência e autonomia das partes envolvidas. Entretanto, para encontrar
parâmetros de comparação entre as realidades imediatas e as necessidades de
avanços no contexto regional, é preciso uma breve contextualização do
comportamento administrativo gerencial dos municípios brasileiros.
Nesta perspectiva, Leal (1978, apud GRIN, 2014, p. 2), explica que o governo
federal considerava que, até a década de 1930, nos municípios havia “falta de
métodos racionais, desorientação administrativa, gestão financeira perdulária,
dívidas crescentes [...]”. Assim, a partir da instituição do Estado Novo (1937), houve
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
267
tentativas de fazer com que a administração municipal pudesse se modernizar. A
criação da Associação Brasileira de Municípios (1946), da Secretaria de Assistência
a Estados e Municípios (1972) e do Programa de Modernização da Administração
Tributária (1997), este culminando no que hoje se entende como Lei de
Responsabilidade Fiscal, serviram de mecanismos para intensificar a ampliação das
capacidades institucionais dos municípios.
Convém esclarecer que o conceito de capacidade institucional é articulado a
uma visão gerencial de administração pública, “na medida em que os esforços para
o desenvolvimento e o fortalecimento da gestão municipal têm como focos a
modernização, a transparência, o controle social e o foco nos resultados”
(FERNANDES, 2016). A autora ainda destaca que a avaliação e o fortalecimento da
capacidade institucional dos entes subnacionais, especialmente dos municípios,
cada vez mais passa a fazer parte de iniciativas do governo federal.
Assim, a descentralização de diversas políticas públicas para os municípios,
na Constituição de 1988, contribuiu para ampliar suas atribuições, destacando cada
vez mais sua presença no cenário político nacional. E, segundo Grin (2014),
especialmente nos governos FHC (1995-2002) e Lula (2003-2010), o tema da
modernização da gestão municipal volta a ganhar força, sendo reinserido na agenda
de políticas, na medida em que se priorizava a criação de capacidades para a
gestão por resultados.
Nesse sentido, para alcançar êxito na promoção do bem-estar dos cidadãos
munícipes, o gestor precisa estar atento às demandas e buscar ações que
minimizem seus impactos negativos, ou até mesmo evitar que elas se apresentem
como problemáticas, antecipando respostas. Como bem definiu Westphal (1997)
“muitas vezes as soluções racionalmente pensadas não são adequadas à realidade
da população”. Dessa forma, qualquer gestão que almeja atender seus munícipes de
forma participativa e cidadã, precisa também estar em consonância com sua
realidade imediata vivida, daí a importância, para o município, do gerenciamento
colaborativo das políticas públicas.
Iniciativas como essa não são novidades no cenário mundial. O movimento
denominado “Cidades Saudáveis” surge em Toronto, no Canadá, no início da
década de 1970, e busca “através de novas formas de ação, criar melhores
condições de vida para a população” (STROZZI e GIACOMINI, 1996, apud
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
268
WESTPHAL, 1997, p.10). Entretanto, para alcançar êxito, esse movimento
dependeu tanto da efetivação de políticas transversais (educacionais, agrícolas,
ambientais, saúde, etc.), por parte da administração pública, quanto da participação
social, que precisou assumir o objetivo de melhoria da qualidade de vida.
Um processo complexo como esse, envolvendo diferentes áreas, demanda
um planejamento que levante as fragilidades e apresente soluções viáveis do ponto
de vista da aplicabilidade, trazendo consequências positivas, tanto para a gestão
municipal, quanto para seus cidadãos. Nessa linha, Rezende (2007) explica que,
com a colaboração da comunidade, os planejamentos municipais e as informações
sistematizadas podem facilitar a gestão das prefeituras e dos municípios.
Com isso, é possível observar que novamente está em foco o estímulo a uma
consciência coletiva cidadã, com a intenção de ampliar a colaboração na gestão
municipal, especialmente da sociedade civil, que pode ordenar as demandas de
forma mais direta. Conjugadas com essa ideia, Gonçalves e Marra (2012) afirmam
que “o interesse público é o interesse de todo o conjunto social”, e vão além quando
reiteram que “a efetivação do interesse público é um compromisso da administração
pública e um direito dos cidadãos”. Porém, de nada adiantará o fomento à
participação social se não houver ferramentas que oportunizem essa proposta
gerencial colaborativa pública.
Assim, o uso de um sistema de gerenciamento colaborativo pode catalisar a
absorção tecnológica das capacidades gerenciais institucionais municipais, além de
auxiliar o processo de tomada de decisões organizacionais e facilitar o feedback das
ações adotadas. Ainda, pode possibilitar o compartilhamento dos conhecimentos e
experiências dos municípios envolvidos, mesmo que ocorra troca de governante ou
de toda equipe administrativa municipal.
Nesse sentido, aproveitando a evolução das tecnologias da informação e
comunicação, visando à melhoria na prestação de serviços públicos, a União
instituiu o Programa Governo Eletrônico, em 2000. Como principais objetivos, é
possível enfatizar: diminuição dos custos, busca pela melhoria da qualidade,
prestação de serviços em meio eletrônico, aumento da transparência nos órgãos
públicos e estímulo ao controle social (SIMÃO e SUAIDEN, 2012). Em sua análise,
os autores também destacam o fato de os entes subnacionais precisarem se
modernizar para não ficar à margem do desenvolvimento econômico, e, além disso,
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
269
reforçam que apenas a melhoria na relação e colaboração entre administração
pública e cidadão, poderá fazer com que esses entes acompanhem a nova ordem
mundial.
Contudo, para um novo sistema ser implantado, e permitir alinhar as diversas
áreas de atuação administrativa de um município, é preciso haver uma infraestrutura
mínima capaz de promover a absorção tecnológica da gestão colaborativa
municipal. Não basta apenas a disponibilização digital de serviços e informações; é
essencial que se permita a colaboração no acompanhamento e desenvolvimento
das políticas por parte de todos os interessados imediatos, mais especificamente, os
cidadãos munícipes.
Portanto, este artigo pretende analisar as capacidades gerenciais
institucionais do município de Portalegre-RN, com o intuito de propor reformas
administrativas colaborativas as quais possam refletir positivamente, tanto no
gerenciamento de pequenos municípios, quanto no bem-estar cotidiano de seus
cidadãos munícipes.
2 CONTEXTO REGIONAL
O município de Portalegre está localizado na região conhecida como Alto
Oeste Potiguar, ocupando uma área territorial de, aproximadamente, 110 km², e
contando com uma população de quase 8 (oito) mil habitantes (PREFEITURA
MUNICIPAL DE PORTALEGRE, 2017). Possui limites com os municípios de Riacho
da Cruz, Tabuleiro Grande, Viçosa, Francisco Dantas, Serrinha dos Pintos e Martins.
Mesmo estando na região do semiárido nordestino, caracterizado por um
clima seco e com poucas chuvas, a cidade está localizada acima do nível do mar,
proporcionando um ambiente mais ameno. Além disso, conta com relevo, hidrografia
e vegetação característicos, destacando atrativos turísticos, como:
● Fonte da bica – conjunto de nascentes de água mineral;
● Mirante da Boa Vista – fornece uma visão geral da cidade e serras
vizinhas;
● Sítio Arqueológico “Pedra do Letreiro” – contém gravuras rupestres em
alto relevo.
Não estando restritos apenas a esses ambientes, “Portalegre é um município
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
270
rico em natural, apresentando recursos potenciais” (VIANA e NASCIMENTO, 2009).
Nesse contexto, percebe-se quão importante é o turismo para a economia da
cidade.
3 DIAGNÓSTICO ADMINISTRATIVO DO MUNICÍPIO DE PORTALEGRE
3.1 Abordagem metodológica
Com a intenção de ampliar a análise e fornecer bases conceituais para dar às
propostas um caráter atual, foi feita uma revisão bibliográfica, em que se buscaram
textos recentes que tratassem sobre a mesma temática deste artigo, qual seja a
gestão municipal e as possibilidades de colaboração, visando um melhor resultado
frente aos seus munícipes. Gil (2008) também destaca a importância da revisão
bibliográfica preliminar, no sentido de realizar uma adequada formulação do
problema.
E para o levantamento da situação administrativa do município de Portalegre,
com vistas a entender em que se baseiam as práticas adotadas pelos gestores
públicos e em que medida elas possuem um suporte tecnológico (como um sistema
de gestão, por exemplo), procedeu-se a uma entrevista informal com o prefeito da
cidade e sua assessoria. Gil (2008) aponta que, com esse tipo de abordagem, é
possível obter uma visão geral do problema, permitindo a coleta de dados.
Como instrumento utilizado em estudos exploratórios, a entrevista se
apresenta com a finalidade de proporcionar melhor compreensão acerca do
problema, e de fornecer hipóteses, servindo como fundamentação em pesquisas
qualitativas.
3.2 Análise da situação administrativa
Atualmente, o município de Portalegre conta com 8 (oito) secretarias em sua
estrutura administrativa. Um fato que chama a atenção é que, em seu organograma,
não há uma secretaria exclusiva para a área de Turismo. Há uma Gerência de
Turismo e Meio Ambiente, vinculada à Secretaria Municipal de Desenvolvimento
Econômico, podendo ser um limitador de atuação. Com isso, as necessidades e
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
271
reivindicações do setor turístico (hotéis, pousadas, restaurantes) precisam percorrer
um caminho mais longo até chegar aos tomadores de decisão.
Para Mendes (2014), a “marca” de um lugar é o conjunto de percepções que
as pessoas criam a respeito dele, e deve ser usado como um ativo que propicie
reflexos positivos na economia local. Assim, com o turismo sendo a “marca” do
município de Portalegre, é preciso que as políticas públicas voltadas a esse setor
sejam avaliadas com prioridade, pois impactam na geração de emprego e renda aos
cidadãos locais, além das arrecadações municipais.
Contudo, a situação que merece destaque é o fato de nenhuma das
secretarias contarem com um sistema de gerenciamento para auxiliar suas tarefas,
inviabilizando um melhor registro e controle das demandas. Tal ocorrência pode
impedir a mensuração correta das atividades de cada setor, e assim frustrar a
organização de um esquema sequencial de atuação. Esse esquema, desenvolvido
com disciplina e coordenação, poderia servir como norteador na verificação das
fragilidades institucionais de cada área administrativa.
A partir desse levantamento, seria possível analisar onde os investimentos em
recursos humanos são mais necessários, por exemplo, fosse pela contratação ou
realocação de pessoal, fosse por treinamentos ou capacitações. Além disso, deixar
que cada órgão público aja de maneira própria, sem algum tipo de conformação,
demonstra uma desorientação administrativa, a qual pode culminar no não
atendimento das necessidades dos cidadãos munícipes, além de dificultar que as
políticas públicas atinjam plenamente seus objetivos.
Também é possível observar que a falta de um sistema de gerenciamento
pode ser um obstáculo ao acompanhamento das ações da administração municipal,
por parte da sociedade. Sem a devida necessidade de registro das demandas, os
servidores públicos municipais assumem discricionariedade na divulgação e controle
das informações, referentes às ações de cada área administrativa.
Como Rezende (2007) destaca que a informação é a primeira premissa a ser
considerada no planejamento municipal, é necessário que ela possua atenção
especial. Negligenciá-la pode implicar em políticas pouco exitosas. Por outro lado,
agregar as informações repassadas pelos cidadãos, e manipulá-las com o auxílio de
um sistema de gerenciamento, pode proporcionar bons resultados para a gestão do
município.
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
272
Com essa investigação, foi possível perceber que a busca por novas soluções
administrativas municipais pode trazer benefícios para a população local. E envolver
outras cidades nesse contexto possibilita tornar o processo menos oneroso, com a
diminuição dos custos através do desenvolvimento e operação de um sistema de
gerenciamento colaborativo. Também é razoável considerar que esse tipo de arranjo
permite a absorção tecnológica e a ampliação das capacidades institucionais dos
municípios envolvidos.
A partir das avaliações realizadas, torna-se interessante pesquisar propostas
capazes de otimizar o desempenho administrativo municipal, podendo resultar em
ações mais eficazes na promoção do bem-estar aos cidadãos.
4 PROPOSTAS DE REFORMAS ADMINISTRATIVAS
Diante da análise administrativa do município de Portalegre, e da confirmação
de algumas fragilidades, é preciso que seus gestores busquem novos arranjos que
permitam o desenvolvimento municipal. Nesse contexto, Abrucio, Filippim e Dieguez
(2013) ressaltam que “a constatação de que municípios sozinhos não conseguem
formular e implementar todas as políticas públicas os tem conduzido a buscar
soluções cooperativas”.
Uma alternativa que tem se mostrado atrativa é a do consórcio público, onde
ocorrem “associações voluntárias entre entes governamentais para produção e
compartilhamento de valores públicos, requerendo cooperação entre as partes
interessadas na realização de objetivos comuns” (MACHADO e ANDRADE, 2014).
Matos e Dias (2012) destacam que a composição de consórcios
intermunicipais proporcionam alternativas para a viabilização de serviços públicos de
qualidade ao “cidadão-cliente”, “se colocando como uma alternativa para
racionalização do modelo de gestão”. Reforçam ainda que a Constituição de 1988
contribuiu com fatos novos na administração pública, definindo sistemas de gestão
democrática, a exemplo dos colegiados públicos, onde setores representantes de
categorias da sociedade civil podem participar de decisões administrativas, além de
promover o planejamento participativo como preceito a ser observado pelos
municípios.
Segundo Angnes et al. (2013), “com os consórcios públicos, pequenos e
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
273
médios municípios passam a ter oportunidades efetivas de […] enfrentar seus
problemas sociais e estruturais por meio de novos instrumentos e parcerias”. Os
autores também destacam o caráter participativo desse tipo de gestão, voltada ao
coletivo da população.
Apesar ter sido incluída no texto constitucional em 1998, a fundamentação e
normatização dos consórcios públicos ocorrem apenas em 2005, com a chamada
Lei dos Consórcios Públicos (Lei nº 11.107, de 6 de abril), sendo finalmente
regulamentados em 2007, estabelecendo normas para sua execução. Machado e
Andrade (2014) frisam que a referida lei gerou expectativas quanto à maior
segurança jurídica aos entes associados, além de uma menor instabilidade em
virtude de variações de cunho político-eleitoral.
Entretanto, os mesmos autores destacam que “a incerteza quanto […] à
oportunidade do beneficiamento para os associados poderia dificultar a conclusão
de barganhas na definição das regras de compartilhamento dos custos”. Ou seja,
encontrar uma função equalizadora entre os benefícios e custos de um consórcio,
para os entes envolvidos, não é um processo simples devido à complexidade de
interesses dos associados.
Outra alternativa a surgir nesse contexto de soluções cooperativas é a do
gerenciamento colaborativo de pequenas cidades. Apoia-se no conceito de
economia colaborativa, em que predomina a noção de que ter acesso a bens e
serviços é melhor do que possuí-los. Como exemplos, Souza e Lemos (2016) citam
as plataformas do Uber e do Airbnb.
Para o caso do Uber, destacam que o uso de aplicativos para a contratação
de transporte privado pode promover uma visão inovadora sobre formas de
deslocamento na cidade, além de gerar uma base de dados de grande porte sobre a
movimentação de pessoas. Essas informações, de posse de um gestor preparado
com as devidas ferramentas gerenciais, podem resultar em políticas públicas mais
eficazes no âmbito da mobilidade urbana.
Em relação ao Airbnb, os autores salientam que a atividade de hospedagem
de pessoas em residências, conforme impulsionada por iniciativas típicas da
economia colaborativa, causam forte impacto na dinâmica das cidades. Aumentando
as possibilidades de hospedagem, esses aplicativos estimulam que haja visitação e
turismo em áreas da cidade nem sempre vistas como atrativas.
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
274
Ainda no sentido de complementar a inovação trazida pela economia
colaborativa, Silva et al. (2016) concluem que negócios colaborativos podem se
apresentar como uma oportunidade de obter vantagens de produtos e serviços
compartilhados, além de facilitar ou até mesmo permitir acesso.
Nesse ensejo, a ideia de gerenciamento colaborativo busca fornecer uma
plataforma na qual os gestores municipais encontrem as ferramentas que irão
auxiliá-los na administração, além de oferecer dados para reforçar a viabilidade, ou
não, de uma política pública. Rezende (2007) destaca o auxílio que esse tipo de
sistema de informação traz para o processo de tomada de decisão.
Seguindo essa mesma linha, Souza e Lemos (2016) asseguram que a
economia do compartilhamento enfatiza o uso de tecnologia da informação em prol
da otimização no uso de recursos pela redistribuição, compartilhamento e
aproveitamento de suas capacidades. Destacam, ainda, que esse tipo de economia
estimula o “consumo colaborativo”, o qual privilegia o acesso a uma ferramenta, em
detrimento da aquisição de algo que pode não ser explorado em todo o seu
potencial.
Isso se torna mais evidente no caso da cidade de Portalegre que, por sua
localização e estrutura, trazem turistas e visitantes, justificando o uso de uma
ferramenta que auxilie o controle desse processo e permita à gestão municipal
investir em melhorias e novos atrativos. O mesmo não pode ser dito de sua vizinha,
Tabuleiro Grande, que não possui fenômeno turístico que defenda o uso de uma
ferramenta de gestão para essa especificidade. Entretanto, ambas as cidades
podem fazer parte de uma mesma rede colaborativa para o gerenciamento de
pequenas cidades, congregando, com isso, outros requisitos comuns e úteis a todas
as cidades, como referentes à segurança, educação e saúde, por exemplo.
Assim, é possível abordar as considerações de Guimarães e Silva (2016), as
quais sustentam que “a cidade inteligente, por consequência, se constrói a partir da
gestão eficiente e dos mecanismos de controle e governança”. E avançam ainda
mais, ao afirmar que é uma tendência mundial a modernização da gestão das
cidades, auxiliada por novas tecnologias, facilitando as relações entre cidadãos e
administradores. Além disso, reconhecem esse processo como alinhado ao
fenômeno da economia colaborativa, em que a conveniência e a flexibilidade são
consideradas conceitos essenciais.
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
275
Além do já abordado, outro ponto interessante em um sistema de
gerenciamento colaborativo é a possibilidade de incluir a iniciativa privada no
processo. Segundo Simão e Suaiden (2012), colaborar com projetos dessa
natureza, que visam à economia de recursos públicos, pode vincular uma imagem
de “socialmente responsável” para a empresa. Como contrapartida, estando
inseridas num ambiente onde as demandas sociais se apresentam de forma direta,
por meio da colaboração dos munícipes, as empresas podem usufruir de uma
espécie de “vantagem competitiva colaborativa”. Ao constatar que determinado
bairro ou região da cidade apresenta déficit de unidades de ensino, por exemplo, um
colégio particular pode ofertar seus serviços de forma mais ágil do que esperar uma
política municipal que ofereça escolas.
Esse contexto tende a favorecer todo o conjunto de colaboradores. As
cidades podem oferecer benefícios (isenção de IPTU, por exemplo) àqueles que
sugerirem ideias que efetivamente se transformem em políticas públicas,
fomentando a colaboração. Da mesma forma, ampliando o número de colaboradores
em prol de uma ação, a gestão municipal pode conseguir o respaldo necessário em
favor de alguma medida administrativa.
E, para também contribuir com as abordagens deste artigo, analisam-se as
contribuições de Teodósio (2010), o qual destaca que “os pequenos municípios do
interior têm possibilidades para avançar em direção a um maior envolvimento de
seus cidadãos no futuro da cidade”. Além disso, reforça que parcerias envolvendo os
três setores (Estado, sociedade civil e empresas) têm assumido papel central nos
discursos de enfrentamento aos problemas sociais em diferentes partes do mundo.
5 CONCLUSÃO
O uso de modelos de gestão participativa tem se mostrado um instrumento de
gestão pública com bons resultados, impulsionado pelas diversas formas de acesso
a bens e serviços, promovidas pelo avanço das ferramentas de tecnologia da
informação. É uma tendência mundial a junção de tecnologias digitais com noções
de ambientalismo e convivência social, com vistas a promover um conceito de
urbanismo mais inteligente.
Uma cidade precisa de metas claras, características que a diferenciem das
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
276
demais e propostas realizáveis. Nesse sentido, é imprescindível aproveitar o
potencial turístico da cidade de Portalegre para ampliar sua inserção no cenário
econômico do estado, impondo características inovadoras avalizadas pela
colaboração de seus cidadãos munícipes.
Dessa forma, se propôs com esse artigo estimular as discussões acerca das
possibilidades de um gerenciamento colaborativo de pequenas cidades, tendendo a
elevar suas capacidades institucionais administrativas através da cooperação entre
municípios. Convém destacar que a proposta busca integrar tanto os cidadãos
munícipes quanto a iniciativa privada local, que podem (e devem) ser protagonistas
no processo de desenvolvimento de políticas públicas, pois são os mais propícios a
“enxergar” a real necessidade do ambiente onde convivem.
Salienta-se que a construção de políticas públicas consistentes passa pelo
contínuo diálogo entre todos os atores sociais relevantes em cada área. Também,
que bons governos estão sempre em busca de práticas bem-sucedidas de gestão e
resolução de problemas de políticas públicas, ressaltando a importância do
conhecimento compartilhado como meio de escapar do amadorismo e de respostas
inconsistentes.
Assim, é interessante se aprofundar nas pesquisas sobre modelos de
economia colaborativa, e analisar em que medida esses conceitos podem contribuir
para melhorar os resultados das políticas adotadas pelos gestores das pequenas
cidades, ampliando a promoção de bem estar aos seus munícipes. Conseguir
inovar, de forma sustentável, e fomentar a colaboração entre administração pública,
sociedade e iniciativa privada, é a fórmula que uma cidade precisa equacionar para
se destacar no cenário político-administrativo.
REFERÊNCIAS
ABRUCIO, F. L.; FILIPPIM, E. S.; DIEGUEZ, R. D. Inovação na cooperação intermunicipal no Brasil: a experiência da Federação Catarinense de Municípios (Fecam) na construção de consórcios públicos. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, 47(6):1543-568, nov./dez. 2013. ANGNES, J. S.; MATTOS, S. M. M.; KLOZOVSKI, M. L.; STURM, M. I. Consórcio Intermunicipal da Fronteira (CIF): descrevendo as principais ações voltadas ao desenvolvimento regional a partir da perspectiva do poder público municipal. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, 47(5):1165-188, set./out. 2013.
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
277
BRESSER-PEREIRA, L. C. Do estado patrimonial ao gerencial. In: Pinheiro, Wilheim e Sachs (orgs.), Brasil: Um Século de Transformações. São Paulo: Cia. das Letras, 2001, p. 222-259. CÂMARA DOS DEPUTADOS. Congresso rejeita destaques e conclui LDO; texto prevê déficit fiscal em 2017. Disponível em <http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/521465-CONGRESSO-REJEITA-DESTAQUES-E-CONCLUI-LDO-TEXTO-PREVE-DEFICIT-FISCAL-EM-2017.html>. Acesso em 23/12/2016. CELSO, R. P.; SILVA, S. J.; COELHO, F. S. Análise Comparativa das Políticas de Governança Eletrônica nos BRIC(s). Dossiê Democracia e Políticas Públicas. Revista Debates, Porto Alegre, v.6, n.2, p. 37-63, maio/ago. 2012. FERNANDES, F. S. Capacidade institucional: uma revisão de conceitos e programas federais de governo para o fortalecimento da administração pública. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v.14, nº 3, Artigo 2, jul./set. 2016. GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2008. 6. ed. 200p. GONÇALVES, R. G.; MARRA, N. C. REGIÕES METROPOLITANAS: uma modalidade de gestão desconcentrada e cooperativa. R. Pol. Públ. São Luís, v.16, n.1, p. 169-177, jan./jun. 2012. GRIN, E. J. Trajetória e avaliação dos programas federais brasileiros voltados a promover a eficiência administrativa e fiscal dos municípios. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, 48(2):459-480, mar./abr. 2014. GUIMARÃES, P. B. V.; SILVA, L. M. Autorregulação jurídica no urbanismo contemporâneo: smart cities e mobilidade urbana. Revista de Direito da Cidade. Vol. 08, nº 4, p. 1231-1253, 2016. ISSN 2317-7721. MACHADO, J. A.; ANDRADE, M. L. C. Cooperação intergovernamental, consórcios públicos e sistemas de distribuição de custos e benefícios. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, 48(3):695-720, maio/jun. 2014. MATOS, F.; DIAS, R. Cooperação intermunicipal na bacia do rio Paraopeba. Rev. Adm. Pública. Rio de Janeiro, 46(5):1225-250, set./out. 2012. MENDES, José Fernando Gomes. O futuro das cidades. Rio de Janeiro: Editora Interciência, 2014. 1. ed. 120p. PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTALEGRE. Sobre o Município. Disponível em: <http://www.portalegre.rn.gov.br/listaprod.asp?lista=categoria&tipo_id=359>. Acesso em: 24 de jan. 2017. REZENDE, D. A. Planejamento de informações públicas municipais: sistemas de
Grupo Temático 2: Governança e Cooperação no Setor Público SILVA, M. M. P.; OLIVEIRA, F. P. S.
278
informação e de conhecimento, informática e governo eletrônico integrados aos planejamentos das prefeituras e municípios. RAP. Rio de Janeiro, 41(3):505-36, maio/jun. 2007. SILVA, J.; TITTON, L.; KITAZAWA, H.; BRITTO, L.. ECONOMIA COLABORATIVA: Uma análise da relação entre valores pessoais, formas de colaboração e efeito dotação. 10º Congresso Latino-Americano de Varejo: "Big Data & Applied Retail Analytics", Brasil, set. 2016. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ocs/index.php/clav/clav2016/paper/view/5892/1682>. Data de acesso: 06 mar. 2017. SIMÃO, J. B.; SUAIDEN, E. J. Cidades digitais em municípios brasileiros de pequeno porte: proposta de um modelo de implantação. Inc. Soc., Brasília, DF, v. 5 n. 2, p.99-116, jan./jun. 2012. SOUZA, C. A. P.; LEMOS, R. Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança. Revista de Direito da Cidade. Vol. 08, nº 4, p.1757-1777, 2016. ISSN 2317-7721. TEODÓSIO, A. S. S. Gestão pública em cidades de pequeno porte: oito perspectivas críticas sobre o desenvolvimento local. Revista Administração em Diálogo. São Paulo, v. 14, n. 1, 2010, p. 01-28. VIANA, F. C.; NASCIMENTO, M. A. L. O turismo de natureza como atrativo turístico do município de Portalegre, Rio Grande do Norte. Pesquisas em Turismo e Paisagens Cársticas. Campinas, 2(1), 2009. WESTPHAL, M. F. Municípios Saudáveis: aspectos conceituais. Saúde e Sociedade. 6(2):9-18, 1997.
Top Related