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GEOPROCESSAMENTO NA BUSCA DEPARÂMETROS INSTITUCIONAIS DE
CONSERVAÇÃO FLORESTAL: O CASO DOSTERRITÓRIOS AYAHUASQUEIROS EM
RONDÔNIA-BR
Julien Marius Reis Thevenin
Universidade Estadual Paulista- UNESP
Edson Luís Piroli
Universidade Estadual Paulista- UNESP
INTRODUÇÃO
Alguns cientistas no campo dos estudos religiosos responsabilizam o
monoteísmo cristão surgido em regiões semiáridas por parte do afastamento da sociedade
ocidental da natureza, que associado ao modo de produção capitalista tem contribuído para
radicais mudanças na cobertura da terra. Salatino (2001) nos mostra, que antigas tradições
religiosas que se originaram e desenvolveram em regiões semiáridas em meio a uma
natureza hostil contribuíram para que não se desenvolvesse o sentimento de veneração de
animais e plantas, que é tão comum em outras tradições. Não só as características biofísicas
exerceram influências, mas também concepções dualistas como o antropocentrismo ou o
teocentrismo, monoteísmo ou politeísmo contribuíram antagonicamente para a postura de
indivíduos e grupos humanos perante a natureza (GUILHARDI; CHADDAD, 2010; SALATINO,
2001).
Características da paisagem como a inexistência de vida, pela ausência de
árvores, jardins, pássaros etc. expressam a atitude antinatural presente em grande porção
de territórios religiosos na atualidade. No entanto, em tradições religiosas e comunidades
tradicionais que apresentaram atitudes de sacralização da natureza, a presença de plantas e
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animais sempre foram uma constante em seus territórios, como afirma Salatino (2001) ao
analisar algumas religiões orientais.
Nos estudos de mudança florestal, cada vez mais arranjos institucionais tem
merecido uma atenção especial, pois instituições efetivas de posse da terra têm o potencial
tanto para limitar a exploração florestal como para encorajá-la, sendo amplamente
reconhecidas como fundamentais para eficiente gestão florestal (TUCKER; SOUTHWORTH,
2009). Nessa perspectiva, vê-se que instituições poderosas como as religiões têm
importante papel, pois possuem grande potencial tanto para afastar o homem da natureza,
com posturas antinaturais, quanto para aproximá-lo com a sacralização da natureza
(SALATINO, 2001).
Assim, tendo em vista os problemas ligados às mudanças no uso e cobertura da
terra, em especial, ao desflorestamento da Amazônia no estado de Rondônia, foram
analisados, neste estudo, os territórios religiosos de instituições que tem por prática o uso
do chá Ayahuasca1 em seus rituais. Surgidos a partir das primeiras décadas do século XX, em
meio à floresta Amazônica brasileira, esses movimentos religiosos cristãos, que foram
liderados por seringueiros e atualmente se expandem pelo Brasil e pelo mundo,
apresentam novos paradigmas a serem desvendados pela ciência.
A necessidade que essas religiões têm de plantar o cipó Banisteriopsis caapi,
popularmente chamado de jagube ou mariri e da folha Psychotria viridis, popularmente
chamada de rainha ou chacrona para o autoconsumo do chá Ayahuasca, e a necessidade
reconhecida por essas instituições de que essas espécies precisam do ambiente florestal
para um melhor desenvolvimento é o foco principal desse estudo. Nesse sentido, o presente
trabalho analisou o uso e a cobertura da terra em 14 propriedades rurais de religiões
ayahuasqueiras no estado de Rondônia-BR (Figura 1). Estima-se, a partir das pesquisas de
campo desenvolvidas, que a área total dessas propriedades equivale atualmente a cerca de
70% de todo território ayahuasqueiro no estado de Rondônia.
O território religioso ayahuasqueiro em Rondônia foi escolhido enquanto recorte
espacial por ser um dos estados que apresenta o maior número de usuários da Ayahuasca
(não-indígenas) atualmente2. Além disso, diferente do estado do Acre, Rondônia é um dos
1 Inúmeras são as denominações utilizadas para designar o chá Ayahuasca, como por exemplo: Hoasca, Daime, Vegetal, Cipó, Mariri, Yagé ou Kamarampi. Segundo Bernadino-Costa e Silva (2011) o termo Ayahuasca tem sido o mais utilizado na bibliografia acadêmica para se referir ao chá e às práticas culturais a ele relacionadas.
2 Na região amazônica apenas o estado do Acre tem um maior número de unidades administrativas (no total das
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estados (inserido na Amazônia legal) que sofreu as maiores taxas de desmatamento ao
longo da história. Dados recentes obtidos pelo INPE (2014) apontam que as taxas de
desmatamento, em Rondônia, que haviam sofrido uma redução entre os anos de 2006 e
2010 (de 2.049 km² para 435 km², respectivamente), voltaram a aumentar no período entre
2010 e 2013 (de 435 km² para 933 km²). Tais taxas só são superadas pelos estados do Pará e
do Mato Grosso, considerando-se o desmatamento da Amazônia legal para esse período de
tempo.
A metodologia do trabalho contou com aplicação de entrevistas e questionários
dirigidos aos responsáveis institucionais de cada propriedade, e o mapeamento da
cobertura da terra nessas propriedades, que foi realizado a partir de técnicas de
geoprocessamento incluindo observações sistemáticas em campo com apoio de aparelho
de posicionamento global (GPS), e que teve como foco principal a classificação da fisionomia
da vegetação. Para o mapeamento foram utilizadas imagens do satélite QuickBird extraídas
do Google Earth através do aplicativo El-Shayal, em resolução espacial de 0,70 m. Usando-se
o aplicativo Envi 5.0 foram realizadas classificações orientadas a objeto, cujo resultado foi
corrigido manualmente no aplicativo ArcGIS 10 com base em fotointerpretação e
observações realizadas em campo.
religiões ayahuasqueiras) do que Rondônia, segundo consta em Labate, Goulart e Araújo (2002), no período desta publicação o Santo Daime (Alto Santo) tinha 600 filiados em toda a instituição, o Centro Espírita e Culto de Oração, Casa de Jesus, Fonte de Luz (Barquinha) 500, o Centro Espírita Beneficente União do Vegetal (UDV) 7.000, e o Santo Daime (CEFLURIS) 3.000. Segundo dados mais atualizados a UDV (maior instituição ayahuasqueira em número de sócios) contava em maio de 2010 com 13.839 sócios, onde aproximadamente 1/6 desses se concentravam em Rondônia, estado onde a religião se originou (BERNADINO-COSTA; SILVA, 2011).
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Figura 1: Localização das 14 propriedades rurais de instituições ayahuasqueiras no estado deRondônia, Brasil.
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A opção por utilizar a classificação orientada a objeto se deu, principalmente,
devido à escala de detalhamento associado ao uso de imagens de alta resolução. A melhoria
da resolução espacial proporcionada pelos avanços tecnológicos ampliou as dificuldades de
aplicação dos classificadores digitais tradicionais (classificadores pixel a pixel), que foram
desenvolvidos baseados em características do pixel como unidade primitiva de informações
a respeito do alvo, voltados, sobretudo, a imagens de baixa resolução espacial (BLÄSCHKE;
STROBL, 2001; LUZ et al., 2010).
A abordagem orientada a objeto surgiu para atender essas novas necessidades
de classificação, baseando-se em objetos compostos pelo agrupamento de pixels a partir da
segmentação da imagem, e ao mesmo tempo permitindo a identificação e separação das
informações contidas na imagem pelos usuários (BAATZ; SCHÄPE, 2000; ALVES et al., 2009;
LUZ et al., 2010). Diversos pesquisadores analisaram a eficiência dessa técnica para o
mapeamento de uso e cobertura da terra e obtiveram como resultado uma exatidão total
superior aos métodos de classificação automáticos tradicionais (MITRI; GITAS, 2004;
ANTUNES, 2003; PINHO, 2005; YAN et al., 2006; ROCHA, 2007; ALVES et al., 2009).
METODOLOGIA
Pesquisa de campo
Em campo foram aplicados 14 questionários acompanhados de entrevistas
semiestruturadas (a partir de um roteiro) aos responsáveis institucionais de cada
propriedade as quais foram gravadas e posteriormente transcritas. Segundo Tucker e
Ostrom (2009, p. 114), “dados coletados localmente também oferecem uma dimensão crítica
para subsidiar análises multiescalares e trans escalares dos fatores institucionais, políticos,
socioeconômicos e ecológicos associados a mudanças em florestas”. A análise das
informações obtidas nos questionários e entrevistas serviram de subsídio para entender a
relação estabelecida entre as áreas delimitadas e as instituições ayahuasqueiras, assim
como, para o reconhecimento dos processos de mudança da cobertura florestal.
Para fins de delimitação das propriedades foram obtidas as coordenadas de
seus vértices com o aparelho Trimble Recon GPS edição XB. O receptor desse GPS permite
uma precisão confiável de 2 a 5 metros, e foi especificamente desenvolvido para determinar
posições em ambientes hostis, como debaixo de copas de árvore ou em construções (de
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acordo com suas especificações técnicas). Também foram registrados 207 pontos de
coordenada no GPS, apoiadas de registro fotográfico, e descrição detalhada da paisagem
para as diferentes classes de cobertura da terra. Nesse procedimento houve uma especial
atenção à descrição fitofisionômica da paisagem, tendo em vista a necessidade de classificar
a vegetação em três diferentes estágios sucessionais: inicial, intermediário ou avançado.
Sensoriamento Remoto e Sistema de Informações Geográficas
Através do aplicativo livre El-Shayal Smart Web On Line foram extraídas imagens
georreferenciadas do aplicativo Google Earth (satélite Quickbird), com resolução espacial de
70 cm, para cada uma das propriedades da área de estudo. Ao extrair as imagens desse
modo perde-se a princípio a possibilidade de manipulação das bandas do satélite, porém
em nenhuma delas foi identificada cobertura de nuvens. Estas imagens já tratadas, datadas
entre 2008 e 2014, junto às coordenadas dos vértices registrados em campo foram
utilizadas na delimitação das propriedades, por meio do aplicativo ArcGIS 10. Concluído o
processo de vetorização das propriedades foi calculada a área de cada uma em metros
quadrados e em hectares, assim como a área total do conjunto de propriedades.
No aplicativo Envi 5.0 foi realizada a classificação orientada a objeto para cada
imagem recortada pelos limites das propriedades analisadas. Os parâmetros da
segmentação multirresolução foram os seguintes: o algoritmo de segmento configurado foi
o de borda (Edge), com o nível de escala variando entre 40 e 50; em configurações de
mesclagem o algoritmo escolhido foi o padrão (Full Lambda Shedule), em níveis de fusão
variando entre 97 a 99, os níveis foram escolhidos de acordo com o delineamento mais
adequado para cada propriedade. Os níveis médios configurados no algoritmo de segmento
evitaram excesso de segmentação e/ou ausência das mesmas, na busca de atingir limites
equivalentes aos limites das classes de cobertura da terra definidas a seguir. Já as
configurações de mesclagem buscaram fundir o máximo de pequenos segmentos dentro de
áreas maiores, onde o excesso de segmentação pudesse ser um problema. O tamanho da
textura Kernel foi para todos 15, pois embora as áreas fossem pequenas não havia uma
grande variância de textura entre as classes.
Após a segmentação as classes foram definidas no painel de regras de
classificação, onde foi selecionado o atributo pertinente a cada classe de acordo com as
características específicas dessas áreas, sendo as mesmas: sucessão secundária (inicial,
intermediária, ou avançada), área sem vegetação (solo exposto, área construída), massa
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d’agua. As áreas de vegetação em diferentes estágios sucessionais foram definidas de
acordo com Mausel et. al. (1993), considerando três níveis: estágio inicial (SS1), no qual
ocorre vegetação graminóide dispersa entre vegetação de porte arbórea em crescimento;
estágio intermediário (SS2), caracterizado pela presença de árvores entre 8 e 12 m de altura,
com uma estratificação vertical relativamente evidente; e, finalmente, o estágio avançado
(SS3), no qual o dossel apresenta uma estratificação vertical mais evidente do que em SS2 e
com árvores normalmente excedendo 20 m de altura.
Devido ao grau de intervenção antrópica dessas áreas não foi considerada uma
classe específica para floresta primária, pois na maioria dos casos as florestas sofreram
corte seletivo (antes da aquisição da propriedade pelas instituições analisadas) ou efeito de
borda, principalmente por força do elevado número de pastagens no entorno das áreas de
estudo. As áreas de pastagem e de cultura agrícola, apesar de existirem de modo reduzido
nas propriedades, encontram-se na maioria em desuso, por isso foram consideradas como
estágio inicial de vegetação secundária. Já o plantio das espécies Banisteriopsis caapi e
Psychotria viridis ocorre em áreas específicas das propriedades, sob vegetação em estágio
avançado ou intermediário de regeneração.
Após a classificação orientada a objeto, foi realizada uma edição vetorial
manualmente no ArcGIS 10 com o objetivo de corrigir os erros da mesma em todas as
propriedades. Segundo Pratt (2007) uma análise realizada pelos olhos humanos continua
sendo a fonte mais robusta e experiente para avaliação de técnicas de segmentação. As
imagens classificadas foram transformadas em mapas de cobertura da terra, em escala
compatível ao nível de detalhamento das imagens (1:3.000). Cada classe teve sua área de
abrangência calculada, sendo em seguida tabulada e transformada em gráficos, utilizando o
aplicativo Microsoft Office Excel.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Cobertura da terra dos imóveis rurais a luz da legislação ambiental
O território ayahuasqueiro analisado somou no total das 14 propriedades rurais
277,36 hectares distribuídos pelo estado de Rondônia, conforme mostrado na Tabela 1.
Quanto ao crescimento dessas áreas, esse se concentrou na década de 1990 quando foram
adquiridas 85% dessas terras, visto que na década de 1980 só foram adquiridas 9%, e que
na década de 2000 houve uma drástica redução chegando a 2% do total de aquisições,
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apesar disso na década de 2010 esse percentual volta a crescer chegando ao ano de 2014
com 4%. O conhecimento do tamanho da área dessas propriedades é de suma importância
quando as mesmas são analisadas sob a ótica da legislação ambiental vigente, tendo em
vista que todas possuem menos de 2 módulos fiscais, e que o módulo fiscal no estado de
Rondônia é de 60 hectares como nos mostra Landau et al. (2012). Dessa forma essas
propriedades se encontram amparadas pelo art. 67 da Lei nº 12.651 (novo código florestal),
de 25 de maio de 2012, que instituiu que:
Nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro)
módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em
percentuais inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída
com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008,
vedadas novas conversões para uso alternativo do solo (BRASIL, 2012a).
Tabela 1: Informações sobre as propriedades da área de estudo.
Imóvel rural/informações Município Área (ha)
Data da Imagem de satélite
Ano de aquisição da propriedade
1 Ariquemes 8,381 10/06/2013 1982
2 Ji-Paraná 4,385 29/07/2013 1985
3 Porto Velho 12,373 11/03/2013 1987
4 Itapuã do Oeste 98,903 23/06/2010 1993
5 Seringueiras 6,062 20/06/2010 1993
6 Presidente Médici 2,619 06/04/2014 1994
7 Campo Novo de Rondônia 5,554 11/08/2010 1996
8 Alta Floresta d' Oeste 4,158 19/08/2008 1997
9 Candeias do Jamari 52,067 21/08/2011 1997
10 Candeias do Jamari 67,538 01/07/2010 1997
11 Cacoal 2,293 28/05/2014 2001
12 Buritis 2,280 05/07/2010 2002
13 Porto Velho 6,214 11/03/2013 2012
14 Novo Horizonte do Oeste 4,689 28/07/2010 2012
Vale ressaltar que o art. 12 da Lei nº 12.651/2012 institui que todo imóvel rural
na Amazônia Legal deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva
Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente,
com um percentual mínimo em relação à sua área total de 80 %, excetuados os
proprietários ou possuidores de imóveis rurais que realizaram supressão de vegetação
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nativa respeitando os percentuais de Reserva Legal previstos pela legislação em vigor à
época (BRASIL, 2012a). O novo código florestal permite, conforme foi instituído pela Lei
complementar nº 312, de 6 de maio de 2005, que dispõe sobre Zoneamento
Ecológico-Econômico do estado de Rondônia - ZSEE, a redução, exclusivamente para fins de
regularização, mediante recomposição, regeneração ou compensação da Reserva Legal de
imóveis com área rural consolidada, situados em área de floresta localizada na Amazônia
Legal, para até 50% (cinquenta por cento) da propriedade, excluídas as áreas prioritárias
para conservação da biodiversidade e dos recursos hídricos e os corredores ecológicos
(RONDÔNIA, 2005).
De acordo com os resultados do mapeamento da cobertura da terra mais de
80% das áreas de cada uma das 14 propriedades estão cobertas por vegetação nativa
(Figura 2), nesse ponto entende-se por vegetação nativa a floresta nativa e suas formações
sucessoras (SS1, SS2, SS3) conforme preconiza o novo código florestal. Essa lei não define a
vegetação primária e secundária e suas formações sucessoras no bioma Amazônia para o
estado de Rondônia, conforme algumas resoluções do CONAMA têm feito para a Mata
Atlântica (não há ainda lei desse tipo para a Amazônia).
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Figura 2: Distribuição percentual das classes de cobertura da terra por imóvel rural, com base nasoma da área total dos imóveis, e pela área total de cada imóvel.
Mesmo se considerássemos apenas os estágios de regeneração intermediário
(SS2) e avançado (SS3) como área coberta por vegetação nativa 13 dos 14 imóveis rurais
teriam áreas superiores aos 80% requeridos para fins de reserva legal. A propriedade 5 é a
única que não teria (com 79% de cobertura SS2 e SS3), porém a supressão da vegetação
nativa nesta é anterior à data de 22 de julho de 2008, de acordo com depoimento do
responsável e visualização de imagem de satélite histórica no aplicativo Google Earth, o que
lhe concederia respaldo legal no suposto caso. Ao analisar os 14 imóveis rurais como um
único território obteve-se por resultado que 224,5 ha (81%) se encontram coberto por SS3,
35,34 ha (13%) por SS2, 15,33 ha (5%) por SS1, e apenas 1,83 ha 1% por áreas sem vegetação
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(Tabela 2).
Tabela 2: Distribuição das classes de cobertura da terra por propriedade e área total em hectares.
Imóvel rural/Classe (ha) SS3 SS2 SS1 Área sem vegetação Massa d'água
1 7,52 0,04 0,13 0,67
2 1,18 1,31 0,06 0,05
3 6,99 4,04 1,07 0,23 0,02
4 82,33 10,05 6,51
5 2,07 2,75 1,19 0,03
6 2,6 1,68 0,03 0,05
7 3,1 1,46 0,91
8 3,42 0,34 0,36 0,02
9 41,93 9,37 0,55 0,2
10 61,81 2,15 3,29 0,27
11 1,34 0,52 0,22 0,04 0,15
12 0,68 1,35 0,14 0,09
13 4,85 0,28 0,87 0,18
14 4,68
Totais 224,5 35,34 15,33 1,83 0,17
Esses resultados são consideravelmente altos se levarmos em consideração o
cumprimento histórico da reserva legal no Brasil, assim como o desmatamento nas regiões
onde essas propriedades se concentram. Segundo Oliveira e Bacha (2003), no Brasil, desde a
década de 1970, tem sido comum o desrespeito ao cumprimento da reserva legal, sendo o
percentual dos imóveis que declaram tê-la abaixo dos 10%, e mesmo os que a cumprem não
mantém a área mínima definida por lei. Para tal afirmação o autor se baseou em dados do
cadastro de imóveis rurais do INCRA, ressaltando que não há dados sistematizados sobre o
número de imóveis e da proporção deles que mantêm reserva legal. Além disso, as
informações foram prestadas diretamente pelo produtor rural, que segundo o autor não
informaram em um ano base todos os dados da propriedade e excluíram informações que
poderiam comprometê-los.
Em estudo de caso em Minas Gerais, onde a legislação ambiental é menos
rigorosa, Soares et al. (2011) analisa 292 imóveis e chega a conclusão que apenas 41
possuem cobertura florestal em condição de atender a legislação ambiental referente a
demarcação de reserva legal. Já Silva (2008) ao analisar 86 assentamentos em Rondônia
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identifica que 61,4% da área sofreram corte raso da vegetação. Nesse segundo caso,
apresentando também contradições na esfera pública, tendo em vista segundo o autor que
esses assentamentos foram induzidos e financiados pelo governo federal, e estimulados
pelo estado por um modelo de produção baseado na pecuária e na soja.
Dados do INPE (2014) mostram que em 2012 não havia nenhum município (na
área de estudo) que detinha 80% de áreas florestadas (Tabela 3), conforme exige a lei para
imóveis rurais no estado. Porém esses dados incluem áreas que se encontram sob
diferentes regimes jurídicos, como é o caso de áreas urbanas, unidades de conservação e
terras indígenas. Municípios como Ariquemes, Seringueiras, Campo Novo de Rondônia,
Cacoal, Buritis, Presidente Médici e Novo Horizonte do Oeste chegam a ter menos de 50% de
sua área total florestada, e menos de 20% no caso dos dois últimos. Também é importante
levar em consideração as diversas alterações na lei, que durante alguns períodos exigiu
percentuais menores e em outros maiores de áreas coberta por vegetação nas
propriedades (OLIVEIRA; BACHA, 2003; CUNHA; MELLO-THERY, 2010).
Tabela 3: Desflorestamento até 2012 por município do estado de Rondônia, na área de estudo.
Municipio Área (km²) Desflorestamento até 2012 (%)
Ariquemes 4.480 3.186,9 (71,14%)
Ji-Paraná 6.955 2.610,9 (37,54%)
Porto Velho 34.636 8.321,5 (24,03%)
Itapuã do Oeste 4.131 8.92,2 (21,60%)
Seringueiras 2.280 1.155,9 (50,70%)
Presidente Médici 1.774 1.604,5 (90,45%)
Campo Novo de Rondônia 3.491 1.912,1 (54,77%)
Alta Floresta d'Oeste 7.138 2.249,6 (31,52%)
Candeias do Jamari 6.933 1.814,7 (26,17%)
Cacoal 3.820 2.497,1 (65,37%)
Buritis 3.315 2.270,3 (68,49%)
Novo Horizonte do Oeste 852 743,2 (87,23%)
Quanto às Áreas de Preservação Permanente (APP) nas propriedades, não foram
identificadas em pesquisa de campo topos de morros, montes, montanhas e serras, nem
áreas de alta altitude, nem encostas, tendo em vista a baixa altitude e declividade do relevo
nas áreas visitadas. As únicas áreas passíveis de preservação permanente foram faixas
marginais de curso d’água natural, nas quais apenas o imóvel 9 possui área consolidada sem
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vegetação, para fins de ocupação de 820 m² o equivalente à 0,08 hectares. No entanto essa
área consolidada também se encontra respaldada na Lei nº 12.727 de 2012 no trecho 1º do
art. 61-A, já que se encontra afastada a mais de 5 metros da faixa marginal do curso d’água:
Para os imóveis rurais com área de até 1 (um) módulo fiscal que possuam áreas
consolidadas em Áreas de Preservação Permanente ao longo de cursos d’água
naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 5
(cinco) metros, contados da borda da calha do leito regular, independente da
largura do curso d’água (BRASIL, 2012b).
Outros dois imóveis (1 e 7), que possuem também menos de um módulo fiscal,
tem pequenos trechos em APP composto com antiga pastagem e plantio de macaxeira com
vegetação em estágio inicial de sucessão, no entanto tais usos do solo também
encontram-se afastados a mais de 5 metros da borda da calha do leito regular do curso
d’água, o que os tornam isentos de recomposição conforme preceitua o artigo da lei citada.
Os demais usos em APP foram consolidados também em período anterior à data 22 de julho
de 2008, sendo os mesmos relacionados ao plantio das espécies Banisteriopsis caapi e
Psychotria viridis sob vegetação nativa em estágio intermediário e avançado de sucessão.
Segundo o art. 61-A da mesma lei “nas Áreas de Preservação Permanente, é autorizada,
exclusivamente, a continuidade das atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de
turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008” (BRASIL, 2012b).
Dessa forma, tendo em vista os dados de cobertura da terra apresentados, os
proprietários desses imóveis rurais estão passíveis de benefícios como o de servidão
ambiental, Cota de Reserva Ambiental – CRA e outros instrumentos congêneres previstos
em lei. Pois estão situados na Amazônia Legal e possuem índice de Reserva Legal maior que
50% de cobertura florestal, e não realizaram a supressão da vegetação nos percentuais
previstos pela legislação em vigor à época, o que lhes concede o direito de utilizar a área
excedente de Reserva Legal para esses fins. Para isso é necessário primeiramente que os
mesmos realizem o Cadastro Ambiental Rural – CAR, e instituam instrumento ou termo de
servidão ambiental firmado perante órgão integrante do Sisnama.
.
As plantas sagradas e a gestão do uso da terra
O plantio das espécies Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis acontece na área de
estudo em porções restritas das propriedades, e por vezes bastante dispersas sob a
cobertura de porte arbórea, o que dificultou um mapeamento preciso do mesmo.
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Independente do sistema implantado (como será visto a seguir) e da área abrangida, todos
os imóveis estão respaldados na Lei nº 12.651 (já citada) tendo em vista que sua
implantação se deu em data anterior a 22 de julho de 2008, com exceção das propriedades
13 e 14 que foram adquiridas no ano de 2012. A partir do trabalho de campo, imagens de
satélite e a classificação da cobertura da terra verificou-se que as propriedades 13 e 14
implantaram o sistema de plantio por raleamento de vegetação em área excedente aos 80%
destinados a reserva legal. Três sistemas de implantação do plantio dessas espécies foram
observados: a partir do raleamento da vegetação com corte raso do sub-bosque; a partir do
reflorestamento em áreas em estágio inicial de regeneração da vegetação; e, sem corte da
vegetação em áreas com vegetação em estágio intermediário ou avançado.
O sistema de plantio implantado por raleamento da vegetação com corte raso
do sub-bosque foi adotado em porções restritas da maior parte das propriedades (Figura 3).
Segundo entrevistados e Teixeira et al. (2008), o cipó Banisteriopsis caapi necessita de
entrada de luz no dossel em suas fases iniciais até alcançar a copa da árvore hospedeira,
principalmente em solos de baixa fertilidade, por isso a adoção desse sistema. Enquanto
que o arbusto Psychotria viridi tem boa adaptação em áreas com maior sombreamento,
embora também precisem de incidência da luz solar. Esse sistema é semelhante ao que foi
implantado na região cacaueira da Bahia (sistema cabruca), com o diferencial de possuir
mais sombreamento, não ter fins lucrativos, e nos casos analisados utilizar apenas espécies
endêmicas. Com mais de 250 anos de implantação o sistema cabruca baiano abriga uma
elevada diversidade de espécies arbóreas nativas, algumas inclusive atualmente só tem
ocorrência natural nas cabrucas, tendo se tornado fundamental na conservação do bioma
Mata Atlântica (SAMBUICHI, 2006; SAMBUICHI et al., 2008; OLIVEIRA et al., 2011; THÉVENIN;
JORDÃO, 2013).
O segundo sistema de implantação ocorre principalmente em áreas de
vegetação secundária em estágio inicial de regeneração, onde são plantadas espécies
arbóreas nativas e algumas exóticas de uso comercial (na maioria das vezes para
autoconsumo da comunidade ayahuasqueira), as quais servem de suporte e sombra para o
plantio das plantas ritualísticas (Figura 4). Esse tipo de reflorestamento ocorre de forma
espontânea e não por determinação jurídica em todas as 14 propriedades da área de
estudo. A partir dos resultados dos questionários aplicados calcula-se que no total das
propriedades foram plantadas aproximadamente 7.260 árvores entre endêmicas e exóticas.
Levando-se em consideração que a soma do total de áreas de SS1 e sem vegetação 17,16 ha
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tal valor equivale a aproximadas 427 árvores por hectare. No entanto, boa parte dessas
arvores já estão em estágio intermediário ou até mesmo avançado de crescimento.
Figura 3: Sistema de plantio do cipó Banisteriopsis caapi por raleamento da vegetação.
Figura 4: Área de plantio reflorestada, e mudas de espécies arbóreas endêmicas parareflorestamento.
Entre as arvores endêmicas plantadas se destacam principalmente: Ipê roxo ou
Pau D’Arco (Tecoma impetiginosa); Ipê amarelo (Tabebuia serratifolia); Apuí (Ficus fagiflolia);
Samaúma (Ceiba sumaúma); Mulateiro (Calycophyllum Spruceanum); Imburana de Cheiro
ou Cerejeira (Amburana acreana); Castanheira (Bertholletia excelsa); Cumaru ferro (Dipteryx
odorata); Cedro rosa (Swietenia mahagoni); Jatobá (Hymenaea courbril); Maçaranduba
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(Manilkara amazônica); Andiroba (Carapa Guianensis); Peroba (Aspidosperma spruceanum);
Aroeira vermelha (Myracrodruon urundeuva); Carapanaúba (Aspidosperma excelsum); Bréu
(Protium heptaphyllum); Mogno (Swietenia macrophylla); Copaíba (Copaifera multijuga);
Breuzim (Protium Caranauma); Faveira ou Pinho-cuiabano (Schizolobium amazonicum),
Freijó (Cordia goeldiana) e diversas árvores frutíferas. Dentre as espécies exóticas plantadas
se destacam: Eucalipto (Eucaliptus urophylla e E. grandis); Teca (Tectona grandis) e frutíferas
diversas. Os plantios de Eucalipto e Teca se restringem a duas áreas com 800 e 700 árvores
plantadas respectivamente em imóveis diferentes. As árvores frutíferas estão dispersas
próximo às áreas de ocupação da maioria das propriedades.
Entre as espécies endêmicas plantadas há predominância das de uso medicinal,
algumas delas ligadas por uma relação histórica a elementos simbólicos e espirituais a essas
instituições ayahuasqueiras, conforme afirmaram alguns dos entrevistados e comenta
Ricciardi (2008). Existem 21 espécies da flora Amazônica na lista oficial de espécies
ameaçadas de extinção, segundo instrução normativa nº 06, de 23 de setembro de 2008
(BRASIL, 2008). Dessas apenas quatro tem ocorrência no estado de Rondônia, sendo que
três delas são arbóreas (Amburana acreana, Bertholletia excelsa e Swietenia macrophylla) e
estão presentes nos reflorestamentos realizados em 8 das 14 propriedades na seguinte
proporção: Amburana acreana em 7 propriedades; Bertholletia excelsa 6 propriedades;
Swietenia macrophylla 1 propriedade3.
Nos plantios de Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis apresentados são
realizados manejos como adubação, roçagem e uso de inseticida. Não há um padrão de
roçagem nessas áreas, sua frequência varia e resulta tanto na manutenção de áreas sem
vegetação de sub-bosque como no crescimento avançado do sub-bosque. A adubação tem
sido realizada apenas em oito propriedades, sendo na maioria de forma esporádica, os que
a praticam dizem fazer uso de adubos orgânicos. Apenas no imóvel 4 é feito uso de
fertilizante químico (NPK), uma única vez ao plantar o cipó ou o arbusto. Apenas foram
registrados dois usos de inseticidas em toda a área dos imóveis, os mesmos de origem
orgânica (calda de fumo com urina de vaca, e produto biológico contra cupim) foram
utilizados para combater pulgões na planta Psychotria viridis e cupins em área de plantio.
Quanto aos herbicidas nenhum uso foi registrado nas áreas de plantio das espécies
ritualísticas, apenas foram utilizados em quatro imóveis em plantios de Ipê, Eucalipto e uma
3Se considerarmos também a ocorrência natural dessas três espécies esses valores aumentam para 10, 13 e 3respectivamente (segundo dados dos questionários).
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única vez numa antiga pastagem.
O terceiro sistema de implantação resume-se ao plantio, principalmente, do
Banisteriopsis caapi em área de vegetação em estágio intermediário e avançado de
sucessão sem corte da vegetação, sem adubação, ou qualquer outro tipo de interferência.
Tal atividade é definida pela Lei nº 12.651/2012 como atividade de baixo impacto ambiental
tendo em vista alínea h, i e j do inciso X do art. 3º, que definem como atividade de baixo
impacto ambiental:
h) coleta de produtos não madeireiros para fins de subsistência e produção de
mudas, como sementes, castanhas e frutos, respeitada a legislação específica de
acesso a recursos genéticos;
i) plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros
produtos vegetais, desde que não implique supressão da vegetação existente
nem prejudique a função ambiental da área;
j) exploração agroflorestal e manejo florestal sustentável, comunitário e familiar,
incluindo a extração de produtos florestais não madeireiros, desde que não
descaracterizem a cobertura vegetal nativa existente nem prejudiquem a função
ambiental da área (BRASIL, 2012a).
Também vale ressaltar o art. 21 da Lei nº 12.651/2012 que torna livre, em áreas
de reserva legal, a coleta de produtos florestais não madeireiros, tais como frutos, cipós,
folhas e sementes (BRASIL, 2012a). Assim, segundo os entrevistados a tendência das práticas
analisadas é de manutenção e expansão tanto de áreas de plantio em SAFs, quanto às
destinadas à conservação florestal. O que pode ser visto no seguinte trecho de entrevista:
[...] o nosso objetivo é plantar mariri e ser autossuficiente [...]. Também aquele
lugar, o plantio, nós usamos como lazer, onde a gente pode levar nossas
famílias, ter uma privacidade, uma tranquilidade em poder estar num lugar que
você se sinta bem. Lá esse plantio nosso é isso é uma extensão do nosso lar,
extensão das nossas casas, chegamos lá e nos sentimos bem, esse é o objetivo
ter aquilo ali para nossos filhos, para nossos netos, e preservar. Preservar a
natureza pra um dia a gente mostrar para nossos netos, nossos filhos como que
é, hoje já está cada vez mais ficando difícil a floresta, então a gente quer ter
aquela floresta lá preservada essa é nossa intenção esse é nosso objetivo.
Cada uma dessas propriedades são frequentadas por associados às instituições,
com comunidades que variaram de 40 à 155 filiados, e que moram predominantemente nas
cidades. A grande maioria tem baixo poder aquisitivo, em média uma ou duas famílias por
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comunidade detém outra propriedade rural particular na qual também reproduz as práticas
de gestão do uso da terra desenvolvidas pelas comunidades ayahuasqueiras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os resultados mostraram que as técnicas de geoprocessamento adotadas foram
eficazes no mapeamento da cobertura da terra na área de estudo, permitindo a
identificação e a representação da fisionomia da vegetação e da distribuição espacial das
propriedades. Assim, técnicas como a de classificação orientada a objeto foi de fundamental
importância na análise de parâmetros institucionais de conservação florestal, o que permitiu
concluir que embora a área total dos 14 imóveis rurais ainda seja relativamente pequena,
94% de todo o território permanece com cobertura arbórea em estágio intermediário ou
avançado de sucessão, mesmo com o forte efeito de borda que sofre em função do grande
número de pastagens no entorno dessas propriedades. Legalmente esses territórios que
desenvolvem atividades de baixo impacto ambiental, também poderão se beneficiar de
instrumentos como o de servidão ambiental, Cota de Reserva Ambiental – CRA e outros
instrumentos congêneres, visto que na maioria dos imóveis suas áreas de reserva legal,
quando declaradas, ultrapassam os limites mínimos estabelecidos por lei.
Não é somente por força da lei que essas instituições têm conduzido suas
práticas de gestão e manejo, a ligação espiritual a algumas plantas e elementos da natureza
se mostram preponderantes nesta relação. Isso pode ser visto também em suas práticas de
reflorestamento, uma vez que junto às espécies nativas conservadas plantam no mínimo
uma das três espécies arbóreas ocorrentes no estado de Rondônia ameaçadas de extinção,
ou seja a Castanheira (Bertholletia excelsa), a Imburana-de-cheiro (Amburana acreana), e o
Mogno (Swietenia macrophylla). Em suma a expansão territorial ayahuasqueira está
relacionada ao crescimento e manutenção de áreas florestadas e/ou destinadas a plantios
das espécies Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis, em sistemas agroflorestais com
predomínio da agricultura orgânica, e traz em seu caráter religioso para sociedade urbana,
novos paradigmas na relação homem/natureza.
AGRADECIMENTOS
Agradecemos à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo –
FAPESP pelo apoio financeiro concedido, na forma de bolsa de doutorado.
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GEOPROCESSAMENTO NA BUSCA DE PARÂMETROS INSTITUCIONAIS DE CONSERVAÇÃO FLORESTAL: O CASO DOS TERRITÓRIOS AYAHUASQUEIROS EM RONDÔNIA-BR
EIXO 6 – Representações cartográficas e geotecnologias nos estudos territoriais e ambientais
RESUMO
Alguns cientistas no campo dos estudos religiosos responsabilizam o monoteísmo cristão surgido
em regiões semiáridas por parte do afastamento da sociedade ocidental da natureza, que
associado ao modo de produção capitalista tem contribuído para radicais mudanças na cobertura
da terra. Desse modo, tendo em vista os problemas ligados às mudanças no uso e cobertura da
terra, em especial, ao desflorestamento da Amazônia no estado de Rondônia, foram analisados,
neste estudo, os territórios religiosos de instituições que tem por prática o uso do chá Ayahuasca
em seus rituais. Surgidos a partir das primeiras décadas do século XX, em meio à floresta
Amazônica brasileira, esses movimentos religiosos cristãos, que foram liderados por seringueiros
e atualmente se expandem pelo Brasil e pelo mundo, apresentam novos paradigmas a serem
desvendados pela ciência. A necessidade que essas religiões têm de plantar as espécies
Banisteriopsis caapi e Psychotria viridis para o autoconsumo do chá Ayahuasca, e a necessidade
reconhecida por essas instituições de que essas espécies precisam do ambiente florestal para um
melhor desenvolvimento é o foco principal desse estudo. A partir dessas observações a presente
pesquisa analisou o uso e a cobertura da terra em 14 propriedades rurais de religiões
ayahuasqueiras no estado de Rondônia-BR. A metodologia do trabalho contou com aplicação de
entrevistas e questionários dirigidos aos responsáveis institucionais de cada propriedade, e o
mapeamento da cobertura da terra nessas propriedades, que foi realizado a partir de técnicas de
geoprocessamento incluindo observações sistemáticas em campo com apoio de aparelho de
posicionamento global (GPS), e teve como foco principal a classificação da fisionomia da
vegetação. Para o mapeamento foram utilizadas imagens do satélite QuickBird extraídas do
Google Earth através do aplicativo El-Shayal, em resolução espacial de 0,70 m. Utilizando-se do
aplicativo Envi 5.0 foram realizadas classificações orientadas a objeto, que posteriormente foram
corrigidas manualmente no aplicativo ArcGIS 10 com base em fotointerpretação e observações
realizadas em campo. Os resultados mostraram que a expansão territorial ayahuasqueira está
relacionada ao crescimento de áreas florestadas e/ou destinadas a plantios das Banisteriopsis
caapi e Psychotria viridis, em sistemas agroflorestais com predomínio da agricultura orgânica.
Embora a área total dos 14 imóveis rurais ainda seja relativamente pequena, 94% de todo o
território permanece com cobertura arbórea em estágio intermediário a avançado de sucessão,
mesmo com o forte efeito de borda que sofre em função do grande número de pastagens no
entorno dessas propriedades. Observou-se ainda a ocorrência de espécies arbóreas ameaçadas
de extinção na maioria das propriedades, as quais mantém áreas destinadas à regeneração
florestal superior às exigidas pelas normas de reserva legal vigentes.
Palavras-chave: geoprocessamento; Ayahuasca; conservação.
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